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Joedy Luciana Barros Marins Bamonte Regilene Aparecida Sarzi-Ribeiro [ORGS.] INTERSTÍCIOS DA PESQUISA NAS ARTES VISUAIS

INTERSTÍCIOS DA PESQUISA NAS ARTES VISUAIS · 2019-02-15 · INTERSTÍCIOS DA PESQUISA NAS ARTES VISUAIS Joedy Luciana Barros Marins Bamonte Regilene Aparecida Sarzi-Ribeiro Joedy

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Joedy Luciana Barros Marins BamonteRegilene Aparecida Sarzi-Ribeiro

[ORGS.]

INTERSTÍCIOS DA PESQUISANAS ARTES VISUAIS

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INTERSTÍCIOS DA PESQUISA NAS ARTES VISUAIS

Joedy Luciana Barros Marins BamonteRegilene Aparecida Sarzi-Ribeiro

Joedy Marins

Erika WoelkeCanal 6 Editora

Profa. Dra. Janira Fainer BastosProf. Dr. José Carlos Plácido da SilvaProf. Dr. Luís Carlos Paschoarelli Prof. Dr. Marco Antônio dos Reis PereiraProf. Dra. Maria Angélica Seabra Rodrigues Martins

Organização

Imagem da capa e aberturas

Projeto Gráfico e Diagramação

Conselho Editorial

Rua Machado de Assis, 10-35Vila América | CEP 17014-038 | Bauru, SPFone/fax (14) 3313-7968 | www.canal6.com.br

Interstícios da pesquisa nas artes visuais / Joedy Luciana Barros Marins Bamonte

Regilene Aparecida Sarzi-Ribeiro (orgs.). - - Bauru, SP: Canal 6, 2017.172 p. ; 21 cm.

ISBN 978-85-7917-475-9 1. Artes visuais. I. Bamonte, Joedy Luciana Barros Marins.

II. Sarzi-Ribeiro, Regilene Aparecida. III. Título.

CDD: 700.7

I61941

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1ª Edição 2017Bauru, SP

Joedy Luciana Barros Marins BamonteRegilene Aparecida Sarzi-Ribeiro

[ORGS.]

INTERSTÍCIOS DA PESQUISANAS ARTES VISUAIS

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Prefácio

Luisa Paraguai

Pensar sobre as pesquisas em Artes é compreendê-las como construção do fazer, cons-tituídas na/pela experiência. E é dessa perspectiva que se organizam nesta publicação as práticas dos artistas e pesquisadores, enquanto movimentos transversais e horizontais, capazes de constituírem ações inventivas, frente aos modos operativos estabelecidos dis-ciplinarmente e/ou institucionalizados. Nos textos aqui apresentados, percebem-se cons-truções potenciais enquanto deslocamentos entre campos de saberes, que mobilizam projetos pessoais em operações teórica, poética e educacional e desenham percursos na produção acadêmica de cada docente pesquisador.

Essas investigações parecem exercitar a compreensão do “transformar para conhecer, e não de conhecer para transformar a realidade” (PASSOS e BARROS, 2009, p.18), na me-dida em que mobilizam articulações e enfatizam processos, evocando repercussões nos demais campos de conhecimento, frente aos dados estabelecidos e forças já instituídas; e promovem modos de fazer/pensar a despeito de exercícios disciplinares e didáticos de abordagens especializadas, que buscam analisar e decompor a experiência na busca de uma compreensão dedutiva pelas partes (PARAGUAI e ROCHA, 2016).

Assim, em consonância com os autores Passos e Barros (2009, p.17-18), assume-se a pes-quisa em Artes como ação de intervenção, entendendo que esta “sempre se realiza por um mergulho na experiência que agencia sujeito e objeto, teoria e prática, num mesmo plano de produção ou de coemergência – o que podemos designar como plano de experiência”.

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Considerando a experiência humana como construção cultural dos sentidos – olhar, tocar, ouvir, cheirar, comer – na qual os limites corporais são codificados/modelizados coletiva-mente, interessa a estes pesquisadores compreender as mediações entre ações e objetos, sujeitos e modos de uso – enquanto construções socioculturais e políticas – para pensar como a ação artística, métodos e processos potencializa um pensamento/atitude crítica a partir dessas representações. Este diálogo relacional e mutável entre pesquisador e objeto de estudo atua como elemento agenciador da investigação: “no encontro entre o campo pesquisado e o pesquisador, podem surgir movimentos que modifiquem tanto um quanto o outro” (ARAÚJO e HILDEBRAND, 2015).

Nesse embate produtivo, processos disruptivos ocorrem na convergência de saberes e habilidades, nos quais a tecnologia, como uma outra lógica estruturante e não somente enquanto ferramental, atua em diálogo com essas ações de criação. Nesse sentido, con-forme De Certeau (2008), é necessário pensar essas práticas como “táticas de resistência”, que rompem com os sistemas disciplinares e verticais para negociar outras conformações potenciais, mais horizontais, e, portanto, inovadoras. Dessa maneira, também a materia-lidade, para além das propriedades técnicas e funções construtivas, atua como elemento formulador do exercício empírico e/ou poético – uma rede de símbolos que, enquanto es-truturam o objeto, negociam a sua expressividade. Uma vontade da/pela forma para criar narrativas – obras de ficção, realidades.

Importa-nos também apontar as produções no contexto do Grupo, na medida em que os diálogos compõem valores, crenças, desejos, interesses e expectativas, coletivos e pes-soais, bem como compromissos institucionais e políticos em uma clara ação de ampliação de enunciados e processos enunciatórios, alargando as possibilidades do compreender fazer pelo viés da práxis. Para Moles (2010, p.217), a complexidade da pesquisa contem-porânea coloca o pesquisador em um corpo social e, portanto, consciente de que os “mé-todos heurísticos por exemplo, emergem explicitamente à consciência do microgrupo na troca discursiva”. Dentre os vários fatores citados pelo autor para a emergência da criação ou invenção, ressalta-se a “capacidade construtiva resultante da comunhão dos recursos intelectuais” (MOLES, 2010, p.217), dependente do exercício efetivo e afetivo das relações interpessoais, permanentes e sistemáticas, em possíveis desconstruções hierárquicas. 5

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Não se pretende esgotar as práticas dos pesquisadores apresentados nesta publicação, e nem é este o desejo, mas trata-se de ler os trabalhos, construções formais da expressão individual, e aproximar-se dos artistas com o objetivo de evocar perguntas.

Referências

ARAÚJO, Daniel P; HILDEBRAND, Hermes R. ZL Vórtice: O processo criativo no contexto artístico contempo-râneo. In Anais do 24o Encontro Associação Nacional de Pesquisadores em Artes Plásticas, Santa Maria, 2015. Disponível em <http://anpap.org.br/anais/2015/simposios/s3/hermes_renato_hildebrand_daniel_paz.pdf>. Acesso em janeiro 2018.

CERTEAU, Michel de. A invenção do cotidiano: 1. Artes de fazer. Petrópolis, RJ: Editora Vozes, 2008.

MOLES, Abraham. A criação científica. 3a. Edição. São Paulo, SP: Editora Perspectiva, 2010.

PARAGUAI, Luisa; ROCHA, Cleomar. Pesquisa-Intervenção: traçados dos planos de experiências. In Anais do 25o Encontro Associação Nacional de Pesquisadores em Artes Plásticas, Porto Alegre, 2016. Disponível em <http://anpap.org.br/anais/2016/simposios/s5/luisa_paraguai-cleomar_rocha.pdf>. Acesso em janeiro 2018.

PASSOS, Eduardo; BARROS, Regina Benevides de. A cartografia como metodo de pesquisa-intervenção. In PASSOS, Eduardo; KASTRUP, Virgínia; ESCOSSIA, Liliana da (org.) Pistas do método da cartografia: Pesquisa-intervenção e produção de subjetividade. Porto Alegre: Sulina, 2009. p.17-34.

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Apresentação

Joedy Marins

A presente publicação nasceu do intuito de evidenciar conteúdos investigados no con-texto do Departamento de Artes e Representação Gráfica, onde eu e Regilene estamos alo-cadas dentro da Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação, do campus da Unesp de Bauru. Conversávamos sobre o quanto conhecemos sobre nossas pesquisas, as quais nos debruçamos durante horas e horas a fio diante dos monitores de nossos computadores, bibliotecas, anotações. Fazemos parte de um mesmo corpo em favor do ensino das Artes Visuais e temos tanto o que compartilhar, refletir, que iniciamos a partir disso um projeto para que pudéssemos vislumbrar melhor os olhares e pontos de interesse inscritos diaria-mente sob o teto do Darg.

Por entender que há um corpo formado por esses conteúdos que se encontram em uma configuração delicada, próxima e intrigante, demos o nome a ele de interstícios, como fen-das entre rochas, pequenas separações entre células, em referência à organicidade e ao mecanismo vivo do qual fazemos parte.

Nosso departamento reúne profissionais provenientes de diversas áreas – Arquitetura, Artes Visuais, Design, Educação Física, Engenharia – que se encontraram um dia para se dedicar ao ensino dentro da universidade. De maneira mais específica, temos o interesse pelo ensino do traço e da arte.

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Nos textos apresentados, podemos ler como cada colega interpreta suas zonas de in-teresse, sejam elas provenientes de suas bibliotecas, salas de aula, ateliês ou experiência pessoal. Os interstícios estão presentes entre as fendas de cada um desses locais, entre nós, entre os profissionais de outras instituições, na essência da arte.

A maneira como a arte se manifesta está presente em questões empíricas, plásticas, te-óricas, técnicas, poéticas, históricas, tecnológicas, educacionais, interativas, sociais, apro-ximando as áreas das quais cada autor provém. Trazem uma amplitude que nos faz pensar as dimensões da arte, sejam elas inter ou transdisciplinares. Somos chamados a pensar na complexidade da vida e em como ela se manifesta sem compartimentos ou divisões burocráticas.

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Sumário

11 INTRODUÇÃORegilene Ap. Sarzi-Ribeiro

15 DIMENSÕES REPRESENTATIVAS: O MATERIAL NA VIVÊNCIA DO ARTISTAEliane Patrícia Grandini Serrano

33 A OBRA COMO FRAGMENTO DO PERCURSO DO ARTISTA: UM ESTUDO SOBRE A PRÓPRIA POÉTICAJoedy Luciana Barros Marins Bamonte

43 OS DIAGRAMAS PEDAGÓGICOS DE MALEVICH: UMA TRADUÇÃO/CRIAÇÃO VISUAL DE SUA TEORIA2

Luana Maribele Wedekin

59 ERGONOMIA E MODA: ENFOQUE DE DESIGN E MODELAGEMMarco Antonio Rossi 9

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79 IMAGENS BIOMÉDICAS E HISTÓRIA DAS TÉCNO-IMAGENS: O CORPO AO AVESSO NA ARTE CONTEMPORÂNEARegilene Ap. Sarzi-Ribeiro

99 RECOMBINANTES ARQUITETÔNICOS TÊXTEIS TENSO-ESTRUTURAIS EM CAMPO EXPANDIDO ENTRE ARTES DIMENSIONAIS E ARQUITETURA: POTÊNCIA E SINGULARIDADESidney Tamai

127 ORIGAMI E DESIGN: ARTE E CIÊNCIA NO DESENVOLVIMENTO DE PRODUTOS INOVADORES Thaís Regina Ueno Yamada

147 LETRAMENTO ESPACIAL E GEOMETRIA DESCRITIVAVânia Cristina Pires Nogueira Valente

167 CURRÍCULO DOS AUTORES

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Introdução

Regilene Ap. Sarzi-Ribeiro

Trata-se de uma publicação interdisciplinar que surgiu da ideia de mapear as pesquisas realizadas visando uma cartografia que apresentasse a diversidade de temas e resultados, tal como uma rede tecida a partir da identidade e/ou coletividade.

Cabe lembrar que “o Departamento de Artes e Representação Gráfica foi instituciona-lizado através da Resolução Unesp nº 87 de 16/10/00, após processo de fusão de dois an-tigos departamentos: Departamento de Representação Gráfica e Departamento de Artes. Tais departamentos funcionavam como unidades independentes, sendo o primeiro volta-do para a área técnica e o segundo para a área artística. O curso de Artes Visuais, na épo-ca intitulado Educação Artística, era lotado no Departamento de Artes e o Departamento de Representação Gráfica atendia com disciplinas da área técnica as três unidades, a Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação, a Faculdade de Ciências e a Faculdade de Engenharia, do Campus Bauru” (Histórico. Departamento de Artes e Representação Gráfica – Site FAAC/Unesp, Bauru).

Participam de Interstícios da Pesquisa os professores doutores do Departamento de Artes e Representação Gráfica: Eliane Patrícia Grandini Serrano, Joedy Luciana Barros Marins Bamonte, Luana Maribele Wedekin, Marco Antonio Rossi, Regilene Ap. Sarzi-Ribeiro, Sidney Tamai, Thaís Regina Ueno Yamada e Vânia Cristina Pires Nogueira Valente, cujos textos são uma síntese das suas pesquisas mais recentes.

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Eliane Grandini, no artigo Dimensões representativas: o material na vivência do artista, apresenta parte dos resultados da sua pesquisa sobre a materialidade na arte contempo-rânea. Eliane afirma: “Hoje, os diferentes usos de materiais e processos criativos na criação do objeto artístico e a evolução do uso de elementos não ortodoxos, na história da arte con-temporânea, ampliaram o campo artístico a ponto de englobar outras áreas de criação [...]”.

Joedy Bamonte discorre sobre o seu próprio processo de criação no artigo A obra como fragmento do percurso do artista: um estudo sobre a própria poética. Joedy relata: “[...] a busca pelo objeto de estudo passa a ser um turbilhão que absorve tudo o que for necessá-rio para trazer respostas na forma plástica. Nessa absorção, as linguagens me emprestam subsídios, características que não me fazem necessariamente fiel a somente uma delas”.

Luana Wedekin, no artigo Os diagramas pedagógicos de Malevich: uma tradução/criação visual de sua teoria, discorre sobre o conjunto de 22 diagramas criados entre 1924 e 1927 no contexto em que Malevich atuava como professor. Luana ressalta que interessa o papel de Malevich “[...] como teórico e como sua teoria compreende uma visão peculiar da história da arte, traduzida de forma imagético-textual em seus diagramas pedagógicos”.

Marco Rossi, em Ergonomia e Moda: enfoque de design e modelagem, apresenta par-te dos resultados de suas pesquisas, cujo objetivo foi “[...] abordar o design de moda na questão da contribuição da ergonomia na modelagem de roupas em um ateliê de costura considerado uma microempresa de fabricação, venda e de ensino, localizada na cidade de Pederneiras, Estado de São Paulo, Brasil”. Marco ressalta que a finalidade “[...] foi propor melhorias nas questões de usabilidade e de conforto dos usuários de roupas confecciona-das nesse ateliê de costura”.

Regilene Sarzi-Ribeiro, no artigo Imagens biomédicas e história das técno-imagens: o cor-po ao avesso na arte contemporânea, exibe um estudo transdisciplinar que articula Artes Visuais, Filosofia Estética, Sociologia, Medicina e História das Técno-imagens, visando in-vestigar, segundo Regilene, “[...] como se constrói as diferentes corporalidades e registros do corpo pela fotografia, filmes, vídeo, raios X, scanner, entre outros dispositivos técnicos e linguagens artísticas, como a gravura expandida”.

Sidney Tamai descreve reflexões da experiência com arquitetura têxtil tenso-estrutu-rais, desenvolvidas com alunos de diversos cursos de Arquitetura. Conceitualmente, sua

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pesquisa atua em campo ampliado, entre escultura/instalações e arquitetura, aposta na potência inventiva desse enlace, em Recombinantes arquitetônicos têxteis tenso-estrutu-rais em campo expandido entre artes dimensionais e arquitetura: potência e singularidade. Sidney afirma: “o construir, como experimento de um processo, passa a ser entendido pe-los alunos como uma dinâmica técnica e também lúdica, capaz de articular todos os parti-cipantes em um trabalho de grupo”.

Thaís Ueno, em seu artigo Origami e design: arte e ciência no desenvolvimento de produ-tos inovadores, apresenta sua pesquisa sobre origami, tecnologia e design e mostra alguns trabalhos que exploram os conceitos básicos do origami no seu desenvolvimento, visando, segundo Thaís, resolver questões específicas de projeto como racionalização no aprovei-tamento de materiais, facilidade de transporte e montagem e flexibilidade de uso.

Vânia Valente, em Letramento espacial e geometria descritiva, discorre sobre o desen-volvimento da habilidade espacial dos alunos durante a Disciplina de Desenho II do Curso de Design da FAAC (Unesp), favorecendo o pensamento espacial eficiente, ou seja, promo-vendo seu Letramento Espacial. Conforme Vânia, “essa habilidade é necessária para a cria-ção, representação e leitura de projetos nas Engenharias, Arquitetura, Design e em outras áreas do conhecimento”, embora haja uma carência de seu desenvolvimento por parte dos discentes ingressantes na universidade.

Boa Leitura!

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Dimensões representativas:

o material na vivência do artistaEliane Patrícia Grandini Serrano

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A trajetória artística da contempora-neidade demonstra uma manipulação de sistemas objetuais diferentes, que trans-forma a matéria em códigos, linguagens e signos no interior da composição visual. Tudo isto ocorre no fluir da temporalidade, nas mutações sociais interferentes no pro-cesso cultural. Dito de outro modo, o artis-ta busca um arsenal de formas, matérias e conceitos que podem ser instrumentos de transformação de seus métodos, o que pode ser observado na sucessão de lingua-gens artísticas produzidas principalmente a partir do final do século XX, onde o inte-resse está em provocar possibilidades ex-pressivas com a prática e manipulação de diferentes materiais.

Nessa perspectiva, Laurentiz indica que:

A matéria é a preocupação mecânica com o suporte material, ao passo que a mate-rialidade abrange o potencial expressivo e a carga informacional destes suportes, englobando também a extramateriali-dade dos meios de informação. [...] Isto acarreta mudanças importantes, pois “operar sobre a matéria e sobre a ma-terialidade determinam maneiras dife-rentes de comportamento. (LAURENTIZ, 1991, p.102-03)

Pintores, escultores, arquitetos, músicos e, ainda, profissionais de todas as áreas do conhecimento elencam e refletem sobre o uso de materiais no processo de criação. A apropriação dos materiais faz parte da ex-periência artística desde os tempos mais re-motos, passando por materiais orgânicos e chegando aos industrializados. A Arte sem-pre se deparou com as múltiplas possibili-dades para sua materialização visual. A cada novo movimento artístico, uma maneira de trabalho é apresentada, e muitas dessas novidades acontecem justamente por no-vas escolhas matéricas. Somente esse viés poderia ser um escopo para o estudo da História da Arte, conforme ressalta Amaral:

Numa época em que as discussões sobre a imagem se voltam cada vez mais aos conceitos de imaterialidade e de virtua-lidade; onde os procedimentos técnicos apropriam-se do simulacro promovendo acentuado afastamento da manualidade e da artesania através de uma produção mecanizada, industrial e digital; momento em que as mídias tecnológicas invadem a cultura se impondo como necessidade premente, parece anacrônico pensar a Arte contemporânea a partir da ideia de materialidade. (AMARAL, 2011, p. 22)

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anoOlhando por esse prisma, é certo que

as manifestações conhecidas e/ou classi-ficadas como action painting, happening, arte conceitual, instalação, performance, etc., materializam-se e ganham força por meio da utilização de materiais não ar-tísticos, incorporados ao objeto de Arte. Obviamente esta não é uma prática nova. Desde 1953, a Assemblage, por exemplo, já é uma velha conhecida dos estudos sobre as artes, porém, o que sempre se renova é a forma de solidificar as ideias a partir de determinados materiais, ou seja, a produ-ção de sentidos da Arte Contemporânea não se esgota, afinal, os diálogos, as inter--relações são os pressupostos da Arte que vivenciamos hoje.

Os deslocamentos de objetos para o contexto artístico podem ser conhecidos, já em 1913, com os ready-made apresen-tados por Marcel Duchamp (1887-1968), o qual nos trouxe a reflexão do efêmero da obra de arte. Para o artista, a durabilidade e a estética do objeto artístico não eram mais os fatores que geravam a dependência da Arte, ou seja: “A arte não é mais para ele uma questão de conteúdos (formas, cores, visões, interpretações da realidade, maneira ou estilo), mas de continente” (CAUQUELIN, 2005, p. 92).

A autora enfatiza que a nova proposta de Duchamp caracteriza não apenas um fazer artístico diferenciado, mas se destaca em relação a um posicionamento global de atitude, de ação e também de procedimen-tos novos. Ele rompe com os modelos que até então vinham sendo adotados e se de-clara “antiartista”, daí a valorização do con-tinente, ou seja, tudo depende do local que abrigará o objeto. Por mais estranho que este possa ser, o que vale no novo olhar de Duchamp são as atribuições sígnicas des-tes. Roda de Bicicleta, de 1913 (Figura 1), e Fonte, de 1917 (Figura 02), são os primeiros ready-mades que tiram a visão de que o artista deveria produzir “à mão” seus tra-balhos. Peças de bicicleta e um urinol são transportados para um espaço diferente do qual serviriam utilitariamente falando. O artista os levou do plano funcional para o plano simbólico, com isso provocou mu-danças no conceito e na essência da arte. Duchamp, então, reinventa não apenas sua arte, mas todo o contexto da Arte, que re-verbera até nossos dias.

Tratar como Arte objetos industrializa-dos não diminui a força e a responsabili-dade do artista. O que Duchamp fez foram escolhas diferentes. Não houve a interven-ção do artista na fabricação dos objetos,

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Figura 1. Roda de Bicicleta, Marcel Duchamp, 1913

Fonte: http://www.portal.fae.ufmg.br/pensareducacao/portal/view/files/

Marcel%20Duchamp.pdf

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anoFigura 2. A Fonte, ready-made

(urinol invertido), Marcel Duchamp, 1917, 60 cmFonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Fonte_(Duchamp)

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porém, ele os escolheu para serem colo-cados em um espaço e tempo diferentes. Se ao artista coube uma escolha, pode-se pensar no estabelecimento de uma cura-doria do “que”, mas principalmente do “como” expor o objeto direcionado para o espaço artístico. Sobre isto, Cauquelin diz: “Num objeto fabricado, a intervenção do artista é, em resumo, mínima. Ele ‘acres-centa’ algumas vezes ao ready-made ou ao signo, mas a materialidade do objeto con-tinua fora dele” (CAUQUELIN, 2005, p. 97).

Tal consideração nos força a refletir so-bre o aspecto da matéria e da materialida-de. Pode-se perceber que esses elementos são inseparáveis, pois o material, por si só, não se constitui em materialidade; logo, não possui potencial expressivo. Se mate-riais como papel, tintas, pedras, chocolate, ferro, etc., são materiais convencionais e não convencionais usados pelas artes vi-suais, o que pensar sobre essa exploração matérica destinada à expressividade? E, ainda, quando esses ou outros materiais se tornam expressivos? Solange Utuari (1999), remetendo-se a uma pesquisa da crítica genética, cita Cecília Salles:

Os objetos, antes de um processo de-terminado, não têm status artístico. São

escolhidos, saem de seu contexto de sig-nificação primitivo e passam a integrar um novo sistema direcionado pelo dese-jo daquele artista. Ampliam, assim, seu significado e ganham natureza artística. (SALLES apud UTUARI, 1999, p.8)

Os materiais são os meios formais do ob-jeto artístico e se tornam expressivos pela manipulação do artista que incorpora ao material toda a subjetividade do seu tem-po e de sua cultura. Esse conceito estético e cultural, relativo à sua expressividade, é uma preocupação definida pelo processo de criação. O artista entende que o mate-rial a ser utilizado na confecção do objeto funciona como mediador na instauração de sua linguagem. A autora acima citada discute sobre os procedimentos utilizados na escolha do material e os respectivos processos de criação:

Percurso criador. Olhar/ sentir/ pensar o que antes, simplesmente, não era. Cada novo olhar é outro olhar, e assim vai se fazendo a obra. Existem vontades. Vontades de artista: projetos, esboços, estudos, protótipos. Vontades da ma-téria: resistir, provocar, obedecer, dialo-gar com o artista. Existe um tempo: do

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anodevaneio, da vigília criativa, do fazer sem parar, de ficar em silêncio e distante, de viver o caos

criador. Existe um espaço: o ateliê. Espaço para produzir, investigar, experimentar. Repouso e reflexão. Espaço-referência. Existe sempre a busca incansável para o artista inventar a sua poética de tal forma que, enquanto a obra se faz, se inventa o modo de fazer. Invenção que, na cartografia, convoca o andarilhar pelo território. Processo de Criação. (SALLES apud UTUARI, 1999, p.4).

Apropriando-se de diferentes materiais, Pablo Picasso (1881-1973) torna-os próprios para os meios que os deslocou, ou seja, tornou artístico algo impróprio para essa lingua-gem. Servindo como paradigma dessas novas questões da Arte, “Picasso produziu arte de qualidade estupenda, seja pela concepção, seja pela realização, pela engenhosidade da invenção e pela constante justeza de execução” (GREENBERG, 2013, p.81).

Provocado por suas inquietantes fases, Picasso explorou múltiplas formas de arte, jun-to com Duchamp, apresentou plasticamente o conceito da reinvenção da arte a partir de suas pesquisas no campo matérico. Em consonância com a “invenção e justeza de exe-cução”, dita por Greenberg (2013), um artigo de Arnaldo Jabor1 elege Picasso como um revolucionador do olhar, aquele que alterou o rumo da história da arte por suas ideias re-volucionárias da arte moderna:

Picasso sabia que nada existe além da vida, nada over the rainbow, nada além do nosso olho que, esse sim, pode ser ampliado como um telescópio ou caleidoscópio, se não estiver do-mesticado por ideologias ou delírios [...]. ( JABOR, 2011, p.D8)

Esse olhar se reflete também na busca do material transformador e criador da arte, deixa de ser instrumento para ser a própria arte. Jabor cita ainda um depoimento da viúva do pintor: “Picasso mexia em tudo: de um peixe comido ele tirava a espinha e fazia uma cerâmica, um selim de bicicleta ele transformava em cara de boi, o regador em um homem, um automóvel em macaco [...]” (ibidem). A série com a temática da guitarra, produzida por Picasso, é um exemplo de reinvenção da própria arte, reinventou o instrumento através das tintas e colagens de papel sobre a tela (Figuras 3 e 4).

1. JABOR, Arnaldo. Picasso nos dá vontade de viver. Jornal O Estado de São Paulo. Caderno 2. 08/02/2011. p. D8.

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Figura 3. Guitarra, 1913. Pintura e Colagem de 1913,

elaborada com jornal recortado, partituras e papel de parede imitando madeira.

Fonte: http://www.istoe.com.br/reportagens/129068_

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anoFigura 4. Guitarra, 1912, feita

de papelão, metal e arameFonte: http://www.istoe.com.br/reportagens/129068_O+CHOQUE+DO+NOVO

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O artista inclui novos elementos na obra em 1912, com isto faz nascer a colagem que depois dará origem à Assemblage, influenciando artistas dos séculos XX e XXI. Ele fez uma série de guitarra em que explorou não apenas a técnica, mas toda a linguagem, haja vista que não são esculturas, pois não têm pedestal/sustentação, nem pinturas, pois são tridi-mensionais. Ele mesmo dizia que eram simplesmente guitarras.

Com Natureza morta na cadeira empalhada (Figura 5), Picasso representa a realidade da cadeira sem colocar esta de forma completa, ou seja, utiliza-se de fragmentos matéricos como uma toalha cuja estampa imita a palha da cadeira, corda, papéis e a própria pintura, os quais fazem referência ao objeto representado. Prende-se, então, ao conceito de represen-tação, os objetos externos à pintura que ressignificam o tema e propõem um diálogo entre o surpreendente (matérias utilizadas) e o tradicional (técnica pictórica). Como diz Schapiro:

É uma pintura quase metafísica, ou epistemológica, em que o pintor desfruta os reflexos e seu próprio poder de manipular estágios diferentes do que chamamos realidade: o objeto real, o objeto simulado, a conjunção destes, e diversas construções arbitrárias que os unem. (SCHAPIRO, 2002, p. 41)

Figura 5. Natureza morta com cadeira empalhada, Picasso, 1912,

óleo sobre papel encerado sobre tela e corda, Museu Picasso, ParisFonte: http://www.historiaimagem.com.

br/edicao16abril2013/picasso.pdf

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anoO processo criativo evidenciado em

Picasso denota a potencialidade da ação artística de se abrir constantemente a no-vas respostas e leituras, independente-mente do tempo e espaço que são obser-vadas. Portanto, considerar a importância do leitor já era, no início do século XX, um dos constituintes compositivos.

Com a aplicação de pedaços de papéis diversos cortados e colados na tela junto à pintura, Picasso não apenas se reinventa, mas apresenta uma nova realidade artís-tica, sua produção é, portanto, reconfigu-rada. A pintura deixa de ser bidimensional e ganha relevos; a escultura, por sua vez, está apoiada em uma pintura. Sobre isso, Geenberg, ao falar do cubismo de Braque e Picasso, diz que a preocupação desses artistas era obter:

resultados escultóricos por meios estrita-mente não esculturais: ou seja, em des-cobrir para cada aspecto da visão tridi-mensional um equivalente explicitamente bidimensional, independentemente de quanto a verossimilhança sofreria neste processo. (GREENBERG, 2013, p. 94)

Hibridização? Talvez se pensarmos no conceito por Canclini (2006), que o define

como processos socioculturais em que es-truturas e práticas, que existiam de forma separada, combinam-se para gerar novas estruturas, objetos ou práticas.

Nesse sentido, Schapiro, Greenberg e Canclini destacam a importância do proces-so de criação que, no caso picassiano, forja concepções artísticas totalmente metafori-zadas: a realidade material é transportada para a realidade do simulacro pictórico. O processo criativo não é somente prazeroso, fruto da inspiração; ao contrário, é um pro-cesso complexo, ativo e objetivo, no qual a imaginação ganha vida a partir da percep-ção da realidade e reorganiza as impres-sões sobre essa realidade em uma nova for-ma a ser concretizada no contexto real. Ao transpor os limites da visualidade artística, Picasso torna a obra em objeto e propõe no-vas interpretações do real, em uma busca de relações entre sua poética e o objeto.

Tanto Duchamp quanto Picasso influen-ciaram as vanguardas posteriores. Com seus inquietantes e provocadores traba-lhos, motivam, até hoje, experiências esté-ticas. Com eles, artistas e público entendem que o conceito deve ser sempre o campo de descobertas individuais, tanto para um quanto para o outro. Por esse motivo, são atualizados na contemporaneidade.

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Sendo assim, já em nossa época, nos anos de 1990, Angelo Venosa, paulista, nas-cido em 1954, é outro artista que incorpora materiais como cera, chumbo, mármore e dentes de animais à sua obra (Figuras 6, 7 e 8). Segundo Tadeu Chiarelli, ao tentar rein-ventar sua arte, seduziu-se profundamente pela autonomia matérica e das formas in-quietantes que possibilitariam (CHIARELLI, 2002, p. 298).

Após muitos processos de inflexão, res-gata formas que antes seduziam o público, porém de maneira totalmente renovada, encontra então um equilíbrio entre conceito estético/artístico, usa a materialidade ex-pressiva a seu favor e não apenas congrega em si o fascínio dos materiais, cria uma lin-guagem singular significativa. Travando um diálogo entre forma e material, suas obras de caráter orgânico sugerem algo diferente da proposta dos ready-made. Com um viés mais artesanal e não industrializado como aqueles de Duchamp, Venosa se destaca gestualmente na construção de seus corpos escultóricos. Corpos porque, mesmo pos-suindo uma linguagem abstrata, de sua obra emergem imagens corpóreas; bocas, den-tes, ossos, esqueletos são usados e se mate-rializam textos visuais impressionantemen-te vivos, com uma organicidade inviolável.

Sua arte não se recusa a imitar a natu-reza, como a maioria das estéticas desse século, nem reduz a natureza a um sis-tema de signos, a uma imagem ou a um estímulo perceptivo, como as correntes realistas e neo-figurativas. Simulando procedimentos orgânicos repete a re-lação de esqueleto e pele, osso e carti-lagem, matérias fluidas e coaguladas. Pondo-se não à frente, mas atrás da natureza, como se esta fosse produzida por seu gesto, o artista assume literal-mente o papel de criador. É, todavia, um criador que não pode transmitir a vida. Muito pelo contrário, o ato de formali-zar imobiliza o processo orgânico numa tensão oca, imóvel. Com isso, a escultura se aproxima à sua matriz pré-histórica: a múmia. O ato de reproduzir, como a que-bra de um tabu, engendra uma maldição: o objeto natural resseca, incha, perde função e sentido. Nele permanece ape-nas o impulso primário, congelado num esforço inútil: a pele retesada, os dentes (MAMMI, 1996)

Na arte contemporânea, o diálogo entre a expressividade e a matéria de-monstra que o artista é o principal agen-te provocador do processo. Ao combinar

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anoFigura 6. Turdus 170, acrílico, 20 x 20 x 45 cm, coleção particular

Fonte: http://www.angelovenosa.com

Figura 7. Sem Título, 1994, osso de boi e bronze fundido, 47 x 42 x 20 cm, coleção particularFonte: http://www.angelovenosa.com

Figura 8. Sem Título, 1994, cera e dentes, 64 x 6 cm, coleção particularFonte: http://www.angelovenosa.com

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determinados materiais em seu objeto artístico, ele submete o ato pensado à au-tenticidade e independência plástica do material e também do imaterial, aprovei-tando os diversos e, às vezes, surpreen-dentes resultados, tornando-os maleáveis e ajustados à forma inicialmente criada.

E é justamente o sentido autêntico da Arte que Angelo Venosa estabelece em sua criação. No objeto estético produzido, tudo é relevante: a cor, a forma, a movi-mentação dos elementos a interferência humana, etc. Toda a ação artística acon-tece de maneira calculada, estudada, po-rém, o produto final é construído a partir do acaso desses materiais combinados entre si. Mediados pela matéria, o Artista e sua Arte revelam novas realidades – a tri-dimensionalidade se organiza dentro das possibilidades matéricas empregadas.

O artista contemporâneo busca a rela-ção entre o material e o tipo de expressivi-dade que este pode oferecer, o momento constitutivo fundamental da atividade ar-tística acaba por ser o momento em que os materiais são escolhidos e ordenados na sintaxe ou pré-iconografia da obra, como destaca Panofsky (1979). O autor entende a obra como processo, ou seja, o produto fi-nal, obviamente, será o gerador de sentido,

porém, para compreender seus significa-dos, é preciso nos voltar para a observa-ção, desde à ideia tida pelo artista, passan-do pela escolha do que será empregado, sua concepção, execução e finalização.

Na organização do espaço artístico, in-tervém a materialidade, escolhida pela sua particular vocação formal. Por isso mate-riais tais como poeira, chocolate, lã, ara-me, cera, parafina, tintas, mármore, etc., são utilizados na produção artística atual: “Matérias são pele sobre a carne da obra. A matéria é, portanto, sígnica na medida em que dá sustento, suporta significação, na mesma relação de conteúdo e forma” (FINI, 2008, p.47).

A abrangência da materialidade na arte contemporânea surge como uma maneira de explorar o potencial artístico de qual-quer material, e ao espectador é concedido o poder de conceitualizar. No ano de 2014, em São Paulo, para relembrar e comemo-rar os cem anos da apresentação dos pri-meiros ready-made de Marcel Duchamp, aconteceu a mostra Ciclo – criar com o que temos, no Centro Cultural Banco do Brasil.

Através de esculturas, instalações e performances, quinze artistas – Daniel Canogar, Daniel Senise, Douglas Coupland, Joana Vasconcelos, Julia Castagno, Lorenzo

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anoDurantini, Michael Sailstorfer, Michelangelo

Pistoletto, Pedro Reyes, Daniel Rozin, Petah Coyne, Ryan Gander, Song Dong, Tara Donovan, Tayeba Begum Lupi – desenvolveram trabalhos cujas pro-postas se basearam no uso de objetos já existentes. Cada um deles optou por uma técnica diferente e singular, mas seguiram o fio condutor: “Procuramos por trabalhos que criam o novo sem inventar mais coisas; que partem daquilo que já está, que já existe”, explica o curador Marcello Dantas (apud IARUSSI, 2014).

Logo na entrada do edifício do Banco do Brasil, deparamo-nos com a obra A Noiva (2005), da artis-ta portuguesa Joana Vasconcelos (Figura 9). Sua obra, um lustre de grandes proporções, integra-se totalmente ao espaço do Museu e parece pertencer ao local, porém, ao invés de cristal, material tradi-cional desse tipo de objeto, a escultura é composta de absorventes internos femininos – surpresa, pro-vocada pelo material, estabelecida logo no início.

Uma das características dessa artista é justa-mente o diálogo com Duchamp e também com o artesanato português. Produzida entre os anos de 2001 e 2005, a obra em questão utilizou cerca de vinte mil absorventes internos que são identi-ficáveis pelo observador somente ao se aproximar dela, ou seja, o espectador é convidado a olhar as entranhas da obra, suas partes internas, seus de-talhes. Esse fato provoca uma metáfora espacial com o próprio objeto constituinte da escultura.

Figura 9. A Noiva, Joana Vasconcelos, 2005Fonte: http://vejasp.abril.com.br/materia/chicletes-escultura-exposicao-centro-cultural-banco-do-brasil

Figura 10. Eguchi’s Ghost, Petah Coyne, 1989Fonte: http://arttattler.com/archivepetahcoyne.html

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Já a artista visual americana Petah Coyne participou com a escultura Eguchi’s Ghost (1989), produzida a partir de fios de aço extraídos de um Trailer Airsteam dos anos de 1950 (Figura 10), o qual foi frag-mentado em blocos e depois literalmente desfiados e modelados até adquirirem apa-rência de cabelo. A escultura simula uma peruca de grandes proporções e tem como base romances e contos literários para sua elaboração. Essa obra em particular teve como inspiração a novela japonesa The house of the sleeping, de Kawabata. A ar-tista dá voz ao imaginário repertoriado por imagens de sua memória. Ao “dissecar” o trailer, vai construindo mentalmente um objeto que, posteriormente, dará origem a uma grande cabeleira grisalha, muito pa-recida com as da mãe da artista, na época, segundo ela mesma indica no vídeo Ciclo. Como criar com o que temos, disponível no site: https://www.facebook.com/ccbbsp/videos/943135002368374/.

Até aqui percebemos que a tela, a tinta, a pedra de mármore não são mais os únicos meios para o artista expressar-se. Hoje, os diferentes usos de materiais e processos cria-tivos na criação do objeto artístico e a evolu-ção do uso de elementos não ortodoxos, na história da arte contemporânea, ampliaram

o campo artístico a ponto de englobar outras áreas de criação (design): as intervenções urbanas (grafite), o próprio corpo do artista (performance) e mesmo as expressões regio-nais e independentes (artesanato, Arte Naïf), fazendo parte, inclusive, do nosso cotidiano.

Quando o artista é atingido pela abran-gência de materiais e começa a trabalhá--los, acontece uma fusão entre o tempo e o espaço. Então, sujeito e objeto passam a dialogar. Se levarmos em consideração a abordagem de Bergson (1990) de que o tem-po se sobressai ao espaço, pois o único tem-po que pode ser considerado real é o vivido, deduzimos assim que a memória é o que fica, tudo o que faz parte de sua experiência vivida. Independentemente da intenção do artista, o significado inicial da matéria utili-zada no objeto artístico é, sim, preservado. Óbvio que, como já explicitamos, ao deslo-car o objeto para outro espaço, o mesmo é ressignificado, porém, sua identidade fica preservada, mesmo que minimizada.

A inserção de certos materiais na reali-zação de objetos artísticos reforça a ideia da participação ativa do artista no mundo; é como se existisse um olhar obsessivo que disseca os objetos e elementos a serem usa-dos nas obras, como estrutura básica da metamorfose do material em materialidade.

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CANCLINI. Nestor Garcia. Culturas Híbridas: Estrategias para Entrar e Sair da Modernidade Tradução Ana Regina Lessa, Heloísa Pezza Cintrão. São Paulo: Edusp, 2006.

CAUQUELIN, Anne. Arte Contemporânea – Uma Introdução. São Paulo: Martins Fontes, 2005.

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JORNAIS

JABOR, Arnaldo. Picasso nos dá vontade de viver. Jornal O Estado de São Paulo. Caderno 2. 08/02/2011. p. D8.

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A obra como fragmento do percurso do artista:

um estudo sobre a própria poética

Joedy Luciana Barros Marins Bamonte

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Poética

Durante meu processo criativo, perce-bo como a sede pela criação acompanha o nascimento da obra em busca de um obje-to de estudo. O interesse se concentra em algo maior do que a materialização daque-le momento, integrando-o ao ansiar a fase seguinte. O registro passa a ser mais uma ferramenta para alcançar um conhecimen-to específico, que não se esgota enquanto maior objetivo, do contrário, a obra seria o fim. A busca pelo objeto de estudo passa a ser um turbilhão que absorve tudo o que for necessário para trazer respostas na for-ma plástica. Nessa absorção, as linguagens me emprestam subsídios, características que não me fazem necessariamente fiel a somente uma delas.

Ao “rejeitar”, adequar, selecionar para o momento da criação, vejo como nessas operações julgo quais técnicas, materiais e linguagens estão aptos para materializar ideias como estratégias para avançar em um campo a ser conquistado. O objetivo maior se encontra em conhecer o que se está fazendo e, para alcançá-lo, é neces-sário me aproximar do alvo e avançar no-vamente. Minha realização (assim como acredito também estarem as conquistas

profundas do ser humano) está no percur-so a ser trilhado e dentro dele, seus trajetos são registrados quando processados no ato da criação. Ao comunicá-la, não saio do percurso, em um continuum. A materia-lização somente responde a uma neces-sidade maior na qual utilizo ferramentas à disposição de uma poética. É ela quem manipula as linguagens, alterando-as, transformando-as.

Nessa leitura, comparo minhas conquis-tas como criadora a outras tão persistentes quanto, dentre as quais posso citar o cami-nhar. Os passos da criança, por exemplo, não objetivam a vitória em uma maratona, mas sim o domínio para o próximo passo e próximo, até alcançar um determinado lu-gar e assim por diante. A comparação tam-bém pode ser feita com a trajetória de um atleta, tendo-se a continuidade, a persistên-cia e a resignação em comum. Assim como para um atleta a bola, os tacos, a raquete, dentre outros, não são o objetivo de sua vitória, mas sim instrumentos, da mesma forma para mim, enquanto artista, as téc-nicas, materiais e suportes são canais para me aproximar do alvo. Nesse sentido, con-sidero relevante abordar a maneira pessoal de utilizar cada um desses canais como o grande desafio para o profissional. Tomo a

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nteliberdade de considerar que a maneira espe-

cífica como o artista o faz constitui o verda-deiro sentido de ser artista, sua lente especí-fica para ler o mundo. Ele é impelido por um conjunto de variáveis que inclui a maneira como aprimorou usar a tinta, o papel, a fo-tografia, o buril, o lápis. Há uma relação in-tensa nessas variáveis, que podem ser cha-madas de influências mútuas nas conexões da rede de criação, que o impele a olhar seu objeto de estudo e a interpretá-lo. Como ele fica diante dessas lentes? Este é o interstício que cabe a esse artista, o intervalo onde lerá o mundo e onde a obra de arte nascerá.

Nesse intervalo entre o autor e a criação da obra, a forma mais adequada e calcula-da para se produzir está nas adaptações à realidade, ou “inadaptações”, “ruídos”, vi-sões originais que não se enquadram nos paradoxos. Por resultarem da individuali-dade, da identidade em leituras absoluta-mente pessoais da realidade, constituem ideias originais, que em sua poesia geram estranhamento ao espectador. Quanto mais o artista conhece a maneira de mani-pular e utilizar suas ferramentas, testando as possibilidades as quais atendem, subju-gando materiais, linguagens, métodos ao alcance de seu objeto de estudo e à ma-neira que o enxerga, mais a fundo chegará

e deixará sua marca, registro de seu olhar específico. Sua interpretação emergirá tra-zendo respostas, que por sinal direciona-rão a outras perguntas, não esgotando sua ânsia criadora.

Dentro dessa trajetória, seja em quais áreas for, sabemos sempre o ponto exato onde paramos. A criação representa uma organização interna constante que nos per-mite conhecer melhor não somente temas externos, como também a nós mesmos, e assim a uma maior compreensão de como lemos o mundo. É um processo interligado, intrínseco ao ser humano. Daí as redes de criação chegarem a ser comparadas às leis da natureza, como faz Cecília Salles ao citar Morin para mencionar as regras existentes nos jogos de associações (SALLES, 2006, p.24).

Ao ler sobre a não linearidade do con-ceito de rede dentro da construção da obra de arte, vejo o quanto se apresenta coerente essa teoria frente às fases lógicas do processo criativo: apreensão, prepa-ração, incubação, iluminação, verificação e comunicação, segundo Abraham Moles (1971) e George Kneller (1973). A não linea-ridade vem de encontro às ocorrências das fases, fazendo com que os insights surjam das relações entre um processo e outro

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no decorrer da vida do artista. As inves-tigações para o surgimento de uma série (objeto de estudo) podem ser exatamente a realização da série anterior, nascendo umas das outras, como livros sendo lidos ao mesmo tempo. O primeiro a ser iniciado pode ser o último a ser finalizado, inclusive. O fazer artístico constitui um mecanismo vivo que pode ser compreendido a partir das sinapses, de como elas ocorrem como raios em uma grande tempestade.

Percurso e fragmentos

Ao estudar a criação em rede, percebo o quanto ela me é familiar, o quanto vem de encontro à maneira como minhas investi-gações são organizadas dentro do proces-so criativo. Exemplos disto são as formas como estruturei minha tese de doutorado Legado: gestações da arte contemporânea – Leituras de imagens e contextualizações do feminino na cultura e na criação plástica (BAMONTE, 2004) ao fazer a leitura de minha produção plástica e da maneira como dou continuidade às criações que compartilham de uma mesma abordagem. Na trajetória de minha produção, procuro a trajetória de um trabalho específico e encontro marcas

impregnadas da identidade que venho construindo. Encontro um contexto plástico maior do qual minha produção faz parte e outros universos que se abrem e dialogam entre si. Nesse percurso, delineia-se uma or-ganicidade nas imagens citadas no corpo do texto, como um jogo de combinações cons-tantes, no qual os elementos se repetem e se reafirmam. Há uma dinâmica no interesse na e pela própria criação, pelo processo la-tente, constante, a sede pelo que o trabalho proporciona e não exatamente por ele em si.

Diante de minha produção atual, obser-vo que as reflexões presentes na tese foram continuadas, e nessa afirmação encontro ar-gumento para reconhecer nas linhas que se conectam e nas tramas que foram construí-das o que Cecília Almeida Salles denomina

[...] conjuntos construídos constituídos a partir de interações, retroações, inter--retroações, que constituem um tecido complexo.

[...] Uma decisão do artista tomada em determinado momento tem relação com outras anteriores e posteriores. Do mes-mo modo, a obra vai se desenvolvendo por meio de uma série de associações ou estabelecimento de relações. [...] (SALLES, 2006, p.27)

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Diante de algumas de obras produzidas posteriormente à defesa do doutorado, trago outras apresentadas na tese, aproximando vários momentos de criação. As imagens da tese denominei “diálogos propostos”, cartões individuais inseridos no final do texto que juntos formam uma colcha de retalhos, pensados para que o espectador fizesse leituras isoladas das imagens apresentadas no decorrer da abordagem, que possuem um vínculo entre si, a partir de referências e obras de artistas que trabalham temas e contextos próxi-mos. São propostas de interação entre criações de mesma autoria, destas com as de ou-tros artistas e contextos e entre si, em diálogos constantes que ampliam as possibilidades de interpretação a partir de conteúdos que foram trabalhados dentro da tese, no processo de criação plástico e teórico.

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Figuras 1 a 20. Imagens que fazem parte de “Diálogos Propostos” (BAMONTE, 2004). Da direita para a esquerda, de cima para baixo: 1. Sem Título, Joedy Marins, 1995 (Marins, 1990-2003); 2. Corte, Edith Derdyk, 2002 (Derdyk, 2002); 3.

Representação gráfica da fecundação do óvulo (Demarest, 1971, p.47); 4, 7, 12, 16, 20: Retalhos de Legado, Joedy Marins, 2002 (detalhes) (Marins, 2003); 5. Couple III (“Casal III”), Louise Bourgeois, 1997 (Fundação, 1998); 6. Toalha de crochê

artesanal; 8. Representação gráfica do trajeto do óvulo fecundado (Persaud, 2000, p.5); 9. Foto de um feto em gestação (Persaud, 2000, p.13); 10. Traços Arraigados, Joedy Marins, 1993 (Marins, 1991-2003); 11. Representação gráfica do ciclo fértil feminino (Demarest, 1971, p.43); 13. Sem Título, Joedy Marins, 2000 (Marins, 2000); 14. Espécie de aranha (Argíope multicolorida) tecendo a teia (Milidge, 1999); 15. Sem Título, Joedy Marins, 2001 (Marins, 2001); 17. Dote II (em execução), Joedy Marins, 2003 (Marins, 1991-2003); 18. Gestação (13º quadro), Joedy Marins, 1991 (Marins, 1990-2003); 19. Legado,

Joedy Marins, 2002 (Marins, 2003).

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Ao observar todas as imagens apresentadas, interessa-me como esse jogo de intera-ções pode parecer com as regras da natureza, pontuando que “diálogos propostos” foram criados para enfatizar o vínculo do fazer artístico com a experiência biológica da gestação e da fertilidade feminina. O desenvolvimento das células do corpo é abordado, da mes-ma forma que Cecília Salles apresenta o jogo de interações, em regras que se aproximam da natureza. Tanto a produção, quanto a necessidade de criar e o objeto de pesquisa são apresentados tendo os padrões têxteis artesanais como metáforas da vida sendo gerada e, dessa forma, como uma criação em rede. As Figuras 1 a 20 apresentam as vinte imagens das 60 que foram inseridas na tese para compor os “diálogos propostos”. Há uma leitura a ser feita das obras com um contexto maior, que inclui obras de outros artistas, imagens do cotidiano e desenhos ilustrativos de Biologia.

Para demonstrar o continuum em meu processo criativo, apresento no formato de “diálogos propostos” algumas imagens de obras apresentadas na tese e realizadas pos-teriormente para que as conexões sejam observadas em minha poética, aproximando-se momentos diferentes do processo criativo. As conexões a serem feitas estão dentro de um contexto mais específico autoral, apresentadas para leitura pontual ou do todo pelo es-pectador, enfatizando-se seus conteúdos ao formar a trama como redes de criação.

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Figura 21 a 40. Imagens de criações apresentadas em “Diálogos Propostos” junto a trabalhos produzidos posteriormente (BAMONTE, 2004). Da direita para a esquerda, de cima para baixo, criações: Joedy Marins: 21. Sem

Título, 1995 (Marins, 1990-2003); 22. Traços Arraigados, 1993 (Marins, 1991-2003); 23. Revisitando Legado, 2010 (Marins, 2010); 24, 25, 36, 37: Retalhos de Legado, 2002 (detalhes) (Marins, 2003); 26: Bichos, 2010 (Marins, 2010); 27. Dote II (em exposição), 2003 (Marins, 2012); 28 e 38. Nu feminino IV e XV (Marins, 2011); 29. Sem título, 2011 (Marins, 2011); 30. Sem

Título, 2001 (Marins, 2000); 31. Dote II (em execução), 2003 (Marins, 2003); 32. Gestação (13º quadro), 1991 (Marins, 1990-2003); 33. Catedral IX, 2010 (Marins, 2010); 34. Legado, 2002 (Marins, 2003); 35. Bulbos XII, 2012 (Marins, 2012); 39. Ainda

assim não me disperso V, 2012 (Marins, 2012); 40. Sem Título, 2001 (Marins, 2001).

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Considerações Finais

Escrever sobre o próprio processo criativo exige um afastamento para que o autor pro-cure se colocar no lugar do espectador. À medida que ocorre um distanciamento do perí-odo em que cada obra ou série foram finalizadas, há uma somatória a outras produções, formando-se um conjunto apto a ser refletido. Ao se fazer essas reflexões, percebe-se que a criação como rede é uma constante, que se refaz e não permite rupturas entre as diferen-tes fases do artista. Uma obra jamais será totalmente desconectada das outras dentro do conjunto produzido pelo mesmo criador. Ao propor a aproximação de imagens represen-tativas de séries e períodos distintos de minha produção plástica, verifico o quanto o ato criativo é muito mais complexo do que compartimentar séries e fazer organizações linea-res. Há um pulsar constante que liga uma obra à outra, trazendo-as à memória para que juntas originem novas produções. Considero o presente trabalho somente um exercício do reconhecimento dessas conexões, aberto a muitas outras que, com certeza, virão.

Referências BAMONTE, Joedy L. B. M. Legado – gestações da arte contemporânea: leituras de imagens e contextualizações do feminino na cultura e na criação plástica – São Paulo: Universidade de São Paulo, Escola de Comunicações e Artes, 2004. 307 p.

KNELLER, George. Arte e ciência da criatividade. 17 ed. São Paulo: IBRASA, 1978.

MOLES, Abraham. A criação científica. São Paulo: Perspectiva, Edusp, 1971.

SALLES, Cecília Almeida. Redes da criação: a criação como rede. Vinhedo: Horizonte, 2006.

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OS DIAGRAMAS PEDAGÓGICOS DE MALEVICH:

UMA TRADUÇÃO/CRIAÇÃO VISUAL DE SUA TEORIA2

Luana Maribele Wedekin

2. Este artigo foi baseado em comunica-ção apresentada no X Ciclo de Investigações em Artes Visuais do Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais do Centro de Artes da Universidade do estado de Santa Catarina (UDESC), em 2015.

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Introdução

“Qualquer historiador da arte para inventar uma nova forma de conhecimento deve inventar uma

nova forma visual” (DIDI-HUBERMAN, 2011).

Kazimir Malevich é bem conhecido no ocidente por sua atuação como artista, mas seu campo de atuação não se restrin-ge somente à produção artística. Foi tam-bém um teórico prolífico, professor dedica-do, curador e administrador de instituições artísticas antes e após a revolução bolche-vique (BORCHARDT-HUME, 2014). Interessa para os objetivos deste artigo o papel de Malevich como teórico e como sua teoria compreende uma visão peculiar da história da arte, traduzida de forma imagético-tex-tual em seus diagramas pedagógicos.

O historiador da arte e filósofo francês Georges Didi-Huberman, ao apresentar a curadoria da exposição Atlas no Centro para Arte e Mídia de Karlsruhe (Zentrum für Kunst und Medientechnologie Karlsruhe) em 2011, afirmou que “qualquer historia-dor da arte para inventar uma nova forma de conhecimento deve inventar uma nova forma visual” (DIDI-HUBERMAN, 2011). O argumento que defendo aqui é que Malevich criou uma nova forma visual para

apresentar suas perspectivas acerca da arte da história da arte.

Primeiramente, é preciso contextualizar a produção destes diagramas pedagógicos. Sua produção está relacionada com a atu-ação de Malevich como professor, inicial-mente na Escola de Arte Popular de Vitebsk, onde permaneceu de 1919 a 1921, e poste-riormente no Instituto de Cultura Artística (GINKHUK). Em Vitebsk, a escola dirigida por Marc Chagall logo acolheu as revolu-cionárias ideias suprematistas, e Malevich foi líder inconteste do coletivo “Campeões da Nova Arte” (UNOVIS). Reunindo profes-sores locais como Vera Ermolaeva e o ar-quiteto e designer gráfico El Lissitzky, além de jovens alunos da instituição, o objetivo do coletivo UNOVIS era “a completa re-novação do mundo artístico nas bases do Suprematismo e a transformação, através de novas formas, dos aspectos utilitários da vida” (KOVTUN; DOUGLAS, 1981, p. 237). Quando a situação se tornou desfavorá-vel em Vitebsk, Malevich e vários de seus discípulos juntaram-se ao corpo de pro-fessores e pesquisadores do Instituto de Cultura Artística de Petrogrado (GINKHUK), instituição também criada como parte da reestruturação do aparato artístico após a Revolução de Outubro de 1917 e cujo

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kinprograma previa a “criação de uma ciência que estudaria todos os aspectos das diferentes artes, suas interações, numa perspectiva da síntese das artes” (MARCADÉ, 2007, p. 207).

Os diagramas pedagógicos de Malevich foram produzidos entre 1924 e 1927 no GINKHUK por esses colaboradores de Malevich, sob sua supervisão. Esses diagramas têm recebido pouca atenção acadêmica (ANDERSEN, 1970; BOERSMA, 1988; MILEEVA, 2011; KOKKORI; BOURAS, 2014) e, como os Architectons (modelos arquitetônicos), os cenários e figurinos para teatro, assim como seu retorno à figuração na década de 1930, emergem como novas facetas do trabalho desse artista a serem exploradas pelos estudiosos.

Os 22 diagramas podem ser divididos em três grupos conforme seu conteúdo: análi-se de uma obra de arte (1-8); análise de sensações (9-16); e os métodos de ensino (17-21). Mostram reproduções de obras de arte, tabelas, gráficos e textos breves escritos em ale-mão. Foram realizados em técnica mista em papel: nanquim, aquarela, lápis, impressão em gelatina de prata, colagem. O tamanho médio dos painéis é de 72 x 98 cm (Figura 1).

Figura 1. Visão geral dos diagramas pedagógicos de Kazimir Malevich na exposição “K. Malevich”, no Stedelijk Museum, Amsterdam, 2013/2014. Foto: Site do Stedelijk Museum, Amsterdam. 45

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Os diagramas foram elaborados para acompanhar Malevich na única viagem que fez para fora da Rússia (na época já União Soviética), em 1927. O destino do artista era a Alemanha, para uma exposição indi-vidual que consistia numa seção da Grande Exposição de Arte de Berlim (Grosse Berliner Kusntausstellung). Carregava consigo cerca de 70 pinturas (um terço delas suprema-tistas), além de desenhos, modelos arqui-tetônicos (Architectons), manuscritos e os 22 diagramas (ANDERSEN, 1970). Malevich passou também por Varsóvia, onde expôs parte do material no Clube de Arte Polonês e deu uma palestra intitulada A análise das tendências contemporâneas na arte (tema dos diagramas 1-8).

Malevich participou da exposição, co-nheceu líderes da Bauhaus – e talvez ti-vesse uma expectativa de ser convidado a lecionar na escola alemã, como fora ante-riormente Kandinsky, mas teve sua estadia abreviada por uma convocação urgente da União Soviética, retornando em junho de 1927. Desde meados da década de 1920, as expressões mais progressistas da vanguar-da russa vinham sendo profundamente questionadas por membros da burocracia estatal ligada às artes. Tais setores come-çaram a dar livre vazão à intolerância com

as produções não objetivas, (des)qualifi-cadas então como “formalistas”, “indivi-dualistas”, “pequeno-burguesas”. Tal pro-cesso culminou com o estabelecimento do Realismo Socialista como único método da arte soviética, em 1934.

Temeroso por sua obra – e por sua vida – Malevich decidiu deixar todo o material que havia levado à Alemanha sob os cuidados do amigo Hugo Häring. Fez um testamento no qual afirmava: “No caso de minha mor-te ou prisão permanente, [os manuscritos] devem ser estudados e traduzidos em ou-tra língua” (MALEVICH apud DOUGLAS, 1990, p. 20). Seu interesse em salvaguar-dar os manuscritos da obra O mundo não--objetivo (1923-1926) foi correspondido, e esta foi traduzida para o alemão por A. von Riesen e publicada em 1927 como o volume 11 da série de livros da Bauhaus. Parte do material que Malevich deixou na Alemanha se dispersou, mas, quanto aos diagramas, cinco foram adquiridos pelo Museu de Arte Moderna de Nova Iorque e 17 compõem a coleção do Museu Stedelijk, em Amsterdam.

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kinTeoria traduzida em diagramas

Em O mundo não-objetivo (1923-1926), que apresento aqui a partir de sua edi-ção em inglês, de 1959 (The non-objecti-ve world, editado em Chicago pela Paul Theobald and Company), Malevich expla-na sua “Teoria do Elemento Adicional”. Imbuído já de um paradigma cientificista que permeava diversos campos das artes na então União Soviética, o autor preten-dia examinar, “de um ponto de vista cien-tífico” “a causa das mudanças observáveis na arte e nos artistas” (MALEVICH, 1959, p. 11). Debruçou-se sobre a produção artísti-ca, a pintura em particular, e buscou inves-tigar “a concepção de mundo do artista, sua particular visão da natureza e o efeito do ambiente sobre ele” (Idem.), compre-endendo exemplares do que ele chamou de Naturalismo (incluindo obras de Hans Holbein e Rembrandt), passando pelo Impressionismo, “Cézannismo”, Cubismo, Futurismo e Suprematismo.

Ao identificar o elemento que “forçou seu caminho no organismo criativo do artista e acarretou uma alteração na sua concepção de arte” (MALEVICH, 1959, p. 12), Malevich lançou mão de uma analogia

médica, na qual o “elemento adicional” na arte operaria como uma bactéria que, ino-culada no organismo, causaria um desloca-mento do sistema linear, ou seja, suscitaria mudanças. Uma “perturbação patológica” num sistema pictórico – por exemplo, em sua estrutura ou em sua concepção visual da natureza – levaria a uma mudança de ponto de vista.

O “elemento adicional” identificado por Malevich é basicamente um elemento for-mal, como ele descreve em O mundo não--objetivo (1959) e como também demons-tra visualmente nos diagramas 1 a 7. No diagrama 1, Malevich exibe uma decom-posição visual de elementos gráficos de exemplares das quatro fases do Cubismo. O artista apresenta inicialmente reprodu-ções de obras cubistas, seguidas de frag-mentos de combinações de elementos grá-ficos, que são então isolados e depurados até que neles seja identificado o “elemento adicional” do Cubismo, um elemento grá-fico em forma de foice (Figura 2). O ele-mento adicional no “Cézannismo” seriam as “curvas fibrosas”, e no Suprematismo, a “linha reta suprematista, de caráter dinâ-mico” (MALEVICH, 1959, p. 60).

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Interessa aqui indicar as formas visuais utilizadas por Malevich para apresentar seus argumentos relativos à história da arte e à sua teoria. O artista sintetiza numa espécie de tabela todo o seu percurso de análise para a identificação do “elemento adicional”. O uso do círculo, como exibido consistentemente nos diagramas seguintes (2 ao 6), indica uma operação de isolamento e observação muito semelhante ao visto nas ciências naturais, onde uma bactéria isolada numa lâmina é ampliada por um microscópio. Interessante constatar que o diagrama permite que todo o processo de análise realizado pelo artista

Figura 2. Kazimir Malevich, Diagrama 1: Uma análise da forma

nos quatro estágios do Cubismo; fragmentos,

junções e linhas são deduzidas, 1924-27,

Museu de Arte Moderna de Nova Iorque.

Foto: Site oficial do MoMA, NY.

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kinseja capturado simultaneamente pelo es-pectador, que, num todo visual, pode ob-servar todas as fases do processo – realiza-das sucessivamente no tempo e no espaço –, mas apresentadas a um só tempo e lugar.

O artifício visual utilizado por Malevich toma de empréstimo o uso de diagramas e tabelas das ciências naturais, mas incorpo-ra criativamente a perspectiva cubista de representação simultânea do tempo. Neste ponto, o diagrama 1 é o mais revolucioná-rio visualmente, sendo os seguintes (até o 7) formas mais detalhadas de demonstrar o mesmo argumento teórico-visual. É como se Malevich apresentasse seu argumen-to e metodologia sintética e simultanea-mente no primeiro diagrama, para depois desdobrar sua reflexão de forma mais de-morada, detalhada e até linear nos painéis seguintes.

Kokkori e Bouras (2014) afirmam que a administração central das instituições científicas e artísticas (Glavnauka), a qual estava subordinado o Instituto de Cultura Artística, recomendava o uso de mapas, cartogramas, diagramas, fotografias, mo-delos e materiais visuais, reconhecendo o método gráfico como apropriado para o ensino e popularização da ciência e da arte. Sendo assim, os painéis idealizados

por Malevich e sua equipe devem ser vistos não como iniciativas isoladas, mas parte de um esforço coletivo.

A perspectiva cientificista de Malevich parece, por vezes, bastante forçada, como é possível observar num registro de um dos laboratórios dirigidos pelo artista no GINKHUK, onde é visto juntamente com N. Suetin, Chasnik e V.T. Vorobev, todos para-mentados como cirurgiões a manipular os Architectons. Contudo, como demonstra Kachurin (2007), Malevich dispôs de diver-sas estratégias para garantir suas condi-ções de trabalho e de pesquisa teórico--prática. Incorporar o discurso cientificista talvez tenha sido apenas um artifício para o artista sobreviver num contexto onde a úni-ca alternativa de trabalho advinha do apoio do Estado. O discurso científico funcionava como um bom antídoto para acusações de “individualismo” e “subjetivismo”.

O fato é que mesmo antes das impo-sições burocráticas do Estado soviético, Malevich já se referia às formas não obje-tivas do Suprematismo como “organismos vivos” (1969, p. 33, originalmente publicado em 1916). E a pesquisa centrada no caráter formal da obra de arte foi uma preocupa-ção consistente e permanente de Malevich como teórico. O artista demonstrou estar

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legitimamente interessado nos fatores que conduzem a grandes transformações na arte e, como um historiador da arte, bus-cou determinar objetivamente as condi-ções e fatores que deflagraram as grandes transformações da arte moderna, da qual ele próprio era parte.

A perspectiva de Malevich é dinâmica, pois o “elemento adicional” é justamente um fator destrutivo da norma existente, mas que produz novas formas, derrubando as antigas ou transformando-as. Malevich apresenta, por exemplo, a pintura “descri-tiva” de Rembrandt como a norma para a qual o Cubismo implica um “novo estado de coisas”, cujo elemento adicional, a forma de foice, leva a uma nova norma. A hostil recepção da arte moderna, por exemplo, o Cubismo, decorre dessa perspectiva dinâmi-ca e não normativa. Nesse ponto, Malevich defende uma arte que não seja simplesmen-te “estática”, “imitativa”, “duplicativa”, mas sim “criativa”, e que, em geral “permanece inacessível ao público” (1959, p. 16), “incom-preensível para as massas” (1959, p. 68). Nas obras “imitativas”, que apenas “reprodu-zem” a natureza, não há “elemento adicio-nal”. O artista aponta para a variedade das interpretações da natureza como caracte-rística das produções criativas, classificadas

como atividade progressiva, em oposição à atividade reacionária da reprodução e imita-ção do que já existe. Nos pressupostos apre-sentados por Malevich transparece a defesa de uma arte não representativa, não objeti-va, como era o Suprematismo.

Os diagramas permitem ao espectador seguir as comparações feitas por Malevich teórico-historiador da arte. Possibilitam observar os diferentes pontos de vista re-lativos à norma em obras acadêmicas, re-alistas, cézannistas e cubistas. Há muitas reproduções de obras de arte nos diagra-mas, as quais apresentam evidências visu-ais de seus argumentos através do paralelo e comparação entre imagens. No diagrama 8, por exemplo, Malevich apresenta as pe-culiaridades da estrutura pictórica de pin-turas de Cézanne, de exemplares impres-sionistas, vistas em detalhe; assim como exibe a variação da energia da cor na com-paração entre obras de Holbein, Matisse e Cézanne, respectivamente caracterizadas por uma arte gráfica colorida, uma pintura em planos de cor e uma “pintura verdadei-ra” (MALEVICH, 1959, p. 43).

O exercício docente foi fundamental como impulso para a sistematização es-crita de suas ideias e também para a sua apresentação visual. A utilização de painéis

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kincom fotografias e reproduções de obras de arte por Malevich está documentada em um registro fotográfico no GINKHUK de cerca de 1925 (Figura 3).

Malevich aparece à esquerda, apontando para um painel com imagens organizadas no interior de contornos quadrados, semelhantes a um organograma, enquanto seis “estu-dantes” acompanham sua explicação (Vera Ermolaeva, a primeira em pé, era professora e foi também diretora da escola em Vitebsk após a saída de Chagall, ressentido por perder seus alunos para o UNOVIS). Não há texto nos painéis, cujo sentido provavelmente se es-tabelecia visualmente e com a explicação verbal do mestre. É possível verificar na foto-grafia que as imagens estavam presas ao painel por alfinetes, indicando a possibilidade de arranjos móveis.

Figura 3. Malevich com um grupo de alunos no GINKhUK, c. 1925. Da esquerda para a direita: Malevich, A.A. Leporskaya (sentada), Vera Yermolaeva (em pé), Gipsi (em pé), Rozhdestvensky, Pozemsky, Yudin.Foto: Site http://monoskop.org/GINKhUK

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Aproximando-se da imagem, é possível identificar imagens semelhantes às que aparecem nos diagramas pedagógicos, es-pecialmente os de número 15 e 16, sobre os quais se tratará mais adiante. Basicamente, exibem exemplos de obras de alguns movi-mentos modernos da arte sobre os quais Malevich se debruçou em sua teoria. No quadro no canto superior direito da foto-grafia, veem-se formas suprematistas: as básicas como o quadrado e a cruz, e alguns exemplares do Suprematismo com a com-binação de “massas de cor”. Na moldura imediatamente abaixo deste quadro, en-contram-se fotografias aéreas, o tipo de “ambiente” que Malevich associa com a criação do Suprematismo. Esse tema repe-te-se no diagrama 16, no qual também são ilustrados os “ambientes” de criação do Cubismo e do Futurismo.

Malevich considera o ambiente onde o artista está inserido como um fator fun-damental na constituição de uma “cultura pictórica”. Artistas realistas estariam em meios “constantes”, “imutáveis”, “estáveis” (1959, p. 56). Enquanto que o entorno urba-no, da “cultura de aço da cidade”, seria o ambiente dos artistas cubistas e futuristas. Malevich (1959, p. 59) afirma: “todo elemen-to adicional exerce uma forte influência na

atitude do pintor na direção da vida que o cerca [...]. Então os Futuristas e os Cubistas, por exemplo, distintivamente pertencem à grande cidade. Eles estão completamente imbuídos da energia da cidade, da grande indústria e refletem sua geometria tensa, dinâmica”.

O diagrama 16 exibe então os am-bientes do Cubismo, do Futurismo e do Suprematismo (Figura 4). Malevich e seus colaboradores utilizaram recortes de jornais para compor montagens com elementos de ambientes urbanos. Na coluna relativa ao ambiente do Cubismo, veem-se imagens bastante heterogêneas: uma imagem de um pavilhão de uma exposição industrial, a fachada de uma fábrica de automóveis de Berlim (Neue Automobil Gesselschaft), uma imagem invertida de um guarda-corpo me-tálico em primeiro plano, um ambiente in-terno de um café (uma garrafa e taças sobre uma mesa, jarros à janela, vários elemen-tos utilizados nas composições cubistas). Recortes de jornal, que remetem à indústria gráfica, à reprodução em grande escala, mas também o desenho de um violino em papel transparente aparece sobreposto ao recorte de jornal. Os recortes podem também ser uma referência, uma “citação” direta às co-lagens cubistas nas quais Picasso e Braque

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kincolaram recortes de jornal em suas telas, ato seminal de uma arte que não mais representa, mas apresenta. Uma lâmina de maneira em forma irregular também foi colada no painel, de modo a reforçar a operação cubista. Há também uma imagem de um fabricante de violino. O violino é o exemplo utilizado por Malevich em O mundo não-objetivo (1959) para elucidar como a “natureza objetiva”, no caso um violino, serve apenas como “ponto de partida” para Picasso criar “novas formas”. A “atividade progressiva” de Picasso vai da “reprodução” da forma do violino, passando por vários “estágios de desenvolvimento”, até o objeto se tornar quase irreconhecível, pois representado de forma subjetiva pelo artista.

Figura 4. Kazimir Malevich, Diagrama no.16: A relação entre a cultura pictórica e o ambiente do artista (no Cubismo, Futurismo e Suprematismo), 1925, 72,4 x 98,4 cm, papel impresso recortado e colado, impressões de gelatina de prata, nanquim e lápis sobre papel, Museu de Arte Moderna de Nova Iorque, Nova Iorque. Amsterdam. Foto: Site do Museu de Arte Moderna de Nova Iorque.

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Na coluna central, do Futurismo, Malevich combinou várias imagens: um bai-le de gala (uma provável referência à pin-tura de Gino Severini A dança Pan Pan, de 1911, que aparece reproduzida no topo do painel); dois corredores saltando um obs-táculo; máquinas e engrenagens metálicas; quatro zepelins de tamanhos diversos; uma locomotiva e uma reprodução de uma das pinturas de Luigi Russolo com tema do di-namismo de uma locomotiva. Em termos formais, há repetição de elementos e cria-ção de um ritmo visual dinâmico, em con-sonância com os escritos do artista:

Quanto mais movimentada for a vida, tanto mais intensa e coerente será a cria-ção da forma dinâmica. O futurista de forma alguma deve retratar máquinas; sua função é criar novas formas abstra-tas. A máquina é, de certo modo, a for-ma ‘externa’ do movimento utilitário, que produz novas formas e fórmulas formais através da multiplicação pela energia criadora dos futuristas (1959, p. 62).

Na coluna dedicada a representar o ambiente do Suprematismo, a montagem inclui eminentemente vistas aéreas, mas surgem também imagens aéreas de três

grandes portos, paisagens de campos culti-vados, o projeto de uma grande ponte, um aeroplano, três guindastes e um homem no cesto de um balão. Malevich afirma que “o ambiente correspondente a esta nova cultura tem sido produzido pelas últimas realizações da tecnologia, especialmente a aviação, de forma que é possível referir-se ao Suprematismo como ‘aeronáutico’” (1959, p. 60). Também aqui predominam ritmos estruturados em diagonais, preva-lece o “elemento adicional” da “linha reta dinâmica”, o “Suprematismo dinâmico do avião” (Idem).

O diagrama 15 (Figura 5) é também de-dicado à representação da percepção do ambiente pelo artista. Malevich organiza os elementos do ambiente do Naturalismo, Impressionismo e Cézannismo. Nesse caso, a coluna relativa ao Naturalismo exibe paisagens rurais, idílicas, ambien-tes de província, de natureza intocada ou campestre; uma fotografia da casa de campo de Malevich, uma imagem com três leitõezinhos, cenas de botes no rio. No Impressionismo, aparece uma imagem de um evento social ao ar livre; enquanto que na coluna do Cézannismo foram cola-das três imagens de cidades provincianas, cercadas de verde. Aqui, o artista e seus

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kincolaboradores organizaram as imagens de maneira relativamente convencional, sem so-breposição ou transparência, mas alinhadas com uma orientação predominantemente vertical. No Impressionismo, há apenas uma imagem do “ambiente” percebido pelo artis-ta, de forma que o diálogo entre imagens se estabelece somente entre as diferentes cultu-ras pictóricas que compõem o mesmo painel.

Se comparado ao diagrama 15, evidencia-se a peculiaridade do diagrama 16, que não se apresenta apenas como a ilustração do ambiente das culturas pictóricas do Cubismo, Futurismo e Suprematismo, mas uma verdadeira montagem dialética (na qual

Figura 5. Kazimir Malevich, Diagrama no.15: Justaposição da percepção pictórica da percepção do artista e seu ambiente (no Naturalismo, Impressionismo e Cubismo), 1927, 72,5 x 98 cm, técnica mista sobre papel, Museu Stedelijk, Amsterdam. Foto: Site do Museu Stedelijk.

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a combinação e tensão entre elementos faz surgir novos sentidos) e dialógica (na qual imagens diversas entre si estabele-cem múltiplas relações) dos elementos que compõem o ambiente no qual os artistas dessas tendências estão inseridos.

Considerações finais

Um espectador desavisado que con-templasse os diagramas pedagógicos de Malevich sem o acompanhamento da apresentação oral de seu autor, ou sem conhecer a teoria do artista, baseando-se somente nas legendas dos painéis, teria es-cassas condições de os compreender. Sob um ponto de vista superficial, os diagramas podem ser entendidos como artifícios ima-gético-textuais para ilustrar ou traduzir a teoria elaborada pelo artista.

Algumas questões relativas ao exercício da tradução podem ser problematizadas: Malevich é tradutor de si mesmo nos dia-gramas; logo, ultrapassam-se as indaga-ções relativas à proximidade da tradução (os diagramas) com o “original” (texto teóri-co). Se nas reflexões mais contemporâneas sobre a tradução literária concorda-se que não há homologia entre as línguas, quiçá

poderia se encontrar homologia entre for-mas de linguagem diversas como o texto (a teoria escrita de Malevich) e as imagens (os diagramas pedagógicos, que também contêm texto). Quanto às diferenças entre tradução e criação (BRITTO, 1999), pode-ria se dizer que os diagramas de Malevich são simultaneamente tradução e criação: aproximam-se os esquemas imagético-tex-tuais de sua teoria escrita, mas igualmente autonomizam-se como criações originais que transcendem as classificações e limita-ções entre linguagens artísticas ou gêneros textuais (teoria, material didático, recurso mnemônico, esquema...).

Proponho pensar nos diagramas de Malevich a partir da declaração de Didi-Huberman que abre este artigo: “Qualquer historiador da arte para inventar uma nova forma de conhecimento deve inventar uma nova forma visual” (2011). E aí pode-se pensar em Malevich como um “inventor de novas formas visuais”, que olha para os movimentos que o antecederam ou foram seus contemporâneos a partir de sua criação, de suas novas formas visuais. Seu trabalho como artista o habilita para a criação de uma nova forma de conheci-mento, materializada em seus diagramas pedagógicos.

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kinA familiaridade de Malevich com as for-mas abstratas, sua experiência como artista e revolucionário criador do Suprematismo, permitiram-lhe a criação de diagramas que ultrapassam a função de meramente apre-sentar informações de forma clara e sin-tética. Seriam os diagramas pedagógicos obras de arte? Certamente os diagramas têm valor independente e, ainda que não seja o caso de considerá-los obras de arte, podem ser reputados como uma espécie de híbridos entre painéis informativos e composições suprematistas, apresentando simultaneamente complexos argumentos teóricos, os quais paradoxalmente só po-deriam ser apresentados de forma visual.

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Ergonomia e Moda: enfoque de design e

modelagemMarco Antonio Rossi

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INTRODUÇÃO

O design de moda pode ser definido como sendo os aspectos que envolvem a criação, as características das formas, si-lhuetas, texturas, cores, materiais e emo-ções associados às questões estéticas, fun-cionais e confortáveis.

Considera-se o design como um instru-mento capaz de contribuir para a indústria como elemento diferenciador na qualidade dos produtos industriais. Assim, o profissio-nal designer de moda deve se conscientizar da importância e do caráter estratégico do design como elemento condicionante da competitividade das empresas produtoras do vestuário e de valor agregado ao produto.

A ergonomia, com os aspectos de con-forto e usabilidade, pode atribuir e agregar benefícios no projeto de vestuários com re-sultados satisfatórios para o produto final dentro da empresa.

O conforto e a modelagem juntos be-neficiam os processos de produção de vestuário.

O objetivo desta pesquisa é abordar o design de moda na questão da contribui-ção da ergonomia na modelagem de roupas em um ateliê de costura considerada uma microempresa de fabricação, venda e de

ensino, localizada na cidade de Pederneiras, Estado de São Paulo. A finalidade é propor melhorias nas questões de usabilidade e de conforto dos usuários de roupas confeccio-nadas neste ateliê de costura.

Serão apresentadas as definições de de-sign de moda, ergonomia e de modelagem de roupa.

DESENVOLVIMENTODESIGN E MODA

A produção de roupas, que tem caráter em sua fabricação artesanal, desenvolveu-se com base em procedimentos empíricos3. Na atualidade, projetar uma roupa para o mercado exige o reconhecimento da im-portância de se considerar os usuários, suas características físicas, culturais, suas habilidades e limitações.

Para tanto, o design deve ser entendido no seu significado mais amplo e atual, que não se aplica somente a um produto físi-co (definido por material, forma e função), mas que se estende ao sistema-produto.

Quando aplicado em um produto, o de-sign agrega valor aos itens desenvolvidos e produzidos. Ao comprar um determinado

3. Que resulta da prática, da observação, e não da teoria. Fonte:

http://www.dicio.com.br/empirico.

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Montemezzo (2003, p. 25) relata que para elaborar um produto o designer par-te de um problema de design existente, ou seja, características e situações vividas por um determinado público consumidor que necessita de um produto ou serviço para melhoria de sua qualidade de vida. Assim, a autora relata que ao desenvolver um pro-duto é pertinente fazer análises específicas quanto ao problema de design a qual o pro-duto se destina, sendo elas:

• Análise da necessidade;• Análise da relação social

(homem-produto);• Análise da relação com ambiente

(produto-ambiente);• Desenvolvimento histórico;• Análise do mercado;• Análise da função (funções práticas);• Análise estrutural (estrutura de

construção);• Análise da configuração (funções

estéticas);• Análise de materiais e processos de

fabricação;• Patentes, legislação e normas;

• Análise de sistema de produto (produto-produto);

• Distribuição, montagem, serviço a clientes, manutenção;

• Descrição das características do novo produto;

• Exigências para com o novo produto.

De acordo com Emídio (2006), a gestão do design auxilia em todo o processo de desenvolvimento de produtos até a sua comercialização, por meio da otimização de custos, embalagens, material promo-cional, padrões estéticos, identidade visu-al, adequação de materiais, fabricação e ergonomia.

A concepção de produto de moda arti-cula concepções de fatores sociais, antro-pológicos, ecológicos, ergonômicos, tec-nológicos e econômicos em coerência às necessidades e desejos de um consumidor. Como pode-se observar, a moda de vestu-ários vai além de simples roupas confeccio-nadas para um público que, às vezes, não está atento ao que consomes.

Rech (2002) conceitua o produto de moda como qualquer elemento ou servi-ço que conjuga “as propriedades de cria-ção (design e tendências de moda), qua-lidade (conceitual e física), vestibilidade,

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aparência (apresentação) e preço, a partir das vontades e anseios do segmento de mercado ao qual o produto se destina”, ob-jetivando a satisfação das necessidades e expectativas do consumidor.

Fornasier (2005) explica que a cada vez que se estruturam novos dados sociais (vi-são de novos competidores), progressos tecnológicos (transformação da matéria, difusão dos modelos) e desenvolvimentos econômicos (trocas comerciais, estruturas de distribuição), geram-se elementos para o design de moda.

Entende-se que a moda e o design são formas de expressão, de comunicação perante a sociedade em que vivemos, as quais criam uma diversidade de elemen-tos para um público com possibilidade de investimentos no que se refere ao cultural e, assim, dão valor à importância no desen-volvimento dos produtos, de ambientes e dos serviços.

ERGONOMIA E MODA

Conforme Iida (2005), a ergonomia con-ceitua no estudo do relacionamento entre o homem e seu trabalho, equipamento e ambiente e, particularmente, a aplicação dos conhecimentos de anatomia, fisiologia

e psicologia na solução de problemas surgidos.

A criação e a produção de produtos de vestuário e moda também necessitam do conhecimento de informações das áreas indicadas por esse autor, como anatomia humana, fisiologia, antropologia, psicolo-gia e sociologia, para melhorar a concep-ção de produtos que façam íntima relação com o usuário. A ergonomia aplicada ao desenvolvimento de produtos tem seu foco na utilização, no aprendizado, na eficiên-cia, na segurança e no conforto, a qual ob-jetiva as necessidades e os desejos do ser humano.

Em se tratando de ergonomia e moda, cuja visão industrial, em que o produto re-sultante da moda não é apenas um objeto propriamente, mas a possibilidade de afir-mação num determinado grupo social, ou numa relação de status4.

As etapas de processo de desenvolvi-mento podem variar conforme o produto e a estrutura da empresa. Entretanto, abran-gem de uma maneira geral: a ideia inicial, as especificações, formulação de alterna-tivas, avaliação das alternativas, constru-ção e teste, e protótipo. Esse processo de desenvolvimento não é linear, ou seja, ele pode retornar às etapas anteriores sempre

4. Para o sociólogo Max Weber, status é

uma categoria social que remete à posição que

o sujeito ocupa em um determinado sistema

de estratificação social. Fonte: http://www.

dicionarioinformal.com.br/status.

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ssique necessário, até a solução final do pro-duto (IIDA, 2005).

A existência de pesquisa em ergonomia e moda faz com que a qualidade de pro-duto na maioria das vezes se relacione às variáveis de condicionantes, e assim perce-be-se que todas influenciarão o princípio do conforto nas decisões de projeto e de-senvolvimento do produto.

QUALIDADE ERGONÔMICA, CONFORTO E USABILIDADE

Quando o assunto é conforto para a er-gonomia, é melhor destacar o desconforto para que seja avaliado, pois conforto pode ser subjetivo para muitos casos. O conforto é uma sensação subjetiva que pode variar de pessoas, de situações, de localização e de tempos (IIDA, 2005).

Conforme Slater (1997 apud ALENCAR; BOUERI, 2012), as interações corpo-vestu-ário tanto térmicas como mecânicas de-sempenham funções muito importantes na determinação do estado de conforto do portador, assim como os ambientes exter-nos (físico, social e cultural). A percepção subjetiva do conforto compreende proces-sos complicados de psicologia sensorial, em que um grande número de estímulos

do vestuário e de ambientes externos se transmite ao cérebro através de canais sen-soriais, estimulando uma definição aceita para o conforto, que é a ausência de dor e de desconforto em estado neutro.

Os estudos sobre o conforto, pela pró-pria natureza, apresentam caráter multi-disciplinar, e sua compreensão é funda-mental em moda e design.

O conforto tem sido visto mais sob o aspecto do subjetivo e considerado como difícil de medir. De forma simplista, costu-mamos dizer que tudo que contribui para o bem-estar do homem se chama conforto. Frequentemente compara-se conforto com comodidade. A modelagem pode interferir nesse processo industrial e no conforto do vestuário de uma forma decisiva para o re-sultado da roupa.

Moraes (2001) trata da usabilidade como a adequação entre produtos e as ta-refas cujo desempenho se destina, da ade-quação com o usuário que o utilizará e da adequação ao contexto que será usado. Afirma, ainda, que se pode compreender usabilidade pela maximização da funciona-lidade de um produto, na interface com seu usuário.

Sendo assim, Moraes (2005 apud Silveira, 2008, p. 99) define a usabilidade

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como “a efetividade, eficiência e satisfação com as quais usuários específicos atingem metas específicas em ambientes particu-lares”. Analisando essa definição, Silveira (2008) sintetiza o conceito pelo esquema conforme mostra a Figura 1.

Figura 1. Síntese do conceito de usabilidade.

Fonte: Silveira (2008).

MODELAGEM

Para a realização da modelagem, é pre-ciso um profissional modelista e/ou estilis-ta, o qual interpreta as criações do designer e elabora os moldes com procedimentos que respeitam a planificação da anatomia do corpo humano, por meio das medidas antropométricas corporais, principalmen-te com auxílio do desenho técnico. Para a elaboração da modelagem, o modelista pode se basear nas técnicas de modelagem

plana (bidimensional) ou da moulage ou draping (SPAINE, 2010).

As peças podem ser cortadas com auxí-lio computadorizado. O risco determina a medida em que deve ser estendido o teci-do, para depois ser cortado. O sistema CAD (Computer Aided Design) pode auxiliar com eficiência as etapas de modelagem, encai-xe e risco (ROSA, 2005).

O sistema CAD traz como melhor bene-fício a questão da melhoria de produtivi-dade associada a flexibilidade e resultados com maior qualidade.

METODOLOGIA

A pesquisa é metodológica, da qual faz parte o estudo dos paradigmas e o método para a produção científica. A metodologia será a intervenção ergonômica com mode-lagem de roupas nas questões de usabili-dade e conforto. Para tanto, será aplicado o método OIKOS – Integração entre design e ergonomia.

Essa metodologia aborda questões di-versas, como o desenvolvimento de proje-tos de produtos de moda e de vestuário, e assim será possível resolver os problemas já na fase de concepção, inserindo alguns

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ssiprincípios ergonômicos, tais como facilidade de manejo, facilidade de manutenção, faci-lidade de assimilação e segurança, uma vez que trabalha o princípio de rever constante-mente os fatores de risco e perseguir a obtenção da adequação e qualidade do produto, sem descuidar das questões econômicas.

MÉTODO OIKOS

No processo de criação e desenvolvimento de produtos de moda, a aplicação dos princí-pios ergonômicos, da usabilidade e do conforto é essencial, já que neles devem ser conside-rados princípios como anatomia humana, fisiologia, antropometria, psicologia e sociologia, fatores que são pertinentes na concepção de qualquer produto direcionado ao homem.

Nesse contexto, Martins (2005) elabora a Metodologia OIKOS, conforme mostra o Quadro 1, desenvolvida para avaliar peças do vestuário integrando os princípios ergonô-micos, de usabilidade e de conforto para fundamentar a avaliação. Segundo a autora, tra-ta-se de uma metodologia de prevenção, que auxilia na identificação de problemas do pro-duto na fase de concepção e de desenvolvimento do projeto, e deve permanecer presente em toda a fase do processo produtivo do vestuário.

Quadro 1. Metodologia OIKOS

Propriedade ergonômica, usabilidade e conforto Avaliação de usabilidade

1. Facilidade de manuseio Facilidade para vestir.Facilidade para desvestir.Acionamento dos aviamentos.Exige pouco esforço para manipulação.Materiais dos aviamentos.Materiais adequados ao uso.Acabamento dos aviamentos.Facilidade para acondicionar.Facilidade durante o uso.Mobilidade durante o uso.

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Propriedade ergonômica, usabilidade e conforto Avaliação de usabilidade

2. Facilidade de manutenção Facilidade de limpeza.Qualidade dos aviamentos e componentes.Eficácia na limpeza (permanência de resíduos).As instruções contidas nos produtos são claras.

3. Facilidades de assimilação (clareza de manuseio)

A forma do produto, aviamentos e componentes sugerem claramente da sua função.Dispensa instruções de uso.Os cuidados indicados de manutenção para a peça estão descritos cla-ramente na etiqueta.

4. Segurança Resistência a fungos, ácaros, bactérias e umidade.Aviamentos sem bordas vivas.Tecido não inflamável.Cós, punhos e golas não prejudicam a circulação e nem machucam a pele.A modelagem permite mobilidade e alcance.Tecido permite transpiração.

5. Indicadores de usabilidade (Jordan)

Consistência (em relação às tarefas realizadas).Compatibilidade com o usuário (em relação ao uso).Clareza visual em relação às informações do produto.Priorização da funcionalidade (entendimento hierárquico das funções).Priorização da informação (entendimento hierárquico da informação).Transferência de tecnologia (aplicação adequada).

6. Conforto Contato do tecido com a pele – toque.Contato do tecido com a pele – abrasão.Contato do tecido com a pele – maciez.Ajuste da peça ao corpo – estático – peso.Ajuste da peça ao corpo – estático – caimento.Ajuste da peça ao corpo – estático – modelo.Ajuste da peça ao corpo – estático – corte.Ajuste da peça ao corpo – dinâmico – flexibilidade.Ajuste da peça ao corpo – dinâmico – elasticidade.Ajuste da peça ao corpo – dinâmico – cisalhamento.

Fonte: MARTINS (2008).

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ssiA partir dessa metodologia em relação à ergonomia e à moda, pode-se dizer que é importante enfatizar a ergonomia em todo o processo de elaboração e produção do produto de moda. As preocupações com a ergonomia que devem ser adotadas nessas fases auxiliarão na elaboração de um pro-duto de vestuário mais significativo no con-forto e bem-estar de seu consumidor.

PROCEDIMENTO METODOLÓGICO

Para compreender as questões levanta-das com esse projeto, será a aplicada a pes-quisa qualitativa. Trata-se de uma pesquisa social, de caráter empírico, que se define como uma metodologia de coleta de dados amplamente empregada.

A aplicação da pesquisa foi realizada por protocolos com perguntas abertas e indivi-duais, mediante estudo de caso, com o intui-to de identificar o cenário do problema em questão. A finalidade dessa pesquisa foi ex-plorar o espectro de opiniões e as diferentes visões referentes às questões ergonômicas com a metodologia OIKOS. Foram feitas fo-tos para ilustração e entendimento.

AMBIENTE PESQUISADO

O ambiente pesquisado foi um ateliê de costura considerada uma microempresa de fabricação, venda e ensino de tecidos, loca-lizada na cidade de Pederneiras, Estado de São Paulo, cujo nome fantasia é: Armazém, conforme mostra a Figura 2.

Figura 2. Fachada do Ateliê Armazém. Fonte: Próprio autor.

Os sujeitos participantes são alunas e/ou funcionárias do ateliê, com uma média de 33 participantes, sendo todas do gêne-ro feminino e com idade média de 40 anos. Foram escolhidas aleatoriamente somente 18 alunas entre as idades de 27 a 56 anos.

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RESULTADOS

Os resultados apresentados foram de-tectados através do questionário aplicado em 18 alunas do curso de corte e costura do ateliê, com consultas in loco. Ainda, foram analisadas as imagens feitas com filmagem e com fotos. Foram divididos em duas ca-tegorias de vestimentas, sendo a Saia e a Blusa. Todas as duas categorias são desti-nadas ao sexo feminino.

Seguem alguns resultados conforme a metodologia OIKOS.

A) SAIA

1 Facilidade de manuseio

1.1 Facilidade para vestir = Das 18 alu-nas, somente duas disseram que

não é fácil vestir a saia dependen-do de algum tipo de tecido não ter flexibilidade.

1.2 Facilidade para desvestir = Das 18 alu-nas, três afirmaram que não acham fácil desvestir, pois precisam tomar cuidado para a peça íntima (calcinha) não sair juntamente com a saia.

1.3 Materiais adequados ao uso = Todas acharam que os materiais são ade-quados ao uso.

1.4 Acabamento dos aviamentos5 = Todas afirmaram que os aviamen-tos são de ótimas procedências.

1.5 Facilidade para acondicionar = Das 18 alunas, somente uma afirmou que é complicado acondicionar devido ao problema de amarrotar o tecido.

1.6 Mobilidade durante o uso = Das 18 alunas, quatro afirmaram que a questão de mobilidade para andar e para sentar fica comprometida.

2 Facilidade de manutenção

2.1 Facilidade de limpeza = Todas afir-maram que a questão limpeza do tecido é simples e fácil com pro-dutos de limpeza específico para lavagem.

5. Preparos, arranjos para obras de costura.

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ssi2.2 Qualidade dos aviamentos = Os aviamentos, com exceção dos bo-tões da saia, são de fácil manuten-ção. Já os botões são de diversos ta-manhos e formas, que às vezes não são encontrados para substituição. E, ainda, alguns botões quebram mesmo antes de usar a saia. Essas observações foram apresentadas por todas as alunas.

2.3 Eficácia na limpeza = Todas as alu-nas afirmaram que se for usado um produto de limpeza correto os resíduos que ficaram no tecido po-dem sair sem problema de danifi-car a saia.

3 Facilidade de Assimilação (cla-reza de manuseio)

3.1 A forma do produto, aviamentos e componentes sugerem clareza da sua função = Todas afirmaram que a saia em sua forma, bem como os aviamentos, é de fácil entendimen-to na questão manuseio.

3.2 Dispensa instrução de uso = As 18 alunas afirmaram que não precisa de instrução de uso. Conforme as 18 alunas afirmaram: as mulheres

que vão usar uma saia sabem como usar uma saia.

3.3 Os cuidados indicados de manu-tenção para a peça estão descritos claramente na etiqueta. = Das 18 alunas, somente três afirmaram que acham complicado e/ou não entendem algumas imagens que vêm estampadas na etiqueta.

4 Segurança

4.1 Aviamentos sem bordas vivas = Das alunas entrevistadas, 16 afirma-ram que alguns colchetes6 vêm fe-chados e com o arame aberto, daí podem furar o dedo ao manusear.

4.2 Tecido não inflamável = Todas as 18 alunas entrevistadas afirmaram que o tecido é inflamável, sim.

4.3 A modelagem permite mobilidade e alcance = Nove das entrevistadas afirmaram que algumas saias em sua modelagem não permitem que as pernas façam alguns alcances e dão menos ainda mobilidades. Algumas saias prendem as pernas.

4.4 Tecido permite transpiração = Todas afirmaram que alguns te-cidos fabricados com material

6. Pequeno gancho metálico que prende na colcheta e usado no vestuário como botão.

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poliéster não permitem total trans-piração da pele.

5 Indicadores de usabilidade

5.1 Compatibilidade ao usuário (rela-ção ao uso) = Todas afirmaram que a saia, dependendo dos movimen-tos que serão necessários para o corpo, não apresenta compatibi-lidade de uso. Muitos modelos de saia podem até mesmo dificultar o uso.

5.2 Clareza visual em relação às infor-mações do produto = Todas afir-maram que as informações de uso da saia não são complicadas e que isso não apresenta obstáculo para uso.

5.3 Priorização das funcionalidades = Todas as 18 alunas afirmaram que a hierarquia das funções da saia não interfere no uso.

6 Conforto

6.1 Contato do tecido com a pele – to-que = Somente uma aluna afirmou que o toque do tecido na pele é de-sagradável e incomoda, pois ela in-formou que não gosta de usar saia.

6.2 Contato do tecido com a pele – abrasão = Quatro alunas afirma-ram que, dependendo do tecido e do molde da saia, pode-se apre-sentar abrasão na pele e machucá--la se o uso for contínuo.

6.3 Contato do tecido com a pele – maciez – Todas as 18 alunas afir-maram que o tecido que apresenta maciez em contato com a pele são os melhores para o uso de longa duração de tempo.

6.4 Ajuste da peça ao corpo – estáti-co – peso = Nove alunas afirma-ram que, dependendo do molde da saia, o ajuste estático em rela-ção ao peso da peça pode deixar desalinhado e fora de simetria e estética.

6.5 Ajuste da peça ao corpo – estáti-co – caimento = Todas afirmaram que o ajuste e caimento da saia são de fundamental importância para o resultado do conforto e de estética.

6.6 Ajuste da peça ao corpo – estático – modelo = Duas alunas afirmaram que, se o modelo não for adequa-do ao usuário, poderá deixar a saia em desconforto ao usuário.

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ssi6.7 Ajuste da peça ao corpo – dinâmi-co – flexibilidade = Quinze alunas afirmaram que a saia, para ter conforto, precisa ter flexibilidade, porém, entendem que alguns mo-delos de saia e de tecido podem não deixar o usuário em conforto de flexibilidade.

B) BLUSA

1 Facilidade de manuseio

1.1 Facilidade para vestir = Das 18 alu-nas, 15 disseram que dependendo

do modelo da blusa não é fácil vestir.

1.2 Facilidade para desvestir = Das 18 alunas, três afirmaram que não acham fácil desvestir, pois algu-mas blusas com o molde apertado ou com um tecido que cola na pele pode dificultar a retirada da blusa.

1.3 Materiais adequados ao uso = Todas acharam que os materiais flexíveis são mais indicados e ade-quados ao uso.

1.4 Acabamento dos aviamentos = Todas afirmaram que os aviamen-tos são de ótimas procedências.

1.5 Facilidade para acondicionar = Das 18 alunas, 13 afirmaram que, dependendo do modelo e do teci-do, o acondicionamento pode fi-car comprometido, pois amarrota muito fácil a roupa depois de pas-sada a ferro elétrico. Algumas blu-sas precisam ser acondicionadas em cabides para não amarrotarem.

1.6 Mobilidade durante o uso = Das 18 alunas, cinco afirmaram que a questão de mobilidade das blusas depende mais do modelo e do teci-do na questão mobilidade.

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2 Facilidade de manutenção

2.1 Facilidade de limpeza = Todas afir-maram que a questão limpeza do tecido é simples e fácil com produ-tos específicos para lavagem.

2.2 Qualidade dos aviamentos = Os aviamentos para as blusas geral-mente são de boa qualidade, en-tretanto, alguns aviamentos, como, por exemplo, botões e colchetes, são de qualidade ruim, o que pode prejudicar o resultado final da peça.

2.3 Eficácia na limpeza = Todas as alu-nas afirmaram que se for usado um produto de limpeza correto, os resíduos que ficaram no tecido podem sair sem problema de dani-ficar a peça.

3 Facilidade de Assimilação (cla-reza de manuseio)

3.1 A forma do produto, aviamentos e componentes sugerem clareza da sua função = Todas afirmaram que a blusa em sua forma, bem como os aviamentos, é de fácil entendi-mento na questão manuseio.

3.2 Dispensa instrução de uso = As 18 alunas afirmaram que não precisa

de instrução de uso. Conforme to-das afirmaram, as mulheres que vão usar determinadas blusas com um modelo mais complicado são orientadas pelas vendedoras.

3.3 Os cuidados indicados de manuten-ção para a peça estão descritos cla-ramente na etiqueta. = Das 18 alu-nas, somente três afirmaram que acham complicado e/ou não en-tendem algumas imagens que vêm estampadas nas etiquetas. Ainda, afirmaram que algumas etiquetas incomodam em contato com a pele.

4 Segurança

4.1 Aviamentos sem bordas vivas = As 18 alunas afirmaram que alguns aviamentos de qualidade ruim po-dem vir com bordas vivas, mas que isso pode ser resolvido mesmo an-tes de ser finalizada a confecção da roupa.

4.2 Tecido não inflamável = Todas as 18 alunas entrevistadas afirmaram que o tecido é inflamável, sim.

4.3 A modelagem permite mobilida-de e alcance = Todas as 18 alunas afirmaram que alguns modelos de

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ssiblusas não dão mobilidade e nem alcance dos braços para determi-nadas atividades. Afirmaram, ain-da, que o modelo da blusa deve ser direcionado para cada necessida-de e/ou atividade.

4.4 Tecido permite transpiração = Todas afirmaram que alguns teci-dos fabricados com material poli-éster não permitem total transpi-ração da pele.

5 Indicadores de usabilidade

5.1 Compatibilidade ao usuário (re-lação ao uso) = Todas afirmaram que, ao adquirir uma blusa, o usu-ário deverá estar atento à compa-tibilidade ao uso da blusa. Uma blusa de festa ou de trabalho deve ser confeccionada para suprir as necessidades.

5.2 Clareza visual em relação às in-formações do produto = Todas afirmaram que as informações de uso da blusa não são complicadas e que não apresentam obstáculo para uso (nas informações).

5.3 Priorização das funcionalidades = Todas as 18 alunas afirmaram que

a hierarquia das funções da blusa não interfere no uso.

6 Conforto

6.1 Contato do tecido com a pele – to-que = Todas as alunas afirmaram que o toque do tecido na pele é de-sagradável e incomoda, principal-mente se o modelo for ajustado ao corpo (à pele).

6.2 Contato do tecido com a pele – abrasão = Quatro alunas afirma-ram que, dependendo do tecido e do molde da blusa, pode-se apre-sentar abrasão na pele e machucá--la se o uso for contínuo.

6.3 Contato do tecido com a pele – ma-ciez – Todas as 18 alunas afirmaram que os tecidos que apresentam maciez e suavidade em contato com a pele são os melhores para o uso de longa duração de tempo.

6.4 Ajuste da peça ao corpo – estático – peso = Dez alunas afirmaram que, dependendo do molde da blusa, o ajuste estático em relação ao peso da peça pode deixar desalinha-do, fora de simetria e com estética prejudicada.

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6.5 Ajuste da peça ao corpo – estáti-co – caimento = Todas afirmaram que o ajuste e caimento da blusa são de fundamental importância para o resultado do conforto e de estética.

6.6 Ajuste da peça ao corpo – estático – modelo = Dez alunas afirmaram que se o modelo não for adequado ao usuário, principalmente ao bió-tipo poderá deixar a blusa descon-fortável ao usuário.

6.7 Ajuste da peça ao corpo – dinâmi-co – flexibilidade = Dezoito alunas afirmaram que a blusa, para ter conforto, precisa ter flexibilidade, porém, entendem que alguns mo-delos de blusa e de tecido podem não deixar o usuário em conforto de flexibilidade, principalmente te-cidos grossos e pesados.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Considerando que a pesquisa foi ba-seada numa metodologia do OIKOS, de-ve-se considerar alguns aspectos que se fizeram relevantes e se destacaram nos resultados:

Saia – Na referência Facilidade de ma-nuseio, destaca-se a Mobilidade durante o uso, sendo que quatro alunas afirmaram que a mobilidade para andar e para sentar fica comprometida, a qual pode travar a ra-pidez e a destreza no ato de andar e sentar. Na referência Facilidade de manutenção, destaca-se Qualidade dos aviamentos, em que os aviamentos da saia, com exceção dos botões, são de fácil manutenção. Já os botões são diversos em tamanho e forma e que às vezes não são encontrados para substituição. E, ainda, alguns botões que-bram mesmo antes de usar a saia. Essas observações foram apresentadas por todas as alunas. Na referência Segurança, desta-ca-se Aviamentos sem bordas vivas, sendo que 16 alunas afirmaram que alguns colche-tes se apresentam fechados e com o arame aberto, daí podem furar o dedo ao manuse-ar. Nas referências Usabilidade e Conforto, destaca-se que existe a Compatibilidade ao usuário (relação ao uso), sendo que todas as 18 alunas afirmaram que a saia, depen-dendo dos movimentos que serão neces-sários para o corpo, não apresenta compa-tibilidade de uso. Muitos modelos de saia podem até mesmo dificultar o uso e tornar o vestuário incompatível com a usabilida-de. Outro item de destaque é Contato do

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ssitecido com a pele – maciez, visto que todas as 18 alunas afirmaram que os tecidos que apresentam maciez em contato com a pele são os melhores para o uso de longa dura-ção de tempo.

Blusa – Na referência Facilidade de ma-nuseio, destaca-se o item Facilidade de vestir, sendo que as 15 alunas disseram que, dependendo do modelo da blusa, não é fácil vestir. Na referência Facilidade de manutenção, destaca-se o item Eficácia na limpeza, sendo que todas as 18 alunas afirmaram que, se for usado um produto de limpeza correto, os resíduos que ficaram no tecido podem sair sem problema de da-nificar a peça. Na referência Facilidade de assimilação, destaca-se o item Forma do produto, aviamentos e componentes su-gerem clareza da sua função, sendo que todas as alunas afirmaram que a blusa em sua forma, bem como os aviamentos, é de fácil entendimento na questão manuseio. Na referência Segurança, destaca-se o item Tecido não inflamável, sendo que todas as 18 alunas entrevistadas afirmaram que o tecido é inflamável, sim. Nas referências Usabilidade e Conforto, destaca-se o item Compatibilidade ao usuário (relação ao uso), visto que as 18 alunas afirmaram que, ao adquirir uma blusa, o usuário deverá

estar atento à compatibilidade ao uso da blusa. Explicam que uma blusa de festa ou de trabalho deve ser confeccionada para suprir as necessidades. Ainda em Conforto, no item Ajuste da peça ao corpo – estático – caimento, todas as alunas afirmaram que o ajuste e caimento da blusa são de funda-mental importância para o resultado do conforto e de estética. Esses itens conforto e caimento podem ser decisivos na aquisi-ção da peça do vestuário.

Esta pesquisa tem a intenção de ques-tionar os aspectos de vestuário em relação a temas da ergonomia e do design, sendo os tópicos de conforto e usabilidade so-mente dois itens relevantes. Deve-se dizer que outros itens poderão ser pertinentes neste estudo, como, por exemplo, dados antropométricos e fisiológicos. Mas esse estudo ficará para o futuro da pesquisa.

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ReferênciasEMÍDIO, L. F. B. A gestão de design como ferramenta estratégica para MPEs do vestuário de moda: um es-tudo de caso na região de Londrina. Bauru, 2006. Dissertação (Mestrado em Desenho Industrial) – Universidade Estadual Paulista.

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IIDA, I. Ergonomia: projeto e produção. São Paulo: Edgard Blucher, 2005.

MONTEMEZZO, M. C. F. S. Diretrizes metodológicas para o projeto de produtos de moda no âmbito acadê-mico. 2003. 97 f. Dissertação (Mestrado em Desenho Industrial) – Universidade Estadual Paulista, Bauru, 2003.

MORAES, A. Ergonomia e usabilidade de produtos, programas, informação. In: Ergodesign: produtos e pro-cessos. Rio de Janeiro: 2AB, 2001. pp. 195-206.

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Imagens biomédicas e história das

técno-imagens: o corpo ao avesso na

arte contemporâneaRegilene Ap. Sarzi-Ribeiro

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Por um estudo transdisciplinar – corpo e imagem, arte e medicina

Ao longo da história da arte, foram inú-meras as vezes que a arte e a medicina se encontraram, construindo uma complexa rede de conhecimento que se manifesta em imagens, obras artísticas, livros e ma-nuais de referência tanto para a Arte quan-to para a Ciência. Questões sociais, políti-cas, religiosas e culturais sempre estiveram presente nesses encontros, transformando as contaminações entre as áreas em novos conhecimentos sobre o corpo.

Cumpre esclarecer que este artigo é parte da pesquisa trienal da autora na qual está se investigando como se constroem os imaginários corporais e as diferentes visu-alidades do corpo visto em seu interior na Arte Contemporânea, visando descrever as relações estético-culturais das imagens médicas com a História da Arte e suas in-terconexões com o campo da Arte, tendo como base um estudo Transdisciplinar que articula as Artes Visuais, a Filosofia Estética Contemporânea, a Sociologia, a Medicina e a História das Técno-imagens.

Nesse contexto, o recorte temporal não contempla uma cronologia linear, mas

destaca Leonardo da Vinci, ícone na cria-ção de imagens anatômicas, a partir da sua relação com imagens produzidas no regime pré-fotográfico, e a norte-americana Tori Ellison. Ela é associada ao regime pós-foto-gráfico, cuja poética se dá pela apropriação e registros do corpo através de operações de pós-produção da imagem técnica, pas-sando por Claudio Mubarac, que explora os dois regimes de criação de imagens ao mesmo tempo, o pré-fotográfico e pós-fo-tográfico, em suas fotogravuras.

O objetivo da pesquisa é ampliar a com-preensão dos processos históricos, sociais e culturais que envolvem a produção e a recepção das técno-imagens resultantes da apropriação e hibridização de imagens biomédicas, exames e diagnósticos mé-dicos. Além disso, visa descrever como se constrói as diferentes corporalidades e re-gistros do corpo pela fotografia, filmes, ví-deo, raios X, scanner, entre outros disposi-tivos técnicos e linguagens artísticas como a gravura expandida, quando se destacam as operações de apropriação e hibridização estética.

A fundamentação teórica é centrada na abordagem transdisciplinar, que pres-supõe um olhar para a complexidade das áreas envolvidas a fim de atravessar os

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irocampos de conhecimento e tecer novos ne-xos entre eles, por meio de um pensamen-to complexo como propõem Edgar Morin (2015) e Basarab Nicolescu (1999), entre outros. Nesse contexto, destacamos a te-oria sistêmica ou a ecologia dos sistemas como base para refletir sobre a estrutura em rede, que organiza as relações entre os artistas, os aparelhos de registro do corpo e suas imagens técnicas. E no referencial histórico-crítico, partindo da aproxima-ção conceitual entre os seguintes teóricos e pensadores: Michel Foucault (2013) e o instrumento do exame e o conceito de dis-positivo; Vilém Flusser (2011) e o conceito de programação e os efeitos que os disposi-tivos maquínicos exercem sobre o homem desde o surgimento das técno-imagens. Lúcia Santaella (2005) e Luiz Claudio da Costa (2009) que tratam cada um à sua ma-neira, sobre os meios de produção, veicula-ção e visibilidade das imagens e os cânones de registro, arquivo e memória.

A semioticista brasileira Lúcia Santaella defende que são três os paradigmas de constituição da imagem, a saber: o pré-fotográfico, o fotográfico e o pós-fotográ-fico. Ao passo que o pesquisador carioca Luiz Cláudio da Costa observa o domínio do regime fotocinematográfico na arte do

século XX e os desdobramentos dos re-gistros e arquivos na arte, na espacialida-de e temporalidade das obras de arte na contemporaneidade.

O filósofo francês Michel Foucault, por usa vez, trata do conceito de dispositivo e de igual forma elabora sua análise sobre o instrumento do exame e sistemas de vigi-lância e controle, relacionados à disciplina como um conjunto de técnicas pelas quais o sistema de poder submete os indivíduos e os torna dóceis. A partir do pensamento do filósofo tcheco, naturalizado brasileiro, Vilém Flusser sobre o conceito de “pro-gramação”, produzida por aparelhos e suas técno-imagens, a pesquisa descreve uma das bases de produção das imagens biomédicas: a fotografia, aproximando os conceitos de dispositivo e programação de Foucault e Flusser, respectivamente. Para Foucault, o dispositivo é uma rede de ele-mentos que compõe o jogo de poder entre o sujeito e a sociedade. Flusser defende a programação como processo civilizatório, no qual a arte pode ser um instrumento de libertação dos homens para romper o poder das técno-imagens e empreender a experiência estética pura.

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As técno-imagens do corpo ao avesso – passado e presente

As conexões entre a representação e as formas de registros (desenho, pintura, escultura, gravura, fotografia, vídeo) do corpo se tornam complexas com as transformações conceituais e tecnológi-cas desencadeadas na passagem do século XVIII para o XIX. As representações do corpo, que antes tinham na ciência anatômica um grande campo de produção e difusão de imagens do corpo, ga-nham notoriedade no século XX com o advento da imagem fotográfica, sobretudo as que surgiram a partir da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), que escancaravam as atrocidades da guerra e a fragili-dade do corpo. Com a evolução dos aparelhos téc-nicos de visualização como a fotografia e os raios X (Figura 1) inventados por volta de 1826 e 1895, res-pectivamente, os registros do corpo por imagens médicas e/ou o seu interior passam por transfor-mações sem precedentes na história das imagens do corpo.

No entanto, como é conhecido, foi durante o Renascimento (entre os séculos XIV e XVI) que a ciência da anatomia ganhou seu verdadeiro impul-so. Médicos, anatomistas e artistas trabalhavam juntos movidos cada vez mais pela capacidade téc-nica dos artistas em traduzir em imagens de gran-de precisão as observações e constatações dos anatomistas. As técnicas de gravura e impressão

Figura 1. Primeira imagem de raios X que o médico Willhelm Röntgen fez das mãos de sua esposa, Anna

Bertha Ludwig, em 1895. Fonte: DREAM ANATOMY GALLERY, 2014.

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da época promoveram a difusão das imagens ana-tômicas, levando-as para um público cada vez maior e mais distante. O movimento humanista ampliou as possibilidades de aproximação e asso-ciação entre as artes e as ciências. O papel, o már-more, a madeira e/ou o metal foram suportes por excelência para o registro de imagens do corpo em desenho, escultura, pintura e/ou gravura cuja “[...] capacidade reprodutora, embora de modo ainda artesanal, já começara a antecipar o caráter fun-damental do paradigma fotográfico” (SANTAELLA, 2005, p.298).

Na investigação sobre os dispositivos de regis-tros do corpo, são conhecidos os desenhos anatô-micos do renascentista italiano Leonardo da Vinci (1452-1519). Quanto mais velho, mais Leonardo se interessava pela ciência e defendia a ideia de que os artistas tinham que conhecer todas as leis da natureza, sendo o olho um instrumento perfeito para se chegar ao conhecimento. Leonardo criou a moderna ilustração científica que se tornou um aparelho de visibilidade essencial para anatomis-tas e biólogos. Em um desenho como o Embrião no Útero (1510), (Figura 2), o artista alia uma agu-da observação e estudo do feto no útero, a parede uterina e a placenta com mecânica e ótica traduzi-das pela clareza de um diagrama.

As imagens produzidas a partir da observação curiosa e detalhista resultam do olhar científico de Leonardo e são registros do corpo ao avesso que

Figura 2. Leonardo da Vinci. Estudo de Embrião dentro do útero. Da série Estudos de Anatomia. 1510. Sanguínea. Acervo: Galeria Academia, Veneza, Itália. Fonte: KEMP, 2005.

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o artista-cientista italiano soube explorar como poucos em seus estudos de anato-mia. O próprio Leonardo definia tais esque-mas como a visão e a introvisão, o fora e o dentro.

A página inteira é um festival de exposi-ção visual. Uma série de pequenos esbo-ços do útero mostra as camadas de sua parede progressivamente abertas, reve-lando o germe de vida lá dentro, como uma castanha no interior de sua casca protetora. As interligações da placenta e da parede uterina são representadas numa secção sólida, que se separa como uma fita de velcro quando é puxada para trás. Do modo que lhe é característico, Leonardo especulava sobre a causa pela qual a mesma alma governa esses dois corpos [...] (KEMP, 2005, p.91).

Muito antes do cinema ou da fotografia, dos raios X ou das tomografias computado-rizadas e da internet, Leonardo da Vinci uti-lizou o desenho para conhecer e desbravar o funcionamento interno do corpo huma-no, associando a Matemática e a Ciência ao seu conhecimento para elaborar suas teo-rias sobre a máquina humana (SILVA, 2013). Os desenhos anatômicos de Leonardo,

feitos por meio da observação da disseca-ção de cadáveres, transformaram a ciência e as ilustrações científicas e foram ampla-mente utilizadas pela Medicina.

Como se conhece na história das técno--imagens, o surgimento dos primeiros apa-relhos de registro do real é acompanhado de diferentes reflexões e críticas sobre os modelos e leis que envolvem tais instru-mentos, técnicas e como estes operam o campo da imagem.

Para Lúcia Santaella, os paradigmas da imagem são três: o pré-fotográfico, cujas imagens são resultado da habilidade ma-nual do homem para dar forma ao mundo visível e invisível; o fotográfico, que produz imagens que dependem de dispositivos maquínicos (fotografia, filmes, vídeos, ho-lografia) capazes de registrar cenas, ob-jetos e paisagens; e o pós-fotográfico, no qual as imagens são totalmente computa-cionais, sintéticas e infográficas, resultan-tes de uma matriz numérica. No regime pré-fotográfico, os processos de criação da imagem são artesanais, e a expressão da visão do artista é fruto da sua habilidade manual. A produção artesanal é concretiza-da por meio de suportes, superfícies e re-ceptáculos de condução da imagem, como o papel, a pedra, a madeira e/ou o tecido. A

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iroimagem gerada é resultado do gesto do ar-tista, que confere uma figuração ao visível. A natureza da imagem pré-fotográfica visa figurar o visível e dar forma ao invisível. O sujeito artista criador da imagem pré-foto-gráfica é um sujeito demiurgo que modela e organiza a matéria caótica preexistente através da imitação de modelos eternos e perfeitos.

No final do século XVIII e começo do século XIX, a fotografia promoveu tanto a produção quanto a reprodução de imagens numa velocidade sem precedentes. Para Vilém Flusser (2011, p. 37), “as imagens téc-nicas são produzidas por aparelhos. Como primeira delas foi inventada a fotografia. O aparelho fotográfico pode servir de mo-delo para todos os aparelhos caracterís-ticos da atualidade e do futuro imediato”. Flusser (2011, p.38) destaca o fato de que os “aparelhos fazem parte de determina-das culturas, conferindo a estas certas características”.

Além das relações dos aparelhos e das imagens com a cultura de sua época, para esta pesquisa interessa especialmente as relações entre a imagem e o dispositivo que a produz. Sobretudo, quando con-sideramos o fato de que a imagem será sempre fruto de operações e categorias

de um espaço-tempo fotográfico (corte e enquadramento) que resultam dos diferen-tes pontos de vista do sujeito que opera a máquina e da própria programação do dis-positivo, como o obturador que recorta o tempo, seu fluxo e continuidade. De acordo com Flusser, a interpretação da imagem fo-tográfica nos leva à compreensão das con-dições culturais da programação do apa-relho e, por suposto, das imagens técnicas que dele resultam:

[...] são categorias de um espaço-tempo fotográfico, que não é nem newtoniano nem einsteiniano. Trata-se de um espa-ço-tempo nitidamente dividido em regi-ões [...] de pontos de vista [...] há região espacial para visões muito próximas, outra para visões intermediárias, outra ainda para visões amplas e distanciadas. Há regiões espaciais para perspectivas de pássaro, outras para perspectiva de sapo, outras para perspectivas de crian-ça. Há regiões espaciais para visões di-retas com olhos arcaicamente abertos, e regiões para visões laterais com olhos ironicamente semifechados. Há regiões temporais para um olhar-relâmpago, outras para um olhar sorrateiro, ou-tras para um olhar contemplativo. Tais

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regiões formam rede, por cujas malhas a condição cultural vai aparecendo para ser registrada (FLUSSER, 2011, p.50).

Conforme alude Santaella, se no regime pré-fotográfico o sujeito é um demiurgo, no fotográfico ele é um sujeito pulsional, voyeur, movente, que faz escolhas a partir do próprio ego, que se movimenta e im-prime mudanças. Nesse contexto, Flusser descreve o fotógrafo como aquele que:

[...] age em prol do esgotamento do programa em prol da realização do uni-verso fotográfico. Já que o programa é muito “rico”, o fotógrafo se esforça por descobrir potencialidades ignoradas. O fotógrafo manipula o parelho, o apalpa, olha para dentro e através dele, a fim de descobrir sempre novas potencialidades. Seu interesse está concentrado no apa-relho e o mundo lá fora só interessa em função do programa. Não está empenha-do em modificar o mundo, mas em obri-gar o aparelho a revelar suas potenciali-dades (SANTAELLA, 2005, p. 304).

A técnica de registro e impressão da luz sobre uma superfície sem o uso de tintas ou grafite deu início à “era da reprodutibilidade

técnica” de Walter Benjamin (1892-1940) ou ao regime fotográfico que, somado ao cine-ma e ao registro do movimento, constitui-rá o regime fotocinematográfico (COSTA, 2009). Em outras palavras, o registro da realidade ou a visualização da imaginação humana na era moderna sofre transfor-mações na medida em que os suportes de condução da imagem se alteram, passando das técnicas de pintura e desenho para a gravura e a fotografia, e depois da fotogra-fia para o cinema. Os regimes e a evolução das imagens técnicas ou técno-imagens são elementos-chave para a compreensão do tema desta pesquisa: os dispositivos de registro do corpo e o hibridismo estético na contemporaneidade.

Na segunda metade do século XX, con-forme Luiz Claudio da Costa, uma crise dos suportes se instala no cenário artístico, fazendo com que numerosos dispositivos eletrônicos de produção e reprodução de imagens passem a ser explorados. Entre as décadas de 1970 e 1980, o suporte passa a ser questionado como lugar de memória e autoridade para dar espaço à arte como prática do tempo: arquivar, diferenciar, se-rializar, intermediar, transferir e reproduzir se tornam operações organizadas por um regime visual fotocinematográfico.

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iroPara o referido autor, a arte no século XX se tornou fotográfica. Registrar, arquivar, samplear e reproduzir ou serializar se tor-nam ações poéticas (fazer) que operam os novos meios e suportes. De igual forma, na era eletrônica o armazenamento de dados e informações e o acesso a diferentes ban-cos de imagens, já codificadas e produzidas pela arte e pela comunicação (fotografia, vídeo, televisão), promovem uma segunda corrente de transformações tanto na pro-dução, quanto na veiculação de imagens do corpo.

O artista brasileiro Claudio Mubarac associa suas imagens gráficas à fotografia e às relações entre a tradição da visuali-dade do corpo e temas filosóficos sobre a morte e a fragilidade da vida. As obras de Mubarac, que também por circunstâncias da vida se defrontou com as imagens bio-médicas e a partir delas elaborou sua poé-tica, são marcadas pelo hibridismo estético no campo da gravura. Mubarac participa da geração que conhece o corpo em detalhes por dentro e por fora, sobretudo depois da primeira metade do século XIX, quando a fotografia passou a revelar coisas que o olhar humano não conseguia captar, mas que a partir do registro fotográfico podiam ser vistas pela percepção detalhada e/ou

fragmentada das imagens. Novas conexões surgem como reflexo das visões críticas so-bre o impacto da tecnologia na vida do ho-mem, sobre a vida e a morte e, junto delas, questões sobre a arte, a ciência e as novas tecnologias da imagem.

Em diferentes séries de sua obra gráfi-ca, como nas suítes Umbra ou Dos Ícones Gráficos, Mubarac se apropria da técnica de photoetching (fotogravura) para criar estampas que combinam imagens raios X e exames médicos. Em uma de suas es-tampas, nota-se a imagem de uma chapa de raios X de um pé esquerdo feminino (da esposa do artista) de perfil e de frente que, por estar sobreposto a uma inscrição hos-pitalar, denuncia a natureza documental das imagens. De igual forma, na suíte Sobre as Câmeras (Figura 3) Mubarac se apro-priou dos raios X de seu corpo e por meio da fotogravura integrou as radiografias às imagens gráficas. Segundo o historiador da arte e curador Tadeu Chiarelli, na produção gráfica do artista é recorrente a manifesta-ção de imagens de esqueleto humano, crâ-nios, quadril, braços e pés e, ainda, troncos humanos e braços dissecados, interpreta-das como metáforas da morte, associadas à simbologia e fragilidade do corpo e à transitoriedade da vida (CHIRAELLI, 2006).

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Figura 3. Claudio Mubarac. Da Suíte SOBRE AS CÂMARAS. 1997/2000.

Fotografia e água-forte. 29x28cm. Fonte: CHIARELLI, 2006.

Mas foi depois de um acidente automobilístico sofrido por Mubarac em 1989, em São Paulo, que o corpo humano ganhou a atenção do artista em definitivo. Antes, Mubarac revisitava a história da gravura explorando a gravura artística em seus aspectos comunicativos, a gravura como canal de informação. Após o acidente, o artista passou a traduzir através da gravura a consciência da fra-gilidade da vida e da existência humana e a rela-cionar a materialidade da gravura à materialidade perecível e quebradiça do corpo. Desde então, seu corpo aparece representado de forma fragmentá-ria, associada à cabeça, crânios, chapas de raios x e desenhos gravados em ponta seca. Sobre a presença do corpo ao avesso e as imagens biomé-dicas nas estampas de Mubarac, Chiarelli afirma:

[...] as imagens de pés ressurgem sozinhas em duas outras estampas impressas em folha de prata sobre chumbo; a imagem dupla, formada pelo crânio e pela mão, reaparece apenas em uma estampa, impressa em folhas de prata sobre chumbo, igualmente; o crânio em buril e água-forte aparece de novo, com sutis intervenções, em mais uma impressão sobre papel, enquanto o corpo com suas vísceras (com intervenções in-vertidas e/ou modificadas) ressurgem mais duas vezes (CHIARELLI, 2006, p.02).

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iroO artista manipula as imagens via com-putador, o que lhe permite um repertório vasto de imagens “[...] povoadas por ou-tros crânios, outros fragmentos do corpo (captados pelos raios-X ou não), por outros corpos despedaçados, por registros da ação do artista sobre a matéria gráfica [...]” (CHIARELLI, 2006, p. 2).

Por usa vez, a artista norte-americana Tori Ellison desenvolve uma relação muito singular com imagens produzidas no cam-po da Medicina, imagens de exames e pro-cedimentos laboratoriais muitas vezes re-lacionados à própria experiência com uma doença ou morte na família, que deflagram novas conexões sensíveis e identitárias en-tre os sujeitos e seus corpos. A artista rela-ta que na década de 1980 desenvolveu uma esclerose múltipla, que tornou necessária a realização de vários procedimentos mé-dicos e exames laboratoriais e de imagem, entre eles os raios x de sua coluna verte-bral. As imagens de seu corpo lhe causa-ram certo fascínio, e a visão do seu interior foi para ela como a visão de uma imagem síntese de sua identidade e/ou essência interior. Desde os anos de 1990, Ellisson passou a pesquisar e inserir as imagens dos seus exames médicos em suas obras de arte, nas quais ela produz uma fusão

ou hibridismo entre diferentes linguagens artísticas e imagens de diferentes proce-dências, o que também a define como uma artista multimídia.

Conforme a bióloga molecular Sylvia B. Nagl, da University College London, a artista Tori Ellison relata suas primeiras aproximações com as imagens médicas da seguinte forma: “The X-ray plates began to fascinate me. I found them beautiful the spine (appears as) perhaps an essential self, a stronger source of self, and an inte-rior, subjective sense of Identity” (NAGL, 2004, p.370).

Diferentes técnicas de gravura como monotipia, serigrafia, litografia, talho doce e técnicas chinesas foram associadas às imagens médicas de seus exames, apro-priadas por meio de fotogravuras estam-padas sobre tecidos de seda, cuja leveza e suavidade nos remetem à fragilidade do corpo e ao fascínio que tais imagens geram na artista.

Na série de impressões The Spaces in Between (Figura 4), produzida no final dos anos de 1990, Ellison misturou diferentes técnicas de gravura e impressão.

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Figura 4. Tori Ellison. Verso. The Spaces in Between. 1998. Litografia e silkscreen sobre papel Rives BFK. 6ª edição. 30x20cm.

Fonte: ELLISSON, 2008.

Nas estampas da referida série, a artista investigou os espaços interiores do corpo in-corporando diferentes desenhos de flores às imagens de raios x de sua espinha, numa alu-são à beleza, delicadeza e transitoriedade da existência humana. Ellison afirma ter se inspi-rado em opostos como claro/escuro, presença/ausência, eu/outro, dentro/fora (ELLISON, 2008). Sobre a referida série de impressões, Ellison comenta:

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iroThe spine for me is like the main river of the body, a life source. It s endlessly fas-cinating and mysterious image, mapping origins and a pattern of growth, like an architecture of the body. Other elements in the prints: transfers from photos of Portland Art Museum’s classical statues casts; eyes and mouths; hands, with ges-tures echoing the floral blossoming pro-cessing; and geometric structures, which I use abstractly to represent interior/ex-terior concepts of the body, and the body in the space. This series led to my resi-dence at Woman’s Studio Workshop, New York (ELLISON, 2008, s/p).

Notamos que Ellison compõe suas im-pressões a partir da imagem médica da co-luna vertebral como em Verso e Stand, nas quais ela é o pilar, é a referência central da identidade subjetiva traduzida pela artista em novas imagens recompostas do próprio corpo. Embora associe a forma da espinha à delicadeza de outras imagens como flo-res ou silhuetas, que aspiram à sutileza das relações entre a vida e a materialidade do corpo, a coluna vertebral não chega a ser desconstruída. Pelo contrário, a artista a mantém como estrutura da imagem, quase sempre alocada no centro da impressão ou

levemente deslocada, como uma metáfo-ra de sustentação da vida e autorreferen-cialidade, frente ao desafio da sua própria doença.

A partir dos anos 1960, os artistas con-ceituais descobriram o corpo e as instala-ções artísticas, mas também a fotografia, o filme e o vídeo. A experiência acumulada com as formas de registro de imagens no campo da comunicação fez com que ações, performances e intervenções urbanas passassem a ser registradas de maneira frequente em fotografias, filmes e vídeos. Surgem as videoinstalações e a arte eletrô-nica, que potencializam o hibridismo esté-tico. E com essas expressões, a história das imagens técnicas se amplia.

Após os anos de 1980, o arquivo foto-cinematográfico atua nos intervalos entre a obra e a sua extensão temporal (COSTA, 2009). A operação de apropriação de ima-gens do corpo já produzidas por disposi-tivos maquínicos, exames médicos e pro-cessos de registro do corpo no campo da Ciência e da Medicina resulta de uma cultu-ra de vigilância, documentação, controle e normalização do corpo.

Nesse campo, interessa-nos a visão do filósofo francês Michel Foucault so-bre o poder implicado na disciplina cujo

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instrumento do exame provoca domes-ticação e objetificação da subjetividade. Os exames médicos surgem como estra-tégia política para controle e domínio de indivíduos e instituições. Foucault afirma: “É o poder de individualização que tem o exame como instrumento fundamental. O exame é vigilância permanente, classifica-tória, que permite distribuir os indivíduos, julgá-los, medi-los, localizá-los e, por con-seguinte, utilizá-los ao máximo. Através do exame, a individualidade torna-se um ele-mento pertinente para o exercício do po-der” (FOUCAULT, 2013, p.182).

Nesse contexto, Márcio Alves da Fonseca (2011) comenta o mecanismo dos exames e as relações com o poder e a disciplina no pensamento de Michel Foucault e revela três procedimentos que permitem ao exa-me desempenhar seu papel disciplinar:

Pelo primeiro deles, o exame realiza uma inversão de visibilidade no exercício do poder. [...] as relações de poder devem permanecer ocultas [...] obrigam a uma visibilidade cada vez maior e mais deta-lhada aqueles que submetem à sua atu-ação. [...] Em segundo, o exame também produz um arquivo, cuja fonte não é ou-tra que não os indivíduos sobre os quais

atua. Com isso, ele faz a individualidade entrar no campo documentário. Toda ex-tração conseguida pelo exame é registra-da e documentada. [...] A vigilância deta-lhada e permanente consegue extrair um grande número de informações sobre o vigiado: seus hábitos, suas reações. [...] pelo exame, o indivíduo passa a ser uma peça de um dispositivo estratégico [...] a individualidade é um objeto de descrição e documentação [...] pode ser controla-da e dominada a partir de um proces-so constante de objetivação e sujeição (FONSECA, 2011, p.61-62).

Destes três procedimentos interessam-nos especialmente dois deles: o método de dar visibilidade detalhada ao sujeito vigia-do, medido e dominado, e a produção do arquivo, registro, documento que revela sua individualidade, traços de sua identi-dade. O primeiro procedimento, associa-mos às novas tecnologias de visibilidade do corpo e o segundo, aos registros do corpo, fotográficos, videográficos e/ou por outras técnicas que são matéria prima para os ar-tistas na sociedade contemporânea.

Para Foucault (2013), existe um jogo disci-plinar de poder que se estende socialmente por meio dos dispositivos, aqui entendidos

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iropor nós como as novas tecnologias de visu-alização do corpo, que geram enunciados científicos e discursos biomédicos que con-trolam e normatizam o corpo dos indivíduos. Nesse sentido, podemos aproximar o jogo disciplinar de poder, em Foucault, do jogo programático dos aparelhos, em Flusser. O primeiro ocorre por meio dos dispositivos, e o segundo, na forma de imagens técnicas, re-sultantes da interação do homem com o pro-grama inscrito nos aparelhos. Observamos que o conceito de dispositivo de Foucault dialoga com o conceito de programação de Flusser. A programação das máquinas pode ser considerada como um jogo de poder que se desdobra em uma rede de relações entre os elementos que o constitui:

O jogo com símbolos passa a ser jogo do poder. Trata-se, porém, de jogo hie-rarquicamente estruturado. O fotógrafo exerce poder sobre quem vê suas foto-grafias, programando os receptores. O aparelho fotográfico exerce poder sobre o fotógrafo. A indústria fotográfica exerce poder sobre o aparelho. E assim ad infi-nitum. No jogo simbólico do poder, este se dilui e se desumaniza. Eis o que sejam “sociedade informática” e “imperialismo pós-industrial” (FLUSSER, 2011, p. 47).

Em síntese, o sujeito fotógrafo se apro-pria do aparelho para domínio sobre os outros, para expressar e comunicar seus discursos e, sobretudo, para projetar-se so-bre os outros sujeitos na forma de imagens (discursos visuais), ao passo que o aparelho visa programar os homens para que estes lhe sirvam de agentes de aperfeiçoamento e evolução técnica. Segundo Flusser, nos di-vertimos (porque somos programados) com as imagens a tal ponto de não as questionar ou as interpretar, e isto nos revela o quanto estamos totalmente imersos, automatiza-dos e domesticados pelas técno-imagens. Esse comportamento acrítico está cegando nossa liberdade de dialogar com as ima-gens. A saída seria a retomada do controle sobre os aparelhos para que fossem possí-veis diálogos criativos, diálogos livres a par-tir de um distanciamento ou reflexão, como a que arte provoca, para que as pessoas to-massem consciência “[...] das virtualidades dialógicas inerentes a imagens: que são infi-nitamente maiores que as virtualidades dos textos [...] De tal consciência imagística nova se abririam horizontes para diálogos infini-tamente mais informativos [...] de riqueza criadora [...] seríamos de repente todos ‘ar-tistas’ (aqui, o termo ‘arte’ engloba ciência, política e filosofia)” (FLUSSER, 2008, p.87).

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Ao citarmos essa visão do artista de Flusser, fica claro que entendemos o ato de se apropriar das imagens biomédicas como uma atitude subversiva e autopoiética do artista dentro do dispositivo – registros do corpo–, e dentro do sistema das técno-ima-gens. A ação de deslocamento das imagens do âmbito médico para o artístico, sobre-tudo a partir da invenção da fotografia, subverte a função das imagens do corpo, antes produzidas com objetivos e sentidos bastante distintos no campo da ciência.

Novos nexos

Cabe ressaltar que as obras em estu-do sobre as novas corporalidades na arte contemporânea operam a partir de apro-priações de imagens biomédicas. Uma vez deslocadas da área médica para o campo da Arte, as imagens do corpo ao avesso participam do hibridismo estético decor-rente das diferentes operações poéticas: deslocamento, apropriação, recodificação e ressignificação do volumoso cenário de produção de imagens do corpo.

A arte contemporânea tem alimenta-do cada vez mais suas imagens, gravuras e fotomontagens, colagens, entre outras,

e, sobretudo, videoinstalações, videoar-tes e espaços imersivos com apropriações de imagens produzidas por diagnósticos e exames médicos. Essas imagens, ou formas de registro do corpo, exploram a exposição interna e externa de órgãos e membros e foram qualificadas por Lúcia Santaella (SANTAELLA, 2004) como corpo esquadri-nhado e/ou corpo ao avesso.

A especificidade de sons e imagens, a experiência audiovisual e a vivência cogni-tiva e sensível que tais imagens promovem transformam-nas em agentes de experi-ências estéticas do corpo na contempora-neidade, resultantes de diferentes corpo-ralidades. Essas experiências participam estruturalmente da constituição do sujeito, sua identidade, e alteram paulatinamente sua percepção, fruição e interação com o mundo (SARZI-RIBEIRO, 2012).

Os diferentes níveis de interação na es-tética digital e as novas tecnologias da ima-gem levam o sujeito à experiência da virtu-alização (SARZI-RIBEIRO, 2014), que reitera a experiência do corpo fragmentário, em fluxo, em constante devir. Tempo, espaço e materialidade são alterados, e experiências estéticas novas são mediadas pelos meios eletrônicos. Novos nexos entre arte, ciên-cia e tecnologia se dão, e as técno-imagens

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iroampliam os dispositivos de visualização do corpo.

Em suma, fica claro, a partir dos resul-tados apresentados, que as diferentes cor-poralidades oriundas da criatividade e do uso de imagens do corpo nas artes visuais, como as que são produzidas pela biome-dicina, provocam diferentes processos de produção de subjetividade e identidade, e novas corporalidades podem ser experi-mentadas e fruídas como experiências ima-géticas puras (FLUSSER, 2008).

Nas obras comentadas neste trabalho, o corpo se revela como algo – sujeito (ar-tista/público) ou objeto (imagem) – que se esquiva, foge e resiste aos padrões de ra-cionalização, normatização e disciplina. O corpo esquadrinhado em constante muta-ção se reinventa continuamente, rompen-do padrões e modelos de programação das imagens técnicas oriundas dos aparelhos e dispositivos. Os artistas, ao se apropria-rem das imagens produzidas por exames médicos como matéria-prima, recodificam essas imagens dando a elas um novo signi-ficado, agora poético.

Essa operação de deslocamento (CAUQUELIN, 2008) de um lugar para outro – do sistema de registro do corpo na Ciência para a apropriação e ressignificação das

imagens biomédicas no sistema da Arte – gera uma ruptura na economia da disciplina e do poder dessas imagens, promovendo derivações no sistema controlador ou mo-delador. A arte contemporânea se apropria de exames médicos com a finalidade de tornar o sujeito objetificado e programado por essas mesmas imagens um sujeito cons-ciente e sensível às novas experiências de visibilidade do corpo que operam sobre o invisível para promoção de uma experiência do novo. Os primeiros resultados desta pes-quisa apontam para o corpo vigiado, devas-sado, ressignificado, múltiplo e polifônico, fruto da investigação científica, o qual uma vez recomposto na arte contemporânea, por diferentes visualidades, torna-se cada vez mais uma presença multifacetada e vir-tualizada, em constante devir.

ReferênciasCAUQUELIN, Anne. Frequentar os incorporais. São Paulo: Martins Fontes, 2008.

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RECOMBINANTES ARQUITETÔNICOS TÊXTEIS TENSO-ESTRUTURAIS EM

CAMPO EXPANDIDO ENTRE ARTES DIMENSIONAIS E

ARQUITETURA: POTÊNCIA E SINGULARIDADE

Sidney Tamai

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INTRODUÇÃO

JUSTIFICATIVA

O artigo proposto se origina, como con-ceito, em uma parte do Doutorado “A trans-missão da arquitetura como campo expan-dido: invenção e singularidade” por mim apresentado na FauUsp em 2009. Foi, em parte, inicialmente apresentado como arti-go no Congresso Internacional “O que é uma escola de Projeto na contemporaneidade?”, promovido pela Fau Mackenzie em setem-bro de 2013 e publicado nos Anais somente na forma digital. Revisto e ampliado, o artigo debruça-se a refletir sobre uma série de tra-balhos experimentais reflexivos que venho realizando enquanto professor-pesquisador no campo ampliado entre Arte e Arquitetura.

Esta pesquisa, que resultou em várias séries de experimentações didática-peda-gógicas, nasceu de alguns questionamen-tos, como a crítica generalizada de TFGs ou TCCs (Trabalhos de Conclusão de Curso) com baixa qualidade inventiva em seus pro-jetos; também como a crítica contínua de que sempre os alunos não sabem desenhar ou “projetar suas ideias”, mesmo seguindo um método. E, ainda, a crítica por parte dos alunos da ausência de práticas no curso de

Arquitetura, problemas que atingem dire-tamente a qualidade dos projetos no ensi-no e aprendizado e, portanto, na formação dos novos arquitetos e urbanistas.

Nesse sentido, pretende-se retomar ideias de alguns autores que se debruçaram sobre o tema e afins, como Jorge Sarquis e outros, que indiretamente articulo para formar propostas experimentais de ensino, como o conceito de Campo Expandido em ação transdisciplinar e elíptica de Rosalind Krauss, especialmente entre as Artes espa-ço-temporais e a Arquitetura. Também o conceito de Transdução utilizado pelo filó-sofo da ciência e técnica Gilbert Simondon, e ainda pela Poesia e Arte Concreta bra-sileira, já as esculturas e instalações, o outro círculo da elipse arte-arquitetu-ra, são tomadas como objeto de estudo. Associado à ideia de transdução, traz-se o conceito que nomino como potência sígni-ca na passagem dissimétrica entre artes. Projetivamente, trabalha-se a proposta de Louis Khan de “deformações contínuas e projetivas”, com ênfase no nível sintático. Para finalizar, abordar-se a atitude experi-mental enquanto ato em escala natural e como forma de conhecimento.

Depois dessa justificativa inicial, serão apresentados os objetivos, os problemas

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amaifundamentais, as hipóteses, as aborda-

gens, as questões conceituais gerais, os ex-perimentos didáticos com suas estratégias e as conclusões.

OBJETIVOS

O Objetivo geral é analisar e esclarecer as experiências didáticas que, acredito, propõem ações projetivas estimulantes, in-ventivas e singulares através da interação Arte/Arquitetura. Para tanto, o partido é Transdisciplinarizar o Projeto Arquitetônico na troca dinâmica com as Artes, especial-mente as espaciais tridimensionais tem-poralizadas. Nessa direção, fazer todo o percurso de descoberta no Projeto Arquitetônico, inventando-o de forma re-flexiva e não linear, imbricando desenhos, maquetes e execução em escala natural.

PROBLEMAS FUNDAMENTAIS

Existe uma infinidade de problemas, mas o foco do trabalho é uma tentativa de formulação do projeto no ensino e apren-dizado contemporâneo que não parta de respostas predefinidas e sem nenhuma base experimental, parecendo que ideias ou o próprio partido arquitetônico se

apresentam do nada, ou seja, desvincula-dos de um processo de escolha e decisão. Isto leva o aluno ao isolamento e a atitudes apoiadas na crença de uma “magia técnica objetiva” que geraria algo previsível.

Como nos lembrou Corbusier, arquite-tura é invenção. Partindo dessa afirmação, temos que pensar que o projeto como ati-tude de lançar além pode e deve permear interdisciplinarmente várias disciplinas de um curso de arquitetura. O conceito de Projeto pode estar em Plástica, Estruturas, Desenho e outras disciplinas, fazendo enla-ces e radicalizações inter e transdisciplina-res, enquanto o mote pode partir de uma descoberta no cotidiano, uma leitura, uma visada singular ou um campo de interesse recorrente. Assim, as alianças tornam-se mais horizontalizadas e não se restringem a um elenco lógico racional, linear e verti-cal onde as coisas do inventar já estão pre-definidas e posicionadas em alguma parte de alguma estrutura, portanto, fechada em suas significações e usos.

Nesse sentido, propõe-se partir de de-senhos e maquetes encarnados na própria arquitetura em campo ampliado. Assim, eles fazem parte do processo, como tra-balho corriqueiro para refletir e avançar no projeto. Desenhos (gestuais, digitais, 101

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diagramas) e maquetes não apenas repre-sentam espacialmente um programa, mas geram uma forma/programa, são signos da arquitetura. Então podemos pensar que quando se diz que os alunos não sabem de-senhar um projeto, talvez estejam dizendo que eles não sabem projetar.

HIPÓTESES

Partindo das questões acima colocadas, lança-se as seguintes hipóteses para a di-reção de um projetar contemporâneo: (1) É possível a produção de processos proje-tivos amplos e contaminados na busca do singular; (2) O campo expandido entre Arte e Arquitetura abre novas possibilidades in-ventivas, através de apropriação e transfor-mações de processos da arte pela arquitetu-ra e vice-versa, gerando novas arquiteturas e novas formas de arte; (3) Essa troca de referências de processos e procedimentos contemporâneos redireciona o Projeto e a Arquitetura para a noção de evento, onde o tempo propõe-se como duração; (4) A expe-rimentação edificável é fundamental para a reflexão do projeto e formação do arquiteto; (5) Ações desse tipo poderiam diminuir dife-renças qualitativas entre escolas de arquite-tura mais ou menos reconhecidas.

ABORDAGEM

Esse conjunto de hipóteses abordado, aliado a outras atitudes projetivas lançadas na justificativa geral, serão trabalhados na experiência desenvolvida didaticamente nos cursos de Arquitetura que aqui serão apresentados. Um conjunto de abordagens mais gerais e outras mais específicas serão expostas a seguir.

Estudaremos experiências e seus resul-tados no ensino de projeto feitos em diver-sas escolas de Arquitetura, que passaram por mudanças e correções durante esse percurso. Isso porque as experiências didá-ticas têm história, são atos e têm processos abertos e adaptativos. Essas ações serão entendidas e abrigadas nas ideias de: (1) Campo ampliado entre Arte e Arquitetura em suas trocas e trânsitos elípticos; (2) Como lenificação das decisões de projeto através do alongamento das etapas ou o intervalo enquanto temporalização dessas decisões; (3) A partir da construção do pro-jeto arquitetônico em escala natural. Essa abordagem se constituiu durante o proces-so, a partir de uma intenção experimental--reflexiva e através de ações específicas que serão apresentadas e descritas no de-correr do artigo.

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amaiDESENVOLVIMENTO DAS

QUESTÕES CONCEITUAIS

Questões que nasceram na própria con-creção didática e foram adquirindo corpo conceitual e estruturando a prospecção e a ação ao longo do processo experimental.

A DESCOBERTA: O CARÁTER INVESTIGATIVO/EXPERIMENTAL NO PROJETO E A FORMAÇÃO DO ARQUITETO

Na busca de um diálogo com outras pro-postas, o processo encontrado organizado de maneira mais semelhante à minha pro-posta é o de Alfredo Sarkis em seu artigo “La investigación proyectual como forma de conocimiento en arquitectura” (SARQUIS, Jorge, 2002). Nesse trabalho, o autor se pre-ocupa com a transmissão da arquitetura e com sua complexidade contemporânea, propondo as seguintes estratégias para o projeto: 1. Tomar o pré-figurado existente, que leva em conta a teoria e a história; 2. Ações para gerar o novo. Modo de projeta-ções com desenhos, diagramas, maquetes e tudo que for possível; 3. Concreções: a obra em si e reconhecimento do contexto.

Sarquis indica que esses três itens do projeto são realizáveis em três campos de

atuação e que se apresentam de uma ati-tude mais abstrata para a mais concreta: 1. Na formação; 2. Na investigação; 3. Na pro-fissão do arquiteto.

Assim como para Sarquis, tomei a Investigação como foco nos trabalhos de-senvolvidos com os alunos e a conside-rei capaz de gerar novos conhecimentos, novos encantamentos. Investigação que não ignora os outros campos e suas es-pecificidades, porque cada campo gera suas próprias ações e bases projetuais. Entre o projeto Profissional, de Formação e de Investigação, trabalho com algumas etapas.

Primeiro, o centro é na Formação, de onde são retiradas algumas variáveis que facilitam o foco da invenção e da Arte den-tro de uma valorização da estrutura sintá-tica do projeto e do lócus, enquanto site specific. O programa arquitetônico é mini-mizado para ganhar foco e potência.

Em um segundo momento, o foco está no projetar Investigativo, que busca a tro-ca com outras disciplinas por analogia e permeabilidade, que enriquece o campo disciplinar da Arquitetura. As variáveis são controladas, mas a radicalização, escolha e articulação dão-se a partir do repertório do aluno em progresso. Como Sarquis (2002)

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nos lembra, o Investigativo funciona como um elo entre o projeto de formação, mais abstrato, e o profissional, mais concreto. A preocupação maior é no estímulo para gerar o novo e a sua concreção. Esse pro-cesso dentro dos recombinantes arquitetô-nicos é sempre realimentado pela atitude experimental-reflexiva.

Em um terceiro tempo, centro no que Sarquis chama de projeto Profissional, que são os recombinantes produzidos como uma obra de arte arquitetônica a partir das variáveis da realidade. Nesse nível, é pos-sível explorar a forma como alguns traba-lhos de fato dialogam com a sociedade e pressupõe um projeto com todas as suas etapas, como as esculturas da Praça do Jardim Nova Anchieta, outras esculturas que deram origem à Praça da Chácara da Barra, as arquiteturas têxteis que foram ocupadas na APA do bairro Bela Aliança em Campinas-SP. (vide imagens).

Mas para desenvolver essas etapas, pro-ponho, diferentemente de Sarquis, uma experiência arquitetônica em escala real, para assim colocar o aluno frente às neces-sidades de decisões que não são exterio-res às experiências. Assim, além da ênfase no projeto de Investigação, ladeado pelas preocupações de Formação e Profissional,

proponho a edificação como processo de ensino e aprendizado. A proposta se des-dobra da seguinte forma: 1. O estudo his-tórico e conceitual das práticas registradas do campo estendido da Arte e Arquitetura. Os alunos leem textos, veem vídeos, des-cobrem interesses e visitam exposições e arquiteturas; 2. Proponho projetar a partir dessas referências apresentadas, utilizan-do meios disponíveis cruzados: desenhos (gestual e/ou eletrônico) e maquetes (pros-pectiva e retrospectiva); 3. Execução na es-cala real ou 1:1; 4. Reflexão sobre o produ-zido enquanto obra, pós-uso (resistências, proteção, montagem, funções, etc.), reali-mentando o conceito de Projeto.

A QUESTÃO DO CAMPO EXPANDIDO E A TRANSDISCIPLINARIDADE NA ARTE (ESCULTURA, INSTALAÇÕES E AFINS) E NA ARQUITETURA E CIDADE

“A metade, ou mais, dos melhores no-vos trabalhos que se têm produzido nos últimos anos não tem sido nem pintura nem escultura”, disse Donald Judd em 1965 (2006), colocando em crise a estreita disciplinaridade.

Em seu artigo A escultura no Campo ex-pandido, Rosalind Kraus (1978), a partir

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amaido entendimento do que acontece na arte

mundial e especialmente na americana, através principalmente da Minimal Art, pro-põe entender a escultura como um campo expandido, não como uma disciplina autor-referente, mas aberta aos procedimentos e lógicas de outras disciplinas e da cultura.

O artista atua através de vários arranjos, que estão articulados. Uma ação é parâme-tro de outra em outra parte do campo. Do ponto de vista da ideia do artista de múlti-plas artes e ciências, isso nos traz à memó-ria o homem renascentista e as vanguardas da virada do século. Como nos diz Krauss:

[...] a práxis não é definida em relação a um determinado meio de expressão – es-cultura – mas sim em relação a operações dentro de um conjunto de termos cultu-rais para o qual vários meios – fotografia, livros, linhas em paredes, espelhos ou es-cultura propriamente dita – possam ser usados. (KRAUS, Rosalind, p. 93 – 1978)

As artes estão contaminadas, e os artistas funcionam como vírus, contaminando outros meios de expressão e inventando novas for-mas de fazer arte, fotografia ou arquitetura.

Fica fácil de entender que o número de variáveis é enorme e a pressão sobre os

campos disciplinares tem origens diversas. É, portanto, difícil dar conta de todas as vari-áveis e saber quais as que são estruturais ou não, ficando cada vez mais difícil atuar como um classificador. É provável que, em função dessa realidade, a diversidade das concep-ções espaciais seja cada vez mais ampliada.

Pensar assim a arquitetura como um grande campo expandido é ampliar o seu entendimento e suas interfaces com ou-tras artes. O campo expandido reconhece a pluralidade das experiências e afasta-se da disciplina com um único conceito vá-lido, uma forma que permite a contami-nação por outras disciplinas, através de novas abordagens e enriquece os proces-sos e procedimentos, como linguagens da arquitetura. Podendo estar mais próximo de responder às necessidades espaciais de uma sociedade em complexidade crescen-te – sociedade da informação, móvel, ele-trônica e desmaterializada.

DISSIMETRIAS, TRANSDUÇÕES E SINGULARIDADE INVENTIVA

Todo potencial criativo está sempre na mudança de uma linguagem para outra. Possui, assim, vários centros, apresentan-do-se no mínimo como elíptico, ou seja, com

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dois centros articulados. No caso das expe-riências que serão tratadas aqui, o trânsito dos recombinantes escultóricos para os re-combinantes arquitetônicos, sendo que a ideia é mudar a intenção e a base material da disciplina através de procedimentos aná-logos, sem perder a qualidade sígnica.

Para clarear essa questão, recorro a considerações que constam em meu artigo Potência sígnica na passagem dissimétrica entre artes (TAMAI, Sidney, 2012). Assim, procuro responder a questionamentos que podem ser feitos sobre o porquê de eu re-correr aos artistas escultores e não ir direto aos arquitetos.

O trânsito de uma estrutura de uma linguagem (um meio) para outra não é automático. É a transdução, ou uma tra-dução por analogia, como nos diz Gilbert Simondon (2008), que atua como invenção, mudando a base material e os procedi-mentos, mas preservando a potência dos signos. É uma tradução inventiva, onde a invenção se faz no ato de traduzir. A mu-dança de bases resiste, o que obriga a uma reinvenção dos códigos. De acordo com José Pinheiro Neves (2007), essa postura, associada a uma atitude de concretude do objeto técnico, de sua estrutura cons-titutiva – de coerência interna de causas e

efeitos – coloca o objeto em funcionamen-to pleno, com autonomia e abertura em perfeita interação ao contexto das condi-ções específicas.

A resistência na passagem muda a for-ma e potencializa a qualidade do signo. A passagem traz potência, pois é difícil a per-manência compreensível do signo em esta-do de ambiguidade permanente. A transi-ção entre ir e voltar funciona como mola e é potencializada via transdução. Isto obri-ga o autor, o arquiteto, o expectador, a se reposicionar, a deslizar, a mudar de lugar e atitude diante do fato.

Essas colocações apontam que uma boa forma de inventar pode ser encontrada na passagem de uma situação para outra. Portanto, a invenção se dá por certa quali-dade que existe em determinado objeto ou intenção (como um signo). O processo gera potência sígnica na passagem dissimétri-ca entre as artes e meios, via transdução, como base da invenção. Existe dissimetria na ação e reação pragmática entre sujeito e objeto. Essa qualidade no confronto com outra materialidade ou procedimentos se modifica, mantendo sua qualidade sígnica. É uma transdução elíptica, pois é formada por no mínimo dois elementos e, portan-to, dois eixos que se retroalimentam e se

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amaimodificam, com ganhos e perdas, mas na

busca do novo. A potência sígnica, portan-to, se dá na passagem entre artes, proces-sos e procedimentos que nem sempre são de mesma origem, nem simétricas, mas que mantém interfaces transitáveis.

A partir desses princípios, um jeito de provocar esse estado de invenção é prorro-gar o tempo do projetar e valorizar as estru-turas sintáticas a partir de sua concretude. Primeiro lentificando o processo de proje-to e diminuindo os referenciais idealizados que se apresentam de pouca aderência e persistência diante das questões coloca-das. O tempo trata de abrandá-los, mini-mizá-los, abrindo espaço para outros valo-res, como os que o próprio trabalho que o aluno desenvolve lhe coloca. As estruturas sintáticas, de forma, espaço, cor, textura, e todas as coisas que trazem o objeto se iluminam na medida em que se apresenta uma sequência não prevista, que se resolve de maneira não simétrica. O não simétrico é um não esgotamento entre o que o objeto invoca e o que responde o usuário/arquite-to, em uma atitude que impede a sutura e encerramento do objeto. Dessa forma, a relação entre o objeto e o sujeito permane-ce aberta e dinamicamente estável, sendo capaz de invocar outros signos.

A ideia aqui é que um signo gera outros signos em cadeia e que possuem uma cer-ta estabilidade de conjunto, mas que dina-mizam o próprio sentido e a forma de uso do objeto (escultura, arquitetura e outros). O conjunto é suficientemente fluído para se ressignificar continuamente, e se pen-sarmos na estrutura de linguagem e sim-plificando um pouco a questão, estão nos níveis sintático (forma), semântico (função) e pragmático (uso). Essa articulação entre as partes, em campo ampliado, potenciali-zadas pela dissimetria, apresenta o objeto sempre apto e rico na produção de signos. Isto permite a entrada na invenção objeto por vários caminhos.

Para colocar em jogo as questões, as-sim, não há sentido em precipitar ques-tões supostamente complexas aos alunos, principalmente os do primeiro ano, pois na impossibilidade de responder a múlti-plas variáveis, eles acabam adotando um método simplista e preexistente, ou seja, pouco inventivo. O objeto, os materiais, os problemas do mundo contemporâneo não lhes dirão nada, apenas colocarão imagens supostamente arquitetônicas no objeto. Os objetos se fecharão sem bor-das e arestas provocadoras para o público. Enquanto inventor, o aluno se coloca como

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um operador de lógicas quantitativas de caráter redundante e que ignora o valor imaterial da arquitetura.

O ponto distante, mas sempre em foco, é o campo expandido transdisciplinar. As passagens dissimétricas que nele circulam e que resistem à tradução fácil pedem ao inventor que ele se posicione e faça esco-lhas, gerando resultados singulares em au-tores singulares.

O EXPERIMENTAL COMO FORMA DE CONHECIMENTO

Os trabalhos devem ser experimenta-dos sempre o mais próximo do real, da es-cala real, dos materiais reais, da situação real do e no espaço, ou seja, diretamente no tempo do ato construtivo. As lógicas dos mecanismos que funcionam como caixa transparente, visíveis nessas arquiteturas têxteis que são, no caso, tema experimen-tal, pensadas didaticamente, são lúdicas e, portanto, interativas.

Os procedimentos técnicos sempre tra-zem algo mais em si, questões culturais se revelam e podem tornar-se objeto de re-flexão para abrir maiores possibilidades. Na nossa cultura contemporânea, o entor-no do mundo dos objetos funciona como

caixa-preta, e pouco sabemos do seu fun-cionamento técnico e de como suas partes se articulam. Isto gera um esgotamento e exclusão do sujeito, algo percebido na in-tensa massificação das ações lúdicas, in-fantojuvenis (brinquedos que se brincam), com baixa interação construtiva. Notamos que a idealização que possibilitou a expan-são desse mercado está em crise, já não é tão interessante possuir carrinhos e bone-cos automatizados que brincam sozinhos. Os meios eletrônicos altamente interati-vos, como computador, internet, internet das coisas, rede, impressoras 3D, etc., têm outra lógica, que lentamente amplia a ação corporal, indicializando o estar no mundo. De toda maneira, estes últimos dialogam assimetricamente, o que abre espaços para proposições interativas e espaciais em ou-tros campos, como na Arquitetura.

Por esses motivos, foi lançada a pro-posta de experimentar através do projetar e do ato construtivo. Isto implica em um tipo de esforço e de interação lógica com a cultura em um confronto ativo com a re-sistência da matéria e da evidência da coi-sa construída, mesmo que efêmera, para os sentidos. Isto não significa simetrias frias, despotencializadas pela eliminação das diferenças, pelas quais só se produz o

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ganização cria uma barreira entre o que se imagina e o que se propõe a fazer. Cabe ao professor dimensionar o tamanho da bar-reira para não ficar intransponível, mas criar dificuldade para haver recolhimento e reflexão sobre o que fazer. Arriscar-se não é fazer qualquer coisa, “o que deu na cabeça”, mas procurar um caminho que deve estar na relação entre objeto, obje-tivos, inventor e entorno. Essa distância é angustiante, mas fundamenta e centra o aluno inventor para a tomada de decisões e a ruptura de impasses.

O que há de arte e sensibilidade nesse processo é a maneira de organizar e dar materialidade à transparência, à forma de aproximação. Torna-se dispositivo o expe-rimentar: da temperatura do lugar, da luz, das texturas, das superfícies e dos mate-riais e cor. Não se trata de um espaço pre-concebido que simetricamente organiza uma centralidade e produz signagens e sen-tidos ao objeto construído. É o sensível que organiza e dá forma aos materiais, espaço e tempo, qualificando o espaço-tempo, e, assim, torna-os arquitetura, escultura, pintura, cidade, ou algo entre. Há delibera-damente uma certa cegueira inicial onde o imprevisível angustia, mas potencializa.

AS AFINIDADES ENTRE ARTE E ARQUITETURA ATUAL: INDICIAIS, EXPERIMENTAIS, FLEXÍVEIS EM SITE SPECIFIC

Para tratar as afinidades entre arte e arquitetura, retomo que Karl André, nos anos 60, fez o seguinte percurso no tempo: Escultura como forma, escultura como estru-tura e escultura como lugar (In: MARZONA, Daniel – 2004), constatação do trabalho que nos faz lembrar as contextualizações que na Modernidade se apresentam na ar-quitetura de Frank Lloyd Wright, Alvar Aalto e Louis Khan.

As inversões e conversões entre as di-versas formas de arte justificaram a es-colha temática dos exercícios que foram propostos no trabalho aqui analisado, em que foi feita a escolha pela arquitetura têx-til tenso-estrutural, efêmera, leve e flexível (BAHAMÓN, Alejandro – 2004), pois esta po-deria possibilitar que a arte saísse do obje-to autorreferencial para site specific, deslo-cando-se da “arte pela arte” e valorizando o processo, o entorno, os limites da natureza, o local, a cultura, a sociedade, a tecnologia, e, por princípio e fim, o usuário/espectoa-tor. Dessa forma, amplia-se as possibilida-des de a arquitetura adaptar-se a um mun-do mutável, tornando-se uma arquitetura flexível, de permanência transitiva e mais

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adequada a programas flexíveis e abertos que valorizam as relações de indicialidade. Assim, para um mundo mutável temos um programa frágil, e para um programa frá-gil, formas flexíveis e adaptáveis. Isto não é uma regra, mas algo que se dá no espaço de jogo entre esses três elementos.

A indicialidade, o signo que tem uma conexão direta com o objeto, possibilita incluir na arquitetura a capacidade de re-gistrar, absorver em sua forma os rastros humanos. Rastros de história indicial e corporal, que contam as ações e usos pra-ticados. Isto de certa maneira compensa a fragilidade do Programa. Percebemos que, sobre as formas flexíveis, é no nível sintático que ocorrem as relações formais da arquitetura, em que se definem cor, tex-tura, proporção, materialidade, por suas qualidades suficientes para responder e se adaptar ao mundo mutável, como nos apresenta Julia Schulz Dornbung:

El interes se há desplazado de lãs obras autônomas y autoreferenciales a las ins-talaciones site-specific com conceptos que incluyen al público. E arquitectura, los edifícios se han vuelto mais permea-bles y sus programas cada vez más fle-xibles e interactivos. Juntos, El arte y La

arquitectura han pasado de crear objetos fijos para ser admirados a crear ambien-tes para ser experimentados y utilizados (DORNBUNG, Julia Schulz - 2000).

A aproximação entre arte e arquitetura se dá pelos limites que o programa coloca a arquitetura, mas que também está cada vez mais presente via site specific, com a in-clusão dessas variáveis indiciais e tópicas. Assim, a proposta de projetar e edificar as arquiteturas tenso-estruturais se apresen-ta como consequência natural do percurso acadêmico dos últimos anos.

PROCESSOS E EXPERIMENTAÇÕES: Origens e continuidades dos exercícios de projeto

O trabalho experimental reflexivo se-lecionado, tema do artigo, foi desenvolvi-do em duas séries. Primeiro foi a série A, entre os anos 2001 e 2006, que projeta e executa os recombinantes escultóricos na escala real e os recombinantes arquitetô-nicos como maquetes. Posteriormente, a série B, em andamento a partir 2006 em diante (com correções de curso que se

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amaiapresentam), invertida, com projetos e exe-

cução dos recombinantes arquitetônicos têxteis tenso-estruturais em escala real. Foram desenvolvidos em várias discipli-nas em geral do primeiro ano do curso de Arquitetura e Urbanismo, com ênfase em Geometria Descritiva, Plástica e Linguagem Arquitetônica, na PucCampinas, Unicamp, USF (Universidade São Francisco) e mais re-centemente na FAAC/Unesp. Nesse amplo percurso, trabalhei também com outros professores em momentos diferentes, aos quais agradeço as trocas enriquecedoras: Alexandre Suárez de Oliveira, Fábio Muzetti e Fernando Perez.

Por limite de espaço e tempo de apre-sentação da proposta no Congresso Internacional, será mostrada a série A dos recombinantes escultóricos como origem, mas ênfase na série B das arquiteturas ten-so-estruturais, enquanto que os recombi-nantes arquitetônicos experimentados na escala natural. Melhor esclarecendo, nos anos iniciais da proposta, foram projetados e executados os recombinantes escultóri-cos em escala natural e os projetos de um Museu (de variáveis controladas) em escala apropriada, no conjunto gráfico e nas ma-quetes, para receber as esculturas, ante-riormente projetadas, também em escala.

Posteriormente, houve a inversão, e ini-ciou-se com os projetos dos recombinantes escultóricos em escala, e na sequência não mais o espaço do museu, que foi substituí-do por uma arquitetura têxtil de base ten-so-estrutural, efêmera, leve, flexível e que pudesse ser construída na escala 1:1.

Os exercícios que serão apresentados e analisados foram antecipados histori-camente pelo trabalho das “Deformações contínuas e progressivas”, cuja origem ge-nérica está em Louis Khan (KHAN, Louis – 1974) e que antecedeu historicamente o grupo dos recombinantes arquitetônicos de base tenso-estrutural, que é o nosso foco principal. Esse exercício de projeto permitiu entender melhor o processo de invenção a partir de uma premissa icôni-ca e diagramática. A base do trabalho é a deformação contínua e progressiva de po-liedros. Inicialmente, um poliedro, depois dois poliedros (de fora para dentro e de dentro para fora) para perceber estruturas importantes, acasos inventivos e apontá--los com alguma clareza para o ensino e aprendizado.

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Figura 1. Trabalhos de alunos: Deformações contínuas e progressivas. Unicamp/USF (2001 a 2005).

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amaiEsses poliedros com variáveis espaciais

controladas navegam pelo icônico diagra-mático, o icônico como imagem que fun-ciona como um signo aberto e de fácil in-teração horizontal e em infinitas direções.

O diagramático se define como uma pré-forma, capaz de aglutinar e fazer convergir para si problemas de fundamentos espa-ciais. Isto vale tanto para o desenho como também para a maquete prospectiva. É mol-dável, não fixo, adaptável e topologicamen-te mole e líquido. Resumindo, seu espaço é modelável, funciona em aberto, como uma forma à procura do seu destino. Essas carac-terísticas foram incorporadas e migraram re-configuradas para a série A (Recombinantes Escultóricos) e B (Recombinantes Arquitetônicos têxteis tenso-estruturais) através de projetos lentificados, cujo objeti-vo é a promoção da demora para maior ob-servação e reflexão do projetável.

OS RECOMBINANTES ESCULTÓRICOS E ARQUITETÔNICOS: COMBINAR AS SEMELHANÇAS E DIFERENÇAS EM CAMPO CONTÍNUO

Nomeio de Recombinantes essas séries, tanto escultóricos como arquitetônicos, porque recombinar significa repactuar, re-solver como linguagem e/ou arte o conflito

entre duas posições, dois procedimentos ou duas materialidades distintas.

As duas séries apresentadas a se-guir, A (Recombinantes Escultóricos) e B (Recombinantes Arquitetônicos têxteis tenso-estruturais), recorrem a alguns con-ceitos-questões que vêm se mostrando consistentes durante o meu percurso de professor para fundamentar os projetos, a construção e sua reflexão.

A série A, desenvolvida entre os anos de 2001 e 2006, nomeada de Recombinantes Escultóricos, veio na continuidade do tra-balho anterior apresentado e ocorreu como uma passagem heterogênea, por etapas, pois, como professor em diversas faculdades de Arquitetura, foi possível experimentar e mudar os procedimentos e escolhas a partir dos resultados obtidos. Sem esquecer que são exercícios feitos com alunos do primeiro ano e propostos semestralmente em disci-plinas como Geometria Aplicada, Plástica ou Linguagem Arquitetônica, cada uma com car-ga horária de quatro horas-aula por semana.

Nelas se propõe um jogo dinâmico en-tre escultura e arquitetura. As esculturas construídas na escala real, 1:1, são as que possibilitam colocar as questões da tri-dimensionalidade e para dialogar com o público como algo construtível e de fato

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construído. O público a que se destina é o do campus universitário, das praças públi-cas e da cidade (ex: Campinas-SP).

A proposta é a passagem, o trânsito, as sugestões, as analogias e os enlaces pos-síveis entre o espaço escultórico e a arqui-tetura recente, na forma de projeto de um espaço museológico em escala para apre-sentar as esculturas feitas na fase anterior.

AS ETAPAS DE PROJETO: COMO SÃO APRESENTADAS EM AULAS

Estuda-se o espaço e a geometria den-tro de um recorte histórico concreto-cons-trutivista-minimal (do interesse ou foco de cada aluno), portanto, de origem moderna que se abre para novos questionamentos, cuja sequência é:

1. Reconhecer as qualidades físicas materiais (transparência, rigidez, texturas, etc.);

2. Entender os procedimentos sobre os materiais (dobrar, furar, torcer, cortar, etc.);

3. Inventividade articulada como lin-guagem a partir dessas compreen-sões. Qualificar as relações entre características físicas e sua dispo-sição sígnica enquanto linguagens

escultóricas/instalações/interven-ções e arquitetônicas.

São cinco etapas didáticas consequentes:1. Corte com pesquisa por parte dos

alunos sobre o campo concreto-construtivista-minimal (leitura de textos, compreensão e produção de imagens, arquivos de PowerPoint, performances – individual e em gru-po). Dessa forma, visa o reconhe-cimento das qualidades e procedi-mentos da obra do artista.

2. Construção de esculturas desses au-tores/artistas por aproximação das qualidades materiais (em grupo). Visando verificar semelhanças e dife-renças entre os artistas e trabalhos, procurando as estruturas que se re-petem e as que são únicas (típicas e tópicas). Isto resulta na aproximação do material e das lógicas e procedi-mentos espaciais do artista.

3. Construção de releituras individu-ais por parte dos alunos. Processo pessoal, reinterpretações a partir de eixos que tocam de forma ra-dical o aluno. Visa a comparação em relação ao campo estendido e verificar se respondem e dialogam com essa proposta.

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amai4. Construção na escala 1:1 das me-

lhores propostas escultóricas (em grupo). Avaliação das dificuldades entre partido, conjunto gráfico, maquetes e obra executada.

5. Espacialização arquitetônica a par-tir dessas referências (projeto indi-vidual – maquete na primeira fase desse curso, entre 2001 e 2006, e arquitetura construída tenso-es-trutural na segunda fase, de 2006 até o presente). Avaliação das di-ficuldades entre partido, conjunto gráfico, maquetes, materiais, for-mas de agregar, ferramentas, lócus e obra executada.

São pesquisados artistas do campo concreto-construtivista-minimal, com ên-fase nas esculturas que colocam questões da arte concreta, neoconcreta, constru-tiva e minimalista, como, por exemplo, o reconhecimento dos processos e procedi-mentos industriais e as diversas formas de entendê-los. Essa escolha está vinculada a uma base histórica que nos ofereceu o Movimento Concreto brasileiro (na arte, programação visual, design e arquitetura) e ao cruzamento temporal sincrônico e dia-crônico, caracterizado de modo geral por

um processo histórico crescente de desma-terialização, de desobjetificação e quase sempre de escala crescente da obra.

AS CONEXÕES ENTRE OS ARTISTAS: FORMA, ESPAÇO E TEMPO

O grupo de artistas referencial estuda-do levanta questões análogas e similares do espaço, forma e tempo, entre escultura/instalação e arquitetura. Artistas estuda-dos e que exploram de forma mais visível:

• Construção: Vladmir Tatlin, Naum Gabo, Franz Weissmann.

• Geometrias (cartesiana, topolo-gia): Malevitch, Tatlin, El Lissitsky, Theo Van Doesburg, Max Bill, Franz Weissmann, Amilcar de Castro, Lygia Clark, Gordon Matta-Clark.

• Escalas: Alexander Calder, Javacheff Christo, Robert Smithson.

• Interatividade: Lygia Clark, Hélio Oiticica, Jesús R. Soto, Julio Le Parc, Gordon Matta-Clark.

• Cinetismo: Naum Gabo, Abraham Palatnik, Le Parc.

• Cor/Luz e Sombra: Moholy Nagy, Palatinik, Le Parc, Dan Flavin, Hélio Oiticica, James Turrel e Dan Graham. 115

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• Transparência, Opacidade, Refração: Gabo, Kazmer Féjer, Soto, Dan Graham.• Composição/Decomposição: Gabo, Calder, Judd, Serra.• Profundidade/Planura: Soto, Gego, Oiticica, Dan Graham, Gordon Matta-Clark.• Estranhamento: Smithson, Serra, Christo.• Efemeridade (duração): Andy Goldsworthy, Le Parc, Kazmer Féjer.• Desmaterialização: Gego (Gertrud Goldschmidt), Le Parc. Ecologia.• Sustentabilidade: Smithson, Christo, Andy Goldsworthy.

A partir do interesse e escolha dos alunos, processa-se os projetos individuais até a construção em escala natural de projetos escolhidos pelos alunos.

EXEMPLOS DOS PROCESSOS DE PROJETO E DA EDIFICAÇÃO NA ESCALA NATURAL

Figura 2. Série A – Projetos de recombinantes escultóricos individuais por parte dos alunos e construção na escala natural (abaixo).

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Figura 3. Anteprojeto e construção na escala 1:1 das melhores propostas escultóricas (em grupo).

Figura 4. Continuação – construção em escala real 1:1.117

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Figura 5. Recombinantes escultóricos construídos para e com as praças e lugares específicos. Série A (individual – projeto de espacialização arquitetônica e somente construção de maquete na primeira fase desse curso,

considerando o conceito de “deformações contínuas e progressivas” entre 2001 e 2006).

Figura 6. Série B –Espacialização arquitetônica a partir dos recombinantes escultóricos, como projeto expandido e arquitetura têxtil construída como tenso-estruturas. Essa segunda fase teve início em 2006 e está em andamento.

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amaiEssa série só muda o caráter de uma etapa, ao final, ao invés de construirmos o recom-

binante escultórico na escala real (1:1), construímos o recombinante arquitetônico, modi-ficando os materiais e controlando algumas variáveis do programa para focar na questão espaço-temporal. Do ponto de vista do espaço, estabelece-se uma gravidade poderosa como abrigo, que enquanto espaço flexível ampara múltiplas funções. A escolha dos ma-teriais e proposta construtiva tem a finalidade de já no projeto repensar a segmentação espaço-função e a linearidade temporal. A ideia é incentivar propostas com espaços contí-nuos, articulados por fluxos, que convoquem outras temporalidades através da sugestão das ocupações e formalizações do próprio espaço.

Figura 7. Projetos – estudos – arquitetura têxtil tenso-estruturais. USF, PucCampinas.

Os projetos finais são apresentados e há uma discussão geral, e os que mais responde-ram à proposta são valorizados e fotografados. Para finalizar, o projeto deixa de ser indi-vidual e passa a ser em grupo, em que os alunos são estimulados a responder a situações reais: vencer a gravidade com sutileza; linguagem coerente entre as ações dos diversos materiais envolvidos; conexão limpa entre os materiais; facilidade de montagem/desmon-tagem; potencializar a passagem das funções entre os materiais e espaços gerados; pro-teção adequada ao sol, ventos e chuvas razoáveis. Aspectos a serem resolvidos na escala humana e com acessos adequados.

As Figuras 8 a 11 mostra as etapas de construção, edificação e uso.119

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Figura 8. Edificações efêmeras têxteis tenso-estruturais. Puccampinas, USF, FAAC/Unesp.

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Figura 10. Edificações efêmeras têxteis tenso-estruturais. Puccampinas, USF, FAAC/Unesp.

Figura 11. Edificações efêmeras têxteis tenso-estruturais. Puccampinas, USF, FAAC/Unesp.

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RESULTADOS (Em relação aos objetivos e hipóteses)

O entendimento das esculturas e/ou ins-talações traz a preocupações dos artistas selecionados, seja pela transparência, con-textualização, escala, e uma infinidade de elementos propostos. Os temas e elementos produzidos pelos artistas e que aparecem por transdução no projeto arquitetônico possibilitam um resultado sempre singular, pois a quantidade de escolha de procedi-mentos e elementos é quase infinita.

Ênfase nas maquetes com estudos mais indiciais, mais táteis, e um incentivo à pro-dução de diagramas e projeções ortogo-nais para prever o conjunto arquitetônico.

Criação do envolvimento e a apropria-ção do projeto feito por todos do grupo. Através do reconhecimento do trabalho dos outros grupos, minimiza-se a autoria e se abre espaço para tranquila apropriação de habitantes eventuais.

Todo o processo das etapas descritas acima alimenta e qualifica ações futuras de projeto. Ao edificar o projeto, mesmo enquanto processos efêmeros, inventa-se espaços cujas qualidades de superfícies, transparência, articulações, ou seja, quali-dades de linguagem arquitetônicas, atraem

pessoas, usuários eventuais que inventam usos próprios.

Esses resultados confirmam as hipóte-ses de que a articulação entre desenhos, maquetes de estudos e vídeos em diálogo constante com ênfase nas maquetes per-mite, via quantidade e qualidades, saltos na direção de uma arquitetura singular e com processos projetivos singulares.

Os projetos inventivos, a partir de ele-mentos nem sempre visíveis na Arquitetura, permite escolhas únicas. O resultado desse conjunto de atividades não depende muito de um conhecimento anterior profundo e permite um conjunto completo de pesqui-sa, projeção, experimentação e edificação com reflexões. Isto trouxe bons resultados em escolas de arquitetura com propostas e qualidades bastante diferenciadas.

CONCLUSÕES

A partir dos resultados das duas fases, é preciso considerar que os exercícios apre-sentados foram adequados às propostas e que os conceitos propostos geraram inte-resse e desejo com um caráter investiga-tivo, através do encantamento da desco-berta, que possibilita ao estudante estar

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amaino mundo. A questão do campo expandido

em diálogo com o campo escultórico per-mitiu trocas análogas que enriqueceram a linguagem dos projetos arquitetônicos.

Esse conjunto ampliado de campo per-mitiu escolhas singulares e potentes nas obras recombinantes escultóricas e nos recombinantes arquitetônicos. As afini-dades entre produção artística moderna e contemporânea permitiram e abriram caminhos para valorizar os processos e procedimentos inventivos e possibilitaram entender e produzir o projeto em sua expe-riência concreta nas arquiteturas flexíveis, efêmeras, de base têxtil.

A experiência e seus resultados vão de encontro às infinitas perguntas que nos colocamos sobre o ensino/aprendizado de Artes e Arquitetura. Nas experiências apre-sentadas e através de conceitos desenvol-vidos, o aluno é sempre um pesquisador, que pensa, projeta e executa de forma inter e transdisciplinar. De forma participativa, o aluno escolhe e inventa a partir de uma base cultural e, ao mesmo tempo, encon-tra a possibilidade de se referir a campos ampliados, nos quais novos processos e procedimentos lhe permitem entradas criativas na arquitetura ou outras artes espaço-temporais.

Há trocas evidentes nos procedimentos por transdução (tradução tátil e analógica). A questão efêmera e flexível coloca ques-tões de produção de design além do enla-ce com a escultura e afins, que permite al-cançar novos parâmetros e procedimentos inventivos.

A técnica é entendida como produção de linguagem a partir de suas qualidades físicas. Quando seus procedimentos são colocados em conflito, implica em potência por dissimetria, que os tornam capazes de gerar uma continuidade de linguagens po-éticas e, principalmente, de singularidades projetivas. O construir, como experimen-to de um processo, passa a ser entendido pelos alunos como uma dinâmica técnica e também lúdica, capaz de articular todos os participantes em um trabalho de grupo.

Enfim, acredito tratar-se de uma pro-posta que tem vários segmentos em con-tinuidades, cujas partes articuladas trans-disciplinarmente geram novos todos, novas unidades. O que aqui foi apresenta-do de forma sucinta também gera elemen-tos que dão origem a novas interfaces, te-mas e novas variáveis de propostas ainda em progresso.

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REFERÊNCIAS

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DORNBUNG, Julia Schulz. Arte y arquitectura: nuevas afinidades. Barcelona, Editorial Gustavo Gili, 2000.

JUDD, Donald. Objetivos específicos (1965) in: Escritos de Artistas; FERREIRA, Gloria e COTRIN, Cecília (org). Rio de Janeiro. Jorge Zahar Editor, 2006.

KAHN, Louis I. Forma Y Deseñho. Buenos Aires, Ed. Nueva Visión - Buenos Aires, 1974.

KRAUSS, E. Rosalind. A escultura no campo ampliado. Tradução de Elizabeth Carbone Baez. In: Revista Gávea nº.1, Rio de Janeiro, ed. Puc RJ, 1978.

________________. Caminhos da Escultura Moderna. São Paulo, Livraria Martins Fontes Edtora Ltda, 1998.

MARZONA, Daniel. Minimal Art. Editora Taschen, 2004.

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ARTIGOS/TESES

TAMAI, Sidney

------------------“Potencia signica na passagem dissimetrica entre artes” st - : “Potencia signica na passagem dissimetrica entre artes” – Seminário Internacional Arte e Tecnologia – 2011 – UNB.

------------------“A transmissão da arquitetura como campo expandido: invenção e singularidade “ São Paulo: USP - Orientador: Carlos de Oliveira Cesar - Tese de Doutorado, apresentada à Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, FAU-USP, Design e Arquitetura, 2009

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ORIGAMI E DESIGN: ARTE E CIÊNCIA NO

DESENVOLVIMENTO DE PRODUTOS INOVADORES

Thaís Regina Ueno Yamada

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INTRODUÇÃO

O desenvolvimento de novos produtos é impulsionado por interesses de vários setores diferentes. Os consumidores que-rem novidades a preços razoáveis, os ven-dedores buscam vantagens competitivas, os empresários trabalham para que seus investimentos tenham um rápido retorno financeiro, e os engenheiros de produção procuram melhorar e facilitar a fabricação e o transporte de produtos.

Com isso, os designers devem buscar atender todos esses interesses e levar em consideração, no planejamento de novos produtos, mais alguns fatores, tais como aspecto visual e a sua sustentabilidade. Além disso, a inovação, “ingrediente vital para o sucesso dos negócios” (BAXTER, 2003), mostra-se como ingrediente básico para que o consumidor deseje adquirir de-terminado produto em detrimento a outro. Porém, a criação de algo verdadeiramen-te novo exige um exercício de associação, combinação e visão por diferentes ângu-los de algo que já existe, e não uma súbita iluminação.

Além disso, há também a necessidade mercadológica atual de produtos mais le-ves, articuláveis e transformáveis, visto que

o espaço útil das residências da maioria da população brasileira está cada vez menor. Há também uma consciência de que é ne-cessária a racionalização no uso de mate-riais, buscando a facilidade construtiva, de transporte e de montagem. A necessida-de estética também está presente, assim como a versatilidade de formas e a flexibi-lidade funcional dos produtos, a fim de au-mentar a sua vida útil.

Seguindo por esse caminho, designers têm inovado na criação de produtos indus-triais e arquitetônicos através da exploração dos princípios construtivos da técnica orien-tal do origami. O origami é a técnica que utiliza dobras para se chegar a uma figura e possui relações geométricas muito especí-ficas que podem ser aplicadas na transfor-mação de materiais bidimensionais diversos (metal, madeira, plástico e papel) em produ-tos, buscando levar ao máximo a associação e a combinação de elementos.

Levado por essa tendência, Stewart criou o termo origamics, que demonstra a na-tureza interdisciplinar do uso dos prin-cípios do origami aplicados em estudos, tanto em design como em diversas áre-as do conhecimento como matemática, engenharia e biologia (STEWART, 2007).

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a Explorando os princípios básicos cons-trutivos da dobragem, pode-se chegar a produtos criativos, versáteis e articula-dos, além de racionais em termos de uso de materiais e de facilidade de monta-gem e transporte.

Neste artigo, serão abordadas a história e a evolução do origami, suas caracterís-ticas e conceitos básicos que o determi-nam, assim como as possibilidades de aplicação em projetos de engenharia, arquitetura e design, a fim de aproveitar todo o potencial dessa técnica em mate-riais diversos.

EVOLUÇÃO DO ORIGAMI

Origami, também conhecido no Brasil como dobradura, é a tradicional técnica de dobrar papel de maneira sequencial a fim de cria figuras e estruturas diversas. O nome originou-se a partir da fusão do ver-bo oru (dobrar) e da palavra kami (papel) e foi criado em 1880. No mundo, ele também é conhecido como papiroflexia (em caste-lhano), paperfolding (em inglês), faltenpa-pier (em alemão) e pliage (em francês).

Um dos precursores no uso do origa-mi para fins educacionais foi Friedrich

Wilhelm Froebel (1782-1852), que desco-briu o potencial de trabalhar essa técnica de dobra em papel para ensinar conceitos geométricos para crianças, principalmente porque o uso de um material concreto e a sua manipulação proporciona o desenvol-vimento da intuição, do capricho e da me-mória, além de provocar questionamentos e despertar interesse nos estudantes.

No entanto, no início da Era Showa japo-nesa (1926 a 1988), acreditava-se que o ori-gami representava uma forma de alienação e padronização do pensamento, e ele pas-sou a sofrer várias críticas de educadores.

Com isso, o origami passou a ser estu-dado como base para a configuração de novas figuras, no exercício da criatividade. Nos anos 30, Akira Yoshizawa revolucio-nou essa arte, criando milhares de novos modelos e organizando uma simbologia de referência internacional para seu uso. Suas exposições na Holanda, em 1955, e em Nova York, em 1959, marcaram o início da difusão do origami criativo pelo mundo, baseado apenas em dobras (sem cortes), e valorizando a propriedade intelectual de autoria das obras artísticas (KODANSHA, 1983). Tanto que a Bauhaus, famosa escola alemã, utilizou a dobradura como inspira-ção para o desenvolvimento de trabalhos 129

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no campo do desenho industrial e arquite-tura (YIGIT, 2004).

Centros de estudos e organizações na-cionais e internacionais foram fundados em diversos países, como, por exemplo, Estados Unidos, França, Alemanha, Índia, Japão e Israel, e a palavra “origami” tor-nou-se conhecida no mundo todo.

Na década de 1980, esta técnica come-çou a chamar a atenção de cientistas que se perguntavam sobre quais seriam as pos-sibilidades geométricas das construções do origami. A partir daí, muitas respostas foram sendo dadas através de estudos ma-temáticos envolvendo geometria plana e espacial, trigonometria, cálculo e álgebra linear. Um corpo de teoremas e axiomas foi desenvolvido para explicar como obje-tos tridimensionais poderiam ser gerados através da dobra de superfícies planas, dentre eles Axioma de Kawasaki, de Huzita, Teoremas de Maekawa e Modelos de Miura (FEI & SUJAN, 2013).

O estudo científico do origami, atra-vés de observação de suas propriedades matemáticas e computacionais, possibi-lita a sua aplicação no design de projetos e soluções de problemas de engenharia. Com o aumento do número de pesquisas relacionadas à ciência do origami, foram

organizados até agora cinco encontros in-ternacionais propiciando troca de expe-riências. O primeiro ocorreu na Itália em 1989, seguido de um encontro no Japão, dois nos Estados Unidos e o último em Singapura, em 2010. Na edição de 2006, definiu-se o nome International Meeting on Origami in Science, Mathematics, and Education – OSME (Encontro Internacional de Origami em Ciência, Matemática e Educação), onde são apresentados artigos científicos sobre a correlação do origami com design, artes, tecnologia, matemática, educação e computação.

Origamics é o termo criado para classi-ficar produtos industriais e arquitetônicos que consideram conceitos, princípios e técnicas do design do origami na transfor-mação de materiais bidimensionais (metal, madeira, plástico e papel) com técnicas de dobra (STEWART, 2007). Essa denomina-ção foi criada para demonstrar a natureza interdisciplinar do uso do origami e seus princípios em estudos que variam de área de conhecimento como matemática, en-genharia e biologia. Ainda em seu artigo, Stewart comenta a necessidade de econo-mizar espaço, tanto em termos comerciais, de engenharia e de estrutura, e que o ori-gami proporciona a construção de formas

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a elaboradas a partir de simples materiais planos.

Assim, para efeito de organização, Lang (2014) estabeleceu três principais cate-gorias do origami científico, cujos limites não são tão definidos, podendo haver uma tramitação entre uma e outra: origami matemático, origami computacional e ori-gami tecnológico. O origami matemático descreve as leis da matemática presentes na estrutura do origami, enquanto que o computacional se preocupa com algorit-mos e teorias para a resolução de proble-mas em origami. E, finalmente, o origami tecnológico estuda aplicações do origami e seus processos de dobra na solução de problemas de engenharia, design indus-trial, arquitetura e tecnologias em geral. O mesmo autor também elenca três critérios que determinam a presença e utilização do origami em projetos:

• O objeto deve ser fino e feito por folhas/placas, qualquer que seja o material;

• Ele precisa estar plano e deve ser passível de abertura no seu desti-no final (3D);

• Precisa se apresentar em menor tamanho durante o seu transporte.

Analisando todos os elementos estrutu-rais do origami e a sua organização compo-sitiva, Yigit (2004, p.39-40) propôs seis con-ceitos básicos do design do origami:

• Unidade – todas as partes do todo devem trabalhar em harmonia, com coesão e integridade;

• Totalidade – a unidade faz res-saltar que o todo é uma estrutura completa, acabada;

• Simplicidade – ausência de com-plexidade excessiva e adornamen-to, clareza de função, racionaliza-ção de material e de produção;

• Abstração – extração da essência e expressão na forma;

• Flexibilidade – capacidade de adaptação, maleabilidade, transformação;

• Modularidade – uso de módulos básicos para a criação de estrutu-ras complexas.

Esses conceitos básicos são os funda-mentos definidores da estrutura do origa-mi e que devem ser observados ao elabo-rar novos modelos. Assim, os elementos estruturais e compositivos e os conceitos básicos do origami podem ser aplicados na transformação de materiais bidimensionais

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(metal, madeira, plástico e papel), principalmente quando há a necessidade da criação de produtos articulados e racionais em termos de uso de materiais e facilidade de montagem e transporte.

ORIGAMICS NA ENGENHARIA E NA ARQUITETURA

Muitas das aplicações dos princípios do origami na engenharia buscam o desenvolvi-mento de estruturas articuláveis que possam aumentar a resistência do material e melho-rar a absorção de impacto e a eficiência energética.

O modelo de Miura, ou Miura-Ori, foi elaborado pelo cientista japonês Koryo Miura para resolver o problema de compressão de um plano por encurtamento através da aplicação do mínimo de energia. Através de inúmeras pesquisas desenvolvidas a partir dos anos 70, ele finalmente chegou ao padrão transformável simultânea e homogeneamente nas dire-ções ortogonais, que foi aplicado no projeto japonês Space Flyer Unit através do desen-volvimento do painel solar transformável (MIURA, 2009), concluído com sucesso em 1995 (Figura 1). Outras duas pesquisas na área da biologia, como a de Kobayashi et al. (1998) e Mahadevan & Rica (2005), confirmam a hipótese de Miura de que esse padrão exige o míni-mo de energia para sua abertura.

Figura 1. Modelo de Miura e o painel solar dobrável (MIURA, 2009).

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a O padrão de Miura e outros padrões de dobra solucionados para superfícies planas também podem funcionar em superfícies cilíndricas. Um padrão triangular cilíndrico é co-mumente empregado pela indústria japonesa em latas dobráveis, facilitando a dobragem e o descarte para reciclagem, sem ocupar muito espaço, como pode ser visto no trabalho de Han et al. (2004). E de olho no potencial dos cilindros expansíveis através de padrões estruturais do origami, You & Kuribayashi (2009) desenvolveram um origami stent graft (en-doprótese autoexpansível) tanto para desbloquear alguma veia ou artéria humana quanto para isolar um aneurisma existente (Figura 2).

Figura 2. Endoprótese fechada e aberta (YOU & KURIBAYASHI, 2009).

Outros exemplos de aplicação dos princípios do origami na engenharia são: o telescó-pio espacial expansível – projeto da Lawrence Livermore National Laboratory –, cuja ideia principal é a facilidade de transporte no foguete pelo tamanho reduzido e abertura pos-terior no espaço, alcançando seu maior diâmetro possível (LANG, 2004); e o software de simulação de abertura de air-bags de Hoffman, que evita maiores custos nos testes físicos desse tipo de equipamento, melhorando seu desempenho a partir do desenvolvimento de sistema de dobragem e abertura mais eficientes (CIPRA, 2001).

Na arquitetura, o origami pode ser aplicado em projetos de coberturas e fachadas, visan-do maior apelo visual e maior facilidade construtiva. Também está presente em estruturas

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transformáveis, explorando alterações de formato para resolver problemas de transporte, montagem, conforto térmico e acústico, além de aumentar a flexibilidade de uso.

O projeto da fachada da Kiefer Technic Showroom, Áustria, da Ernst Giselbrecht + Partner (2007), procura controlar a entrada de luz através do sistema automático de po-sicionamento de seus painéis metálicos articulados, tornando também possível a criação de várias composições da mesma fachada, atribuindo dinamismo a esse elemento arqui-tetônico (Figura 3).

Figura 3. Kiefer Technic Showroom e algumas configurações da sua fachada (ERNST GISELBRECHT + PARTNER, 2007).

O origami também está presente em estruturas como abrigos emergenciais e constru-ções temporárias, pois alia a facilidade de transporte da estrutura “dobrada” com a fa-cilidade de montagem. Um bom exemplo é o Global Village Shelters (2013), com abrigos temporários de 6m2 e 20m2 feitos de polipropileno e que são disponibilizados dobrados em pequenos pacotes. O menor pode ser montado por dois adultos em menos de 20 minutos (Figura 4), e o maior, em uma hora. Os dois abrigos vêm com portas, janelas e cobertura, são leves (o menor tem 77 kg e o maior 236 kg), e apresentam durabilidade de cerca de cinco anos.

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Figura 4. Montagem da casa de 6m2 da Global Village Shelters (2013).

disso, têm um forte apelo visual e buscam a inovação através da multiplicidade de configurações.

Nesta seção, empregou-se o termo “produtos origâmicos” para definir aque-les que foram projetados considerando os conceitos básicos do design do origami na transformação de materiais bidimensionais diversos (metal, plástico, papel, madeira, bambu) em tridimensionais através do uso de curvaturas, cortes e dobras. Serão apre-sentados a seguir alguns exemplos.

PRODUTOS GRÁFICOS ORIGÂMICOS

Uma das aplicações mais comuns do origami é na área de design gráfico, vis-to que o material (papel) é seu principal

ORIGAMICS E DESIGN

Segundo Yigit (2004), ao dobrar ou cur-var uma folha de qualquer material, é pos-sível chegar a formas e estruturas muito interessantes, que preservam a sua elastici-dade e apresentam uma riqueza de funcio-nalidades com baixos custos de produção. Assim, o emprego do origami no design de um produto pode resolver problemas relacionados à racionalização no uso de material, na facilidade de fabricação (por conta da modularidade), de transporte e de armazenamento. Isto porque os produ-tos com origami em seu conceito buscam a economia de espaço, já que são transfor-máveis, e potencializam o uso pela flexibili-zação e versatilidade de suas formas. Além 135

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componente. Há muitos exemplos de aplicação como cartões comemorativos e materiais promocionais, como calendários, convites, malas diretas, etc. (Figura 5).

Figura 5. Tsucasa Calendar, do designer Noriaki Hayashi (KOZAK & WIEDERMANN, 2006).

As embalagens de presentes e de produtos industriais também empregam os conceitos do origami em seus sistemas de abertura e fechamento e no acondicionamento de produ-tos em seu interior. Mathias Van de Walle (2014), designer holandês, buscando um design ultra-simples e eficiente e se inspirando no origami, projetou um recipiente para espuman-te, que ao ser desdobrado abriga a garrafa juntamente com gelo e água (Figura 6).

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Figura 6. Clicq’Up, 2011. Balde dobrável para champagne da Veuve Clicquot (WALLE, 2014).

Em projetos de livros, especialmente os infantis, a estrutura do origami baseada no po-p-up ou kirigami 3D (uma variação do origami, pois contém cortes) é frequentemente em-pregada para fazer com que a criança manipule o livro de maneira que ela sinta que está brincando enquanto lê. Pode-se encontrar livros que trabalham com a ideia do kirigami tri-dimensional em 90o, onde o próprio papel se transforma em figuras distribuídas em vários planos e há um completo aproveitamento do material, sem desperdícios, ou há também aqueles que aplicam a geometria do kirigami 3D de abertura em 180o ou 360o, com o uso de várias camadas de papel intercaladas e sobrepostas que “levantam” a figura à medida que as folhas são abertas (Figura 7).

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Figura 7. Exemplos de kirigami 3D de 90o (CHATANI, 1983) e 180o (CHATANI & NAKAZAWA, 1994).

A produção gráfica de projetos que utilizam o origami como estratégia construtiva ne-cessita de um bom planejamento gráfico da ideia, das cores, do tipo de papel, do tipo de impressão e do acabamento e é semi-industrial, já que pode contar com todo o processo em maquinário específico, mas o acabamento das dobras ainda precisa ser feito manual-mente, um fator que pode aumentar os custos da peça.

No entanto, os clientes que requisitam ou aceitam esse tipo de fator de inovação bus-cam a originalidade e a criatividade como forma de atingir seus públicos, uma forma di-ferenciada de divulgação de seus produtos ou de uma mensagem, e sabem que a peça produzida com a técnica do origami irá surpreender as pessoas. Dessa forma, a fixação do produto no mercado será mais forte e pode durar mais tempo.

PRODUTOS INDUSTRIAIS ORIGÂMICOS

A partir de uma folha de material que mescla telas de policarbonato e poliéster, James Dieter projetou a Origami Chair (Figura 8), que se transforma em uma estrutura tridimen-sional, por meio de dobras, e é forte o suficiente para suportar o peso de um adulto.

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Figura 8. Origami Chair e suas etapas de montagem (DIETER, 2003).

Aqui, o designer Mathias van de Walle surge novamente com alguns produtos indus-triais origâmicos (Figura 9), como a mesa Fix (feita de uma placa de alumínio fina de 15 mm de espessura), o porta-objetos Crab (também de alumínio) e a luminária Bobonne (com-posta por uma circunferência de tecido com marcas de vinco e clipes para o usuário fixá-la como desejar).

Figura 9. Projetos Fix, Crab e Bobonne, respectivamente (WALLE, 2014).

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O banco em bambu laminado colado elaborado por Kimpara (2008) atua como mobiliá-rio urbano e foi especialmente projetado para ser utilizado na região da Liberdade, em São Paulo (Figura 10). Devido à alta concentração de imigrantes e descendentes de japoneses, a designer utilizou o origami na configuração de sua forma como identificação cultural com a região. Ela também observou que a simetria trazia mais proximidade com o origami e conferia mais equilíbrio para a estrutura.

Figura 10. Banco em BLaC com influência do origami em sua estrutura (KIMPARA, 2008).

O origami também pode ser usado em estruturas articuláveis, que se transformam do bidimensional para o tridimensional, resolvendo questões como eficiência do espaço e portabilidade. O banco 63 graus, dos alemães Barkschat, Blümel e Arnold (IPPINKA, 2012), alia a simplicidade dos módulos e das conexões para possibilitar que o produto se dobre em fechamento (Figura 11).

Figura 11. Banco aberto e fechado, com o detalhe da sua articulação (IPPINKA, 2012).

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a A Figura 12 mostra a mesa retrátil de parede em bambu da Union Elemental, de Bogotá, e a cadeira dobrável de compensado de bambu da Monstrans, que possibilitam que o pro-duto economize espaço quando não for usado.

Figura 12. Mesa retrátil à esquerda (ALVARADO, 2009) e cadeira dobrável à direita (MONSTRANS, 2012).

Além desses exemplos, há ainda a possibilidade apontada por Nojima Taketoshi, pes-quisador da Universidade de Kyoto, de que o origami pode ser um excelente recurso para se pensar em outros projetos que necessitem da dobra e da desdobra instantânea, como garrafas plásticas, latas e outros recipientes, materiais de construção, equipamentos mé-dicos e outros produtos usados em emergências e resgates (HAGIWARA, 2008).

CONCLUSÃO

Um longo caminho foi percorrido pelo origami desde seus primeiros modelos tradicio-nais até a atualidade. Inicialmente considerado como um artesanato ou recurso recreativo, o origami se renovou e se transformou em um meio de intersecção entre a arte e a ciência, a natureza e a geometria, o emocional e o racional, o simples e o complexo.

O estudo aprofundado da matemática implícita no origami possibilitou sua aplicação em diferentes áreas do conhecimento: educação, arte, engenharia, arquitetura e design.

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Há, portanto, um grande campo a ser ex-plorado pelo estudo do origami científico, desde produtos nanotecnológicos voltados às áreas da saúde aos grandes projetos lan-çados ao universo.

Os estudos e projetos apresentados neste artigo indicam que a boa forma e a estética das estruturas em origami confe-rem um maior apelo visual. Sua geometria, baseada na organização racional de seus módulos compositivos, aumenta a resis-tência do material, melhora a absorção de impacto e a eficiência energética, além de proporcionar maior facilidade construtiva.

Além disso, essas estruturas atendem necessidades produtivas atuais de transpor-te, armazenamento e montagem. Oferecem também maior flexibilidade e versatilida-de de uso, assim como conforto térmico e acústico. Ou seja, o estudo e a aplicação do origami em projetos físicos aliam boa forma, racionalização dos materiais e dos proces-sos de fabricação utilizados e resolução de problemas que necessitam de transforma-ção de materiais 2D para 3D, e vice-versa.

Os projetos apresentados neste artigo são apenas alguns exemplos do que vem sendo desenvolvido nos últimos anos por designers, arquitetos e engenheiros inspi-rados pela técnica oriental do origami, a

fim de inovar em seus produtos e satisfazer as necessidades do consumidor. Na busca pelo novo, promove também a interativida-de do público com o projeto e a facilidade de composição através da modularidade e articulação das formas. Portanto, o origa-mics apresenta uma grande potencialidade no desenvolvimento de novos produtos, por estar presente na determinação de suas bases conceituais, no processo de de-terminação da forma e nas técnicas neces-sárias para sua fabricação.

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LETRAMENTO ESPACIAL E GEOMETRIA DESCRITIVA

Vânia Cristina Pires Nogueira Valente

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Habilidade Espacial

Desde os primórdios da humanidade, a habilidade espacial se mostrou presente e ne-cessária. Entre outras conexões cognitivas, ela possibilitava ao homem voltar à sua caver-na depois de um dia de caça. A escuridão da noite e a semelhança das entradas nas pedras impeliam o refinamento dessa espacialidade no ser humano.

Os termos “habilidade espacial”, “habilidade de visão espacial”, “visão espacial”, “apti-dão espacial” e “pensamento espacial”, entre outros, são utilizados para definir as mesmas funções cognitivas. De acordo com Thurstone (1997), habilidade espacial é a capacidade para imaginar e conceber objetos em duas ou três dimensões.

McGee (1979) definiu a habilidade espacial como “a capacidade de manipular, girar, tor-cer, ou inverter mentalmente um objeto ou estímulo pictoricamente representado”. Em sua pesquisa, afirmou ainda que “uma infinidade de estudos analíticos desde 1930 apoia-ram de forma consistente a existência de pelo menos duas capacidades espaciais distin-tas: visualização e orientação”. Para Newcombe (2010), a habilidade espacial é utilizada na localização de objetos, na identificação de suas formas, nas relações entre elas e nas trajetórias que traçam quando se movem. Ela considera que todos utilizam essa habili-dade diariamente em situações corriqueiras, como rearranjar a mobília em um cômodo, montar uma estante seguindo as instruções de um esquema ou seguir um mapa para se localizar. Lohman (1979) estabeleceu ainda que essa habilidade é composta por três fato-res principais (relações, orientação e visualização) e quatro fatores menores: velocidade de aproximação, velocidade perceptual, memória visual e cinestésico. Eles estão descritos na 4. Segurança1.

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eTabela 1. Componentes da Habilidade Espacial.

Fator Descrição

Relações Espaciais Capacidade de realizar rotações de um objeto mentalmente e de resolver problemas espaciais.

Orientação Espacial Capacidade de imaginar um objeto por um outro ponto de vista diferente do ângulo observado.

Visualização Espacial Habilidade de resolver mentalmente tarefas de movimentação ou deslo-camento de partes de uma imagem.

Velocidade de Aproximação Velocidade de combinar estímulos visuais incompletos com suas repre-sentações da memória de longo prazo.

Velocidade Perceptual Velocidade de combinar estímulos visuais.

Memória Visual Memória de estímulos visuais de curto prazo.

Cinestésico Velocidade de fazer discriminação esquerda-direita

Fonte: Adaptação de Lohman (1979).

Com o surgimento da meta-análise, vá-rias pesquisas dessa área foram resgatadas e analisadas conjuntamente.

Meta-análise consiste em colocar dife-rentes estudos juntos em um mesmo banco de dados e utilizar metodologias analíticas e estatísticas para explicar a variância dos resultados utilizando fa-tores comuns aos estudos. (ROSCOE; JENKINS, 2005).

A pesquisa de Lohman (1979), poste-riormente meta-analisada com a de Carroll (1993), aponta que “a Habilidade Espacial pode ser definida como a capacidade para

gerar, manter, recuperar e transformar ima-gens visuais bem estruturados. Não é uma construção unitária. Existem, de fato, várias habilidades espaciais, cada uma delas des-tacando os diferentes aspectos do processo de imagem”. Carroll (1993) definiu habilida-de espacial como a destreza na formação in-terna de representações mentais de padrões visuais e no uso de tais representações para a resolução de problemas espaciais.

Linn e Peterson (1985) realizaram estu-dos através de meta-análise das pesquisas realizadas entre 1974 e 1982 sobre habilida-de de visualização espacial e sintetizaram-na como a habilidade de transformar, girar, e recordar informações simbólicas não

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linguísticas. Foi definido então que a habi-lidade espacial consiste de rotação mental, percepção espacial e visualização espacial.

Os mapas tradicionais, assim como os projetos de Engenharia, Arquitetura ou Design, são representações bidimensionais do espaço tridimensional, e a sua leitura requer um grande desenvolvimento de competências espaciais, pois, desde o nas-cimento, a habilidade espacial é desenvol-vida imersa na tridimensionalidade.

A interpretação de um mapa requer transformar informações bidimensionais em tridimensionais para que os símbolos diagramados façam sentido no ambiente real. A Figura 1 ilustra o processo de con-versão de 2D para 3D.

Figura 1. Conversão de 2D para 3D.

Fonte: Autoria própria.

O desenvolvimento da competência para a realização da operação inversa, ou seja, transformar informações tridimensio-nais em bidimensionais, iniciam-se na in-fância com os desenhos, na tentativa de re-produzir pensamentos ou a realidade que se conhece. A Figura 2 ilustra o processo de conversão de 3D para 2D.

Figura 2. Conversão de 3D para 2D.Fonte: Autoria própria

A representação bidimensional de um objeto tridimensional se chama projeção, e o conhecimentos de técnicas para traçá--la é fundamental para os profissionais que trabalham com projetos e representação gráfica.

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Medição da Habilidade Espacial

Desde o início das pesquisas sobre ha-bilidade espacial, vários testes foram de-senvolvidos com o objetivo de mensurá-la, alguns deles estão elencados na Figura 3. Guitarra, 1913. Pintura e Colagem de 1913, elaborada com jornal recortado, partitu-ras e papel de parede imitando madeira.2. Esses instrumentos de avaliação permi-tem medir os componentes cognitivos da habilidade espacial e indicar aqueles que se diferenciam com maior intensidade nos homens e nas mulheres. Segundo Lohman (1993), a habilidade espacial tem sido me-dida por meio de quatro tipos diferentes de testes:

• De desempenho: manipulação de blocos tridimensionais, quebra-ca-beças e dobraduras de papel;

• Com papel e lápis;• Verbais, nos quais um problema é

exposto oralmente e a resposta de-penderá da construção mental de imagens;

• Baseados em animações ou movi-mentos dinâmicos realizados com ferramentas computacionais.

Os testes para a medição dos compo-nentes da habilidade espacial são aplica-dos basicamente com dois propósitos:

• Para aferir as habilidades cogniti-vas – aplicados uma vez.

• Para aferir o desenvolvimento das habilidades cognitivas antes e após uma atividade programada (curso, treinamento ou outro pro-grama pedagógico) – são aplicados duas vezes na forma de pré-teste e pós-teste.

A avaliação das respostas, além dos acertos, geralmente considera também a velocidade de execução dos testes. De acordo com Seabra (2009), indivíduos com baixa habilidade espacial repetem o processo de rotação mais vezes do que o necessário, pois se esquecem de deter-minadas representações intermediárias. Segundo Newcombe (2010), a velocidade com a qual tarefas que requerem essa ha-bilidade são realizadas pode ser um pa-râmetro para indicar a diferença de seu desenvolvimento.

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Tabela 2. Testes para Avaliação de Habilidade Espacial.

Teste Sigla Autor Descrição

Mental Cutting Test MCT CEEB, 1939 Deve ser determinada a secção de um objeto.

Rod-and-frame test RFT Witkin, 1948 A barra deve ser ajustada para ser repre-sentada na vertical.

The Water Level Test WLT Piaget, 1956 Deve-se determinar qual é a inclinação correta do nível do líquido.

Spatial Relation Subset of Primary Mental Abilities Test

PMASR Thurstone, 1958 Deve ser realizada a rotação mental de objetos bidimensionais.

Differential Aptitude Test DATSR Bennett, 1973 A partir do desdobramento de um sólido (figura plana), deve-se encontrar seu só-lido correspondente.

Cards Rotation Test CRT Ekstrom, 1976 Deve-se realizar a rotação de objetos bidimensionais.

Mental Rotation Test MRT Vandenberg, 1978 Deve-se realizar a rotação de objetos tridimensionais.

Purdue Spatial Visualization Test

PSVT-R Guay, 1977 Criado para medir a capacidade de visu-alizar rotações no espaço.

Three-Dimensional Cube Test 3DC Gittler, 1998 Comparação de cubos racionados.

Test de Visualización TVZ Velasco,2002

Desdobramento de um cubo. Deve ser encontrado o elemento para preencher o local indicado com “?”.

Fonte: Autoria própria.

Descrição das Formas com Precisão

Quando são mencionadas as palavras “engenheiro”, “arquiteto” e “designer”, logo vem à mente a palavra “projeto”. Essa associação faz-se em função da linguagem gráfica utili-zada por esses profissionais para transmitir suas ideias e se comunicar com os executores de suas obras ou produtos.

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eTodo e qualquer projeto de Engenharia, Arquitetura ou Desenho Industrial precisa ser desenhado antes de cons-truído. Esse desenho é o diálogo en-tre quem projeta e quem executa. (PEREIRA, 2001).

O desenvolvimento de técnicas de repre-sentação gráfica, não só do ponto de vista prático, como também do ponto de vista instrumental, evoluiu com a humanidade desde a Pré-História. Um marco importan-te foi o desenvolvimento da perspectiva7. O pequeno conhecimento do mundo antigo da real profundidade dos objetos em pintu-ras, apesar de uma rude ilusão tridimensio-nal, foi algumas vezes sugerido em cenas apenas pela disposição de figuras umas em frente às outras. Os romanos alcançaram um entendimento parcial da convergência de linhas paralelas, mas nunca desenvolve-ram a ideia de pontos de fuga.

A história universal das artes visuais é o vasto campo de aplicação de todos os ti-pos de perspectiva. Todas elas têm seus fundamentos racionais, embora algumas não sejam modelos exemplares. Mas to-das estão intimamente ligadas ao esfor-ço dos homens no sentido de descrever,

7. Desenho com o pro-pósito de representações tridimensionais a partir de um determinado ponto de vista. Os ob-jetos representados em perspectivas sofrem distorções angulares e

inventar e compreender seu universo. (FLOCON, 1967)

Estudos sistematizados da perspectiva surgiram a partir da Renascença Italiana, no século XV. A Figura 3 ilustra projetos de Leonardo da Vinci para bombear água, ela-borados nesse período.

Figura 3. Desenho de bombas de água.Fonte: Leonardo Da Vinci (século XV).

A Gravura de Albrecht Dürer (1525), ilus-trada na Figura 4, representa um artista utilizando um aparato desenvolvido para se registrar ponto a ponto um objeto a ser representado em perspectiva.

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A Figura 5 ilustra a obra Rafael Sanzio intitula-da A Escola de Atenas e desenvolvida entre 1509-1510. Ela é um exemplo de perspectiva exata por ter sido elaborada para criar a ilusão do espaço tri-dimensional. A intenção foi transmitir a noção de que uma pintura plana é como uma janela através da qual se pode observar uma cena. Nesse caso, todas as linhas perpendiculares ao plano da janela convergem para um ponto, conhecido como ponto de fuga, na linha do horizonte.

Figura 5. A Escola de Atenas.Fonte: Pintura de Raphael (1509-1510).

Figura 4. Homem desenhando um alaúde.Fonte: Gravura de Albrecht Dürer (1525).

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eApesar de facilitar a visualização das formas, essa técnica não é suficiente para a elabo-ração de projetos, pois a verdadeira grandeza (VG), ou seja, as dimensões reais dos objetos e o posicionamento relacional de seus componentes, não são explicitados, e para que a comunicação gráfica seja eficiente, a representação deve ser precisa.

Os projetos são representações de objetos tridimensionais em uma superfície plana de modo que demonstrem sua forma de maneira clara, inequívoca e com exatidão.

Foi somente em fins do século XVIII, com a sistematização da Geometria Descritiva por Gaspard Monge (1746-1818), da Ècole Polytechnique de Paris, que o problema de descrição da forma e das dimensões reais dos objetos ficou claramente resolvido. Esse fato forneceu às técnicas de desenho o ferramental necessário para transformá-lo na linguagem gráfica dos projetos da Era Industrial que começava a nascer.

O livro Geometria Descritiva, redigido por Gaspard Monge em 1811 para apoiar sua dis-ciplina, apresenta técnicas para representação de objetos tridimensionais em duas dimen-sões. A Figura 6 ilustra a página de rosto e uma página de exercício com uma projeção em épura8 obtida pelo seccionamento de um cone por um plano oblíquo.

Figura 6. Página de rosto e exercício do livro Geometria Descritiva, de Gaspard Monge – 1811.Fonte: http://www.maa.org/press/periodicals/convergence/mathematical-treasures-gaspard-monges-descriptive-geometry

8. Épura é a represen-tação bidimensional de dois planos divididos por uma linha (Linha de Terra). Acima dessa linha é representada a projeção do Plano Vertical (PV), e abaixo, a projeção do Plano Horizontal (PH).

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No século XIX, com o surgimento de várias escolas de Engenharia Civil, a Geometria Descritiva (GD) passou a ser dis-ciplina obrigatória em seus cursos. Marmo (1974) recomenda a utilização de méto-dos de GD para resolver os problemas de representação.

A Geometria Descritiva é o meio mais satisfatório para estabelecer um ‘diálogo gráfico’ entre um projetista e um exe-cutor de obras técnicas, permitindo ao primeiro transmitir e ao segundo cap-tar as ideias sobre FORMA, TAMANHO e POSIÇÃO das referidas obras; sem essa ‘linguagem gráfica’, seria impraticável o exercício da Engenharia e Arquitetura” (MARMO, 1974).

Atualmente, a Geometria Descritiva consta da grade curricular dos cursos uni-versitários de Engenharia, Arquitetura e Design e é ministrada com o objetivo de fornecer os subsídios necessários para a re-presentação de objetos tridimensionais e a interpretação de projetos que utilizam essa linguagem.

Letramento Espacial e Geometria Descritiva

A palavra “letramento” remete à ideia de alfabetização, ou ainda ao ato pedagógico de promover o desenvolvimento da habili-dade ler e escrever. Atualmente, esse termo também descreve o desenvolvimento de competências. De acordo com o relatório da UNESCO (2006), a palavra “letramento” passou a ser utilizada com um sentido mui-to mais amplo e metafórico para se referir ao desenvolvimento de outras habilidades e competências, por exemplo “Letramento da Informação”, “Letramento Visual”, “Letramento em Mídia” e “Letramento Científico”.

Um grande questionamento nos primór-dios das pesquisas em habilidade espacial foi sobre sua condição. Essa habilidade é inata, ou seja, inerente ao ser humano des-de o seu nascimento ou ela pode ser apri-morada durante a existência humana?

Bertoline (1988) sugeriu que a habili-dade espacial é desenvolvida por meio de experiências de vida. Ele pontuou que as crianças expostas a ambientes de aprendi-zagem adequados possuem essa habilida-de mais forte posteriormente. Harle (2010) segue a linha de pensamento de Bertoline

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e(1988) e complementa que a habilidade es-pacial pode ser melhorada.

Grande parte da literatura mostra que a habilidade espacial se desenvolve ao lon-go do tempo de vida de uma pessoa, e que as intervenções podem melhorar a capacidade espacial. (HARLE, 2010).

Inúmeras pesquisas demonstram o sucesso de intervenções para o desenvol-vimento da habilidade espacial, dente al-gumas já referenciadas neste texto estão Prieto (1993), Vasta (1996), Leopold (1996), Gorska (1998), Medina (1998), Newcombe (2002) e Lippa (2010).

O progresso cognitivo dos sujeitos partici-pantes das pesquisas citadas foi comprovado por meio da comparação dos resultados do pré-teste, realizado antes das atividades pro-gramadas, com o pós-teste, aplicado depois delas. Isto posto, é consenso no meio acadê-mico, das mais variadas instâncias e graus, que o pensamento espacial pode ser desen-volvido e deve ser promovido em todos os níveis do sistema de educação.

Pesquisadores têm apontado diversas ações formativas para melhorar a habilida-de espacial. Sorby (1999) elenca algumas delas:

1) Jogar com brinquedos de construção;

2) Participar de aulas de desenho ou mecânica;

3) Jogar games tridimensionais em computador;

4) Praticar alguns tipos de esportes; e 5) Ter bem desenvolvidas as habilida-

des matemáticas.

Alguns programas de estudo com o ob-jetivo de potencializar a habilidade espa-cial, principalmente os inseridos nos cursos de Cartografia, Geografia e Geologia, têm aplicado treinamento utilizando os seguin-tes recursos:

1) Leitura de mapas; 2) Equipamentos GPS9 (Global

Positioning System, ou Sistema de Posicionamento Global);

3) Softwares GIS10 (Geographic Information System, ou Sistemas de Informação Geográfica); e

4) Sistemas de Geoprocessamento, como o Google Earth11.

9. Aparelhos que se co-municam com satélites, fornecem a localização em latitude e longitude e fornecem dados para aplicativos de mapas, esportes, laser, etc.

10. De acordo com a Universidade de Edimburgo, na Escócia, GIS é “um sistema informatizado para cap-tura, armazenamento, verificação, integração, manipulação, análise e visualização de dados relacionados a posições na superfície terrestre”.

11. https://www.google.com/earth/.

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Ensino de GD no Curso de Design da FAAC/Unesp

A Disciplina Desenho II do Curso de Design da FAAC/Unesp tem como con-teúdo principal a Geometria Descritiva. Essa disciplina é iniciada com os concei-tos de Projeção, em seguida apresenta os Sistemas Cônico e Cilíndrico de Projeção e, em sequência, aborda o Sistema Cilíndrico de Projeção de forma mais detalhada, por ser este o sistema utilizado na Geometria Descritiva.

Os livros de Geometria Descritiva tra-zem, de maneira geral, como primeiro tópi-co a classificação das Projeções, em segui-da os Sistemas de Projeção e as Operações Projetivas. Depois, desenvolvem o estudo do ponto, da reta e do plano, nessa ordem. Esses livros apresentam as figuras geo-métricas planas e os sólidos geométricos apenas nos capítulos finais. No entanto, observa-se em sala de aula, ao explicar os Sistemas de Projeções, que o aluno conse-gue visualizá-los melhor quando toma-se como exemplo um modelo de sólido geo-métrico, ou um objeto real de seu cotidiano.

Nos cursos de GD, a prática necessa-riamente mescla-se à teoria. Em conjun-to, elas fornecem aos alunos conceitos,

teoremas, definições, notações e procedi-mentos que propiciam a aquisição de habi-lidades de concepção e representação grá-fica. A prática é que possibilita aos alunos a construção, solidificação e fixação do seu conhecimento em GD. Sendo assim, para que os alunos adquiram a capacidade de-sejada, uma das metodologias mais utiliza-das nos cursos de GD tem sido a Resolução de Problemas.

Durante a Disciplina de Desenho II, os alunos se deparam com problemas de re-presentação de objetos individuais em perspectivas e épuras, representação de composições tridimensionais com inter-secção e seccionamento dos mesmos, e a disciplina culmina com o desenvolvimento de projetos de objetos com vários sólidos e as planificações que permitiram a sua montagem.

A O Paper Craft, ou seja, objeto tridi-mensional de papel, solicitado como traba-lho deveria ser composto por, no mínimo, 5 módulos (sólidos), sendo pelo menos 3 diferentes e um deles deveria ser uma pirâmide seccionada por um plano notá-vel.7 apresenta o trabalho do aluno Willian Pieroni de Souza, da turma de Desenho II de 2015. A foto mostra um relógio elabora-do com cinco módulos sobrepostos e o seu

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projeto com as planificações de cada módulo. Este foi apenas um dos inúmeros problemas que os alu-nos precisaram resolver durante essa disciplina.

O Paper Craft, ou seja, objeto tridimensional de papel, solicitado como trabalho deveria ser com-posto por, no mínimo, 5 módulos (sólidos), sendo pelo menos 3 diferentes e um deles deveria ser uma pirâmide seccionada por um plano notável.

O aluno deveria elaborar as planificações dos elementos do objeto que permitissem sua mon-tagem e a épura com a pirâmide seccionada para encontrar a VG da secção.

No Curso de Design da Faculdade de Arquitetura Artes e Comunicação da Unesp, a habilidade espa-cial é promovida utilizando os sólidos geométricos desde as primeiras aulas. Para os alunos é mais plausível visualizar objetos e compreender suas projeções do que visualizar entes primitivos (pon-to, reta ou plano). Ao realizar as projeções ape-nas com os primitivos geométricos, a dificuldade aumenta consideravelmente, pois os alunos não alcançam a abstração necessária para o entendi-mento. Quando a proposta apresentada é inversa, ou seja, tem-se a projeção no plano e o aluno ne-cessita visualizar o objeto no espaço, as dificulda-des se acentuam.

A grande preocupação do docente nessa dis-ciplina é administrar seu conteúdo de forma que, logo no início do curso, o aluno aprimore sua habilidade espacial para que seja possível seu

Figura 7. Trabalho do William.Fonte: Foto da autora.

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aprendizado de GD, promovendo, assim, as competências desejadas. A complexidade da teoria necessária para a aplicação das técnicas de Geometria Descritiva e a dissociação de seus conceitos da vivência anterior do aluno são fatores que dificultam o aprendizado.

Para facilitar a compreensão da teoria do Sistema Mongeano de Projeção, os docentes buscam estratégias pedagógicas que promovam a lapidação da habilidade espacial até que o aluno desenvolva a capacidade de abstração necessária. Nas aulas de Geometria Descritiva do Curso de Design da FAAC/Unesp, são utilizados os seguintes recursos:

• Explicações na lousa (Figura 8);• Modelos tridimensionais em madeira (Figura 9);• Animações/Sistema Hypergeo (Figura 10);• Exercício no software AutoCAD (Figura 11);• Fotografias com o celular dos alunos para visualização das faces dos objetos

(Figura 12);• Exercícios desenvolvidos em papel A3 com instrumentos de desenho técnico

(Figura 13).

Figura 8. Explicação na lousa do seccionamento do cubo e sua VG.

Fonte: Foto da autora.

Figura 9. Modelos tridimensionais em madeira.

Fonte: Foto da autora.

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Figura 10. Quadros da animação de projeções no 1º diedro e formação da épura.Fonte: Valente (1997).

Figura 11. Exercício de Perspectiva

Cavaleira no AutoCAD.Fonte: Foto da autora.

Figura 12. Vista superior de um modelo de madeira obtida via fotografia de celular.

Fonte: Foto da autora.

Figura 13. Exercícios desenvolvidos em papel A3 com instrumentos de desenho técnico.Fonte: Foto da autora.

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Além desses recursos, outros também são utilizados. Percebe-se nas aulas que o entendimento dos mecanismos das proje-ções se dá de forma mais clara quando se apresenta os planos de projeção com mo-bilidade ou animações.

As noções de diedro12 e épura são me-lhores compreendidas quando se mostra à classe um modelo montado em acrílico, ou em papelão, de dois planos se interceptan-do e formando 90º entre si, com flexibilida-de para que se possa fazer o rebatimento deles, ou seja, “abrir” o ângulo de 90º até que ele chegue a 180º e fique um sobre o outro.

De acordo com Strong (2002), o desen-volvimento de novas tecnologias de infor-mática tem sido pesquisado como meios possíveis para ampliar o pensamento espa-cial e melhorar as habilidades e competên-cias espaciais.

As dificuldades específicas da disciplina de GD e a heterogeneidade das turmas mo-tivaram o desenvolvimento de ferramentas computacionais como sites como Valente (1997), softwares tutores como Valente (2003), softwares de Realidade Virtual como Seabra (2008), Sistemas Estereoscópicos como Santos (2000), videoaulas, para auxi-liar os alunos em seus estudos.

12. Espaço delimitado por dois planos que

formam 90º entre si.

As técnicas descritas até aqui têm sido utilizadas há anos com sucesso na disci-plina de Desenho II do Curso de Design da Unesp, pois, ao final do semestre, os alunos atingem os objetivos propostos e alcançam as competências necessárias para a repre-sentação de objetos tridimensionais no plano.

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Currículo dos Autores

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ELIANE PATRÍCIA GRANDINI SERRANO

Possui graduação em Educação Artística, Habilitação em Artes Plásticas, pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (1990), mestrado em Projeto, Arte e Sociedade pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (1997) e doutorado em Letras – Estudos Literários pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (2003). Atualmente é Docente no Departamento de Artes e Representação Gráfica (DARG) da Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação (FAAC) na Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), campus de Bauru. É a atual coordenadora do Curso de Artes Visuais do Departamento de Artes e Representação Gráfica. Tem experiência na área de Artes, com ênfase nas artes visuais. Participa da linha de pesquisa do Departamento Artes Plásticas.

JOEDY LUCIANA BARROS MARINS BAMONTE

Graduação em Educação Artística, com Habilitação em Artes Plásticas, pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (1991), mestrado em Comunicação e Poéticas Visuais pela FAAC/Unesp – Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação (1998) e doutorado em Ciências da Comunicação pela USP/ECA – Escola de Comunicações e Artes, na área de Comunicação e Estética do Audiovisual, linha de pesquisa Sistemas de Significação em Imagem e Som (2004). Professora assistente doutora em RDIDP na FAAC/Unesp junto ao Departamento de Artes e Representação Gráfica. Professora colaboradora no Programa de Pós-graduação em Artes do Instituto de Artes-Unesp, campus de São Paulo, na Área de Artes Visuais, linha de pesquisa de Processos e Procedimentos Artísticos. Desenvolve projetos em arte contem-porânea, produção plástica, processos criativos, crítica de processo e desenho enquanto linguagem. O foco é dado para procedimentos e métodos de criação. Líder do grAVA (Grupo de Pesquisa em Artes Visuais e Audiovisual), na Unesp, no qual investiga e cria junto aos alunos de Artes da Unesp as linguagens presentes na atualidade em artes visuais e multi-mídia, enfatizando a importância da mediação para a formação de público. Como artista plástica, investiga processos híbridos entre linguagens, priorizando o desenho, processos

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Sbiológicos e a produção têxtil em sua poética. Membro do Comitê de Poéticas Artísticas da ANPAP (Associação Nacional de Pesquisadores em Artes Plásticas) desde 2011 e da APAP (Associação Profissional de Artistas Plásticos de São Paulo) desde 2014.

LUANA MARIBELE WEDEKIN

Professora assistente doutora na Unesp, no Departamento de Artes e Representação Gráfica da Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação do campus de Bauru. Pós-doutorado na linha de Teoria e História da Arte no Ceart-UDESC; doutora em Psicologia (UFSC, 2015); M.A. em História da Arte pelo The Courtauld Institute of Art (University of London, UK, 2013/2014); mestre em Antropologia Social (UFSC, 2000); Especialização em Estudos Culturais (UFSC, 1997); graduada em Educação Artística, Habilitação em Artes Plásticas (UDESC, 1993). Membro da Anpap (Associação Nacional de Pesquisadores de Artes Plásticas) e da ABCA (Associação Brasileira de Críticos de Arte). Colíder do grupo de pesquisa cadastrado no CNPQ LabIMAGEM (Laboratório de Estudos da Imagem – DARG/FAAC) e membro do grupo História da Arte: Imagem – Acontecimento (PPGAV/UDESC). Pesquisas atuais confluem para os estudos sobre a arte russa (especialmente a vanguarda) em suas diversas linguagens e os aspectos metodológicos da história da arte.

MARCO ANTONIO ROSSI

Possui graduação em Desenho Industrial pela FAAC/Unesp, em Bauru/SP (1990), mes-trado em Desenho Industrial pela FAAC/Unesp, em Bauru/SP (1997) e doutorado em Agronomia pela Unesp/FCA, em Botucatu/SP (2007). Fez o curso International Engineering Educator pela Society for Engineering Education International – IGIP (2015). Atualmente é professor assistente doutor da FAAC/Unesp, em Bauru/SP. Tem experiência na área de Engenharia Civil, Engenharia de Produção e Arquitetura, com ênfase em desenho arqui-tetônico para Engenharia Civil e Arquitetura e Ergonomia de produção para Engenharia de Produção. Atua principalmente nos seguintes temas: desenho técnico básico, desenho 169

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técnico civil, desenho arquitetônico, ergonomia de produção e de produto, design indus-trial, fatores humanos de trabalho, segurança e saúde do trabalhador na área de produção.

REGILENE AP. SARZI-RIBEIRO

Pós-doutora em Artes pelo Instituto de Artes da Unesp/SP. Doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC/SP. Professora assistente doutora do Departamento de Artes e Representação Gráfica da Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação da Unesp/Bauru-SP. Docente permanente do Programa PPGMiT: Pós-Graduação em Mídia e Tecnologia da FAAC (Unesp/Bauru) na Linha de Pesquisa Tecnologias Midiáticas. Docente colaboradora do Programa de Pós-Graduação em Artes do Instituto de Artes da Unesp/SP, na Linha de Pesquisa Abordagens Teóricas, Históricas e Culturais da Arte. Líder do grupo de pesquisa labIMAGEM: Laboratório de Estudos da Imagem, credenciado no CNPq e certificado pela Unesp. Colíder do grAVA: Grupo de Pesquisa em Artes Visuais e Audiovisual (FAAC/Unesp/Bauru). Pesquisadora dos grupos de pesquisa Arte e Tecnologia (UFSM/RS) e GEA: Grupo de Estudos Audiovisuais (FAAC/Unesp/Bauru). Membro da Diretoria, Biênio 2017-2108, da Associação Nacional de Pesquisadores em Artes Plásticas (ANPAP), onde compõe o Comitê História, Teoria e Crítica de Arte. Membro do Comitê Científico da Revista Educação Gráfica (FAAC/Unesp/Bauru). Consultora do Conselho Estadual de Educação de São Paulo (CEE-GP) para avaliação de Cursos de Graduação/Ensino Superior. Atua na área de Artes Visuais com ênfase para História da Arte, Arte Contemporânea e Audiovisual, Teoria e Crítica das Artes do Vídeo e do Audiovisual, Corpo, Arte Eletrônica e Técno-imagens. Como artista visual, desenvolve trabalhos articulando o corpo às linguagens da fotografia e do vídeo, vídeo-pintura e videoarte.

SIDNEY TAMAI

Possui doutorado pela FauUsp na área de Design e Arquitetura, onde articulou arte e arquitetura enquanto campo ampliado. Fez mestrado em Artes e Multimeios pela Universidade Estadual de Campinas (1995) e graduação em Arquitetura e Urbanismo pela

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SFederação das Faculdades Brás Cubas (1980). É atualmente professor do Curso de Artes e Arquitetura da FAAC/Unesp e foi professor da IA-AU Unicamp e FAU-IA da PucCampinas. Tem estudado e experimentado o campo ampliado e transdisciplinar entre artes e arquite-tura nas suas convergências e divergências de linguagens, campo este estruturado em dois eixos elípticos que apresenta potências dissimetrias inventivas: linguísticas e metalinguís-ticas. A experimentação em ato circula interativamente entre arte pública via de recombi-nantes tridimensionais espaços-temporais e arquiteturas fluídas, especialmente as têxteis tenso-estruturais. Esse conjunto é posto em crise através de reflexões do contemporâneo ao pensar e propor arte e arquitetura em interações complexas através de abordagens sin-gulares onde é possível a ocorrência de novos e inesperados arranjos espaços-temporais, na direção de reinventar e qualificar artes e arquiteturas. De forma mais ampla, estuda as interações, meios, processos, procedimentos e consequências de linguagens entre: 1. Arte como campo estendido (Arte Concreta, Minimal e Contemporânea); 2. Arquitetura contem-porânea como campo ampliado; 3. Cultura digital eletroeletrônica.

THAÍS REGINA UENO YAMADA

Com doutorado em Design (2016) e mestrado em Desenho Industrial (2003) pela Universidade Estadual Paulista e graduação em Desenho Industrial com Habilitação em Programação Visual pela mesma instituição (1997), exerceu, de fevereiro de 2002 a junho de 2010, a função de professora titular do curso de Bacharelado em Design do Instituto de Ensino Superior de Bauru. Atualmente, é professora assistente do Departamento de Artes e Representação Gráfica da FAAC (Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação da Unesp), atuando nos cursos de Design, Licenciatura em Matemática e Bacharelado em Artes Visuais. Participa como Pesquisadora do Grupo Psicologia da Educação Matemática, do Departamento de Educação da Faculdade de Ciências/Unesp e do Grupo de Pesquisa Linguagem do Espaço e da Forma, do Departamento de Artes e Representação Gráfica/Unesp. Pesquisa nas áreas de expressão gráfica e aplicações de técnicas do origami em projetos de design, tratando de temas como educação gráfica, design gráfico e de produto, educação matemática com o uso do origami e do kirigami. É coordenadora do Projeto de 171

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Extensão Universitária UNATI – Universidade Aberta à Terceira Idade, do campus Bauru, e do sub-projeto “Rejuvenescendo com Arte”, que trabalha a arte e a cultura para a terceira idade de Bauru.

VÂNIA CRISTINA PIRES NOGUEIRA VALENTE

Livre Docente em Representação Gráfica. Docente em tempo integral, regime esta-tutário, da Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. Ministra aulas nos cursos de graduação em Design e Artes Visuais e na Pós-graduação em Mídia e Tecnologia. Doutora em Engenharia Civil pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. Mestre em Desenho Industrial pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. Graduada em Processamento de Dados pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. Foi Diretora de Informática da Faculdade de Ciências da Unesp-Bauru. Tem experiência nas áreas de Programação de Interfaces Interativas e Ensino de Desenho e pesquisa os seguintes te-mas: Representação Gráfica, Design de Multimídia, Aplicação de Games Digitais para o Letramento Espacial, Objetos de Ensino Gamificados, Desenvolvimento de Hipermídia e Integração Arte-Educação-Tecnologia.

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