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4 Física na Escola, v. 14, n. 2, 2016 Introdução C omumente ouvimos os professores dizendo: “nossos alunos não são mais como os de antigamente”. E, de fato, não são. Sobretudo, os alunos de hoje não são os mesmos para os quais o nosso sistema educacional foi criado [1]. Em seu dia a dia, muitos estão constante- mente conectados a redes sociais e acostu- mados ao acesso direto a informações em seus smartphones, tablets ou computa- dores, tão logo tenham algum interesse em buscá-las. Para eles, longas aulas expositivas centradas no professor, com poucas possibilidades de interação e eleva- do grau de passividade, são altamente desmotivadoras e carentes de significado. Dentre os inúmeros desafios enfrentados pelos professores para promover uma aprendizagem significativa dos conteúdos, a divergência entre o perfil dos alunos atuais e o modelo de ensino ocupa posição importante. A questão que se apresenta é: como fazer diferente? Certamente não há uma única res- posta para esta questão. Pesquisadores e professores de diversas áreas, em particu- lar do ensino de física, vêm envidando esfor- ços para mudar a sala de aula por meio de uma aprendizagem mais ativa ( active learning). Aprendiz- agem ativa, neste contexto, envolve a realização de ativida- des de ensino que per- mitam aos alunos se engajarem cognitivamente e refletirem ao longo do processo sobre aquilo que estão fazendo [2]. Dentre diversas possíveis formas de se implementar tais atividades, uma metodologia de ensino em particu- lar tem ganho destaque nos últimos anos: a Sala de Aula Invertida (Flipped Classroom) Tobias Espinosa de Oliveira Instituto de Física, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil. E-mail: [email protected] Ives Solano Araujo Instituto de Física, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil. Bolsista do CNPq – Brasil. E-mail: [email protected] Eliane Angela Veit Instituto de Física, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil. E-mail: [email protected] Aulas puramente expositivas, com alunos passivos e comumente inibidos a qualquer ação interativa. Esse retrato do ensino tradicional di- verge do perfil dos alunos atuais, os quais, em sua maioria, estão constantemente conectados à internet, com acesso fácil à informação e habi- tuados a ambientes interativos, sejam eles vir- tuais ou presenciais. Uma possível correção a essa dissonância se encontra na inversão da sala de aula, o que significa que os alunos tomam contato com o conteúdo em casa e o tempo disponível em aula que, tradicionalmente, é ocupado por longas exposições orais do profes- sor, é utilizado para que os alunos estudem, interagindo ativamente com seus colegas e pro- fessor. O presente artigo apresenta a metodologia de ensino conhecida como Sala de Aula Invertida e diferentes métodos que permitem essa inversão no ensino de física. Discutimos os motivos que podem incentivar o professor de física a modifi- car a sua prática, bem como as principais dificul- dades que ele pode encontrar nesse percurso. [3]. Nela, os alunos entram em contato com os tópicos a serem discutidos em sala através de atividades prévias às aulas. Isso pode ser feito em casa, por exemplo, por meio de leituras e/ou visualização de vídeos indicados pelo professor e algumas questões sobre o conteúdo tratado nesses recursos. Em sala de aula, os alunos, usualmente de forma colaborativa, rea- lizam atividades experimentais, de simulação computacional e/ou resolução de problemas, por exemplo. Ao “inverter” a aula, ou seja, centrar o ensino nos alu- nos e ressignificar o papel do professor para além da transmissão de informações, ganha-se tempo em sala para que ativi- dades mais nobres aconteçam, tais como discussões pormenorizadas sobre con- ceitos físicos e atenção a dificuldades espe- cíficas apresentadas pelos alunos. Por isso, é importante que mais pro- fessores conheçam maneiras para diver- sificar as suas práticas e se sintam moti- vados a fazê-lo. Não existe apenas uma forma de inverter a sala de aula. O docente precisa ter liberdade para escolher entre diferentes métodos de ensino e, de forma crítica, modificá-los quando necessário para que possam ser aplicados em seu con- texto educacional. Apesar da ampla divulgação alcançada pela “sala de aula invertida”, muitas vezes são difundidas concepções equivo- cadas ou incompletas que dificultam sua adoção por parte de professores interessados em modificar suas aulas. Além disso, mesmo que a in- versão da sala de aula possa ser feita em praticamente qualquer disciplina [4], exis- tem desafios particulares a cada uma delas. O presente artigo tem como propósito Os alunos de hoje não são os mesmos para os quais o nosso sistema educacional foi criado. E muitos deles estão constante- mente conectados a redes sociais e acostumados ao acesso direto a informações em seus smartphones, tablets ou computadores, tão logo tenham algum interesse em buscá-las Sala de aula invertida

Introdução [3]. Nela, os alunos entram em contato C · professor para realizar tarefas associadas à resolução de problemas, entre outras [3]. O contato inicial com a informação

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Page 1: Introdução [3]. Nela, os alunos entram em contato C · professor para realizar tarefas associadas à resolução de problemas, entre outras [3]. O contato inicial com a informação

4 Física na Escola, v. 14, n. 2, 2016

Introdução

Comumente ouvimos os professoresdizendo: “nossos alunos não sãomais como os de antigamente”. E,

de fato, não são. Sobretudo, os alunos dehoje não são os mesmos para os quais onosso sistema educacional foi criado [1].Em seu dia a dia, muitos estão constante-mente conectados a redes sociais e acostu-mados ao acesso direto a informações emseus smartphones, tablets ou computa-dores, tão logo tenham algum interesseem buscá-las. Para eles, longas aulasexpositivas centradas no professor, compoucas possibilidades de interação e eleva-do grau de passividade, são altamentedesmotivadoras e carentes de significado.Dentre os inúmeros desafios enfrentadospelos professores para promover umaaprendizagem significativa dos conteúdos,a divergência entre o perfil dos alunosatuais e o modelo de ensino ocupa posiçãoimportante. A questão que se apresentaé: como fazer diferente?

Certamente não há uma única res-posta para esta questão. Pesquisadores eprofessores de diversas áreas, em particu-lar do ensino de física,vêm envidando esfor-ços para mudar a salade aula por meio deuma aprendizagemmais ativa (activelearning). Aprendiz-agem ativa, nestecontexto, envolve arealização de ativida-des de ensino que per-mitam aos alunos seengajarem cognitivamente e refletirem aolongo do processo sobre aquilo que estãofazendo [2]. Dentre diversas possíveisformas de se implementar tais atividades,uma metodologia de ensino em particu-lar tem ganho destaque nos últimos anos:a Sala de Aula Invertida (Flipped Classroom)

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Tobias Espinosa de OliveiraInstituto de Física, UniversidadeFederal do Rio Grande do Sul, PortoAlegre, RS, Brasil.E-mail: [email protected]

Ives Solano AraujoInstituto de Física, UniversidadeFederal do Rio Grande do Sul, PortoAlegre, RS, Brasil.Bolsista do CNPq – Brasil.E-mail: [email protected]

Eliane Angela VeitInstituto de Física, UniversidadeFederal do Rio Grande do Sul, PortoAlegre, RS, Brasil.E-mail: [email protected]

Aulas puramente expositivas, com alunospassivos e comumente inibidos a qualquer açãointerativa. Esse retrato do ensino tradicional di-verge do perfil dos alunos atuais, os quais, emsua maioria, estão constantemente conectadosà internet, com acesso fácil à informação e habi-tuados a ambientes interativos, sejam eles vir-tuais ou presenciais. Uma possível correção aessa dissonância se encontra na inversão da salade aula, o que significa que os alunos tomamcontato com o conteúdo em casa e o tempodisponível em aula que, tradicionalmente, éocupado por longas exposições orais do profes-sor, é utilizado para que os alunos estudem,interagindo ativamente com seus colegas e pro-fessor. O presente artigo apresenta a metodologiade ensino conhecida como Sala de Aula Invertidae diferentes métodos que permitem essa inversãono ensino de física. Discutimos os motivos quepodem incentivar o professor de física a modifi-car a sua prática, bem como as principais dificul-dades que ele pode encontrar nesse percurso.

[3]. Nela, os alunos entram em contatocom os tópicos a serem discutidos em salaatravés de atividades prévias às aulas. Issopode ser feito em casa, por exemplo, pormeio de leituras e/ou visualização devídeos indicados pelo professor e algumasquestões sobre o conteúdo tratado nessesrecursos. Em sala de aula, os alunos,usualmente de forma colaborativa, rea-lizam atividades experimentais, desimulação computacional e/ou resoluçãode problemas, por exemplo. Ao “inverter”a aula, ou seja, centrar o ensino nos alu-nos e ressignificar o papel do professorpara além da transmissão de informações,ganha-se tempo em sala para que ativi-dades mais nobres aconteçam, tais comodiscussões pormenorizadas sobre con-ceitos físicos e atenção a dificuldades espe-cíficas apresentadas pelos alunos.

Por isso, é importante que mais pro-fessores conheçam maneiras para diver-sificar as suas práticas e se sintam moti-vados a fazê-lo. Não existe apenas umaforma de inverter a sala de aula. O docenteprecisa ter liberdade para escolher entrediferentes métodos de ensino e, de formacrítica, modificá-los quando necessário

para que possam seraplicados em seu con-texto educacional.

Apesar da ampladivulgação alcançadapela “sala de aulainvertida”, muitasvezes são difundidasconcepções equivo-cadas ou incompletasque dificultam suaadoção por parte de

professores interessados em modificarsuas aulas. Além disso, mesmo que a in-versão da sala de aula possa ser feita empraticamente qualquer disciplina [4], exis-tem desafios particulares a cada umadelas.

O presente artigo tem como propósito

Os alunos de hoje não são osmesmos para os quais o nossosistema educacional foi criado.E muitos deles estão constante-

mente conectados a redessociais e acostumados ao

acesso direto a informações emseus smartphones, tablets ou

computadores, tão logo tenhamalgum interesse em buscá-las

Sala de aula invertida

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5Física na Escola, v. 14, n. 2, 2016

apresentar a “sala de aula invertida” ediscutir alguns desafios e possibilidadesde sua implementação em aulas de física.

Sala de Aula Invertida (FlippedClassroom)

O termo Flipped Classroom, ou, emuma tradução livre, “Sala de Aula Inver-tida”, é comumente associado aos traba-lhos dos professores norte-americanosBergmann e Sams, que publicaram umlivro [3] onde divulgam uma maneira deinverter a sala de aula, na qual as tradicio-nais exposições orais do professor sãosubstituídas por vídeos a serem assistidospelos alunos fora da sala de aula. No livro,os professores Bergmann e Sams, atravésda experiência acumulada em anos ensi-nando química em escolas de Ensino Mé-dio, buscam incentivar e auxiliar a mu-dança na prática docente. Apesar de seremuma referência no que diz respeito à Salade Aula Invertida, os próprios autores des-tacam que o termo não pertence anenhum professor ou pesquisador especí-fico, e que diversos métodos já existentespoderiam ser caracterizados como formasde inversão da sala de aula [3]. Mas, afinal,o que é a Sala de Aula Invertida?

A Sala de Aula Invertida é uma meto-dologia de ensino que inverte a lógicatradicional de ensino. O aluno tem o pri-meiro contato com o conteúdo que iráaprender através de atividades extraclas-ses, prévias à aula. Em sala, os alunos sãoincentivados a trabalhar colaborativa-mente entre si e contam com a ajuda doprofessor para realizar tarefas associadasà resolução de problemas, entre outras [3].

O contato inicial com a informaçãopode ser feito por meio de vídeos, textosou qualquer outro material de apoio, osquais o professor pode disponibilizaronline. Em aulas tradicionais, um brevemomento de distração do estudante du-rante a exposição do professor, pode sersuficiente para dificultar uma compreen-são adequada de alguma explicação. Emcontrapartida, na Sala de Aula Invertida,o aluno, em casa, estuda em seu próprioritmo, tendo a opção de pausar o vídeo ereproduzi-lo quantas vezes achar neces-sário ou, em caso de textos, reler diversasvezes o que não compreendeu. Em casode dúvida, o aluno tem a possibilidade derecorrer a outras fontes de informações(e.g. páginas da internet, vídeos, livros,etc.). Além disso, recomenda-se que o pro-fessor peça aos alunos que escrevam eenviem suas dúvidas para que ele possaabordá-las na aula.

Em sala de aula, o foco é voltado àaplicação dos conceitos estudados em casapelos alunos. Como já mencionado, isso

pode ser feito através de resolução de pro-blemas, atividades experimentais e/ou desimulações computacionais, etc. Nessastarefas, estimula-se a interação aluno-aluno e aluno-professor, havendo umaalteração tanto no papel do professorquanto do aluno. Como bem reiteramBergmann e Sams [3], “o papel do profes-sor em sala é auxiliar os estudantes, e nãotransmitir a informação”. Por sua vez, oaluno assume uma postura ativa e, mui-tas vezes, contribui para a aprendizagemde seus colegas por meio de suas expli-cações.

A crescente popularização da Sala deAula Invertida faz com que cada vez maisprofessores a adotem; em contrapartida,comumente são disseminadas ideiasequivocadas a seu respeito. Comentamosalgumas delas [5] na sequência.

A Sala de Aula Invertida não éalgo inédito e não existe umaúnica maneira de inverter a salade aula

Inovações na sala de aula não são tãorecentes quanto parecem. No final do Sé-culo XX, por meio do método de estudosde caso, começaram a aparecer as primei-ras iniciativas de cobrir a informação forada sala de aula e de práticas orientadasem sala. Um dos métodos de inversão desala de aula mais difundidos no ensino defísica, o Instrução pelos Colegas (Peer In-struction) [6], teve origem na década de1990. Outros métodos, como o Ensino sobMedida (Just-in-Time Teaching) [7],Aprendizagem Baseada em Equipes (Team-Based Learning) [8], Aprendizagem Basea-da em Projeto (Project-Based Learning) [9]e Aprendizagem Baseada em Problemas(Problem-Based Learning) [10] têm origementre as décadas de 70 e 90. Alguns dessesmétodos serão apresentados brevementemais adiante. Podemos retroceder aindamais no tempo com Sócrates (469 a.C.-399 a.C.), que propunha o diálogo ativoatravés de discursos maiêuticos (métodosocrático), os quais induzem o interlocu-tor a pensar, agir e refletir por si mesmo.Se pensarmos bem, talvez o estranho sejaa insistente preeminência de aulas centra-das no professor e com alunos passivos.

Inverter a sala de aula nãoimplica necessariamente no usode videoaulas

Utilizar vídeos no estudo de casa dosalunos é apenas uma possibilidade. Comojá comentado, em vez de assistir um vídeo,o professor pode pedir para o aluno lerum texto, por exemplo. E não se trata ape-nas de disponibilizar vídeos ou textos aosestudantes, inverter a sala de aula também

diz respeito ao que se faz com o estudoprévio. Para isso, o docente pode orientaralguma atividade, como pedir para queos alunos façam anotações sobre o queestão estudando, elaborem perguntas, ouque respondam algumas questões. O do-cente, de posse das informações prove-nientes do estudo dos alunos, conseguemapear as dificuldades apontadas e, as-sim, preparar explicações pontuais aserem proferidas em sala de aula. É im-prescindível salientarmos que a Sala deAula Invertida não se restringe ao uso devídeos, e tão pouco elimina o papel do pro-fessor no processo de ensino e aprendi-zagem.

São diversas as potencialidades rela-cionadas à inversão das aulas de física.Na próxima seção discorreremos sobrealguns motivos pelos quais o professorpode ser incentivado a modificar a suaprática.

Por que inverter as aulas defísica?

A mudança nas aulas de física podeadvir da percepção docente dos benefíciosatrelados a ela. Nesse sentido, expomosalguns motivos para se inverter a sala deaula.

A Sala de Aula Invertidaressignifica o papel do professor

Em aulas tradicionais, normalmenteo professor assume o papel de transmissorde informação, dispendendo boa parte dotempo em sala de aula comunicandoverbalmente conceitos físicos e escrevendoa solução de exercícios resolvidos no qua-dro. Em meio a alunos nascidos na era dainternet e com acesso a ferramentas detecnologia da informação, a disseminaçãode informações pode ser feita de formamais eficiente em contextos educacionaisque saiam da zona de carência absolutade condições materiais. O próprio estu-dante, além de ter acesso aos livros textosdistribuídos no PNLD, pode acessar ainformação com poucos toques em seusmartphone se tiver interesse. Na Sala deAula Invertida, o docente torna-se respon-sável por criar, selecionar e organizar oestudo, bem como auxiliar os estudantes,sanando as dúvidas deles e concentrandomais atenção às especificidades de cada umnos encontros presenciais. O professor defísica, dispondo do tempo ganho em salade aula ao diminuir consideravelmente otempo destinado às exposições orais, podeconcentrar-se em orientar atividades emsala de aula focadas no engajamentocognitivo dos estudantes e no estímulo daautonomia discente, enriquecendo assimsua prática.

Sala de aula invertida

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6 Física na Escola, v. 14, n. 2, 2016

Inverter as aulas coloca o alunono centro do processo educativo

Em aulas convencionais, o professoré o centro do processo educativo; a atençãoestá voltada para ele na maior parte dotempo. Na Sala de Aula Invertida os alu-nos ocupam posição central. O professorpassa a se importar menos sobre comovai expor determinado conteúdo, e maisa respeito das atividades que serão desen-volvidas pelos estudantes para construí-rem seus conhecimentos. Os alunos se tor-nam corresponsáveis tanto pela própriaaprendizagem quanto pela dos colegas.Quando estão em casa, são encarregadosde se prepararem para as atividades queserão desenvolvidas em sala de aula [11].Em classe, são responsáveis por ajudar oscolegas nas atividades e contribuir paraas discussões orientadas pelo professor, oque, por sua vez oportuniza a consoli-dação do que está sendo por eles apren-dido.

Na sala de aula invertida sãolevados em consideração osconhecimentos prévios dos alunos

Conforme apontado por Ausubel[12], o fator isolado mais importante paraa aprendizagem é aquilo que o estudantejá sabe. Em aulas tradicionais, as possíveistentativas do professor de acessar os co-nhecimentos prévios dos estudantes po-dem ser bastante restritas devido ao tempolimitado que ele dispõe em classe. Na Salade Aula Invertida, as dificuldades e dúvi-das enfrentadas pelos alunos em seusestudos em casa são levadas ao conheci-mento do professor, que as usa para pla-nejar as atividades a serem realizadas nosencontros presenciais. As dúvidas e errospercebidos na fase de preparação são pontode partida e combustível para as discus-sões em classe.

A Sala de Aula Invertida lida coma heterogenia na sala de aula

Muitas vezes, as aulas preparadascom métodos de ensino tradicionais têmpor alvo um “aluno médio” hipotético, si-tuado em posição intermediária entre osalunos que apresentam mais facilidade decompreensão e os que apresentam menos.Ao não levar em consideração as especifi-cidades dos alunos reais, não raro as ativi-dades de ensino terminam por não atingirninguém. Na sala de aula invertida, aheterogenia, usualmente presente namaior parte das turmas, além de ser le-vada em consideração, através do acessoaos conhecimentos prévios dos alunos, ébem-vinda por instigar as discussões en-tre os colegas. Hipoteticamente, se todos

os alunos fossem iguais e soubessem tudo,nada haveria para ser debatido; de manei-ra análoga, se todos os alunos tivessem difi-culdades muito grandes na compreensãodos conceitos, a discussão também poderiaser prejudicada. A diversidade beneficia osalunos que naquela ocasião compreen-deram mais rapidamente o conteúdo e têma chance de consolidar sua própria apren-dizagem ensinando, e também auxiliaaqueles que apresentaram dificuldades, queaprendem com seus colegas e, por meio desuas dúvidas, estimulam as discussões. Éimportante frisar que tais papéis assumidospelos estudantes não são necessariamentefixos, podendo se alternar ao longo da rea-lização das atividades.

Métodos ativos de ensinobaseados no modelo de sala deaula invertida podem auxiliar nodesenvolvimento de hábitos deestudos nos estudantes

Em diversos contextos educacionais,os estudantes não estão acostumados aestudar em casa, a não ser na véspera daprova, quando muito. Na sala de aulainvertida, todo o conteúdo que os alunosestudariam na véspera de alguma tarefade avaliação classificatória é dividido empequenas partes que não o sobrecarregam.Eles podem ler algumas páginas do livro-texto (duas ou três seções) ou assistir umvídeo curto (menos de 20 minutos de du-ração), por exemplo. Através das tarefasde preparação prévia, os alunos tendem aadquirir o hábito de estudar, não tendoque dedicar esforços, altamente desgas-tantes e pouco eficazes horas antes dealgum exame [13].

Salas de aula invertidas auxiliamos alunos no desenvolvimento dacapacidade de reflexão e dahabilidade de elaborar boasperguntas

Saber elaborar boas perguntas é tãoimportante quanto saber respondê-las[11]. Para desenvolver tal habilidade é es-sencial que o aluno consiga refletir sobreaquilo que está estudando. Em aulas tradi-cionais, o professor dita o ritmo, e os alu-nos interessados tentam acompanhar asexplicações. Esse tipo de abordagem,muitas vezes, causa no discente um sen-timento equivocado de que entendeu oconteúdo e, não raramente, quando tentaaplicar esse conhecimento, percebe quenão o entendeu. Na Sala de Aula Invertidao ritmo é dado, em parte, pelo estudante.A partir do contato prévio com o conteú-do, ele tem tempo para pensar sobre o queestá estudando. Além disso, ao pedir paraque os alunos elaborem perguntas sobre

o conteúdo do material de estudo, o pro-fessor está estimulando o desenvolvi-mento tanto da capacidade de reflexãoquanto da habilidade de elaboração de per-guntas. Essa prática, em contrapartidacom o método tradicional, pode causar noaluno uma sensação de desconforto, ouseja, ele se sente confuso ao perceber queaquilo que achara que tinha compreen-dido corretamente, na verdade não estavaclaro. No entanto, como bem destacamDowd e cols. [14], tal sentimento pode seruma indicação de engajamento metacog-nitivo, o que pode contribuir na apren-dizagem.

A inversão na sala de aula podeestimular o desenvolvimento dehabilidades relacionadas aotrabalho colaborativo

Não basta que os alunos aprendamos conteúdos e a resolver problemas defísica, é essencial na sociedade contempo-rânea que as pessoas adquiram habilida-des relacionadas ao trabalho colaborativo,como por exemplo: saber ouvir e comu-nicar ideias, contribuir em discussões,respeitar e ser flexível diante de conflitos.Adicionalmente, segundo Vygotsky [15],o processo de ensino e aprendizagem seconstrói por meio de interações sociais,as quais podem acontecer entre o profes-sor e os alunos, mas, também por intera-ções entre os próprios alunos. Na Sala deAula Invertida, o tempo em classe podeser destinado à resolução de problemas defísica, em pequenos grupos, mediadas peloprofessor. Com isso, os alunos podem re-solver tarefas colaborativamente quetalvez não fossem capazes sozinhos. Alémdisso, ajuda a aprenderem a explicar demaneira que outras pessoas possam en-tender [11].

Os aspectos mencionados anterior-mente não esgotam potencialidades advin-das da inversão das aulas de física. Pesqui-sas em ensino de física mostram que osmétodos ativos de ensino podem melhorara compreensão de conceitos físicos [e.g.16-19], diminuir as taxas de reprovaçãoe evasão [e.g. 20-21], bem como desen-volver atitudes positivas em relação àsaulas de física, se comparadas com aulastradicionais [e.g. 18, 19]. Na próximaseção, descrevemos alguns dos métodosativos de ensino que estão gerando osresultados para o ensino de física aquiapontados.

Diferentes métodos ativos parainverter as aulas de física

Não há maneira infalível de ensinarfísica (ou qualquer conteúdo que seja),tampouco um único método de inverter

Sala de aula invertida

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a sala de aula. O professor, conhecendodiferentes abordagens, tem a possibilidadede decidir qual delas se ajusta melhor aoseu contexto de ensino. Nesta seção, apre-sentamos alguns métodos ativos de ensinoque vêm mostrando resultados na inver-são das aulas de física, salientando infor-mações que podem ser úteis às suas res-pectivas implementações.

Invertendo a sala de aula com ouso de vídeos

O método de inversão da sala de auladesenvolvido pelos professores Bergmanne Sams [3], cuja principal estratégia é ouso de vídeos, é, possivelmente, um dosmais conhecidos e difundidos pela mídia.Um dos motivos que o tornou popular éa sua simplicidade.

Neste método, os alunos, em casa, as-sistem a um vídeo de 10 a 15 minutoscom o conteúdo a ser estudado. Enquantoolham o vídeo, fazem anotações e formu-lam perguntas para levarem à sala de aula.Em classe, nos primeiros 10 minutos, oprofessor esclarece as dúvidas dos estu-dantes e, em seguida, os envolve em ativi-dades de resolução de problemas, experi-mentais e/ou de simulações computacio-nais, as quais são realizadas em pequenosgrupos. Nesse processo, o professor cir-cula pela sala de aula orientando os alunose ajudando-os a sanar suas dúvidas.

O professor que decidir implementaresse método em suas aulas de física podeproduzir seus próprios vídeos e disponi-bilizá-los aos alunos ou usar vídeosprontos disponíveis na internet. Para criá-los, duas opções básicas se destacam: fil-magem das exposições orais feitas peloprofessor para uma turma real ou apenaspara câmera; e também a captura de some imagem do computador por meio desoftwares específicos, como o Jing1,Camtasia Studio2, CamStudio3 ouRecordMyDesktop4. Ao optar pela capturade tela, pode criar apresentações de slidesou escrever na tela do computador, utili-zando uma mesa digitalizadora e um soft-ware adequado, como o Smooth Draw5.A escrita (ou desenho) na tela, uma dastécnicas mais utilizadas em videoaulasatualmente, torna a explicação dinâmica,possibilitando que o estudante acompanheas construções do professor, como se esti-vesse frente a um quadro negro. Tanto afilmagem do próprio professor, quanto acaptura de imagem e som no computador,podem ser combinadas para a produçãodos vídeos que também podem contarcom a adição de materiais preexistentes.

A construção de vídeos pode ser umatarefa desafiadora para os professores,tanto devido à falta de tempo, quanto pela

falta de domínio das ferramentas neces-sárias. Nesse caso, o docente pode se valerde vídeos disponíveis gratuitamente noYouTube. Dentre os vários canais de físicade qualidade, estão: O Kuadro (Fig. 1 (a)),FabrisFísica (Fig. 1 (b)), Me Salva! (Fig. 1(c)) e, no âmbito da divulgação científica,Veritasium (Fig. 1 (d)), que apesar de serem inglês possibilita a inserção de legendaem português. Esses canais não esgotama quantidade de bons vídeos disponíveisna internet, que cresce a cada dia.

A Sala de Aula Invertida de Bergmanne Sams é apenas uma das muitas alterna-tivas de se inverter as aulas de física. Aseguir, apresentamos o Just-in-Time Teach-ing (Ensino sob Medida).

Ensino sob Medida (Just-in-TimeTeaching)

O Just-in-Time Teaching, ou em umatradução livre Ensino sob Medida (EsM),foi desenvolvido pelo professor de físicaGregor M. Novak e seus colaboradores naIUPUI (Indiana University-Purdue Univer-sity Indianapolis) e na Academia da ForçaAérea, ambas nos EUA [7]. O método pro-põe, com o auxílio da tecnologia, conectartarefas preparatórias realizadas fora dasala de aula com a dinâmica estabelecidadentro dela. Os alunos, em casa, se pre-param para as aulas; o professor, por suavez, prepara suas aulas “sob medida” pormeio do feedback que recebe dos alunos.

Nas palavras de Novak e cols. [7,p. 33, tradução nossa], o “Ensino sob Me-dida consiste em uma mistura cuidado-samente orquestrada de atividades deaprendizagem”. Os estudantes realizamalgumas dessas atividades fora da sala de

aula, em um ritmo próprio. Eles estudamum material indicado (e.g. seções do livro-texto, vídeo) e respondem a algumas ques-tões. As respostas são enviadas eletroni-camente ao professor, que as utiliza paraorganizar as atividades de sala de aula. Adinâmica da sala de aula varia, podendocontar com pequenas exposições orais doprofessor, demonstrações experimentais,simulações computacionais e resolução deproblemas em pequenos grupos. O EsMnão é rígido e pode ser acoplado a outrosmétodos ativos de ensino, ou seja, nãoexiste uma única maneira de usá-lo. Noentanto, seja qual for a dinâmica estabe-lecida em sala de aula, ela deve levar emconta as respostas dos alunos às tarefasde preparação. O aspecto essencial do EsMé a conexão entre o que feito fora e dentroda sala de aula [7].

A seguir, descrevemos detalhadamen-te as tarefas extraclasses e em classe quecompõem o método, tanto do ponto devista do estudante, quanto do professor.Atividades extraclasses

As atividades extraclasses são funda-mentais na aplicação do método. Por meiodas respostas advindas das tarefas de pre-paração, o professor determina a maneirapela qual a física é apresentada e discutidaem sala de aula.

Inicialmente, o professor envia algu-ma tarefa aos alunos, com pelo menosdois dias de antecedência, geralmente aindicação de algum texto e em torno detrês questões conceituais a serem respon-didas e enviadas pelos alunos, por ummeio eletrônico. O docente pode solicitara leitura de algumas seções do livro ouindicar algum texto ou vídeo online. Seja

Figura 1: Alguns canais do YouTube com vídeos que podem ser usados nas disciplinas defísica. (a) O Kuadro. (b) FabrisFísica. (c) Me Salva!. (d) Veritasium.

Sala de aula invertida

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qual for a ferramenta, o conteúdo nãopode ser demasiadamente extenso (emmédia cinco páginas, no caso de um texto)e deve ter uma linguagem clara. Entre asquestões, é imprescindível que uma delasseja uma pergunta de feedback sobre oentendimento do material indicado [22].A questão de feedback pode ter a redaçãoexposta na Fig. 2.

Sobre as questões referentes ao con-teúdo estudado, elas podem ser de dois ti-pos: WarmUps e Puzzles [7].

As questões do tipo WarmUp (ou emuma tradução livre questões preparató-rias) são o coração do método EsM, poisoferecem ao aluno uma visão reflexiva donovo conteúdo de física que está sendoestudado e impulsionam as atividades desala de aula. São questões que abordamaspectos conceituais centrais sobre o con-teúdo e podem, em alguns casos, apre-sentar uma situação ligada ao cotidiano,sem utilizar muitos termos físicos. Ao res-ponderem às questões WarmUp, deseja-seque os estudantes sejam capazes de sabersobre quais assuntos será a aula, de enten-der e descrever as situações representadasna questão e de refletir sobre as respostas,podendo não ter certeza sobre elas, nemsaber todos os detalhes.

As WarmUps podem ser de três tipos:dissertativa (Fig. 3), estimativa (Fig. 4) emúltipla escolha (Fig. 5). Cada uma delasatende a objetivos diferentes. As questõesdissertativas incentivam os estudantes aentenderem conceitos físicos e aplicá-losa problemas ligados ao mundo real. Osalunos são encorajados a expressar, atra-vés da escrita, relações entre diferentesgrandezas, e a não usarem equações, auxi-liando no desenvolvimento de habilidadesde comunicação. As questões de estima-tiva servem para os estudantes aprende-rem a resolver problemas não estrutu-rados, desenvolverem pensamento críticoe adquirirem certa intuição sobre os fenô-menos físicos. Por sua vez, as questões demúltipla escolha, ao contrário das disser-tativas, levam o estudante considerarvárias possibilidades, explorando possíveisconcepções alternativas sobre o conceitoque está em estudo. Inclusive, questõesde múltipla escolha são boas para iniciardiscussões em sala de aula considerandoo que está errado em cada uma das alter-nativas incorretas.

As questões do tipo Puzzle normal-mente necessitam a articulação de dife-rentes conceitos para serem solucionadas.A principal diferença entre questões do tipoPuzzle e WarmUp é a complexidade daquestão e a precisão esperada nas respos-tas [7]. O WarmUp serve para introduzire fazer o estudante refletir sobre um novo

Figura 2: Exemplo de questão de feedback do entendimento do material da tarefa depreparação.

Figura 3: Exemplo de questão WarmUp dissertativa [23].

Figura 4: Exemplo de questão WarmUp de estimativa [24, tradução nossa].

Figura 5: Exemplo de questão WarmUp de múltipla escolha [6].

conteúdo que ainda não foi discutido emsala de aula, enquanto o Puzzle encerraou revisa um tópico e articula diferentesconceitos estudados. O WarmUp estádiretamente conectado ao material deestudo; o Puzzle pode requerer informa-ções adicionais e leva em consideração asdiscussões já estabelecidas em aulas an-teriores. Esse tipo de questão pode serusado também em classe para fomentar

discussões em pequenos grupos.Os Puzzles podem ser adaptados de

vestibulares, ENEM e livros-textos. Asquestões conceituais propostas por Mazur[6] e os testes sobre concepções relativasà força e movimento [26] e corrente elé-trica em circuito simples [27], por exem-plo, também são boas fontes para ques-tões. Adicionalmente, uma breve pesquisano Google pode ajudar o professor a en-

Sala de aula invertida

Page 6: Introdução [3]. Nela, os alunos entram em contato C · professor para realizar tarefas associadas à resolução de problemas, entre outras [3]. O contato inicial com a informação

9Física na Escola, v. 14, n. 2, 2016

contrar questões pertinentes. O fator maisimportante é que exista relação entre asquestões e as atividades que serão pro-postas para a sala de aula. A Fig. 6apresenta um exemplo de Puzzle.

Outras atividades podem ser acopla-das para enriquecer as atividades de casa,como: simulações interativas (e.g. PhET6),textos e discussões online que motivem osestudantes (e.g. pergunte ao CREF7),notícias sobre acontecimentos da física,podcasts (e.g. Nerdcast, Dragões de Gara-gem, Scicast), blogs (SienceBlogs Brasil) ecanais do YouTube (Nerdologia, Minu-toDaFísica, Manual do Mundo, CiênciaTodo Dia) voltados à divulgação científica.Além disso, podem ser usadas listas deproblemas. A escolha das atividades e aforma de apresentá-las variam de acordocom os objetivos do professor e da insti-tuição.

O professor precisa enviar as atividadesprévias aos alunos, que, por sua vez,precisam enviar as respostas ao professor.Uma forma eficiente e prática de fazê-lo éutilizar o Google Forms8, que consiste emuma ferramenta gratuita que permite criarformulários e disponibilizá-los online(enviando um link para os estudantes) paraque possam ser respondidos. As respostassão organizadas em tabelas, às quais oautor do formulário tem acesso [28].

As respostas dos alunos precisam seravaliadas pelo professor, mas não em ter-mos de certo e errado, e sim em termosde raciocínio demonstrado e de engaja-mento com a atividade. O interessante éque os estudantes reflitam ativamentesobre o material estudado e enviem aoprofessor um feedback capaz de enriqueceras atividades de sala de aula.

De posse das respostas dos estudantesàs tarefas de preparação, o professor podeadequar suas exposições orais. Algumashoras antes da aula, ele precisa analisar eselecionar as respostas que possibilitemuma melhor apresentação do conteúdo,o que não representa, necessariamente, asrespostas corretas. Descrições que apon-tem concepções alternativas são boas fon-

tes de discussões em sala de aula. O pro-fessor pode ter uma aula preparada pre-viamente, com vídeos, simulações,exemplos do cotidiano, demonstraçõesexperimentais e ajustá-la, usando os re-cursos mais pertinentes aos aponta-mentos e dúvidas advindas da tarefa depreparação.Atividades em classe

O aspecto mais importante é que adiscussão dos WarmUps e Puzzles são aprópria aula. O desen-volvimento das expli-cações das teorias econceitos físicos estáinterligado com asquestões propostaspelo professor e asrespectivas respostasdos alunos [7]. Osestudantes precisamperceber que seus es-forços para realizar atarefa de preparaçãosão a essência das aulas, assim, engajar-se-ão cada vez mais nas atividades. Comisso, as atividades em classe previstas peloEsM se dividem em dois tipos comple-mentares: aulas expositivas interativas eprática colaborativa.

As aulas expositivas interativas sãoexposições orais (normalmente divididasem pequenas etapas de aproximadamente15 minutos) que o professor organiza uti-lizando as perguntas e respostas dosalunos à tarefa de preparação. A partir daanálise feita, algumas horas antes da aula,a maneira como os conceitos físicos sãoapresentados é construída. Recomenda-seque sejam mostradas as respostas dosalunos (de forma anônima) e, a cada aula,respostas de alunos diferentes sejam uti-lizadas para que todos tenham suas colo-cações postas nas discussões. O profes-sor, se possível, deve tentar não deixarperguntas sem respostas.

A prática colaborativa consiste emorganizar os alunos em pequenos grupospara resolverem problemas. A preparaçãopara essas aulas pode ser feita por meio

da resolução de problemas de livro-texto,por exemplo. No início da aula, em apro-ximadamente 20 minutos, o professorrevisa os problemas de casa. Em seguida,os alunos são organizados em grupos erecebem novos e mais complexos proble-mas para resolverem. Recomenda-se quetodos os grupos trabalhem no mesmoproblema, facilitando assim a troca deinformações entre os grupos.

Como mencionado anteriormente, oEsM é um métodoflexível, o que implicaque a prática colabo-rativa pode ser aplica-da de diversas manei-ras diferentes, inclusi-ve com a junção deoutros métodos ativosde ensino. A seguir,apresentamos doismétodos que, além depoderem ser utili-zados individual-

mente, podem ser acoplados ao EsM: oInstrução pelos Colegas e a AprendizagemBaseada em Equipes.

Instrução pelos Colegas (PeerInstruction)

O Ensino sob Medida (EsM) e o Ins-trução pelos Colegas (IpC) são doismétodos que vêm sendo utilizados emconjunto como uma forma de inverter asaulas de física [6]. O EsM orienta o pro-fessor em como realizar e tirar o melhorproveito do estudo prévio. O IpC, desen-volvido pelo professor de física de HarvardEric Mazur [6], oferece subsídios paraorientar as discussões de forma ativa emsala de aula, sendo uma opção para a prá-tica colaborativa indicada pelo EsM.

No IpC, o professor apresenta um tes-te conceitual (Puzzle) aos alunos, os quaiso respondem individualmente, utilizandoalgum sistema de votação. Em seguida,dependendo da quantidade de acertos, oprofessor instrui os alunos a tentaremconvencer uns aos outros de suas res-postas. Afinal, o sujeito que acabou decompreender determinado conceito podeter uma forma diferente e, muitas vezes,mais eficiente que a do professor, de expli-car àquele que ainda está com dificuldadesde entendimento. O ensino (ou instrução)pelos colegas é o aspecto central do mé-todo. Por fim, o método prevê uma segun-da votação, após a discussão entre os cole-gas.

Na Fig. 7, mostramos uma linha dotempo com a combinação do EsM e doIpC para uma determinada aula, extraídada Ref. [22]. Inicialmente o professor ela-bora a tarefa de preparação, denominada

Sala de aula invertida

Figura 6: Exemplo de Puzzle [25].

As respostas dos alunosprecisam ser avaliadas não emtermos de certo e errado, mas

em termos de raciocíniodemonstrado e de engajamentocom a atividade. Os estudantesdevem refletir sobre o materialestudado e enviar ao professor

um feedback capaz deenriquecer as atividades de

sala de aula

Page 7: Introdução [3]. Nela, os alunos entram em contato C · professor para realizar tarefas associadas à resolução de problemas, entre outras [3]. O contato inicial com a informação

10 Física na Escola, v. 14, n. 2, 2016

por Araujo e Mazur [22] de Tarefa deLeitura (TL), e a envia para os estudantes.Os alunos, fora da sala de aula, leem omaterial, respondem às questões propos-tas pelo professor e as enviam. Esse pro-cesso inicial acontece de 2 a 7 dias antesda aula. Com aproximadamente 12 horasde antecedência à aula, o professor revisaas respostas dos alunos, planeja suas bre-ves exposições orais e define os testes con-ceituais que irá usar durante a aula. Emclasse, o professor inicia com uma expo-sição oral, enfatizando as dúvidas dos alu-nos referentes a um dos tópicos tratadosna TL. Em seguida, apresenta uma ques-tão conceitual, na qual os estudantes pen-sam individualmente em uma resposta evotam. O professor avalia a distribuiçãode respostas e, caso esta fique em tornode 30 a 70% de acertos, solicita que osalunos discutam a questão em pequenosgrupos e convençam seus colegas sobresuas respostas. Feito isso, os estudantesvotam novamente. Caso a distribuiçãoseja menor que 30%, o professor podediscutir a resposta e apresentar uma novaquestão conceitualsobre o mesmo tema.Se for maior que 70%,ele pode discutir aresposta com os alu-nos e passar para umnovo tópico. Maioresinformações sobre oIpC podem ser encontradas em Araujo eMazur [22].

Sobre os sistemas de votação, mencio-namos três: os cartões de respostas (flash-cards), os Clickers e os Plickers. O primeiroé o mais simples, o próprio professor podeconfeccionar seus próprios cartões com asalternativas (A, B, C, D e E), podendo teruma cor associada a cada letra para faci-

litar a identificação. A única desvantagemdo uso dos cartões é que a contagem deacertos (a distribuição de respostas) temque ser feita “no olho”. Os Clickers sãodispositivos eletrônicos individuais (con-troles remotos) que se comunicam com ocomputador do professor. Com eles, oprofessor pode ter acesso facilitado à dis-tribuição de respostas, pois a mesma apa-rece na tela de seu computador. O únicoproblema é que esses dispositivos sãocaros e grande parte das escolas de EnsinoMédio brasileiras não têm condições decomprá-los. Uma alternativa tecnológicae barata, que une as vantagens dos cartõesde respostas e as dos Clickers, é o uso dePlickers. Nesse caso, o professor baixa umaplicativo em seu smartphone (cujo nomeé Plickers), disponível gratuitamente paraAndroid e iOS, e os alunos votam comcartelas de respostas que contém um có-digo similar ao QR code que o aplicativo écapaz de ler através da câmera do apare-lho, correspondente a cada alternativa5

(Fig. 8 (a)). Na Fig. 8 (b) apresentamos atela do aplicativo Plickers no momento da

leitura do código im-presso em uma folha.Cada cartela é nume-rada e são diferentesentre si. Deste modo,é possível designaruma cartela para cadaaluno e registrar a

evolução de suas respostas ao longo dotempo.

Os métodos EsM e IpC focam princi-palmente na compreensão conceitual; jáoutras formas de se inverter a sala de aula

abrem espaços para o desenvolvimento deoutras habilidades essenciais ao ensino,em específico de física, como resolver pro-blemas e trabalhar colaborativamente.Esse é o caso do método que apresentamosna subseção seguinte, o Team-Based Learn-ing, ou, em uma tradução livre, Aprendi-zagem Baseada em Equipes, métododesenvolvido pelo professor de gestão enegócios, Larry Michaelson [8], cujadivulgação no ensino de física ainda érecente [29].

Aprendizagem Baseada emEquipes (Team-Based Learning)

A Aprendizagem Baseada em Equipes(ABE) é um método ativo que tem comofoco melhorar a aprendizagem e desen-volver habilidades de trabalho colabora-tivo, através de uma estrutura que envol-ve: o gerenciamento de equipes de apren-dizagem, tarefas de preparação e aplicaçãode conceitos, feedback constante e avalia-ção entre os colegas. A ideia central é queos alunos sejam ativos e se sintam respon-sáveis pela própria aprendizagem e pelados colegas. A ABE busca desenvolver ver-dadeiras equipes de aprendizagem, asquais diferem de grupos por duas carac-terísticas: um alto nível de comprometi-mento individual para o bem do grupo econfiança entre os membros [8]. Paradesenvolver tais habilidades as equipes(normalmente de cinco a sete integrantes)são fixas durante toda a aplicação do mé-todo e são organizadas pelo professor demaneira que sejam as mais heterogêneaspossíveis no que diz respeito ao conhe-cimento, experiências pessoais, interesses,

Sala de aula invertida

Figura 7: Linha do tempo do Ensino sob Medida e do Instrução pelos colegas para uma determinada aula [22].

Na Aprendizagem Baseada emEquipes, a ideia central é queos alunos sejam ativos e sesintam responsáveis pela

própria aprendizagem e pelados colegas

Page 8: Introdução [3]. Nela, os alunos entram em contato C · professor para realizar tarefas associadas à resolução de problemas, entre outras [3]. O contato inicial com a informação

11Física na Escola, v. 14, n. 2, 2016

entre outros fatores, favorecendo o sur-gimento de equipes com níveis seme-lhantes de interatividade.

Na implementação do TBL, umadisciplina é organizada em módulos, comduas fases principais, apresentadas naFig. 9. Cada uma das fases, Preparação eAplicação, envolvem tanto atividadesextraclasses quanto atividades em classe,cuja lógica é a da sala de aula invertida,ou seja, os estudantes tomam contato como conteúdo em casa e resolvem atividadesativamente em sala de aula.

Na fase de preparação (quadro 1 daFig. 9), antes da aula, os estudantes reali-zam um estudo prévio, por meio de textos,vídeos e simulações, dentre outros. Essesmateriais são usualmente entregues a elescom antecedência mínima de dois dias. Emsala de aula (quadro 2 da Fig. 9), conti-nuando a fase de preparação, os estudan-tes respondem a um Teste de Preparaçãoindividual (TPi), cujas questões, preferen-

cialmente conceituais (WarmUps ePuzzles), estão relacionadas com a tarefarealizada em casa. Em seguida, o mesmoteste é realizado em equipe (Teste de Pre-paração em equipe - TPe). Nessa etapa,cada equipe recebe uma cartela (similar abilhetes de premiação instantânea) con-tendo uma grade para marcar as respos-tas, definidas consensualmente através dodiálogo entre os colegas. A resposta sele-cionada pela equipe é marcada na graderaspando-a. Caso a resposta escolhidaesteja correta, aparecerá um símbolo indi-cando. Se estiver errada, os estudantesvoltam a discutir para tentar encontrar aresposta certa. Em caso de objeção à for-mulação da questão, a equipe pode inter-por um recurso (ou apelação), que é enca-minhado ao professor para avaliação.Finalizando a fase de preparação, o profes-sor faz uma breve exposição oral, enfati-zando os pontos de maior dificuldade dosalunos durante a realização dos testes.

Sala de aula invertida

Na fase de aplicação, os alunos se en-volvem em atividades, usualmente deresolução de problemas, individuais, emcasa (quadro 3 da Fig. 9), e em equipe nasala de aula (quadro 4 da Fig. 9). Em sala,todas as equipes resolvem o mesmoproblema, um por vez e, ao final de cadasolução, expõem suas respostas para to-dos os estudantes (em pequenos quadrosbrancos ou cartolinas, por exemplo),discutindo entre eles e com o professor.Ao término da discussão, o professorentrega um novo problema e o processorecomeça. Assim, todos os alunos pensamjuntos no mesmo problema, evitando oparticionamento de tarefa que poderiaacontecer caso fosse entregue uma listade problemas por equipe.

Maiores informações sobre o métodopodem ser encontradas nas Refs. [19, 29].

Principais desafios para inverteras aulas de física

Dentre os principais desafios que o do-cente pode enfrentar ao almejar invertersuas aulas podemos citar: uma grande ex-tensão de conteúdos curriculares a seremtrabalhados; o número de aulas semanaisdisponíveis para a disciplina; ausência dohábito de estudo prévio às aulas por partedos alunos; uma estrutura burocrática rígi-da na instituição de ensino que se opõe ainovações; a heterogenia da turma, princi-palmente em termos de conhecimento; etambém o número elevado de alunos nasturmas.

A seguir comentamos tais desafios eapontamos possíveis formas de enfrentá-los. Obviamente, não se trata da apresen-tação de soluções universais e muitomenos definitivas, mas sim pontos de par-tida para auxiliar o professor em sua refle-xão sobre a implementação dos métodosde ensino discutidos ao longo deste artigo.

O conteúdo programático defísica é extenso e o tempo élimitado para inverter a sala deaula

O conteúdo programático da discipli-na de física é, de fato, bastante extenso, eo tempo disponível em sala de aula, sejaela invertida ou não, é exíguo. A tendênciaé que o professor pense que não terátempo disponível para ensinar tudo queestá programado e ainda fazer com queos estudantes sejam ativos em sala deaula. O aspecto essencial a ser consideradoaqui é uma reflexão sobre o que é ensinar.Muitas vezes, o pensamento subjacente aesse respeito está alinhado com um pontode vista transmissionista do conhecimentono qual apenas os conteúdos copiados noquadro-negro, ou exibidos em slides em

Figura 8: (a) Cartela de respostas para leitura via software Plickers. Cada lado correspondea uma alternativa (A, B, C ou D)9. (b) Tela do aplicativo Plickers no momento da leiturado código impresso em uma folha.

Figura 9: Principais fases de um módulo do TBL [19].

Page 9: Introdução [3]. Nela, os alunos entram em contato C · professor para realizar tarefas associadas à resolução de problemas, entre outras [3]. O contato inicial com a informação

12 Física na Escola, v. 14, n. 2, 2016Sala de aula invertida

sala de aula, podem ser considerados comoministrados pelo professor. Ao pedir queos alunos tomem o primeiro contato como conteúdo fora da sala de aula, atravésde alguma leitura ou assistindo a um ví-deo, o conteúdo já começa a ser abordado.O tempo que o professor gastaria em salade aula apresentando informações que po-deriam ser lidas ou assistidas pelos alunosfora da sala de aula, passa a ser investidona oferta de ativida-des de ensino focadosna aprendizagem ati-va por parte dos alu-nos. Na medida emque os estudantesvão adquirindo hábi-tos de estudo, conse-guem aprimorar acapacidade de com-preensão dos conteú-dos e, consequentemente, mais tempo oprofessor terá em sala.

Os alunos não estudam fora dasala de aula

Muitos educadores argumentam,quando se deparam com a sala de aulainvertida, que seus alunos não leriam omaterial indicado e nem mesmo assisti-riam a vídeos em casa. Realmente, em di-versos contextos de ensino, incentivá-losa estudar em casa não é uma tarefa fácil.Contudo, diversos trabalhos demonstramexperiências bem-sucedidas neste sentido[e.g. 6, 7, 19, 22-24]. Uma alternativausada pelos autores para amenizar essadificuldade é fazer com que a preparaçãoprévia para as aulas tenha papel impor-tante na atribuição dos conceitos avalia-tivos na disciplina. A ideia é usar o nívelde esforço explicitado pelos alunos ao ten-tar responder às questões associadas àstarefas de preparação prévia através doraciocínio demonstrado, e não pela corre-ção das respostas. Assim, os estudantesnão ficam inibidos em errar e se sentemincentivados a tentar responder [22] a par-tir do que realmente estão compreenden-do. Além da apresentação de um par dequestões sobre o conteúdo abordado, oprofessor pode também apresentar umapergunta sobre as dificuldades que tive-ram ao ler o material ou ao assistir aovídeo e, caso não tenham tido nenhumadificuldade, que digam o que mais lhesdespertou interesse. As tarefas de prepa-ração prévia devem ser sucintas. Reco-mendamos que o tempo total de prepara-ção envolvendo o contato inicial com o con-teúdo (através da leitura, por exemplo) e aresposta às questões sobre o material dis-ponibilizado não ultrapasse 45 min. É fun-damental para o estabelecimento do hábito

de estudo por parte dos discentes que astarefas sejam bem definidas, e não tomemmuito tempo para serem realizadas.

A estrutura da escola é rígida elimita qualquer tentativa deinovação

Algumas escolas são resistentes àmudança, sendo contrárias a qualqueriniciativa educacional menos conservado-

ra. Em certos casos, in-clusive, as escolas ado-tam materiais que pa-recem manifestar aintenção de ser “a pro-va de professor”, ouseja, que o nível dequalidade de ensinoseria garantido pelaadoção de livros eapostilas, reduzindo o

papel do professor à execução de atividadesjá planeadas. Nesses casos, o professorpode tentar inverter a sala de aula aospoucos. Não é necessário que haja umamudança brusca, pode começar apenascom um tópico a partir dos materiais jáadotados pela instituição. Por exemplo, astarefas de preparação prévia podem serfeitas a partir da leitura de seções do livro/apostila usados pelos alunos, assim comoproblemas e testes conceituais podemtambém vir desses materiais. Na medidaem que resultados positivos vão apare-cendo, é razoável esperar que os própriosalunos e seus pais passem a apoiar asações tomadas pelo professor, o que podefacilitar a aceitação das mudanças inova-doras por parte da instituição de ensino.

As turmas são heterogêneas e onúmero de alunos por turma éelevado

Ao inverter a sala de aula é necessárioque se dê mais atenção aos alunos. Issofaz alguns professores pensarem quequalquer método ativo se tornariainviável em turmas numerosas eheterogêneas. No entanto, a inversão dasala de aula promove a interação entre osalunos e apresenta melhores resultadosjustamente quando há uma diferençainicial em termos da compreensão porparte dos alunos. Alunos que apresentamcerta dificuldade de entendimento frentea algum conteúdo passam a contar nãosó com o professor, mas também com oscolegas para auxiliar sua compreensão.Por outro lado, os alunos quecompreenderam mais rapidamente epassaram a auxiliar seus colegas, têm aoportunidade de consolidar aquilo queaprenderam, assim como expandir suacompreensão na medida em que precisam

externalizar argumentos e convencer seuscolegas sobre suas respostas. Cabesalientar que os alunos, ao longo dotrabalho, costumam alternar de papéis.Desse modo, permitimos que o aluno sejacorresponsável pela sua própria aprendi-zagem e também pela de seus colegas.Com isso, o professor não se sobrecarrega,sendo a única “fonte de explicações” emsala de aula. Obviamente, é de responsa-bilidade do docente incentivar e organizara colaboração entre os alunos. No sentidode buscar o trabalho colaborativo, po-demos ainda argumentar que turmas nu-merosas tornam as aulas mais interes-santes, pois diversificam e enriquecem asdiscussões.

Comentários finais

Neste artigo, apresentamos a metodo-logia de ensino conhecida como Sala deAula Invertida e alguns métodos que po-dem ser associados a ela. Nosso objetivofoi apontar caminhos para os professoresinteressados em melhorar suas práticaspara que conheçam algumas possibili-dades e se motivem a inverter suas aulas.

É de nossa opinião que o educador quedeseje modificar a sua prática não deva sefixar a um único método de ensino, sejaele qual for. Defendemos a diversidademetodológica e a autonomia do profes-sor como ingredientes essenciais no plane-jamento e implementação de qualqueratividade de ensino. Mesmo aulas essen-cialmente expositivas podem se mostrarrelevantes dentro da organização de umaunidade de ensino e seria um equívocopensar que deveriam ser abolidas apenaspor serem “tradicionais”.

Por meio de reflexões sobre o processode ensino-aprendizado e novas formas deconcretizá-lo em seu contexto educacionalúnico, incentivamos que o professor assu-ma uma postura crítica. Os métodos ati-vos de ensino não podem ser vistos comoreceitas a serem seguidas ou meras técni-cas que o professor dispõe. Se forem en-carados de maneira rígida, o docente podeter dificuldades para lidar com as dificul-dades de natureza social, cultural e econô-mica, que certamente aparecerão em suatrajetória didática. Conforme já salienta-mos, a autonomia e o discernimento doprofessor são imprescindíveis.

Mesmo que o foco pelo qual tratamosa Sala de Aula Invertida esteja principal-mente na melhoria da compreensão con-ceitual e na habilidade de resolução de pro-blemas, evidentemente isso não diminuia importância de discussões sobre aspectosepistemológicos, históricos e sociais. Porexemplo, a discussão sobre a natureza doconhecimento científico e a relação entre

Incentivar os alunos a estudarem casa não é uma tarefa fácil.

Contudo, diversos trabalhosdemonstram experiências bem-

sucedidas neste sentido. Éfundamental para o estabe-

lecimento do hábito de estudopor parte dos discentes que astarefas sejam bem definidas

Page 10: Introdução [3]. Nela, os alunos entram em contato C · professor para realizar tarefas associadas à resolução de problemas, entre outras [3]. O contato inicial com a informação

13Física na Escola, v. 14, n. 2, 2016

Notas11111Ferramenta gratuita para captura de imagem da tela do computador e som. Disponível em http://www.jingproject.com.2Um dos programas (pagos) mais populares para captura de tela e som e edição de vídeos. Disponível em https://www.techsmith.com/camtasia.html.3Software gratuito e open source para capturar a tela do computador. O CamStudio está disponível para download apenas no Win-dows. Disponível em http://camstudio.org/.4Programa gratuito e open source destinado a usuários GNU/Linux que desejam capturar a tela do computador. Disponível emhttp://recordmydesktop.sourceforge.net/about.php ou na central de programas do Ubuntu.5Software gratuito para escrever (ou desenhar) na tela do computador. Disponível em http://www.smoothdraw.com/sd.6O PhET simulações interativas é um projeto da Universidade do Colorado (EUA), fundado em 2002 pelo Prêmio Nobel de FísicaCarl Wieman, que conta com um grande acervo de simulações de diversos conteúdos de física, química, biologia, ciências da terrae matemática. Também apresenta uma série de propostas de atividades a serem usadas com as simulações. Disponível em https://phet.colorado.edu/pt_BR/.7O CREF, Centro de Referência para o Ensino de Física do instituto de Física da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS),possui uma seção que se destina a resolver dúvidas conceituais sobre física, na maioria das vezes ligadas ao cotidiano. As respostassão dadas normalmente por especialistas da área do próprio Instituto de Física da UFRGS. Disponível em https://www.if.ufrgs.br/cref/.8Ferramenta eletrônica gratuita utilizada para criar questionários, disponibilizar aos alunos e receber as respostas organizadas emtabelas. Disponível em http://docs.google.com.9Os desenhos correspondentes as letras do alfabeto (A, B, C e D), cujo aplicativo do celular conseguirá ler, pode ser adquiridogratuitamente pelo site do próprio aplicativo. Disponível em https://plickers.com/PlickersCards_2up.pdf.

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Sala de aula invertida

Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS) po-dem efetivamente chegar à sala de aulapor meio dos métodos de ensino aqui apre-sentados ou de suas adaptações, manten-do os pontos centrais motivadores da

inversão da sala de aula.Esperamos que as discussões aqui

levantadas possibilitem o enriquecimentoda prática do professor de física. No entan-to, como bem destacamos no decorrer do

texto, para usufruir das vantagens da Salade Aula Invertida existem desafios a sersuperados, e cabe ao professor ser o agentede mudança.