INTRODUÇÃO A RETÓRICA

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NATUREZA E FUNO DE RETRICA

O que retrica? Segundo Charles Perelman e L. OlbrechtsTyteca, a arte de argumentar. A retrica visa convencer; Morier, G.Genette, J.Cohen e Grupo MU, consideram a retrica como estudo do estilo, e mais particularmente das figuras. Aquilo que torna literrio um texto.

A retrica a arte de persuadir pelo discurso. O que o discurso? toda produo verbal, escrita ou oral, constituda por uma frase, que tenha comeo e fim, e apresente certa unidade de sentido. A Retrica no aplicvel a todos os discursos, mas somente aqueles que visam persuadir.

Exemplos: Pleito advocatcio, alocuo, poltica, sermo, folheto, cartaz, de publicidade, panfleto, fbula, petio, ensaio, tratado de filosofia, de teologia ou de cincias humanas. Drama e o romance, desde que de tese, e o poema satrico ou laudatrio

Os discursos(no sentido tcnico definido acima) que no visam persuadir. Exemplos: poema lrico, tragdia, melodrama, comdia, romance, contos populares, piadas. Acrescentemos os discursos de carter puramente cientfico ou tcnico: modo de usar, em oposio a anncio publicitrio; veredicto, em oposio a pleito advocatcio; obra cientfica, em oposio vulgarizao; ordem, em oposio a slogan.

levar algum a crer em alguma coisa. 1) Pedro persuadiu-me de que sua causa era justa 2) Pedro persuadiu-me a defender sua causa Exemplo: Pedro conseguiu (1)levar-me a acreditar em alguma coisa, enquanto em (2) ele conseguiu lervar-me a fazer alguma coisa, no se sabendo se acredito nela ou no. A persuaso retrica consiste em levar a crer(1), sem redundar necessariamente no levar a fazer(2). Se, ao contrrio, ela levar a fazer sem levar a crer, no retrica.

Pode-se dizer, por exemplo, que algum persuadiu algum a fazer alguma coisa por ameaa ou promessa, e que nisso residia toda a eficcia de sua argumentao? Resposta: verdade que se pode falar de eficcia, mas no de argumentao. Esta visa sempre a levar crer. Por certo, atravs de promessa ou ameaa, pode-se persuadir algum a cometer um erro, mas esse algum estar persuadido de que o erro no erro?

Quando se traduz a retrica do grego techn, encontramos um termo ambguo, ou duplamente ambguo. Porque? Em primeiro lugar porque designa tanto uma habilidade espontnea, quanto uma competncia adquirida atravs do ensino. Em segundo, porque designa ora uma simples tcnica, ora, ao contrrio, o que na criao ultrapassa a tcnica e pertence somente ao gnio do criador. Onde est a arte?

Retrica espontnea: uma aptido para persuadir Retrica ensinada: que serve parar formar. Com o nome por exemplo de tcnicas de expresso e comunicao. Serve para ensinar o que alguns j parecem saber naturalmente. Independente das duas formas, encontramos os mesmos procedimentos, intelectuais e afetivos, que fazem da retrica uma tcnica.

No, muito mais. O verdadeiro orador um artista no sentido de descobrir argumentos ainda mais eficazes do que se esperava, figuras de que ningum teria ideia e que se mostram ajustadas; artistas cujo o desempenho no so programveis e que s se fazem sentir posteriormente.

Decorre de sua definio: arte de persuadir. Porque meios o discurso persuasivo? Por meios de ordem racional e afetiva. Em retrica razo e sentimentos so inseparveis. Os meios de competncia da razo so os argumentos. Os argumentos podem ser divididos em dois tipos: raciocnio silogstico(entimemas) e os que se fundamentam no exemplo.

Silogstico(entimemas) Se dirige a um auditrio mais especializado, como um tribunal Exemplo - Se dirige de preferncia ao grande pblico Como j notava Aristteles o exemplo mais afetivo que o silogismo.

Etos O carter que o orador deve assumir para chamar a ateno e angariar a confiana do auditrio. Patos As tendncias, os desejos, as emoes do auditrio das quais o orador poder tomar partido.

De um modo meio diferente Ccero distingue docere, delectare, movere: Docere (instruir, ensinar), o lado argumentativo do discurso. Delectare (agradar) o lado agradvel, humorstico, etc. Movere (comover) aquilo com que ele abala, impressiona o auditrio.

O persuasivo do discurso comporta dois aspectos: um que chamaremos de argumentativo; e o outro, de oratrio. Dois aspectos nem sempre fceis de distinguir.

Oratrios Os gestos do orador, o tom e as inflexes de sua voz so puramente oratrios. A metfora, a hiprbole, a anttese so oratrias por contriburem para agradar e comover. Mas so tambm argumentativas no sentido de exprimirem um argumento condensando-o, tornando-o mais contundente. Exemplo: A Religio o pio do povo.

Meio de convencimento puramente racional, sem nada de afetivo e que escapa portanto ao domnio da retrica, chega-se ao seguinte esquema.Retrico Argumentao

Demonstrativo

OratrioRacional

Por mais primordial a funo persuasiva no nica. Se a retrica a arte de persuadir pelo discurso, preciso ter em mente que o discurso no e nunca ser um acontecimento isolado. Ao contrrio ope-se a outros discursos. A lei fundamental da retrica que o orador nunca est sozinho, exprime-se sempre em concordncia com outros oradores ou em oposio a eles, sempre em funo de outros discursos.

Para ser persuasivo, o orador deve antes compreender os que lhe fazem face, captar a fora da retrica deles, bem como seus pontos fracos. Esse trabalho de interpretao feito por todos de modo mais ou menos espotneo. Para ser um bom orador, no basta saber falar, tem que principalmente saber para quem est falando. Funo hermenutica a arte de interpretar textos.

Na universidade atual, essa funo fundamental, para no dizer nica. No se ensina retrica como a arte de produzir discursos, mas como a arte de interpret-los.

Mas a a retrica recebe outra dimenso; no mais uma arte que visa a produzir, mas uma teoria que visa compreender Oliver Reboul.

Quando utilizamos a retrica no o fazemos s para obter certo poder; tambm para saber, para encontrar alguma coisa. E essa a terceira funo da retrica, que denominares heurstica, do verbo grego euro, eureka, que significa encontrar. Em resumo, uma funo de descoberta.

O que a retrica poder ter para descobrir? Vivemos em um mundo que no condiz inteiramente com o conhecimento cientfico, um mundo em que a verdade raramente evidente, e a previso segura raramente possvel. Num mundo sem evidncia, sem demonstrao, sem previso certa, em nosso mundo humano, o papel da retrica de defender esta ou aquela causa, esclarecer aquele que deve dar a palavra final.

Contribui para inventar uma soluo, onde no h deciso previamente escrita. E faz isso instaurando um debate contraditrio, s possvel graas a seus procedimentos, sem os quais logo descambaria para o tumulto e a violncia. A retrica possui realmente uma funo de descoberta.

Nesta funo o autor amplia o campo da retrica. Ao estudarmos os programas escolares da Idade Mdia e da poca clssica, pode-se verificar que a retrica s admite a primeira das trs funes. Funo hermenutica reservada a gramtica, e a funo heurstica dialtica.

Mas ser legitimo impor cultura as divises de um programa escolar, para estanc-la em disciplinas sem inter-relaes, em especialidades? Qual , pois, esse mesmo todo de que fazia parte a retrica? Em termos modernos, cultura geral.

No fim do sculo XIX, a retrica foi abolida do ensino francs, e o prprio termo foi riscado dos programas. Mas se apagando a palavra no se suprimiu a coisa. A retrica permaneceu s que desarticulada. Ensinar a compor segundo um plano, a encadear os argumentos de forma coerente e eficaz, a cuidar do estilo, a encontrar as construes apropriadas e as figuras exatas, a falar distintamente e com vivacidade, no sero retrica no sentido mais clssico do termo?

Os critrios segundo os quais um professor de lngua, ou mesmo de fiosofia, avalia uma redao respeito ao assunto, ao plano, argumentao, ao estilo, personalidade - , que esses critrios so encontrados, com outros nomes, na retrica clssica. No existe cultura sem formao retrica

Reboul, O., Introduo a retrica. So Paulo: Martins Fontes. 2004.

Aprender a arte de bem dizer j e tambm aprender a ser Olivier Reboul.