17
INTRODUÇÃO CITOLOGIA A citologia, também chamada citopatologia, é uma especialidade que analisa microscopicamente a morfologia celular, além das alterações decorrentes de patologias relacionadas. COLEMAN (1989) relata que seu surgimento ocorreu no século XIX, junto de melhores microscópios e teorias celulares, iniciando com análise de líquidos corporais. Em seguida, alterações patológicas foram estudadas através da observação de células tumorais. Tais estudos contribuíram para descrição de pleomorfismo estrutural, alterações nucleares e relação núcleo citoplasma. Ao comentar o surgimento da citologia, não pode ser esquecido George N. Papanicolaou. Ele iniciou seus estudos com porquinhas da Índia, investigando alterações cervicais decorrentes de mudanças hormonais. Essa pesquisa foi posteriormente estendida à mamíferos. Durante seus trabalhos, Papanicolaou desenvolveu uma técnica de confecção e coloração a qual recebeu seu próprio nome (COLEMAN, 1989). Com a ajuda de outros profissionais com mesmo objetivo, Papanicolaou divulgou a importância da citologia, tornando-a um método reconhecido pela classe médica. Através de sua técnica de coloração, a morfologia das células cancerosas foi descrita o que o levou a incentivar o uso de tal técnica como método de rastreamento de câncer no colo do útero. Atualmente, a técnica de Papanicolaou é utilizada em todo o mundo e tem contribuído para a redução da mortalidade por câncer do colo uterino (COLEMAN, 1989; GOMPEL e KOSS, 1997; TUON, 2002; DERCHAIN, FILHO e SYRJANEN, 2005). De um modo geral, podemos dividir a citologia como ginecológica e não- ginecológica. Na primeira temos a análise da região cervical feminina, sendo utilizada para triagem populacional no rastreio de lesões cervicais, além de avaliação da secreção vaginal. Em não-ginecológica, encontram-se os materiais procedentes de outras áreas do corpo como, por exemplo, mama, pulmão e cavidade abdominal (QUEIROZ e LIMA, 2000). As amostras para exame citológico podem ser obtidas por meio de duas maneiras diferentes, que estão relacionadas com o tipo de citologia chamado. Quando a amostra for coletada por meio de esfoliação, raspado ou abrasão, chamamos de citologia esfoliativa. Já quando o é realizada uma punção, denominamos citologia aspirativa a qual pode ser representada pela Punção Aspirativa com Agulha Fina (PAAF). Os espécimes obtidos também podem ser provenientes de outros procedimentos, como por meio de broncoscopia em caso de lavado bronco- alveolar (COLEMAN, 1989; MCKEE, 1997; QUEIROZ e LIMA, 2000; DIGENE, 2004) A citologia cérvico-vaginal é o principal método utilizado no rastreio do câncer do colo do útero, pois avalia e identifica graus de alteração celular do epitélio escamoso. Seu objetivo é identificar lesões malignas e pré-malignas, além de auxiliar no diagnóstico de infecções genitais e outras benignidades. O

INTRODUÇÃO citologia

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: INTRODUÇÃO citologia

INTRODUÇÃO CITOLOGIA

A citologia, também chamada citopatologia, é uma especialidade que analisa microscopicamente a morfologia celular, além das alterações decorrentes de patologias relacionadas. COLEMAN (1989) relata que seu surgimento ocorreu no século XIX, junto de melhores microscópios e teorias celulares, iniciando com análise de líquidos corporais. Em seguida, alterações patológicas foram estudadas através da observação de células tumorais. Tais estudos contribuíram para descrição de pleomorfismo estrutural, alterações nucleares e relação núcleo citoplasma.

Ao comentar o surgimento da citologia, não pode ser esquecido George N. Papanicolaou. Ele iniciou seus estudos com porquinhas da Índia, investigando alterações cervicais decorrentes de mudanças hormonais. Essa pesquisa foi posteriormente estendida à mamíferos. Durante seus trabalhos, Papanicolaou desenvolveu uma técnica de confecção e coloração a qual recebeu seu próprio nome (COLEMAN, 1989).

Com a ajuda de outros profissionais com mesmo objetivo, Papanicolaou divulgou a importância da citologia, tornando-a um método reconhecido pela classe médica. Através de sua técnica de coloração, a morfologia das células cancerosas foi descrita o que o levou a incentivar o uso de tal técnica como método de rastreamento de câncer no colo do útero. Atualmente, a técnica de Papanicolaou é utilizada em todo o mundo e tem contribuído para a redução da mortalidade por câncer do colo uterino (COLEMAN, 1989; GOMPEL e KOSS, 1997; TUON, 2002; DERCHAIN, FILHO e SYRJANEN, 2005).

De um modo geral, podemos dividir a citologia como ginecológica e não-ginecológica. Na primeira temos a análise da região cervical feminina, sendo utilizada para triagem populacional no rastreio de lesões cervicais, além de avaliação da secreção vaginal. Em não-ginecológica, encontram-se os materiais procedentes de outras áreas do corpo como, por exemplo, mama, pulmão e cavidade abdominal (QUEIROZ e LIMA, 2000).

As amostras para exame citológico podem ser obtidas por meio de duas maneiras diferentes, que estão relacionadas com o tipo de citologia chamado. Quando a amostra for coletada por meio de esfoliação, raspado ou abrasão, chamamos de citologia esfoliativa. Já quando o é realizada uma punção, denominamos citologia aspirativa a qual pode ser representada pela Punção Aspirativa com Agulha Fina (PAAF). Os espécimes obtidos também podem ser provenientes de outros procedimentos, como por meio de broncoscopia em caso de lavado bronco-alveolar (COLEMAN, 1989; MCKEE, 1997; QUEIROZ e LIMA, 2000; DIGENE, 2004)

A citologia cérvico-vaginal é o principal método utilizado no rastreio do câncer do colo do útero, pois avalia e identifica graus de alteração celular do epitélio escamoso. Seu objetivo é identificar lesões malignas e pré-malignas, além de auxiliar no diagnóstico de infecções genitais e outras benignidades. O diagnóstico é feito a partir da análise de lâminas com esfregaço de secreção vaginal e material do colo uterino. Com a detecção precoce das lesões cancerosas com o auxílio da citologia, a mortalidade por câncer do colo do útero reduziu (TUON, 2002; DIGENE, 2004; ALBRING, BRENTANO e VARGAS, 2006; AMARAL et al, 2006; BUFFON, CIVA e MATOS, 2006).

Até a obtenção de um diagnóstico, a citologia compreende diversas etapas de processamento. Basicamente, a amostra é coletada sendo posteriormente fixada, corada e analisada microscopicamente. Os fixadores utilizados para citologia ginecológica são etanol a 95% e de cobertura. A coloração é a de Papanicoloau e os laudos são liberados de acordo com o Sistema Bethesda. No Brasil, há um sistema de nomenclatura que e baseado no Bethesda, porém, com algumas modificações (QUEIROZ e LIMA, 2000; JUNIOR, 2003; BUFFON, CIVA e MATOS, 2006; BRASIL, 2006).

Page 2: INTRODUÇÃO citologia

Cada atividade do manuseio do material citológico possui características e observações que devem ser seguidas, para que seu objetivo seja alcançado. Caso alguma falha durante a obtenção e o processamento da amostra ocorra, resultados erroneamente diagnosticados podem ser encontrados. Isso explica o grande problema da citologia, resultados falso-negativos, porém, falso-positivos também ocorrem, mas em menor freqüência (GOMPEL e KOSS, 1997; LORETO et al, 1997; QUEIROZ e LIMA, 2000; ARCURI et al, 2002; AMARAL et al, 2006).

HISTÓRICO DA CITOLOGIA

Os estudos celulares os quais são a base da citologia iniciaram no século XIX com o desenvolvimento industrial do microscópio óptico relacionado ao conhecimento de teorias relacionadas às células. Profissionais ligados à ciência começaram a analisar microscopicamente materiais humanos como sangue, pus e secreções, descrevendo a morfologia celular observada. Mais tarde, com mais recursos, passaram a ser estudadas as alterações celulares decorrentes da patologia das doenças e, com isso, foi se instalando a utilização da citologia como método de diagnóstico (COLEMAN, 1989; GOMPEL e KOSS, 1997).

Com a análise das células, foram criados atlas os quais contribuíram com os estudos posteriores. GOMPEL e KOSS (1997) relatam como primeiras publicações o atlas Donné, em 1845, e o livro de Pouchet, em 1847, os quais apresentavam desenhos das células vaginais. Posteriormente novas imagens foram surgindo e também tendo sua qualidade melhorada, uma vez que já demonstravam características relacionadas à patologias.

Além do avanço relacionado às imagens, os termos utilizados em citologia também foram enriquecendo. Alguns pesquisadores, com o auxílio de suas próprias criações, complementaram a decisão das características patológicas das células utilizando a histologia como referência, demonstrando também a importância da biópsia (GOMPEL e KOSS, 1997).

Em 1928 Babès e Papanicolaou tornaram a citologia um método conhecido, porém, a comunidade médica não o aceitou facilmente sendo necessária muita insistência. Outros pesquisadores colaboraram demonstrando a importância da citologia em lesões que ficam, de certo modo, ocultas no colo uterino. Nessa época de divulgação, a citologia se difundiu apenas em países industrializados, nos quais estudos demonstraram que tiveram sua taxa de câncer invasivo do colo uterino diminuída (GOMPEL e KOSS, 1997).

Com o grande entusiasmo devido sucesso na área ginecológica, Papanicolaou decidiu iniciar investigação de outros materiais como urina, lavado gástrico, ascite, secreção prostática e fluido espinhal. Além dele, outros pesquisadores podem ser citados como importantes contribuintes da citologia, entre eles: Alfred Donne e Lionel S. Beale (analisaram microscopicamente pus, sangue, ascite e urina), Dr F. Donaldson (estudos com células da superfície de tumores), Henri Lebert (observou células de tumores sólidos e císticos) e Johannes Müller (descreveu critério de microscopia que diferenciava tumores benignos e malignos de acordo com a quantidade de tecido conectivo) (COLEMAN, 1989).

Como resultados dos diversos trabalhos, foram descritos pleomorfismo estrutural, alterações nucleares e da relação núcleo-citoplasma, porém, não foram esclarecidos a origem das células tumorais e os mecanismos de divisão e replicação celular (COLEMAN, 1989). Um período de entusiasmo, assim definido por GOMPEL e KOSS (1997), se iniciou. A incidência de câncer cervical invasivo e a mortalidade relacionada diminuíram em grandes porcentagens o que fez com que fossem relatados apenas os pontos positivos relacionados à citologia. As deficiências foram ignoradas até que estudos passaram a mostrar a subjetividade do exame citológico, ressaltando os altos números de resultados falso-negativos. Muitos clínicos defendiam que a biópsia proporcionava resultados mais satisfatórios em comparação com a

Page 3: INTRODUÇÃO citologia

citologia, além de muitos exames serem diagnosticados erroneamente como inflamatórios devido amostra inadequada (COLEMAN, 1989).

Vários estudos se iniciaram em torno da citologia para corrigir as “falhas” relacionadas à ela como: população com acesso as campanhas de triagem, técnicas de colheita e fixação da amostra e estabelecimento de normas para coloração, varredura das lâminas e interpretação microscópica (GOMPEL e KOSS, 1997). Após muito trabalho dos pesquisadores, a citologia passou a ser um método de diagnóstico aceito como uma especialidade. Ela se divide de acordo com a técnica utilizada na coleta do material. Para materiais obtidos por meio de raspados ou escovados, chamamos citologia esfoliativa, enquanto para materiais coletados por aspirados ou punção chamamos citologia aspirativa (DIGENE 2004; COLEMAN, 1989). A citologia esfoliativa teve como seus iniciantes Julius Vogel, o qual examinou e diagnosticou um tumor próximo à mandíbula, e Lionel S. Beale que diagnosticou 19 um câncer de faringe.

Ambos obtiveram o diagnóstico por meio da citologia esfoliativa (COLEMAN, 1989). Com o passar dos anos a citologia foi se difundindo para as mais diversas áreas como micologia (ARAÚJO et al, 2003), bacteriologia (CUSTÓDIO et al, 2003) e patologia anal (SILVA et al, 2005). A citologia cérvico-vaginal, principal representante da citologia, se tornou exame de rotina para as mulheres (ARCURI et al, 2002). Atualmente, a técnica de Papanicolaou é utilizada em todo mundo por clínicas e hospitais como primeira linha de investigação de suspeita de doença maligna, contribuindo com a diminuição da incidência de câncer de colo uterino (COLEMAN, 1989).

Para um exame com qualidade é importante que as etapas de sua realização sejam bem feitas, como coleta/colheita, preservação da amostra, preparo das lâminas e interpretação diagnóstica (DIGENE, 2004). Como o controle de qualidade usual em laboratórios de citologia é baseado na revisão de alguns exames, apenas os erros de má interpretação podem ser detectados. Diagnóstico falso-negativo por ausência de material diagnóstico não é descoberto porque sua fonte de erro é a coleta inadequada de material (ARCURI, 2002).

COLETA DO MATERIAL

Podemos separar a coleta de acordo com o material a ser analisado, ou melhor, de acordo com a procedência do material. A citologia fica divida em dois grandes grupos: citologia ginecológica e citologia não-ginecológica. De um modo geral, os materiais podem ser processados de forma direta, sendo centrifugados ou citocentrifugados. Apesar dos cuidados exclusivos para cada grupo, são indicadas algumas recomendações para a realização dos exames citológicos em geral (MOURA, 1998):

- Materiais viscosos, secreções vaginal e prostática por exemplo, devem ser imediatamente fixados de modo que não sequem ao ar antes; as lâminas são mergulhadas em álcool 95%.

- Materiais líquidos que necessitam realização de concentração celular, como urina, líquido pleural e líquido ascítico.

Citologia Ginecológica

QUEIROZ e LIMA (2000) relatam que Bebes, em 1928, utilizava uma alça de platina para a coleta cervical, sendo esse o primeiro instrumento utilizado. Já Papanicolaou e Traut, por meio de uma pipeta de vidro, aspiravam o fluido vaginal, sendo ele a amostra a ser observada. Anos mais tarde, em 1944, o médico canadense Ayre, criou uma espátula de madeira para realizar uma “biópsia de superfície”, método que foi utilizado após sua publicação, em 1947.

Page 4: INTRODUÇÃO citologia

A espátula projetada por Ayre apresenta um pequeno problema que é a coleta insuficiente de células endocervicais. Com o objetivo de corrigir a deficiência da coleta com a espátula de Ayre, Koss e Hicklin propuseram usar swab umedecido em salina como complemento para coletar as células endocervicais. O resultado não foi atingido devido suavidade e formato do cotonete (swab) (QUEIROZ e LIMA, 2000).

O swab foi então substituído pela escovinha que, além de apresentar bons resultados na coleta do material endocervical, preserva melhor as células devido a presença do muco que é coletado junto, evitando dessecação. A utilização da espátula de Ayre junto da escovinha, possibilita a observação de maior número de células endocervicais se comparada à utilização exclusiva da espátula ou combinada com o swab (QUEIROZ e LIMA, 2000). A citologia ginecológica pode ser utilizada para diferentes finalidades, como (GOMPEL e KOSS, 1997; MOURA, 1998; QUEIROZ e LIMA, 2000):

- Estudo oncológico: compreende a análise de alterações morfológicas que podem anteceder e/ou demonstrar uma patologia, como um tumor. Podem ser encontradas células pré-neoplásicas e neoplásicas, além de ser possível avaliar a presença de neoplasia primária ou metastática. O material coletado é obtido de três regiões: orifício cervical, ectocérvice e parede da vagina, sendo este último pouco utilizado. Pode ser realizada coleta única (material das três regiões coletados simultaneamente com mesmo instrumento) ficando três esfregaços em uma lâmina, ou tríplice (mais de um instrumento utilizado), podendo ser feito o esfregaço de cada região em uma lâmina ou os três em uma única lâmina.

- Estudo hormonal: verificar alterações morfológicas decorrentes de mudanças hormonais, ou seja, avaliar a função ou atividade hormonal. O material é colhido do terço superior da parede lateral da vagina, sendo feito apenas um esfregaço por lâmina.

Além dos objetivos acima citados, a citologia ginecológica também é utilizada para contribuir como diagnóstico de infecções genitais por Papiloma vírus, Cândida spp, Herpes vírus, Trichomonas vaginalis, Actinomyces spp, Gardnerella vaginalis e outras bactérias inespecíficas. Outras benignidades como adenose vaginal e endometriose, por exemplo, podem também ter seu diagnóstico auxiliado pela citologia (QUEIROZ e LIMA, 2000). Para qualquer caso, são preparadas duas lâminas para cada paciente (QUEIROZ e LIMA, 2000). GOMPEL e KOSS (1997) dividem a colheita do material ginecológico em relação ao local de procedência:

- Esfregaço vaginal: é feito com abaixador de língua, ou parte arredondada da espátula de Ayre ou da pipeta de vidro. São obtidas secreções contendo células descamadas das mucosas vaginais e cervicais, muco, leucócitos, macrófagos e detritos celulares necróticos em vias de eliminação; bactérias, vírus e parasitas também podem aparecer. É possível obter uma diversidade das células do trato genital, porém, permanece uma pobreza de células malignas quando há um tumor cervical. O esfregaço vaginal é considerado mais eficaz que o cervical na detecção de tumores endometriais, tubários, ovarianos ou metastáticos, os quais são todos raros.

- Esfregaço cervical: utilização da espátula de Ayre a qual, devido sua forma, permite coletar da superfície da ectocérvice (parte “chata”), da endocérvice (braço alongado) e também da zona de transição (região côncava). Também pode-se usar a escova Cervex pois coleta simultaneamente material da endo e ectocérvice. Deve ser lembrado que QUEIROZ e LIMA (2000) indicam o uso combinado da espátula com a escova para obtenção de melhores resultados.

Para a realização de um exame citológico com qualidade, algumas recomendações devem ser seguidas como: abstinência sexual por 24 horas pelo menos, não fazer higiene vaginal no

Page 5: INTRODUÇÃO citologia

dia do exame, não usar ducha vaginal desde a véspera e nem medicamentos por no mínimo 48 horas. Além disso, o especulo vaginal não pode ser lubrificado (MOURA, 1998). Os laboratórios que realizam esse tipo de exame fornecem as informações adequadas às pacientes, oralmente ou por meio de um “manual”. Como exemplo, orientações fornecidas pelo laboratório Criesp em sua página na internet as quais se encontram no Anexo I.

Em citologia ginecológica são utilizados dois tipos de coleta do material: esfoliação ou abrasão. A citologia esfoliativa compreende a coleta das células que descamaram espontaneamente sendo realizada com uma espátula. Já na citologia abrasiva é realizado um raspado da mucosa com o objetivo de soltar as células do epitélio o que é feito com uma escova (GOMPEL e KOSS, 1997; ILLESCAS, 2006)

Coloração

O método de coloração mundialmente utilizado em citologia ginecológica é o Papanicolaou o qual possui o nome do seu próprio criador, George N. Papanicolaou. Ele é composto de um corante nuclear (hematoxilina) e dois corantes citoplasmáticos (Orange G e EA) (COLEMAN, 1989; QUEIROZ e LIMA, 2000; JUNIOR, 2003; DIGENE, 2004).

A coloração de Papanicolaou é baseada na diferença do tamanho das moléculas dos corantes, onde quanto menores elas forem, mais fácil sua entrada e saída das células, ou seja, sua penetração e remoção (QUEIROZ e LIMA, 2000). Existem dois meios de coloração com o método de Papanicolaou (CUNHA, 1987; QUEIROZ e LIMA, 2000; JUNIOR, 2003):

- Progressivo: a coloração ocorre progressivamente até a intensidade de cor desejada ser encontrada, eliminando a descoloração com ácido clorídrico e água. Esse método utiliza hematoxilina de Mayer, Delafieild’s, Gill-Baker-Mayer e Gill. É mais utilizado para materiais não ginecológicos, porém, é usada para todos os materiais na maioria dos laboratórios.

- Regressivo: é realizada uma sobrecoloração, ou seja, coloração excessiva com hematoxilina não acidificada, sendo o excesso posteriormente removido com ácido clorídrico diluído. A hematoxilina de Harris é o tipo de corante utilizado para esse método o qual é pouco utilizado nos laboratórios.

CUNHA (1987), QUEIROZ e LIMA (2000) e JUNIOR (2003) relatam as vantagens da técnica de Papanicolaou, as quais justificam seu uso: transparência celular o que permite diferenciação das células mesmo quando estão sobrepostas, definição de detalhes nucleares e diferenciação celular. De um modo sucinto, as etapas da coloração são:

1º Fixação

2º Hidratação

3º Coloração nuclear

4º Desidratação

5º Coloração citoplasmática com contracorantes

6º Clareamento e montagem das lâminas.

Diversos autores demonstram protocolos para a coloração de Papanicoalou onde o que os diferencia, na maioria das vezes, é o tempo de mergulho nas cubetas. QUEIROZ e LIMA (2000) destacam ser muito importante ter um roteiro de coloração, com tempos de permanência em hematoxilina e EA bem definidos, para serem obtidos resultados

Page 6: INTRODUÇÃO citologia

satisfatórios. No Anexo III são observados alguns protocolos de coloração com sua respectiva referência.

O xilol presente nas últimas etapas de coloração é a solução responsável pela etapa de clareamento, a qual fica entre a desidratação e a montagem, e proporciona a transparência celular (QUEIROZ e LIMA, 2000). A determinação do uso e da ordem de aplicação das substâncias está ligada à ação exercida por elas na coloração. QUEIROZ e LIMA (2000) explicam sucintamente tais critérios:

- Após os corantes, as lâminas são mergulhadas em seus solventes: hematoxilina água destilada (remove a hematoxilina não ligada); orange G e EA álcool;

- O HCl remove hematoxilina do citoplasma uma vez que retém o corante apenas no núcleo. Essa etapa é chamada de diferenciação e resulta com o citoplasma descorado. Ela é seguida pela água destilada a qual interrompe sua ação. A concentração do HCl varia, podendo ser 0,2%, 1%, 0,25% ou 0,5%;

- Se for utilizada água corrente no lugar de água destilada, deve-se medir o pH e a concentração de cloro, pois se presente em grande quantidade altera o pH, podendo desbotar a coloração das amostras;

- O álcool após o Orange G e Policromo tem como função retirar o corante não ligado ao citoplasma. Os últimos mergulhos em álcool absoluto removem toda água do esfregaço e, por isso, essa etapa é chamada de desidratação a qual deixa a lâmina pronta para a montagem;

- O xilol não é corado e nem quimicamente reativo e seu índice de refração eleva o do esfregaço, tornando ele transparente. No seu primeiro banho ele remove o álcool enquanto no segundo ele aumenta a transparência do esfregaço e o prepara para a fase de montagem.

Comercialmente, existem substitutos para o xilol, porém, devem ser feitas adaptações para uso deles nas etapas de montagem e clareamento. O Clearium é um clareador de uso corrente que permite a passagem direta, da lâmina, do último álcool para o meio de montagem, eliminando o xilol (QUEIROZ e LIMA, 2000).

Ao final da coloração, as lâminas passam por uma etapa chamada “montagem” na qual é utilizada uma substância que liga de modo permanente lâmina e lamínula. Os agentes normalmente utilizados são bálsamo de Canadá e Entelam® (CUNHA, 1987; GOMPEL e KOSS, 1997; JUNIOR, 2003). Os corantes utilizados para a coloração de Papanicolaou são detalhados a seguir. Os métodos de preparação deles são apresentados no Anexo IV.

Hematoxilina de Harris

A hematoxilina é um corante básico que cora ácido, o que explica sua afinidade pela cromatina. É, portanto, um corante nuclear o qual é natural e possui diversas formulações. Para torná-la um corante nuclear de uso, além de ser diluída em água, são necessários os componentes a seguir (QUEIROZ e LIMA, 2000; JUNIOR 2003):

- Agente oxidante: transforma a hematoxilina em hemateína, ou seja, torna o corante ativo, porém, ainda com pouca afinidade nuclear. Exemplos: óxido de mercúrio e sódio iodato;

- Mordante: agente que induz a cor do corante, formando uma ligação da hemateína com ácidos nucléicos e proteínas nucleares o que revela a cromatina nuclear. É composto por íons metálicos como o sulfato de alumínio, conhecido como Alumen;

- Solvente: dissolve a hemateína na solução e reduz a taxa de oxidação;

Page 7: INTRODUÇÃO citologia

- Acidificante: garante a seleção do material nuclear e ajuda na prevenção da oxidação do corante.

O modo que a hematoxilina cora, pode ser representado da seguinte forma

(QUEIROZ e LIMA, 2000):

Orange G

É um corante ácido que cora a queratina de laranja. É composto de: solução aquosa ou alcoólica do corante aniônico orange G, ácido fosfotúngstico, álcool etílico a 95% e, opcionalmente, ácido acético glacial (CUNHA, 1987; GOMPEL e KOSS, 1997; QUEIROZ e LIMA, 2000; JUNIOR, 2003).

O Orange G é uma pequena molécula com capacidade de penetrar nas hemácias e nas células com ceratina ou precursores de ceratina, corando-os de laranja intenso e brilhante. O ácido fosfotúngstico atua como mordente, intensificando a cor alcançada. Esse corante deve ser guardado em frasco escuro, ao abrigo da luz, e deve ser filtrado no momento do uso (QUEIROZ e LIMA, 2000; JUNIOR 2003).

EA

É um corante policrômico o qual cora estruturas celulares de rosa pela ação da eosina Y ou de verde ou azul através do verde brilhante. Seus componentes básicos (QUEIROZ e LIMA, 2000; JUNIOR 2003):

- Verde luz ou verde brilhante SF: conhecido como light green; é um corante ácido que cora de verde-azul o citoplasma de células com metabolismo ativo, como:

OXIDAÇÃO* células intermediárias, parabasais, colunares, histiócitos, leucócitos, carcinomas indiferenciados de grandes e pequenas células e células de adenocarcinoma.

- Eosina Y: corante ácido o qual cora de rosa citoplasma de células escamosas superficiais, nucléolos, mucina endocervical, eritrócitos e cílios.

A fórmula original continha ainda como componente o Pardo de Bismark. Ele não adiciona uma coloração característica ao citoplasma, o que o eliminou em várias formulações. Seu uso, portanto, é considerado opcional. No preparo do corante, ele é encontrado associado com ácido fosfotúngstico e ácido acético, em alguns protocolos (QUEIROZ e LIMA, 2000).

Existem três formulações desse corante: EA 36, EA 50 (fórmula comercial) e EA 65 que se diferenciam de acordo com a intensidade da cor da coloração. É possível utilizar qualquer fórmula para qualquer material, o que depende da preferência do profissional. EA 36 é a fórmula original de Papanicolaou (QUEIROZ e LIMA, 2000; JUNIOR 2003).

A formulação EA 65 possui metade da quantidade do verde brilhante do EA, mas eosina e pardo de Bismark em mesma quantidade. Sua composição é específica para preparados não ginecológicos, principalmente espessos. Para amostras ginecológicas, pode ser usado para ajudar na diferenciação de adenocarcinomas endocervicais dos endometriais (QUEIROZ e LIMA, 2000).

Page 8: INTRODUÇÃO citologia

Para citologia ginecológica o EA 36 é o tipo normalmente utilizado. Em sua formulação, além dos componentes acima citados, ele possui o ácido fosfotúngsticoo qual é um ácido de competição que contribui na coloração pelo verde brilhante SF

(GOMPEL e KOSS, 1997; QUEIROZ e LIMA, 2000).

Fonte: Monografia - Gabriela Tramontina

Citologia Cérvico-vaginal normal e Citologia Hormonal.

Prof. Dr. Halbert Villalba

Citologia Genital Normal

Células Escamosas

Superficiais

Intermediárias

Parabasais

Células basais quase nunca são observadas em citologia.

Células Escamosas Superficiais:

Geralmente são observadas de forma isolada e raramente em aglomerados.

Diâmetro de 40 a 60um

Núcleo denso e picnótico (diâmetro de 5 a 7um), com halo claro estreito

Citoplasma: achatado, transparente, poligonal e eosinofílico, geralmente com grânulos pequenos e perinucleares (lipídios).

Fase estrogênica são melhor observadas.

Pode-se observar células escamosas superficiais anucleadas ou escamas – extrema queratinização celular – coloração amarelada ou alaranjada clara.

Grande quantidade dessas células deve-se considerar queratinização excessiva epitelial – leucoplasias (lesão branca clinicamente visível – colposcopia).

Células Escamosas Intermediárias:

Medem cerca de 30 a 40um

Isoladas, lâminas ou aglomerados celulares.

Fase lútea do ciclo mestrual é comum observar aglomerados de células intermediárias.

Núcleo aberto (vesicular) redondo a ovalado (8 a 10um).

Page 9: INTRODUÇÃO citologia

Cromatina finamente granulada.

Configuração elíptica a esférica (alongadas e fusiformes).

Citoplasma rico em glicogênio cianofílico, raramente eosinofílico e com vacúolos pequenos. Parte periférica mais escura que a central, pregueado durante a fase lútea do ciclo menstrual.

A quantidade de glicogênio depende da situação hormonal da paciente.

Gravidez – núcleo deslocado para periferia (gânulos corados em amarelo Pap.) – forma de barco – células naviculares.

Podem formar pérolas córneas:

Núcleos normais – normalidade.

Anomalias nucleares – carcinomas.

Citólise – células com núcleos nús.

Presença de numerosos núcleos isolados e detritos celulares, muitas vezes pela ação de bastonetes e lactobacilos, os quais metabolizam o glicogênio.

Fase pré-menstrual e gravidez.

Células Escamosas Parabasais:

Medem cerca de 15 a 30um.

Núcleo volumoso, ocupa grande porção celular idêntico ao das células intermediárias.

Apresentam-se isoladamente.

Formato ovalado a esférico (esfoliação espontânea).

Alongamento ou deformação em casos de remoção traumática (esfregaços) – formam lâminas ou agrupamentos celulares.

Citoplasma cianofílico e bem demarcado.

Em mulheres em menopausa podem ser as células dominantes nos esfregaços, ou em mulheres jovens por infecção ou trauma.

Células Endocervicais:

O aspecto das células endocervicais, nos esfregaços vaginais, é bastante variável e depende da forma que estão posicionadas.

Maior eixo – células colunares, com 20 a 30um de comprimento e 8 a 10um de diâmetro.

Page 10: INTRODUÇÃO citologia

Citoplasma é transparente e o núcleo esférico.

Podem formar arranjos em paliçada.

Favos de mel – agrupamentos poligonais, células em forma aplainada.

Parâmetro de boa técnica de esfregaço.

Dependem do ciclo menstrual:

Período estrogênico – citoplasma relativamente denso e cianofílico e o núcleo é elíptico ou esférico.

Fase secretora – citoplasma distendido por muco claro e abundante, deslocar o núcleo em direção à base da célula – presença de pequenas projeções nucleares (papilas) – núcleo irregular.

Bordas ciliadas – grande número de células significa metaplasia tubária.

Corpúsculo ciliado – ciliocitoftoria.

Células Endometriais:

O endométrio dá dois tipos de células:

Colunares ou cubóides – provenientes da superfície e das glândulas endometriais.

Células pequenas – provenientes do estroma endometrial.

O aspecto dessas células depende da técnica empregada, sendo diferentes quando ocorre descamação espontânea da remoção por esfregaços.

Mulheres em idade fértil:

Nos esfregaços o número de células diminuiu até o 12 dia do ciclo.

Após 12 dias ou em mulheres na menopausa a presença de células endometriais nos esfregaços deve ser considerada patológica.

Durante o fluxo menstrual elas aparecem isoladas, agrupadas ou em lâminas, juntamente com eritrócitos e células inflamatórias.

Células pequenas, formato ovalado, cubóide ou raramente cilíndrica.

Núcleo esférico.

Citoplasma cianofílico com vacuolização fina ou grosseira (praticamente invisível).

São mais comuns nos 10 primeiros dias do ciclo.

Do 5 a 7 dia do ciclo ocorre o êxodo – agrupamentos de células estromais do endométrio junto com histiócitos.

Page 11: INTRODUÇÃO citologia

Quando as células endometriais são aspiradas, apresentam morfologia melhor preservada.

Fase proliferativa – grupos celulares em forma de favo de mel ou em paliçada – semelhante às células endocerivicais (difícil diferenciação ou impossível);

Fase secretora – Aumentam de tamanho, passam a apresentar núcleos maiores e acumulam depósitos de glicogênio no interior de vacúolos citoplasmáticos.

Células Endometriais:

Endométrio pós-menopausa:

Quando observadas em mulheres pós-menopausa, são patologias como hiperplasias ou carcinomas de endométrio, ou podem surgir decorrente ao tratamento com estrogênios.

Aconselha-se nesses casos seguir a investigação.

Citologia Hormonal

Prof. Dr. Halbert Villalba

O processo de amaturação do epitélio escamoso não queratinizado que reveste a porção infravaginal do colo e a vagina é controlado por hormônios.

Estrogênios – induz maturação epitelial completa com predominância de células escamosas superficiais maduras nos esfregaços.

Progesterona – efeitos contrários ao estrógeno – inibe o processo de maturação.

Queda ou ausência de estrógeno – leva a atrofia – redução do nível de maturação do epitélio escamoso.

O epitélio glandular endocervical também reflete as condições hormonais, mais discretamente e de difícil avaliação.

A avaliação hormonal da mulher por meio de citologia esfoliativa deve ser realizada só de material retirado da parede vaginal lateral.

Os espécimes citológicos devem ser acompanhados de dados clínicos, idade, data da última menstruação, tratamento hormonal, cirúrgico ou radioativo.

Fixação normal com álcool absoluto.

Condições que impedem a avaliação hormonal:

Page 12: INTRODUÇÃO citologia

Infecções

Vaginose bacteriana

Presença de escamas anucleadas devido a hiperqueratose

Citólise

Indicações para citologia hormonal:

Avaliação de função ovariana em mulheres histerectomizadas

Avaliação de função ovariana em mulheres com desrodens menstruais

Avaliação de função ovariana na infância

Avaliação de prognóstico e guia de conduta de gravidez, com possível desequilíbrio hormonal e abortos habituais.

Diagnóstico de persistência folicular.

Avaliação da função ovariana em mulheres climatéricas e pós-menopausa.

Guia de Terapia de Reposição Hormonal (TRH) quanto à duração do efeito e eficácia.

Diagnóstico de tumor produtor de hormônio na infância e pós-menopausa.

Biópsias são mais precisas quanto ao diagnóstico.

Índices para avaliação cito-hormonal:

Índice cariopicnótico – relação entre células superficiais maduras com células intermediátias maduras.

Índice eosinofílico – relação entre células eosinofílicas com células cianofílicas.

Índice de células dobradas – relação de células maduras dobradas, com células escamosas maduras planas.

Índice de células agrupadas – relação de células escamosas em grupos de 4 ou mais células, com células isoladas ou em pequenos grupos menores de 4 células.

Índice de maturação (de Frost) – relação de células parabasais com intermediárias e superficias expressas em números relativos (IM = parabasais: intermediárias: superficiais).

Padrão cito-hormonal:

Recém-nascida – semelhante ao da mãe ao tempo do parto (predominância de células intermediárias com poucos leucócitos PMN);

Page 13: INTRODUÇÃO citologia

10 semanas a fase pré-púbere – padrão de imaturidade (microbiota cocóide, leucócitos PMN e células parabasais [padrão atrófico])

Esperado ser visto também no climatério e na pós- menopausa.

10 semanas a fase pré-púbere, climatério e pós-menopausa.

Menacme (período entre a menarca e a menopausa) – apresenta padrão citológico cíclico, com duas fases separadas pelo período ovulatório.

Crescente de maturidade celular (até a ovulação);

Decrescente de maturidade celular (após a ovulação).

Leitura do esfregaço hormonal:

O efeito estrogênico é estimado pela observação da maturação do epitélio vaginal.

Para este propósito, a contagem diferencial é feita.

Só células escamosas morfologicamente normais são contadas.

Célula superficial = 1,0

Célula intermediária = 0,5

Célula parabasal = 0,0

Valor de Maturação = percentagem de cada uma dessas células é multiplicado pelo número correspondente e o resultado somado.

VM = (parabasais x 0) + (intermediárias x 0,5) + (superficiais x 1).

Exemplos de achados normais para valores de maturação.

Recém- nascida = VM (60 – 70)

Infância = VM (0 – 30)

Puberdade = VM (50 – 60)

Menacme = VM (60 – 90)

Gravidez = VM (50 – 69)

Lactação = VM (0 – 40)

Menopausa = VM (0 – 40).