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7/21/2019 Introdução Geral http://slidepdf.com/reader/full/introducao-geral-56f796e0d6364 1/2 Antigo Testamento II  Históricos e Poéticos 1 INTRODUÇÃO GERAL Os Salmos, Jó e os Provérbios, nas Bíblias hebraicas, formam um grupo à parte, com a denominação de Livros poéticos. No uso comum, cristão e moderno, porém, acrescentam- se-lhes também o Eclesiastes e Cântico dos Cânticos; e é freqüente entre os estudiosos gregos bem como entre os autores modernos, estender a todos o nome de Livros poéticos. E com razão; pois o Cântico dos Cânticos e Eclesiastes são escritos em versos como os Provérbios. Eclesiastes possui forma poética, embora menos rigorosa. Trata-se, portanto, de um elemento comum a todos esses livros. São também chamados livros didáticos ou sapienciais, por falarem muito de sabedoria; os salmos são na máxima parte de gênero lírico, sem, todavia, lhes faltar o elemento didático; o gênero do Cântico dos Cânticos é exclusivamente o lírico. De resto, lírico e didático são os dois gêneros de poesia cultivada pelos hebreus. O que caracteriza toda a poesia hebraica é o chamado paralelismo. Ordinariamente, o verso compõe-se de dois membros ou hemistíquios, que repetem idéias e palavras que se correspondem quanto ao sentido (paralelismo sinonímico), como,  por exemplo: “Quando Israel saiu do Egito, e a casa de Jacó do meio dum povo bárbaro, Judá ficou  sendo o santuário de Deus, e Israel o seu domínio" (Sl 114.1-2). Outra forma de paralelismo é paralelismo antitético que destaca o mesmo conceito  por meio de contrastes, como, por exemplo: "Um filho sábio é a alegria de seu pai, porém um filho insensato é a tristeza de sua mãe" (Pv 10.1). O segundo hemistíquio não é, às vezes, a repetição, e sim o complemento do  primeiro (paralelismo sintético ou progressivo), como, por exemplo: "Com a minha voz clamei ao Senhor, e ele ouviu-me do seu santo monte" (Sl 3.4). A observância dos paralelismos ajuda a compreensão do verso, visto que a segunda  parte repete e, muitas vezes, esclarece obscuridades ou figuras contidas no primeiro hemistíquio. Deve-se notar de maneira especial que freqüentes vezes os dois hemistíquios  paralelos apresentam cada um uma parte e aspecto da idéia, e unidos formam um só conceito. O citado Pv 10.1 quer significar que o filho sábio é a glória dos pais, ao passo que o insensato causa-lhes tristeza. A poesia do Velho Testamento é a mais significativa contribuição do povo hebreu à literatura universal, tal e qual outro qualquer povo, sua literatura primitiva era poética. Não dispomos, no Velho Testamento, de um conjunto completo dos escritos poéticos israelitas; apenas alguns poemas de significação religiosa foram incluídos nos livros sagrados e nem todos estão no cânon. Diz-se que "Salomão produziu mais de três mil provérbios e mil e cinco odes ou cantos". Comentaristas bíblicos destacam algumas produções literárias das coleções de  poesias conhecidas como "As guerras de Yahweh" (Nm 21.14) e "O livro de Jasar" (Js 10.13). Essa poesia lírica era essencialmente popular no antigo Israel, o que atesta o número de sinônimos em hebraico nos "hinos", dos quais há pelo menos treze. Somente as idéias comuns admitem muitas e diferentes palavras para expressá-las. A existência em hebraico - língua pobre de sinônimos  –  de treze palavras para indicar hino ou canto, sugere o largo cultivo da poesia no antigo Israel.

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Antigo Testamento II – Históricos e Poéticos 1 

INTRODUÇÃO GERAL

Os Salmos, Jó e os Provérbios, nas Bíblias hebraicas, formam um grupo à parte, coma denominação de Livros poéticos. No uso comum, cristão e moderno, porém, acrescentam-se-lhes também o Eclesiastes e Cântico dos Cânticos; e é freqüente entre os estudiososgregos bem como entre os autores modernos, estender a todos o nome de Livros poéticos. Ecom razão; pois o Cântico dos Cânticos e Eclesiastes são escritos em versos como osProvérbios. Eclesiastes possui forma poética, embora menos rigorosa. Trata-se, portanto, deum elemento comum a todos esses livros.

São também chamados livros didáticos ou sapienciais, por falarem muito desabedoria; os salmos são na máxima parte de gênero lírico, sem, todavia, lhes faltar oelemento didático; o gênero do Cântico dos Cânticos é exclusivamente o lírico. De resto,lírico e didático são os dois gêneros de poesia cultivada pelos hebreus.

O que caracteriza toda a poesia hebraica é o chamado paralelismo.Ordinariamente, o verso compõe-se de dois membros ou hemistíquios, que repetem

idéias e palavras que se correspondem quanto ao sentido (paralelismo sinonímico), como, por exemplo:

“Quando Israel saiu do Egito, e a casa de Jacó do meio dum povo bárbaro, Judá ficou  sendo o santuário de Deus, e Israel o seu domínio" (Sl 114.1-2).

Outra forma de paralelismo é paralelismo antitético que destaca o mesmo conceito por meio de contrastes, como, por exemplo:

"Um filho sábio é a alegria de seu pai, porém um filho insensato é a tristeza de suamãe" (Pv 10.1).

O segundo hemistíquio não é, às vezes, a repetição, e sim o complemento do primeiro (paralelismo sintético ou progressivo), como, por exemplo:

"Com a minha voz clamei ao Senhor, e ele ouviu-me do seu santo monte" (Sl 3.4).A observância dos paralelismos ajuda a compreensão do verso, visto que a segunda

 parte repete e, muitas vezes, esclarece obscuridades ou figuras contidas no primeirohemistíquio.

Deve-se notar de maneira especial que freqüentes vezes os dois hemistíquios paralelos apresentam cada um uma parte e aspecto da idéia, e unidos formam um sóconceito.

O citado Pv 10.1 quer significar que o filho sábio é a glória dos pais, ao passo que oinsensato causa-lhes tristeza.

A poesia do Velho Testamento é a mais significativa contribuição do povo hebreu à

literatura universal, tal e qual outro qualquer povo, sua literatura primitiva era poética. Nãodispomos, no Velho Testamento, de um conjunto completo dos escritos poéticos israelitas;apenas alguns poemas de significação religiosa foram incluídos nos livros sagrados e nemtodos estão no cânon.

Diz-se que "Salomão produziu mais de três mil provérbios e mil e cinco odes oucantos". Comentaristas bíblicos destacam algumas produções literárias das coleções de

 poesias conhecidas como "As guerras de Yahweh" (Nm 21.14) e "O livro de Jasar" (Js10.13). Essa poesia lírica era essencialmente popular no antigo Israel, o que atesta o númerode sinônimos em hebraico nos "hinos", dos quais há pelo menos treze. Somente as idéiascomuns admitem muitas e diferentes palavras para expressá-las. A existência em hebraico -

língua pobre de sinônimos  –   de treze palavras para indicar hino ou canto, sugere o largocultivo da poesia no antigo Israel.

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Antigo Testamento II – Históricos e Poéticos 2 

As linhas da poesia hebraica são vigorosamente agrupadas. Em alguns poemas, asestrofes são facilmente distinguidas. Ocasionalmente, o estribilho ou “coro” vem ao  fim decada estrofe (Ver Salmo 107.8,15,21,31). Há poucas ocorrências de rimas na poesiahebraica. Em Juízes 16.24 temos o que se chamou "um hino formado de uma rima única".Há uma rima repetida no primeiro verso do Salmo 14. O autor de Isaías 40-66,ocasionalmente, faz alguma rima. Em outras palavras, a poesia de Israel omite essacaracterística, tão essencial à nossa idéia de poesia. C. C. Torrey sugere que talvez a poesiasecular hebraica usasse mais a rima do que a canônica, e os escritores sagrados a tinhamcomo "demasiado vulgar para ser empregada em composições sérias". Seja essa a razão ounão, a poesia bíblica emprega, de preferência, os chamados “versos livres”, mais do quequalquer outra forma.

A efetividade da poesia hebraica é grandemente devida à sua liberdade de abstrações.Sempre apela aos sentimentos fundamentais. No intuito de expressar seu desespero, oSalmista designa as sensações que o caracterizam, com as expressões "minha garganta estáseca", "meus olhos falham", "eu mergulho em profundas dificuldades e não encontro lugarfirme". O terror da noite é expresso por Elifaz (Jó 4.12-17), com o tremor dos ossos, silênciomortal e a visão de objetos indefinidos.

Quando o autor do Salmo 65.9-13 apresenta o que Deus está fazendo com a terra quecriou, o faz em termos de uma ardente sensação num dia quente de primavera. Não háresultado mais trágico do que a interpretação de uma passagem poética por um teólogo

 prosaico. Nunca tiveram melhor aplicação no caso, as palavras de Paulo: "... a letra mata,mas o Espírito vivifica..." (2Co 3.6).

O poeta deve ter a liberdade de dizer as coisas da maneira que quiser e, muitas vezes,lida com sentimentos e aspirações que se perdem no realismo da linguagem. Como Jacó,que lutou com um anjo. Isto deve ser lido com simpatia espiritual e cooperação. Suas

 palavras simples não devem ser consideradas como cortesias etimológicas, nem suasafirmativas isoladas como fórmulas teológicas.É muito fácil perceber-se o absurdo de uma interpretação literal da poesia.

Sabem todos que isso não deve ser feito. Quando se lê no Cântico de Débora: "...doscéus lutaram as estrelas, de suas órbitas lutaram contra Sísera...", o leitor verifica logo queas estrelas não brandiram suas espadas e entraram em luta. É apenas uma figura poética, deimaginação, que apresenta o fato de que todo o universo de Deus estava aguerrido contra talhomem maligno. Outra vez, quando o livro de Jó se refere ao tempo da criação "...quando asestrelas da manhã cantaram juntas..." (Jó 38.7), o leitor não deve imaginar uma reunião deestrelas cantando um hino, mas admitir que o poeta deseja apresentar-nos a alegria do

universo de Deus na linguagem da imaginação. O autor do Salmo 114, descrevendo alibertação dos israelitas do Egito, assim se expressa: "O mar o viu e transbordou; o Jordãovoltou a sua correnteza. As montanhas pularam como carneiros, as colinas, comocordeiros". Nada mais jocoso seria tomar-se esse quadro literalmente. Interpretar-se as

 passagens poéticas do Velho Testamento de qualquer outra forma além da exaltação comose apresentam é ignorar o método divino que escolhe poetas acima de todos os outros, a fimde acenar aos homens do passado e do futuro, ao qual nenhum estranho tem acesso.