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1
H. S. Botelho de Miranda Alexandre J. M. Leite
(Prof. Auxiliar) (Assistente)
INVENTÁRIO HIDROGEOLÓGICO DOS
TERRENOS DO POLO III DA UNIVERSIDADE DO PORTO
(CAMPO ALEGRE)
2
ÍNDICE
1 - INTRODUÇÃO. OBJECTIVOS DO TRABALHO
2 - METODOLOGIA USADA
3 - LOCALIZAÇÃO
4 - ENQUADRAMENTO GEOLÓGICO
5 - LEVANTAMENTO DE DIACLASES E FRACTURAS
6 - PERMEABILIDADE DOS GRANITOS E DAS FORMAÇÕES SEDIMENTARES
7 - ALTERAÇÃO DO REGIME DE ESCOAMENTO NA ZONA DO CAMPO
ALEGRE
8 - CAPTAÇÕES DESAPARECIDAS NA ÁREA DO POLO III E NA SUA
ENVOLVENTE DE INFLUÊNCIA
8.1 - CAPTAÇÕES AFECTADAS OU DESTRUÍDAS
9 - INVENTÁRIO DE RECURSOS HÍDRICOS DA ÁREA DO POLO III E SUA
ENVOLVENTE, SUSCEPTÍVEIS DE MOBILIZAÇÃO / VALORIZAÇÃO
IMEDIATA OU QUASE IMEDIATA
9.1 - MINAS NOS TERRENOS UNIVERSITÁRIOS
9.2 - MINAS EXTERIORES AOS TERRENOS UNIVERSITÁRIOS
10 - IMPACTE DAS NOVAS CONSTRUÇÕES UNIVERSITÁRIAS SOBRE A
HIDROGEOLOGIA
10.1 - FACULDADE DE LETRAS
10.2 - FACULDADE DE ARQUITECTURA
10.3 - EDIFÍCIOS DA FACULDADE DE CIÊNCIAS
11 - RECURSOS POTENCIAIS (OCULTOS OU NÃO APROVEITADOS)
ANEXO
3
1. Introdução. Objectivos do trabalho
Por solicitação da Reitoria da Universidade do Porto, o Departamento de Minas da
Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP) procedeu a um
reconhecimento geológico e hidrogeológico nos terrenos do denominado Polo III que
circundam as novas Faculdades de Letras, Ciências e Arquitectura, bem como o Estádio
Universitário, na zona do Campo Alegre.
O objectivo principal deste reconhecimento releva da necessidade de aproveitamento
de caudais de água emergentes com vista a estabelecer planos de rega de áreas ajardinadas que
vão integrar o futuro Polo III, bem como da necessidade de localizar alvos possíveis para
implementação de captações de águas subterrâneas por meio de furos.
Para atingir o objectivo definido à partida, houve necessidade de empreender os
seguintes trabalhos de caríz genérico e preparatório, essenciais para a interpretação do regime
de armazenamento e circulação de águas subterrâneas na área do Polo III e áreas envolventes:
1. Estudos de Fotointerpretação para detectar a fracturação regional.
2. Trabalhos de campo para levantamento geológico, incluindo a definição da rede de
fracturação local e regional.
3. Tratamento estatístico dos valores de densidade de fracturação encontrados.
4. Interpretação de todos os resultados obtidos e elaboração de mapas resumo.
A estas acções seguiu-se um conjunto de diligências e trabalhos orientados para:
1. Localização de captações ainda activas (poços, minas, fontes) na área do Polo III e sua
caracterização do triplo ponto de vista de:
estado de conservação
caudais emergentes
perspectivas de valorização / recuperação mediante intervenções pontuais
tecnicamente não complexas e pouco onerosas
2. Identificação de mananciais que se sabe terem existido (e sido aproveitados) na zona
envolvente do Polo III mas que, por imperiosas necessidades de drenagem ou outras
razões, terão sido desviados para a rede camarária de águas pluviais. A finalidade
4
desta pesquiza consistia na avaliação das possibilidades de uma eventual recuperação e
aproveitamento para reforço do abastecimento da área do Polo III em águas de rega.
3. Exame de captações particulares situadas na área envolvente do Polo III virada ao Rio
Douro, com a finalidade de estabelecer possíveis relações de causalidade entre as
alterações ocorridas em algumas destas captações e as intervenções urbanísticas (da
alçada da U.P. ou de outras entidades) ocorridas durante as últimas duas dezenas de
anos, em toda a zona abrangida por este estudo.
Os meios usados para a concretização do trabalho foram exclusivamente os existentes
no Departamento de Minas da FEUP. A equipa de investigadores do Dep. Minas que
efectuou o estudo pôde contar com a valiosa colaboração do Prof. Eurico Pereira, investigador
principal do Instituto Geológico Mineiro, coordenador da Carta Geológica 1/200.000 (Folha
1) onde a região em estudo se encontra cartografada, e que é também professor convidado do
Departamento de Minas.
2. Metodologia usada
A metodologia implementada comprendeu o acompanhamento cerrado dos trabalhos
de construção em curso na zona, nomeadamente as Faculdades de Letras, Ciências e
Arquitectura, bem como a identificação e caracterização de todas as minas, poços e fontes
existentes em toda a área. Esta fase desenrolou-se durante alguns anos, permitindo alguma
quantificação do comportamento destes recursos hídricos ao longo do tempo, nomeadamente
a influência das obras de construção civil sobres os mesmos. Em 1987 foi entregue um
relatório prévio onde se dava conta de um primeiro inventário dos recursos hídricos existentes
na área envolvente da nova Faculdade de Letras.
Para a elaboração de um modelo interpretativo do modo de circulação das águas
subterrâneas da região, efectuaram-se estudos de carácter geológico, baseados em análises
incidentes sobre a Carta Geológica 9C (Fig. 1), à escala 1/50.000, editada pelos Serviços
Geológicos de Portugal em 1957, bem como sobre a Carta Geológica de Portugal, Folha 1
(Fig. 2), à escala 1/200.000, editada pelos Serviços Geológicos de Portugal em 1989. Dados
de levantamento de pormenor, da autoria do Doutor Eurico Pereira, e cedidos pelo mesmo,
foram de grande utilidade para os nossos objectivos.
5
O estudo de pares de fotografias aéreas confirmou os dados já adquiridos permitindo,
para além da caracterização do tipo de afloramentos existentes e suas relações espaciais,
definir as principais redes de fracturação regional, possibilitando ainda a formulação de
relações entre a topografia actual e as referidas redes de fracturação.
Com estas informações, os trabalhos de campo prosseguiram com um levantamento
de pormenor, quer de fracturas e diaclases, quer de possíveis contactos entre formações
geologicamente diferentes. Os valores de direcção e inclinação dos planos de fracturas e
diaclases, recolhidos à bússola, foram tratados estatisticamente, em rede de projecção
Schmidt, o que permitiu a definição das principais famílias daqueles acidentes geológicos.
Toda a informação recolhida faz parte do presente relatório.
Esc. 1/50 000 Esc. 1/200 000
Fig.1 Fig.2
3. Localização
A região estudada encontra-se representada na Carta Militar de Portugal, folha
Nº110 à escala 1/25.000, edição dos Serviços Cartográficos do Exército, e nas Cartas
Geológicas de Portugal já referidas, edições dos Serviços Geológicos de Portugal.
A área pode considerar-se delimitada a Oeste e a Este, respectivamente pelos
meridianos que passam pelo Estádio Universitário e pela Rotunda da Boavista, a Norte
pela Avenida da Boavista e a Sul pelo Rio Douro (Fig.3).
As principais vias que servem a zona são a Estrada Marginal do Rio Douro, a Rua
do Campo Alegre, a Rua do Gólgota e os acessos à Ponte da Arrábida.
6
Como base para a elaboração dos mapas-resumo realizados, foi usada uma ampliação
da Carta Militar referida.
Fig.3
7
4. Enquadramento Geológico Geral
Morfologicamente, a região estudada, faz parte da vertente Norte do Rio Douro, cujo
vale “rasga” uma larga plataforma que se estende desde norte até à zona do Monte da
Virgem, no concelho de Vila Nova de Gaia. Toda esta plataforma desce suavemente para o
mar.
Fig. 4
À escala geológica regional, a área em estudo integra-se na Zona Centro-Ibérica
(Z.C.I.), que corresponde a uma das regiões paleogeográficas da Península Ibérica.
Geograficamente, encontramo-nos próximo da “Sutura Porto - Tomar - Badajoz - Córdoba”,
que materializa o contacto entre a Z.C.I. e a Zona de Ossa Morena (Z.O.M.), mais a sul. Esta
8
MAPA DE LOCALIZAÇÃO
Esc. 1/25 000
sutura corresponde, actualmente, à raiz de uma cadeia de montanhas que resultou da colisão
de dois continentes, em períodos Pré-Câmbricos (Fig.4). Esta sutura passa junto à Foz do
Fig. 5
9
Douro, aflorando rochas desta estrutura nas praias entre o Castelo do Queijo e a Praia da
Luz.
Este “acidente” geológico é importante para o objectivo deste estudo, uma vez que é
considerado activo durante longos períodos geológicos, sendo responsável pela densidade de
fracturação dos maciços próximos, bem como pelo desenvolvimento dessas mesmas fracturas.
Como pode ser observado no levantamento geológico da Fig. 5 que abrange as duas
margens do Rio Douro, na zona afloram rochas Ígneas (três tipos de granitos), Metamórficas
(gneisses e micaxistos) e Sedimentares, estas formando terraços flúvio-marinhos de idade
recente. Estas formações irão de seguida ser descritas sucintamente, aproveitando-se para
simultaneamente as integrar no contexto geodinâmico da sua formação.
Do - Complexo Xisto-Grauváquico (C.X.G.) indiferenciado
O Complexo Xisto-Grauváquico corresponde a uma sequência de materiais
sedimentares metamorfizados, de idade Câmbrica, originalmente depositados em regime
turbidítico, numa bacia distensiva contemporânea das primeiras fases de um ciclo tectónico de
grandes dimensões que afectou os terrenos da Península
Ibérica, a Orogenia Hercínica. Estes materiais podem
ser associados aos resultantes do desmantelamento da
cadeia de montanhas formada durante a colisão entre a
Z.O.M e a Z.C.I referidas anteriormente. Ao conhecido
Grupo do Douro corresponde uma sequência completa do
C.X.G., descrita por Bernardo Sousa (1982), na região de
Pinhão - S. João da Pesqueira.
A Orogenia Hercínica, que ocorreu entre o
Devónico Médio (380 Ma) e Carbónico Superior (286
Ma), é responsável pelo fecho do oceano Rehic e também
pela consequente colisão entre dois continentes.
Evidências desta sutura podem ser observadas no
contacto entre as duas zonas paleogeográficas
Fig. 6
10
denominadas de Zona de Ossa Morena e Zona Sul Portuguesa (Fig. 4).
Com o desenrolar da Orogenia Hercínica, os terrenos do C.X.G. foram
metamorfizados em diferentes graus, mas é ainda possível, em muitos lugares, determinar a
sequência estratigráfica original. Noutros terrenos, o grau de metamorfismo foi demasiado
elevado, tendo-se atingido estágios próximos, mas anteriores, à fusão, sendo o resultado a
existência de gneisses e migmatitos.
Estes são os terrenos mais antigos na zona, encontrando-se cartografados a Oeste do
Polo III.
‘f - Granito da Arrábida - fácies muscovítico/biotítico de grão médio
‘m - Granito da Boavista - fácies muscovítico/biotítico de grão fino a médio
g - Granito de Lavadores - fácies biotítico porfiróide
A análise da formação dos granitos existentes em Portugal deve também ser efectuada
numa perspectiva geodinâmica. A Orogenia Hercínica é caracterizada por uma colisão que
prevê, simultaneamente, a existência de fenómenos de subducção e obducção para leste, a
partir do Devónico Médio.
O processo de obducção gerou o empilhamento de mantos de carreamento e o
consequente espessamento crustal (num mínimo de 5 Km) verificado durante a 2ª e 3ª Fase
(F2 e F3) da Orogenia. Daqui resulta uma inversão da tensão máxima que passou de
horizontal, característica dos ambientes colisionais, a vertical. Este facto tem como
consequência o desenvolvimento de um regime distensivo que é o responsável pelo
aparecimento de falhas normais. A este intervalo de tempo corresponde também o início da
ascensão dos granitóides profundos, por um fenómeno denominado de “telescopagem”, ou
seja, os granitóides intrudem em um corpo granítico anterior.
Em relação com a subducção, é suposta a geração de magmas básicos de várias
origens, profundos, com ascenção e instalação comandadas pela dinâmica global,
aproveitando os grandes lineamentos estruturais hercínicos e ante-hercínicos. Estes magmas,
que estarão na origem do fluxo térmico responsável pelo metamorfismo regional, ao
ascenderem, modificam as isogeotermas, induzem fusão crustal em larga escala, hibridizam-se
e diferenciam-se. Apesar da complexidade do processo, o modelo prevê a existência de dois
grandes grupos de granitos: uns de duas micas, ligados essencialmente ao processo de fusão
11
crustal e outros, com plagioclase cálcica e seus diferenciados, mais profundos e de complexa
origem e evolução.
De uma forma resumida, indicam-se de seguida (Fig. 7) os diferentes grupos e séries
presentes classificados numa dupla perspectiva orogénica e temporal, vindo o tempo de
instalação referenciado às fases principais de deformação.
Fig. 7
Os granitóides de duas micas, ‘f e ‘m, foram produzidos no início da colisão
naquela que é definida como a Fase 3 da Orogenia (F3). Por isso são considerados Sin-
Tectónicos (Sin F3). São os granitos mais abundantes na região do Polo III. O granito
porfiróide biotítico, aflorante na margem Sul do Douro, conhecido por granito de Lavadores,
g, instalou-se em fases posteriores à Orogenia (Pós F3) durante aquilo que é usualmente
descrito como a fase de relaxação do Orógeno. Este granito não apresenta qualquer tipo de
lineação nem orientação dos seus fenocristais em virtude de, aquando da sua instalação, já não
existirem tensões compressivas importantes.
Na maioria dos orógenos é normal verificar-se a reactivação de fracturas anteriores por
sujeição a um novo regime de tensões, por vezes diferente daquele que gerou a primitiva
fracturação.
A tensão máxima nas fases iniciais da Orogenia Hercínica teve orientação NE - SW.
Esta tensão originou fracturação dúctil-frágil NW - SE e ENE - WSW, além de fendas de
tracção NE - SW e NNE - SSW. Posteriormente à instalação dos principais corpos
granitóides, e nomeadamente dos que afloram na região estudada, o campo sofreu acentuada
12
rotação, com a tensão máxima próxima de N - S. As fracturas anteriormente geradas são então
retomadas, e passam a desligamentos frágeis (o orógeno está mais frio) compatíveis com o
novo campo de tensões. Assim, no quadrante oeste temos fracturação dextra e no quadrante
leste, essencialmente, senestre. O sistema frágil NNE - SSW, senestre, atinge nesta fase,
grandes proporções. Este facto é, naturalmente, de grande relevância para os nossos
objectivos.
Mais recentemente, em tectónica considerada Plio - Quaternária (5.1 Ma até à
actualidade), registam-se fracturações crustais de direcção N - S e ENE - WSW, que têm
comportamento de abatimento em “graben” e “semi graben”. O exemplo mais claro deste tipo
de estruturas é constituído pelo “graben” N - S de Valença - Porrinho, com o qual se podem
correlacionar as fracturas da zona em estudo com idêntica direcção, assim como na zona
offshore de Aveiro no conhecido “graben” de Aveiro.
A “acidente” já referida como “Sutura Porto - Tomar - Badajoz - Córdoba” rejoga,
em tempos geológicos recentes, com movimento dextro de direcção NW, evidenciando o
carácter distensivo da fracturas de NE.
Podemos considerar que os terrenos estudados foram e continuam a ser afectados por
aquele acidente tectónico.
Q1, Q2 e Q3 - Terraços Flúvio-Marinhos
Na zona estudada encontram-se alguns terraços deixados quer pelo Rio Douro, quer
pelo mar. Existem indícios de que o mar, no final do Cenozóico, cobria grande parte do
território portuense e que o litoral se situava bastante para o interior. Por recuos sucessivos, o
nível do oceano foi descendo, deixando depósitos de praias antigas, o que nos permite inferir
as diversas posições que este ocupou. Com este movimento regressivo a linha de costa foi
transferida para uma posição bastante para ocidente da original.
Foi nessa altura que o Douro escavou profundamente o seu leito, abandonando
depósitos importantes em plataformas horizontais (a Figura 8, correspondente a um pequeno
afloramento visívelnas traseiras do cemitério de Agramonte, mostra o tipo de materiais
integrantes desses depósitos).
13
Relativamente às praias antigas, estas são evidenciadas também por terraços
caracterizados por materiais com um grau de arredondamento superior aos existentes em
terraços do rio.
Naturalmente que este facto estará relacionado com o
maior grau de trabalho de desgaste produzido pelos
efeitos de onda de costa, inexistentes nos regimes
unidireccionais de transporte fluvial.
Actualmente, a linha de costa está num
processo de avanço para o interior do continente
provocado pelos movimentos transgressivos do mar.
Com a referência Q1 é definido o depósitos
fluvial da Boavista com nível entre os 80 e os 90 metros de cota<
relativamente ao nível médio da água do mar. Como será referido, este terraço, dadas as suas
características como rocha armazém para a água, desempenha um papel importante na recarga
dos aquíferos da zona.
5. Levantamento de diaclases e fracturas
Com o objectivo de estudar a abundância relativa de família de diaclases e falhas que
afectam os granitos da região, efectuou-se um levantamento das direcções e inclinações de
planos observados em afloramentos não alterados. Estes afloramentos correspondem aos
encontrados na Rua D. Pedro V, na encosta Norte da Ponte da Arrábida e na Rua da
Mocidade da Arrábida (Fig. 10) A respectiva representação de densidade de polos (linhas
perpendiculares aos planos) em projecção estereográfica, na Rede de Schmidt ou de igual
área, mostra a existência de 4 famílias de planos (Fig.9):
a - N 5 E - Sub-vertical;
b - N 30 E - 70 WNW;
c - N 85 E - Sub-vertical;
d - N 65 W - 80 SSW a sub-vertical.
Fig. 8
14
Foram ainda detectadas algumas fracturas sub-horizontais associadas a fenómenos localizados
de descompressão das rochas ígneas.
Com base em todos os dados atrás referidos, podemos construir um primeiro modelo
estrutural da zona em estudo.
Assim, como é possível observar no bloco-diagrama da Fig. 11 e na cartografia
geológica da Fig. 12, a mancha granítica da Arrábida encontra-se afectada por determinadas
fracturas regionais bem desenvolvidas que condicionam a topografia local, sendo de admitir a
interligação entre estas por intermédio das famílias de fracturas definidas em projecção
estereográfica.
O contacto entre o terraço da Boavista e o granito da Arrábida, desenvolve-se em
flagrante paralelismo com a Rua do Campo Alegre, delimitando a bacia de recarga e
alimentação em água das fracturas que afectam todo o maciço.
Rua da Mocidade da Arrábida Fig. 9
Fig. 10
16
GEOLOGIA LOCAL
1 Km
Fracturas regionais inferidas por observação de fotografia aérea e/ou levantamentos de campo
Limite entre o Terraço de nível entre os 80 e os 90m - Q1 e o Granito da Arrábida ‘f
Fig. 12
Não vislumbramos, contudo, qualquer possível relação de intencionalidade e
dependência entre o andamento que veio a ser conferido à Rua do Campo Alegre e a
natureza das formações rochosas sobre (e ao longo) das quais a Rua se desenvolve, salvo uma
hipotética configuração topográfica primitiva que, quiçá marcando sensivelmente “em nível”
a transição entre formações sedimentares (terraços Q1) e as formações ígneas do soco
(granitos), induzisse o natural desenvolvimento da Rua com a configuração que hoje possui.
17
Seja qual for a origem histórica desta coincidência de alinhamentos entre o eixo geral
da Rua e a bordadura dos terraços (Fig. 12), importa desde já que para ela chamemos a
atenção porquanto neste facto radica, em muito larga medida, a profunda alteração
hidrogeológica que a área em estudo sofreu até aos nossos dias (e continuará sem dúvida a
sofrer em dias vindouros), à medida que se desenrola o impacte urbanístico que sobre a zona
tem incidido e continuará a incidir (Fig. 13).
Para que o sentido último destas asserções venha a tornar-se perfeitamente claro,
impõe-se que algumas breves considerações sejam expendidas sobre permeabilidade dos
terrenos, na generalidade, e, em particular, sobre a permeabilidade dos terrenos cujo estudo
ora nos ocupa.
Fig. 13
6. Permeabilidade dos granitos e das formações sedimentares
As rochas eruptivas (caso típico, os granitos) são pouco permeáveis, especialmente
quando não decompostas. Consequentemente, a maior parte da água que sobre elas precipita
não se infiltra, escorrendo superfícialmente e/ou sofrendo evaporação.
18
Fig. 14
Para que a infiltração ocorra, é imprescindível a existência de fendas nos maciços, ao
longo das quais a água se instale e circule, deste modo diminuindo as quantidades de água
escorrida e evaporada (Fig. 14). Quando houver fracturas importantes (a) cruzando os
maciços, em conjugação com redes de fissuras relativamente densas em profundidade e,
sobretudo, em associação com uma zona de decomposição superficial de razoável possança,
(b) pode tornar-se substancial a quantidade de água infiltrada comparativamente à fracção que
escorre à superfície e que se evapora.
A água poderá então preencher a quase totalidade
da rede de fendas (diaclases: descontinuidades originadas
pelas compressões orogénicas, em resultado das quais o
maciço se decompõe em blocos grosseiramente
paralelipipédicos; leptoclases: superfícies de disjunção
resultantes da contracção associada ao arrefecimento dos
maciços; e fracturas de descompressão, geralmente sub-
horizontais, originadas pela redução da pressão estática
associada à remoção - por efeito da erosão - das zonas
superiores dos maciços), fendas estas ao longo das quais
(b)
(c)
(a)
Fig. 15
19
a circulação se opera por simples acção da gravidade. Deve notar-
se que é escassa (em maciços graníticos) a possibilidade de que, por reacções químicas
originando dissolução dos minerais constituintes da rocha, o volume de vazios e possança das
fissuras aumente progressiva e significativamente no tempo (Fig. 15); por outro lado, em
virtude da própria génese das referidas fracturas, a densidade espacial, a importância e o
interesse destas (enquanto vias de escoamento de água) decresce rapidamente com a
profundidade.
Consequentemente, a penetração da água neste tipo de formações rochosas resulta
circunscrita a faixas bastante superfíciais dos maciços (zona (c), Fig. 14), neste sentido de que
a fronteira interna de tais faixas se desenvolve habitualmente em grande concordância com a
superfície topográfica, acompanhando-a a uma distância média que é, em geral, muito menos
relevante do que se crê; a circulação da água, por seu lado, processa-se de um modo
espacialmente descontínuo (isto é, não abrangendo a totalidade da fracturação existente na
massa rochosa) e efectua-se - face à ausência de porosidade - apenas ao longo de algumas das
superfícies externas dos blocos aproximada e grosseiramente paralelipipédicos resultantes dos
fenómenos de rotura e disjunção atrás refridos.
Não é legitimo, portanto, falar-se em “lençóis de água” para caracterizar os aquíferos
de maciços graníticos, mas mais propriamente em veios líquidos cujas estrutura e real
extenção são, no âmago desses maciços, perfeitamente imprevisíveis “a priori”. Esta verdade
intuitiva é claramente evidenciada pelo facto de, em encostas ou taludes que seccionam este
tipo de aquíferos a água não manar em lâmina mas sim pontualmente (fontes de maior ou
menor débito) (Fig.16) e pelo facto de as minas por meio das quais se procura frequentemente
valorizar estes recursos não possuirem traçado (nem sequer) aproximadamente rectilíneo, mas
antes caracterizado ora por sinuosidades com desenvolvimento mais ou menos longo, ora por
bruscas inflexões, ora ainda pela presença de divertículos laterais sensivelmente normais ao
eixo das minas.
20
Fig.16
Não fogem a estas regras as minas por nós estudadas, o que apenas denuncia a
preocupação dos mineiros em “não perderem o veio” ao empreenderem o avanço no interior
de um maciço onde de antemão (e por experiência acumulada) sabiam que poderiam operar
apenas por tentativas cuidadosas face aos “caprichos” do percurso das águas.
O maciço por nós estudado revela a existência de algumas falhas importantes -
fracturas regionais, detectadas por fotogeologia e com andamento confirmado (quando
possível, face à ausência de recobrimentos superficiais) por inspecção directa dos terrenos -
em cujas vizinhanças relativamente próximas se situa a maior parte das captações (minas,
poços) ainda activas ou exauridas em consequência de numerosas intervenções urbanísticas
ocorridas a montante (Fig. 13).
Fig. 17
Esta concentração das fontes junto das grandes falhas (embora não em exacta
coincidência com estas), faz suspeitar da existência de inúmeras falhas subsidiárias (não
cartografadas) que terão vindo, essas sim, a determinar a localização das minas e poços
identificados.
É indubitável que as falhas regionais controlam a geomorfologia da área em estudo
(Fig. 11), assentando esta inferência quer na orientação quer na forma de alguns vales
profundos - “talwegs” - que rasgam a calote granítica (encosta) da margem direita do Rio
Douro; a estas falhas e também às subsidiárias (mais difíceis de detectar, já pelo seu menor
desenvolvimento, já pelo facto de se encontrarem ocultas por terrenos de recobrimento ou por
lençol freático
Terraços Q1
21
utilidades diversas devidas à intervenção humana) estão inequívocamente associadas as fontes
de cujo aproveitamento e valorização resultaram as minas estudadas.
É evidente que estas falhas - principais e subsidiárias - assumem, mesmo que
suturadas ou possuindo caixas de possança nula ou pouco significativa, uma enorme
importância hidrogeológica, por constituirem caminhos priviligeados para potencial ou
efectiva circulação de águas através de zonas profundas do maciço granítico. Ao longo destas
falhas, a circulação pode caracterizar-se por grandes caudais, contrariamente ao que
geralmente sucede ao longo das superfícies de compartimentação das zonas alteradas do
maciço (rede de fissurações superficiais mais ou menos abertas atrás descritas).
Em formações sedimentares (exemplo típico, no caso vertente: os terraços Q1) mais
ou menos incoerentes e no topo de formações graníticas a elas subjacentes que tenham sofrido
processo mais ou menos intenso de desagregação / alteração (apodrecimento do granito), a
abundância de vazios e espaços intergranulares propicia a retenção da água precipitada à
superfície. A água desce por gravidade e, por acumulação sobre a parte não alterada do
maciço granítico (bed-rock) e seguidamente no interior dos sedimentos sobrejacentes, vem a
preencher totalmente os espaços livres (permeabilidade intergranular). Se a rocha sã for
suficientemente desprovida de permeabilidade “em grande” (permeabilidade através de
fissuração) ou não recortada por grandes falhas, o escoamento subterrâneo das águas
processar-se-á a um rítmo inferior ao da sua afluência a partir da superfície, ficando em
grande parte temporariamente armazenada nas formações permeáveis (sedimentos não
consolidados superficiais e topos alterados das calotes graníticas): conjugam-se deste modo as
condições propiciadoras da formação de verdadeiros lençois freáticos (“lençois de água”).
Esta caracterização genérica do modo de circulação / armazenamento de água em
formações graníticas e sedimentares é transponível “ipsis verbis” para a área em estudo (Fig.
17): as águas que se infiltram e armazenam maioritáriamente nos terraços Q1, nomeadamente
o da Boavista, eram primitivamente captadas em poços (ou, num caso pelo menos, por meio
de estruturas hidráulicas constituidas por combinação de poços interligados por minas)
localizados ao longo e a Sul da corda definida pela Rua do Campo Alegre (troço entre as
instalações da C.C.R.N. e o extremo Poente do Jardim Botânico; ou ressurgiam (ainda
ressurgem, nalguns casos) em pontos que salpicam irregularmente parte da encosta que forma
a margem direita do Rio Douro, sendo aí o seu aproveitamento realizado por meio das minas
cujo estudo constitui objectivo parcial deste trabalho.
22
No primeiro caso - poços ao longo da Rua do Campo Alegre, a afluência da água a
tais captações processava-se por simples percolação através dos sedimentos constituintes do
terraço; no segundo caso - minas e poços de encosta - a água emergia (ou emerge ainda) após
ter efectuado trajectos mais longos, não muito profundos na maioria dos casos, mas
necessariamente sinuosos ao longo das fissuras e da massa alterada do maciço granítico
subjacente ao terraço - armazém.
7. Alterações no regime de escoamento na zona do Campo Alegre
Feita esta carcterização genérica - que apesar do seu cariz algo didáctico de modo
algum se nos afigura dispicienda - voltemos ao problema da Rua do Campo Alegre e das
profundas alterações que toda a zona envolvente sofreu em curto espaço de tempo.
Há pouco mais de quatro dezenas de anos, ainda a zona do Campo Alegre consistia
essencialmente e apenas em terrenos agrícolas entremeados com manchas de bosque e jardins
envolvendo raras casas de lavoura e residências apalaçadas (Casa Primo Madeira, Casa
Burmeister, Quinta dos Ingleses, Quinta do Póvoa, etc.), cruzada por quelhas e poucas ruas
de traçado bastante irregular e de que remanescem vestígios físicos e toponímicos (Rua do
Golgota, Rua da Boa Viagem).
A Rua do Campo Alegre estendia-se perpendicularmente àquelas, estreita e pouco
edificada na maior parte da sua extensão. Apenas na zona do actual cruzamento do Campo
Alegre a ocupação urbana assumia maior expressão, existindo ai núcleos de residências e
bairros modestos (de que sobrevivem vestígios nas traseiras dos grandes prédios actuais)
habitados por agricultores e sobretudo por operários de uma desaparecida indústria que
ostentava a curiosa denominação popular de Fábrica “do Arranca”.
Importa salientar os seguintes aspectos do padrão de ocupação urbana da zona: esta
caracterizava-se pela baixa densidade e pela dispersão dos focos habitacionais, consistindo as
edificações em núcleos ou alinhamentos de habitações de um ou dois pisos, na sua quase
totalidade desprovidas de caves.
Dito de outro modo, posta a ausência - por desnecessárias e por razões funcionais e
económicas - de grandes fundações, os edifícios praticamente “pousavam” (na quase
totalidade) sobre o terreno, deste modo raramente interferindo na livre circulação subterrânea,
em direcção ao Rio Douro e numa direcção normal a esta (os terraços Q1 têm pendor geral na
23
direcção Poente) das águas de precipitação infiltradas e armazenadas nos terraços que se
desenvolvem a Norte do eixo geral definido pela Rua do Campo Alegre (terraço da
Boavista).
A intercepção de águas subterrâneas, quando ocorria, caracterizava-se por uma
intencionalidade perfeitamente assumida e decorrente de necessidades inescapáveis: traduzia-
se na abertura de poços pouco profundos (mas bastante produtivos, dada a razoável cota do
nível freático então existente) de onde os moradores recolhiam a água para múltiplas
finalidades domésticas, agrícolas e pecuárias.
Nos terrenos onde está implantado o edifício da Aliança Seguradora (Fig. 18) existia
uma fonte com abundante caudal de água potável, fonte esta que veio a estar na origem de
delicados problemas de drenagem aquando da abertura dos caboucos (bastante profundos)
daquele edifício.
Não é por mero propósito de exemplificação que referimos explicitamente o caso deste
grande edifício; é que - quer pelo tipo de problemas então suscitados pela presença das águas
nos alicerces, quer pelo tipo de solução que para esses problemas foi encontrada (recolecção
exaustiva das águas e seu encaminhamento directo para a rede de águas pluviais) - constitui
um paradigma do tipo de perturbação que, do ponto de vista hidrogeológico, veio a decorrer
da transformação sofrida pela Rua do Campo Alegre e pela sua área envolvente Norte. E
esta transformação, que com este edifício praticamente se iniciou, prossegue com carácter de
inelutabilidade que obviamente nada de bom augura quanto ao futuro da maioria das
captações existentes na área por nós estudada.
24
Fig. 18
É que todos os edifícios que do lado Norte da Rua do Campo Alegre têm vindo desde
então a ser construídos consistem em grandes blocos de habitações ou polivalentes, dotados
de caves e (em não poucos casos) de sub-caves. É transparente que edifícios tão
profundamente encastrados nos terrenos, sucedendo-se (em extensos troços da Rua) com raras
soluções de continuidade lateral, formam uma verdadeira cortina de betão, uma barragem que
impede a passagem das águas armazenadas nos terraços a Norte dessa cortina urbana (Fig.
17).
A acrecentar ao mero efeito de barragem, juntem-se as acções de drenagem cuidadosa
e deliberada que, logicamente, os construtores jamais deixam de implementar (mormente
quando interceptam veios de água) com vista a tentar evitar infiltrações nas caves dos
edifícios; e junte-se ainda - para além da redução da área de infiltração associada à simples
implantação de um grande edifício - o efeito de impermeabilização decorrente de todo o tipo
de pavimentações com finalidades diversas operadas sobre os terrenos imediatamente
envolventes desses mesmos edifícios.
O resultado não poderia ser outro senão o que actualmente se observa:
25
I. Abatimento de caudais em inúmeros poços situados nos terrenos a Sul da Rua do
Campo Alegre;
II. Extinção total de não poucas das captações que antes serviam generosa e
abundantemente as quintas e espaços verdes a que atrás aludimos;
III.Perturbações em captações localizadas em zonas tão longinquas como as da base da
encosta virada ao Douro (freguesia de Massarelos) e em núcleos habitados
situados a Sul da nova Faculdade de Letras.
Outro dos grandes factores responsáveis pela descaracterização da hidrogeologia
primitiva da área em estudo e também por profundas roturas na antiga malha urbana da zona
do Campo Alegre (mais propriamente, da zona do cruzamento do Campo Alegre) consistiu
no rompimento das vias de acesso à auto-estrada e ao Estado Universitário. Obra que no
tempo precedeu largamente a explosão urbanística que em toda a corda do Campo Alegre
actualmente se regista, a ela é imputável um efeito de intercepção e drenagem imediata de
águas subterrâneas, cuja passou a processar-se ao longo dos taludes resultantes dos desaterros
exigidos pelo lançamento dos sobreditos acessos. A este assunto voltaremos oportunamente
com outro desenvolvimento; mas cabe aqui e agora referir, embora de passagem e como mero
exemplo, que os problemas que afectam hoje (e neutralizaram temporariamente) a mina que
abastece a antiga Faculdade de Arquitectura (Quinta do Póvoa) relevam directamente do
entupimento do aqueduto em forma de U que, passando sob a trincheira constituida pelo
acesso da auto-estrada ao cruzamento do Campo Alegre, refazia a ligação entre o lado Norte
da cerca da Faculdade de Arquitectura e a mina que lhe fica fronteira (com abertura no talude
oposto), desenvolvendo-se na direcção da Rua do Golgota; e mencionar ainda que o
rebaixamento drástico de nível freático (em termos de permeabilidade por
fissuração)originado pelos rasgões feitos no terreno para abertura daquele acesso foi a causa
directa e enequivoca do abatimento quase total de duas minas - em tempos muito produtivas -
que se desenvolviam, com orientação Norte, no local onde recentemente viriam a ser
implantados os edifícios da nova Faculdade de Arquitectura.
8. Captações desaparecidas na área do Polo III e na sua
envolvente de influência.
26
Por efeito dos dois grandes factores de perturbação que atrás referimos, a saber:
Desenvolvimento de uma barreira de betão praticamente contínua na bordadura da
bacia de alimentação (terraço da Boavista) da área em estudo (cortina urbana); e /
ou
Desaterros paralelos a essa bordadura exigidos pela abertura das vias de acesso à
auto-estrada.
numerosas captações localizadas fora e dentro dos terrenos universitários sofreram
destruição pura e simples ou
neutralização (parcial ou total) por desvio das águas para a rede pública de águas
pluviais;
intersecção parcial, com redução dos primitivos caudais a simples “bicas” não
merecedoras de qualquer aproveitamento;
contaminação por águas negras de esgoto com proveniência incerta e hoje
praticamente impossivel de determinar, o que veio a impor a sua desactivação por
entulhamento e/ou ligação directa à rede de esgotos.
Apresentamos mais adiante uma relação de captações cujo destino foi o atrás indicado.
Não a pretendemos exaustiva, até porque da localização e reais características de algumas
dessas captações restam hoje apenas imprecisas reminiscências na memória de idosos ex-
moradores dos primitivos bairros e pequenos núcleos urbanos e de antigos caseiros das
quintas que foram sendo devoradas pelo avanço urbanístico; mas, mesmo incompleta, ainda
assim nos parece útil, já como elemento ilustrativo e corroborante das afirmações atrás
aduzidas já porque evidencia o facto seguinte: vem a ser a Universidade a principal vítima das
alterações incidentes no regime hidrogeológico da área estudada; e, uma vez que, por um lado
não existem cartas hidrogeológicas que representem o estado primitivo da zona do Polo III e
da sua área envolvente Norte e, por outro lado, grande parte das transformações perturbadoras
ocorreu antes de os terrenos integrantes do Polo III terem passado à posse da Universidade,
torna-se hoje impossível uma imputação precisa de responsabilidades pelo
abatimento/desaparecimento de caudais antes emergentes nos terrenos da U.P. ou pela
contaminação (por águas negras de esgoto) de algumas das captações que serviam aqueles
terrenos. Ora, não sendo curial pretender fundamentar queixas em simples conjecturas ou em
suspeitadas relações de causa-efeito insusceptíveis de sustentação em bases científicas
27
(mormente quando reportadas tais queixas a situações já muito distanciadas no tempo),
preferimos orientar grande parte do nosso trabalho - concomitantemente com trabalhos de
reconhecimento geológico de fundo e de pormenor e com a interpretação do padrão
hidrogeológico da zona - para uma paciente e morosa reconstituição do passado “aquífero”
esperando daí extrair pistas para
averiguar como e para onde terão sido desviadas as águas de fontes e minas hoje
desaparecidas, tendo em vista uma eventual recuparação;
averiguar qual a origem provável de algumas águas que, tendo eventualmente sido
encanadas por necessidades diversas de drenagem, emergem livres na área do Polo
III e aparentemente ressurgem em alguns pontos da base da encosta virada ao
Douro;
determinar a origem provável de contaminações que afectam algumas das
captações, ainda activas do Polo III, com vista a futuras diligências tendendo a
restituir às águas qualidade original.
8.1 - Captações afectadas ou destruídas.
1 - Quatro poços e uma fonte sob o edifício da Aliança Seguradora; as suas águas são
em parte utilizadas na rega dos espaços ajardinados envolventes do edifício; os excedentes
(que constituem a maioria) são desviados para a rede de águas pluviais.
2 - Fontenário: desactivado aquando da abertura do cruzamento do Campo Alegre.
3 - Fontenário: situava-se sensivelmente no eixo da rua, supondo-se que a água que
debitava terá sido encaminhada para a rede de águas pluviais.
28
Fig. 19
4 e 5 - Poços sob os edifícios seguintes ao da Aliança Seguradora: as águas foram
desviadas para a rede de águas pluviais.
6 - Poço situado no ângulo Noroeste do parque de estacionamento do Campo Alegre
(junto da Rua do Golgota); na altura em que pela primeira vez o inspeccionamos (1987) era
já uma captação muito pouco produtiva, praticamente extinta; mas em tempos terá sido, de
acordo com informações colhidas, uma excelente captação em termos de débito. O poço foi
aterrado aquando da construcção do parque.
7 e 8 - Minas que abriam no terreno onde foi implantada a nova Faculdade de
Arquitectura. Já estavam praticamente extintas em 1987, debitando então caudais
insignificantes. Foram destruídas por construcção do edifício e os escassos remanescentes de
água desviados dos alicerces por meio de conveniente drenagem. Tratava-se de minas com
cota de soleira relativamente elevada, devendo-se o abatimento dos caudais à abertura dos
acessos à auto-estrada.
1 2
3
4 5
6
7 8
9
10
11 12
13
14
Rua Campo Alegre
Captações afectadas
ou destruídas (ver texto)
29
9 - Poço situado junto ao muro do Círculo Universitário, do lado exterior. Constituia o
elemento principal de uma curiosa captação formada por 3 poços interligados por uma mina.
Do poço central emergia um braço (B) que, atravessando perpendicularmente a Rua do
Campo Alegre, abria num poço situado no quintal de uma vivenda já desaparecida; o outro
braço (A), alinhado com o eixo do primeiro, abria num poço situado em terrenos que hoje
pertencem à Universidade (Fig. 20).
Desta estrutura resta apenas o poço central (em tempos equipado com uma enorme nora de
ferro accionada por muares), uma vez que os desaterros exigidos pela construção de edificios
da Universidade (centro de Citologia) conduziram à destruição de grande parte do braço A e
respectivo poço (D).
Citologia
D
Fig. 20
Mas quando tal sucedeu já este dispositivo hidráulico tinha perdido interesse, dado que o
caudal abateu drasticamente após remodelações efectuadas na Rua e, sobretudo, com a
implantação de edifícios e vivendas no lado Norte daquela artéria.
O óculo C e parte do braço B (plenamente inseridos na zona de alimentação - terraço
Q1 - do conjunto e portanto os principais recolectores de águas) foram completamente
destruidos com a implantação dos grandes edifícios fronteiros ao Círculo Universitário.
10 - Poço que existiu no páteo traseiro do Círculo Universitário. Praticamente
exaurido à data da remodelação que o edifício sofreu, foi desactivado por entulhamento.
11 - Poço da Faculdade de Letras: existiu á entrada e à esquerda do portão da actual
Faculdade de Letras um poço (em tempos altamente produtivo) que há relativamente poucos
A
Poço
Central B
Círculo
Universitário Rua do
Campo Alegre
C
30
anos teve que ser atulhado. As águas que para ele convergiam começaram a surgir
contaminadas por águas negras de esgotos, cuja origem não foi possível estabelecer de forma
inequívoca; a captação exalava (e instalava na zona de entrada da Faculdade) odores
nauseabundos, uma das razões que (aliada ao abatimento de caudal e à impossibilidade de
imputação de responsabilidades) determinaram a sua neutralização por entulhamento
completo.
12 - Mina do Lago (Jardim Botânico): o caudal foi progressivamente abatendo, até se
tornar insuficiente para as necessidades que anteriormente supria satisfatoriamente. Para além
do mais, as águas evidenciam contaminação orgânica.
13 - Mina (Jardim Botânico): desactivada por meio de ligação à rede de esgotos em
virtude de ter sido contaminada por águas negras de proveniência desconhecida e
indeterminável.
14 - Poço situado no quintal de uma habitação existente no núcleo (assinalado com X
na carta anexa): o caudal sofreu redução substancial (e jamais se regenerou completamente) a
partir do momento em que foi iniciada a construção do conjunto de grandes edifícios que se
situam ao lado da Aliança Seguradora. Trata-se de um caso já referido no relatório do
primeiro estudo por nós efectuado em 1987 (Reconhecimento Hidrogeológico Prelimiar da
Zona da Nova Faculdade de Letras - Polo III da U.P.), extremamente elucidativo quer da
complexidade do regime de acumulação/circulação das águas subterrâneas na zona em estudo,
quer da grande sensibilidade do sistema de circulação à intervenção em pontos dos terrenos
por vezes muito distanciados dos locais onde vêm a ocorrer perturbações.
9 - Inventário de recursos hídricos da área do Polo III e sua
envolvente próxima, susceptiveis de mobilização/valorização
imediata ou quase - imediata.
Não obstante o panorama algo desolador atrás descrito e as perspectivas pouco
animadoras que a evolução urbanística até agora registada deixa antever (à medida que
31
prosseguir a intervenção sobre a área em estudo e a sua envolvente, mais se acentuará a
tendência para que - por efeito de eventual intersecção de “veios” de água e subsequentes
acções de drenagem, isolamento de aquíferos e impermeabilizações dos terrenos de cobertura
- rocha armazém - se vão extinguindo as captações mais superficiais, isto é, os poços e minas
com escasso recobrimento), ainda existem na área do Polo III e da sua envolvente próxima
mananciais absolutamente merecedores de aproveitamento e/ou valorização, porque
evidenciam caudais importantes caracterizados por nula ou pouco significativa variação
sazonal.
Chamamos a atenção para o seguinte e importante aspecto: a sobrevivência destes
mananciais releva da feliz circunstância de as suas águas serem de circulação razoavelmente
profunda, tendo as captações ainda activas uma alimentação assegurada por um esquema de
permeabilidade que é fundamentalmente do tipo permeabilidade-em-grande (fissural). A
circulação destas águas é estreitamente controlada pelo sistema de grandes falhas secundárias
que recortam em blocos de menores dimensões os grandes blocos definidos pela intersecção
das regionais (Figura 21 - Fotografia Aérea).
A situação exemplar referida em 14 do item anterior é claramente um caso de
intersecção de um “veio” de água controlado por um acidente estrutural do tipo dos acima
referidos, já que nenhuma outra explicação lógica se apresenta como plausível face ao que
conhecemos quer da topografia, quer da tectónica e hidrogeologia da área que medeia entre a
alegada causa de perturbação e a captação perturbada.
32
Fracturas regionais inferidas por observação de fotografia aérea
Área representada na carta anexa
Fig. 21
Outro exemplo podemos referir: o poço que abundantemente abastece em águas de
rega os jardins da C.C.R.N. esteve em riscos de perda total - por abatimento do seu (poderoso)
caudal - em consequência da abertura das fundações do novo Centro Comercial Cidade do
Porto. Esta eminência decorreu do facto de o edifício em questão, que compreende vários
pisos abaixo da superfície, estar implantado sobre a falha ao longo da qual se efectua a
circulação das águas que convergem para a sobredita captação.
F7
F5
F3
F2
F8
F4
F1
F9
F6
33
Foi, neste caso, possível estabelecer uma inequívoca relação de causa - efeito entre o
abatimento de caudal da captação e o aprofundamento de uma escavação que se desenvolvia a
uma considerável distância daquele dispositivo hidráulico; o que, por seu lado, fundamentou e
legitimou as (bem sucedidas) diligências da entidade prejudicada no sentido da reposição das
condições primitivas da captação perturbada.
Raramente é possível , contudo, uma imputação tão clara de responsabilidades: os
condicionalismos históricos, as características e múltiplas formas de expressão da
transformação urbanística que ocorreu (e ocorre) em toda a zona onde se inserem os terrenos
da Universidade (aliados à complexidade da tectónica e da hidrogeologia das mesmas), são
determinantes poderosas para a instalação de intermináveis polémicas entre peritos (e,
eventualmente, de querelas jurídicas por isso mesmo extremamente difíceis de derrimir) visto
que, como bem o comprova o caso da captação da C.C.R.N., pode existir uma relação
geográfica insuspeitada (ou dificilmente suspeitavel “a priori”) entre a ocorrência de uma
perturbação e a causa que verdadeiramente a originou.
Os recursos que a seguir caracterizaremos integram o que podemos designar por
recursos à vista, porque correspondem a mananciais há muito conhecidos e desde sempre
aproveitados para fins diversos (domésticos e/ou agro-pecuários).
Já em 1987 - quando por incumbência da Reitoria da U.P. procedemos ao exame dos
terrenos onde posteriormente viria a ser implantada a nova Faculdade de Letras -
referenciámos esses mananciais, expondo o seu estado de conservação e possibilidades de
reaproveitamento.
Procurando evitar repetições, respigaremos do Relatório então elaborado apenas os
elementos que não perderam actualidade, obviamente aduzindo eventuais dados novos
entretanto emergentes em consequência de intervenções de diversa índole que, no espaço de
tempo decorrido, se verificaram em terrenos do Polo III e na sua área envolvente próxima.
34
9.1 - Minas nos terrenos Universitários
- Minas do arco da Rua da Pena:
No ângulo Noroeste da antiga Quinta da Cuf, sob o entroncamento da Rua da Pena
com a Rua da Boa Viagem (Fig. 23), existe um arco de pedra em cuja parede de fundo abrem
as entradas de duas minas (designadas por M3 e M4, no Relatório de 1987).
Mina A1 (= M3 - Relatório Preliminar, 1987)
A mina A1, com soleira sensivelmente ao nível do rebordo do tanque que
primitivamente coligia as águas emergentes de A1 e A2, desenvolve-se para Noroeste com
traçado aproximadamente rectilíneo e numa extensão total de 50,0 m.
Após trabalhos de limpeza por nós efectuados (a mina encontrava-se bastante
assoreada por areias e por lamas negras oriundas do esgoto de uma extinta exploração
pecuária - ovinos e caprinos - que funcionava onde hoje está o parque de estacionamento
camarário) foi possivel verificar que:
em toda a sua extensão, a mina possui os hastiais revestidos a pedra seca e tecto
constituido por lajes de granito (Fig. 22);
tem traçado sensivelmente rectilíneo, orientação N 320 e comprimento 50,0 m; a
água debitada era coligida num pequeno tanque de decantação construido no fundo
da mina e depois conduzida até ao exterior por meio de uma caleira contínua
constituida por telhas de beiral (telha “canuda”) cuidadosamente assente no lastro
da mina;
o caudal debitado era (na altura em que foram efectuados os trabalhos de limpeza e
de inspecção pormenorizada), da ordem dos 52 m3 / dia;
35
o seu estado de conservação é excelente: nenhuma das capas se apresenta fracturada
ou deslocada e os hastiais continuam perfeitamente alinhados. Deve referir-se ainda
um curioso pormenor: dadas as características mecânicas da rocha atravessada por
este trabalho e atendendo à topografia
primitiva dos seus terrenos de recobrimento,
tudo aponta para que esta mina não tenha sido
escavada pelo sistema de “vala aberta”; nestas
condições, quer a sua escavação, quer o
trabalho subsequente de revestimento
cuidadoso dos hastiais e (sobretudo) o
capeamento - na totalidade da sua extensão -
por meio de lajes de granito, constituem sem
dúvida, tendo ainda em conta as exiguas dimensões laterais deste trabalho, uma
obra a todos os titulos notável, como tal digna de preservação e valorização.
Mina A2 (= M4 - Relatório Preliminar, 1987)
Esta mina abre à direita de A1 com soleira a
cerca de 2 metros acima daquela, desenvolvendo-se
ascendentemente e com inflexão larga à esquerda,
atingindo rapidamente uma cota de 4 m (relativamente
à soleira de A1); prolonga-se de seguida com inclinação
progressivamente mais suave. A partir dos 23.5 m
medidos segundo o seu eixo, este trabalho não é
visitável com segurança, uma vez que a sua estabilidade
é extremamente precária (Fig. 23).
Trata-se de uma mina construída com técnica
muito semelhante à da mina A1, mas mais alta e mais
larga no seu troço inicial.
Na inspecção por nós efectuada em 1987, esta mina podia ser percorrida numa
extensão bastante superior à actual, na altura estimada em cerca de 40 m.
Actualmente, várias das lages de capeamento encontram-se partidas e ao longo dos
Fig. 22
Fig. 23
36
hastiais e do tecto registaram-se “arrasadelas”, no troço não revestido. Estes danos
têm em grande parte origem na trepidação a que esta mina foi submetida por efeito
do trânsito de camiões e movimentação de máquinas escavadoras durante a
construção da Nova Faculdade de Letras. Dado tratar-se de uma mina com pouco
recobrimento (facto de que derivou a sua vulnerabilidade às “agressões” atrás
referidas), a sua recuperação - no troço inicial, pelo menos - não é dificil nem
onerosa.
Na mesma altura (1987), o caudal desta mina foi estimado em 87,5 m3 / dia.
Trata-se de uma inferência extraída atravéz da comparação do tempo de enchimento
e da capacidade de um tanque (hoje derruido) que em tempos recolhia as suas
águas, por sua vez baseada nos dados fornecidos por um antigo caseiro da primitiva
Quinta da Cuf que esta mina (juntamente com a A1) abastecia.
A esta mina afluiam, nessa altura, águas negras de esgoto, razão pela qual o seu
caudal teve que ser estimado pela via indirecta referida; eram estas águas que, dada
a diferença de cota entre esta mina e a mina A1, iam acumular-se nesta última. Esta
contaminação (cuja origem inequívoca nunca foi possível determinar) deixou de
registar-se após a construção da nova faculdade de Letras e, sobretudo, após ter
cessado a pequena exploração pecuária que existiu nos terrenos do actual parque de
estacionamento referido. Como se conclui, estas duas minas debitavam um caudal
total estimado em cerca de 145 m3 /dia ( 4350 m
3 / mês). Expliquemos a utilização
do termo debitavam.
Quando foi efectuado o rebaixamento da Rua do Bom Sucesso e do Campo
Alegre com vista à construção dos túneis do cruzamento daquelas duas artérias, o
caudal destas duas minas foi progressivamente abatendo até à quase total extinção.
Não obstante, o “veio de água” que as abastecia não foi definitivamente
neutralizado, mas apenas interceptado noutro local: as águas passaram a brotar no
fundo da escavação destinada aos túneis, precisamente no ponto onde conflui o
túnel da Rua do Bom Sucesso com a Rua do Campo Alegre (vd carta anexa).
Estas águas foram drenadas por meio de uma conduta construida com manilhas de
betão de 60 cm de diâmetro, à qual foi conferido o trajecto aproximadamente
indicado na carta anexa. A conduta cruza as vias de acesso á auto-estrada e vem
abrir num poço situado nos terrenos da Fac. de Letras, não muito distante das minas
37
A1 e A2. Esta conduta colige ainda as águas de chuvas que escorrem para as
sargetas instaladas nas rampas dos dois túneis atrás mencionados.
Segundo medidas efectuadas após a conclusão dos túneis, o caudal transportado não
sofreu quebra alguma, atinjindo (em dia não chuvoso) o montante total de 145 m3 /
dia correspondente ao das duas minas A1 e A2. Estas águas têm sido
abundantemente utilizadas na obra da Faculdade de Letras, sendo os excedentes
encaminhadas para a linha de águas pluviais que se situa ao longo da parte
remanescente da Rua da Boa Viagem.
Como se vê, a restituição das águas às minas A1 e A2 será (se este vier a ser o
entendimento quanto ao seu melhor destino) uma tarefa que não se reveste de
qualquer dificuldade especial. Por outro lado, se as águas vierem a ser utilizadas
apenas para rega, o facto de a conduta atrás referida também transportar
esporadicamente águas das chuvas não constitui qualquer impedimento à sua plena
recolecção e mobilização.
Importa agora referir uma circunstância que se nos afigura extremamente importante:
fazendo fé nas informações do Sr. José Coelho (pessoa que há mais de vinte anos a esta parte
está encarregada dos jardins envolventes das instalações da C.C.R.N. e que muito bem
conhece os regimes de águas da zona em apreço) existe uma ligação estreita entre o poço
principal da C.C.R.N. (Fig. 24) e as minas A1 e A2
11.6 m
Poço
CCRN 1.6 m
Bomba Corte
N
Tubaria
80
2.5 m
38
0.9 m
Falha Planta
Fig. 24
que temos vindo a caracterizar; concretamente, quando se procede à extracção de grandes
quantidades de água do poço da C.C.R.N., sofre abatimento parcial o caudal pertencente às
duas minas A1 e A2 (agora conjunto, após a intercepção do seu “veio” alimentador no ponto
atrás assinalado, ponto este muito próximo do local onde, sob o pavimento dos túneis, existe o
poço da C.C.R.N.).
Esta circunstância implica as seguintes ilações:
do ponto de vista hidrogeológico, é evidente que o acidente tectónico (falha ou
sistema de falhas) ao longo do qual se faz a circulação das águas que confluem
naquele poço é o mesmo acidente que garante a circulação das águas abastecedoras
das minas A1 e A2.
do ponto de vista da propriedade das águas em causa, resulta não menos evidente
que nenhuma das entidades - Universidade e C.C.R.N. - poderá arrogar-se o
exclusivo ou a primazia da posse das mesmas: as duas entidades haverão de acordar
entre sí o regime de partição / utilização que entenderem mais racional e
mutuamente vantajoso.
- Mina A4 (Arquitectura):
Trata-se de uma mina cuja boca abre no talude fronteiro à parede Norte da cerca da
antiga Quinta do Póvoa (Fig. 25), actual Faculdade de Arquitectura. Atravessa a via de acesso
à auto-estrada e prolonga-se sob a Rua do Gólgota por comprimento que desconhecemos.
39
Trata-se de uma mina não visitável em virtude
de se encontrar bastante assoreada; deste
assoreamento resultou aliás a obstrução do aqueduto
em U que a prolonga sob o recorte produzido pelo
braço de acesso da auto-estrada ao Campo Alegre,
obstrução que lhe abateu progressivamente o caudal
(em 1987 já este estava reduzido a uns escassos 0.45
m3 /hora).
Posteriormente às obras de remodelação e
repavimentação da Rua do Gólgota, as águas da mina começaram a surgir contaminadas por
águas e detritos de esgoto doméstico, do que resultou a obstrução total do aqueduto de
comunicação da mina com uma caixa de visita existente à esquina dos muros Norte e Leste da
cerca da Faculdade; as águas emergentes da mina passaram a escorrer livremente no talude
onde a mina abre e depois sobre o piso da estrada, aqui formando um charco permanente.
Devido a este facto, os S.M.A.S. decidiram encaminhar as águas para a rede de águas
pluviais, para o que bastou a abertura de um pequeno óculo de comunicação escavado junto à
parede (fontenário) que obtura a entrada primitiva da mina.
Não exitem actualmente condições para que se possa medir com rigor o caudal da
mina; mas sabemos, por informações colhidas, que é poderoso, justificando que se tomem
providências no sentido de:
desobstrução do aqueduto, com vista a restabelecer a ligação entre a mina e a
Faculdade de Arquitectura; simultaneamente,
reposição da qualidade das águas, mediante neutralização do foco de contaminação
por esgotos domésticos que actualmente tornam essas águas imprestáveis.
- Mina A3 (Letras):
A meia altura do anfiteatro natural formado pelos terrenos onde se situa a Faculdade
de Letras (ver mapa anexo) abria uma mina (não visitável na altura em que a conhecemos -
1987 -, por já então se encontrar fortemente assoreada) agora oculta em virtude de aterros
entretanto efectuados, que debitava um caudal da ordem dos 24.5 m3 /dia.
Fig. 25
40
A mina comunicava com um tanque colector por meio de uma tubagem de P.V.C., o
que tornou possível uma estimação bastante precisa do seu caudal; este não sofre variações
sazonais sensíveis e a água é potável.
No seu conjunto, as minas A1, A2 e A3 poderão assegurar aproximadamente:
A1 + A2 ----------------- 145 m3/dia --------------- 4350 m
3/mês
A3 ----------------- 24.5 m3/dia -------------- 735 m
3/mês
5085 m3/mês
9.2 - Minas exteriores aos terrenos Universitários
Incluimos neste inventário algumas captações que, não pertencendo à Universidade,
poderão contudo vir a beneficiá-la mediante acordo com a C.M.P., os S.M.A.S. e/ou a Junta
de Freguesia de Massarelos e após a efectuação de obras que se não afiguram dificeis nem
muito onerosas.
- Fonte da Rua D. Pedro V:
Trata-se do manancial que abastecia o fontenário situado no terço superior da Rua,
junto a um talude granítico vertical que resultou da
abertura daquela artéria (Foto 26).
Recentemente decidiram os S.M.A.S.
desviar definitivamente as águas debitadas por esta
fonte para a rede de águas pluviais, como meio de
pôr termo aos constantes desacatos que nas
imediações desta fonte ocorriam entre
automobilistas que ali iam lavar as suas viaturas.
As águas desta fonte - que debita um caudal
de 17 m3/dia - 510 m
3/mês - são portanto, neste
momento, águas perdidas. Têm excelente qualidade e o caudal nunca abate; e posto que os
Fig. 26
41
S.M.A.S. para elas não perspectivam qualquer futura utilização, estes serviços afirmam-se
receptivos à sua cedência à Universidade sem exigencia de qualquer contrapartida.
- Minas dos S.T.C.P.:
Referimos deste modo duas captações localizadas nos terrenos das antigas oficinas dos
S.T.C.P. demolidas para construção de alguns blocos habitacionais. Os desaterros exigidos
pela construcção destes blocos criaram taludes no
extremo Sul dos terrenos Universitários (terrenos da nova
Faculdade de Letras), onde abrem duas captações cujas
características não tivemos oportunidade de estudar por
só muito recentemente termos tido conhecimento da sua
existência (Foto. 27).
Estamos em crer que não será dificil um
entendimento entre a Universidade e a Junta de Freguesia
de Massarelos no sentido da construção de uma cisterna
enterrada onde fossem coligidas as águas:
provenientes destas minas, caso a autarquia se disponha a cedê-las;
provenientes da fonte da Rua de D. Pedro V;
proveniente da mina A3 atrás caracterizada.
cisterna essa donde, por bombagem, seríam levadas aos terrenos da Universidade.
Fig. 27
42
10. Impacte das construções da Universidade sobre a
hidrogeologia.
10.1 - Faculdade de Letras.
Não obstante as intervenções bastante pronunciadas sobre os terreno que a
implantação deste edifício veio a exigir - desaterros por meios puramente mecânicos e por
explosivos, segundo linhas grosseiramente paralelas ao muro da C.C.R.N., seguidas de
deposição dos materiais provenientes das escavações nos terrenos da antiga Quinta da CUF -
são nulas as perturbações dai decorrentes para o esquema geral de circulação das águas na
zona habitada que se desenvolve nas imediatas proximidades e a sul da nova Faculdade. Com
efeito,
a) - é facto que a abertura das fundações deste edifício exigiu a destruição de grande
parte de uma mina que abastecia as residências de P. Barbosa (esta expropriada pela U.P. e
demolida) de F. Fernandes e Paulo Valada. No entanto, como era conhecida (e comprovada
por meio de escrituras notariais) quer a posse, quer o modo de repartição das águas que a mina
debitava (e debita ainda), foi possível salvaguardar os direitos existentes, mediante
convenientes obras de protecção da parte remanescente da mina e de reconstituição do
dispositivo adutor das águas pertencentes às residências de F. Fernandes e Paulo Valada para a
caixa de distribuição onde (no eixo da Rua da Pena) se efectua a repartição das mesmas
segundo as fracções por direito pertencentes a cada uma das residências em causa.
A parte destas águas que por expropriação da propriedade de P. Barbosa ficou a
pertencer à Universidade constituía uma fracção diminuta do total em causa; entendeu-se, por
isso mesmo, que não se justificava a implementação de um novo dispositivo de repartição,
vindo esta parcela a constituir um pequeno reforço às fracções abastecedoras das residências
de F. Fernandes e Paulo Valada.
b) - os desaterros a que acima aludimos implicaram a criação de taludes onde, em
alguns dos vértices de zonas de alteração do maciço granítico exposto (Fig. 16) se
evidenciaram fontes, nenhuma das quais debitando, no entanto, caudal que justificasse
43
tratamento especial com vista ao seu futuro aproveitamento como “minas” para rega; as águas
que deste modo surgiram na área de implantação do edifício foram, por conseguinte,
desviadas do alicerce do mesmo mediante apropriados dispositivos de drenagem. Neste
momento, essas águas correm livres no interior dos aterros formados a sul da nova Faculdade.
c) - os sobreditos aterros vieram a soterrar a entrada da mina A3 e o tanque que esta
mina abastecia.
Após o soterramento da mina e do tanque, as águas (pertencentes à Universidade)
correm livres no terreno, vindo a constituir sem dúvida parte do caudal que flui de uma bica
improvisada existente no talude criado aquando da preparação dos terrenos para implantação
dos blocos habitacionais em construção nas vizinhanças da Rua Capitão Eduardo Romero
(Vd 9.2).
d) - quanto às minas que abrem na cabeceira do arco sobre o qual se efectua a junção
das Ruas da Boa Viagem e da Pena, as causas do abatimento (quase total em A1, total em
A2) dos seus caudais já foram identificadas e descritas (vd 9.1), de modo algum radicando,
como comprovado, nas obras da Faculdade de Letras.
e) - no que respeita às áreas habitadas envolventes da zona da Faculdade de Letras,
algumas perturbações ocorreram ao longo dos tempos. Mormente, moradores do núcleo
habitacional assinalado com (x) na carta anexa têm ultimamente encaminhado para a junta de
Freguesia de Massarelos e para a Universidade queixas relativas a perdas de caudal nos seus
poços, as quais, na opinião dos queixosos, se deveriam às obras da Faculdade de Letras e da
nova Faculdade de Arquitectura.
Face ao que hoje conhecemos sobre a estrutura geológicas e a tectónica da zona em
causa, bem como sobre o modo como aí se processa a circulação de águas subterrâneas
(essencialmente ao longo de falhas, que as minas interceptam a diferentes cotas), estamos em
condições de asseverar que as intervenções nos terrenos determinadas pela construção da nova
faculdade de Letras de modo algum estão na origem das perturbações que motivam as
supracitadas queixas.
Trata-se, aliás, de reclamações que antecedem em muito tempo o arranque das obras
da Faculdade de Letras e, por maioria de razão, as obras da Faculdade de Arquitectura.
Transcrevemos, em abono desta afirmação, uma passagem do relatório preliminar por um dos
44
signatários elaborado em 1987, onde, a propósito da invulgar e mítica extensão que a voz do
povo invariavelmente atribui às minas situadas na zona em estudo, se referia o seguinte “
iniciando-se por detrás e a cerca de 4 metros abaixo da referida capela (trata-se do local
assinalado com (x) na planta anexa), estende-se uma mina com direcção sensivelmente
idêntica à de M3 (=A3), cujo caudal, aquando da abertura das fundações de um dos blocos
do lado Norte da Rua do campo Alegre, começou a “abater” gradualmente até à prática
extinção (situação actual, de caracter permanente ao longo do ano). As águas da mina, desde
sempre límpidas e utilizadas para todos os consumos domésticos, passaram a surgir
barrentas logo que a escavação para implantação do referido prédio atingiu certa
profundidade; face aos danos verificados, terá sido apresentado competente reclamação
junto da entidade proprietária do referido bloco, a qual terá tentado - sem êxito - restituir à
captação as suas características iniciais. “
10.2 - Faculdade de Arquitectura.
O novo edifício da Faculdade de Arquitectura consiste num conjunto de construções
que praticamente “pousam” sobre o terreno onde foram implantadas, na medida em que quase
não dispõem de caves. Não pode, portanto, imputar-se-lhes qualquer efeito de intersecção
profunda de “veios” de água que eventualmente cruzassem a área ocupada pelos edifícios.
A construção desta Faculdade obrigou, sim, à destruição de duas pequenas minas que
já em 1987 debitavam apenas insignificantes fios de água, a cujo (imprescindível) desvio para
o dispositivo geral de drenagem do conjunto edificado de modo algum podem imputar-se as
perturbações do regime de circulação e abastecimento de águas registadas na franja habitada
(Freg. de Massarelos) que se desenvolve a Sul (base da encosta) do conjunto edificado. As
obras deste obrigaram a desaterros do lado Norte, com deslocação dos materiais escavados
para o lado oposto (Sul da antiga Via Panorâmica) formando um aterro que veio a ocultar
alguns tanques que primitivamente serviam pequenas quintas aí existentes.
45
Deve referir-se que o fontanário / lavadouro (pertencente à Freg. de Massarelos)
situado na base da encosta do vale fronteiro ao edifício de Arquitectura é abastecido por um
manancial oriundo de uma captação (mina, provavelmente) que abre entre o antigo e os novos
edifícios de Arquitectura, o qual não foi afectado pelas remexidas nos terrenos. A boca da
captação consiste actualmente em uma manilha de betão (Fig.
28) que debita a água para um poço (também de betão), a partir
da qual se estende certamente o aqueduto enterrado que, ao
longo da encosta (vd carta anexa), encaminha a água para o
sobredito fontanário. O percurso exacto deste aqueduto não é
conhecido; mas, do exame que foi possível efectuar (todo o
terreno do vale está invadido por espessa vegetação selvagem)
parece poder concluir-se que a água em questão (que não
pertence à Universidade) será encaminhada por um troço inicial
do aqueduto até um pequeno tanque intermédio (actualmente
oculto pela vegetação) e, a partir deste e ao longo do segundo troço de aqueduto, directamente
para o fontanário / lavadouro.
Nenhum dos moradores da zona que trabalham, como hortas, algumas pequenas
parcelas dos socalcos da encosta (e alguns fazem-no há muitos anos) jamais viu ou visitou (se
é que tal é possível) o aqueduto em causa, presumindo-se que se trata de um aqueduto de
pequena secção (“caneiro”, na gíria local), atravessando os terrenos a razoável profundidade.
As queixas oriundas da Junta de Freguesia de Massarelos quanto à deficiente
qualidade da água que surge no fontanário radicam nas seguintes causas:
i) em virtude das alterações morfológicas operadas na encosta por via das obras,
algumas pequenas fontes preexistentes não foram ainda devidamente reordenadas, pelo
que as águas se perdem nos terrenos e, aí circulando livremente, acabam por carrear
finos detritos barrentos para o fontanário / lavadouro;
ii) dado que ainda não esta efectuada a ligação do saneamento da nova Faculdade de
Arquitectura à rede camarária de saneamento, há também alguma contaminação
orgânica das águas escorrentes e infiltradas nos terrenos, águas essas que (juntamente
com as águas livres, mas limpas, atrás referidas) ressurgem em pontos diversos da
cabeceira de pedra do fontanário.
Fig. 28
46
Como maneiras de obviar a estes inconvenientes e restituir à água do fontanário a
qualidade primitiva (ponto essencial das queixas da Junta de Freguesia, já que, quanto a
caudais, não foram postas reclamações de monta) preconizamos o seguinte:
a) a recolecção das águas oriundas das sobreditas pequenas fontes que abrem na encosta e seu
encaminhamento para o aqueduto do fontanário de Massarelos, constituiriam um pequeno
reforço do caudal deste, não representando qualquer perda para a U. P. já que, pela sua
insignificância aparente não se afiguram merecedores de obras hidráulicas (mesmo que pouco
onerosas) com vista a eventual reaproveitamento para rega dos terrenos da Universidade.
b) execução do saneamento definitivo do novo edifício da Faculdade de Arquitectura e sua
ligação à rede pública como meio de obviar à contaminação orgânica da água afluente ao
fontanário.
Relativamente à água que abastece o antigo edifício de Arquitectura (vd 9.1. Mina A4,
Arquitectura), podemos agora afirmar que não tem qualquer relação com a do manancial que,
situado entre os edifícios (actual e antigo da Fac. de Arquitectura) abastece o fontanário de
Massarelos: ensaios realizados por recurso a um marcador hidrogeológico (rodamina)
habilitam-nos a concluir pela independência total das duas captações. A água da mina A4
perde-se actualmente, pelas razões oportunamente apontadas (vd 9.1), na conduta de águas
pluviais que lhe passa aos pés; a restituição da operacionalidade ao aqueduto (actualmente
entupido) permitirá reencaminhar a água para o tanque existente nos jardins do antigo edifício
de Arquitectura. O caudal em causa (que não foi possível medir, mas que por simples
inspecção visual se saber ser elevado) justifica plenamente as diligências que nesse sentido se
façam.
10.3 - Edifício da Faculdade de Ciências
Foi-nos facultado verificar, pelo acompanhamento regular dos trabalhos de escavação
das fundações dos novos edifícios da Fac. de Ciências, que não foi cruzado qualquer
falhamento importante do ponto de vista hidrogeológico. A água que tendia a acumular-se no
fundo das escavações não tinha origem em “veios” interceptados, sendo simplesmente água de
imbibição dos terrenos devassados pela escavação; para seu desvio dos alicerces dos edifícios
47
foram efectuadas competentes drenagens, com encaminhamento das águas para a conduta de
águas pluviais existente ao longo da Rua Viterbo de Campos.
Note-se que perto da confluência da tubaria de drenagem das “Ciências” com a
referida linha de águas pluviais foi assinalada (a cota inferior à cota de lançamento da tubaria
de drenagem) a existência de uma mina com razoável caudal; esta última (que foi
salvaguardada pelas obras) terá sido presumivelmente ligada a alguma linha de águas pluviais
aquando da intervenção de fundo que a J.A.E. operou em toda a área (há sensivelmente 35
anos) para construção das ligações à auto-estrada e Estádio Universitário.
Trata-se de uma interpretação com carácter conjectural (que consequentemente
avançamos com natural reserva), dado não existirem em poder da Câmara Municipal (nem
qualquer dos Serviços Municipalizados) cartas de implantação de infra-estruturas da zona a
partir das quais se possa ajuizar do seu grau de plausibilidade.
Mas podemos asseverar, em resultado de cuidadosa inspecção da área, a não existência
em terrenos da U.P. de qualquer fonte que (já pelo caudal, já pela orientação geral presumível
do alinhamento da mina e do possível caminhamento das águas) sugira eventual
correspondência com a mina atrás referida.
48
11. Reservas Potenciais (ocultas ou não aproveitadas)
Desconhecem os autores qual o tipo de intervenção definitiva para a área assinalada no
esboço da Fig. 29.
Fig. 29
Mas quer esta intervenção se traduza i) no prolongamento das edificações que
integram a Fac. de Ciências; ii) na criação de parques de estacionamento e de um novo acesso
da Rua do Campo Alegre à auto-estrada (em substituição da Rua do Gólgota); iii) ou em
acções conjugando as duas finalidades anteriores, uma coisa é certa: as escavações para
implantação de edifícios ou os desaterros motivados pela abertura de novos acessos
rodoviários porão fatalmente em evidência águas subterrâneas (abundantes e de cota freática
relativamente alta nesta fracção particular da área total em estudo) que, obviamente será
necessário drenar.
Nestas condições, entendemos que esta drenagem deva sempre fazer-se para a conduta
que, sob o pavimento do troço de confluências dos dois braços de túnel de Campo Alegre,
reconduz aos terrenos da Fac. de Letras (vd 9.1, Mina A2) a água que antes era debitada pelas
minas A1 e A2; fundamentamos esta proposta nos seguintes argumentos:
49
a) sendo inevitável a efectuação da drenagem dos terrenos em causa (grande parte das
habitações existentes no canto Nordeste do terreno dispõe de poços produtivos), que
esta se faça, por simples gravidade, para a linha mais próxima e de mais baixa cota - e
esta é sem dúvida, a conduta atrás referida;
b) os caudais deste modo captados constituirão reforço não desprezável ao caudal
actualmente disponível para mobilização, pela U.P., para fins de rega e cuja condução
se faz actualmente pela conduta em causa.
Como já referimos (vd 6), a morfologia da área em
estudo encontra-se fortemente condicionada pelas falhas
regionais, sendo também possível correlacionar a posição e
andamento das minas inspeccionadas com essas mesmas
falhas.
É grande a importância hidrogeológica das falhas,
sendo de considerar o cruzamento das mesmas como locais
potenciais para a realização de furos de captação com vista
a reforçar os caudais colectados em todos os mananciais
descritos.
Um exemplo que não podíamos deixar de referir, e
que vem confirmar a afirmação anterior, diz respeito aos
tanques de lavagem de roupa e fontes existentes ao cimo
da Rua de D. Pedro V, por baixo da Casa Diocesana de
Vilar. Neste local confluem 3 mananciais de água com caudais apreciáveis, cujo
aproveitamento deu origem a uma construção em alvenaria de grande envergadura (Fig. 30),
sinal que atesta a importância destes para a população que lhes dá uso.
Ora, uma simples análise da Fig. 31, permite verificar que neste local se cruzam 3
importantes falhas regionais, pelo que cada uma delas será responsável por um dos três
caudais emergentes.
Analisando mais em pormenor a Fig. 31, podemos então adiantar que existem, pelo
menos, mais cinco alvos que devem vir a ser tidos em consideração, se a U.P. pretender
implementar furos de captação de água nos seus terrenos.
Um primeiro alvo, que designamos por AL1, situa-se nos terrenos do Jardim Botânico.
Corresponde ao cruzamento das falhas designadas por F6 e F9. Este alvo pode estar
relacionado com as duas minas que existem no Jardim Botânico (vd 8.1 - 12 e 13), uma das
Fig. 30
50
quais se encontra desactivada. Devemos realçar que estamos a propor o aproveitamento de um
alvo em que a captação da água é realizada em profundidade, obviando a todos os
inconvenientes existentes numa captação por mina.
O alvo AL2 situa-se próximo dos terrenos para onde se previa a construção do Teatro
do Campo Alegre e do Planetário. Neste local cruzam-se as falhas F6 e F8. Por inspecção
superficial do interior e bordadura da rotunda criada pelas via de saída da Ponte da Arrábida
em direcção ao Campo Alegre e estrada de acesso ao Estádio Universitário, é possível
constatar a existência de afloramentos graníticos onde se visualizam algumas fracturas e
vegetação permanente que são indícios prometedores da existência de água.
O alvo AL3 situa-se no vale que se desenvolve em frente à nova Fac. de Arquitectura.
Neste vale bastante pronunciado, cruzam-se quatro falhas (que o condicionam),
respectivamente F3, F5, F6 e F7.
O alvo AL4 coincide com a mancha de terrenos anteriormente descritos e marcados a
verde na Fig. 29. Nas suas proximidades cruzam-se as falhas F4 e F7.
Finalmente refere-se o alvo AL5, situado nos terrenos da Fac. de Letras,
correlacionado com as falhas F3 e F4.
É evidente que a eleição de um (ou mais) destes alvos para localização de furos
destinados a captação de águas profundas depende de inúmeros factores, entre os quais um
avulta com carácter de poderosa condicionante; referimo-nos ao factor constituído pelos
edifícios já existentes, em curso de construção ou cuja implantação definitiva está já decidida,
os quais podem desenvolver-se sobre um (ou vários) dos alvos identificados.
Por outro lado, o facto de se assinalarem as grandes falhas regionais como acidentes
dotados de alta probabilidade de constituírem vias de circulação de caudais poderosos não
exclui, de modo algum, a eventualidade de existirem outras falhas (àquelas associadas), não
cartografadas por não serem inferíveis do exame fotogeológico, compartimentando os grandes
poliedros de terreno definidos pela intersecção das falhas regionais.
Estas falhas de 2ª ordem - chamêmos-lhes assim - podem perfeitamente constituir
alvos não menos interessantes que os primeiros. Mas a detecção desta segunda rede de falhas
não pode fazer-se por reconhecimento directo (isto é, por inspecção directa dos terrenos), uma
vez que toda a área se encontra recoberta (salvo em raríssimos locais onde o soco granítico
aflora) por solos - orgânicos ou não - que completamente ocultam a sua evidência superficial.
No entanto, existem meios indirectos de proceder ao levantamento deste tipo de falhas,
meios dentre os quais destacamos o sistema VLF. Trata-se de tecnologia e equipamento
51
familiares aos docentes do Dep. Minas, organismo onde existem elementos muito
experimentados e com excelentes provas dadas na sua utilização ao serviço de Câmaras
Municipais, empresas de fabrico de cerveja, etc.
A prospecção electromagnética VLF - Very Low Frequency - usa como fonte
excitadora as ondas electromagnéticas das estações emissoras de rádio com frequência muito
baixa, na banda dos 15 kHz até 30 kHz, que são utilizadas nas comunicações a longa
distância. Existem fontes emissoras a operar em diferentes países. Quando as ondas hertzianas
provenientes dessas fontes distantes incidem sobre uma estrutura condutora enterrada, mesmo
que coberta por uma camada de solo de espessura apreciável, esta passa a funcionar como
uma antena enterrada que por indução electromagnética cria um novo campo que vai interferir
na recepção do aparelho VLF. Tudo se passa como se o campo da emissora sofresse uma
modificação de polarização. Numa formação rochosa compacta, as zonas fracturadas (quando
preenchidas por água) correspondem a zonas de maior condutividade, comportando-se
portanto como estruturas moderadamente condutoras que o VLF permite evidenciar.
Em terrenos atravessados por linhas de transporte de electricidade (subterrâneas ou
aéreas), o sistema VLF pode sofrer interferências que originam alteração de sinal.
Não obstante, em grande parte dos terrenos do Polo III (terrenos universitários) não
existe, tanto quanto sabemos, uma rede tão densa de cabos eléctricos que inviabilize
radicalmente a aplicação do sistema VLF. É nossa convicção,
53
portanto, que largas manchas dos terrenos da U.P. poderão ser inspeccionados por meio do
VLF, o que permitirá a detecção de outros alvos hidrogeológicos (estes associados à
intersecção de falhas de 2ª ordem do tipo atrás mencionado).
Nomeadamente, os terrenos da U.P. que se estendem a Poente e a Sul das edificações
da Fac. de Ciências, (terrenos da actual Fac. de Letras, da nova Fac. de Arquitectura, do
Jardim Botânico e do Estádio Universitário) poderão revelar alvos insuspeitados constituindo
alternativas aos que neste momento são conhecidos. Este aspecto (de extremo interesse no
caso do Estádio Universitário) é também importante do ponto de vista da concepção de um
sistema integrado de captação profunda (furos) capaz de, com o contributo das captações
superficiais (minas e poços activos) identificados neste relatório, garantir à U.P. a autonomia
plena em matéria de águas para rega da área verde que se pretende revitalizar e/ou criar de raíz
na zona do Polo III.
Ora o projecto de um sistema optimizado de captações, armazenagem e distribuição
interligada de águas de rega numa zona já tão fortemente condicionada como é a do Polo III
exige, obviamente, o conhecimento prévio de múltiplos locais (alvos) onde se afigure
provável a obtenção dos competentes recursos hídricos. Alguns destes locais são agora
conhecidos; mas convém não olvidar que certos dos alvos identificados nesta primeira
campanha se situam sob edifícios recentemente construídos ou numa sua excessiva
vizinhança, o que - se não inviabiliza totalmente o seu aproveitamento - não deixa de implicar
o recurso a sondagens inclinadas, mais longas e dispendiosas em termos de execução,
equipagem e manutenção. Torna-se, portanto, transparente o interesse associado à
identificação de novos alvos funcionando como eventuais sucedâneos dos que neste momento
se conhecem, prevenindo a hipótese de alguns dentre estes se revelarem, por razões de vária
índole, insusceptíveis de aproveitamento. Em reforço do que precede, lembramos que, do
ponto de vista dos custos operacionais de um sistema integrado de captação e distribuição, há
todo o interesse em que as distâncias de transporte sejam mínimas, nomeadamente as
distâncias entre captações e respectivos depósitos colectores-distribuidores. Este desiderato só
é alcançável, evidentemente, se as captações se distribuírem o mais regularmente possível na
área total a irrigar; no caso vertente, isto implica a procura de novos alvos na área Poente da
nova Fac. de Ciências, já que as vicissitudes geológicas determinaram a ocorrência majoritária
de alvos prometedores na zona a Nascente e a Sul da sobredita Faculdade.
O Departamento de Minas possui os equipamentos e os recursos técnicos
indispensáveis para que um estudo desta natureza possa ser empreendido, caso a Universidade
54
venha a decidir-se pela conveniência de o executar; mas é tarefa que somente poderá ser
levada a cabo em campanha de levantamentos distinta e subsequente à que com o presente
relatório damos por concluída.
FEUP, Dep. de Minas - Outubro de 1995
__________________________ __________________________
H. S. Botelho de Miranda Alexandre J. M. Leite
(Prof. Auxiliar) (Assistente)