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inverno017 - palavrapreta.files.wordpress.com · eu sou do azeite" 35 abril: ... moriais que agora parecem uma ilusão, então precisamente ... que a navalha do corte que o chamado

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inverno017brasíliaDF

padê editorial

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tatiana nascimento

lundu,

poemas

cole-sã Odoyá #2

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poemas de tatiana nascimento(escritos em 2014 y 15, quase todos)

revisão: sabrina lopesprojeto editorial y diagramação: tatiana nascimento

ilustração da capa:

padê editorial étatiana nascimento y bárbara esmênia

brasília/[email protected]

lundu, foi feito no df,em fevereiro de 2016

a segunda tiragem em agosto de 2017

nascimento, tatianalundu, / tatiana nascimento. - 2a. ed. - brasília:padê editorial, 2017.

isbn: 978-85-920822-0-8

I. poesia I. título.

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adesvio:

em caso de emergência, quebre oprotocolo

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índex

odoyá 8pasto 9rodízio 10f48.1 1112 anú13 freátik14 delirismo15 sequilho reinos17 pajubárelicárionetuno em peixesfuísteclichê22 belizpilão 23visprenda minhacãterra estéreo 27alvos 28pa ojare 29gasta5.5hamurabi 32pólen 33dendêabrilpretocídio 36y7masankiôlundu 40y41diz/faço 42-44é que... (malembe, sampaulo)transmutá 49-53oniradiabobaleias 58y59manhãdissestetamboresbordaguiné 66anaisblack face 68cabalística dos eguns

ilú 70tangokemet

lovershipdesglaç

engenharias77 cesura

boloquitandaplexo 80

plantas secretasmadrugarrandômicaverão 84

hemisférioritmo 86miragem

iêxirê 89

“the earth is not a cold dead place”moisés

92, kronos é um deus,Amor

banzêromedio

santo-fortemudeznudez 97

babilôniasexo

idiomatradução 101

rotinamergulharestaçãoinversão

outro verãofim 109

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marabô

achei (que) você, (estava numa) encruzilhada(devanei(gr)os desde meu cuíerlombismo)

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a revolta de Odoyá.

lame-a oudeixe-mar.

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mundo vasto:

nessas ruminas da civilizaçãotudo vira pasto

y soja pra ração.

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placas com final sístole ou diástole:

o trânsito até que tá fluindo, congestionado tão é oscoração.

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F48.1

cura eh um processo de low-cura

precisa do tempo tentopassar.

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pretazulado (v. 3)

anu rasgafora coraçãovoa mais alto vasto y distanteque fome de asa é mirar horizontesaudade batida do chão

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freátik:

se corria um rio y chamava memória,enterrou na história: agora

só passa concretoaqui

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delirismo

pássaro enjaulado não canta,clamapor justiça

a gente que finge não entender o recado.

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delirismo

pássaro enjaulado não canta,clamapor justiça

a gente que finge não entender o recado.

sequilho

biscoito de pól-vora barril de pol-

vilhosempre uma lembrança

pronta no gatilho

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dos reinos mineral, vegetal, animal, & o capital:

os pastos de concentração são um campo vasto pra abstração daquela postasem pelo sem pele sem olhos sem matilha macia...isoporbandejada y filmeplastificada na prateleiraclimatizada do jeito que ISO-1945 gosta.

manufaturar morte como comida também é fetichismo de la mercancía.

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pajubá, ou

tradução alvejante de cultura retinta:chamar de padê

cocaína

(y depois Laroyê que eh diabólico...mas quem mata quem morre

quem ganha na trata dotóxico?)

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relicário v. 4

amorbibelôdelicado

se guarda noarmário num juntaninguém só

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netuno em peixes.

com a boca cheia de dentes y vazia de palavrasos olhos cheios de pó y nunca rios / dágua / para /

escorrer nada que valha / nada /destulhar as calhas retinais

barragem de contenção imaginária entre os canaislagrimais y o nó da garganta que calagrimais y o nó da garganta que ca

lamaçais y o nó da garganta que

chove.

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fuíste al sur

tivesse máquina do tempo que nem de espaçoyo volvia hasta asunción dos mil doce,pra tomar um tererê e dormir com você(noite sem pesadelo, dessa vez).como tempo só avança,voy dormir solita

o que é de boa, até,mas um tererê bem que ia bem nesse calorzão.

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clichê:

de volta às ruminas dessa civilização, você

bovinamentea ruína

meu coraçãomúsculo chei de nervura

como fossechiclé:mastigamastiga

mastiga atééééé tirar todo sumoy cospe.

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beliz:

já enfrentou muito golpe simy se corpo desse mar num carrega cicatrizé que sua pele dágua se desfaz contra o toque

de cada golpe

açoite chicote

eu me refizeu me refizeu me refiz

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pilão:

fazer do silêncio um prelúdioda palavra mais significativa

sentidodesejado y compartida

fazer do silêncio desinfortúniodesamarra

desafobaçãouma aprendizagem da maceração que nem concha pisa

areia em pérola,y diamante sonha uma era de vulcão

(bajo condições desantrópicas de temperatura y pressão)

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vis

desconfiança herançadesmenina:os arautos do sexo fácio sexo frágio sexovil.violado(por eles mesmos!)

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prenda minha, v. 3

rastreada na fé,achada no faro,

pêga no laço.

alma roubada da perdição amém y salva num afã:rude genealogia colonial do amor

amuja pintada à mão na foto prêmio de presa pagãbugre valentia na moldura do avô

"quando foi de madrugada, prenda minhafoi-se embora e me deixou"

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cã:

silêncioretalhando minhagargantapalavra enterrada, palavra escondida, palavra vexadaverguenzasilêncio de palavra nao-dita, intranqüilanao deixa ninguém dormirpior que tv do vizinho passando aquelas barbaridadepior que cã chorando sozinha trancada num quintal(tiraram ela da rua, da família dela, pra isso?)pior que briga de gato, mas de unhasigualmenteafiadas

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terra estéreo

a frequência do mono é sempresádica:

tempero sódiconamoro gâmico

o lato fúndico das culturasmono

fásicasnas faíscasdas enxadasdisputando:

os herdeiro do sol na balay os desterro do sal na cara

e na coragem.

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alvosnão dis-pardosmas de: dis-paros

alvospulmonaresdo dióxido da classe ranço brancomuito ódio aos alvos pretosei-los

meus alveo-los feitosbanzo

doem disfeitos sufoco

qualquer respiradouro senhorial é poucosou sensorial

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pa ojare

resquício da escravidão a servício da servidãoregalos da colonização: regalia de

cafezinho com bulinaçãoesquece o açúcar não, doçura

humildade num é humilhação. y curraresponde com sangue no olho, justiça do cão

desumanidade né, decapitar o patrão...a forja duma guerra que nunca cessa

de corpos, de peles, de classes, de chão"o dono da minha cabeça é aquele que decepa"

Ogum pa lele paOgum pa ojare

Ogum pa lele papa ojare

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gasta

vermelho pisado na chuva:é barropó fino na seca que tudo cobre(e tb todo mundo que morre)na mão de quem planta:farturanas latifundigarras,monoculturaera pequi, cajá, buriti,cerrado úmido cilial, era

agora quilômetros quilômetros detudo tudo tudo igualpros guasca nem cerrado basta

("um grão de pé de guerrapra colher dente por dente")

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brasília 5.5

sujo demaisnovo demais

escuro demaisferidas demais na

pele quase ultimato

um corpo a maisno vagão erradono século errado

no continente errado

presença quase desacato

incomoda demais a políciaas pessoas de bem

o ar metropolitan chic apressa

do

trem

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das ovelhas de hamurabi.

pra todo mundo que reza de joelho a cartilha do perdão e do arrependimento,

y lava a alma dando porrada joelhada paulada cuspe na cara facada no judas do

novo testamento:

a política do linchamento

nunca foi exceção nesse par de milênios lento

(como atestam os corpos retintos dos detentos)

no fundo no fundo ngm parece gostar muito da maria magdanela

(até hoje o ofício de seu sustento

é motivo de algum ... constrangimento,

acho q soh toleram ela porque cristo jesus insistiu no bom exemplo

mas hoje em dia quem beijaria

os pés dos lazarentos?),

atotô babá que odayá lambeu com seus dedos de salmoura, & oyá tocou com suas

línguas de vento, que se dependesse só do "amai-vos..." mandamento

todo mundo tava era fudido mermo.

o pólen púrpura da palavra

(toctoc toc

toc)quem vem lá?

eu que não abria a portase sabia que era pra você entrar

mas mesmo sem agô nem motumbá você ia passarpra pisar no tapete mágico da minha língua

com suas botas de mortepra sentar no céu encantado da minha boca

com suas ancas de chicoterir do meu pranto

quebrar meu sorrisoe largar tudo rompido

eu ia caminhar uma noite de quinhentos anospra me remendar

mas uma hora você dorme, não dorme?ah,

dorme,uma hora você dorme...

e eu não te espero acordar pra lascar minhalíngua de açoite nas costas do teu roubo secular

retomar o archeio do pólen púrpura da palavra

te sufocandominha gargantame libertando

[outubro de 2009]

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o pólen púrpura da palavra

(toctoc toc

toc)quem vem lá?

eu que não abria a portase sabia que era pra você entrar

mas mesmo sem agô nem motumbá você ia passarpra pisar no tapete mágico da minha língua

com suas botas de mortepra sentar no céu encantado da minha boca

com suas ancas de chicoterir do meu pranto

quebrar meu sorrisoe largar tudo rompido

eu ia caminhar uma noite de quinhentos anospra me remendar

mas uma hora você dorme, não dorme?ah,

dorme,uma hora você dorme...

e eu não te espero acordar pra lascar minhalíngua de açoite nas costas do teu roubo secular

retomar o archeio do pólen púrpura da palavra

te sufocandominha gargantame libertando

[outubro de 2009]

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dendê,

poema!

poema poema poema poema

po e ma.

eu escrevi pra vc umpoemaescrevi pra vc feitunbeso

y eu mesmo que preferia era te beijarloucamenteas palavras caladas uminstante apenas um maismas

tb... c num deu nada pra mealegrar ontem(o invés!)

nem cabe vendeta na conjugação pqeu e vc... a gente é tudo da mesma laia

só que em vc o q cheirapaura exala mostardana dobra da minhanuca

igualmente amarelas mas opostasde natureza:

"meu tempero é outro,eu sou do azeite"

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abril:

ouvi silêncio fazendo suas curvas até sair de dentro de mim y comentar uma palavra no canto do seu olho, “quei-ra”, não de forma imperativa mas como um convite pra que você falasse também. te mandei um bilhete em tempos ime-moriais que agora parecem uma ilusão, então precisamente qual é a diferença entre ‘memória’ e ‘ilusão’ senão que no caso de uma memória partilhada a duas a invenção foi das duas? eu não sei, continuei ouvindo silêncio vin-

do em suas curvas por dentro de mim até comentar algo em meu próprio coração, numa língua ainda não inventada nem imaginada, e que portanto eu não poderia reproduzir nem mesmo como palavra montada dentro de um poema sobre a

forma com que silêncio vem em curvas de algum lugar mui-to sutil y sedimentado lá dentro, fundo, quente, úmido

de mim pra se manifestar como qualquer coisa que não uma palavra – um afago, um aceno, uma impressão, um arrepio, qualquer coisa que não uma palavra feita da desfeitura

de silêncio que surge de curvas espiraladas subindo pelo aparelho fonador ou ainda de um pouco mais embaixo, da

boca doesôfago.

eu ouvia por um tipo de silêncio que não me bastassenem me incomodassenem te lembrassenem me afagassenem dolorisse

nem nadaque nem fosse silêncio mesmo

só a absurdez da vastidão de mar,mutez de mar

que obviamente não é mudo masse você fosse convidada a interpretar sua voz

ou a voz do desertoou minha voz na sua cabeça

como faria,a não ser por sua própria inflexão?

entende o que quero dizer quando digo que sinto silêncio se vindo em curvas?

[pra gaú]

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é na produção e na reproduçãoque a navalha do corteque o chamado da morte

se menina é nova é na reproduçãoou na clandestinagem da interrupção

("ah, mas nisso tu num pensou / na hora do bem-baum" ou "as da sua raça é forte / güenta sem injeção")

se muleque é novo é pela produçãona função de trafica até a de avião

(ou só pela impressãoa mera suspeiçãode.é o kitpeba em açãoé o terror do bonezãoos lobby$ta pela redução)

e desde abolição é assim que mata aquiassim que se descarta povo preto aquina espreita de curetar, na fila de parir,na mira da UPP, se responde ou se fugir

morte matada pela mão enluvada branco y verdepique hospitalencomendada pela mão armada, filmadora-capacetede policial(do exército / no morro, / socorro!)

política de extermínio é que nem bala no troco de pãoengole tododia uma pá de irmã y irmãoo povo sem sobrenome da famíliamais bastardizada da nação

y tudo isso pros boy ficá doidãopra não faltá mão-de-obra pro patrãopra empregada ter sempre substituiçãopra lotá os complexo de contençãoter muita notícia batida no jornal-televisão:

pretocídio

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lençol branco / corpo negro / caído no chão

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eleguá ko eleguá ko aña minha bocaboca do mundocaladaparece fazer mundo dormirencruzilha meu Ori na desmastigação de todaspalavrassonho desconfuso de eu dejá-vivi alaroyemasankiôeleguá koeleguá ko aña minha boca tamanhaafã de tudo aspirardevorarcom sede sedenta de água de mary quanto mais entornava mais sentia aumentarsede da própria ganadesejo do própriolatej-ar me assanha pela bocaminha sanha é pele y boca encruzilha eleguádescaminho impassivo não podia mais chamar

eleguá ko aña, alaroyê minha boca era abebe de me espelhar no oco do mundose calava parecia que mundo ia acabarminha boca me cobriamas sem nunca me cobrarera só o que eu dizia, y o que eu queriacalaraí só me ouviarespirar, agô

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masankiô

falando era boca de tudo

encruzilha o avessarmotumbá

bendisse Ifá:trezentos y sessenta

graus de saturnome avisô

alaroyê,masankiô

mas retornonunca mesma

que nem águanunca “nunca”“nunca mais”sempre mais,

eleguágua

de beber

mergulhou fonte pra-eu-dentroviu segredo

diznome-ar:

a filha do olho do vento!

eleguá eleguá ko

eleguá ko añaalaroyê masankiô

eleguá koeleguá ko aña

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lundu,

vem cá, deita em mim que nem ar que de tanto amar a gravidade deita em cima de tudo que tem na superfí-cie da terra y empurra quem tá dentro dela, ou que nem água vai se deitando em ondas sobre toda areia de qualquer praia pela dança do humor das marés, vindo indo no fluxo do vento, da lua, do sol, até, se te fizer sentido

ou então chama de F31.oceânicas se te apetecer, que elas são imprevisíveis, as ondas são imprevisíveispra afobação contida dum relógio, um diagnóstico de “doença mental”. mas vem, deita aqui que eu te rece-bo, y todo seu desejo, refluente mas sempre

presenteao mesmo tempo embrulhado y anunciado do silêncio que suas várias vozes calam,mas sempre

presente. eu quero que c me queira tanto y lento que nem um anú pairando no vento, pra quem o ar é casa tanto quanto a asa é força da expressão de sua graça, da engenharia sutil do seu povo, uma herança alada

que c pouse esse eu me tremer por dentro num sopro de saliva quente que nem vida significa ar prum anú muito além da pérola macia da pleura dele...

no querer do seu desejo meu desejo refez inteiro (é que eu não nasci lésbica)na arrebentação do meu desejo te quero oceano ao avesso (uma hipotenusa desértica)é assim que eu sinto o que é dialética,y esse meu abandonar também dança

uma diáspora

sãosão

sinto

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tem um somum som que seu cabelo faz no meio do meus dedo

é quase um tom específico de crespoguardado entre as camadas de uma voz

sua sampleando cada pétala de flores como na sua boca toda tragédia fossevirar música de novo

(beat box)

é que eu te vi dançar, y em menos de um instante eu já sabia que ia fugir tudo dentro de mim se eu não te

respirasse feito um cheiro antigo estranhofamiliar nítido

se você não fosse a pele exata da noite embaixo do sonho escuro de minhas pálpebra

aí eu voltei lá y prometi pra todas elas, sopro do mar, ondas do vento, gotas de sol fossilizando na

minha pele o corpo evaporado de água-mar em pedrícu-las de alma-sal, uma lembrança

eu prometi que eu dançava um lundu pra você quando esse desejo chegasse

y recuasseavançasse

y recuasseassentasse

y recuasse molhando fundo ancestral perene turvo tudo que transborda de você y eu na beira desse abismo,

beira do mar.

na beira do mundo, as ondas deitam na maré pra encherassim como o vento deita num pulmão pra suceder

a escuridão deita no horizonte pra anoitecery eu

deitoem você.

v. 36

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diz/faço qualquer trabalho, y m/eu amor de volta todo dia

quizila contenção quebrantoforca / camisa de força / sexo à forçafórceps. oucesárea(sem-injeção)interrupçãoa serviço do patrão(pra filha dele tem legalização)bastardomarpardo(pra gente é)negaçãodisjunçãoretenção no complexo decontenção quizila quebranto comtensãocompleiçãocor:tiçãoferrãomarcaduraqueimadurapele borbulharaça impuraferraduramula. a cavalo dado não se olhadentaduradentiçãodente-de-leite

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ama-de-leiteamarelo-azeite

azeite... dendezeiro... deleite:farofa, ebó, padê!

(tô falando de cocaína não tá?)Laroyê,

midádicumê?chuta não

que eh macumbaeh o quê? enfeite?eh seita? aceite:neh enredo não

neh folclore nãonem eh possessão,

eh religião.uma ala no sambódromo

bastaria? tava bom pra catarse

do delírio coletivo?eh primitivo? eh

feitiçaria?(cabia num capítulo da tua tese na antropologia?)

fantasia: carnaval carniçalbambuzalurubuzal

filial da sucursaldo inferno colonial "eu vim

porque me roubaram"me venderam porque

me compraramme doeram

dor... arrancaramdor

mares de banzonavegaram

dorme odiaram

dó?chicotearam

atearam fogo? tambémno terreiro de iaiá.sopra um vento, Oyá,

que livrai-nos do mal doesquecimentode quem?

os santos malditos diriamamém?

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rindo por dentrofingindo

espanto? quebranto... quizila... Ifá, com você,eu vim do mar

do amargor eu podia saber de cor

a dorme chamar de errante

me ceder ao feitoreu podia ser só

matéria turvamemória podrejante em rio-curva

mas mais:sou carne crua

línguafiadamente assentada

y pele... pele! agô,minha

Pele: tu, es-cura

alimenta de um tanto minhas fundura...quebranto... quizila? banzo.

quelê / acalanto / roncó / irê:Orí forte > plexo convexo >

Ofá rumo:sorte

calmariatecnologia ancestral

y força

que axé, princípio vital fim y meio,

é força

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é que de onde que eu vim é assim: cê deita a cabeça bem pra trás y parece que tudo é só azulde beira a beira [v. 9]

são:6 horas y 47 minúterosacordados desde antesdo céu clarojá cansadassecretáriascozinheirasprofessorasempregadascarregam

correria dentro do peito apertado no vagãoy a cidade nas costas doídas pelo patrão

são3 horas y 4&20 mininosou meninasdesaguandorolam pedras pela sédescalços e com pétão encardidoquanto a cidadeque descarrega umadose de rajada diária contra seus“o peito do pé do pedro

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é preto!”

e é por isso que tododia ele morre mais cedomesmo se for

no meio da tardeno coração da cidade ou num buraco

no gueto[a polícia alega alegre: “suspeito”]

são9 horas & uns tantos m

inóspitos espaços no silêncioentre a novela & quase hora da janta

o caminho beco viela eu ...num dá medo?

faz nem 3 hora era pipapiquebola

criança

agora eu aperto o passoligero

num compasso diferente do que eu tô acostumadamas já tô acostumada

a noite foi roubada da gentesó que num é de assalto que eu tenho medo não viu

só quem nunca me acostuma é o ritmo dessa cidade, não

o céu mesmo de noite nunca fica escurãoninguém dorme?

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no metrô todo mundo me ultrapassa eu desaprendi a pressa

que, no cerrado,

horizonte não é tudo só esse concreto y aço na ver-tical não véy num tem essa sensação de labirinto do tetris o céuzão é só o ouro se cê vira a cabeça bem pra trás...

[piscavermelhopiscavermelhopiscavermelhoalar-mealardealarmealerdaFECHA

ah

merda

era pra eu descer nobrás. jáera.]

essaânsia de chegar no fim do arco-íris de milgrau de cinza é pra achar um pote desossego? umrespiradouro?olhos que não ex-capem os meusnão lágrimem fumaçadas fábrica,dos escapamento?

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eu tento / mas eles desviam muito

rápidosão18horasy30minúteisemponto.os passos

engravatadospássaros

engaioladosos sonhos

engavetadosy amores

empoeirados

a garoa deita em tudo divagar

mas os relógicos sãosempre apressad

os não repousam

são

osso

não

pouso

são ...

[pausa]

não

pára

são-paulo.

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transmutá:

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em nome do caisdo trilho

e do espírito banzoele me disse simdisse sem senão

era a gira da vez

em nome do capatazdo grilho

e do espírito claustroele temeu que simele disse: não!

palenque, QUILOMBO em vez

em nome do maízo milho

e seu espírito quânticoele me disse "sim"a flor da explosãocurando sua tez

em nome do saravádo brio

e do espírito soltoele me disse simc num ouviu não?

ele disse tao... nuvens...

em nome do aido íleo

e do espírito sângueo

em nome do hepáticodo rínio

e do espírito pâncreas

ele me fez

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renome Orí-zomabile tática

instinto drapetômano

ele me fez

o xamânico bichoancestral biônicohumano ilícito

ele me fez

tectônico ritocontinente riscodiásporo onírico

ele textura

de pele escura

quebrantolura

acalanto

era tantode areiade fundode marde lowcura

Ilê disse sim(pro Axé)Ikú nãopro amém

NÃO!

e Ele dissen-tão vem

TataAtotô,Baba.

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o curandeiro palhico é o pai:

em seu canto,Sapatá

dançarino varíoloco o filho:em seu banho,

Odoyá,

doburu seu espírito-milho:venta o manto

pipocá

com um soprode Oyá

para transmutápara transmutápara trans

mu

táta

tata

táta

tata

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onira eu me deitoeu me durmoeu sonhosonho com uma montanha coberta de árvores cobertas de folhas cobertas de arar por todos os lados y poros, dentro y forase mexendo dançarinamente que nem vento de acordarde acolherde acariciar sonho com uma montanha de árvore coberta de folhas cheias de gotasde águacada gota brilha como uma lente pequena redonda con-vexamente contandoos segredos do mundo inteiro(e de todo mundo que olha cada uma delasde perto)sonho com um tipo de água de redençãoque vem nos libertaruma grande quantidade de água que vejo do alto de uma serra precáriaenquanto corro tão rápido que alguém pensaria que voo& então depois da serra aparece marmar verdeverde escurocheio de promessa de limpar tudo& fazer tudo certo agora, dessa veztem casas tambémcasas enormes que o mar lambe com suas ondas se es-palhandochegando nos azulejos, no piso de uma garagemprimeiro(o piso é vermelhocimento-quemado"vermelhão"coisa boa de minas)y logo as línguas molhadas de mar vão subindopelas paredespelas escadas

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molhando os degraus de madeiraas janelas

as cortinasos móveisas camasas louças

os restos de comidanão tem ninguém nessas casas enormes que

eu sonhopelo menos ninguém como a gente

e o silêncio repentino das ondas deixa

tudo com cara de um filme antigo de ficção científica futurista rodado em super- 8 de imagem bem granulada colorido em techini-

color

é engraçado quando eu sonhodepois de dormir

depois de deitar.

[de 2009 também]

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virei no que chamam diabomeu couro era rarocustava quararrancar nem os dentede cavalo dadocabresto alado costuma afundara menos que Eleguá... Laroyê. Masankiô.

veleiros do medono mei do aguaceiroum sólido marsalmoura incabida pra tantoquebranto y feridatingida de sanguenão-estanque / ardidacustosa de cicatrizar.

ou era esse mar bacia do pranto infinitamanchando de banzo sua extensa medida?

sofrência de história antigasangrência insofrível resistidaquilombismodum povotodoque nem na alcunha pessoaganhava guaridamas se fez alafiar

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entidade maior y sentidaOrí é destino y acolhidae tudo no mundo tem boca

porque come e porquetambém sabe falar

vingança retalha qualquer casa-grandechão palavra preta espalhado sangueterreiro-refeita dançalma de longe

um poder do opressor eh fazendo silêncioem navalha

encruzilha nossa carnedilacera nossa alma

mas aqui não,

sinhozimcapatazcapitão

sacristão

aqui

não.

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baleias (v. 17):

na revolução / do reboladona estratégia / do jeitinho

contra o ataque tático / da cutucação

tipo esquemática masnada sistemática, mais

pra sintomáticadiagnosticação

(y solidão:tecnologia em rede social de assistir,compartilhar, & curtir / solidão)

chama vitimismo

vive de passadismoprende em denuncismo

traz capataz pra reaçãoquem pensou que estase é

equilíbrionunca fez cordabambismo

se:esquivocou / na enterração

prefiro:

escavação arqueológicatipo organo-bótica

de futuroprefiro ciborgue

de pele diaspóricaondalética pós-utópica

desaqüendá no portoinseguro (são)

ancestraistecnologias curativasanciãstecnologias orgasmativasdazantigatecnologia contraceptivas(famoso “cola-velcro” é puratecnolorgia dazamiga)

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animais tecnologias digestivas / palatais /gustativas,papilás:

(y la nave vá:)tchu tchatcha tchutchu tchatchu tchatcha tchutchutchu tchacha thutchutumdum

“baleias comem micropartículapra fazer micropolítica!”oi? c falou que“baleias comem micropartículapra fazer micropolítica”?oxi oxi oxi oxi, pra mimbaleias fazem micropolíticaporque comem micropartícula. (y as baleias num são peixes,são mamíferas) eu sempre sonhei com elas numa onda meioxamânica…a casa delas tem vista oceânica,diz que elas é tudo monogâmica,que têm lembrança elefântica, y ainda assim elas vivem flutuando & cantando?amram, ainda assim, vivem flutuando y cantando... então eu,(que como diria a carolina de jesus sou) exótica euavessa a venena tóxica euessa mamífera torta (y tortillera) eusobrevivida às estatística necrófilaracista, lesbofóbicaeu qui num vô rimámemória y dor

né?

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manhã (v. 01/016)

minha mãe é de ventotodo dia cedo eu vou me abraçar dela no ponto de es-trangulamento da paisagemonde o concreto aparente do arquiteto só não se der-ramou mais ainda sobre a réstia mais valente do cer-rado porque em algum lugar eles tinham que instalar uma malha de eletricidade néos postes, com seus braços rígidos estendidos pro céu, não abraçam

Oyá.

eles só reverenciam o maquinário da cidade dividida por ruas estreitas, esburacadas, de alta velocidade, baixa reciprocidade.de um lado tem prédio de 35 andares, do outro con-domínios inacreditáveis, 5 suítes cada castelo, sete garagens pra todas as carruagens.cubículos [coloniais] pra criadagem.

eu ando por um mei de mato onde os anús inda conseg-uem montar ninho a despeito da desova de cachorro morto, entulho, embalagens de todo tipo de plástico da mesma natureza

petrólea.

as redes de eletricidade sólida fazem um zunido con-stante que na minha cabeça cê... lembra aquele filme da pretty woman lutando contra o câncer comendo as vísceras das crianças por morarem perto demais de uma malha de eletricidade?os aviões passam longe levando gente que num conheço pra num sei onde mas não me dá saudade daqui,

quase nada me dá saudade daqui

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só a ausência dágua no leito afogado pelas pe-dras-fantasma desse... desse... desse rio onde eu me emburaco no ponto de enamoramento das visagens, dos

vestígios, dos delitos, do delírio, dos dilúviosa ausência das águas claras enferrujada

por dejetospor entulho

pelos sonhos de concreto do arquiteto mais famoso que a cidade que ele nunca habitou

por onde ele nuncacaminhou recebendo uma rajada de “poeira poeira la-

vadeira enfeitadeira poeira poeira vermelha”

contra os olhos.

minha mãe é vento e todo dia de manhã eu vou com os cachorros me abraçar com ela no ponto de entorpeci-

mento das minhas cartilagenso coração é uma engrenagem rangendo fundo no peito

raso rasgado pela amargura da cidadeaço, concreto, paisagem de cimento

minha mãe se chama a dona dos ventos, das tempesta-des, das paixões,

e dos mortos.

um abraço dela vale mais que duas mil setecentas y vinte três passagens de ônibus pra qualquer outro

ponto fudido rasgado roto torto dessa cidade quebra-da com ou sem integração do sistema de imobilização

urbanae por isso eu preciso seguir delirando,

por isso eu prefiro seguir delirandopor isso

que eu vou seguir delirando

("don’t fall asleep at the wheelsi waited for you but you never came

you better keep moving")

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"...que se tua voz tivesse força igual à imensa dorque sentes, teu grito acordaria não só a tua casa,"

casadade papel passadopassada lavada varridadona de casamulhermãepaiporradaa marretada é na testa da résVACAa murretada é na reles esposapresta pra nada emposta: prateleira rosada, cortes &carnes resfriada, frígida, moleflácidafolgadaa facada é na altura do coraçãono suvacosangradapingada no ladrilho& os pedaços do corpo daPORCApendurada em correntessuja desleixadanum sabe fazer nada numcria direito os filhocozinha mal, fala tudo erradoBURRA JUMENTA CAVALAgrosseira ignorantepreguiçosa lentanum passa num varrea vassourada é naCACHORRAacorrentadarainha de fundo de quintalprisionada-guardiã da garagemgradeadaPIRANHA GALINHAsafadapara de chorarpara de gritarpara de doertem ninguém ouvindo e quem tá ouvindo num faz nada.

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(mas a vizinhança inteira??)

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tambores ancestrais dos ritmos desvalidos um poema me levou de volta um sonhoacord'eu

poesia que me veio de cor dadador'meu

a irmã trazia pra casa docede mel y palavras pra comunicar aquelas almasisoladas em solidão consanguínea

fazia alvenaria parecer uma casa;quem sentia tudo avesso era eue sempre foi assim.

os gemidos os tossidos as risadasboneca quebrada parecia a mãe da mãe dela e deeu

ecoando na madrugada de pesadelo jamais rezava assimesquema "isquemia"coração rebelde

em rébreudia

[dadá, a yemanjá da casa. esse é pra você: por seu amor, sua força, y doçura]

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a borda horizontina eh toda mar:

sua pele tambor me ecoa

tudo aqui em mim ehsal

saudade

& shiiiiiu...chuaaaaa...

você

pausa no ruídoda rotina

vazaleeeeento na minha retina

nas minhas

vag

(y

n)as

minh

as rima...

["ay váyanse preparando / ay váyanse preparandoque el conejo va a salir / búscalo aquí, que búscalo

alláque el conejo va a salir / como que te va, te va

como que te viene, viene / como con tu lindo abrazovágalme díos, que este si es dolor / arrulladito me

tienes"]

[pra r., melhor oferenda de Yemanjá naquele ano]

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guiné:

e sepor decreto-lei ventre dela foi feito pra:limpar

se por decreto-lei ventre dela foi feito pra:carregar

se por decreto-lei ventre dela foi feito pra:fabricar

a raçao bastardoo bandido

ela fez foi colá-velcro, tomá garrafada,cada criaamadacomo fosse realeza

senzalabanzoôôô zunido de bala

(e tome vinho da guiné, pra sinhozim não lhe abusartome vinho da guiné, ele nunca mais é acordar)

favela, ranço, zunindo chibata

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dos anais da psiquiatria,

maus agourosnos auspícios dos

hospíciosauscultando os suplícios

diastosísclicostaquicardíacos

nos peitos olorososnos plexos bolorentos

o complexo psiquiadentrovai

temço y nadaholístico

fragmentar corpo em pedacíliosCÍDicos ou

cistosnas púpilas das "as normalias"

y suas pestanas pegajosasou um cisco

no ferrolho do seu culto acerebral:

lobotominha rima com monogaminha,mas mesmo assim so

lnum faz ser/tão.

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exhibit b, v. 6:

corta corta corta essa imagemfinda essa viagem de sepultura náutica pra carregarminhas ancestraiscorta essa imagemfinda essa viagem de tumba trágica pros meusancestraisc o r t a sua viagem,fim! dessa imagem de catacumba exótica, zoológica!,pra agradar, ensinar, compassionar seus ancestraisfim dessa viagem, corta essa imagemde mortalha nostálgica a serviço das suas ancestrais

que minha língua preta é mágica!minha língua, preta, é mágica.naufraga a memória torta na calunga funda dessaslembragem, é tudo paragem...quer me impedir caminhar / congela o frame na iaiáeu nasci foi pra dançar, eu nasci pra voarela quer impedir eu de me amarquer me afogar no mar que é a minha casame assombrar da noiteque tem a minha face?mas não tem, não tem, não tem disfarceBLACKFACE É BACK AÇOITE

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[da matemática, da cabalística, danumerologia racística dos eguns]

02/10/1992111 defuntos28/11/2015111 disparos23 anos depois515 anos depois05 corpos depois02 segundos depoistododia

=

87/dia87/dia87/dia

morte da periferiaestatística necrofiliapretofobia estadistay viva la policía?

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ilú

distante y lentocomo um sonho enchendode água morna castelosde poeiratransborda derraama dentromarei’as ondasturvas meu destinosimultaneamente leve intensoavessao denso,nu transedançoolhofechadocorpoacordadobatuque úmido ancestral do vento

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da jurisprudência do tango,

1.

eu bebo da sua voz com a/videz de quem mergulha no

próprio alheamento em busca de um espelho

e entorno meu silêncio como líquido desfeito em vento

porque assim eu sonhei que você poderia me

acompanhar.

2.

sua lua embaixo de

qualquer noite virando silêncio veloz que as palavras tentam

devorar sem engasgar

me assusta e me apraz

me chamou de volta na terra que eu jurei nunca mais caminhar

(por isso mesmo só nos resta

dançar)

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kemet [to n. said w. and all his beauty]

palavraperda / gesto vagoimprecisoraciocínio

palavrapedra /gesto vidroimprevistogecarcinus

palavrapreta / gesto vastoinconsútil

Sol

sinto

(o trópico de câncer tange a ponta pira-midal)

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lovership:

planejar o fim do mundo, pra mim,é esse banzo por uma noite virando

céu no dia da sua boca,apocalipse

de palavras.

planejar o mundo, por fim,é esse banzo por uma noite virando

céu na boca do seu dia,apocalipse

de palavras.

planejar o fim, no mundo,é esse banzo por uma boca virando

noite no dia do seu céu,apocalipse

de palavras.

planejar o fundo do mim, por um segundo,é esse banzo por uma noite virando

dia no céu da sua boca,

apocalipse

de palavras.

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desglaç v. 4

gigante y rara indiscutível floradacactácea no meio da nevascaembaixo absurdavesso deserto

fogo de areiapestanejante bajo pesodes' hielo eterno parecente

mas por cada espinho sonhay é logo que ela despertalogo desperta

sazonalprecisacerta

[pra nina]

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entume

ser:

dizfaz minha gramática com péta

lágrimas pesadas riscam a pelexata de nuvemto arredio me desorganiza, também, a sem

sa(cia)ção sintética de uma sintaxe dos afetos, que tão diz

ordenando-seu é outro idiomavara a curva do meu desejo

enciclopédica:

a menor distância entre dois plexos é mergulharno abismo da paixão & dum

si(l)em

cio

tum dum... tum dum... tum dum...

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engenharias da destruição

tem muita cabeça nos meus pensamentosguilhotinando meus sonhos sob uma esteira fabril demetas, convenções, planejamentos, res-sentimentosum fio fino de suspensão febril se derrama regular y lento portoda superfície das minhas pelespelosporoscartilagens entupidas de simentoeu hoje me acordei sentindo urgentee que eu não compartilhava linguagem em comum com nenhuma outra pessoa humana sequer pra quem pudesseme desarquitetar

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o jeito que sua palavra vai dizcosturando a forma de uma palavra,

se reinventando em outra logo também descosturadapra revelar o fio impermanente do sentido

amram, tem uma figura de linguagem que dá nome pra isso

mas eu tô falando é da impressão

seu jeito de descosturar a forma de uma palavrareinventando ela em outra logo também descosturada

revelando o frio do sentido impermanentevestindo ele de outra forma,

provis

olha: sei que tem uma figura de linguagem pra dar nome nisso

mas tô falando é de como me entorna

["nossas palavras se ajuntam uma na outrapor amor, não por sintaxe"]

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tem que pôr cada ingrediente em seu tempo ylugar,bater com vigormas devagar

porque se for rápido demais faz a massa des

amar

(você ama ydisanda rápido demais)

é que nem receita de bolo: pra num disandar,

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quitanda.

fruta secabu ceta suculenta chu pa queé de uva manga abacaxi maçã y seus lábiosde romã, seus dedos tecelã lúcuma tucumã naranja tropicana y banana-

passa, só desejo que nã... num

passa.

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plexo:

território aberto sub-epidérmico que gosta muito desexo. só sente dor se pressente dissabortem um parente soleneno oriente:“timo”y t r e m e quando eu passo renteao peso ladino do seu aré bastante lunar;um radar selvagem. instruções de lavagem:águademar

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a pele do tambor parece rasamas o seu barulho é fuuundo...

a casca da semente guarda o segredo do mundo:devir / devir / devir

tudo dependedágua

do vento que espalhado calor que embrasada terra que abraça

da quebra da dormência

a vida sementeia plantas secretas

[gaú de novo, y pra lice tb]

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madrugar:

grande ocupaçãodevisar paisagensplanejarconfortos,aspirar a nadaalém de acordar nas horas tinturadas de uma qualquer alvoradasimplismente acordarpra sonhar que depois de: vidraças,grades & muralhas, ruas poste-reverenciadas,memórias de rio asfaltadas, terra cimentadaainda tem muita paisagem que divinar

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randômica:

paixão é peledesejo da pele

vontade de pele

é trocar de pele depois que uma pelejávelhacabadacansadamarcada despelabrilha pele nova em folha de pele

paixão é obscuridadeescuridão y aleatoriedade

uma ficção científica da epiderme

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solstício

os cílios do dia transbordam suas beiramais longa, vai longe Orí-zonte. convexo

de sol uma chamap u l s a n d ono plexo

[y aqueles que arrastam inverno no peitohão de ver,hão!]

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no peito sul do hemisfério aberto,

meu faz primavera em qq bandaestação mais farta y mantra:

no plexo amor, no base calor, flor na planta

tudobrota

água morna y seusmistérios.

(“abre a janela do meu peito”)

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(é o mesmo ritmo das ondas,)

sístole:apaixonado pela inérciasegue pulsando

diástole:até se arrancadopeito afora prarespirar

(das marés...)

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miragem:

achei que era oásis s.q.n., seca deserto estiagem sertão.

estiagem: achei que era oásis s.q.n., seca deserto sertão miragem.

(prefiro o primero)

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iê:

aprendi com água de rio,ligeira no meio y macia nas beira:que crise é encher o peito de vento semcoragem de mergulhar, que esse rolet de gavetaserve só pra embolorar y que eu sempre fui de ultra-passarqualquer barreira.

volta do mundo, camará.

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xirê:

vi o que as pretas faziamde branco da cabeça aostornozelos, que nos pés

iam descalças

alguém cochichou“tão ensinando o santo dançar”

intuí:tão é ensinando o corpo orixá(r).

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mas é uma terra redonda... céu expande pra cima y o mar pra baixo, entãohorizonte eh o único ponto de contato(mas é vasto!)

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moisés

eu no exercício de contenção, você: exército em expansão. euvou de síntese, cê antítese. & no q’eu apocalip-se,

c num é só o gênesis não, mermão,é o velho testamento inteiro:

caos, sacrifício, barbáriedevoção.

[w., que nunca amei,mas pra quem fiz poemas ótimos]

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kronos é um deus,

não um relógio. y a feitura da meteorologia é coisa sua né?q qdo a gnt se encontrou parece q o tempo ao mesmo tempoparou y disparou aqui por dentrofiquei toda sem medida com vc

(tambor de todos os ritmos,transformai as velhas formas do viver)

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Amor:

leve a pena de maatnada além do que me bate

transpar-essência é ser fortefortaleza nu core, diz-cerne y sorte

a minhacaminhar amante

sob teunorte

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banzêro

saudade não – essa eu aprendi(depois de mais velha)mas banzo eu desde sempre senti,vei comigo de lá de onde eu vim(muito longe dessa terra)

[pra nina]

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medio

avesso do desejo num eh a sco eh aquele tédio a cre

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santo-forte:

oráculo-bússula-talismã Odú de Ifá, norte hoje ontem amanhã enche minha vida de sorte

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mudeznudez

falaranca aqui da minha boca palavra

que não quer calarnem um beijo.

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babilônia 11:15

a chuva derrama um intentoantigoenferrujar meu equipamentocontigo

[r., tateando tambores nos meus interiores]

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sexo:

palavra certa pra escorrer de sua bocamomento exato pra correr por sua pele

um dedodo pescoço até o avesso

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em qualquer idioma,

calmacamaalmaama

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tradução:

idioma dos corpos é comtato

e a língua da pele tem a melhor dicção(chama “fricção”).

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rotina:

na memória da minha retina só dá sua pretice, sem pestanejar“até debaixo dágua”, mesmo que olho abrisse,“até o sol raiar”

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mergulhar:

acordei na beira do seu risoparecia um mar

rarefeito em precipício

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estação:

a gente esqueceu mas semente sabe do começo exato delaavisa as flores de dentro da terra, óbviocomo elas vestem pétalas, imprecisam de relógio.

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inversão térmica, v. 3

agosto guarda pro inverno as noites frias que cortam maistb as manhãs mais vendavaistb as paixões mais infernais

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deixa o verão pra mais tarde:

dia do mais longo dos sóis...y eu sonhando um equinócio em seus lençóis

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eu hoj estoudesa paresendo

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fim

nem sonhonem poema

nem palavrasilêncio nem

num temninguém

aqui alémde mim da madrugada

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(ei,

c deve ter notado as ilustres companhias de ellen oléria,manoel de barros, radiohead, aláfia, legião urbana, djavan &cacaso, los cojolites, laerte, beto guedes, explosions in thesky, moraes moreira y carlinhos brown espalhadas por aí. talvez até um los hermanos... mas tudo bem se não notou.

gracias a minha mãe sinaide:por me ensinar a amar livros & me ensinarque feminismo é uma prática, não um monte de palavras;a meu pai, mário jorge, musicador do cotidiano;sabrina lopes pela revisão;samuel pela centelha y palavras, materiaisy imateriais,leo pelas capas,y bárbara esmenia,pela ventania partilhada.)

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livro ___ de 400(segunda edição)

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sem pái chão numtem pó& cia

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