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JORNAL - AJURIS - A AJURIS tem como finalidades, entre ... · A legislação é uma colcha de retalhos. ... fiscal que o Estado fez ao longo dos últimos anos e continua fazendo,

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JORNAL DA AJURIS

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Uma democracia verdadeira não admite que as grandes questões públicas caminhem à margem do domínio social. A falta de transparência nas políticas de isenções fiscais, na conjuntura atual, desencadeia uma série de questionamentos, com forte apelo

coletivo no que diz aos direitos fundamentais. Os recursos envolvidos nos programas de incentivos ocupam mais de um terço do orçamento público no Rio Grande do Sul ao mesmo tempo em que o Estado não cumpre o mínimo constitucional nas destinações orçamentárias para educação e saúde. Este contexto mescla precariedade de serviços essenciais, carência de receita, ausência de controle social nas políticas de incentivos e falta de critérios de avaliação das contrapartidas. Os efeitos desta realidade podem ser bem percebidos pelas dificuldades dos governantes em consolidar programas de gestão que resultem em melhoras significativas nos serviços públicos. A estagnação da máquina administrativa persiste num ambiente em que a receita é inatingível pela estrutura de fiscalização. O modelo gera uma série de questionamentos e suspeitas indesejáveis para uma democracia estável e baseada na sólida institucionalidade. A sociedade gaúcha, republicanamente, deve ter plena autonomia para avaliar e decidir sobre os modelos de desenvolvimento trilhados pelos governantes. O primeiro passo é a total transparência, a sequência será decorrência dos múltiplos olhares sobre o mesmo problema. Este é o caminho que vislumbramos para fazer acontecer a democracia.

Nos últimos anos, o Poder Público vem se abrindo cada vez mais ao controle social. Páginas na internet expõem gastos e outros dados do Executivo, do Legislativo e do Judiciário. Segundo o professor de Direito Constitucional, Eduardo Carrion, “é um princípio básico da democracia, a publicidade e a transparência”.

Há, entretanto, um tema que ainda permanece sombrio: a concessão de isenções fiscais à iniciativa privada. “Existe uma total falta de critérios na concessão dos benefícios. Mesmo os entendidos não entendem isso direito. A legislação é uma colcha de retalhos. Fizeram uma legislação obtusa, onde se renuncia a créditos sem uma base técnica. Ou seja, é um chute estimar o montante de tributos que foi realmente renunciado”, afirma Celso Três, procurador da República.

“É importante esclarecer que a fiscalização dos benefícios, a verificação da sua conformidade com os termos estabelecidos na norma da sua concessão, é função institucional da Receita Estadual”, explica o presidente do Sindicato dos Servidores Públicos da Administração Tributária do Estado (Sindifisco-RS), Luiz Antônio Bins, subsecretário da Receita no Governo Rigotto.

Em verdade, o montante concedido pelo Estado ao setor empresarial por meio de renúncias tributárias não é conhecido pela sociedade. De acordo com a Constituição, a competência para fiscalizar a Receita cabe ao Tribunal de Contas do Estado (TCE). Na realidade, contudo, a situação é outra: “Historicamente, a Receita Estadual tem obstaculizado a ação do controle externo. Solicitações de documentos e auditorias foram negadas por conta do sigilo fiscal. Estamos tratando de um componente do mesmo Estado, e é óbvio que esse sigilo deve ser compartilhado”, afirma o procurador-geral do Ministério Público de Contas, Geraldo Da Camino.

Dedicado a pesquisar este tema, o economista Alfredo Meneghetti Neto, da Fundação de Economia e Estatística (FEE), sustenta que “não há nada disponibilizado atualmente. É tudo muito obscuro”. Desta forma, a falta de transparência levanta dúvidas sobre o impacto das isenções no orçamento público gaúcho. Meneghetti destaca que a arrecadação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) no Estado, deveria crescer no mesmo ritmo da economia. “Se ela cresce 1% ao ano, o ICMS deveria crescer 1%, ou muito próximo disso. Se isso não acontece, eu devo crer que seja em decorrência dos incentivos”, comenta.

Na avaliação do economista da FEE, o Movimento pela Transparência dos Benefícios Fiscais surge em um momento muito oportuno. “É um ponto fundamental, não só para a sociedade gaúcha, mas também para os demais Estados”.

Essa mobilização organizada pela Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul (AJURIS) e pela União Gaúcha em Defesa da Previdência Social e Pública, já começa a dar os primeiros resultados. “Percebemos, no atual governo, uma disposição de efetivo respeito à Constituição. Esperamos que a partir de agora as requisições sejam atendidas e os documentos disponibilizados, para que o Tribunal possa avaliar a legalidade, a economicidade, e o interesse público nessas renúncias fiscais que são tão importantes nesse montante de recursos que tanta falta faz”, salienta o procurador Geraldo Da Camino.

Falta de controle social sobre renúncias fiscais ainda persiste

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Associação dos Juízes do Rio Grande do SulPresidente: João Ricardo dos Santos CostaVice-presidente Administrativo: Benedito Felipe Rauen FilhoVice-presidente de Patrimônio e Finanças: Pio Giovani DreschVice-presidente Cultural: Dulce Ana Gomes OppitzVice-presidente Social: José Antônio Azambuja Flores

Jornal da AJURISEdição: Elaine Carrasco – Reg. Prof. 7535 e Maurício Macedo – Reg. Prof. 9532Diretora de Comunicação: Maria Lucia Boutros Buchain Zoch RodriguesSubdiretor de Comunicação: Cláudio Luís MartinewskiConselho de Comunicação: Carlos Alberto Etcheverry, João Armando Bezerra Campos, Túlio de Oliveira Martins e Leoberto Narciso BrancherJornalista-chefe: Ivana Ritter Equipe de jornalismo: Carolina Grigol, Elaine Carrasco e Maurício MacedoColaboração: Eduardo Müller (Sindifisco-RS e Afisvec-RS) e Claudio Medaglia (AMP-RS)Capa: Maurício TeixeiraEditoração eletrônica: Margit MelchiorsTiragem: 3.000 exemplaresEndereço: Rua Celeste Gobbato, nº 81 – Praia de Belas – Porto Alegre/RS – CEP 90110-160 Telefone: 51 3284-9100 Fax: 51 3284-9132E-mail: [email protected] – Site na Internet: www.ajuris.org.br

João Ricardo dos Santos CostaPresidente da AJURIS e da União Gaúcha em Defesa da Previdência Social e Pública

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Por um orçamento democrático

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Movimento abre debate sobre transparência e benefícios fiscais

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Desde maio de 2007, um projeto de lei neste sentido tramita na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul. De autoria do deputado Raul Pont (PT), o PL 212/2007 determina que “o Governo Estadual dê publicidade aos benefícios concedidos às empresas gaúchas, autorizados pela Lei do Fundopem e alterações posteriores, através de publicação anual no Diário Oficial e na internet da relação das concessões e da fruição do benefício, de forma detalhada.”

Essa batalha pela transparência, porém, não é tão simples. Em quatro anos de tramitação no Legislativo gaúcho, a proposta ainda nem foi analisada pela Comissão de Constituição e Justiça. “Os benefícios fiscais não podem ser um segredo de Estado”, salienta Pont.

Para o parlamentar, a situação agora é mais favorável do que antes. “O bloco de sustentação do Governo tem mais força do que quando o PT estava na oposição. Além disso, existe um número grande de entidades se somando, e preocupadas com este tema.”

Pont justifica a iniciativa. “Os números são alarmantes, já que as isenções fiscais envolvem um terço do orçamento público estadual. Os benefícios individualizados por empresas são os piores, pois não englobam incentivos a um setor específico. Normalmente são destinados a corporações transnacionais.”

“Só com a transparência teremos uma visão mais clara de quais os benefícios que poderiam ser cortados, e quais devem ser mantidos. Se diminuirmos em 10% o montante destinado às isenções, acredito que já teríamos todas as condições de equilibrar as contas do Estado. O valor arrecadado seria o mesmo que o Governo alega ser necessário para isso”, garante.

ntes mesmo de ser lançado oficialmente, o Movimento pela Transparência dos Benefícios Fiscais – promovido pela AJURIS e pela União Gaúcha em Defesa da Previdência Social e Pública (UG) – conquistou amplo espaço na imprensa gaúcha. Além disso, abriu um debate sobre o tema nos setores público e privado.

Líderes políticos, empresariais e sindicais se manifestaram apoiando a causa. Isto mostra que o debate precisa avançar, e que a mobilização pode trazer um resultado positivo na luta pela Reforma Tributária. É o que afirma Germano Rigotto, ex-governador do Rio Grande do Sul. “É uma forma de contribuir imensamente para que possamos construir um projeto que ponha um fim à chamada Guerra Fiscal”.

Essa disputa entre Estados na atração de investimentos, acaba se refletindo negativamente no orçamento público. Na avaliação do atual chefe do Executivo Estadual, Tarso Genro, a famigerada Guerra Fiscal é que determina a existência de uma carga tributária muito acima do normal, em nosso País. “Exagerada porque é presumivelmente renunciável para dar racionalidade ao movimento do capital em busca da sua melhor possibilidade de investimento”, declarou o governador gaúcho, em reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES-RS) realizada no dia 5 de maio.

O que causa essa concorrência interna na Federação, segundo Tarso, é o atual sistema tributário distorcido. “Uma carga fiscal exagerada que determina, para a modulação da taxa de lucro, que os investimentos que os capitais fazem numa ou noutra região, busquem a melhor possibilidade.” Segundo ele, a solução é “fazer uma profunda Reforma Tributária na estrutura estatal brasileira para acabar com a Guerra Fiscal para, inclusive, termos uma carga fiscal mais baixa que não possa ser renunciada.”

Para o líder do PSDB na Assembleia, deputado Adilson Troca, as empresas beneficiadas precisam prestar contas à sociedade, da contrapartida que dão ao Estado. “A transparência precisa ser total, pois trata-se de dinheiro público”, afirma. Já o deputado Márcio Biolchi, líder do PMDB no Legislativo gaúcho, defende a existência e a observância de critérios objetivos. “Só assim caminharemos ao encontro da solução das distorções fiscais e das suas consequências sociais.”

Além de ampliar a campanha a favor da Reforma Tributária, o Movimento da AJURIS e da UG também reforçou a mobilização pela transparência dentro do setor público. No mesmo discurso ao Conselhão, o governador comprometeu-se a fornecer um balanço dos benefícios concedidos pelo Executivo à iniciativa privada. Disse também que a situação de crise financeira enfrentada pelo Rio Grande do Sul é consequência desta política de isenções de impostos que vem sendo aplicada há décadas. “São bilhões de renúncia fiscal que o Estado fez ao longo dos últimos anos e continua fazendo, para se manter, para entrar no jogo dos investimentos enquanto a Guerra Fiscal continuar”, concluiu Tarso.

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Projeto de lei determina publicação de isenções

na internet

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A falta de verbas para construir novas escolas, ou apenas para reformar as que já existem, contribuiu para que o Estado despencasse no ranking da qualidade do ensino público. Mas como é possível cobrar bons resultados de estudantes e professores quando são oferecidos como salas de aula alguns contêineres de lata?

Em 2007, vários deles foram espalhados por cinco escolas estaduais em Caxias do Sul e Porto Alegre. Segundo o diretor do Cpers/Sindicato, Antonio Avelange Padilha Bueno, um dos casos mais polêmicos ficava na Zona Sul da Capital. Cerca de 450 crianças assistiam às aulas naquele espaço. “No verão, um calor insuportável. No inverno, um frio de arrebentar a alma. E com o temporal, o risco iminente de uma descarga elétrica”, denunciou o professor de História, em artigo publicado na internet. Pela Constituição, o Estado deve investir 35% da receita líquida em educação. Mas segundo dados da Secretaria da Fazenda, elaborados pelo Dieese, o percentual investido em 2010 foi de apenas 27%.

Na segurança pública, a carência de policiais causa enorme insegurança na população. Na Brigada Militar, 22 mil servidores se empenham diariamente no combate à criminalidade, arriscando a própria vida. Para cobrir todo o Estado, a estimativa é de que seriam necessários, no mínimo, 33 mil brigadianos – ou seja, o déficit chega a um terço do efetivo.

Já na Polícia Civil a situação é ainda pior. Para dar andamento ao montante de inquéritos represados (eram em torno de 1,5 milhão em 2007), a instituição precisaria contar com 11 mil policiais e delegados. De acordo com a Ugeirm/Sindicato, o efetivo atual tem apenas a metade disso.

ão é de hoje que a população gaúcha sofre com carências no atendimento médico, com a precaridade das escolas públicas e com a criminalidade em alta. O Governo do Estado, que deveria ter uma estrutura adequada para oferecer bom serviço à sociedade, alega falta de recursos

orçamentários para dar conta das necessidades.Os investimentos, tanto na educação quanto na saúde, estão

garantidos pela Constituição Federal de 1988. A Carta determina percentuais mínimos que devem ser investidos nestas áreas, algo que vem sendo descumprido por sucessivas administrações que se instalaram no Palácio Piratini.

A Emenda Constitucional nº 29 estabelece a aplicação de 12% da receita corrente líquida do Estado em saúde pública. Desde a virada do milênio, porém, o maior índice investido foi em 2001, com a destinação de pouco mais de 7%. A previsão para este ano é de que sejam aplicados 7,89%, ainda muito aquém do que determina a lei.

Isso traz consequências sérias. Estudo do Núcleo de Pesquisas do Sindicato Médico do Rio Grande do Sul (Simers) mostra que, de 1993 a 2010, o número de leitos hospitalares disponibilizados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) caiu de 8.698 para 5.462, somente em Porto Alegre. Queda superior a 37%, o que explica, em parte, o aumento vertiginoso das filas desde 1993, afinal, no mesmo período, a população da Capital gaúcha cresceu 12%.

A Farmácia de Medicamentos do Estado também não tem cumprido sua função por falta de verbas. Alguns remédios mais caros, e considerados vitais para a sobrevida de pacientes, são obtidos apenas por meio da Justiça. É por isso que o Poder Judiciário gaúcho reúne quase 50% de todos os processos que envolvem o setor de saúde no País. O Núcleo de Pesquisas Médicas do Hospital de Clínicas de Porto Alegre estima que aproximadamente 10 mil novas ações sejam ajuizadas a cada ano, por este motivo.

Entre elas está a movida pela família de Diego Dal Pra Vieira, que mora em Lagoa Vermelha, interior do Estado. Em 2006, aos 18 anos, o jovem sofreu um acidente de trabalho e perdeu o movimento de braços e pernas. Por conta da tetraplegia, Diego precisa, regularmente, tomar medicamentos que garantem o bom funcionamento da bexiga, o controle de espasmos e do tônus muscular. “São remédios importantes para que ele tenha uma vida um pouco melhor”, explica a mãe, Maria Inês Dal Pra Vieira.

Sem condições para custear o tratamento, a família entrou na Justiça para garantir o recebimento dos remédios que constam na lista dos que deveriam ser fornecidos pelo Estado obrigatoriamente. “Antes do processo, pedimos para a Secretaria de Saúde, mas nunca recebemos. Agora, mesmo com a ação, em abril, por exemplo, veio metade da quantidade necessária de um e um terço de outro. Este mês, não veio nada”, desabafa..

Cobertor curto afeta educação e também a segurança

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Carência de recursos se reflete na baixa qualidade dos serviços públicos

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Quem dá mais?Política industrial transforma-se em leilão

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Guerra Fiscal que impera em nosso País impede que o Brasil adote um política industrial sólida, que seja indutora do desenvolvimento e incentive a produção e a geração de postos de trabalho de forma sustentável. “Com a situação que existe hoje, tudo acaba se transformando num leilão de benefícios, sem nenhuma visão de

longo prazo”, destaca o deputado estadual Raul Pont (PT).Como não existe legislação específica que regule o uso deste mecanismo

de forma articulada, a concessão de benefícios fiscais têm sido utilizada como meio de barganha em que se busca a atração de um investimento para um Estado ou Município, em detrimento de outros. “As próprias empresas usam esta disputa em um jogo de chantagem para aumentar seus benefícios, como ficou claro na negociação sobre a montadora Ford”, afirma Rodrigo Gonzalez, cientista político da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs).

Segundo Gonzalez, existe um grande interesse político dos governantes em usar o anúncio da implantação de uma nova empresa, para promoção pessoal. “Muitas vezes isso faz com que o ganho político imediato, pese mais no cálculo do que o resultado econômico permanente do empreendimento”, comenta.

O professor da Ufrgs lembra, ainda, que esse tipo de barganha geralmente é oferecido a grandes empresas, deixando em desvantagem o pequeno empresário local, cuja atividade tende a gerar, de forma agregada, mais empregos do que os grandes empreendimentos. “Oferecem terrenos e isenção de impostos para criar uma montadora de automóveis, mas nenhuma facilidade é oferecida para quem deseja criar uma padaria na esquina”, exemplifica.

Além disso, o caráter competitivo gerado por este sistema de incentivos fiscais dificulta ainda mais as negociações para que se faça a Reforma Tributária. “Só assim poderemos diminuir o número de tributos, tornando mais racional e controlável a arrecadação, e onerando mais os setores mais ricos, e não os mais pobres, como ocorre hoje.”

A falta de transparência no modelo atual também traz outras consequências. “Favorece para que alguns acabem ganhando muito dinheiro e ninguém fique sabendo”, acredita o ex-governador gaúcho Germano Rigotto.

Para o deputado Pont, há interesses poderosos por trás. “É possível perceber isso quando grandes empresas estão em campanha por alguma coisa, pois sempre aparece algum deputado defendendo a corporação, como se o incentivo a ela fosse a saída para todos os problemas do Estado. Não se tem prova dessa relação, mas é visível que existem lobbies específicos, tanto aqui na Assembleia, quanto no Congresso Nacional. Um caso emblemático, por exemplo, é o que envolve as chamadas papeleiras, ou seja, a indústria de celulose.”

Já Rodrigo Gonzalez destaca que “o benefício esperado em troca não se limita às isenções fiscais. O que se busca é o poder de influência em outros aspectos, como na definição de políticas de investimento, o que tende a ir além de empresas específicas, identificando-se com grupos econômicos mais gerais, como industriais, ruralistas ou empresários da comunicação social”.

Todos eles concordam que a solução para reduzir o impacto deste problema junto à sociedade está na transparência. “A publicação, seja na internet, seja em jornais, das listas de doadores, assim como a publicação do volume de recursos que o Estado deixa de arrecadar com benefícios tributários, identificando nominalmente os beneficiários, seria um bom começo”, ressalta o cientista político. “Com transparência, as decisões políticas seriam melhores e os interesses envolvidos mais fáceis de identificar.”

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Guerra ou suicídio fiscal?

Para Mauro Knijnik, titular da pasta do Desenvolvimento e Promoção do Investimento, do Governo Tarso, a chamada Guerra Fiscal pode levar os Estados ao suicídio fiscal. “O Brasil vive isso. Os Estados são suicidas ao encararem a concorrência da forma como é feita hoje. É um pensamento

pequeno, de apenas curto prazo, para consagrar uma gestão”, afirmou à Revista Indústria em Ação, da Federação das Indústrias do Rio Grande do Sul (Fiergs).

O secretário estadual fez, ainda, um relato que expõe a atual situação. “Já tive empresa aqui acertada verbalmente, e que veio outro Estado e ofereceu vantagens que, na minha visão não podem ser oferecidas em termos de isenções.”

Com uma longa trajetória na área, Knijnik apresenta o seu ponto de vista. “Não pode o Estado ser dono da indústria e dar a gestão e os resultados para a iniciativa privada. A iniciativa privada tem que correr riscos também”. Segundo ele, a parceria deve ser “saudável”. “Não pode o Estado bancar uma empresa e o empresário só administrar e receber o lucro”, conclui.

Apesar dessa postura refratária do secretário Knijnik, os setores empresariais defendem que o Rio Grande do Sul tenha uma atitude ainda mais agressiva com relação à Guerra Fiscal. Para o presidente eleito da Federação das Indústrias (Fiergs), Heitor José Müller, se o Estado não adotar este tipo de iniciativa, pode acabar perdendo investimentos. “Se não atrairmos as empresas, não teremos nem uma parte do ICMS. Zero vezes zero é igual a zero”, declarou ele após ser eleito para comandar a entidade a partir de julho deste ano. “As empresas que gerariam parte do ICMS aqui, irão gerar receitas por lá. É algo que o Governo não pode deixar acontecer.”

O diretor-executivo da Agenda 2020, Ronald Krummenauer, segue a mesma linha. Ele alerta que, na realidade atual, o Estado que não entrar na chamada Guerra Fiscal, corre o risco de ficar sem novos investimentos, como a ampliação das empresas que já estão em funcionamento, ou a atração de outras. “Isso dificulta a geração de empregos e renda”, complementa.

Krummenauer diz ainda que o modelo vigente só será modificado com a implantação de uma Reforma Tributária ampla. “Principalmente, para que possamos diminuir a dependência que Estados e Municípios têm do Governo Federal”, afirma.

Enquanto isso não é realizado, a política de incentivos fiscais deve ser mantida, segundo ele. “O aspecto fundamental é o Estado elaborar bons contratos com as empresas beneficiadas. A contrapartida das empresas deve prever o que trará de benefícios para a sociedade. Outro fator importante são os investimentos em outras áreas que tornam o Rio Grande do Sul mais competitivo, como na educação profissional, inovação e infraestrutura”.

Entretanto, há quem enxergue ilegalidade no sistema de concessão de isenções fiscais à iniciativa privada. Procurador do Ministério Público Federal em Novo Hamburgo, Celso Três é um deles: “Se formos verificar a fundo, muitas das leis que se aplicam na Guerra Fiscal são inconstitucionais, mas não acabam sendo analisadas pelo Supremo Tribunal Federal”.

Segundo ele, nesse bojo entram diversos aportes financeiros, numa espécie de intervenção do Estado na economia. “O Estado, para intervir na economia, deveria seguir uma pauta social, mas isso não ocorre. Existem empresas que apenas não são administradas pelo Estado, mas se financiaram por longo período com recursos públicos. Tem dinheiro ali que deveria ser público, só não é porque não foi recolhido.”

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