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Hipótese de Riemann e física José Carlos Valencia Alvites

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Hipótese de Riemann e física

José Carlos Valencia Alvites

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Hipótese de Riemann e física

José Carlos Valencia Alvites

Orientador: Prof. Dr. Paulo Afonso Faria da Veiga

Dissertação apresentada ao Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação - ICMC-USP, como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Ciências - Matemática . VERSÃO REVISADA

USP – São Carlos Março de 2012

SERVIÇO DE PÓS-GRADUAÇÃO DO ICMC-USP

Data de Depósito: 26/03/2012 Assinatura:________________________

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Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Prof. Achille Bassi e Seção Técnica de Informática, ICMC/USP,

com os dados fornecidos pelo(a) autor(a)

V152hValencia Alvites, José Carlos Hipótese de Riemann e física / José Carlos ValenciaAlvites; orientador Paulo Afonso Faria da Veiga. --São Carlos, 2012. 94 p.

Dissertação (Mestrado - Programa de Pós-Graduação emMatemática) -- Instituto de Ciências Matemáticas ede Computação, Universidade de São Paulo, 2012.

1. Função zeta de Riemann. 2. Hipótese de Riemann.3. Zeros não triviais. 4. Teorema dos NúmerosPrimos. 5. Função zeta de Riemann e física. I. Fariada Veiga, Paulo Afonso, orient. II. Título.

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Aos tres pilares daminha vida, meus pais

Luisa e Rosalio, e meugrande amor Mary .

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Agradecimentos

Meus mais sinceros agradecimentos, sem duvida, aos meus pais, Lucy e Rosalio, os amo

por acima de tudo, que sempre acreditaram em mim apesar dos meus defeitos, pelo apoio,

muito obrigado mama e papa.

A Mary, meu amor, minha companheira, minha melhor amiga, que sempre leva o melhor

de mim, que me ensinou a ser uma pessoa melhor, pelo apoio em tempos difıceis, pelas crıti-

cas, para ela com amor e admiracao, obrigado bebe.

Ao Professor Paulo, meu orientador, que me apoiou na minha estadia em Sao Carlos, pela

orientacao, amizade e por sempre estar disposto a me ajudar no trabalho, este trabalho e em

grande parte o produto de suas ideias e sugestoes, professor muito obrigado por seu apoio a

voce e sua famılia que foram muito gentis comigo.

Aos Professores Edgar Vera, que foi meu orientador na graduacao, e Luis Carrillo, pro-

fessores da Facultad de Ciencias Matematicas da UNMSM, no Peru.

Ao ICMC, por me dar a oportunidade.

Aos professores do ICMC pela importante formacao academica.

A CAPES, pelo apoio financeiro, sem o qual nao seria possıvel a realizacao deste trabalho,

muito obrigado pelo apoio.

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Resumo

Neste trabalho, introduzimos a funcao zeta de Riemann ζ(s), para

s ∈ C\1 e apresentamos muito do que e conhecido como justifica-

tiva para a hipotese de Riemann. A importancia de ζ(s) para a teoria

analıtica dos numeros e enfatizada e fornecemos uma prova conhecida

do Teorema dos Numeros Primos. No final, discutimos a importancia de

ζ(s) para alguns modelos fısicos de interesse e concluimos descrevendo

como a hipotese de Riemann pode ser acessada estudando estes sistemas.

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Abstract

In this work, we introduce the Riemann zeta function ζ(s), s ∈C\1 and present much of what is known to support the Riemann

hypothesis. The importance of ζ(s) to the Analytic number theory is

emphasized and a proof for the Prime Number Theorem is reviewed. In

the end, we report on the importance of ζ(s) to some relevant physical

models and conclude by describing how the Riemann Hypothesis can

be accessed by studying these systems.

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Sumario

1 Introducao e Motivacao 1

2 Preliminares 5

2.1 Funcao Gama de Euler . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5

2.2 A Funcao Zeta de Riemann . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13

2.3 Funcoes Inteiras de Ordem Um . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24

3 A Hipotese de Riemann 33

3.1 Estabelecendo a Hipotese de Riemann . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33

3.2 Os Zeros nao-triviais de ζ(s) e a Teoria Analıtica dos Numeros. . . . . . . . . 41

3.3 A Conjetura de Hilbert-Polya e a Hipotese de Riemann . . . . . . . . . . . . 55

3.4 Outras Formulacoes Equivalentes para a Hipotese de Riemann . . . . . . . . 55

4 Zeta de Riemann e a Fısica 63

4.1 Regularizacao Zeta . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 64

4.2 O Bilhar Circular Aberto . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69

4.3 Mecanica Estatıstica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 74

5 Consideracoes Finais 77

A Informacoes Adicionais 79

B Mais Informacoes 87

Indice Remissivo 95

9

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Notacao

C O conjunto dos numeros complexos.Z O conjunto dos numeros inteiros.N O conjunto dos numeros inteiros nao negativos.R O conjunto dos numeros reais.

Γ(s) A funcao Gama de Euler.ζ(s) A funcao Zeta de Riemann.ξ(s) A ξ-funcao de Riemann.S A faixa crıtica.L A reta crıtica.

Λ(x) A funcao de von Mangoldt.Ψ(x) A funcao de Chebyshev.π(x) A funcao de contagem de numeros primos.γE A constante de Euler-Mascheroni.LQ O conjunto dos numeros livres de quadrados.H(Ω) O conjunto das funcoes analıticas em Ω ⊆ C.

[·] A funcao chao.Li(x) A funcao integral logarıtmica Euleriana.

11

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Capıtulo

1Introducao e Motivacao

Em 1737, Euler provou que a serie (P denota o conjunto dos numeros primos)∑p∈P

1

p,

diverge, o que implica na existencia de infinitos numeros primos. Um outro resultado impor-

tante obtido por Euler e apresentado na seguinte formula

∏p∈P

(1− 1

ps

)−1

=∑n≥1

1

ns, ∀ s ∈ R, s > 1 . (1.1)

Euler tambem calculou a soma da serie infinita∑

n≥11ns , para s = 2, encontrando o valor

∑n≥1

1

n2=π2

6.

Um metodo interessante para calcular o valor de∑

n≥11ns , para s par e s inteiro negativo

ımpar, e descrito no Apendice B. A relacao expressa na equacao (1.1) foi o estımulo inicial

para que Riemann iniciasse suas pesquisas envolvendo a serie infinita∑

n≥11ns . Na sua celebre

publicacao de 1859, entitulada Sobre os Numeros Primos Menores que uma Magnitude Dada

[20], Riemann considerou a funcao

ζ(s) =∑n≥1

1

ns. (1.2)

Que ζ(s) e facilmente estendida para valores de s complexos localizados no semi-plano com-

plexo s ∈ C : R(s) > 1 e uma consequencia imediata do fato que |ns| = na, onde s = a+ ib;

a, b ∈ R, i2 = −1, implicando na convergencia absoluta da serie no lado direito da equacao

1

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2 Capıtulo 1 — Introducao e Motivacao

(1.2), neste domınio. Contudo, neste trabalho, Riemann nao apenas considerou o domınio

acima, mas a extensao de ζ(s) no conjunto C\1.Para ver que ζ(s) pode ser estendida como uma funcao meromorfa em C, com uma unica

singularidade descrita por um polo simples em s = 1, nao podemos usar a equacao (1.2). Ao

contrario, nos nos servimos de uma extensao meromorfa da funcao Γ(s) de Euler, que e uma

generalizacao da funcao fatorial. Ao mesmo tempo, com a ajuda desta funcao Γ(s) obtemos

uma relacao funcional compatıvel, que concorda com (1.2) em R(s) > 1, dada a seguir [10]

(Mais adiante no texto, estabeleceremos esta relacao!)

ζ(s) = 2sπs−1 sin(πs

2

)Γ(1− s)ζ(1− s), ∀ s ∈ C\1 . (1.3)

A extensao meromorfa da funcao zeta de Riemann, ζ(s) definida em (1.2), com s ∈ C \ 1,e o tema central desta dissertacao. Esta funcao e o ingrediente principal de um dos mais

complexos e ricos problemas da matematica moderna, conhecido como a “A Hipotese de

Riemann”, o qual se manifesta e afeta um grande numero de areas da Matematica.

E facil mostrar, considerando o anulamento da funcao sin(πs2

)em (1.3), que ζ(s) possui

raızes triviais em s = −2,−4,−6, . . . A Hipotese de Riemann conjetura que ζ(s) apresenta

tambem zeros nao-triviais na reta crıtica

s ∈ C : R(s) =1

2.

Essa conjetura emergiu do fato que Riemann calculou tres zeros, usando o que e hoje con-

hecida como a formula de Riemann-Seigel [10]. Outros zeros na reta crıtica foram obtidos

analiticamente por outros renomados matematicos (Gram, Backlund, Hutchinson, Titch-

marsh, Turing, Lehmer, Meller, Lehman, Rosser, Yohe, Schoenfeld, Brent, van de Lune, te

Riele, Winter, Odlyzko, Wedeniwski, Gourdon e Patrick Demichel), e hoje ja conhecemos

mais de 1, 5 bilhoes de zeros aproximados na reta crıtica, obtidos usando metodos numericos

[27]. Ademais, mostra-se em alguns casos, e ha forte indicacao nos tratamentos numericos,

que todos os zeros sao simples, isto e, de multiplicidade um.

A Hipotese de Riemann faz parte da lista dos 23 grandes problemas da Matematica pro-

postos por Hilbert no Congresso Internacional de Matematicos de Paris, em 1900, sendo

ainda um dos poucos por resolver, juntamente com a Conjetura de Goldbach (Todo numero

par maior ou igual a 4 e a soma de dois primos.) e o Teorema de Kronecker-Weber es-

tendido para corpos nao-abelianos (No caso abeliano, este teorema estabelece que um corpo

numerico algebrico cujo grupo de Galois sobre Q seja abeliano, e um subcorpo de um corpo

ciclotomico, ou seja, um corpo obtido ao adicionar-se uma raiz complexa da unidade aos

numeros racionais.).

Como dissemos acima, na Matematica, a funcao zeta e a Hipotese de Riemann tem con-

sequencias em diversas areas. Um exemplo marcante e a Teoria dos Numeros, e todos os

domınios que se relacionam com ela (Teoria dos Codigos, Geometria Algebrica, etc), onde

observamos que ζ(s) nos fornece uma medida da densidade dos numeros primos na reta real

e tem papel fundamental na formulacao do Teorema dos Numeros Primos, que estabelece

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3

uma “contagem” (estimativa) dos numeros primos, obtido original e independentemente por

Jacques Hadamard e Charles Jean de la Vallee-Poussin. Posteriormente, este teorema foi

demonstrado, sem usar a Teoria Analıtica dos Numeros, por Atle Selberg e Paul Erdos.

Selberg tambem obteve uma famosa formula de traco com seu nome [22], que apresenta

uma relacao estreita com os zeros de ζ(s) (O Teorema dos Numeros Primos sera tratado na

secao 3.2). Podemos continuar mencionando tambem a Teoria de Operadores (Conjetura de

Hilbert-Polya), a Teoria das Matrizes Aleatorias, etc.

A relacao de ζ(s) e da Hipotese de Riemann com temas da Fısica e tambem muito vasta.

Por exemplo, na Mecanica Classica, estao associados com o bilhar circular aberto [7], na

Mecanica Estatıstica Classica, temos o Teorema de Lee-Yang sobre os zeros de funcoes de

particao, as quais determinam as quatidades termodinamicas de sistemas tais como gases e

cadeias de spins [14], [16] e os fenomenos de transicoes de fase (bifurcacoes) que podem ocor-

rer nos mesmos. Na Mecanica Estatıstica Quantica, os zeros de ζ(s) aparecem, por exemplo,

na descricao do sistema de um gas dito Riemannium [18]. As matrizes aleatorias tambem

sao frenquente variaveis na Mecanica Estatıstica e seu espectro importante para descrever as

propriedades destes sistemas. Relacionam-se, conforme exposto acima, naturalmente com a

Hipotese de Riemann. A funcao ζ(s) fornece uma ferramenta muita utilizada para a regular-

izacao de operadores, fornecendo um sentido matematico para integrais de caminho utilizadas

por Hawking [29]. ζ(s) tambem aparece em sistemas dinamicos recorrentes na teoria do Caos

Quantico (fase de Berry) [4] e a formula de Selberg relaciona-se, por exemplo, com modelos

fısicos com espaco tempo do tipo Kaluza-Klein [29].

Curiosamente, embora confirmar ou nao a Hipotese de Riemann seja um dos proble-

mas mais importantes da Matematica, entendemos que e muito frequente que profissionais e

pesquisadores da Matematica nao conhecem seus requisitos mınimos. Entendemos tambem

que essa atitude provem de muitos fatores, ate aqueles que fogem do escopo da ciencia em si.

Contudo, pensamos ser esta uma atitude pouco recomendada aqui.

Neste contexto, decidimos preparar e redigir um texto contendo alguns dos pontos fun-

damentais para que qualquer estudioso da matematica, a comecar por um estudante em vias

de se graduar, possa compreender e estabelecer uma ideia geral basica do problema.

De forma alguma deve o leitor concluir que nos tornamos um expert no assunto, sobretudo

porque, como frisamos acima, trata-se aqui de um assunto nao trivial e extremamente amplo.

Nosso texto, esperamos, podera ser considerado uma porta de entrada no tema.

Com este proposito, procuramos apresentar um texto relativamente auto-contido, com

muitas das demonstracoes basicas e todos os ingredientes necessarios ao tema.

Infelizmente, so tomamos conhecimento do excelente livro [6] quando este trabalho ja

estava finalizado. Outras excelentes referencias no tema de ζ(s) sao [10], [15], [26] e [9].

Sobre o uso extensivo de resultados genericos de Analise Complexa temos as referencias [8] e

[1].

Para completar nosso trabalho, realizamos uma discussao breve e pouco aprofundada

sobre alguns dos pontos de contato com a Fısica.

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4 Capıtulo 1 — Introducao e Motivacao

Por fim, vale mencionar que alem da solucao de um grande problema em si, a confirmacao

da Hipotese de Riemann trara um aprimoramento do numero de primos menores que um

numero dado x, refinando o resultado atual do Teorema dos Numeros Primos (ver secao 3.2

do capıtulo 3).

Concluindo, esperamos que o leitor interessado consiga aqui se motivar para aprimorar

seus conhecimentos no tema e, quica, poder juntar algum grao de conhecimento a tudo o que

e sabido hoje.

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Capıtulo

2Preliminares

Neste capıtulo, apresentamos resultados basicos classicos e algumas definicoes a serem uti-

lizados no decorrer do trabalho. Apresentamos algumas provas que, a nosso ver, nao sao facil-

mente encontrados na literatura na forma aqui apresentada ou cujas demonstracoes trazem

algum argumento tecnico que seja relevante em algum ponto subsequente do texto.

No que segue, usamos as seguintes notacoes. Dados a, b ∈ R, com a < b, denotamos

H(a, b) = z ∈ C : a < R(z) < b,

e, convencionamos que

H(a,+∞) = z ∈ C : a < R(z) e H(−∞, b) = z ∈ C : R(z) < b.

Tambem, para Ω ⊆ C denotamos por H(Ω) o conjunto das funcoes analıticas (holomorfas)

em Ω e B(0;R) e o disco em C com centro em 0 e raio R > 0. As notacoes O, Oε, e ε

serao muito usadas no texto e foram definidas no Apendice A.

2.1 Funcao Gama de Euler

A funcao Gama e a aplicacao Γ : H(0,+∞)→ C definida como

Γ(z) :=

∫ ∞0

e−ttz−1dt. (2.1)

Para ver que a definicao acima faz sentido, observamos que se H(0,+∞) 3 z = σ+ iτ , σ,

τ ∈ R, entao ∫ ∞0

e−ttz−1dt =

∫ 1

0e−ttz−1dt+

∫ ∞1

e−ttz−1dt.

Analisamos as duas integrais do lado direito:

5

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6 Capıtulo 2 — Preliminares

∫ 10 e−ttz−1dt : Claramente

∣∣∣ ∫ 10 e−ttz−1dt

∣∣∣ ≤ ∫ 10

∣∣∣e−ttz−1∣∣∣dt =

∫ 10 e−ttσ−1dt. Logo como et >

1, para qualquer t ∈ (0, 1), entao e−t < 1, assim

e−ttσ−1 < tσ−1, ∀t ∈ (0, 1)⇒∫ 1

0e−ttσ−1dt <

∫ 1

0tσ−1dt <∞

⇒∣∣∣ ∫ 1

0e−ttz−1dt

∣∣∣ <∞.∫∞

1 e−ttz−1dt : Analogo ao caso anterior,∣∣∣ ∫∞1 e−ttz−1dt

∣∣∣ ≤ ∫∞1 e−ttσ−1dt. Agora, como

et =∑

k≥0tk

k! entao tn

n! ≤ et para qualquer t ≥ 1 e n ∈ N. Assim, consideremos n′ ∈ Ntal que σ < n′, entao σ − (n′ + 1) < 0, logo

e−ttσ−1 ≤ tσ−(n′+1)n′!, ∀t ≥ 1⇒∫ ∞

1e−ttσ−1dt ≤ n′!

(tσ−n

σ − n′

)∣∣∣+∞1

=n′!

n′ − σ<∞

⇒∣∣∣ ∫ ∞

1e−ttz−1dt

∣∣∣ <∞, ∀z ∈ H(0,+∞).

Portanto, Γ(z) e bem definida. Alem disso, pelo metodo de integracao por partes, e claro

que, para z ∈ H(0,+∞), temos a recorrencia

Γ(z + 1) = zΓ(z). (2.2)

Ademais, pelo calculo direito, Γ(1) = Γ(2) = 1.

Assim, para qualquer n ∈ N,

Γ(n) = (n− 1)!,

o que tambem justifica escrever 0! = 1.

Agora vamos provar que Γ(z) pode ser estendida para uma funcao meromorfa em C. Para

este fim, usamos o seguinte lema.

Lema 2.1 . Seja (cn)∞n=0 uma sequencia em C tal que∑

n≥0 |cn| converge e S = −n : n ∈N ∪ 0 e cn 6= 0. Entao, f(z) =

∑n≥0

cnz+n converge absolutamente para qualquer z ∈ C\S

e uniformemente em subconjuntos limitados de C\S. Alem disso, f e uma funcao meromorfa

em C com polos simples no conjunto S e Res(f,−n) = cn, para qualquer −n ∈ S.

Demonstracao: Seja A ⊂ C um conjunto limitado. Entao, existe R > 0 tal que A ⊆B(0;R). Assim, |z| < R para qualquer z ∈ A. Logo, se n ≥ R temos |z+n| ≥ n−|z| ≥ n−R.

Isto implica que | 1z+n | ≤

1n−R , para |z| < R e n > R. Portanto, se n0 > R,

∣∣∣ m∑n=n0

cnz + n

∣∣∣ ≤ m∑n=n0

|cn||z + n|

≤m∑

n=n0

|cn|n−R

≤ 1

n0 −R

(m∑

n=n0

|cn|

), ∀m ≥ n0.

Da ultima desigualdade, temos que a serie∑

n>Rcnz+n converge absolutamente. Ademais,

como | cnz+n | ≤|cn|n0−R , para qualquer n > R, entao esta serie tambem converge uniformemente

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2.1 Funcao Gama de Euler 7

no conjunto A. Isto implica que a serie∑

n≥0cnz+n define uma funcao que tem um numero

finito de polos simples em S que estao contidos em B(0;R). Portanto, temos que

f(z) =∑n≥0

cnz + n

,

e uma funcao meromorfa com polos simples em S. Entao, para qualquer −n ∈ S podemos

escrever

f(z) =cn

z + n+

∑−m∈S−−n

cmz +m

,

onde∑−m∈S−−n

cmz+m e uma funcao analıtica em z = −n. Assim, Res(f,−n) = cn e como

n e arbitrario, temos Res(f,−n) = cn, ∀ − n ∈ S.

Finalmente, podemos estabelecer o seguinte teorema.

Teorema 2.2 . Γ(z) pode ser estendida a uma funcao meromorfa no plano complexo, com

polos simples em 0,−1,−2, .... Alem disso, vale que

Res(Γ,−n) =(−1)n

n!.

Demonstracao: Para z ∈ H(0,+∞), temos

Γ(z) =

∫ ∞0

tz−1e−tdt =

∫ 1

0tz−1e−tdt+

∫ ∞1

tz−1e−tdt. (2.3)

A segunda integral do lado direito converge para todo z = x+ iy ∈ C. De fato,∣∣∣ ∫ ∞1

tz−1e−tdt∣∣∣ ≤ ∫ ∞

1tx−1e−tdt.

Repetindo o argumento acima, lembrando que, para t ≥ 1, n!tn ≥ e−t para qualquer n ∈ N,

seja nx ∈ N tal que nx > x, entao x− (nx + 1) < 0 assim temos∫ ∞1

tx−1e−tdt ≤ nx!

∫ ∞1

tx−(nx+1)dt = nx!

(lim

t→+∞

tx−nx

x− nx− 1

x− nx

)=

nx!

nx − x.

Assim temos que, para qualquer z ∈ C,∫∞

1 tz−1e−tdt converge, entao esta integral representa

uma funcao inteira. Por outro lado, como a funcao exponencial e inteira, a sua serie de Taylor

converge uniformemente em subconjuntos compactos de C e temos

∫ 1

0tz−1e−tdt =

∫ 1

0tz−1

∑n≥0

(−1)ntn

n!

dt

=∑n≥0

(−1)n

n!

∫ 1

0tn+z−1dt

=∑n≥0

(−1)n

n!

(1

n+ z

).

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8 Capıtulo 2 — Preliminares

Assim, substituindo em (2.3), obtemos

Γ(z) =∑n≥0

(−1)n

n!

(1

n+ z

)+

∫ ∞1

tz−1e−tdt, (2.4)

para qualquer z ∈ H(0,+∞), logo como∑

n≥0(−1)n

n! <∞, pelo Lema 2.1, o lado direito desta

ultima igualdade define uma funcao meromorfa em C com polos simples em 0,−1,−2, ... e

Res(Γ,−n) = (−1)n

n! .

No restante deste trabalho, para evitar confusao e para evitar a introducao de novas

notacoes, vamos continuar denotando por Γ(z) a extensao meromorfa da funcao Γ(z) definida

em (2.1). Agora, e claro que, de (2.2) e do Teorema 2.2 , temos o seguinte corolario.

Corolario 2.3 . Para qualquer z ∈ C\−1,−2,−3, . . .

Γ(z + 1) = zΓ(z).

Como exemplo, vamos verificar a consistencia de (2.4) com o corolario ultimo. Seja

z ∈ C \ −1,−2, . . ., entao de (2.4) temos

Γ(z + 1) =∑n≥0

(−1)n

n!

(1

n+ 1 + z

)+

∫ +∞

1tze−tdt

=∑n≥0

(−1)n+1

(n+ 1)!

(− n+ 1

n+ 1 + z

)+ (−e−ttz)

∣∣∣+∞1

+ z

∫ +∞

1tz−1e−tdt

=∑n≥0

(−1)n+1

(n+ 1)!

(z

n+ 1 + z− 1

)+

1

e+ z

∫ +∞

1tz−1e−tdt

= z∑

n+1=m≥1

(−1)m

m!

(1

m+ z

)−

∑n+1=m≥1

(−1)m

m!+

1

e+ z

∫ +∞

1tz−1e−tdt

= z

∑m≥1

(−1)m

m!

(1

m+ z

)+

1

z

−∑m≥1

(−1)m

m!+ 1

+1

e+ z

∫ +∞

1tz−1e−tdt

= z∑m≥0

(−1)m

m!

(1

m+ z

)−∑m≥0

(−1)m

m!+

1

e+ z

∫ +∞

1tz−1e−tdt

= z∑m≥0

(−1)m

m!

(1

m+ z

)− 1

e+

1

e+ z

∫ +∞

1tz−1e−tdt

= z

∑m≥0

(−1)m

m!

(1

m+ z

)+

∫ +∞

1tz−1e−tdt

= zΓ(z).

Agora, com ajuda da funcao Γ(z) vamos definir a funcao Beta que sera de utilidade na

parte de regularizacao Zeta (secao 4.1). Observamos que, para u, v ∈ H(0,+∞),

Γ(u) =

∫ ∞0

e−ttu−1dt e Γ(v) =

∫ ∞0

e−ttv−1dt.

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2.1 Funcao Gama de Euler 9

Logo, fazendo a mudanca t = x2, temos

Γ(u) =

∫ ∞0

e−x2x2(u−1)2xdx = 2

∫ ∞0

e−x2x2u−1dx.

Analogamente,

Γ(v) = 2

∫ ∞0

e−x2x2v−1dx.

Multiplicando as duas igualdades anteriores

Γ(u)Γ(v) = 4

(∫ ∞0

e−x2x2u−1dx

)(∫ ∞0

e−y2y2v−1dy

)= 4

∫ ∞0

∫ ∞0

e−(x2+y2)x2u−1y2v−1dxdy.

Considerando a integral dupla e usando coordenadas polares, obtemos

Γ(u)Γ(v) = 4

∫ π2

0

∫ ∞0

e−r2r2(u+v)−1 cos2u−1 θ sin2v−1 θdrdθ

=

(2

∫ ∞0

e−r2r2(u+v)−1dr

)(2

∫ π2

0cos2u−1 θ sin2v−1 θdθ

)

=

(∫ ∞0

e−r2(r2)((u+v)−1)2rdr

)(2

∫ π2

0cos2u−1 θ sin2v−1 θdθ

)

⇒ Γ(u)Γ(v) = Γ(u+ v)

(2

∫ π2

0cos2u−1 θ sin2v−1 θdθ

). (2.5)

A integral da ultima expressao pode ser calculada como segue:

2

∫ π2

0cos2u−1 θ sin2v−1 θdθ =

∫ π2

0(cos2 θ)u−1(sin2 θ)v−1(2 cos θ sin θ)dθ

=

∫ π2

0(1− sin2 θ)u−1(sin2 θ)v−1(2 cos θ sin θ)dθ,

e, fazendo a mudanca s = sin2 θ, temos

2

∫ π2

0cos2u−1 θ sin2v−1 θdθ =

∫ 1

0(1− s)u−1sv−1ds.

Entao, a funcao beta B(v, u) e definida como

B(v, u) :=

∫ 1

0(1− s)u−1sv−1ds. (2.6)

Logo, de (2.5) temos

Γ(u)Γ(v) = Γ(u+ v)B(v, u), (2.7)

para u, v ∈ H(0,+∞).

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10 Capıtulo 2 — Preliminares

Seja x ∈ (0, 1). Da equacao acima temos

Γ(x)Γ(1− x) = Γ(1)B(x, 1− x) =

∫ 1

0(1− s)1−x−1sx−1ds =

∫ 1

0(1− s)−xsx−1ds.

Fazendo a mudanca de variaveis s = uu+1 , obtemos

Γ(x)Γ(1− x) =

∫ +∞

0

(u

u+ 1

)x−1(1− u

u+ 1

)−x 1

(u+ 1)2du =

∫ +∞

0

ux−1

u+ 1du.

Agora, usando este resultado, vamos provar uma relacao que vai ser de muita utilidade, no

que segue, e que nos diz que Γ(z) nao tem zeros. Para este fim, vamos usar o seguinte lema.

Lema 2.4 . Para y ∈ (0, 1), temos∫ +∞

0

u−y

u+ 1du =

π

sinπy.

Demonstracao: Considere o conjunto G = z ∈ C : z 6= 0, arg(z) ∈ (0, 2π), e o ramo do

logaritmo seguinte

log(reiθ) = log r + iθ

onde θ ∈ (0, 2π). Logo, para z ∈ G seja f(z) := e−y log z. Assim f e um ramo da funcao

exponencial z−y. Agora, considere em C o caminho dado na Fig. 2.1,

Figura 2.1: Caminho γ usado na integral da Eq. (2.8).

onde 0 < r < 1 < R. Assim, temos que se γ := CR + L2 + Cr + L1. Como γ e homotopica a

zero e desde que limz→−1(z + 1)f(z)z+1 = e−πiy, temos que Res

(f(z)z+1 ,−1

)= e−πiy. Assim, pelo

Teorema dos resıduos temos ∮γ

f(z)

z + 1dz = 2πie−πiy. (2.8)

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2.1 Funcao Gama de Euler 11

Agora observemos o que acontece com as integrais∫L1

f(z)z+1dz e

∫L2

f(z)z+1dz:∫

L1

f(z)

z + 1dz =

∫ R

r

f(teiα)

teiα + 1eiαdt, (2.9)

consideremos g : [r,R]× [0, π2 ]→ R definida como

g(t, α) =∣∣∣ f(teiα)

teiα + 1eiα − t−y

t+ 1

∣∣∣.E claro que g(t, 0) = 0, para qualquer t ∈ [r,R]. Como [r,R] × [0, π2 ] e compacto, entao

g e uniformemente contınua. Assim, para qualquer ε > 0, existe δ0 > 0 de modo que se

(t− t′)2 + (α− α′)2 < δ20

⇒∣∣g(t, α)− g(t′, α′)

∣∣ < ε

R.

Em particular, se t′ = t e α′ = 0, temos

g(t, α) = |g(t, α)| < ε

R, ∀α < δ0

⇒∫ R

rg(t, α)dt ≤ ε(R− r)

R< ε, ∀α < δ0

⇒∣∣∣ ∫ R

r

f(teiα)

teiα + 1eiαdt−

∫ R

r

t−y

t+ 1dt∣∣∣ < ε, ∀α < δ0

⇒ limα→0+

∫L1

f(z)

z + 1dz = lim

α→0+

∫ R

r

f(teiα)

teiα + 1eiαdt =

∫ R

r

t−y

t+ 1dt. (2.10)

Similarmente, como log(z) = log(z) + 2πi, entao∫L2

f(z)

z + 1dz =

∫ r

R

f(te−iα)

te−iα + 1e−iαdt =

∫ r

R

f(teiα)

te−iα + 1e−iαdt =

∫ r

R

e−y log(teiα)

te−iα + 1e−iαdt

=

∫ r

R

e−y(log(teiα)+2πi)

te−iα + 1e−iαdt = −e−2πyi

∫ R

r

e−y(log(teiα))

te−iα + 1e−iαdt

⇒∫L2

f(z)

z + 1dz = −e−2πyi

∫ R

r

e−y(log(teiα))

te−iα + 1e−iαdt. (2.11)

Semelhante ao caso anterior, consideremos h : [r,R]× [0, π2 ]→ R, dada por

h(t, α) =∣∣∣e−y(log(teiα))

te−iα + 1e−iα − t−y

t+ 1

∣∣∣.Ainda, como no caso anterior, h e uniformemente contınua e h(t, 0) = 0 para qualquer

t ∈ [r,R]. Portanto, ∀ε > 0, ∃δ1 > 0 de modo que

h(t, α) <ε

R, ∀α < δ1 ⇒

∫ R

rh(t, α)dt < ε, ∀α < δ1,

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12 Capıtulo 2 — Preliminares

e, pela definicao de limite

limα→0+

∫L2

f(z)

z + 1dz = −e−2πyi

(limα→0+

∫ R

r

e−y(log(teiα))

te−iα + 1e−iαdt

)= −e−2πyi

∫ R

r

t−y

t+ 1dt. (2.12)

Nos estimamos agora as integrais∫CR

f(z)z+1dz e

∫Cr

f(z)z+1dz:∣∣∣ f(z)

z + 1

∣∣∣ ≤ |z|−y|z + 1|≤ |z|−y

|1− |z||

⇒∣∣∣ ∫

Cr

f(z)

z + 1dz∣∣∣ ≤ 2πr1−y

1− re∣∣∣ ∫

CR

f(z)

z + 1dz∣∣∣ ≤ 2πR1−y

R− 1

⇒ limr→0

∫Cr

f(z)

z + 1dz = lim

R→+∞

∫CR

f(z)

z + 1dz = 0. (2.13)

Agora, da equacao (2.8), temos∫CR

f(z)

z + 1dz +

∫L2

f(z)

z + 1dz +

∫Cr

f(z)

z + 1dz +

∫L1

f(z)

z + 1dz =

∮γ

f(z)

z + 1dz = 2πie−iπy

⇒∫CR

f(z)

z + 1dz +

∫Cr

f(z)

z + 1dz = 2πie−iπy −

(∫L2

f(z)

z + 1dz +

∫L1

f(z)

z + 1dz

),

entao, de (2.9), (2.10), (2.11), (2.12) e (2.13) obtemos

limα→0+

(∫CR

f(z)

z + 1dz +

∫Cr

f(z)

z + 1dz

)= 2πie−iπy − (1− e−2πyi)

∫ R

r

t−y

t+ 1dt.

Logo, pela definicao de limite, para qualquer η > 0 existe δ > 0 de modo que, se 0 < α < δ,

⇒∣∣∣2πie−iπy − (1− e−2πyi)

∫ R

r

t−y

t+ 1dt−

(∫CR

f(z)

z + 1dz +

∫Cr

f(z)

z + 1dz

) ∣∣∣ < η

2.

Tomando os limites R→ +∞ e r → 0, obtemos∣∣∣2πie−iπy − (1− e−2πyi)

∫ +∞

0

t−y

t+ 1dt∣∣∣ ≤ η

2< η.

Finalmente, como η > 0 e arbitrario, segue que∫ +∞

0

t−y

t+ 1dt =

2πie−πiy

1− e−2πiy=

π

sin(πy).

Para concluir, conforme foi mencionado antes do Lema 2.4 , que Γ(z) nao possui zeros,

estabelecemos a seguinte proposicao.

Proposicao 2.5 . Para qualquer s ∈ C \ Z temos

Γ(s)Γ(1− s) =π

sin(πs).

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2.2 A Funcao Zeta de Riemann 13

Demonstracao: Como Γ(x)Γ(1 − x) =∫ +∞

0ux−1

u+1 du, para qualquer x ∈ (0, 1), entao pelo

lema anterior

Γ(x)Γ(1− x) =π

sinπ(1− x)=

π

sin(πx), x ∈ (0, 1).

Alem disso, como (0, 1) tem pontos limite em C \ Z, entao

Γ(s)Γ(1− s) =π

sin(πs), ∀s ∈ C \ Z.

Assim, podemos estabelecer agora o teorema que segue.

Teorema 2.6 . A funcao Γ(z) nao tem zeros.

Demonstracao: Pela proposicao anterior, para qualquer s ∈ C \ Z, temos que

Γ(s)Γ(1− s) =π

sin(πs).

Entao Γ(z) nao tem zeros em C \ Z, assim os unicos zeros possıveis de Γ(z) so podem estar

em Z. Mas Γ(z) tem polos em 0,−1,−2, . . . e Γ(n) = (n − 1)! para qualquer n ∈ N. Em

consequencia, Γ(z) nao tem zeros.

2.2 A Funcao Zeta de Riemann

Nesta secao, vamos introduzir a funcao zeta de Riemann que e o tema central do nosso

trabalho. Vamos tambem fornecer algumas de suas propriedades. Uma delas, o Produto de

Euler dado no Teorema 2.7 , adverte-nos da sua relacao com a teoria dos numeros.

A funcao Zeta de Riemann e definida como a funcao ζ : H(1,+∞)→ C tal que

ζ(s) :=∑n≥1

1

ns. (2.14)

Para ver que esta definicao e boa, e suficiente provar que para qualquer s ∈ H(1,+∞),∑n≥1

1ns < ∞. Mais geralmente, vamos provar que a serie que define ζ(s) converge absolu-

tamente em H(1,+∞). Alem disso, mostraremos que ζ(s) ∈ H(H(1,+∞)).

De fato, primeiro vamos provar que a serie que define ζ(s) converge absolutamente em

H(1,+∞). Seja s = σ + it ∈ H(1,+∞), logo 1 < σ. Como ns = nσ+it = nσnit = nσeit logn,

temos que para qualquer m ∈ Nm∑n=1

∣∣∣ 1

ns

∣∣∣ =m∑n=1

1

nσ.

Agora consideremos s = σ + it fixo em H(1,+∞) e definimos f : [1,+∞) → R, do seguinte

modo f(x) = 1xσ . Claramente, f e decrescente e contınua. Logo, usando o criterio da integral,

para a serie∑

n≥11nσ , temos∫ +∞

1

1

uσdu = lim

b→+∞

∫ b

1

1

uσdu = lim

b→+∞

b1−σ

1− σ− 1

1− σ=

1

σ − 1<∞.

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14 Capıtulo 2 — Preliminares

Entao, para qualquer s ∈ H(1,+∞), a soma∑

n≥1

∣∣∣ 1ns

∣∣∣ e convergente, logo∑

n≥11ns converge

absolutamente para todo s ∈ H(1,+∞).

Agora, provaremos que ζ(s) e uma funcao analıtica em H(1,+∞). Para isto, basta provar

que a serie que define ζ(s) converge uniformemente em subconjuntos compactos de H(1,+∞).

Para tal, escrevemos ζ(s) =∑

n≥1 gn(s), onde gn(s) = 1ns n∈N ⊆ H(H(1,+∞)). Seja

A ⊂ H(1,+∞), compacto. Como A e compacto, existe σ0 > 0 tal que, para qualquer

s = σ + it ∈ A, temos que 1 < σ0 ≤ σ, e entao∣∣∣ 1

ns

∣∣∣ =1

nσ≤ 1

nσ0,

para qualquer s ∈ A. Como vimos na demonstracao de convergencia absoluta,∑

n≥11nσ0 <

∞. Entao, pelo teste de Weierstrass∑

n≥01ns converge uniformemente em A e, consequente-

mente, ζ(s) e analıtica em H(1,+∞).

Vamos agora mostrar o primeiro resultado importante envolvendo ζ(s).

Teorema 2.7 (Produto de Euler). Para s = σ + it ∈ H(1,+∞). Temos

ζ(s) =∏p∈P

(1− 1

ps

)−1

.

Demonstracao: Seja X ∈ N, com X ≥ 2, e consideremos a funcao

ζX(s) :=∏p∈Pp≤X

(1− 1

ps

)−1

.

Observemos que, como∣∣∣ 1ps

∣∣∣ = 1pσ < 1, vale(

1− 1

ps

)−1

=∑k≥0

1

pks.

Assim, a convergencia da serie no lado direito e absoluta. Logo, se p1, p2, . . . , pm ∈ P, sao

tais que 2 = p1 < p2 < . . . < pm ≤ X, entao

∏p∈Pp≤X

(1− 1

ps

)−1

=

∑k1≥0

1

pk1s1

∑k2≥0

1

pk2s2

. . .

∑km≥0

1

pkmsm

=∑

k1,...,km≥0

1

(pk11 . . . pkmm )s.

Agora, notemos que a serie multipla acima nao tem termos repetidos, pois, se

1

(pk11 . . . pkmm )s=

1

(pr11 . . . prmm )s⇒ pk11 . . . pkmm = pr11 . . . prmm .

Logo, pelo Teorema Fundamental da Aritmetica, concluimos que k1 = r1, . . . , km = rm.

Alem disso, para qualquer n ∈ N e n ≤ X, existem k1, . . . , km ∈ N tais que n = pk11 . . . pkmm .

Como esta descomposicao e unica temos que∏p∈Pp≤X

(1− 1

ps

)−1

=∑n≤X

1

ns+

′∑n>X

1

ns,

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2.2 A Funcao Zeta de Riemann 15

onde ′ denota a soma de todos os numeros naturais maiores que X, de tal forma que seus

divisores primos sao ≤ X. Agora, concentremo-nos nesta ultima soma. Temos

∣∣∣ ′∑n>X

1

ns

∣∣∣ ≤ ′∑n>X

1

nσ<∑n>X

1

nσ.

Novamente, consideremos f : [1,+∞) → R, definida como f(x) = 1xσ . Assim, dado M ∈ N

com M ≥ X, consideremos a particao Q = X < X + 1 < . . . < M de [X,M ]. Com isso,

considerando a soma inferior s(f,Q) de f em relacao a Q, podemos escrever

s(f,Q)︸ ︷︷ ︸f(X+1)+f(X+2)+...+f(M)=

∑Mn>X

1nσ

≤∫ M

Xf(u)du =

∫ M

X

1

uσdu ≤

∫ M

X

1

uσdu+

1

⇒M∑n>X

1

nσ≤ u1−σ

1− σ

∣∣∣MX

+1

⇒∞∑n>X

1

nσ≤ X1−σ

σ − 1+

1

Xσ≤ 1

Xσ−1+X1−σ

σ − 1=σX1−σ

σ − 1

⇒∣∣∣ ′∑n>X

1

ns

∣∣∣ < σX1−σ

σ − 1.

Assim, X1−σ → 0, quando X → +∞, pois σ > 1. Isso implica que∑′

n>X1ns → 0, quando

X → +∞. Consequentemente,

∏p∈Pp≤X

(1− 1

ps

)−1

=∑n≤X

1

ns+

′∑n>X

1

ns

e, quando X → +∞, obtemos o resultado desejado

∏p∈P

(1− 1

ps

)−1

=∑n≥1

1

ns.

Corolario 2.8 . A funcao ζ(s) nao tem zeros no conjunto H(1,+∞).

Demonstracao: Admitamos que existe s0 = σ0 + iτ0 ∈ H(1,+∞) tal que ζ(s0) = 0. Logo

para qualquer p ∈ P, temos∣∣∣ (1− 1

ps0

)−1 ∣∣∣ =∣∣∣1 +

∑j≥1

1

ps0j

∣∣∣ ≥ 1−∑j≥1

∣∣∣ 1

ps0j

∣∣∣ = 1−∑j≥1

1

pσ0j= 1− 1

pσ0 − 1

⇒∣∣∣ (1− 1

ps0

)−1 ∣∣∣ ≥ 1− 1

pσ0 − 1. (2.15)

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16 Capıtulo 2 — Preliminares

Agora, se e10/σ0 < p, entao 1pσ0−1 <

1e10−1

< 110 , portanto, 1

pσ0−1 ∈ (0, 1/10). Logo considere-

mos a desigualdade e−2x < 1− x, para x ∈ (0, 1/10), que pode ser comprovada graficamente

ou pelo fato seguinte:

Da Desigualdade (2.49), temos que, para qualquer w ∈ C, com |w| ≤ 1/2,

e−2|w|2 ≤ |(1− w)ew|.

Em particular, se x ∈ (0, 1/2),

e−2x2 ≤ (1− x)ex,

⇒ e−2x2−x ≤ 1− x.

Mas, e−2x < e−2x2−x, para x ∈ (0, 1/2). Em particular para x ∈ (0, 1/10) tambem a desigual-

dade e cumprida.

Assim, como 1pσ0−1 ∈ (0, 1/10) entao e

− 2pσ0−1 < 1− 1

pσ0−1 . Logo, substituindo em (2.15),

temos ∣∣∣ (1− 1

ps0

)−1 ∣∣∣ > e− 2pσ0−1

⇒∣∣∣ ∏p∈P:p>e10/σ0

(1− 1

ps0

)−1 ∣∣∣ ≥ e−2(∑

p∈P:p>e10/σ01

pσ0−1

)> 0

⇒∏

p∈P:p>e10/σ0

(1− 1

ps0

)−1

6= 0,

o que implica

ζ(s0) =

∏p∈P:p≤e10/σ0

(1− 1

ps0

)−1 ∏

p∈P:p>e10/σ0

(1− 1

ps0

)−1 6= 0,

que e uma contradicao.

Observacao 2.9 . Do Produto de Euler, as duas seguintes observacoes surgem:

1. ζ(s) pode ser definida, em alternativa, usando o Produto de Euler.

2. O Produto de Euler mostra a ligacao da funcao zeta de Riemann com os numeros

primos.

Agora vamos ver que ζ(s) pode ser estendida para uma funcao meromorfa em C. Para

isso, vamos usar o lema seguinte.

Lema 2.10 . Para s ∈ H(1,+∞), temos

Γ(s)ζ(s) =

∫ +∞

0

ts−1

et − 1dt.

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2.2 A Funcao Zeta de Riemann 17

Demonstracao: Para qualquer s ∈ H(1,+∞), temos

Γ(s) =

∫ +∞

0ts−1e−tdt.

Logo, fazendo a mudanca de variavel t = nx, onde n ∈ N, obtemos

Γ(s) =

∫ +∞

0(nx)s−1e−nxndx = ns

∫ +∞

0xs−1e−nxdx.

Entao,

Γ(s)1

ns=

∫ +∞

0xs−1e−nxdx⇒ Γ(s)ζ(s) =

∑n≥1

∫ +∞

0xs−1e−nxdx

⇒ Γ(s)ζ(s) =

∫ +∞

0xs−1

∑n≥1

e−nx

dx =

∫ +∞

0xs−1

(e−x

1− e−x

)dx =

∫ +∞

0

xs−1

ex − 1dx.

Entao, nos estamos prontos para provar que ζ(s) admite uma extensao meromorfa no

plano complexo.

Teorema 2.11 . A funcao ζ(s) admite a uma funcao meromorfa em C com polo simples em

s = 1 e com Res(ζ, 1) = 1.

Demonstracao: Pelo Lema 2.10 , temos que, para s ∈ H(1,+∞),

Γ(s)ζ(s) =

∫ +∞

0

ts−1

et − 1dt.

Entao,

Γ(s)ζ(s) =

∫ 1

0

ts−1

et − 1dt+

∫ +∞

1

ts−1

et − 1dt. (2.16)

Vemos que a segunda integral desta ultima igualdade converge para qualquer s ∈ C. De fato,

se σ = R(s), ∣∣∣ ∫ +∞

1

ts−1

et − 1dt∣∣∣ ≤ ∫ +∞

1

∣∣∣ ts−1

et − 1

∣∣∣dt =

∫ +∞

1

tσ−1

et − 1dt.

Observamos que tn

n! ≤∑

k≥1tk

k! = et − 1 ∀n ∈ N e t ∈ [1,+∞). Assim, para ns ∈ N de tal

forma que σ − ns < 0, como tnsns!≤ et − 1, temos

tσ−1

et − 1≤ (ns!)t

σ−1−ns ⇒∫ +∞

1

tσ−1

et − 1dt ≤ ns!

∫ +∞

1tσ−1−nsdt =

ns!

ns − σ.

Com isso, temos que, para qualquer s ∈ C, a integral∫ +∞

1ts−1

et−1dt converge e portanto repre-

senta uma funcao inteira a que denotaremos por ϕ(s) =∫ +∞

1ts−1

et−1dt. Por outro lado, para a

primeira intregral do lado direito de (2.16), consideremos a funcao h(z) = 1ez−1 que tem polo

simples em z = 0. Ademais, Res(h, 0) = limz→0z

ez−1 = 1, entao

h(z) =1

z+G(z)

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18 Capıtulo 2 — Preliminares

onde G e uma funcao meromorfa em C com polos de primeira ordem em z = 2kπi, k ∈ Z\0.Portanto,

h(z) =1

z+∑n≥0

cnzn, |z| < 2π.

Mas, como B(0; 2π) e limitada, entao existe M > 0 que satisfaz |G(z)| < M, ∀z ∈ B(0; 2π).

Entao, por estimativas de Cauchy |G(n)(0)| ≤ Mn!(2π)n < Mn!

2n , logo |cn| = |G(n)(0)n! | <

M2n .

Finalmente, como∑

n≥0M2n <∞, segue que

∑n≥0 |cn| <∞. Logo para s ∈ H(1,+∞), como

h(z) = 1z +

∑n≥0 cnz

n converge uniformemente em [0, 1], temos

∫ 1

0

ts−1

et − 1dt =

∫ 1

0ts−1h(t)dt =

∫ 1

0ts−1

1

t+∑n≥0

cntn

dt

⇒∫ 1

0

ts−1

et − 1dt =

∫ 1

0ts−2 +

∑n≥0

cn

∫ 1

0ts−1+ndt =

1

s− 1+∑n≥0

cns+ n

. (2.17)

E, substituindo ϕ(s) e (2.17) em (2.16), obtemos

Γ(s)ζ(s) =

∫ 1

0

ts−1

et − 1dt+

∫ +∞

1

ts−1

et − 1dt =

1

s− 1+∑n≥0

cns+ n

+ ϕ(s), s ∈ H(1,+∞)

⇒ Γ(s)ζ(s) =1

s− 1+∑n≥0

cns+ n

+ ϕ(s), s ∈ H(1,+∞). (2.18)

Assim, pelo Lema 2.1 , esta funcao pode ser estendida a uma funcao meromorfa em C com

polo simples em s = 1 e/ou polos simples em s = 0,−1,−2, . . . dependendo se cn 6= 0 ou

cn = 0. Agora, como Γ(s) nao tem zeros entao 1Γ(s) ∈ H(C), logo de (2.18) para s ∈ H(1,+∞)

temos

ζ(s) =Γ(s)ζ(s)

Γ(s)=

1

Γ(s)

1

s− 1+∑n≥0

cns+ n

+ ϕ(s)

.

Agora, considerando as extensoes meromorfas de Γ(s)ζ(s) e Γ(s), temos que, como Γ(1) =

0! = 1, entao ζ(s) tem um polo simple em s = 1 e Res(ζ, 1) = 1. Alem disso, visto que Γ(s)

tem polos simples em s = 0,−1,−2, . . . entao a funcao 1Γ(s) tem zeros simples nestes pontos,

assim ζ(s) tem singularidades removıveis em s = 0,−1,−2, . . .. Portanto, ζ(s) estende-se a

uma funcao meromorfa em C com polo simples em s = 1.

Analogo ao que foi feito com Γ(s) na secao anterior, no que segue, denotamos por ζ(s) a

extensao meromorfa da funcao ζ(s) definida em (2.14).

Agora vamos continuar com um resultado que no proximo capıtulo vai nos ajudar a

analisar os zeros reais de ζ(s).

Teorema 2.12 . Para qualquer s ∈ C \ 1, temos

ζ(s) = πs−12s sin(πs

2

)Γ(1− s)ζ(1− s).

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2.2 A Funcao Zeta de Riemann 19

Demonstracao: Consideramos o caminho C dado na Fig. 2.2 abaixo, e, para s ∈ C, fixo,

consideremos a seguinte integral ∫C

ws−1

ew − 1dw.

Figura 2.2: Caminho C.

Pelo Teorema de Cauchy, e claro que a integral e independente de 0 < ε < 2π e da

distancia das linhas horizontais em relacao ao eixo real. Por essa razao, faremos o calculo

desta integral no limite quando ε → 0 e quando a distancia entre as linhas horizontais

em relacao ao eixo real tende a zero. Assim considerando novamente o ramo do logaritmo

log(w) = log |w|+ i arg(w), arg(w) ∈ (0, 2π), temos

|ws−1| = |w|R(s)−1

earg(w)I(s).

Como arg(w) ∈ (0, 2π) , entao existe M > 0 de modo que

|ws−1| ≤M |w|R(s)−1, (2.19)

para qualquer w ∈ z ∈ C : z 6= 0, arg(z) ∈ (0, 2π). Agora consideremos a aplicacao

ψ(w) = 1ew−1 que claramente tem um polo simples em w = 0, entao g(w) = w

ew−1 tem

uma singularidade removıvel em w = 0. Assim, podemos estender g de modo que g(0) :=

limw→0w

ew−1 = 1. Entao, 1g(w) = ew−1

w , para w 6= 0. Logo, como 1g e continua em w = 0,

temos, para w suficientemente pequeno e |w| 6= 0

1−∣∣∣ 1

g(w)

∣∣∣ ≤ ∣∣∣ 1

g(0)− 1

g(w)

∣∣∣ ≤ 1

2⇒ 1

2≤∣∣∣ew − 1

w

∣∣∣

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20 Capıtulo 2 — Preliminares

⇒ 1

|ew − 1|≤ 2

|w|.

Assim, temos que ∫Cε

1

|ew − 1|dw ≤ 4π,

onde Cε e a porcao de circunferencia, de raio ε > 0, que faz parte de C. Assim, de (2.19),

obtemos ∣∣∣ ∫Cε

ws−1

ew − 1dw∣∣∣ ≤MεR(s)−1

∫Cε

1

|ew − 1|dw ≤ 4πMεR(s)−1

⇒ limε→0

∫Cε

ws−1

ew − 1dw = 0. (2.20)

Agora, olhemos para as integrais sobre os caminhos horizontais:∫L1

ws−1

ew − 1dw =

∫ R

ε cos θ

(t+ (ε sin θ)i)s−1

et+(ε sin θ)i − 1dt.

Analogo a demonstracao do Lema 2.4 consideremos g : [ε,R]× [0, π2 ]→ R, definido como

g(t, θ) =∣∣∣(t+ (ε sin θ)i)s−1

et+(ε sin θ)i − 1− ts−1

et − 1

∣∣∣claramente g(t, 0) = 0, ∀t ∈ [ε,R]. Como g e uniformemente contınua, entao dado η > 0,

existe δ > 0 de modo que

g(t, θ) <η

R, ∀θ < δ ⇒

∫ R

ε cos θg(t, θ)dt ≤ η

R(R− ε cos θ) < η

⇒ limθ→0

∫ R

ε cos θg(t, θ)dt = 0

⇒ limθ→0

∫L1

ws−1

ew − 1dw =

∫ R

0

ts−1

et − 1dt. (2.21)

Agora como log(w) = log(w) + 2πi, entao temos que∫L2

ws−1

ew − 1dw =

∫ ε cos θ

R

(t− (ε sin θ)i)s−1

et−(ε sin θ)i − 1dt =

∫ ε cos θ

R

elog(t+(ε sin θ)i)(s−1)

et−(ε sin θ)i − 1dt

=

∫ ε cos θ

R

e(log(t+(ε sin θ)i)+2πi)(s−1)

et−(ε sin θ)i − 1dt = −e2πi(s−1)

∫ R

ε cos θ

e(log(t+(ε sin θ)i))(s−1)

et−(ε sin θ)i − 1dt.

Assim, pelos mesmos criterios usados no caminho L1, temos que

limθ→0

∫L2

ws−1

ew − 1dw = −e2πi(s−1)

∫ R

0

ts−1

et − 1dt. (2.22)

Logo tomando os limites R→ +∞, ε→ 0, θ → 0 e de (2.20), (2.21), (2.22) temos∫C

ws−1

ew − 1dw =

∫ +∞

0

ts−1

et − 1dt− e2πi(s−1)

∫ +∞

0

ts−1

et − 1dt = (1− e2πi(s−1))

∫ +∞

0

ts−1

et − 1dt

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2.2 A Funcao Zeta de Riemann 21

⇒∫C

ws−1

ew − 1dw = −2ieπi(s−1) sinπ(s− 1)

∫ +∞

0

ts−1

et − 1dt.

Agora, se s ∈ H(1,+∞) pelo Lema 2.10 temos que Γ(s)ζ(s) =∫ +∞

0ts−1

et−1dt, entao∫C

ws−1

ew − 1dw = 2ieπi(s−1) sin(πs)Γ(s)ζ(s), ∀s ∈ H(1,+∞). (2.23)

Logo, como∫Cws−1

ew−1dw tem sentido para qualquer s ∈ C, entao, da igualdade (2.23) con-

siderando continuacao analıtica, temos que∫C

ws−1

ew − 1dw = 2ieπi(s−1) sin(πs)Γ(s)ζ(s), ∀s ∈ C. (2.24)

Agora, vamos calcular a mesma integral usando o Teorema de Resıduos no caminho β descrito

descrito na Fig. 2.3. Seja s ∈ H(−∞, 0) fixo e consideremos a funcao F (w) = ws−1

ew−1 . Pelo

Figura 2.3: Caminho β.

Teorema dos Resıduos,

∮β

ws−1

ew − 1dw = 2πi

(m∑n=1

Res(F, 2nπi) +

m∑n=1

Res(F,−2nπi)

), (2.25)

notemos que 2kπi e um polo simples de F , ∀k ∈ Z, pois limw→2kπ(w−2kπi)[(w−2kπi)F (w)]

= 0. Assim, temos que:

• Se k > 0,

Res(F, 2kπi) =(

2kπeπ2i)s−1

= (2kπ)s−1eπ2

(s−1)i,

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22 Capıtulo 2 — Preliminares

• Se −k < 0,

Res(F,−2kπi) =(

2kπe3π2i)s−1

= (2kπ)s−1e3π2

(s−1)i.

Entao, calculando o lado direito de (2.25), obtemos∮β

ws−1

ew − 1dw = 2πi

m∑n=1

(2nπ)s−1(eπ2

(s−1)i + e3π2

(s−1)i)

= 2πi

m∑n=1

2s−1ns−1πs−1eπ(s−1)i(e−π2

(s−1)i + eπ2

(s−1)i)

= −2s+1iπseπis

(e−

π2

(s−1)i + eπ2

(s−1)i

2

)m∑n=1

1

n1−s

= −2s+1iπseπis cos(π

2(s− 1)

) m∑n=1

1

n1−s = −2s+1iπseπis sin(π

2s) m∑n=1

1

n1−s

⇒∮β

ws−1

ew − 1dw = −2s+1iπseπis sin

(π2s) m∑n=1

1

n1−s . (2.26)

Agora, observemos que, se w pertence ao lado vertical direito do quadrado β, entao∣∣∣ ws−1

ew − 1

∣∣∣ =|ws−1|ew − 1

=elog |w|(R(s)−1)−arg(w)I(s)

|ew − 1|=

(1

earg(w)I(s)

)(|w|R(s)−1

|ew − 1|

).

Logo, como arg(w) ∈ (0, π4 ] ∪ [7π4 , 2π) (limitado), entao existe M > 0 tal que∣∣∣ ws−1

ew − 1

∣∣∣ ≤M |w|R(s)−1

|ew − 1|.

Alem disso,

|eR(w) − 1| = ||ew| − 1| ≤ |ew − 1| ⇒ 1

|ew − 1|≤ 1

|eR(w) − 1|.

Assim, temos ∣∣∣ ws−1

ew − 1

∣∣∣ ≤M |w|R(s)−1

|eR(w) − 1|≤M |R(w)|R(s)−1

|eR(w) − 1|.

Logo, se denotamos por LV D o lado direito vertical do quadrado, como a parte real de w e

fixo deste lado, temos o seguinte∣∣∣ ∫LVD

ws−1

ew − 1dw∣∣∣ ≤M |R(w)|R(s)−1

|eR(w) − 1|`(LV D) = M

|R(w)|R(s)−1

|eR(w) − 1|(2|R(w)|) =

2M |R(w)|R(s)

|eR(w) − 1|

⇒ limR(w)→+∞

∫LVD

ws−1

ew − 1dw = 0, (2.27)

onde ` denota o comprimento. Analogamente, no lado esquerdo vertical LV E temos a mesma

estimativa, ou seja existe M ′ de modo tal que∣∣∣ ws−1

ew − 1

∣∣∣ ≤M ′ |w|R(s)−1

|ew − 1|

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2.2 A Funcao Zeta de Riemann 23

⇒∣∣∣ ∫

LV E

ws−1

ew − 1dw∣∣∣ ≤ 2M ′|R(w)|R(s)

|eR(w) − 1|

⇒ limR(w)→−∞

∫LV E

ws−1

ew − 1dw = 0. (2.28)

Agora, vejamos o que acontece nos lados superior e inferior do quadrado, novamente temos

que existe M ′′ > 0 tal que∣∣∣ ws−1

ew − 1

∣∣∣ ≤M ′′ |w|R(s)−1

ew − 1≤M ′′ |I(w)|R(s)−1

ew − 1.

Por outro lado, como em linhas horizontais limR(w)→+∞1

|ew−1| = 0 e limR(w)→−∞1

|ew−1| = 1,

entao existe A > 0 de modo que1

|ew − 1|≤ A

nos lados superior e inferior de qualquer quadrado. Entao,∣∣∣ ws−1

ew − 1

∣∣∣ ≤M ′′A|I(w)|R(s)−1

nos lados superior e inferior de β. Logo, como R(s) < 0 e o comprimento para ambos lados

e descrito por 2|I(w)|, se denotamos como LS e LI os lados superior e inferior, temos∣∣∣ ∫LS

ws−1

ew − 1dw∣∣∣ ≤ 2M ′′A|I(w)|R(s) e

∣∣∣ ∫LI

ws−1

ew − 1dw∣∣∣ ≤ 2M ′′A|I(w)|R(s)

⇒ limI(w)→+∞

∫LS

ws−1

ew − 1dw = lim

I(w)→−∞

∫LI

ws−1

ew − 1dw = 0. (2.29)

Assim, de (2.29), (2.28) e (2.27), considerando os lados de β tendendo ao infinito, e de (2.26)

com (2.24), temos

2ieπi(s−1) sin(πs)Γ(s)ζ(s) =

∫C

ws−1

ew − 1dw = −2s+1iπseπis sin

(π2s)∑n≥1

1

n1−s

⇒ 2ieπi(s−1) sin(πs)Γ(s)ζ(s) = −2s+1iπseπis sin(π

2s)ζ(1− s)

⇒ sin(πs)Γ(s)ζ(s) = 2sπs sin(π

2s)ζ(1− s)

⇒ 2 sin(π

2s)

cos(π

2s)

Γ(s)ζ(s) = 2sπs sin(π

2s)ζ(1− s)

⇒ cos(π

2s)

Γ(s)ζ(s) = 2s−1πsζ(1− s), ∀ R(s) < 0 e s 6= 0,−2,−4,−6, . . .

e como esta e uma igualdade entre funcoes meromorfas em C

⇒ cos(π

2s)

Γ(s)ζ(s) = 2s−1πsζ(1− s), ∀s 6= 0.

Fazendo a mudanca s por 1− s, temos

cos(π

2(1− s)

)Γ(1− s)ζ(1− s) = 2−sπ1−sζ(s)

⇒ ζ(s) = 2sπs−1 sin(πs

2

)Γ(1− s)ζ(1− s), ∀s ∈ C \ 1.

Com isso, concluimos a demonstracao do Teorema 2.12 .

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24 Capıtulo 2 — Preliminares

2.3 Funcoes Inteiras de Ordem Um

Como vimos na secao anterior, ζ(s) nao e uma funcao inteira. Mas, como veremos no

proximo capıtulo, esta associada, algebricamente, a uma funcao inteira. Alem disso, esta

e uma funcao inteira de ordem um. Portanto, precisamos introduzir esta definicao e desen-

volver algumas propriedades em relacao a seus zeros. Estas propriedades ajudam a relacionar

alguns dos zeros de ζ(s) com a teoria analıtica dos numeros e encontrar propriedades destes,

por exemplo ζ(s) tem um numero infinito enumeravel de zeros nao reais.

Para uma melhor compreensao desta secao, recomendamos que o leitor faca uma leitura

previa do Apendice A, na secao de Notacao Assintotica.

Definicao 2.13 . Uma funcao inteira f : C→ C e de ordem um se

|f(z)| = Oε(exp(|z|1+ε)),

para qualquer ε > 0.

Lema 2.14 . Seja g ∈ H(C) tal que g(z) 6= 0, para qualquer z ∈ C, que verifica

|g(z)| = exp(O(|z|3/2))

para qualquer z ∈⋃j≥1 ∂B(0;Rj), onde limj→+∞Rj = +∞. Entao,

g(z) = exp(Az +B),

para algumas constantes A, B.

Demonstracao: Como g(z) 6= 0 para qualquer z, entao existe h ∈ H(C), tal que

g(z) = exp(h(z)). (2.30)

Tambem, como |g(z)| = exp(O(|z|3/2)), entao |h(z)| = O(|z|3/2). Agora, seja z ∈ C. Logo,

como limj→+∞Rj = +∞, temos que existe j ∈ N tal que z ∈ B(0;Rj). Entao, pela formula

integral de Cauchy, temos

h′′(z) =1

πi

∫∂B(0;Rj)

h(w)

(w − z)3dw

⇒ |h′′(z)| ≤ 1

π

∫∂B(0;Rj)

|h(w)||(w − z)|−3dw. (2.31)

Podemos escolher j suficientemente grande tal que z ∈ B(0;Rj/2). Assim,

|z − w| ≥ |w| − |z| ≥ Rj −Rj2

=Rj2. (2.32)

Usando |h(w)| = O(|w|3/2), existe uma constante M > 0 tal que

|h(w)| ≤MR3/2j . (2.33)

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2.3 Funcoes Inteiras de Ordem Um 25

Assim, de (2.32) e (2.33) em (2.31), temos

|h′′(z)| ≤ 16R−1/2j .

Logo, se j → +∞, temos h′′(z) = 0 e como z e qualquer temos que h(z) = Az + B,

para algumas constantes A, B. Finalmente, usando esse fato em (2.30), obtemos g(z) =

exp(Az +B).

Teorema 2.15 (Formula de Jensen). Sejam R, ε > 0. Admitamos que f e analıtica em

B(0;R + ε), que f(z) 6= 0, para R ≤ |z| < R + ε e z = 0, e que f tem zeros z1, . . . , zm em

B(0;R) (contando com as multiplicidades respectivas). Entao,

1

∫ 2π

0log |f(Reiθ)|dθ = log |f(0)|+ log

(Rm

|z1| . . . |zm|

).

Demonstracao: A demonstracao pode ser encontrada em [8].

Corolario 2.16 . Seja f uma funcao inteira com f(0) 6= 0. Entao,

1

∫ 2π

0log |f(Reiθ)|dθ − log |f(0)| =

∫ R

0

n(r)

rdr,

onde n(r) := |z ∈ B(0; r) : f(z) = 0|.

Demonstracao: Pela Formula de Jensen, so temos que provar que∫ R

0n(r)r dr = log

(Rm

|z1|...|zm|

).

Para isso, ordenemos os zeros em relacao a sua magnitude, isto e, rj = |zj |, j = 1, . . . ,m e

r1 ≤ r2 ≤ . . . ≤ rm. Por conveniencia, seja r0 = 0 e rm+1 = R. Assim, temos que∫ R

0

n(r)

rdr =

∫ r1

r0

n(r)

rdr +

∫ r2

r1

n(r)

rdr + · · ·+

∫ rm+1

rm

n(r)

rdr

=

∫ r1

r0

0

rdr +

∫ r2

r1

1

rdr + · · ·+

∫ rm+1

rm

m

rdr =

m∑j=1

j log

(rj+1

rj

)=

m∑j=1

log

(rj+1

rj

)j

= logm∏j=1

(rj+1

rj

)j= log

(Rm

r1 . . . rm

).

Agora passamos a provar uma propriedade importante das funcoes inteiras de ordem um,

que sera muito util no proximo capıtulo.

Teorema 2.17 . Seja f uma funcao inteira de ordem um. Entao, para X > 1, temos

(i) ∑f(ρ)=0|ρ|≥X

|ρ|−1−ε ε X−ε/2,

para qualquer ε > 0.

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26 Capıtulo 2 — Preliminares

(ii) ∑f(ρ)=0ρ 6=0

|ρ|−1−ε <∞,

para qualquer ε > 0.

(iii) f tem a seguinte representacao:

f(z) = zreAz+B∏f(ρ)=0ρ 6=0

(1− z

ρ

)ez/ρ.

Demonstracao:

(i) Se z = 0 e um zero de multiplicidade r de f , entao consideremos g(z) = f(z)zr , que e uma

funcao inteira e verifica g(0) 6= 0. Alem disso, como f e inteira de ordem um, temos

que, para qualquer ε > 0,

|f(z)| ε exp |z|ε+1. (2.34)

Logo, como limz→∞1|z|r = 0, entao existe R > 0 tal que

|z| > R⇒ 1

|z|r< ε. (2.35)

Assim, de (2.34) e (2.35), temos que

|g(z)| = |f(z)||z|r

ε exp |z|1+ε,

o que equivale a dizer que |g(z)| = Oε(exp(|z|1+ε)). Portanto, g e uma funcao inteira

de ordem um. Aplicando agora o Corolario 2.16 , temos que∫ R

0

n(r)

rdr =

1

∫ 2π

0log |g(Reiθ)|dθ − log |g(0)|

=1

∫ 2π

0log |g(Reiθ)|dθ − 1

∫ 2π

0log |g(0)|dθ =

1

∫ 2π

0log∣∣∣g(Reiθ)

g(0)

∣∣∣dθ⇒∫ R

0

n(r)

rdr =

1

∫ 2π

0log∣∣∣g(Reiθ)

g(0)

∣∣∣dθ. (2.36)

Mas, como |g(Reiθ)| ε exp |Reiθ|1+ε = exp |R|1+ε entao log |g(Reiθ)| ε |R|1+ε e como

log |g(0)| e uma constante, entao em (2.36) temos∫ R

0

n(r)

rdr ε R

1+ε (2.37)

para qualquer ε > 0. Denotemos por SR o numero de zeros de f no anel R ≤ |z| < 2R.

Assim, temos

SR ≤ n(2R) =1

R

∫ 3R

2Rn(2R)dr ≤ 1

R

∫ 3R

2Rn(r)dr ≤ 3

∫ 3R

2R

n(r)

rdr

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2.3 Funcoes Inteiras de Ordem Um 27

= 3

(∫ 3R

0

n(r)

rdr −

∫ 2R

0

n(r)

rdr

).

Mas, por (2.37), temos que

SR ε R1+ε. (2.38)

Logo, se ρ e um zero de f tal que |ρ| ≥ X, consideremos j ∈ N tal que 2j ≤ |ρ| < 2j+1.

Entao, X < 2j+1. Assim,∑f(ρ)=0|ρ|≥X

|ρ|−1−ε ≤∑

j∈N:2j+1<X

2−(1+ε)jS2j .

Mas, por (2.38), S2j ε 2j(1+ε/2). Entao,∑f(ρ)=0|ρ|≥X

|ρ|−1−ε ≤∑

j∈N:2j+1<X

2−(1+ε)jS2j ε

∑j∈N:2j+1<X

2−(1+εj)2j(1+ε/2)

=∑

j∈N:2j+1<X

2−εj/2 =2−εk0/2

1− 2−ε/2,

onde k0 e o menor numero natural tal que X < 2k0+1. Logo, temos 2−εk0/2 < 2ε/2X−ε/2

e da ultima desigualdade segue que

∑f(ρ)=0|ρ|≥X

|ρ|−1−ε ε

∑j∈N:2j+1<X

2−(1+εj)2j(1+ε/2) =2−εk0/2

1− 2−ε/2<

2ε/2

1− 2−ε/2X−ε/2

⇒∑f(ρ)=0|ρ|≥X

|ρ|−1−ε ε X−ε/2.

(ii) Sabemos, a partir do item anterior, que se X > 1 entao∑

f(ρ)=0|ρ|≥X

|ρ|−1−ε < ∞, para

qualquer ε > 0. Isto implica que∑

f(ρ)=0|ρ|>1

|ρ|−1−ε < ∞. Alem disso, como f tem um

numero finito de zeros em B(0; 1), entao a soma∑

f(ρ)=00<|ρ|≤1

|ρ|−1−ε e finita. Portanto,∑f(ρ)=0ρ 6=0

|ρ|−1−ε <∞.

(iii) Consideremos a funcao

F (z) :=∏f(ρ)=0ρ 6=0

(1− z

ρ

)ez/ρ.

Para ver que F ∈ H(C), so temos que provar que o produto converge uniformemente

sobre qualquer subconjunto compacto de C. Assim, tomando um ramo de logaritmo

conveniente, isto e equivalente a provar que∑f(ρ)=0ρ 6=0

log

(1− z

ρ

)+z

ρ

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28 Capıtulo 2 — Preliminares

converge uniformemente em qualquer subconjunto compacto. Entao seja K ⊂ C com-

pacto. Logo, existe R > 0 tal que K ⊂ B(0;R). Assim, para qualquer z ∈ K, temos

que

∑f(ρ)=0ρ 6=0

log

(1− z

ρ

)+z

ρ

=∑f(ρ)=0|ρ|>2R

log

(1− z

ρ

)+z

ρ

+

∑f(ρ)=0

0<|ρ|≤2R

log

(1− z

ρ

)+z

ρ

.

A segunda soma do lado direito converge pois e uma soma com um numero finito de

termos. Assim, so temos que provar que a primeira soma converge. De fato, sabemos

que

log(1− x) = −x− x2

2− x3

3− . . . , |x| < 1,

o que implica que se |x| ≤ 12 entao

|x+ log(1− x)| =∣∣∣x2

2+x3

3+ · · ·

∣∣∣ ≤ |x|2(1

2+

1

22+

1

23+

1

24+ · · ·

)= |x|2. (2.39)

Mas, como |ρ| > 2R e |z| ≤ R entao∣∣∣ zρ ∣∣∣ ≤ 1

2 logo por (2.39) temos

∣∣∣zρ

+ log

(1− z

ρ

) ∣∣∣ ≤ ∣∣∣zρ

∣∣∣2 ≤ R2

|ρ|2

⇒ sup|z|≤R

∣∣∣zρ

+ log

(1− z

ρ

) ∣∣∣ ≤ R2

|ρ|2

e, como pelo item anterior,∑

f(ρ)=0ρ 6=0

1|ρ|2 <∞, segue que

∑f(ρ)=0|ρ|>2R

sup|z|≤R

∣∣∣ zρ+log(

1− zρ

) ∣∣∣ <∞. Portanto,

∑f(ρ)=0|ρ|>2R

log(

1− zρ

)+ z

ρ

converge uniformemente sobre K. Entao

F ∈ H(C).

Agora pela, definicao de F , e claro que

g(z) :=f(z)

zrF (z)

e uma funcao inteira. Vamos continuar a usar o Lema 2.14 para provar que existem

constantes A,B tais que g(z) = exp(Az + B). Para j ∈ N, sabemos que, por (2.38), o

numero de zeros no anel 2j ≤ |z| < 2j+1 e O(2j(1+ε)). Portanto, existe R ∈ [2j , 2j+1)

tal que, para qualquer z ∈ ∂B(0;R), |z − ρ| > 0 para qualquer ρ zero de f . Assim,

como 1R → 0, quando R→ +∞, temos que

|z − ρ| 1

R, ∀ρ zero de f e z ∈ ∂B(0;R), (2.40)

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2.3 Funcoes Inteiras de Ordem Um 29

e tomamos Rj := R. Agora, seja z ∈ C tal que |z| = Rj para algum j ∈ N. Entao,

podemos decompor F (z) do seguinte modo

F (z) =

∏f(ρ)=0

0<|ρ|<Rj2

(1− z

ρ

)ez/ρ

︸ ︷︷ ︸

P1

∏f(ρ)=0

Rj2 ≤|ρ|<2Rj

(1− z

ρ

)ez/ρ

︸ ︷︷ ︸

P2

∏f(ρ)=0|ρ|≥2Rj

(1− z

ρ

)ez/ρ

︸ ︷︷ ︸

P3

.

(2.41)

Analisando essa expressao, temos que:

P1: Se 0 < |ρ| < Rj2 , temos∣∣∣ (1− z

ρ

)ez/ρ

∣∣∣ ≥ ∣∣∣1− z

ρ

∣∣∣e−|z/ρ| = ∣∣∣1− z

ρ

∣∣∣e−Rj/|ρ| ≥ (Rj|ρ| − 1

)e−Rj/|ρ| > e−Rj/|ρ|

⇒ |P1| > exp

−Rj ∑f(ρ)=0

0<|ρ|<Rj2

1

|ρ|

. (2.42)

Mas, como |ρ| < Rj/2, entao |ρ|ε+1 < (Rj/2)ε|ρ| para qualquer ε > 0. Assim,

1

|ρ|<

(Rj2

)ε 1

|ρ|1+ε⇒

∑f(ρ)=0

0<|ρ|<Rj2

1

|ρ|≤(Rj2

)ε ∑f(ρ)=0ρ 6=0

1

|ρ|1+ε.

Sabemos pelo item (ii) que∑

f(ρ)=0ρ 6=0

1|ρ|1+ε = C ′ε <∞. Entao,

exp

−Rj ∑f(ρ)=0

0<|ρ|<Rj2

1

|ρ|

≥ exp

(−C

′ε

2εRε+1j

). (2.43)

Logo, de (2.42) e (2.43), temos que

|P1| > exp

(−C

′ε

2εRε+1j

). (2.44)

P2: SeRj2 ≤ |ρ| < 2Rj , vale que 1

2Rj< 1|ρ| ≤

2Rj

. Assim,∣∣∣ (1− z

ρ

)ez/ρ

∣∣∣ =|ρ− z||ρ|

|ez/ρ| ≥ |ρ− z|2Rj

e−Rj/|ρ| ≥ |ρ− z|2Rj

e−2.

Mas, pela equacao (2.40), |ρ − z| 1Rj

, entao, usando esta desigualdade na de-

sigualdade anterior, obtemos∣∣∣ (1− z

ρ

)ez/ρ

∣∣∣ 1

2e2R2j

. (2.45)

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30 Capıtulo 2 — Preliminares

Novamente, por (2.38) sabemos que SRj2

+ SRj ε R1+εj . Entao, existe C ′′ε > 0

tal que SRj2

+ SRj ≤ C ′′εR1+εj , para Rj suficientemente grande. Alem disso, como

Rj ∈ [2j , 2j+1), temos que 1 < Rj . Com isso e usando (2.45), temos que

|P2|

(1

2e2R2j

)SRj2

+SRj

(1

2e2R2j

)C′′ε R1+εj

. (2.46)

Agora, como o crescimento exponencial e superior ao crescimento potencial, temos(1

2e2R2j

)C′′ε R1+εj

ε e−R1+2ε

j .

Logo, desta ultima desigualdade (mudando convenientemente ε por ε/2) e de

(2.46), temos que

|P2| ε exp(−R1+εj ). (2.47)

P3: Primeiro vamos provar que, se |w| ≤ 1/2, entao |(1 − w)ew| > e−2|w|2 . De fato,

consideremos a serie de Taylor log(1− w) = −∑

m≥1wm

m , se |w| < 1. Entao,

(1− w)ew = exp

(−w

2

2− w3

3− · · ·

), ∀ |w| < 1. (2.48)

Mas, ∣∣∣−∑n≥2

wn

n

∣∣∣ ≤∑n≥2

|w|n

n= |w|2

∑k≥0

|w|k

k + 2.

Assim, se |w| ≤ 1/2, |w|k ≤ 12k

o que implica que |w|k

k+2 ≤1

2k(k+2)< 1

2k, para

qualquer k = 0, 1, . . .. Entao,∑

k≥0|w|kk+2 ≤ 2 usando este e a desigualdade acima,

segue que ∣∣∣−∑n≥2

wn

n

∣∣∣ ≤ 2|w|2.

Logo, em (2.48), temos

|(1− w)ew| =∣∣∣ exp

(−w

2

2− w3

3− · · ·

) ∣∣∣ ≥ exp

−∣∣∣−∑n≥2

wn

n

∣∣∣ ≥ e−2|w|2

⇒ |(1− w)ew| ≥ e−2|w|2 , ∀ |w| ≤ 1/2. (2.49)

Agora, se |ρ| ≥ 2Rj , temosRj|ρ| ≤

12 . Logo, pela desigualdade (2.49), temos∣∣∣ (1− z

ρ

)ez/ρ

∣∣∣ ≥ e−2R2j/|ρ|2

⇒∣∣∣ ∏f(ρ)=0|ρ|≥2Rj

(1− z

ρ

)ez/ρ

∣∣∣ ≥ exp

−2R2j

∑f(ρ)=0|ρ|≥2Rj

1

|ρ|2

. (2.50)

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2.3 Funcoes Inteiras de Ordem Um 31

Logo, como2Rj|ρ| ≤ 1, para ε ∈ (0, 1), temos que

2Rj|ρ|≤(

2Rj|ρ|

)ε⇒ 1

|ρ|2≤ (2Rj)

ε−1 1

|ρ|ε+1.

Por outro lado, sabemos pelo item (ii) que∑

f(ρ)=0ρ 6=0

1|ρ|ε+1 <∞. Portanto,

∑f(ρ)=0|ρ|≥2Rj

1

|ρ|2≤ (2Rj)

ε−1∑f(ρ)=0ρ 6=0

1

|ρ|ε+1

⇒ exp

−(2Rj)ε−1

∑f(ρ)=0ρ 6=0

1

|ρ|ε+1

≤ exp

− ∑f(ρ)=0|ρ|≥2Rj

1

|ρ|2

.

Desta ultima desigualdade e de (2.50), temos que, para ε ∈ (0, 1),

|P3| ≥ exp

−2ε

∑f(ρ)=0ρ 6=0

1

|ρ|ε+1

Rε+1j

. (2.51)

Agora de (2.44), (2.47) e (2.51) em (2.41) temos

|F (z)| = |P1P2P3| ε exp(−C ′′′ε R1+εj ), ∀ε ∈ (0, 1).

Em particular, para ε = 1/2, temos que

|F (z)| exp(−C ′′′R3/2j ). (2.52)

Alem disso, como f e uma funcao inteira de ordem um, vale

|f(z)| exp(R3/2j ). (2.53)

Portanto,

|g(z)| = |f(z)||z|r|F (z)|

=|f(z)|

Rrj |F (z)| exp

((C ′′′ + 1)R

3/2j

).

Logo, como |z| = Rj e j ∈ N e arbitrario, temos que

|g(z)| = exp(O(|z|3/2)

),

para qualquer z ∈⋃j∈N ∂B(0;Rj). Entao, pelo Lema 2.14 , temos que existem

constantes A,B tais que

g(z) = Az +B

⇒ f(z) = zreAz+B∏f(ρ)=0ρ6=0

(1− z

ρ

)ez/ρ.

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32 Capıtulo 2 — Preliminares

E fica provado o Teorema 2.17

A partir deste teorema, obtemos o seguinte corolario.

Corolario 2.18 . Com as mesmas notacoes do teorema anterior, se∑

f(ρ)=0ρ6=0

1|ρ| <∞, entao

|f(z)| = expO(|z|).

Demonstracao: Primeiro observemos que, para qualquer z ∈ C,

|(1− z)ez| ≤ e2|z|. (2.54)

De fato, |(1 − z)ez| ≤ (1 + |z|)e|z| ≤(

1 + |z|+ |z|22! + |z|3

3! + · · ·)e|z| = e2|z|. Agora vamos

provar o resultado principal. Pelo teorema anterior, sabemos que f(z) = zreAz+B∏

f(ρ)=0ρ6=0

(1− z

ρ

)ez/ρ.

Entao,

|f(z)| = |z|r|eAz+B|∣∣∣ ∏f(ρ)=0ρ 6=0

(1− z

ρ

)ez/ρ

∣∣∣ = |z|r|eAz+B|∏f(ρ)=0ρ 6=0

∣∣∣ (1− z

ρ

)ez/ρ

∣∣∣≤ |z|re|A||z|+|B|

∏f(ρ)=0ρ6=0

∣∣∣ (1− z

ρ

)ez/ρ

∣∣∣.Assim, usando (2.54) no lado direito da desigualdade acima, temos

|f(z)| ≤ |z|re|A||z|+|B|∏f(ρ)=0ρ 6=0

∣∣∣ (1− z

ρ

)ez/ρ

∣∣∣ ≤ |z|re|A||z|+|B|e2

(∑f(ρ)=0ρ 6=0

1|ρ|

)|z|,

e, como para |z| suficientemente grande, |z|r ≤ e|z|, e|A||z|+|B| ≤ e(|A|+|B|)|z|, da desigualdade

acima segue que

|f(z)| ≤ exp

1 + |A|+ |B|+ 2

∑f(ρ)=0ρ6=0

1

|ρ|

|z| ,

para |z| suficientemente grande,

⇒ |f(z)| = expO(|z|).

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Capıtulo

3A Hipotese de Riemann

O objetivo deste capıtulo e introduzir a Hipotese de Riemann, dar uma evidencia forte

dela e apresentar algumas propriedades dos zeros de ζ(s) em relacao a uma regiao de Cque chamamos faixa crıtica. As ferramentas necessarias ja forem desenvolvidas no Capıtulo

2. Apos isso, continuamos a estudar os zeros nao-triviais da funcao ζ(s), salientando a

importancia destes na teoria analıtica dos numeros, e depois introduzimos a conjetura de

Hilbert-Polya. No final, apresentamos duas formulacoes equivalentes da Hipotese de Riemann,

um delas importante na Teoria das Cordas.

3.1 Estabelecendo a Hipotese de Riemann

Do Corolario 2.8 , vimos que ζ(s) nao tem zeros em H(1,+∞). Contudo, do Teorema

2.12 , temos que

ζ(s) = 2sπs−1 sin(πs

2

)Γ(1− s)ζ(1− s),

para R(s) < 0. Assim, os zeros de ζ(s) para R(s) < 0, sao os zeros de sin(πs2

)que sao

−2,−4,−6, . . .. Estes sao chamados de zeros triviais de ζ(s). Com isso, os demais zeros de

ζ(s), denominados zeros nao trivias de ζ(s) devem estar no conjunto S, onde S := s ∈ C :

0 < R(s) < 1 que e a faixa crıtica. Para poder enunciar a Hipotese de Riemann, vamos

precisar do seguinte teorema.

Teorema 3.19 . ζ(s) nao tem zeros na fronteira da faixa crıtica, isto e, nas retas R(s) = 1

e R(s) = 0.

Demonstracao: Vamos continuar usando o metodo indireto. Mas primeiro vamos provar

que para σ, t ∈ R, com σ > 1,

|ζ(σ)|3|ζ(σ + it)|4|ζ(σ + 2ti)| ≥ 1. (3.1)

33

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34 Capıtulo 3 — A Hipotese de Riemann

Com efeito, para s = σ + it ∈ H(1,+∞), temos que ζ(s) =∏p∈P

(1− 1

ps

)−1, entao

log(ζ(s)) = −∑p∈P

log

(1− 1

ps

). (3.2)

Agora, consideremos a serie de Taylor de log(1− x) com centro em x = 0. Temos

log(1− x) = −∑m≥1

xm

m, |x| < 1, (3.3)

e entao, usando (3.3) em (3.2), obtemos a equacao

log ζ(s) = −∑p∈P

−∑m≥1

p−sm

m

=∑p∈P

∑m≥1

p−sm

m=∑p∈P

∑m≥1

p−σm

me−imt log p

⇒ R (log ζ(s)) =∑p∈P

∑m≥1

p−σm

mcos(mt log(p)). (3.4)

Agora observemos que, ∀θ ∈ R, temos que

0 ≤ 2(cos θ + 1)2 = 2 cos2 θ − 1 + 3 + 4 cos θ = cos 2θ + 4 cos θ + 3

⇒ 0 ≤ 3 + 4 cos θ + cos 2θ, ∀θ ∈ R. (3.5)

Logo, de (3.4), com s = σ, s = σ + it e s = σ + 2it, respectivamente,

R (log ζ(σ)) =∑p∈P

∑m≥1

p−σm

m,

R (log ζ(σ + it)) =∑p∈P

∑m≥1

p−σm

mcos(mt log p),

R (log ζ(σ + 2ti)) =∑p∈P

∑m≥1

p−σm

mcos(2mt log p).

Entao, pela desigualdade (3.5), temos

3R (log ζ(σ)) + 4R (log ζ(σ + it)) + R (log ζ(σ + 2ti)) =∑p∈P

∑m≥1

p−σm

m(3 + 4 cos(mt log(p)) + cos(2mt log(p))) ≥ 0

⇒ 3R (log ζ(σ)) + 4R (log ζ(σ + it)) + R (log ζ(σ + 2ti)) ≥ 0. (3.6)

Mas, como log(z) = log |z| + i arg(z), entao R(log(z)) = log |z|. Usando este resultado em

(3.6), temos

3 log |ζ(σ)|+ 4 log |ζ(σ + it)|+ log |ζ(σ + 2ti)| ≥ 0

⇒ log(|ζ(σ)|3|ζ(σ + it)|4|ζ(σ + 2ti)|

)≥ 0

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3.1 Estabelecendo a Hipotese de Riemann 35

⇒ |ζ(σ)|3|ζ(σ + it)|4|ζ(σ + 2ti)| ≥ 1.

Agora, vamos continuar com a demonstracao. Como ζ(s) tem um polo simples em σ = 1

e Res(ζ, 1) = 1, segue que

ζ(σ) =1

σ − 1+ g(σ), (3.7)

onde g e analıtica em s = 1. Logo, supondo que existe t ∈ R \ 0 tal que ζ(1 + it) = 0,

entao, para σ > 1 suficientemente proximo de 1, temos

|ζ(σ + it)| = |ζ(σ + it)− ζ(1 + it)| ≤ |σ − 1|(

sup0<l<1

|ζ ′(1 + l(σ − 1) + it)|). (3.8)

Tambem, para qualquer σ ∈ (1, 1 + δ), onde δ > 0 e suficientemente pequeno, existe A > 0,

que depende de t, tal que |ζ(σ + 2it)| ≤ A. Logo, deste ultimo resultado, e usando (3.8) e

(3.7) em (3.1), resulta que

1 ≤ |ζ(σ)|3|ζ(σ + it)|4|ζ(σ + 2ti)| ≤∣∣∣ 1

σ − 1+ g(σ)

∣∣∣3|σ − 1|4(

sup0<l<1

|ζ ′(1 + l(σ − 1) + it)|)4

A

⇒ 1 ≤ |1 + (σ − 1)g(σ)|3|σ − 1|(

sup0<l<1

|ζ ′(1 + l(σ − 1) + it)|)4

A.

Com isso, se σ → 1+, temos 1 ≤ 0, o que e uma contradicao. Assim ζ(1 + it) 6= 0, para

qualquer t ∈ R.

Analogamente, se existe t ∈ R \ 0 tal que ζ(ti) = 0, entao pela equacao funcional para

ζ(s) (Teorema 2.12 ), temos que

0 = ζ(ti) = 2tiπti−1 sin(π

2ti)

Γ(1− ti)ζ(1− ti).

Logo, como 2tiπti−1 sin(π2 ti)

Γ(1 − ti) 6= 0, segue que ζ(1 − ti) = 0. Mas, isso nao pode ser

verdade, porque contradiz o que foi feito no caso anterior.

Finalmente mostremos que 0 e 1 nao sao zeros de ζ(s). De fato, s = 1 nao e um zero

pois e um polo simples de ζ(s). Assim, e suficiente provar que s = 0 nao e um zero de ζ(s).

Como sin(πs2

)tem um zero simples em s = 0 e ζ(1− s) tem um polo simples em s = 0, entao

existem funcoes analıticas h e g com h(0), g(0) 6= 0 tais que sin(πs2

)= sg(s) e ζ(1−s) = h(s)

s .

Assim, novamente pela equacao funcional de ζ(s), temos

ζ(0) = lims→0

ζ(s) = lims→0

2sπs−1 sin(πs

2

)Γ(1− s)ζ(1− s) = lim

s→02sπs−1sg(s)Γ(1− s)h(s)

s

⇒ ζ(0) =g(0)h(0)

π6= 0.

Portanto, ζ(s) nao tem zeros na fronteira da faixa crıtica e o Teorema 3.19 fica mostrado.

Assim, podemos concluir que quaisquer zeros nao-triviais estao na faixa crıtica S = s ∈C : 0 < R(s) < 1. Riemann calculou tres destes zeros usando a formula Rieman-Siegel [10]

e conjeturou a sua famosa hipotese.

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36 Capıtulo 3 — A Hipotese de Riemann

Conjetura 3.20 (Hipotese de Riemann). Todos os zeros nao-triviais de ζ(s) estao na reta

crıtica L := s ∈ C : R(s) = 12.

Esta conjetura foi enunciada em 1859 na sua publicacao entitulada Sobre os Numeros

Primos Menores que uma Magnitude Dada [20].

Continuaremos com alguns resultados importantes para nos ajudar a apresentar algumas

propriedades dos zeros de ζ(s) que tambem nos deixam o caminho livre para apresentar uma

evidencia da Hipotese de Riemann.

Agora vamos estudar algumas propriedades dos zeros de ζ(s). Para tal, precisamos do

seguinte lema.

Lema 3.21 . Para qualquer x > 0, temos que

+∞∑n=−∞

e−n2π 1

x =√x

(+∞∑

n=−∞e−n

2πx

).

Demonstracao: Dado x > 0, consideremos a funcao ψ(t) = e−t2πx. Entao, pela Formula

de Soma de Poisson discutida no Apendice A ( ver Eq. (A.9)), temos que

+∞∑n=−∞

ψ(n) =+∞∑

k=−∞

∫ +∞

−∞ψ(t)e2πiktdt.

Assim,

+∞∑n=−∞

e−n2πx =

+∞∑k=−∞

∫ +∞

−∞e−t

2πx+2πiktdt =

+∞∑k=−∞

e−πk2 1x

∫ +∞

−∞e−πx(t−

ikx )

2

dt

⇒+∞∑

n=−∞e−n

2πx =+∞∑

k=−∞e−πk

2 1x

∫ +∞

−∞e−πx(t−

ikx )

2

dt. (3.9)

Logo, para qualquer k ∈ Z, consideremos o caminho conectando, na ordem, os pontos a

seguir, [−R− ikx , R−

ikx , R,−R,−R−

ikx ]. Entao, pelo Teorema de Cauchy, segue que∫

[−R− ikx,R− ik

x,R,−R,−R− ik

x]e−πxz

2dz = 0. (3.10)

Mas, se z ∈ [R− ikx , R], entao z = R− iλ onde λ ∈ [−k

x , 0]. Assim, z2 = R2−λ2−2Rλi e, em

consequencia, eπxz2

= e−πx(R2−λ2−2Rλi). Daı, considerando uma parte de (3.10), temos que∫[R− ik

x,R]|e−πxz2 |dz = e−πxR

2

∫ 0

− kx

eπxλ2dλ

⇒ limR→+∞

∫[R− ik

x,R]|e−πxz2 |dz = 0.

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3.1 Estabelecendo a Hipotese de Riemann 37

De modo analogo,

limR→+∞

∫[−R,−R− ik

x]|e−πxz2 |dz = 0.

Portanto, considerando (3.10) no limite R→ +∞ temos que∫ +∞

−∞e−πx(t−

ikx )

2

dt =

∫ +∞

−∞e−πxt

2dt.

Porem, sabemos que, para qualquer % > 0, a integral Gaussiana e calculavel e vale∫ +∞−∞ e−%u

2du =√

π% . Entao, ∫ +∞

−∞e−πx(t−

ikx )

2

dt =1√x.

Em seguida, usando esse resultado em (3.9), obtemos

+∞∑n=−∞

e−n2πx =

1√x

(+∞∑

k=−∞e−πk

2 1x

)

⇒+∞∑

k=−∞e−πk

2 1x =√x

(+∞∑

n=−∞e−n

2πx

).

Este resultado e usado para demonstrar o seguinte teorema.

Teorema 3.22 . Seja s = σ + it ∈ H(1,+∞). Entao,

π−s2 Γ(s

2

)ζ(s) =

1

s(s− 1)+

∫ +∞

1(x

s2−1 + x−

s2− 1

2 )ω(x)dx, (3.11)

onde ω(x) =∑

n≥1 e−πn2x.

Demonstracao: Se s = σ + it ∈ H(1,+∞), entao, por definicao, temos que Γ(s2

)=∫ +∞

0 e−uus2−1du. Logo, fazendo a mudanca de variavel u = πn2x, temos que

Γ(s

2

)=

∫ +∞

0e−πn

2x(πn2x)s2−1πn2dx = nsπ

s2

∫ +∞

0e−πn

2xxs2−1dx

⇒ π−s2 Γ(s

2

) 1

ns=

∫ +∞

0e−πn

2xxs2−1dx.

Mas, como s ∈ H(1,+∞), da igualdade anterior vemos que

π−s2 Γ(s

2

)ζ(s) = lim

N→+∞

N∑n=1

∫ +∞

0e−πn

2xxs2−1dx = lim

N→+∞

∫ +∞

0xs2−1

N∑n=1

e−πn2xdx

= limN→+∞

∫ +∞

0xs2−1

∑n≥1

e−πn2x −

∑n>N

e−πn2x

dx

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38 Capıtulo 3 — A Hipotese de Riemann

=

∫ +∞

0xs2−1ω(x)dx− lim

N→+∞

∫ +∞

0xs2−1∑n>N

e−πn2xdx,

e, entao, que

π−s2 Γ(s

2

)ζ(s) =

∫ +∞

0xs2−1ω(x)dx− lim

N→+∞

∫ +∞

0xs2−1∑n>N

e−πn2xdx. (3.12)

Agora, observemos a seguinte desigualdade, evidente para x > 0,∑n>N

e−πn2x ≤

∫ +∞

Ne−πu

2xdu.

Fazendo aqui a mudanca de variavel v = πu2x, temos

∑n>N

e−πn2x ≤

∫ +∞

Ne−πu

2xdu =1

2√πx

∫ +∞

πN2xe−vv−

12dv.

Continuamos a estimativa em duas partes:

• Se x < 1πN2 , temos

1

2√πx

∫ +∞

πN2xe−vv−

12dv ≤ 1

2√πx

∫ +∞

0e−vv−

12dv =

Γ(

12

)2√πx.

• Se x > 1πN2 . Logo, se πxN2 < v, entao, v−

12 < 1

N√πx

e∫ +∞

πN2xv−

12 e−vdv ≤ 1

N√πx

∫ +∞

πN2xe−vdv =

e−πN2x

N√πx

⇒ 1

2√πx

∫ +∞

πN2xv−

12 e−vdv ≤ e−πN

2x

2Nπx.

Tambem, como∣∣∣ ∫ +∞

0xs2−1

(∑n>N

e−πn2x

)dx∣∣∣ ≤ ∫ 1

πN2

0xσ2−1

(∑n>N

e−πn2x

)dx+

∫ +∞

1πN2

xσ2−1

(∑n>N

e−πn2x

)dx,

das duas estimativas anteriores, segue que:∣∣∣ ∫ +∞

0xs2−1

(∑n>N

e−πn2x

)dx∣∣∣ ≤ ∫ 1

πN2

0xσ2−1 Γ

(12

)2√πxdx+

∫ +∞

1πN2

xσ2−1 e

−πN2x

2Nπxdx. (3.13)

Em seguida, analisamos as duas integrais do lado direito de (3.13):∫ 1πN2

0 xσ2−1 Γ( 1

2)2√πxdx: Temos∫ 1πN2

0xσ2−1 Γ

(12

)2√πxdx =

Γ(

12

)2√π

∫ 1πN2

0xσ−12−1dx =

Γ(

12

)√π(σ − 1)

(1

πN2

)σ−12

e, como σ > 1,

limN→+∞

∫ 1N

0xσ2−1 Γ

(12

)2√πxdx = 0.

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3.1 Estabelecendo a Hipotese de Riemann 39

∫ +∞1

πN2xσ2−1 e−πN

2x

2Nπx dx: Fazendo a mudanca de variavel u = πN2x, temos

∫ +∞

1πN2

xσ2−1 e

−πN2x

2Nπxdx =

∫ +∞

1

e−uuσ2−2

2πσ2Nσ−1

du,

e consideramos os seguintes casos:

1. Se σ2 − 1 > 0, entao∫ +∞

1

e−uuσ2−2

2πσ2Nσ−1

du =

∫ +∞1 e−uu(σ2−1)−1du

2πσ2Nσ−1

≤∫ +∞

0 e−uu(σ2−1)−1du

2πσ2Nσ−1

=Γ(σ2 − 1

)2π

σ2Nσ−1

⇒ limN→+∞

∫ +∞

πN

e−uuσ2−2

2(πN2)σ2

du = 0.

2. Se σ2 − 1 ≤ 0, entao σ

2 − 2 < 0, logo 1 < u, e entao

uσ2−2 < 1⇒ e−uu

σ2−2 < e−u

⇒∫ +∞

1e−uu

σ2−2du ≤

∫ +∞

1e−udu =

1

e

⇒∫ +∞

1

e−uuσ2−2

2πσ2Nσ−1

du ≤ 1

2eπσ2Nσ−1

⇒ limN→+∞

∫ +∞

πN

e−uuσ2−2

2πσ2Nσ−1

du = 0.

Assim, em qualquer caso, limN→+∞∫ +∞πN

e−uuσ2−2

2πσ2 Nσ−1

du = 0.

Portanto, em (3.13), temos que limN→+∞∫ +∞

0 xs2−1(∑

n>N e−πn2x

)dx = 0. Logo, de

(3.12), π−s2 Γ(s2

)ζ(s) =

∫ +∞0 x

s2−1ω(x)dx. Assim,

π−s2 Γ(s

2

)ζ(s) =

∫ 1

0xs2−1ω(x)dx+

∫ +∞

1xs2−1ω(x)dx.

Substituindo x−1 por x na primeira integral do lado direito, temos

π−s2 Γ(s

2

)ζ(s) =

∫ +∞

1x−( s2+1)ω(x−1)dx+

∫ +∞

1xs2−1ω(x)dx.

Mas, pelo Lema 3.21 , ω(x−1) =√xω(x)− 1

2 +√x

2 , e entao

π−s2 Γ(s

2

)ζ(s) =

∫ +∞

1x−( s2+1)

(√xω(x)− 1

2+

√x

2

)dx+

∫ +∞

1xs2−1ω(x)dx

=1

s(s− 1)+

∫ +∞

1(x

s2−1 + x−

s2− 1

2 )ω(x)dx.

Portanto,

π−s2 Γ(s

2

)ζ(s) =

1

s(s− 1)+

∫ +∞

1(x

s2−1 + x−

s2− 1

2 )ω(x)dx,

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40 Capıtulo 3 — A Hipotese de Riemann

e concluimos a demonstracao do Teorema 3.22 .

A integral no lado direito de (3.11) existe para qualquer s ∈ C. Entao, esta integral define

uma funcao inteira. Portanto, se ξ(s) e definida como segue

ξ(s) :=1

2s(s− 1)π−

s2 Γ(s

2

)ζ(s), (3.14)

temos, pelo Teorema 3.22 , e por esta ultima afirmacao, que ξ(s) ∈ H(C). Alem disso,

ξ(1− s) =1

2

(1 + (1− s)(1− s− 1)

∫ +∞

1(x

1−s2−1 + x−

(1−s)2− 1

2 )ω(x)dx

)= ξ(s).

Entao, ξ(s) satisfaz a propriedade importante

ξ(1− s) = ξ(s). (3.15)

Tambem, novamente pelo Teorema 3.22 , e claro que tambem vale a propriedade

ξ(s) = ξ(s). (3.16)

Agora, com a ajuda de ξ(s), vamos provar o seguinte teorema.

Teorema 3.23 . Os zeros nao-triviais de ζ(s) sao simetricos com relacao ao eixo real e

tambem com relacao a reta crıtica.

Demonstracao: Claramente os unicos zeros de ξ(s) sao os zeros nao-triviais de ζ(s); o

recıproco tambem e verdadeiro, pois de (3.14) os zeros triviais de ζ(s) sao cancelados pelo

polos de Γ(s2

), s

2Γ(s2

)= Γ

(s2 + 1

)6= 0 (pelo Teorema 2.6 ) e s − 1 e cancelado pelo polo

de ζ(s). Entao, se ρ e um zero nao trivial de ζ(s) temos que tambem e um zero de ξ(s).

Mas, pela equacao (3.16), ρ tambem e um zero de ξ(s). Portanto, tambem e um zero de

ζ(s). Assim, os zeros sao simetricos com relacao ao eixo real. Analogamente, se escrevermos

ρ = a+ ib, entao ρ = a− ib tambem e um zero de ξ(s). Logo, pela equacao (3.15), temos que

1− ρ = 1− a+ ib tambem e um zero de ξ(s) portanto e um zero de ζ(s). Assim, os zeros sao

simetricos com relacao a reta crıtica.

Resumindo, os zeros nao-triviais de ζ(s), alem de estarem localizados na faixa crıtica

S = s ∈ C : 0 < R(s) < 1, satisfazem as propriedades:

(i) Nao existem zeros na fronteira de S.(ii) Os zeros nao-triviais sao simetricos com relacao a L e o eixo real.

Para concluir esta secao, com as ferramentas ja adquiridas ate aqui, apresentamos uma

evidencia para a Hipotese de Riemann. Para isso, vamos definir Ξ(t) como segue

Ξ(t) := ξ

(1

2+ it

). (3.17)

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3.2 Os Zeros nao-triviais de ζ(s) e a Teoria Analıtica dos Numeros. 41

Usando (3.15) e (3.16) em (3.17), temos, para t ∈ R,

Ξ(t) = ξ

(1

2+ it

)= ξ

(1

2+ it

)= ξ

(1

2− it

)= ξ

(1−

(1

2− it

))= ξ

(1

2+ it

)= Ξ(t).

Assim, Ξ(t) ∈ R para qualquer t ∈ R. Agora, consideremos o numero N(T ) de zeros de ζ(s)

contidos na regiao z ∈ C : 0 < R(z) < 1, 0 ≤ I(z) ≤ T, para T ≥ 0. Logo, e claro que se

consideramos a funcao Ξ(t) restrita a t ∈ R, entao Ξ(t) e uma funcao real contınua. Assim,

deve ter um zero de ordem ımpar entre dois numeros reais em que muda de sinal. Alem disso,

se o numero de zeros e igual ao numero de mudancas de sinal, entao esses zeros sao de ordem

um, ou seja se escolhermos T > 0 de modo conveniente, tal que o numero de mudancas de

sinal de Ξ(t) em [0, T ] e igual a N(T ), entao estes sao zeros simples de ζ(s) e satisfazem a

Hipotese de Riemann. Entao, nesse caso, terıamos a garantia de que todos os zeros de ζ(s)

sao simples. Para provar a Hipotese de Riemann aqui e suficiente provar que para qualquer

T > 0 o numero de mudancas de sinal de Ξ(t) e igual a N(T ), mas nao temos certeza de

tais informacoes. No entanto, podemos dizer que os primeiros 1.5 bilhoes de zeros de ζ(s),

obtidos numericamente, parecem satisfazer essa propriedade (ver [27]). Em outras palavras

corroboram a Hipotese de Riemann.

3.2 Os Zeros nao-triviais de ζ(s) e a Teoria Analıtica dos Numeros.

Aqui, vamos apresentar a importancia de os zeros de ζ(s) na teoria analıtica dos numeros.

Esta relacao ja era previsıvel, pois como vimos anteriormente no Produto de Euler ζ(s) ja

estabelecemos uma relacao de ζ(s) com os numeros primos. Para obter as propriedades de-

sejadas, vamos usar a teoria das funcoes inteiras de ordem um, que ja vimos no Capıtulo 2.

Na verdade, vamos provar que ξ(s) e uma funcao inteira de ordem um.

Como vimos anteriormente, os zeros nao-triviais de ζ(s) e os zeros de ξ(s), definida em

(3.14), sao os mesmos. Entao, para abreviar notacoes, vamos denotar por ρ os zeros na fixa

crıtica S e nao vamos especificar se estamos lidando com ζ(s) ou ξ(s), salvo alguns casos.

Agora, apresentamos o seguinte teorema que vai nos ajudar a estabelecer uma represen-

tacao de ζ(s), com s em S.

Lema 3.24 (Formula de Soma de Euler). Seja φ ∈ C1 ([a, b]). Entao,

∑n∈(a,b]

φ(n) =

∫ b

aφ(x)dx+

∫ b

a

(x− [x]− 1

2

)φ′(x)dx+

(a− [a]− 1

2

)φ′(a)−

(b− [b]− 1

2

)φ′(b).

Demonstracao: Por integracao por partes∫ b

aφ(x)d

(x− [x]− 1

2

)= φ(x)

(x− [x]− 1

2

) ∣∣∣ba−∫ b

a

(x− [x]− 1

2

)φ′(x)dx

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42 Capıtulo 3 — A Hipotese de Riemann

⇒∫ b

aφ(x)dx−

∫ b

aφ(x)d[x] = φ(x)

(x− [x]− 1

2

) ∣∣∣ba−∫ b

a

(x− [x]− 1

2

)φ′(x)dx.

Portanto, ∑n∈(a,b]

φ(n) =

∫ b

aφ(x)d[x]

=

∫ b

aφ(x)dx+

∫ b

a

(x− [x]− 1

2

)φ′(x)dx+

(a− [a]− 1

2

)φ′(a)−

(b− [b]− 1

2

)φ′(b).

Consideremos agora φ(x) := n−s, onde s ∈ H(1,+∞) e a, b em Z. Entao, pela Formula

de Soma de Euler, temos que

b∑n=a+1

1

ns=

∫ b

a

1

xsds+ s

∫ b

a

([x]− x+ 1

2

)xs+1

dx+1

2(b−s − a−s)

=b1−s − a1−s

1− s+ s

∫ b

a

([x]− x+ 1

2

)xs+1

dx+1

2(b−s − a−s).

Agora, tomando a = 1 e b→ +∞

+∞∑n=2

1

ns=

1

s− 1+ s

∫ +∞

1

([x]− x+ 1

2

)xs+1

dx− 1

2.

Entao,

ζ(s) =1

s− 1+ s

∫ +∞

1

([x]− x+ 1

2

)xs+1

dx+1

2,

e simplificando a integral, obtemos a representacao

ζ(s) =s

s− 1− s

∫ +∞

1

x− [x]

xs+1dx. (3.18)

Observe que a integral no lado direito da equacao acima existe para qualquer s ∈ S. Entao,

(3.18) da uma representacao de ζ(s) para s ∈ S.

Agora, com a teoria de funcoes inteiras de ordem um desenvolvida anteriormente e a

equacao (3.18), prosseguimos com a prova de algumas propriedades de ζ(s) e seus zeros.

Teorema 3.25 . ξ(s) e uma funcao inteira de ordem um.

Demonstracao: Sabemos que ξ(s) e uma funcao inteira e que ξ(s) = ξ(1−s) para qualquer

s ∈ C, entao so temos que provar que

ξ(s) = Oε(exp(|s|1+ε)), ∀ ε > 0,

para R(s) ≥ 12 . Consideremos o fato que

ξ(s) =1

2s(s− 1)π−

s2 Γ(s

2

)ζ(s), (3.19)

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3.2 Os Zeros nao-triviais de ζ(s) e a Teoria Analıtica dos Numeros. 43

e vamos limitar cada um dos fatores que compoem o lado direito de (3.19). Para s = σ+ it ∈H(0,+∞), ∣∣∣Γ(s

2

) ∣∣∣ =∣∣∣ ∫ +∞

0e−uu

s2−1du

∣∣∣ ≤ ∫ +∞

0e−uu

σ2−1du = Γ

(σ2

).

Mas, da formula de Stirling,

log Γ(σ

2

)=σ − 1

2log(σ

2

)− σ

2+

1

2log 2π +O(σ−1).

Entao, na desigualdade anterior temos que∣∣∣Γ(s2

) ∣∣∣ ≤ Γ(σ

2

)= exp

(σ − 1

2log(σ

2

)− σ

2+

1

2log 2π +O(σ−1)

) exp

(σ log σ

2

)

≤ exp

(|s| log |s|

2

)

⇒∣∣∣Γ(s

2

) ∣∣∣ = O

(exp

(|s| log |s|

2

)). (3.20)

Tambem, pela equacao (3.18), concluimos que

ζ(s) = O(|s|). (3.21)

Alem disso, e claro que ∣∣∣12s(s− 1)π−

s2

∣∣∣ = O(exp(2|s|)). (3.22)

Finalmente, das equacoes (3.20), (3.21) e (3.22) em (3.19) obtemos que ξ(s) e uma funcao

inteira de ordem um, o que prova o Teorema 3.25 .

Corolario 3.26 . A serie∑

ξ(ρ)=01|ρ| diverge.

Demonstracao: Admitamos que∑

ξ(ρ)=01|ρ| <∞. Assim, pelo Corolario 2.18 , temos que

|ξ(s)| = expO(|s|). (3.23)

Usando ξ(s) = 12s(s − 1)π−

s2 Γ(s2

)ζ(s), e a formula de Stirling, para x ∈ R, temos que

log Γ(x2

)∼ x

2 log x2 e, por (3.18), limx→+∞

x∈Rζ(x) = 1. Entao, para x ∈ R, temos que

ξ(x) ∼ 1

2x(x− 1)π−

x2 e

x2

log x2 =

1

2x(x− 1)e

x2

log x2π

o que contradiz (3.23). Portanto,∑

ξ(ρ)=01|ρ| e divergente.

Corolario 3.27 . ζ(s) tem um numero infinito enumeravel de zeros nao-triviais.

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44 Capıtulo 3 — A Hipotese de Riemann

Demonstracao: Sabemos que os zeros nao-triviais de ζ(s) sao os zeros de ξ, entao a prova

e uma consequencia direta do corolario acima.

Agora, vamos destacar algumas relacoes entre os zeros de ζ(s) com a teoria analıtica dos

numeros. Pelo Teorema 2.17 ,

ξ(s) = eAs+B∏ρ

(1− s

ρ

)es/ρ. (3.24)

Tambem, pelo mesmo teorema, temos que, para qualquer ε > 0,∑ρ

1

|ρ|1+ε<∞. (3.25)

Pela equacao (3.24),ξ′(s)

ξ(s)= A+

∑ρ

(1

s− ρ+

1

ρ

).

Mas, como ξ(s) = (s− 1)π−s2 Γ(s2 + 1

)ζ(s), entao

ξ′(s)

ξ(s)=

1

s− 1− 1

2log π +

1

2

Γ′(s2 + 1

)Γ(s2 + 1

) +ζ ′(s)

ζ(s).

Assim, das duas ultimas equacoes segue que

ζ ′(s)

ζ(s)= A− 1

s− 1+

1

2log π − 1

2

Γ′(s2 + 1

)Γ(s2 + 1

) +∑ρ

(1

s− ρ+

1

ρ

). (3.26)

Vamos agora definir duas funcoes, de muita utilidade, para relacionar os zeros de ζ(s) e

numeros primos e estabelecer o Teorema dos Numeros Primos, que e a relacao entre os zeros

nao-triviais de ζ(s) e a teoria analıtica dos numeros a ser discutida neste trabalho.

Denotamos por Λ a funcao de von Mangoldt definida como

Λ(n) :=

log p, n = pm para algum p ∈ P

0, n 6= pm ∀ p ∈ P.

Uma relacao da funcao de von Mangoldt e ζ(s), de grande importancia, e a seguinte. Do

produto de Euler, resulta que, para qualquer s ∈ H(1,+∞), ζ(s) =∏p∈P

(1− 1

ps

)−1. Logo,

log ζ(s) = −∑p∈P

log

(1− 1

ps

).

Usando a serie de Taylor, log(1− x) = −∑

m≥1xm

m , |x| < 1, temos

log ζ(s) =∑p∈P

∑m≥1

p−smm−1,

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3.2 Os Zeros nao-triviais de ζ(s) e a Teoria Analıtica dos Numeros. 45

e, derivando membro-a-membro,

−ζ′(s)

ζ(s)=∑p∈P

∑m≥1

p−sm log p.

Alem disso, pela definicao de Λ∑m≥1

p−sm log p =log p

ps+

log p

p2s+

log p

p3s+ · · ·

=Λ(p)

ps+

Λ(p2)

p2s+

Λ(p3)

p3s+ · · ·

=∑m≥1

Λ(pm)

(pm)s.

Assim, temos

− ζ ′(s)

ζ(s)=∑n≥1

Λ(n)

ns, s ∈ H(1,+∞). (3.27)

A outra funcao de extrema importancia e a funcao de Chebyshev, que e definida como

Ψ(x) :=∑

n∈N:n≤xΛ(n).

Agora, continuamos com os resultados seguintes, que vao nos auxiliar na demonstracao

do Teorema dos Numeros Primos.

Lema 3.28 . Seja ρ = β + iγ, e consideremos T ≥ 1. Entao,∑ρ

1

1 + (T − γ)2= O(log T ).

Demonstracao: Do Corolario A.61 ,

Γ′(s)

Γ(s)= log s+O

(1

|s|

)(| arg s| < π). (3.28)

Agora, consideremos s = 2 + iT . Entao, por (3.26),

ζ ′(s)

ζ(s)= A− 1

s− 1+

1

2log π − 1

2

Γ′(s2 + 1

)Γ(s2 + 1

) +∑ρ

(1

s− ρ+

1

ρ

). (3.29)

Mas, claramente, A − 1s−1 + 1

2 log π = O(log T ). Alem disso, de (3.28), temos que para T

suficientemente grande existe C > 0 tal que∣∣∣Γ′ ( s2 + 1)

Γ(s2 + 1

) ∣∣∣ ≤ C log T

⇒Γ′(s2 + 1

)Γ(s2 + 1

) = O(log T ), (3.30)

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46 Capıtulo 3 — A Hipotese de Riemann

e, como s = 2 + iT , ∣∣∣ζ ′(s)ζ(s)

∣∣∣ ≤∑n≥1

Λ(n)

n2<∞.

Assim, existe uma constante C1 > 0 tal que∣∣∣ζ ′(s)ζ(s)

∣∣∣ ≤ C1. (3.31)

Portanto, de (3.30), (3.31) e (3.29), temos que

∑ρ

(1

s− ρ+

1

ρ

)= O(log T )

⇒∑ρ

R

(1

s− ρ+

1

ρ

)= O(log T )

⇒∑ρ

2− β(2− β)2 + (T − γ)2

= O(log T ).

Como 12(1+(T−γ)2)

≤ 2−β(2−β)2+(T−γ)2

, a prova e concluıda.

Corolario 3.29 . O numero de zeros ρ = β + iγ, tais que |T − γ| ≤ 1, e O(log T ).

Demonstracao: Se |T − γ| ≤ 1, entao

(T − γ)2 + 1 ≤ 2⇒ 1

2≤ 1

1 + (T − γ)2

⇒ 1

2|ρ = β + iγ : |T − γ| ≤ 1| ≤

∑ρ:|T−γ|≤1

1

1 + (T − γ)2≤∑ρ

1

1 + (T − γ)2= O(log T ).

Assim, o numero de zeros ρ = β + iγ, tais que |T − γ| ≤ 1, e O(log T ).

Lema 3.30 . Se t ≥ 1 e s = σ + it, onde −1 ≤ σ ≤ 2. Entao

ζ ′(s)

ζ(s)=

∑ρ:|t−γ|≤1

1

s− ρ+O(log t).

Demonstracao: Pela equacao (3.26), para s = σ + it, com −1 ≤ σ ≤ 2, temos

ζ ′(s)

ζ(s)= A− 1

s− 1+

1

2log π − 1

2

Γ′(s2 + 1

)Γ(s2 + 1

) +∑ρ

(1

s− ρ+

1

ρ

), (3.32)

de onde, com s = 2 + it, escrevemos

ζ ′(2 + it)

ζ(2 + it)= A− 1

1 + it+

1

2log π − 1

2

Γ′(

2+it2 + 1

)Γ(

2+it2 + 1

) +∑ρ

(1

2 + it− ρ+

1

ρ

). (3.33)

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3.2 Os Zeros nao-triviais de ζ(s) e a Teoria Analıtica dos Numeros. 47

Usando (3.28) em (3.32) e (3.33), alem disso, desde que A− 1s−1 + 1

2 log π = A− 12+it + 1

2 +12 log π = O(log t) e por (3.31) ζ′(2+it)

ζ(2+it) = O(1), subtraindo-se membro a membro (3.32) de

(3.33), obtemos a seguinte equacao

ζ ′(s)

ζ(s)= O(log t) +

∑ρ

(1

σ + it− ρ− 1

2 + it− ρ

). (3.34)

Observando agora que∣∣∣ 1

σ + it− ρ− 1

2 + it− ρ

∣∣∣ =2− σ

|(σ − β) + i(t− γ)||(2− β) + i(t− γ)|≤ 3

|t− γ|2, (3.35)

e tambem ∑ρ:|t−γ|>1

1

|t− γ|2= O(log t), (3.36)

alem do fato que se |t− γ| > 1, temos

1 + (t− γ)2 < 2|t− γ|2 ⇒ 1

|t− γ|2<

2

1 + (t− γ)2.

Logo, pelo Lema 3.28 ,∑ρ:|t−γ|>1

1

|t− γ|2≤ 2

∑ρ:|t−γ|>1

1

1 + (t− γ)2≤ 2

∑ρ

1

1 + (t− γ)2= O(log t).

Assim, usando (3.36) em (3.35), temos que

∑ρ:|t−γ|>1

(1

σ + it− ρ− 1

2 + it− ρ

)= O(log t). (3.37)

Alem disso, do Corolario 3.29, sabemos que o numero de zeros ρ tais que |γ−t| ≤ 1 e O(log t),

e como o conjunto ρ : |γ − t| ≤ 1 e compacto, entao∑ρ:|t−γ|≤1

∣∣∣ 1

2 + it− ρ

∣∣∣ = O(log t). (3.38)

Assim, finalmente, usando (3.37) e (3.38) em (3.34), temos o resultado desejado

ζ ′(s)

ζ(s)=

∑ρ:|t−γ|≤1

1

s− ρ+O(log t).

Teorema 3.31 . Seja 2 ≤ T ≤ x. Entao

Ψ(x) = x−∑

|I(ρ)|≤T

ρ+O

(x log2 x

T

).

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48 Capıtulo 3 — A Hipotese de Riemann

Demonstracao: Para s = σ + it ∈ H(1,+∞), pelas equacoes (3.26) e (3.27), temos∑n≥1

Λ(n)

ns= −ζ

′(s)

ζ(s)=

1

s− 1−∑ρ

(1

s− ρ+

1

ρ

)− 1

2log π +

1

2

Γ′(s2 + 1

)Γ(s2 + 1

) −A. (3.39)

Alem disso, ∑n≥1

|Λ(n)|nσ

∫ +∞

1

log x

xσdx = (σ − 1)−2

⇒∑n≥1

|Λ(n)|nσ

= O((σ − 1)−2).

Portanto, pela formula de inversao (Teorema A.59 ), temos, para b = 1 + log−1 x,

Ψ(x) =1

2πi

∫ b+iT1

b−iT1

∑n≥1

Λ(n)

ns

xs

sds+O

(x1+log−1 x log2 x

T

)+O

(x log(2x) log x

T

)

=1

2πi

∫ b+iT1

b−iT1

(−ζ′(s)

ζ(s)

)xs

sds+O

(x log2 x

T

), (3.40)

onde T1 ∈ [T, T + 1] e tomado adequadamente para que a distancia da reta I(s) = T1 ao

zero de ζ(s) mais proximo seja log−1 x e tambem para que nao haja zero no conjunto

z ∈ C : R(z) ∈ (0, 1) e I(z) ∈ [T, T1]. De fato, pelo Corolario 3.29 , o numero de zeros ρ

tais que T ≤ I(ρ) ≤ T+1 e O(log T ). Entao, existe T1 ∈ [T, T+1] tal que |T1−I(ρ)| > 0 para

qualquer ρ zero de ζ(s) tal que T ≤ I(ρ) ≤ T+1 (observar que pela finitude dos zeros tais que

|T −I(ρ)| ≤ 1, podemos escolher T1 de modo que nao haja zeros no conjunto (0, 1)× [T, T1]).

Logo, consideremos ρ′ o zero de ζ(s) mais proximo da reta I(s) = T1. Como T ∈ [2, x], entao

log T > 0. Alem disso, desde que 1log T → 0, quando T → +∞, temos

|T1 − I(ρ′)| log−1 T ≥ log−1 x.

Agora considerando a integral

J =1

2πi

∫[b−iT1,b+iT1,− 1

2+iT1,− 1

2−iT1,b−iT1]

(−ζ′(s)

ζ(s)

)xs

sds,

e usando (3.39), e claro que a funcao(− ζ′(s)ζ(s)

)xs

s tem polos simples em s = 0, 1 e os zeros ρ

de ζ(s) tais que |I(ρ)| ≤ T1. Assim, pelo teorema de Cauchy, resulta que

J = x−∑

|I(ρ)|≤T1

ρ− ζ ′(0)

ζ(0). (3.41)

Vamos continuar estimando as integrais∫[b+iT1,− 1

2+iT1]

(−ζ′(s)

ζ(s)

)xs

sds,

∫[− 1

2+iT1,− 1

2−iT1]

(−ζ′(s)

ζ(s)

)xs

sds

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3.2 Os Zeros nao-triviais de ζ(s) e a Teoria Analıtica dos Numeros. 49

e ∫[− 1

2−iT1,b−iT1]

(−ζ′(s)

ζ(s)

)xs

sds.

A primeira e terceira integrais tem o mesmo modulo. Entao, nos limitaremos somente a

primeira. Para ela, temos a estimativa∣∣∣ ∫[b+iT1,− 1

2+iT1]

(−ζ′(s)

ζ(s)

)xs

sds∣∣∣ ≤ ∫ b

−1/2

|xσ+iT1 ||σ + iT1|

∣∣∣ζ ′(σ + iT1)

ζ(σ + iT1)

∣∣∣dσ ≤ x

T1

∫ b

−1/2

∣∣∣ζ ′(σ + iT1)

ζ(σ + iT1)

∣∣∣dσ.(3.42)

Agora, para a segunda integral, temos∣∣∣ ∫[− 1

2+iT1,− 1

2−iT1]

(−ζ′(s)

ζ(s)

)xs

sds∣∣∣ ≤ ∫ T1

−T1

∣∣∣ζ ′(−1/2 + it)

ζ(−1/2 + it)

∣∣∣ |x−1/2+it|| − 1/2 + it|

dt

≤ 2√x

∫ T1

−T1

∣∣∣ζ ′(−1/2 + it)

ζ(−1/2 + it)

∣∣∣dt. (3.43)

No que segue, vamos utilizar o Lema 3.30 , do seguinte modo. Para σ ∈ (−1/2, b) e x

suficientemente grande

ζ ′(σ + iT1)

ζ(σ + iT1)=

∑ρ:|T1−γ|≤1

1

(σ − β) + i(T1 − γ)+O(log T1). (3.44)

Sabemos, tambem, pela escolha de T1, que |T1 − γ| 1log T e, pelo Corolario 3.29 , que a

quantidade de zeros tais que |T1 − γ| ≤ 1 e O(log T1). Entao, se |T1 − γ| ≤ 1, temos∣∣∣ 1

(σ − β) + i(T1 − γ)

∣∣∣ ≤ 1

|T1 − γ| log T

de onde∑ρ:|T1−γ|≤1

∣∣∣ 1

(σ − β) + i(T1 − γ)

∣∣∣ log T log T1 ≤ log T log(T + 1) ≤ log T log 2T log2 T.

Portanto, substituindo em (3.44), temos que

ζ ′(σ + iT1)

ζ(σ + iT1)= O(log2 T ) +O(log T1) O(log2 T ) +O(log(T + 1)) O(log2 T ) +O(log 2T )

⇒ ζ ′(σ + iT1)

ζ(σ + iT1)= O(log2 T ).

Assim, usando este resultado em (3.42), obtemos∣∣∣ ∫[b+iT1,− 1

2+iT1]

(−ζ′(s)

ζ(s)

)xs

sds∣∣∣ x

T

(3/2 + log−1 x

)log2 T x log2 x

T. (3.45)

Novamente, pelo Lema 3.25, para t ≥ 1 temos

ζ ′(−1/2 + it)

ζ(−1/2 + it)=

∑ρ:|t−γ|≤1

1

(−1/2− β) + i(t− γ)+O(log t),

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50 Capıtulo 3 — A Hipotese de Riemann

e tambem, pelo Corolario 3.29 , o numero de zeros tais que |t − γ| ≤ 1 e O(log t). Entao, a

soma do lado direito da igualdade anterior e O(log t). Portanto, para 1 ≤ t ≤ T1.

ζ ′(−1/2 + it)

ζ(−1/2 + it)= O(log t) = O(log T1),

e, usando (3.43),

√x

2

∣∣∣ ∫[− 1

2+iT1,− 1

2−iT1]

(−ζ′(s)

ζ(s)

)xs

sds∣∣∣ ≤ ∫ 1

0

∣∣∣ζ ′(−1/2− it)ζ(−1/2− it)

∣∣∣dt+

∫ T1

1

∣∣∣ζ ′(−1/2− it)ζ(−1/2− it)

∣∣∣dt+

∫ 1

0

∣∣∣ζ ′(−1/2 + it)

ζ(−1/2 + it)

∣∣∣dt+

∫ T1

1

∣∣∣ζ ′(−1/2 + it)

ζ(−1/2 + it)

∣∣∣dt T1 log T1

⇒∫

[− 12

+iT1,− 12−iT1]

(−ζ′(s)

ζ(s)

)xs

sds = O

(T1 log T1√

x

)= O

(x log2 x

T

). (3.46)

Assim, usando (3.45) e (3.46) em (3.41), e depois em (3.40), segue o resultado enunciado do

Teorema 3.31 .

Teorema 3.32 . Existe c > 0 tal que, para qualquer zero ρ = β + iγ, temos

β < 1− c

log(|γ|+ 2).

Demonstracao: De (3.27), temos que, para s = σ + it ∈ H(1,+∞),

−R(ζ ′(s)

ζ(s)

)=∑n≥1

Λ(n)n−σ cos(t log n)

⇒ −3Rζ ′(σ)

ζ(σ)− 4R

ζ ′(σ + it)

ζ(σ + it)−R

ζ ′(σ + 2it)

ζ(σ + 2it)=∑n≥1

Λ(n)n−σ(3 + 4 cos(t log n) + cos(2t log n)).

Mas, como vimos na demonstracao do Teorema 3.19 , para qualquer θ ∈ R, temos que

3 + 4 cos θ + cos 2θ ≥ 0. Entao, na igualdade anterior, temos

− 3Rζ ′(σ)

ζ(σ)− 4R

ζ ′(σ + it)

ζ(σ + it)−R

ζ ′(σ + 2it)

ζ(σ + 2it)≥ 0. (3.47)

Logo, se 1 < σ ≤ 2, por (3.26), sabemos que ζ′(s)ζ(s) tem um polo simples em s = 1. Portanto,

− ζ ′(σ)

ζ(σ)≤ 1

σ − 1+A1. (3.48)

Ademais, por (3.28), temos que ∣∣∣Γ′ ( s2 + 1)

Γ(s2 + 1

) ∣∣∣ log |t|.

Entao, de (3.26), para |t| suficientemente grande, existe A2 > 0 tal que

−Rζ ′(σ + it)

ζ(σ + it)≤ A2 log |t| −

∑ρ

R

(1

s− ρ+

1

ρ

). (3.49)

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3.2 Os Zeros nao-triviais de ζ(s) e a Teoria Analıtica dos Numeros. 51

Como R(

1s−ρ

)= σ−β

(σ−β)2+(t−γ)2> 0 e R

(1ρ

)= β

β2+γ2> 0, onde ρ = β + iγ, entao, da

desigualdade anterior, para |t| suficientemente grande, temos que

−Rζ ′(σ + 2it)

ζ(σ + 2it)≤ A2 log |t|. (3.50)

Assim, de (3.48), (3.49), (3.50) e usando o fato de que para qualquer ρ, σ−β(σ−β)2+(t−γ)2

≤∑ρR

(1s−ρ + 1

ρ

), considerando (3.47), temos, para qualquer ρ,

0 ≤ 3

σ − 1+ 3A1 +A4 log |t| − 4(σ − β)

(σ − β)2 + (t− γ)2,

para |t| suficientemente grande (A4 = 5A2). Logo, da desigualdade acima, temos que existe

M > 0 tal que4(σ − β)

(σ − β)2 + (t− γ)2≤ 3

σ − 1+A5 log |t|,

para |t| ≥ M e para alguma constante A5 > 0. Tambem, sem perda de generalidade, as-

sumimos que M ≥ e. Assim, tomando t = γ e σ = 1 + 12A5 log |γ| , na desigualdade acima,

temos4

σ − β≤ 3

σ − 1+A5 log |γ|,

simplificando

β ≤ 1− 1

14A5 log |γ|

⇒ β < 1− 1

14A5 log(|γ|+ 2).

Agora consideremos ρ tal que |γ| < M . Entao, como nao existem zeros na fronteira da

faixa critica, existe δρ > 0 tal que β < 1−δρ. Pondo δ0 = minρ∈(0,1)×(−M,M) δρ, para qualquer

ρ = β + iγ com |γ| < M , temos

β < 1− δ0.

Assim, basta tomar c′ > 0 tal que c′

δ0< log(|γ|+ 2) para qualquer ρ ∈ (0, 1)× (−M,M), logo

considere c := min 114A5

, c′.

Agora, com todos os resultados apresentados acima, estamos prontos para enunciar e

provar o Teorema dos Numeros Primos.

Teorema 3.33 (Teorema dos Numeros Primos). Para x ≥ 2,

Ψ(x) = x+O(x exp(−δ√

log x)),

para alguma constante δ > 0.

Demonstracao: Pelo Teorema 3.31 , sabemos que, para 2 ≤ T ≤ x,

Ψ(x) = x−∑

I(ρ)≤T

ρ+O

(x log2 x

T

). (3.51)

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52 Capıtulo 3 — A Hipotese de Riemann

Pelo Teorema 3.32 , para |ρ| ≤ T , temos que

R(ρ) ≤ 1− c

log(|I(ρ)|+ 2)≤ 1− c/2

log T.

Entao, ∣∣∣xρρ

∣∣∣ =xR(ρ)

|ρ|≤x exp

(− c log x

2 log T

)|ρ|

,

e, como o numero de zeros ρ tais que |ρ| < T e O(T 2) (isso e uma consequencia da prova de

(2.38), porque aqui nos provamos que n(2R) ε R1+ε, para qualquer ε > 0, assim tomando

ε = 1 o resultado e obtido), concluimos que

∑I(ρ)≤T

ρ= O

(xT 2 exp

(− c log x

2 log T

)).

Agora, tomando T = exp

(√c/2 log x

2

), temos

∑I(ρ)≤T

ρ= O

(x exp

(−√c

2

√log x

)), (3.52)

e, tambem, que

x log2 x

exp

(√c/2 log x

2

) x exp

(−√

c2

4

√log x

). (3.53)

Assim, tomando δ =

√c2

4 e substituindo (3.52) e (3.53) em (3.51), concluimos a demonstracao

do Teorema dos Numeros Primos.

Observamos que esta nao e a versao mais conhecida do Teorema dos Numeros Primos.

Mas, vamos provar que o Teorema 3.33 implica nesta versao. Para isso, lembremos que

Ψ(x) =∑n≤x

Λ(n).

De forma equivalente, o lado direito dessa equacao pode ser reescrito como

Ψ(x) =∑

p∈P:p≤xap(x) log p,

onde ap(x) e o maior inteiro tal que pap(x) ≤ x. Agora, observemos que pap(x) ≤ x e equivalente

a ter ap(x) ≤ log xlog p . Mas, como ap(x) e o maior inteiro com esta propriedade, entao ap(x) =[

log xlog p

]. Portanto, podemos escrever

Ψ(x) =∑

p∈P:p≤x

[log x

log p

]log p. (3.54)

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3.2 Os Zeros nao-triviais de ζ(s) e a Teoria Analıtica dos Numeros. 53

Agora, definindo a funcao π(x), que conta o numero de primos menores que x dado, como

π(x) :=∑

p∈P:p≤x1.

Essa e a funcao envolvida na versao original do teorema dos numeros primos, que e de

grande importancia na teoria analıtica dos numeros. Com isso, estamos prontos para provar

o seguinte teorema.

Teorema 3.34 . Ψ(x) ∼ x se e somente se π(x) ∼ xlog x .

Demonstracao: De (3.54)

Ψ(x) =∑

p∈P:p≤x

[log x

log p

]log p ≤

∑p∈P:p≤x

log x

log plog p = log x

∑p∈P:p≤x

1 = log(x)π(x)

⇒ Ψ(x)

x≤ π(x)

xlog x

. (3.55)

Tambem, se 1 < y < x,

π(x) = π(y) +∑

p∈P:y<p≤x1 < y +

∑p∈P:y<p≤x

log p

log y≤ y +

1

log yΨ(x)

⇒ π(x) ≤ y +1

log yΨ(x).

Agora, seja x suficientemente grande tal que 1 < xlog2 x

e 1 < log(x). Entao, tomando

y = xlog2 x

, temos na desigualdade acima

π(x) ≤ x

log2 x+

1

log(

xlog2 x

)Ψ(x)

⇒ π(x)x

log x

≤ 1

log x+

log x

log x− 2 log(log x)

(Ψ(x)

x

). (3.56)

O resultado segue das desigualdades (3.55) e (3.56).

Portanto, da nossa versao do teorema dos numeros primos e o teorema ultimo, o seguinte

corolario e direto.

Corolario 3.35 (Versao Original do Teorema dos Numeros Primos).

limx→+∞

π(x)x

log x

= 1.

Agora vejamos quais consequencias a Hipotese de Riemann traz ao resultado do Teo-

rema dos Numeros Primos. Vamos ver, sem entrar em muitos detalhes, que se assumimos

a Hipotese de Riemann como verdadeira entao temos um comportamento assintotico apri-

morado (correcao) daquele dado no Corolario 3.35 .

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54 Capıtulo 3 — A Hipotese de Riemann

Da demonstracao do Teorema 3.25 , temos que existe C > 0 tal que, para |s| suficiente-

mente grande, vale

|ξ(s)| ≤ exp(C|s| log |s|).

Logo, desta ultima desigualdade e pelo Corolario 2.16 , temos que

log(2)n

(R

2

)≤∫ R

R/2

n(r)

rdr ≤

∫ R

0

n(r)

rdr+log |ξ(0)| = 1

∫ 2π

0log |ξ(Reiθ)|dθ < 2CR logR,

(3.57)

para R suficientemente grande. Por outro lado, se a hipotese de Riemann e verdadeira,

entao os zeros nao-triviais sao da forma ρ = 12 + iγ, logo de (3.57), temos que o numero de

zeros nao-triviais, tais que |γ| ≤ T e O(T log T ). Mas, do Teorema 3.31 , sabemos que para

2 ≤ T ≤ x

Ψ(x) = x−∑|γ|≤T

ρ+O

(x log2 x

T

). (3.58)

Tomando T = x1/2, temos ∣∣∣ ∑|γ|≤T

ρ

∣∣∣ ≤ x1/2∑|γ|≤T

1

γ. (3.59)

Agora, se denotamos por N(T ) o numero de zeros na faixa crıtica, tais que |γ| ≤ T , entao

∑0<|γ|≤T

1

γ=

∫ T

0

1

tdN(t) =

N(T )

T+

∫ T

0

N(t)

t2dt,

e desde que N(T ) = O(T log T )

⇒∣∣∣ ∑

0<|γ|≤T

1

γ

∣∣∣ = O(log2 T ).

Logo, a partir desta ultima igualdade em (3.59) e, depois em (3.58), temos

Ψ(x) = x+O(x1/2 log2 x). (3.60)

Alem disso, considerando a funcao integral logarıtmica Euleriana Li(x) :=∫ x

2dt

log t , vale

Li(x) ∼ x

log x, (3.61)

o que e demonstrado usando a Regra de l’Hopital. Finalmente usando (3.60) e (3.61), e obtida

a seguinte estimativa

π(x) = Li(x) +O(x1/2 log x).

Assim, vemos que, se a hipotese de Riemann e verdadeira, entao isso nos da uma melhor

estimativa para a distribuicao de numeros primos menores que uma quantidade dada.

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3.3 A Conjetura de Hilbert-Polya e a Hipotese de Riemann 55

3.3 A Conjetura de Hilbert-Polya e a Hipotese de Riemann

Nesta secao vamos discutir, sem entrar em detalhes, a conhecida conjectura de Hilbert-

Polya, que relaciona a zeros nao-triviais de ζ(s) com os autovalores de um operador Hermi-

tiano ilimitado.

Conjetura 3.36 (Conjetura de Hilbert-Polya). Existe um operador hermitiano tal que seus

autovalores sao as partes imaginarias dos zeros nao-triviais de ζ(s).

Claramente, esta hipotese esta intimamente relacionada com a hipotese de Riemann. Com

efeito, seja s = 12 +iλ. Logo, se temos que (H, < ·, · >) denota um espaco de Hilbert separavel

e H um operador hermitiano definido em H com autovalor λ, entao, se f e um autovetor de

H associado a λ, temos que

Hf = λf.

Como H e hermitiano, entao λ ∈ R. Como mencionado anteriormente foram calculados 1.5

bilhoes de zeros nao-triviais de ζ(s). Quando se fez um estudo probabilıstico destes zeros

foram encontrados semelhancas entre a distribuicao desses zeros e os valores proprios de

alguns operadores quanticos. Estas semelhancas apoiam a ideia de Hilbert e Polya e motiva a

busca de um operador hermitiano que esteja ligado a ζ(s) e a mecanica quantica. A primeira

ideia natural e que este operador hermitiano seja definido em um espaco unidimensional.

Mas, infelizmente, as tentativas para encontrar este operador cujos autovalores, de alguma

forma, explicam ou tenham alguma relacao com os zeros nao-triviais de ζ(s) nao tiveram

sucesso. Portanto, se houver, este operador pode ser definido em um espaco de dimensao

infinita. Para o leitor interessado, recomendamos as referencias [4] e [23].

3.4 Outras Formulacoes Equivalentes para a Hipotese de Riemann

Nesta secao, apresentamos algumas formulacoes equivalentes da Hipotese de Riemann. A

primeira ira considerar uma representacao de ξ(s) como um produto infinito. Alternativo a

representacao como produto infinito, de uma funcao inteira de ordem um. A segunda e de

grande importancia na teoria das cordas (ver [12]).

Como vimos anteriormente, ξ(s) e uma funcao inteira. Entao, assumimos que ela pode

ser representada como segue

ξ(s) = ξ(0)∏ρ

(1− s

ρ

), (3.62)

este resultado e demostravel e uma prova completa do mesmo e apresentada em [10]. Agora,

definamos φ do seguinte modo

φ(s) := ξ

(s

s− 1

).

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56 Capıtulo 3 — A Hipotese de Riemann

Entao, por (3.15), temos que

φ(s) = ξ

(1− s

s− 1

)= ξ

(1

1− s

)⇒ φ(s) = ξ

(s

s− 1

)= ξ

(1

1− s

). (3.63)

Assim, temos o seguinte teorema.

Teorema 3.37 . A Hipotese de Riemann e verdadeira se e somente se φ′(s)φ(s) ∈ H(B(0; 1)).

Demonstracao: Notemos que a aplicacao s 7→ ss−1 mapeia L em ∂B(0; 1) e o conjunto

s ∈ C : 0 < R(s) < 12 em B(0; 1). Tambem, pelo Teorema 3.23 , os zeros de ζ(s) sao

simetricos com relacao a reta crıtica. Entao, se a Hipotese de Riemann e verdadeira, os zeros

de φ(s) estao em ∂B(0; 1). Alem disso, pelo princıpio do argumento, como o numero de zeros

de φ(s) em qualquer regiao triangular T ⊂ B(0; 1) e dado por∮∂T

φ′(z)φ(z) dz, temos∮

∂T

φ′(z)

φ(z)dz = 0, (3.64)

entao, pelo Teorema de Morera [8], φ′(s)φ(s) ∈ H(B(0; 1)). Reciprocamente, se φ′(s)

φ(s) ∈ H(B(0; 1)),

entao vale a equacao (3.64). Logo, φ(s) nao tem zeros em B(0; 1). Assim, os zeros de φ(s)

estao em ∂B(0; 1) e isso implica que os zeros nao-triviais de ζ(s) estao na reta crıtica.

Agora, se a Hipotese de Riemann e verdadeira do teorema acima sabemos que φ′(s)φ(s) admite

uma representacao em serie de Taylor. Entao, podemos ver o que acontece com os coeficientes

presentes nessa serie ou que propriedades podem ser satisfeitas por eles. A serie de Taylor

com centro em s = 0 e raio conveniente para a funcao φ′(s)φ(s) e

φ′(s)

φ(s)=∑n≥0

kn+1sn,

onde os coeficientes kn com n ≥ 1 podem ser calculados por derivacao logaritmica de φ(s).

Usando (3.62), temos que

φ(s) = φ(0)∏ρ

(1− s

(s− 1)ρ

)= φ(0)

∏ρ

1− (1− 1/ρ)s

1− s,

e derivando logaritmicamente temos que k1 =∑

ρ1ρ . Mas, sabemos pelo Corolario 3.27 que∑

ρ

∣∣∣1ρ ∣∣∣ diverge, assim temos o seguinte corolario.

Corolario 3.38 . Se a Hipotese de Riemann e verdadeira, entao a serie∑

ρ1ρ converge

condicionalmente.

Vamos continuar apresentando outra forma equivalente da Hipotese de Riemann. Esta

equivalencia se deve a Jeffrey C. Lagarias [17]. Para essa equivalencia, vamos precisar da

constante de Euler-Mascheroni que e definida como

γE := limn→+∞

(Hn − log n),

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3.4 Outras Formulacoes Equivalentes para a Hipotese de Riemann 57

onde Hn :=∑n

j=11j . Seu valor numerico aproximado e 0, 577215664901532860606 . . .. Esta

constante tem a peculiaridade de ser um numero real que ainda nao sabemos se e racional ou

irracional.

Vamos precisar tambem dos resultados apresentados nos teoremas abaixo, onde-como

usual-a notacao d|n significa que d divide n.

Teorema 3.39 . Se a Hipotese de Riemann e verdadeira, entao para qualquer n ≥ 5041∑d|n

d ≤ eγEn log log n.

Teorema 3.40 . Se a Hipotese de Riemann e falsa, entao existem constantes 0 < β < 1/2 e

C > 0 tais que ∑d|n

d ≥ eγEn log log n+Cn log logn

(log n)β,

para infinitos valores de n.

As provas destes dois teoremas sao bastante tecnicas e exigiriam um grande desvio que

evitaremos aqui. O primeiro teorema e o Teorema 1 da Ref. [21]. O segundo e uma conse-

quencia da Proposicao 1 da Secao 4 de [21]. Para mais detalhes remetemos [21] e [17].

Vemos que, nos dois teoremas anteriores os termos do lado direito nao diferem muito,

isso e o fato que a Hipotese de Riemann esta sendo envolvido em cada um dos casos ja

nos adverte da possibilidade de haver algum resultado muito importante na origen desses

resultados. Agora, para continuar buscando mais um equivalente da Hipotese de Riemann,

vamos precisar dos dois lemas seguintes.

Lema 3.41 . Para n ≥ 3,

exp(Hn) log(Hn) ≥ eγEn log logn.

Demonstracao: Primeiro, vamos provar que∫ n

1

1

t2

∑r∈Z:1≤r≤t

1

dt =∑

r∈Z:1≤r≤n

∫ n

r

1

t2dt, (3.65)

para n ∈ N. De fato, para n = 1, o resultado e evidente, admitamos que∫ n

11t2

(∑r∈Z:1≤r≤t 1

)dt =∑

r∈Z:1≤r≤n∫ nr

1t2dt (hipotese indutiva). Entao, para n+ 1, temos

∑r∈Z:1≤r≤n+1

∫ n+1

r

1

t2dt =

∑r∈Z:1≤r≤n

∫ n+1

r

1

t2dt =

∑r∈Z:1≤r≤n

(∫ n

r

1

t2dt+

∫ n+1

n

1

t2dt

)

=∑

r∈Z:1≤r≤n

∫ n

r

1

t2dt+

∑r∈Z:1≤r≤n

∫ n+1

n

1

t2dt

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58 Capıtulo 3 — A Hipotese de Riemann

=∑

r∈Z:1≤r≤n

∫ n

r

1

t2dt+

∫ n+1

n

1

t2

∑r∈Z:1≤r≤t

1

dt

=

∫ n

1

1

t2

∑r∈Z:1≤r≤t

1

dt+

∫ n+1

n

1

t2

∑r∈Z:1≤r≤t

1

dt =

∫ n+1

1

1

t2

∑r∈Z:1≤r≤t

1

dt,

onde o penultimo passo segue da hipotese indutiva.

Agora, vamos provar o resultado principal. Consideremos a seguinte integral

∫ n

1

[t]

t2dt =

∫ n

1

1

t2

∑r∈Z:1≤r≤t

1

dt.

Usando aqui a Eq. (3.65), temos∫ n

1

[t]

t2dt =

∑r∈Z:1≤r≤n

∫ n

r

1

t2dt =

n∑r=1

(1

r− 1

n

)= Hn − 1

⇒ Hn = log n+ 1−∫ n

1

t− [t]

t2dt. (3.66)

Desta ultima igualdade, temos que limn→+∞(Hn− log n) = 1−∫ +∞

1t−[t]t2dt. Entao, voltando

para a mesma igualdade, temos

Hn = log n+ 1−∫ +∞

1

t− [t]

t2dt+

∫ +∞

n

t− [t]

t2dt

= log n+ γE +

∫ +∞

n

t− [t]

t2dt.

Alem disso, e claro que∫ +∞n

t−[t]t2dt ≥ 0 para qualquer n ∈ N. Entao, da igualdade acima

Hn ≥ log n+ γE

⇒ exp(Hn) ≥ eγEn. (3.67)

Tambem, como Hn ≥ log n para n ≥ 3, entao log(Hn) ≥ log log n para n ≥ 3. Assim,

desta ultima desigualdade e de (3.67), multiplicando membro a membro, temos o resultado

procurado.

Lema 3.42 . Para n ≥ 3,

Hn + exp(Hn) log(Hn) ≤ eγEn log logn+4n

log n.

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3.4 Outras Formulacoes Equivalentes para a Hipotese de Riemann 59

Demonstracao: Para n ∈ N, seja Rn := Hn − log(n + 1) e claro que Rn pode se escrever

da seguinte forma

Rn =

∫ n+1

1

(1

[t]− 1

t

)dt,

de onde vemos que Rnn∈N e uma sequencia crescente de termos nao negativos. Tambem,

limn→+∞

(Hn − log(n+ 1)) = limn→+∞

(Hn+1 − log(n+ 1)− 1

n+ 1

)= γE − lim

n→+∞

1

n+ 1= γE .

Entao, temos

Hn − log(n+ 1) ≤ γE

⇒ exp(Hn) ≤ eγE (n+ 1). (3.68)

Mas, de (3.66), temos para n ≥ 3

Hn ≤ log n+ 1

⇒ log(Hn) ≤ log(log n+ 1) = log

((1 +

1

log n

)log n

). (3.69)

Usando o fato que log(1 + x) ≤ x, para x ≥ 0, temos que log(

1 + 1logn

)≤ 1

logn . Entao,

log(

1 + 1logn

)+log log n ≤ 1

logn +log log n, o que implica log((

1 + 1logn

)log n

)≤ log log n+

1logn . Assim, de (3.69) obtemos

log(Hn) ≤ log log n+1

log n, (3.70)

para n ≥ 3. Logo de (3.68) e de (3.70), multiplicando membro a membro,

exp(Hn) log(Hn) ≤ eγEn log log n+eγEn

log n+ eγE

(log log n+

1

log n

),

para n ≥ 3. Tambem, da desigualdade 2x log x + 2 ≤ ex, para x ≥ 1, tomando x = log n

tem-se que, para n ≥ 3,

log log n+1

log n≤ n

2 log n.

Desta ultima desigualdade e da desigualdade precedente, segue que

exp(Hn) log(Hn) ≤ eγEn log logn+3eγEn

2 log n, (3.71)

para n ≥ 3. Agora, considerando a desigualdade x2 + x ≤ ex, para x ≥ log 3, e escrevendo

x = log n con n ≥ 3, temos

log n+ 1 ≤ n

log n,

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60 Capıtulo 3 — A Hipotese de Riemann

para n ≥ 3; assim, de (3.66), Hn ≤ log n+ 1, para n ≥ 3, e da desigualdade acima

Hn ≤n

log n,

para n ≥ 3. Finalmente, desta desigualdade e de (3.71), somando membro a membro, obtemos

Hn + exp(Hn) log(Hn) ≤ eγEn log log n+(3eγE/2 + 1)n

2 log n, n ≥ 3.

Observando que 1 + 3eγE/2 < 4 (isto e devido a que γE ≈ 0, 577215664901532860606 . . .),

temos, no lado direito da desigualdade acima, e concluimos a prova.

Com todos os resultados acima, estamos prontos para demonstrar a seguinte equilavencia

da Hipotese de Riemann, descrita no seguinte teorema.

Teorema 3.43 . A Hipotese de Riemann e verdadeira se e somente se, para qualquer n ∈ N,∑d|n

d ≤ Hn + exp(Hn) log(Hn),

onde a igualdade so e valida para n = 1.

Demonstracao: Admitamos que a Hipotese de Riemann e verdadeira. Entao, pelo Teorema

3.39 e pelo Lema 3.41 , temos que, para n ≥ 5041,∑d|n

d ≤ eγEn log log n ≤ exp(Hn) log(Hn) < Hn + exp(Hn) log(Hn).

Agora, para 1 ≤ n < 5041, pode-se verificar a mesma desigualdade calculando os valores para

cada termo e comparando.

Reciprocamente, se∑

d|n d ≤ Hn + exp(Hn) log(Hn), para n ∈ N, entao a Hipotese de

Riemann e verdadeira, porque, do contrario pelo Teorema 3.40 e da hipotese, temos que

existem β ∈ (0, 1/2) e C > 0 tais que

eγEn log log n+Cn log logn

(log n)β≤∑d|n

d ≤ Hn + exp(Hn) log(Hn)

⇒ eγEn log log n+Cn log logn

(log n)β≤ Hn + exp(Hn) log(Hn),

para infinitos valores de n. Mas, pelo Lema 3.42 , e da desigualdade acima, temos que

Hn + exp(Hn) log(Hn)− 4n

log n+Cn log logn

(log n)β≤ Hn + exp(Hn) log(Hn),

para infinitos n; o que implica que

log n log log n

(log n)β≤ 4

C,

para infinitos n, e esta ultima desigualdade e um absurdo.

Concluindo, adicionando aos resultados apresentados na Tabela da pagina 42 os outros

resultados aqui obtidos para os zeros nao-triviais ρ de ζ(s).

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3.4 Outras Formulacoes Equivalentes para a Hipotese de Riemann 61

(i) Existe um numero infinito enumeravel de zeros nao-triviais.

(ii) Os zeros nao-triviais fornecem uma prova do limite limx→+∞π(x)x

log x= 1.

(iii) Se a Hipotetese de Riemann e verdadeira,∑

ρ1ρ converge condicionalmente.

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Capıtulo

4Zeta de Riemann e a Fısica

Neste capıtulo vamos apresentar algumas relacoes entre ζ(s) e seus zeros nao-triviais com

a Fısica. Exploraremos essa relacao apenas em nıvel introdutorio. Observamos, contudo,

que essa relacao e bastante vasta. Referencias sao dadas para os temas tratados aqui. Num

aspecto mais geral, sugerimos consultar o site:

http://empslocal.ex.ac.uk/people/staff/mrwatkin//zeta/physics.htm

Na primeira secao, apresentamos a regularizacao zeta, onde aplicaremos os resultados

referentes a essa questao para obter os determinantes de uma famılia de operadores lineares,

onde um desses operadores e de grande importancia na mecanica quantica (o Hamiltoniano

do oscilador harmonico unidimensional). Logo na segunda secao, apresentamos o bilhar

circular (classico) aberto. Neste modelo, vamos ver a relacao que temos com algumas funcoes

aritmeticas conhecidas (a funcao totiente de Euler e a funcao de Mobius) e tambem o que

e de extrema importancia para nos, sua relacao com ζ(s) e os zeros desta. Finalmente, na

terceira secao, apresentamos dois modelos da mecanica estatıstica criados por Bernard Julia.

O primeiro deles, tem a funcao ζ(s) como funcao de particao e naturalmente se relaciona com

os numeros primos (Primon Gas). Em seguida, apresentamos, sem entrar em muitos detalhes,

outro modelo, que e devido a Andreas Knauf. Concluımos revelando uma semelhanca entre

as funcoes de particao dos tres modelos discutidos.

Como o nosso foco e a funcao zeta, omitiremos a demonstracao de alguns resultados

importantes na sequencia, nos limitamos a citar referencias onde podem ser encontrados.

63

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64 Capıtulo 4 — Zeta de Riemann e a Fısica

4.1 Regularizacao Zeta

Para comecar, vamos motivar esta secao introduzindo dois exemplos da ideia de regular-

izacao zeta, nos casos em que podemos usar o que foi feito nas secoes anteriores.

Em alguns modelos fısicos temos a necessidade de calcular a soma dos numeros natu-

rais, o que obviamente e uma soma divergente. Mas devido a varios fatos fısicos envolvidos

presume-se que esta soma deva ser regularizada de alguma forma para ser finita. Entao, por

conveniencia, nos podemos escrever esta soma do seguinte modo

1 + 2 + 3 + · · · =(

1

1

)−1

+

(1

2

)−1

+

(1

3

)−1

+ · · ·

e esta quantidade parece tomar a forma de ζ(−1). Mas s = −1 nao esta em H(1,+∞) onde

ζ(s) e definida (em princıpio) como a soma que ja conhecemos. Assim, a fim de atribuir um

valor finito para esta soma, podemos considerar a extensao meromorfa de ζ(s) (regularizacao

zeta). Por isso, vamos dar essa soma o valor de ζ(−1).

Agora, dado n ∈ N, sabemos que n! := n(n − 1)(n − 2) · · · 1 que, obviamente, esta bem

definido, mas se considerarmos∏+∞n=1 n este valor nao e definido, pois este produto diverge.

Vamos ver como este produto pode ser regularizado. Sabemos que, para s ∈ H(1,+∞),

ζ(s) =∑n≥1

1

ns;

e, como ζ(s) ∈ H(H(1,+∞)), entao

−ζ ′(s) =∑n≥1

log n

ns,

para s ∈ H(1,+∞). Logo, como ζ ′(s) e definido em C\1 podemos escrever de forma errada

−ζ ′(0) =∑

n≥1 log n. Portanto,

e−ζ′(0) = e

∑n≥1 logn =

∏n≥1

elogn =∏n≥1

n.

Entao, agora podemos pensar que o produto infinito dos numeros naturais (que em realidade

e nao finito) e finito, atribuindo o valor de e−ζ′(0) que e finito, pois ζ(s) admite uma con-

tinuacao meromorfa com polo simples em s = 1.

Este ultimo exemplo de regularizacao zeta e a chave do metodo de regularizacao do

determinante de um operador em dimensao infinita. Admitamos ter um operador linear

T : X → X , onde dimX = +∞. Assumamos que T tem un espectro discreto λj , njj≥0

onde a multiplicidade nj do autovalor λj e finita para qualquer j ≥ 0. Assim, de alguma

forma, devemos ter

detT =∏j≥0

λnjj . (4.1)

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4.1 Regularizacao Zeta 65

Mas, novamente, temos um problema pois o produto infinito geralmente diverge. Para regu-

larizar o produto anterior, consideremos a seguinte funcao

ζT (s) :=∑j≥1

njλsj, R(s) 0, (4.2)

esta funcao e comumente chamada, em Fısica, como a funcao zeta espectral de T . Agora, como

estamos interessados no caso em que λj > 0, para qualquer j ≥ 0, prosseguimos formalmente,

como foi feito anteriormente (incorretamente) e, temos

−ζ ′T (s) =∑j≥0

nj log λjλsj

.

Portanto,

−ζ ′T (0) =∑j≥0

nj log λj

⇒ e−ζ′T (0) =

∏j≥0

enj log λj =∏j≥0

λnjj .

Comparando esta ultima expressao com (4.1) surge, naturalmente, uma maneira de definir o

determinante de T como

detT := e−ζ′T (0), (4.3)

sempre que ζT (s) admita uma continuacao meromorfa, pelo menos no semi-plano H(−ε,+∞),

para algum ε > 0.

Agora, vamos ver como todos estes resultados podem ser aplicados aos operadores do tipo

Schrodinger da forma

TM := − d2

dx2+ x2M , M = 1, 2, . . .

e definidos em L2(R). No que segue, precisamos dos seguintes teoremas.

Teorema 4.44 . TM verifica as seguintes condicoes:

(i) e positivo,

(ii) tem resolvente compacta,

(iii) tem espectro discreto λj , njj≥0 (que depende de M), tal que verifica o seguinte

0 < λ0 < λ1 < . . . ; limk→+∞

λk = +∞,

e nj = 1, para qualquer j ≥ 0.

Demonstracao: Seja λ um autovalor de TM . Entao, existe u nao nulo, definido em algum

intervalo aberto de R, tal que

TMu = λu,

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66 Capıtulo 4 — Zeta de Riemann e a Fısica

mas isto e equivalente a

u′′ + (λ− x2M )u = 0.

Portanto, como esta ultima equacao e uma equacao de Sturm-Liouville, precisamos de recorrer

aos resultados da Teoria de Sturm-Liouville. O item primeiro e segundo, sao resultados

obtidos em [25]. Em relacao ao terceiro item, o fato que os autovalores estao em ordem

estritamente crescente, e um resultado que pode ser encontrado em qualquer livro de Teoria

Qualitativa de Equacoes Diferenciais Ordinarias contendo resultados da Teoria de Sturm-

Liouville, por exemplo [24]. Os outros resultados deste mesmo item, tambem sao resultados

de [25].

Como os λj dependem de M , no que se segue, serao denotados como λj = λj(M). Para

M fixo, consideremos para qualquer n = 0, 1, . . ., a seguinte equacao de autovalores

d2y

dx2+ (λn(M)− x2M )y = 0, (4.4)

e admitamos que limx→±∞ y(x) = 0. A equacao x2M = λn(M) claramente tem duas raızes

−λn(M)1

2M < 0 < λn(M)1

2M , que satisfazem o seguinte resultado.

Proposicao 4.45 .∫ λn(M)1

2M

−λn(M)1

2M

(λn(M)− x2M )1/2dx =

(n+

1

2

)π +O

(1

n

)para qualquer n = 0, 1, 2, . . .

Demonstracao: Este e um caso particular de um teorema mais geral que pode ser encon-

trado em [19].

Teorema 4.46 . λn(M) tem o seguinte comportamento assintotico

λn(M) ∼

(M√π(2n+ 1)Γ

(1

2M + 32

)Γ(

12M

) ) 2MM+1

quando n→∞.

Demonstracao: Da Proposicao 4.45 , temos que∫ λn(M)1

2M

−λn(M)1

2M

(λn(M)− x2M )1/2dx =

(n+

1

2

)π +O

(1

n

), (4.5)

entao a integral do lado esquerdo e

∫ λn(M)1

2M

−λn(M)1

2M

(λn(M)− x2M )1/2dx = 2

∫ (√λn(M)

)1/M0

√(√λn(M))2 − x2Mdx

= 2√λn(M)

∫ (√λn(M)

)1/M0

√√√√1−

(x√

λn(M)1/M

)2M

dx.

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4.1 Regularizacao Zeta 67

Fazendo a mudanca de variavel x√λn(M)

1/M = y, temos nesta ultima integral

∫ λn(M)1

2M

−λn(M)1

2M

(λn(M)− x2M )1/2dx = 2(√

λn(M))M+1

M

∫ 1

0

√1− y2Mdy.

Novamente, fazendo a mudanca y2M = t, temos

∫ λn(M)1

2M

−λn(M)1

2M

(λn(M)− x2M )1/2dx =

(√λn(M)

)M+1M

M

∫ 1

0

(√1− x

)x

12M−1dx

⇒∫ λn(M)

12M

−λn(M)1

2M

(λn(M)− x2M )1/2dx =

(√λn(M)

)M+1M

M

∫ 1

0(1− x)

32−1 x

12M−1dx.

Mas, aplicando (2.6) e (2.7) na ultima integral no lado direito obtemos

∫ λn(M)1

2M

−λn(M)1

2M

(λn(M)− x2M )1/2dx =

(√λn(M)

)M+1M

Γ(

12M

)Γ(

32

)MΓ

(1

2M + 32

) ,

e, usando Γ(

32

)= Γ

(1 + 1

2

)= 1

2Γ(

12

)=√π

2 ,

∫ λn(M)1

2M

−λn(M)1

2M

(λn(M)− x2M )1/2dx =

(√λn(M)

)M+1M

Γ(

12M

)√π

2MΓ(

12M + 3

2

) .

Assim, por (4.5), temos o seguinte resultado(√λn(M)

)M+1M

Γ(

12M

)√π

2MΓ(

12M + 3

2

) =

(n+

1

2

)π +O

(1

n

).

Logo, existe K > 0 tal que, para n suficientemente grande, temos

∣∣∣λn(M)M+12M Γ

(1

2M

)√π

2MΓ(

12M + 3

2

) −(n+

1

2

)π∣∣∣ ≤ K

n

⇒∣∣∣ λn(M)

M+12M Γ

(1

2M

)M√π(2n+ 1)Γ

(1

2M + 32

) − 1∣∣∣ ≤ 2K

(2n+ 1)nπ,

e, isto completa a prova do Teorema 4.46 .

Se considerarmos a funcao zeta espectral de TM , entao por (4.2) e do Teorema 4.44, temos

que

ζTM (s) =∑j≥0

1

λsj. (4.6)

Para continuar, precisamos saber propriedades analıticas de ζTM (s). Portanto, vamos provar

o seguinte corolario.

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68 Capıtulo 4 — Zeta de Riemann e a Fısica

Corolario 4.47 . ζTM (s) converge absolutamente em H(M+12M ,+∞), e e tambem analıtica

neste conjunto.

Demonstracao: Do Teorema 4.46 ,

limn→+∞

λn(M)(M√π(2n+1)Γ( 1

2M+ 3

2)Γ( 1

2M )

) 2MM+1

= 1

⇒ limn→+∞

(2n+ 1)2MM+1

λn(M)=

(Γ(

12M

)M√πΓ(

12M + 3

2

)) 2MM+1

.

Escrevendo lM =

(Γ( 1

2M )M√πΓ( 1

2M+ 3

2)

) 2MM+1

, entao da definicao de limite temos que existe n0 ∈ N,

tal que se n ≥ n0, entao ∣∣∣(2n+ 1)2MM+1

λn(M)− lM

∣∣∣ < 1

⇒ (2n+ 1)2MM+1

λn(M)< 1 + lM ⇒

1

λn(M)<

1 + lM

(2n+ 1)2MM+1

⇒∣∣∣ 1

λsn(M)

∣∣∣ < (1 + lM )R(s)

(2n+ 1)2MM+1

R(s).

Mas, como∑

n≥01

(2n+1)2MM+1

R(s)converge para qualquer s ∈ H(M+1

2M ,+∞), entao pelo criterio

de comparacao para series, temos que∑

n≥0

∣∣∣ 1λsn(M)

∣∣∣ < ∞, para qualquer s ∈ H(M+12M ,+∞).

Agora, constatamos que ζTM (s) e uma funcao analıtica no semiplano H(M+12M ,+∞). De fato, e

suficiente provar que a serie∑

n≥01

λsn(M) converge uniformemente em subconjuntos compactos

de H(M+12M ,+∞). Para tal, seja A ⊂ H(M+1

2M ,+∞), compacto, se s = σ + it ∈ A, entao como

A e compacto, existe σ0 > 0 tal que M+12M < σ0 ≤ σ, para qualquer s = σ + it ∈ A. Logo,

como limn→+∞ λn(M) = +∞, temos que existe n0 ∈ N tal que λn(M) ≥ 1 para qualquer

n ≥ n0. Assim, para s ∈ A, temos |λsn(M)| = λσn(M)

⇒∣∣∣ 1

λsn(M)

∣∣∣ =1

λσn(M)≤ 1

λσ0n (M), (4.7)

para n ≥ n0. Mas, pela convergencia absoluta de ζTM (s) em H(M+12M ,+∞), ja provada, temos

que∑

n≥01

λσ0n (M)

< ∞, pois σ0 >M+12M . Entao, aplicando o teste de Weierstrass em (4.7),

temos que∑

n≥01

λsn(M) converge uniformemente en A. Portanto ζTM (s) e analıtica neste

conjunto e isto completa a prova.

Para continuar e tentar obter o resultado (4.3) para TM , e natural perguntar se ζTM (s)

admite uma continuacao meromorfa em C, de modo que seja analıtica em s = 0.

Atraves de exemplo, para exibir a continuacao meromorfa de ζTM (s), vamos considerar o

caso em que M = 1. Neste caso, e bem conhecido na Fısica (note que T1 e o Hamiltoniano

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4.2 O Bilhar Circular Aberto 69

de um oscilador harmonico quantico unidimensional) que os autovalores de T1 sao da forma

λk = 2k + 1, k = 0, 1, 2, . . .. Neste caso particular, temos que

ζT1(s) =∑n≥0

1

(2n+ 1)s, s ∈ H(1,+∞),

e, desenvolvendo a soma, temos

ζT1(s) = ζ(s)−(

1

2s+

1

4s+

1

6s+ · · ·

)= ζ(s)− 1

2s

(1 +

1

2s+

1

3s+

1

4s

)

= ζ(s)− 1

2sζ(s) =

(1− 1

2s

)ζ(s)

⇒ ζT1(s) =

(1− 1

2s

)ζ(s), s ∈ H(1,+∞). (4.8)

Sabemos que ζ(s) e uma funcao meromorfa en C com polo simples em s = 1. Entao, de (4.8),

temos que ζT1(s) admite uma extensao meromorfa em C com polo simples em s = 1.

Consideremos agora M arbitrario. Sabemos, pelo Corolario 4.47 , que ζTM (s) e analıtica

em H(M+12M ,+∞), mas nao conhecemos seus autovalores. Felizmente temos o apoio de um

teorema devido a Andre Voros cuja demonstracao se encontra em [28].

Teorema 4.48 . ζTM (s) e analıtica em s = 0. Alem disso,

ζ ′TM (0) = log sin

2(M + 1)

).

Portanto, temos o Corolario.

Corolario 4.49 .

detTM = csc

2(M + 1)

).

Demonstracao: Do Teorema 4.48 e de (4.3), a prova segue direitamente.

4.2 O Bilhar Circular Aberto

Nesta secao, apresentamos um exemplo de um bilhar dinamico, o bilhar circular, e sua

relacao com a Hipotese de Riemann.

Consideremos uma mesa de bilhar circular de raio unitario. Suponhamos que uma bola

comece a se mover com uma velocidade unitaria constante e admitamos que as colisoes sao

elasticas, isto implica na conservacao da energia cinetica e que o angulo de incidencia e reflexao

sao iguais em cada reflexao nas paredes da mesa. O momento angular com respeito a origem

tambem e preservado. Agora, os parametros que fixam a trajetoria da bola sao o angulo de

incidencia ψ e o angulo β mostrado na Fig. 4.1.

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70 Capıtulo 4 — Zeta de Riemann e a Fısica

Figura 4.1: Bilhar circular.

Notemos que o perıodo das orbitas determinadas pelas trajetorias da bola dependem de

ψ, por exemplo, se ψ = mπn entao o perıodo da orbita e n, tambem observamos que, pelas

condicoes do problema, o tempo entre cada colisao com a borda da mesa e T = 2 cosψ.

Novamente usando a geometria da figura acima, e claro, que a variacao dos parametros e

dada pela seguinte aplicacao

(ψ, β) 7→ (ψ, β + π − 2ψ).

Ate agora, nao ha nada de complicado sobre o acima exposto. Com o proposito de

introduzir mais um parametro para o problema, vamos considerar dois buracos no bordo da

mesa, com comprimento ε, que dependem de um angulo θ, como mostrado na Fig. 4.2.

Com essa nova condicao, o problema se torna mais complicado, porque pode acontecer

que a bola saia da mesa por algum desses buracos. Assim, com todas as condicoes impostas

ate agora, a primeira pergunta que propomos e, qual e a probabilidade P (t) de que o escape

da bola ocorra pelo menos apos de um tempo t? A primeira coisa a fazer para responder

a esta pergunta, e saber as condicoes iniciais (ψ0, β0) para que o tempo de escape seja pelo

menos t. Em [7], essas condicoes sao dadas como segue: podemos tomar ψ0 = ψm,n + η, onde

ψm,n = π/2 −mπ/n com m < n primos relativos (i.e. (m,n) = 1), 0 < η ε e β0 pode-se

tomar no seguinte conjunto

β′0 ∈(ε+

ηt

cosψm,n, θ′)⋃(

θ′ + ε+ηt

cosψm,n,2π

n

);

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4.2 O Bilhar Circular Aberto 71

Figura 4.2: Bilhar circular aberto.

onde ′ indica que os angulos sao tomados congruentes modulo 2π/n. Em seguida, sob essas

condicoes iniciais, temos que P (t) e estimada da seguinte forma

P (t) ∼ 1

t

[ 2πε ]∑n=1

n(g(

2πn − θ

′ − ε)

+ g(θ′ − ε))

n−1∑m=0

(m,n)=1

sin2 πm

n, (4.9)

onde g e definido como segue

g(x) :=

x2, x > 00, x ≤ 0.

Os detalhes de como avaliar P (t) podem ser encontrados em [7].

Ate agora, nao encontramos nenhuma relacao com a teoria dos numeros. Para ver como

ela ocorre, vamos definir duas funcoes aritmeticas de vital importancia na teoria dos numeros,

e relaciona-las com (4.9).

Definicao 4.50 (Funcao totiente de Euler).

ϕ(n) := Cardm ∈ N : m < n, (m,n) = 1. (4.10)

Definicao 4.51 (Funcao de Mobius). Dado n ∈ N com descomposicao primaria n =

pa11 . . . pakk , definimos µ(n) como segue

µ(n) :=

1, n = 1,

(−1)k, a1 = a2 = · · · = ak = 1,0, outros casos.

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72 Capıtulo 4 — Zeta de Riemann e a Fısica

Uma das propriedades de µ mais importantes e dada no seguinte teorema.

Teorema 4.52 (Formula de inversao de Mobius). Sejam f e g funcoes aritmeticas tais que

f(n) =∑

d|n g(d). Entao, vale que

g(n) =∑d|n

f(d)µ(nd

).

O inverso tambem e valido.

Demonstracao: Ver [3].

Agora para continuar com sucesso o nosso problema e apresentar uma propriedade da

funcao de Mobius fundamental nesta secao, vamos precisar do seguinte teorema:

Teorema 4.53 .n−1∑m=0

(m,n)=1

e2πimn = µ(n).

Demonstracao: E claro que a afirmacao do teorema e equivalente a provar que a soma das

raızes primitivas n-esimas da unidade e µ(n). As raızes primitivas da unidade foram discutidas

no Apendice A. Entao, se Sk (veja a Proposicao A.66) e a soma das raızes primitivas k-esimas

da unidade, pela proposicao A.66 , se F (m) :=∑

d|m Sd, temos

F (m) =

1, m = 1,0, m 6= 1.

Logo, pelo Teorema 4.52 ,

Sn =∑d|n

F (d)µ(nd

)= F (1)µ(n) = µ(n).

A partir deste teorema, o seguinte corolario e obvio.

Corolario 4.54 .n−1∑m=0

(m,n)=1

cos2πm

n= µ(n).

Agora, temos todas as ferramentas para encontrar uma relacao entre (4.9) e teoria dos

numeros. Em (4.9), usando a identidade do arco duplo, a definicao de ϕ dada na Eq. (4.10)

e o Corolario 4.54 , temos

P (t) ∼ 1

t

[ 2πε ]∑n=1

n(g(

2πn − θ

′ − ε)

+ g(θ′ − ε))

n−1∑m=0

(m,n)=1

(1− cos

2πm

n

)

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4.2 O Bilhar Circular Aberto 73

=1

t

[ 2πε ]∑n=1

n(g(

2πn − θ

′ − ε)

+ g(θ′ − ε))

n−1∑m=0

(m,n)=1

1−n−1∑m=0

(m,n)=1

cos2πm

n

=

1

t

[ 2πε ]∑n=1

n(g(

2πn − θ

′ − ε)

+ g(θ′ − ε))

8π(ϕ(n)− µ(n))

⇒ P (t) ∼ 1

t

[ 2πε ]∑n=1

n(g(

2πn − θ

′ − ε)

+ g(θ′ − ε))

8π(ϕ(n)− µ(n)). (4.11)

Assim, ja obtivemos uma relacao entre P (t) e duas funcoes de muita importancia na teoria

analıtica dos numeros. Mas ainda nao temos uma relacao do problema com a funcao ζ(s),

de vital importancia neste trabalho. Para esse fim, vamos considerar P∞ a probabilidade de

que as orbitas da bola nao escapem da mesa. Por (4.11), P∞ esta dada, por

P∞ = limt→+∞

tP (t) =1

∑n≥1

n(ϕ(n)− µ(n))

(g

(2π

n− θ′ − ε

)+ g(θ′ − ε)

).

Obviamente, P∞ e uma funcao de θ e ε. Portanto, no que segue, vamos escrever P∞ =

P∞(ε, θ). Agora, se precisamos saber o comportamento de P∞ como funcao de ε, consideramos

a transformada de Mellin de P∞, definida por (veja Ref. [11])

P (s) :=

∫ ∞0

P∞(ε, θ)εs−1dε,

de modo que P∞ e dado como

P∞(ε, θ) =1

∫ c+i∞

c−i∞ε−sP (s)ds,

(transformada inversa de Mellin), onde a constante c e determinada de modo que a integral

que define P exista. Assim, usando a transformada de Mellin e analisando os valores de

P (s) e onde entra em jogo a funcao ζ(s). Bunimovich e Dettman [7], calcularam valores de

P (s)(q/2π)s+1 para θ = 2π/q, com q = 1, 2, 3, 4, 6; e obtiveram a tabela a seguir

q P (s)(q/2π)s+1

1 ζ(s)−12s(s+1)(s+2)ζ(s+1)

2 ζ(s)s(s+1)(s+2)ζ(s+1)

3 3s(7ζ(s)+2s+2(ζ(s)−1)+2)−ζ(s)(2s+2+1)2s(s+1)(s+2)(3s+1−1)ζ(s+1)

4 2s(13ζ(s)+3s+2(ζ(s)−1)+3)−ζ(s)(3s+2+5)4s(s+1)(s+2)(2s+1−1)ζ(s+1)

6 (π/3)s+1(6s+8.12s−25.30s+(1−3.2s−13.3s−8.4s+25.5s+27.6s−25.10s+8.12s−25.15s+25.30s)ζ(s))2s(s+1)(s+2)(2s+1−1)(3s+1−1)ζ(s+1)

Assim, vemos que este problema esta relacionado com ζ(s). Alem disso, na tabela acima, o

termo ζ(s+1) aparece no denominador de cada resultado. Por isso, se considerarmos os zeros

nao-triviais de ζ(s+ 1), eles nos fornecem divergencias de P (s), que podem ser interpretadas

de alguma forma em P∞ e assim poderıamos tentar um novo caminho para provar a Hipotese

de Riemann.

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74 Capıtulo 4 — Zeta de Riemann e a Fısica

4.3 Mecanica Estatıstica

Nesta secao, apresentamos dois modelos, devidos a Bernard Julia [14] (Teoria Estatıstica

dos Numeros). No primeiro, foi considerado um modelo de gas bosonico (spin inteiro) e no

segundo um modelo de gas fermionico (spin semi-inteiro).

No que segue, vamos considerar os numeros primos ordenados de modo crescente, ou seja,

P = p1 = 2 < p2 = 3 < p3 = 5 < · · · .

Consideramos um gas bosonico, nao interagente em que cada partıcula que o compoe,

tem a sua disposicao estados, onde em cada energia En e proporcional ao logaritmo de um

numero primo, i.e. (E0 > 0)

E1 = E0 log p1, E2 = E0 log p2, . . . , Ej = E0 log pj , . . .

Podemos etiquetar um estado por um numero natural n, este estado o denotamos como

ψn. Agora, o teorema fundamental da aritmetica estabelece que n pode ser decomposto de

maneira unica como o produto de elementos de P, i.e.

n =∏pj∈P

pαjj . (4.12)

Fisicamente, isso nos diz que no estado ψn temos αj partıculas que tem energia Ej e que se

rn e o maior numero natural tal que αrn 6= 0 em (4.12), a energia total do estado ψn e

En := α1E0 log p1 + . . .+ αrnE0 log prn = E0 log

rn∏j=1

pαjj

= E0 log n. (4.13)

Logo, a grande funcao de particao deste sistema e

QB(T ) =∑n≥1

exp

(− EnkT

), (4.14)

onde T e a temperatura do sistema e k = 1.380 Joule/Kelvin, e a constante de Boltzmann.

Desenvolvendo (4.14), temos

QB(T ) =∑n≥1

exp

(−E0 log n

kT

)= ζ

(E0

kT

), (4.15)

assim, temos que a funcao zeta de Riemann e a funcao de particao deste gas. Alem disso,

este modelo tem potencial quımico nulo. Sabemos que, para T < E0k nao temos problemas

com respeito ao comportamento do gas, pois ζ(s) e analıtica nessa regiao. Fisicamente isso

significa que, para baixas temperaturas, o gas tem um bom comportamento. Mas tambem

sabemos que ζ(s) tem um polo simples em s = 1, ou seja em T = E0k , que e conhecida como

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4.3 Mecanica Estatıstica 75

a temperatura de Hagedorn, na qual a funcao de particao diverge.

Agora, a nossa atencao e focada em saber como interpretar os zeros de ζ(s) neste modelo.

Esses zeros podem ser interpretados como pontos de transicoes de fase. Isto e, usando algum

resultado fısico, temos uma relacao entre estas transicoes de fase e a Hipotese de Riemann.

Notemos que o que, a princıpio, era encontrar apoio, quanto a possibilidade de encontrar

um formalismo matematico para atacar a Hipotese de Riemann, tambem leva a possıveis

progressos na Fısica.

Na segunda parte dessa secao, ao contrario do modelo anterior, vamos considerar um gas

fermionico. Para continuar precisamos da seguinte definicao.

Definicao 4.55 . Un numero n ∈ N e dito livre de quadrados se nao existe p ∈ P tal que

p2|n.

Novamente, vamos considerar um gas em que cada partıcula que o compoe, tem a sua

disposicao estados, onde em cada estado a energia En esta definida como no modelo ante-

rior, mas como e um gas fermionico, temos que considerar o princıpio de exclusao de Pauli.

Entao, duas partıculas nao podem ocupar o mesmo estado. Portanto, os numeros que devem

etiquetar nossos estados devem ser tais que em sua decomposicao (4.12) os αj podem apenas

ser 0 ou 1 para qualquer j ∈ N. Assim, os numeros livres de quadrados etiquetam os estados

neste modelo. Tambem e claro que a energia total de cada estado e dada como em (4.13).

Para conhecer as propriedades deste modelo e ver se ele tem alguma relacao com a hipotese

de Riemann, o caminho mais logico a seguir e encontrar sua funcao de particao, assim para

facilitar a notacao denotaremos por LQ ao conjunto dos numeros livres de quadrados, entao

a funcao de particao grande canonica e

QF (T ) =∑n∈LQ

exp

(−E0 log n

kT

)=∑n∈LQ

1

nE0kT

. (4.16)

Mas, pelo Produto de Euler, para s ∈ H(1,+∞), temos

ζ(s)

ζ(2s)=∏p∈P

(1− p−2s)

(1− p−s)=∏p∈P

(1− p−s) =∏p∈P

(1− 1

ps

)= 1 +

1

2s+

1

3s+

1

5s+

1

6s+ . . .

=∑n∈LQ

1

ns.

Desta ultima igualdade em (4.16) chegamos a

QF (T ) =ζ(E0kT

)ζ(2E0kT

) . (4.17)

Um dos resultados mais interessantes neste modelo, mostrando uma relacao estreita com

a teoria analıtica dos numeros, e a seguinte proposicao.

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76 Capıtulo 4 — Zeta de Riemann e a Fısica

Proposicao 4.56 .

QF (T ) =∑n≥1

|µ(n)|

nE0kT

, T <E0

k.

Demonstracao: Do fato de que µ(n) = 0, se n ∈ LQ, e de (4.16), obtemos o resultado.

Por fim, outro modelo muito interessante foi proposto por Andreas Knauf [16], onde temos

em conta um sistema de spins cuja funcao de particao e Q(s) = ζ(s−1)ζ(s) . A razao para este

modelo e a utilizacao do Teorema de Lee-Yang, que afirma que todos os zeros da funcao

de particao de um modelo de Ising ferromagnetico no plano complexo sao unitarios (para

uma visao mais detalhada do Teorema Lee-Yang e do modelo de Ising ver [13]). Outro fato

notavel, neste modelo e que a sua funcao de particao pode ser escrita como

Q(s) =∑n≥1

ϕ(n)

ns, s ∈ H(2,+∞),

onde ϕ e a funcao totiente de Euler. Para uma demonstracao detalhada deste resultado,

remetemos a [3]. Assim, como uma observacao final, vemos que de (4.15), o Teorema 4.56 e

a ultima equacao, algumas series da forma

Z(s) =∑n≥1

g(n)

ns,

onde g e uma funcao aritmetica, podem ser interpretadas como funcoes de particao de al-

guns modelos, essas series sao chamadas Series de Dirichlet. Para mais detalhes sobre estas

recomendamos a Ref. [3].

Concluindo, vimos que a relacao entre ζ(s) e seus zeros, e a Fısica e muito estreita. O

site http://empslocal.ex.ac.uk/people/staff/mrwatkin//zeta/physics.htm traz muitos outros

exemplos.

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Capıtulo

5Consideracoes Finais

Neste trabalho, estudamos a funcao zeta de Riemann ζ(s), s ∈ C \ 1. Motivamos e

justificamos porque e plausıvel postular a hipotese de Riemann de que os zeros nao-triviais

de ζ(s) se encontran na faixa crıtica 0 < R(s) < 1 e, mais precisamente, na reta crıtica

R(s) = 12 .

Como uma conexao entre ζ(s) e a teoria analitica dos numeros, estabelecemos o Teorema

dos Numeros Primos que nos mostra como ζ(s) nos fornece uma densidade para os numeros

primos em R.

Vimos tambem diversas formas matematicas equivalentes para enunciar a hipotese de

Riemann.

A importancia da funcao ζ(s) em alguns sistemas fısicos relevantes foi tambem revisada

e equivalentes fısicos para a hipotese de Riemann foram estabelecidos.

A relacao entre ζ(s) e a Fısica e muito vasta.

Esperamos que o presente texto consiga motivar o leitor interessado a prosseguir os passos,

aqui descritos, do maravilhoso caminho que constitui esse problema da hipotese de Riemann.

77

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Apendice

AInformacoes Adicionais

Notacao Assintotica

Sejam f, g : U ⊆ K→ K, (K = R ou C). Escrevemos

f(x) = O(g(x)), (A.1)

se existe uma constante positiva M e um r > 0 tal que |f(x)| ≤M |g(x)| para |x| > r. Outra

forma equivalente de escrever (A.1) e a seguinte:

|f(x)| |g(x)|. (A.2)

A notacao ultima nos ajuda em materia de calculo, como e mostrado na secao das funcoes

inteiras de ordem um. Agora, temos que especificar o caso onde a constante M depende de

um parametro ε > 0, por exemplo, na definicao de uma funcao inteira de ordem um, entao,

as notacoes de (A.1) e (A.2) sao alteradas pelas seguintes:

f(x) = Oε(g(x)) e |f(x)| ε |g(x)|.

Finalmente, outra das notacoes assintoticas que utilizamos neste trabalho, embora nao muito

frequentemente, mas de grande importancia, e a seguinte:

Sejam f, g : R→ R. Escrevemos

f ∼ g,

se limx→+∞f(x)g(x) = 1.

79

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80 Capıtulo A — Informacoes Adicionais

Algumas Formulas Assintoticas

Teorema A.57 (Formula de Perron). Sejam c ∈ (1, 2], T > 2 e x 6= 1 um numero real

positivo. Entao

1

2πi

∫ c+iT

c−iT

xs

sds =

1 +O(

xc

T | log x|

), x > 1

O(

xc

T | log x|

), x < 1.

Demonstracao: Seja U c e consideremos os seguintes casos

x < 1: Seja o retangulo [c− iT, U− iT, U+ iT, c+ iT, c− iT ]. Entao, pelo teorema de Cauchy,

1

2πi

∫[c−iT,U−iT,U+iT,c+iT,c−iT ]

xs

sds = 0

⇒ 1

2πi

(∫[c−iT,U−iT ]

xs

sds+

∫[U−iT,U+iT ]

xs

sds+

∫[U+iT,c+iT ]

xs

sds+

∫[c+iT,c−iT ]

xs

sds

)= 0.

(A.3)

Mas ∫[U−iT,U+iT ]

xs

sds =

∫ T

−T

xU+it

U + itidt→ 0, se U → +∞.

Alem disso, temos que∣∣∣ ∫[c−iT,U−iT ]

xs

sds∣∣∣ =

∣∣∣ ∫ U

c

xσ−iT

σ − iTdσ∣∣∣ ≤ ∫ U

c

Tdσ =

xU − xc

T log x

⇒∫

[c−iT,U−iT ]

xs

sds = O

(xc

T log x

),

e, analogamente, ∫[c−iT,U−iT ]

xs

sds = O

(xc

T log x

).

Assim, temos em (A.3) o procurado, e e assim concluıda a demonstracao para este caso.

x > 1: Seja o retangulo [c − iT, c + iT,−U + iT,−U − iT, c − iT ]. Logo, como a funcao xs

s

tem um polo simples no origem, entao, pelo teorema de Cauchy,

1

2πi

∫[c−iT,c+iT,−U+iT,−U−iT,c−iT ]

xs

sds = 1,

e prosseguimos como no caso anterior.

A demonstracao e assim concluıda.

Lema A.58 . Seja x = N + 12 (N ∈ N). Entao,∑x2<n<2x

∣∣∣ log(nx

) ∣∣∣−1= O(x log x).

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81

Demonstracao: Para x2 < n < 2x, claramente 0 <

∣∣∣1 − nx

∣∣∣ ≤ 1 e 0 <∣∣∣ log

(nx

) ∣∣∣ ≤ log 2.

Entao, ∣∣∣ log(nx

) ∣∣∣ ∣∣∣1− n

x

∣∣∣ =|x− n|x

.

Portanto,∑x2<n<2x

∣∣∣ log(nx

) ∣∣∣−1 x

∑x2<n<2x

|x− n|−1 x∑n≤x

1

n≤ x

∫ x

1

1

udu = x log(x)

⇒∑

x2<n<2x

∣∣∣ log(nx

) ∣∣∣−1= O(x log x).

Teorema A.59 (Formula de Inversao). Seja f(s) =∑

n≥1anns e admitamos que

∑n≥1

|an|nσ <

∞, para qualquer σ > 1. Alem disso, |an| ≤ A(n), onde A(x) e uma funcao monotona

crescente, e ∑n≥1

|an|nσ

= O((σ − 1)−α),

quando σ → 1+, onde α e uma constante maior que zero. Entao, a seguinte formula e valida

para qualquer b > 1, T ≥ 1, x = N + 12 (N ∈ N):

Φ(x) =∑n≤x

an =1

2πi

∫ b+iT

b−iTf(s)

xs

sds+O

(xb

T (b− 1)α

)+O

(xA(2x) log x

T

).

Demonstracao: Como x = N + 12 , entao x

n 6= 1, para qualquer n ∈ N. Da hipotese, temos

que∑

n≥1anns e absolutamente convergente para s = b+ it. Entao, integrando termo a termo

e usando a Formula de Perron A.57

1

2πi

∫ b+iT

b−iTf(s)

xs

sds =

1

2πi

∑n≥1

an

(1

2πi

∫ b+iT

b−iT

(xn

)s dss

)

=∑n≤x

an +O

∑n≥1

|an|(xn

)bT−1

∣∣∣ log(xn

) ∣∣∣−1

. (A.4)

Agora, dividamos a soma de O do seguinte jeito∑n≥1

|an|(xn

)bT−1

∣∣∣ log(xn

) ∣∣∣−1

=∑

xn≤ 1

2ou x

n≥2

|an|(xn

)bT−1

∣∣∣ log(xn

) ∣∣∣−1+

∑x2<n<2x

|an|(xn

)bT−1

∣∣∣ log(xn

) ∣∣∣−1.

Na primeira soma, ∣∣∣ log(xn

) ∣∣∣ ≥ log 2⇒∣∣∣ log

(xn

) ∣∣∣−1≤ 1

log 2,

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82 Capıtulo A — Informacoes Adicionais

e, como∑

n≥1|an|nb

= O((b− 1)−α), entao

∑xn≤ 1

2ou x

n≥2

|an|(xn

)bT−1

∣∣∣ log(xn

) ∣∣∣−1= O(xbT−1(b− 1)−α). (A.5)

Na segunda soma, temos∑x2<n<2x

|an|(xn

)bT−1

∣∣∣ log(xn

) ∣∣∣−1≤ A(2x)2bT−1

∑x2<n<2x

∣∣∣ log

(N + 1/2

n

) ∣∣∣−1,

mas e claro que∣∣∣ log

(N+1/2n

) ∣∣∣ =∣∣∣ log

(n

N+1/2

) ∣∣∣. Entao, na desigualdade, temos

∑x2<n<2x

|an|(xn

)bT−1

∣∣∣ log(xn

) ∣∣∣−1≤ A(2x)2bT−1

∑x2<n<2x

∣∣∣ log

(n

N + 1/2

) ∣∣∣−1.

Alem disso, pelo Lema A.58 ,∑

x2<n<2x

∣∣∣ log(

nN+1/2

) ∣∣∣−1= O(x log x). Portanto,

∑x2<n<2x

|an|(xn

)bT−1

∣∣∣ log(xn

) ∣∣∣−1= O(xT−1A(2x) log x). (A.6)

Substituindo (A.5) e (A.6) em (A.4), temos o procurado.

Teorema A.60 (Formula de Stirling). Para δ > 0. Se z ∈ w ∈ C : argw ∈ (−π + δ, π −δ), |w| > 1, entao

log Γ(z) =

(z − 1

2

)log z − z +

1

2log 2π +Oδ(|z|−1).

Demonstracao: Ver [15].

Corolario A.61 . Com as mesmas condicoes do teorema anterior, temos

Γ′(z)

Γ(z)= log z +Oδ(|z|−1).

Demonstracao: Ver [15].

Formula de Soma de Poisson

Consideremos f : R→ R contınua, e definamos g do seguinte modo

g(x) :=∑n∈Z

f(x+ n), (A.7)

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83

onde estamos assumindo que a soma definindo g e convergente. Claramente, g tem perıodo

T = 1. Entao, usando a forma complexa da serie de Fourier, temos que

g(x) =+∞∑

n=−∞cne

2nπxi, (A.8)

onde ck =∫ 1

0 g(x)e−2kπxidx, para qualquer n ∈ Z. Agora, se substituımos (A.7) na equacao

que define aos ck, temos

ck =

∫ 1

0

(∑n∈Z

f(x+ n)

)e−2kπxidx =

∫ 1

0

∑n∈Z

f(x+ n)e−2kπ(x+n)idx

=∑n∈Z

∫ n+1

nf(y)e−2kπyidy =

∫ +∞

−∞f(y)e−2kπyidy,

desta ultima igualdade em (A.8), temos

g(x) =

+∞∑n=−∞

(∫ +∞

−∞f(y)e−2nπyidy

)e2nπxi

⇒+∞∑

k=−∞f(x+ k) =

+∞∑n=−∞

∫ +∞

−∞f(y)e−2nπ(y−x)idy.

Agora, se tomamos x = 0, na ultima igualdade, obtemos a Formula de Soma de Poisson:

+∞∑k=−∞

f(k) =

+∞∑n=−∞

∫ +∞

−∞f(y)e−2nπyidy. (A.9)

Observacao A.62 . Para que a soma do lado esquerdo da Eq.A.9 exista, precisamos que

f ∈ h : R→ C : h ∈ C∞, lim|x|→∞ |x|mf (n)(x) = 0, para quaisquer inteiros m,n ≥ 1 fixos.

Raızes Primitivas da Unidade

Definicao A.63 . Seja n ∈ N. τ ∈ C e chamada uma raiz n-esima da unidade se τn = 1.

Alem disso, se τk 6= 1 para qualquer k ∈ N, com k < n, entao, τ e chamada uma raiz

primitiva n-esima da unidade.

Teorema A.64 . Se τ e uma raiz primitiva n-esima da unidade. Entao, as raızes n-esimas

da unidade sao 1, τ, τ2, . . . , τn−1.

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84 Capıtulo A — Informacoes Adicionais

Demonstracao: Sejam k1, k2 ∈ 0, 1, . . . , n − 1, tais que 0 ≤ k1 < k2 ≤ n − 1, entao

1 ≤ k2−k1 < n, logo como τ e uma raiz primitiva n-esima da unidade, temos que τk2−k1 6= 1,

portanto τk1 6= τk2 . Assim 1, τ, τ2, . . . , τn−1, sao todos diferentes.

Finalmente, como(τk)n

= 1, para qualquer k ∈ 0, 1, . . . , n− 1, entao 1, τ, τ2, . . . , τn−1

sao todas as raızes n-esimas da unidade, e concluimos a prova.

Lema A.65 . Se τ e uma raiz primitiva n-esima da unidade. Entao τm = 1 se e somente se

n|m.

Demonstracao: Admitamos que τm = 1. Entao, pelo algoritmo de divisao, existem q, r ∈ Ztais que m = qn+ r, onde 0 ≤ |r| < n. Logo,

1 = τm = τ qn+r = τ r.

Assim, como τ e uma raiz primitiva da unidade entao τk 6= 1, para qualquer k < n, e como

r so pode tomar os valores 0,±1, . . . ,±(n− 1); o unico valor que satisfaz a igualdade acima

e r = 0, o que implica que n|m. A recıproca e obvia.

Proposicao A.66 . Se Sk denota a soma das raızes primitivas k-esimas da unidade. Entao∑d|n

Sd =

1, n = 1,0, n 6= 1.

Demonstracao: Sejam Rn o conjunto das raices n-esimas da unidade e Pn o conjunto das

raızes primitivas n-esimas da unidade. Assim, pelo Lema A.65 , se τ ∈ Pd, entao τn = 1 se

e somente se d|n. Isto implica que Pd ⊆ Rn, para qualquer d|n

⇒⋃d|n

Pd ⊆ Rn. (A.10)

Agora, se τ ∈ Rn, entao o conjunto k ∈ N : k ∈ [0, n] e τk = 1 6= ∅, pois n pertence a este

conjunto. Logo, pelo princıpio da boa ordenacao, o conjunto acima tem um menor elemento

d 6= 0. Assim, τd = 1 e τk 6= 1, para 1 ≤ k < d. Isto implica que τ ∈ Pd e como τn = 1,

novamente pelo Lema A.65 , d|n entao τ ∈ Pd ⊆⋃d|n Pd

⇒ Rn ⊆⋃d|n

Pd.

Desta inclusao e de (A.10) temos que

Rn =⋃d|n

Pd.

Notemos que, pelo fato de que os elementos dos Pd sao raızes primitivas, a uniao acima e

disjunta. Entao, somar os elementos de Rn e equivalente a somar todos os elementos dos Pd,

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85

onde d|n. Assim, seja τ uma raiz primitiva n-esima da unidade. Logo, pelo Teorema A.64 ,

temos que Rn = 1, τ, τ2, . . . , τn−1. Entao, pelo dito anteriormente, se n > 1 temos∑d|n

Sd = 1 + τ + τ2 + · · ·+ τn−1 =1− τn

1− τ= 0,

e se n = 1 e claro que∑

d|n Sd = 1, e concluimos a prova.

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Apendice

BMais Informacoes

Caracterısticas de Dirichlet e Funcoes L de Dirichlet

Definicao B.67 . Seja N ∈ N. Uma Caracterıstica de Dirichlet modulo N e uma aplicacao

χ : Z/NZ → C, tal que χ(m) = 0, para qualquer m tal que (m,N) > 1, e χ|(Z/NZ)∗ e um

homomorfismo (nao nulo) entre os grupos multiplicativos (Z/NZ)∗ e C∗.

Para N natural, pode haver muitas caracterısticas de Dirichlet modulo N , mas existe uma

de vital importancia χ0 tal que χ0(a) = 1, para qualquer a ∈ (Z/NZ)∗. Esta e chamada a

caracterıstica principal modulo N .

Proposicao B.68 . Seja N ∈ N. Se χ e uma caracterıstica de Dirichlet modulo N , entao

χ(a)ϕ(N) = 1, para qualquer a ∈ (Z/NZ)∗.

Demonstracao: Como |(Z/NZ)∗| = ϕ(N), entao, para qualquer a ∈ (Z/NZ)∗, temos que

aϕ(N) = 1 e como χ|(Z/NZ)∗ e um homomorfismo de grupos χ(a)ϕ(N) = χ(aϕ(N)) = χ(1) = 1.

Definicao B.69 . Seja χ uma caracterıstica de Dirichlet modulo N . Para s ∈ H(1,+∞),

definimos

L(s, χ) :=∑n≥1

χ(n)

ns.

L(s, χ) e chamada funcao L de Dirichlet.

87

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88 Capıtulo B — Mais Informacoes

L(s, χ) esta bem definida, com efeito, pela Proposicao B.68 , χ(n)ϕ(N) = 1 para qualquer

n ∈ N, tal que (n,N) = 1, logo |χ(n)| = 1, para qualquer n ∈ N tal que (n,N) = 1, e

|χ(n)| = 0, para qualquer outro caso. Entao, para s = σ + it ∈ H(1,+∞), temos∣∣∣χ(n)

ns

∣∣∣ ≤ 1

nσ,

para qualquer n ∈ N. Assim L(s, χ) esta bem definida.

Vemos que a prova da boa definicao de L(s, χ) e analoga a prova da boa definicao de ζ(s).

Entao nao e estranho ver que tem propriedades analogas a ζ(s). De fato, ela verifica uma

representacao analoga ao produto de Euler, como e indicado no seguinte teorema.

Teorema B.70 . L(s, χ) satisfaz

L(s, χ) =∏p∈P

(1− χ(p)

ps

)−1

.

Demonstracao: A prova e analoga ao produto Euler, a unica diferenca aqui e o uso da

propriedade de multiplicativa de χ (homomorfismo de grupo).

Alguns valores de ζ(n), n ∈ Z \ 1

Definicao B.71 .

h1(t) := 1+t2(1−t) , hr(t) :=

(t ddt)r−1

h1(t) (r ≥ 2).

Teorema B.72 .sinπx

πx=∏n≥1

(1− x2

n2

), x ∈ R.

Demonstracao: Ver [1].

Proposicao B.73 . Seja x ∈ C \ Z e t = e2πix. Entao, valem

1. h1(t) = − 14πi

∑n∈Z

(1

x+n + 1x−n

).

2. Se r ≥ 2, entao hr(t) = (r − 1)!(− 1

2πi

)r∑n∈Z

1(x+n)r .

Demonstracao:

1. Do Teorema B.72 , temos

1

π

d

dxlog

(sinπx

πx

)=

1

π

d

dx

∑n≥1

log

(1− x2

n2

)

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89

⇒ 1

π

(π cosπx

sinπx− π

πx

)=

1

π

∑n≥1

(1

n+ x+

1

x− n

)

⇒ cotπx =1

π

∑n≥1

(1

n+ x+

1

x− n

)+

1

x

. (B.1)

Desta ultima equacao, e claro que

cotπx =1

π

∑n≤−1

(1

n+ x+

1

x− n

)+

1

x

. (B.2)

Assim, adicionando (B.1) e (B.2) membro a membro, temos

2 cotπx =1

π

∑n∈Z

(1

n+ x+

1

x− n

)

⇒ −2ih1(t) =i(eπxi + e−πxi)

eπxi − e−πxi= cotπx =

1

∑n∈Z

(1

n+ x+

1

x− n

)

⇒ h1(t) = − 1

4πi

∑n∈Z

(1

n+ x+

1

x− n

).

2. Como t = e2πix, entao(t ddt)r−1

=(

12πi

ddx

)r−1. Assim, indutivamente para r = 2 por

definicao e do item anterior, temos

h2(t) = td

dth1(t) =

1

2πi

d

dx

(− 1

4πi

∑n∈Z

(1

n+ x+

1

x− n

))

=

(− 1

2πi

)2∑n∈Z

1

(n+ x)2.

Admitamos que hr(t) = (r − 1)!(− 1

2πi

)r∑n∈Z

1(x+n)r . Logo,

hr+1(t) =

(td

dt

)rh1(t) = t

d

dt

(td

dt

)r−1

h1(t) = td

dthr(t)

=1

2πi

d

dx

((r − 1)!

(− 1

2πi

)r∑n∈Z

1

(x+ n)r

)

=1

2πi

(− 1

2πi

)r(r − 1)!

∑n∈Z

−r(x+ n)r−1

(x+ n)2r

= r!

(− 1

2πi

)r+1∑n∈Z

1

(x+ n)r+1.

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90 Capıtulo B — Mais Informacoes

Teorema B.74 . Seja N ∈ N, χ uma caracterıstica de Dirichlet modulo N e r ∈ N. Admi-

tamos que χ(−1) = (−1)r. Logo, se ζN := e2πi/N , entao

L(r, χ) =1

(r − 1)!

(−2πi

N

)r 1

2

∑a∈(Z/NZ)∗

χ(a)hr(ζaN ).

Demonstracao: Pela Proposicao B.73 , temos∑a∈(Z/NZ)∗

χ(a)hr(ζaN ) =

∑a∈(Z/NZ)∗

χ(a)(r − 1)!

(− 1

2πi

)r∑n∈Z

1

(a/N + n)r

= (r − 1)!

(− 1

2πi

)r∑n∈Z

∑a∈(Z/NZ)∗

χ(a)

(a/N + n)r.

Entao,

∑a∈(Z/NZ)∗

χ(a)hr(ζaN ) = (r−1)!

(− 1

2πi

)r∑n≥0

∑a∈(Z/NZ)∗

χ(a)

(a/N + n)r+∑n<0

∑a∈(Z/NZ)∗

χ(a)

(a/N + n)r

.

(B.3)

Alem disso, se n ≥ 0,

∑a∈(Z/NZ)∗

χ(a)

(a/N + n)r=

N−1∑a=1

χ(a)

(a/N + n)r= N r

N−1∑a=1

χ(a)

(a+Nn)r= N r

∑Nn<m<N(n+1)

χ(m)

mr.

(B.4)

De forma semelhante, se n < 0 escrevemos n′ = −(n+ 1) ≥ 0. Entao,

∑a∈(Z/NZ)∗

χ(a)

(a/N + n)r=

N−1∑a=1

χ(a)

(a/N + n)r=

N−1∑a=1

χ(a)

(a/N − n′ − 1)r

=

N−1∑a=1

(−1)rχ(a)

((N − a)/N + n′)r= N r

N−1∑a=1

χ(−a)

(−a+ (n′ + 1)N)r= N r

∑Nn′<m<N(n′+1)

χ(m)

mr. (B.5)

Assim, de (B.4) e (B.5) em (B.3), obtemos∑a∈(Z/NZ)∗

χ(a)hr(ζaN ) = (r−1)!

(− N

2πi

)r2∑n≥0

∑Nn<m<N(n+1)

χ(m)

mr= 2(r−1)!

(− N

2πi

)rL(r, χ).

Teorema B.75 . Se r ∈ N, e par. Entao,

ζ(r) =1

(r − 1)!

1

2r − 1(2πi)r

1

2hr(−1).

Demonstracao: No teorema anterior, tome N = 2 e consideremos a caracterıstica principal

modulo 2, χ0. Logo,

L(r, χ0) =1

(r − 1)!(πi)r

1

2hr(−1), (B.6)

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91

Mas,

L(r, χ0) =∑

n≥1:n e ımpar

1

nr= ζ(r)−

∑n≥1

1

(2n)r= ζ(r)

(1− 1

2r

),

deste ultimo, em (B.6), conclui a prova.

Deste ultimo teorema, podemos calcular qualquer valor de ζ(n) para n par. Por exemplo,

ζ(2) = π2

6 e ζ(4) = π4

90 .

Agora, vamos calcular os valores de ζ(s) nos inteiros negativos. Como vimos anteriormente

os pares negativos sao os zeros triviais de ζ(s). Entao, nos concentramos em calcular ζ(n)

para n inteiro negativo ımpar.

Definicao B.76 . Os numeros de Bernoulli Bn sao definidos pela seguinte formula:

x

ex − 1=∑n≥0

Bnn!xn.

Pelo Lema 2.10 , para s ∈ H(1,+∞),

Γ(s)ζ(s) =

∫ 1

0

ts−1

et − 1dt+

∫ +∞

1

ts−1

et − 1dt.

Como vimos na demonstracao do Teorema 2.11, a integral∫ +∞

1ts−1

et−1dt representa uma funcao

em s, que tambem e inteira. Entao so temos que focalizar nossa atencao na outra integral.

Assim, usando a definicao dos numeros de Bernoulli, temos

Γ(s)ζ(s) =

∫ 1

0

t

et − 1ts−2dt+

∫ +∞

1

ts−1

et − 1dt =

∫ 1

0

∑n≥0

Bnn!ts+n−2dt+

∫ +∞

1

ts−1

et − 1dt

=∑n≥0

Bnn!

1

s+ n− 1+

∫ +∞

1

ts−1

et − 1dt.

Daı, vemos que Γ(s)ζ(s) ∈ H(C\1, 0,−1,−2,−3, . . .) e seus polos sao simples. Entao, para

todos os numeros naturais n

lims→1−n

Γ(s)ζ(s)(s+ n− 1) =Bnn!.

Mas, pelo Teorema 2.2 , Res(Γ,−m) = (−1)m

m! , para m = 0, 1, 2, . . .. Entao,

(−1)n−1

(n− 1)!ζ(1− n) =

(lim

s→1−nΓ(s)(s+ n− 1)

)ζ(1− n) = lim

s→1−nΓ(s)ζ(s)(s+ n− 1) =

Bnn!.

Logo para n = 2, 4, 6, . . .

ζ(1− n) = −Bnn.

Assim, desta ultima equacao, temos os valores procurados. Por exemplo ζ(−1) = − 112 ,

ζ(−3) = − 1120 , ζ(−5) = − 1

252 , . . . .

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Indice Remissivo

B(v, u), funcao beta, 9

Γ(s), funcao Gama de Euler, 5

Λ(x), funcao de von Mangoldt, 44

Ψ(x), funcao de Chebyshev, 45

L, reta crıtica, 36

S, faixa crıtica, 33

π(x), funcao de contagem de numeros pri-

mos, 53

ξ(s), ξ-funcao de Riemann, 40

ζ(s), funcao Zeta de Riemann, 13

Conjetura

de Hilbert-Polya, 55

Hipotese de Riemann, 36

Constante de Euler-Mascheroni, 56

Funcao

totiente de Euler, 71

totiente de Mobius, 71

Funcao de particao, 74–76

Funcao inteira de ordem um, 24

Funcao zeta espectral, 65

Li(x), funcao integral logarıtmica Euleri-

ana, 54

Numero livre de quadrados, 75

Series de Dirichlet, 76

Teorema

dos Numeros Primos, 51

dos Numeros Primos, versao original,

53

Formula de Inversao, 81

Formula de inversao de Mobius, 72

Formula de Jensen, 25

Formula de Perron, 80

Formula de Soma de Euler, 41

Formula de Stirling, 82

Transformada de Mellin, 73

Transformada inversa de Mellin, 73