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JÉSSICA ALVES GALVÃO LAVAGEM DE DINHEIRO: SURGIMENTO, EVOLUÇÃO, CONCEITO E FASES. BRASÍLIA, 2014. WWW.CONTEUDOJURIDICO.COM.BR

LAVAGEM DE DINHEIRO - Conteúdo Jurídico · documento que se referia a um processo judicial em 1982, ocorrido na Flórida, em que se apurava a ocultação de bens oriundos do tráfico

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JÉSSICA ALVES GALVÃO

LAVAGEM DE DINHEIRO:

SURGIMENTO, EVOLUÇÃO, CONCEITO E FASES.

BRASÍLIA, 2014.

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Sumário

Resumo ....................................................................................................................................... 3

Introdução ................................................................................................................................... 3

1. Histórico do crime de lavagem de dinheiro ........................................................................ 4

1.1 Itália ....................................................................................................................................................... 4

1.2 Estados Unidos ...................................................................................................................................... 5

2. Origem do termo: lavagem de dinheiro............................................................................... 6

3. Brasil e a lavagem de dinheiro ............................................................................................ 7

4. Conceito e fases do crime de lavagem de dinheiro ........................................................... 11

5. Alterações da Lei 9.613 ocorridas em 2012 ...................................................................... 14

Conclusão ................................................................................................................................. 15

Referências ............................................................................................................................... 16

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Lavagem de dinheiro:

Surgimento, evolução, conceito e fases.

JÉSSICA ALVES GALVÃO

Resumo

A lavagem de dinheiro é uma prática antiga do ser humano possuindo relatos de sua

ocorrência mais de 3.000 anos. Para melhor compreender o intuito do autor desse delito

que visa ocultar ou dissimular a origem ilícita de ativos importante se faz conhecer a origem,

conceitos e fases desse tipo penal.

Palavras chaves: Lavagem de dinheiro. Origem. Conceito. Fases.

Introdução

O presente artigo tem por objeto de estudo a lavagem de dinheiro que

juntamente com o desenvolvimento da sociedade veio evoluindo desde o seu surgimento.

Com a integração da humanidade se possui atualmente um alto nível de globalização em

todos os setores seja na economia, nas informações e infelizmente nos crimes também. O

crime de lavagem de dinheiro ao se aprimorar e adentrar nessa esfera de globalização se

tornou um dos principais delitos que ocorrem em âmbito nacional e internacional, sendo

pauta de convenções interpaíses e gerando legislações dentro de territórios nacionais como

é o caso da lei brasileira nº 9.613, publicada em 1998, que tipifica penalmente a lavagem de

dinheiro.

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1. Histórico do crime de lavagem de dinheiro

O Crime de Lavagem de dinheiro é corriqueiramente encontrado nas pautas do poder

judiciário brasileiro, assim como em manchetes que tratam sobre a condenação ou absolvição

de acusados vinculados a essa conduta delituosa. Mas apesar de ser um crime atual a ideia de

ocultar ou esconder dinheiro que provem de fontes ilícitas ou obscuras não é uma conduta

nova, existem relatos históricos desde a Bíblia Cristã, quando é contada a história de Ananias

e sua mulher Safira1 que “venderam uma propriedade e ocultaram uma parte, dando apenas

uma parcela aos apóstolos”2. Há ainda os que defendem que a origem da lavagem de dinheiro

teria ocorrido a mais de 3.000 anos na China, em decorrência de algumas práticas adotadas

pelos comerciantes, na tentativa de proteger seus bens contra quem detinha o poder3.

Os primeiros países do mundo a criminalizarem a lavagem de dinheiro foram a Itália e

os Estados Unidos.

1.1 Itália

Na Itália, vivia-se o auge do denominado “anos de chumbo”, período em que as

famosas “máfias italianas” dominavam as ações criminosas com o objetivo de desestabilizar o

Estado. Uma das mais conhecidas máfias foram as “Brigadas Vermelhas” que após realizarem

o sequestro (ocorrido em 16.03.1978) de um político do alto escalão do poder público

desencadeou uma comoção internacional. Tal situação gerou a criação do Decreto- Lei nº 59

de 21 de março de 1978 que posteriormente veio a compor o Código Penal desse país. Essa

norma “incriminou a substituição de dinheiro ou de valores provenientes de roubo

qualificado, extorsão qualificada ou extorsão mediante sequestro”4 na tentativa de

desestabilizar tais organizações criminosas que utilizavam essas medidas violentas para

conseguir capital e se beneficiar de outras formas.

1 Atos dos Apóstolos, Cap. V, versículos 1-11. 2 ANSELMO, Márcio Adriano. Lavagem de dinheiro e cooperação jurídica internacional. São Paulo: Saraiva,2013. Página 35. 3Disponível em: http://www.conteudojuridico.com.br/apostila-e-resumo,crimes-de-lavagem-de-dinheiro-lei-n-961398-doutrina-jurisprudencia-e-exercicios-atualizada-com-a-lei-n-126832,37655.html. Acesso em:10.03.2014. 4 DE CARLI, Carla Veríssimo. Lavagem de dinheiro: ideologia da criminalização e análise do discurso. Porto Alegre. Verbo Jurídico, 2008. Página 79.

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1.2 Estados Unidos

Nos Estados Unidos, o fortalecimento das organizações criminosas ocorreu após a

edição de uma lei (em 28.10.1919) de proibição ao transporte, venda ou produção de qualquer

tipo de bebida alcoólica que tivesse em sua constituição um teor alcoólico superior a 0,5%.

Um dos mais famosos chefes do crime à época foi Alphonese Capone, ele conseguiu erguer

uma fortuna com as bebidas ilegais e só foi preso em 1931 por sonegação fiscal.

Essa “Lei Seca” acabou por gerar um mercado paralelo que rendeu milhões para os

grupos criminosos e se tornou uma norma sem efetividade, pois não houve aceitação social de

tamanha restrição.

Em 1933, houve a revogação da proibição, porém os grupos mafiosos já estavam

investindo em outros tipos de ações para dar retornos econômicos rápidos e voluptuosos como

as casas de jogos e o tráfico de substâncias entorpecentes. Entretanto, com a queda de Al

Capone os outros chefes do crime sentiram a urgência em criar mecanismos para proteger os

lucros dos seus negócios e Meyer Lansky foi o percursor de um instrumento que ficou

conhecido como offshore5, que consistia na remessa do dinheiro para bancos localizados fora

do estado americano e de preferência que possuíssem especial regulamentação, ou seja, os

denominados “paraísos fiscais”.

Segundo Heleno Torres que é citado por Márcio Adriano, os “paraísos fiscais” podem

ser classificados de acordo com o tipo de favorecimento que proporciona, podendo ser quanto

ao:

a. Regime societário – “possuem um regime maleável, permitindo a constituição

de sociedades sem grandes formalidades-” 6;

b. Regime penal – “são os que apresentam normas permissivas, deixando de

aplicar crimes de evasão fiscal, fraudes em balanço, corrupção e lavagem de

dinheiro, em amplo favorecimento às atividades criminosas”7 ;

5 OFFSHORE nos dicionários significa em geral feito ou registrado no exterior a alguma distância da costa; “No sentido comercial, uma empresa offshore é uma pessoa jurídica que está situada no estrangeiro em relação aos seus proprietários, sujeitos a um regime de normas diferente. Esse tipo de companhia é utilizada muitas vezes para fugir dos altos encargos fiscais existentes no país de domicilio dos proprietários em outros casos para se esconder dinheiro de origem criminosa. Outra denominação comum, para esses centros financeiros com especial regulação ( maior sigilo financeiro menores exigências para a constituição de empresas não-nacionais e menor tributação) é a de paraísos fiscais. DE CARLI, Carla Veríssimo. Lavagem de dinheiro: ideologia da criminalização e análise do discurso. Porto Alegre. Verbo Jurídico, 2008. Página 82 . 6 ANSELMO, Márcio Adriano. Lavagem de dinheiro e cooperação jurídica internacional. São Paulo: Saraiva,2013. Página 54. 7 ANSELMO, Márcio Adriano. Lavagem de dinheiro e cooperação jurídica internacional. São Paulo: Saraiva,2013. Página 55.

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c. Regime bancário – “são aqueles que facilitam o exercício de atividade

bancaria ou financeira sem submissão a rígido controle, ausência de

transparência e extremo sigilo” 8.··.

A legislação norte-americana surgiu de forma progressiva na seguinte ordem:

• Banck Secrecy Act de 1970 – estipulava que as instituições financeiras deveriam

comunicar todas as vezes que se efetuassem transações superiores a dez mil dólares,

com o objetivo de criar um vinculo por onde o dinheiro passasse e assim combatendo

a lavagem de dinheiro e crimes financeiros.9

• Anti- drug Abuse Act of 1986 – foi um ato que previa várias medidas entre elas a

MONEY LAUNDERING CONTROL ACT (atos de controle de lavagem de dinheiro)

que criminalizou o crime de lavagem de dinheiro no país e o adicionou no Código dos

Estados Unidos da América que é usado até hoje.

Como se pode observar a tipificação que ocorreu na Itália foi mais restrita, porém

detém grande importância por ter sido a primeira legislação sobre o tema e mesmo com a

evolução dessa norma a essência do crime que é a “modificação da situação do dinheiro ou

dos valores criminosamente obtidos” se manteve nas regras posteriores10. Em contrapartida a

abrangência da legislação estadunidense marca o crime de lavagem de dinheiro e põe em

evidência a real globalização dessa conduta.

2. Origem do termo: lavagem de dinheiro

A expressão “Lavagem de dinheiro” foi usada oficialmente pela primeira vez em um

documento que se referia a um processo judicial em 1982, ocorrido na Flórida, em que se

apurava a ocultação de bens oriundos do tráfico de entorpecentes da região e essa

denominação acabou sendo divulgada pela impressa e nos meios acadêmicos 11.Entretanto,

academicamente, a utilização desse termo é crítica por alguns estudiosos como Rodolfo Tigre

Maia que defende ser a forma mais correta a “reciclagem de ativos ilícitos”. Esses

8 ANSELMO, Márcio Adriano. Lavagem de dinheiro e cooperação jurídica internacional. São Paulo: Saraiva,2013. Página 55. 9 DE CARLI, Carla Veríssimo. Lavagem de dinheiro: ideologia da criminalização e análise do discurso. Porto Alegre. Verbo Jurídico, 2008. Página 84. 10 DE CARLI, Carla Veríssimo. Lavagem de dinheiro: ideologia da criminalização e análise do discurso. Porto Alegre. Verbo Jurídico, 2008. Página 80. 11 ANSELMO, Márcio Adriano. Lavagem de dinheiro e cooperação jurídica internacional. São Paulo: Saraiva,2013. Página 55.

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doutrinadores que criticam o uso de “lavagem de dinheiro” sustentam que se trata de um

“neologismo” ou um mero termo jornalístico12.

Acredita-se de um modo geral que o termo seja oriundo da expressão Money

laundering que surgiu nos Estados Unidos entre 1920 a 1930 quando os gângsteres norte-

americanos usavam empresas de fachada como lavanderias de roupa e lavadoras de

automóveis para ocultar a origem ilícita do dinheiro que tinham. A ideia de lavar algo que

teoricamente está “sujo” para que fique “limpo” acaba traduzindo amplamente a real intenção

desse delito que é transformar um “dinheiro sujo” em sua origem em um “dinheiro limpo” e

aparentemente honesto.

Na jurisdição internacional existem diferentes variações do neologismo “lavagem de

dinheiro”, a título de curiosidade na Alemanha, Argentina, Áustria, Suíça, Brasil e Estados

Unidos usam essa expressão de acordo com as mudanças de idioma. Já na Espanha, França e

Portugal se usa o termo “branqueamento de capitais”. Tal denominação não foi bem aceita no

Brasil por se considerar ter um cunho racista na palavra branqueamento.13

3. Brasil e a lavagem de dinheiro

A Organização das Nações Unidas (ONU) em 1988 promulga a Convenção Contra o

Tráfico Ilícito de Entorpecentes e Substâncias Psicotrópicas – Convenção de Viena-. O Estado

brasileiro se tornou signatário dessa convenção em 1991 através do Decreto n. 154. Esse

dispositivo possui dentre os seus temas à lavagem de dinheiro, à cooperação internacional e o

combate a outros crimes como o financeiro.

Segundo Márcio Anselmo, os principais pontos e objetivos da Convenção são:

“a obrigação de incriminar penalmente a lavagem de dinheirinho procedente do

narcotráfico, a cooperação internacional para facilitar as investigações

internacionais, facilitar a extradição para os assuntos de lavagem, assim como o

confisco internacional dos bens dos narcotraficantes, facilitar a cooperação nas

12 BRAGA, Romulo Rhemo Palitot. O fenômeno da lavagem de dinheiro e o bem jurídico protegido. Curitiba. Juruá, 2010.Página 26. 13 BRAGA, Romulo Rhemo Palitot. O fenômeno da lavagem de dinheiro e o bem jurídico protegido. Curitiba. Juruá, 2010.Página 27,28.

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investigações administrativas e as investigações judiciais referentes à cooperação

internacional não devem ser impedidas pelo sigilo bancário.”14

Ao ratificar o trato o Brasil assumiu o compromisso de normatizar penalmente o

“ilícito praticado com bens, direitos e valores oriundos do narcotráfico”15. Podendo-se

observar no artigo 3, do já mencionado decreto a responsabilidade de tipificar essa conduta.

ARTIGO 3

Delitos e Sanções

1 - Cada uma das Partes adotará as medidas necessárias para caracterizar como

delitos penais em seu direito interno, quando cometidos internacionalmente:

(...)

b) i) a conversão ou a transferência de bens, com conhecimento de que tais bens são

procedentes de algum ou alguns dos delitos estabelecidos no inciso a) deste

parágrafo, ou da prática do delito ou delitos em questão, com o objetivo de ocultar

ou encobrir a origem ilícita dos bens, ou de ajudar a qualquer pessoa que participe

na prática do delito ou delitos em questão, para fugir das consequências jurídicas de

seus atos;

ii) a ocultação ou o encobrimento, da natureza, origem, localização, destino,

movimentação ou propriedade verdadeira dos bens, sabendo que procedem de algum

ou alguns dos delitos mencionados no inciso a) deste parágrafo ou de participação

no delito ou delitos em questão;16

A publicação da Lei 9.613 em 03 de março de 1998 veio a honrar o compromisso

assumido pelo país no âmbito internacional, porém a Convenção de Viena possui um caráter

mais limitado se for comparada com a lei nacional, nessa o crime de lavagem de dinheiro está

vinculando apenas ao tráfico de drogas e nesta se amplia o rol de crimes antecedentes

possíveis que podem levar a lavagem. O artigo primeiro do texto original da referida lei trazia

em seus incisos como crimes antecedentes, o seguinte rol taxativo:

I - de tráfico ilícito de substâncias entorpecentes ou drogas afins; II - de terrorismo;

14 ANSELMO, Márcio Adriano. Lavagem de dinheiro e cooperação jurídica internacional. São Paulo: Saraiva,2013. Página70. 15 DE CARLI, Carla Veríssimo. Lavagem de dinheiro: ideologia da criminalização e análise do discurso. Porto Alegre. Verbo Jurídico, 2008. Página 166. 16 BRASIL, Portal Planalto – Presidência da República. .Decreto nº 154 de 26 de Junho de 1991. Disponível

em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/D0154.htm. Acessa em: 19.03.2014.

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II – de terrorismo e seu financiamento; (Redação dada pela Lei nº 10.701, de

9.7.2003)

III - de contrabando ou tráfico de armas, munições ou material destinado à sua

produção;

IV - de extorsão mediante sequestro;

V - contra a Administração Pública, inclusive a exigência, para si ou para outrem,

direta ou indiretamente, de qualquer vantagem, como condição ou preço para a

prática ou omissão de atos administrativos;

VI - contra o sistema financeiro nacional;

VII - praticado por organização criminosa.

VIII – praticado por particular contra a administração pública estrangeira (arts. 337-

B, 337-C e 337-D do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código

Penal). (Inciso incluído pela Lei nº 10.467, de 11.6.2002).17

Entretanto, essa listagem acima mencionada foi revogada pela Lei nº 12.683 de 09 de

julho de 2012, norma esta que trouxe modificações importantes para a adequação do tipo

penal estudado ao cenário global que sofre continuas alterações.

Existem classificações doutrinárias no que dizem respeito às gerações do crime de

lavagem de dinheiro e sobre as fases desse delito que podem fundamentar as mudanças

sofridas no ordenamento jurídico. A primeira geração do crime de lavagem de dinheiro é a

que está contida na Convenção de Viena onde só se tem como crime antecedente o tráfico de

entorpecentes. A segunda geração é a que corroborou para a criação do texto original da Lei

nº 9.613 de 1998 em que se amplia o rol de crimes antecedentes, porém ainda se limita a uma

lista taxativa. Por fim, a terceira geração foi a que deu ensejo à reforma ocorrida em 2012 na

legislação do crime de lavagem de dinheiro brasileira em que se considera como crime

anterior qualquer infração penal (gênero), seja crime (espécie) ou contravenção (espécie).

17 BRASIL, Portal Planalto – Presidência da República LEI Nº 9.613, DE 3 DE MARÇO DE 1998. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9613.htm. Acesso em: 19.03.2014.

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Fígura 1 - Fluxograma da Lei nº 9.613 de 1998

Fonte: Página do COAF - Conselho de Controle das Atividades Financeiras18

18 BRASIL, COAF - Conselho de Controle das Atividades Financeiras – Unidade de inteligência financeira do Brasil. Disponível em: http://www.coaf.fazenda.gov.br/pld-ft/sobre-a-lavagem-de-dinheiro. Acesso em: 19.03.2014

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4. Conceito e fases do crime de lavagem de dinheiro

A Lei nº 9.613 além de tipificar penalmente a lavagem de dinheiro estabelece suas

fases e cria a COAF (Conselho de Controle das Atividades Financeiras) órgão criado junto ao

Ministério da Fazenda com o objetivo de prevenir e combater o crime de lavagem de dinheiro

e outros relacionados ao sistema financeiro19. E esse órgão conceitua a lavagem de dinheiro

como sendo: um conjunto de operações comerciais ou financeiras que buscam a incorporação na economia de cada país, de modo transitório ou permanente ,de recursos, bens e

valores de origem ilícita e que se desenvolvem por meio de um processo dinâmico

que envolve, teoricamente, três fases independentes que, com frequência, ocorrem

simultaneamente.20

Essas três fases independentes e que podem ocorrer simultaneamente mencionadas no

conceito do crime foram elaboradas pela GAFI21 com o intuito de facilitar a compreensão do

conjunto de operações que envolvem a lavagem de dinheiro. Sendo essas etapas a colocação,

ocultação e integração conforme interpretação do COAF. Entretanto, doutrinariamente

ocultação e colocação são vistos como sinônimos, e as três etapas são separadas da seguinte

forma:

a. Ocultação, colocação ou placement- considerada como a primeira fase do crime em

que se tenta desvincular o dinheiro da sua origem ilícita, buscando disfarçar sua fonte

introduzindo os valores no sistema financeiro.

Romulo Rhemo apresenta algumas maneiras de se colocar o capital na economia, podendo

ser através “das instituições financeiras tradicionais – como bancos e cooperativas-, das

19 BRASIL, COAF - Conselho de Controle das Atividades Financeiras – Unidade de inteligência financeira do Brasil. Disponível em: http://www.coaf.fazenda.gov.br/o-conselho/competencias. Acesso em: 19.03.2014. 20 BRASIL, COAF - Conselho de Controle das Atividades Financeiras – Unidade de inteligência financeira do Brasil. Disponível em: http://www.coaf.fazenda.gov.br/pld-ft/sobre-a-lavagem-de-dinheiro. Acesso em: 19.03.2014 21 “O Grupo de Ação Financeira contra a Lavagem de Dinheiro e o Financiamento do Terrorismo (GAFI/FATF) é uma organização intergovernamental cujo propósito é desenvolver e promover políticas nacionais e internacionais de combate à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo. Criado em 1989, o GAFI é um organismo elaborador de políticas que atua visando a gerar a vontade política necessária para realizar reformas legislativas e regulatórias nessas áreas.” BRASIL, COAF - Conselho de Controle das Atividades Financeiras – Unidade de inteligência financeira do Brasil. Disponível em: http://www.coaf.fazenda.gov.br/atuacao-internacional/participacao-no-gafi. Acesso em: 20.03.2014

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instituições financeiras não tradicionais – casas de cambio, cassinos- e por meio da introdução

na economia diária – restaurantes, hotéis, empresas aéreas-” 22.

b. Dissimulação, estratificação ou layering- Carla Veríssimo conceitua essa etapa como

sendo “a criação de múltiplas camadas de transações” 23 que acabam por afastar ainda

mais os valores de sua fonte irregular para assim dificultar o rastreamento do “lastro”

que o dinheiro possa deixar. Nessa etapa são feitas inúmeras transações e operações

financeiras sucessivas utilizando-se para isso bancos internacionais, contas e vários

tipos de investimentos. Aqui se pode observar ainda mais a importância da cooperação

internacional para se tentar achar a origem do dinheiro e tentar se desarticular os

paraísos fiscais.

c. Integração ou integration- O dinheiro volta para os criminosos formalmente para que

possam desfrutar dos valores sem levantar suspeitas das autoridades nacionais.

Geralmente, se fazem investimentos imobiliários, aplicações em empresas,

automóveis.

Apesar da diferença na denominação das três etapas pela COAF e pela doutrina, o

conceito apresentado dentro de cada etapa permanece praticamente o mesmo.

Figura 2 - Correspondência entre as classificações da COAF e a Doutrina.

Fonte: Elaborada pela autora.

Importante destacar que essa divisão das fases não deve ser emoldurar ou ser

entendida como absoluta, pois em certos casos pode ocorrer que em uma só operação se

conclua todo o processo do tipo penal.

22 BRAGA, Romulo Rhemo Palitot. O fenômeno da lavagem de dinheiro e o bem jurídico protegido. Curitiba. Juruá, 2010.Página 30. 23 DE CARLI, Carla Veríssimo. Lavagem de dinheiro: ideologia da criminalização e análise do discurso. Porto Alegre. Verbo Jurídico, 2008. Página 118.

COAF

Colocação

Ocultação

Integração

Doutrina

Ocultação, colocação ou placement

Dissimulação, estratificação ou layering

Integração ou integration

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O artigo 1º da Lei 9.613 trás expressamente somente o verbo “ocultar” e o

“dissimular”, a ação de integrar é subentendida nos demais parágrafos desse artigo, assim

como no restante da norma.

Art. 1o Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição,

movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou

indiretamente, de infração penal. (Redação dada pela Lei nº 12.683, de 2012)

I –a VIII - (revogado). (Redação dada pela Lei nº 12.683, de 2012)

Pena: reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº

12.683, de 2012)

§ 1o Incorre na mesma pena quem, para ocultar ou dissimular a utilização de

bens, direitos ou valores provenientes de infração penal: (Redação dada pela Lei nº

12.683, de 2012)

I - os converte em ativos lícitos;

II - os adquire, recebe, troca, negocia, dá ou recebe em garantia, guarda, tem

em depósito, movimenta ou transfere;

III - importa ou exporta bens com valores não correspondentes aos

verdadeiros.

§ 2o Incorre, ainda, na mesma pena quem: (Redação dada pela Lei nº 12.683,

de 2012)

I - utiliza, na atividade econômica ou financeira, bens, direitos ou valores

provenientes de infração penal; (Redação dada pela Lei nº 12.683, de 2012)

II - participa de grupo, associação ou escritório tendo conhecimento de que

sua atividade principal ou secundária é dirigida à prática de crimes previstos nesta

Lei24.

Figura 3 – Fases do Crime de Lavagem de Dinheiro.

Fonte: Página do COAF - Conselho de Controle das

Atividades Financeiras25.

24 BRASIL, Portal Planalto – Presidência da República LEI Nº 9.613, DE 3 DE MARÇO DE 1998. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9613.htm. Acesso em: 19.03.2014.

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5. Alterações da Lei 9.613 ocorridas em 2012

Como já salientado em momentos anteriores do texto, a Lei nº 12.683 de 09 de julho

de 2012 trouxe consideráveis alterações ao texto original da Lei nº 9.613. As modificações

foram impulsionadas por críticas doutrinárias, além da necessidade de se enquadrar a norma à

evolução da sociedade e por consequência dos crimes.

A COAF em sua página virtual apresenta as principais alterações, tais como:

• A extinção do rol taxativo de crimes antecedentes, admitindo-se

agora como crime antecedente da lavagem de dinheiro qualquer infração

penal;

• A inclusão das hipóteses de alienação antecipada e outras medidas

assecuratórias que garantam que os bens não sofram desvalorização ou

deterioração;

• Inclusão de novos sujeitos obrigados tais como cartórios,

profissionais que exerçam atividades de assessoria ou consultoria

financeira, representantes de atletas e artistas, feiras, dentre outros;

• Aumento do valor máximo da multa para R$ 20 milhões.26

25 BRASIL, COAF - Conselho de Controle das Atividades Financeiras – Unidade de inteligência financeira do Brasil. Disponível em: http://www.coaf.fazenda.gov.br/links-externos/fases-da-lavagem-de-dinheiro. Acesso em: 19.03.2014 26 BRASIL, COAF - Conselho de Controle das Atividades Financeiras – Unidade de inteligência financeira do Brasil. Disponível em: http://www.coaf.fazenda.gov.br/links-externos/fases-da-lavagem-de-dinheiro. Acesso em: 19.03.2014.

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Conclusão

O crime de lavagem de dinheiro constitui um tipo penal autônomo, no entanto

sempre figurará como acessório de uma prática delitiva anterior. A tentativa de mascarar a

origem ilícita de dinheiro é uma das bases que dão sustentação a enorme e cada vez mais

sofisticada rede de crimes existentes no mundo inteiro, pois os grupos criminosos são

verdadeiras empresas que geram dinheiro através do tráfico de drogas, da corrupção ou o

tráfico de pessoas, por exemplo, e precisam converter esse dinheiro para o sistema

financeiro formal e dessa maneira tirar proveito dos seus negócios obscuros que lecionam a

sociedade, impulsiona a violência e continuam a financiar mais crimes.

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Referências

• ANSELMO, Márcio Adriano. Lavagem de dinheiro e cooperação jurídica

internacional. São Paulo: Saraiva,2013.

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resumo,crimes-de-lavagem-de-dinheiro-lei-n-961398-doutrina-jurisprudencia-e-

exercicios-atualizada-com-a-lei-n-126832,37655.html. Acesso em:10.03.2014.

• DE CARLI, Carla Veríssimo. Lavagem de dinheiro: ideologia da criminalização e

análise do discurso. Porto Alegre. Verbo Jurídico, 2008.

• BRAGA, Romulo Rhemo Palitot. O fenômeno da lavagem de dinheiro e o bem

jurídico protegido. Curitiba. Juruá, 2010.

• BRASIL, Portal Planalto – Presidência da República. .Decreto nº 154 de 26 de Junho

de 1991. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-

1994/D0154.htm. Acessa em: 19.03.2014.

• BRASIL, Portal Planalto – Presidência da República LEI Nº 9.613, DE 3 DE MARÇO

DE 1998. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9613.htm. Acesso

em: 19.03.2014.

• BRASIL, COAF - Conselho de Controle das Atividades Financeiras – Unidade de

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ft/sobre-a-lavagem-de-dinheiro. Acesso em: 19.03.2014.

• BRASIL, COAF - Conselho de Controle das Atividades Financeiras – Unidade de

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• BRASIL, COAF - Conselho de Controle das Atividades Financeiras – Unidade de

inteligência financeira do Brasil. Disponível em: http://www.coaf.fazenda.gov.br/atuacao-

internacional/participacao-no-gafi. Acesso em: 20.03.2014

• BRASIL, COAF - Conselho de Controle das Atividades Financeiras – Unidade de

inteligência financeira do Brasil. Disponível em: http://www.coaf.fazenda.gov.br/links-

externos/fases-da-lavagem-de-dinheiro. Acesso em: 19.03.2014.

• Conteúdo Jurídico. Disponível em: http://www.conteudojuridico.com.br/artigo,o-

novo-crime-de-lavagem-de-dinheiro-e-a-infracao-penal-antecedente-legislacao-de-

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