“Letramento Como Liberdade” - Uma Análise da Concepção de Letramento

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    Anais do X Encontro do CELSUL Crculo de Estudos Lingusticos do SulUNIOESTE - Universidade Estadual do Oeste do ParanCascavel-PR | 24 a 26 de outubro de 2012 | ISSN 2178-7751

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    LETRAMENTO COMO LIBERDADE: UMA ANLISE DA CONCEPO DELETRAMENTO

    Hrika Ribeiro dos Santos CONSALTER1

    RESUMO: Sob a perspectiva terica dos Novos Estudos de Letramento (STREET, 1984,

    1995, 2010; BARTON; HAMILTON, 1998), nossa proposta, neste artigo, consiste em

    analisar como o Projeto Produo de Sentidos nas Diferentes Representaes Culturais:Encontros e Desencontros, da Rede de Colgios Maristas, que tem por base o Projeto

    Letramento como Liberdade, da UNESCO, articula as concepes de letramentos a fim decontribuir com o empoderamento do cidado. Para empreender nossos gestos de leitura,

    fixamos o olhar em vrias discusses relacionadas ao letramento e entendemos que apesquisa proposta pode contribuir com a formao de educadores mais reflexivos e alunos

    letrados nos mais diferentes sentidos que o termo pode ancorar. A anlise mostrou que,apesar de o projeto apresentar uma proposta de trabalho que visa ao empoderamento do

    aluno-cidado, oscila na apresentao das concepes de letramento, pois ora literacia

    sinnimo de alfabetizao, ora apresentada em uma perspectiva social e tem como foco o

    desenvolvimento de habilidades e competncias as quais permitem ao indivduo transitar nos

    mais diferentes meios sociais.

    PALAVRAS-CHAVE: Letramento; Empoderamento; Prticas escolares.

    ABSTRACT: Under the theoretical approach of the New Studies of Literacy (STREET, 1984,1995, 2010; BARTON; HAMILTON, 1998), our purpose, in this article, consists in analyzing

    how the Project Construction of Senses in the Different Cultural Representations:

    Agreements and Disagreements, from the chain of Marista Schools, which is based on the

    Project of UNESCO Literacy as Freedom, deals with the literacy conceptions in order to

    contribute with the citizens empowerment. Undertaking our reading gestures, we have

    focused our attention in various discussions related to literacy and we have understood that

    the current research may contribute with a more reflexive teacher education and with the

    students literacy in different senses of that term. In spite of the project has been based on a

    purpose which aims the empowerment of the student-citizen, the analyses has shown that the

    project has varied in its presentation of the literacy conceptions, sometimes consideringliteracy as synonym of knowing reading and writing and sometimes being presented in a

    social perspective focusing on the development of skills and competencies which allow the

    human being passes through different social circles.PALAVRAS-CHAVE: Literacy;Empowerment; Teaching Practices.

    1 Introduo

    Letrar adquire uma perspectiva maior que ensinar a ler e a escrever dentro de umcontexto em que a escrita e a leitura tenham sentido e faam parte da vida do aluno. Essateoria defendida por Soares (1998), professora titular da Faculdade de Educao da UFMG

    1Doutoranda pela Universidade Estadual de Maring. Professora Colaboradora na Universidade Estadual deMaring. Professora e Coordenadora de Lngua Portuguesa do Colgio Marista de Maring. E-mail:[email protected]

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    (Universidade Federal de Minas Gerais) e doutora em educao, a qual explica que, aoolharmos historicamente para as ltimas dcadas, poderemos observar que o termoalfabetizao, sempre entendido de uma forma restrita como aprendizagem do sistema daescrita, foi ampliado. J no basta aprender a ler e escrever, necessrio mais que isso para ir

    alm da alfabetizao funcional (denominao dada s pessoas que foram alfabetizadas, masno sabem fazer uso da leitura e da escrita).Nesse sentido, fundamental falar que h muito o letramento no se basta dentro de

    uma perspectiva psicolgica e histrica apenas, mas se abre perspectiva social e etnogrfica,a qual se consolidou com Heath (1983) e Street (1984) nos anos 1990 sob a nomenclatura de

    New Literacy StudiesNovos Estudos de Letramento, que nortear as discusses realizadasneste artigo. Isso, de certa forma, humaniza a questo uma vez que amplia a viso, mostrandoas lacunas e o entorno do problema. Para Heath e Street, o letramento no cabe numa anlisefechada, mas se abre para as questes do social e do poltico, da vida do homem real nasociedade contempornea.

    A Rede de Colgios Marista, pensando em tornar seus alunos cidados mais letrados,

    props um trabalho com encaminhamentos que propiciem o desenvolvimento do letramento.Assim, o objetivo do presente artigo apresentar algumas reflexes tericas em relao aofenmeno do letramento, sendo o foco central das discusses a sua origem, o seu processohistrico, as suas principais caractersticas e como ele tratado no projeto elaborado pelocolgio Marista, o qual pautado num projeto maior, elaborado pela UNESCO. Partimos do

    princpio de que este artigo pode ser considerado relevante na medida que nos propusemos arefletir sobre o fenmeno letramento considerado, ainda por muitos educadores e educandos,como uma dimenso terica e metodolgica estranha em sua prtica pedaggica de sala deaula.

    2 Discusso terica

    O termo Letramento recente nos estudos acadmicos brasileiros. Ele datado a partirda dcada de 1980 e tem como objetivo relacionar as mediaes ocorridas entre os sujeitos esuas relaes sociais e o mundo da cultura escrita. Assim, de acordo com Soares (1998, p. 40),o indivduo letrado aquele que vive em estado de letramento, e no s aquele que sabe ler eescrever, mas o que usa socialmente a leitura e a escrita, pratica a leitura e a escrita, respondeadequadamente s demandas sociais de leitura e de escrita.

    A autora ainda ressalta que o termo letramento uma traduo da palavra inglesaliteracy, a qual significa pessoa educada, especialmente capaz de ler e escrever. Dessaforma, possvel dizer que ela concebe alfabetizao (alfabetizao do cdigo da leitura e da

    escrita pelo sujeito) como pr-requisito para o letramento (apropriao e uso social da leiturae da escrita pelo sujeito).Subjacente a essa concepo de letramento, encontra-se o argumento de que a escrita

    pode trazer consequncias de ordem social, cu ltural, poltica, econmica e lingustica, querpara o grupo social em que seja introduzida, quer para o indivduo que aprende a us-la(SOARES, 1998, p. 17).

    Confirmando a afirmao de Soares (1998), Kleiman (1995) acredita que o termoletramento comeou a ser usado no Brasil a partir da publicao da obra No mundo daescrita: uma perspectiva psicolingustica (Editora tica, 1986), de Mary Kato, em que alngua falada culta consequncia do letramento. Assim, a partir de 1986, o termo passou afazer parte do cenrio educacional brasileiro. Ele, ento, deixa de ser tratado como sinnimo

    de alfabetizao e passa a ter uma amplitude maior, reconhecida, inclusive por dicionrios.Houaiss (2001, p. 1474) apresenta trs significados para o termo: 1. Representao da

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    linguagem falada por meio de sinais; escrita. 2. Alfabetizao (processo). 3. (dcada de 80)conjunto de prticas que denotam a capacidade de uso de diferentes tipos de materiaisescritos.

    Ainda nos anos 1980, Tfouni publica a obra Adultos no alfabetizados: o avesso do

    avesso, na qual a autora apresenta a distino entre alfabetizao e letramento e d maissustentao ao que, a partir dessa poca, concebe-se como letramento.Duas dcadas depois, Tfouni (2000, p. 20), tomando por base Vygotsky, defende que o

    letramento representa, por um lado, transformao e mediao, e por outro, a sofisticao deformas mais elaboradas do comportamento humano, os processos mentais superiores:raciocnio abstrato, memria ativa e resoluo de problemas. Ampliando ainda a questo,Tfouni v o letramento como um produto do desenvolvimento da sociedade e uma causa detransformao dessa mesma sociedade e, como consequncia disso, o letramento a influencia.Longe de ser inocente ou neutro, o letramento carrega em si instrumentos lingusticos econceituais que esto ligados questo da cultura e da estrutura social.

    Nesse sentido, Tfouni (2000, p. 23) acredita que o termo iletrado no pode ser o

    antnimo de letrado. Isso significa que em uma sociedade no existe grau zero deletramento, mas graus de letramento. Para a pesquisadora, no existe relao sinonmicaentre no-alfabetizado e iletrado. Nas palavras dela, o iletramento no existe, enquantoausncia total, nas sociedades industriais modernas.

    Nos anos de 1990, Angela Kleiman e Magda Soares lanam, respectivamente, as obrasOs significados do letramento e Letramento: um tema em trs gneros, as quaiscontriburam ainda mais com as reflexes tericas e metodolgicas concernentes aoletramento, reafirmando e enfatizando o papel social que ele exerce.

    Tambm compactua com esse pensamento a autora e professora Maria de LourdesDionsio, da Universidade de Minho, a qual concedeu uma entrevista sobre o assunto para

    Nilcia Lemos Pelandr e Adriana Fischer, na UFSC, Florianpolis, em novembro de 2006.Dionsio afirma que letramento um conjunto de capacidades para usar o escrito.

    Indo ao encontro dessa concepo, Barton e Hamilton (1998) afirmam que antes deconstituir um conjunto de habilidades intelectuais, o letramento uma prtica cultural, scio ehistoricamente estabelecida, que permite ao indivduo apoderar-se das suas vantagens e,assim, participar efetivamente e decidir, como cidado do seu tempo, os destinos dacomunidade qual pertence e as tradies, hbitos e costumes com os quais se identifica. Acapacidade de enxergar alm dos limites do cdigo, fazer relaes com informaes fora dotexto falado ou escrito e vincul-las sua realidade histrica, social e poltica socaractersticas de um indivduo plenamente letrado.

    J Street (1995) utilizou a expresso "Literacy practices" como um meio de focalizar

    as prticas sociais e concepes do ler e escrever. Ele define o letramento segundo duasperspectivas: a autnoma e a ideolgica e defende que a literacia, na concepo autmona,destinada s pessoas pobres, analfabetas, residentes em aldeias, ou jovens urbanos,

    promoveria desenvolvimento dessas habilidades cognitivas e a possibilidade de ascensoeconmica, tornando-os melhores cidados, embora as condies sociais e econmicas que

    produziram sua "ignorncia" estejam em primeiro lugar. Segundo o autor, o modeloautnomo disfararia as suposies culturais e ideolgicas, fazendo com que o letramento seapresente como algo neutro e universal, capaz de promover esses benefcios. O modeloautnomo impe concepes ocidentais de alfabetizao/letramento de uma para outrasculturas, ou dentro de um pas, ou ainda de uma classe ou grupo cultural sobre outros.

    Fazendo uma contraposio a essa viso, o autor sugere o modelo ideolgico o qual

    oferece uma viso culturalmente mais sensvel das prticas de alfabetizao/letramento,contemplando a variao destas de um contexto a outro. Esse modelo prope no apenas a

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    aquisio neutra de habilidades tcnicas, mas uma prtica social que sempre est implcita nosprincpios epistemolgicos socialmente construdos. Os modos que as pessoas destinam leitura e escrita so arraigados a concepes de conhecimento, identidade e modos de ser eestar. Estes esto sempre inclusos em prticas sociais, em um mercado de trabalho especfico

    ou em um contexto educacional particular e os efeitos de aprender sero dependentes dessescontextos. Alfabetizao/letramento, nesse sentido, sempre competitiva e seus significados esuas prticas, consequentemente so verses particulares e, portanto, sempre "ideolgicas",

    pelo fato de que todas as prticas de letramento so aspectos no apenas da cultura, mastambm das estruturas de poder de uma sociedade.

    Ligados a esses modelos, essa nova perspectiva trouxe ainda dois fenmenos bsicosde letramento: os eventos e as prticas de letramento. Ainda retomando Street (2001), o autorafirma que a distino desses dois fenmenos puramente metodolgica uma vez que orientao pesquisador a observar situaes que envolvem a lngua escrita e a identificar ascaractersticas dessa situao. Os eventos de letramento, nas palavras de Heath (1983), so assituaes em que a lngua escrita estabelece a interao e o processo de interpretao das

    partes envolvidas. J as prticas de letramento, nas palavras de Street (1995), designam ocomportamento e as concepes culturais e sociais dos participantes de um evento deletramento. Em sntese, os eventos e as prticas de letramento so constitudos pela presenaou pela referncia ao texto escrito.

    Ainda fazendo referncia aos conceitos do autor, Street (1984) considera maisadequado o uso da nomenclatura letramentos (no plural). Ele afirma que

    [...] seria, provavelmente, mais apropriado referimo-nos a letramentos doque a um nico letramento, e devemos falar em letramentos e no deletramento, tanto no sentido de diversas linguagens e escritas, quanto nosentido de mltiplos nveis de habilidades, conhecimentos e crenas, no

    campo de cada lngua e/ou escrita (STREET, 1984, p. 47).

    Marcuschi e Xavier (2010) fazem coro com Street (1995) ao afirmarem que oletramento um processo de aprendizagem social e histrica da leitura e da escrita emcontextos informais e de usos utilitrios, por isso um conjunto de prticas, ou seja,letramentos. Alm disso, Marcuschi e Xavier (2010, p. 23) mencionam os planos dedesenvolvimento sugeridos pela UNESCO (Organizao das Naes Unidas), os quais tmcomo base a crena de que a alfabetizao uma coisa boa e que a pobreza, a doena e oatraso geral esto vinculados com o analfabetismo, assim os autores chegam concluso deque, por sua vez, o progresso, a sade e o bem-estar econmico esto igualmente de formaautoevidente vinculados com a alfabetizao. No entanto, eles admitem que a histria da

    alfabetizao no comprova essas expectativas da UNESCO. importante considerar que essas expectativas da UNESCO vm de longa data. Street

    (2010) relata que, j em 1970, quando ele foi ao Ir pesquisar sobre o processo de migrao,pessoas da UNESCO diziam que o nico jeito de melhorar a sociedade, em termos dedesenvolvimento econmico, era aumentando o nvel de alfabetizao. No entanto, o autorchama a ateno para um aspecto de suma importncia e que, muitas vezes, no considerado: o fato de que o mesmo programa de alfabetizao no funciona da mesma formaem todos os lugares, pois, segundo Street, o letramento varia, porque as identidades sodiferentes, as habilidades tambm, alm do envolvimento em relao a questes sociais.

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    3 Anlise de dados

    Talvez pelo fato de o letramento, como sinnimo de alfabetizao, no ser garantia deuma vida scio-econmica favorecida, a UNESCO lanou, para os anos de 2003 a 2012, o

    projeto Letramento como Liberdade em que, num primeiro momento, define literaciacomoa Habilidade de ler e escrever, com compreenso, um recado ou notcia relativa vida diria.Envolve um continuun nas habilidades/competncias de leitura e de escrita e, normalmente,inclui tambm atividades bsicas de aritmtica. Nessa perspectiva, o conceito de letramentoapresentado no est ligado apenas a conhecimentos, ao que as pessoas adquirem ou deixamde adquirir, mas ao saber o que, em determinadas situaes cotidianas, elas so capazes deusar, a fim de participarem mais ativamente da vida em sociedade. O conceito adotado aquiaproxima-se daquele proposto por Soares (1998) alfabetizar letrando.

    Alm desse conceito apresentado, o projeto da UNESCO procura aprofundar umpouco mais o significado do termo letramento, para o qual utiliza o sinnimo literacia,ressaltando que ele significa o domnio e a produo de saberes que do sentido para a

    realidade, tais como: valores, representaes, comportamentos, intenes e ideologias com osquais as pessoas tm contato. Ressalta tambm que o letramento abarca a diversidade deinterpretaes, de sentidos, na busca das explicaes para a realidade, isto , concebe oletramento como um caminho para o acolhimento da multiculturalidade e um direito quedeveria ser assegurado a todo cidado.

    No projeto, apresentado um esclarecimento de que a palavra literacia, emprincpio, era utilizada para explicar a aquisio das competncias lingusticas e de leitura.Depois disso, mencionado que essa designao foi ampliada e hoje se fala de literaciacientfica, matemtica, histrica, geogrfica, computacional etc.. Assim como na noo deletramento, o conceito no est ligado apenas s coisas que as pessoas aprendem ou deixamde aprender, mas saber o que, em determinadas situaes da vida, as pessoas so capazes deusar em seu cotidiano, para uma participao ativa nos espaos onde vivem.

    De acordo com o projeto da UNESCO, a literacia a capacidade de processar ainformao escrita e us-la, com intenes e sentidos, para agir na sociedade, com conscinciae com capacidade de interveno. Por isso, literacia, como capacidade de conhecer e intervirno mundo, implica empoderamento, alm de possibilidade de participao e de deciso.

    Dessa forma, pode-se dizer que literaciasignifica o domnio e a produo de saberesque do sentidos para a realidade. Esse processo no mecnico nem homogneo (igual paratodos): ele est relacionado aos diferentes valores, representaes, comportamentos,intenes, ideologias, que as pessoas constroem e vivem, nas diferentes sociedades e que so

    possveis ou no em decorrncia de fatores socioculturais. Isso significa que no h apenas

    uma leitura possvel. A literacia implica uma diversidade de interpretaes, de sentidos, nabusca das explicaes para a realidade.Nessa perspectiva, o reconhecimento de vrios sentidos na construo dos

    conhecimentos leva a compreender a literacia como um caminho para o acolhimento damulticulturalidade e a reconhec-la como um direito. Reconhecer o acesso ao conhecimentocomo direito tambm faz parte do Projeto Marista:

    A educao marista, empenhada na luta por justia e por estruturas desolidariedade, valoriza o indivduo como sujeito de direitos e criaoportunidades para seu acesso a espaotempos sociais, culturais eeducacionais (UNIO MARISTA DO BRASIL, 2010, p. 26).

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    Esse projeto, que objeto de anlise desta pesquisa, defende que o tema do letramento de extrema importncia para o campo da educao e, por isso, lanou a proposta do IIICongresso Virtual Interdisciplinar Marista, no qual sero realizadas discusses acerca da

    Literacia, dentro da perspectiva de diversidade de produo de sentidos no mundo

    contemporneo, a fim de, ao menos tentar, tornar todos os sujeitos envolvidos cada vez maiscompetentes e dispostos a viver, ler, interpretar e agir, construindo uma sociedademulticultural baseada no reconhecimento, no respeito mtuo e na paz.

    A Dcada da Literacia da ONU expressa o desejo da comunidade internacional depromover o ambiente literato para todos, tanto nos pases desenvolvidos quanto nos emdesenvolvimento. Entende-se que pais com um nvel cultural mais avanado mandam seusfilhos para a escola; pessoas literatas aproveitam mais as oportunidades de continuar suaformao; sociedades literatas esto melhores preparadas para se desenvolverem. Essa dcada

    para a Literacia das Naes Unidas foi declarada pela Assembleia Geral da ONU emdezembro de 2001, com o pressuposto de que a literacia fundamental para a aquisio decompetncias essenciais para a vida de todos. Crianas, jovens e adultos no podem aspirar

    autonomia e liberdade sem literacia. A estratgia da ONU tem como objetivo apoiar aeducao para todos, nomeadamente os 774 milhes de adultos e 72 milhes de crianas semacesso escola e, consequentemente, sem acesso alfabetizao.

    Para a Unesco, a literaciaest no cerne da educao bsica e essencial nas lutas paraa erradicao da pobreza, para a reduo da mortalidade infantil, para limitar o crescimento

    populacional, para alcanar a igualdade de gnero e assegurar o desenvolvimento sustentvel,a paz e a democracia. Ao reconhecer a diversidade, a literaciafavorece o dilogo, o respeito,a compreenso da complexidade e riqueza das sociedades humanas. O carter interdisciplinare as preocupaes com a literacia como uma forma de empoderamento e de integraoapresentados pela UNESCO so consoantes com os princpios e objetivos do ProjetoEducativo Marista para o ano de 2012.

    Dessa forma, vale analisar a proposta e verificar qual (is) ou so a(s) concepo(es)de letramento(s), de fato, adotada(s) no projeto, visto que, nos dados apresentados at aqui, japareceram, pelo menos, trs conceitos distintos.

    A anlise que ora se prope visa ao estudo do projeto III CONGRESSO VIRTUALINTERDISCIPLINAR MARISTA - LITERACIA: conexo, dilogo e liberdade no que tange aquestes relativas aos estudos a respeito de letramento. Anualmente, o colgio desenvolve

    projetos envolvendo as diferentes reas do conhecimento e, neste ano, o foco, ancorado naDcada da Literacia da ONU, o letramento.

    Logo aps a apresentao do ttulo do projeto, apresentado o emblema da Dcada daLiteracia e, na sequncia, so mencionadas algumas informaes a respeito do projeto. Dentre

    elas, ressaltado que a UNESCO lidera, nos anos de 2003 a 2012, a Dcada da Literacia dasNaes Unidas (UNLD, em ingls), que tem como tema: Literacia como Liberdade. Essadcada foi lanada em 2003, pela ONU, tendo como objetivo aumentar o nvel de literaciae, com isso, empoderar as pessoas. citado que a comunidade internacional reconhece a

    promoo da literaciacomo de interesse de todos, como parte dos esforos pela paz, respeitoe trocas no mundo globalizado. Paralelamente, a UNESCO lanou a campanha: Literacia parao Empoderamento (LIFE) em 2005, como estratgia dos oito Objetivos do Milnio, que,

    juntamente com o programa Educao para Todos, tem como meta o aumento da taxa dealfabetizao em 50%, at 2015.

    vlido ressaltar que os oito Objetivos do Milnio foram criados pela ONU no ano2000 aps a anlise dos maiores problemas mundiais. O programa Educao para Todos,

    segundo dentre os oito objetivos apresentados, nasceu em 1990 com a finalidade deproporcionar educao bsica para todas as crianas e reduzir o analfabetismo entre adultos

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    at o final da dcada de 90. No ano 2000, o Frum Mundial da Educao reafirmou osobjetivos do programa determinando que, at 2015, todas as crianas devero ter acesso educao bsica gratuita e de boa qualidade.

    Tendo como base o projeto da UNESCO, o projeto do colgio Marista menciona umadefinio deLiteracia:

    Habilidade de ler e escrever com compreenso, um recado ou notcia relativa vida diria. Envolve um continuunnas habilidades/competncias de leiturae de escrita e, normalmente, inclui tambm habilidades bsicas de aritmtica(ORGANIZAO DAS NAES UNIDAS, 2011a).

    Logo aps a apresentao dessa definio de letramento, so elencados algunscomentrios para a elucidao do termo os quais permitem verificar uma viso ancorada nos

    Novos Estudos de Letramento, pois a literacia entendida como o domnio e a produo de

    saberes que do sentidos para a realidade. vlido ressaltar que, quando esses saberes soapresentados, normalmente, no so saberes dos grupos menos desenvolvidos, mas daacademia e de ouras instituies de poder. Alm disso, ressalta-se que esse processo no mecnico nem homogneo (igual para todos), mas que ele est relacionado aos diferentesvalores, representaes, comportamentos, intenes, ideologias, que as pessoas constroem evivem, nas diferentes sociedades. Dessa forma, literacia implica uma diversidade deinterpretaes, de sentidos, na busca das explicaes para a realidade.

    Essa concepo vai ao encontro da concepo de Kleiman (1995) a qual considera quea leitura e a escrita fazem parte de atividades sociais, tais como ler um manual ou pagarcontas. Da a importncia de se entender a leitura e a escrita no s como atividades com umfim em si mesmas tal como prope o modelo autnomo de letramento, mas como atividades

    que servem a um propsito e, analisar esse propsito, deve ser parte de um modelo maiseficaz de letramento. Alm disso, Kleiman (2000) apresenta que as mltiplas prticas deletramento da vida social devem ser estruturantes das atividades escolares em todos os nveis,as quais devem ter como origem interesses da vida do aluno.

    Depois disso, so mencionadas as relaes da dcada da literacia com a educaomarista e evidenciado que esta se empenha na luta por justia e por estruturas desolidariedade, valoriza o indivduo como sujeito de direitos e cria oportunidades para seuacesso a diversos contextos e situaes sociais, culturais e educacionais. Os elaboradores do

    projeto alegam que existem timas razes para fazer da literacia o tema central do IIICongresso Virtual Interdisciplinar Marista, tais como criar oportunidades para os sujeitosescolares exercerem a cidadania por meio de debates sobre um tema dessa relevncia,favorecendo o desenvolvimento de competncias para exercer a vida participativa e para o

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    constante aprender (aprender a aprender). Sendo assim, a rede marista de colgios prope essecongresso, que tem como objetivos

    Estimular e promover o estudo daLiteraciaentre os diversos sujeitos escolares na

    PMBCS (Provncia Marista Brasil Centro Sul), numa perspectiva de respeito multiculturalidade. Promover, por meio do estudo da Literacia, o esprito cooperativo e o respeito

    mtuo, tendo em vista os objetivos da UNESCO e os ideais do Projeto EducativoMarista.

    Promover a integrao das Unidades e dos profissionais das diferentes reas esegmentos de ensino.

    Oferecer momentos de crescimento pessoal e de explorao de diferentescompetncias/habillidades, por meio do desenvolvimento do raciocnio lgico eda organizao do pensamento ao planejar aes e tomar decises.

    Desenvolver posturas, atitudes e valores pertinentes ao exerccio do trabalho emequipe e em projetos coletivos com regras definidas e de resoluo de problemas,como a sociabilidade, a responsabilidade diante do trabalho, a criticidade e a

    busca pela superao de dificuldades.

    O primeiro objetivo ressalta a multiculturalidade, a qual, segundo Martins (2012), uma abordagem de cunho social e cultural existente dentro de um pas, em dada comunidade etambm dentro de uma mesma escola. Trabalhar dentro de uma dimenso multiculturalimplica trabalhar levando em conta a heterogeneidade do corpo docente e discente, e nofocalizar apenas em torno de uma cultura homognea e hegemnica.

    difcil mensurar essa multiculturalidade quando se refere a alunos maristas, visto

    que a maioria pertence a classes sociais privilegiadas e tem fcil acesso a cultura. No entanto,se o projeto englobar alunos das obras sociais maristas, as quais atendem s comunidadescarentes, essas diferenas ficam mais evidentes e, portanto, o trabalho com o tema torna-semais real e significativo.

    Kleiman (1995) assegura que, gradativamente, os estudos sobre o fenmenoletramento - que at ento voltavam as suas atenes para os efeitos do letramento em umadimenso universal - passaram a contemplar unidades isoladas, tais como gruposminoritrios em certas comunidades e comunidades no - industrializadas, preocupando-se emdescrever as condies de usos da escrita naqueles contextos com a finalidade decompreender como eram e quais eram os efeitos da prtica de letramento naquelascomunidades minoritrias, que comeavam a integrar a escrita como uma tecnologia de

    comunicao dos grupos que sustentavam o poder. Essa preocupao parece tambm estarpresente no objetivo exposto.O segundo objetivo promover, por meio do estudo da Literacia, o esprito

    cooperativo e o respeito mtuo, tendo em vista os objetivos da UNESCO e os ideais doProjeto Educativo Marista. Para o desenvolvimento desse objetivo, o colgio prope otrabalho com produes artsticas, tais como desenho,pintura ou HQ, fotografia,filme/vdeo,

    poema, poesia ou crnica. No entanto, em momento algum se sugere como pode ser feita aintegrao entre o objetivo e a materialidade a qual ele precisa alcanar, ou seja, entre oletramento que se pretende desenvolver a as prticas que sero utilizadas para desenvolv-lo.

    Projeto Marista para o Ensino Fundamental endossa esse objetivo, pois acredita que asdiferentes realidades dos sujeitos evidenciam que no possvel separar a educao do meio

    social, pois ela deriva das demandas do meio, assim como tambm as provoca. Nessa

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    perspectiva, interessa rede de colgios o desenvolvimento da capacidade criativa dossujeitos, a viso de mundo, de enfrentamento das adversidades, do inusitado, de explorao e

    produo do indito vivel.Esses objetivos so mencionados no projeto e merecem ateno, no entanto o objetivo

    maior a elaborao de trabalhos cujo tema central Produo de Sentidos nas DiferentesRepresentaes Culturais: Encontros e Desencontros. Com o intuito de favorecer a pesquisa,o tema principal do Congresso Virtual foi direcionado em dois subtemas, oferecidos comoopes para os alunos:

    Subtema 1Direitos Humanos e MulticulturalidadeSubtema 2Representaes do Mundo e Produo de IdentidadesAps a escolha de um dos subtemas, os grupos precisaro ser orientados para

    selecionarem um objeto de estudo, organizarem seus trabalhos de pesquisa (levantamento oucoleta de dados, de referncias, entrevistas, questionrios etc.) e de produo textual eartstica.

    3.1 Subtema 1Direitos Humanos e Multiculturalidade

    - Literacia como um direito humano e como expresso da multiculturalidade

    O conceito de direitos humanos um conceito histrico do mundo moderno, quecomeou a tomar forma com a Revoluo Francesa e com a Declarao dos Direitos do

    Homem e do Cidado (1789). Em 1948, aps a Segunda Guerra Mundial, a ONU adotou aDeclarao Universal dos Direitos Humanos. Ambas as declaraes no tm fora de lei, masprocuram definir, fundamentalmente, os significados e os contornos de direitos humanos e deliberdades individuais e fazer com que os Estados Nacionais cumpram suas prescries. EssasDeclaraes trazem uma srie de princpios e preceitos que possuem uma vocao deuniversalidade, ou seja, expressam direitos inerentes pessoa, independentemente a sua

    posio social, nacionalidade, raa, credo, gnero, origem etc. Os direitos so divididos emdireitos humanos, sociais, polticos, econmicos e culturais e pressupem que todas as

    pessoas devam ter acesso a eles. Dentre os direitos humanos, encontra-se a literacia, traduzidacomo o acesso educao, cultura e participao cidad.

    Porm, esta vocao universalista pode colocar em risco outro direito, conferidoigualmente a todos: o respeito s diferenas culturais. Se no houver esse respeito, corre-se orisco de um imperialismo cultural. Ou seja, preciso respeitar as diferenas cultu rais egarantir que as culturas respeitem os direitos humanos universais.

    Escolhendo esse tema para desenvolver a pesquisa, os alunos devero trabalhar naperspectiva de compreender as relaes entre produo de conhecimento, de culturas e os

    direitos humanos. uma proposta louvvel, pois vai ao encontro do que os Novos Estudos doLetramento propem, que o letramento no desvinculado do contexto cultural e social noqual construdo, bem como do significado que as pessoas atribuem escrita e das relaesde poder que regem os seus usos, de modo que a juno desses fatores resulta em letramentosmltiplos que variam de comunidade para comunidade, por conta das condiessocioeconmicas, culturais e polticas que as influenciam (cf. TERZI, 2006; STREET, 2003).

    Terzi (2006, p. 5) aponta que, na prtica, a opo pelo modelo ideolgico deletramento exige no apenas ensinar aos alunos a tecnologia da escrita, ou seja, promover aalfabetizao, mas, simultaneamente, oferecer-lhes a oportunidade de entender as situaessociais de interao que tm o texto escrito como parte constitutiva e as significaes que essa

    interao tem para a comunidade local e que pode ter para outras comunidades. Em suma,

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    significa ensinar o aluno a usar a escrita em situaes do cotidiano como cidado crtico(TERZI, 2006, p. 5).

    3.2 Subtema 2Representaes do Mundo e Produo de Identidades

    - Literacia como forma de expresso cultural e como produo de identidades

    Neste subtema discute-se a literacia como leitura, interpretao e ao no mundo. Aliteracia a produo e o uso de um conjunto de signos e smbolos, utilizados de diferentesmaneiras, por diferentes culturas. Ao expressar esta leitura de mundo, criam-se diferentesrepresentaes do mundo e, ao criar representaes para explicar o mundo, indivduos egrupos produzem tambm suas identidades.

    Falar de identidades pressupe falar em igualdades e em diferenasquem parte dogrupo e quem no ou, quem est includo e quem est excludo. Alm disso, precisoconsiderar que estas identidades e diferenas so produzidas culturalmente e, portanto, noso naturais. Segundo Silva (2011, p. 3):

    Afirmar a identidade significa demarcar fronteiras, significa fazer distinesentre o que fica dentro e o que fica fora. Essa demarcao de fronteiras, essaseparao e distino, supem e, ao mesmo tempo, afirmam e reafirmamrelaes de poder. Ns e eles no so, neste caso, simples distinesgramaticais. Os pronomes ns e eles no so, aqui, simples categoriasgramaticais, mas evidentes indicadores de posies-de-sujeito, marcadas porrelaes de poder.

    A construo das identidades um ato da cultura: da lingustica, do sistema tico emoral, das relaes de poder, da educao etc.. A educao, com seus rituais, currculos,

    formas de avaliao, relaes entre os sujeitos escolares, tem papel fundamental na formaoe na fixao das identidades. Ao escolher este subtema, a escola ir trabalhar no sentido decompreender como se do os mais diversos processos de construo dos conhecimentos paracompreender e respeitar as identidades em suas multiplicidades, promovendo a convivnciaacolhedora e a paz, como pretende a ONU e o Projeto Marista.

    Em ambos subtemas, professores e alunos trabalharo na perspectiva interdisciplinar,contextualizando sua pesquisa temporal e espacialmente, valendo-se de diferentes referncias.De acordo com o projeto, a pesquisa dever se basear em diferentes fontes. Haver hdisposio da comunidade educativa um hotsite do projeto, o qual oferecer inicialmentealgumas pistas e apoios, como links, textos, entrevistas e outros instrumentos que auxiliarono processo de pesquisa.

    Um aspecto que merece destaque que, antes de o projeto ser efetivamenteapresentado aos alunos do EM, os quais participaro da produo dos artigos, foram gravadosquatro vdeos com o intuito de despertar o interesse da comunidade educativa para arealizao do projeto.

    O primeiro vdeo apresentado aos alunos tinha como temas: O que literacia eDcada da Literacia, o qual objetivava aumentar o empenho efetivo em aes que

    promovessem o letramento no mbito educacional. Foi mencionado que, de acordo com oprojeto, na escala global, 1 em cada 5 adultos no l e no escreve e que os esforosrealizados durante a dcada da literacia esto focados nas pessoas e nos grupos sociaismarginalizados (sobretudo as mulheres).

    Nesse primeiro vdeo, narrada a histria de uma mulher que havia parado de estudar

    h muito tempo e que estava retomando a vida escolar, com o auxlio da filha j adolescente.

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    A me estava bastante apreensiva com a volta ao colgio e a filha tentando tranquiliz-la. Nasala de aula, a cmera focaliza o texto Dcada da Literacia, para dar a impresso de que ame est estudando sobre essa temtica na sala de aula. No final, a aluna agradece a

    professora por ser to inteligente e por compartilhar o saber com os alunos.

    Ao refletir a respeito desse vdeo que introduziu o projeto de literacia no colgio,pode-se observar que o conceito de letramento no ultrapassa o da alfabetizao. Issosignifica que a escola est assumindo a sua funo primeira, que ensinar a ler e a escrever.

    No entanto, o vdeo poderia ter evidenciado que alfabetizar o aluno apenas o primeiro passopara dar sequncia a uma etapa que nunca se encerra: o letramento. Nas palavras de Soares(2004, p. 89), o letramento o uso efetivo e competente da leitura e da escrita nas prticassociais que envolvem a lngua escrita.

    Embora o vdeo mostre uma escola consciente da sua funo de escolarizao, mostratambm que ela nem sempre incorpora s suas funes o papel de letrar o aluno nesse

    processo. No vdeo, a aluna adulta estava apenas lendo a respeito da literacia e noparticipando de eventos e prticas de letramento. Isso significa que a escola, muitas vezes,

    deixa sorte de cada um dos alunos uma das mais importantes prxis pela qual responsvel.O segundo vdeo abordou a temtica Direitos humanos e Multiculturalidade, com o

    intuito de levar em considerao os diversos saberes, garantindo a multiculturalidade que, porsua vez, segundo o projeto, assegura a conquista dos direitos e o respeito, e promove, assim,uma sociedade mais humana.

    A histria de dois alunos que se dirigem biblioteca do colgio a fim de pesquisar oque literacia e encontram a seguinte definio A palavra literacia inicialmente erautilizada para explicar a aquisio de competncias de leitura e de clculo. Hoje, o conceito

    de literacia no se relaciona quantidade de conhecimentos que as pessoas podem adquirir,mas sim em saber o que, em determinadas situaes, as pessoas so capazes de usar e

    decidem usar no seu cotidiano para uma participao ativa no seu meio.Os alunos sentem dificuldades em entender a definio e solicitam a ajuda de um

    professor que tambm est na biblioteca. Este lhes d algumas sugestes para trabalhar com otema, dizendo que, quando eles fossem falar de direitos humanos, poderiam filmar estratgiasque garantissem o acesso ao conhecimento, como a escola para adultos ou mesmo pegar odepoimento de algum que j trabalhou ou frequentou cursos de informtica ou ingls emcomunidades carentes. Alm disso, acrescentou que eles poderiam trabalhar a questo dascotas para ndios, negros etc. e, depois disso, promover um debate na sala com a participaode algum convidado especialista na rea. Na sequncia, aparece a cena dos alunosagradecendo o professor e voltando para a sala de aula.

    Nesse vdeo, o professor falou de letramento considerando-o alm de alfabetizao,

    pois falou de outras prticas de letramento, alm da leitura e da escrita, mas todas elascontinuam atreladas ao letramento escolar. Alm disso, o professor sugeriu que os alunospesquisassem realidades diferentes daquela que eles vivenciam e isso bastante vlido, pois,de acordo com Street (2010), o letramento varia. Ele afirma que

    [...] as pessoas podem estar envolvidas em uma forma e no de outra, suasidentidades podem ser diferentes, suas habilidades podem ser diferentes,seus envolvimentos em relaes sociais podem ser diferentes. Por isso,selecionar s uma variedade de letramento pode no ter os efeitos que seespera (STREET, 2010, p. 37).

    Os outros dois vdeos no sero descritos por abordarem mais a sustentabilidade, que um dos outros 8 objetivos do milnio.

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    4 Consideraes finais

    Como se pode observar, a inteno do projeto em tornar os alunos mais letrados

    bastante vlida. H muito o que se depreender de tudo o que foi exposto. No entanto, apesarde vrias vezes apresentar concepes claras e atuais de letramento, em muitos momentos otermo abordado de forma bastante equivocada, o que demonstra que, talvez, os elaboradoresdo projeto no tenham muito claras as novas concepes do que letrar. E, se isso aconteceat com os idealizadores, preocupante como ser a receptividade desse projeto pelacomunidade educativa que quem, de fato, poder coloc-lo em ao.

    Pode-se dizer que esse projeto seria mais vivel para comunidades menos favorecidasdo que a comunidade marista, pois d-se a impresso de que ele, talvez, esteja fora de lugar,apenas para abordar um tema que est em voga no meio acadmico. Conforme aponta Terzi(2006), a opo por um modelo de letramento no neutra. A escolha por essa forma detrabalhar com o termo reflete muitas ideologias do colgio, as quais podero ser avaliadas

    posteriormente.

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