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a colecç A o STVDIVM GIORGIO DEL VECCHIO COLECÇÃO STVDIVM  TEMAS FILOSÓFICOS, JURÍDICOS E S OCIAIS GIORGIO DEL VECCHIO da Universidade de Roma o H hH W Ctí ARMÊNIO AMADO Editor - Sucessor LIÇÕES DE FILOSOFIA DO DIREITO 5.“ Edição TRADUÇÃO DE ANTÓNIO JOSÉ BRANDÃO REVISTA E PREFACIADA POR L. CABRAL DE MONCADA E ACTUALIZADA POR ANSELMO DE CASTRO ARMÉNIO AM ADO — EDITOR, SUCESSOR-COIMBRA

Lições de Filosofia Do Direito - Giorgio Del Vecchio

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  • 7/23/2019 Lies de Filosofia Do Direito - Giorgio Del Vecchio

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    a

    c o l e c A o

    S T V D I V M

    GIORGIODEL VECCHIO

    C O L E C O S T V D I V M

    TEMAS FILOSFICOS, JURDICOS E SOCIAIS

    GIORGIO DEL VECCHIOda Universidade de Roma

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    A R M N I O

    A M A D O

    Editor - Sucessor

    LIESDE FILOSOFIA

    DO DIREITO5. Edio

    TRADUO DE

    ANTNIO JOS BRANDO

    REVISTA E PREFACIADA POR

    L. CABRAL DE MONCADAE ACTUALIZADA POR

    ANSELMO DE CASTRO

    A R M N I O A M A D O E D I T O R , S U C E S S O R - C O I M B R A

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    LIESD E

    FILOSOFIA DO DIREITO

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    C O L E C O S T V D I V M

    TEMAS FILOSFICOS, JURDICOS B SOCIAIS

    GIORGIO DEL VECCHIOProfessor da Universidade de Roma

    LIESDE

    FILOSOFIA DO DIREITO

    TRADUO DE

    ANTNIO JOS BRANDOJ.aEDIO CORRECTA E ACTUALIZADA

    SEGUNDO A IO.aE LTIMA EDIO ITALIANA

    REVISTA E PREFACIADA POR

    L. CABRAL DE MONCADA

    E ACTUALIZADA POR

    ANSELMO DE CASTRO

    A R M N I O A M A D O - E D I T O R , S U C E S S O R - C O I M B R A - 1 9 7 9

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    Titulo original:Leziooi dl Filosofia dei Dtrltto

    Autor:Giorgio Del Vecchio

    Direitos exclusivos em lngua portuguesa deArmnio Amado Editor, Sucessor

    Ceira Coimbra Portugal 1979Coleco Studium,n.0158 e 59

    P R E F C I O

    A Filosofia do direito hoje mais em voga, de data rela-

    tivamente recente. A sua histria no vai muito alm de umagerao, remontando a pomo mais de sessenta anos.

    Se tomarmos como ponto de referncia, para marcar o

    incio dessa modernidade, o momento da renovao da filosofia

    deKantno sculo transacto, poderamos dizer que tal filosofia

    se subdivide fundamentalmente em dois perodos separados um

    do outro pela primeira guerra mundial: o doNeokantismo e o

    da reaco contra ele. Devemos, sem dvida, ao primeiro o des-

    pertar da reflexo filosfica no campo jurdico, depois do largoperodo positivista que acompanhou quase toda a segunda

    metade do sculoxix. J, porm, lhe no devemos o estado mais

    actual da nossa conscincia filosfica em nenhuma das grandesdirectrizes em que esta se afirma.

    Ao grito de Liebmann, zuriick zu Kant (voltemos a

    Kant), de 1865, sucedeu um estado de esprito que se poderia

    talvez exprimir melhor pelo grito precisamente oposto: fujamosde Kant. preciso reconhecer isto: a mais moderna filosofiaultrapassou Kant numa larga frente, e foge dele. E contudo,

    facto no menos notvel: a influncia e a sombra de Kantcontinuam a perseguila. Hoje, como escreveuOktega, as portas

    dapriso kantiana parecem abrirse de par em par. Os presos

    evademse de l um a um! E contudo esses presos evadidos

    conservam ainda c fora, j na liberdade, muitos dos hbitoscontrados na priso.

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    8 PREFACIO

    Ao subjectivismo da Crtica kantiana sucedeu o bjecti

    vismo de um conhecimento de novo voltado para o ser. Toma-

    ram a reatarse neste ponto, em determinados sectores do pen-

    samento filosfico contemporneo, as melhores tradies da

    Philosophia perennis. 0 ser, a realidade, e a Ontologia que osestuda, protendem a retomar o seu antigo lugar no centro da

    especulao filosfica, submetendo a si novamente, emboraseguindo outras vias, como nos melhores tempos da Grcia eda Idade Mdia, o estudo do sujeito, da lgica e da Teoria do

    conhecimento. Arevoluo copemiciana, a que aludia o smile

    deKant, insiste em produzirse, mas desta vez no sentido inverso

    do imaginado pelo filsofo de Konigsberg. Os termos da pro-

    blemtica gnoseolgica so, uma vez mais, invertidos ou, pelo

    menos, profundamente modificados nas sum relaes. No centro

    do sistema solar do conhecimento fica, outra vez, o objecto.

    E gravitando em volta dele, como a Terra em volta do soi, est

    outra vez o sujeito. Mais do que isso: Constituindo como que ofundo longnquo, mas no j julgado de todo inacessvel ao

    nosso rgo visual filosficoespcie de esfera celeste sobre

    a qual este novovelho sistema planetrio das relaes entre o

    sujeito e o objecto se desenha eis outra vez retomada aMetafsica, que Kantprudentemente tentara afastar, que os

    neokantianos quiseram radicalmente eliminar, e dentro da qual

    voltam a perfilarse todas as inquietaes e anseios de infinitoque agitam a alma contempornea. Mas, facto no menos

    curioso: este estremecimento o de uma alma muito mais rica

    na conscincia de si mesma, e isso precisamente devido, em

    grande parte, s profundidades da prpria reflexo kantiana.Esta, nos seus grandes traos, a situao do presente.

    A moderna Filosofia do direito, hoje mais em voga, nasceu poissob o signo doNeokantismo, e foi um rebento da grande rvore

    da filosofia kantiana. E se hoje, passados cerca de trinta anos, vemos aquela enveredar, em larga medida, por outros caminhosem demanda de outros horizontes, como por exemplo, os de

    um novo idealismo objectivo ou os de um novo Direito natural,

    PREFACIO 9

    em que o melhor da Escolstica ressurge renovado, a primeira

    pergunta a fazer aos representantes destas diversas correntes, e ser sempre a mesma: como foraram eles as portas

    da priso? Por onde saram dela? Que elementos conservaram

    da lio deKant?Ponhamos justamente estas perguntas a respeito do ilustre

    filsofojurista italiano, Giorgio del Vecchio, cujas Lezionisaem hoje em traduo portuguesa, qwal estas despretenciosas

    linhas pretendem servir de prefcio. Qual o seu sistema deideias? Em que relao se acha com Kant e oNeokantismo?

    Em que medida os ultrapassa?

    A construo de ideias dedel Vecchio nasceu em 1902,

    depois de largos estudos feitos na Alemanha, com o seu primeiro

    trabalho, intitulado II sentimento giairidico. A encontramos j

    em germe todo o seu ulterior sistema de ideias filosficats, como

    este veio a desenvolverse. Nasceu tal sistema sob o signo do

    Neokantismo, ento em plena ascenso. A influncia de Mar

    burgo e as afinidades com o pensamento deStammlerso nele

    inegveis. Tal qual este,del Vecchio atribui tambm Filo-

    sofia do direito, como objecto prprio das suas investigaes,

    estes dois temas capitais: a determinao do conceito de direito,

    e a determinao do ideal jurdico. Que direito, e como deveser o direito? Eis a tambm as duas preocupaes mximas

    iniciais do filsofo italiano. A primeira chamase uma questo

    lgico-gnoseolgica; segunda uma questo tico-axiolgica.A primeira referese ao conhecer e ao conhecimento; a segunda

    ao dver ser e ao obrar. S certo quedel Vecchio lhes acres-centou uma terceira, emprico-fenomenolgica, relativa ao ser

    histricosocial do direito, afastandose neste ponto da sua ins-

    pirao kantiana de origem. Mas esta terceira parte ou captulo

    da sua temtica, digase de passagem, hoje considerada uma

    espcie de corpo estranho e menos filosfico no sistema das

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    10 PREFACIO

    suas ideias, devendo verse nela antes o resduo das correntesdo sociologismo naturalista do sculoxix, ou seja, do positivismo

    e historicismo, que ainda se reflectem na formao do seuesprito.

    Mais importante, porm, notar as posies fundamentaisa que o ilustre professor italiano se soube elevar no segundo dos

    temas capitais, a que acabamos de nos referir, dado que noprimeiro ele pode ser considerado um nekantiano da Escola de

    Marburgo. , com efeito, na parte referente determinao

    do ideal jurdico quedelVecchiosobretudo ultrapassa o kantismo, fundando uma nova metafsica.

    J se tem chamado ao sistema de ideias delvecchiano umidealismo crtico. Isto, sem dvida, em ateno ao subjecti-

    vismo transcendental do seu ponto de partida: a Oitica da

    Razo paira. Tal designao contudo est longe de ser justa,

    se sem reservas a quisermos aplicar ao todo desse sistema. Se

    conservarmos palavra crtico o seu significado rigorosa-mente filosfico, a designao s poder aplicarse primeira

    parte das suas investigaes. De idealismo crtico s h nasua obra a atitude inicial; digamos: o primado por ele atribudo

    ao problema do conhecimento, a maneira como procura deter-

    minara priori o conceito de direito; e ainda a sua maneira de

    conceber as relaes entre o direito e a moral. Mas esteidea-

    lismo crtico j do mesmo modo se no revela, com a mesma

    pureza e intensidade, na segunda parte da temtica do filsofo,

    onde ele menos fiel primeira orientao, para se deixaratrair na rbita de outros mundos de ideias.

    A determinao do ideal jurdico, ou seja, do direito justo, aquela parte da Filosofia jurdica, a que quase exclusivamente

    se consagram os filsofos juristas de todos os tempos, e a quemais usualmente se d o nome deDireito natural. E sabeseque o Neokantismo, com Stammler e del Vecchio, reagindo

    contra o positivismo e o naturalismo do sculo xix, e apesarda raiz kantiana do seu pensamento, foi neste sculo, fora da

    Escolstica, o verdadeiro restaurador da ideia dum Direito natu

    rol. Isto inegvel. Como procurou, porm,delVecchioassen-

    tar e fundamentar a sua concepo de um Direito natural?Diremoss duaspalavras a este respeito, por estar a opunctum

    saliens da sua emancipao do kantismo.Kant der ar nos, como geralmente sabido, o derradeiro

    termo na linha de evoluo das ideias jusnaturalistas do

    sculo xvm. Tambm ele foi, sem dvida, jusnaturalista. Maso seu Direito natural, pelo total esvaziamento da Razo (Ver-

    nunft) dos seus contedos empricos, ficara reduzido a uma

    forma vcua e pobre, espcie de moldura sem quadro, tabela

    sem nmeros, ou ainda a uma figura abstracta qual fora rou-

    bada toda a vida. Alm disso, esse direito deixou de se impor

    do exterior ao homem, passando a imporselhe do interior. Deixem de estar necessariamente ancorado num ser transcen-

    dente ou numa natureza repleta de momentos empricos, para

    ser considerado uma simples lei da Razo. Os seus preceitos

    ideais, universais, no iam alm disto: obra por maneira quepossas sempre tratar a vontade livre e racional, isto , a humanidade, em ti e nos outros, como um fim e no como um meio.

    Ou ainda: obra por forma que a tua liberdade (no o mesmoque o arbtrio) possa sempre harmonizar-se com a liberdade

    dos outros, segundo uma lei geral de liberdade para todos.

    Tudo o que de concreto podia extrairse do conceito de direitoparaKant, como direito natural, consistia nisto. ComKant o

    jusnaturalismo mirrarase num absoluto e total jusracionalismo,convertida a Razo numa forma pura e sem contedos.

    Esta orientao foi tambm ainda a seguida porStammler.

    Stammler, porm, j lhe no foi inteiramente fiel. O formarlismo criticista deste filsofo j no foi to rgido como o de

    Kant. Assim, quando ele tratou de definir o seu conceito de

    Direito natural, alis englobado na ideia formal de justia, vol-taram a aparecer dentro dele, inopinadamente, certas ideias,

    como a de personalidade livre e a de comunidade humana ou

    Estado, que, embora ele o no pensasse, tinham muito mais

    de emprico que de puramente racional e estavam longe de cor-

    PREFACIO 11

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    12 PREFACIO

    responder a puras formas lgicas. Por outro lado, a preocupa-

    o teleolgica ou finalista, embora sem projeco metafsica,

    queKant arredara, voltava tambm a desempenhar na cons-truo deStammlerum importante papel.

    Ora importa notar que este afastamento, a princpio quase

    insensvel, do pensamento kantiano, e sobretudo este abraar

    de preocupaes teleolgicas, vm a produzirse emdelVecchionum grau muito maior do que em Stammler, conduzindoo

    a edificar, por ltimo, na base do seu neokantismo, um verda-

    deiro e novo sistema metafsico de ideias. E este o pontodecisivo.

    Anatureza humana qualdelVecchiovai buscar o cri-

    trio para definir o ideal jurdico, o direito justo, com efeito,

    nem uma realidade puramente emprica, como era para muitos

    dos jusnaturalistas clssicos, nem mera ideia racional e a/penas

    formal, como era paraKant. antes uma realidade espiritual

    orientada por fins e fazendo parte de um universo tambm teo-logicamente estruturado.Anatureza humana , neste sentido

    diz ele um princpio vivo que anima o universo e se

    exprime na infinita variedade do seu desenvolvimento. S aquela

    substncia que reconhecemos imune da angstia da causalidade:

    a razo anterior que d normas a todas as coisas e lhes assina

    a sua prpria tendncia'. E uma tal visualizao teolgica

    notese desde j no , como era paraKante os nekan

    tianos, um simples princpio regulativo, heurstico, da nossa

    compreenso de certas coisas, ou um certo ngulo de viso ou

    ponto de vista no essencial, s aplicveis esfera do humano.

    mais. uma estrutura da realidade que abarca o universoe o homem. Tratase de uma teleologia no regvlativa, mas cons-

    titutiva e carregada de momentos ontolgicos. , porm, evi-dente que uma tal concepo da natureza humana, como a danatureza em geral, est j muito para alm do kantismo, econstitu uma nova metafsica. E o mesmo se diga do conceito

    de personalidade humana que est na base destas ideias. Che-gado a este ponto, dirseia que a que o nosso filsofo dban

    PREFACIO 13

    dona definitivamente a lio deKant, sem poder permanecer

    por mais tempo dentro do ergstulo kantiano. Foi por a quedel Vecchio se evadiu dele: pela porta das concessesquealis o Neokantismo, com Stammler, j comeara a fazer

    svisualizaes teleolgicas da realidade, atravs das quais vol-

    tavam a descortinarse, c fora, em vasta perspectiva, as sedu-

    toras paragens metafsicas. O ilustre mestre italiano alargouainda mais esse buraco, j aberto nas grades da dita priso,

    pelo telelogismo stammleriano. E contudo, conforme j atrs

    notmos, tambm neste caso o evadido de tal priso no pode

    esquecerse dela, e continuou a conservar vivo o hbito das for-

    mulaes gnoseolgicas de ntido sabor kantiano. Ao darnos

    o preceito supremo do seu Direito natural, o formalismo kantianoerguese de novo. Assim dele esta frmula:obra por maneira

    que sejas, no simples meio ou veoulo das foras da natureza,

    mas um ser autnomo com a dignidade de princpio e fim; no

    como indivduo emprico {homo phaenomenon), mas como serracional (homo noumenon). No parece estarse a ouvir ainda

    a voz do mesmoKant?E poderemos ns depois disto continuar a chamar ainda

    Idealismo ao sistema de ideias dedelVecchio?Se por Idealismo entendermos o Idealismo crtico, subjec-

    tivo e transcendental, que reduz todo o mundo das nossas repre-sentaes a um jogo de formas criadas por uma conscinciaem si mesma*, uma Bewusstsein berhaupt, no necessria e

    ontlogicamente ancorada num ser transsuibjectivo, absorvida

    toda a filosofia numa Teoria do conhecimento, como j disse-

    mos acima, evidente que no. Aquilo que ele conserva deKantno o bastante para o incluir sob a rubrica desse .. .ismo.

    Neste sentido,delVecchiono kantiano nem idealista. O seu

    Idealismo no um Idealismo epistemolgico nem critico. Mas

    se por Idealismo entendermos toda a outra concepo do uni-

    verso caracterizada pla afirmao de uma realidade metafsica

    das ideias, quer em sentido platnico, como transcendncia, quer

    aristotlico, como imanncia, ento poderemos tranquilamente

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    14 PREFACIO

    continuar a chamar a del Vecchio um idealista. Simplesmente:

    o seu idealismo ser ento um Idealismo metafsico.

    O Idealismo de del Vecchio , alm disso, uma forma de

    Idealismo parecida em vrios aspectos com muitas outras que

    pulularam na histria da filosofia do sculo xix e do actual,em que, como j foi notado porRecasens (*), tomam a aparecer

    muitos momentos derivados de todas as grandes correntes doIdealismo alemo postkantiano. Fichte com a sua concepo

    do Eu, principio absoluto e autnomo, do qual toda a realidade

    do noeu no passa de ser uma funo; Schelling com o seu

    organicismo teleolgico e metafsico, inspirador do sistema de

    Krause; Hegel com o seu panlogismo tambm metafsico, de

    uma Razo universal que acaba por se fazer natureza, cons-

    cincia e espirito, a si mesmo se contemplando como pensamento

    absoluto, etc., todos estes momentos, com efeito, surgem aqui

    e alm, como ingredientes de rpida fulgurao que logo se

    diluem, absorvidos na sntese do pensamento delvecchiano. Nele,poderia dizerse, esto em germe todas as formas conhecidas

    do Idealismo ocidental. Poderamos tambm chamarlhe por

    essa razo um Idealismo eclctico.

    Recentemente, del Vecchio converteuse ao Catolicismo.

    Este facto tem levado alguns escritores a darem ao sistema

    das suas ideias uma nova interpretao, tendente a desliglo

    de certos dos seus momentos kantianos, principalmente do que

    no kantismo h de formalismo tico e jurdico, bem como de

    muitos dos seus ingredientes hegelianos e scheTlinguianos, para

    o aproximarem de outras concepes e pontos de vista maisconsentneos com um jusnaturalismo escolstico de pura base

    tomista. Pretendeuse descobrir a como que o balbuciar duma

    verdade eterna e absoluta, em profunda concordncia com as

    verdades fundamentais do Cristianismo.

    (') Direcciones contemporneas dei pensamiento jurdico,pg. 107.

    PREFACIO 15

    Conquanto, na sua generalidade, nos parea inteiramente

    justificada esta ltima pretenso, no julgamos, porm, vivel

    nenhuma tentativa de interpretao das ideias de del Vecchio

    em conjunto sobre a base de uma amputao de tal natureza

    de quaisquer dos momentos que elas contm. Uma amputao

    destas equivaleria a uma violncia praticada contra a realidade

    histrica do sistema que elas constituem, como esse sistemafoi vivido e pensado pelo seu autor. Se o sistema pode em si

    mesmo ser considerado como contendo algo de contraditrio,

    preciso reconhecer que tal contradio est sobretudo na poca

    e na situao histrica mental, de que ele emerge. H contradi-

    es orgnicas no ntimo de muitos sistemas de ideias, cuja tentar

    tiva de eliminao, longe de os purificar, os torna simplesmente

    incompreensveis como dado existencial de um pensamento

    vivido.

    Por isso, conclumos:

    O sistema de ideias do ilustre autor destasLezionipertence

    historicamente, de uma maneira definitiva, ao quadro da filo-

    sofia idealista dos fins do sculoxix e mergulha as suas razes

    no terreno das mais autnticas tradies do Idealismo alemo

    kantiano, postkantiano e neokantiano. a tentativa de uma

    sntese dessas trs formas de Idealismo, reflectindo osque todas

    elas alis tm de inacabado e de contraditrio entre si. Nenhum

    desses elementos contudo assume nele a consistncia de uma

    orientao ou directriz assaz forte, para lhe poder ser atri-

    buda anacionalidade de uma qualquer dessas trs formas deIdealismo como nica e exclusiva. Nem to pouco os seus mo-mentos metafsicos e jusnaturlsticos esto suficientemente

    libertos de preocupaes crticas, para se supor que na con-

    tinuao da linha lgica do sistema possa vir a encontrarse,

    ao fim e ao cabo, a pura escolstica tomista.

    A obra deste insigne filsofojurista pode, numa palavra,

    caracterizarse, na sua suprema inteno filosficae nisto

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    16 PREFACIO

    vai a melhor homenagem que lhe podemos e devemos prestar

    como mais um grande esforo por conciliar entre si as duas

    grandes correntes deste sculo, principalmente a partir da pri-meira guerra mundial: a das exigncias do espirito critico,

    aplicado a todo o conhecimento, de que foi paradigma a lio

    deKant, e a das novas exigncias de um mais puro idealismo

    tico. Por outras palavras: entre o que de eterno h emKant,

    e as aspiraes de uma nova tica de valores materiais, no

    simplesmente formais no sentido de Max Scheler supe

    radora de todo o logicismo, a acenar para uma nova metafsica

    em que volta a verse ao longe o claro das grandes verdadesdo Cristianismo.

    A soluo pessoal religiosa que o nosso ilustre amigo deu

    ao problema dessa conciliao, no uma soluo lgica do

    sistema, como j contida nele, mas uma soluo do homo

    religiosus,para alm de todo o filosofar, que delVecchio.

    CabraldeMoncada

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    DUAS PALAVRAS DO TRADUTOR

    Costumase dizer que os livros tambm possuem um destino.Se fosse necessrio ilustrar com um exemplo o adgio, nenhum

    outro melhor podia ser encontrado que o dasLies de Filosofiado Direito do ilustre Reitor da Universidade de Roma, o Pro-

    fessor Giorgio del Vecchio. Editadas pela vez primeira em

    1980, dois anos depois, em 1982, tomavase necessria outra

    edio, j esgotada em 1986, ano em que se publica a terceira.

    A guerra impediu que sasse nova edio em 1989; esta publicada em 1944; mas, logo no ano seguinte, houve necessi-

    dade de imprimir a5. a mesma que nestes dois volumes se

    apresenta ao mundo da cultura lusada na verso portuguesa.

    Entretanto, o livro havia feito carreira fora da Itlia. Tror

    duzido para espanhol, francs, alemo, turco e japons, correra

    mundo, por toda a parte recebendo o prmio devido ao autor

    pelo notabilssimo esforo precursor de que as lies so o coroar

    mento e a sntese.Com o brilho e a proficincia habituais fez o meu querido

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    18 DUAS PALAVRAS DO TRADUTOR

    Muitas vezes se repreende a Filosofia do Direito por andar

    longe do mundo e da luta dos humanos interesses; e os seus

    cultores, por se alhearem das preocupaes correntes do homemde leis, para nada os ajudando no momento em que melhorou mais fundamente desejam meditar o Direito. Pois bem: oreparo no pode ser dirigido a estas Lies, onde se mantm

    contacto estreito com os dados da vida jurdica, sem todaviase cair na redundncia intil de repetir em termos filosficos

    o j dito pela cincia dogmtica do Direito. Eis a razo pela

    qucU elas tm actuado, por toda a parte, como despertador eficaz

    da vocao filosfica dos juristas. Oxal continuem a cumprir

    em Portugal to afortunado como benfico destino.

    AntnioJosBrando

    PREFCIO DO AUTOR7A EDIO ITALIANA (1950)

    A reviso a que foi submetida a presente edio no intro-

    duziu na obra nenhuma modificao substancial. Breves foram

    os acrescentamentos sofridos pela parte histrica (por exemplo,

    quanto Filosofia do Direito na Alemanha) e o mesmo se digados sofl idos pela parte sistemtica (por exemplo, os relativos

    ao Tribunal constitucional, aos direitos potestativos, ao matriar-cado, ideia de progresso e luta pelo justia). Fizeramse

    tambm alguns retoques com o fim de introduzir na exposio

    maior clareza e preciso. Por ltimo, em ordem a atingir o

    mesmo fim, introduziuse igualmente leve alterao na ordem

    das matrias, no tocante s normas tcnicas e aos destinatriosdas normas jurdicas.

    Possam os desvelos consagrados a esta nova edio e osmelhoramentos nela introduzidos testemunhar, ao menos, a gra-

    tido do autor pelo constante e cada vez maior favor com quea obra tem sido acolhida pelos estudiosos.

    Roma, 1950

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    PREFCIO DA 8A EDIO

    A presente edio foi tambm objecto de uma nova revisodo autor, apesar do reduzido tempo decorrido sobre a prece-

    dente. Nela se introduziram numerosos retoques e alguns adita-mentos, como sejam, quanto a estes, as mais completas refe-

    rncias, na Parte Histrica, a Gioberti, Mazzini e a outros

    autores italianos e estrangeiros, com o que se preencheramvrias lacimas; e, na Parte Sistemtica, a reelaborao e melhor

    esclarecimento de alguns pontos, por exemplo, dos factos e actos

    jurdicos, o Estado e a sociedade dos Estados, etc.Sem nada prejudicarem a ndole originria da obra, de

    manual escolar, os desenvolvimentos que vm sendo introdu-

    zidos, progressivamente, nas vrias edies, no deixaro tam-

    bm de ser de algum modo teis aos estudiosos em geral das

    doutrinas jurdicas.

    Roma, 1951

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    PREFCIO DA PRESENTE OA EDIO

    A presente 10.aedio, ao contrrio da 9.aedio, quase

    idntica precedente, contm vrias alteraes e aditamentos

    de certa importncia, tanto na Parte Histrica como na Siste-

    mtica.Aditouse tambm a esta edio um ndice analtico, de

    acordo com os votos expressos por alguns estudiosos.

    Rama, Dezembro de 1957

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    a 1934).Rivista internazionale di Filosofia del diritto(Roma, desde 1921).

    Revue Internationale de la thorie du droit(Brno, desde 1926 a 1939).

    Archives de Philosophic du droit et de Sociologie juridique (Paris, desde1931 a 1940; nova srie, com o ttulo: Archives de Philosophic dudroit,desde 1952).

    Anurio de Filosofia del derecho(Madrid, desde 1953).

    PARTE HISTRICA

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    HISTRIA DA FILOSOFIA DO DIREITO

    Consideraes preliminares

    De cada cincia vantajoso conhecer a histria. Mas a

    importncia de tal conhecimento faz-se sentir de modo particular

    a respeito das disciplinas filosficas: em estas, o presente, sem

    o passado, carece de sentido; e o passado revive no presente.

    Os problemas filosficos que hoje discutimos so fundamen

    talmente os mesmos que aos filsofos antigos se mostraram,

    ainda que de modo germinal ou embrionrio. O exame dos sistemas filosficos, por outro lado, proporciona-nos uma srie

    de experincias lgicas. Ao efectu-las, aprendemos a ver a

    que concluses se chega quando se parte de certas premissas

    e, assim, a tirar partido da aprendizagem, com o intuito de nos

    avizinharmos de sistema mais perfeito, que seja produto de

    mais intensa maturidade, capaz de evitar os erros j entretanto

    cometidos e de aproveitar os progressos j entretanto atingidos.

    A Histria da Filosofia , por conseguinte, meio de estudo

    e de investigao, e, como tal, poderosa ajuda para o nosso

    trabalho: oferece-nos repositrio de observaes, de raciocnios,de distines, que a um homem s, no decurso da vida, seriaimpossvel ocorrer. Acontece-nos o mesmo que a qualquer art

    fice actual que, agora, seria incapaz de ser o inventor de todos

    os instrumentos da sua arte.

    No caso particular da Filosofia do Direito, a histria dela

    mostra-nos sobretudo que em todas as pocas se meditou sobreo problema do Direito e da Justia. Logo: o facto denuncia

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    32 LIES DE FILOSOFIA DO DIREITO

    que tal problema no uma inveno artificiosa mas corres

    ponde necessidade natural e constante do esprito humano.

    A Filosofia do Direito, porm, no se nos depara, nas suasorigens, como disciplina autnoma mas mesclada com a Teo

    logia, a Moral e a Poltica; s pouco a pouco se operou a sua

    autonomia. Nos primeiros tempos, a confuso foi completa e,

    no Oriente, temos o seu melhor exemplo, pois, a, os livros

    sagrados apresentam-se simultaneamente como tratados de Cos

    mogonia, de Moral, e contm elementos de outras cincias,

    assim tericas como prticas. Nestes escritos predomina o esp

    rito dogmtico. Neles o direito concebido maneira de pres

    crio divina, superior ao poder humano, e, por isso, no como

    objecto de discusso e cincias, mas to s de f. As leis

    positivas so tambm consideradas indiscutveis; e no se julga

    susceptvel de fiscalizao e limite o poder existente, expresso

    da divindade. Em esta fase, prpria dos povos orientais, ainda

    o esprito crtico no se tinha manifestado. Contudo, injusto

    seria olvidar que muitos destes povos, sobretudo os hebreus,os chineses e os indianos deram notvel impulso aos estudos

    filosficos, sobretudo no respeitante Moral.

    A Filosofia Grega

    Primrdios

    a Grcia a ptria por excelncia da Filosofia, que nela

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    HISTORIA DA FILOSOFIA DO DIREITO 33

    quatro elementos: gua, ar, fogo e terra), no tem importncia

    para o nosso estudo.

    Outra escola, quase contempornea da jnica, a Eletica,tentou responder ao mesmo problema pela boca dos seus repre

    sentantes Xenfanes, Parmnides, Zeno de Eleia, Melisso

    de Samos mas de modo bem mais profundo e reflectido.

    Erguendo-se at um conceito metafsico, sustentou que o ser

    uno, imutvel, eterno. Por outro lado, aceita uma nica dis

    tino: entre aquilo que e aquilo que no , Daqui a negao

    do conceito de devir e de movimento: ambos correspondem

    apenas a iluso dos sentidos. No de admitir o nascimentoe a morte, o trnsito entre ambos.

    Relacionam-se com as doutrinas das Escolas Jnica e Ele

    tica as doutrinas de outros filsofos, como Eraclito, que sustenta,

    ao contrrio dos Eleticos, o conceito do devir; Empdocles,

    que formulou a teoria dos quatro elementos: o fogo, o ar, a gua,

    a terra; Anaxgoras, Demcrito, etc., que consideram tambm

    no o problema tico-jurdico, mas o cosmolgico ou o do ser

    em geral; embora encontremos j uma outra refernciaquele problema em Herclito e Demcrito.

    Mais forte conexo com a nossa disciplina apresenta outra

    escola desta poca: a Pitagrica.

    Pouco se conhece de Pitgoras, quer quanto vida, quer

    quanto doutrina. Nascido em Samos, no ano de 582 A. C.,

    emigrou para a Itlia meridional, para Orotone onde fundou

    uma sociedade, com adeptos escolhidos da sua doutrina. Esta

    corporao aristocrtica, de carcter religioso e moral, vincu

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    34 LIES DE FILOSOFIA DO DIREITO

    contestou. Particularmente importante o estudo do continua-

    dor de Pitgoras, Filolau, contemporneo de Scrates, com o

    seu escrito Da Natureza( uepl

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    36 LIES DE FILOSOFIA DO DIREITO

    Como pelo exposto se d conta, os Sofistas eram cpticos

    em moral, mais negadores e destruidores do que construtivos

    e afirmativos. No Obstante, grande mrito foi o seu por terem

    atrado a ateno dos homens sobre dados e problemas relativos

    ao homem, ao pensamento humano; e a perturbao trazida

    pela sua actividade conscincia pblica foi ainda benfica e

    fecunda, pois aguou o esprito crtico para muitos temas queat ento a ningum preocupavam. Enquanto os filsofos da

    escOla Jnica se haviam entregue exclusiva meditao do

    mundo externo, os Sofistas deram o seu interesse a proble

    mas psicolgicos, morais e sociais. A eles se deve, por exem

    plo, a colocao rigorosa do problema de saber se a justia

    tem um fundamento natural; se aquilo que justo por lei ou,

    como ns dizemos, o direito positivo tambm justo por

    natureza (a anttese entre o v^w Styaiov e o

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    38 LIES DE FILOSOFIA DO DIREITO

    O que nos afirmou do saber em geral vale tambm para

    o saber jurdico. Para alm das coisas singulares devemos aprender a ver a universalidade. Aqueles que apenas conseguem ver

    a variedade das coisas justas, as simples teses ou normas

    jurdicas, mais no a Justia em si, no merecem o nome de fil

    sofos (91X600901). So antes amantes de opinies (91X086^01).

    Acima das contradies do mundo emprico, objecto da opinio,

    existe o mundo inteligvel, objecto da cincia. Filosofia , preci

    samente, amor da cincia.

    Scrates, deste modo, lanou as primeiras pedras para

    um sistema filosfico idealista, mas no construiu o edifcio,

    que foi obra de Plato. Ensinou o mtodo do filosofar, sobre

    tudo no respeitante tica, reagindo contra o cepticismo pr

    tico dos sofistas na procura do Bem.

    Ensinou a respeitar as leis (que os Sofistas haviam ensi

    nado a desprezar), e no s as leis escritas, mas tambm as

    que, embora no escritas, valem igualmente em todos os luga

    res, e so impostas pelos deuses aos homens.Scrates afirmou assim a sua f em uma Justia superior,

    para a validez da qual no preciso sano positiva, nem

    formulao escrita. A obedincia s leis do Estado , no entanto,

    para Scrates, um dever que deve cumprir-se em todos os

    casos. O bom cidado deve obedecer mesmo s leis ms, para

    no estimular com a sua atitude os maus cidados a violar

    as 'boas. O prprio Scrates exemplificou em vida este prin

    cpio, pois, acusado injustamente de ter introduzido novos deu

    ses e corrompido a juventude, foi condenado morte por este

    pretenso delito, enfrentando serenamente a execuo da sen-

    tensa em vez de aproveitar a fuga que amigos aflitos lhe haviam

    preparado. A acusao de ter introduzido novos deuses, j feitapor Aristteles na Rane, foi possvel s porque Scrates se

    dizia inspirado por uma divindade (Sa[[Av), que no era outra

    seno a sua conscincia; e esta atitude, que parecia contrria religio dominante, serviu de pretexto aos seus inimigos. A ma

    neira sublime e serena como encarou a morte toma ainda mais

    historiadafilosofiadodireito 39

    admirvel a sua figura e faz dele um precursor de outros mr

    tires do pensamento. Pelo seu ensino, dedicado investigao

    dos princpios racionais da actividade humana, Scrates merece

    ser considerado um dos principais (se no absolutamente, o

    primeiro) dos fundadores da tica.

    Plato

    As obras do grande discpulo de Scrates, Plato (427-

    -347 A. C.), escritas em forma de dilogo, figuram o Mestre

    na ocasio de discutir com discpulos e com Sofistas, seus adver

    srios, de sorte que o sistema platnico parece vir de Scrates.

    No foi este, porm, o edificador: Scrates abriu caminho

    especulao filosfica, mas no nos legou sistema completo.

    O Scrates platnico no coincide com o Scrates histrico,

    mas, em grande parte, o prprio Plato.

    Das doutrinas deste s nos ocupamos na medida em que

    interessam especialmente nossa doutrina. Mencionaremos doisdos seus dilogos, a Repblica, ou rcoXixea (que melhor se tra

    duziria por Estado) e as Leis, ou Nfxou A estes, acrescen

    taremos outro, que fica entre os dois primeiros, intitulado o

    Poltico 7roXmx0.De todos, o mais importante o primeiro, em que Plato

    nos apresenta, como todo o rigor, a sua concepo do Estado.

    Ele pretende encarar o problema da Justia no Estado, pois,

    como ele diz, ali ela pode ser lida mais claramente, porque

    est escrita em caracteres grandes, ao passo que, em cada

    homem, est escrita com letras pequenas.

    Para Plato, o Estado o homem em grande, ou seja:

    um organismo completo, em que se encontra reproduzida a

    mais perfeita unidade. Constitudo por indivduos, solidamente

    estruturado, semelha um corpo formado por vrios rgos,

    cujo conjunto lhe toma possvel a vida. No indivduo, corno noEstado, deve reinar aquela harmonia que se obtm pela virtude.

    A Justia a virtude por excelncia, pois consiste em uma

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    40 LIES DE FILOSOFIA DO DIREITO

    relao harmoniosa entre as vrias partes de um corpo. Ela

    exige que cada qual faa o que lhe cumpre fazer (x au-rou

    7tp

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    42 LIES DE FILOSOFIA DO DIREITO

    es estaduais. Por aqui se verifica quo erroneamente inter

    pretam a teoria platnica aqueles que teimam em ver nela a

    precursora do socialismo hodierno. Platofoi conduzido sua

    concepo do Estado ideal, no por consideraes econmicas

    mas por preocupaes ticas e polticas.Ficam assim resumidamente expostos os conceitos formu

    lados por Plato no dilogo da Repblica. O dilogo acercadas Leis, composto mais tarde, quando Plato ultrapassava

    os setenta anos, apresenta j carcter diferente. Aqui, em vez

    de nos dar a descrio de um puro ideal, considera antes a

    realidade histrica nos seus aspectos contingentes e permite-nos

    avaliar o seu admirvel senso prtico. No dilogo da Repblica,

    Plato tinha formulado a mxima de que os sbios devero

    governar segundo a sabedoria; e, se admitirmos que a sabe

    doria domina o mundo as leis sero suprfluas (neste sentido,

    leia-se ainda o Poltico, 294 a 299); mas se considerarmos

    a prtica, e a natureza humana concretamente, constatamos

    a necessidade das mesmas. O dilogo das leis exprime precisamente a passagem entre aquilo que idealmente devia ser e

    aquilo que a vida impe, e trata longamente o problema da

    legislao. E isto sem afectar os princpios fundamentais expos

    tos na Repblica. Plato reserva para o Estado uma funo

    educadora. Por isso quer as leis acompanhadas de exortaes

    e dissertaes que expliquem os seus fins. s leis penais atmbuifim essencialmente teraputico. Plato considera os delin

    quentes como enfermos (posto que, segundo o ensinamento

    socrtico, nenhum homem voluntariamente injusto): a lei

    o meio para cur-los, a pena o remdio para os mesmos.No entanto, no se recusa a tirar as ltimas consequncias

    da sua atitude. Pelo delito, nem s o delinquente revela estar

    enfermo, pois tambm o Estado se ressente da sua enfermidade.

    Quando a sade do Estado o exige, isto : quando esta seacha permanentemente ameaada por um delinquente incorri

    gvel , impe-se a supresso do delinquente para salvaguarda

    do bem comum. A este propsito convm notar a diferena

    HISTORIA DA FILOSOFIA DO DIREITO 43

    entre a concepo de Plato e a da moderna Escola de Antro

    pologia criminal. Esta considera a delinquncia como um pro

    duto da degenerescncia fsica, ao passo que, para Plato, o

    delinquente intelectualmente deficiente, a sua enfermidade

    aberrao, ignorncia da verdade, ou seja: da virtude que

    conhecimento da verdade.

    No dilogo das Leis, Plato mostra um maior respeito dapersonalidade individual (muito embora os escravos fiquem sem

    pre excludos). A famlia e a propriedade so conservadas e j

    no sacrificadas a uma espcie de estadualismo, como na Rep-

    blica.No entanto, autoridade do Estado concede ainda impor

    tncia sobrepujante. A ele compete fixar a repartio da pro

    priedade (e da a diviso dos indivduos por classes), intervir

    nos matrimnios e vigiar a vida conjugal (sujeita sempre a

    uma rigorosssima vigilncia), dirigir a actividade musical e

    potica (tambm esta regulada para fins educativos), superin

    tender na religio, no culto, etc.... Quanto forma poltica,

    critica Plato tanto a monarquia como a democracia, em queuma parte dos cidados manda enquanto a outra obedece, pro

    pondo uma espcie de sntese de ambas, cujo modelo sobretudo o regime de Esparta (onde ao lado de dois reis, havia oSenado e os Eforos).

    Como dissemos, neste dilogo encontra-se notvel base his

    trica ; por exemplo: h nele um maravilhoso tratado da gnese

    do direito. Transparece a, igualmente, um conhecimento mais

    completo e rigoroso da realidade emprica do que aquele luz

    do qual foi concebido e escrito o dilogo da Repblica. Mas,

    ainda neste, onde o Estado se nos depara como pura concepoideal, no falta um enxerto histrico, o qual deriva da 7tXi

    grega: esta apresenta-se a nos seus traos essenciais e, simulta

    neamente, idealisada. Plato queria reagir contra o cepticismo

    dos sofistas e as tendncias demaggicas do seu tempo, afirmando que s os melhores deviam governar, e desejava tambm

    impedir a dissoluo da coisa pblica. Desta sorte, deve-se

    reconhecer que a sua teoria poltica teve tambm um intuito

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    44 LIES DE FILOSOFIA DO DIREITO

    prtico e contm numerosas referncias s condies histricas

    da poca.

    Aristteles

    Aristteles (384-322 A. C.), nascido em Estagira, foi,

    durante vinte anos, discpulo de Platoe, mais tarde, preceptor

    de Alexandre Magno. Quando este subiu ao trono, fundou

    Aristtelesa sua escola em Atenas, no Ginsio liceu (dedi

    cado a Apoio Auxeio). Dedicou-se a todos os ramos de conhe

    cimento e pode dizer-se que, com ele, iniciaram-se muitas das

    nossas cincias. Porm, tendo-se perdido grande cpia dos escri

    tos anteriores ao seu laJbor, no se pode hoje ajuizar at que

    ponto (beneficiou das investigaes dos antecessores. O carc

    ter do seu gnio diferente do de Plato:este, por ndole,

    mais especulativo, Aristtelesmais inclinado observao

    dos factos. Nas questes cardeais de Filosofia, contudo, no

    se afasta muito do Mestre; , por isso, errado apresent-lo, como vulgarmente acontece, na qualidade de seu adversrio

    e antagonista. verdade que Aristtelesexpressamente refuta

    algumas teorias de Plato.Amide se faz referncia s discr

    dias pessoais que teriam oposto o mestre ao discpulo. Mas pro

    vavelmente exagerou-se a este respeito e formaram-se lendas

    em tomo das relaes entre os dois grandes filsofos. Deve-sereconhecer, em todo o caso, que tambm Aristtelesfoi essen

    cialmente metafsico e idealista.

    Na exposio do pensamento deste filsofo tambm nos

    limitaremos ao exame das doutrinas que mais directamenteinteressam Filosofia do Direito. Para este propsito, as obras

    a considerar, pela importncia directa, so a Poltica e a tica.Desta ltima, chegaram at aos nossos dias trs redaces: ticaNicomaqueia, tica Eudemia e a chamada Grande Moral ou

    Magna Moralia, cujos captulos, em muitos dos seus passos,coincidem. S a primeira, a Nicomaqueia, no oferece dvidasque obra de Aristteles; quanto s outras duas, a Eudemia,

    HISTORIA DA FILOSOFIA DO DIREITO 45

    provavelmente, um trabalho de Eudeme,seu discpulo, e a

    Grande Moralum extracto das duas verses primeiras. Tam

    bm a Poltica(7roXiTtx), em oito livros, no nos chegou com

    pleta. Outro escrito dele, sobre as constituies (rcoXiTeiai), con

    tendo a descrio de 158 constituies, perdeu-se quase total

    mente e s h pouco se descobriu fragmento importante dele:

    a Constituio dos Atenienses.Para Aristteles, assim como para Plato, osumo bem

    a Felicidade, fruto da virtude. O Estado uma necessidade:

    no apenas simples au^or/oc (aliana), simples associao

    momentnea para atingir fim particular, mas perfeita unio

    orgnica, tendo por fim a virtude e a felicidade universal;

    a comunho necessria ao servio da .perfeio da vida. O ho

    mem tov toXitxov(animal poltico) pois vida poltica

    levado pela pripria natureza. E o Estado, logicamente, prima

    aos indivduos, tal como o organismo prima as suas partes.

    Assim como no possvel conceber uma mo viva separada

    do corpo, assim tambm, no se pode conceber o indivduo

    sem o Estado. O Estado regula a vida dos cidados mediante

    leis. Estas dominam inteiramente a vida, porque os indivduos

    no pertencem a si mesmos, mas ao Estado. Contedo das leis

    a justia. Desta, Aristtelesnos deixou uma profunda an

    lise. O princpio da justia a igualdade, a qual aplicada de

    vrias maneiras. Aristtelesdistingue, portanto, a justia em

    muitas espcies. A primeira de entre elas a chamada justia

    distribuitiva(t Sxouov v Tai, t Siavs[i.yjTixv), que preside

    distribuio das honras e dos bens e tem por fim obter que

    cada um receba daquelas e destes poro adequada ao seu

    mrito (xax av). Se explicava Aristteles as pessoas

    so desiguais em mrito, to-pouco as recompensas devero

    ser iguais. Com isto, mais no se fez, como manifesto, seno

    confirmar o princpio da igualdade: pois este seria violado, na

    sua aplicao especfica, se fosse dado tratamento igual a

    mritos desiguais. A Justia distributiva consiste, portanto,

  • 7/23/2019 Lies de Filosofia Do Direito - Giorgio Del Vecchio

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    46 LIOES DE FILOSOFIA DO DIREITO

    em uma relao proporcional que Aristteles, no sem algum

    artifcio, define como uma proporo geomtrica ( yewfAeTpixfl

    vaXoya).

    A segunda espcie de justia a justia correctiva ou equi-

    paradora, a que tamlbm se podia chamar rectificadora ou

    sinalagmtica, por presidir s relaes da troca (t v rol

    ouvXXY(i-i Siop&wTixSv). Ainda neste domnio se explica o

    princpio da igualdade, emlbora de forma diversa, pois, neste

    caso, trata-se apenas de medir impessoalmente os ganhos e

    as perdas; ou seja: as coisas e as aces consideradas em

    seu valor objectivo, supondo-se iguais os termos pessoais. Tal

    medida, segundo Aristteles, encontra o seu tipo prprio na

    proporo aritmtica (api Yixixf) vaXoya).

    Esta espcie de justia procura lograr que as duas partes,

    que se encontram em relao, venham a achar-se, uma relati

    vamente outra, em condies de paridade; e de tal sorte, que

    nenhuma receba ou d demais ou de menos. Daqui segue-sea definio desta espcie de justia como ponto intermdio ou

    meio termo entre o dano e a vantagem. No entanto, estes ter

    mos compreendidos em sentido amplo aplicam-se no s s

    relaes voluntrias ou contratuais, mas tambm s que Aris-

    tteles chama involuntrias (

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    48 LIES DE FILOSOFIA DO DIREITO

    A considerao que a Aristteles mereceram os graus

    intermdios de convivncia, demonstra, da sua parte, concep

    o histrica superior de Plato. Aqueles agregados cons

    tituem as diversas etapas para se chegar ao Estado.

    A abolio da famlia e da propriedade, concebida por

    Plato, acha no discpulo viva oposio e crtica. Neste con

    traste revela-se a diversidade de temperamento dos dois fil

    sofos : ao idealismo absoluto, puramente especulativo de Plato,

    ope-se o esprito observador de Aristteles, que nos prprios

    factos indaga a sua razo relativa e o grau do seu desenvol

    vimento sucessivo.A famlia tem por elementos o homem, a mulher, os filhos

    e os criados; sociedade estabelecida perpetuamente pela natu

    reza. Da unio de vrias famlias resulta a aldeia ou a vila

    (xt>|x>]); da reunio de vrias vilas, o Estado que nico,

    e, portanto, goza de plena autarquia. Ele constitui o fim das

    outras formas de convivncia e dado pela natureza. Para

    prescindir do Estado o indivduo teria de ser mais ou menos

    do que homem: um deus ou um bruto.Aristteles observa o fenmeno da escravatura e tenta

    justific-lo, demonstrando como aqueles homens incapazes de

    se governarem, devem ser dominados. Alguns homens nasce

    ram para serem livres, outros para serem escravos. Alm destas

    razes, apresenta outras de ordem prtica para provar a utili

    dade da escravido. 0 Estado, conforme a concepo aristo-

    tlica, necessita de uma classe de homens que se dediquem s

    ocupaes materiais que sirvam as outras classes de condio

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    HISTORIA DA FILOSOFIA DO DIREITO 49

    vida pblica e de se dedicarem s letras e s cincias, eviden

    temente devido, em parte, existncia da escravido. Esta era

    um efeito, tido por legtimo, da conquista militar. Muitos dos

    escravos mais cultos, especialmente gregos, exercitavam nobresfunes, servindo de grande proveito formao cultural dos

    seus proprietrios. Em Roma, muitos escravos eram amanuen

    ses e professores muito estimados; e muitos outros faziam ser

    vio nas numerosas bibliotecas, especialmente nas da poca

    do Imprio.

    Talvez os factos que acabam de ser recordados ajudem

    a compreender melhor agora, pelo menos at certo ponto, o

    motivo pelo qual Aristteles aceitava como necessria a escra

    vatura: esta, dizia ele, podia abolir-se se a lanadeira e a

    agulha corressem sem auxlio de algum sobre o tear. Tais

    palavras indicam que ele estava dominado pela ideia da funo

    econmica desempenhada pela escravatura no seu tempo. Pois,

    para a abolio desta contriburam, em pocas sucessivas, alm

    de outras causas, o progresso da indstria, a inveno das

    mquinas, etc.... de admitir, portanto, com respeito a certasfases da histria, a relativa necessidade da escravatura e,

    neste sentido, so apreciveis as observaes de Aristteles.

    Mas, por outro lado, inadmissvel a sua tese, se lhe for atri

    budo o alcance de uma justificao absoluta, uma vez que a

    escravatura, em si mesma considerada, vai contra o direito

    que qualquer homem naturalmente tem autonomia. E de

    nenhuma maneira se pode afirmar que, por natureza, exista

    uma espcie de homens destinados servido.

    S OSO O TO historia da filosofia do direito 51

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    50 LIES DE FILOSOFIA DO DIREITO

    entre as instituies e as condies histricas e naturais. Quer

    dizer: preocupou-se, no com o ptimo absoluto, mas com o

    ptimo relativo. O seu exame recai sobre os governos mais

    adequados s vrias situaes de facto.Foi Aristtelesquem, antes de qualquer outro, fez a dis

    tino dos vrios poderes do Estado o legislativo, o executivo

    e o judicirio. A constituio poltica o ordenamento dos trs referidos poderes. E segundo o poder supremo exercido por

    uma, por algumas ou por todas as pessoas, distingue trs tipos

    de constituio: monarquia, aristocraciae 'poltica.A estes trs

    tipos, considera-os igualmente bons, sempre que o poder supremo

    seja exercitado para o bem de todos (xoivv ou|x

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    52

    ao Estado. Mas com a filosofia estica anuncia-se e prepara-se

    moral mais ampla e humana. O Estoicismo afirma a existncia

    de uma liberdade que nenhuma opresso poder destruir: a

    liberdade que resulta da superao das paixes.O homem livre se segue a sua verdadeira natureza, se

    aprende a vencer as suas paixes, tomando-se independente

    delas. Neste sentido, nenhuma diferena h entre livres e

    escravos. H uma Sociedade do gnero humano para l dos

    limites traados pelos Estados polticos, baseada na identidade

    da natureza humana e das leis racionais que lhe correspondem.

    por si mesmo significativo que entre os mais insignes cultores

    desta filosofia, se encontrem um escravo como Epicteto e um

    imperador como MarcoAurlio.A Filosofia Estica, de certo modo, preludia o Cristianismo.

    A Escola Epicrea

    escola estica ope-se a epicrea, a qual, por sua vez,foi antecedida pela escola cirenaica ou hedonstica, fundada

    por Aristipo de Cirene. Para esta escola, o nico bem o

    prazer; e o prazer igualmente o nico fundamento das obri

    gaes.Epicuro, que fundou a sua escola em Atenas no ano de

    306 A. C. e a manteve at morte (270 A. C.), parte do con

    ceito fundamental dos cirenaicos, mas teve o mrito de ter

    dado doutrina hedonista um mais amplo e racional desen

    volvimento. Para Epicuro, a virtude j no , como era para

    os esticos, o fim supremo da vida, mas meio de atingir a feli

    cidade. Assim se anuncia o princpio utilitrio ou hedonstico,

    contrrio ao da Moral estica, e pode afirmar-se que as escolas

    ticas posteriores se dividiram, segundo estas duas diversas

    concepes, em um contnuo contraste.Foi Epicuro homem sbio e prudente, que recomendava

    a temperana como virtude primeira para assegurar o prazer.Segundo a sua doutrina, no se trata de procurar quaJlquer

    HISTORIA DA FILOSOFIA DO DIREITO 53

    prazer, nem de fugir a toda a dor, mas conduzir-se em um

    modo que a soma final represente um mximo possvel de

    prazer e o mnimo possvel de sofrimento. Tal conduta envolve

    um certo clculo e uma medida utilitria. A intemperana,

    especialmente, prejudica o organismo, abrevia a vida e, por

    tanto, diminui a faculdade de gozar. Neste sentido, a Epicuro

    foi dado apontar preceitos de natureza tica.

    Por outro lado, a Escola Epicrea contm, embora em

    germe, uma teoria sobre a distino qualitativa ou graduao dos

    prazeres. Ao invs da Escola Cirenaica, que considerava sobre

    tudo as sensaes fsicas, Epicuro atribui maior peso aos pra

    zeres e s dores espirituais, assaz mais duradouros. Assim para

    ele, a amizade tida na conta de prazer maior. Isto mostra

    como a sua doutrina no exclusivamente materialista.

    Mas nesta graduao dos prazeres tem origem a crtica

    do utilitarismo; visto que se admitem prazeres superiores e

    inferiores, faz-se mister um critrio de escolha, uma regra quali

    tativa, de harmonia com a qual o sumo bem pode ser inclusivamente a satisfao da conscincia, ainda que a troco de uma

    dor fsica. Supera-se, deste modo, a simples doutrina hedonista

    que, sem distines, quer o prazer pelo prazer.

    Merece ainda ateno a doutrina de Epicuro respeitante

    ao Estado. Ainda neste campo, domina o utilitarismo. Nega o

    nosso filsofo que o homem seja por natureza socivel. Na

    origem, esteve em luta permanente com o seu semelhante. Mas

    tal luta, sendo causa de sofrimento, foi suprimida pelo Estado.

    luz desta concepo, o direito um pacto ditado pela utili

    dade e o Estado o efeito da resultante. Por isso, os homens

    podero sempre romper com tal pacto, quando da sua manu

    teno deixe de resultar a utilidade em funo da qual adveio

    a sua celebrao. O Estado epicurista, como se v, corresponde

    situao de anarquia potencial. Depara^se-nos aqui (pres

    cindindo de uma ou outra aluso dos Sofistas) a primeira

    formulao histrica da doutrina do contrato social, que, nesta

    sua primeira forma rudimentar e tosca, se contrape doutrina

    54 LIOES DE FILOSOFIA DO DIREITOHISTORIA DA FILOSOFIA DO DIREITO 55

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    54 LIOES DE FILOSOFIA DO DIREITO

    platnica ou aristotlica que dava ao Estado por fundamento

    a prpria natureza humana. Teremos ocasio de nos referir

    s diversas formas que a doutrina contratual assumiu depois,

    na Idade Mdia e na Idade Moderna.

    Os Juristas Romanos

    No teve Roma filosofia original; mas assim como no

    Oriente o supremo tema da actividade espiritual foi a Religio

    e na Grcia a Filosofia, em Roma foi o Direito. Neste domnio,

    Roma deu a medida da sua capacidade criadora e o seu saber

    mostrou-se excelso. Sem dvida, tambm l se manifestaram

    vrias correntes do pensamento filosfico, mas vieram da Grcia.

    Pode dizer-se que todas as escolas gregas tiveram represen

    tantes em Roma: o epicurismo foi exiposto por Lucrcio Caro

    no clebre poema De rerum natura; o estoicismo, por Sneca,

    MarcoAurlio, etc....

    Coube a Ccero (106-43 A. C.), no entanto, o mrito dehaver tomado a Filosofia popular em Roma, de ter servido de

    agente intermedirio entre o pensamento grego e o pensamento

    latino. As suas obras, a que deu grande esplendor formal e

    eloquncia, tm um contedo quase inteiramente grego. Ele

    prprio disse das suas obras:

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    sas circunstncias. Por ltimo, h o ius civile, que o que

    vigora para certo povo em particular. Entre os termos desta

    trieotomia ius naturale, ius gentium, ius civile no exis

    tem contradies necessrias, pois cada um deles corresponde

    a determinaes graduais do mesmo princpio.

    Tambm o Estado, para Ccero, um produto da natureza:

    um instinto natural impele o homem para a convivncia e,

    precisamente, para a convivncia poltica. Assim se renova a

    doutrina aristotlica.

    Os juristas romanos, em geral, possuam cultura filosfica.

    Mas em Roma, de entre todos os sistemas da filosofia grega,

    foi o estoicismo aquele que teve mais fortuna, pois era oque melhor correspondia ndole austera, ao carcter forte

    mente rgido do cidado romano. Tambm o ideal cosmopoltico

    dos esticos encontrava certa verificao positiva no crescente

    domnio de Roma. O conceito de uma lei natural, comum a

    todos os homens, tomou-se familiar aos juristas romanos, quase

    uma crena implcita e subentendida na sua prpria noo dedireito positivo. O fundamento deste a naturalis ratio, a qual

    no corresponde mera razo subjectiva, individual, mias

    racionalidade nsita na ordem das coisas. Como tal, superior

    ao arbtrio humano. H pois, urna lei natural, imutvel, preexis

    tente, que no deve o ser a uma elaborao artificial: lei uni

    forme, no sujeita a mudanas por obra dos homens (ius

    naturale est id quod semper bonum et aequum est).

    O conceito do ius naturale relaciona-se com o conceito da

    aequitas. Aequitas significa propriamente equiparao, isto :

    um tratamento igual dado a coisas ou relaes iguais. B um

    critrio que obriga a reconhecer aquilo que idntico no subs-

    tracto das coisas, para alm do vrio e do acidental.

    As ideias de lei natural e de equidade actuam como factores de progresso no campo do Direito. O direito positivo

    modificao do direito natural, feita com elementos arbitr

    rios e acidentais. As condies de tempo e de lugar mudam,a utilitas sugere normas particulares e isto amplamente

    reconhecido pelos juristas romanos. No obstante, perseveraram

    sempre no estudo do direito com o intuito de o reconduzirem

    s suas razes mais profundas, de confrontarem a norma com

    o seu natural fundamento, suprimindo desarmonias e desigual

    dades, equiparando e equilibrando, de modo a expurgar tudo

    quanto seja inquo ou irracional.

    O simples reconhecimento de que o Direito positivo con

    trrio ao Direito natural no basta de per si para o abolir, mas

    determina uma tendncia para a sua reforma ou modificao,

    tambm no momento da aplicao judicial da lei mediante a

    aequitas.Advirta-se que o magistrado romano detinha um poder

    assaz mais vasto do que o magistrado moderno; tanto que, ao

    entrar no desempenho do cargo, o pretor anunciava as mximas

    que informariam a sua jurisdio (edictum).

    O Direito natural permanece, assim, como se acabou de

    ver, o mais alto critrio terico.

    Dele se deduzem as mximas mais gerais, como esta, por

    exemplo: todos os homens so iguais e livres (segundo os ensi

    namentos da filosofia estica). Os juristas romanos, ao enun

    ci-la, reconheciam expressamente, portanto, que a escravatura

    contrariava o direito natural; mas justificavam-na em nome

    do ius gentium, pois era costume vigente em todos os povos

    (em consequncia da guerra). Outro princpio do direito natural

    o enunciado pela frmula: adversus periculum naturalis ratio

    permittit se defenderei. o princpio da legtima defesa (vim

    vi repellere licet).

    A Ulpiano se deve uma definio de direito natural dife

    rente da que nas obras de outros escritores se l: o direitonatural escreve quod natura animalia docuit.Com esta

    definio, a validez do Direito natural abrange tambm os

    animais em geral; mas, substancialmente, limitou-se a formu

    lar de outro modo o que era para todos um firme princpio,

    ou seja: o fundamento do Direito est na prpria natureza

    das coisas naqueles motivos que, embora no homem se desen

    58 LIOES DE FILOSOFIA DO DIREITO HISTORIA DA FILOSOFIA DO DIREITO 59

  • 7/23/2019 Lies de Filosofia Do Direito - Giorgio Del Vecchio

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    volvam mais amplamente, todavia j se encontram em germe

    nos animais inferiores.Questo importante em tomo das ideias jurdicas dos roma

    nos, a respeitante ao ius gentium. Esta designao era usada

    em diversos sentidos, que convm distinguir rigorosamente. Emuma primeira acepo, por ius gentium nomeia-se o complexo

    de normas que no Estado romano se aplicam aos estrangeiros.

    Isto : entre estrangeiros e estrangeiros, e entre estrangeiros

    e romanos, muito embora aqueles fossem excludos do ius civile.

    Em regra, para estas relaes internacionais estabelecia-se um

    direito simples, despido das formalidades solenes de que se

    revestia o direito prprio do povo romano. O ius gentium o

    modo simples e suficiente de regular as relaes a que so

    admitidos tambm os estrangeiros.

    segunda acepo, que depois foi dada frmula, deve-se

    ter chegado assim: em uma primeira fase, os romanos no

    conceberam o ius gentium como superior ao ius civile, mas

    como inferior, maneira de um direito rudimentar, tosco; emuma segunda fase, debaixo da influncia da Filosofia grega,

    reconheceram nessa mesma simplicidade de relaes a marca

    da natureza, o reflexo da lei natural; portanto, viu-se nele um

    elemento de superioridade. O ius gentium considerou-se como

    expresso das exigncias primordiais e comuns de todos ospovos, como a revelao mais directa da razo universal. Ento

    entendeu-se por jus gentium o Direito positivo comum a todosos povos (quasi quo jure omnes gentes wtuntur).

    Assim, um facto da experincia assumiu, a pouco e pouco,

    significado filosfico, chegando-se tricotomia: direito natural

    (universal, idntico, perptuo); direito das gentes (elementos

    comuns que se encontram nos vrios direitos positivos); direitocivil (com as suas particularidades que so determinaes ulte

    riores das precedentes).Mas amide o ius gentium aparece confundido com o ius

    naturale.Aquele, porm, conceito essencialmente romano, sadoda experincia histrica dos romanos; este, conceito prprio da

    Filosofia grega. Isto no exclui que os romanos possam ter

    tido alguma intuio em tal sentido, antes ainda do influxo

    da filosofia grega. Os dois conceitos protendem a encontrar-se

    e, por vezes, dir-se-ia que coincidem. Todavia, diferente e no

    raro oposto o sentido de cada um deles, de sorte que no se

    pode aceitar a tese, segundo a qual estes tenham constitudo

    realmente uma s cousa. J citmos o facto de os juristas roma

    nos para quem a escravatura face dos jus naturale (diantedo qual todos os homens nascem livres) era ilcita a consi

    derarem face do jus gentium justificvel. Isto bastaria para

    mostrar a diversidade dos dois conceitos.

    Alis, os juristas romanos no foram grandes pelas abstrac

    es tericas nem pelas ideias puramente filosficas, mas na

    transposio destas para a prtica do Direito positivo, nas suas

    aplicaes. Souberam satisfazer as exigncias lgicas e as neces

    sidades mutveis da realidade. Embora os juristas romanos

    guardassem o maior respeito pelas formas histricas e tradi

    cionais das instituies, no forando ou impedindo a sua evoluo contnua, nunca perderam de vista a vida concreta e a

    natureza das coisas. Souberam contribuir permanentemente

    para o progresso jurdico, segundo o contedo das novas exi

    gncias, com uma perfeita tcnica formal.

    Nisto est a sua glria mxima. A nossa disciplina tem

    por fontes clssicas a filosofia grega e a jurisprudncia romana.

    O Cristianismo e a filosofia do direito na Idade Mdia

    A sublime doutrina religiosa e moral que, nascida na Pales

    tina, se difundiu em poucos sculos em grande parte do mundo

    civilizado, provocou profunda transformao nas concepes

    do Direito e do Estado. Originariamente, porm, a doutrina

    crist no tinha significado jurdico ou poltico, mas to s

    moral. O princpio cristo da caridade, do amor, da fraterni

    dade, no se props obter reformas polticas e sociais, mas sim,

    reformar as conscincias. A liberdade e a igualdade de todos

    60 LIES DE FILOSOFIA DO DIREITO

    >

    HISTORIA DA FILOSOFIA DO DIREITO 61

  • 7/23/2019 Lies de Filosofia Do Direito - Giorgio Del Vecchio

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    60

    os homens, a unidade da grande famlia humana, constituem,

    sem dvida, corolrio da pregao evanglica. Estas ideias, con

    tudo, no foram directamente dirigidas contra a ordem pol

    tica existente. A prpria escravatura no foi combatida, mas

    respeitada como instituio humana, muito embora se afir

    masse a igualdade dos homens perante a lei divina. Os Padres

    da Igreja chegaram a consider-la como condio propcia aosservos e aos senhores: aos primeiros, para se exercitarem na

    pacincia e obedincia devida aos segundos; a estes, na doura e

    benevolncia devida queles. No se sustenta, em suma, a neces

    sidade de abolir a escravatura, embora se aconselhasse a conve

    nincia de se mitigar a mesma com os princpios cristos do

    amor e da caridade. A doutrina de Cristo foi essencialmente

    apltica. Todos os seus ensinamentos, ainda mesmo aqueles

    que depois foram usados para justificar o domnio temporal,

    tiveram originria e exclusivamente um significado espiritual.

    Jesusdisse: No vim para ser servido, mas para servir. Omeu Reino no deste mundo. Dai a Csar o que de Csar,

    a Deus o que de Deus. Os tributos devem ser pagos ao

    Estado, no Igreja, pois esta, ao contrrio daquele no se

    ocupa, nem deve ocupar-se de assuntos mundanos.

    A doutrina crist, todavia, produziu efeitos e ganhou in

    fluncias notveis sobre a Poltica e as cincias que se lhe refe

    rem. Um primeiro efeito, de natureza metodolgica, consistiu

    na aproximao do Direito da Teologia. Se o Mundo gover

    nado por um Deus pessoal, logo se vem a considerar o Direito

    como emanado de uma ordem divina e o Estado como instituio

    divina. Por sua vez, a vontade divina conhece-se, no pelo racio

    cnio, mas pela Revelao: antes de ser demonstrada, deve ser

    acreditada ou aceite pela f. S na poca do Renascimento, na

    qual se verificou, de certo modo, um ressurgimento da Filosofia

    e da cultura greco-latina, a doutrina clssica recebeu reconfir

    mao e voltou a dizer-se que o Direito independente da

    Teologia e deriva da natureza humana.

    Outro efeito do Cristianismo ou, melhor, da forma his

    trica do Cristianismo est patente na nova concepo do

    Estado e da posio deste em face da Igreja. Na antiguidade

    clssica, acima do indivduo, s o Estado existia como per

    feita unidade; o indivduo tinha a suprema misso de ser bom

    cidado, de ao Estado se dar inteiramente. O homem era, acima

    de tudo e essencialmente cidado, e, para ele, nada existia

    para l do Estado. Com o Cristianismo, outro fim proposto

    ao indivduo: um fim religioso, ultramundano. A meta final

    j no a vida civil, mas a felicidade eterna, a beatitude celeste,

    cuja obteno se consegue mediante a subordinao vontade

    divina, representada pela Igreja. A religio do Estado clssico

    era uma magistratura que lhe estava sujeita; na Idade Mdia,

    a Igreja tende a sobrepor-se ao Estado, visto que, enquanto este

    se ocupa das coisas terrenas, aquela ocupa-se das coisas eternas.

    Da a pretenso de usar do Estado como meio de atingir fim

    religioso. A Igreja vem assim a afirmar-se como autoridade

    autnoma, superior ao Estado. E, desta sorte, as relaes polticas adquirem dois aspectos e complicam-se: aos dois termos

    iniciais cidado e Estado junta-se um terceiro a Igreja.

    O princpio fundamental do Cristianismo, o seu ideal a

    fraternidade dos homens em Deus mais elevado e amplo do

    que o princpio fundamental da Grcia clssica. Por via de regra,

    o grego confinava-se ao Estado, no via algo para alm da7VXl.

    O cosmopolitismo foi apenas tese formulada pelos esticos,

    a qual, de certo modo, preludia o Cristianismo. O ideal cristo,

    porm, na medida em que actua como factor histrico e como

    princpio da organizao social, assume algumas das caracte

    rsticas prprias dos sistemas polticos; como fora social, nem

    sempre teve o carcter de efectiva universalidade, mas operou

    como termo antittico de outras foras. A Igreja, politicamente,

    afirmou-se sempre, de certo modo, como o partido guelfo em

    relao ao partido gibelino, como Estado perante outros Estados.

    fi muito importante notar que os Padres da Igreja, se bem

    62 LIOES DE FILOSOFIA DO DIREITOHISTORIA DA FILOSOFIA DO DIREITO 63

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    que extrassem do Declogo e do Evangelho os princpios do

    direito natural, acolheram tambm em grande parte, as dou

    trinas dos juristas romanos sobre esse ponto, os quais, sob a

    influncia dos filsofos gregos, especialmente dos esticos,

    haviam admitido, semelhantemente, a existncia de uma lei

    natural, como pressuposto das leis positivas. Esta concepo

    jusnaturalstica transmitida depois aos canonistas e a todos

    os estudiosos da Idade Mdia, recebeu desenvolvimento ade

    quado na Filosofia escolstica, como se v sobretudo no sis

    tema de S. Toms.Desempenhou, por isso, na civilizao posterior uma funo

    reguladora. Pode dizer-se que os elementos essenciais do pensa

    mento clssico no se perderam inteiramente, no bstanite

    a transformao operada pelo Cristianismo, mas antes deve

    ram a este uma nova vida.A influncia da doutrina Crist fez-se sentir geralmente

    no sentido de uma mitigao e humanizao gradual de nume

    rosos institutos jurdicos, designadamente numa maior considerao pela boa f; na proibio do abuso do direito de pro

    priedade ; num maior favor pelas manumisses e institutos pios

    em proveito, sobretudo, dos pobres, e no combate ao divrcio,

    o concubinato e contra as atrocidades das penas e das liutas

    de gladiadores.Surta na idade antiga e desenvolvida na Idade Mdia em

    que especialmente veio a obter predomnio, a Filosofia Onst

    divide-se em dois perodos principais: a Patrstica e a Escols-

    tica. Naquela fixam-se os dogmas, os artigos da f por acodos Padres da Igreja, de que lhe advm o nome, nesta d-se

    a elaborao dos dogmas, graas, especialmente, aos elementos

    proporcionados pela Filosofia Grega.

    A Patrstica

    A Patrstica vai das origens do Cristianismo at Carlos

    Magno (800), e subdivide-se em dois perodos, separados pelo

    conclio de Niceia (325). Entre os Padres da Igreja, depois

    dos Apstolos, recordaremos: Tertuliano, Clemente Alexan-

    drino, Orgenes, Lactncio, Santo Ambrsio, etc.... O mais

    importante de todos , contudo, Santo Agostinho (354-430),

    que escreveu numerosas obras. Nascido emTagaste, na Num-

    dia (Arglia), veio a falecer em Hipona como bispo. sobre

    tudo na obra em vinte e dois livros intitulada De civitate Dei

    que desenvolve a sua teoria da histria do gnero humano,

    sobre o problema do bem e do mal, sobre o destino ultrater-

    reno do homem, sobre a Justia e sobre o Estado. Em nenhuma

    outra obra se poder observar melhor a diferena entre o

    conceito helnico e o conceito cristo de Estado. Ao passo que

    os gregos tinham exaltado o Estado como sendo o fim supremo

    do homem, Santo Agostinho exalta sobretudo a Igreja e a

    comunho das almas em Deus. A Civitas terrena a qual nocorresponde precisamente a um Estado concreto, mas, em

    geral, ao reino da impiedade (societas impiorum) resulta do

    pecado original, sem o qual no existiriam senhorios polticos,juizes e penas. Os Estados tm at, delitos por origem (Caim

    e Rmulo, por exemplo, foram fratricidas) e o prprio Imprio

    romano surge aos olhos de Santo Agostinhoprofundamente

    corrupto e viciado pelo paganismo.

    A Civitas terrena, portanto, caduca, e aspira a ser substi

    tuda pela Civitas Dei (ou civitas colestis), que existe j na

    terra, embora parcialmente, e, por ltimo, chegar a reinar s.

    Por Civitas Dei entende Santo Agostinho a comunho dos

    fiis, a qual como que figura uma cidade divina, pois os fiis

    esto predestinados a participar da vida e da beatitude eternas.

    O Estado terreno possui finalidade louvvel, e deriva tam

    bm da vontade divina e da natureza enquanto se prope manter a paz temporal entre os homens; mas sempre subordinado

    cidade celeste, isto , praticamente Igreja, a qual procura

    obter a paz eterna. A sua justificao, de valor relativo, reside

    sobretudo na sua aptido a servir de instrumento por meio do

    qual a Igreja atinge os seus prprios fins (deve, por isso, repri-

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    64 LIOES DE FILOSOFIA DO DIREITO

    mir as heresias). O Estado terreno desaparecer uma dia, a fim

    de dar lugar ao estabelecimento do reino de Deus.

    Esta concepo grandiosamente catastrfica das coisas

    humanas explica-se, pelo menos em parte, por experincias polticas do tempo de Santo Agostinho, que assistiu invaso do

    Imprio pelos brbaros. Ao nosso Santo se deve, por outro lado,

    a elaborao das partes mais severas da doutrina crist: pre

    destinao, condenao eterna da maior parte dos homens,

    etc. A Filosofia poltica de Santo Agostinho representa o

    triunfo da asctica. Nesta concepo, que tende a depreciar

    o Estado, as aspiraes ultramundanas so exaltadas custa

    dos valores da vida terrena. Notamos ainda que a obra Civitas

    Dei pode considerar-se o primeiro ensaio da Filosofia da hist

    ria, sob ponto de vista cristo. Santo Agostinho v na hist

    ria a realizao dos desgnios da Providncia divina. Ele indica,

    por exemplo, a conquista de Roma pelos brbaros como um

    prembulo do juzo universal.

    A Escolstica

    Com a Filosofia Escolstica verifica-se parcial regresso

    Filosofia Clssica. Na segunda metade da Idade Mdia, diver

    sas obras, especialmente de Filosofia Grega, que no obscuro

    perodo anterior tinham sido perdidas ou ignoradas, foram nova

    mente descobertas e postas em lugar de honra. Todavia foram

    estudadas com mtodo dogmtico e no intuito particular de as

    conciliar com os dogmas religiosos este o carcter funda

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    HISTORIA. DA FILOSOFIA DO DIREITO 65

    ram milagre de engenho na elaborao dos dogmas e no esforo

    de harmoniz-los com a Filosofia Clssica. No foram ainda

    superadas a agudeza e a habilidade dialctica dos escolsticos

    para fazer distines. Mesmo conservando o carcter dogmtico, a Filosofia Escolstica tentou desenvolver os dogmas reli

    giosos mediante anlises racionais, na medida em que estas

    eram consentidas pelos limites impostos pela f. Ainda neste

    intento ficou visvel e foi fecundo o influxo do pensamento

    clssico.Assim se verifica com particular evidncia nas doutrinas

    de S.Toms de Aquino (1225-1274), o principal representante

    da Escolstica. A sua obra mais importante e conhecida, a

    Summa Theologiae, compndio sistemtico do saber do seu

    tempo, deu-lhe a fama e a qualidade de Mestre e de Chefe dou

    trinal do Catolicismo. Mas, alm desta, escreveu outras obras,

    de que citaremos um tratado, De regimine principum,cujo pri

    meiro livro, apenas, segundo parece, da sua autoria, perten

    cendo os restantes livros a um seu discpulo, Ptolomeu da

    Luca (Ptolemaeus Lucencis).A S. Toms se deve a sistematizao mais orgnica do

    pensamento cristo. S assinalaremos aqui os passos de maior

    interesse para a nossa disciplina. O fundamento da doutrina

    jurdica e poltica tomista a admisso de trs categorias deleis: Lex cetema, Lex naturalis e Lex humana. A primeira

    a prpria razo divina, governadora do mundo ratio divincesapientice de ningum conhecida inteiramente em si, mas da

    qual o homem pode obter conhecimento parcial atravs das

    66 LIOES DE FILOSOFIA DO DIREITO HISTORIA DA FILOSOFIA DO DIREITO 67

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    tatis humance naturce (ib. q. 91, arts. 2. e 4.) A lex humana

    , por ltimo, inveno do homem, mediante a qual, utili

    zando-se os princpios da lei natural, se efectuam aplicaes

    particulares dela (ib. q. 91, art. 3.; q. 95, art. 2.). Mas a lei

    humana pode derivar da natural de duas maneiras: per modum

    conclusionum e per modum determinationis. No primeiro caso,

    representa concluses silogsticas deduzidas de premissas for

    necidas pela lei naturail; no segundo, uma mais completa especificao do preceituado genericamente pela lei natural.

    Desta trade surgem alguns problemas prticos. Por exem

    plo: ser devida obedincia lex humana no caso de ela con

    trariar a lex naturlis ou a lex aetema? Ou, se antes se pre

    ferir: at que ponto deve o cidado obedincia s leis promul

    gadas pelo Estado? Segundo a doutrina tomista, a lei humana

    dever ser obedecida, ainda mesmo no caso de contrariar o

    bem comum isto : mesmo quando provoque um dano, a

    fim de que a ordem seja mantida (propter vitandum scandalum

    vel turbationem) ; no dever ser obedecida, porm, se implicar violao da lex divina (contra Dei mandatum). Tal seria

    o caso de uma lei que impusesse um culto falso.

    O influxo de Aristteles patenteia-se ainda mais clara

    mente na doutrina tomista do Estado, e tambm evidente

    a diferena entre a teoria tomista e a de Santo Agostinho.

    Para S. Toms o Estado um produto natural e necessrio

    satisfao das necessidades humanas. Ele deriva da natureza

    social do homem e existiria independentemente do pecado.

    O Estado tem por fim garantir a segurana dos co-associados

    e promover o bem comum. O Estado uma imagem do reino

    de Deus.iS. Toms, deste modo contrastando com Santo Agostinho,

    reabilita o Estado e o seu conceito. No entanto, por outro

    aspecto, mantm-se fiel lio agostiniana quando mantm a

    doutrina da subordinao do Estado Igreja, qual deve obedecer sempre, ajuidando-a assim a atingir os fins dela. Estado

    que se oponha Igreja no legtimo. O Papa, representante

    do Poder divino, tem direito de punir os soberanos e pode dis

    pensar os sbditos do dever de obedincia, desligando-os do

    juramento de fidelidade. Esta maneira de pensar teve enorme

    importncia na histria poltica da Idade Mdia.

    Eis em resumo a teoria tomista, que contm preciosos ele

    mentos deduzidos, em parte, das doutrinas gregas e romanas.Nela, sob certo aspecto, pode notar-se como um defeito o atri

    buir Autoridade preponderncia sobre a Liberdade. O homem,embora livre, considerado regularmente numa situao passiva

    ante a autoridade pblica, quer seja civil, quer estadual. Ele

    no ocupa o lugar central. No o autor das leis, deve to

    s estar-lhes sujeito. A sua autonomia no lhe plenamente

    reconhecida na ordem terica (como sujeito de conhecimento),

    nem na ordem prtica (como sujeito de aces). A heteronomia

    domina. Isto, certo, no exclui conceito elevado da persona

    lidade humana, participe de uma substncia e de uma lei abso

    lutas. S. Toms diz que as substncias racionais, ou seja, as

    pessoas, hbent dominium sui actus; et non slum aguntwr,sicut alia, sed per se agunt(S. T., l.ftq. 29, art. 1.).

    Por outro lado de observar que no sistema tomstico

    a autoridade no concebida como completamente arbitrria,

    mas sim limitada pelos preceitos da ordem natural.

    No mbito da prpria Filosofia Escolstica h que referir a

    divergncia parcial representada pelo franciscano Duns Scotus,