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9 Lição 1 Planejando e estruturando seu trabalho Jan Lublinski

Lição 1 Planejando e estruturando seu trabalhowfsj.org/course/pt/pdf/mod_1.pdf · 1.1 Introdução Repórteres de ciência, mesmo os experientes, tendem a se apaixonar à primeira

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    Planejando e estruturando seu trabalho

    Lição 1

    Planejando e estruturando seu trabalho

    Jan Lublinski

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    Curso On-line de Jornalismo Científico

    1.1 Introdução

    Repórteres de ciência, mesmo os experientes, tendem a se apaixonar à primeira vista: Uma droga nova contra tuberculose – tenho que escrever sobre isso! Matéria escura – que mistério emocionante! Um computador por criança – temos que discutir isso!

    Mas escrever bem sobre ciência não é só encontrar temas instigantes. Questões complexas precisam ser, pelo menos em parte, compreendidas e colocadas dentro de um contexto, coisa que os cientistas podem não fazer nas entrevistas mais simples.

    Escrever sobre ciência envolve pensar sobre as questões: Qual será o foco do meu trabalho? Como eu planejo, negocio e apresento uma matéria?

    Após completar esta lição, você terá uma nova visão sobre perfil dos veículos, audiências e ângulos de abordagem possíveis para as notícias jornalísticas. Você também estará mais familiarizado ou familiarizada com o conceito de sentença de pesquisa, o que pode ajudar você a estruturar sua pesquisa, bem como a escrever sua matéria. E você terá uma breve introdução sobre os conceitos de escrita narrativa e sentença narrativa.

    1.2 Quem é você?

    O jornalismo é uma profissão importante; tem um papel crucial na sociedade. Então, o seu trabalho é tão importante quanto o de um fazendeiro, um político, um médico ou um cientista.

    Mas seu trabalho e suas prioridades são bem diferentes.

    Lembre-se de que você é jornalista, não cientista. Tenha em mente também que você não é um professor ou professora, embora tenha que explicar muitas coisas para seu público. E você também não é um escritor ou escritora literária, embora precise escrever de um jeito que faça as pessoas gostarem de ler suas matérias.

    Seu trabalho é informar o público de forma efetiva e agradável, além de ficar com a antena sempre ligada para captar, por exemplo, questões controversas. Não importa se você trabalha como freelance ou faz parte da equipe do jornal, se você é editor-chefe ou repórter – você é um ou uma jornalista profissional e está prestando um serviço importante à sociedade.

    Profissão

    Fazendeiro(a)

    Político(a)

    Médico(a)

    Cientista

    Professor(a)

    Escritor(a) literário(a)

    Jornalista

    Serviço para a sociedade

    comida, energia

    democracia, legislação

    tratar pacientes, saúde pública

    conhecimento, tecnologia, busca da verdade

    educação

    arte, ficção, entretenimento

    informação, debates públicos, antena ligada

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    Planejando e estruturando seu trabalho

    1.3 Conhecendo o perfil do seu veículo

    Mesmo uma matéria excelente não é boa se não está adequada ao perfil do veículo. Muitos jornalistas científicos novatos sugerem temas aos editores que não são relevantes para aquela publicação ou programa de rádio e TV. Na maioria dos casos, isso poderia ser resolvido com uma análise minuciosa do que já foi produzido ou transmitido.

    Então, descubra o que o veículo tem publicado sobre o tema que você propõe ou temas afins. Como ele lida com esses tópicos? Que ângulos ele privilegia? Ele apresenta o tema apenas como notícia ou há debates também?

    Você também deve considerar que tipo de matéria quer apresentar. Se você desejar simplesmente apresentar fatos ou colocar notícias em um contexto, uma matéria curta geralmente é o formato mais indicado. Se você tem um fato maior para contar, que exige mais informações, uma reportagem especial pode ser melhor. Ou, ainda, se você deseja apresentar um texto mais subjetivo, proponha um texto de opinião. Rádio e TV oferecem muitos formatos diferentes: entrevistas, reportagens com trechos de entrevistas, documentários. Para ter certeza de que seu produto combina com o perfil do veículo, procure e leia, assista ou ouça uma matéria já publicada no formato que você escolheu. Tente se familiarizar com o maior número de formatos possível.

    1.4 Trabalhando com editores

    Descubra quem é o editor ou editora. Eles tendem a ser mais receptivos se você conhece seus interesses e o que eles publicaram anteriormente.

    Uma vez que você tem uma ideia clara da notícia que quer propor, envie a sugestão para o editor ou a editora. Explicar por telefone por que a matéria é relevante e como você pretende abordar o tema pode ser mais eficaz do que enviar informações por e-mail. Descreva em linhas gerais o que pretende fazer, esteja aberto(a) a sugestões e certifique-se de que você concorda quanto aos procedimentos necessários. Se você decidir enviar um e-mail antes de telefonar, tenha cuidado ao escrevê-lo – um pequeno esforço extra neste momento pode fazer toda a diferença.

    Estabeleça uma relação de trabalho com o seu editor ou a sua editora. Uma vez que você começou sua pesquisa sobre o tema, mantenha contato. Informe e envolva os editores, especialmente se a notícia ou o ângulo de abordagem mudarem. Porém, tenha em mente que editores estão sempre ocupados e preferem repórteres que não criam trabalho extra. Limite sua comunicação a um mínimo. Avise-os se você não vai cumprir o prazo. E certifique-se de que você está escrevendo uma matéria do tamanho combinado. Se você tem informações extras, considere a possibilidade de, posteriormente, fazer uma outra matéria que dê seguimento ao assunto.

    Prepare-se para revisar seu texto depois que o editor ou a editora o tiver lido. Editores têm sua própria visão sobre uma matéria e alguns podem querer mudar sua versão inicial, talvez solicitando trabalho adicional. Mas certifique-se de que o texto ainda passa sua mensagem.

    Claro, editores variam de bons – ou mesmo excelentes – a ruins. Trabalhar com diferentes editores vai ensinar-lhe muitas coisas. Não desanime por causa de revisões ou discussões: elas são práticas editoriais corriqueiras. Preste atenção às alterações feitas por bons editores em seu trabalho – esta é a melhor forma de tornar-se um(a) jornalista mais habilidoso(a).

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    Curso On-line de Jornalismo Científico

    1.5 Conhecendo seu público

    Quem é o público-alvo de um determinado veículo de comunicação? Ele lê sobre ciência regularmente? Ou este é apenas um entre muitos outros tópicos? A audiência está apenas parcialmente interessada (como frequentemente é o caso do rádio) e precisa ser convencida a ler, ver e ouvir suas matérias?

    Procure evitar pensar que você está escrevendo para os cientistas que você entrevistou. Eles não são os seus principais leitores, ouvintes ou expectadores.

    Explicar conteúdos científicos é importante, mas não é a única tarefa do(a) jornalista. Jornalistas têm que popularizar a ciência para atrair o interesse do público. Mas o jornalismo científico também procura mostrar às pessoas os limites do nosso conhecimento. Estamos falando da boa investigação jornalística, de relacionar a ciência a outras partes da sociedade – política, economia, saúde. E estamos falando de criticar cientistas e outros especialistas quando necessário.

    Tente imaginar que você é um(a) amigo(a) ou advogado(a) do leitor(a), não seu(sua) professor(a). Como você pode informá-lo, entretê-lo ou ajudá-lo? Então, decida que aspectos do tema você precisa analisar e quais são menos importantes.

    Pense no quanto você deve se aprofundar nos conteúdos científicos e nas metodologias usadas. Frequentemente as implicações da pesquisa são importantes, mas algumas vezes o próprio conteúdo científico é extremamente relevante. Se você não tem certeza, leia outras publicações sobre o mesmo tema, pergunte ao editor(a) ou a colegas, e nunca se esqueça de quem é a sua audiência.

    Exemplo 1:

    Clique no link a seguir para ver uma matéria jornalística em que há necessidade de explicar um método científico para colocar a notícia em seu contexto:Novidade promissora contra a Aids[http://cienciahoje.uol.com.br/138286]

    Exemplo 2:

    Clique no link a seguir para ver uma matéria jornalística que, apesar de tratar do uso de nova tecnologia, não explica em detalhes como ela funciona. O texto, porém, discute as possíveis aplicações da tecnologia, que parecem interessar mais aos leitores:

    Programa acelera comparação de genomas[http://www.fiocruz.br/ccs/media/34-37%20bioinformatica.pdf ]

    1.6 Pesquisando o tema

    Reserve tempo para planejar cuidadosamente sua pesquisa jornalística. Liste as pessoas com quem você precisa falar e em que ordem você pretende encontrá-las ou telefonar para elas.

    Tenha em mente que jornalismo significa usar mais de uma fonte.

    Tenha em mente também que entrevistar as pessoas certas é tão importante quanto entrevistar várias pessoas. Tenha certeza de que você buscou todos os lados da notícia. Muitas vezes, não é suficiente falar apenas com cientistas. Você pode falar também com membros de organizações não-

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    governamentais (ONGs), políticos, empresas e pacientes ou pessoas que lidam com determinado problema. Inclua quantas pessoas for possível. Mas lembre-se também de que o jornalista deve trabalhar com eficiência. Não perca seu tempo com fontes ou aspectos do tema que não acrescentam nada à sua matéria.

    Tente avaliar a reputação de diferentes fontes de notícias científicas. Cheque as principais informações com diferentes especialistas. Mas também pergunte a eles sobre as fontes que você está usando. E não hesite em questionar especialistas sobre outros especialistas e seus campos de conhecimento. Dessa maneira, você vai criar um olhar mais sensível sobre o assunto que está abordando.

    Tente criar hipóteses e questioná-las. Esteja pronto para mudar seu plano de ação quando parecer necessário.

    Exemplo:

    Clique no link a seguir para acessar uma reportagem, em espanhol, que é um exemplo de como os repórteres podem cobrir vários lados de uma notícia.Gobierno de Brasil compensará recorte de fondos en CyT(Governo do Brasil compensará corte de orçamento em C&T)[http://www.scidev.net/es/news/gobierno-de-brasil-compensar-recorte-de-fondos-en-.html]

    1.7 Qual o seu ponto de vista?1.7.1 A câmera do jornalista

    Como jornalista, você deve ter consciência de que vê as coisas sob determinada perspectiva. Você relata eventos e questões que observa por um determinado ponto de vista. Você pode estar sentado(a) em sua mesa ou num laboratório de um cientista; pode estar escrevendo sobre o que ouviu numa entrevista coletiva ou sobre o que viu na cozinha de alguém.

    Toda matéria precisa de um ponto de vista ou perspectiva. Mesmo que você esteja escrevendo sobre ciência, não existe uma visão jornalística “objetiva”. Você pode escolher destacar uma tendência, colocar o resultado de uma pesquisa num contexto ou comentar uma controvérsia científica. Ou talvez você queira fazer o perfil de uma pessoa após passar um dia de trabalho com ela.

    Então, lembre-se: há muitas maneiras de contar a mesma história. Escolha cuidadosamente a sua.Pense em você como um(a) jornalista segurando uma câmera – mesmo que você esteja trabalhando para veículos impressos, on-line ou rádio. A pergunta é: para onde você vai apontar sua câmera imaginária?

    Sua câmera pode estar:

    • focada em uma única pessoa, como um paciente ou uma vítima;• posicionada no alto, a uma certa distância, de forma independente e pouco envolvida;• focada em uma organização que oferece informação, como uma ONG ou empresa;• focada em uma comunidade científica;• focada no público, examinando problemas de sua vida cotidiana;• ... e certamente existem outras opções.

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    Uma vez posicionada a sua “câmera”, deixe-a onde está. Não a mude de um lugar para outro sem um bom motivo. Em outras palavras, atenha-se a uma determinada perspectiva enquanto estiver criando sua reportagem – isto é, a menos que você esteja preparando um material muito grande e precise mudar a posição da sua “câmera”. Nesse caso, deixe isso claro para o seu leitor.

    Exemplo:

    Imagine que você deseja cobrir a construção de uma nova usina geotérmica na África Ocidental. Seu editor permite que seja uma reportagem longa. Uma matéria curta poderia ter uma de três possíveis posições da “câmera”, mas uma grande reportagem pode combinar as três perspectivas:

    a. As pessoas que podem se beneficiar da fonte de energia renovável.

    b. Os engenheiros e a companhia que vão construir a usina – seu trabalho e o risco financeiro envolvido em cada escavação.

    c. Funcionários do governo e de ONGs que apoiam a construção da usina geotérmica. Qual é a sua visão sobre o suprimento de energia no futuro?

    Clique no link a seguir para acessar uma reportagem, em inglês, que ilustra como isso pode ser feito:Kenya looks underground for power(Quênia procura energia no subsolo)[http://news.bbc.co.uk/2/hi/africa/4473111.stm]

    1.7.2 Trabalhando com a “sentença de pesquisa”

    Para esclarecer sua abordagem de uma notícia, você pode achar útil escrevê-la em uma só sentença. Isso pode ajudar a planejar sua investigação, bem como a preparar sua primeira versão da matéria e a encontrar um estilo para escrever.

    A frase a seguir pode ser um ponto de partida muito útil:“Após finalizar minha investigação jornalística, vejo desta maneira: ...”A ideia é completar esta “sentença de pesquisa” várias vezes ao longo da apuração, falando-a em voz alta ou anotando-a.

    Exemplos:

    1. “Após finalizar minha investigação jornalística, vejo desta maneira: o Quênia trabalha por um futuro melhor investindo em fontes de energia geotérmicas.”

    2. “Após finalizar minha investigação jornalística, vejo desta maneira: usinas geotérmicas podem ajudar a resolver os problemas de energia em algumas partes do mundo, mas o risco financeiro envolvido nas escavações ainda é um grande obstáculo.”

    3. “Após finalizar minha investigação jornalística, vejo desta maneira: uma plantação de flores que usa energia geotérmica no Quênia é um exemplo do uso criativo e vitorioso dessa forma de energia.”

    Como nos exemplos anteriores, a parte complementar da sentença deve sempre incluir um ponto de vista ou mesmo um julgamento. Isso não significa incluir sua opinião ou mesmo um comentário na matéria, mas deve ajudar você a encontrar um foco para sua investigação jornalística e posicionar bem a sua “câmera”.

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    Usar a “sentença de pesquisa” ajuda você a:

    • Esclarecer como você quer contar a história e decidir que aspectos e fatos são importantes ou não. Você pode, inclusive, usar essa “sentença de pesquisa” antes de começar a sua pesquisa.

    • Saber como cada parágrafo deve se encaixar na matéria. Cada frase que você escrever deverá, de alguma forma, seguir a direção apontada pela “sentença de pesquisa” ou discutir um aspecto dela.

    Porém, é claro que fazer jornalismo significa também questionar suas próprias convicções. Então, esteja preparado(a) para alterar sua “sentença de pesquisa” durante sua investigação, se necessário. Você pode perceber que ela está errada ou que apenas não tão boa quanto uma nova opção.

    Observação: A “sentença de pesquisa” não aparece na matéria final. Ela é um guia para os jornalistas e a conclusão a que o leitor deve chegar depois de ler o texto.

    1.8 Estruturando o conteúdo

    Antes de começar seu texto, reserve algum tempo para planejá-lo. Escreva num pedaço de papel tudo o que precisa estar na matéria e em que ordem. Encontre uma introdução para seduzir um leitor parcialmente interessado. Na maioria dos casos, é melhor ir diretamente ao ponto, porque os leitores querem descobrir rapidamente qual é a notícia e onde o texto quer chegar. Uma matéria bem escrita não acrescenta fatos que não estão relacionados, mas, sim, segue um fio condutor. Deve estar claro para o leitor por que um parágrafo segue o anterior. Depois de começar a escrever, você pode querer mudar a estrutura inicial do artigo. Mesmo assim, é bom começar com um planejamento inicial. Também é útil esboçar desde o início como o texto vai terminar.

    Bons repórteres de ciência evitam afogar o leitor em informações. Jornalistas científicos não pretendem expor tudo o que eles sabem sobre o tema: escolhem minuciosamente o que apresentar ao público. Durante o planejamento e a confecção da matéria, tente espalhar as informações mais complexas, intercalando-as com parágrafos de leitura mais fácil. E tenha em mente o limite de palavras que você combinou com o editor ou editora.

    Esteja certo(a) de que escrever sobre ciências envolve escolhas cuidadosas. Os temas com que você lida são complexos, então você precisa decidir que aspectos devem ser definidos em linguagem mais simples ou explicados em detalhe. É igualmente importante pensar: Que tópicos podem ser abordados de forma superficial? Que aspectos você pode simplesmente descartar? Quanto mais claramente você definir seu ponto de vista, a posição da sua “câmera” ou a sua “sentença de pesquisa”, mais fácil vai ser tomar essas decisões.

    1.9 Escrita narrativa

    Começar seu artigo com uma história curta sobre uma personalidade ou pessoa comum pode captar a atenção do leitor, especialmente se o texto é uma reportagem especial. Mas isso só funciona se a história levar o leitor direto ao tema central de sua reportagem. Se a história inicial for realmente envolvente, você pode inclusive querer estendê-la a todo o artigo.

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    Exemplo:

    Clique no link a seguir e veja os dois parágrafos iniciais da matéria. Ela começa com uma história muito simples que leva o leitor ao tema principal.Aborto espontâneo é mais comum do que se pensa[http://delas.ig.com.br/aborto+espontaneo+e+mais+comum+do+que+se+pensa/n1237496370586.html]

    A escrita narrativa segue as regras clássicas da literatura. Ela requer um personagem principal e um oponente ou uma dificuldade que ele ou ela encontra. No final, você deve dizer se e como o conflito foi resolvido, ou mesmo as dificuldades que ficaram. Sua “câmera” vai focar este personagem e o público vai querer saber o que acontece (este método também funciona muito bem na TV e no rádio). Todas as informações gerais e científicas nesta história seriam incluídas ao longo do enredo literário.

    Pode ser útil completar as seguintes “sentenças narrativas”:Hoje vou contar a história do meu personagem principal chamado...Ele(a) encontra a seguinte dificuldade/ desafio/ conflito: ...No final, a dificuldade/ desafio/ conflito se resolveu / permaneceu sem solução – ou nada mudou.

    Por exemplo, em vez de simplesmente listar os últimos acontecimentos relacionados à vacina contra gripe, um redator ou redatora pode escolher trabalhar com a seguinte sentença:

    “Hoje vou contar a história de Jo Smith, um cientista que tenta encontrar novas vacinas contra os vírus da gripe. Mas ele tem que enfrentar essa batalha todos os anos.”

    1.10 O que não fazer...

    Aqui apresentamos um resumo de dicas que vão ajudar você durante todo o processo de planejar, pesquisar e escrever seu artigo.

    No jornalismo científico há algumas coisas que você não deve fazer...

    • Não apresente uma notícia exatamente da forma como foi apresentada num press release.• Não pense que você sempre tem que agradar a cientistas ou médicos com sua reportagem. Você não é o porta-voz deles. Eles não são seu público. Você pode, no entanto, ter que explicar aos cientistas entrevistados que há diferenças entre relações públicas e jornalismo.• Não hesite em consultar mais de um especialista sobre determinada questão. Isso permite que você apresente um ou mais lados da história.• Não tenha medo de consultar mais de uma instituição ou universidade sobre os temas.• Não exagere a importância de uma descoberta científica para promover sua matéria. Tente colocá-la dentro de um contexto.• Não coloque informações desnecessárias em seus artigos. O trabalho do jornalista é deixar de fora as coisas irrelevantes e escolher as informações mais importantes.• Não tenha medo de fazer perguntas estúpidas. Elas são parte do seu trabalho e sempre haverá alguém no seu público ansioso pelas respostas.• Não tenha medo de dizer ao cientista que não entendeu o que ele ou ela está dizendo.

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    1.11 ...E o que fazer

    Tente fazer as seguintes coisas:

    • Tome as rédeas da sua matéria. Tente pensar: esta é a minha matéria! Sou jornalista e posso decidir sobre o que a matéria será, incluindo que aspectos da notícia são interessantes e importantes para o meu público.• Tente ser tão preciso(a) quanto possível. Tente usar uma linguagem clara, que todo mundo possa entender. Tenha certeza de que você entendeu os fatos corretamente.• Responda às questões: Quem? O quê? Quando? Onde? Por quê? Como? E certifique-se de responder a todas as questões que o seu público poderia fazer.• Confirme se os fatos estão corretos, especialmente aqueles que você encontrou pesquisando na internet, pois eles podem estar ultrapassados.• Tente avaliar a importância da sua matéria. Quão grande ou importante ela é? Quem é afetado por essas questões? Com quem mais posso falar para aprender mais e conhecer os vários aspectos da questão?• Procure encontrar e explicar o contexto da notícia. Seu trabalho é ver conexões e implicações que mesmo os cientistas e políticos podem não ter visto.• Faça com que seu trabalho seja transparente. Diga ao público quais foram as fontes das informações mais importantes a que você teve acesso. Isso ajuda os leitores a saber como você fez a sua pesquisa e quem você entrevistou.• Considere o processo de edição como parte do trabalho. Um(a) jornalista que se recusa a ouvir críticas dos colegas não trabalha de forma profissional.

    1.12 Questões (1-3) As questões a seguir ajudarão você a revisar o conteúdo da parte teórica da Lição 1. Algumas soluções possíveis estão na próxima página. Tente não olhar nossas respostas antes de escrever as suas num pedaço de papel.

    Para começar, visite o site [http://www.scidev.net/es/practical-guides/], em espanhol. Procure identificar os critérios para que uma matéria jornalística seja publicada no portal SciDev.Net. Em seguida, responda às três primeiras questões:

    Questão 1:

    Quantos parágrafos o leitor de um artigo de SciDev.Net deve ler antes de compreender o sentido principal do texto?a. 1 parágrafob. 3 parágrafosc. 5 parágrafos

    Questão 2:

    Imagine que você começou a escrever sua primeira matéria para SciDev.Net, mas percebeu que já tem 600 palavras antes de terminar o texto. O que você faz?

    a. Reduz o número de palavras para 350, como foi combinado com o editor ou editora.b. Pede ao editor permissão para escrever 650 palavras.c. Escreve 1200 palavras, envia ao editor e explica por que seu texto virou uma reportagem.

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    Questão 3:Qual das pautas a seguir estaria mais adequada para SciDev.Net?

    a. Extratos de plantas contra leishmanioses. Um grupo de pesquisadores brasileiros analisou substâncias ativas de 16 espécies de vegetais cujos extratos brutos são tradicionalmente usados contra infecções e inflamações – como úlceras, malária e diarréia – e comprovou que cinco delas são efetivas contra os parasitos causadores das leishmanioses e sete, contra o fungo Candida krusei, que afeta pessoas imunodeprimidas.b. Países andinos tentam frear o degelo de seus glaciais. Projeto apresentado pela Comunidade Andina de Nações pretende ajudar Bolívia, Equador e Peru a enfrentarem a redução acelerada de seus glaciais tropicais, causada pelas mudanças climáticas. O projeto terá duração de quatro anos e será financiado pelo Banco Mundial e pelos países andinos.c. Colômbia financiará atividades de ciência e tecnologia. Pela primeira vez em seus 40 anos, o Instituto Colombiano para o Desenvolvimento da Ciência e da Tecnologia abre uma convocatória massiva de 11 propostas para promover a formação avançada e as atividades de ciência, tecnologia e inovação no país.

    1.13 Respostas das questões (1-3)

    Questão 1:a. 1 parágrafo

    Questão 2:a. Reduz o número de palavras para 350, como foi combinado com o editor ou editora.

    Questão 3:Todas as opções (a, b e c) são boas e todas foram publicadas em SciDev.Net. Este exercício era apenas

    para fazê-lo(a) pensar sobre os critérios.

    1.14 Questões (4-6)

    Questão 4:Clique no link a seguir para acessar uma reportagem. Qual é a sua “sentença de pesquisa”?OMS denuncia aumento recorde de remédios falsificados[http://www.estadao.com.br/arquivo/mundo/2003/not20031111p33327.htm]

    Questão 5:Leia esta reportagem. Qual a sua “sentença de pesquisa”?Dobra o número de transplantes realizados no Brasil, mas 69 mil ainda aguardam na fila[http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u507524.shtml]

    Questão 6:Imagine que você foi solicitado(a) para fazer uma reportagem sobre sistemas de busca, como Google[http://www.google.com] ou Yahoo! [http://www.yahoo.com]. Redija pelo menos duas possíveis “sentenças de pesquisa”.

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    1.15 Respostas das questões (4-6)

    Você pode ter redigido suas respostas de maneira um pouco diferente, mas aqui estão algumas sugestões.

    Questão 4:Após finalizar minha investigação jornalística, vejo desta maneira: A Organização Mundial da Saúde detectou que os altos preços de medicamentos e a expansão da pobreza estão fazendo com que o mercado ilegal de remédios cresça.

    Questão 5:Após finalizar minha investigação jornalística, vejo desta maneira: Embora o número de transplantes realizados no Brasil tenha crescido vertiginosamente nos últimos anos, o país ainda não consegue atender a todos os que necessitam de órgãos.

    Questão 6:Possíveis sentenças de pesquisa poderiam ser as seguintes (mas certamente há muitas outras):i) Após finalizar minha investigação jornalística, vejo desta maneira: Há poucos atores que competem no mercado global de sistemas de busca.ii) Após finalizar minha investigação jornalística, vejo desta maneira: A maioria das pessoas utiliza apenas um sistema de busca e solicita pesquisas muito simples, embora especialistas aconselhem o uso de vários sistemas de busca e opções de busca avançada.iii) Após finalizar minha investigação jornalística, vejo desta maneira: O Google apoia o regime na China obedecendo às regras do país e fazendo buscas com autocensura.

    1.16 Exercícios (1-2)

    Exercício 1: Conhecendo o públicoEste exercício é relacionado ao conteúdo teórico da Lição 1. É uma tarefa de casa que você pode fazer sozinho(a) e, depois, enviar a um tutor, orientador ou outros colegas para discutir com eles.

    a. A maioria das matérias de SciDev.Net tem uma perspectiva ou ponto de vista internacional. Selecione qualquer matéria do portal SciDev.Net que fale sobre o país em que você vive. Tente reescrevê-la de forma a direcioná-la aos leitores de um jornal local, com uma nota de, no máximo, 200 palavras.b. Quem mais você poderia contatar ou entrevistar para a matéria, próximo de onde você vive?c. Imagine que você começou uma coluna para crianças no seu jornal. Encontre uma matéria sobre ciência na internet (não necessariamente de SciDev.Net) que possa ser adaptada como um texto para crianças de 8 a 11 anos. Reescreva o texto para este público em 100 palavras.

    Exercício 2: Sentença de pesquisaEste exercício é relacionado ao conteúdo teórico da Lição 1. É uma tarefa de casa que você pode fazer sozinho(a) e, depois, enviar a um tutor, orientador ou outros colegas.

    a. Escolha uma matéria que você escreveu no passado. Você poderia escolher sentenças de pesquisa ou sentenças narrativas adequadas? Agora pense em alternativas – outras sentenças de pesquisa ou sentenças narrativas que também teriam funcionado.b. Escolha um veículo de comunicação conhecido. Encontre algo que anunciaram alguns anos atrás. Qual foi a sentença de pesquisa? Como você poderia escrever uma nova matéria sobre a antiga pauta? Redija uma nova sentença de pesquisa ou sentença narrativa.

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    1.17 Exercício (3): Lidando com a invisibilidade

    Este exercício é relacionado ao conteúdo teórico da Lição 1. É uma tarefa de casa que você pode fazer sozinho(a) e, depois, enviar a um tutor, orientador ou outros colegas.

    Leia a tradução de uma matéria jornalística publicada pelo tabloide britânico The Sun:

    Cientista inventa capa de invisibilidade (The Sun, 19/10/2006)Uma “capa” de invisibilidade foi produzida por um cientista britânico. O dispositivo pode emitir micro-ondas ao seu redor para tornar objetos indetectáveis por meio de radar. Especialistas estão confiantes de que o artifício pode ser aprimorado para fazer o mesmo com raios de luz – tornando as coisas invisíveis a olho nu, assim como a capa do jovem bruxo Harry Potter. Uma equipe liderada pelo professor Sir John Pendry construiu o protótipo na Universidade de Duke, na Carolina do Norte. Ele é feito de dez anéis de fibra de vidro recobertos por cobre, que desvia as ondas. Ao descrever como funciona, seu colega, o professor Davir R. Smith disse: “Todas as ondas eletromagnéticas são varridas em torno dessa área... para emergir do outro lado, como se elas tivessem passado por um espaço vazio”. O professor Pendry, da Faculdade Imperial de Londres, anunciou o projeto no início deste ano. Ele foi financiado pelo departamento de defesa dos Estados Unidos.

    Esta é uma matéria jornalística clássica. Ela traz a informação mais importante no início e responde a todas as perguntas jornalísticas: Quem? O quê? Quando? Onde? Por quê? Como? Sua linguagem é simples e clara. Mas ainda há algo errado com o texto.

    Importante: Por favor não tente se tornar um especialista na física desta pesquisa! Você não precisa entender tudo em detalhe. Apenas tente compreender, a grosso modo, as principais ideias e estimar sua relevância jornalística.

    Questão 1:

    Tente descobrir o que está errado no artigo. Você pode encontrar a resposta procurando nos seguintes materiais, em inglês:Press release original distribuído por EurekAlert[http://www.wfsj.org/course/en/L1/micro.html]

    Artigo científico original publicado na revista Science[http://www.wfsj.org/course/docs/Cloack_Schurig-10-20-06.pdf ]

    Matéria jornalística correlata publicada na mesma revista[http://www.wfsj.org/course/docs/cloack_cho.pdf]

    E uma boa matéria sobre isso publicada pela BBC[http://news.bbc.co.uk/2/hi/science/nature/6064620.stm]

    Questão 2: Qual foi a sentença de pesquisa da matéria publicada em The Sun?

    Questão 3: Como poderíamos escrever uma sentença de pesquisa melhor?

    Questão 4: Você pode pensar numa sentença narrativa sobre este assunto?

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    Planejando e estruturando seu trabalho

    1.18 Respostas do exercício (3) e exercício (4)

    Questão 1:

    O artigo tem várias coisas completamente erradas:

    • Não foi John Pendry que criou a capa, mas seus colegas norte-americanos – Pendry apenas desenvolveu a teoria matemática para isso.

    • Os objetos escondidos pela capa não são invisíveis para o radar.

    • Na verdade, a capa não funciona tão bem assim. Ela funciona apenas para uma banda limitada de frequências de micro-ondas, como uma cor específica no espectro visível. E só funciona em duas dimensões. Mesmo assim, apenas alguns dos raios são guiados em volta do objeto coberto pela capa. Então, tudo o que a capa faz é provar que os métodos matemáticos de Pendry estão corretos e que ela pode ser útil para futuros projetos de pesquisa.

    • Não é tão fácil assim estender o método usado pela capa para o espectro visível.

    • Mesmo que esta capa não esconda completamente as coisas, a tecnologia pode, um dia, ser útil para fins militares. Os militares estão financiando esta pesquisa.

    Questão 2:

    Após finalizar minha investigação jornalística, vejo desta maneira: Um cientista britânico conseguiu construir uma capa que pode esconder coisas de micro-ondas e radares.

    Questão 3:

    Após finalizar minha investigação jornalística, vejo desta maneira: Cientistas norte-americanos e britânicos desenvolveram um dispositivo que, embora seja imperfeito, mostrou-se capaz de provar um princípio físico.

    Questão 4:

    Aqui estão duas possíveis ideias:

    i) Hoje vou contar a história de físicos que não são capazes de usar mágica para tornar as coisas invisíveis e precisam obedecer às regras da natureza. Eles têm uma nova ideia de como alcançar isso, mas encontram muitas dificuldades. No final, eles produziram algo muito modesto.

    ii) Hoje vou contar a história de um personagem fictício: um agente do serviço secreto que ouviu falar de uma nova tecnologia de defesa que consiste no uso de uma “capa de invisibilidade”. Ele começa a investigar, fica surpreso com o que lê no jornal, observa o cientista e, então, percebe que seu governo terá que monitorar o uso desta tecnologia. (Esta ideia provavelmente funcionaria apenas na TV ou no rádio – e realmente requer armar cenas dramáticas, como numa peça. Mas certamente seria uma maneira criativa de noticiar a inovação).

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    Curso On-line de Jornalismo Científico

    Agora que você completou estas questões, tente fazer o seguinte exercício e discuti-lo com o seu orientador.

    Exercício 4:

    Tente reescrever a matéria de The Sun em 140 (!) palavras (a mesma extensão da matéria original). Tudo bem se algumas frases ficarem iguais. Tenha em mente que, neste espaço tão limitado, você não pode explicar muito. Decida que aspectos deixar de fora. Tente manter a matéria interessante sem cometer imprecisões de conteúdo.