Livro Mec Final Baixa

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  • Presidncia da Repblica

    Ministrio da Educao

    Secretaria-Executiva

  • MINISTRIO DA EDUCAO

    SECRETARIA DE EDUCAO BSICA

    Programa Nacional Biblioteca

    da Escola (PNBE): leitura e

    biblioteca nas escolas pblicas brasileiras

    Braslia

    2008

  • Secretaria de Educao Bsica

    Diretoria de Polticas de Formao, Materiais Didticos e

    Tecnologias para Educao Bsica

    Coordenao-Geral de Materiais Didticos

    COORDENAO TCNICA

    Jeanete Beauchamp

    Jane Cristina da Silva

    EQUIPE TCNICA

    Andra Kluge Pereira

    Ceclia Correia Lima

    Elizngela Carvalho dos Santos

    Ingrid Llian Fuhr Raad

    Jos Ricardo Albens Lima

    Lucineide Bezerra Dantas

    Lunalva da Conceio Gomes

    Maria Marismene Gonzaga

    EQUIPE DE APOIO

    Andra Cristina de Souza Brando

    Leandro Pereira de Oliveira

    Paulo Roberto Gonzaga

    Ministrio da Educao

    Secretaria de Educao Bsica

    Esplanada dos Ministrios Bloco L 6 andar sala 612

    Braslia-DF 70047-900

    TIRAGEM

    146 mil exemplares

    Impresso no Brasil

    Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)

    Brasil. Ministrio da Educao.

    Programa Nacional Biblioteca da Escola (PNBE): leitura e bibliotecas nas escolas pblicas

    brasileiras / Secretaria de Educao Bsica, Coordenao-Geral de Materiais Didticos; elaborao

    Andra Berenblum e Jane Paiva. Braslia: Ministrio da Educao, 2008.

    130 p. ; il. color. ; 24 cm.

    Inclui anexos e bibliografia.

    ISBN 978-85-7783-013-8

    1. Escola Pblica Brasil. 2. Leitura. 3. Biblioteca. 4. Poltica pblica. 5. Educao. I.

    Berenblum, Andra. II. Paiva, Jane. III. Ttulo.

    CDD 370

    ELABORAO

    Andra Berenblum

    Jane Paiva

    EDITORAO

    Aline Cristina de Lima Dantas

    FOTOGRAFIA

    Aline Cristina de Lima Dantas

    Edna Castro de Oliveira

    Jssica Ferreira

    Luiza de Miranda Lemos

    Maria Jaqueline de Grammont M. de Arajo

    Marinaide Queiroz

    Odila Dessaune de Almeida

    Tnia Moura

    Wanir Azarany de Almeida

  • SumrioAPRESENTAO

    POR QUE AVALIAO DIAGNSTICA DOS

    PROGRAMAS DO PNBE?

    DIMENSES DO PROGRAMA NACIONAL

    BIBLIOTECA DA ESCOLA

    A LEITURA NO BRASIL: COMO CONHECER A

    DIVERSIDADE DE PRTICAS PEDAGGICAS?

    A PESQUISA AVALIATIVA: METODOLOGIA PARA

    O DIAGNSTICO DO PNBE.

    CONHECIMENTOS PRODUZIDOS NO CAMPO DA

    PESQUISA: DA VIDA DA ESCOLA A POLTICAS PBLICAS

    Brasil: Escolas, Matrculas e Bibliotecas

    Regio Norte: Par

    Regio Nordeste: Cear, Bahia e Sergipe

    Regio Sudeste: Minas Gerais e Esprito Santo

    Regio Sul: Rio Grande do Sul

    Regio Centro-Oeste: Gois

    COLHEITA A RIQUEZA DO CAMPO

    Leitura e Condies Sociais e Culturais

    Concepes de Leitura e Escrita e de Leitores

    Espaos de Leitura nas Escolas

    As Crianas e Adolescentes que nos

    Escapam: eles no gostam de ler?

    Atividades / Prticas de Leitura e Currculo

    Leitura Como Fundamento do Projeto Poltico-Pedaggico da Escola

    Professores No So Leitores?

    Formao Docente Para Trabalhar com os Acervos

    Formao de Gestores para o Trabalho com a Leitura

    Problematizao: livros literrios ou livros didticos?

    Prticas e Atos de Leitura

    Publicidade de Incentivo Leitura

    Polticas de Leitura e Descontinuidades Participao

    Local nas Escolhas dos Acervos; Autores Regionais; Relao Mais

    Prxima do MEC com as Escolas; Investigao da Realidade

    Antes da Implantao de Programas

    SEMEADURA AS SEMENTES VOLTAM AO CAMPO

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS

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  • Apresentao

    Uma ao pblica de incentivo leitura, como parte da poltica educacional, tem

    por princpio proporcionar melhores condies de insero dos alunos das escolas pblicas

    na cultura letrada, no momento de sua escolarizao. Constitui, ainda, no contexto da

    sociedade brasileira, uma forma de reverter uma tendncia histrica de restrio do acesso

    aos livros e leitura, como bem cultural privilegiado, a limitadas parcelas da populao. A

    instituio, pelo Ministrio da Educao, de uma poltica de formao de leitores, ,

    portanto, condio bsica para que o poder pblico possa atuar sobre a democratizao das

    fontes de informao, sobre o fomento leitura e formao de alunos e professores

    leitores.

    As primeiras aes voltadas para a biblioteca escolar e para o incentivo leitura e

    formao de leitores, como o Programa Salas de Leitura, tiveram incio nos anos oitenta.

    Em 1997, foi institudo o Programa Nacional Biblioteca da Escola PNBE, por meio do

    qual vm sendo distribudos, em formatos de atendimento variados, acervos s bibliotecas

    e a alunos e professores das escolas pblicas do ensino fundamental. O modelo de

    interveno adotado vem historicamente privilegiando um nico aspecto que compe uma

    poltica de formao de leitores: a compra e a distribuio de livros s escolas e aos alunos.

    Considerando os baixos resultados apresentados pelos alunos das escolas pblicas

    do ensino fundamental em avaliaes como o PISA e os dados crticos levantados pelo

    Sistema Nacional da Educao Bsica SAEB sobre os indicadores de desempenho em

    leitura das crianas ao final dos primeiros e dos ltimos anos do ensino fundamental,

    constata-se que a distribuio de acervos s escolas, alunos e professores pelo PNBE vem

    cumprindo de forma tmida sua funo de promover a insero dos alunos na cultura

    letrada. Embora fundamental para a implantao de uma poltica de formao de leitores, o

    Programa deve ser entendido como uma das aes dessa poltica que est estruturada em

    dois eixos principais: (1) Qualificao dos recursos humanos e (2) Ampliao do acesso a

    materiais de leitura diversificados. Esses eixos encontram-se detalhados no documento

    Por uma Poltica de Formao de Leitores disponvel na pgina www.mec.gov.br.

    Dessa forma, e entendendo que uma poltica de formao de leitores deve ser

    encaminhada para alm de aes de aquisio e distribuio de acervos, o MEC realizou ,

    por intermdio da Secretaria de Educao Bsica (SEB), uma pesquisa avaliativa do

    PNBE, intitulada Avaliao diagnstica do Programa Nacional Biblioteca da Escola, com

    o objetivo de obter subsdios sobre o uso que vem sendo feito dos livros encaminhados s

    escolas e sobre o impacto desse Programa na formao de leitores. Essa pesquisa foi

    desenvolvida pela Associao Latino-americana de Pesquisa e Ao Cultural ALPAC e

    forneceu dados importantes sobre questes centrais relacionadas s bibliotecas escolares e

    s prticas de leitura e de escrita realizadas nas salas de aula e pelas escolas.

    O objetivo do Ministrio da Educao ao divulgar o resultado dessa pesquisa

    contribuir para a reflexo de gestores e professores no que diz respeito s prticas de leitura

    que se desenvolvem na escola, formao do professor e situao do espao fsico

    necessrio para a implantao da biblioteca escolar, de forma a integr-la dinmica

    escolar como ambiente central aos processos de aprendizagem e de disseminao de

  • informao. Para tanto, necessrio, no s repensar as prticas de leitura desenvolvidas

    na sala de aula como, tambm, o papel da biblioteca no projeto poltico-pedaggico das

    escolas, transformando-a em um espao de convivncia, de debate, de reflexo e de

    fomento leitura.

    Secretaria de Educao Bsica

  • POR QUE AVALIAO DIAGNSTICA

    DOS PROGRAMAS DO PNBE?

  • Este documento apresenta os resultados da pesquisa Avaliao diagnstica do

    Programa Nacional Biblioteca da Escola (PNBE) realizada pela Secretaria de Educao

    Bsica do Ministrio da Educao em parceria com uma equipe de pesquisadores ligados

    Associao Latino-americana de Pesquisa e Ao Cultural (ALPAC), do Laboratrio de

    Polticas Pblicas (LPP) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).

    A pesquisa teve a finalidade de investigar a realidade das prticas pedaggicas em

    torno das obras distribudas pelo Programa Nacional Biblioteca da Escola, realizando um

    diagnstico sobre: o que professoras e professores, diretores, coordenadores pedaggicos,

    responsveis por biblioteca, estudantes e pais pensam sobre os livros de literatura que

    chegam s escolas; que uso vem sendo feito desses livros; quais so as prticas de leitura e

    de escrita realizadas nas salas de aula e pelas escolas; e que papel a biblioteca tem

    representado nas escolas pblicas. Para que esse diagnstico fosse o mais prximo

    possvel da realidade, foram preservadas as falas dos depoentes, mantendo as formas orais

    como se expressaram, sem alterar os modos de dizer, mesmo quando eles, do ponto de vista

    da lngua padro, pudessem apresentar algum "erro" de concordncia ou de qualquer

    natureza. O que estava em jogo era saber como cada um pensava essas questes, ou seja,

    interessava o contedo das falas, e por isso essas falas foram intencionalmente preservadas

    sem qualquer retificao.

    A divulgao dessa pesquisa pelo MEC se constitui como mais um material de

    formao, discusso e debate em torno da leitura e da escrita, ao apresentar os caminhos

    possveis de uma pesquisa avaliativa, as escolhas feitas, os modos como se vai produzindo

    a metodologia para abordar a realidade que se deseja conhecer, as questes enfrentadas no

    trabalho de campo, a sistematizao de informaes coletadas e as possveis leituras dessas

    informaes como dados significativos, que revelam aspectos at ento encobertos pela

    fragmentao de informaes do campo sobre o objeto de estudo.

    O documento pretende, principalmente, dialogar com professores e gestores sobre

    situaes vividas por eles cotidianamente, que merecem ateno na prtica pedaggica,

    porque afetam muitos estudantes e comprometem, se no forem assumidos como questes

    centrais da escola brasileira, a qualidade da educao como poltica pblica.

    Esse dilogo, pela leitura e atribuio de sentidos ao que foi escrito, visa a exercitar

    prticas de leitura compreensiva, que consideram todo leitor como um co-autor do texto,

    ao atribuir sentidos ao que l. Desse modo, o ato de leitura deste relato da pesquisa pode

    constituir um evento formador autnomo, ou ser compartilhado coletivamente para

    dialogar com concepes, prticas e experincias que esses profissionais desenvolvem no

    cotidiano da escola, reforando-as ou transformando-as.

    A Avaliao Diagnstica do PNBE: desenvolvimento da pesquisa em 2005

    Com vistas a subsidiar a elaborao de uma poltica de formao de leitores que v

    alm das aes de aquisio e distribuio de livros e acervos s escolas pblicas de

    educao bsica, a Secretaria de Educao Bsica (SEB) realizou, em 2005, uma srie de

    seminrios regionais, onde foram discutidas com representantes dos sistemas pblicos de

    ensino as idias e conceitos que norteariam essa poltica. Paralelamente, foi realizada a

    pesquisa em questo sobre o impacto da distribuio dos acervos do PNBE nas prticas de

    incentivo leitura desenvolvidas nas escolas brasileiras.

    A partir dessa pesquisa, pde-se traar uma espcie de retrato do que vem

    acontecendo nas escolas brasileiras desde 1998, quando o MEC passou a distribuir,

    sistematicamente, acervos literrios coletivos e individuais s escolas pblicas de ensino

    fundamental de todo o pas.

    Para que a pesquisa pudesse ter validade nos dados levantados, um nmero

    significativo de escolas 196 foi selecionado, por amostra estatstica, em oito estados

    e 19 municpios, representando o universo de escolas de ensino fundamental de crianas,

    jovens e adultos existentes nas redes pblicas. Essas escolas acolheram os pesquisadores e

    ofereceram um vasto panorama sobre as prticas de leitura e escrita realizadas a partir dos

    livros recebidos ao longo desses anos.

    09

  • 1

    No perodo de 2001 a 2003, o MEC distribuiu acervos de literatura para uso individual de alunos da 4 e da 8 sries do ensino

    fundamental e de estudantes das ltimas sries, etapas, fases e ciclos da educao de jovens e adultos, acervo este denominado Palavra

    da Gente.

    A idia central da pesquisa era avaliar se a poltica de distribuio de livros afetava

    as prticas pedaggicas dos professores e como isso acontecia para, s ento, orientar a

    continuidade ou reviso do Programa.

    Com essa questo para investigar, organizou-se a pesquisa de modo a verificar os

    usos feitos com os acervos; se os livros que se destinavam aos estudantes foram ou no

    distribudos; que prticas de leitura/escrita professores e estudantes exerciam na escola;

    que orientao cada escola dava a seus professores quanto ao uso dos livros; que prticas

    de leitura e escrita aconteciam na escola durante a permanncia dos pesquisadores; se a

    poltica centralizada de distribuio de livros pelo Governo Federal contribura para a

    qualidade da educao, promovendo a incluso de crianas, adolescentes, jovens e adultos

    leitores e escritores autnomos no mundo letrado; e as formas como esses livros eram

    aproveitados na comunidade.

    Devolvendo os Resultados a Professoras e Professores, Gestores e Estudantes

    No tem sido prtica dos pesquisadores tanto de universidades quanto de

    governos devolver resultados de pesquisas a todos os interessados, incluindo aqueles

    que participaram como informantes e depoentes da coleta de informaes/dados. Por isso,

    essa pesquisa inova ao organizar esta publicao destinada especialmente a gestores,

    professoras e professores extensiva a estudantes e demais profissionais da escola ,

    que desejem conhecer em que suas prticas com a leitura e a escrita se parecem ou no com

    a de muitos outros professores do pas, suas dificuldades, xitos e realizaes.

    A todos os que participaram da pesquisa, o nosso agradecimento pelo

    envolvimento, pela acolhida, desejando que o retorno dos resultados, por meio dessa

    publicao, satisfaa curiosidade de tantos que apostaram na importncia de saber como

    um programa de distribuio de livros avaliado pelos que o usam/no usam, praticam/no

    praticam a leitura e a escrita, transformam suas prticas pedaggicas dando lugar a textos

    que, mexendo com a imaginao de crianas, jovens e adultos, podem fazer diferena na

    qualidade da escola brasileira: a escola que queremos, para que todos os brasileiros e

    brasileiras, alm de ter sucesso no aprender, passem nela um tempo de vida muito feliz.

    10

  • DIMENSES DO PROGRAMA

    NACIONAL BIBLIOTECA DA ESCOLA

  • Para que se possa compreender a complexidade do Programa pesquisado e,

    principalmente, porque muitos professores que lero esse texto no participaram da gnese

    do PNBE fato constatado pela prpria pesquisa , inicia-se este captulo pela

    apresentao dos diferentes acervos que compuseram, ano a ano, o Programa Nacional

    Biblioteca da Escola. Cada um dos acervos datado e surge em circunstncias diversas,

    com determinadas caractersticas, ao longo do perodo em que foi distribudo.

    Programa Nacional Biblioteca da Escola PNBE 1998 1 a 8 sries

    Em 1998, o Programa distribuiu 20.000 acervos para 16.600.000 estudantes de

    20.000 escolas de 1 a 8 sries com mais de 500 estudantes.

    Programa Nacional Biblioteca da Escola PNBE 1999 1 a 4 sries

    Em 1999, o Programa distribuiu 36.000 acervos, beneficiando 10.800.000

    estudantes de 1 a 4 sries, de 36.000 escolas com mais de 150 estudantes.

    Programa Nacional Biblioteca da Escola PNBE 2000 - Biblioteca do Professor

    O Programa voltou-se para a distribuio, em 2000, de 30.718 acervos para

    profissionais da educao em 30.718 escolas.

    Programa Nacional Biblioteca da Escola PNBE 2001 - Literatura em minha Casa 4 e

    5 sries

    Em 2001, o Programa deixou de distribuir acervos coletivos para as bibliotecas

    escolares e voltou-se distribuio de 12.184.788 colees para 8.561.639 estudantes de

    4 e 5 sries de 139.119 escolas. As colees foram organizadas segundo critrios de

    gnero literrio e com formato prprio, o que exigiu adaptaes grficas das editoras

    quando se tratava de obras j comercializadas, incluindo a padronizao de tamanho e a

    ausncia de cor no miolo, restringindo a cor capa. As escolas desses estudantes receberam

    um conjunto de cada coleo selecionada.

    Programa Nacional Biblioteca da Escola PNBE 2002 - Literatura em minha Casa 4

    srie

    Em 2002, novamente o Programa atendeu ao pblico de 4 srie, distribuindo

    4.216.576 colees a 3.527.014 estudantes em 70.455 escolas.

    Programa Nacional Biblioteca da Escola PNBE 2003 - Literatura em minha Casa 4 e

    8 sries e Palavra da Gente EJA

    O PNBE 2003, dentro da mesma sistemtica de acervos para uso individual,

    atendeu: 3.449.253 estudantes de 4 srie, em 124.408 escolas, com 4.062.510 colees;

    2.969.086 estudantes de 8 srie, em 35.685 escolas, com 3.745.810 colees; e 463.134

    estudantes de sries, etapas e ciclos finais do ensino fundamental de educao de jovens e

    adultos (EJA), em 10.964 escolas, com 544.916 colees.

    Os dados apresentados a seguir ajudam a dimensionar o universo de escolas que

    vem atendendo, no Pas, a cerca de 97% da populao em idade escolar, qual se destina o

    Programa Nacional Biblioteca da Escola (PNBE). Referem-se ao total de escolas pblicas

    de ensino fundamental, s que tm biblioteca e ao total de matrculas nessas escolas, de

    reas urbanas e rurais, conforme registrado no sistema de dados do INEP, o EDUDATA, de

    2003.

    13

  • 2

    No Brasil, existem 5560 municpios, o que significa que a distribuio desses acervos atingiu cerca de 65% dos municpios brasileiros.

    Observando os dados, pode-se verificar de imediato o descompasso entre o total de

    escolas, de bibliotecas e de estudantes potenciais usurios dessas bibliotecas no

    universo contabilizado. Mas a constatao precisa ser compreendida em sua

    complexidade, para alm da percepo da falta que o nmero de bibliotecas logo sugere.

    Desde 1998, o Governo Federal vem distribuindo acervos, obras, colees de

    livros de literatura e obras de referncia, tanto para estudantes quanto para professores. No

    ano de 2004, inclusive, foram distribudos acervos para 3659 municpios, com o objetivo

    de ampliar a ateno s comunidades. O volume de obras distribudas e o investimento

    total realizado, muitas vezes, contrastam com a situao estrutural das escolas

    demonstrada pela pesquisa e com o uso que vem sendo feito desses acervos.

    Nascido com a finalidade de dotar os estabelecimentos pblicos de ensino com

    acervos para as bibliotecas das escolas, em meio do percurso o Programa destinou os

    investimentos para colees pessoais recebidas por poucos estudantes no universo de

    matrculas, de definio prvia do Ministrio, e praticamente manteve-se como tal um

    grande programa de distribuio de livros, sem apoio de projetos de formao continuada

    de professores que tivesse o objetivo de repensar a formao de leitores pelas escolas

    pblicas brasileiras.

    Fonte: MEC/INEP: EDUDATA, 2003.

    Critrio de seleo: Estabelecimentos com Ensino Fundamental Ano: 2003, Dependncia

    Administrativa: Pblica

    Abrangncia Geogrfica

    Total

    BRASIL

    149.968

    Rural 96.600

    Urbana 53.368

    Critrio de seleo: Estabelecimentos com Ensino Fundamental Ano: 2003, Dependncia

    Administrativa: Pblica Abrangncia Geogrfica Escolas com Biblioteca BRASIL 34.307 Rural

    5.752

    Urbana

    28.555

    Fonte: MEC/INEP: EDUDATA, 2003.

    Tabela 3: Matrculas de ensino fundamental em escolas pblicas Brasil

    Critrio de seleo: Matrcula no Ensino Fundamental Ano: 2003, Dependncia Administrativa:

    Pblica

    Abrangncia Geogrfica

    Matrcula total

    BRASIL

    31.162.624

    Rural

    6.136.317

    Urbana

    25.026.307

    Fonte: MEC/INEP: EDUDATA, 2003.

    Tabela 1: Estabelecimentos pblicos de ensino fundamental Brasil

    Tabela 2: Escolas pblicas com biblioteca Brasil

    14

  • A LEITURA NO BRASIL:

    COMO CONHECER A DIVERSIDADE

    DE PRTICAS PEDAGGICAS?

  • Do brasileiro, diz-se que no gosta de ler. Poucas pesquisas tm sido realizadas

    contestando essa afirmao do senso comum, mas entre elas destaca-se o Retrato da

    Leitura no Brasil, de 2000, realizada por iniciativa de entidades do livro e de fabricantes de

    papel, nica que tentou definir o consumo de livros no pas, medindo sua penetrao e as

    dificuldades de acesso.

    Essa pesquisa foi feita por amostragem, na populao com mais de 14 anos de

    idade, com pelo menos trs anos de escolaridade, o que equivalia a 86 milhes de pessoas.

    Nesse nmero imenso, estava includo o grupo de analfabetos funcionais, que alcana 65%

    da populao.

    A pesquisa descobriu, por exemplo, que 49% dos leitores e 53% dos compradores

    de livros esto concentrados na Regio Sudeste, e que 62% dos entrevistados disse gostar

    de livros. Tambm percebeu que o nvel de escolaridade tem forte vnculo com prticas de

    leitura ler e comprar livros, entre outras. Mas duas concluses foram importantes para

    desfazer alguns mitos sobre a leitura, como o de que o brasileiro no gosta de ler. A

    primeira, a de que os brasileiros com mais instruo lem bastante cerca de 35% leitor

    freqente; a segunda, que o baixo ndice de escolaridade com qualidade e as condies de

    acesso ao livro so a raiz do problema.

    De certa forma, e com mais profundidade, comentando os resultados da pesquisa,

    Maus (2002, p. 68) concorda com essas concluses, ampliando a compreenso sobre o

    problema:

    Entre as vrias revelaes da pesquisa algumas novas e surpreendentes, outras

    nem tanto , uma deve ser vista com especial preocupao: a excluso da leitura a

    que est forada grande parte da populao brasileira. Pode-se dizer que o quadro

    de excluso social que caracteriza o pas reproduzido de modo tristemente fiel nesse

    campo.

    E ainda, referindo-se ao modo como muitos brasileiros se tornam leitores, afirma:

    Muitas vezes esse um leitor quase herico, que consegue, de alguma forma em

    igrejas, por emprstimos de amigos, por meio da escola ou das poucas e precrias

    bibliotecas existentes , superar os obstculos que lhe so impostos e chegar at o

    livro, contra quase todas as probabilidades. (MAUS, 2002, p. 70).

    Lindoso (2005), antroplogo-editor que esteve frente da pesquisa Retrato da

    Leitura no Brasil, refletindo sobre os problemas atuais na rea, em srie de quatro matrias

    publicadas aos sbados no caderno Prosa e Verso do jornal O Globo, do Rio de Janeiro,

    questiona, no dia 11 de fevereiro de 2006:

    Ou ser que essa verso de que brasileiro no gosta de ler revela mais sobre uma

    elite poltica, econmica e administrativa que no percebe a importncia do

    acesso leitura para todos como um componente essencial na construo de uma

    sociedade democrtica? Ser que os exemplos [...] no mostram como as pessoas

    buscam, nos interstcios do seu tempo e com parcos recursos, condies para saciar

    necessidades multifacetadas de acesso a esses instrumentos de informao, cultura,

    lazer e de satisfao de inquietaes psicolgicas, religiosas e morais que so os

    livros?

    Anterior pesquisa das entidades do setor editorial, tambm a Associao de

    Leitura do Brasil (ALB) props um Censo de Leitura, valendo-se da reunio de mais de

    17

  • 2000 profissionais no evento bienal Congresso de Leitura do Brasil (COLE), em 1999,

    com o objetivo de identificar que tipo de texto se l, de que maneira e com qual finalidade,

    mapeando uma amostra estatisticamente representativa de pessoas. A ALB ressaltava o

    possvel descompasso entre "os discursos catastrofistas sobre condies de leitura no pas

    e os dados numricos" sobre tiragens de livros, jornais e revistas, crescentes nos anos 1990.

    Segundo a entidade, isso ocorria porque se trabalhava com uma concepo mtica de leitor

    e de leitura, que:

    [...] no considera leitura o ato de inteleco de best-sellers, de livros religiosos, de

    jornais populares, revistas femininas, novelas sentimentais, livros de auto-ajuda.

    Nega-se a existncia de leitores, pois espera-se que todos leiam clssicos da

    literatura, revistas e jornais cultos, livros tcnicos eruditos. Construiu-se

    historicamente uma idia mtica de livro e de leitura, evidentemente inatingvel como

    qualquer mito. (ABREU, 1999. Disponvel em www.alb.com.br. Acesso em 14 fev.

    2006).

    O conceito de letramento comea a ser utilizado nos meios acadmicos na tentativa

    de superar a concepo de alfabetizao centrada nos aspectos tecnolgicos (codificao e

    decodificao) da aquisio da lngua escrita. Vrios autores (KLEIMAN, 1995;

    SOARES, 2002; ROJO, 1998; TFOUNI, 2002; GOULART, 2001; entre outros), partindo

    de diversos paradigmas tericos, tm-se dedicado a definir o conceito de letramento, que

    envolve prticas sociais efetivas de leitura e escrita.

    Um argumento a favor do uso do termo refere-se ao fato de que os diversos grupos

    sociais utilizam a leitura e a escrita de forma diferenciada em relao s suas prticas

    sociais e culturais. Ainda que uma pessoa no domine o cdigo escrito e por esse motivo

    no possa ser definida como alfabetizada, pode ser, no entanto, considerada letrada, j que

    possui determinadas estratgias orais letradas e competncias necessrias para participar

    de diversos eventos de letramento (KLEIMAN, 1995), conhecendo os usos sociais da

    escrita em diferentes contextos.

    A Cultura Avaliativa desde a Dcada de 1990: influncias externas

    A dcada de 1990 pode ser definida, no plano da poltica educacional, como poca

    de instaurao de uma cultura avaliativa. Essa cultura no est em julgamento quanto

    concepo que encerra, apenas constatando-se a influncia externa exercida sobre a

    educao brasileira para adotar parmetros e indicadores de avaliao, segundo a

    concepo do mximo rendimento para o menor investimento.

    Nesse tempo, autoridades educacionais locais criaram sistemas de avaliao

    quantitativa de habilidades e competncias individuais para as diversas reas de

    conhecimento, referenciados por parmetros internacionais de avaliao de desempenho

    de estudantes, o que permitia realizar comparaes entre os diversos pases participantes.

    As orientaes, ditadas por agncias de financiamento internacional, construram

    metodologias e referenciais tpicos e concordantes com o projeto poltico neoliberal, o que

    inclua a desqualificao da escola pblica e o no-reconhecimento da multiculturalidade

    inerente s populaes e constituinte de seus universos culturais e simblicos. Em seu

    lugar, passou-se a oferecer um modelo nico, pensado para supostos sujeitos homogneos,

    segundo paradigmas educacionais de prestgio para a elite, como forma de resolver os

    problemas da desigualdade educacional.

    O modelo incluiu a concepo de esbanjamento de recursos e inoperncia do

    Estado para prestar servios educacionais, e oferecia uma alternativa educao pblica: a

    privatizao. Essa alternativa tinha como fundamento um conjunto de instrumentos de

    avaliao, todos a partir da mesma lgica, no admitindo a heterogeneidade, as diferenas,

    nem mesmo o debate acadmico, e inevitavelmente esses instrumentos confirmavam os

    pressupostos que os geraram.

    18

  • Com a intensificao dos acordos da Organizao Mundial do Comrcio (OMC),

    acelerando os processos de mercantilizao de servios educacionais, em que o lucro, para

    ser garantido, exigia prever ofertas mnimas de servio a consumidores, a substituio de

    um modo de pensar a educao como direito , para outro como consumidor ,

    esvaziava politicamente o sentido e as finalidades da educao: formao do cidado

    crtico, a quem se devia, para form-lo, um mximo de oferta, em contrapartida a um

    mnimo padronizado.

    O Programa Internacional de Avaliao de Alunos (PISA) em 2000: Foco na Leitura

    Um exemplo de proposta de avaliao foi estabelecido pelo Programa

    Internacional de Avaliao de Alunos (PISA), da Organizao para Cooperao e

    Desenvolvimento Econmico (OCDE) a partir de 2000, cujo objetivo medir o

    desempenho dos estudantes nas reas de leitura, matemtica e cincias. Naquele ano, o

    Programa centrou-se na avaliao de aptides para a leitura, e do Brasil participaram 4.893

    jovens com idades entre 15 e 16 anos. Os resultados da avaliao mostraram que os pases

    da Amrica Latina ocuparam os ltimos lugares na avaliao e, entre estes, o ltimo

    colocado foi o Brasil.

    Segundo o relatrio do Programa, o PISA avaliou conhecimentos, habilidades e

    competncias adquiridos pelos estudantes que os capacitam para uma participao efetiva

    na sociedade e o letramento em leitura, ou seja, o uso e a reflexo sobre textos escritos para

    alcanar objetivos pessoais, desenvolver o conhecimento e o potencial individuais e

    participar plenamente na vida em sociedade.

    O letramento em leitura foi avaliado em trs dimenses: a) a forma do material de

    leitura; b) o tipo de tarefa de leitura, o que corresponde s vrias habilidades cognitivas

    prprias de um leitor efetivo; c) o uso para o qual o texto foi construdo. Alguns estudantes

    apresentaram melhor desempenho em uma situao de leitura do que em outra, o que

    justificou a incluso de diversos tipos de leitura nos itens de avaliao.

    Segundo o documento, os conhecimentos e habilidades em leitura demandados

    pelas provas do PISA requerem que os participantes estabeleam relaes diferenciadas

    com o texto escrito, abrangendo processos de identificao de informaes especficas, de

    compreenso, de interpretao e de reflexo.

    Os resultados mostraram que o desempenho dos estudantes brasileiros nas provas

    de leitura estava relacionado ao nmero de sries concludas, o que confirmava a primeira

    pesquisa referida nesse texto. Entre os estudantes com nove ou mais anos de escolarizao,

    a mdia nacional chegava a 431, numa escala de zero a 625. Quando os estudantes tinham

    oito anos de estudo, a pontuao caa para 368, e com sete anos de estudo, era ainda menor,

    de 322. Essa diferena de pontuao fez com que a mdia geral ficasse em 396, colocando

    o Pas em ltimo lugar na lista da avaliao, que inclua 28 naes desenvolvidas e quatro

    emergentes: Brasil, Letnia, Mxico e Rssia.

    Como interpretar esses resultados? O que eles poderiam indicar? Quais seriam

    algumas possveis causas do baixo rendimento dos estudantes brasileiros na rea de

    leitura? Que crticas vm sendo realizadas pela academia quanto ao modelo formulado?

    Coincidindo com a anlise crtica do Programa PISA realizada por Emilia Ferreiro

    (2005), no parecem existir padres de avaliao universais eficientes para dar conta do

    desempenho dos estudantes em nenhuma rea de conhecimento. Isto porque, como se

    sabe, existem enormes diferenas entre os pases em relao s condies de acesso a

    conhecimentos e habilidades, considerados necessrios para a plena participao social.

    Como mostram dados apresentados no relatrio do Programa PISA, o Brasil um

    dos pases com maior desigualdade na distribuio da renda e de bens culturais, e um

    pas culturalmente diverso. , portanto, possvel medir competncias, habilidades e

    rendimentos individuais com um nico padro de medida em um pas to desigual e to

    diverso como o nosso?

    Sem aprofundar no contedo especfico das provas de rendimento aplicadas, o

    PISA na rea de leitura se prope a avaliar o letramento em leitura, entendido como a

    19

  • compreenso, o uso e a reflexo sobre textos escritos para alcanar objetivos pessoais,

    desenvolver o conhecimento e potencial individuais e participar plenamente na vida em

    sociedade. Esta definio, primeira vista, pareceria indicar que as provas avaliam a

    capacidade dos estudantes para alcanar uma determinada compreenso de sentido que se

    encontra no prprio texto; e que todos os estudantes tm os mesmos objetivos pessoais e as

    mesmas possibilidades e condies de participao na sociedade.

    Outras Questes: onde esto as bibliotecas?

    Segundo WERTHEIN (Correio Braziliense, 10 abr. 2005), ex-representante da

    UNESCO no Brasil, calcula-se que, no Pas, 73% dos livros est concentrado nas mos de

    16% da populao, e ainda, segundo dados do IBGE, 89% dos municpios no tm

    bibliotecas pblicas e 65% no possui livrarias, nem lojas de msica. As bibliotecas

    equipadas esto localizadas nas zonas urbanas ou nas reas centrais das cidades.

    Dados levantados pelo Censo Escolar 2004 (INEP) mostram que, das 53 mil

    bibliotecas escolares existentes em todo o pas, 46 mil (86%) encontram-se em reas

    urbanas, sendo que a rede privada concentra o maior nmero de bibliotecas. A Regio

    Sudeste possui o maior nmero de bibliotecas escolares (39% do total). Essas estatsticas

    alarmantes mostram as enormes desigualdades regionais e a desigualdade na distribuio

    de bens culturais.

    Os Achados da Pesquisa: como desatar os ns da leitura na escola?

    Do mesmo modo que esses dados, a pesquisa realizada e objeto deste livro

    tambm retrata a multiplicidade de dificuldades que enfrentam diretores e professores nas

    escolas brasileiras para organizar e manter bibliotecas, garantir funcionamento adequado

    s necessidades dos professores e s demandas dos estudantes e possibilitar o acesso destes

    aos acervos, alm de dificuldades no que se refere qualidade das obras e ao estado em que

    se encontram os livros.

    Nos ltimos anos, a concepo de leitura vem sendo repensada a partir de uma srie

    de debates e trabalhos tericos que a concebem como uma questo pedaggica, ao mesmo

    tempo em que lingstica e social (ORLANDI, 1985). Autores nacionais como Geraldi,

    Lajolo, Zilberman, Soares, Goulart, Zaccur, entre outros, partindo de concepes tericas

    diferentes, desenvolveram trabalhos que permitem pensar a leitura como atividade

    humana que implica algo mais que a decodificao e a compreenso de um sentido que est

    dado no prprio texto.

    A leitura implica, tambm e principalmente, a produo e construo de sentidos e,

    nesse processo, o sujeito se forma como leitor em interao com o texto, com outros textos,

    a partir da sua prpria histria de leitor e de suas experincias de vida. Considera-se, ento,

    que o acesso aos bens culturais fundamental para o processo de se tornar leitor, ao mesmo

    tempo em que essencial, para isso, realizar um tipo de trabalho com a leitura que

    possibilite refletir sobre essas relaes, sobre os sentidos apreendidos no texto e sobre os

    sentidos construdos e reconstrudos pelo leitor.

    No entanto, no a distribuio de acervos que muda as prticas dos professores

    quanto ao uso dos livros de literatura nas atividades pedaggicas, nem muda nos sujeitos a

    compreenso do que lem, melhorando sua apropriao de sentidos.

    Mesmo quando utilizados, esses livros continuam marcados pela ordem da

    gramtica e do contedo, pela busca de resposta certa e nica interpretao para a leitura.

    Por essa razo, a democratizao do acesso leitura esperada pela distribuio de

    livros do PNBE, com alcance amplo no que diz respeito a usurios de diversos segmentos

    estudantes, professores e pessoas das comunidades e em variados desenhos

    escolas e comunidade, acervos coletivos e individuais, obras e colees , parece no ter

    acontecido como previsto.

    20

  • O fato de existirem recentemente acervos literrios e obras de referncia na cultura

    escolar no muda por si s as prticas privadas e, de certa forma, autoritrias, ainda

    encontradas entre gestores e professores, que devem realizar, com liberdade e esprito

    pblico, um trabalho qualificado com os ttulos literrios, questionando pensamentos

    circulantes na cultura vigente de que os alunos estragam os livros, como se estes no

    merecessem o que lhes destinado.

    Outro aspecto a considerar exige pr na roda de discusso a ideologia do livro

    didtico implantada no pas h mais de duas dcadas, o que tem feito com que este tipo de

    livro ocupe um lugar central nos processos de aprendizagem, na quase totalidade das salas

    de aula das escolas brasileiras. Mesmo admitindo-se os avanos de qualidade que vm

    sendo, h alguns anos, impulsionados pelo Ministrio da Educao na indstria editorial

    construda em torno desse tipo de texto, esta sustenta a ideologia de livro central com

    muita fora, sendo bastante difcil realizar sua substituio por outros tipos de obras.

    Portanto, a publicao de livros didticos no apenas se imps s polticas

    pblicas, mas imps um modo de ser pedaggico, um modo de ser professor e um modo de

    ser estudante nas escolas brasileiras que, sem dvida, interessam ao mercado editorial

    sobremaneira, mas tem deixado fraturas expostas na formao de crianas, adolescentes e

    jovens como leitores e escritores e aprisionado na mesma teia seus professores.

    Essa disparidade entre o tipo de trabalho realizado com a leitura nas escolas e as

    capacidades e habilidades de leitura medidas nas avaliaes que implicariam um

    trabalho bem diferente com a lngua escrita confirma o entendimento de Emlia Ferreiro

    (2005, p. 39) em relao aos programas de avaliao de rendimento: temos [como

    resultado] avaliaes individuais feitas com toda independncia da avaliao das

    condies que permitiriam aceder a ditas competncias.

    A pesquisa Avaliao diagnstica do Programa Nacional Biblioteca da Escola

    pode, portanto, constituir importante contribuio a autoridades polticas, professores e

    gestores, ao mapear o tipo de trabalho de leitura e escrita efetivamente realizado nas salas

    de aula. Com esse conhecimento, talvez se possa interpretar de forma crtica e produtiva os

    resultados dos programas de avaliao, questionando as reais condies de acesso s

    habilidades consideradas indispensveis para que os sujeitos possam participar

    plenamente da vida em sociedade.

    Considerando a excluso e a desigualdade de bens e servios (principalmente no

    que diz respeito educao, cultura e lazer) existente entre as diferentes classes sociais

    brasileiras, os resultados das provas no surpreendem. Parece que a questo central das

    avaliaes refere-se ao uso que se faz desses dados, como interpret-los e que tipo de

    decises polticas podem suscitar. Se, em lugar de responsabilizar estudantes e suas

    famlias pelo baixo rendimento nas provas aplicadas, esses dados fossem utilizados para

    avaliar o verdadeiro trabalho realizado nas escolas, as reais condies de produo dos

    conhecimentos e a coerncia entre a oferta educacional e as habilidades e aptides

    solicitadas nas provas, esses dados poderiam ser significativos para contribuir na

    elaborao de polticas de interveno educativa concretas.

    No mais possvel desenhar polticas educativas sem enfrentar a problemtica de

    extrema desigualdade social existente no Brasil, sem avaliar a real oferta dos sistemas e das

    instituies pblicas e sem se pensar nos professores como verdadeiros protagonistas da

    ao educacional. s perversas condies de trabalho no cotidiano escolar e aos magros

    salrios dos professores, quase nunca levados em conta, somou-se a responsabilidade

    pelos resultados obtidos pelos estudantes nas provas de rendimento individual,

    penalizando ainda mais o quadro do magistrio no Brasil.

    Na rea especfica de leitura, espera-se dos professores que sejam bons leitores,

    que estejam informados, que incentivem e dinamizem a leitura compreensiva,

    comparativa e crtica, e que realizem diversos tipos de atividades com a linguagem escrita.

    A partir da pesquisa realizada, pde-se, principalmente, constatar: a dificuldade

    dos professores para trabalharem com os acervos; a ausncia quase total de formao que

    21

  • 22

    permita a esses profissionais refletir sobre sua prtica pedaggica e discutir diferentes

    concepes de linguagem, de leitura e escrita; os limites de aproveitamento do material

    disponvel e a angstia dos professores, pela falta de tempo para exercitar a prpria leitura.

  • A PESQUISA AVALIATIVA:

    METODOLOGIA PARA O

    DIAGNSTICO DO PNBE

  • 3 Aleatrio, segundo o Dicionrio Houaiss, o que depende das circunstncias, do acaso; casual, fortuito, contingente. Uma

    amostra aleatria, portanto, aquela que no depende de indicaes prvias, mas se faz ao acaso.

    A partir da metodologia do projeto de pesquisa de avaliao diagnstica,

    estabeleceu-se uma amostra de escolas pertencentes a oito Unidades da Federao,

    abrangendo 19 municpios, distribudos geograficamente, atendendo os resultados do

    Censo Demogrfico de 2000 efetuado pelo IBGE, e considerando a cobertura de 467.275

    escolas contempladas com as remessas dos livros integrantes do Programa Nacional

    Biblioteca da Escola (PNBE).

    A opo de trabalhar por amostra um subconjunto do universo envolvido pela

    temtica baseou-se no fato de esta constituir uma poro ou parcela convenientemente

    selecionada do universo (populao). Para compor essa amostragem, a populao foi

    dividida em subpopulaes, que por sua vez foram divididas em subsubpopulaes, e

    assim por diante, em vrios estgios processo chamado de amostragem multiestgios

    (AM). Uma amostra aleatria foi selecionada em cada estgio para compor a amostra total.

    Por no requerer uma lista (cadastro) de todos os elementos constituintes da populao,

    mas apenas listas de regies, estados, municpios, bairros, ruas etc., este esquema de

    amostragem mostrou-se vantajoso.

    Os critrios mais importantes em qualquer levantamento de dados so aqueles que

    garantem a confiabilidade registrar a informao corretamente , validam a

    informao e registram o tipo correto de informao. O resultado mnimo exigido do

    levantamento que este indique o alcance e a distribuio da questo em foco.

    Para garantir a confiabilidade do levantamento, ou seja, fazer o levantamento de

    dados sem cometer erros de amostragem, exigiu-se ter uma amostra com a mesma

    composio que a populao em sua totalidade. Do mesmo modo, a validade precisou ser

    garantida, requerendo-se, para isso, que os pesquisadores e os entrevistados tivessem

    idias precisas sobre o que se investigava. A ao voluntria de participar do levantamento

    era desejvel, porm o controle dos entrevistados foi indispensvel, para no desequilibrar

    a estrutura desejada na pesquisa.

    Para a realizao do estudo, o modelo de amostragem multiestgios teve a seguinte

    abordagem:

    Primeiro estgio: grandes regies geogrficas selecionadas.

    Segundo estgio: estados selecionados.

    Terceiro estgio: municpios selecionados, com dois critrios qualitativos: sempre incluir a

    capital do estado e dois municpios selecionados num raio de at 100 km da capital.

    Quarto estgio: escolas selecionadas conforme critrios de porte (nmero de estudantes),

    caractersticas, nmero de livros recebidos do PNBE, entre outros.

    Foram consideradas todas as escolas que receberam livros do acervo Literatura em

    minha Casa, por serem as mais indicadas para a avaliao, e foi identificada a populao de

    7 a 14 anos nos resultados do Censo Populacional de 2000, realizado pelo IBGE.

    Para que cada entrevistado tivesse a mesma probabilidade de ser escolhido

    utilizou-se a regra de PPT, ou seja, para cada municpio fez-se a comparao entre o

    tamanho da amostra desejada e o tamanho do cadastro existente, aplicando-se o fator de

    correo, e chegando-se ao seguinte quadro amostral:

    25

  • Tabela 1: Quadro Amostral Estgios 1, 2 e 3 e quantitativo de escolas por municpio

    A seleo apontou a escolha de 102 escolas nas capitais e 94 nos demais municpios

    num raio de at 100 km. A seleo dos municpios em cada estado baseou-se nos dois/trs

    municpios com maior probabilidade. Verificou-se ainda a localizao do municpio

    selecionado, um fator importante no desenvolvimento da pesquisa, haja vista a

    impossibilidade de realizao do trabalho de campo em determinadas reas devido a

    dificuldades de acesso e tempos de deslocamento, entre outros fatores.

    Do conjunto de 196 escolas, 100 eram estaduais e 96 municipais, resultado da

    escolha aleatria. A identidade dessas escolas foi preservada, mas alguns elementos so

    oferecidos aos leitores para conhecimento da realidade das instituies e compreenso dos

    usos que fazem ou no fazem dos diferentes acervos recebidos. Neste livro, por

    razes ticas, nenhuma escola e nenhum sujeito estaro identificados.

    Um Guia do Pesquisador orientou os trabalhos da pesquisa, desde o projeto

    elaborado, passando por indicadores, modos de observao e toda a discusso sobre a

    metodologia para desenvolv-lo: roteiros de entrevistas com os diversos sujeitos, roteiros

    de grupos focais, listagens de escolas, orientaes quanto ao trabalho de campo e para a

    elaborao do relatrio final, alm de ofcio de apresentao dos pesquisadores preparado

    pelo MEC, em apoio negociao do trabalho de campo. O Guia no reduzia, no entanto,

    REGIES ESTADOS MUNICPIOS ESCOLAS

    25 Par

    Belm -

    Ananindeua

    Castanhal 5

    15 Bahia

    Salvador

    Camaari 9

    17

    Cear Fortaleza

    Caucaia

    15

    6

    Sergipe Aracaju

    Lagarto

    4

    10

    Gois

    Goinia

    Anpolis

    10

    5

    Esprito

    Santo

    Vitria

    Vila Velha

    7

    12

    9 Minas

    Gerais

    Belo

    Horizonte

    Betim

    Contagem

    9

    12

    13

    Rio

    Grande

    Do Sul

    Porto

    Alegre

    Canoas

    Viamo

    13

    8

    19

    196

    26

    Norte

    Nordeste

    Centro-Oeste

    Sudeste

    Sul

    Total

  • os limites da pesquisa, sempre deixando que a realidade e, em sntese, a prtica social e

    educativa, guiassem o trabalho de campo.

    A metodologia adotada no projeto previu a coleta de dados no campo,

    contemplando quatro procedimentos:

    a observao de campo;

    a realizao de entrevistas com diretores, coordenadores pedaggicos, agentes de biblioteca

    (auxiliares, tcnicos, responsveis, bibliotecrios);

    a realizao de grupo focal com estudantes e professores;

    a realizao de entrevistas com pais e comunidade.

    Todas as entrevistas e as diversas formas de abordagem metodolgica foram

    levadas a cabo a partir de um roteiro previamente elaborado e de fichas de perfil dos

    sujeitos participantes, no identificados. As observaes de campo se realizaram, tambm,

    com base em um roteiro que apontava alguns aspectos a serem verificados nas escolas

    selecionadas.

    Grupo Focal: metodologia na avaliao diagnstica

    Por ser uma tcnica de pesquisa de abordagem qualitativa com diversos sujeitos, o

    grupo focal (GF) no deve ser confundido com entrevista coletiva. A escolha metodolgica

    dessa tcnica grupal de coleta de concepes e de opinies deu-se pelo favorecimento de

    rpidas posies a respeito de um tema, o que a recomenda para avaliao de polticas

    pblicas. Alm disso, o grupo focal tem a vantagem de concentrar-se nos objetivos e no

    tema da pesquisa de forma mais rpida, pelo fato de se valer de grupos estruturados, com

    pessoas que se renem para discutir um objetivo ou tema comum, um ponto focal,

    estabelecido a partir de um roteiro bsico.

    Mas, para isso, h a necessidade de se garantir uma certa homogeneidade nos

    grupos formados (grupo s de professores, s de estudantes de uma srie, o fato de todos

    terem recebido acervos, de todos freqentarem a biblioteca e usarem os livros do acervo

    recebido, entre outros). Embora os grupos representem recortes de grupos sociais

    determinados, no so formados aleatoriamente, mas levando em conta o objeto focal e

    passando, neste sentido, a constituir um grupo homogneo.

    Por meio do grupo focal, todas as singularidades presentes e assumidas pelos

    participantes tendem a aparecer, sem que se precise destacar seus enunciadores.

    Interessam as idias sobre os temas, e no os sujeitos enunciadores. Um cuidado observado

    quando se utiliza essa metodologia que os pesquisadores faam o mnimo de

    intervenes, e no expressem opinies, pois estas nada acrescentam e at podem

    dificultar o levantamento de idias do grupo. A participao dos pesquisadores perante o

    grupo deve ser mnima, permanecendo atentos funo de manter o fio condutor do tema

    proposto para evitar divagaes

    Na interlocuo que se estabelece entre os pares participantes do grupo focal

    chega-se opinio do grupo, no se registrando a identificao de cada um quanto ao que

    disse.

    Os pesquisadores devem ficar atentos a toda a movimentao dos participantes do

    grupo, alm dos discursos, assim como dos no-ditos. Gestos, posturas, intervenes

    significativas dos participantes so expresses importantes que no podem ser perdidos.

    A liberdade da fala dos participantes convidados a expressarem suas posies

    sobre um ponto focal fica garantida, por no se aceitarem pessoas que no se incluam nos

    critrios de formao daquele grupo, o que invalidaria o uso da tcnica. Para isso, a

    explicitao dos objetivos da pesquisa, seus usos, finalidades e quem so os pesquisadores

    (no confundidos com os pesquisados) fundamental, assim como o estabelecimento de

    27

  • regras de funcionamento de forma clara e objetiva, garantindo aos participantes o sigilo

    das identidades, o compromisso tico e de privacidade, construindo um pacto de respeito

    mtuo. Na tcnica do GF, no o entrevistador quem concede a palavra, mas cabe a ele

    garantir que todos a tomem, sem dirigir, sem interromper, apenas trazendo o grupo para o

    foco, quando se afasta dele. Tambm cabe ao entrevistador mobilizar os participantes para

    que percam a censura, a inibio.

    Um aspecto metodolgico importante a destacar que o GF no busca o consenso,

    pois o que interessa ouvir o mximo de opinies do grupo e, para isso, quanto mais

    espontneas forem as participaes, melhor. Os pesquisadores precisam, para isso,

    conhecer bem o roteiro de questes para no perder o rumo, da mesma forma que podero

    ampliar o roteiro com perguntas no previstas, no incio ou no meio do trabalho, a partir de

    questes surgidas no contexto do grupo. A ordem dos assuntos tratados pode ser sem/com

    alternncia, garantindo-se a proposta original planejada no roteiro.

    Para assegurar resultados adequados com a tcnica do GF, recomendou-se, a partir

    da experincia de vrios pesquisadores, que se fizesse um mnimo de quatro grupos focais

    para cada segmento (quatro para professores e quatro para estudantes) e um mximo de

    seis, por estado, distribudos por igual no municpio selecionado da Regio Metropolitana

    e na capital. Esse quantitativo baseia-se na experincia de outras pesquisas que tm

    demonstrado que, superado esse nmero de participantes, os grupos passam a enunciar as

    mesmas idias, com redundncias de tal ordem que indicam a saturao das opinies.

    Para o caso do grupo focal de estudantes, estabeleceu-se a prioridade de estudantes

    de 5 a 8 sries que participam ou participaram do Programa (de alguma de suas ofertas,

    fosse individual ou coletiva), embora tenha ocorrido o caso de estudantes j freqentando o

    ensino mdio que integraram o grupo focal, pelo fato de terem recebido o acervo

    Literatura em minha casa no primeiro ano de sua distribuio.

    A metodologia do GF deve levar a categorias de anlise comuns a todas as equipes

    e estados/municpios, ainda que seja possvel acrescer categorias novas que surjam dos

    prprios grupos, o que exige estar atento para sua emergncia na realidade pesquisada.

    O grupo focal mostrou-se acertado como metodologia de pesquisa. Trouxeram

    surpresas, quando realizados com estudantes, quanto a prticas de leitura desconhecidas,

    em muitos casos, talvez, pelos professores, diretores e bibliotecrios.

    Questes Metodolgicas da Pesquisa de Campo: dos entrevistados e dos locais

    visitados

    No caso das entrevistas com os responsveis das crianas/adolescentes que

    receberam o material do Literatura em minha casa, no se fixou um nmero previamente

    definido, pelas dificuldades inerentes marcao de entrevistas com pais e mes

    trabalhadores, recomendando-se que fossem realizadas sempre que possvel.

    Para que se garantissem as condies da pesquisa, facilitando a ida dos

    pesquisadores ao campo, foram feitos contatos diretos do MEC com as Secretarias de

    Educao dos estados e encaminhado um ofcio com informaes sobre a pesquisa,

    solicitando colaborao para seu desenvolvimento. Mesmo assim, na prtica, alguns

    problemas ocorreram, desafiando a percia dos pesquisadores para super-los.

    As distncias entre as escolas, em muitos casos, foram bastante grandes, exigindo

    deslocamentos especficos e longas demoras, muitas vezes pelo fato de as localidades

    serem de difcil acesso, sem transporte adequado para chegar a elas. Povoados, por

    exemplo, em Lagarto (SE), distavam at 24 km da sede de um municpio pequeno e com

    poucas opes de transporte para a periferia. nibus, trem, metr, txi, carro particular etc.

    foram utilizados, alm das caminhadas que integraram o roteiro dos pesquisadores.

    Em regies no Sudeste, como Belo Horizonte, por exemplo, as chuvas imprevistas

    muitas vezes caam do nada, no dizer dos pesquisadores, que eram obrigados a escapar

    das intempries sbitas.

    28

  • Entre os municpios, a referncia de integrar a regio metropolitana no impediu a

    incluso de um municpio distante 80 km de Belm Castanhal , embora nem sempre o

    acesso favorecesse o percurso de distncias menores, em outros municpios, obrigando a

    gastar tempos longos e demorados.

    Notcias alegres e outras nem tanto foram chegando durante os 11 longos dias em

    que a equipe de coordenao acompanhou, distncia, atenta e vivamente o trabalho dos

    22 pesquisadores nos oito estados (e em alguns casos esse tempo se ampliou, como no

    Cear, na Bahia, no Esprito Santo, em Minas Gerais e em Gois, com equipes locais). Os

    pesquisadores diziam das dificuldades em chegar a alguma comunidade para entrevistas

    com pais; das suspeitas de que os livros haviam chegado, mas no se encontravam nas

    mos dos destinatrios originais; das idias preconceituosas em relao populao pobre,

    quanto a no saber cuidar de livros; das evidncias de escolas sem conhecimento dos

    acervos do PNBE, com diretores afastados por irregularidades; das dificuldades de

    conseguir marcar os grupos focais, porque para isso se retiravam professores das salas de

    aula; de bibliotecas fechadas. Mas tambm diziam das atividades observadas, gravadas e

    fotografadas realizadas com estudantes, explorando contos, poesia; de bibliotecas bem

    organizadas e acessveis aos usurios; de participao da comunidade na vida da biblioteca

    escolar; da emoo dos pesquisadores com a garra de diretores e professores que, apesar

    das pssimas e impraticveis condies de trabalho, realizavam com vontade e

    competncia um trabalho cidado, digno e de qualidade junto s crianas, por intermdio

    da leitura.

    Na maioria das unidades, diretores e outros profissionais de cada turno auxiliaram

    bastante para que entrevistas e grupos focais acontecessem, dentro do possvel, em lugar

    apropriado, identificando e convidando tambm pais de estudantes e pessoas da

    comunidade para entrevistas.

    O tempo da pesquisa tambm foi considerado extremamente curto, dado o nmero

    de escolas a serem pesquisadas e a complexidade das questes metodolgicas, que

    exigiam, muitas vezes, disponibilidade dos pesquisadores para retorno, o que demonstrou

    e reforou a necessidade de mais tempo em cada municpio para a realizao do trabalho de

    campo.

    Como apresentado na tabela 2, a pesquisa, do ponto de vista quantitativo, abordou

    359 sujeitos estudantes, 303 professores, 200 diretores, 5 bibliotecrios, 152 responsveis

    por bibliotecas e 31 pais, alm de 37 outros profissionais ligados escola, totalizando 1087

    pessoas de 196 escolas, em 19 municpios de oito estados.

    As abordagens a cada um desses sujeitos foram bastante diferenciadas, embora a

    questo mais intensa vivenciada, do ponto de vista metodolgico, tenha sido em relao

    aos grupos focais de professores, cuja ausncia das salas de aula criava situaes nem

    sempre facilmente contornadas pelas escolas.

    Pelo depoimento dos diretores, principalmente, pde-se saber que os livros foram

    distribudos, embora muitos tivessem dificuldade de precisar quais colees receberam, as

    quantidades recebidas e as formas de distribuio. visvel, no trabalho de alguns

    gestores, a falta de controle quanto aos materiais recebidos. Registre-se que, em muitos

    casos, a alternncia de poderes, tanto em nvel estadual e municipal, quanto nas escolas,

    diretamente, afeta a continuidade das aes pedaggicas, no somente interrompendo

    projetos e fluxos de trabalho, como sonegando informaes aos sucessores, o que imprime

    descontinuidade.

    A afirmao de que no sabe o que a escola recebeu porque era outro o diretor

    remete para a confirmao do que se vem sinalizando a cada dia: no h um projeto

    pedaggico na escola, e os vnculos de trabalho frgeis do professor, que entra e sai

    rapidamente, d suas aulas e vai embora sem participar da continuidade e do cotidiano da

    escola fazem com que se ignorem aes, acervos recebidos, projetos. Os professores

    desconhecem o movimento da escola como um todo, que fica restrito, no mximo, aos

    acontecimentos de sua classe.

    29

  • Estu

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    Pro

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    31

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    30

  • Outra dificuldade metodolgica esteve afeta ao aspecto operacional,

    especificamente para agendamento de grupo focal com professores, em funo das formas

    de organizao do trabalho escolar em cada turno e de cronogramas de formao

    continuada e eventos na escola e nas sedes administrativas s quais tinham que atender.

    Muitos professores no tinham tempo disponvel para permanecer na escola aps o

    perodo de aulas, pois deveriam se deslocar imediatamente para outra escola, e s vezes at

    mesmo para outra rede de ensino em que tm uma segunda matrcula como professores.

    Jornadas duplas ou triplas de trabalho, no permitiram, em muitos casos, encontrar horrio

    adequado para reunir professores das vrias reas. Alm disso, alguns professores fizeram

    objeo idia de participar dos GF, por questionarem a validade da pesquisa e os

    benefcios que dela poderiam advir.

    Estes foram desafios que, mais uma vez, exigiram negociaes, muitas vezes

    apresentando alternativas sinalizadas pelos diretores/professores: liberao dos estudantes

    mais cedo; mobilizao de funcionrios para assumirem as turmas dos professores que

    participariam do grupo focal; perda, para o professor, do seu tempo de descanso (recreio

    dos estudantes); e alterao do horrio do incio das aulas.

    Outra questo a considerar em muitas redes como, por exemplo, em Vila Velha,

    disse respeito municipalizao e grande movimentao de professores, o que provocou

    mudanas no corpo docente, fazendo com que em algumas escolas no mais se

    encontrassem os antigos professores que trabalharam com o Programa. Os novos, que

    atuavam na escola no momento, o desconheciam.

    Experincias singulares na chegada em cada unidade escolar, e a dinmica de cada

    uma imprimiram ritmos diferentes ao prosseguimento do trabalho, levando as equipes a

    tomarem decises quanto ao que seria considerado prioritrio em relao ao

    funcionamento do PNBE em cada escola.

    Objetivos da Avaliao e Limites da Pesquisa

    O objetivo da avaliao, como definido no projeto, centrou-se em construir um

    diagnstico abrangente, que permitisse identificar, compreender e ampliar o

    conhecimento sobre:

    as formas dos atos de leitura nas escolas brasileiras contempladas com os diversos

    acervos referidos;

    os objetivos que cada escola vem produzindo para os diversos acervos;

    as formas de implementao dos objetivos produzidos pelas escolas;

    as concepes circulantes sobre biblioteca, leitura e sobre as prticas e atos dela

    decorrentes;

    os pblicos envolvidos e o alcance dos acervos;

    o perfil dos professores e do pblico envolvido;

    as formas que as propostas pedaggicas assumem a partir da existncia de acervos,

    vistas sob os aspectos filosficos e metodolgicos; os desenhos curriculares e de gesto;

    o potencial das escolas para ampliar a oferta de acervos e de servios a partir dos

    acervos/bibliotecas j existentes;

    o conhecimento sobre as preferncias de formato do recebimento de acervos (provi-

    mento individual Literatura em minha casa ou coletivo biblioteca

    escolar/espao de leitura);

    as formas concretas de ampliao da oferta de acervos e de servios por parte da

    escola;

    as necessidades da escola quanto a livros para o acervo coletivo (literatura, obras de

    referncia, de apoio pesquisa, entre outros);

    31

  • a formao continuada de professores para dinamizar a leitura e a escrita;

    as concepes de avaliao sobre atos e prticas de leitura;

    a existncia de regime de colaborao entre as escolas e outras entidades na realizao

    de prticas, atos e projetos de leitura;

    a aceitao, os limites e as possibilidades dos diferentes projetos decorrentes do

    Programa;

    o apoio elaborao de uma poltica de formao de leitores.

    Nem todos os objetivos, no entanto, foram inteiramente atingidos, observando-se

    alguns elementos adicionais, no previstos a priori, que emergiram da interveno da

    pesquisa.

    Pode-se dizer que os objetivos foram tratados diferenciadamente pelos

    pesquisadores, tomando em conta modos prprios de trabalho, facilidade nas abordagens

    com diretores e demais gestores, tempo reservado pelas escolas para o acolhimento aos

    pesquisadores, entre outros.

    Ao tomar como referncia a concepo de avaliao diagnstica, assumida no

    projeto em questo, se tece uma narrativa marcada pelas muitas vozes dos

    pesquisadores, dos participantes envolvidos e de vrios autores/interlocutores que

    estudam essas questes capazes de revelar a multiplicidade de prticas leitoras, os

    sentidos variados atribudos a elas e a dimenso coletiva da discusso, na perspectiva de

    encontrar indcios de mudanas nas prticas locais, com vista (re)formulao de polticas

    pblicas na rea.

    A complexidade que envolve os atos da leitura e da escrita ps em cheque,

    entretanto, o tempo previsto para desenvolvimento da pesquisa bastante restrito ,

    considerando a quantidade de dados coletados, a sistematizao que incluiu a escrita de

    relatrios de campo e do Relatrio Final e, conseqentemente, a necessidade de

    aprofundamento de estudos tericos, de modo a entrecruzar as mltiplas possibilidades

    explicativas sobre esses mesmos dados.

    Outro limite da pesquisa disse respeito ao uso da metodologia de grupo focal, face

    ao tempo necessrio para realiz-lo e o tempo da escola, este marcado pelas rotinas de

    aula, de recreio, de merenda, de reunio de professores. Situao que impe pensar os

    agrupamentos formados pelos professores disponveis e dos estudantes como sujeitos da

    pesquisa. Estes ltimos se colocaram para a pesquisa em funo de suas disponibilidades

    de tempo, escapando do critrio de seleo suas trajetrias pregressas escolares e os

    percursos integrados, ou no, pelo contato com acervos do PNBE. Essas variveis se

    evidenciaram com mais fora, de acordo com as sries em que se encontravam ao tempo da

    pesquisa, realizada em 2005, e o quanto de tempo se passou desde que receberam/tiveram

    acesso a livros de qualquer um dos acervos do PNBE.

    Tais limites, no entanto, no significaram imobilismo. Ao contrrio, serviram de

    desafio aos pesquisadores para super-los e, por meio desse movimento, criar espaos de

    discusso coletiva constitudos como outros momentos de formao continuada para todas

    as pessoas envolvidas nessa experincia: pesquisadores, professores, diretores,

    responsveis por bibliotecas, estudantes, pais e mes de estudantes, representantes de

    secretarias de educao municipais e estaduais.

    Um ltimo aspecto sobressaiu na pesquisa, demonstrado pelo destemor de alguns

    participantes, que reverteram a posio de entrevistados para a de entrevistadores,

    devolvendo aos pesquisadores questes avaliativas, pelo vvido interesse que tinham de

    conhecer a posio de quem avaliava o trabalho da escola. Eis um exemplo: depois de

    desligado o gravador, um diretor perguntou insistentemente o que se pensava de sua

    entrevista, completando agora a minha vez de entrevist-los; o que acharam do nosso

    trabalho? Da nossa escola? Essa idia do livro na casa do estudante, vocs tm a minha

    promessa, eles vo ser entregues!.

    32

  • A pesquisa permitiu chegar a reflexes coletivas que conduziram ao objetivo de

    registrar a complexidade, a pluralidade de aes e de solues que marcam as prticas

    leitoras nos mltiplos espaos das escolas e de seu entorno, na tentativa de avanar no

    controle social de programas educacionais, especialmente o PNBE. Essas reflexes tanto

    podem contribuir para a tomada de decises sobre seu desenho, quanto sobre aes dele

    decorrentes ou com ele imbricadas, que exigem reorientao ou reposicionamento, como

    o caso precpuo de apoio a projetos de formao continuada de professores.

    33

  • CONHECIMENTOS PRODUZIDOS NO

    CAMPO DA PESQUISA: DA VIDA DA

    ESCOLA A POLTICAS PBLICAS

  • A partir deste captulo, os principais dados da pesquisa sero apresentados,

    oferecendo ao leitor uma viso panormica de todos os estados em que foi realizada,

    contextualizando, sempre que possvel, a regio em que os dados se inserem. Todos os

    dados estatsticos do sistema educacional apresentados referem-se fonte MEC/INEP:

    EDUDATA, do ano de 2003.

    Tambm a referncia feita s escolas ser sempre em relao s efetivamente

    includas na amostra, ou seja, aquelas que foram abordadas pela equipe de pesquisa. Todas

    as informaes foram prestadas pelos sujeitos que circulam na escola, como demonstrado

    em tabela anterior, assim como os depoimentos que aparecero ao longo do texto. Trazer a

    fala das pessoas para o texto tem uma dupla finalidade: em primeiro lugar, garantir que os

    informantes tenham preservadas suas vozes, o que sabem e o que pensam sobre a vida e o

    cotidiano das escolas e, em segundo lugar, conferir legitimidade a essas pessoas como as

    que precisam ser escutadas quando se discutem polticas educacionais, porque mais do que

    ningum vivenciam processos, dificuldades, constroem sadas e arranjam solues para os

    fatos do cotidiano. As falas denotam saberes e conhecimentos da realidade, muito difceis

    de serem assegurados sem a vivncia diria das complexidades presentes nas escolas

    brasileiras.

    Alm disso, um ltimo motivo se impe: o dever tico de pesquisadores de

    devolver o significado do que disseram as pessoas que participaram da pesquisa, do que

    contaram e de como essa disposio de participar pde ser conformada como

    conhecimento. Conhecimento que ajuda a compreender as lgicas da vida cotidiana, os

    problemas muitas vezes invisveis aos gestores pblicos e invisveis, freqentemente, para

    as prprias pessoas que vivem a escola, que no consideram como saberes tudo o que

    sabem.

    Desse modo, o texto foi organizado seguindo todas as regies seus estados e

    municpios e em cada uma delas trazendo tona a situao das escolas pesquisadas e do

    que disseram os entrevistados sobre elas, sobre a vida escolar, o livro, a leitura e sobre o

    PNBE.

    Brasil: escolas, matrculas e bibliotecas

    O conjunto de escolas pblicas brasileiras de ensino fundamental de que se partiu

    para formar a amostra foi de 149.968 unidades, sendo 96.600 na rea rural e 53.368 na rea

    urbana.

    As matrculas alcanavam em 2003 o quantitativo de 31.162.624 de estudantes,

    com 6.136.317 matriculados em rea rural e 25.026.307 em rea urbana, o que representa

    quatro vezes o nmero de estudantes da rea rural. Observa-se que o nmero de escolas em

    rea rural bem maior do que na urbana, diferindo significativamente, no entanto, quando

    se refere ao nmero de matrculas, fortemente concentradas em rea urbana, em menor

    nmero de escolas, porm maiores em capacidade de atendimento. Esta caracterstica

    acompanhar todas as regies, como se observar na continuidade da leitura.

    Se a rede pblica de ensino fundamental ampla, no entanto, o nmero de escolas

    com biblioteca representa do total, ou seja, apenas 34.307 tm biblioteca. Destas, 5.752

    esto em rea rural e 28.555 em rea urbana, o que representa cerca de 6% das escolas em

    rea rural contra mais de 50% em rea urbana.

    Regio Norte: Par

    A Regio Norte foi contemplada pela amostra com o estado do Par, abrangendo

    trs municpios: a capital Belm, Ananindeua municpio conurbado a Belm, e

    Castanhal, distante 80 km de Belm, e o mais longe de todos os selecionados nos demais

    estados. Embora constitua a maior regio geogrfica, tem populao rarefeita e grandes

    espaos desabitados e distantes, o que dificulta, em muito, a realizao de pesquisas.

    37

  • A relao entre escolas com bibliotecas e o total de escolas pblicas na Regio

    Norte fortemente discrepante. So 23.160 escolas, destacando-se o fato de a maioria das

    escolas ser em rea rural 18.950, onde justamente est o menor nmero de bibliotecas, e

    4.210 na urbana.

    As matrculas em toda a regio alcanaram 3.169.809 estudantes, dos quais

    1.038.951 na rea rural e aproximadamente o dobro na urbana 2.130.858. Para esses

    estudantes, as bibliotecas so muito poucas: 2.438 no total de escolas, com 493 em escolas

    da rea rural e, praticamente, o qudruplo em escolas urbanas 1.945.

    Considerando-se que a poltica de distribuio de livros do PNBE privilegiou, no

    incio, escolas com nmero mnimo de 500 estudantes, baixando depois para 250 e,

    finalmente para 100, pode-se afirmar que na srie histrica do Programa as menos

    contempladas foram as escolas rurais, em uma realidade de carncias preexistentes na

    maioria delas.

    No Par: Belm, Ananindeua e Castanhal

    A amostra no estado do Par foi de 30 escolas, sendo 25 na capital Belm e no

    municpio de Ananindeua e cinco em Castanhal.

    A rede pblica no estado de 11.670 estabelecimentos de ensino (federais,

    estaduais e municipais, sendo 9.831 na rea rural e 1.839 na urbana), com matrcula de

    1.562.315 crianas e adolescentes no ensino fundamental, sendo 622.726 matrculas na

    rea rural e 939.589 na urbana, apesar de o nmero de escolas ser quase oito vezes o da

    urbana. Do total de escolas, apenas 692 tm biblioteca, com 150 na rea rural e 542 na

    urbana, o que mostra a fragilidade da rede, em que somente cerca de 6% tm biblioteca,

    ainda assim concentradas na rea urbana.

    Belm

    Belm tem rede pblica de ensino fundamental composta por 292 escolas, das

    quais 5 esto em rea rural e 287 na rea urbana. As matrculas alcanam 196.381

    estudantes no total, com 1.324 na rea rural e 195.057 na urbana. A situao da biblioteca

    escolar nessas unidades apresenta o seguinte quadro: 103 no total, ou seja, menos de 50%

    das escolas tm biblioteca, estando todas elas na rea urbana. No h, pois, bibliotecas em

    qualquer das cinco escolas da rea rural.

    Ananindeua

    Em Ananindeua, so 141 escolas pblicas, e quase a totalidade 133 na rea

    urbana. Apenas oito escolas esto na rea rural. Essas escolas tm 73.470 matrculas, das

    quais 70.347 na rea urbana e 3.123 nas oito escolas rurais. O quadro de bibliotecas nas

    escolas segue a mesma tendncia do estado, com 39 escolas com bibliotecas, sendo 38 na

    rea urbana e apenas uma dentre as oito escolas da rea rural.

    Castanhal

    Em Castanhal, as matrculas alcanam 25.327 estudantes, distribudos em 80

    escolas, estando 3.098 deles em 42 escolas rurais e 22.139 em 38 escolas urbanas. Das 80

    escolas, apenas 15 tm biblioteca: uma no conjunto de 42 escolas rurais e 14 dentre as 38

    urbanas.

    Situao das Escolas e Revelaes da Pesquisa

    No Par, o Programa teve incio, na maior parte das escolas pesquisadas, nos anos

    de 2002 e 2003.

    38

  • Menos da metade das escolas percorridas possua espao reservado para biblioteca

    ou sala de leitura e, ainda assim, algumas se encontravam desativadas.

    As escolas pesquisadas da rede estadual comportavam as estruturas mais precrias.

    Um pequeno nmero dispunha de espao destinado biblioteca. A maioria das unidades

    visitadas precisava de reformas, e a falta de manuteno nos espaos fsicos s permitia a

    utilizao precria. O funcionamento das atividades se fazia em locais inadequados, e

    muitos professores atuavam em regime de contratao temporria.

    Nas escolas municipais, em geral, a realidade era diferente, ao menos quanto ao

    espao fsico. Observou-se melhor adequao de espaos, maior quantidade de

    bibliotecas e articulao mais direta com o rgo gestor, justificado pela proximidade das

    administraes municipais com suas redes, diversamente da situao da administrao

    estadual em relao s suas escolas.

    Principalmente as escolas do municpio de Belm foram contempladas com cerca

    de 1.500 a 2.000 ttulos variados, desde a administrao anterior e por alguns anos. As do

    municpio de Castanhal tambm receberam colees, alm dos acervos do PNBE. O

    municpio de Ananindeua pareceu mais frgil neste aspecto.

    Em relao quantidade de livros recebidos do Literatura em minha casa, as

    informaes foram muito variadas. Em aproximadamente 40% das escolas os livros no

    foram suficientes para todas as crianas, e as colees foram repartidas, sem muito

    prejuzo na distribuio. Nas demais escolas no se detectaram problemas, e em duas

    houve relato de que as colees chegaram em quantidade muito superior ao nmero de

    estudantes.

    Houve ainda o registro de uma escola que trabalhava com educao de jovens e

    adultos no perodo vespertino e que recebeu livros para crianas, em vez da coleo

    especfica para a modalidade PNBE 2003 Palavra da Gente.

    Em meio ao grupo entrevistado observou-se que poucos estudantes freqentavam a

    biblioteca da escola espontaneamente. A maior parte a ela recorria em funo dos trabalhos

    de sala de aula, embora todos afirmassem que gostavam do espao e que acabavam lendo

    outras coisas, alm das que eram demandadas pelas atividades escolares. possvel que o

    maior problema em relao utilizao da biblioteca para pesquisas se situasse no fato de

    que estas pesquisas quase sempre se restringiam a contedos escolares, demandando a

    utilizao de outros livros didticos. Como conseqncia, constatou-se a subutilizao do

    espao: Vamos sim na biblioteca, mas vou falar a verdade: a gente s faz copiar [...] e

    temos que ler muito para explicar o trabalho.

    Nos depoimentos dos prprios estudantes, a distribuio individual de colees do

    Literatura em minha casa foi destacada como aspecto muito positivo. A sensao era a de

    que o livro em casa tinha significado especial. Essa estratgia adotada pelo PNBE, no

    entanto, dificilmente conseguiu ser avaliada de forma aprofundada, pelas dificuldades de

    se chegar s famlias e conhecer de fato o que ocorreu na vida cotidiana, quando o livro se

    fez presente.

    Depois que as escolas realizavam atividades com os livros, e que estes iam para a

    casa dos estudantes, as informaes eram escassas: no sabiam se circulavam nas mos de

    outros leitores; se os estudantes voltavam a l-los; se liam os ttulos no explorados na

    escola etc. Paralelamente, os acervos coletivos das escolas estavam deficitrios, o que

    exigia refletir se, como poltica pblica, era vivel continuar a distribuio do material

    desta forma.

    Em algumas escolas estaduais visitadas, apesar das experincias desenvolvidas de

    incentivo leitura, percebeu-se tambm que os espaos de biblioteca eram utilizados

    prioritariamente para pesquisas escolares demandadas pelas diferentes disciplinas, mesmo

    quando reuniam significativo acervo de ttulos de diferentes gneros, que eram, por isso

    mesmo, subutilizados.

    Em espaos de salas de leitura municipais pde-se perceber como, mesmo com

    acervo de qualidade e professores responsveis para o trabalho nesse espao, o uso se fazia

    como alternativa sala de aula, para a realizao de projetos de reforo escolar.

    39

  • Nenhuma atividade era estruturada de modo a que a leitura de ttulos disponveis tivesse

    posio central, mas, ao contrrio, restringia-se a trabalhos pedaggicos que reproduziam

    a lgica da sala de aula, com cpias, disciplinas e passividades, e utilizando,

    prioritariamente, o livro didtico.

    Apesar dos esforos, eram muitas as dificuldades, desde as relacionadas precria

    condio de leitores dos prprios professores, at os conflitos relacionados cultura

    escolar em que predominavam, ainda, metas conteudistas. Frente s dificuldades de

    aprendizagem do cdigo escrito, por parte de muitos estudantes, a sala de leitura

    funcionava subordinada apenas a projetos de reforo escolar.

    Em algumas escolas com biblioteca ouviu-se que o acervo de livros estava

    disponvel utilizao da comunidade local, muitas vezes a nica opo na regio para o

    acesso a livros variados, o que, por isso mesmo, fazia com que as bibliotecas fossem muito

    solicitadas.

    O relato a seguir simblico para expressar um dos principais desafios junto aos

    profissionais responsveis pelo espao de leitura na escola: a no-prioridade desse espao

    como projeto coletivo aspecto central no que diz respeito sua pertinncia.

    [...] a coordenadora, uma das primeiras coisas que ela faz: ela rene os professores,

    rene o professor daqui que sou eu. E geralmente ela pergunta qual a atividade que

    eu gostaria de estar desenvolvendo na sala de leitura [...] ento, todo projeto, a sala

    de leitura participa [...] pois , porque a sala de leitura ela tem que... fugir de um

    esteretipo que foi criado que quem trabalha em sala de leitura fica na sala de leitura

    apenas para tirar o p dos livros, organizar a estante e receber o visitante. E no s

    isso que eu queria e nem quero. Eu gostaria de estar na sala de leitura, mas da forma

    como eu estou. Tendo um projeto e desenvolvendo esse projeto da melhor maneira

    possvel, juntamente com os meus colegas da sala de aula.

    Na rede estadual do Par registrou-se, em sntese, que nem todas as escolas

    contavam efetivamente com espaos de biblioteca, e tambm que estes espaos no eram

    padronizados, assumindo em cada escola configuraes que revelavam as condies

    locais, no tocante a espao fsico, gesto e aos modos de organizar o trabalho coletivo em

    relao leitura.

    Observou-se, ainda, que se a organizao desse espao fazia parte de uma iniciativa

    formal da rede oferecendo infra-estrutura, lotao de professores para o trabalho,

    formao continuada para docentes e para os demais profissionais, disseminando

    conhecimentos sobre a importncia da leitura , no era correspondida, no interior da

    escola, por movimentos de reivindicao e de valorizao desse espao formal, na

    organizao de referenciais de incentivo leitura para toda a comunidade escolar.

    Parte das entrevistas e das conversas informais com dirigentes e professores

    revelaram que as bibliotecas escolares poderiam no apenas servir s necessidades de

    leitura da comunidade escolar, mas tambm comunidade mais ampla, e principalmente a

    do entorno da escola, incluindo pais de estudantes e mesmo ex-estudantes da escola.

    [...] que vem sendo utilizada por professores, por alunos e at mesmo pela

    comunidade... De outras escolas que vm aqui fazer leitura... Porque a gente sabe que

    biblioteca na nossa cidade muito difcil... A gente tem uma biblioteca pblica que

    muito pobre, o acervo que existe l... Das escolas aqui em Castanhal, poucas tm

    biblioteca. A nossa escola se sente at privilegiada, apesar de ter uma biblioteca

    pequena, com poucos livros, mesmo assim tem privilgio em relao a outras escolas

    que no possuem livros.

    40

  • Um dado significativo quanto s prticas de leitura, recolhido nos grupos focais

    com estudantes, foi relativo postura das famlias. Embora a maior parte dos pais ou

    responsveis pelas crianas no tivesse contato sistemtico com a leitura grande parte

    deles, inclusive, com baixa escolaridade era comum o relato de crianas sobre a

    cobrana dos pais em relao ao exerccio da leitura. Esse exerccio vinha sempre

    associado escrita, mas do seguinte modo: cpia de textos para melhorar a grafia,

    realizao de leituras obrigatrias e aleatrias cotidianamente, assim como a escrita de

    cartas. Percebeu-se, em vrias situaes, a tentativa de reforo ao trabalho escolar por

    iniciativa das prprias famlias, com prticas que complementavam atividades

    consideradas fundamentais para o aprendizado da leitura e da escrita.

    Algumas escolas se esforavam para desenvolver programaes como: Semanas

    de Leitura; Feiras Literrias; Gincanas Literrias, entre outras. Este esforo poderia ser

    compreendido como resultado da percepo do lugar da leitura na formao dos sujeitos.

    Mas o que pareceu fundamental para ser pensado pode ser assim resumido: como se

    desenrola a proposta de trabalho com a leitura e a escrita no cotidiano da biblioteca escolar

    ou da sala de leitura, e de como estas se articulam, ou no, com o que proposto pelo

    projeto poltico-pedaggico da escola e vice-versa?

    Sujeitos leitores e escritores em formao, nas escolas, devem ser os protagonistas

    deste trabalho, pensando no alcance das prticas de leitura e escrita, dentro e fora da escola.

    Estariam, contudo, os professores reflexionando coletivamente sobre os significados das

    programaes realizadas e oferecidas aos estudantes como prticas de incentivo leitura?

    Regio Nordest