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Sociologia da Educação
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A letra grega , adotada universalmente
para simbolizar o prefixo micro (pequeno),
usada nesta obra para representar o con-
junto das disciplinas relacionadas rea de
cincias sociais, em que se estudam aspectos
scio-histricos dos grupos humanos.
sociologia da educao
Diretor-presidente
Wilson Picler
Editor-chefe
Lindsay Azambuja
Editores-assistentes
Adriane Ianzen Jerusa Piccolo
Anlise de informao
Eliane Felisbino Trisotto
Reviso de texto
Schirley H. de Gois Hartmann
Capa
Bruno Palma e Silva
Projeto grfico
Raphael Bernadelli
Diagramao
Rafaelle Moraes
Conselho editorial
Ivo Jos Both, Dr. (presidente)Elena Godi, Dr.a
Jos Raimundo Facion, Dr.Srgio Roberto Lopes, Dr.
Ulf G. Baranow, Dr.
Obra coletiva organi-zada pela Universidade
Luterana do Brasil (Ulbra).
Informamos que de inteira respon sabilidade
do autor a emisso de conceitos.
Nenhuma parte desta publicao poder ser
reproduzida por qualquer meio ou forma sem a pr-via autorizao da Ulbra.
A violao dos direitos autorais crime estabe-
lecido na Lei n 9.610/98 e punido pelo Artigo 184 do
Cdigo Penal.
S678
Sociologia da educao / Organizado pela Universidade Luterana do Brasil (Ulbra). Curitiba: Ibpex, 2008.175 p.
ISBN 978-85-99583-63-0
1. Sociologia educacional. 2. Sociologia educacional Brasil. I. Universidade Luterana do Brasil. II. Ttulo.
CDD 370.1920. ed.
apresentao
Caros alunos, entendo o conhecimento como um mar aberto, no qual nos propomos navegar. Mas, para um navegador, essencial estar de posse de uma boa bssola, que nos ajuda a encontrar o norte. Essa bssola a cincia, que nos per-mite conhecer a realidade que est sempre contida neste
mar aberto. A sociologia, enquanto cincia que nasce no sculo XIX, uma cincia de fundamental importncia para que possamos compreender a realidade que nos cerca. Imaginem a sociologia aplicada educao. nossa bssola de carter mais especfico, que nos possibilita compreender
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a realidade educacional brasileira e a prpria significao
da educao nas sociedades. Pensar a educao no contexto de nossa realidade
estarmos em contato inclusive com srias contradies que geram problemas, mas que, ao mesmo tempo, solicitam mudanas, mudanas estruturais de carter forte, mudan-as que nos possibilitem construir um caminho para uma educao mais democrtica, fortalecendo tambm os direi-tos de cidadania para indivduos e grupos na realidade social vivenciada.
Entendemos que a educao no Brasil vive um momento de crise, principalmente a educao pblica, em cujo con-texto nos deparamos com o no-desenvolvimento de medidas que assegurem uma educao de qualidade para expressivo contingente da populao. Nesse sentido, esta-mos vivendo as guas turbulentas das contradies sociais que permeiam o espao educacional. Para enfrent-las, como bons navegadores, devemos estar de posse de exatos instrumentos que nos permitam compreender e analisar a realidade presente, pois na medida em que compreen-demos as circunstncias nas quais nos encontramos que adquirimos a capacidade de transform-las, nascendo em ns todo o desejo e a fora para a transformao.
Para muni-los desses instrumentos, no captulo 1, tra-balharemos inicialmente com os elementos que denotam a especificidade da sociologia da educao, ao mesmo tempo
em que veremos a educao enquanto processo socializador e tambm a educao enquanto processo de controle social.
No segundo captulo, apresentaremos os principais pressupostos dos clssicos da sociologia autores como Karl Marx, mile Durkheim e Max Weber e os aspectos em que suas concepes nos permitem compreender a educa-o enquanto fenmeno social estruturante e estruturado.
Num novo momento deste trabalho, no captulo 3, abordaremos os elementos da concepo conservadora
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de educao no contexto de nossa realidade social, exami-nando trs formas de pedagogia a tradicional, a nova e a tecnicista, que so formas conservadoras com que a edu-cao se manifesta no contexto de nossos bancos escola-res. Em seguida, analisaremos, no captulo 4, os elementos da tendncia progressista de educao, ao mesmo tempo em que discutiremos as determinaes da estrutura social sobre a mesma educao. Esse um aspecto importante, na medida em que a prpria tendncia progressista da educa-o envolve a considerao da estrutura social abrangente, para que possamos pensar a educao no contexto notada-mente da sociedade brasileira.
No captulo 5, iremos examinar as instituies sociais e a educao, apresentando os meios de comunicao de massa tambm como instituio social, tendo em vista que se cons-tituem enquanto um poder estruturante de forte influn
cia no campo educacional e nas instituies sociais, como a famlia, a instituio religiosa, o Estado e a educao.
No captulo 6, analisaremos os elementos da globaliza-o e sua relao com a educao, sem deixarmos de con-siderar os processos de desenvolvimento econmico e sua influncia no contexto da educao, em nossa abordagem
da relao entre mudana social e educao.Desenvolveremos tambm, no captulo 7, uma investi-
gao acerca da educao contempornea, centralizando a anlise nos aspectos sociolgicos, abrangendo conceitos-chave como estrutura, sujeito, processos sociais e relao entre poder e processo educativo, que envolvem sempre toda e qualquer anlise sociolgica que se queira crtica da realidade social vivenciada por indivduos e grupos. Em seguida, no captulo 8, iremos abordar teorias contem-porneas que contribuem para pensar a educao. Para tanto, examinaremos autores como Norbert Elias, Pierre Bourdieu, Michel Foucault e Anthony Giddens, no que estes geraram de luz para que possamos pensar tambm
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a educao no contexto das sociedades complexas, globali-zadas e marcadamente excludentes.
Trabalharemos tambm no captulo 9 aspectos da edu-cao no Brasil. Procuraremos empreender uma reflexo
acerca de alguns elementos fundamentais da educao no contexto da realidade brasileira atual, como, por exemplo, o analfabetismo funcional e estrutural. Por ltimo, pro-poremos uma reflexo, no captulo 10, acerca do que ser
professor. Trata-se de um captulo que traz um diferencial, pois apresenta uma proposta, mais do que um trabalho com teorias e prticas relacionadas educao. Nossa inteno ser justamente fomentar a reflexo, sempre necessria,
acerca do ser professor, principalmente no contexto de uma realidade social como a nossa. O ltimo captulo , pois, uma proposta, nada mais que isso, para se pensar o
ser professor e o que efetivamente isso significa.
Neste nosso trabalho, propomo-nos, fundamental-mente, oferecer os elementos que nos permitam a refle-xo mais precisa possvel sobre a relao entre realidade social e processo educacional, para que possamos salvar nossas circunstncias e, conseqentemente, a ns mesmos enquanto educadores diante de uma realidade educacio-nal que ainda se pauta por elementos marcadamente con-servadores, que necessitam, com urgncia, ser repensados, ser transformados a fim de que a educao, acima de tudo,
seja um elemento de transformao e de libertao dos gri-lhes da inconscincia e da inrcia a que possamos estar ligados enquanto cidados e profissionais. Estudemos a
realidade, para que a nuvem do no-saber no nos deixe amordaados diante da necessidade que temos de gritar por liberdade e de gritar por nossos direitos mais sagrados de exerccio pleno da cidadania. Desejamos bons estudos a todos e que utilizem sempre a bssola precisa do conhe-cimento para navegar no mar aberto em que se constitui nossa realidade social.
sumrio
( 1 ) A especificidade da sociologia da educao, 11
( 2 ) Os tericos clssicos e suas concepes sobre a educao: principais pressupostos tericos, 25
( 3 ) Educao enquanto instncia conservadora, 47
( 4 ) Tendncia progressista da educao e as deter-minaes da estrutura social sobre a educao, 59
( 5 ) As instituies sociais e a educao, 73
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( 6 ) A relao entre mudana social e educao, 93
( 7 ) Educao contempornea, 107
( 8 ) Teorias contemporneas que contribuem para pensarmos a educao, 121
( 9 ) A educao no Brasil, 145
( 10 ) Ser professor, 157
Consideraes finais, 169
Referncias por captulo, 171
Referncias, 173
Gabarito, 175
( 1 )
a especificidade da sociologia da educao
Maria Clara Ramos Nery bacharel em
Cincias Sociais, especialista em Educao
Popular pela Universidade do Vale do Rio dos
Sinos (Unisinos), mestre em Sociologia pela
Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS) e doutoranda em Cincias Sociais
pela Unisinos. professora dos cursos de
Cincias Sociais, Pedagogia e Administrao
da Universidade Luterana do Brasil (Ulbra).
Maria Clara Ramos Nery
( )
neste momento de nosso trabalho, vamos abordar a especificidade da sociologia da educao, para
que possamos compreender o que ela possui de mais seu, sua fundamental caracterstica, de modo a podermos tam-bm, enquanto educadores, entender sua importncia, que se faz notar ao nos permitir sempre trabalhar os determi-nantes sociais que interferem, que influem at mesmo nos
processos educativos e tambm em nossa prtica docente.
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(1.1)
relao entre o nascer de uma cincia e de uma instituio social e as mudanas na estrutura social
Para pensarmos a sociologia da educao, devemos pen-sar e compreender o contexto histrico fundamental da sociologia como cincia. Esta surgiu no sculo XIX, como uma resposta intelectual para os problemas que a socie-dade estava apresentando. Nesse sentido, temos elementos importantes a considerar. Um deles , justamente, a sig-nificao do sculo XVIII para o surgimento da sociolo-gia como cincia. Esse sculo o perodo em que temos a presena de uma dupla revoluo: a Revoluo Industrial, de carter econmico e social, e a Revoluo Francesa, de carter eminentemente poltico, por meio da qual a bur-guesia, enquanto classe social, toma o poder na Frana e expande-se para todo o mundo, internacionalizando-se.
Outro elemento a considerar que os processos dessas duas revolues so significativos, porque foram a fora
motriz da consolidao do modo de produo capitalista, que tem como caracterstica bsica a posse privada, parti-cular dos meios de produo. Afirma Meksenas1:
Esse modo de produo que se originou do comrcio e da
manufatura foi responsvel pelo desenvolvimento de novas
invenes, tcnicas, aumento das atividades produtivas,
dando origem moderna indstria. A intensa urbanizao
do nosso sculo fruto desse processo e o aparecimento de
classes sociais tambm o . Agora, sob a sociedade capitalista,
a fonte de riquezas no mais a terra, mas sim a proprie-
dade de fbricas, mquinas, bancos, isto , a propriedade dos
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meios de produo. Assim, os poucos proprietrios dos meios
de produo se constituem na classe empresarial (burguesia)
enquanto uma imensa maioria de pessoas no-proprietrias
se constitui na classe trabalhadora (proletariado), que, para
sobreviver, troca sua capacidade de trabalho por salrio.
Ou seja, tudo o que uma sociedade necessita para pro-duzir seus bens controle privado, posse particular de uma minoria os detentores dos meios de produo. Esse aspecto de fundamental importncia, na medida em que essa transformao no contexto das sociedades contem-porneas, principalmente das sociedades do mundo oci-dental, fez com que a sociedade se tornasse um problema, existindo muitas questes de ordem social para serem resolvidas. Ento, no sculo XIX, surge a sociologia como uma resposta intelectual para os problemas que a socie-dade estava a apresentar.
Temos assim, a partir do sculo XIX, notadamente em 1839, ano em que Augusto Comte nomeou a ento fsica social de sociologia, o surgimento de uma cincia com objeto e mtodos de investigao, que buscaria responder s prin-cipais questes que se apresentavam no universo social da poca. Era uma sociedade marcada por contradies, con-seqentemente por crises de carter econmico, poltico e tambm cultural; era uma sociedade em que se percebia a vigncia do conflito. Outro no poderia ser o contexto de
surgimento da sociologia, como dissemos anteriormente. Podemos verificar que a sociologia, em seu primeiro
momento, tinha um carter conservador, na medida em que se encontrava preocupada com a ordem que se perde com o advento do modo de produo capitalista. Nesse sentido, a grande preocupao era com o restabelecimento da antiga ordem. Segundo Meksenas2, podemos afirmar que a socio-logia fruto de uma poca, de uma nova organizao social,
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de uma transformao social. A nova ordem social est ins-taurada; portanto, necessrio ser explicada, entendida.
Os autores considerados clssicos da sociologia so Karl Marx (1818-1883), mile Durkheim (1858-1917) e Max Weber (1864-1920). Esses autores objetivaram desenvolver teorias que at hoje se constituem enquanto base explica-tiva e de interpretao da sociedade capitalista. Essas teo-rias so: a teoria crtica (Marx), a teoria funcionalista (Durkheim) e a teoria compreensiva (Weber), ou sociologia crtica, sociologia funcionalista e sociologia compreensiva, respectivamente.
Como podemos pensar a educao no contexto
dessa nova sociedade e dessa nova cincia?
Deve ficar entendido que os processos culturais, no
contexto das sociedades capitalistas, fazem com que se fortalea a concepo de que a cincia a fonte de toda e qualquer explicao para o estar no mundo. De acordo com Meksenas3, disseminou-se a idia de que a prpria vida moderna s poderia ser entendida sob a tica da cincia, melhor dizendo, sob a tica dos mtodos cientficos e, nesse
processo, a educao tambm vai sofrer transformaes, j que passa a refletir valores que tm a cincia como base,
deixando ento de refletir valores religiosos presentes no
contexto da sociedade feudal. importante considerar que
Ser nesse contexto ideolgico da nascente sociedade indus-
trial que nasce uma nova instituio responsvel por essa
educao: a escola. Percebemos que uma das caractersticas
da revoluo ideolgica capitalista foi transportar uma edu-
cao que durante o feudalismo ocorria na famlia e na Igreja
para a instituio da escola. Nasce assim a escola: uma ins-
tituio com normas especficas, agentes prprios (direto-
res, professores, alunos, orientadores pedaggicos etc.) e toda
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uma hierarquia. A escola se prope o objetivo de preparar os
indivduos para a vida em sociedade ao mesmo tempo que
desenvolve suas aptides pessoais. Com isso, nasce tambm
nova estrutura de ensino: muitas salas de aula, muitos alunos
numa s sala, provas, notas, porcentagens de freqncia, car-
teiras em filas, diplomas. Tudo com o objetivo de educar uma
massa cada vez maior de indivduos, tentando adapt-los aos
valores dessa nova sociedade capitalista do sculo XVIII. A
escola que conhecemos hoje , portanto, produto dos sculos
XVIII e XIX, perodo em que aparece a idia da necessidade
de educao pblica e obrigatria para todas as pessoas.4
Como podemos depreender das consideraes de Meksenas5, surge no contexto social, na nova ordem capi-talista, a necessidade de explicar a realidade, mas tambm a necessidade de criar espaos para preparar indivduos que se adaptem nova ordem estabelecida, ao novo sis-tema. A escola ser ento, de certa forma, a instituio que ter este papel de preparao de indivduos que devem estar adequados ao sistema social.
A partir dessas consideraes, importante verificar a
relao de interdependncia presente entre o contexto social, o surgimento da cincia e o surgimento da escola enquanto instituio. A transformao que se operou nas estrutu-ras sociais originou novas formas de ser enfocada a reali-dade social vivenciada por indivduos e grupos, bem como novas instituies sociais, com funes especficas, sendo
a escola uma das principais. Nesse sentido, devemos com-preender tambm que se originaram novas sociologias, entre elas a sociologia da educao, a cincia que vai inves-tigar, interpretar e analisar a escola como instituio social, considerando os processos sociais que a envolvem. De certa forma, o campo de estudos da sociologia da educao pode ser diversificado, mas, mesmo em sua diversificao, ele
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necessita de instrumental terico-metodolgico detalhado e especfico, que permita a compreenso dos elementos
presentes nos contextos social, histrico, poltico, cultural e econmico sobre os quais se assenta a educao.
(1.2)
a educao como processo socializador
O que podemos entender por socializao?
Anteriormente j comentamos a esse respeito, quando tra-tamos da relao de interdependncia entre o surgimento de uma cincia e de uma instituio social e as transforma-es presentes na estrutura das sociedades. Nesse sentido, podemos pensar que a socializao o processo de adequa-o do indivduo no sistema social. Viver em sociedade sig-nifica estar de certa forma enquadrado ao sistema social,
seguindo as regras e as normas sociais estabelecidas.O processo de socializao permite a manuteno e a
sobrevivncia da sociedade. Na medida em que indivduos e grupos pautam sua conduta pelas normas e regras pre-vistas socialmente, encontram-se adaptados sociedade e esta ento pode manter-se coesa e em harmonia, como nos diriam os positivistas e os funcionalistas. O processo de socializao , pois, o fator que permite verificarmos a
existncia de vnculos sociais que, consolidados, mantm a sociedade harmonicamente constituda e em ordem.
A educao pode e deve ser concebida como uma das principais instncias de socializao das novas geraes. Ela permite que nos constituamos enquanto seres sociais
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em nosso estar no mundo, pois, segundo Oliveira6, con-siste em um processo social de carter permanente no con-texto das sociedades humanas, sendo responsvel pelo nosso ajustamento aos padres culturais vigentes.
Claro est ento que uma das principais tarefas da edu-cao no contexto das sociedades encontra-se no fato de fazer com que nossos interesses individuais sejam realiza-dos por meio dos interesses sociais. Nesse sentido, a edu-cao, enquanto fonte de socializao, nos faz verificar que
sozinhos nada conseguimos, precisamos dos outros e preci-samos, de certa forma, estar adequados s regras coletivas.
Meksenas7 esclarece que o homem s desenvolve suas faculdades [...] em contato com outras pessoas, com o meio social. A convivncia no grupo, por sua vez, s pos-svel se o indivduo acatar certas regras comuns a todos, se for capaz de abrir mo de alguns de seus desejos para ter outros, socialmente aceitos. Viver em sociedade nos pede
justamente isto: que, de certo modo, consigamos abrir mo de alguns de nossos desejos em nome do coletivo. Podemos afirmar, assim, que o processo de socializao se
realiza em sua plenitude quando podemos realizar esse gesto, pois a funo social da educao justamente evitar a contradio sempre presente entre os interesses pessoais e os interesses sociais.8
A educao ento deve fazer com que o indivduo inter-nalize idias e procedimentos que fazem parte do meio social, j que a educao enquanto instncia transmissora dos padres morais aceitos socialmente permite a prpria reproduo da sociedade.
A educao una: deve inculcar no indivduo idias que
fazem parte do meio social em que vive. Como vimos, a socie-
dade se caracteriza por ser um corpo cuja tendncia natural
o progresso e a harmonia; a garantia dessa tendncia nos
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dada pela moral social, que impe ao indivduo a conduta
exigida pela sociedade. Nesse contexto, a educao se caracte-
riza por ser o ato de transmisso dessa moral.9
Ao mesmo tempo, a educao mltipla, na medida em que envolve uma soma de conhecimentos diferentes, que variam de indivduo para indivduo, considerando-se o contexto social. Embora seja una, dentro desta mesma unidade encontramos uma diversidade de conhecimentos. Dessa forma,
A educao mltipla, alm de uma, porque, ademais dos
valores comuns a todos os indivduos de uma sociedade, que
ela transmite, existe uma soma de conhecimentos distintos,
que variam de classe para classe social ou de profisso para
profisso. Portanto, apesar de ela ser uma, pode existir den-
tro dessa unidade uma certa diversidade ou especializao de
conhecimentos.10
Esse aspecto, de certa forma, demonstra a dialtica pre-sente na educao enquanto processo socializador.
(1.3)
a educao como processo de controle social
Vimos a educao em sua funo socializadora, mas impor-tante verificarmos que a educao tambm possui, junto
com outras instituies sociais, a funo de realizar o con-trole social. No podemos separar a educao dessa funo, sendo que o controle social se encontra sempre relacionado com uma forma disciplinar de reger as condutas, que vem a
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garantir a permanncia e a sobrevivncia das sociedades. Nos grupos sociais, existe sempre algum tipo de con-
trole, que pode ser de carter individual ou de carter social, pois no podemos viver numa sociedade sem qual-quer forma de controle, na medida em que ningum sabe-ria ao certo o seu padro adequado de comportamento, a norma de conduta a seguir e assim por diante. No possvel viver em sociedade sem que existam formas de controle, pois este mesmo controle rege nossa conduta e estabelece repertrios de aes individuais e coletivas e padres sociais de comportamento, que nos permitem cir-cular com certa segurana no meio social, no exerccio de nossos papis sociais.
Os padres sociais de comportamento, ou padres de comportamento, podem ser entendidos enquanto regula-ridades, que so impostas pela sociedade para todos os indivduos e determinam as condutas dos indivduos e dos grupos, estabelecidas pelos padres culturais. Segundo Oliveira11, a educao tem por finalidade ajustar os educan-dos aos padres culturais vigentes. Esse processo de ade-quao permite que os educandos sejam capazes de estar integrados na sociedade de acordo com o prprio desen-volvimento cultural. assim que a sociedade se mantm em ordem.
Temos em sociedade elementos formais e elementos informais de controle social. Comparando o direito com a educao, podemos entender o direito enquanto ele-mento formal de controle social, uma vez que suas normas e regras se encontram no campo do obrigatrio, no sendo, portanto, facultativas. A educao pode ser considerada enquanto elemento informal de controle social, visto que nela se encontram presentes elementos que se inserem no campo do facultativo, no campo da cultura. Salientamos,
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porm, que, mesmo no campo do facultativo, encontramos determinaes que estabelecem condutas e padres com-portamentais aceitos socialmente. Nesse sentido, deve ficar
entendido que o conjunto de normas e de regras presen-tes na sociedade sobrepe-se ao indivduo, fazendo com que ele se adapte ao meio social. Reiteramos que a edu-cao possui esta funo social: a preparao dos indiv-duos para se adequarem ao sistema. Assim, as normas e as regras sociais exercem papel norteador das condutas, per-mitindo a construo de repertrios especficos de aes
individuais e coletivas.
A partir das discusses apresentadas, pense e reflita:
Qual o papel da educao no contexto da nossa vida?
Qual o papel fundamental da educao no contexto das
sociedades?
leitura complementar
Gosto de ser gente porque, inacabado, sei que sou um ser condicionado mas, consciente do inacabamento, sei que posso ir mais alm dele. Esta a diferena profunda entre o ser condicionado e o ser determinado. A diferena entre o inacabado que no se sabe como tal e o inacabado que histrica e socialmente alcanou a possibilidade de saber-se inacabado.
Gosto de ser gente porque, como tal, percebo afi-nal que a construo de minha presena no mundo, que no se faz no isolamento, isenta da influncia das foras
sociais, que no se compreende fora da tenso entre o que
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herdo geneticamente e o que herdo social, cultural e his-toricamente, tem muito a ver comigo mesmo. Seria ir-nico se a conscincia de minha presena no mundo no implicasse j o reconhecimento da impossibilidade de minha ausncia na construo da prpria presena. No posso me perceber como uma presena no mundo, mas, ao mesmo tempo, explic-la como resultado de operaes absolutamente alheias a mim.
Neste caso o que fao renunciar responsabili-dade tica, histrica, poltica e social que a promoo do suporte a mundo nos coloca. Renuncio a participar, a cumprir a vocao ontolgica de intervir no mundo. O fato de me perceber no mundo, com o mundo e com os outros me pe numa posio em face do mundo que no de quem nada tem a ver com ele. Afinal, minha presena
no mundo no a de quem a ele se adapta mas a de que nele se insere. a posio de quem luta para no ser ape-nas objeto, mas sujeito tambm da Histria.
Fonte: FREIRE, 1997.
indicao cultural
MEKSENAS, P. Sociologia da educao. Introduo ao estudo da escola no processo de transformao social. So Paulo: Edies Loyola, 2005.
Uma dica de estudo interessante a leitura do livro de Paulo Meksenas, que no segundo captulo trabalha a edu-cao segundo o funcionalismo. Voc encontrar elementos
que lhe permitiro visualizar a funo social da educao enquanto fator de socializao.
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atividades
Como uma atividade de estudo, cremos que a seguinte 1. questo se faz importante: na constituio de nossa perso-nalidade individual, devemos considerar os determinan-tes sociais?
A sociologia, como cincia que possui objeto de investigao 2. e mtodo, surge como resposta intelectual s transforma-es sociais ocorridas com a consolidao do capitalismo. As revolues que marcaram esse perodo foram:
a Revoluo Francesa e a Revoluo Industrial.a. somente a Revoluo Industrial. b. somente a Revoluo Francesa. c. a Revoluo Inglesa.d. Nenhuma das alternativas anteriores.e.
A sociologia, em seu surgimento, apresenta um carter:3. libertador.a. crtico.b. conservador.c. libertrio.d. Nenhuma das alternativas anteriores.e.
A instituio social que nasce com a sociedade capitalista :4. a famlia.a. a escola.b. a Igreja.c. o Estado.d. Nenhuma das alternativas anteriores.e.
( 2 )
os tericos clssicos e suas concepes sobre a educao:
principais pressupostos tericos
( )
Maria Clara Ramos Nery
anteriormente vimos a especificidade da sociologia da educao e tambm a funo social da edu-cao. Neste captulo, vamos trabalhar com os clssicos da sociologia Marx, Durkheim e Weber e suas concepes acerca da educao, ressaltando o que trazem de especfico
nesse campo e suas contribuies para a rea.
Qual a contribuio dos clssicos da sociologia
para que possamos compreender a educao?
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Primeiramente, devemos ter claro que a principal questo sociolgica se traduz por considerar a relao entre indivduo e sociedade. Nesse sentido, torna-se necessrio examinar os autores clssicos da sociologia e a forma como respondem a essa principal questo sociolgica.
(2.1)
karl marx (1818-1883)
Para Marxa, a sociedade determina o indivduo por meio das condies materiais de existncia. Podemos verificar
ento que estamos diante de uma concepo de carter determinista.
O critrio de compreenso da relao entre indivduo e sociedade em Marx , como vimos, o critrio econmico. Para nosso autor de referncia, somos determinados em funo de nossas condies materiais de existncia e somente nesse sentido que a sociedade determina o indi-vduo. Para o marxismo, o pensamento, a viso de homem e a viso de mundo so resultado das condies mate-riais. Portanto, o mundo material deve ser considerado como anterior ao esprito, e este mesmo esprito deriva das condies materiais.
O materialismo marxista considera o mundo como uma rea-
lidade dinmica, um complexo de processos, que exige obser-
varmos a realidade dialeticamente, isto , em que ponto a
realidade influencia a idia e a idia influencia a realidade.
a. As citaes indiretas de Marx apresentadas no decorrer do livro so baseadas em: MARX, 1973 e MARX; ENGELS, 1976.
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Assim, o esprito no conseqncia passiva da ao da
matria, podendo reagir sobre aquilo que o determina, liber-
tando o ser humano por meio de sua ao sobre o mundo, per-
mitindo, assim, no futuro, a ao revolucionria.1
Podemos perceber, ento, que em Marx encontramos a presena da ao do homem no mundo, ou seja, o homem, a partir de sua compreenso da realidade, partindo desta mesma realidade, teria o papel de exercer em seu estar no mundo uma ao transformadora.
Nesse sentido, uma pergunta importante deve ser feita:
a idia que faz o real ou o real que faz a idia?
Numa concepo marxista, o real que faz a idia, pois no campo da realidade concreta que se encontram as condies de possibilidade para realizaes. No tendo por base as idias que a vida do homem no mundo ser explicada. , sim, pela atividade material humana, a prxis, que vamos compreender as idias, a viso de homem e a viso de mundo. Marx assinala que as idias dominantes na sociedade so as idias da classe dominante.2
Compreendido o prprio ponto de partida da concepo
marxista da relao entre indivduo e sociedade, vamos
agora trabalhar a questo da educao. Como Marx via
a educao? Como uma concepo marxista trabalha
com a educao?
Primeiramente, torna-se necessrio repetir que em Marx so as relaes sociais de produo, as relaes econmicas os fatores determinantes da sociedade. De acordo com a teoria marxista, toda formao social pos-sui uma infra-estrutura, em que se encontram as relaes sociais de produo, e uma superestrutura, em que esto
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presentes trs instncias: a ideolgica, a jurdica e a poltica.
A infra-estrutura determina a superestrutura social, que,
por sua vez, legitima as relaes sociais de produo pre-
sentes na infra-estrutura. Considerando a superestrutura,
em Marx, podemos verificar que a educao faz parte da
superestrutura social, na instncia ideolgica.
O termo ideologia aqui para ns assume aspecto funda-
mental. Em Marx, a ideologia constitui-se em uma distor-
o do pensamento que se origina das contradies sociais
e que oculta estas mesmas contradies, as quais, por sua
vez, se manifestam nas idias, nas vises de mundo e de
homem, nas crenas e nas prprias categorias de conheci-
mento. Afirmam Silva e Carvalho3:
A ideologia impede que o proletrio tenha conscincia da pr-
pria submisso, porque camufla a luta de classes ao represen-
tar, de forma ilusria, a sociedade, mostrando-a como una e
harmnica. Alm disso, segundo Marx, a ideologia esconde
que o Estado, longe de representar o bem comum, a expres-
so da classe dominante.
Podemos ento verificar que a ideologia se constitui em
uma viso falsa da realidade, na medida em que escamo-
teia, esconde aspectos desta mesma realidade.
J dissemos que a educao encontra-se na esfera supe-
restrutural da sociedade e atinente esfera ideolgica.
Marx no trabalhou especificamente com a educao, mas
podemos ver, considerando que as idias dominantes na
sociedade so as idias da classe dominante, que no mar-
xismo a educao, ou o processo educativo, seria transmis-
sor da ideologia dominante, como podemos concluir pela
leitura do trecho a seguir:
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A esperana de Marx por uma nova sociedade no pode ser
construda sem a presena da ao educativa. No Manifesto,
ele deixa claro que a educao deve ser levada em conside-
rao no momento de se elaborar qualquer projeto de supe-
rao das relaes sociais burguesas. preciso, segundo ele,
arranc-la da influncia da classe dominante, do modo bur-
gus de ver o mundo, se no quisermos que as crianas sejam
transformadas em simples objetos de comrcio, em simples
instrumentos de trabalho (Marx, 1984, p. 32). Entre as
medidas a serem implementadas para que um novo tipo de
educao seja desenvolvido, preciso uma educao pblica
e gratuita de todas as crianas. Pensando a educao como
parte de sua utopia revolucionria, Marx identificou nela
uma arma valiosa a ser empregada em favor da emancipao
do ser humano, de sua libertao da explorao e do jugo do
capital a construo da sociedade comunista.4
Podemos verificar que a concepo marxista acerca da
educao e do prprio papel dela no contexto da sociedade capitalista detm um carter crtico. Nesse sentido, tam-bm podemos afirmar que a concepo marxista permi-tiu que se tivesse uma percepo do processo educativo de carter mais questionador. A sociologia da educao modificase com as questes levantadas pelo marxismo,
enquanto instncia supraestrutural de carter ideolgico. Cabe salientar que em Marx o que se expressa de forma clara a transformao da sociedade capitalista em uma forma mais igualitria e justa de sociedade.
De acordo com o marxismo, a educao um instru-mento, no contexto da sociedade capitalista, pelo qual os dominados internalizam os valores e a viso de mundo da classe dominante, mas isso exclui a possibilidade de refle-tirmos acerca de uma pedagogia que possa ser um meio
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pelo qual se pode superar a ordem social capitalista, sem-pre desigual e, marcadamente, excludente.
Tomando as idias de Marx para uma educao que vise rea-
lizao e formao de uma personalidade humana unificada
e plena, necessrio considerar a educao no um problema
individual, privado, sujeito a um processo de aperfeioamento
espiritual, e, sim, um problema social, dependente da trans-
formao da estrutura econmica da sociedade. Como, para
ele, o homem a essncia que se faz a si mesmo, a prtica edu-
cativa pode se tornar uma atividade favorvel no apenas para
formar pessoas, como tambm para transformar a sociedade.5
Sendo entendido o que nos colocam Silva e Carvalho, podemos verificar que a educao tem um papel social
notadamente crtico, questionador da ordem vigente. Pode contribuir, assim, para a mudana da ordem social, j que permite, por meio do processo de ensino-aprendizagem, o prprio rompimento com a dominao estabelecida pela classe dominante.
Paulo Freire foi um dos pedagogos brasileiros que bus-caram transformar o papel conservador da educao, dando-lhe um carter transformador, na medida em que props que o processo de ensinoaprendizagem se fizesse
a partir da prpria realidade do aluno, marcada fortemente pela desigualdade social. De qualquer forma, importante percebermos que em Marx a transformao da sociedade envolve a presena da ao educativa. A sociedade capi-talista, com suas contradies, no pode ser transformada, superada, sem considerao do processo educativo no que ele tem de supraestrutural e, assim, de legitimador da
nova ordem social.
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(2.2)
emile durkheim (1858-1917)
Como Durkheim responde principal questo sociol-
gica, que a relao entre indivduo e sociedade?
Em Durkheimb, encontramo-nos tambm diante do determinismo. No entanto, seu determinismo diferen-cia-se do encontrado em Marx. Em Durkheim, a sociedade determina o indivduo por meio das normas, das regras sociais, que so produzidas coletivamente. Nesse sentido, nossas formas de pensar, de sentir e de agir encontram-se determinadas pela sociedade. Para Durkheim, a educa-o se constituiria como a principal fonte de socializao, na medida em que ela (a educao) permitiria a interna-lizao das normas e das regras presentes na sociedade. Encontramos a a concepo de que o processo de sociali-zao o mesmo que o processo de educao, pois pelo ato de educar que os indivduos e os grupos acabam por interiorizar todos os elementos da moral que se encontram presentes no meio social. Conforme estudos de Atisiano6,
Essa socializao, segundo Durkheim, compe o processo
de aprendizagem social que permite a absoro das formas
de viver da sociedade, seja pensamentos, atitudes, smbolos
e regras. No bojo dessa socializao, est a moral da socie-
dade, a qual constituda por alguns tipos de regras, direitos
e deveres, sistema de recompensa e castigo, etc. Essa mesma
moral tambm faz parte da linha mestre de ensino nas esco-
las, ou seja, as prticas pedaggicas adotadas na educao
b. As citaes indiretas de Durkheim apresentadas no decorrer do livro so baseadas em: DURKHEIM, 1974; 1967.
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no so desvinculadas da estrutura social qual pertence.
Os mesmos princpios desenvolvidos na sociedade, por meio
de outras instituies sociais, so adotados na escola, a fim
de acompanhar a constituio e as necessidades do orga-
nismo social (Tura, 2001, p. 49). O fim ltimo da escola
como reguladora social difundir uma moral laica racional,
que proporcionasse a coao social (Souza, 1994, p. 8).
Podemos verificar nessa teoria que a escola, enquanto
instituio social, reflete os elementos presentes na socie-dade e o processo de ensino-aprendizagem o processo que tambm permite e estabelece formas de regulao social, adequando indivduos e grupos prpria estrutura da sociedade. importante considerar que a instituio do Estado reguladora da ordem social, estabelecendo a ordem no contexto das sociedades complexas. A educao, na medida em que uma das funes do Estado, tambm reguladora da moral vigente na sociedade.7
Durkheim focalizou em sua concepo sociolgica as estruturas e as instituies sociais, considerando as novas relaes de poder que se instauravam em sua poca. Estava preocupado com elementos de desagregao social, de desordem social que identificava em sua sociedade. A
educao para ele se constitua num processo contnuo que permitiria a ordem e a estabilidade social, uma vez que pela via educacional determinados valores ticos seriam passados e internalizados por indivduos e grupos. A educao enquanto instituio social reflete elementos
da sociedade na qual esto contidos indivduos e grupos. Podemos entender, ento, como dissemos anteriormente,
que, para Durkheim, a educao se constitui no principal ele-mento de socializao, na medida em que permite a adequa-o, pela internalizao dos valores, normas e regras sociais, de indivduos e grupos ao contexto social mais amplo.
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O fato social na concepo de Durkheim
Na abordagem de Durkheim, encontramos como objeto de investigao sociolgica o fato social, que podemos defi-nir como o conjunto de normas e regras estabelecidas cole-tivamente. O fato social se constitui, assim, em todas as maneiras de pensar, agir e sentir que exercem sobre indi-vduos e grupos coero exterior e que so independentes das concepes individuais. Possui, pois, uma fora coer-citiva sobre indivduos e grupos, independentemente de suas vontades individuais. Os fatos sociais possuem como caractersticas ser coercitivos, exteriores e genricos. Se no pudermos identificar tais caractersticas, no nos encontra-mos diante de um fato social, pois so condicionantes e explicativas do fato social.8
Que relao podemos fazer entre o fato social
e a educao?
A educao, em Durkheim, tem poder coercitivo sobre indivduos e grupos, fazendo com que estejam adequa-dos s normas, aos costumes, aos hbitos estabelecidos na sociedade. Nesse sentido, fazer parte da sociedade agir de acordo com o socialmente determinado, sendo que a escola, enquanto instituio social, fora motriz da absor-o do que se encontra presente no contexto social.
Para Durkheim, a educao exerce coero sobre os indiv-
duos, obrigando-os a se conformarem aos seus contedos,
costumes e hbitos, desenvolvidos na escola e presentes na
sociedade, isto , para que sejamos aceitos na coletividade em
que vivemos, preciso que nos adaptemos s posturas por
ela determinadas. A educao tambm se apresenta de forma
exterior ao indivduo, ou seja, no cabe a ele decidir ou desejar
ser educado conforme os padres estipulados pela sociedade,
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isso j definido antes mesmo do seu nascimento, tem exis-
tncia prpria. E, por fim, a educao tem um aspecto geral,
no se trata de um caso isolado, e sim de um mecanismo ado-
tado da maior parte dessa sociedade.
[...] Ele definiu as trs caractersticas citadas acima para que
entendamos que um fato social s explicado por meio de
outro fato social a partir da investigao das instituies e a
explicao do seu funcionamento. A educao fato social e
instituio, apresenta-se independente dos indivduos, ela
uma fora maior do que eles, que lhes dita comportamentos
exigidos pela sociedade.9
Durkheim estabelece a prpria definio das caracte-rsticas dos fatos sociais, a coercibilidade, a exterioridade e a generalidade, sendo que esta ltima a mais sociolgica das caractersticas, se assim podemos dizer, na medida em que a partir da generalidade que os indivduos e os gru-pos reproduzem em si as regras, as normas, os costumes, as crenas etc. presentes na sociedade, que estabelecem padres comportamentais e repertrios de aes coletivas, permitindo a ordem e a coeso social. Salienta Atisiano10 que em Durkheim a preocupao fundamental no se encontra na priorizao dos indivduos, mas das institui-es sociais e suas determinaes, pois a manuteno da ordem, da coeso e do consenso sociais lhe era importante.
O que verificamos ser uma tnica no pensamento de
Durkheim encontra-se no fato de que, no contexto das sociedades complexas, caracterizadas por uma diviso do trabalho (especializao) que mais desenvolvida do que nas sociedades consideradas simples, as vrias instituies presentes na sociedade acabam por exercer suas funes determinadas a fim de integrar os indivduos. A educao,
para Durkheim, envolve, ento, a ao que as geraes adul-tas exercem sobre as geraes mais jovens, que ainda no
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se encontram preparadas para a vida social. A educao tem por objetivo fazer com que se desenvolva na criana e nos jovens caractersticas especialmente morais, em estrita consonncia com os valores exigidos socialmente.
Durkheim no estava preocupado com a transforma-o da sociedade capitalista, mas sim com a sua regulao. Concebe a educao enquanto elemento que integra a socie-dade, na medida em que deve existir para manter a ordem social. No tarefa da educao a transformao da ordem social, notadamente da ordem social capitalista, mas sim a prpria reproduo dos valores morais e ticos dessa socie-dade. Nesse sentido, a educao numa concepo durkhei-miana no tem a funo de mudar, mas sim de reproduzir.11
(2.3)
max weber (1864-1920)
Vimos anteriormente a concepo de Durkheim acerca da
significao da educao no contexto social. Agora vamos
trabalhar com as concepes de Weberc sobre a educa-o, abordando alguns aspectos importantes de sua teoria. Como Weber concebe a relao entre indivduo e sociedade, a principal questo sociolgica? Em Weber, no estamos diante de determinismos, pois, em sua concepo acerca de tal relao, podemos dizer que traz para dentro da socio-logia o indivduo enquanto construtor de seu universo social. Para Weber, o indivduo em interao, trocando sen-tidos e significados, compartilhando esses mesmos senti-dos e significados, constri a sociedade. Esse um primeiro
c. As citaes indiretas de Weber apresentadas no decorrer do livro so baseadas em WEBER, 1984.
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momento na concepo da relao entre indivduo e socie-dade em Weber. Somente num segundo momento que teremos a determinao do social sobre o individual.
Weber recusa uma concepo determinista, pois, em seu ato de nomear as coisas, o ser humano lhes d existn-cia, lhes d vida, porque lhes atribui significados. O homem
em seu estar no mundo, ento, constri seu prprio uni-verso o universo social, que, por sua vez, exercer sobre ele sua determinao e, nesta determinao, Weber tam-bm considera os aspectos de carter econmico.
O ponto de partida de Weber para compreender a sociedade constitui a compreenso da ao do homem. Para ele, necessrio investigar, interpretar e analisar a ao do homem em seu estar no mundo, bem como os sentidos e os significados que seriam a fora motriz dessa
mesma ao. Seu ponto de partida encontra-se, pois, na ao social e na concepo de que a sociologia uma cin-cia compreensiva.
Weber dialoga com a teoria marxista, mas afasta-se de Marx na medida em que, ao explicar a sociedade, parte das relaes estabelecidas pelos homens no contexto da socie-dade capitalista e no centraliza sua anlise em determi-nantes econmicos. Considera a existncia de inmeros grupos sociais em sociedades diferentes, que envolvem culturas diferentes e que, portanto, devem ser considera-das tambm na ao educativa. No nega taxativamente a luta de classes, mas considera que no se encontram exclu-sivamente nas classes sociais todas as causas e as conse-qncias das transformaes sociais. Alm disso, em Weber, a sociedade no uma fora exterior sobre indiv-duos e grupos que os determina, mas o prprio resultado de processos interativos.
A sociologia do alemo Max Weber (1864-1920) tem como
premissa a idia de que a sociedade no apenas uma coisa
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exterior e coercitiva que determina o comportamento dos
indivduos, mas sim o resultado de uma enorme e inesgotvel
nuvem de interaes interindividuais. A sociedade para Weber
no aquilo que pesa sobre o indivduo, mas aquilo que se vei-
cula entre eles. As conseqncias dessa viso para a sociolo-
gia da educao, claro, sero bastante significativas.12
Rodrigues13 chama a ateno para a concepo diferen-ciada que Weber prope, considerando-se os determinis-mos de Marx e Durkheim, embora no tenha produzido uma teoria sociolgica sobre a educao.
Para Weber, segundo Rodrigues, os homens vem o mundo no qual se encontram inseridos a partir de seus valores. So os valores compartilhados que so internaliza-dos pelos indivduos, ou seja, so subjetivados de formas distintas, de acordo com o processo de interao em que os indivduos esto inseridos. O mesmo meio social pode ter significados diferenciados para os indivduos e, por-tanto, pode originar diferentes formas de agir, na medida em que estes agem conforme assimilam os elementos cul-turais e tambm conforme os diferentes tipos de raciona-lidade empregados. A realidade concebida por Weber, ento, como o encontro entre os homens e os valores aos quais eles se vinculam e os quais articulam de modos dis-tintos no plano subjetivo. Assim, a sociedade no se cons-titui em um bloco, mas em uma rede em que se encontram presentes interrelaes. Podemos verificar ento que, em
Weber, os valores que internalizamos so fora motriz de nosso agir; logo, agimos em funo dos valores que inter-nalizamos em nossa interao com o outro.14
[...] por ao (incluindo a omisso e a tolerncia) entende-
mos sempre um comportamento compreensvel com relao a
objetos, isto , um comportamento especificado ou caracteri-
zado por um sentido (subjetivo) real ou mental, mesmo
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que ele no seja quase percebido. [...] A ao que especifica-
mente tem importncia para a sociologia compreensiva , em
particular, um comportamento que:
I. est relacionado ao sentido subjetivo pensado daquele que
age com referncia ao comportamento de outros; 2. est co-
determinado no seu decurso por esta referncia significativa
e, portanto, 3. pode ser explicado pela compreenso a partir
deste sentido mental (subjetivamente).15
Segundo Rodrigues16, agir em sociedade envolve sem-pre algum grau de racionalidade por parte de quem age, e esta mesma racionalidade envolve a interao com outro indivduo, j que em sociedade estamos sempre em intera-o. Podemos afirmar ento que h uma relao de inter-dependncia entre racionalidades, a racionalidade de cada um se encontra referida racionalidade de outros.
Tipos de ao social
Em Weber, observamos que a concretude das normas e das regras sociais se realiza somente quando essas normas e regras encontram-se presentes em cada indivduo pelo processo de interao e internalizao e manifestam-se em cada um sob a forma de motivao. Cada pessoa age em sociedade tendo como ponto de referncia um motivo, que pode ser determinado pela tradio, pelo afeto e pela racio-nalidade. Nesse ponto de sua teoria, Weber estabelece os tipos de ao social que se realizam na vida em sociedade, pois o objetivo que se expressa na ao social o que nos permite desvendar seu prprio sentido, uma vez que cada indivduo acaba por considerar no seu agir a resposta ou a reao de outros indivduos. So quatro os tipos de ao social estabelecidos por Weber:
Ao social tradicional a ao que determinada por um costume, por um hbito, na qual o ator social
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obedece a reflexos que so enraizados de longa prtica.
a que determinada por hbitos, costumes e cren-as e que acaba por ser transformada em uma segunda natureza. Nesse tipo de ao social, reproduzem-se padres sociais que so consagrados pelos costumes e pelas tradies observadas na convivncia social.Ao social afetiva Tem como caracterstica fundamen-tal ser emotiva, ser determinada por afetos ou at mesmo por estados sentimentais. Pode ser uma ao reativa de carter emocional do ator social em dada circunstncia, em dado instante de sua vida, no sendo determinada por um objetivo ou por um sistema de valores.Ao social racional com relao a valores Tem como caracterstica fundamental ser a ao que deter-minada pela crena consciente em um dado valor que considerado significativo por parte do ator social. De
certa forma, o ator social age em conformidade com seus princpios morais e ticos e acaba por racionali-zar o agir em conformidade com esses princpios.Ao social com relao a fins Tem como caracterstica bsica ser ao que o homem realiza enquanto ator social, tendo como referncia ou motivao seus objetivos e con-siderando os meios de que dispe para atingi-los.
Em nosso viver em sociedade, enquanto atores sociais, no exerccio de nossos papis sociais, encontramo-nos diante dessas formas de agir, ou seja, essas aes sociais fun-cionam como foras motivacionais de nosso agir cotidiano.
Weber um autor que procurou investigar, interpre-tar e analisar a sociedade moderna, complexa, a sociedade capitalista, portanto, que se constitui em uma sociedade que se pauta pela racionalidade. Weber ir nos falar de uma modernidade desumanizante17, na qual prevalece o que denomina de desencantamento do mundo.
O homem da modernidade racional um homem
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desencantado, pois vive no mundo do imprio da lei e da razo e educar nesse mundo tem aspectos diferenciados em relao a educar antes dessa transformao. No entanto, afirma Carvalho18:
Se o destino do homem enfrentar a vida racionalizada, isto
exige uma virilidade tamanha para podermos aceitar, sem
iluses polticas, religiosas, filosficas, educacionais, o car-
ter inelutvel desse processo. Significa aceitarmos tudo o que
h de mais terrvel e doloroso, como tambm de mais alegre e
exuberante na existncia. Aqueles que concebem a metafsica,
isto , que constroem mundos para alm desse, que profeti-
zam e esperam a superao do espetculo da finitude, despre-
zando o que ocorre aqui e agora, supondo existir outra vida,
igualam-se ao homem da ordem: o homem burocrtico.
Carismtica e dionisaca, portanto, a educao que afirma
sem reserva, o fatum, que aceita que ele se afirme por meio do
homem que espelha o mundo, que traduz a vida, que nos d
chance de formar a personalidade.
Segundo o ponto de vista de Max Weber, se possvel construir
uma ao educativa na modernidade, ela deve estar fundada
num questionamento permanente de suas prprias condies.
A educao, para Weber, no contexto de uma socie-dade marcadamente racionalizada, estaria em estreita rela-o com a estratificao social, com meios de distino e
de obteno de certas honras que envolvem o poder e o dinheiro. No modelo ideal weberiano a educao , con-forme o caso, socialmente dirigida a trs tipos de finali-dades: despertar do carisma, preparar o aluno para uma conduta de vida e transmitir conhecimento especializado. O primeiro tipo de educao do carisma no se apli-caria s pessoas normais, no se constituindo, portanto, numa pedagogia, pois no se pode ensinar o carisma, no se pode preparar para o carisma, que pode ser concebido
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como um dom pessoal. O segundo tipo conduta de vida Weber denomina de pedagogia do cultivo, voltada a formar o homem culto.19
Ao segundo tipo, Weber chama de pedagogia do cultivo.
Ela procura formar um tipo de homem que seja culto, onde o
ideal de cultura depende da camada social para a qual o indi-
vduo est sendo preparado, e que implica em prepar-lo para
certos tipos de comportamento interior (ou seja, para a refle-
xividade) e exterior (ou seja, um determinado tipo de com-
portamento social). Tal processo educacional assumia o aspecto
de uma qualificao cultural, no sentido de uma educao geral,
e destinava-se ao mesmo tempo, composio de determinado
grupo de status (sacerdotes, cavaleiros, letrados, intelectuais humanistas, etc.), e composio do aparato administrativo
tpico das formas tradicionais de dominao poltica.20
Podemos verificar que o segundo tipo envolve uma
educao para a qualificao cultural, em que uma educa-o geral parece ser prioritria. Quanto ao terceiro tipo de educao, denominado por Weber, segundo Rodrigues21, de pedagogia do treinamento, envolvendo uma racionalizao da vida social e a prpria burocratizao do aparato pblico de dominao de carter poltico. Esse tipo de educao supe um preparo especializado no sentido de transformar o indivduo num tcnico, num perito. Entendemos que a pedagogia do treinamento predominante no contexto da Modernidade, ao mesmo tempo em que uma pedagogia que envolve a ascenso social e a obteno de status privado.
Weber via na pedagogia do treinamento, imposta pela racio-
nalizao da vida, o fim da possibilidade de desenvolver o
talento do ser humano, em nome da preparao para a obten-
o de poder e dinheiro. A racionalizao inexorvel, inven-
cvel, e a educao especializada, a lgica do treinamento,
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para Weber, tambm . Para ele, no h nada que se possa
fazer a respeito.22
Nesse sentido, encontramos em Weber um certo pessi mismo com relao sociedade moderna. Tambm possvel perceber que na sua viso imprescindvel o enfrentamento do mundo burocrtico, no qual se encon-tra presente a racionalidade, para que a vida e o mundo social no deixem de ser uma possibilidade. Para Weber, essa deveria ser a responsabilidade da ao educativa.23
leitura complementar
O desenvolvimento do diploma universitrio das esco-las de comrcio e engenharia, e o clamor universal pela criao dos certificados educacionais em todos os campos
levam formao de uma camada privilegiada nos escri-trios e reparties. Esses certificados apiam as preten-ses de seus portadores de intermatrimnios com famlias notveis (nos escritrios comerciais as pessoas esperam naturalmente a preferncia em relao filha do chefe), as
pretenses de serem admitidos em crculos que seguem cdigos de honra, pretenses de remunerao respeit-veis em vez da remunerao pelo trabalho realizado, pre-tenses de progresso garantido e de penses na velhice e, acima de tudo, pretenses de monopolizar cargos social e economicamente vantajosos. Quando ouvimos de todos os lados a exigncia de uma adoo de currculos regulares e exames especiais, a razo para isso , decerto, no uma
sede de educao surgida subitamente, mas o desejo de restringir a oferta dessas posies e de sua monopolizao
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pelos donos dos ttulos educacionais. Como a educao necessria aquisio do ttulo exige despesas consider-veis e um perodo de espera de remunerao plena, essa luta significa um recuo para o talento (carisma) em favor
da riqueza, pois os custos intelectuais dos certificados
de educao so sempre baixos, e com o crescente volume desses certificados os custos inte lectuais no aumentam,
mas decrescem [...]. Por trs de todas as discusses atuais sobe as bases do sistema educacional, se oculta em algum aspecto mais decisivo a luta dos especialistas contra o tipo mais antigo de homem culto.
Essa luta determinada pela expanso irresistvel da burocratizao de todas as relaes pblicas e privadas de autoridade e pela crescente importncia dos peritos e do conhecimento especializado. Essa luta est presente em todas as questes culturais ntimas
Fonte: Weber, citado por Rodrigues, 2007, p. 68.
indicao cultural
RODRIGUES, A. T. Sociologia da educao. So Paulo:
Lamparina, 2007.
Como dica de estudo, sugerimos a leitura dessa obra, na
qual encontramos elementos fundamentais para compreen-
dermos, de forma mais clara e abrangente, a relao entre
as teorias dos clssicos da sociologia, suas concepes
acerca da educao no contexto das sociedades e a prpria
sociologia da educao.
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atividades
Como atividade de estudo, procure fazer um quadro com-1. parativo envolvendo as concepes da relao entre indiv-duo e sociedade encontradas em Marx, Durkheim e Weber, bem como as concepes de educao. Voc ver que, feito
esse quadro comparativo, identificar elementos fundamen-tais das teorias dos autores mencionados neste captulo.
A principal questo sociolgica no contexto da atualidade :2. a relao entre indivduo e sociedade.a. a relao entre indivduos e grupos.b. a relao entre sociedade e capitalismo.c. a relao entre indivduo e Estado.d. Nenhuma das alternativas anteriores.e.
Os objetos de investigao sociolgica em Marx, Durkheim 3. e Weber, respectivamente, so:
classes sociais, fatos sociais e ao social.a. ao social, fatos sociais e classes sociais.b. fatos sociais, classes sociais e ao social.c. ao social, classes sociais e fatos sociais.d. Nenhuma das alternativas anteriores.e.
Em Marx, considerando-se a relao entre infra e superes-4. trutura, a educao encontra-se na esfera:
infra-estrutural da sociedade.a. superestrutural da sociedade.b. econmica da sociedade.c. poltica da sociedade.d. Nenhuma das alternativas anteriores.e.
( 3 )
educao enquanto instncia conservadora
( )
vimos anteriormente os tericos clssicos da sociologia e suas concepes acerca da educao. Agora vamos trabalhar com a educao em seu aspecto conser-vador e em seu aspecto de libertao, de transformao da realidade social vivenciada por indivduos e grupos.
Podemos questionar: em que aspecto as concepes con-
servadoras da educao contribuem para a manuteno
da ordem vigente no contexto da sociedade brasileira?
Maria Clara Ramos Nery
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(3.1)
tendncias conservadoras
A partir de Durkheim, teve origem uma srie de teorias pedaggicas, na medida em que a concepo sociolgica de educao de carter funcionalista influiu em muitas das
abordagens sobre a educao no contexto da denominada pedagogia moderna. So chamadas de conservadoras, porque tm como fundamento a noo de que a sociedade uma soma de indivduos que devero ser preparados para ser adequados vida social por meio do processo educativo. So conservadoras tambm porque no concebem a trans-formao do mundo atual, ou seja, no envolvem a trans-formao da sociedade capitalista, com suas contradies e desigualdades, mas, sim, pregam sua reproduo a par-tir da adequao dos indivduos ao sistema, vida social1. So trs, segundo Meksenas2, as tendncias conservadoras que merecem destaque na contemporaneidade: a pedago-gia tradicional, a pedagogia nova e a pedagogia tecnicista.
Algumas palavras sobre a pedagogia tradicional
Na pedagogia tradicional, podemos considerar que o indi-vduo um assimilador que deve ser adaptado ao con-texto social que o envolve. O pressuposto inicial que o indivduo deve assimilar os conhecimentos acumulados no decorrer do desenvolvimento do homem em seu estar no mundo. Afirma Meksenas3: Parte do princpio de que a melhor forma de adaptar e preparar o indivduo para a vida em sociedade fazer com que assimile uma srie de conhecimentos referentes cultura e cincia, acumulados no decorrer do desenvolvimento da civilizao humana.
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O aluno seria nesse contexto um simples receptor de infor-maes, que lhe permitam o enriquecimento de sua cultura individual, que lhe possibilitem desenvolver funes teis no contexto da sociedade. Se recobrarmos Weber, veremos que era justamente isto que ele condenava, se assim pode-mos dizer no contexto das sociedades modernas, o prprio surgimento de cultos especialistas.
Aqui estamos diante de uma pedagogia que se pauta pela simples transmisso de conhecimentos acumulados historicamente. Nesse aspecto, a figura do professor vai
assumir papel central, na medida em que o grande trans-missor de informaes que so necessrias aos alunos. Ele o dono de um saber acumulado que deve transmitir. Ele, professor, portanto, detm todo o poder, cabendo ao aluno ouvi-lo silenciosamente, para poder enriquecer sua cul-tura individual. Aquele que da melhor forma apreender as informaes fornecidas encontrar-se- apto para concorrer no mercado de trabalho, bem como estar mais bem adap-tado ao sistema, podendo galgar os mais promissores pos-tos na escala social. Podemos atestar aqui a concepo de que a ascenso social est intimamente ligada educao, mas esta mesma ascenso social no se constitui em uma obra coletiva, e, sim, em uma obra de carter individual, pois depende fundamentalmente do esforo individual4.
Estamos diante do conhecimento enciclopdico. Se-gundo Meksenas5, o professor o centro do processo edu-cativo, pois ele a figurachave na transmisso do saber
cientfico. A aula deve, portanto, girar em torno da figura
do professor, que deve ser tambm a autoridade respons-vel pelo bom desempenho do ensino e da ordem dentro da sala de aula. Ao aluno cabe apenas acatar as decises sem question-las.
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Que capacidade crtica desenvolve o aluno para a com-
preenso de seu estar no mundo? Que questionamentos
da realidade social vivenciada pode realizar sendo
apenas um receptor de informaes?
So questes que devemos fazer quando nos deparamos
com a pedagogia tradicional? Embora possamos pensar
que no haja mais lugar para esse tipo de pedagogia no
contexto de uma sociedade capitalista, marcadamente
concorrencial, e no prprio contexto de uma sociedade
informacional, ser que esse tipo de pedagogia tem
decretado o seu final, a sua inadequao?
Entendemos que no, apesar de em muitos cursos ainda existir esse modo de pensar e de muitos educadores ainda professarem essa forma de agir pedaggico.
Algumas palavras sobre a pedagogia nova
Na pedagogia tradicional, verificamos que a melhor forma
de adequar o indivduo para a vida em sociedade fazer com que ele assimile os conhecimentos referentes aos conhecimentos acumulados no desenvolvimento da civi-lizao. J na pedagogia nova o que temos como princi-pal pressuposto fazer com que, em vez de acumular os conhecimentos produzidos pela humanidade, ele aprenda a maneira como esses conhecimentos se criam.
O aspecto fundamental no contexto da pedagogia nova encontra-se no fato de que o indivduo deve conhecer as formas e os mtodos que lhe permitam chegar s informa-es produzidas e acumuladas pela civilizao humana. Nessa forma de pedagogia, o objetivo fundamental diz respeito ento ao ato de ensinar o aluno a produzir conhe-cimento e no a simplesmente transmiti-lo.
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Se o objetivo no transmitir conhecimento, mas ensinar o
aluno a produzi-lo, ento a figura do aluno deve ser to impor-
tante quanto a do professor. Este passa a se ver como orientador.
A aula expositiva no se faz necessria. Mais importantes que
a exposio do professor se tornam os trabalhos em grupo, a
dinmica, o debate, pois todas essas tcnicas levam valoriza-
o da experincia, da prtica, enfim, do aprender fazendo.6
Podemos perceber que encontramos aqui uma forma mais dinmica do prprio processo de ensino-aprendi-zagem, na medida em que o aluno acaba por possuir um papel mais ativo, mais construtor, diramos assim, de sua aprendizagem sob a orientao do professor. H o reconhe-cimento do papel ativo do aluno na absoro das formas e dos mtodos que lhe permitam chegar s informaes.
No contexto da pedagogia nova, a relao professor- aluno, no que concerne ao processo de ensino-aprendizagem, teria um cunho mais democrtico. Mas essa democracia que se supe existente acaba por no se referir, segundo Meksenas7, igualdade de oportunidade para todos, ou seja, no envolve o questionamento da realidade presente nas sociedades capitalistas marcadamente desiguais, pois a democracia que se faz envolve a liberdade de ascender socialmente e a manuteno da competio, que no ques-tionada, mantendose de forma camuflada o princpio da
adaptao do indivduo sociedade, sem que seja constru-da uma conscincia crtica que leve sua transformao.
Algumas palavras sobre a pedagogia tecnicista
Uma outra pedagogia de carter conservador a peda-gogia tecnicista. Ela est diretamente relacionada com os determinantes de mercado da sociedade capitalista e tem como pressuposto o fato de que o indivduo encontra-se adaptado sociedade, recebendo informaes a partir dos
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determinantes de estmulo-resposta. As informaes se constituiriam no estmulo, ao qual deve o indivduo apre-sentar uma resposta adequada8.
Nesse tipo de pedagogia, fica a cargo dos especialistas
da educao estabelecer e elaborar os estmulos e os pro-gramas de ensino. O papel do professor se modifica, j que
fica restrito aplicao dos estmulos e dos programas em
sala de aula. O professor agora tem o papel de ser o instru-tor de ensino, o prprio treinador, como observa Meksenas9,
O professor-instrutor representa o elemento que treina ou adestra o aluno a realizar com xito uma tarefa qualquer. Podemos verificar ento que, no contexto da sociedade capi-talista, de acordo com as prprias necessidades do sistema, o papel do professor foi se alterando paulatinamente.
A pedagogia tecnicista tem como objetivo principal o rpido treinamento do aluno para sua tambm rpida pro-fissionalizao. Desse modo,
As aulas passam a se organizar atravs de recursos audiovi-
suais, textos programados ou livros didticos que se estrutu-
ram no eixo pergunta-resposta. Ao aluno no cabe o direito ao
debate ou questionamento. Apenas reao aos estmulos que
o instrutor lhe determinar. Nesse contexto no se valorizam
as aulas expositivas (pedagogia tradicional) nem os trabalhos
em grupo (pedagogia nova), ao contrrio, o aluno se v mui-
tas vezes sozinho diante de um texto que dever seguir com
perguntas e respostas. Nem instrutor nem aluno debatem.10
Pela afirmao de Meksenas, podemos verificar que
no encontramos a forma dialgica do processo de ensino-aprendizagem. Essa ausncia do dilogo fator obstaculi-zador do advento de uma conscincia crtica que permita a ao transformadora da sociedade. Trata-se de uma ten-dncia pedaggica conservadora, como so as tendncias
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anteriores que vimos. Em todas o objetivo primordial a adaptao e a adequao do indivduo sociedade, mas da mesma forma como indivduos e grupos devem adap-tar-se sociedade, eles reproduzem esta mesma sociedade em suas condutas, em suas vises de mundo e de homem em seu ato de viver coletivamente. Mantm-se a ordem estabelecida, sem questionamentos e sem transformaes radicais em sua estrutura, permancendo, assim, a configu-rao social que se alicera na desigualdade e na excluso, como o contexto da sociedade capitalista.
(3.2)
tendncias pedaggicas conservadoras no contexto da educao brasileira
Na escola brasileira, segundo Meksenas11, considerando-se as prticas pedaggicas, no podemos encontrar uma das trs tendncias aplicadas em seu sentido puro, exclusiva-mente. Encontramos, sim, um universo hbrido que envolve as trs tendncias pedaggicas modernas, na medida em que historicamente no aplicamos um dos modelos em sua totalidade.
Examinando esse aspecto, questiona Rodrigues12:
Como compreender os debates e conflitos sociais que envol-
vem a educao contempornea sem levar em conta a confi-
gurao atual dos conflitos em torno da economia e do Estado
capitalista? Como entender a escola e o ensino atuais sem
entender o confronto hoje colocado entre os interesses priva-
dos e a regulamentao do Estado?
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Responder a essas questes envolve a construo de uma conscincia crtica acerca da realidade social viven-ciada. Afirma ainda Rodrigues13:
As concepes de mundo, as idias e os valores que as pessoas
compartilham entre si e que ensinam a seus filhos e alunos
no so ddivas do cu; so construdas na teia cotidiana de
relaes e interaes. So invenes do homem, so constru-
es sociais. E so sempre resultado dos conflitos e dos con-
sensos que se estabelecem na sociedade, so fruto das relaes
de poder e da violncia (fsica ou simblica) que alguns gru-
pos ou classes so capazes de exercer sobre outros.
O processo de ensino-aprendizagem com todos aque-les que nele se encontram envolvidos no pode ficar imune
aos questionamentos da ordem social. por esse aspecto que podemos conceber a educao brasileira ainda como conservadora, repetimos, na medida em que nas salas de aula as trs tendncias pedaggicas encontram-se mescla-das e, portanto, em pleno sculo XXI, no temos ainda o verdadeiramente novo na educao.
leitura complementar
Podemos afirmar que a pedagogia tradicional sempre foi o
eixo central da escola brasileira, desde os tempos das pri-meiras escolas leigas e pblicas que se estabeleceram por ocasio da vinda de D. Joo VI para o Brasil em 1808. Nas
dcadas de 1920 e 1930, o cenrio cultural e educacional do Brasil passa por mudanas significativas. Dos vrios
acontecimentos que mudaram o rumo de nossa educao, merece destaque a criao, em 1924, da ABE (Associa1o Brasileira de Educao). Nessa associao aparece um
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grupo de educadores liderados pelo socilogo Fernando de Azevedo, que se articulam em torno do Movimento Renovador do Ensino. Eles sero os primeiros porta-vozes da pedagogia nova no Brasil. Com isso, podemos afirmar que nas dcadas de 1920/1930 surgem no pas as
primeiras idias da pedagogia nova. Entretanto, por no se conseguirem viabilizar, as propostas dessa pedagogia sero pouco adotadas. Apenas recentemente comeam a ser mais debatidas entre ns e passam, junto com a peda-gogia tradicional, a fazer parte das prticas escolares.
A pedagogia tecnicista comea a ser muito difundida e at se torna um dos pilares da proposta metodolgica para o ensino oficial brasileiro no perodo subseqente a 1970.
Com a instaurao do regime militar em 1964 a tnica que tecnocratas e generais procuram dar ao ensino vai na linha profissionalizante da modeobra: capacitar trabalhado-res de modo rpido. Na verdade, a maior preocupao dos introdutores da tendncia tecnicista no Brasil era evitar ao mximo que a escola fosse local de debate e questionamento da vida nacional e, nesse contexto poltico, a proposta tecni-cista parecia ser a ideal
Fonte: MEKSENAS, 2005, p. 55-56.
indicao cultural
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia. So Paulo: Paz e Terra, 1997.
Sugerimos a leitura desse livro de Paulo Freire, pois nos permite compreender as dimenses reais do ato de ensi-nar, que no pode estar excludo dos limites da disciplina de Sociologia da Educao.
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atividades
Procure fazer um quadro comparativo entre as trs tendn-1. cias pedaggicas da educao, envolvendo o item concepo de educao. Voc ver que assim ser possvel identificar,
de forma clara, a diferena entre as trs tendncias pedag-gicas presentes no contexto da educao brasileira.
Na pedagogia tradicional, o aluno basicamente um:2. assimilador.a. transmissor.b. receptor.c. questionador.d. Nenhuma das alternativas anteriores.e.
No contexto da pedagogia nova, o aluno deve:3. transmitir os conhecimentos acumulados.a. aprender a maneira como esses conhecimentos acumu-b. lados se criam.receber ensinamentos da forma como os conhecimentos c. so transmitidos.questionar criticamente a realidade social vivenciada.d. Nenhuma das alternativas anteriores. e.
A pedagogia tecnicista se encontra diretamente relacio-4. nada com:
os determinantes de mercado da sociedade capitalista.a. a escola nova e suas formas de transmisso de conheci-b. mentos.a escola tradicional e suas formas de transmisso de c. conhecimentos.a escola progressista e suas formas de transmisso de d. conhecimentos.Nenhuma das alternativas anteriores.e.
( 4 )
tendncia progressista da educao e as determinaes da
estrutura social sobre a educao
( )
no captulo anterior vimos as tendncias con-servadoras da educao. Nesta parte de nossa abordagem, trabalharemos fundamentalmente com dois aspectos rele-vantes: as tendncias progressistas da educao e as deter-minaes da estrutura social sobre a educao.
Uma questo aqui se faz importante: por que, no
contexto da realidade brasileira, no teve impulso e
desenvolvimento uma concepo de educao de
carter mais progressista?
Maria Clara Ramos Nery
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A resposta adequada a essa questo nos permite com-preender em que medida as tendncias educacionais ou pedaggicas no se encontram refratrias aos determinan-tes estruturais que se apresentam no contexto social em que esto envolvidas.
Como vimos anteriormente, principalmente quando trouxemos a abordagem de Marx, a partir da incorpora-o dos pressupostos marxistas que a pedagogia assumir concepes mais crticas a respeito do processo educativo, do processo de ensino-aprendizagem e sua relao com a sociedade. Essa mudana notadamente comea a ocorrer a partir da dcada de 1970, perodo em que muitos soci-logos procuraram desenvolver concepes mais crticas acerca da educao e do prprio papel desta na sociedade.
A sociedade capitalista marcadamente desigual e excludente, na medida em que nela se encontra presente o prprio processo da luta de classes, em que temos uma relao desigual entre capital e trabalho. Desigual porque, enquanto o capital, representado pela burguesia, dona dos meios de produo, tenta conservar seu status quo, seus privilgios, o trabalho, representado pela classe trabalha-dora, detentora unicamente de sua fora de trabalho, tenta transformar sua realidade, que sofrida, na medida em que sofre as contradies do modo de produo capitalista. Nesse sentido, a relao entre essas classes notadamente antagnica e desigual.
Considerando esses aspectos e verificando que a escola
antes de tudo uma instituio social que no refrat-ria ao que se encontra presente no contexto social mais amplo, podemos depreender que a desigualdade presente na estrutura social perpassa os espaos da escola, pois a classe que detm o poder econmico no contexto das sociedades detm tambm o poder ideolgico, jurdico e
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poltico desta mesma sociedade. Considerando a relao entre infra e superestrutura social, podemos observar que a escola, sendo superestrutural, reproduz as relaes pre-sentes no contexto da infra-estrutura e exerce tambm o papel de legitimadora destas mesmas relaes, que so desiguais. Ocorre, porm, que todo sistema origina em si sua fora contrria, o que se constitui em um aspecto dia-ltico presente na prpria vida tudo est pleno de seu contrrio e, assim, possvel construir concepes e vises de homem e de mundo de carter mais progressista dentro do prprio ambiente escolar, no contexto das relaes coti-dianas, ou seja, no mundo da vida.
A escola no necessariamente deve reproduzir as rela-es presentes na infra estrutura; enquanto instncia supe-restrutural que , ela pode tambm ser a fora contrria que, sendo dinmica, permita uma anlise crtica da rea-lidade social vivenciada por indivduos e grupos e, assim, levar aos caminhos que possibilitem transformaes nos pro cessos de desigualdades sociais presentes na sociedade, principalmente por meio do processo de conscientizao do aluno acerca de sua prpria realidade social vivenciada. A escola no pode resumir-se a um papel meramente repro-dutor da ordem vigente, ela tambm fonte ou fora motriz de concepes e vises do processo de ensino-aprendiza-gem mais progressistas que levariam transformao da sociedade e, conseqentemente, da prpria escola.
Na escola enquanto instituio social, que reproduz as contradies presentes no contexto da sociedade mais ampla, encontramos, por outro lado, segundo Meksenas1, quando se refere a Georges Snyders, foras progressistas que podem estar presentes nas resistncias ao sistema por parte dos alunos, na presena de professores progressis-tas e questionadores da ordem vigente, com uma nova
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concepo de mundo e de homem para alm do prprio sistema. Encontramos na escola ento a presso dos deno-minados movimentos populares. A escola, por ser uma insti-tuio social, no refratria ao que se passa na sociedade; portanto, tambm incorpora em seu interior os movimentos que buscam questionar e transformar a ordem instituda.
Devemos compreender que o processo educativo pode ter carter conservador ou inovador, dependendo do con-texto histrico e social no qual est contido. A educao se constitui enquanto uma verdadeira tcnica social, como uma metodologia que tem por finalidade influenciar o com-portamento humano, visando adaptao do homem aos padres institudos de interao e de organizao social. A educao como processo social deve ser aberta, democr-tica, para preparar ou equipar as pessoas ou grupos para a mudana social, isto , para o aperfeioamento progres-sivo do homem e a construo de um mundo melhor. Na atualidade, no contexto de uma sociedade ps-moderna, em que certezas caram por terra, a escola pode ser um espao de resistncia, favorecendo a reflexo e a compreen-so acerca de uma realidade social complexa, globalizada e marcadamente excludente.2
(4.1)
concepo libertadora da educao
A pedagogia libertadora, como denominada essa nova concepo da educao, questiona drasticamente as formas conservadoras de educao. De acordo com os pressupostos
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dessa nova pedagogia, h nessas formas de educao o processo de domesticao dos alunos, no sentido de adap-t-los ao sistema, fazendo com que entendam sua condi-o scio-histrica como natural e no como construo humana, como produto da realizao do homem em seu estar no mundo. So assim porque se pautam pela trans-misso do conhecimento, no trabalhando com elementos de cunho mais questionador da ordem social, poltica, eco-nmica e cultural na qual os alunos esto inseridos.
Em outras palavras, a pedagogia libertadora no est preo-
cupada apenas com a cultura individual do aluno, nem em
modelar o seu comportamento para viver na sociedade capi-
talista, ao contrrio: a proposta da pedagogia libertadora
partir dos problemas enfrentados pelo aluno no seu cotidiano
para que ele possa compreender criticamente a sua classe
social de origem de modo a ter uma prtica transformadora
da realidade que o cerca. Em resumo, a preocupao central
aprender a ler nas desigualdades do capitalismo os caminhos
que possam levar alterao dessa mesma sociedade. Nesse
sentido, a pedagogia libertadora progressista: coloca como
eixo central a relao educao-poltica.3
Podemos verificar a diferena entre a forma de pen-sar a educao no contexto da pedagogia libertadora e as outras formas conservadoras. Entender de forma crtica o seu cotidiano permite ao aluno a construo de uma cons-cincia crtica e questionadora acerca da realidade na qual ele vive. Se analisarmos bem a sociedade brasileira, pode-mos entender que a educao libertadora no nasceu no mbito da instituio escola, mas fora dela. Nasceu no contexto dos movimentos sociais em sua luta, nasceu no con-texto da busca por melhores condies de trabalho da classe trabalhadora. Nesse contexto, a pedagogia libertadora
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aparece como a pedagogia dos oprimidos: pessoas da classe trabalhadora que foram excludas prematuramente da escola. No por acaso, essa tendncia nasce da prtica de alfabetizao de adultos. Nessa citao de Meksenas4, ele demonstra claramente que a pedagogia libertadora tem sua nascente nos segmentos excludos dos bancos escolares em funo de uma entrada prematura no mercado de trabalho.
(4.2)
determinaes da estrutura social sobre a educao
Com base no que vimos anteriormente sobre os pressupos-tos de uma educao libertadora, podemos perguntar:
O que ocorre no contexto de nossa sociedade que faz com
que a educao no assuma um carter mais progressista
ou libertador?
Pensar nesse aspecto pensar justamente a questo da estrutura social, pois, repetimos, a escola e o prprio processo educativo no se encontram imunes s determi-naes presentes na estrutura social, a qual se constitui no conjunto das partes de um todo que esto concatena-das, encadeadas e que permitem a formao de um todo.
Dito de outro modo, estrutura social a totalidade do sta-tus existente em um determinado grupo social ou em uma sociedade. Pelo que podemos observar, a estrutura social envolve ento as partes que so constitutivas de uma totali-dade. Nesse sentido, toda estrutura social envolve elemen-tos econmicos, ideolgicos, jurdicos e polticos, formando uma totalidade.5
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Cada um dos participantes de uma estrutura desempenha
o papel correspondente posio social que ocupa. O con-
junto de todas as aes que so realizadas quando os mem-
bros de um grupo desempenham seus papis sociais compe
a organizao social. Esta corresponde, portanto, ao funcio-
namento do organismo social.6
Encontramos a dois conceitos fundamentais estrutura social e organizao social, sendo que a estrutura envolve os atores sociais no exerccio de seus papis sociais e a orga-nizao social, que envolve o prprio funcionamento do denominado organismo social. Podemos concluir, ainda, que a estrutura social acaba por nos dar uma idia, uma viso de esttica o que est presente; j a organizao social nos d uma idia de dinmica, na medida em que nela se encon-tram envolvidos os atores sociais e as relaes que estabele-cem. A escola um espao de carter pluridimensional no qual se encontram posicionados os atores sociais.7
Pensar na estrutura social tambm pensar no modo de produo que constitui a estrutura. importante que retomemos a concepo marxista acerca da estrutura social. Temos a de forma clara a formao social composta da infra e da superestrutura social. importante que vejamos a relao entre essas duas foras que formam a socie-dade. A infra-estrutura, em que se encontram as bases eco-nmicas da sociedade, as relaes de produo, determina a superestrutura isto , a forma como os homens se orga-nizam para produzir os bens de que necessitam (modo de produo) a base infra-estrutural de toda e qualquer sociedade , e a superestrutura, por sua vez, composta das instncias ideolgica, jurdica e poltica