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X Encontro Nacional da Anpur | ST2, 5 | Re-configurações territoriais: re-estruturações econômicas e sócio-espaciais 1 Transportabilidade dos Serviços e Local de Incidência Tributária: Impactos na Arrecadação de Belo Horizonte Ana Luiza Nabuco Palhano Prefeitura de Belo Horizonte 1 - Introdução Os municípios brasileiros podem cobrar três impostos, que são, o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), o Imposto Sobre a Transmissão de Bens Imóveis por Ato Oneroso “Inter-Vivos” (ITBI) e o Imposto Sobre Serviço de Qualquer Natureza (ISSQN), também conhecido como Imposto Sobre Serviço. Dentre estes, o ISSQN é, simultânea e paradoxalmente, o tributo que oferece maiores possibilidades de cobranças - especialmente se considerarmos o crescimento do setor terciário da economia nacional -, mas também uma fonte de receita própria insegura para os municípios - tendo em vista os inúmeros questionamentos em torno de sua cobrança. O ISSQN é, de fato, um imposto polêmico. Em parte, pelo fato de ser relativamente jovem, o que implica na existência de procedimentos ainda não totalmente consolidados e lacunas na legislação. Mas esta não é a única justificativa. Trata-se de um imposto sujeito a regras muito complexas, seja com relação ao fato gerador, ao local de incidência, às inúmeras alíquotas aplicáveis ou à base de cálculo. Isto sem falar nos casos de isenção, imuni- dade e não incidência. Tal sofisticação dificulta a atuação dos Fiscos Municipais e tem gerado um enorme volume, pelo menos na cidade de Belo Horizonte, de recursos administrativos e judiciais impetrados por contribuintes insatisfeitos com os lançamentos efetuados. Um dos principais questionamentos atuais diz respeito ao local da incidência tributária, se é no município da sede da empresa ou naquele da prestação do serviço. Possíveis mudanças na concepção do local de incidência do ISSQN para algumas atividades, caso venham a tornar-se definitivas, irão gerar uma redistribuição intermunicipal dos valores arrecadados, aumentando o grau de incerteza quanto ao nível de arrecadação municipal. Este trabalho surgiu para construir metodologia que permita calcular o efeito que um novo entendimento quanto ao local em que é devido o ISSQN terá sobre as receitas próprias municipais. 2 - Referencial Teórico: 2.1 – Local de Incidência do ISSQN: O Imposto Sobre Serviços foi criado pela Emenda Constitucional nº 18, de 1º de dezembro de 1965, e implantado em 1966, a partir da instituição do Código Tributário Nacional (CTN). Em 31 de dezembro de 1968, com o Ato Institucional nº 5 em vigor e o Congresso Nacional fechado, foi publicado o Decreto-Lei 406/68, que definiu, nos artigos 8º, 9º, 10 e 12, os quatro

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Transportabilidade dos Serviçose Local de Incidência Tributária:

Impactos na Arrecadação de Belo HorizonteAna Luiza Nabuco PalhanoPrefeitura de Belo Horizonte

1 - Introdução

Os municípios brasileiros podem cobrar três impostos, que são, o ImpostoPredial e Territorial Urbano (IPTU), o Imposto Sobre a Transmissão de BensImóveis por Ato Oneroso “Inter-Vivos” (ITBI) e o Imposto Sobre Serviço deQualquer Natureza (ISSQN), também conhecido como Imposto Sobre Serviço.Dentre estes, o ISSQN é, simultânea e paradoxalmente, o tributo que oferecemaiores possibilidades de cobranças - especialmente se considerarmos ocrescimento do setor terciário da economia nacional -, mas também uma fontede receita própria insegura para os municípios - tendo em vista os inúmerosquestionamentos em torno de sua cobrança.

O ISSQN é, de fato, um imposto polêmico. Em parte, pelo fato de serrelativamente jovem, o que implica na existência de procedimentos ainda nãototalmente consolidados e lacunas na legislação. Mas esta não é a únicajustificativa. Trata-se de um imposto sujeito a regras muito complexas, sejacom relação ao fato gerador, ao local de incidência, às inúmeras alíquotasaplicáveis ou à base de cálculo. Isto sem falar nos casos de isenção, imuni-dade e não incidência. Tal sofisticação dificulta a atuação dos Fiscos Municipaise tem gerado um enorme volume, pelo menos na cidade de Belo Horizonte, derecursos administrativos e judiciais impetrados por contribuintes insatisfeitoscom os lançamentos efetuados. Um dos principais questionamentos atuais dizrespeito ao local da incidência tributária, se é no município da sede daempresa ou naquele da prestação do serviço. Possíveis mudanças naconcepção do local de incidência do ISSQN para algumas atividades, casovenham a tornar-se definitivas, irão gerar uma redistribuição intermunicipaldos valores arrecadados, aumentando o grau de incerteza quanto ao nível dearrecadação municipal. Este trabalho surgiu para construir metodologia quepermita calcular o efeito que um novo entendimento quanto ao local em que édevido o ISSQN terá sobre as receitas próprias municipais.

2 - Referencial Teórico:

2.1 – Local de Incidência do ISSQN:

O Imposto Sobre Serviços foi criado pela Emenda Constitucional nº 18, de 1ºde dezembro de 1965, e implantado em 1966, a partir da instituição do CódigoTributário Nacional (CTN). Em 31 de dezembro de 1968, com o AtoInstitucional nº 5 em vigor e o Congresso Nacional fechado, foi publicado oDecreto-Lei 406/68, que definiu, nos artigos 8º, 9º, 10 e 12, os quatro

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elementos estruturais do Imposto Sobre Serviços. Em primeiro lugar, o fatogerador deste imposto é a prestação dos serviços previstos em uma “Lista deServiços”, anexa ao Decreto-Lei. Segundo, a base de cálculo do imposto é opreço do serviço, ressalvadas as duas situações de prestação de serviços sob aforma de trabalho pessoal do próprio contribuinte, quais sejam, ostrabalhadores autônomos e as sociedades de profissionais liberais1. Terceiro, ocontribuinte do imposto é o prestador do serviço. Por fim, o artigo 12 doDecreto-Lei 406/68 estabelece duas regras para o local de incidência doImposto Sobre Serviços: a regra geral – contida no inciso “a” -, impostodevido no estabelecimento/domicílio do prestador, e as exceções, para obrascivis e exploração rodoviária – incisos “b” e “c” -, imposto devido no local daprestação dos serviços.

A Constituição Federal de 1988 concedeu, ao município, autonomia parainstituir e arrecadar os tributos de sua esfera de competência. Com isto, paraalguns doutrinadores, a regra de incidência contida no inciso “a” do artigo 12do Decreto-Lei 406/68 passou a ser inconstitucional, por desrespeitar o“princípio da territorialidade”, ao permitir que um município institua tributosobre fato ocorrido fora de seu território, quando a sede do estabelecimentoprestador estiver em seu território. Em 1994, decisão proferida pelo SuperiorTribunal de Justiça (STJ) abriu a possibilidade para que fosse questionado,judicialmente, o local onde é cobrado o Imposto Sobre Serviços. Em julho de2000, a Primeira Seção deste Tribunal consolidou regra única para o local deincidência do ISSQN, sempre no local da prestação do serviço, poucoimportando onde está a sede da empresa2.

2.2 – Conceito e características de serviços na literaturaeconômica:

O termo serviço, dada sua complexidade, é utilizado, predominantemente,para indicar uma categoria residual, terciária, que engloba as atividades quenão podem ser enquadradas nos setores primário e secundário (FISHER,1935; CLARK, 1951). Nesse sentido, a definição do setor serviços é incipientee precária e seus atributos são predominantemente negativos, causando certaperplexidade dos teóricos a respeito desta simplificação (LIPIETZ, 1985, apudBERGHOTZ, 1993:806). As principais tentativas de elaboração de umaconceituação mais rigorosa baseiam-se na distinção de serviços e bens -geralmente o bem é entendido como algo tangível e o serviço como intangível(FISHER, 1935; CLARK, 1951; HILL 1977; RIDDLE,1986).

Pode-se observar que, passados tantos anos de discussão acadêmica,não há um conceito definitivo para serviços, embora algumas características 1 Para estes dois casos, o ISSQN devido independe da receita auferida, sendo calculado em função de cada profissionalhabilitado.2 Alguns doutrinadores defendem que a referida decisão do STJ é um desrespeito às regras contidas no Decreto-Lei406/68. Como o objetivo deste trabalho não é defender nenhuma das posições, mas apenas avaliar os impactos destadecisão sobre a arrecadação de Belo Horizonte, não nos prolongaremos nesta discussão. Sobre as alegações defendidas porambas as partes ver, por um lado, CARRAZZA (1979), CASTRO (1999) e DAUD (2001) e, por outro, MACHADO (2000). Há,ainda, aqueles que não compartilham da tese de inconstitucionalidade da alínea “a” do artigo 12 do Decreto-Lei 406/68,reconhecendo a legitimidade de sua aplicabilidade restrita aos serviços com difícil definição do local da prestação (TÔRRES,2002).

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sejam normalmente aceitas como representativas do setor, destacando-se aintangibilidade, inestocabilidade, intransportabilidade, simultaneidade deprodução e consumo e perecibilidade. O que se tem visto, no entanto, é quetais atributos não são inerentes a todos os serviços, dada a heterogeneidadedos mesmos, e que não servem como parâmetros para diferenciá-los dosbens.

Interessa-nos, em particular, a questão da intransportabilidade,defendida por autores como LEMOS (1988), como característica central dosserviços. Por esta linha de raciocínio, o fato de o serviço não ser tangível e tersua produção e consumo simultâneos impede o deslocamento do terciário.Enquanto na produção de manufaturas o produto pode ser produzido em umlugar, vendido em outro e consumido em um terceiro, numa empresa deserviços o processo de prestação de serviço é parte integrante do próprio. Oresultado é que o mercado tem de se concentrar no mesmo espaço e tempoem que a produção do serviço se dá. Os usuários de serviços acorrem ao localda produção, e nunca o contrário.

Não nos parece ser esta, contudo, a atual situação dos serviços. Aoquestionar-se a intransportabilidade, percebe-se que as suas ditas outrasquatro características (simultaneidade de consumo e produção,inestocabilidade, perecibilidade e intangibilidade), não são também próprias detodos os serviços.

Tschetter (1987) afirma que os atributos perecibilidade etransportabilidade não são corretos para diferenciar bens e serviços, poispodem pertencer, ou não, a ambos:

“Em regra, os bens são pensados como sendo mais duráveis, maistransportáveis que os serviços. Porém, programas de softwares para

computadores são tanto duráveis quanto transportáveis. Alguns serviços aoprodutor, como auxílio temporário ou conservação de edifícios, não são nemduráveis nem transportáveis. Outros serviços como serviços de consultoria legal,

de engenharia e administração são transportáveis via telecomunicações e via

aérea. E a expertise técnica de um advogado ou engenheiro é tão durávelquanto a produção de muitas indústrias manufatureiras.” In: TSCHETTER

(1987), citado por SILVA (1990).Silva (1990) enfatiza que a intangibilidade e inestocabilidade também

não são atributos que possam distinguir os serviços dos bens. Entre asexceções importantes, o autor cita o resultado de uma operação cirúrgica, adocumentação produzida por serviços profissionais, as alterações provocadasem bens duráveis submetidos a serviços de reparação e os “serviçosincorporados”, no qual se incluem filmes, livros e softwares.

O próprio Lemos relativiza a idéia de intransportabilidade dos serviços, aoadmitir que a atividade de produção dos serviços é transportável – desde quegarantidas as condições mínimas de rentabilidade, quanto à aglomeração emercado concentrado, além de custo de transporte mediano – e que, emmuitos casos, não é nítida a fronteira entre bens e serviços.

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2.3 – Tipologia do setor serviços:

Os serviços serão classificados quanto à possibilidade e forma de transporte, apartir de corte proposto por BHAGWATI (1987). O autor discerne dois grandesgrupos de serviços, definidos pelo tipo de interação estabelecida entreconsumidor e produtor: serviços que requerem proximidade física entreprodutor e consumidor e serviços prestados a longa distância. Estes doisgrupos podem ser subdivididos em:

-2.3.1 Serviços Intransportáveis:

O serviço não desloca, pois alguns elementos empregados na sua prestaçãosão intransportáveis. Apenas o usuário tem mobilidade, indo até o produtor. Éa forma mais convencional de prestação de serviço. Trata-se de serviço cujaprodução e consumo ocorrem ao mesmo tempo e no estabelecimento doprestador. Para ser prestado, exige relação pessoal entre produtor e usuáriodo serviço, tendo de ser entregue diretamente a este último. É o caso dosserviços hospitalares, por exemplo.

2.3.2 - Serviços Transportáveis com contato direto entre consumidor eprodutor:

Neste caso, ao contrário do anterior, o serviço desloca, pois é o local daprodução que vai até o usuário. Trata-se, assim como o “serviçointransportável”, de serviço produzido e consumido no mesmo local, só quedefinido pelo cliente e distinto do estabelecimento do prestador. Exigemproximidade física entre fornecedor e cliente. Um bom exemplo são osserviços de vigilância e segurança.

2.3.3 - Serviços Transportáveis sem contato direto entre consumidor eprodutor:

Estes serviços, assim como os “serviços transportáveis com contato direto”deslocam. O deslocamento, contudo, implica em pouco ou nenhum movimentofísico, quer dos consumidores, quer dos produtores - prescinde de contatofísico entre usuário e prestador do serviço, embora possa ocorrer. O que odesloca é o resultado do serviço, e não sua produção. São serviços prestadosa longa distância, o que implica em local de produção do serviço distinto doseu local de consumo.

O deslocamento do serviço para o local consumidor pode ser feito deduas formas. Em primeiro lugar, há serviços que se transformam emmercadorias, podendo ser transportados, cada vez para locais mais distantes,possibilitando a ampliação do mercado atendido, tendo em vista os avançostecnológicos nas áreas de transportes e comunicações3.

Em segundo lugar, há serviços prestados a longa distância e baseadosem informação (information-based). A generalização das Tecnologias deInformação e Comunicação, nos Anos 90, com o avanço da infra-estrutura da

3 Sobre este assunto, ver HARVEY (1993).

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micro-eletrônica, informática, internet e telecomunicações, possibilitou umareorganização produtiva4, com a possibilidade de prestação de serviços àdistância do cliente, podendo o resultado deste serviço ser transportadoeletronicamente para o local consumidor. Bons exemplos são serviçosprestados por instituições financeiras.

2.3.4 Serviços com Transportabilidade Mista:

Serviço pode deslocar. Trata-se de serviços que são, habitualmente, e nãocomo exceção, produzidos tanto na sede do prestador, como em local definidopelo cliente. Além disto, podem ter, ou não, local de produção e consumoidênticos. Ou seja, podem ser prestados de mais de uma das formas previstasnos três itens anteriores. Um bom exemplo é a manutenção de máquinas eequipamentos, que pode ser feita na oficina do prestador ou no cliente.

Quando tais serviços forem prestados e consumidos na empresa, são“serviços intransportáveis”. Quando forem prestados na empresa econsumidos em outro local, são “serviços transportáveis sem contato direto” e,quando produzidos e consumidos fora da empresa são “serviços transportáveiscom contato direto”.

O Quadro 1, na página seguinte, resume as principais característicasdestes quatro grupos de serviços

3 –Cálculo dos Impactos, Sobre a Arrecadação Municipal de Issqn,da Incidência Tributária no Local da Prestação dos Serviços

A metodologia proposta baseia-se exclusivamente nas decisões atuais do STJ:regra de incidência do imposto dada pelo local da prestação do serviço e nãomais pelo estabelecimento prestador. Assim, identificou-se, em primeiro lugar,que os tipos de serviços passíveis de serem impactados por esta decisão sãoaqueles que podem ter local da produção do serviço distinto do estabeleci-mento prestador. Tais serviços foram selecionados. Para tanto foi necessária,antes, a classificação, quanto ao grau e forma de “transportabilidade”, dosserviços sobre os quais incide o ISSQN.Quadro 1 - Características das Quatro Formas de Transporte de ServiçosTipologia Transportabilidade do

serviçoForma de transporte doserviço

Realocação de fatores

1)Serviço In-transportável

Serviço não desloca Não existe Realocação do fatorusuário

2)Serviço Trans-portável com contatodireto

Serviço desloca Local da produção doserviço vai até oconsumidor

Realocação do fatorprodutor

3)Serviço Trans-portável sem contatodireto

Serviço desloca Sem movimento físico:serviço desloca comomercadoria ou vir-tualmente

Não há realocação dosfatores produtor ouusuário

Serviço pode nãodeslocar

Não existe Realocação do fatorusuário

4)Serviço Misto

Serviço pode

Local da produção doserviço vai até oconsumidor

Realocação do fatorprodutor

4Sobre este assunto, ver GERSHUNY & MILES (1983); FREEMAN et al (1982); HARVEY (1993).

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deslocar Sem movimento físico Não há realocação defatores

3.1 –Serviços sujeitos ao ISSQN:

O conceito de serviços adotado por este trabalho restringe-se aos 101 tipos deatividades sujeitas à incidência do ISSQN, citadas na “Lista de Serviços”,anexa ao Decreto-Lei 406/68. Tendo em vista que todos estes serviços estãocondensados em 42 grupos de atividades previstos no Código de AtividadesEconômicas de Belo Horizonte, e que este Código informa a alíquota para cadaserviço, esta será a classificação adotada.

3.2 - Enquadramento dos serviços na Tipologia:

Nesta etapa, procedemos à classificação das 41 5 atividades de serviços,previstas no Código de Atividades Econômicas de Belo Horizonte (CAE), emquatro grupos, em função da transportabilidade dos serviços6: (i) intrans-portáveis, (ii) transportáveis com contato direto, (iii) transportáveis semcontato direto e (iv) transportabilidade mista. O Quadro 2 apresentará oenquadramento, proposto nesta monografia, destes serviços, além da par-ticipação de cada grupo de serviços na arrecadação de ISSQN em BeloHorizonte.

3.3 - Seleção dos serviços a serem pesquisados:

Apenas os serviços cujo local da produção pode ser transferido até o usuáriosão objeto de estudo deste trabalho, pois são aqueles que, quando comer-cializados entre municípios, impactam a arrecadação de ISSQN, caso oimposto seja exigido em função do local da prestação do serviço e não maisem função do local da sede do estabelecimento prestador. Duas das categoriasprevistas na Tipologia enquadram-se nesta definição.

Em primeiro lugar, temos os “serviços transportáveis com contato dire-to”. Destes, somente o serviço de construção civil7 não fará parte do universopesquisado, pois o local de incidência do ISSQN sobre tais serviços já é o dolocal da prestação do serviço. Neste caso, o entendimento do STJ não trazmudanças quanto ao local de recolhimento do ISSQN, não tendo efeitos sobrea arrecadação.

Em segundo lugar, temos os “serviços mistos”, cuja caracterização, parao Fisco Municipal, do local em que foi prestado o serviço, poderá tornar-seinviável. O contribuinte poderá ora alegar que prestou serviços em sua sede,ora no cliente, com o intuito de beneficiar-se de alíquotas menores de Imposto

5 Tendo em vista que o grupo de atividade econômica dos serviços “comunitários e sociais” tem participação inexpressivana arrecadação de ISSQN, o mesmo será excluído de nossa análise, o que reduz o universo pesquisado a 41 grupos deatividades de prestação de serviços.6 Convém ressaltar que, para tal enquadramento, foi observado o procedimento usual para prestação do serviço, e não asexceções. Isto equivale a dizer que, por exemplo, é o cliente quem leva seu carro à oficina mecânica, embora o opostopossa, eventualmente, ocorrer.7 O serviço de exploração de rodovias não foi considerado, pois não há pagamento de ISSQN referente a este tipo deserviço em Belo Horizonte. De qualquer forma, as mesmas considerações feitas ao longo deste trabalho para construçãocivil valem para o serviço de exploração de rodovias, o que significa que ele seria excluído do universo a ser pesquisado,pois o imposto cobrado sobre estes serviços já é devido no local da prestação dos serviços.

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Sobre Serviços. Neste sentido, a tendência será a de que o ISSQN devidosobre serviços com transportabilidade mista venha a ser devido, mantida adecisão do STJ nos moldes atuais, sempre no local onde é prestado o serviço.Pelo seguinte motivo.Quadro 2 - Serviços: Tipologia e Participação na Arrecadação de ISSQN BH– Jan anov/01

Transportabi-lidade

Cód.CAE

Descrição Grupo de Atividade % no totalarrecadado 8

63 Reparação, conserto, limpeza e manutenção de veículos 5,6211 Serviços médico-hopitalares e laboratoriais 4,6931 Serviços de hospedagem e alojamento 2,9272 Composição e impressão gráfica 2,7652 Cursos livres 2,4651 Ensino regular 2,4571 Serviços de cinefoto, som e reprodução 1,74

Serviços 81 Transporte municipal de passageiros 1,63Intransportáveis 131 Guarda de bens 0,88

21 Serviços de beleza, higiene pessoal e destreza física 0,8441 Diversões públicas com cobrança de ingresso 0,6942 Diversões públicas sem cobrança de ingresso 0,5965 Beneficiamento/confecção de bens não destinados a

comercialização0,43

12 Serviços odontológicos 0,4132 Serviços de alimentação 0,15

Subtotal do grupo 28,26151 Serviços de construção civil 7,47122 Locação de bens 3,4161 Conservação, manutenção, limpeza e saneamento de bens imóveis 3,00

Serviços 62 Instalação e montagem de bens móveis 2,87Transportáveis 124 Locação de mão-de-obra 2,05com contato 132 Vigilância e segurança 1,84Direto 83 Transporte municipal de valores e documentos 1,09

82 Transporte municipal de cargas 1,05152 Serviços técnicos e auxiliares de construção civil 0,78161 Decoração, paisagismo, jardinagem, agricultura e congêneres 0,12

Subtotal do grupo 23,68141 Instituições financeiras 8,73111 Administração de bens e negócios 4,11113 Intermediação de direitos e serviços 2,32

Serviços 92 Serviços técnicos administrativos 2,28Transportáveis 101 Serviços de publicidade e propaganda 1,29sem contato 33 Serviços de turismo 0,71Direto 142 Administração de seguros e co-seguros 1,04

121 Arrendamento 0,02114 Intermediação de mão-de-obra 0,02123 Locação de direitos 0,02

Subtotal do grupo 20,5491 Planejamento, organização, assessoria e consultoria 7,5793 Serviços de Informática 7,48

Serviços 64 Reparação, conservação e manutenção de máquinas eequipamentos

5,88

Mistos 153 Consultoria técnica e projetos de engenharia 3,08112 Intermediação de bens 2,0313 Serviços veterinários e afins 0,09

Subtotal do grupo 26,13

Fonte: Gerência de Tributos Mobiliários da Coordenação de Finanças - PMBH

8 Grupo indefinido de serviços, responsável por 1,39% da arrecadação de ISS, não incluso.

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Os municípios, para fiscalizarem e cobrarem o ISSQN devido no local daprestação, quando o prestador for de outro município, terão que atribuir estafunção ao responsável tributário, ou seja, o tomador do serviço terá que fazera retenção do imposto na fonte. Só que nem sempre é possível distinguir olocal da prestação dos serviços contratados. O tomador do serviço, tendo emvista esta dificuldade, e, temendo ser responsabilizado pelo pagamento doimposto, tenderá a adotar regra única quanto ao ISSQN a ser retido: sempreque o serviço for prestado por empresa de outro município, procederá àretenção do imposto na fonte, sem atentar para o local da prestação. Esteprocedimento, aliás, a vigorar a atual decisão do STJ, tende a tornar-sepadrão.

Sendo assim, optamos por incluir os “serviços com transportabilidademista”, que podem ser prestados tanto no estabelecimento, quanto em localdefinido pelo cliente, no cálculo do impacto da decisão do STJ sobre a arre-cadação de ISSQN, ainda que nem sempre estes serviços sejam prestadosfora do estabelecimento.

Os serviços categorizados como “intransportáveis” ou “transportáveissem contato físico” não farão parte do universo pesquisado neste trabalho,pois, nestes casos, o entendimento do STJ não traz mudanças quanto ao localde recolhimento do ISSQN e, conseqüentemente, não impactua a arrecadação.Isto porque, para estes, os locais do estabelecimento prestador e da prestaçãodo serviço são coincidentes, não se alterando o local de pagamento doImposto Sobre Serviço, qualquer que seja o entendimento adotado (o doSuperior Tribunal de Justiça ou o do inciso “a”, artigo 12 do Decreto-lei406/68).

Com a exclusão da construção civil, serão quinze grupos de atividadespesquisados, responsáveis por 42,34% da arrecadação de ISS em BeloHorizonte, conforme Quadro 3.Quadro 3- Grupos de Atividade selecionadas:

Código Descrição Grupo de Atividade Participação noTotal Arrecadadode ISSQN (%)

91 Planejamento, organização, assessoria e consultoria 7,5793 Serviços de Informática 7,4864 Reparação, conservação e manutenção de máquinas e equipamentos 5,88122 Locação de bens 3,41153 Consultoria técnica e projetos de engenharia 3,0861 Conservação, manutenção, limpeza e saneamento de bens imóveis 3,0062 Instalação e Montagem de bens móveis 2,87124 Locação de mão-de-obra 2,05112 Intermediação de bens 2,03132 Vigilância e Segurança 1,8483 Transporte municipal de valores e documentos 1,0982 Transporte municipal de cargas 1,05152 Serviços técnicos e auxiliares de construção civil 0,78161 Serviços de decoração, paisagismo, jardinagem, agricultura e congêneres 0,1213 Serviços Veterinários e Afins 0,09Total deste grupo 42,34

Fonte: Gerência de Tributos Mobiliários da Coordenação de Finanças - PMBH

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3.4 – Cálculo:

Para se chegar à mensuração dos impactos do local de incidência do impostodado pelo local da prestação do serviço, é necessário que seja conhecido oresultado líquido do comércio intermunicipal de serviços, ou seja, o valor dadiferença entre exportação e importação de serviços9. Sobre este resultadoserá calculado o imposto adicional a ser arrecadado por Belo Horizonte – casoo valor importado supere o exportado – ou o imposto perdido – caso o valorde serviços exportados supere o de importados. Como o ISSQN é, contudo,um imposto que incide sobre o valor da receita com alíquotas distintasconforme o tipo de serviço prestado, é necessário que o valor líquido docomércio intermunicipal de serviços seja calculado para cada tipo de serviço eque sejam especificadas suas respectivas alíquotas. Tais alíquotas sãodefinidas de modo autônomo por cada município, sendo dadas, em BeloHorizonte, pela Tabela anexa à Lei Municipal 5641/89 e alterações posteriores.

Os impactos da incidência tributária no local da prestação dos serviços,sobre a arrecadação de ISSQN, para cada um dos grupos de serviços se-lecionados é dado por:

_Ti = (Xi – Mi) * Alíquotai

_Ti: Impacto, sobre a arrecadação do ISSQN, para o serviço tipo “i”, deincidência tributária no local do serviço.

Xi: Valores recebidos com a exportação do serviço tipo “i”

Mi: Valores gastos com a importação do serviço tipo “i”

Alíquotai: Alíquota para recolhimento de ISSQN do serviço tipo “i”

O resultado final sobre a arrecadação de Belo Horizonte é dado por:

_T = _ _Ti

_T: Impacto, sobre a arrecadação total do ISSQN, de incidência tributáriano local do serviço.

Um _T positivo indica que a decisão do STJ resultará em redução daarrecadação de ISSQN. Caso _T seja negativo, haverá aumento na arre-cadação deste imposto.

3.5 - Considerações Metodológicas:

A proposta metodológica elaborada parte de algumas simplificações. Emprimeiro lugar, o cálculo do impacto da imposição fiscal no local onde se deu aprestação dos serviços sobre a arrecadação do ISSQN é um cálculo potencial.Assume-se a hipótese de que não há omissão de imposto - que o ISSQN éintegralmente pago, sempre que devido.

A segunda simplificação é que a decisão do Superior Tribunal de Justiçanão afeta o valor total pago a título de ISSQN no país, mas apenas redistribuieste valor entre os municípios. Ou seja, que a decisão do STJ é seguida à risca 9 Deve-se ressaltar que, para este trabalho, o conceito de importação refere-se a serviços prestados para empresassediadas em Belo Horizonte, por empresas estabelecidas em outros municípios. Serviços exportados, por sua vez, sãoaqueles prestados para empresas estabelecidas fora do município de Belo Horizonte, cujo produtor esteja sediado em BeloHorizonte.

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pelo contribuinte do imposto, que continua recolhendo o tributo,integralmente, ainda que para outro município. Assim, este seria um jogo desoma zero para o país. Parece-nos, contudo, que um cenário mais realista, avigorar a decisão do STJ, seria aquele com tendência de queda no valor totalde Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza pago no Brasil. Por doismotivos principais.

O primeiro é o possível aumento da evasão fiscal. A definição do local daprestação para alguns serviços, por parte dos Fiscos Municipais, poderátornar-se inviável, o que abre a possibilidade para que o contribuinte, caso seucliente não faça a retenção do imposto na fonte, “escolha” o local quesustentará como o da prestação do serviço, sempre com o intuito de pagarmenos imposto. Além disto, há grandes dificuldades em tornar efetiva e amplaa retenção na fonte do Imposto Sobre Serviço de Qualquer Natureza, porparte do tomador do serviço, única forma de exigir o pagamento do tributo,caso ele seja devido no local de sua prestação. Isto porque, para que otomador do serviço assuma a obrigação de reter este imposto na fonte, énecessário tempo, para que seja orientado - sobre situações em que se tornaresponsável tributário, procedimentos para retenção na fonte do ImpostoSobre Serviços e definição da alíquota incidente - e convencido pelo FiscoMunicipal a exercer esta nova obrigação. Para isso, será necessária umainversão na ótica tradicional da fiscalização municipal, que está habituada aauditar o prestador do serviço e não seus clientes.10

Feitas estas ressalvas, este modelo tem os méritos de ampliar a frente deinvestigações e de ser o primeiro estudo do gênero realizado no Brasil.

4 - Resultados Obtidos:

Uma das dificuldades encontradas para avaliar o comércio intermunicipal deserviços é a inexistência de dados sobre valores de importação e exportação.A aplicação do modelo proposto só foi possível em decorrência dadisponibilidade de dados de importação e exportação de serviços, para omunicípio de Belo Horizonte, levantados através da “Pesquisa ISS”11, realizadapela Gerência de Tributos Mobiliários da Coordenação de Finanças daPrefeitura de Belo Horizonte, referentes aos quinze grupos de serviços se-lecionados, aqueles com possível realocação do fator de produção, ou seja,serviços que podem ser produzidos fora do estabelecimento prestador (citadosno Quadro 3).

Economias com baixo grau de abertura ao comércio externo de serviçosdificilmente serão impactadas pela decisão do STJ. Os impactos naarrecadação municipal serão especialmente significativos para cidades tipi-camente produtoras e comercializadoras de serviços com outros municípios.Este parece ser o caso de Belo Horizonte, que assistiu, principalmente a partir 10 Alguns dados revelam a pouca relevância de que goza atualmente a retenção na fonte em Belo Horizonte. Do ISSQNtotal arrecadado nesta cidade, nos anos de 2000 e 2001, a retenção na fonte representou, respectivamente, apenas 1,02%e 0,93%.11 Este trabalho incluiu o desenvolvimento de dois questionários para levantamento destes dados, os “Formulários de Pesquisa ISS”, um respondido pelosprestadores e outro pelos tomadores de serviços. Os questionários foram enviados para mais de 4.000 estabelecimentos e o trabalho de campo resultou na“Pesquisa ISS”, desenvolvida entre maio-dezembro/2002.

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dos Anos Oitenta, ao crescimento do setor terciário na economia da cidade12. Ahipótese de que é também um município que comercializa serviços com suaárea metropolitana e com outros grandes centros urbanos baseia-se, por suavez, na tese de Lemos (1988) de que os serviços estão sempre concentradosnos centros econômicos urbanos e em seu entorno, e é confirmada pelosdados discutidos a seguir.

O Quadro 4 apresenta o saldo, positivo, da balança comercial de serviçospara o ano de 2001 - exportações superam em muito as importações. A últimacoluna mostra que a incidência do ISSQN no local da prestação do serviçoimplica em perda de R$29.049.361,31 para os cofres públicos de BeloHorizonte, o que significa 14,86% da arrecadação anual do ISSQN destemunicípio13.

Quadro 4: Impactos do local de Incidência Tributária sobre Arrecadação de ISSQN

Belo Horizonte – 2001 – Em R$ 1,00

Tipo de Serviço14 Exportação (X) Importação (M) Saldo Comercial AlíquotaPerda anualISS

Em R$1,00 Em R$1,00 (X-M) - R$1,00 ISS (Ai) _T=(X-M)*Ai

1)Planejamento 345.994.789,85 23.832.110,23 322.162.679,62 0,05 16.108.133,982)Desenv.Software 27.618.044,48 9.684.079,69 17.933.964,79 0,005 89.669,823)Demaisserv.informática 24.512.929,28 31.436.044,98 -6.923.115,70 0,05 -346.155,794)Varrição/Saneamento 0,00 5.435.271,66 -5.435.271,66 0,05 -271.763,585)Conservaçãoimóveis 245.925,93 741.064,52 -495.138,59 0,02 -9.902,776)Decoração/Paisagismo 332.878,31 118.556,38 214.321,93 0,05 10.716,107)Auxs.construção civil econsultoria técnica54.471.928,59 5.037.765,07 49.434.163,52 0,02 988.683,278)LocaçãoVeículos 123.611.878,04 789.984,15 122.821.893,89 0,01 1.228.218,949)Loc.Outros bensmóveis 38.753.442,17 7.418.537,07 31.334.905,10 0,05 1.566.745,2510)Instalaçãomáquinas 120.047.273,09 70.978.434,87 49.068.838,22 0,05 2.453.441,9111)Reparaçãomáquinas 175.437.029,74 37.649.676,24 137.787.353,50 0,05 6.889.367,6712)Vigilância/segurança 6.582.884,58 1.048.894,26 5.533.990,32 0,02 110.679,8113)Fornecim.mão-obra 6.921.124,95 8.487.590,81 -1.566.465,86 0,02 -31.329,3214)Seleção mão-de-obra 0,00 1.244.583,90 -1.244.583,90 0,05 -62.229,2015) Servs.Veterinários 0,00 9.568,30 -9.568,30 0,05 -478,41

16) Intermediação 51.718.226,61 30.013.985,28 21.704.241,33 0,015 325.563,62

12 Dados de emprego apurados por Lemos e Diniz (200), a partir da RAIS, para o período 1986-97, corroboram a tese decrescimento do terciário em Belo Horizonte. A participação do ISSQN na arrecadação própria deste município nos últimoscinco anos também confirma a importância dos serviços no PIB municipal. Em 2000, por exemplo, segundo dados daGerência de Tributos Mobiliários da Coordenação de Finanças da PBH, arrecadou-se R$192.258.797,35 com ISSQN, o que é37,85% da receita tributária própria.13 A arrecadação de ISSQN para 2001, segundo dados da PBH/SCOPLAN/SMMAI/GEIT, foi de R$ 195.484.356,95.14 Por haver alíquotas diferenciadas para pagamento de ISSQN, os serviços de informática foram divididos em“desenvolvimento de software” e “demais serviços de informática”; os de conservação, manutenção, limpeza e saneamentode bens imóveis em “varrição, coleta de lixo e saneamento” e “conservação de imóveis”; a locação de bens em “locação deveículos” e “locação de outros bens móveis”; e a locação de mão-de-obra em “fornecimento de mão-de-obra” e “seleção erecrutamento”.

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bens

Outros15 127.970.490,86 130.332.864,33 -2.362.373,47 0,00

Total16 1.104.218.846,48 364.259.011,74 739.959.834,74 29.049.361,31

Fonte: Secretaria Municipal de Arrecadações/PMBH

Duas informações confirmam a tendência observada de perdasignificativa de receita de ISSQN para Belo Horizonte, caso o imposto sejacobrado no local da produção dos serviços. Em primeiro lugar, os serviçosmais exportados em 2001 foram os de “planejamento, organização, assessoriae consultoria”, que representaram 31,33% das exportações de serviços. Estesserviços foram, também, aqueles que apresentaram o maior resultado positivoda balança comercial (exportações menos importações), ou seja, este será ogrupo de atividades que apresentará maior queda na arrecadação de ISSQN,caso a incidência seja no local da prestação dos serviços17, sendo responsávelpor mais da metade do ISSQN perdido. A única possibilidade de reverter estequadro para Belo Horizonte é caso haja uma revisão parcial da decisão do STJ,de modo que, para os serviços cujo local da prestação seja duvidoso, oimposto continue sendo pago na sede do estabelecimento prestador.

Em segundo lugar, há saldo negativo na balança comercial (valorimportações é maior que das exportações) para os serviços de “varrição esaneamento”, “fornecimento de mão-de-obra”, “seleção e recrutamento demão-de-obra”, “serviços veterinários”, “demais serviços de informática” e“conservação de imóveis”. Os ganhos na arrecadação de ISSQN que taisserviços importados por Belo Horizonte podem garantir, caso Belo Horizontepasse a adotar o local de incidência como o do local da prestação dos serviços,são, contudo, pouco relevantes.

5 - Conclusão

Este trabalho objetivou desenvolver metodologia para cálculo do impactoda decisão do Superior Tribunal de Justiça, relacionada à nova definição dolocal de incidência do Imposto Sobre Serviço de Qualquer Natureza, sobre aarrecadação municipal. Ainda que o tema venha sendo debatido por teóricos, amedição destes impactos, até onde se sabe, é inédita no país. A propostametodológica desenvolvida baseou-se exclusivamente no formato atual dadecisãol do STJ. Isto significa que a regra adotada para incidência do ISSQNfoi sempre a do local da prestação do serviço. Sabe-se, contudo, que háserviços para os quais a definição deste local é complexa. É o caso dosserviços de planejamento, assessoria, consultoria, projetos e intermediação debens, dentre outros. É também o caso dos serviços virtuais. A Internet, ummercado global livre para a prestação de serviços, que conecta pessoas com a

15 Dados para “outros serviços” foram apresentados apenas para que o total refletisse todos os serviços importados eexportados. Os “outros serviços” não são, contudo, considerados para o cálculo do impacto do local da prestação do serviçocomo local de incidência tributária. Ver Quadro 3 “serviços selecionados”.16Transporte municipal foi excluído do levantamento, dada a pouca confiabilidade dos dados obtidos na Pesquisa ISS -empresas entrevistadas não dispõem de informação de gastos/receitas com transporte municipal, mas apenas do totalgasto/faturado com transporte.17 Conforme já abordado anteriormente, a permanecer a decisão do STJ no formato atual, os serviços de consultoria, quetêm difícil definição do local de sua prestação, tendem a pagar ISSQN no local do consumo do serviço.

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dispensa do contato pessoal e que tem como uma de suas características afalta de localização física, pode permitir que serviços escapem dos sistemasmunicipais de regulação e da definição tradicional do local de prestação.

Para tais casos, julgamos que será necessária definição do que vem a serconsiderado “local da prestação do serviço”, sob o risco de, ao não fazê-lo,tornar inexeqüível a regra do local da prestação e, conseqüentemente, facilitara evasão fiscal. Vislumbram-se dois procedimentos, cada um com suaslimitações.

Em primeiro lugar, é possível que o “local da prestação do serviço” venhaa ser definido unicamente pelo critério do local do consumo do serviço. Assim,o imposto seria sempre devido no local para o qual o serviço se destina. Há,contudo, alguns problemas sérios a serem considerados antes da adoção destaconcepção.

Por um lado, o princípio da territorialidade, justificativa dada pelo STJpara utilizar o local da prestação como a única regra aplicável para definir olocal da incidência do imposto, continuaria a ser desrespeitado. Para serviçoscujo local de produção é distinto do local de consumo, um serviço deinformática prestado à distância, dentro da sede do prestador, por exemplo,teriam o Imposto Sobre Serviço cobrado pelo município onde está o cliente.Trata-se, também, de invasão de competência de um município sobre outro.

Por outro lado, estaria surgindo um novo imposto, sem previsão legal,com novas características. O fato gerador, por exemplo, não seria mais aprodução do serviço, mas sim seu consumo. O principal sujeito passivo nãoseria o prestador do serviço, mas o responsável tributário, o cliente.

Em segundo lugar, é possível que o “local da prestação do serviço” sejadefinido, simultaneamente, por dois critérios. Um, para os serviços que são,sempre, prestados no local do consumo, e, para os quais, não há dúvida nadefinição quanto ao local em que foi executado. É o caso da construção civil eseus serviços auxiliares, dos serviços de decoração, paisagismo, jardinagem eagricultura, da locação de bens, dos serviços de conservação, manutenção,limpeza e saneamento de bens imóveis, da instalação e montagem de bensmóveis, da locação de mão-de-obra, da vigilância e segurança e do transportemunicipal. Para os demais serviços, valeria a regra do local do estabele-cimento prestador. Esta segunda concepção, ainda que interesse aos cofrespúblicos municipais de Belo Horizonte, tem o inconveniente de resultar emnova sofisticação para cálculo e pagamento de um imposto já tão controversocomo o ISSQN.

Nota-se que a referida decisão do STJ, assim como varias outras decisõesJudiciais, não é suficiente para resolver as dúvidas relacionadas à cobrança doImposto Sobre Serviço. Isto porque tais dúvidas são originárias de problemasconceituais não abordados quando da criação deste imposto. Ao tentarresolver a questão do local de incidência do ISSQN, o Superior Tribunal deJustiça conseguiu torná-lo um imposto ainda mais polêmico, aumentando acomplexidade dos procedimentos para seu pagamento.

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Feitas tais ressalvas, espera-se que os resultados obtidos com ametodologia desenvolvida nesta monografia permitam o balizamento dedecisões a serem adotadas pelo município de Belo Horizonte, uma cidadetipicamente exportadora de serviços, que terá perda de quase 15% daarrecadação com o ISSQN, caso o imposto venha a ser cobrado no local daprestação dos serviços, conforme determina o Superior Tribunal de Justiça.Esta é mais uma variável que afetará negativamente a receita de BeloHorizonte, dentre outras tantas, como o atual cenário de recessão econômica,discussões judiciais sobre situações de ilegalidade na cobrança do ISSQN e apossibilidade de aprovação de Reforma Tributária que diminua o papelarrecadador dos municípios.

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