Luiz_Mott_Etno Historia Da Homossexualidade No Brasil

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    ETNO-HISTRIA DA HOMOSSEXUALIDADE NA AMRICA LATINA*

    Prof. Dr.Luiz Mott**

    A homossexualidade deve ser um desafioe no um tabu para a Cincia, dizia j em 1957

    G.A.SILVER

    1

    e no obstante tal sugesto, injustificado compl do silncio continua a barrar daAcademia os estudos sobre o amor que no ousa dizer o nome (Oswald Wilde). J em 1927, B.Malinowski, um dos pais da Antropologia moderna, chamava a ateno para a importncia de seestudar temas da sexualidade humana tirando a folha da parreira que cobre o sexo2 - noobstante, neste final do segundo milnio da nossa civilizao, o estudo do amor e erotismo entrepessoas do mesmo gnero ou continua proibido, ou , considerado tema de marginal e de menorimportncia no meio universitrio. Se ponderarmos que os gays3 e lsbicas representam 6 a 10%da populao dos pases ocidentais4, concluiremos que somente o preconceito e discriminaopoderiam explicar o desprezo pelo conhecimento de to significativo contingente demogrfico. Emseu recente livro sobre as unies entre homossexuais na Europa pr moderna, J. Boswell adverte-nos do quo ilgica e cruel tem sido nossa cultura, notadamente aps o sculo XIV, ao eleger ahomossexualidade como a maior e mais horroroso de todos os nossos tabus sexuais. O pecadonefando isto , aquele cujo nome no pode ser mencionado - e muito menos praticado! - foiconsiderado pela moral judaico-crist como mais grave do que os mais hediondos crimes anti-sociais, como por exemplo, o matricdio, a violncia sexual contra crianas, o canibalismo, ogenocdio e at o deicdio - todos pecados-crimes mencionveis, enquanto s o abominvelpecado de sodomia foi rotulado e tratado como nefandum5

    pois com o objetivo de quebrar o silncio e tabu que ainda cerca o amor entre pessoasem nosso continente , que decidi tratar da histria e antropologia da homossexualidade na AmricaLatina. Reunindo informaes bibliogrficas de difcil acesso, geralmente inexistentes noscompndios tradicionais, minha inteno, alm de esboar um quadro geral do homoerotismo emdiferentes reas culturais desta parte do orbe, estimular outros pesquisadores nativos aaprofundar as pistas aqui apresentadas, no apenas visando o deleite intelectual, diletante oufetichista, mas tendo em vista o reconhecimento dos direitos de cidadania deste bulioso segmentosocial cujos direitos humanos so negados e vilipendiados na maior parte de nossos pases,inclusive dentro das prprias universidades.

    Para efeito de anlise, dividi este trabalho em trs partes, a saber:I) A Homossexualidade na Amrica Pr-ColombianaII.) A represso aos Sodomitas na Amrica Latina ColonialIII) Gays e lsbicas latino-americanos hojePortanto, antecipando algumas das concluses desta pesquisa, gostaria de destacar que o

    estudo da Etno-Histria do Homoerotismo na Amrica Latina reveste-se de particular interessepara diferentes mentalidades, do quotidiano e da sexualidade. Os dados aqui coligidos permitemavanar a discusso sobre a prpria teoria da Homossexualidade6, ratificando-se de um lado a

    * Esta comunicao foi apresentada no Seminrio-Taller de Histria de las Mentalidades y los Imaginarios,realizado na Pontficia Universidad Javerina de Bogot, Colmbia, Departamento de Histria e Geografia, 22-26/8/1994. Aproveito a ocasio para agradecer ao Coordenador do evento, Dr.Jaime Humberto Borja Gomez, o

    convite e oportunidade de participar deste seminrio.**Professor do Departamento de Antropologia da Universidade Federal da Bahia, Brasil1 SILVER, G.A. The Homosexual: Challenge to Science, The Nation, 1957, 84: 451-454.2 MALINOWSKI, B. Sexo e Represso na Sociedade Selvagem. Petrpolis: Vozes Editora,1973.3 O termo gay, provm do catalo-provenal gai, sendo usado desde os sculos XIII-XIV como sinnimode homossexual. Cf. BOSWELL, J. Christianity Social Tolerance and Homosexuality. Gay People inWestern Europe from the Beginning of the christian Era to the XIVth Century , Chicago: ChicagoUniversity Press, 1980:43.4 KINSLEY, A.et allii. Sexual Behavior in the Human Male. Philadelphia: W.B.Saunders, 1948.5 BOSWELL, J. Same-Sex Unions Premordern Europe. New York: Villard Books, 1994: xxxiii6 GREENBERG, David. The construction of Homosexuality. Chicago, The University Chicago Press, 1988

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    universalidade temporal e espacial das prticas homfilas, desmitificando assim a acusao vulgarde que teriam sido os europeus os introdutores do vcio filosfico (Voltaire) no Novo Mundo. Outraquesto sugerida pelos dados aqui apresentados remete-nos a um dos impasses tericos maiscadentes e ainda no resolvido pelos estudiosos deste tema: at que ponto o conceito de homossexualidade pode ser usado com propriedade heurstica para descrever e interpretar asrelaes unissexuais do mundo extra-europeu ? Deixarei ao leitor, no final deste trabalho, retirarsuas prprias concluses quanto a esta polmica que coloca de um lado os essencialistas e dooutro, os construtivistas sociais.7

    I. A homossexualidade na Amrica Pr- Colombiana

    Ultra Oequinotialem no peccari.(Ditado Ibrico do Sculo XV)

    Para se estudar as prticas homossexuais no Novo Mundo quando da chegada dosconquistadores europeus, dispomos basicamente de trs fontes: Esculturas e cermicasrepresentando cenas homoerticas; Mitos conservados na memria oral dos nativos e registradosnos manuscritos nos tradicionais; Relatos dos primeiros cronistas que entraram em contato com os

    amerndios8

    .Conforme relata Gonzalo Fernandez de Ovideo, em sua Histria General y Natural de las

    Indias, (1535), o gosto pelo vcio nefando se espalhava no s por toda a rea circum-caribe, mastambm ao longo da Tierra Firme, atual costa da Venezuela e Colmbia, donde muchos destosindios y indias eram sodomitas. Observou escandalizado que en aquel diablico e nefando actode Sodoma, hechos de oro derelieve. Yo vi uno destos joyeles del diablo que pesaba veinte pesosde oro, hueco, vaicado y bien labrado, que se hoboen el Puerto de Santa Marta en la costa deTierraFirme, ao de 1514... Asi que ved si quien tales joyas se prescia y compone su persona, siusar tal de maldad en tierra donde tales arreos traen, o si se debe tener por cosa usada eordinaria e comn aellos.9

    Tambm Francisco Lopez de Gomara (1552) refere-se presena de dolos homossexuaisentre os nativos mexicanos de Sant Anton: Hallaron entre unos arboles un idolillo de oro y muchosde barro, dos hombres cabalgando uno sobre otro a fuer de Sodoma.10

    Por ocasio da descoberta da Pennsula de Yucatan, encontraram os espanhis outracomprovao escultrica de que os Maias prestavam culto ao amor unissexual: Tenianmuchosidolos de barro, unos como con caras de demonios y otros como de mujeres y otros de malasfiguras, de manera que al parecer, estaban haciendo sodomias los unos indios com los otros.11

    Tambm na Amrica do Sul, na regio dos Andes, foram encontrados provasarqueolgicas confirmando a prtica do homoerotismo antes da chegada dos europeus. H notcia

    7 BOSWELL, J. Revolutions,Universals and Sexual Categories, in Hidden from History: Reclaiming the GayandLesbians Past, Duberman, M. Et.allii (eds.) New American Library, 1990. Para efeito desta anlise, restringimosnossa amostra apenas aos territrios hoje conhecidos como constitutivos da Amrica Latina, tendo como limitesetentrional o Mxico, incluindo todos os pases de lngua latina da Amrica Central, Caribe e Amrica do Sul.8Este o momento de prestar homenagens ao precursor dos estudos sobre a histria da homossexualidade entre osamerndios, Antonio Raquena, que j em 1945 publicava seu pioneiro e ainda insuperado Notcias y consideraciones

    sobre las anormalidades sexuales de los aborigenes americanos: Sodomia, publicado na Acta Venezolana, Tomo I,n1, Jul.Set.1945:3-32 (traduzido para o ingls, Sodomy among native american peoples, Gay Sunshine, 38/39,1979:37-39). Apesar da postura abertamente homfobica do autor - at certo ponto compreensvel na poca, setetrabalho o vademecum para o estudo deste tema, do qual lanamos mo muitas vezes ao longo destas pginas.9 FERNANDEZ Oviedo, G. Historia General y Natural de las Indias.L. V, Cap.III,1535, apud Cardin, Alberto. Guerreros, Chamanesy Travestis. INDCIOS DE Homossexalidad entrelos exticos. Barcelona, Tusquets Editores, 1984:150. Depois de Raquena, A.Cardn representa a maior sntesedocumental referente a esta temtica.10 LOPEZ DE GOMARA, F Conquista de Mxico. Histria General de Indias. (1551) Apud Raquena, op.cit. 1945:411 LOPEZ DE GOMARA, F Conquista de Mxico. Histria General de Indias. (1551) Apud Raquena, op.cit.1945:4.

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    que os espanhis teriam igualmente no Peru encontrado e derretido esculturas em ourorepresentando cpula anal entre dois homens.12 Preservaram-se contudo at nossos dias diversaspeas de cermica, reservatrios de gua ou moringas, onde exmios artistas pr-incaicosesculpiram na argila, cenas explcitas de homossexualismo. Na clebre coleo de cermicaertica Mochica coletada pela Famlia Larco, com data anterior a 1000 A.D., 3% das peasretratam realisticamente cenas de penetrao per annum.13

    Alm dos dolos mexicanos e das cermicas peruanas, outra importante fonte pr-colombiana para se conhecer a prtica da homossexualidade no Novo Mundo a coleo dosclebres Cdices Maias - obras El Chilan Balam , El Popol Buj ( Livro del Consejo) e as ProfeciasMaias - obras pictogrfica-hieroglficas que tratam da histria mitolgica e costumes destacivilizao. Atravs destes manuscritos, notadamente do Cdice Vaticano n 3738, constata-se queno panteo asteca, ocupava lugar proeminente a deusa Xochipilli, divindade hermafrodita,protetora do amor e da sexualidade no procriativa, a qual, quando representada como homem,tornava-se o deus Xochipilli, padroeiro da homossexualidade masculina, controlador das doenassexualmente transmissveis14. Segundo estes Cdices, os Maias dividiam a histria mitolgica domundo em diferentes perodos, sendo a Quarta Idade, a que precede o perodo anterior chegadados Europeus, tambm chamada de Idade Negra ou Idade das Flores, e tinha como patronaXochiquetzal, smbolo do sexo e da sensualidade. Esta es la edad em que los vcios, la molicie, elabandono de las costumbres austeras se instalan entre los hombres. Es la edad en que se olvidamlas virtudes viriles de los guerreros y de los magistrados, y se ensalza la vida blanda, facil ypervertida. Es sublimacin de la Danza de las Flores, de las grinaldas y del afeminamiento. Es elimperio de los mostradores del dorso, segun el Codice del Chilan Balam.15

    So contudo os relatos dos primeiros cronistas contemporneos s conquistas do NovoMundo, a fonte principal comprobatria da existncia, grande extenso e variedade das prticashomossexuais na Amrica Latina.

    J Fernan Cortez, na sua Primeira Carta Relacin, enviada ao Imperador Carlos V em1519, dizia: Hemos informados de cierto que todos ( los indios) de Vera Cruz son sodomitas yusan aquelabominale pecado,16 acrescentando Lopez de Gomarra que os nativos do Rio Panucoe adjacncias eram grandisimos putos17, usando o mesmo termo corrente desde a Idade Mdiaem toda Pennsula Ibrica, injustamente associado os homossexuais s prostitutas.

    Tarefa extremamente difcil avaliar o grau de objetividade ou subjetividade destasafirmaes pois nalguns casos, parece que os cronistas tendiam a exagerar os hbitos

    pecaminosos dos selvagens exatamente com o escopo de justificar a conquista, reduo ougenocdio dos mesmos. Gomarra e outros cronistas associam a sodomia impiedade: Como noconocen el verdadero Dios y Seor, estn en grandisimos pecados de idolatria, sacrifcios dehombres vivos, comida de carne humana, habla con el diablo, sodomias, etc18

    Quanto aos astecas, h clara contradio entre os primeiros observados, Diaz del Castilhoapontando-os como grandes amantes do homoerotismo, enquanto o franciscano Frei Benardino deSahagum exime-os desta abominao, ambos concordam, no entretanto, quanto afeminao etravestismo como elementos estruturais da prtica homossexual masculina: Eran todos los dmasdellos somticos, en especial los que vivian en las costas y tierra caliente, en tanta manera queandaban vestidos en hbito de mujeres muchachos a ganar en aquel diabolico y abominablevicio.19 Ocitado missionrio franciscano assim descreve os costumes dos nativos na sua HistriaGeneral de las cosas de la Nueva Espaa:

    12 LARCO HOYLO,R. Checan: Essay on Erotic Elements in Peruvian Art. Genebra, Nagel Publ.196513GUERRA,F. The Pre-Columbian Mind. London, Seminar Press, 1971:43-44.14 BULLOUGH, V.L. Sexual Variance in Socitety and History. Chicago, The University of Chicago Press, 1976:42;Thompson, J.E. Maya History and Religion. Norman, University of Oklahoma Press, 1970.15 Requena, op.cit. 1945_516 CORTES,H Cartas de Relacin de la Conquista de Mxico, tomo I,p.32, apud Requena,op.cit.1945:817 LOPEZ DE GOMARA, op.cit. 1551, tomo I Cap.XLVII. p.16318 LOPEZ DE GOMARA, op.cit. 1551, tomo I Cap.XLVII. p.16319 DIAZ DEL CASTIHO, op.cit. 1605,Cap.CCVIII, apud Cardin, 1984:153

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    El somtico paciente es abominable, nefando y detestable, digno de que hagan burla y serian las gentes, y el hedor y fealdad de su pecado nefando no se puede sufrir, por el asco que o enel hablar, por todo se muestra mujeril o afeminado, en el andar o en el hablar, por todo lo cualmerece ser quemado.20 Tambm Fray Bartom da las Casas defende os nativos que missionou deserem muito afeitos s nefandices, ressaltando os especialistas nas civilizaes maias e astecas acontradio notada entre a mitologia extremamente dionisaca, valorativa inclusive dahomossexualidade, ao lado de uma prtica moral bastante repressiva, do tipo apolneo, prevendoinclusive a pena de morte para certos casos de homossexualismo.21

    Aceptada o rechazada, honrada o severamente castigada, segn la nacin que se ejerci,( la homosexualidad) estava presente del Estrecho de Bering al de Magallanes...concluiu commaestria quem primeiro estudou las anormalidades sexuales de los aborigenes americanos.22

    Inmeros so os relatos de cronistas, viajantes e missionrios descrevendo a presena dendios homossexuais e travestis entre as tribos e naes da atual Amrica do Norte, onde famososberdaches chegaram a ser retratados em pitorescas gravuras do sculo XVII.23 Praticada pelosmaias, astecas e caribes, a homossexualidade tambm teve muitos adeptos em diferentescivilizaes dos antigos imprios andinos, da Colmbia ao Chile, incluindo os Chavin, Tiahunaco,Nazca, Chimu, notadamente os Incas e Chibchas. Em sua Crnica del Peru, Cieza de Leonobservou que por los tener el demonio ms presos en las cadenas de su perdicin, en losoraculos y adoratrios donde se hallaba el dolo y daba laas respuestas, haca entender que

    convenia para el servicio suyo, que alguns mozos desde su niez estuviesen en los templos paraque a su tiempo, cuando se hiciesen los sacrificios y fiestas solenes, los seores y otrosprincipales, usasen com ellos el maldito pecado de la sodomia. Segun el padre Domingo de SantoToms, generalmente entre los serranos y Yungas, en cada tiemplo o adoratorio principal, tienenum hombre o ds o ms, segun el dolo, los cuales andan vestido como mujeres y dias principales,su ayuntamiento carnal torpe, especialmente los seores principales. Ellos hacian entender que talvicio era especie de santidad y religion24.

    A associao entre homossexualismo e xamanismo e outras manifestaes religiosas tema fartamente documentado em incontveis culturas, em todos continentes e ao longo de todahistria humana.25

    Tambm entre os aborgenes do Brasil e das partes mais meridionais da Amrica do Sulabundam evidncias de que os amores homossexuais faziam parte das alternativas erticassocialmente aceitveis antes da chegada dos conquistadores portugueses. Entre os Tupinamb,

    que ocupavam a maior parte da costa brasileira, os ndios gays eram chamados de tibira, e aslsbicas de acoaimbeguira. Eis como so descritos no Tratado Descritivo do Brasil em 1587:

    No contentes em andarem to encarniados na luxria naturalmente cometida, somuito afeioados ao pecado nefando, entre os quais se no tem por afronta. E o que se serve

    20 SAHAGUN,B. Histria general de las cosas la Nueva Espaa. L.X, Cap.XI, apud Cardin,op.cit. 1984:15321 A intolerncia machista e a homofobia deste franciscano no deixa se ser surpreendente, pois alm dahomossexualidade ser conhecida durante toda a idade Mdia como vcio dos clrigos, dentre todas as OrdensReligiosas, a dos Franciscanos era exatamente a que mais devotos tinha do amor que no ousa dizer o nome.Boswell, op.cit. 1980; Mott, Luiz. Pagode Portugus: A Subcultura gay em Portugal nos tempos da Inquisio,Cincia eCultura, vol.40,fev.1980:120-139

    MURRAY, S.O. Male Homosexuality in Central and South America. New York, Gai Saber Monograph,n 5, 1987.Esta obra, que rene 9 artigos de diferentes especialidades sobre a homossexualidade latino-americana, inclusive umartigo de minha autoria Homosexuality Brazil: Bibliography particularmente til, pois apresente reviso crtica dostrabalhos histricos e antropolgicos clssicos, alm de dois lxicos sobre termos espanhis e portugueses para referir-se aos homossexuais.22 Requena, op.cit. 1945:3.23 KATZ,J. Gay American History. New York, Avon Books, 1976. Cf.reproduo da gravura de Theodore deBry(1591) onde se v hermafroditas empregados no transporte de pessoas (pg.431)24 CIEZA DE LEON,P. La Cronica del Peru. Calpe, Madrid, 1992, apud Requena, op.cit.17-18.25 CONNER, R.P. Blossom of Bone reclaiming the connections between homoeroticism and the Sacred. Harper SanFrancisco, 1993

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    de macho se tem por valente e contam esta bestialidade por proeza. E nas suas aldeias pelo

    serto h alguns que tem tenda pblica a quantos os querem como mulheres pblicas.26

    Eis como outro cronista, Gandavo, j em 1576 descrevia a conduta das mulheres-machos:Algumas ndias h que no conhecem homem algum de nenhuma qualidade, nem o consentiroainda que por isso as matem. Estas deixam todo o exerccio de mulheres e imitam os homens e

    seguem seus ofcios como se no fossem fmeas. Trazem os cabelos cortados da mesma maneiraque os machos e vo guerra com seus arcos e flechas e caa, preservando sempre nacompanhia dos homens. E cada uma tem mulher que a serve, com quem diz que casada. Eassim se comunicam e conversam como marido e mulher.27

    Provavelmente foram estas ndias ultra masculinizadas, as acoaimbeguira que seremvistas lutando contra os espanhis no Rio Maraon, foram confundidas com as legendriasAmazonas, mito que propagou-se por todo o Continente Americano, muito embora carecendo dequalquer evidncia confivel quanto sua veracidade.28

    Entre os nativos Guaicuru, pertencentes grande nao Guarani , residentes nas margensdo Rio Paraguai, ainda nos finais do sculo XVIII, eram encontrados ndios homossexuais quealm de tranvestirem-se, eram totalmente identificados com o estilo de vida do sexo oposto:

    Entre os Guaicurus e Xamicos, h alguns homens a que estimam e so estimados, aque se chamam cudinhos, os quais lhes servem como mulheres, principalmente em suaslongas digresses. Estes cudinhos ou nefandos demnios, vestem-se e se enfeitam comomulheres, falam como elas, fazem s os mesmos trabalhos que elas fazem, trazemjalatas,urinam agaxados, tm marido que zelam muito e tem constantemente nos braos, prezam muitoque os homens os namorem e uma vez cada ms, afetam o ridculo fingimento de se suporemmenstruados, no comendo mulheres naquela crise, nem peixe nem carne, mas sim de algumfruto e palmito, indo todos os dias, como elas praticam, ao rio, com uma cuia para selavarem.29

    guisa de concluso desta primeira parte, baseando-me nos principais estudos sobre ahomossexualidade na Amrica Latina, assim como em monografias antropolgicas e histricasconsagradas diferentes culturas desta regio, enumero a seguir a lista das etnias ndigenas, dopassado e do presente, sobre as quais h evidncia arqueolgica, histrica, etnogrfica ou

    lingstica, comprobatria da prtica do homossexualismo.30-Mxico: Albardaos, Cipacingo, Itza, Jaguaces, Panuco, Sinaloa, Sonora, Tabasco,

    Tahus,Tlasca, Yucatecas, Maias e Astecas.- Panam: Dairem, Panam

    -Colombia: Bogot, Cayos, Chinatos, Chitarero, Guaira, Gauticos, Laches, Lile, Kagaba,Kogi, Mosca, Matilones, Urabaes, Zamba.

    -Peru Camana:,Caares, Carauli, Chibchas, Chinchas, Chincamas, Conchuco, Guanuco,Huayllas, Manta, Peru, Picta, Quellaca, Tarama, Tumebamba e os nativos de Puerto Viejo, Isla daPlata, Isla da Puna, Sta Helena, San Miguel, Serranos.

    - Venezuela: Acchaguas, Bobure, Capechos, Carabina, Cari-

    26 SOUSA, Gabriel Soares. Tratado Descritivo do Brasil em 1587. S.Paulo, Companhia Editora Nacional, 1971:308334.27 GANDAVO, Pero Magalhes. Histria da Provncia Santa Cruz. Tratado da Terra do Brasil. (1576) S.Paulo,Editora Obelisco, 1964:56-91.28 MOTT, Luiz. Amazonas: Um mito e algumas hipteses, in Amrica em tempo de Conquista, Vainfas R. (Org.),Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor, 1992:33-3729 Revista do Instituto Histrico e Geogrfico Brasileiro, tomo13, 1850, p.358; TomoI, 1839, pg. 32-3330 Esta relao de tribos indgenas sobre as quais h evidncias etno-histricas sobre a prtica do homoerotismobaseia-se nas seguintes bibliografias: Foster, S. W. A Bibliography on Homosexuali ty among Latin-AmericanIndians, Cabirion, n 12, Spring/Summer 1985:17-19: Mott. Luiz. Homosexuality in Brazil: Bibliography, in MaleHomosexuality in

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    bes, Chiricoa, Ciparicote, Coquibacoa,- Bolivia: Chiguano,Wachipaeri- Chile: Araucanos, Mapuche, Patates- Brasil: Boror, Tupinamb, Guats, Banar, Wai-Wai, Xa-

    vante, Trumai, Tubira, Guaicuru, kaingaig, Nambiquara, Tenetehara, Yanomani, Mehinaku,Camaiur, Cubeo, Guaiaquil.

    II. A represso aos sodomitas na Amrica Latina colonial

    Raa sobre a qual pesa uma maldio e deve viver na mentira e no perjrio, visto quesabe ser tido punvel e vergonhoso, por inconfessvel, seu desejo, o que faz para toda a criatura amaiordoura.

    ( M. Proust, 1921)

    Apesar da sodomia ser considerada pela Cristandade como o mais torpe, sujo edesonesto pecado, punida como crime hediondo equivalente ao regicdio e traio nacional,

    merecedores os homossexuais da pena de morte na fogueira, no obstante tamanho tabu ediscriminao, poca das grandes descobertas, floresceu na Pennsula Ibrica intrpida eheroca sub cultura gay31 nalgumas partes mais vsivel e ousada do que a existente em paseseuropeus fora da esfera inquisitorial.32

    Malgrados antemas dos missionrios e primeiros cronistas contra os ndios praticantes domau pecado, a despeito da perseguio desencadeada pelos conquistadores e autoridades contratal crime - lembremo-nos do cruel genocdio praticado por Vasco Balboa, em 1513, o qual, no istmodo Panam, encontrado numeroso squito de nativos homossexuais, prendeu quarenta deles queforam devorados por ces ferozes, conforme narra Pietro Martire e retrata dramtica gravura dapoca.33

    Apesar da violenta homofobia capitaneada pela Inquisio, o certo que desde osprimrdios da colonizao, sodomitas europeus encontraram no Novo Mundo espao privilegiadopara a prtica do homoerotismo. A extenso e isolamento dos novos territrios, a nudez e maiorliberdade sexual dos nativos e escravos, a frouxido moral dos muitos desclassificados sociaisque vieram arriscar a sorte nas Amricas, ou para c foram degredados, so fatores que facilitarama propagao da homossexualidade nas novas conquistas. Acrescenta-se ainda outro elementofacilitador da homossexualizao notadamente da Amrica Portuguesa: 18% dos sodomitascondenados ao degredo pelo Tribunal do Santo Ofcio de Lisboa foram enviados para o Brasil,34 amaior parte deles reincidindo no vcio italiano.

    Salvo erro, o primeiro sodomita pblico e notrio a pisar nas Amricas de que temosnotcias foi o jovem portugus Estevo Redondo, criado do Governador de Lisboa, D. ManoelTelles, que arribou em Olinda, no nordeste brasileiro, em fevereiro de 1549, degredado parasempre.35

    31 TRUMBACH, R. Sodomite subcultures, Sodomitical roles and the Gender Revolution of the XVIIth recentehistoriography, Eighteehth-Century Life. N9, 1985: 109-12132 GERARD, K. Et allii.The Porshuit of Sodomy. Male homosexuality in Renaissance and Enligtenment Europe. NewYok, The Haworth Press, 1989. Carrasco,R. Inquisicin y represion sexual en Valencia, Laertes, Barcelona,1985.33 Balboa Indos nefandum sodomiae scelus committentes canibus obijcit dilaniandos.Cf.gravura no texto34 MOTT, Luiz. Justifica et Misericordia: A Inquisio Portuguesa e a represso ao nefando pecado de sodomia, inInquisio: Ensaios sobre Mentalidade, Heresias e Arte, A. Novinsty et allii (orgs.) So Paulo, EDUSP/Expressoe Cultura, 1992:703-738.35 Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Inquisio de Lisboa, Processo n352, 22-1-1547.

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    Em 1558 a vez do cirurgio Felipe Correia, inveterado fanchono com ntida tendnciacross-gender36 ser degredado para o Brasil: tinha fama de mulherigo por suas falas e jeitos,bufaro e paciente.37

    Estabelecida em 1536, a Inquisio Portuguesa nunca conseguiu instalar um tribunalautnomo em terras braslicas, diferentemente do que ocorreu com o Santo Ofcio de Indias, nolitoral colombiano. Infelizmente ainda no foi realizado um inventrio de todos os sodomitas latino

    americanos presos e processados por estes tribunais da Santa Inquisio. Temos notcia que jem 1548 foram registrados sete casos de sodomia na Guatemala, entre estes, o dicono JuanAltamiro, e seu cmplice, Frei Jos de Barrera, alm de um ndio, Juan Martin, que ao serencaminhado para a fogueira foi salvo devido a um distrbio provocado por quatro clrigos e outroscivis. Levantamentos parciais informam sobre a priso de 19 somtigos no Mxico em 1658: nadaconsta nas principais obras sobre a atuao inquisitorial no Peru e Chile no tocante ao abominvelpecado de sodomia.38 para o Brasil que conseguimos localizar o maior nmero de registrosdocumentais permitindo reconstituir com abundncia de detalhes, as principais caractersticas davivncia homossexual dos colonos a partir dos finais do sculo XVI.

    Entre 1591-1620, de um total de 283 culpas confessadas nas duas Visitaes que o SantoOfcio (da fez a diferentes Capitanias do Nordeste brasileiro, h registro de 44 casos de sodomia(15,5%), sendo, depois da blasfmia, o desvio mais frequentemente praticado pelos colonizadores.Dos denunciados, 61% eram brancos, 24% mestios de variegados fentipos, 9% negros e 6%

    ndios, predominando as relaes sodomticas entre parceiros de diferentes cores, os quaisocupavam toda a gama de profisses: de Governador Geral do Brasil, como Diogo Botelho, asacerdotes, senhores de engenho, funcionrios pblicos, militares, estudantes, feitores, criados,escravos, etc.39

    Tais relaes entre homossexuais de cores-classes diferentes muitas vezes antagnicas,nem sempre refletem a mesma lgica da dominao senhorial heterossexista, pois h vriosexemplos de ndios e negros que desempenharam o papel ativo ou quer na iniciativa da seduo,quer na prpria relao copulativa, conforme demonstrei em meu trabalho O Sexo Cativo:Alternativas erticas dos africanos e seus descendentes no Brasil Escravista.40

    Aps beneditino levantamento nos mais de quatro mil denncias, e 400 processos desodomia arquivados na Torre do Lombo de Lisboa, localizamos at o presente 283 denncias debrasileiros ou portugueses, residentes no Brasil, infamados de praticarem o pecado de Sodoma.Destes, 32 foram processados, sendo 11 condenados a remar nas gals del Rei, alguns por cinco

    anos, outros gals perptuas; 6 foram degredados para reas remotas da Colnia ou para frica.Embora nenhum sodomita destes presos pelo Santo Ofcio tenha sido condenado morte nafogueira, h registro da execuo dois homossexuais no Brasil colonial: em 1613, em So Lus doMaranho, por ordem dos invasores franceses, instigados pelos missionrios capuchinhos , umndio Tupinamb, publicamente infamado e reconhecido como tibira, foi amarrado na boca de umcanho sendo seu corpo estralhaado com o estourar do morteiro, para purificar a terra de suas

    36 DYNES, W. Homosexuality: A research guide. New York, Garland, 1987.37 Arquivo Nacional da Torre do Tombo, a Inquisio de vora, Processo n8874, 155338 MEDINA, J.T. Histria del Tribunal del Santo Ofcio de la Inquisicin en Mxico. Santiago, ImprentaElzeveriana, 1905.

    Chinchila Aguila, Ernesto. La Inquisicin en Guatemala, Edicion Ministerio de Educacin Publica, 1953Delgado, Paulino Castaeda y Hernandez Aparicio, Pilar. La Inquisicin de Lima (1570-1635), Madrid, EditorialDeimos, 1989VERRIL, A.H.La Inquisicin. Paris, Payot,1932MEDINA, J.T. Histria del Tribunal del Santo Ofcio de la Inquisicin en Chile. Santiago, Imprenta Ercilla, 1890, 2vol.39MOTT, Luiz. Escravido e Homossexualidade, in Histria e Sexualidade no Brasil, R. Vainfas (org.), S.Paulo.Editora Graal, 1986;19-40.40 MOTT, Luiz. O Sexo Proibido: Virgens, Gays e Escravos nas garras da Inquisio. Campinas, Editora Papirus,1989

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    maldades41. Em 1678, um segundo martir homossexual executado na Capitania de Sergipe delRei: um jovem negro, escravo, foi morto de aoites por ter cometido o pecado de sodomia.42

    Quanto s lsbicas, como em 1646 o Santo Ofcio Portugus deliberou excluir a sodomiafoeminarum da lista dos crimes pertencentes sua jurisdio, foi sobretudo nos finais do sculoXVI que as homossexuais femininas foram vtimas da sanha inquisitorial, mesmo assim, menosreprimidas que os homoerticos masculinos. Das 29 denncias de lesbianismo registradas no

    Nordeste brasileiro, entre 1591-1593, 5 receberam penas pecunirias e espirituais, 3 foramdegredadas e 2 condenadas a aoites pblicos.43Conforme j referimos, amor que no ousava dizer o nome teve seus adeptos em todas

    classes, raas e etnias do Brasil Colonial, sendo praticado tanto nas manses senhoriais, comonos casebres de escravos e livres pobres; nas casernas, igrejas e mosteiros masculinos efemininos; na zona rural e urbana, incluindo tanto interaes espordicas e fortuitas, comdiferentes parceiros, quanto relaes estveis, algumas por dcadas seguidas. Em meu estudoDesventurasde um sodomitaportugus no Brasil Seiscentista reconstruo a vivncia homossexualde um violeiro-mercador de fumo, Luiz Delgado e de seus numerosos amantes, primeiro em vora,no Reino, depois degredado para o Brasil, vivendo ora no Rio de Janeiro, ora na Bahia, ondeconcluo que malgrado a existncia de legislao draconiana tanto civil quanto cannica, contra ocrime de sodomia, houve espao na Amrica Colonial para o surgimento de uma incipiente sub-cultura gay, vezes, exibida e frentica,44 comportando inclusive o exibicionismo desafiador de

    travestis. O primeiro homossexual travesti que temos notcias no Brasil foi um negro natural doCongo, Francisco Manicongo, escravo de um sapateiro, residente em Salvador, denunciado naVisitao de 1591: recusava-se trazer vestido de homem que lhe dava seu senhor, [conservando]o costume dos negros gentios de Angola e Congo, onde os negros somitigos que o pecadonefando servem demulheres paciente, so chamados dequimbanda, os quais trazem um panocingido com as pontas por diante que lhes fica uma abertura diante...45. Tambm em Cuba hinformao de prticas homfilas entre os escravos nos engenhos de cana de acar.46

    Tambm ndios j batizados, vivendo nos arredores dos primeiros ncleos coloniais doBrasil, so apontados como sodomitas, assumindo alguns ofcios e posturas geralmente atribudasao sexo frgil, outras acusados de viverem como marido e mulher, como se amancebadosfossem47

    Tudo leva a crer que tambm nos demais pases latino-americanos, durante o perodocolonial, existiram no apenas cripto-sodomitas amorfos e isolados, mas um contingente no

    desprezvel de somticos que apesar de rotulados de maricas, eram suficientemente machospara exteriorizar suas preferncias invertidas atravs de gestos, roupas e adereos prprios de umsub-cultura sincrtica e sui-generis. para o Mxico, alm do Brasil, que dispomos dedocumentao comprovante de tal hiptese: no ano de 1658 foram denunciados 123 sodomitasvivendo na cidade do Mxico e seus arredores, dos quais 19 foram presos e 14 queimados. Umdestes escapou da fogueira por ser menor de 15 anos, recebendo contudo como castigo, 200aoites e 6 anos de trabalhos forados.48 Segundo contava a Alcaide do Crime da Nova Espanha,D. Sotomayor, opecado nefando tem mui contaminado estas provncias, diagnstico correto, poisdentre as mariquitas presas, constava alguns que por quarenta anos seguidos praticavamsomitigarias, se regalaban uns a otros, chegando a simular prenhez. Entre os denunciados

    41 MOTT, Luiz. A Inquisio no Maranho, ( no prelo)42 MOTT, Luiz. A Inquisio em Sergipe. Aracaju, Fundesc,198943 BELLINI, Ligia. A Coisa Obscura: Mulher, Sodomia e Inquisio no Brasil Colonial. S.Paulo, EditoraBrasiliense, 1989. Mott, Luiz. O Lesbianismo no Brasil. Porto Alegre, Ed. Mercado Aberto,198844 MOTT, Luiz. Relaes raciais entre homossexuais no Brasil Colonial Revista de Antropologia, USP, 1992, vol35: 169-190.45 MOTT,Luiz. Escravido e Homossexualidade, op.cit.1986: 19-40.46 FRAGINALS,M El Ingenio. Habana,Ed. Nuestra Historia, 1978:38447 MOTT, Luiz. Somitigos, Tibira e Quimbanda: A prtica do homossexualismo entre brancos, ndios e negros naBahia e Pernambuco nos sculos XVI e XVII, Comunicao apresentada na 33 Reunio da SBPC, Salvador, 1981.48 GUIJO, Gregorio. Dirio, 1648-1664. Ed. Manoel Romero deTerreos, Mxico, 1952, 2 volumes, apud De laSantidad a la Perversion,, S.Ortega (ed), Las Cenizas del Deseo, de Serge Gruzinski, Mxico, Enlace, EditorialGrijalbo, 1985:255-280.

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    predominavam os ndios, mestios, espanhis, mulatos e at mouriscos e portugueses.49 Dentreestes destacavam-se os domsticos ou escravos, seguidos dos estudantes e pequenoscomerciantes. Como ocorria na Pennsula Ibrica, tambm os somticos de Nova Espanhaassumiam traos e caractersticas do sexo frgil, trazendo vestidos de mulheres e tratando-se comnomes femininos: entre os setenciados havia um mulato apelidado Cotita; os mestios atendiampor La Zangarriana, La Estampa ,La Conchita; um alfaiate espanhol era La Luma, outro, LasRosas; o ndio Martin tornou-se La Martina de los Cielos e um negro atendia por La Morossa. 50 Eiscomo se comportava um destes somticos mexicanos:

    El dicho Juan de la Vega hera mulato afeminado... le ilamaban Cotita ( que es lomesmo que mariquita) y el dicho mulato se quebrava de cintura y traia atado en la frente dehordinario un paito ilamado melindre que usan las mujeres y en las aberturas de las mangasde um jubn blanco que traia puesto, traya muchas cintas pendientes y se sentava en elsuelonen un estrado como muger y hacia tortilhas y labada y guisaba.51

    Consta que aps este violento progrom de 1658, novamente em 1673 mais sete mulatos,negros e mestios de Mixcoac foram queimados, a tambm ficamos em dvida, se processadoscom todas as formalidades prprias do Santo Ofcio, ou por iniciativa das autoridades civis,considerando ser a sodomia crime de foro mixto.52

    Alm destes homossexuais mexicanos executados na segunda metade do sculo XVII,encontrei nos arquivos portugueses referncia a mais quatro sodomitas vivendo na AmricaEspanhola, at desconhecidos pela historiografia local. O primeiro episdio remete-nos ao Vice-Reino do Peru em 1598: Frei Joo de Valencuela era natural de Xerex (Sevilha), frade carmelitano,doutor em Teologia e missionrio do Peru, mestre e grande pregador. Ao retornar dos Andes, emBadajoz (Estremadura), foi preso pelos Familiares do Santo Ofcio portugus, acusado de dormirde portas trancadas com seu criado, o moo Joanilho,13 anos. No desenrolar da investigao, foiacusado de ser to puto quantos putos havia na Itlia, terra que no imaginrio ibrico da pocarepresentava a prpria reincarnao de Sodoma e Gomorra. Denunciaram mais: que apsmissionar no Peru e na Nova Espanha, na caravela em que retornou a Europa, por pouco no foi

    jogado no mar pelos marinheiros escandalizados, com medo de que Deus Nosso Senhorcastigasse-os com desgraas e naufrgios, em castigo pela devassido do frade somtigo. Apesarde alegar inocncia, dos Carmelitas de Castilha, obrigado ao jejum de po e gua todas as quartase sextas feiras.53

    Para o sculo XVII - representa o perodo de maior homofobia por parte da Inquisio -dispomos de mais de dois processos. Bartolomeu Martins de Moura, 40 anos, ouvires de ouro,parte de cristo-novo, preso em 1655, foi julgado no s por professar secretamente a Lei deMoiss, como por prticas sodomticas. No Santo Ofcio declarou ter vivido dois anos na cidade doMxico e em Vera Cruz, sendo na ocasio estudante talvez, colega de alguns daqueles 7estudantes setenciados naquela provncia em 1658.54

    Este ltimo caso relativo a um sodomita hispano-americano preso pela Inquisio deLisboa particularmente interessante, por reunir algumas especifidades. O re natural doMxico: Pedro Medina, 30 anos, soldado. Ostentava imagem masculina diferentemente de muitosoutros somticos afeminados:

    tinha rosto trigueiro, cabelo preto com gadelhas sobreos ombros, barba preta, estaturamediana. Vestia cales amarelos com riscas verdes, gibo riscado de negro, tudo coisa da

    ndia.55

    49 GRUNZINSKI, S.op.cit.1985:26650 Idem, ibidem, p.27251 Idem, ibidem, p.27452 Idem, ibidem,p.27853 Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Inquisio de vora, Processo n957 e n10618.54 Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Inquisio de Lisboa, Processo n7829, 1655.55 Arquivo Nacional da Torre doTombo, Inquisio de Lisboa, Processo n3710, 1657.

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    Seu pai era portugus, mudando para o Mxico onde servia de escudeiro a uma fidalga.Em Nova Espanha Pedro Medina nasceu, foi crismado na S do Mxico, sendo oficianteD.Francisco Manso. Nada informam os documentos sobre sua vida ertica na terra natal. Feitosoldado na armada castelhana, viajou por longnquos reinos do Oriente: Filipinas, Jacatar naIndia, China, caindo cativo dos mouros. Sofrendo violentos espancamentos de seu dono islamita,ento na Prsia, arrenegou Jesus Cristo, vivendo na Lei de Maom, at que foi resgatado peloscalvinistas holandeses, permanecendo preso num navio, na costa do Ceilo, por meses seguidos.Novamente livre, aps tantas peripcias, ao chegar em Lisboa, denunciado ao Santo Ofcio porum jovem de 20 anos, Manoel Rois, igualmente ex-prisioneiro dos batavos. Segundo este moo,nos 6 meses em que sob o jugo dos calvinistas, mantiveram mais de 120 cpulas sodomticas,metendo seu membro viril e derramado semente no vaso traseiro dele, confessante, e comconsentimento dele, cometeram mais 80 vezes o nefando pecado de sodomia, sendo PedroMedina o paciente.

    O re mexicano, por sua vez , ao ser preso, acrescentou que quando na India, tambmcometera o pecado de sodomia com um moo holands, Cornlio, sendo agente e paciente, umas vez, e com Joo Bautista, veneziano de 18 anos, prestaram culto Vnus Prepstera maistrs ocasies. Foi condenado aviltante pena dos aoites pelas pblicas de Lisboa e condenado a5 anos de gles - um local tentador para quem estava to acostumado a no resistir s pulseshomoerticas embalado pelas ondas do mar...

    III. Gays e lsbicas latino americanos hoje

    Com o fim das Inquisies Portuguesa e Espanhola, tambm na Amrica Latina soextintos os Tribunais do Santo Ofcio, em 1820 no Peru e Mxico, em 1821 em Cartagena e noBrasil.56 Extingue-se o Monstrum Horribilem mas infelizmente, como mentalidades no se mudamdecreto, at hoje persiste na Amrica Latina o espectro inquisitorial, no apenas na ideologiamoralista e intolerante, como na prpria composio das elites locais, cujas tradicionaisdescendem diretamente dos terrveis Familiares e Comissrios do Santo Ofcio.57

    Diversos pases latino-americanos, entre eles o Brasil, com a Independncia, porinspirao modernizante do Cdigo Napolenico, discriminalizaram a sodomia, deixando deconstar nos novos Cdigos Penais, muito embora persista entre ns, forte preconceito ediscriminao contra os praticantes desta variante amorosa. Sob alegao de atentado ao pudorou prtica da prostituio, incontvel nmero de pederastas foram chantageados, encarcerados etorturados pelos agentes da nova ordem policial. Apesar de muitos mdicos e cientistastrabalharem por retirar os invertidos sexuais das delegacias e prises, para tentar sua cura emseus ambulatrios e clnicas, na qualidade de ces de guarda da moral oficial, estes doutores, noaf de regenerar tais desvios, adotaram s vezes modernas formas de violncia, torturando asindefesas mariquitas com terapias doloridssimas que chegaram a incluir choques eltricos, dosescavalares de hormnios e perigosos produtos qumicos e at o transplante de testculos demacacos.58

    Suicdio, clandestinidade total, baixa estima, marginalidade, assassinatos, passaram a sero po de cada dia de milhares de uranistas latino-americanos, rechaados dentro de suasprprias famlias, humilhados nas ruas, barrados no acesso ao trabalho. Pesquisas levadas a cabono Brasil, pas considerado um dos menos homofbicos da Amrica Latina, revelam que dentretodas as minorias sociais, gays e lsbicas so os mais odiados, dio manifesto num continuumque inclui o insulto verbal, o tratamento depreciativo nos meios de comunicao, a violncia fsicanas ruas, priso arbitrria, os assassinatos59. No Mxico, at hoje gays so apelidados decuarenta e uno em aluso aos 41 maricones presos numa s noite no ano de 1901, os quais

    56 TESTAS, G.& Testas, J. A Inquisio. So Paulo, Difuso Europia do Livro, 1968:100, A Inquisio na AmricaEspanhola57 BENNASSAR, B. Aux origenes du caciquisme: Les Familiers de IInquisition en Andalousie au XVIIme sicle,Cahiers du Monde Hispanique et Luso-Brasilien, n727, 1976: 64-71.58 RIBEIRO, Leondio. Homossexualismo e Endocrinologia. Rio de Janeiro, Livraria Francisco Alves, 1938.59 Grupo Gay da Bahia: Violao dos Direitos Humanos de Gays e Lsbicas no Brasil. (no prelo).

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    foram submetidos a humilhantes castigos, obrigados a varrer as ruas da capital e lavar as latrinaspblicas.60

    Tambm na Argentina, nos anos 30, as festas reunindo homossexuais

    terminaban muchas veces son la irrupcin imprevista de la policia, sobre todo em lapoca en que era mas urgente la limpieza peridica de los vidrios de la jefatura, menester para

    el los vigilantes elegian simpre a losmaricas, obligados entonces a entregarsecon trapo, jabny agua la feminina pero nada agradable tarea.61

    Nos ltimos anos, a imprensa vem noticiando repetidamente o homicdio de centenas degays, lsbicas no Mxico, Colmbia, Equador62 e sobretudo no Brasil, onde h documentaocomprovando que nos ltimos 15 anos, mais de 1200 homossexuais foram violentamenteassassinados, vtimas de crimes homofbicos, perfazendo uma mdia de um assassinato dehomossexual a cada cinco dias.63

    Para reagir contra este verdadeiro genocdio e contra as no menos cruis discriminaesde que so vtimas mais de 10% dos latino-americanos homfilos64, em sintonia com oreconhecimento internacional de que a homossexualidade no doena nem desvio, mas umaorientao sexual to legitima, normal e saudvel quanto a heterossexualidade oubissexualidade,65 alguns anos aps a famosa rebelio gay ocorrida em Nova York em 1969,

    considerada o marco inicial e smbolo do moderno movimento homossexual internacional, tambmna Amrica Latina gays e lsbicas vm se organizando para ter os mesmos direitos humanos dosdemais cidados.

    Foi na Argentina onde se organizou o primeiro grupo de defesa dos direitos de gays elsbicas: em 1971 fundada a Frente de Liberacin Homosexual66 que passou a editar oprimeiro boletim homossexual do Continente do Sul, o Somos. Logo no ano seguinte so fundadosno Mxico duas entidades congneres: Sex-Pol e Frente de Liberacin Homosexual.67 Em 1978 a vez do Brasil entrar na luta pela cidadania dos homossexuais: nosso primeiro grupo gaychamou-se Somos, fundado em So Paulo e logo ramificado para outros estados da federao.Em 1979 uma faco deste grupo organiza o LF, Lsbico-Feminista,68 que passou a editar oboletim Chanacomchana. Quando da realizao do I Encontro Brasileiro de Homossexuais, em1980, j existiam mais de vinte grupos gays e lsbicos de norte a sul do pas: hoje ultrapassammeia centena.

    Peru tambm teve seu Movimento Homosexual de Lima (MHOL) fundado ainda nosincios dos anos 80, possuindo sede no centro da cidade onde presta assistncia psicolgica e

    jurdica aos homossexuais. Como os demais grupos aqui citados, com o surgimento da epidemia

    60 DYNES, W. Enciclopeia of Homosexuality. New York, Garland, 1990:80361 BAO, Daniel. Invertidos sexuales, Tortilleras and Maricas Machos: The Construction of Homosexuality in BuenosAires, Argentina, 1900-1950in De Cecco & Elia (orgs.), If your seduce a straight person can you make then gay?New York, The Harwoth Press, 1993:205.62 Bulletin of Internacional Gay and Lesbian Human Rights Comission, S. Francisco, 1993.63 Boletim do Grupo Gay da Bahia, n1-28, 1980-1994.64 com base no citado Relatrio Kinseyque costuma-se calcular em 6% as pessoas exclusivamente homossexuais,

    que ocupam os nmeros 5 e 6 da Escala Kinsey.65 Em 1985,o Conselho Federal de Medicina do Brasil excluiu a homossexualidade da Classificao Internacional deSade ratificou esta deciso, suprimindo no ltimo CID o pargrafo 302.0 que classificava o homossexualismo comodesvio e transtorno sexual66STUCKELMAN, Joey. Intercourse, Discourse and Identity: A study of the formation of Homosexual identitites under authoritarianism in Argentina and Brazil . Senior Thesis, Latin American Studies, Santa CruzUniversity, CA, 1992.66 LUMDSEN, Ian. in Homosexuality. Society and the State Mexico. Toronto, Canadian Gay Archives, 1991.67 MACAE, Edward. A construo da Igualdade. Identidade Sexual e Poltica no Brasil da Abertura. Campinas,Editora Unicamp, 1990;Trevisan, J.S.

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    da AIDS, tais entidades passaram a dedicar-se tambm preveno do HIV, contribuindo com osgovernos locais e com outras no-Governamentais (ONGs/AIDS) na preveno desta sndrome.69

    Colmbia possuiu nos incios da dcada de 80 a maior e melhor produzida revista gay daAmrica do Sul, Ventana Gay, alm do boletim De Ambiente, publicado ento pelo Colectivo delOrgullo Gay, sediado em Bogot. Segundo Spartacus Gay Guide, a principal publicaointernacional do gnero, existiram nos incios da dcada atual mais duas publicaes

    homossexuais em Bogot: Lambda Gay e Conotaciones. Segundo esta mesma fonte, em 1987,mais de 50 homossexuais foram assassinados neste homcidios atribudos a esquadres damorte.70

    Venezuela tambm teve sua organizao homossexual, hoje inativa: Grupo Entendido, oqual, em 1983, denunciou junto Anistia Internacional uma srie de maltratos praticados pelasforas policiais contra os freqentadores dos espaos gays locais.71

    Mxico, devido vizinhana com os Estados Unidos, onde o movimento homossexual extremamente forte e organizado, e graas ao contacto com os chicanos homfilos, pashispano-americano onde os gays e lsbicas esto mais organizados: j chegaram a realizarmanifestaes de rua com mais de quatro mil maricones & tortilleras. Alm de dezenas degrupos homossexuai, destacando-se o Grupo Orgullo Homossexual de Liberacin, Y Que!,Collectivo Sol, com atuao na Capital e em Guadalajara e Tijuana, dispem os atuaisveneradores da deusa Xochiquetzal de alguns servios de apoio, como o Centro Comunitrio Gay,

    Grupo para Alcotras e Neurticos Homossexuais, alm de um templo filial da MetropolitanCommunity Church, a primeira igreja homossexual do mundo.72

    H pases latino-americanos onde ainda persistem leis que penalizam os homossexuais:Nicargua, Cuba e Equador73, inviabilizando o surgimento de movimento organizado em defesa dacidadania dos gays e lsbicas. No Uruguai, Bolvia e Paraguai, e nos demais pases da AmricaCentral e Caribe, os homossexuais ainda no se organizaram para defender seus direitoshumanos. O Chile oferece motivo para reflexo: logo aps os anos lgubres da ditadura militar,surgiram alguns grupos bastante dinmicos, como Movimento Homosexual y Lesbico de Chile,o Colectivo Lesbico-Feminista. Em 1922, realizou-se em Santiago do Chile e 1 Encontro Sul-Americano de Grupos Gays e Lsbicos. Um detalhe auspicioso: este encontro contou com o apoiottico da Comunidade Quaker, um gesto histrico e pioneiro de respeito e solidariedade humanapartindo de uma entidade crist latino-americano.

    guisa de concluso

    O estudo da etno-histria da homossexualidade na Amrica Latina desde os tempos pr-colombianos at atualidade revela-nos de um lado o preconceito irracional e cruel contra umaminoria social, os gays, lsbicas e travestis - cuja identidade existencial e expresso afetivo-sexualforam secularmente considerados o mais grave pecado e crime mais hediondo, ambosmerecedores da morte.

    Ao resgatar esta micro-histria to marcada pela intolerncia e violncia, trs foram nossosobjetivos: primeiro, quebrar o silncio e desmistificar o tabu que ainda hoje persistem vis-a-vis ahomossexualidade, tornando-a tema srio merecedor de mais estudos e pesquisas pelasdiferentes reas do conhecimento cientfico; segundo, ao abordar a evoluo dahomossexualidade masculina e feminina neste meio milnio de histria latino-americana, tivemos

    como espao demonstrar a universalidade temporal e espacial desta manifestao humana,avanando no conhecimento emprico de certas reas culturais at ento pouco divulgadas nosmeios acadmicos: terceiro, tivemos como preocupao demonstrar que a homofobia, assim

    69 ARBORELA. Manoel. Social and sexual varience in Lima, in S.Murray, op.cit. 1987:101-1117.70 ARBORELA. Manoel. Social and sexual varience in Lima, in S.Murray, op.cit. 1987:101-111771 Idem, ibidem, p.990-99372Idem, ibidem, p .519.e.ss.60172 Idem, ibidem, p.122, 142, 601.

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    como o racismo e o machismo, so frutos podres de variegadas matrizes culturais que seexacerbaram em nosso triste passado escravista, e como tal, emergem como facetas de umaideologia perversa e desumana, que s poder ser superada atravs das luzes da cincia e pelobom senso dos cdigos internacionais de direitos humanos.

    Apesar do quadro ainda sombrio e das freqentes violaes dos direitos de cidadania doshomossexuais latino-americanos, tudo nos leva a crer que dias melhores comeam a brilhar para

    tal minoria social: at os incios do sculo passado, quando da extino do Santo Ofcio daInquisio, a homossexualidade era crime condenvel morte em todo Continente Latino-Americano. Hoje, a Amrica Latina caminha em sentido inverso: imitao do que ocorre adcadas nos mais civilizados pases do primeiro mundo, no Brasil, em 73 Municpios e em trsestados da Federao, as constituies locais proibem expressamente qualquer discriminaobaseada na orientao sexual. Ontem, era crime ser homossexual. Hoje o crime discriminar ohomossexual.

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