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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS FACULDADE DE CIÊNCIAS MÉDICAS MARCIELI CRISTINE DO AMARAL SANTOS ENTRE A VIVÊNCIA COM EDUCADORES E A PROPOSTA COM ALUNOS COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA): ESTUDO DE ATIVIDADES DE ARTE COM MATERIAIS PARA EXPLORAÇÃO SENSORIAL CAMPINAS 2015

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

FACULDADE DE CIÊNCIAS MÉDICAS

MARCIELI CRISTINE DO AMARAL SANTOS

ENTRE A VIVÊNCIA COM EDUCADORES E A PROPOSTA COM ALUNOS COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA):

ESTUDO DE ATIVIDADES DE ARTE COM MATERIAIS PARA EXPLORAÇÃO SENSORIAL

CAMPINAS

2015

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

Faculdade de Ciências Médicas

MARCIELI CRISTINE DO AMARAL SANTOS

ENTRE A VIVÊNCIA COM EDUCADORES E A PROPOSTA COM ALUNOS COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA): ESTUDO DE ATIVIDADES DE

ARTE COM MATERIAIS DE EXPLORAÇÃO SENSORIAL

Dissertação de mestrado apresentada ao Programa de Pós

Graduação da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade

Estadual de Campinas - UNICAMP para obtenção de título de

Mestra em Saúde, Interdisciplinaridade e Reabilitação, área de

concentração Interdisciplinaridade e Reabilitação

ORIENTADOR(A): PROF.ª DR.ª LUCIA HELENA REILY ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO

FINAL DA DISSERTAÇÃO DEFENDIDA PELA ALUNA

MARCIELI CRISTINE DO AMARAL SANTOS, E ORIENTADA

PELA PROF.ª DR.ª LUCIA HELENA REILY

_______________________________________ Assinatura do(a) Orientador(a)

CAMPINAS

2015

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DEDICATÓRIA

Ao meu pai Alvaro da Silva Santos (In memoriam).

A Roberto José Diniz, pelo apoio e incentivo.

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente quero agradecer a Deus por estar sempre ao meu lado, amparando-

me e me dando forças.

À minha mãe e meu irmão, pelo incentivo e pelo apoio, e, sobretudo, por torcerem e

rezarem por mim em todos os momentos difíceis desta caminhada.

À minha orientadora Profa. Dra. Lucia Helena Reily, pelo carinho, acolhimento,

paciência e disponibilidade, e por participar desta construção com toda a sua

competência.

Aos coordenadores, professores e colegas da Pós-Graduação em Saúde

Interdisciplinaridade e Reabilitação – FCM da Unicamp.

À Profa. Dra. Adriana Lia Friszman de Laplane e à Profa. Dra. Ana Angélica

Medeiros Albano pelas contribuições na banca de qualificação.

À Profa. Dra. Elizabeth dos Santos Braga, do departamento EDF – Departamento de

Filosofia da Educação e Ciências da Educação da USP, pela sua contribuição

teórica durante suas aulas e orientações sobre a minha temática.

À Profa. Ana Alice Francisquetti, por ter me orientado no estágio em Arte-

reabilitação – AACD e me ensinado sobre atuação com pessoas com deficiência.

À Profa. Regina Santos pela ajuda, incentivo e supervisão nos momentos do início

do trabalho de arteterapia com os autistas.

À Sra. Maria de Fátima Vasconcellos, pela confiança no trabalho de arteterapia com

os autistas na Escola de Educação Especial ABADS – Associação Brasileira de

Assistência e Desenvolvimento Social (antiga Pestalozzi – SP).

À Sra. Dáurea V. Uehara, pela colaboração e disponibilidade de ceder o espaço da

Vida – Escola Integrada de Educação Especial para a realização desta pesquisa.

A todos os educadores, estagiários, auxiliares, secretária, fonoaudióloga e

profissionais de serviços gerais que fizeram parte desta pesquisa.

A todos os alunos desta pesquisa e seus familiares por confiarem em meu trabalho.

À Profa. Ms. Thais Cristina Casson, pelo carinho, amizade e pela competência e

seriedade com que fez a correção desta Dissertação de Mestrado.

À minha amiga Sueli Antonusso, pelo carinho, amizade e incentivo.

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Por fim, agradeço ao meu esposo Roberto e à Floreca, minha gatinha, pela

compreensão nos momentos mais difíceis deste processo e por fazerem parte da

minha vida.

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RESUMO

Práticas artísticas podem contribuir para o desenvolvimento dos alunos com

Transtorno do Espectro Autista (TEA) em escolas especializadas. Entretanto, o tema

de artes com TEA ainda demanda estudos e capacitação de educadores para que

seu uso seja ampliado. Este trabalho visa estudar o processo de formação em

serviço de um grupo de educadores que atua com alunos com TEA – nível

moderado e severo –, com foco em práticas artísticas com materiais que possibilitam

a exploração sensorial. Trata-se de um estudo de natureza qualitativa, uma

pesquisa-ação, alicerçada na teoria histórico-cultural. Foi desenvolvida em uma

instituição de ensino que trabalha com alunos com TEA na cidade de São Paulo, SP.

Foram realizados encontros e oficinas de artes com os educadores, utilizando

alguns materiais. Em um segundo momento, os educadores realizaram as mesmas

atividades com os alunos. Foi investigado o processo de contato, exploração,

seleção e apropriação dos educadores, e das novas vivências com os materiais

como forma de promover a aproximação e o engajamento na atividade dos alunos

com TEA. Os alunos focalizados apresentavam significativas limitações de

linguagem, comportamentos restritos e pouco interesse nas propostas pedagógicas,

daí a importância de buscar e propiciar experiências sensoriais que fossem

estimulantes para eles. Tanto as oficinas dos educadores como as vivências dos

alunos foram gravadas, fotografadas, e registradas em diário de campo. Os dados

foram analisados de modo a perceber consonâncias e discrepâncias, visando

melhor compreender como a ampliação de repertório de educadores repercutiu nas

vivências que eles propuseram ao trabalhar com os alunos com TEA. Espera-se com

este trabalho contribuir com as pesquisas sobre a educação para TEA, focalizando

como os educadores podem trabalhar com materiais que permitem diferentes formas

de exploração sensorial de forma lúdica com os alunos com TEA, de nível moderado

e severo, tendo em vista a importância de estabelecer contatos significativos com o

mundo.

Palavras-chave: Oficinas de arte. Formação de professores. Transtorno autístico.

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ABSTRACT

Artistic practices can contribute to the development of students with Autism Spectrum

Disorder (ASD) in specialized schools. However, the subject of TEA with arts still

demands studies and teacher training in order to spread its use. This work aims to

study the process of in-service training of a group of educators who works with

students with ASD - moderate and severe level -, focusing on artistic practices with

materials that enable sensory exploration. It is a qualitative study, an action research,

based on historical and cultural theory. It was developed in an educational institution

working with students with ASD in São Paulo, SP. Meetings and art workshops were

held with educators, and some materials were used. At a second stage, educators

performed the same activities with students. It investigated the process of contact,

exploration, selection and acquisition of educators, the new experiences with the

materials as a way to promote the approach and engagement in the activity with TEA

students. The students focused on the study presented significant language

limitations, restricted behaviors and little interest in educational proposals, hence the

importance of seeking and providing sensory experiences that were exciting for

them. Both workshops of educators and the students' experiences were recorded,

photographed, and registered on a field diary. The data were analyzed in order to

understand consonance and discrepancies, to better understand how the expansion

of educators’ repertoire reflected on the experiences they proposed while working

with students with ASD. We hope this work contributes to the research on education

for ASD, focusing on how educators can work with materials that allow different forms

of sensory exploration in a playful way with students with ASD, moderate and severe

level, considering the importance of establishing significant contacts with the world.

Keywords: Art workshops. Teacher training. Autistic disorder.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Marlene amassa o papel celofane e escuta o som 84

Figura 2 – Marlene enrola os papéis celofane no braço 85

Figura 3 – Marlene abraça os papéis celofane no seu corpo 85

Figura 4 – Marlene salienta ao Tadeu sobre o som do papel celofane 86

Figura 5 – Tadeu dobra o papel celofane 86

Figura 6 – Marlene encapa o braço de Tadeu com papel celofane 97

Figura 7 – Marlene ajuda Tadeu a passar a mão revestida de papel

celofane no rosto

87

Figura 8 – Marlene dá um beijo em Tadeu, que está vestido com os

papéis celofane

88

Figura 9 – Gilberto, Marlene e Tadeu se abraçam 88

Figura 10 – Carla cria um balão com os papéis celofane 92

Figura 11 – Carla amarra o papel celofane na cabeça 92

Figura 12 – Júlio forma uma bola com os papéis celofane 94

Figura 13 – Pesquisadora dá dica de como amarrar a bola de papéis

celofane

94

Figura 14 – Carla amarra a bola confeccionada de papéis celofane 94

Figura 15 – Júlio chuta a bola de celofane para Carla 94

Figura 16 – Júlio chuta a bola de celofane para o gol 95

Figura 17 – Júlio comemora o chute que deu para Carla 95

Figura 18 – Carla conversa com a pesquisadora 102

Figura 19 – Denise tampa os olhos para não participar da atividade 105

Figura 20 – Carla esfrega a serragem na mão de Denise 105

Figura 21 – Carla balança e mostra a mão de Denise molinha 105

Figura 22 – Flor feita por Eleonora com serragem colorida 109

Figura 23 – Eleonora sente a textura da serragem colorida 110

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Figura 24 – Michel acrescenta a serragem organizadamente 111

Figura 25 – Bacia com serragem amontoada por cor 111

Figura 26 – Michel reclama para iniciar a mistura das cores 112

Figura 27 – Michel coloca a cabeça na serragem no chão 113

Figura 28 – Mandala da Elenice 117

Figura 29 – Mandala do Fabrício 117

Figura 30 – Bandeira do Brasil da Fabiana 117

Figura 31 – Flor da Janete 117

Figura 32 – Roberta mistura as cores das tintas no plástico bolha 119

Figura 33 – Roberta pinta o plástico bolha e estoura as bolhinhas 119

Figura 34 – Rodrigo estoura as bolhinhas antes de começar a pintar 120

Figura 35 – Roberta ensina Rodrigo como pintar no plástico bolha 120

Figura 36 – Rodrigo olha, ouve o outro educador elogiando-o e sorri 121

Figura 37 – Rodrigo expande a pintura no plástico bolha 122

Figura 38 – Roberta contorna o coração juntamente com o aluno 122

Figura 39 – Roberta convida o aluno para fazer uma flor 122

Figura 40 – Roberta convida o aluno para fazer a letra “R” 122

Figura 41 – Rodrigo passa e espalha a tinta nas mãos e sente a

textura

123

Figura 42 – Eleonora pinta em pé, com a ponta dos dedos das mãos 127

Figura 43 – Produção final de Eleonora 127

Figura 44 – Eleonora estoura o plástico bolha, pintando 128

Figura 45 – Lucila desenha a Galinha Pintadinha no plástico bolha

e escreve o número 4

129

Figura 46 – Coração do Fabrício 135

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Figura 47 – Bandeira da Fabiana 135

Figura 48 – Flor e Céu da Janete 135

Figura 49 – Fabrício mistura as cores de areia na caixa de areia 137

Figura 50 – Fabrício faz a cortina de areia 137

Figura 51 – Fabrício movimenta a mão de Bernardo para tocar na

areia

138

Figura 52 – Bernardo insere uma mão para tocar a areia caindo 139

Figura 53 – Bernardo insere as duas mãos para tocar a areia caindo 139

Figura 54 – Bernardo bate palmas e comemora 139

Figura 55 – Fabrício e a pesquisadora seguram o braço de Bernardo,

que está escapando da atividade

140

Figura 56 – Eleonora manuseia a areia colorida com a pazinha 144

Figura 57 – Leonel limpa os grãos de areia entre os dedos 145

Figura 58 – Leonel sente-se feliz ao manusear a areia colorida 146

Figura 59 – Leonel escreve com o rodinho na areia colorida 147

Figura 60 – Leonel escreve com o dedo na areia colorida 147

Figura 61 – Leonel comemora com a educadora a escrita na areia

colorida

147

Figura 62 – Roberta amassa a massinha caseira preparada com suco

de uva

153

Figura 63 – Leonardo experimenta a massinha 154

Figura 64 – Leonardo cheira a massinha 155

Figura 65 – Leonardo deita no ombro de Roberta e ela lhe dá um beijo 155

Figura 66 – Leonardo, encostado no ombro de Roberta, separa os

pedacinhos da massinha

156

Figura 67 – Leonardo transfere os pedacinhos de um monte para

outro

156

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Figura 68 – Leonardo termina de separar o montinho e Roberta

observa

157

Figura 69 – Elenice mistura a tinta guache na massinha caseira 159

Figura 70 – Elenice ensina Josué a fazer a tromba do elefante 161

Figura 71 – Josué soca a massinha 162

Figura 72 – Josué batuca na massinha 162

Figura 73 – Josué brinca com a massinha caseira 162

Figura 74 – Josué enrola a massinha 163

Figura 75 – Josué faz a cobrinha com a massinha 163

Figura 76 – Josué faz a letra “J” com a massinha caseira e comemora 163

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 Dados dos alunos 77

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AACD Associação de Assistência à Criança Deficiente

ABADS Associação Brasileira de Desenvolvimento Social

APA American Psychiatric Association

AVDs Atividades de Vida Diária

CAA Comunicação Ampliada e Alternativa

CNE/CEB Conselho Nacional de Educação/Câmara de Educação Básica

DSM Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais

EAD Educação a Distância

NEE Necessidades Educacionais Especiais

SUS Sistema Único de Saúde

TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

TEA Transtorno do Espectro Autista

TEACCH Treatment and Education of Autistic and Communication

Handicapped Children

TGD Transtorno Global do Desenvolvimento

TNT Tecido não tecido

ZPD Zona de Desenvolvimento Proximal

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SUMÁRIO

Agradecimentos ...................................................................................... vi

Lista de Figuras ....................................................................................... x

Lista de Tabelas ...................................................................................... xiv

Lista de Abreviações e Siglas ................................................................. xv

1 – INTRODUÇÃO .................................................................................. 18

2 – TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA – TEA............................ 24

2.1 Conceito............................................................................................. 24

2.2 Níveis de gravidade em TEA.............................................................. 25

2.3 Etiologia e diagnóstico....................................................................... 26

2.4 Prevalência do TEA............................................................................ 27

2.5 Comorbidades, alterações associadas.............................................. 28

2.6 Questões comportamentais............................................................... 30

2.7 Medicalização.................................................................................... 31

2.8 Comunicação do TEA........................................................................ 33

2.9 Problemas Sensoriais........................................................................ 34

3 – CENÁRIO DOS EDUCADORES....................................................... 37

3.1 Síndrome de Burnout ........................................................................ 37

3.2 Síndrome de Burnout com educadores de ensino especial .............. 39

3.3 Educador-cuidador ............................................................................ 41

3.4 Ampliação de estudos e apoio de outros profissionais ..................... 42

3.5 Aprendizado do alunado de educação especial e TEA ..................... 43

4 – POLÍTICAS PÚBLICAS E INCLUSÃO ESCOLAR DE ALUNOS COM TEA

48

4.1 Políticas Públicas .............................................................................. 48

4.1.1 Âmbito nacional .............................................................................. 48

4.1.2 Âmbito estadual .............................................................................. 49

4.1.3 Âmbito municipal ............................................................................ 50

4.2 Inclusão de TEA – caminhos a percorrer........................................... 50

5 – REFLEXÕES SOBRE ATIVIDADES DE ARTES NO CAMPO DO TEA .........................................................................................................

58

5.1 Pesquisas em arte e inclusão, e TEA ...............................................

59

5.2 O direito à participação em práticas expressivas ............................. 59

6 – ABORDAGEM HISTÓRICO-CULTURAL.......................................... 65

6.1 Desenvolvimento, aprendizado e brincadeira .................................. 67

7 – MÉTODO .......................................................................................... 73

7.1 Critérios de inclusão da pesquisa ..................................................... 73

7.2 Participantes ...................................................................................... 74

7.3 Materiais utilizados nas oficinas ........................................................ 78

7.4 Registro............................................................................................. 80

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7.5 Critérios para interpretação dos dados............................................. 80

8 – ANÁLISE E RESULTADOS ............................................................. 83

8.1 Material papel celofane..................................................................... 83

8.2 Material serragem colorida................................................................ 101

8.3 Material plástico bolha ...................................................................... 118

8.4 Material areia colorida....................................................................... 136

8.5 Material massinha caseira................................................................. 151

9 – CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................. 169

10 – REFERÊNCIAS............................................................................... 174

APÊNDICES

Apêndice 1 – TCLE – Educadores que atuam com TEA ........................

TEA......................................................

185

Apêndice 2 – TCLE – Pais e/ou responsáveis legais que atuam com

TEA...........................................................................................................

TEA.........................................

187

Apêndice 3 – Questionário com os educadores ...................................... 189

ANEXOS

Anexo 1 – Lista de sintomas do Transtorno do Espectro Autista de

acordo com os novos critérios oferecidos pelo DSM-5®

acordo com os novos critérios oferecidos pelo DSM-5® .......................

190

Anexo 2 – Níveis de gravidade para Transtorno do Espectro Autista

autista......................................................................................................

193

Anexo 3 – Parecer do Comitê de Ética e Pesquisa da Faculdade de

Ciências Médicas – UNICAMP.................................................................

194

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1 – INTRODUÇÃO

A comunicação, a música e as artes visuais interrelacionam-se em minha

trajetória: estudei piano, musicalização infantil, arteterapia, arte-reabilitação, arte e

inclusão, oficinas e formação de educadores. E ainda continuo a caminhar e

comunicar...

Na minha infância, entre seis e sete anos, iniciei meus estudos em piano

com professores particulares, até ingressar no Conservatório Musical Ernesto

Nazareth, e me formei pianista aos 15 anos.

Tive formação acadêmica na área de Comunicação Social, no curso de

Publicidade e Propaganda na Faculdade Armando Álvares Penteado (FAAP), e

posteriormente cursei Pós-Graduação Lato Sensu em Marketing na Escola Superior

de Propaganda e Marketing (ESPM). Trabalhei alguns anos na área de Marketing,

especificamente com eventos, feiras de tecnologia da informação e coordenando

ações de campanha publicitária e assessoria de imprensa. Retomei a área da

música alguns anos mais tarde, quando conheci o projeto “Vivendo Valores na

Educação - VIVE”, desenvolvido pela Brahma Kumaris, que contava com apoio da

Unicef /Unesco.

Este projeto capacitava educadores de creches, escolas, colégios e

prefeituras, resgatando valores humanos, utilizando oficinas com as linguagens

artísticas: artes visuais, teatro, música e dança. Participei de diversos treinamentos e

logo me tornei voluntária na divulgação e apresentação do projeto, utilizando

principalmente a música e as artes visuais nas oficinas com os educadores. Este

voluntariado foi de grande valia para o meu encontro com a educação, na

perspectiva de promover valores humanos, e linguagens artísticas em vivências e

oficinas.

Neste período, retomei a minha identidade como pianista e comecei a

atuar na área da educação musical, ministrando aulas de piano, teclado, teoria

musical em escolas e conservatórios musicais, e aulas de musicalização infantil em

creches, escolas particulares e Centros Educacionais Unificados (CEUS).

Na época do voluntariado, percebi a necessidade de me engajar no

campo da formação de educadores como área profissional. Com o anseio de me

instrumentalizar e conhecer as potencialidades que as atividades artísticas

proporcionam, direcionei os meus estudos por meio do curso de especialização em

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Arteterapia no Sedes Sapientiae em São Paulo. Realizei estágio em duas áreas:

inclusão e educação. Um estágio supervisionado muito significativo foi na

Associação de Assistência à Criança Deficiente (AACD), em arte-reabilitação,

atendendo crianças e adultos de diversas patologias, como: Paralisia Cerebral (PC),

Traumatismo Crânio Encefálico (TCE), Acidente Vascular Cerebral (AVC), Acidente

Vascular Encefálico (AVE), Mielomeningocele e Lesão Medular. O projeto específico

desenvolvido foi “A Música Clássica induz as crianças com Paralisia Cerebral a

expressarem seus sentimentos por meio da atividade plástica”.

A partir da especialização em arteterapia, comecei a atuar

profissionalmente em diversas instituições de educação especial com pessoas com

quadros de deficiência intelectual e de distúrbios emocionais e autismo.

Posteriormente, trabalhei como arteterapeuta na Escola da Associação

Brasileira de Desenvolvimento Social – ABADS (antiga Pestalozzi – SP) – com

alunos com Transtorno do Espectro Autista (TEA) de diversos níveis: severo,

moderado e leve, utilizando atividades terapêuticas com música e com pintura,

desenho, colagem, modelagem e construção.

Quando eu trabalhava na Escola ABADS, percebi a dificuldade em

proporcionar um repertório de atividades de artes que visassem a participação e

interação dos alunos com TEA de nível moderado e principalmente o severo. Tanto

os alunos quanto eu ficávamos frustrados com as propostas tradicionais que se

mostravam complexas demais para esta população. Eles não conseguiam se

engajar em atividades de releituras de obras de arte e de ilustração de contos que

eu propunha. Iniciei então uma pesquisa na literatura em busca de alternativas e

pouco encontrei sobre a prática de arte para alunos autistas com nível moderado e

severo.

Diante disso, iniciei uma supervisão em arteterapia e comecei a aplicar

materiais que permitissem diferentes formas de exploração sensorial de forma

lúdica, sem a preocupação da cobrança estética, de construção de representações

figurativas. Eu percebia a dificuldade de promover o jogo simbólico com os alunos

da Escola ABADS para construir um repertório mais próximo do que eu esperava,

conforme a minha experiência anterior. Entendi que a participação era melhor

quando usava materiais que promoviam contato sensorial direto, como: tinta a dedo,

serragem colorida, areia colorida, massinha artificial e caseira, gelatina, diversos

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tipos de papéis e outros. Assim como eu, percebi que os meus colegas educadores,

assistentes e auxiliares também demonstravam sua frustração diante do trabalho

com os alunos mais comprometidos, que não se envolviam nas atividades

pedagógicas costumeiramente propostas.

Quando falo das dificuldades de participação dos alunos com TEA nível

moderado e severo, refiro-me ao autismo associado à deficiência intelectual. Alguns

alunos apresentam também crises convulsivas não controladas com medicamento.

Essas crises incluem momentos de ausência eventuais de alguns alunos, mas

também crises severas tônico-clônicas mais esporádicas, que exigiam interrupção

da atividade para cuidados imediatos. Muitos alunos apresentam graves

comprometimentos na comunicação, ou seja, não se expressam pela oralidade. A

dificuldade de se fazer entender e de entender o que se espera deles gera

comportamentos de difícil manejo, em que os alunos buscam chamar a atenção por

outras vias, de expressão aguda de frustração (gritos, resistências, recusa...) e

isolamento. É difícil identificar o motivo do não interesse em atividades que

geralmente são motivadoras para outras crianças.

Também é difícil entender como alguns alunos com TEA se concentram

muito tempo em alguns objetos mas não reagem a outros. Alguns comportamentos

são muito descritos na literatura, como as estereotipias, o rodopio do próprio corpo,

girar objetos, flapping nas mãos, repetição de movimentos não interpretados como

funcionais. Na atividade de arte, tais ações podem impedir o contato com o mundo e

a participação social. A manipulação de brinquedos parece, muitas vezes,

caracterizar-se menos como uma brincadeira ou um jogo simbólico, e sim

predominantemente como um comportamento repetitivo sem a noção da função

esperada para o objeto em questão.

A extrema resistência à mudança de rotinas e a apresentação de hipo ou

hiper-reatividade ao toque, a dificuldade na exploração de materiais diversos

(papéis, texturas, tintas) e também a sensibilidade a determinadas sonoridades e

iluminação dificulta a participação, exigindo que o educador busque alternativas que

sejam melhores aceitas.

Um dos aspectos mais difíceis de lidar, conforme minha experiência, são

os comportamentos agressivos (auto e hetero), como bater e beliscar outras

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21

pessoas, e também bater a cabeça na parede, no chão, beliscar-se e morder a

própria mão ou outra parte do corpo. Alguns alunos apresentam hiperatividade,

andando ou correndo de um lado para o outro na sala de aula, sem cansar,

enquanto outros demonstram estranha apatia.

Outras dificuldades dizem respeito aos cuidados de higiene. Alguns

alunos apresentam controle dos esfíncteres tardio, usam fraldas, e necessitam de

apoio nas atividades de higiene e alimentação, inclusive cuidado para evitar ingestão

de materiais de arte (massinha, tinta, giz de cera).

Minha atuação como arteterapeuta na Escola ABADS, com os alunos com

TEA, levou-me a utilizar materiais de fácil manuseio e que proporcionassem um

contato inicial com a arte, fazendo com que os alunos pudessem explorar uma gama

de propriedades do tato (áspero, macio, liso, ondulado, pastoso, macio, frio, seco) e

da visão (materiais com diversas cores, formas e possibilidades de mistura). Além de

fazê-los sentir, percebi a necessidade de promover brincadeiras e transformações.

Ao realizar essas atividades uma vez por semana com os alunos com

TEA, percebi que mesmo aqueles alunos mais comprometidos interessavam-se e

participavam dessas propostas lúdicas. Os educadores que ficavam com os alunos

no dia a dia começaram a perceber que os alunos participavam mais e passaram a

realizar atividades semelhantes. A partir dessa experiência, entendi a necessidade

de me aprofundar nos conhecimentos sobre TEA para melhor entender as

necessidades dos meus alunos, enquanto também focalizava a contribuição que eu

poderia dar sobre a formação de educadores em serviço. Vislumbro que foi nesta

etapa que comecei a sentir a necessidade de realizar uma pesquisa para buscar

subsídios e repertórios para a prática em arte com alunos com TEA.

Nas instituições de educação especial, aprendi muito sobre a diversidade

de respostas da população atendida e sobre a necessidade de adaptar as propostas

de artes visuais e música considerando as limitações e possibilidades.

Concomitantemente, fui assumindo também a realização de um trabalho

com oficinas para educadores em diversos locais, como creches, escolas de

educação infantil e fundamental, Secretarias Municipais de Educação de Mogi das

Cruzes e Itaquaquecetuba, explorando diversos temas relacionados às artes visuais,

música, dança e inclusão.

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A experiência de criar vivências para os professores que ofereciam

oportunidades de expressão com materiais como a tinta a dedo, areia colorida, papel

celofane, plástico bolha, serragem de madeira e outros materiais instigou o meu

interesse em elaborar um projeto de pesquisa sobre as atividades de arte que

promovessem o uso dos diferentes sentidos. Constatei um despreparo dos

educadores, assistentes e auxiliares para lidar com os alunos com TEA de nível

moderado e, principalmente, severo, que apresentam pouca resposta às atividades

propostas. Eles têm dificuldade para criar estratégias que promovam o interesse,

envolvimento e a participação dos seus alunos. Alguns educadores nunca tinham

trabalhado com esta população e não conheciam muito sobre a patologia, nem

tinham recebido treinamento para lidar com estes alunos; não sabiam o que fazer,

quais as atividades e propostas de trabalho aplicar e por onde começar. Observei

que algumas propostas desenvolvidas pelos educadores eram, muitas vezes,

incompatíveis com as possibilidades de engajamento dos alunos. Percebi que

faltava aos educadores um repertório.

Verificando esta carência de material didático, ferramentas e atividades

pedagógicas, e a dificuldade dos educadores com esta população, resolvi propor

nesta pesquisa oficinas de artes com os educadores anteriormente à aplicação com

os alunos, utilizando os materiais que pesquisei e apliquei durante os anos em que

trabalhei na Escola da ABADS. Notei que a exploração sensorial de diversos

materiais coloridos, de várias texturas, poderia proporcionar um caminho de

interação entre as crianças e educadores, e ser uma via de contato, de

expressividade e de ludicidade para as crianças e adolescentes desses níveis.

O que proponho são momentos de reflexão com os educadores, para que

eles possam interagir com os materiais nas oficinas, de forma lúdica, e em nível

sensorial. Que possam agir com o corpo sobre esses materiais, o que já implica em

escolhas e expressão, para melhor entrar em diálogo plasticamente com os alunos.

Que contemplem as necessidades das crianças e adolescentes com TEA de níveis

moderado e severo. A ideia é partir do que esses alunos trazem, atentando para os

modos como esses alunos interagem com os materiais e como se expressam.

Diante dessa problematização, meu objetivo geral é: estudar o processo

de formação em serviço de um grupo de educadores que atua com alunos com TEA

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– nível moderado e severo –, numa instituição especializada, com foco em práticas

artísticas com materiais que possibilitam a exploração sensorial.

Ao acompanhar os modos como os alunos com TEA tomam contato com,

exploram, selecionam e utilizam materiais que possibilitam o manuseio sensorial,

pretendeu-se buscar suporte para subsidiar o planejamento de experiências

sensoriais que esses educadores poderão propor nas suas atividades como forma

de promover a aproximação e o engajamento com os alunos.

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2 – TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA – TEA

2.1 Conceito

Este estudo se insere no campo do autismo, com foco nas propostas de

atividades com materiais que possibilitam a exploração sensorial pensadas para a

educação de pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA).

O termo TEA faz parte de um grupo de transtornos ou distúrbios do

neurodesenvolvimento que acometem mecanismos cerebrais de sociabilidade

básicos e precoces, geralmente antes dos três anos de idade, interferindo nos

processos de desenvolvimento social, cognitivo e da comunicação (1).

Destaca-se ainda que o termo TEA agrupa transtornos de etiologias

múltiplas, diferentes graus de acometimento e a heterogeneidade das manifestações

comportamentais, referindo-se a uma possível natureza dimensional em que se

ampliam as fronteiras dos rótulos diagnósticos, interconectando diversas condições

(1).

De acordo com Lampreia, o autismo é concebido como

um transtorno do desenvolvimento de base biológica inata, embora sua etiologia ainda permaneça desconhecida. Caracteriza-se por uma tríade de prejuízos nas áreas de interação social e de comunicação e por padrões restritos e repetitivos de comportamentos, interesses e atividades, mas abrange um spectrum muito heterogêneo de quadros clínicos ou comportamentais (2:161).

A Associação de Psiquiatria Americana havia estabelecido e publicado

critérios para o diagnóstico do autismo, em 2002 (3), no formato DSM-IV-TR™.

Houve algumas reformulações na última versão de 2014 (4), o DSM-5® do Manual

Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais.

A primeira mudança neste manual é com relação à nomenclatura.

Autismo não está mais enquadrado na categoria de Transtorno Invasivo do

Desenvolvimento (TID), mas em uma nova categoria: Transtorno do Espectro Autista

(TEA). Não é apenas uma mudança de nome, e sim de classificação. Eliminam-se

as categorias específicas de Autismo, Síndrome de Asperger, Transtorno

Desintegrativo de Infância (TDI) e Transtorno Global do Desenvolvimento sem Outra

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Especificação (TGD-SOE). Todos passam a fazer parte do Transtorno do Espectro

Autista (TEA), cujos critérios diagnósticos sofreram alterações (4).

A tríade de sintomas nucleares (interação social, comunicação, padrões

restritos e repetitivos de comportamento, interesses e atividades), anteriormente

considerada, deu lugar para uma díade de sintomas nucleares (comunicação social

e interação social, padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou

atividades). Sob este último domínio houve a inclusão de critérios sensoriais (hiper

ou hiporreatividade a estímulos sensoriais ou interesse incomum em aspectos

sensoriais do ambiente), aumentando a relevância dos aspectos sensoriais para o

autismo, algo relevante no quadro dos alunos com TEA que participaram desta

pesquisa.

2.2 Níveis de gravidade em TEA

O DSM-5® discrimina três níveis de gravidade de acordo com prejuízos à

participação na vida social e familiar, como alterações significativas na comunicação

social verbal e não verbal, interação social e comportamentos restritos e repetitivos,

característico do TEA. Os níveis de gravidade são aqueles que 1) exigem apoio, 2)

exigem apoio substancial, e 3) exigem apoio muito substancial. (ver o Anexo 2)

O nível 1, “exigindo apoio”, representa o nível mais leve e caracteriza-se

pela necessidade de menor grau de apoio. Podem ocorrer déficits na comunicação

social, incluindo dificuldade para iniciar interações sociais e exemplos claros de

respostas atípicas ou sem sucesso a aberturas sociais dos outros. Pode parecer

apresentar interesse reduzido por interações sociais. Os comportamentos são

percebidos como restritos e repetitivos; a pessoa com TEA pode se mostrar pouco

flexível diante de mudanças e acontecimentos fora da sua rotina ou expectativa.

Para algumas pessoas, a organização e planejamento das suas atividades podem

afetar a sua autonomia plena (4).

O nível 2, “exigindo apoio substancial”, é entendido como o nível

moderado, em que as pessoas com TEA apresentam grandes prejuízos nas

habilidades de comunicação social tanto no nível verbal quanto no nível não verbal.

Pode haver pouca resposta nas interações sociais iniciadas pelo outro e, da mesma

forma que no nível 1, alterações na rotina e situações não previstas, em vários tipos

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de contextos sociais, podem gerar grande sofrimento e dificuldade de corresponder

a tais situações de maneiras socialmente adequadas (4).

O nível 3, “exigindo muito apoio substancial”, é considerado o nível

severo. Este nível caracteriza-se por significativo prejuízo no funcionamento social

devido aos déficits graves nas habilidades de comunicação social. A iniciativa

própria nas interações sociais é muito pequena, geralmente acontecendo com

objetivo de atender a alguma necessidade. Com relação aos comportamentos

restritos e repetitivos, há extrema dificuldade em lidar com aquilo que sai da rotina

ou não é esperado, gerando grande ansiedade (4).

A questão dos níveis de gravidade é significativa para esta pesquisa

porque trabalhamos somente com alunos do nível moderado e severo.

Enquanto a DSM-IV-TR™ indicava que a manifestação de sintomas

(atrasos ou funcionamento anormal em interação social, comunicação

social/linguagem e/ou jogo simbólico ou imaginativo) deveria ocorrer antes dos três

anos de idade, no novo documento temos mudanças que são indicadas no critério

C:

os sintomas devem estar presentes precocemente no período do desenvolvimento (mas podem não estar totalmente manifestos até que demandas sociais excedam as capacidades limitadas, ou podem ser mascarados por meio de estratégias aprendidas ao longo da vida) (4:50).

Para o presente estudo, optei por me basear no DSM-5®, embora haja

outros sistemas de diagnóstico utilizados para classificação de autismo, como o CID-

10 (Classificação Internacional de Doenças), no qual o autismo infantil é conceituado

como um Transtorno Global do Desenvolvimento com características específicas.

2.3 Etiologia e diagnóstico

Até o presente momento, os pesquisadores não identificaram uma única

etiologia para o TEA e não há diagnóstico laboratorial, genético ou exame

neurológico específico para definir o diagnóstico. Apesar de termos evidências de

anormalidades do neurodesenvolvimento vinculadas ao autismo, e também

identificação de fatores genéticos, biológicos, ambientais que parecem contribuir

para a exibição de certos sintomas ou características, o processo da construção do

diagnóstico na prática não é simples (5). Atualmente, o instrumento chave utilizado

para a determinação do diagnóstico é o DSM-5®, que apresenta os critérios básicos.

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Silva e Mulick (5) citam que um número cada vez maior de profissionais

têm indicado que a avaliação do diagnóstico deve ser feita por uma equipe

interdisciplinar, incluindo pelo menos um neuropediatra e um psicólogo com

especialização em distúrbios do desenvolvimento. Recomendam também entrevista

clínica com os pais ou responsáveis para averiguar sobre a história social e familiar

da criança, a história médica da criança, a história do desenvolvimento da criança,

os instrumentos auxiliares de diagnóstico, além da avaliação médica e psicológica.

2.4 Prevalência do TEA

O TEA vem ganhando maior visibilidade, principalmente nas últimas

décadas. Dentre as principais razões para este aumento, tem-se: a maior

conscientização de clínicos e da comunidade sobre as manifestações da pessoa

com TEA; os critérios diagnósticos mais precisos e um número maior de pessoas

que pode ser diagnosticado dentro da categoria da pessoa com TEA; melhor

detecção de casos sem deficiência intelectual; aumento de estudos epidemiológicos;

melhora nos serviços de atendimento a esta população; mudanças nas

metodologias dos estudos, como na idade da amostra e nos critérios diagnósticos

(6). Também não posso deixar de citar a articulação de líderes dos movimentos da

sociedade civil pelos direitos das pessoas com TEA, em grande parte formados por

pais e mães, que há muitos anos vêm lutando por esta causa e que estão

atualmente divulgando suas necessidades e anseios.

Estudos atuais realizados em países desenvolvidos apontam a melhor

estimativa de prevalência de 6 a 7 casos por 1.000 habitantes (uma criança para

cerca de 150 crianças) (7).

Outro dado relevante é do Center for Disease Control and Prevention

(CDC) dos EUA, que estimou para 2008 que a prevalência global do TEA foi de 11,3

por 1.000 (um em 88) em crianças de oito anos (8).

Ressalto que há maior incidência de TEA em meninos do que em

meninas, na proporção de quatro meninos para cada menina (9).

No Brasil, os estudos sobre a prevalência dos indivíduos com TEA são

escassos; também não foram incluídos nos dados demográficos do IBGE no

documento “Características Gerais da população, religião e pessoas com

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deficiência”, de 2010, no qual é apenas citada a deficiência mental e intelectual,

salientando: “não se considerou como deficiência mental as perturbações ou

doenças mentais como autismo, neurose, esquizofrenia e psicose” (10:28). No

Primeiro Encontro Brasileiro para Pesquisa em Autismo (EPBA), Fombonne (11)

estimou uma prevalência de aproximadamente 500 mil pessoas com autismo em

âmbito nacional, baseando-se no Censo de 2000.

A Secretaria Municipal da Pessoa com Deficiência e Mobilidade Reduzida

apresentou, no final do ano de 2012, os dados preliminares do Censo-Inclusão,

levantamento para identificar, mapear e cadastrar o perfil socioeconômico das

pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida, no âmbito do Município de São

Paulo. Dentre deficiências identificaram-se:

Deficiências mental e intelectual - Total: 8.152

• Autismo: 10,61% (865)

• Deficiência intelectual / mental: 94,25% (7.684) (12)

Cito um único estudo sobre prevalência no Brasil, que é o de Paula, et al,

(13); trata-se de pesquisa piloto transversal sobre a epidemiologia dos TEA, com

uma população de 1470 crianças entre 7 e 12 anos de idade, de um bairro de

Atibaia (São Paulo), em que se estimou uma prevalência de 27,2/10.000 ou

aproximadamente 0,3%.

2.5 Comorbidades, alterações associadas

A deficiência intelectual é uma condição complexa muitas vezes

associada ao quadro de TEA.

A American Psychiatric Association (APA) apresenta como diagnóstico

diferencial da deficiência intelectual com TEA e afirma que é comum entre pessoas

com transtorno do espectro autista.

Sua investigação pode ser complicada por déficits sociocomunicacionais e comportamentais, inerentes ao transtorno do espectro autista, que podem interferir na compreensão e no engajamento nos procedimentos dos testes. Uma investigação adequada da função intelectual no transtorno do espectro autista é fundamental com reavaliação ao longo do período do desenvolvimento, uma vez que escores do QI no transtorno do espectro autista podem ser instáveis, particularmente na primeira infância (4:40).

Fombonne (14), em uma de suas pesquisas, nos apresenta que a

proporção mediana dos indivíduos com TEA sem deficiência intelectual é de 30% e,

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com deficiência intelectual, 70%, sendo que os valores correspondentes são de que

30% dos indivíduos com TEA têm deficiência intelectual leve a moderada, e 40%

têm deficiência intelectual grave a profunda.

A substituição do termo retardo mental por deficiência mental ou

deficiência intelectual foi estipulada por uma Lei Federal dos Estados Unidos.

Atualmente o Brasil tem adotado a terminologia e a definição de deficiência

intelectual indicada pela American Association on Intellectual and Developmental

Disabilities (AAIDD), que defende a mudança de terminologia de retardo mental para

deficiência intelectual (15).

Veltrone e Mendes (16) chamam nossa atenção para o fato de que a

própria legislação brasileira é ainda vaga ao adotar a nomenclatura da deficiência

intelectual e comentam que:

apesar de defender um conceito teórico, não define os demais procedimentos para se lidar com esta questão, tal como avaliação para identificação, avaliação para ensino e aprendizagem e avaliação para definição do atendimento educacional. Veltrone e Mendes (16) apud Veltrone e Mendes (15:368).

A APA define a deficiência intelectual (transtorno do desenvolvimento

intelectual) como:

um transtorno com início no período do desenvolvimento que inclui déficits funcionais, tanto intelectuais quanto adaptativos, nos domínios conceitual, social e prático (4:33).

A APA classifica os níveis de gravidade em leve, moderada, grave e

profunda, que são definidos com base no funcionamento adaptativo, determinando o

nível de apoio necessário (4).

Outra definição de deficiência intelectual que consultei também é da

American Association on Mental Retardation – AAMR – que validou a nomenclatura

deficiência intelectual em agravo ao retardo mental definindo-a como:

Incapacidade caracterizada por limitações significativas no funcionamento intelectual e no comportamento adaptativo, como expresso nas habilidades práticas, sócias e conceituais, originando-se antes dos dezoito anos de idade. (17:?) apud (15).

As autoras Veltrone e Mendes destacam que mesmo a deficiência

intelectual tendo diversas definições e terminologias, há uma circunstância em

comum:

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trata de uma condição que nem sempre é identificada num primeiro momento e acaba estando ligada a um déficit do indivíduo (social, intelectual, funcional, comportamental) em relação a uma norma e, consequentemente, de comparação entre pares e semelhantes (15:363-364).

Quanto às avaliações médicas nas pessoas com TEA, é bastante

necessária a verificação de algumas comorbidades.

Fatores médicos usualmente investigados incluem distúrbios de ordem

neurológica (como epilepsia, convulsões, esclerose tuberosa), metabólica

(como erros inatos em aminoácido, carboidrato, peptídios, metabolismo

motocondrial, intoxicação por chumbo) e genética (como a síndrome do X

frágil e outras mutações genéticas especialmente nos cromossomos 7 e 15)

(18) [...] problemas sensoriais (visão, audição), problemas particulares de

linguagem (dispraxia verbal, disartria, apraxia) bem como dificuldades

alimentares e de sono (5:125-126).

2.6 Questões comportamentais

Crianças com autismo frequentemente apresentam problemas de

comportamento, como hiperatividade ou passividade incomum, inflexibilidade a

mudanças ambientais, realização de rituais repetitivos, estereotipias motoras (bater

os braços como se fossem asas – “flapping”), nervosismo e risos sem motivo, muitas

vezes bastante severos, que incluem:

hiperatividade, dificuldade de prestar e/ou manter atenção, atenção

hiperseletiva (i.e. tendência a prestar mais atenção nas partes/detalhes do

que no todo) e impulsividade, bem como comportamentos agressivos,

autodestrutivos, perturbadores e destrutivos (5:120).

Destaca-se uma pesquisa de Durand (19) sobre os comportamentos

agressivos, desafiadores, e também os autodestrutivos que os autistas apresentam,

como dar tapa em seu próprio rosto, bater com a cabeça na parede, morder a mão e

sua relação com os prejuízos da linguagem e a sociabilização. Esses

comportamentos são uma forma de comunicação importante expressa pelos autistas

que merecem ser considerados e interpretados, pois, como eles têm a comunicação

pobre, acabam encontrando maneiras para: indicar a necessidade de auxílio e

atenção, obter objetos desejados, se livrar de atividades e situações que causam

sofrimento e que são indesejáveis (19).

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Crianças com maior comprometimento apresentam “acessos de ira” com

relação à reação às exigências de cumprir uma tarefa, alterações de rotina ou

eventos inesperados (1).

A frustração total, a incapacidade de se comunicar ou a falta de

compreensão podem levar a explosões de agressividade como: jogar-se no chão,

gritar, chorar, bater com a cabeça, bater nos outros etc. As pessoas com TEA e com

deficiência intelectual severa podem morder as próprias mãos ou punhos – levando

até o sangramento e à formações calosas; cutucam excessivamente a pele,

arrancam o cabelo, batem no peito ou golpeiam-se (1, 5).

Silva e Mulick (5) salientam que podem ocorrer problemas neurológicos

nos indivíduos com TEA, como a epilepsia. Eles citam que, de acordo com os

estudos de Barbaresi et al (18) e Newson & Hovanitiz (21), as pessoas com TEA

podem desenvolver durante a infância ou adolescência transtornos convulsivos ou

epilepsia.

Destaco também a comorbidade dos problemas de alimentação que os

indivíduos com TEA apresentam. Alguns têm uma dieta hiperseletiva, insistem em

comer uma pequena seleção de alimentos, recusam-se a provar alimentos novos, o

que pode levar até à desnutrição. Eles podem ter aversão a determinados alimentos,

devido à textura, odor ou cor, e as crianças com comprometimentos mais graves

algumas vezes se alimentam de coisas não comestíveis (condição denominada

como pica), que frequentemente podem levar à intoxicação (1, 5).

Outro problema apresentado pela pessoa com TEA durante a infância são

distúrbios no sono, com “padrões erráticos de sono com acordares frequentes à

noite por longos períodos” (1: S-8).

2.7 Medicalização

Uma questão bastante presente no atendimento a pessoas com TEA é a

prescrição de medicamentos para controlar a epilepsia, diminuir os distúrbios

comportamentais – como as estereotipias, agressividade e automutilação –, os

comportamentos obsessivos, ansiedade, alterações de sono, e hiperatividade.

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Nikolov et al (22:S40) nos dizem que “não existem atualmente,

tratamentos medicamentosos-padrão disponíveis, que tratem os sintomas nucleares

do autismo”.

Os autores também citam as intervenções farmacológicas:

Geralmente têm como alvo sintomas específicos que acompanham os sintomas nucleares e que incapacitam gravemente o funcionamento do indivíduo, comumente não permitindo que ocorram intervenções educacionais e comportamentais de “primeira linha” (e.g. agressão, comportamento autodestrutivo, rituais compulsivos, baixa tolerância à frustração com acessos explosivos, hiperatividade, etc.) (22:S40).

Gadia, et al (23) acentuam que a utilização de medicamentos no autismo

ainda é principiante. Os autores ressaltam que para o tratamento de distúrbios

comportamentais dos autistas, o neuroléptico haloperidol é a medicação mais

utilizada, pois ela diminui consideravelmente a agressividade, estereotipias e

comportamentos automutilantes. Eles também destacam os antipsicóticos atípicos

(olanzepina, quetiapina e ziprazidona) que podem contribuir com a irritabilidade,

agressividade e hiperatividade das pessoas com TEA.

Soorya et al (24) pesquisaram sobre os tratamentos psicofarmacológicos

para um dos sintomas nucleares do TEA, que são os comportamentos restritivos,

repetitivos e perfil de interesses estereotipados (CRRE), os quais são pouco

estudados, comparados aos outros sintomas como a comunicação e a linguagem.

As autoras comentam que vários fatores contribuem para a ausência de atenção a

esse sintoma. Um deles é devido a esses sintomas (comportamentos restritivos,

repetitivos e perfil de interesse estereotipados) ocorrerem tanto em crianças sem

alterações no desenvolvimento neuropsicomotor, quanto em crianças com TEA. Elas

também relataram que pesquisas recentes mostraram que esses sintomas são mais

acentuados e frequentes em crianças com TEA do que em crianças ditas

normotípicas.

Os relatos de Bushsbaum, et al (25), apresentados pelos autores Gadia,

et al (23), sobre os inibidores seletivos da captação de serotonina:

fluoxetina, fluxoxamina, paroxetina, sertralina e citalopram, têm sido usados em autistas na tentativa de diminuir comportamentos obsessivos, rituais e estereotipia com eficácia variável, e em geral, são bem tolerados (23:S90).

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Os anticonvulsivantes são geralmente utilizados no tratamento de

crianças e adultos com TEA devido à alta incidência de convulsões (22).

Uma outra medicação é o Risperidona, que é citada na pesquisa de

Nikolov, et al (22), a qual foi utilizada com crianças e adolescentes com TEA que

tinham graves acessos de ira, agressão e/ou comportamento automutilatório. Esse

estudo apontou que houve uma melhora significativa na hiperatividade e nas

estereotipias, porém com pouca evidência de benefícios nas características

nucleares do autismo a curto prazo.

No início de 2015, o Sistema Único de Saúde – (SUS) incorporou o

oferecimento do primeiro medicamento para tratar os sintomas do autismo –

Risperidona. A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que no Brasil o

número alcance dois milhões de pessoas com a síndrome do TEA (26).

Ressalto as questões da deficiência intelectual, dos comportamentos, da

epilepsia, das alterações na alimentação, no sono, e também as medicações, devido

ao fato de os alunos da pesquisa apresentarem tais comorbidades e alterações, que

demandaram cuidados no planejamento das atividades durante o estudo.

2.8 Comunicação do TEA

As pessoas com TEA apresentam dificuldades e alterações na habilidade

de comunicação. Alguns são mudos totalmente, outros desenvolvem uma linguagem

pouco funcional e espontânea, apresentando limitação extrema das competências

de conversa e discurso.

Rivière aponta sobre as funções comunicativas para com as pessoas com

espectro autista:

Nos níveis mais afetados, não sabem sequer como manejar as pessoas para conseguir efeitos desejáveis do mundo físico. Nos intermediários, carecem de competência necessária para desenvolver as atividades comunicativas cuja finalidade essencial é compartilhar a experiência interna. Nos menos alterados, os quais já conseguem realizar funções comunicativas que permitem compartilhar experiência, a comunicação é uma atividade difícil (27:244).

Considerando ainda as alterações na linguagem dos indivíduos com TEA,

destaco alguns pontos, como substituição do pronome “eu” pela terceira pessoa

pronominal; linguagem na forma imperativa e ausência das declarativas; presença

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de ecolalias imediatas, repetindo algo que acabou de ser dito, e ecolalias tardias ou

remotas, que são palavras ou expressões que são reproduzidas dos meios de

comunicação ou de outras pessoas; estereotipias verbais, como expressar sons ou

palavras automaticamente e sem finalidade (28).

Com relação aos transtornos qualitativos de linguagem receptiva dos

indivíduos com TEA, há alguns deles que nunca respondem à interação verbal,

parecendo não ouvintes; apresentam dificuldades em entender metáforas, ironias,

refrãos, não compreendem a linguagem abstrata (27, 20), mas apresentam

compreensão literal e pouco flexível dos enunciados.

Rivière (27) se refere às dificuldades de pessoas com autismo para imitar

e realizar o jogo simbólico, aspectos importantes do desenvolvimento.

2.9 Problemas Sensoriais

Respostas incomuns a estímulos sensoriais são descritas desde o

começo da história do autismo. Tanto Kanner, em 1943, quanto Asperger, em 1944,

descreviam reações bizarras de seus pacientes com relação aos sons, toques,

cheiros, estímulos visuais e paladar.

Hatch-Rasmussen (29) aborda o autismo como uma desordem dos

sentidos, em que cada sentido opera de forma isolada, e o cérebro não consegue

integrar e organizar os estímulos de modo a obter um significado.

As crianças e os adultos com autismo, bem como aqueles com outras

deficiências de desenvolvimento, podem apresentar um sistema sensorial

disfuncional. Às vezes, um ou mais sentidos são hiper ou hipo reativos à

estimulação. Tais problemas sensoriais podem ser a principal razão para

comportamentos como balanço, giro, e flapping (29).

O pesquisador Baranek (30) cita em seu artigo que vários estudos

demonstram efeitos positivos das intervenções sensoriais e motoras na redução

primária de comportamentos aberrantes na população de TEA .

Caminha e Lampreia explicam sobre a hipo ou hipersensibilidade:

Indivíduos autistas geralmente mostram hipo ou hipersensibilidade que pode ser experimentado em todas as modalidades sensoriais. Um limiar sensorial elevado é característica de hipossensibilidade, enquanto que um limiar sensorial baixo é característica de hipersensibilidade (31:234).

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As autoras Caminha e Lampreia (32) comentam sobre as duas

estratégias de respostas diferentes que os autistas com hiposensibilidade sensorial

podem apresentar: a primeira é a passivo, (de baixo registro), que é quando por

exemplo, eles não reparam em alguém que entra no quarto ou quando suas mãos e

face estão sujas. A segunda é a ativo (busca sensações), que é quando, por

exemplo, eles têm comportamentos impulsivos e realizam movimentos como rodar,

balançar, escalar, fazer sons com a boca, tocar nos objetos, sentir a vibração da

música, cheirar flores e usar perfumes.

Elas comentam também sobre as duas estratégias presentes nas

respostas possíveis dos indivíduos com hipersensibilidade: a passivo (sensibilidade

sensorial) que são aqueles que são facilmente distraídos por sons, cheiros,

movimentos. Por exemplo, nas roupas, eles incomodam-se com o tecido, as

etiquetas. Com relação ao paladar, percebem facilmente o sabor, o tempero e a

temperatura da comida. A outra estratégia é o ativo (evita sensações), que é quando

o autista apresenta resistência, não participa em atividades, não consegue ficar em

ambientes agitados e cria rotinas e rituais para reduzir a ocorrência de estímulos

(32).

De acordo com Klin, o aspecto do estímulo sensorial está presente nas

pessoas com TEA nas seguintes situações:

Tanto a hiper quanto a hipossensibilidade aos estímulos sensoriais são típicos das crianças com autismo; as crianças com autismo podem ser muito agudamente sensíveis a sons (hiperacusia), tapar os ouvidos ao ouvir um cão latir ou o barulho de um aspirador de pó. Outras podem parecer ausentes frente a ruídos fortes ou a pessoas que as chamam, mas ficam fascinados pelo fraco tique-taque de um relógio de pulso ou pelo som de um papel sendo amassado. Luzes brilhantes podem causar estresse, ainda que algumas crianças sejam fascinadas pela estimulação luminosa (mover um objeto para frente e para trás em frente dos seus olhos). Pode haver extrema sensibilidade ao toque (defensividade tátil), incluindo reações fortes a tecidos específicos ou ao toque social/afetuoso, embora haja muitas crianças que sejam insensíveis à dor e possam não chorar após um ferimento grave (1:S8).

As autoras Caminha e Lampreia (31) fizeram uma revisão de literatura e

apontaram alguns dados sobre a prevalência das anormalidades sensórias das

crianças autistas: 70 a 80% (33); 30 a 100% (34).

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36

Em outro estudo feito por Baranek, et al (35) com 56 crianças, entre 5

meses e 6 anos, com o diagnóstico de autista, após a aplicação de um questionário

sobre as experiências sensoriais1, foi constatado que 69% dos autistas apresentam

sintomas sensitivos no geral, variando de proporções com hipo ou hiper-

responsividade ou ambos, em relação ao grupo de controle típicos.

Baranek (30:417) menciona que vários estudos constataram que o

desempenho das crianças com autismo em tarefas motoras e de imitação com

objetivos dirigidos parece ser melhor em contextos significativos e propositais,

comparados com situações descontextualizadas.

Levando em consideração todas as questões listadas é que realizei este

estudo, com propostas de atividades de arte com materiais que possibilitem a

exploração sensorial. No primeiro momento com educadores de alunos com TEA, e

no segundo, com a aplicação dos mesmos materiais com os alunos com TEA, por

ser facilitadora para este tipo de experimento, instigando a aplicação com esta

população, focando em tarefas motoras, sensoriais e de imitação, utilizando as

percepções como o toque, estímulos visuais, sonoros, olfativos e gustativo.

1 Sensory Experiences Questionnaire (SEQ); anteriormente conhecido como o Sensory Supplement Questionnaire - Questionário Suplemento Sensorial -, é um breve (10 minutos) relatório cuidador, instrumento concebido para avaliar as respostas comportamentais ao cotidiano comum de experiências sensoriais em crianças de 5 meses até 6 anos. Seu objetivo principal é caracterizar os aspectos sensoriais em crianças com autismo, e para discriminar padrões de hipo e hiper-responsividade entre aqueles com autismo, DD, ou desenvolvimento típico. A SEQ se destina a ser utilizado tanto para pesquisa efeitos, quanto como um suplemento clínico para tradicionais avaliações de desenvolvimento ou de diagnóstico, que tipicamente não abordam características sensoriais (35:592)

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3 – Cenário dos Educadores

3.1 – Síndrome de Burnout

Diversos estudos apontam para as dificuldades de docentes no

desempenho de suas tarefas, devido às difíceis condições de trabalho no momento

atual. Dentre eles, temos o ritmo intenso com jornada de horas de trabalho longas,

ausência de pausas para descanso, refeições rápidas e em lugares desconfortáveis,

exigência de altos níveis de atualização, diferentes modelos educacionais para

dominar, pressão pelo uso de novas tecnologias, escassez de material para suas

atividades, falta de perspectiva de crescimento, mudança no seu papel como

professor dentro do contexto social, dentre eles, exercer o papel de conselheiro(a)

ou “mãe” dos alunos, principalmente nos assuntos relacionados à droga,

sexualidade e gravidez (36, 37).

Esteve (37), em seu livro “O mal-estar docente: a sala de aula e a saúde

dos professores”, cita Blasé (38) quando aponta os fatores que incidem sobre o

estresse dos educadores: a ação do professor em sala de aula, a qual gera tensões

associadas a sentimentos e emoções negativas (fator primário - direto), e o contexto

ambiental onde se exerce a profissão (fator secundário - indireto).

Quando o estresse é crônico e prolongado, considerado um processo

cumulativo, caracterizado por exaustão física, emocional e mental em relação ao

trabalho desempenhado e por um profundo sentimento de frustração, pode-se dizer

que trata-se de burnout (39).

Conforme diz o autor Reinhold (39), burnout (“consumir-se em chamas”) é

considerado um risco ocupacional, e certos tipos de pessoas estão mais

predispostas a tê-lo, principalmente profissionais sociais – que é o caso dos

professores. Também indica Meleiro, que não somente a presença de fatores

estressantes provoca o estado de estresse. “Há fatores condicionantes individuais:

predisposição genética, idade, sexo e personalidade” (36:14). A autora Benevides-

Pereira (40) aborda que as diferentes características de personalidade interferem no

desencadeamento do burnout e principalmente nas pessoas com padrão de

personalidade tipo A:

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pessoas que são mais competitivas, esforçadas, com um estilo de vida muito em função do tempo, impacientes, com excessiva necessidade de controle e dificuldade em tolerar frustração (40: 55).

Cabe aqui ressaltar GIL-MONTE e colaboradores (41:141) os quais

afirmam sobre a síndrome de burnout que ela é “considerada pela Organização

Mundial de Saúde (42) um risco para o trabalhador, podendo ocasionar deterioração

físico-mental.”

A síndrome de burnout caracteriza-se como

uma deterioração cognitiva que consiste na perda de motivação e baixa realização pessoal no trabalho, por dano afetivo caracterizado por esgotamento emocional e físico, bem como pelo surgimento de atitudes e condutas negativas frente aos clientes e à organização, na forma de comportamentos de indiferença, frieza e distanciamento (41:141).

No Brasil, o Ministério da Saúde reconhece essa síndrome como

“síndrome do esgotamento profissional”:

um tipo de resposta prolongada a estressores emocionais e interpessoais crônicos no trabalho, resultante da vivência profissional em um contexto de relações sociais complexas, envolvendo a representação que a pessoa tem de si e dos outros [...] Afeta principalmente profissionais que trabalham com prestação de serviços ou cuidadores, em contato direto com os usuários, como a educação, saúde, assistentes sociais, policiais, agentes penitenciários, professores, entre outros (43:191-192).

Diante deste cenário, citamos os principais sintomas gerados nos

educadores: 1) físicos: fadiga constante e progressiva, dores de cabeça e

osteomusculares, distúrbios do sono, transtornos cardiovasculares,

imunodeficiência; 2) psíquicos: alterações na memória, sentimento de alienação,

solidão e impotência, falta de atenção e concentração, baixa autoestima, depressão;

3) comportamentais: negligência, irritabilidade, incremento da agressividade, perda

de iniciativa; 4) defensivos: tendência ao isolamento, absenteísmo, perda de

interesse pelo trabalho ou lazer, enfim, um estresse ocupacional, decorrente do

trabalho (40).

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3.2 Síndrome de Burnout com educadores de ensino especial

O esgotamento profissional pode ser constatado especialmente na

educação especial, como enfocam Naujorks e Barasuol (44), quando comparam o

trabalho dos educadores com alunos ditos normais e especiais:

os docentes que trabalham cujo desenvolvimento é o esperado, apresentam indicadores de fadiga e desgaste emocional. Em relação aos professores que trabalham com alunos com necessidades educacionais especiais, onde as exigências pedagógicas e afetivas são maiores, observa-se que o desgaste é maior (44:1).

A autora Benevides-Pereira (40), em seu livro “Burnout: Quando o

trabalho ameaça o bem-estar do trabalhador”, aponta que o educador de alunos com

necessidades educacionais especiais (NEE) tem algumas características que

interagem com os agentes estressores, no sentido de incrementá-los, inibi-los ou

eliminá-los. Essas características levam o educador a desmotivar-se e frustrar-se no

seu dia a dia: perfeccionismo (gostam de tudo organizado, tanto os seus pertences

como o do aluno), preocupação com o tempo e ritmo rápido (vencer conteúdos)

tendem a dificultar o processo de aprendizagem desses alunos.

Meleiro ressalta que os educadores que lidam com pessoas com

deficiência demonstram “dedicação e empenho” no seu dia a dia, mas também se

deparam com situações de estresse devido às intercorrências que podem surgir no

ambiente escolar como: “disciplinar a criança rebelde ou agressiva por sua própria

deficiência”; momentos “quando a criança especial fica doente ou piora seu quadro

de base”; e também quando “as famílias esgotam seus recursos financeiros e

emocionais” no tratamento (36: 20).

Outro sentimento que também está presente nos educadores é a

ansiedade, conforme enfatiza Esteve:

A complexidade da tarefa que o professor assume e a considerável fragmentação de sua atividade, produzida, em boa parte, pelo aumento das expectativas projetadas sobre eles, o que propicia que o acúmulo de tensão dirija-se ao desenvolvimento de uma ansiedade perturbadora (37:154).

A ansiedade tende a aumentar no ambiente educacional, não só em

relação ao relacionamento social com os colegas, mas com o aumento de

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40

responsabilidade que lhe é exigido e as expectativas projetadas pelos familiares

sobre o educador (44).

Uma pesquisa de Carlotto, et al (45), realizada com 63 educadores(as) de

todas as 8 escolas especiais pertencentes à região central do estado do Rio Grande

do Sul, trata sobre a Síndrome de Burnout com educadores de ensino especial.

Foram aplicados questionários de dados bio-sócio-demográficos, laborais e

psicossociais, para avaliação da Síndrome de Burnout, versão para educadores2,

constituído em quatro subescalas: ilusão para o trabalho, desgaste psíquico,

indolência e culpa. Os pesquisadores revelaram uma prevalência de 6,6% de

educadores com sentimentos de desilusão pelo trabalho, 25,4% com desgaste

psíquico, 14,3% sentem culpa, e nenhum educador apresentou nível alto de

indolência.

Outro dado relevante na pesquisa dos autores Carlotto, et al (45) foi

referente à porcentagem de sujeitos com níveis altos de burnout: 30,6% no perfil 1 e

14,3% no perfil 2. Para classificar os dois perfis de burnout eles utilizaram o modelo

teórico de Gil-Monte (46). O Perfil 1 não incapacita o indivíduo para o exercício do

seu trabalho e caracteriza-se por um conjunto de sentimentos e condutas vinculadas

ao estresse laboral, que originam uma forma moderada de mal-estar. O perfil 2

caracteriza-se por apresentar sérios problemas na execução do trabalho e também

por uma crescente ausência de longo prazo no trabalho e comorbidades

psiquiátricas.

Carlotto, et al (45) também aplicaram na pesquisa citada uma outra

bateria de avaliação, sobre as variáveis psicossociais presentes nos educadores da

escola especial: autonomia, conflito de papel, ambiguidade de papel, sobrecarga de

trabalho, apoio social, conflitos interpessoais, autoeficácia, satisfação no trabalho,

tendência ao abandono. Constataram valores mais altos na autonomia, no apoio

social e no trabalho (45).

Alguns educadores da educação especial apresentam insatisfações no

trabalho, que estão relacionadas à exaustão emocional, ao distanciamento e à baixa

realização profissional (47). Outros educadores sentem-se frequentemente

2 Questionário para Avaliação da Síndrome de Quemarse por el Trabaljo – CESQT-PE. (46)

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frustrados devido à lentidão da aprendizagem dos alunos ser maior; com isso,

acabam se sentindo menos bem-sucedidos e realizados profissionalmente (48).

3.3 Educador-cuidador

Outro aspecto levantado para com estes educadores de pessoas com

deficiência é com relação ao seu papel. Eles também exercem o papel aconselhado

do ‘educador-cuidador’, baseado no modelo médico-psicológico. Michels (49:271)

comenta que ainda hoje temos a manutenção de cursos de formação de professores

para a Educação Especial tendo o modelo médico-psicológico como eixo

organizador das disciplinas.

O docente da educação especial vive um momento de transição do

modelo médico-psicológico para a nova abordagem do conceito de NEE,

“focalizando de forma individual e contaminante os diagnósticos de deficiência ao

colocá-los sobre as necessidades de aprendizagem, entendidas como uma relação

processual entre docentes e discentes”, conforme define o parecer do Conselho

Nacional de Educação/Câmara de Educação Básica - CNE/CEB 14/2001

Brasil/Ministério da Educação e Cultura (50) apud Carlotto (45:323).

Muitas vezes, o educador executa dois ou mais papéis distintos, agindo

contrariamente às práticas educativas, conflitando com seus valores internos e de

ação, de acordo com Esteve (37) e Nwikina & Nwanekezi (51) apud Carlotto (45).

Não conseguindo atender os papéis simultaneamente, ele não se percebe com

sobrecarga pela falta de clareza do seu papel e pelo conflito com as suas atribuições

em relação aos alunos, e, frequentemente, desenvolve o sentimento de culpa, o que

causa problemas de saúde e sentimentos de mal-estar psicológico (45).

Naujorks e Barasuol comentam sobre os vários papéis do educador:

Para dar conta da sua “ensinagem” vê-se assumindo vários papéis: de mãe, de médico, de enfermeiro, de psicólogo, simultaneamente ao seu verdadeiro papel que é o de educador. Esse cotidiano do profissional tende a levar a uma fragmentação de sua atividade e fragilidade na sua identidade (44:3).

O educador de pessoa com deficiência assume o lugar de “educador-

cuidador”, pois o nível de proximidade no fazer pedagógico e um olhar de cuidador

se intensificam, exigindo atuação tanto física quanto emocional deste educador.

Envolve-se por vezes um contato corporal bem próximo, como no auxílio nas

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Atividades de Vida Diária (AVDs), e também no trabalho pedagógico em salas de

aula. Outras tarefas efetuadas no papel de cuidador são verificar se o aluno tomou o

remédio prescrito, acompanhar nas brincadeiras durante o intervalo junto aos

colegas, exigindo não só do educador fisicamente, mas emocionalmente (44).

3.4 Ampliação de estudos e apoio de outros profissionais

As autoras Naujorks e Barasuol (44), em relação à ampliação de estudos

e conhecimentos, comentam que os educadores da área de educação especial

sentem-se despreparados, pois se queixam que não tiveram no currículo acadêmico

embasamento teórico voltado a esta área.

Felício (52) conclui em sua pesquisa realizada em Bauru- SP, que os

educadores não estão preparados para lidar, educar e ensinar alunos com TEA, e

que o grau de instrução e informações destes educadores não é suficiente para se

trabalhar de forma funcional, adequada e significativa. Estes pontos importantes

estão relacionados à insuficiência da formação profissional nas áreas especiais, à

falta de informações, capacitações, cursos, palestras sobre TEA e suas

manifestações.

Em um estudo realizado em São Paulo (53) com 51 educadores de

escolas regulares e especiais que tinham crianças e adolescentes com diagnóstico

psiquiátrico incluído no Espectro do Autismo em suas salas de aula, foi aplicado um

questionário com questões fechadas e de classificação. Os resultados relevantes

apresentados foram: os educadores demonstraram não conhecer muito sobre o

TEA; relataram também o despreparo para lidar com estes alunos; o não

recebimento de formação e orientação suficientes para trabalhar com esta

população; além da falta de apoio e salas de aulas numerosas.

Richard (54) é citado no artigo de Pimentel e Fernandes (53:172) e

recomenda para o profissional que trabalha com esta população: “é necessária a

participação em atividades de educação continuada para manter-se atualizado com

os mais recentes avanços do TEA”. Ele também afirma que tal profissional precisa

receber suporte de equipes multidisciplinares e da instituição.

Nessa direção, Rivière ressalta sobre apoio externo a escolas e

professores:

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Todas as escolas e todos os professores que atendem crianças com transtornos globais do desenvolvimento requerem apoio externo e orientação por especialistas nesses casos. É imprescindível para eles a orientação por parte de assessores com bom nível de formação (27:250).

Com muita frequência há sentimento de frustração, ansiedade e

impotência nos professores que não contam com apoios suficientes (27).

Em uma investigação realizada na cidade de Sevilha, na Espanha, Ortiz

et al (55) concluem que há uma necessidade de uma rede específica de apoio ao

professor que trabalha diretamente com o aluno com TEA e que mais da metade dos

alunos é atendida por estes professores, que não contam com essa rede de apoio.

O número de reuniões entre eles é escasso e existe uma coordenação insuficiente

entre os professores que atendem alunos com TEA. Os autores recomendam que

seria positivo se esta rede criasse vias paralelas de apoio informal, com algumas

atividades pontuais que visassem contribuir para a difusão da informação,

proporcionando exemplos de experiências positivas e integração bem sucedida

entre os profissionais. Estes fatores consequentemente reduziriam a ansiedade,

preparando antecipadamente a inclusão de um aluno(a) autista.

Outro estudo que destaco é de Gomes (56), efetuado em duas escolas

particulares e quatro escolas públicas localizadas na cidade de Natal/RN, com seis

professoras e seis coordenadoras pedagógicas que atendem alunos autistas. A

autora constatou que os educadores têm uma prática limitada na interação com os

alunos com TEA devido à ausência de capacitações na área e também à visão dos

professores sobre o TEA, focados na ideia da limitação da síndrome. Outro aspecto

é que alguns educadores sentem-se incapazes de lidar com estes alunos. Com

relação às coordenadoras, elas esperam que a formação venha de especialistas de

fora e não se aprofundam sobre a inclusão do aluno autista, apresentando a

questão.

3.5 Aprendizado do alunado de educação especial e TEA

As autoras Naujorks e Barasuol (44) comentam que um dos aspectos que

traz desgaste emocional aos docentes de educação especial está relacionado ao

aprendizado do alunado, pois o educador sente-se impotente frente às dificuldades

do aluno, pois ele foi preparado a trabalhar com alunos que “aprendem” e, quando

se depara com o “não aprender” e com as suas próprias limitações, isso gera

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angústia, sofrimento, desânimo, cansaço e até ameaça a sua identidade e sua

autoestima.

O educador atualmente tem como objetivo realizar o trabalho pedagógico

processual existente entre os educadores e alunos. O educador deve focalizar de

forma individual as necessidades de aprendizagem das deficiências de cada aluno

(45). Essa nova abordagem também provoca angústia, tensões desastrosas,

desorientações, quando em um pequeno período de tempo, os educadores sentem-

se obrigados a fazer uma mudança excessiva nas suas práticas educacionais.

Esteve (37) apud Carlotto (45).

Com relação às alterações dos alunos com TEA (comunicação, interação

e comportamentos), as autoras Pimentel e Fernandes (53) citam que é

significativamente limitado o modo de educar alunos com TEA, e também indicaram

a necessidade de melhorias na qualidade do material didático trabalhado com esse

indivíduo, sem especificar como isso poderia ser feito.

As autoras (53) também mencionaram que ainda não existe no Brasil a

inclusão que a Lei de Diretrizes e Bases estabelece e que, para isso acontecer,

precisam ser feitas adaptações estruturais e curriculares, como também apoio aos

educadores e famílias e uma maior conscientização da população com relação às

pessoas com TEA.

Outra pesquisa que ressaltamos foi realizada com 38 educadores da rede

municipal de ensino da cidade de Bauru, com a aplicação de questionários com

questões abertas e fechadas, com a finalidade de investigar a experiência dos

educadores a respeito de alunos com TEA e as necessidades de conteúdo, para

que, posteriormente, ocorresse a elaboração de um curso de difusão sobre a

temática. Dentre os dados relevantes, os pesquisadores mencionaram que 84% dos

educadores entrevistados não conseguiram identificar pelo menos uma das

características que compõem as categorias diagnósticas desta patologia; 81,58%

dos educadores responderam que sempre consideram a necessidade de adequar o

conteúdo e modificação das estratégias de ensino utilizadas comumente nas salas

de aula; 75,32% responderam que há sempre a necessidade de modificar as

estratégias utilizadas em sala de aula (57).

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Ortiz et al (55) explicam que as adaptações dos currículos

individualizados na maioria dos alunos com TEA na cidade de Sevilha, na Espanha,

não estão sendo aplicadas, e, quando ocorrem, são utilizadas como resposta

burocrática, devido ao fato de os documentos estarem desatualizados. Os autores

salientam que os indivíduos com TEA, além dos aspectos da tríade – comunicação,

interação e comportamentos repetitivos –, geralmente também apresentam

dificuldades de aprendizagem das áreas curriculares, por isso a necessidade de

adaptação curricular.

Outro aspecto é com relação ao número de alunos autistas em sala de

aula. Gomes (56), em sua pesquisa em escolas particulares e públicas na cidade de

Natal/RN, aborda as práticas efetivadas e ressalta que o número de alunos em sala

de aula é maior (20 a 30 alunos), no que se refere à proposta da inclusão (não

exceder 20), em escolas municipais visitadas. Já nas duas escolas particulares, ele

destaca que há um número menor de alunos (5 a 12) e observa que há uma

professora auxiliar disponível para estes alunos autistas e adaptações curriculares,

como o uso da Comunicação Ampliada e Alternativa (CAA) em uma das escolas, e a

outra escola apresenta atendimento individualizado.

Também foi relatado pelas observações da autora (56) que os alunos

autistas são tratados pelos colegas como deficientes e que os colegas não buscam

contato e interação com eles. Em todas as escolas pesquisadas, observou-se o

isolamento do aluno autista e a ausência de ações coletivas por parte dos

professores para a inserção deste aluno nas atividades, justificada devido ao seu

comportamento.

Em um estudo de Gomes e Mendes (58:393) sobre a escolarização de

alunos com TEA em escola comum, eles salientaram que “a maioria deles interage

com seus colegas ‘sempre’ ou ‘às vezes’ e entre 60% e 70% dos alunos apresentam

comportamentos difíceis de lidar ‘às vezes`”.

Os autores Gomes e Mendes (58) também abordam a permanência dos

alunos com TEA na sala de aula. Na educação infantil, percebeu-se que a maioria

dos alunos com TEA permanece em sala de aula, devido aos conteúdos serem mais

flexíveis e interessantes para as crianças. Também se referem ao 1º. Ciclo,

mostrando que a metade dos alunos permanecia “às vezes” em sala de aula, e nos

ciclos 2º e 3º, somente cerca de 30%. Uma das conclusões dos autores é que no

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fundamental I, II e o médio, o nível de aprendizagem de conteúdos pedagógicos

desses alunos é baixo e também há pouca participação deles em sala de aula.

Vários autores mencionaram que os educadores de TEA no seu dia a dia

direcionam seu olhar às limitações do transtorno TEA, observam apenas as

dificuldades desses indivíduos e não deslumbram possibilidades de aprendizado,

devido aos atrasos no desenvolvimento, e na maioria das vezes, sentem-se

despreparados e incapazes de lidar com estes alunos. Questiono, quais são as

dificuldades específicas que os educadores enfrentam na educação dos TEA de

nível moderado e severo? Muitas vezes estes educadores pretendem atingir

objetivos educacionais incompatíveis com o nível de desempenho dos alunos.

Escolhas de atividades mais lúdicas e expressivas envolvendo arte e música são

mais acessíveis e podem ser uma plataforma para atingir os objetivos pretendidos.

Nos relatos dos artigos pesquisados, observei que, muitas vezes, os

educadores assumem papéis profissionais ainda enraizados no modelo médico-

psicológico que se pauta nas características clínicas dos alunos , e adotam tanto

o papel de educador como o de cuidador. Pela sobrecarga de atribuições, não

conseguem atendê-los e podem sentir-se desgastados na sua atuação.

Os autores consultados também citam outros sentimentos gerados nos

educadores de TEA: a frustração e a ansiedade, os quais podem ser causados por

várias situações, como as expectativas projetadas nos alunos, a carência de

estratégias e de adaptações para o ensino, com o intuito de tornar os conteúdos

mais flexíveis e atraentes. Este cenário pode ter como consequência a rotatividade

dos educadores no ambiente educacional, similar à saída de vários professores da

instituição, como aconteceu durante esta pesquisa.

Os autores indicam que a participação do educador em atividades de

educação continuada, cursos, palestras, bem como assessoria e contribuições de

profissionais de equipe multidisciplinar são importantes como apoio e suporte para

as equipes, minimizando os sentimentos de angústia e impotência.

Parti do princípio que as propostas de oficinas com as atividades lúdicas

de arte realizadas com os educadores e posteriormente aplicadas com os alunos

com TEA podem contribuir significativamente para diminuir o estresse dos

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educadores, pois possibilitam momentos de prazer, suporte, segurança e novas

possibilidades de interação com esses alunos.

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4 – Políticas Públicas e Inclusão escolar de alunos com TEA

4.1 Políticas Públicas

As políticas públicas em âmbito municipal, estadual e nacional para as

pessoas com TEA foram criadas para assegurar o acesso, permanência e

apropriação de conhecimento nas instituições de ensino, saúde, nutrição, moradia,

trabalho, previdência e assistência social, mas ainda são ineficientes na prática no

Brasil. No decorrer deste capítulo, abordarei as principais delas dentro da área da

educação.

4.1.1 Âmbito nacional

O Decreto nº 7612, de 17 de novembro de 2011, institui o Plano Nacional

dos Direitos da Pessoa com Deficiência – Plano Viver sem Limite, com a finalidade

de promover, por meio da integração e articulação de políticas, programas e ações,

o exercício pleno e equitativo dos direitos das pessoas com deficiência, nos termos

da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu

Protocolo Facultativo, aprovados por meio do Decreto Legislativo no 186, de 9 de

julho de 2008, com status de emenda constitucional, e promulgados pelo Decreto nº

6.949, de 25 de agosto de 2009 (Art. 1º) (59).

O Ministério da Saúde institui a Rede de Cuidados à Saúde da Pessoa

com Deficiência no âmbito do SUS (Portaria 793, de 24/04/2012), estabelecendo

diretrizes para o cuidado de pessoas com deficiência temporária ou permanente;

progressiva; regressiva ou estável, intermitente ou contínua (60).

A Lei 12.764/2012, de 27 de dezembro de 2012, institui a Política

Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtornos do Espectro do

Autismo, sendo esta considerada Pessoa com Deficiência para todos os efeitos

legais (61).

O Ministério da Saúde lançou no dia 02 de abril de 2013 – Dia Mundial de

Conscientização do Autismo – a primeira política de saúde pública voltada

especificamente para essa população: Diretrizes de Atenção à Reabilitação da

Pessoa com Transtornos do Espectro do Autismo (TEA) traz indicadores do

desenvolvimento infantil e sinais de alerta para facilitar o diagnóstico precoce da

doença (62).

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A Lei de Diretrizes e Bases nº 12.796, de 04 de abril de 2013, altera a Lei

no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da

educação nacional, para dispor sobre a formação dos profissionais da educação e

dar outras providências. Uma das mudanças que consta no capítulo V define

educação especial como a modalidade de educação escolar oferecida

preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos com deficiência,

transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação (63).

O capítulo V da Lei de Diretrizes e Bases apresenta algumas diretrizes:

oferecer, quando necessário, serviços de apoio especializado na escola regular,

para atender às peculiaridades da clientela de educação especial (Art. 58, § 1º); o

atendimento educacional será feito em classes, escolas ou serviços especializados,

sempre que, em função das condições específicas dos alunos, não for possível a

sua integração nas classes comuns de ensino regular (Art. 58, § 2º); a oferta de

educação especial, dever constitucional do Estado, tem início na faixa etária de zero

a seis anos, durante a educação infantil (Art. 58,§ 3º) (63).

4.1.2 Âmbito estadual

Acompanhando as políticas públicas referentes ao TEA, em 21 de

setembro de 2011, a Secretaria de Estado da Educação de São Paulo, representada

pela Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas, por intermédio do Centro de

Apoio Pedagógico Especializado, tornou público no Diário Oficial o edital de

convocação para credenciamento de instituições educacionais especializadas em

atendimento a alunos com transtorno global do desenvolvimento, como especificado:

CID/10 F84.0, F84.1, F84.4, F84.5, F84.8, F84.9, para constituição de cadastro de

credenciados e eventual formalização de ajuste, na conformidade do Projeto Básico

que integra o presente (64)

A Lei 15.668, de 12 de janeiro de 2015, foi publicada na Secretaria da

Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo que dispõe sobre diretrizes para a

política de diagnóstico precoce e tratamento dos sintomas da Síndrome do Autismo

no âmbito do sistema de saúde. De acordo com o Artigo 2º., o Poder Público poderá

firmar convênios com entidades e clínicas afins, visando ao repasse de recursos

para custeio ou remuneração de serviços (65).

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4.1.3 Âmbito municipal

Considerando o disposto nas Leis Federais nº 8.069, de 13 de julho de

1990 – O Estatuto da Criança e do Adolescente (73) – e nº 9.394, de 20 de

dezembro de 1996 (67) – que estabelece as Leis das Diretrizes e Bases da

Educação Nacional, a LDB - e na Resolução CNE/CEB nº 2, de 11 de setembro de

2001 (68), que institui Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação

Básica -, a Prefeitura do município de São Paulo estabeleceu o Decreto Municipal nº

45.415, de 18 de outubro de 2004, em relação à Política de Atendimento a Crianças,

Adolescentes, Jovens e Adultos com NEE no Sistema Municipal de Ensino de São

Paulo. De acordo com o parágrafo único do Art. 9º, os serviços conveniados de

Educação Especial poderão ser prestados por instituições sem fins lucrativos

conveniadas com a Secretaria Municipal de Educação, voltadas ao atendimento de

crianças, adolescentes, jovens e adultos com NEE, cujos pais ou o próprio aluno

optarem por esse serviço, após avaliação do processo ensino-aprendizagem, e se

comprovado que tais alunos não podem se beneficiar dos serviços públicos

municipais de Educação Especial (69).

A Lei 15.409/2011, de 12 de julho de 2011, institui a Política Municipal de

Atendimento às Pessoas com Transtorno Invasivo do Desenvolvimento – Autismo,

que pauta pelas seguintes diretrizes, dentre outras, que visem a proteção, promoção

e integração: atendimento das pessoas com autismo nas instituições públicas

municipais, de forma igualitária, respeitadas as peculiaridades inerentes às

diferentes situações. (Art. 1º. Item I) (70).

Destaca-se uma necessidade de implantação efetiva dessas políticas

públicas para as pessoas com TEA, que é uma condição ainda pouco consolidada

no Brasil e requer um processo de intervenção contínua do poder público e a

cobrança intensiva de vários segmentos da sociedade civil, para que realmente as

pessoas com TEA tenham direito a tratamento digno e adequado às suas

necessidades.

4.2 Inclusão de TEA – caminhos a percorrer

No Brasil, houve uma necessidade histórica de diferenciar os termos

integração e inclusão, conforme diz Bosa, que explica que enquanto na

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integração investe-se na possibilidade de indivíduos com deficiência frequentarem escolas comuns de ensino, cujos currículos e métodos pedagógicos estão voltados para crianças consideradas ‘normais’, na inclusão muda-se o foco do indivíduo para a escola. Neste caso, é o sistema educacional e social que deve adaptar-se para receber a criança deficiente (71:69).

Um dos objetivos do Estado em investir na inclusão de alunos nas

escolas regulares é a diminuição de gastos com a educação especial, que é menor

do que o investimento em escolas especializadas, que vivem de verbas públicas

(72).

Nessa mesma linha de raciocínio, Mendes (73) comenta que, a curto

prazo, a diminuição de investimentos nas instituições especializadas e os

fechamentos de programas e serviços nas escolas públicas – que já estão

ocorrendo, como a sala de recursos e classes especiais – trazem como

consequência benefícios financeiros para o Estado, pois os custos diminuem. A

autora também destaca que a médio e longo prazo, as mudanças na organização e

gestão de pessoal, formação continuada de professores especializados e diminuição

no atendimento especializado dos alunos com deficiência também revelam um

encolhimento de custo para o Estado.

Depois de instaurado o movimento da inclusão que favorece e conduz a

inclusão escolar de todo e qualquer aluno com deficiência nas escolas comuns da

rede regular de ensino, muitas instituições especializadas tiveram dificuldade de

reconfigurar o seu papel nos processos de diagnóstico, avaliação, tratamento e

educação das pessoas com deficiência. Mantoan e Prieto (74) citam duas definições

para o papel da instituição especializada: 1) prestação de serviços para o ensino

comum e 2) atendimento para os alunos que não têm condições de frequentar uma

escola regular (como ocorre, às vezes, no caso de alunos com TEA de nível severo

e moderado).

Com relação aos papéis dos professores nestas instituições

especializadas, eles também são indefinidos, conforme comentam Mantoan e Prieto

(74:26), pois “atuam como orientadores de professores de escolas comuns, onde

estão incluídos alguns alunos dessas instituições, ora dão aulas como professores

de ensino regular, mas em escolas especiais!”.

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Segundo Bosa (20), não há uma conclusão final sobre qual escola o aluno

autista deve frequentar, a especial ou a regular, pois salienta que cada aluno deve

ser tratado individualmente, focando nas necessidades e potencialidades de cada

criança.

Cintra et al (75) são citados no artigo de Pimentel e Fernandes (53:172) e

comentam sobre as divergências entre os envolvidos na inclusão

as expectativas de diferentes grupos envolvidos no processo de inclusão escolar, ou seja professores, pais de alunos com deficiência e sem deficiência são divergentes. Os professores se preocupam, principalmente, com as questões sociais das crianças inclusas, enquanto os pais esperam que eles atentem para os aspectos pedagógicos.

Na pesquisa de Alves (76), um dos pontos relevantes abordados é a

relação das percepções dos educadores referente à inclusão ou não de alunos com

TEA nas escolas regulares. Alguns educadores mostram-se a favor, pois acreditam

que a inclusão educacional é favorável apenas para a socialização, convívio,

relacionamento interpessoal entre os alunos. Estes ressaltam também que as

turmas têm que ser menores, e que eles devem ter um acompanhamento e o

preparo profissional.

A autora também mostra o outro lado, os educadores que não apoiam a

inclusão, pois acreditam que os alunos deveriam ser direcionados para classe

especial ou escola especializada, pois acham que os alunos com TEA devem ser

incluídos e não somente aceitos e serem colocados meramente em um espaço físico

escolar, tendo somente uma inclusão física e não educacional. Outro ponto

abordado é que alguns alunos com TEA não estão preparados para o convívio com

outras crianças na escola, pois apresentam comportamentos que às vezes

tumultuam o ambiente escolar, como gritos, falas desconexas, andar e correr pelas

salas. Argumentam também que para haver a inclusão destes alunos, eles precisam

de diferenciais para a sua concretização, como apoio e assessoramento de

profissionais da Educação Especial que possam ajudá-los.

Vasques e Baptista ressaltam a dificuldade de atender os alunos com

TEA:

Mesmo com referência ao Estado e às políticas, a culpabilização do professor diante dos impasses escolares e inclusivos, há uma incapacidade técnica do professor para atender sujeitos com tamanhas necessidades

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educativas especiais. Da lógica tecnicista derivam como soluções programas adaptados e individualizados, de cunho comportamental ou cognitivista, em escolas comuns e especiais (77:680).

Uma outra pesquisa que cito é de Ciantelli, et al (78), na qual apresentam

um estudo de caso com 2 crianças, com idade de 8 anos, um aluno com transtorno

global do desenvolvimento - autismo - e uma aluna com duplo diagnóstico, paralisia

cerebral e autismo. Ambas matriculadas em uma unidade escolar de uma rede

municipal de ensino do oeste paulista. Esse estudo visou discutir e orientar a prática

pedagógica com esses alunos, referente ao seu desenvolvimento acadêmico.

Os alunos da pesquisa citada apresentam características como baixa

tolerância à realização das tarefas, dificuldades na interação social e no contato

visual, estereotipias como movimentos de balanço do tronco e flapping. Apenas o

aluno apresentava comportamentos auto e hetero agressivos mediante às

frustrações, jogava-se no chão, atirava objetos pela janela. A aluna apresentava

comportamento de apatia na maior parte do tempo, e a professora especialista

auxiliava nas atividades devido à dificuldade de execução. Eles mostravam um nível

de competência curricular baixo, não se apropriando dos conteúdos pré-escolares.

Após observações realizadas, as pesquisadoras elaboraram propostas com

intervenções lúdicas e dirigidas para estes dois alunos, utilizando brinquedos e

objetos que estimulavam os canais sensitivos das crianças. O aluno apresentou

resposta aos brinquedos, explorando-os, e a aluna jogava-os no chão. Com relação

aos estímulos olfativos e gustativos, o aluno demonstrou respostas faciais, e a aluna

uma ocorrência mínima de reações faciais.

As autoras Ciantelli et al (78) aplicaram a Escala de Comportamento de

Vineland3 e identificaram que estes alunos apresentavam comportamentos similares

aos das crianças de idades menores que as deles, e que necessitavam de auxílio

para realizar suas atividades diárias na maior parte do tempo. Com relação aos

resultados obtidos, decidiram encaminhar a aluna, que demonstrou quase nenhuma

evolução acadêmica nos últimos dois anos na escola regular, para um centro

especializado de autismo da região, Centro Especializado em Autismo e Patologias

Associadas (CEAPA). No caso do aluno, por ter apresentado alguns avanços na

3 Instrumento desenvolvido em 1984 que tem como objetivo avaliar, por intermédio do relato de pessoas próximas como mãe, pai, professoras, cuidadores, a independência pessoal e social do indivíduo desde o nascimento até a vida adulta, observando o comportamento adaptativo em 5 áreas de desenvolvimento.

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escola regular no ano letivo, decidiram mantê-lo na escola comum, porém com a

necessidade da elaboração de um plano de ensino individualizado (PEI), visando

adaptar e propor atividades mais adequadas ao aluno.

As autoras Ciantelli, et al (78:120) enfatizam, sobre os alunos com

autismo, que estes “exigem respostas educacionais diferenciadas da escola, e

nesse direcionamento, os profissionais devem buscar subsídios teóricos-

operacionais para lidar com este alunado”.

Elas também questionam “qual a contribuição das práticas escolares,

oferecidas na sala de aula comum, para o desenvolvimento educacional desses

alunos” (78:120).

As autoras (78) concluem após os estudos que há necessidade de

propiciar atividades que desenvolvam e promovam as habilidades funcionais destes

alunos para diversas situações sociais, visando a sua autonomia, pois a manutenção

de determinados alunos com TEA, mesmo tendo o auxílio dos professores

especializados nas classes comuns, é considerada pouco efetiva. Também

ressaltam que se deve contemplar todas as possibilidades de ajustes na sala de

aula, como adaptações nos recursos metodológicos, infraestrutura e acessibilidade

antes de encaminhar o aluno para uma escola especial. Elas ainda salientam que o

atendimento educacional especializado, como é oferecido hoje nas escolas

municipais, não pode ser restringido – há necessidade de ações e formas

alternativas educacionais a serem oferecidas pelo Estado para essas instituições

públicas.

Vasques e Baptista apontam sobre os estudos de inclusão

A presença incipiente de estudos que tematizam o atendimento educacional especializado como ação complementar; a recorrente pergunta pelos limites e impossibilidades da inclusão escolar no contexto, inclusive físico, das escolas e classes especiais; a formação de professores centradas prioritariamente nos aspectos técnicos e instrumentais de um saber-fazer profissional (77:680).

Gomes (56) apresenta em sua pesquisa que parece que os alunos com

TEA invadiram a escola e que eles, os professores, coordenadores, não têm

subsídios para trabalhar com estes alunos e necessitam de formação, e comenta

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que este é o cenário da forma como a inclusão foi proposta ou imposta na

sociedade.

Dessa forma, Gomes nos diz sobre a inclusão de TEA:

A inclusão não se resume exclusivamente à receptividade destes alunos nas escolas regulares, é necessário atentar para atendimentos mais específicos que venham perceber as individualidades, limitações, capacidades restritas que são particularidades dos alunos com autismo (56:14).

A autora ainda ressalta sobre os professores, referente à inclusão:

Os profissionais desta escola já possuem essa consciência de inclusão, faltando-lhe, pois uma ação didática mais planejada da professora e, uma ação colaborativa das coordenadoras neste processo onde todos colaborem de alguma forma para a mudança no cenário inclusivo da criança autista. (56:14)

Sobre a escolarização de alunos com TGD, Vasques e Baptista (77:680),

comentam: “exige um trabalho a ser desenvolvido no coletivo, bem como a

construção de um estilo próprio de ensinar e responsabilização por um processo a

ser sustentado em diferentes instâncias”.

Gomes constata em sua pesquisa que a inclusão de alunos com TEA é

difícil e também:

é preciso uma reorganização da escola [...] ressignificação de valores, crenças e respeito às diferenças por parte destes profissionais investigados, mudança de prática e formação continuada aos professores para iniciar um processo de inclusão de fato (56:14).

Gomes e Mendes (58) realizaram uma pesquisa em Belo Horizonte com

33 professores de 33 alunos com autismo de escolas regulares do município. Os

professores responderam a um questionário semiestruturado e, dentre as questões:

dados dos alunos; tipos de suporte ao aluno e ao professor; aspectos do aluno na

escola; aspectos sobre a comunicação e aprendizagem do aluno e o comportamento

do aluno na escola, e também preencheram a escala CARS4 referente ao seu aluno.

4 A escala CARS – Childhood Autism Rating Scale (Schopler, Reicheler, Renner, 1988) foi traduzida, adaptada e validada para o Brasil por Pereira, Riesgo e Wagner (2008). É um instrumento que permite identificar pessoas com características comportamentais de autismo e distingue entre autismo e atraso no desenvolvimento sem autismo.

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Neste estudo, as pesquisadoras Gomes e Mendes (58) descrevem que

90% dos alunos com TEA, especialmente do 1º ciclo, contam com apoio de

auxiliares de vida escolar, e esta ação tem como consequência o número alto de

frequência desses alunos em sala de aula. As pesquisadoras opinam que o motivo

do número ser alto pode ser devido aos pais sentirem-se tranquilos em deixar seus

filhos na escola com o apoio de um auxiliar. As autoras ressaltam que estes

estagiários necessitam de capacitação e supervisão para mediar as relações com a

criança na escola e não se tornarem meros cuidadores situação esta também

verificada na instituição onde realizei o presente estudo.

As autoras também mencionam que é vantajosa a manutenção de

esquema de estagiários para a gestão das instituições escolares, devido ao menor

custo de pagamento de estagiários, dos quais 80% concluíram o ensino médio,

comparado à contratação de profissionais especializados com formação superior.

Para os professores, os estagiários representam mais um adulto na sala, ajudando a

tomar conta dos alunos em momentos de necessidade. As pesquisadoras

questionam qual é o benefício para os alunos se a educação continuar a ser

mascarada pelo assistencialismo e se não houver provisão de profissionais

capacitados para desenvolver o potencial dos alunos (58).

Outro dado que se destaca nesta pesquisa em Belo Horizonte é que entre

40% e 60% dos professores recebem apoio do município no formato de orientação,

em intervalos de tempo bem espaçados. Cerca de 40% dos professores afirmou

“nunca” ter dúvidas ou dificuldades em lidar com os seus alunos com autismo. As

autoras comentam que a presença do auxiliar de vida escolar pode influenciar neste

dado, pois os professores não têm muito contato com as crianças (58).

Por mais que haja políticas públicas municipais, estaduais e federais

definidas e direcionadas para a área da educação, vários autores identificam que, na

prática, ainda falta muita mudança para que as políticas se efetivem. Pergunto, o

objetivo é diminuir as despesas de custeio das instituições especializadas de

educação especial que atendem a poucos, para investir na inclusão de alunos na

escola regular, com gasto menor? Nos relatos dos artigos consultados, constatei

que, muitas vezes, o aluno com TEA é apenas incluído fisicamente nestes espaços

escolares regulares, mas não é incluído educacionalmente. Para muitos familiares,

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as escolas especializadas tornam-se uma opção mais indicada, por oferecer apoio

de equipes especializadas e formação teórico-operacionais na área de deficiência e

TEA.

Na minha experiência, considero que os alunos com TEA que apresentam

nível moderado a severo, como os alunos que participaram desta pesquisa,

necessitam, muitas vezes, de atendimento direcionado às suas necessidades

específicas (desenvolvimento de contatos interativos, habilidades funcionais e

promoção da autonomia). Isso raramente acontece nas escolas regulares, que não

dispõem de recursos metodológicos adequados e que se apoiam em práticas

escolares convencionais.

Em salas com muitos alunos, o professor não consegue atender as

demandas gerais. No caso de alunos com TEA, que apresentam condutas

imprevisíveis como andar e correr pelo espaço, gritar, bater a cabeça na parede,

morder a si e aos outros, é imprescindível ter o apoio de profissionais capacitados

para acompanhá-los e orientá-los durante a sua permanência e aprendizado em sala

de aula. Poucos professores formados nos cursos atuais de Pedagogia são

preparados para lidar com e ensinar esta população, dadas as suas especificidades.

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5 – Reflexões sobre Atividades de arte no campo do TEA

5.1 Pesquisas em arte e inclusão, e TEA

A área de arte e deficiência promove um encontro multidisciplinar em que

atuam diversos pesquisadores de diferentes áreas: psicólogos, terapeutas

ocupacionais, educadores, psiquiatras e profissionais da área de arte. Trata-se de

uma área relacionada à saúde mental e também à educação especial (79).

Diante de um levantamento de 32 trabalhos, entre dissertações e teses

realizadas até 2009, Reily mostra que as principais temáticas abordadas pelos

pesquisadores de arte e inclusão foram: nove em deficiência visual (cegueira e baixa

visão), sete sobre deficiência intelectual, cinco sobre a surdez, duas sobre

deficiência física, duas abordam o autismo, uma com o tema de deficiência múltipla,

e sete discutem grupos mistos (79).

Menciono outra pesquisa, esta específica referente aos conhecimentos

produzidos sobre os Transtornos Globais do Desenvolvimento (TGD)5 entre 2000 e

2012, nos programas de pós-graduação no Brasil. Vasques e Baptista (77)

investigaram a base de dados para o levantamento, como o Portal do CAPES (teses

e dissertações) e a Biblioteca Digital de Teses e Dissertações (BDTD), e

identificaram 366 produções acadêmicas. Ressalto que apenas 24 pesquisadores

são da área da Linguística, Letras e Artes (6,5%). Nessa pesquisa, também foram

identificados 5 grandes eixos temáticos: escolarização (107 = 29,3%); terapêuticas e

terapias (101 = 27,6%); avaliação, escalas e testagens (90 = 24,6%);

diagnóstico/etiologia (51 = 13,9%); inclusão social (17 = 4,6%).

Os autores Vasques e Baptista (77) fizeram um recorte nesta base de

dados e escolheram o eixo escolarização, com 107 documentos. Dentre este

número, ressalto, com relação às grandes áreas de conhecimento, que apenas dois

são da área de Linguística, Letras e Artes, sendo um da área de Música e um de

Artes Plásticas.

5 TGD – Transtorno Global do Desenvolvimento. Eliminaram-se as categorias específicas de Autismo, Síndrome de Asperger, Transtorno Desintegrativo de Infância (TID) e Transtorno Global do Desenvolvimento sem Outra Especificação (TGD-SOE). Todos passam a fazer parte do Transtorno do Espectro Autista (TEA) (4).

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Cabe observar ainda que, em geral, encontram-se estudos de arte,

principalmente o desenho, direcionados para as pessoas com TEA de nível leve,

como pessoas com Síndrome de Asperger, também incluindo pessoas com

síndrome Savant. Os estudos com esses grupos discutem a questão da criatividade

no autismo e valorizam o desenho figurativo, as altas habilidades em representação

espacial (com uso de conhecimentos de perspectiva, mesmo que em nível

autodidata) (80,81).

Estudos com pessoas com TEA de nível moderado, e principalmente

severo, são escassos na área de arte e educação. Analisando vários artigos,

percebe-se que os autores que abordam o baixo funcionamento muitas vezes

revelam uma abordagem primordialmente terapêutica, com sessões que priorizam o

atendimento individual, usando a arteterapia, musicoterapia, terapia ocupacional e

outros. As atividades de arte realizadas por estes profissionais partem da ideia que

eles podem não responder a propostas grupais. Os objetivos normalmente

direcionados nestas terapias são o autoconhecimento, a melhora da comunicação, a

construção de relações, a expressão de sentimentos e outros.

Há cinco anos, iniciei um trabalho com crianças e adolescentes com TEA,

de nível moderado e severo, e tive dificuldades de encontrar estudos, sugestões,

estratégias para poder atuar com atividades de arte destinadas a esta população, e,

no período de três anos, pude experimentar, ousar e vivenciar algumas experiências

na instituição onde trabalhei. A pouca literatura encontrada, bem como o repertório

construído ao longo do percurso profissional, mostraram o valor de algumas

modalidades expressivas que poderiam ser exploradas e elaboradas com os

participantes da pesquisa, considerando as possibilidades de contatos sensoriais

com materiais que promovem variadas formas de exploração, com ou sem

preocupação em elaboração de produto.

5.2 O direito à participação em práticas expressivas

As atividades de arte programadas para crianças e adolescentes com

TEA promovem de maneira lúdica e prazerosa sua inserção no meio social – mesmo

no caso dos alunos com maior comprometimento, que não costumam participar e ter

interesse em propostas lúdicas. Aos poucos, fui criando e experimentando

estratégias, escolhendo materiais adequados e chamativos e, às vezes, até mesmo

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utilizando minhas mãos como intermediárias, juntamente com as deles. Com isso,

encontramos um canal de expressividade de seus sentimentos e sensações.

Segundo Reily, “se uma criança apresenta limitações que afetem a

recepção das sensações ou a sua resposta motora a elas, vai ser preciso valorizar

outras vias de acesso sensorial, bem como outras alternativas de ação sobre o

mundo” (82:50).

A atividade de arte promove a interação social, a expressão e

comunicação não verbal, o prazer na sensorialidade, entre outros aspectos. Mas,

sobretudo, a arte promove a constituição da linguagem, a compreensão de como os

sentidos são manifestos e veiculados por meio de imagens. Trata-se de uma

atividade que pode ser significativa para alunos com TEA, porque promovem sua

interação sensorial com materiais atrativos, de diferentes cores e texturas.

As atividades de arte podem contribuir para o desenvolvimento global do

aluno, considerando suas dificuldades de comportamento, interação social,

comunicação, expressividade, bem como as suas alterações de sensibilidade ao

toque (defensividade tátil), incluindo reações fortes ao toque social/afetuoso, que

podem afetar suas relações afetivas.

Neste estudo, optei por trabalhar com atividades lúdicas de arte com

materiais que possibilitam a exploração sensorial envolvendo iniciativas motoras por

parte dos alunos, pois a atividade sensório-motora é a forma inicial de contato com o

mundo e por onde se dá a percepção da concretude das coisas. Segundo Vigotski, a

percepção é um aspecto integrado de uma reação motora. Na atividade lúdica de

arte, os materiais serão o brinquedo e a criança é livre para definir suas próprias

ações, movimentos, sendo uma liberdade ilusória, pois suas ações são, de fato,

subordinadas à percepção dos materiais, e a criança age de acordo com eles (83).

Toda percepção é um estímulo para a atividade. Uma vez que uma situação é comunicada psicologicamente através da percepção, e desde que a percepção não esteja separada da atividade motivacional e motora, é compreensível que a criança, com sua consciência estruturada dessa maneira seja restringida pela situação na qual ela se encontra (83:127).

Holm (84) diz que as brincadeiras sensório-motoras são de extrema

importância, que muitas vezes são pouco consideradas pelo adulto – pensamos que

nada está acontecendo ali, mas só o fato da ação do corpo das crianças sobre os

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materiais, o ambiente, já são movimentos estéticos, que implicam escolhas e

expressão.

O comportamento sensório-motor é a forma inicial de contato com o

mundo e de aquisição de conhecimento do ponto de vista biológico, que tem em

mente as atividades táteis da boca, dos membros etc. O bebê explora as coisas em

seu meio ambiente pelo tato, associado à visão (85). Fazemos uma relação com

alunos com TEA mais comprometidos.

Lowenfeld ressalta também sobre esta associação do tato e visão:

as experiências cinestésicas que vão desde os simples movimentos incontrolados do corpo até uma coordenação altamente desenvolvida também podem ser consideradas a base de uma grande variedade de formas artísticas. Espaço, forma, cores, texturas, sensações cinestésicas e experiências visuais acrescentam uma multiplicidade de estímulos para a expressão (86:44).

As autoras Ferraz e Fusari (87) comentam sobre a prática artística como

atividade lúdica:

Ao mesmo tempo em que representa as coisas e o mundo ou estabelece consigo e com o outro, a criança está brincando. Ela brinca criando e cria brincando. Com isso, a prática artística é vivenciada pelas crianças pequenas como uma atividade lúdica, onde “o fazer” se identifica com “o brincar”, o imaginar com a experiência da linguagem ou da representação (87:123).

A atividade imaginativa, a criação e a experimentação que estão

constantemente evidentes nas brincadeiras, no brinquedo e no jogo, pertencem

também aos fundamentos essenciais das aulas de Arte para crianças (87).

Uma equipe pesquisadora da Universidade Tuiuti do Paraná – UTP –

realizou um Projeto de Extensão Universitária com alunos estagiários do Curso de

Licenciatura em Artes Visuais da Faculdade de Artes do Paraná – FAP, em parceria

com a Escola de Educação Especial Alternativa, entre os anos de 2002 e 2006, com

a temática “Ensino de Arte no Universo Autista”. Fernandes et al (88), autores do

projeto, enfocaram o ensino de artes com ações pedagógicas para alunos com TEA

de nível severo e enfatizaram abordagens de estimulação sensorial e perceptiva:

as artes visuais oferecem à criança materiais lúdicos que podem levar a descobertas, conhecimentos, experimentação de possibilidades. Nos alunos

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autistas, essas experimentações se tornam livres, pois não se espera um resultado, apenas se experimenta, sem se deter no significado (88:4-5).

Apoiados na visão de Benjamin sobre o instante do gesto espontâneo, os

autores valorizaram os olhares, as mãos, o prazer dos sentidos e também a

importância do brincar como guia na atividade com a arte com essa população.

Afirmam que “é necessário um conhecimento sensível que ultrapasse a tentativa de

conceituar o processo que ocorre nesse universo” (88:5).

Zillmer e Dubois comentam do seu trabalho com as crianças com TEA em

uma escola regular:

Na oficina, com essas crianças, usamos brinquedos e materiais e artes visuais para experiências que favorecem as brincadeiras. A arte passa a ser ensinada de forma lúdica, e a brincadeira vai se inserindo pelo uso das tintas, melecas, massas de modelar caseira, barro, água, etc., que fazem parte do universo infantil (89:61).

Os autores também citam que os alunos são desafiados à

exploração/expressão plástica a partir das experimentações básicas voltadas à

percepção de si, do outro e do seu cotidiano, com a intenção de despertar a

sensibilidade e a educação dos sentidos.

Para as crianças e adolescentes com TEA, principalmente de nível

moderado e severo, com pouca resposta e limitações de linguagem, a sua

participação em brincadeiras de arte com materiais para exploração sensorial pode

proporcionar experiências sensoriais construtivas, pois estas atividades, envolvendo

técnicas e habilidades culturais, podem compensar algumas dificuldades dessa

população, estabelecendo formas alternativas para este indivíduo estar e viver

socialmente, tendo o educador como mediador desse processo.

Com relação à escolha do material, deve-se levar em consideração o

nível de desenvolvimento da criança, pois ela encontra nestes materiais algo que

corresponde às suas necessidades de contato sensorial. O professor também

deverá conhecer a variedade de materiais artísticos existentes e as possibilidades

de uso com os seus alunos (86).

O conhecimento sobre as necessidades dos alunos com importante nível

de atraso de desenvolvimento e pouca linguagem interativa deve ser abordado nos

cursos de formação de professores no Brasil (90), já que o futuro professor se

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defrontará com grande diversidade de alunos quando assumir uma sala de aula com

alunado, que poderá incluir alunos com TEA numa classe bastante heterogênea.

Ressalto que, além de disciplinas que tragam conteúdos teórico-práticos

sobre o ensino no contexto de inclusão, há também necessidade de conteúdos

sobre práticas artísticas, principalmente para os educadores que lidam com arte e

inclusão. As autoras Ostetto e Leite (91), que trabalham com formação de

professores de educação básica, indicam a importância da disciplina de artes no

curso de pedagogia, que contribui para a formação cultural do professor e

desenvolve repertório que servirá para as práticas com as crianças.

Refletir sobre os significados da arte; possibilitar vivências com diferentes materiais e técnicas de criação, promovendo o resgate e a reflexão sobre tantas formas de expressão possíveis (e tantas vezes esquecidas no adulto!); ampliar a sensibilidade e a percepção para as diferentes linguagens do mundo: a educação do educador (91:17).

A experiência do educador em vivências de arte é extremamente

importante, pois de acordo com Lowenfeld

um professor que nunca tenha passado pelo processo de criar com um material artístico específico jamais compreenderá o tipo peculiar de raciocínio, de reflexão, o qual é necessário para trabalhar com o barro, com as tintas ou com qualquer outro elemento. Isso significa que o professor deve estar verdadeiramente envolvido na criação com esses materiais, não sendo bastante que os conheça de um modo abstrato, por ter lido ou por ter realizado mecanicamente algum projeto. O material e a expressão devem formar um todo (86:83).

Nas oficinas de arte, embora devam ser planejadas antecipadamente por

meio da preparação do ambiente, escolha da linguagem e os materiais a serem

utilizados, sempre ocorrem interferências e improvisos no caminho, ainda mais

quando o assunto são alunos com TEA. Zillmer e Dubois comentam que “em relação

aos alunos com TGD, nunca nos deparamos com situações rotineiras, nosso

planejamento pedagógico requer estratégias de ensino que permitem a modificação

da prática” (89:55).

A ação do professor na aula de artes incentivando, apoiando e

propiciando momentos de expressão é fundamental. Zillmer e Dubois (89) ressaltam

que na oficina de artes os professores são mediadores de aprendizagem,

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acreditando nas possibilidades criativas dos alunos e na arte como importante

caminho da sua expressão.

Nos cursos de pedagogia, as disciplinas que oferecem suporte para os

conteúdos expressivos muitas vezes apresentam propostas que consideram

crianças de nível elementar, que já desenham figurativamente. Entendendo que as

crianças com TEA de nível moderado a severo respondem a propostas de contato

com materiais, mas ainda não realizam elaborações em nível de representação

figurativa, é preciso buscar repertórios em autores que trabalham com educação

infantil, por exemplo. Uma contribuição interessante está nas publicações da

dinamarquesa Anne Marie Holm, que atuava com crianças sem deficiência. A autora

valoriza a ação de todo o corpo:

quando se trabalha com a primeira infância, arte não é algo proposto de forma isolada. Engloba: controle corporal, coordenação, equilíbrio, motricidade, sentir, ver, ouvir, pensar, falar, ter segurança. E ter confiança, para que a criança possa se movimentar e experimentar. E que ela retorne ao adulto, tenha contato e crie junto. O importante é ter um adulto por perto, co-participando e não controlando (84:12).

Percebi que, no afã de atingir a alfabetização, muitas vezes os

professores seguem modelos demasiadamente sofisticados para o momento de

desenvolvimento dos seus alunos com TEA, principalmente dos níveis moderados e

severos. É preciso pensar modos de engajá-los de forma que as atividades façam

sentido para eles. O apoio e supervisão in loco de que necessitam os profissionais

que atenderão essa população, principalmente os educadores, monitores, auxiliares,

estagiários das instituições (credenciadas ou não), escolas, colégios particulares,

dizem respeito às formas de atingir os alunos de maneira simples, lúdica, corporal e

sensível.

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6 – Abordagem histórico-cultural

Na abordagem histórico-cultural, o desenvolvimento fundamenta-se na

sua concepção de homem enquanto ser biológico e social, que se estabelece por

meio de sua interação com o outro. Entende-se que o homem se constitui na cultura,

num processo histórico, por meio da ação mediada por sistemas simbólicos

constituídos por grupos sociais, sendo eles os elementos intermediários entre o

sujeito e o mundo.

A história do comportamento da criança nasce do entrelaçamento da linha

dos processos elementares, que são de origem biológica, como reflexos, reações

automatizadas ou processos de associação simples; e também das funções

psicológicas superiores como ações conscientemente controladas, atenção

voluntária, memorização ativa, pensamento abstrato, comportamento intencional e

origem sociocultural, transformando o homem de ser biológico em sócio-histórico

(92).

As relações entre os estímulos e as respostas se diferenciam em cada

uma das funções, conforme cita Vigotski6.

as funções elementares têm como característica fundamental o fato de serem total e diretamente determinadas pela estimulação ambiental. No caso das funções superiores, a característica essencial é a estimulação autogerada, isso é, a criação e o uso de estímulos artificiais que se tornam a causa imediata do comportamento (92:53).

A mediação acontece quando, ao invés de agirmos de forma direta,

imediata, no mundo físico e social, nosso contato é indireto ou mediado pelo outro

por intervenção de um elemento intermediário na relação. Vigotski destaca dois tipos

de ferramentas auxiliares: signos e instrumentos. Embora ambos possuam função

mediadora, orientam o comportamento humano em linhas divergentes, porque a

natureza das atividades humanas com signos e instrumentos diverge, como explica

o autor:

6 São diversas as grafias encontradas para o nome do autor: Vygotski, Vigotsky, Vygotsky, Vigotski, Vigotskii. As edições norte-americanas e portuguesas utilizam Vygotsky. No Brasil, ainda não há uma padronização, mas em trabalhos publicados recentemente, é utilizada a grafia Vigotski, que mais se aproxima da russa, e que utilizaremos neste trabalho. Serão consideradas as formas aplicadas pelos autores na bibliografia.

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A função do instrumento é servir como um condutor da influência humana sobre o objeto da atividade; ele é orientado externamente; deve necessariamente levar a mudanças nos objetos. Constitui um meio pelo qual a atividade humana externa é dirigida para o controle e domínio da natureza. O signo, por outro lado, não modifica em nada o objeto da operação psicológica. Constitui um meio de atividade interna dirigido para o controle do próprio indivíduo, o signo é orientado internamente (92:72-73).

No processo de desenvolvimento do indivíduo, as relações mediadas

passam a predominar sobre as relações diretas. De um lado, a presença dos

elementos mediadores como o instrumento provoca mudanças nos objetos; de

outro, o signo auxilia nos processos psicológicos e introduz uma ligação a mais nas

relações sujeito/meio, tornando-as mais sofisticadas (92).

Segundo Oliveira, entende-se o desenvolvimento da criança

metaforicamente como um processo em espiral, passando por um mesmo ponto a

cada nova evolução, no processo histórico, enquanto avança para um nível superior.

O uso dos signos engendra duas mudanças qualitativas; uma delas é a utilização de

marcas externas, o que vai se transformar em processo interno de mediação. Este

processo é denominado de internalização por Vigotski. Outra mudança é o

desenvolvimento de sistemas simbólicos, que organizam os signos em estruturas

complexas e articuladas (93).

Vigotski (92) nomeia internalização a reconstrução interna de uma

operação externa e que consiste numa série de transformações, que se iniciam num

processo interpessoal para ser internalizado como processo intrapessoal, resultado

de várias ações ocorridas durante o desenvolvimento.

Ao longo do processo de desenvolvimento, o indivíduo passa a utilizar

signos internos, substituídos por representações mentais, deixando de necessitar de

marcas externas dos objetos do mundo real. Os signos internalizados são, como as

marcas exteriores, elementos que representam objetos, eventos, situações, e

passam a ser compartilhados pelo indivíduo na cultura proporcionando a

comunicação e interação social (93).

Segundo Vigotski (92:75), “todas as funções do desenvolvimento da

criança aparecem duas vezes: primeiro, no nível social, e, depois no nível individual;

primeiro entre pessoas (interpsicológico), e depois, no interior da criança

(intrapsicológica)”.

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6.1 Desenvolvimento, aprendizado e brincadeira

Outro aspecto fundamental da teoria de Vigotski refere-se aos níveis de

desenvolvimento. Para Vigotski, é preciso considerar não apenas o nível de

desenvolvimento real, mas também o nível que ele denominou de potencial ou

proximal (93).

Um dos níveis de desenvolvimento é o nível de desenvolvimento real,

capacidade da criança em realizar tarefas de forma independente, compreendendo

as etapas já alcançadas, conquistadas, e consolidadas por ela em determinada

atividade. Trata-se do nível mais avaliado em pesquisas sobre o desenvolvimento

infantil. As funções psicológicas neste nível são aquelas já bem estabelecidas,

amadurecidas naquele momento, os produtos finais do desenvolvimento (92).

No nível de desenvolvimento potencial, está implicada a capacidade da

criança em desempenhar tarefas com a ajuda de adultos ou de crianças mais

capazes. Seria um momento do desenvolvimento que caracteriza não as etapas já

alcançadas, consolidadas, mas etapas posteriores, nas quais a interferência de

outras pessoas afeta significativamente o resultado da ação individual. Há tarefas

que uma criança não é capaz de realizar sozinha, mas que torna-se capaz de

realizar se alguém lhe der instruções, pistas, mostrar como o problema pode ser

solucionado, ou o mediador inicia a solução e a criança completa (92).

A partir destes dois níveis de desenvolvimento, Vigotski define a Zona de

Desenvolvimento Proximal (ZDP) como:

A distância entre o nível de desenvolvimento real, que se costuma determinar através da solução independente de problemas, e o nível de desenvolvimento potencial, determinado através da solução de problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes (92:112).

As funções que ainda não amadureceram nas crianças, mas que estão

em processo de constantes transformações, tendo a ajuda de adultos ou crianças

mais experientes na realização de determinada tarefa, se tornarão tarefas que

poderão ser executadas sozinhas futuramente. Ressalto que a interação social é

extremamente importante no processo de construção e consolidação das funções

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psicológicas humanas, sendo que, aos poucos, o aprendizado de novas tarefas

desperta esses processos de desenvolvimento (93).

Freitas (94:53) comenta que muitas das dificuldades de aprendizagem

devem-se à falta de inserção dos aprendizes em um nível proximal suficiente para

que alcancem o êxito.

Sobre a mediação lúdica, Freitas comenta que

não se restringe de brincadeiras ou de um setting (cenário) ludoterápico. É preciso estar atento e disponível, principalmente no caso de crianças cuja linguagem (verbal e gestual) é bastante limitada ou não desenvolvida, para os movimentos que denotam comunicabilidade: interesse, maior ou menor curiosidade, alegria ou inquietações, para intervir de modo a favorecer a atenção (ao objeto e ao mediador), a motivação e também o acolhimento. (94:53)

A escola tem um papel fundamental no desenvolvimento da criança, pois

por meio da intervenção do educador e dos colegas de classe – como

demonstração, fornecimento de pistas, instruções –, o aprendizado impulsiona o

desenvolvimento da criança, não a dirigindo apenas para as etapas que já foram

alcançadas, mas àquelas ainda não incorporadas pelos alunos. Estas mediações

provocam avanços que não aconteceriam espontaneamente pela criança,

ressaltando a importância do meio cultural e as relações entre os indivíduos (93).

Para possibilitar o encontro/confronto das experiências cotidianas no

contexto em que elas ocorrem para a formação de conceitos, quer sejam

acadêmicos ou não, numa maior internalização consciente do que está sendo

vivenciado e concebido, o educador necessita estabelecer uma relação criteriosa

entre mediação pedagógica, cotidiano e formação de conceitos para o processo de

ensino e aprendizagem fluir (95).

Outro aspecto a ser considerado é que o educador como mediador deve

explorar a sua sensibilidade para perceber no aluno autista os significados que estão

sendo construídos com relação aos conceitos que estão sendo formados, quer

sejam elementares ou complexos. O processo de ensino e aprendizagem – não só o

acadêmico, mas também os conhecimentos do cotidiano, ações de afeto, sentimento

e também de valor necessita ser orientado pela perspectiva da linguagem (95),

não apenas no caso de pessoas com autismo, mas na educação de um modo geral.

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No trabalho em questão, procurei, nos momentos em que o educador

estava com o aluno na oficina de arte, salientar e orientar para que eles

percebessem os detalhes da sua interação e como a utilização de materiais para

exploração sensorial na brincadeira e a linguagem podem aproximar este aluno do

contexto social. Destaco abaixo a importância da linguagem na mediação conforme

os autores mencionam.

Para Vigotski, como afirma Reily (82:19)

[...] a palavra, a linguagem é o veículo primordial da mediação. É com a

palavra que o homem salienta, marca, destaca aquilo que é relevante num

caledoscópio de estímulos que bombardeiam por todo lado os seus diversos

sistemas sensoriais. Mas a marcação daquilo que é relevante se dá no

contexto social.

O desenvolvimento da linguagem nos indivíduos com TEA acontece

mediante a ação dialógica entre o educador e o aluno.

É o desenvolvimento da linguagem da criança autista como atividade

constitutiva do sujeito a partir da mediação exercida pelo professor numa

perspectiva não reduzida de simples troca de informações ou de

comunicação mecanizada, mas em situações dialógicas com significado

cultural (96:10).

Freitas (94) cita Vigotski (97) ao afirmar que quando há um defeito

biológico, o organismo desenvolve possibilidades de reorganização e funcionamento

em acordo com o que é oportunizado e exigido pela cultura.

Vigotski nos fala que “as formas culturais de comportamento são o único

caminho para a educação da criança anormal. Elas consistem na criação de

caminhos indiretos de desenvolvimento onde este resulta impossível por caminhos

diretos” (98:868).

O autor relata sobre a passagem do desenvolvimento natural ao cultural

que é no desenvolvimento psicológico natural da criança e no seu meio circundante, na necessidade de comunicação com esse meio, que se encontram todos os dados necessários para que se realize uma espécie de autoignição do desenvolvimento cultural, uma passagem espontânea da

criança do desenvolvimento natural ao cultural (98:868).

A proposta desta pesquisa nos possibilita um olhar contemporâneo para a

educação da deficiência, percebendo as possibilidades de participação dessa

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população, sem dar prioridade ao que falta nos alunos com TEA e sim ao que eles

podem ter capacidade de construir e reconstruir na interação com o outro.

Nesse sentido, Vigotski oferece uma contribuição ao olhar para a

dinâmica do desenvolvimento da criança com deficiência, partindo do pressuposto

da compensação que:

o defeito exerce uma dupla influência em seu desenvolvimento. Por um lado, ele é uma deficiência e atua diretamente como tal, produzindo falhas, obstáculos, dificuldades na adaptação da criança. Por outro lado, exatamente porque o defeito produz obstáculos e dificuldades no desenvolvimento e rompe o equilíbrio normal, ele serve de estímulo ao desenvolvimento de caminhos alternativos de adaptação, indiretos, os quais substituem ou superpõem funções que buscam compensar a deficiência e conduzir todo o sistema de equilíbrio rompido a uma nova ordem (98:869).

Uma das estratégias que utilizei neste estudo para as crianças e

adolescentes com TEA foi a sua participação em brincadeiras de arte com materiais

para exploração sensorial, pois elas proporcionam experiências sensoriais

edificantes, podem diminuir algumas particularidades das dificuldades dessa

população, estabelecendo formas alternativas para esses indivíduos estarem e

viverem no grupo, tendo o educador uma função importante na mediação.

Sobre o desenvolvimento da criança na brincadeira, Vigotski diz que

“criança desenvolve-se, essencialmente, através da atividade de brinquedo.

Somente neste sentido o brinquedo pode ser considerado uma atividade condutora

que determina o desenvolvimento da criança” (99:135).

Pode-se destacar a existência da atividade imitativa no desenvolvimento

infantil através da brincadeira do faz de conta. Vigotski (99) e Leontiev (100)

concedem a brincadeira como uma função primordial para o desenvolvimento

infantil, uma vez que oferece à criança uma apropriação do meio cultural onde ela foi

constituída e no local onde a criança vive.

A atividade imitativa no contexto escolar não é um processo mecânico.

Vigotski (92:115) afirma que “as crianças podem imitar uma variedade de ações que

vão muito além dos limites de suas próprias capacidades.” O conhecimento da zona

de desenvolvimento proximal neste tema é fundamental, pois só é possível às

crianças imitarem ações, atividades que estão dentro da zona de desenvolvimento

proximal do indivíduo (93).

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A brincadeira é uma atividade em que a motivação está no próprio

processo. O alvo da brincadeira não se resume em produzir algo, mas em fazer, no

sentido da ideia da própria ação. Leontiev (100:120) ainda salienta que “a

brincadeira da criança não é instintiva, mas precisamente humana, atividade objetiva

que, por constituir a base da percepção que a criança tem do mundo dos objetos

humanos, determina o conteúdo de suas brincadeiras”.

A percepção é um aspecto integrado a uma reação motora e, no

brinquedo, a criança define suas próprias ações, numa liberdade aparente (99). Nos

indivíduos com TEA mais comprometidos, que normalmente necessitam de um

parceiro para brincar, suas ações são, de fato, secundárias aos objetos, e a criança

reage de acordo com as propriedades deles.

Oliveira salienta que “a promoção de atividades que favoreçam o

envolvimento da criança em brincadeira, principalmente aquelas que promovem a

criação de situações imaginárias, tem nítida função pedagógica” (93:67).

Entre os escritos de Vigotski, os seus textos sobre os processos de

imaginação e criação da criança são particularmente pertinentes para este estudo,

pois nas brincadeiras trabalha-se muito com estes dois processos. Para Vigotski, a

imaginação é uma atividade essencial para o ser humano e não é um passatempo

dispensável da mente; a brincadeira não é uma simples lembrança do que se

experimentou, “mas uma relaboração criativa de impressões experimentadas”

(101:17).

Com relação à criação, Vigotski valoriza “toda atividade do homem que

tem como resultado a criação de novas imagens ou ações, e não a reprodução de

impressões ou ações anteriores de sua experiência” (102:13). O autor também

define que a criação está em toda a parte no meio cultural, a partir do momento em

que o “homem imagina, combina, modifica e cria algo novo” (102:15).

Nas aulas de artes para crianças, a atividade lúdica acontece o tempo

todo, no brinquedo e no jogo. Existe neste fazer a identificação com o brincar, no

qual a criação, a atividade imaginativa e a experimentação estão sempre presentes

(87:123).

Os autores Smolka e Vigotski (101) apresentam quatro formas de relação

entre imaginação e realidade. A primeira ligação entre imaginação e realidade é

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quando elementos adquiridos das experiências vividas fornecem sustento para a

criação; e quando a variedade, abundância da experiência anterior da pessoa, serve

como material disponível e interfere na atividade criadora da imaginação.

A segunda forma da relação da imaginação com a realidade refere-se à

experiência social ou experiência do outro no contexto histórico-cultural, como as

artes, história oral, textos, literatura, música, teatro. As experiências vividas por

outras pessoas, transmitidas por veículos sociais, servem de alimento para a nossa

imaginação (101).

A terceira forma da relação da imaginação com a realidade é de

natureza emocional e mais subjetiva, já que o sentimento se atrela a determinadas

experiências, ou imagens que de alguma forma se relacionam a ela. Vigotski explica

que “as imagens da fantasia servem de expressão interna aos nossos sentimentos”

(101:26).

A quarta e última forma de relação entre fantasia e realidade é uma

criação totalmente nova, que não faz parte do repertório anterior de experiências, e

também não corresponde a qualquer objeto existente. A partir do momento que ela é

incorporada na realidade das experiências vividas, esta nova criação começa a

efetuar interferência sobre outras coisas (101).

Como os indivíduos com TEA apresentam déficits nas brincadeiras

imaginativas (4), exploramos nas oficinas com os alunos o fato de eles se mostrarem

responsivos ao encorajamento dado pelos educadores e por mim, para aprimorar

capacidades que estabelecem avanços numa área primordial do desenvolvimento

da criança.

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7 – Método

Este estudo de natureza aplicada assume uma abordagem qualitativa, ou

seja, “trabalha com o universo dos significados dos motivos, das aspirações, das

crenças, dos valores e das atitudes” (103:21). O projeto fundamentou-se no

referencial da pesquisa-ação. Segundo Thiollent,

é um tipo de pesquisa social com base empírica que é concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo e no qual os pesquisadores e os participantes representativos da situação ou do problema estão envolvidos de modo cooperativo e participativo (104:14).

A pesquisa foi desenvolvida na Vida - Escola Integrada de Educação

Especial em SP, entre fevereiro e novembro de 2014, em atuação sistemática de

oficinas para os educadores, estagiários e auxiliares, com posterior observação da

realização das atividades com os alunos, utilizando os materiais correspondentes

propostos nas oficinas. Escolhi realizar as oficinas de artes para os educadores e

alunos porque acredito que neste espaço dinâmico, em que as atividades artísticas

são vivenciadas, no aprender na prática, propiciamos o sentir, a descoberta, a

expressão, a reflexão, a construção de conhecimento e o aprendizado, numa

perspectiva de significação que ultrapassa o ato concreto.

A escola Vida caracteriza-se por atender alunos que apresentam

diagnósticos de condutas típicas de diversas síndromes, principalmente o TEA, que

se manifestam nas mais variadas idades. Os alunos tinham entre 9 e 24 anos, e com

diversos níveis de comprometimento, sendo atendidos individualmente e algumas

vezes em grupo, sempre que possível, com encontros semanais de 40 minutos de

duração. Os educadores tinham entre 22 e 43 anos, entre estagiários, auxiliares,

educadores e especialistas. As oficinas aconteceram em grupo e outras individuais,

com encontros semanais de 30 minutos de duração.

7.1 Critérios de inclusão da pesquisa

Educadores formados ou auxiliares e estagiários cursando pedagogia,

artes visuais/plásticas, música e educação física, que trabalhem com

alunos com TEA com nível moderado e severo;

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Educadores formados ou cursando especialização em Educação

Especial, TEA, Deficiência Mental, Arteterapia, Psicopedagogia, que

trabalhem com alunos com TEA com nível moderado e severo;

Educadores e alunos cujos pais tenham assinado o Termo de

Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

Todos os integrantes participaram do estudo somente após autorização

da Escola, dos educadores e dos responsáveis, por meio do TCLE, anexado ao

protocolo de avaliação inicial do pesquisador (Apêndices 1 e 2).

A Instituição se dispôs a colaborar com a pesquisa. O desenvolvimento

das atividades propostas foi planejado de acordo com a disponibilidade de tempo

dos educadores responsáveis, sendo organizado o trabalho em fases distintas.

A pesquisa foi autorizada pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Faculdade

de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (Anexo 3) pelo parecer

nº. 521.066 em 17/01/2014.

7.2 Participantes

Os participantes foram 9 profissionais, dentre eles: educadores,

estagiários e auxiliares, que atuaram com 15 crianças e adolescentes de ambos os

sexos com Transtorno do Espectro Autista – TEA, com níveis de desempenho

escolar moderado e severo. Os nomes dos profissionais e alunos foram alterados

para preservar a sua identidade.

Educadores

1) Carla, 32 anos, técnica em enfermagem. Curso de Pedagogia em

andamento. Trabalhou numa Clínica Abrigo com pacientes adultos e idosos,

inclusive autistas. Atuou como estagiária na Escola Vida.

2) Elenice, 32 anos. Curso de Pedagogia em andamento. Trabalhou

durante 4 meses em um berçário e em recreação como monitora. Atua há 20 anos

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como voluntária com crianças em evangelização infantil. Trabalhou como auxiliar de

classe na Escola Vida.

3) Eleonora, 22 anos, pedagoga. Curso de Pós-Graduação em Educação

Especial e Inclusiva – Educação a Distância (EAD) em andamento. Trabalhou como

estagiária, auxiliar de classe e atualmente é professora na Escola Vida.

4) Fabiana, 29 anos, pedagoga. Curso de Pós-Graduação em Educação

Especial e Inclusiva – EAD em andamento. Trabalhou como estagiária para o Centro

de Informação e Atendimento à Inclusão (CEFAI) em sala de aula na Educação

Fundamental, acompanhando um aluno com Síndrome de Down. Participou de

diversos cursos na área inclusiva: on-line de Síndrome de Down e Educação

Inclusiva - Paralisia Cerebral, Autismo, Síndrome de Down; nos cursos, tinha oficinas

de construção de materiais, os quais eram posteriormente levados para a sala de

aula. Atua como professora na Escola Vida.

5) Fabrício, 33 anos, pedagogo. Pós-Graduação em Psicopedagogia e

Arteterapia. Curso de Pós-Graduação em Educação Especial e Inclusiva – EAD em

andamento. Trabalhou em creches como educador e com alunos com deficiência

física e com Síndrome de Down. Trabalhou também na Secretaria de Educação do

SENAC. Atuou em consultório. Atuou como professor na Escola Vida.

6) Gabriela, 34 anos, psicóloga. Educadora Física e Pedagoga. Foi

educadora profissional na Escola da Família. Atuou como professora de educação

física na educação infantil, fundamental I e II, ensino médio e ETEC. Atuou em

consultório voluntariamente por 2 anos e meio. Atuou com aluno com Síndrome de

Down em academia de ginástica. Atua como professora na Escola Vida.

7) Janete, 41 anos, pedagoga. Curso de Pós-Graduação em Educação

Especial Inclusiva – EAD em andamento. Trabalhou em escola particular com uma

aluna com Síndrome de Down. Participou de palestra e cursos tanto na Escola Vida

como na AACD. Atuou como professora na Escola Vida.

8) Marlene, 36 anos. Curso de Pedagogia – EAD em andamento. Atuou

como estagiária na Escola Vida.

9) Roberta, 43 anos. Curso de Pedagogia – EAD em andamento. Iniciou

como estagiária na Escola Vida e atualmente é auxiliar de sala. Participou de cursos

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e palestras na abordagem Treatment and Education of Autistic and Communication

Handicapped Children (TEACCH) oferecidos pela Escola Vida na área de autismo.

Alunos

Os educadores que fazem parte da pesquisa e eu selecionamos uma lista

de alunos com nível moderado e severo de TEA que participaram do projeto, sendo

observados por mim.

1) Bernardo, 16 anos

2) Daniel, 9 anos

3) Denise, 24 anos

4) Evelin, 9 anos

5) Gilberto, 23 anos

6) Gilmar, 14 anos

7) Jamil, 11 anos

8) Josué, 11 anos

9) Júlio, 11 anos

10) Leonardo, 13 anos

11) Leonel, 12 anos

12) Lucila, 9 anos

13) Michel, 9 anos

14) Rodrigo, 13 anos

15) Tadeu, 16 anos

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Dados dos alunos coletados nos prontuários e com informantes da escola

Tabela 1. Dados dos alunos Nome Data de nascimento Sexo Diagnóstico Medicação

Bernardo

10/03/98 M Autismo – F84

Epilepsia - G.40.2

Clonazepan – 2mg 3x dia, Lamotrigina Rispiridona, Torval 300, Hidantal, Neuleptil

Dependente para as AVDs e usa fralda. Seu comportamento inclui movimentos estereotipados com as mãos, braços, e

apresenta conduta autoagressiva e heteroagressiva. Ele não se comunica verbalmente e emite sons na maioria das vezes não

compreensíveis. Entende ordens simples, porém não as executa. Quadro de epilepsia de difícil controle.

Daniel 25/11/04 M Transtorno Global do Desenvolvimento – F.84.0

Rispiridona – 1mg – noite Ácido Valproico líquido – 5ml 2x dia

Independente nas AVDs. Seu comportamento apresenta agitação física e motora. Entende e executa ordens simples. Fala ecolálica. Início do processo de alfabetização, reconhece as vogais, o seu nome e também reconhece as cores primárias.

Denise 22/08/89 F Autismo – F.84.0 + Retardo Mental Grave – F.72

Dependente nas AVDs e não tem controle dos esfíncteres. Apresenta baixa visão, tem redução motora com mobilidade reduzida e movimentos estereotipados. Entende ordens simples, porém não as executa. Resistente às atividades propostas. Ela não se comunica verbalmente e emite sons incompreensíveis.

Evelin 25/08/04 F Autismo Infantil – F.84 Risperidona – ½ tarde e ½ noite Neuleptil – 2 gotas 12hs /12hs

Dependente nas AVDs e ainda não apresenta controle dos esfíncteres. Seu comportamento inclui agitação, usa o “choro” como forma de comunicação. Ela não se comunica verbalmente e emite sons incompreensíveis. Entende ordens simples, porém apresenta resistência na execução. Interesse específico por bolas, sapatos e revistas.

Gilberto 16/10/90 M Paciente com Distúrbio Comportamental Atípico e Crise Epileptiforme.

Ácido valpróico – 4x dia

Clobazam – 4x dia

Dependente para as AVDs e é extremamente infantilizado. Aluno com distúrbio comportamental atípíco, com crises epileptiformes de difícil controle. Realiza as atividades propostas de maneira lenta e com inconsistência. Sua fala é restrita e com palavras isoladas.

Gilmar 11/09/99 M Autismo Infantil – F.84.0 Levopromazina – 100 mg –noite Zolpidem – 10mg – 1 comp. noite Melatonina – suplemento noite

Dependente para as AVDs. Apresenta estereotipias corporais acentuadas e contínuas, e comportamentos oscilatórios com

agressividade exacerbada. Entende e executa ordens simples. Sua fala é restrita e com palavras isoladas.

Jamil 15/09/02 M Autismo – F.84 Neuleptil – 8 gotas

Dependente nas AVDs. Apresenta movimentos estereotipados, isolamento e fixação por objetos específicos. Entende e

executa ordens simples. Utiliza a fala para o que necessita, com palavras isoladas e também fala ecolálica.

Josué 29/07/02 M Autismo – F84.0 Clorpromazina – 40mg/ml (15-15-30 gotas manhã, tarde, noite)

Dependente nas AVDs. Considerado autista clássico, apresenta comportamento com estereotipias, maneirismo, fala ecolálica.

Iniciou processo de alfabetização, reconhece vogais, escreve seu nome e reconhece as cores primárias e secundárias.

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Júlio 18/06/02 M Autismo – F84.0 apresentando moderado nível de funcionamento

Dependente para as AVDs. Seu comportamento abrange agitação física e motora. Entende e executa ordens simples. Utiliza esporadicamente a fala quando sente necessidade. Encontra-se no início da alfabetização e reconhece e escreve o seu nome e as cores primárias.

Leonardo 18/10/2000 M Autismo – F84.0 + Retardo Mental Moderado – F71

Rispiridona – 2mg – 14h00 Sertralina – 1mg – 8h00

Dependente para as AVDs. Seu comportamento inclui movimentos estereotipados, agressividade com movimentos descoordenados, hiperatividade física e motora. Não reage aos estímulos propostos em sala de aula, e prefere ficar isolado na maioria do tempo. Pouquíssima interação com os colegas e educadores. Ele não se comunica verbalmente. Retardo mental comprometido.

Leonel 18/11/02 M Transtorno Invasivo do Desenvolvimento – F.84.0

Dependente para as AVDs e é resistente à alimentação. Seu comportamento inclui movimentos estereotipados e autoagressão esporádica. Entende e executa ordens simples. Ele se comunica verbalmente com fala ecolálica. No pedagógico, reconhece as vogais, as cores primárias, escreve e reconhece seu nome e, quando solicitado, escreve os nomes dos amigos.

Lucila 28/08/04 F Autismo com bom funcionamento – F.84.0

Independente nas AVDs. Entende e executa ordens simples. Ela tem interesse específico desenho e escrita. Já consegue ler,

e conhece e escreve seu nome e reconhece as cores primárias. Sua fala acontece esporadicamente.

Michel 28/01/05 M Autismo Infantil – F.84.0; Epilepsia Idiopatia – G.40.3; Hidrocefalia congênita – G.91

Valproato – 2,5ml – 12h00

Dependente para as AVDs e é resistente à alimentação. Seu comportamento inclui estereotipias, isolamento e irritabilidade.

Entende e executa ordens simples. Apresenta vocabulário limitado e expressa pouquíssimas palavras. Prontidão para

alfabetização e reconhece as cores primárias.

Rodrigo 04/06/2000 M Autismo – F.84.0

Dependente para as AVDs e é extremamente resistente à mudança de rotina. Seu comportamento inclui estereotipias,

isolamento e agressividade. Ele não se comunica verbalmente. Ele não gosta muito de participar das propostas pedagógicas

em sala de aula, e prefere ficar no seu canto, isolado.

Tadeu 04/10/97 M Transtorno Global do Desenvolvimento – F.84

Independente para as AVDs. Ele é extremamente organizado e apresenta movimentos ritualizados e estereotipados. Ele não se comunica verbalmente, mas entende e executa ordens simples.

7.3 Materiais utilizados nas oficinas

A escolha dos materiais utilizados nesta pesquisa veio em decorrência da

experiência durante três anos com alunos com TEA em outra instituição, bem como

a partir de algumas leituras específicas. Os materiais privilegiados foram alguns

cujas qualidades tátil, sonora e visual poderiam gerar resposta por parte das

crianças, permitindo-lhes expressar-se de forma mais espontânea e lúdica.

Selecionei: papel celofane, serragem de madeira, plástico bolha, areia colorida,

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bolinha em gel, massinha caseira e papel ondulado. As ações foram pinturas,

modelagem e manuseio.

Foram apresentados os objetivos da pesquisa aos educadores,

estagiários, auxiliares e aos pais e/ou responsáveis dos alunos envolvidos. Também

foi solicitada a assinatura do TCLE.

Inicialmente, fiz uma reunião com a diretora, coordenadora e educadores

para a elaboração do cronograma. Posteriormente, tive o período de observação

durante dois meses, de fevereiro até março/2014, nas oficinas de arte, com a

utilização de alguns materiais de arte, como pintura a dedo. Iniciei um contato com

os alunos para criação de vínculo e para observar o desempenho deles, ao

experimentarem e explorarem alguns materiais, além da relação comigo e com os

educadores.

Tive encontros com os educadores e promovi a realização de oficinas de

artes com materiais para exploração sensorial. Na semana seguinte à oficina com os

educadores, ocorreu a atividade com seus alunos. Nestes encontros, elaborei planos

de ação que auxiliassem no desenvolvimento de cada aluno, considerando seu

desempenho e necessidades. Também foi considerada a minha experiência com

trabalhos realizados com esses tipos de materiais e com essa população.

Foi aplicado um questionário semi-estruturado aberto aos educadores,

levantando opiniões, impressões, sensações sobre a oficina de arte e as

expectativas sobre a utilização dos materiais para exploração sensorial com os

alunos.

Os encontros com os educadores foram sete; aconteceram uma vez por

semana, com duração de 30 minutos, e minha intenção foi promover um processo

de ação-reflexão-ação com a realidade observada, para examinar, discutir, analisar

e reavaliar como os materiais foram utilizados e como foi o processo de interação

com o educador. A realidade proporcionou outra possibilidade, que foi mostrar os

vídeos aos educadores em duas ocasiões. Diante da situação, tomei decisões de

promover ações desencadeadas por essas trocas de informações, construindo

assim novos repertórios sobre modos de trabalhar com esses alunos.

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7.4 Registro

O registro dos dados foi realizado por meio de anotações no diário de

campo – tanto pelos educadores quanto por mim – e também fotografia e

videogravação de todas as sessões (oficinas com educadores e atividades com os

alunos). Todo material gravado e registrado foi identificado, catalogado e arquivado.

Foram 139 episódios, entre as videogravações, e foram selecionados alguns

episódios para análise, considerando a importância de ter exemplos do material

empregado, representando duplas educador/aluno, e estes, então, foram transcritos.

As atividades específicas selecionadas para análise incluíram as

atividades com papel celofane, serragem de madeira, plástico bolha, areia colorida e

massinha caseira. Saliento que um dos materiais que utilizei – bolinha de gel – foi

retirado da transcrição após a consulta com pesquisadores doutores do Instituto de

Biociências de Rio Claro da Universidade Estadual Paulista (IBRC-UNESP), que nos

orientaram sobre o fato de que a bolinha em gel é feita de uma substância chamada

poliacrilato de sódio, que é irritante para os olhos, pele e nariz, e que não pode ser

ingerida. Destaco que após as oficinas, não tive nenhum tipo de problema, tanto

com os educadores quanto com os alunos.

7.5 Critérios para interpretação dos dados

Todo o material (as transcrições das videogravações selecionadas, as

respostas aos questionários e as anotações nos diários de campo) possibilitou

grande envolvimento com os dados coletados. O amplo manuseio do material e as

sugestões da banca de qualificação direcionaram o agrupamento temático

consonante com os objetivos do estudo.

Os dados significativos para este estudo foram as evidências da

apropriação de repertórios novos e da sensibilização dos educadores nas oficinas,

além da transposição e repercussão das vivências na sua prática com os alunos.

Assim, os registros em fotografia e videogravação, e as anotações dos educadores

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em seus diários de campo7, após a realização das atividades com os alunos,

forneceram a base qualitativa que possibilitou as análises.

A análise foi realizada de modo a perceber consonâncias e discrepâncias

entre as respostas dos educadores e dos alunos quanto aos diferentes materiais

propostos. Foi avaliada também a resposta dos alunos quanto ao interesse, busca,

iniciativa e a qualidade do brincar diante dos vários materiais. Com relação aos

educadores, a análise também buscou evidenciar a ampliação (ou não) do repertório

de propostas sensoriais disponíveis para sua atuação com os alunos. A escolha dos

episódios para análise pautou-se em alguns critérios, relacionados ao objetivo:

Seleção de dupla de episódios (oficina com o educador e a realização

da atividade deste educador com seu aluno) que revelasse alguma

forma de transposição ou da experiência do educador para sua

mediação com o aluno;

Escolha de duplas diferentes educador/aluno em que havia dois

modos diferentes de atuar – com alunos moderados e severos;

Escolha de duplas educador/aluno em que havia diversidade marcante

de desempenho e interesse pelo material, da parte dos educadores ou

da parte dos alunos;

Experiências com diversos materiais que instigaram e promoveram

uma reação ou resposta significativa ou diferente das habituais

respostas dos educadores ou dos alunos, para a discussão sobre as

qualidades sensoriais dos materiais, por exemplo: interesse em

manipular para alunos que usualmente ficavam correndo, resistindo ao

novo etc.;

Momentos interessantes de mediação dos educadores que fizeram

algo para mobilizar a participação dos seus alunos – criatividade,

busca de estratégias para envolver o aluno.

Após a análise das oficinas com a pintura a dedo no papel ondulado,

tanto dos educadores como dos alunos, percebi que o resultado das ações era

semelhante aos episódios da pintura a dedo no plástico bolha, por serem o mesmo

7 Foi realizada uma revisão simples nas citações do diário de campo dos educadores.

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processo de pintura a dedo, mas apenas com texturas diferentes. Devido a isso,

optei por não inserir o papel ondulado nos relatos.

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8 – Análise e Resultados

A escolha dos materiais analisados a seguir – papel celofane, serragem,

plástico bolha, areia colorida e massinha caseira – foi determinada por objetivos

semelhantes: proporcionar experiência visual, tátil, sonora, gustativa e/ou olfativa e

lúdica para os educadores e alunos; construir repertório dos educadores e dos

alunos sobre modos de trabalhar; observar a importância das vivências do educador

e posteriormente a aplicação na oficina com os alunos.

8.1 Material papel celofane

O papel celofane é um material liso, transparente, frágil, e normalmente é

utilizado como revestimento para embrulhar, proteger e encapar coisas. Apresenta

uma área ampla e gera interesse pela transparência e riqueza nas cores,

possibilitando diversas ações sobre ele, como: amassar, dobrar, cobrir, descobrir,

tocar, sobrepor, enrolar, andar, pisar, rasgar, balançar, dançar, massagear, jogar e

brincar. Outro aspecto que pode ser explorado com o papel celofane é o som.

Dependendo da intensidade do movimento, o material reverbera na proporção do

toque, quanto à intensidade, da velocidade do movimento ou da percussão.

Atividades: Explorar o papel celofane com as inúmeras possibilidades

que ele proporciona, com outra intenção, sem ser o de embrulhar, proteger e

encapar. Como o papel celofane é flexível, moldável e instável, a atividade tende a

promover processos que podem ser contínuos, desmanchando os amassados,

brincando com os movimentos e formas.

Episódios 4 e 10

Episódio 4 – Duração: 8´15´´

Estagiárias: Marlene e Bernardete8

Episódio 10 – Duração: 24´15´´

Alunos: Tadeu e Gilberto

8 Bernardete trabalhou como estagiária durante 2 meses e participou unicamente da oficina do papel celofane, pois ficou doente e acabou se desligando da escola.

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Descrição

Oficina com Marlene

Marlene tem 36 anos, cursa Pedagogia – EAD e atuou como estagiária na

Escola Vida durante 5 meses. Desligou-se da escola durante o projeto de pesquisa.

Na oficina das estagiárias, Marlene abriu somente um pouco o papel

celofane, que permanecia meio dobrado, enrolou-o com as duas mãos, amassou-o

lentamente e, levemente, cheirou-o, passou-o sobre seus braços e mãos, sentindo a

textura.

Sugeri para a estagiária colocar um pouco mais de força ao amassar e

perceber o som que estava sendo emitido. Marlene amassou e colocou o papel

celofane perto da orelha, percebendo o som.

Marlene: Eu estou vendo que ele funciona amassando; do jeito que você fizer, ele fica, se transforma, muda de textura (a estagiária amassou lentamente, abriu um pouco o papel celofane, virou-o de um lado, esticou-o um pouco) (...) Pesquisadora: Percebe o som... (...) Bernardete: Barulho de chuva, parece, né? Marlene: É (a estagiária continuou e amassou o papel celofane lentamente, e com as duas mãos, de forma leve, ao lado da orelha direita, e deu uma risadinha)

Figura 1 – Marlene amassa o papel celofane e escuta o som

Em determinado momento, ela experimentou o papel celofane enrolado

no seu braço e comentou sobre a sensação de quentura vivenciada.

Pesquisadora: Agora experimenta também um pouco no corpo, sabe, passar no braço, ele até aberto, assim. Põe sobre o braço, isso. Em contato

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com o teu corpo, né? (...) Veja que cor que fica seu braço. Qual é a sensação? Aí, tem o som por trás. (...) Marlene: Chega a esquentar o material (a estagiária colocou também no outro braço e começou a enrolá-lo bem devagar com os dois papéis – azul e verde) Pesquisadora: Como ficou teu braço? Marlene: Bem quente.

Figura 2 – Marlene enrola os papéis celofane no

braço

Figura 3 – Marlene abraça os papéis celofane no seu

corpo

Em outro momento, Marlene colocou os papéis celofanes sobre o seu

corpo, cobriu o tórax, as costas, e ajeitou-os, como se fosse uma peça de roupa.

Ficou “vestida” com os papéis celofanes por alguns momentos, acariciou-os, tocou-

os e abraçou-os, expressando sentimento de carinho.

Pesquisadora: Então, vamos falando tchau para o material. Aí, então, deixa ele

no cantinho. Guarda a sensação com você.

Marlene: Verdade. Interessante, né? (a estagiária tirou os papéis celofanes do

corpo e colocou-os na mesa)

Para finalizar a atividade, dei a dica para a estagiária lembrar da

sensação da exploração do celofane durante a oficina.

No questionário, Marlene descreveu o material da seguinte forma:

“É um material interessante, pois ele faz descobrirmos muitas sensações as quais muitas das vezes não prestamos atenção e nem damos valor. Podemos sentir sensações incríveis, como amassar o material, o barulho

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que ele faz, a mistura da cor quando colocado junto com outra cor, a leveza”. (Marlene – Questionário após a oficina do papel celofane).

Oficina com Tadeu

Tadeu é um adolescente de 16 anos. Ele é extremamente organizado e

independente nas AVDs e apresenta movimentos ritualizados e estereotipados. Não

se comunica verbalmente, mas entende e executa solicitações contextualizadas.

Na oficina com o aluno, a estagiária repetiu diversas manipulações

exploradas durante a oficina, como a ação de escutar o som ao amassar o papel

celofane. Marlene ressaltou o som que o papel celofane faz com o amassa-amassa

e levou as mãos do Tadeu com o celofane amassado até suas próprias orelhas.

Marlene: Aperta, aperta. (a estagiária mostrou com as mãos como fazer o movimento de apertar) Tadeu: (silêncio) (o aluno iniciou dobrando e depois começou a apertar o papel celofane lentamente) Marlene: Isso! (a estagiária continuou a mostrar com as mãos como fazer o movimento de apertar) Tadeu: (o aluno continuou apertando/amassando o papel celofane e formou uma bola) Marlene: Parabéns!!! Marlene: Aperta, aperta. Escuta o barulho, oh! Põe no ouvido (a estagiária continuou a fazer o movimento de apertar com as mãos e mostrou para o aluno que o movimento deve ser feito ao lado da orelha) (...) Marlene: Tá ouvindo o barulho? Viu? (a estagiária observou o aluno amassar o papel celofane ao lado de sua orelha)

Figura 4 – Marlene salienta ao Tadeu sobre o som do papel celofane

Figura 5 – Tadeu dobra o papel celofane

Em vários momentos, percebi que o aluno repetia algumas vezes o

movimento de dobrar o papel celofane, colocar as folhas ao lado, uma em cima da

outra, organizando-as. Observando essa situação, perguntei se ela já tinha enrolado

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o papel celofane nos braços do aluno. Ela aceitou a sugestão, enrolou o papel

celofane nos braços do Tadeu, encapando-o, e fez alguns movimentos.

Figura 6 – Marlene encapa o braço de Tadeu com

papel celofane

Figura 7 – Marlene ajuda Tadeu a passar a mão

revestida de papel celofane no rosto

Marlene: Passa a mão, passa no rosto. (a estagiária pegou no braço do aluno, revestido de papel celofane, e ajudou-o a se movimentar até o rosto). Tadeu: (silêncio) (o aluno cheirou o papel celofane) (...) Marlene: Gostou? Sente o material. (a estagiária passou a mão por cima do papel celofane, com movimentos de vaivém, no braço esquerdo do aluno) Tadeu: (silêncio) (o aluno passou a mão direita com movimentos de vaivém no seu braço esquerdo, revestido com papel celofane)

Na oficina de Tadeu, após o pedido de outro aluno Gilberto – que também

participava desta oficina – e a dica para utilizar o papel celofane como “roupa”,

constatei que ocorreram momentos em que Tadeu mostrou-se envolvido nas ações

deste faz de conta, demonstrando carinho e afeto.

Pesquisadora: Agora com o Tadeu. Vamos tentar colocar a roupa que nem colocou nele. (referindo-se ao aluno Gilberto) Marlene: (silêncio) (a estagiária pegou os papéis celofanes amarrados um no outro e começou, juntamente comigo, a enrolar os papéis celofanes no tronco de Tadeu, e depois ela continuou enrolando sozinha) Pesquisadora: Isso prof., dá uma enrolada no corpo dele. Vamos ver. Marlene: (silêncio) (a estagiária ajeitou os papéis no corpo do aluno) Marlene: Que bonito! Tadeu: (silêncio) (o aluno começou a tocar na roupa feita com o papel celofane e depois esticou os braços para a estagiária) Marlene: Pega, pega. Olha a roupa do Tadeu. (a estagiária fez o movimento com as mãos de pegar e apertar os papéis, fazendo um barulho na “roupa de celofane” do aluno e segurou nas mãos dele) Tadeu: (silêncio) (o aluno ofereceu o rosto para a educadora dar um beijo nele) Marlene: (silêncio e dando risada) (a educadora beijou-o e começou a fazer cócegas no Tadeu e apertar o celofane para produzir som)

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Tadeu: (silêncio) (o aluno novamente ofereceu o rosto para a educadora dar um beijo)

Figura 8 – Marlene dá um beijo em Tadeu, que está

vestido com os papéis celofane

Figura 9 – Gilberto, Marlene e Tadeu se abraçam

Na sequência, tivemos um momento de confraternização e alegria entre

os participantes, proporcionado pelas experiências lúdicas da brincadeira do faz de

conta, com a utilização do papel celofane como “roupa”.

Pesquisadora: O Gi está de roupa hoje, hein? Gilberto: Coloca aí, coloca. Gilberto: Dá um abraço aí, tia. Dá um abraço aí. (o aluno observou o carinho entre Marlene e o Tadeu e correu para encontrar com eles para dar um abraço) Janete: O abraço!!! (a educadora se aproximou do grupo) Todos: Eh!!!!!!!!! (Gilberto, Marlene e pesquisadora) Pesquisadora: Ele quer confraternizar.

No final da oficina com o aluno, solicitei o registro no diário de campo

sobre a oficina.

“No momento que ele pegou nas folhas já foi abrindo, amassou, formou uma bola, depois começou a passar no rosto. Enfaixamos o braço, ele gostou bastante. Começou a passar no meu braço, depois no dele, enfaixamos os dois. Ele fez bastante barulho. Depois amarramos as folhas uma na outra. Ele gostou; balancei bastante fazendo barulho. Ele só mexeu e olhava bastante nos meus olhos. Depois cobriu o rosto e começou a brincar de esconde-esconde, saiu correndo com o rosto coberto. Ele se soltou bastante, pois é bem tímido”. (Diário de campo da Marlene)

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Análise dos episódios

Ao analisar os dois episódios, percebi que várias situações que

aconteceram na oficina da estagiária se repetiram na oficina com o aluno. O

episódio da estagiária mostra que ao explorar melhor a sonoridade proporcionada

pelo material, ela pôde salientar na oficina do aluno a qualidade do som que o papel

celofane produz quando amassado. Dependendo da intensidade do movimento no

papel celofane, o som reverbera na proporção do toque. Ao amassá-lo com força, o

som emitido é forte; ao amassá-lo levemente, o som emitido é fraco.

Concordo com Holm quando cita que os materiais que são:

sentidos, tocados e manuseados não criam, necessariamente, uma ‘obra de arte’ visível, mas ‘algo’ próprio, que está além disso. Como adultos, precisamos melhorar nossa capacidade de ouvir. Ouse ouvir. Ouse sentir o que é sublime, o que vai além dos limites (84:14).

A estagiária, na oficina do aluno, ajudou Tadeu a ampliar as

possibilidades em relação ao material, que, no início, tendiam para a dobra e

redobra, como ele costumava fazer com papéis. Ao solicitar que ele amassasse o

papel celofane e ouvisse o som, se enrolasse com os papéis, isso provocou novas

sensações e percepções, tanto em nível tátil quanto auditivo. Ele expressou ter

correspondido às expectativas oferecendo o rosto para o beijo da educadora.

O ato de amassar o papel celofane foi uma brincadeira para Tadeu.

Brincar de amassar, sentir e experimentar o papel é importante para Holm, que diz

que “é preciso construir no ar antes de construir sobre uma base firme” (84:72).

É oportuno salientar Vigotski, quando comenta sobre o brincar e zona de

desenvolvimento proximal:

O brinquedo cria uma zona de desenvolvimento proximal da criança. No brinquedo, a criança sempre se comporta além do comportamento habitual de sua idade, além de seu comportamento diário, no brinquedo é como ela fosse maior do que é na realidade (99:134).

Entendo que se Tadeu tivesse brincado com o papel celofane como ele

sempre faz com outros papéis, ele teria continuado a dobrar e desdobrar as folhas

sem conseguir atentar para outras possibilidades. O fato de a estagiária ter

participado da oficina, vivenciando diversas maneiras de manusear os papéis,

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possibilitou que ela, a partir de algumas sugestões que dei, pudesse ampliar o

repertório do aluno.

A minha intervenção na oficina com o aluno ajudou, pois as dicas e pistas

levaram a estagiária, aos poucos, a promover experiências táteis com o papel

celofane no corpo de Tadeu. Marlene começou encapando o braço de Tadeu,

passou o papel no rosto, e posteriormente revestiu o tórax e as costas, nas

brincadeiras de faz de conta, com as roupas de papéis celofane.

Cabe aqui ressaltar Holm (84), quando descreve possibilidades de

materiais de arte para os educadores utilizarem com as crianças sem deficiência,

que achei que valem para as nossas crianças e adolescentes com TEA:

Abra a mente para o uso de materiais inusitados. São inúmeros os materiais disponíveis num mundo aberto a várias interpretações... Abra-se ao tempo e deixe que a brincadeira seja parte do ato de criação. Escute a si mesma, conviva de igual para igual com a criança e esteja presente de corpo e alma (84:11).

Neste caso, o papel celofane, por ser um material que possui uma

superfície grande, transparência e riqueza nas cores, possibilitou utilizá-lo como um

objeto substituto, como se fosse um tecido para fazer roupa, permitindo o gesto, a

ação simbólica. Rocha diz “o objeto lúdico tem de comportar a ação lúdica” (105:67).

Concordo com Leontiev (100) quando nos diz que nem todo objeto pode

representar qualquer papel na brincadeira, porque a realização lúdica, apesar de ser

marcada pelas condições objetivas existentes, é simultaneamente sempre

dependente da ação. E esta ação pode ter significado.

A ação numa situação imaginária ensina a criança a dirigir seu comportamento não somente pela percepção imediata dos objetos ou pela situação que a afeta de imediato, mas também pelo significado dessa situação (100:127).

A oficina da estagiária foi marcada por experiências afetivas e

brincadeiras de faz de conta com o papel celofane em contato com o seu corpo.

Colocá-los e deixá-los sobre o tórax e costas, como se fosse uma “roupa”, fez com

que ela se abraçasse e acarinhasse o material.

A brincadeira do faz de conta, na confecção da roupa de celofane no

corpo, a expressão e troca dos sentimentos de carinho e afeto gerados por esta

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ação também foram vivenciadas na oficina do aluno. Marlene amarrou e ajeitou os

papéis celofanes no corpo de Tadeu e ele ficou vestido com “roupa de papel

celofane”; então Marlene deu um beijo no Tadeu quando ele ofereceu o rosto.

Posteriormente, aconteceu uma confraternização com o abraço coletivo entre

Marlene, Tadeu e o outro aluno Gilberto, que estava presente neste mesmo

ambiente da oficina, com a outra educadora.

Aconteceram trocas e interações afetivas, proporcionadas pela

brincadeira, bem como construções criativas com o papel celofane. Ocorreu uma

reciprocidade de ação entre a imaginação e os sentimentos:

tudo o que a fantasia construa influenciará reciprocamente os nossos sentimentos, e ainda que tal edifício não concorde, em si mesmo, com a realidade, todos os sentimentos que provoca são reais, efectivamente vividos pelo homem que os experimenta (102:23).

Ferraz e Fusari ressaltam que ao mesmo tempo em que a imaginação

colhe da realidade as informações que foram filtradas pelos sentimentos, a fantasia

mobiliza emoções (87:92).

Concluí que a ampliação do repertório e a criatividade para novas

possibilidades do uso do papel celofane são um processo de construção e

aprendizado conjunto. Aprendi com a vivência na oficina da estagiária, que também

aprendeu com as dicas durante a oficina. E posteriormente, na oficina do aluno,

pude recuperar esses aprendizados, tanto da minha parte, quanto principalmente da

estagiária, que vivenciou novas experiências lúdicas e promoveu maneiras criativas

de trabalhar e interagir com o aluno.

Episódios 5 e 19

Episódio 5 – Duração: 12´15´´

Estagiária: Carla

Episódio 19 – Duração: 13´10´´

Aluno: Júlio

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Descrição

Oficina com Carla

Carla tem 32 anos, é técnica em enfermagem e cursa Pedagogia.

Trabalhou numa clínica abrigo com pacientes adultos e idosos, inclusive autistas.

Atuou como estagiária na Escola Vida durante 6 meses, desligando-se da escola

durante o projeto de pesquisa.

Na oficina das estagiárias, Carla experimentou os papéis celofanes de

várias maneiras: amassou, pisou, cheirou, rodopiou, massageou, explorou a

transparência e o som, jogou para cima, e utilizou o papel celofane para lutar com a

parceira. Outra maneira que a estagiária explorou o papel celofane, à qual darei

ênfase, foi o jogo simbólico. Carla deu forma aos papéis celofanes, e criou um balão

e em seguida um chapéu.

Pesquisadora: O que você fez aí, Carla?

Carla: Tentei fazer um balão, mas ele não encheu (a estagiária segurou as

pontas do celofane com os outros papéis dentro e balançou o balão como se fosse enchê-

lo)

Figura 10 – Carla cria um balão com os papéis celofane

Figura 11 – Carla amarra o papel celofane na cabeça

Quando ela fez o balão, não chegou a fechá-lo; tentou encher com o

vento e logo desistiu, soltando os papéis e desmanchando o balão.

Carla: Olha aqui, oh! Sabe aquelas senhorinhas. Ah! Ah! Ah! (a estagiária pegou

o papel celofane na cor rosa e colocou na cabeça, amarrando como se fosse um chapéu).

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No questionário, Carla descreveu o material da seguinte forma:

“O papel celofane faz a interação entre o som, cores e criatividade. Ele é

tranquilo e de fácil manuseio”. (Carla – Questionário após a oficina do papel celofane).

Oficina com Júlio

Júlio é um adolescente de 11 anos e apresenta nível moderado de

funcionamento. Utiliza esporadicamente a fala quando sente necessidade. Encontra-

se no início da alfabetização. Reconhece e escreve o seu nome e reconhece as

cores primárias.

No início da oficina com o aluno, Júlio amassou o papel celofane e formou

uma bola. Em seguida, fez o mesmo movimento com outro papel, ficando duas bolas

de papel celofane em cima da mesa. A estagiária, não sabendo como dar

continuidade, olhou para mim sem saber o que fazer.

Pesquisadora: Pode enrolar os dois. (referi-me aos papéis celofane) Carla: Vamos colocar os dois, oh! Júlio. Vamos pegar, oh! (a estagiária pegou os dois papéis celofane e abriu-os colocando sobre a mesa) Carla: Amassa os dois. (a estagiária deu para o aluno amassar um papel dentro do outro - o incolor e o rosa) Júlio: (silêncio) (o aluno formou uma bola com os dois papéis celofane e apertou com força os dois papéis) Pesquisadora: Prof., dá outra folha. Aí amassa dentro dessa, entendeu? Carla: Tó, mais essa (a estagiária pegou outra cor – azul, ajeitou os papéis e deu as três folhas para o aluno amassar). Amassa todas. Amassa todas juntas, isso, todas. (o aluno amassou com força os papéis, um dentro do outro formando uma bola) Pesquisadora: Nossa!! Que bolona ele está fazendo. Carla: Olha, deixa eu colocar mais uma folha. (a estagiária deu uma outra cor – amarela, abriu as folhas para ele colocar as outras amassadas dentro) Carla: Amassa Júlio. Amassa, vamos fazer uma bola. (o aluno começou a amassar todas as folhas dentro do papel celofane amarelo)

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Figura 12 – Júlio forma uma bola com os papéis celofane

Figura 13 – Pesquisadora dá dica de como amarrar a bola de papéis celofane

Depois de amassar todos os papéis e confeccionar uma bola grande, o

aluno tentou segurá-los para fechar a bola, mas não adiantava. Ao tirar as mãos da

bola, ela se abria e se desmanchava. A estagiária ofertou mais uma cor de papel e

perguntou se ele queria. Ele não respondeu e olhou para Carla, que na sequência

olhou para a bola, tentando fechá-la também. Como não tinha nenhum recurso de

cola, ou fita crepe para colá-los, resolvi interferir sugerindo amarrar as pontas da

última camada.

Carla: Vou amarrar para você (a estagiária começou a amarrar as folhas dando

nó nas pontas, formando uma bola)

Júlio: (silêncio) (o aluno ficou olhando a estagiária amassar as pontas dos

papéis)

Figura 14 – Carla amarra a bola confeccionada de

papéis celofane

Figura 15 – Júlio chuta a bola de celofane para a Carla

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Nos momentos finais da oficina com o aluno, eles pegaram a bola que

construíram com os papéis celofane, brincaram, interagiram e chutaram na quadra

da escola.

Carla: Vem jogar bola, Júlio, vem. (a estagiária pegou a bola que eles fizeram juntos e começou a chutar, direcionando a bola para o aluno) Carla: Uh-huh! Vai Júlio. (o aluno chutou a bola para ela) Carla e Júlio: (jogaram futebol com a bola de papel celofane e brincaram de um chutar para o outro, rindo)

Quando Júlio chutava a bola para a Carla, favoreceu-se um movimento de

comemorar com pulos, risos e vocalizações.

Carla: Joga, para o gol. Vai Júlio, para o gol, chuta (o aluno caminhou até a bola,

chutou para a estagiária e comemorou)

Na sequência, nesta brincadeira de faz de conta de futebol, a estagiária

envolveu o aluno com empolgação, alegria, vibração e incentivo, dizendo “Vamos

fazer o gol”, “Chuta, chuta para o gol”, chamando a atenção para fazer os gols. Júlio

ficou feliz em participar da brincadeira.

Carla: Aqui Júlio, aqui no meu pé. Vamos fazer o gol. Carla: GOOOOLLLL. (a estagiária gritou e jogou a bola para a trave do gol da quadrinha) Júlio: (o aluno caminhou atrás da bola e chutou) Carla: Vem Júlio, oh lá (a estagiária chutou a bola para o lado e o aluno caminhou atrás). Carla: Chuta de volta. (o aluno ficou com a bola no pé e chutou fraquinho) Pesquisadora: Vai Júlio, joga para o gol. Carla: Chuta, chuta para o gol. (o aluno chutou para o gol com força). Goollllll. Carla e Júlio: (os dois trocaram depois chutes um para o outro com a bola e o aluno comemorou pulando e emitindo um som) Júlio: Ehhhh.

Figura 16 – Júlio chuta a bola de celofane para o gol Figura 17 – Júlio comemora o chute que deu para Carla

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No final da oficina da estagiária com o aluno, a estagiária escreveu no

diário de campo:

“Interagiu com o material, brincou, sentiu, jogou bola, desenvolveu a atividade

com e sem auxílio, ouviu o som emitido pelo papel celofane e foi criativo.” (Diário de campo

de Carla).

Análise dos episódios

Saliento semelhanças entre a produção da oficina com a estagiária e a

oficina com o aluno. Ambas exploraram o jogo simbólico. A oficina com a Carla na

confecção do balão e chapéu, e na oficina com Júlio, na confecção conjunta com a

estagiária da bola e o jogo de futebol.

Destaco que as experiências que aconteceram na oficina da estagiária -

como colocar papel celofane dentro do outro para dar volume e formar um balão,

amarrar os papéis uns nos outros como uma forma de balançar, brincar com o

material – nos ajudaram na mediação (pistas, instruções e incentivo) na oficina do

aluno.

Quando Júlio amassou o papel celofane e moldou uma bola, a estagiária

deu uma outra folha e o aluno fez a mesma coisa, uma outra bola, ficando com duas

bolas em cima da mesa. Carla, não sabendo como dar andamento e o que fazer,

olhou para mim, e sugeri colocar um papel dentro do outro e formar uma bola única,

pois lembrei do balão que a estagiária havia construído. Como a estagiária fez

combinações de colocar uma folha dentro da outra e formou-se o balão, por que não

aproveitar esta ideia e fazer uma combinação similar, utilizando as folhas da mesma

maneira, mas dando um novo significado para a criação? Uma bola.

A oficina com Júlio mostrou também que a mediação da estagiária com o

aluno (incentivos verbais, pistas) auxiliou o adolescente a construir sentidos para as

situações vividas e possibilitou a interação dos dois durante o jogo de futebol, com a

troca de chutes de um para o outro, os gols, enfim, brincaram com felicidade e

descontração.

Nesta perspectiva, Leontiev comenta sobre as relações sociais que

acontecem nos jogos:

As relações sociais já surgem nesses jogos de forma explícita - sob a forma de relações dos jogadores entre si. Ao mesmo tempo, o papel “de

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brinquedo” também é alterado. Seu conteúdo agora determina não apenas as ações das crianças em relação ao objeto, mas também suas relações em face de outros participantes do jogo. Estes últimos, os demais participantes, tornam-se também conteúdo da atividade lúdica, e neles se fixa o motivo do jogo (100:135).

Destaco que poucas vezes ouvimos a voz do Júlio nas outras oficinas.

Nesta oficina, ele emitiu alguns sons, comemorando o gol com a palavra “Ehh!!!”. A

interação gerou um momento de jogo imaginativo no qual o uso do objeto significado

(bola) impôs-se ao uso do objeto percebido (bola de celofane), numa ação de

espécie mais lapidada.

O papel celofane foi utilizado como um objeto-pivô na brincadeira e

forneceu uma transição quando tornou-se um substituto dessa separação, no caso,

a separação entre o significado “bola” de uma bola real.

No brinquedo, o pensamento está separado dos objetos e a ação surge das ideias e não das coisas: um pedaço de madeira torna-se um boneco e um cabo de vassoura torna-se um cavalo (99:128).

Vigotski comenta ainda sobre a separação do objeto real e do seu

substituto:

o brinquedo fornece um estágio de transição nessa direção sempre que um objeto (um cabo de vassoura, por exemplo) torna-se um pivô dessa separação (no caso, a separação entre o significado “cavalo” de um cavalo real) (99:128).

O procedimento de fechar o balão na oficina da estagiária não aconteceu,

e ela optou por desmanchá-lo, desamassando os papéis. Na oficina do aluno, com a

minha interação, sugeri que amarrasse as pontas, para fechar a bola, pois a nossa

experiência anterior de amarrar os papéis, na oficina das estagiárias, possibilitou

essa criação.

Ressalto quando Vigotski (101) aborda que a variedade e abundância da

experiência anterior serve para enriquecer as novas experiências, à medida que

soluções encontradas em um contexto são reaproveitadas em outro.

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Análise geral

Tanto no trabalho de Marlene com Tadeu, quanto na oficina de Carla e

Júlio, percebe-se que a minha mediação diante às estagiárias facilitou na relação

delas na oficina com os alunos, pois dei dicas para ficarem atentas quando os

alunos repetem sempre uma ação. De que forma se pode intervir para ocorrer a

saída de ações repetitivas e aproveitar uma vivência nova para ampliar repertórios

possíveis? Essa conduta mostra que às vezes as estagiárias necessitam de apoio in

loco, pois como estão em fase de aprendizado, estágio, há momentos que elas não

sabem como proceder com o aluno, ficando um pouco perdidas.

Rivière (27) indica que os educadores necessitam de apoio e orientação

externa de profissionais especialistas e com bom nível de formação em TEA durante

o seu processo de formação.

Percebo que a estagiária Marlene é bem tranquila, sensível, carinhosa e

afetuosa. Ela demonstrou estas características em sua oficina quando: sentiu a

quentura do papel em seus braços, abraçou os papéis celofane, fazendo uma

“roupa” em seu corpo com calma. Também na oficina com o aluno, quando: segurou

o braço dele e pediu para ele passar no rosto fazendo carinho; beijou Tadeu,

abraçou os alunos. A mediação da Marlene com o aluno foi marcada por

experiências afetivas, as quais são muito necessárias para esses alunos. Conforme

comenta Magiolino (106:35), “o afeto é visto como solução de problemas

educacionais, os sentimentos e emoções passam a ser trabalhados em atividades

das mais diversas, que vão desde a expressão oral e corporal”.

Carla por sua vez se mostrou alegre, animada, divertida e criativa.

Expressou isso quando confeccionou um balão, fez o chapéu das senhorinhas;

também na oficina do aluno, quando brincou com ele de futebol, comemorou os gols,

deram risadas juntos. A mediação da Carla foi marcada por experiências alegres,

pois ela conseguiu envolver Júlio na atividade e entretê-lo na brincadeira de jogo de

futebol.

Ao analisar os episódios, percebi que diante da expressão de Carla – que

interpretei como um pedido de sugestão sobre o que mais poderia ser feito – e da

percepção que Marlene não estava trazendo novas saídas para as ações do aluno

de ficar somente dobrando as folhas de celofane, minha atitude foi, nos dois casos,

intervir. Sugeri à Carla que ela poderia colocar uma folha dentro da outra para criar

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uma bola; e sugeri à Marlene enrolar os braços do aluno com o papel transparente.

Meu objetivo foi ajudá-las a lembrar do que elas tinham vivenciado em suas próprias

oficinas.

Apesar de identificar a necessidade de as estagiárias participarem de

vivências lúdicas outras vezes, para poderem ampliar o repertório e também

aprender melhor sobre os TEA e como lidar melhor com eles, saliento que as

atividades vividas proporcionaram trocas e aprendizados para mim (que estava num

papel de observadora da atividade, primordialmente) e para as estagiárias

responsáveis pela atividade com os alunos, o que repercutiu consequentemente no

desempenho dos alunos.

Carlotto et al (45) mencionam que os professores de educação especial

necessitam, no dia a dia, usar sua criatividade e principalmente autonomia,

apresentando entusiasmo e motivação, pois o planejamento prévio de sua aula

precisa ser ajustado o tempo todo. Assim, numa atividade como a relatada, em que

o aluno interage de formas não previstas, a experiência profissional e o traquejo de

saber lidar com as variações permitem criar novos improvisos que levam à

continuidade da participação do aluno.

Rocha afirma sobre as mediações sociais no brincar:

Essas possibilidades de desenvolvimento, implicadas no brincar, não se concretizam automaticamente: para isso são necessárias condições propiciadas pelas relações sociais, em especial a participação de outros – adultos e parceiros – no transcorrer das experiências de vida da criança (105:73).

Nas oficinas dos alunos em geral, tivemos também várias ações sobre o

material, como: rasgar, andar, pisar e pular em cima, jogar os papéis para cima e

pegar, tocar, balançar, enrolar, desenrolar, dançar, massagear, jogar e brincar.

Enfatizo uma propriedade que se destacou, que foi a transparência, aproximando o

educador do aluno, proporcionando brincadeiras de esconde-esconde, mudança de

tons e cores nos braços e pernas. (Episódio 19)

Um aluno que nos surpreendeu com a interação com este material foi o

Gilmar, tanto em momentos em que brincou sozinho, jogando os papéis para cima,

como o brincar com a educadora Janete, de balançar os papéis celofane amarrados

um no outro. Normalmente, esse aluno se desinteressa facilmente com as

propostas, mas nesta ocasião, demonstrou alegria ao realizá-la. (Episódio 12)

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Percebi que alguns alunos, entre eles Josué, tiveram uma rejeição ao

papel celofane. No caso de Josué, o que incomodou foi o som. (Episódio 14)

“Era nítida sua aversão ao barulho do material. Mesmo quando dava ideias para que ele interagisse com o material, ele recuava, e era apenas por um momento. Nem mesmo as cores que chamam sua atenção interessaram a ele. Em contato com sua pele, ele também se mostrou bloqueado ao material.” (Diário de campo da Elenice)

No geral, o papel celofane foi bem aceito pelos educadores. Apenas a

estagiária Elenice mencionou que o papel celofane causou um pouco de

desconforto. A estagiária achou que foi devido ao som produzido ao manuseá-lo,

mas mesmo assim interagiu com o material. (Episódio 5)

“É um papel que faz um pouco de barulho, é um material que tem vários meios

de ser usado; em mim, ele dá arrepios.” (Elenice - Questionário após a oficina de papel

celofane).

Comentaram que é um material com cores vibrantes, resistente, leve e

fácil de manusear. Exploraram a transparência, o som ao amassá-lo e manuseá-lo;

brincaram de não deixá-lo cair no chão; sobrepuseram os papéis celofane de cores

diferentes e compuseram uma nova cor; rodaram o papel celofane com o braço

rapidamente e enrolaram no ar, formando um tipo de cone; rasgaram com a boca;

dançaram segurando o papel celofane, um em cada mão e alternando os

movimentos, levando-os sob a cabeça, girando pelo corpo, para frente e para trás;

assopraram e esperaram o papel cair no chão; construíram alguns acessórios como

capa, echarpe e roupa.

Respondendo ao questionário, disseram:

“O material utilizado trouxe para o momento uma sensação de leveza, beleza e tranquilidade. Creio que muitas dessas sensações foram causadas pelas cores escolhidas que, embora fortes, transpassam para mim calmaria e alegria”. “Leve e fácil de manusear”. (Fabrício - Questionário após a oficina de papel celofane) “É um material interessante, onde é possível explorar seu som, a cor e a mudança de ambiente quando olhamos através dele.” “É um material liso, macio, com coloração diversificada e possui uma impressão sonora muito legal.” (Eleonora - Questionário após a oficina de papel celofane)

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8.2 Material serragem colorida

A serragem é encontrada na cor natural de madeira ou pode ser tingida.

Pode ser utilizada para arranjos, enfeites, enfim, decoração em geral. Também está

presente na ornamentação das ruas, formando um tapete na celebração de Corpus

Christi, uma das mais tradicionais festas do Brasil.

A serragem permite ser agrupada, misturada, jogada, alisada em ações

físicas sobre o material. Estas ações dão espaço para a expressividade e escolhas,

que movimentam o sentido estético à medida que surgem formas, linhas, montes,

misturas de cor. É um material instável, em que a preocupação com o produto

pronto se esvai no processo de exploração. A experiência pode levar a iniciativas de

representações figurativas com a serragem.

Utilizei nestas oficinas serragens tingidas (as naturais também são

coloridas).

Atividades: Experimentar a serragem com outra finalidade – não seu uso

para montar arranjos ou enfeites, mas sim para brincar, manusear, agrupar, misturar,

jogar, alisar dentro de um suporte plástico ou na caixa de madeira.

Episódios 25 e 36 Episódio 25 – Duração: 19´15´´

Estagiária: Carla

Episódio 36 – Duração: 10´30´´

Aluna: Denise

Descrição Oficina com a Carla

Carla tem 32 anos, é técnica em enfermagem e cursa Pedagogia.

Trabalhou numa Clínica Abrigo com pacientes adultos e idosos, inclusive autistas.

Atuou como estagiária na Escola Vida durante 6 meses, desligando-se da escola

durante o projeto de pesquisa.

No início da oficina com a estagiária, conversamos sobre a serragem

colorida, e Carla foi descobrindo, ao manuseá-la, que para os alunos com TEA, o

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material é indicado para trabalhar com a percepção, o contato, a sensação. Ela

considerou que precisaria de outro material para fazer comparação de texturas.

Carla: No caso, seria mais percepção, para eles sentirem, ter contato? Pesquisadora: Para trabalhar o colorido, também. Carla: As cores, né? Pesquisadora: As cores. Apesar que, por exemplo, para eles, a gente não vai nomear as cores que eles não reconhecem, no caso, né? Mas, como é que você trabalharia isso? Carla: Ah, não sei, dá uma dica, sei lá. Acho que o contato. (a estagiária pegou a serragem do potinho e mexeu um pouco) Pesquisadora: Eh!! Então, vai pegando e colocando para cá. (orientei a estagiária a pegar a serragem do potinho e jogar na bacia) Carla: O contato, isso então. Para eles sentirem. Para ir diferenciando. (a estagiária começou a pegar a serragem do potinho e colocar na bacia) Pesquisadora: Isso. Carla: Mas, não teria que ter uma outra coisa para diferenciar este de uma coisa mais suave – no caso, algodão, que é macio. Teria que ser só serragem mesmo? Pesquisadora: Então, porque é assim: a gente vai trabalhar com vários materiais; aí seria só esse. Carla: Esse, né? Pesquisadora: Porque você vai ver as possibilidades. Daqui a pouco você vai descobrindo, entendeu? O que vai acontecer... Porque assim, o meu projeto são coisas bem simples, entendeu? São coisas simples. Carla: Porque eles também, não tem muito que... Pesquisadora: Também por causa da população, entendeu? Porque se eu coloco uma coisa muito rebuscada, eles não fazem.

Figura 18 – Carla conversa com a pesquisadora

Durante a oficina com a estagiária, após ser questionada sobre como ela

iria apresentar e conduzir a oficina da serragem colorida com a aluna Denise, que é

bem resistente a participar de atividades pedagógicas em sala de aula, Carla

comentou sobre a aluna:

Pesquisadora: Como é que você faria para apresentar o material para ela, por exemplo? Carla: Você pode brincar, porque ela vai... (a estagiária imitou corporalmente o que a aluna Denise iria fazer; levou o tronco para trás, quando colocou o material na sua mão, imitando a aluna). Aí ela tem aquela resistência, mas aos pouquinhos ela vai. (a estagiária mostrou com a mão, como colocaria a serragem na mão da aluna)

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Pesquisadora: Passando bem na mãozinha dela. Carla: Aí você vai verbalizando para ela, aí ela vai e ela chega lá. Ela está comendo sozinha, você já viu? (a estagiária passou uma mão na outra devagar) Pesquisadora: Me falaram. (...) Carla: Para ela, ela tem que sentir, tem que ver que não vai machucar, ela é muito arisca. Aí percebendo ela dá aquela... Pesquisadora: Até a gente dá uma olhada antes para ver se não tem floco grande, sabe assim?

No questionário, Carla descreveu o material da seguinte forma:

“É um material lindo, colorido e áspero.” (Carla – Questionário após a oficina da

serragem colorida)

Oficina com Denise

Denise é uma jovem de 24 anos, apresenta o diagnóstico de autismo e

retardo mental grave. Ela é dependente nas AVDs e não tem controle dos

esfíncteres. Apresenta baixa visão, tem mobilidade reduzida e movimentos

estereotipados. Resiste às atividades propostas. Entende ordens simples, porém

não as executa. Ela não se comunica verbalmente, mas emite sons. Em raros

momentos dirige o olhar ao outro.

No começo da oficina, Denise foi muito resistente. A estagiária colocou

um pouco de serragem na mão da aluna e pediu para ela sentir, abrir os olhos, mas

a aluna permaneceu com os braços duros, pouco flexíveis e com os olhos fechados.

Pesquisadora: Você não quer tocar em nada, né? Você não quer tocar em nada? Ah! Carla: Olha, Denise. (a estagiária falou bem baixinho e colocou um pouquinho de serragem na mão da aluna) Carla: Olha que legal. Denise, olha. Sente, sente Denise. (a estagiária fechou e segurou a mão da aluna com a serragem dentro) Denise: (silêncio) (a aluna estava de olhos fechados) Carla: Abre o olho, Denise. Denise, abre o olho, Denise! (a estagiária abriu a mão da aluna e passou a serragem rapidamente na mão dela, mas a aluna resistiu, não abrindo os olhos)

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Figura 19 – Denise tampa os olhos para não participar da atividade

Aos poucos, com a nossa persistência, a aluna cedeu e acabou aceitando

o toque da serragem na sua mão direita, tanto na palma da mão como no dorso, e a

tensão diminuiu. Sugeri que a estagiária Carla incentivasse a aluna com elogios.

Carla: Olha que legal, Denise. (a estagiária segurou no pulso da aluna e passou a serragem na palma da mão com a outra mão) Pesquisadora: Nossa, olha. Carla: Segura, Denise (a estagiária repetiu o movimento e passou a serragem na palma da mão da aluna) Pesquisadora: Isso, Prof. Pode fazer assim um pouquinho nela. (a estagiária esfregou a serragem colorida na palma da mão da aluna e também no dorso da mão, com movimentos de vaivém) Pesquisadora: Olha. (segurei a bacia na frente da aluna) Pesquisadora: A mão tá dura? Carla: Não, não, oh, oh! (a estagiária continuou esfregando a serragem na mão da aluna e mostrou que os dedos da aluna estavam moles) Pesquisadora: Pode continuar, continuar. Pesquisadora: Faz elogio para ela. (falei bem baixinho) Carla: Olha, Denise, olha que linda!!! (a estagiária continuou esfregando a serragem na palma da mão da aluna) Pesquisadora: Que lindo! Carla: Olha a sua mão, olha Denise, tenta segurar sozinha. Pesquisadora: A mão como é que está? Carla: Molinha, molinha, oh, oh! (a estagiária balançou a mãozinha da aluna para mostrar para mim que estava mole) (...) Carla: Parabéns, Denise!!! Pesquisadora: Nossa, parabéns!!! Carla: Você gostou, Denise? Pesquisadora: Está precisando de mais material? Carla: Não, tá bom.

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Figura 20 – Carla esfrega a serragem na mão de

Denise Figura 21 – Carla balança e mostra a mão de Denise

molinha

Destaco um momento, na sequência, em que a estagiária se surpreendeu

com o interesse de Denise pelo material, comentando que era um milagre, pois ela

ficou por um bom tempo massageando a mão direita da aluna com a serragem e

Denise permaneceu com o braço e mão moles e flexíveis.

Carla: Nossa, gente, ela gostou, que milagre. (a estagiária esfregou a serragem na palma e no dorso da mão da aluna) Pesquisadora: Olha que bonita. Carla: Só um milagre. Ah! Ah! Ah! (a estagiária continuou esfregando a serragem na palma e no dorso da mão da aluna)

Em certo momento, Carla jogou a serragem de cima para baixo na bacia,

sem tocar o material na aluna, e somente pediu para ela olhar a caída da serragem.

Denise deu uma olhadinha rápida e em seguida demonstrou desinteresse e virou o

rosto.

Carla: Denise, olha! (a estagiária continuou jogando a serragem de cima para baixo na bacia, fazendo uma cortina de serragem) Pesquisadora: Ela estava olhando ou impressão? Carla: Ela estava olhando. Pesquisadora: Continua prof. Carla: Denise, olha, Denise, aqui oh! (a estagiária foi com a bacia na direção da aluna e jogou a serragem colorida de cima para baixo) Denise: (silêncio) (a aluna deu uma olhadinha rápida para a serragem) Carla: Olha que lindo, Denise. Põe a mão, Denise. Pesquisadora: A mão, oh! Oh! (a pesquisadora se aproximou e colocou a sua mão em cima da bacia para a estagiária jogar a serragem, na frente da Denise) Denise: (silêncio) (a aluna permaneceu parada, fazendo movimento de flapping na mão direita, fechou os olhos e virou para o outro lado)

No final da oficina com a aluna, a pesquisadora solicitou para a estagiária

registrar no diário de campo sobre a oficina.

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“No início foi resistente, ficou com as mãos rígidas (duras). No decorrer da atividade e com o meu auxílio, ela foi interagindo dentro de suas limitações. Foi observado que, por instantes, ela, quando estimulada, interagiu visualmente com o material.” (Diário de campo da estagiária Carla)

Análise dos episódios

Na maioria das vezes, o trabalho com alunos com TEA que apresentam

poucas respostas demanda grande empenho, acolhimento e atenção do educador,

por isso então resolvi detalhar alguns trechos do episódio acima, com o objetivo de

mostrar o que realmente aconteceu na interação educador-aluno. Martins e Góes

(107:29) comentam que alguns movimentos dos indivíduos com TEA são simples e

rápidos e demandam “uma observação constante para uma resposta do adulto que

acolha e encoraje a continuidade de interação”.

Enfatizo que a nossa conversa com a estagiária sobre a serragem

colorida foi extremamente positiva, pois Carla foi descobrindo na troca de

experiências e no manuseio da serragem que o importante para essas

crianças/adolescentes mais comprometidas é o trabalho com o sensorial, o contato.

Situação diferente do início da oficina, quando a opinião dela era de que somente a

exploração tátil não bastava, teria que ter e mostrar para o aluno a diferença do

toque com outros materiais para comparar, como macio, áspero etc. Fica muito claro

no episódio que Denise não teria condições de diferenciar dois tipos de textura,

mesmo porque não se permitia sentir e explorar o material oferecido.

Nesse sentido, Reily (118) nos recomenda para os casos de alunos mais

comprometidos a realização de atividades de artes com experiências táteis. Para

promover um melhor rendimento, às vezes o atendimento individual é indicado. A

autora também ressalta que “a criança aprende que as coisas são ásperas ou lisas,

duras ou moles, quentes ou frias, sentindo com suas próprias mãos, antes de

aprender o nome que se dá a estas características” (108:25).

A estagiária explorou qualidades sensoriais na sua oficina: a textura da

serragem, o tamanho dos flocos, a mistura das cores. Ela não ficou preocupada em

criar algo figurativo com as serragens.

Cabe aqui frisar Ostetto e Leite, quando descrevem a importância da

contribuição da arte no trabalho de formação do educador, mesmo que não

direcionado a educadores especiais:

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Fazer com adultos para que façam com as crianças ou fazer com adultos mostrando “como fazer com as crianças”. É fundamental tocar no repertório do grupo, mexer com dimensões que não apenas a cognitiva, racional científica (91:19).

Constato que a suposição da estagiária sobre a resistência da aluna em

manusear a serragem colorida aconteceu no episódio, mas tivemos alguns

momentos de aceitação e interação com a estagiária. Como Denise é uma aluna

que não gosta de tocar as coisas com as mãos e tem hipersensibilidade ao toque,

Carla e eu imaginamos que ela não aceitaria tocar no material ofertado. Considero

que os indivíduos com TEA podem apresentar um limite sensorial elevado

(hipossensibilidade) ou baixo (hipersensibilidade) em todas as modalidades

sensoriais. Alguns comportamentos podem acontecer, como visão lateral (olhar com

o canto dos olhos), no intuito de diminuir excesso de estímulo ou extrema

sensibilidade ao toque (defensividade tátil) (31).

Acentuo também a importância da continuidade da conversa, na oficina

da estagiária, de como envolver Denise com a serragem, o que fazer e como fazer.

Os educadores não estão preparados para ensinar alunos com TEA e eles detêm

poucas informações para trabalhar de forma significativa e apropriada com estes

alunos (52).

Essa troca de ideias com a estagiária facilitou posteriormente o contato

com a aluna, pois possibilitou uma melhor percepção, manejo e integração quanto

às possíveis respostas dela, de forma mais próxima da sua atuação e

possibilidades. A aluna, aos poucos, foi diminuindo a resistência ao toque e

interagindo com a estagiária e o material. A criança com deficiência precisa de

estímulos que facilitem realizar o aprendizado e por um período longo (108).

A atividade com Denise parece indicar que a mediação da estagiária (o

apoio nos braços e mãos, os incentivos verbais dados a Denise) ajudou a jovem a

se interessar, seja por um minuto, e a levou a entrar em contato com o meio.

As relações entre os estímulos e as respostas se diferenciam em cada um

dos comportamentos, conforme cita Vigotski:

as funções elementares têm como característica fundamental o fato de serem total e diretamente determinadas pela estimulação ambiental. No caso das funções superiores, a característica essencial é a estimulação autogerada, isso é, a criação e o uso de estímulos artificiais que se tornam a causa imediata do comportamento (92:53).

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Góes (109) cita que a educação de pessoas com deficiência não deve focar as

funções elementares, pois estas são menos flexíveis, e que seu núcleo orgânico não

é mutável pela ação educativa. O que se deve direcionar é para a construção de

funções psicológicas superiores, pois estão secundariamente conectadas ao fator

orgânico, são mais suscetíveis à ação educativa e dependem das oportunidades de

compensação concretizada pelo grupo social.

No relato do episódio, pode-se considerar que, embora estejamos

trabalhando com ênfase no sensorial, no manuseio da serragem colorida, estamos

trabalhando além da função elementar (o reflexo da aluna frente ao material, suas

reações automáticas quanto à textura). Também estamos iniciando o trabalho com

as funções psicológicas superiores, como a atenção, por meio do processo de

mediação do educador para com a aluna no meio social.

A aluna ficou mais entretida na atividade quando o material teve contato

com o seu corpo diretamente, provocando algum tipo de reação. Situação diferente

de quando Denise somente olhou para a caída da serragem, feita pelas mãos da

estagiária, sem sentir o material diante do qual Denise teve pouquíssimo interesse

em responder.

Episódios 22 e 38 Episódio 22 – Duração: 12´00´´

Educadoras: Eleonora e Janete

Episódio 38 – Duração: 14´00´´

Aluno: Michel

Descrição

Oficina com a Eleonora

Eleonora tem 22 anos, é pedagoga, e atualmente cursa Pós-Graduação

em Educação Especial e Inclusiva – EAD. Trabalhou como estagiária, auxiliar de

classe, e atualmente é professora na Escola Vida.

Na oficina das educadoras, Eleonora, no início, agrupou a serragem

amarela no centro da bacia de forma lenta e organizada e fez um miolo de flor.

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Depois, agrupou cinco montinhos de serragem na cor vermelha para fazer as

pétalas, formando assim uma flor. Eleonora ficou preocupada com o produto final

que o agrupamento de serragem podia oferecer.

Pesquisadora: O que você fez? Eleonora: Uma flor? Pesquisadora: Uma flor. Que cores você utilizou? Eleonora: Vermelho e o amarelo.

Figura 22 – Flor feita por Eleonora com serragem colorida

Dando continuidade, eu propus para a educadora algumas ações para

não ficar somente na produção figurativa; incentivei-a a misturar as serragens que

havia utilizado para fazer a flor, acrescentar mais serragens, enterrar a mão e sentir

a textura do material.

Pesquisadora: Então agora vamos experienciar um pouco... misturar essas cores no pote, né? (...) Eleonora: Pode pegar outras cores, ou só as cores que a gente usou? Pesquisadora: Não, pode pegar outras cores também. (...) Eleonora: (silêncio) (a educadora misturou a serragem que utilizou para fazer a flor com uma mão só) Pesquisadora: Então Eleonora, aí você não acha que ficou pouco material para misturar, não ficou? Com a mão assim? Eleonora: Ficou. (a educadora pegou com a mão esquerda mais serragem de outro potinho para colocar na bacia e misturou com as duas mãos) Pesquisadora: Vai colocando mais material e vê como você vai percebendo. Eleonora: (silêncio) (a educadora pegou com a mão esquerda a serragem amarela em boa quantidade do potinho, jogou na bacia e misturou com as duas mãos as outras cores. Soltou o material com uma mão em cima da outra lentamente. Sentiu a textura da serragem, esfregando-a na mão)

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Figura 23 – Eleonora sente a textura da serragem colorida

Pesquisadora: Trabalhem enterrando a mão, por exemplo, sabe? Isso. Eles até curtem de poderem perceber a mão, né? Eleonora: (silêncio) (a educadora enterra a mão esquerda e com a mão direita joga mais serragem por cima da mão) Pesquisadora: Se quiser colocar material, pode colocar.

Oficina com Michel

Michel é um menino de 9 anos com diagnóstico de Autismo Infantil,

Epilepsia Idiopatia e Hidrocefalia Congênita. Seu comportamento inclui estereotipias,

isolamento e irritabilidade. Dependente para as AVDs e é resistente à alimentação.

Apresenta vocabulário limitado e emite poucas palavras.

Na oficina do aluno, Michel pegou a serragem amarela do potinho menor

com a mão; lentamente e com cuidado, começou a colocar na bacia, de forma a

agrupar e amontoar os flocos de maneira organizada. A educadora ofereceu outra

cor de serragem, mas o aluno quis terminar de pegar toda a serragem amarela do

potinho. Depois fez o mesmo com outra cor.

Eleonora: Quer o amarelo? Michel: (silêncio) (o aluno enfiou a mão no potinho com a serragem amarela e puxou para próximo de si) Eleonora: Pega o amarelo. Michel: (silêncio) (o aluno começou a colocar a serragem amarela com muito cuidado e lentamente) Eleonora: Nossa! Olha como ficou bonito. Michel: (silêncio) (o aluno olhou e observou como ficou) Eleonora: Olha só, Michel. Michel: (silêncio) (o aluno continuou a colocar a serragem amarela bem devagar na bacia)

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Figura 24 – Michel acrescenta a serragem organizadamente

Eleonora: Quer outra cor? Tem azul, tem verde. Michel, quer outra cor? Michel: (silêncio) (o aluno continuou a colocar a serragem amarela lentamente, e agrupando-a sem fazer bagunça) Eleonora: Pega outra cor. Michel: (silêncio) (o aluno continuou a colocar a serragem amarela, os últimos flocos) Pesquisadora: Pelo jeito ele quer terminar cada cor, né? Eleonora: Ele não gosta de bagunçado. Ele gosta tudo arrumado. Misturar, não vai ser o dele, que ele não gosta de misturar. Pesquisadora: É mesmo, prof.? Eleonora: Ele gosta de tudo arrumado. Michel: (silêncio) (o aluno terminou de colocar toda a serragem amarela do potinho menor na bacia) Eleonora: Nossa!!! Olha como está ficando lindo!

Figura 25 – Bacia com serragem amontoada por cor

Durante a oficina, Michel reconheceu o nome das cores e ficou bravo

quando a educadora solicitou a ele misturar e manusear as serragens.

Pesquisadora: Nossa! Acabou. Acabou. Michel: Amarelo, amarelo. Eleonora: Acabou. Pesquisadora: Então, agora, vamos misturar. Eleonora: Mistura. (a educadora mostrou com a mão no ar, como misturar) Michel: Amarelo. (o aluno colocou a bacia um pouco de lado) Eleonora: Vamos misturar. (a educadora puxou a bacia e colocou perto do aluno e convidou-o para misturar)

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Eleonora: Vamos misturar. Aqui, oh! (a educadora pegou a mão do aluno e colocou na bacia e começou a jogar a serragem em cima da mão dele) Michel: Não, não, não, não. (o aluno falou em voz alta, gritando) Eleonora: Olha, olha. Olha só, está caindo (a educadora jogou em cima da sua mão, e acabou cobrindo a mão dele, com a serragem na bacia redonda. Ele tirou a mão, limpou-a para que não ficasse nenhuma serragem. Limpou também a blusa)

Figura 26 – Michel reclama para iniciar a mistura das cores

Eleonora procurou dialogar com ele, incentivou e elogiou verbalmente com o

intuito de convidá-lo a misturar as serragens: “Que lindo!”; “Você cobriu a sua mão”;

“Mistura as cores”; “Agora você com as duas mãos”.

Eleonora: Você. Agora é o Michel. É a vez do Michel agora. Michel: (silêncio) (o aluno começou a manusear sozinho) Eleonora: Isso! Ah! Que lindo! Muito bem. Vamos lá. Michel: (silêncio) (o aluno colocou as duas mãos na bacia. Ele começou a colocar lentamente as serragens por cima da sua mão, com movimentos bem lentos) Eleonora: Olha! Você cobriu a sua mão. Você cobriu a sua mão. Michel: (silêncio) (o aluno ficou um pouco cobrindo a mão e depois tirou a mão. Limpou, olhando para que não ficasse nenhuma serragem na sua mão e no punho da blusa) Pesquisadora: Muito cuidado, né? Pesquisadora: Prof., mistura você agora com as duas mãos. Isso, para dar o exemplo. Isso. (a educadora misturou a serragem com as duas mãos e o aluno ficou olhando) Eleonora: Olha Michel, vamos misturar as cores. Olha, várias cores, muitas cores. Agora você com as duas mãos. Usa essa também. (pegou na mão do aluno, trazendo-a para dentro da bacia) Michel: (silêncio) (o aluno começou a mexer lentamente, misturando a serragem com as duas mãos) Eleonora: Vai Michel, mistura com as duas cores. Nossa! Minha nossa! Vamos? Vamos lá. (...)

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Eleonora: Vamos, vai, mexa com as duas mãos, olha! (a educadora repetiu o movimento de misturar as cores com as duas mãos e deixava cair um pouquinho de serragem fora da bacia) Michel: Uh!!! Ai, ai, ai. (o aluno pegou a serragem que caía da bacia e colocou na bacia novamente)

Após o término da oficina, como tinha forrado o chão com o tecido não

tecido (TNT) para as outras crianças brincarem, Michel depois foi até o TNT, deitou

no chão, e quis brincar um pouco com as serragens, experimentando colocar na sua

face.

Figura 27– Michel coloca a cabeça na serragem no chão

No final da oficina com o aluno, a pesquisadora solicitou para a

educadora registrar no diário de campo sobre a oficina.

“No início da atividade, [o aluno] separou todas as cores. No decorrer da atividade, misturou as duas últimas cores, o verde e o azul, e quando solicitado, misturou todas juntas, cobriu as mãos, jogou para o alto, sempre com muito cuidado quando caía material, e no final, colocou material no rosto.” (Diário de campo da Eleonora)

Análise dos episódios

Ao analisar os dois episódios, podemos observar que há algumas

semelhanças quanto à preocupação com a estética no modo de trabalhar com a

serragem.

A educadora criou algo figurativo com as serragens, uma flor, que não

remete diretamente ao processo de criação do aluno. Michel não faz algo figurativo,

mas, ao brincar, preocupou-se em agrupar as cores das serragens da mesma cor,

organizou-as na bacia sem misturá-las, mantendo de uma certa forma algo

visualmente atraente.

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Nas brincadeiras sensório-motoras, acontece uma ação do corpo sobre

os materiais. O ambiente já proporciona um movimento estético, que implica

escolhas de cores e expressão do aluno no modo de colocar as serragens na bacia.

Muitas vezes, estas brincadeiras são ignoradas pelos educadores, pois acham que

não está ocorrendo algo significativo (84).

Michel trabalhou com a serragem colorida pela primeira vez, e observei

que o aluno fez uma reelaboração criativa de impressões vivenciadas. Trata-se de

um processo semelhante ao denominado por Vigotski de atividade criadora,

chamada de combinatória.

A própria educadora, no início do episódio, falou comigo que o aluno não

gostava de coisas bagunçadas e sim tudo arrumado. Descrevo que como o

resultado da expressão artística reflete características de cada pessoa, quando

solicitei que ele misturasse as cores, ele reclamou, falou alto que não queria

misturar, pois isso ia contra a sua natureza.

Aponto que uma das características dos indivíduos com TEA são os

padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses e atividades. No caso

do Michel, ele tem o padrão de organizar as coisas e não gosta de bagunça. As

atividades de artes proporcionaram novas experiências: misturar as serragens que

estavam organizadas.

Embora a educadora tivesse a preocupação com a rejeição do aluno em

misturar o material, ela respeitou o seu tempo e cativou-o com propostas o tempo

todo por iniciativa própria. Assim, foi diminuindo a resistência ao toque e o aluno foi

explorando o material. Cito algumas sugestões e incentivos dados pela educadora:

“Que lindo!”; “Você cobriu a sua mão”; “Mistura as cores”; “Agora você com as duas

mãos”. Assim, a educadora promoveu experiências lúdicas com o material, explorou

o sensorial, e o aluno participou. Com isso, ampliou-se o seu repertório, gerando

maior flexibilidade na atuação.

A brincadeira propicia à criança o entendimento de signos sociais e

culturais e, nas aulas de arte, pode ser uma forma agradável para praticar novas

situações e colaborar para entender e apropriar-se mais naturalmente do mundo

cultural e estético (87).

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Análise geral

Tanto no trabalho de Carla com Denise quanto na relação de Eleonora e

Michel, percebe-se que as educadoras têm a suposição de que seus alunos não vão

aceitar manusear, tocar no material, em razão da resistência, hipersensibilidade ao

toque, ou porque não gostam de bagunça, desorganização.

No episódio da Carla com Denise, a suposição da estagiária era em

relação à resistência ao toque, a hipersensibilidade, mas a aluna interagiu com a

estagiária dentro dos seus limites, com o toque, massagem da serragem nas suas

mãos. A aluna sinalizou positivamente quando amoleceu o braço e a mão, e quando

olhou para a serragem e para a estagiária. O desafio no trabalho com alunos que

têm pouquíssima resposta aos estímulos, quer sejam visuais, táteis, olfativos,

sonoros ou gustativos, é encontrar maneiras de envolvê-los e trazer materiais,

atividades que correspondam àquilo que lhes é significativo e não longe da realidade

do aluno. No caso deste episódio, Carla atendeu e correspondeu às demandas da

aluna.

Reily defende, sobre a atuação do professor próximo ao aluno:

Só o professor atento às necessidades da criança vai perceber se ela está se frustrando devido alguma dificuldade motora ou técnica e poderá, assim, fornecer a orientação necessária no momento e na medida certa para aquela criança. (110:47).

No episódio da Eleonora com o Michel, a suposição da educadora era em

relação à mistura de cores da serragem, à desorganização no material. No início do

episódio, revelou-se a preocupação com o figurativo, tanto por parte da educadora

como do aluno. Ela fez uma flor na sua oficina e o aluno agrupou e organizou as

serragens por cores, não querendo misturá-las. Por minha sugestão, a educadora

misturou suas serragens e o aluno foi diminuindo a resistência e acabou misturando-

as também.

As atividades com os alunos parecem indicar que a minha mediação e a

das educadoras (os incentivos verbais, instruções, pistas) ajudaram, ao ampliar

outras possibilidades de interação.

Evidenciou-se que as educadoras ficaram felizes com as respostas dos

alunos. Cada aluno foi olhado individualmente, focando-se nas potencialidades de

cada criança/adolescente (20).

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Carla disse que se surpreendeu com o interesse de Denise pelo material,

verbalizando que era um milagre a sua atuação: ficar com o braço e mão moles e

flexíveis. Eleonora também se surpreendeu com a ação de Michel de misturar as

serragens.

Ciantelli et al (78) endossam que há necessidade de assegurar atividades

que possam desenvolver e suscitar as habilidades funcionais para as situações

sociais do meio, tendo em vista a independência dos alunos.

Nas oficinas dos alunos em geral, tivemos um caso em que o aluno

apresentou não propriamente um desinteresse, mas uma rejeição à serragem

colorida, pois durante a oficina, ele virou de costas para não participar.

Episódio 41 - Aluno Leonel

“Apresentou resistência com o material. Foi realizando a atividade de acordo

com o comando solicitado pela professora”. (Diário de campo da educadora Eleonora)

Outros alunos, no entanto, responderam bem. O aluno Bernardo, que é

bem comprometido, também gostou bastante da sensação do material da serragem

de madeira caindo em suas mãos quando o educador jogou, e a própria brincadeira

de olhar a serragem caindo no seu corpo foi divertida.

Episódio 28 – Aluno Bernardo

“O Bernardo se mostrou muito interessado no manuseio do material oferecido. Interagiu, manipulou, experimentou o material com extremo interesse. Em um dado momento, parei de interagir com ele, deixando-o livre para o manuseio. O resultado foi extremamente positivo, pois mesmo sem a minha intervenção, ele não se desinteressou pelo material, pelo contrário, em vários momentos repetia meus movimentos como o da ‘chuva’. Permaneceu sentado durante a atividade, deitando somente quando perdeu o interesse. Contudo, observei uma participação e interação do aluno com o material muito positivas.” (Diário de campo do educador Fabrício)

No início da exploração da serragem colorida, alguns educadores

relataram que ficaram incomodados por ele ser áspero e, até por ser lascas de

madeira, tem-se a impressão que machuca.

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“O material, por ser áspero, incomoda a princípio; porém, quando começamos a

manuseá-lo, percebemos que é só no começo”. (Fabiana - Questionário após a oficina da

serragem colorida)

Os educadores registraram sobre as características da serragem colorida

e as várias sensações que ela proporcionou ao manuseá-la.

Respondendo ao questionário, disseram:

“Leve, são flocos coloridos; seco” [...] “O material é ótimo, traz uma sensação de

ser criança; é bem colorido, o que chama bastante atenção.” (Elenice – Questionário após a

oficina da serragem colorida)

“Áspero, firme e bem colorido. Tem uma textura áspera, mas que não arranha. Por ser de lascas de madeira, tem-se a impressão que machuca. A sensação é boa; ao jogar para o alto, dá uma sensação de liberdade, uma nevasca colorida.” (Janete - Questionário após a oficina da serragem colorida)

Com relação à utilização da serragem colorida, nota-se que alguns

educadores, além de elogiarem a beleza do colorido e a sensação que ela

proporcionou de liberdade ao jogá-la para cima, a expressão plástica revelou o

repertório imagético do grupo, e não faltou imagem de mandalas, bandeira nacional

e flor.

Figura 28 – Mandala da Elenice Figura 29 – Mandala do Fabrício

Figura 30 – Bandeira do Brasil da Fabiana Figura 31 – Flor da Janete

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8.3 Material plástico bolha

O plástico bolha normalmente é utilizado para embrulhar, forrar e proteger

objetos quando transportados de um local para outro. Apresenta uma superfície

grande e cria curiosidade, porque convida a tocar, brincar, amassar, ouvir o som das

bolhas estourando; o plástico tem transparência, e pode ser usado como cobertura.

Sabe-se que as pessoas, quando desembrulham algo embalado em

plástico bolha, gostam muito de ficar estourando as bolhinhas, gerando uma

sensação prazerosa.

Atividades: Utilizar o plástico bolha com outro objetivo, ocultar o uso para

embrulhar, mas sim aplicar o guache sobre ele, pintando, misturando e sobrepondo

cores, podendo até deixar marcas desenhadas com o dedo e também escrita. Como

o plástico não absorve a tinta e não rasga, como acontece no papel, a atividade visa

favorecer o desenvolvimento gradativo, em que o movimento de mistura e marcas

pode ser constante.

Episódios 44 e 52 Episódio 44 - Duração: 8´40´´

Educadoras: Roberta e Fabiana

Episódio 52 - Duração: 13´00

Aluno: Rodrigo

Descrição

Oficina com Roberta

Roberta tem 43 anos, cursa Pedagogia – EAD em andamento. Iniciou

como estagiária, depois foi promovida a auxiliar de sala na Escola Vida. Participou

de cursos e palestras oferecidos sobre o TEACCH pela Escola Vida na área de

autismo.

No início da oficina com as educadoras, Roberta (auxiliar) estourou

algumas bolhas do plástico antes de começar a atividade e comentou que nunca

pintara neste material.

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A auxiliar preferiu misturar as cores das tintas, sobrepôs as cores, sem

preocupação figurativa, dando prioridade à experiência sensorial e estourando as

bolhinhas. Pintou e estourou com os dedos da mão direita e depois da mão

esquerda e, posteriormente, com movimentos simultâneos ou alternados dos dedos

das duas mãos.

Figura 32 – Roberta mistura as cores das tintas no plástico bolha

Figura 33 – Roberta pinta o plástico bolha e estoura as bolhinhas

Pesquisadora: Como é este sonzinho? Roberta: Ah, é muito gostoso. Muito bom de ouvir. Pesquisadora: E de estourar? Roberta: Melhor ainda.

Após o meu pedido para ela ficar em pé e estourar as bolhas utilizando

toda a palma da mão, Roberta pintou e estourou com as duas mãos em movimentos

circulares, na superfície do plástico, e logo retornou a estourar com o dedo e

também com os polegares. Comentou que estourar com toda a palma da mão não

dá a mesma firmeza quanto estourar com os dedos.

No questionário, Roberta descreveu o material da seguinte forma:

“É um material muito bom de mexer e traz uma sensação de prazer”. “É um

material ondulado muito macio e fácil de trabalhar”. (Roberta – Questionário após a oficina

do plástico bolha)

Oficina com Rodrigo

Rodrigo é um adolescente com 13 anos, extremamente resistente à

mudança de rotina, independente para as AVDs. Não se comunica verbalmente, e

muitas vezes se isola. Não gosta muito de participar das propostas pedagógicas em

sala de aula, e prefere ficar no seu canto.

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No início da oficina, o aluno também começou a estourar as bolhas, antes

de iniciar a pintura com a tinta guache. Rapidamente, a estagiária despejou a tinta

para Rodrigo pintar, com o intuito de ele não se dispersar, pois poderia fugir, como já

acontecera em outra ocasião.

Figura 34 – Rodrigo estoura as bolhinhas antes de começar a pintar

Figura 35 – Roberta ensina Rodrigo como pintar no plástico bolha

Pedi para a auxiliar segurar as mãos do aluno e ensinar como pintar no

plástico bolha. Roberta começou a fazer movimentos em conjunto com o aluno, de

vaivém, até estourarem algumas bolhinhas. À medida que a auxiliar percebeu que o

aluno assimilou como pintar, deixou-o fazer sozinho.

Roberta fez algumas ações para manter o aluno engajado na atividade,

como: apontou para onde ele tinha que pintar com o intuito de ampliar o espaço de

pintura; pegou no cotovelo dele, levando a mão para a mesa; incentivou o uso da

outra mão; pegou sua mão e a colocou em cima da tinta para espalhar; acrescentou

outras cores para chamar a atenção; incentivou a mistura e pintura em lugares sem

tinta; colocou cores que ele gosta, como o laranja (minha dica); elogiou verbalmente.

Rodrigo espalhou a tinta sozinho com a mão direita no plástico bolha e

algumas vezes tentou estourar com os dedos. A auxiliar Roberta, o educador

Fabrício (que também estava na sala) e eu incentivamos o aluno, dizendo

“Parabéns”, “Que lindo!” e “Que bonito!”.

Roberta: Olha Rodrigo! Olha Rodrigo! Olha, mais laranja. Oh! Passa a mão, passa. Que gostoso! Você gostou? Rodrigo: (Não responde) (o aluno espalhou a tinta com uma mão, olhou para o plástico bolha e também para o lado, para ver o que estava acontecendo na sala) Roberta: Ei, você gostou, Rodrigo? Hein? Põe a outra mão. Vai, vai, Rodrigo. (a auxiliar fez carinho na cabeça do aluno, chamando-o para a atividade, e também tocou no cotovelo, dando um empurrãozinho,

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chamando sua atenção para voltar a pintar. Pegou no outro cotovelo, trazendo o outro braço e outra mão, colocando-a na altura da mesa para pintar) Rodrigo: (Não responde) (o aluno espalhou a tinta com as duas mãos) Pesquisadora: Nossa!!! Que lindo!!! Roberta: Parabéns Rodrigo. Rodrigo: (silêncio) (o aluno tocou o plástico bolha com as duas mãos e estourou com os dedos) Fabrício: Nossa Rodrigo. Que lindo!!! Rodrigo: (Silêncio) (o aluno olhou para o educador quando ouviu o elogio) Roberta: Olha a bolinha apertando. Olha a bolinha, oh! (a auxiliar demonstrou como podia apertar com o dedo, onde não tinha tinta) Roberta: Que legal! Legal, né? (o aluno olhou para a auxiliar) Fabrício: Olha, Rodrigo. Que bonito!!! Olha! (o aluno olhou para o educador, deu uma risadinha, e em seguida continuou pintando)

Figura 36 – Rodrigo olha, ouve o outro educador elogiando-o e sorri

O aluno ficou um tempo entretido no material, percebeu a textura da tinta

no plástico bolha. Fez movimentos bem lentos com as duas mãos, de baixo para

cima, em vaivém, depois com movimentos para as laterais, enfim, tendo uma

percepção sensorial, semelhante à da oficina da educadora.

Roberta: Passa a mão, passa. Isso. Olha. Olha só. Rodrigo: (silêncio) (o aluno começou a expandir o local da pintura, mesmo sem tinta, e estourou algumas bolhinhas) Roberta: Vamos colocar verde? Olha aqui, Rodrigo. Olha a tinta aqui, oh! (a auxiliar jogou um pouco de tinta verde no plástico bolha) Roberta: Passa a mão lá na tinta. Rodrigo: (silêncio) (o aluno espalhou a tinta e olhou para o educador) Fabrício: Olha, Rodrigo! Rodrigo: (silêncio) (o aluno espalhou a tinta no plástico bolha) Roberta: Olha aqui Rodrigo, que legal esse! Vai lá. I-s-s-o!!! Que legal! (o aluno ficou somente com uma mão espalhando a tinta e a outra mão limpando no avental)

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Figura 37 – Rodrigo expande a pintura no plástico bolha

Figura 38 – Roberta contorna o coração juntamente com o aluno

Roberta pediu para que Rodrigo olhasse e pintasse, juntamente com ela,

um coração que ela destacou contornando a pintura. O aluno fez juntamente com

ela, mas logo voltou a querer espalhar a tinta e a estourar as bolhinhas.

Roberta: Olha, vamos fazer um coração? (a educadora pegou na mão direita do aluno para fazerem juntos o formato do coração) Roberta: Olha o coração do Rodrigo. Olha o coração. (a educadora pegou na mão esquerda do aluno, para contornarem juntos do outro lado o formato do coração) Rodrigo: (silêncio) (o aluno começou a estourar as bolhinhas dentro do coração)

Em outro momento, ela desenhou uma flor e falou que era do Rodrigo.

Roberta: Olha aqui, que legal, Rodrigo, vamos fazer uma flor? Olha a flor do Rodrigo? Oh! Oh! Oh Rodrigo, vamos? Rodrigo: (Não responde) (o aluno continuou deslizando as mãos para cima e para baixo e sentiu a textura da tinta)

Figura 39 – Roberta convida o aluno para fazer uma flor

Figura 40 – Roberta convida o aluno para fazer a letra

“R”

Enquanto Rodrigo espalhava a tinta, Roberta aproveitou para trabalhar a

nomeação das cores vermelha e laranja, dando maior ênfase nisso do que ao

envolvimento do aluno com a tinta. Isso me intrigou, porque eu considerei que ela

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deveria dialogar com o aluno ao invés de se preocupar com conteúdos pedagógicos

que me pareceram, no momento, distantes do interesse dele.

Roberta: Olha, quer essa aqui, olha essa oh, ver-me-lho!

Pesquisadora: Peraí Roberta, ele está estourando, você viu? Percebeu?

Rodrigo: (o aluno estava estourando as bolhinhas, pintando no plástico bolha)

Em outra situação, ela chamou atenção para a letra R do nome dele -

Rodrigo.

Roberta: Vamos fazer o R, R de Rodrigo. Olha o R de Rodrigo. Rodrigo: (silêncio) (o aluno continuou pintando de cima para baixo e sentiu a tinta deslizar na mesa. Apagou o R que a auxiliar fez e não atentou aos seus comandos) (...) Pesquisadora: Tá querendo sentir, né? Rodrigo: (silêncio) (o aluno continuou pintando de cima para baixo e olhou para mim quando fiz o comentário)

Em determinado momento, Rodrigo começou a passar a tinta nas mãos,

espalhou-a de uma mão para a outra e entrelaçou-as. Sentiu a textura e pintou suas

mãos, olhando para elas atentamente.

Figura 41 – Rodrigo passa e espalha a tinta nas mãos e sente a textura

No final da oficina da auxiliar com o aluno, solicitei que a auxiliar

registrasse suas impressões no diário de campo.

“O aluno se entregou de corpo e alma à atividade; interagiu usando as tintas e mexendo no plástico, estourando as bolhas. Achei muito interessante

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como o aluno se entregou à atividade. Senti que essa atividade pode ser usada em sala de aula.” (Diário de campo da auxiliar Roberta)

Análise dos episódios

Em função do trabalho com alunos com TEA que apresentam respostas

sutis, às vezes não demonstrando interesse imediato, às vezes exigindo persistência

do educador, busquei incluir um detalhamento que pudesse representar de forma

fidedigna os esforços dos educadores em assegurar a participação do aluno diante

da proposta, pois Rodrigo é um adolescente que na maioria das vezes não participa

das atividades e fica isolado em seu canto.

Os educadores estão preparados para trabalhar com alunos que

“aprendem” e defrontam-se com a dificuldade de aprendizagem dos indivíduos com

TEA de nível moderado e severo, devido às alterações nos aspectos da tríade

(comunicação, interação e comportamentos repetitivos) (44). Gomes e Mendes citam

em seu artigo sobre o não acompanhamento destes alunos em sala de aula:

no caso dos alunos com autismo, como a maioria deles não acompanha os conteúdos pedagógicos, provavelmente devem ser frequentemente retidos, o que acaba causando a distorção entre a série/ciclo e a idade cronológica (58:392).

Em algumas escolas os educadores necessitam fazer adaptações nas

áreas curriculares desses alunos e utilizar tecnologia assistiva, como a utilização da

CAA (56), para promover a participação e aprendizado. Esse quadro poderá gerar

nos educadores o sentimento de impotência frente às dificuldades do aluno e dos

seus próprios limites e, consequentemente, provocar um desgaste emocional (55).

Observo semelhanças entre a produção das oficinas com a auxiliar e a

atividade com o aluno. Na oficina da auxiliar, ela explorou qualidades sensoriais: a

textura das tintas, a mistura das cores, o som do estouro das bolhinhas. Não ficou

preocupada com o sentido figurativo na sua oficina, não desenhou, não pintou, não

escreveu o nome, simplesmente pintou sem significado claro dentro dos parâmetros

de simbolização gráfica do adulto.

Embora a educadora quisesse que o aluno explorasse o plástico bolha de

outra maneira, encaminhando-o para um desempenho mais escolar, Rodrigo

explorou o material de forma sensorial. Primeiramente, estourou as bolhas com os

dedos sem utilizar a tinta; depois espalhou e misturou a tinta estourando as bolhas;

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fez movimentos bem lentos com as duas mãos, de baixo para cima, em vaivém,

depois com movimentos para as laterais; passou tinta nas mãos e as esfregou,

entrelaçando-as; mas foi preciso manter o incentivo, chamar a sua atenção, mostrar

possibilidades.

Este processo de envolvimento de Rodrigo com a pintura é similar às

colocações de Fernandes et al (88) sobre a aplicação das artes visuais com autismo

quando apontam para a experimentação livre dos materiais lúdicos em artes, sem

esperar o significado no resultado.

Havia uma preocupação de contenção, caso Rodrigo resolvesse escapar

e se isolar, ainda que não tenha acontecido nenhuma desistência da atividade. Com

relação a questões comportamentais dos indivíduos com TEA, Silva e Mulick (5)

comentam que alguns alunos podem apresentar hiperatividade, impulsividade e

dificuldades de prestar e/ou manter atenção. Algumas dessas características podem

ocasionar uma desestabilidade na permanência do aluno em sala de aula, segundo

Gomes e Mendes (58), ainda mais quando a atividade não lhes agrada. Quando os

conteúdos são mais flexíveis e interessantes, como acontece na atividade de arte,

essas dificuldades podem não se manifestar.

A atividade com Rodrigo parece indicar que a intervenção dos

educadores (os incentivos verbais, instruções, pistas dadas a Rodrigo) ajudou o

jovem a se manter entretido e o levou a expandir a pintura no espaço. Quando viu

que ele estava interessado, a auxiliar utilizou a estratégia de colocar a guache verde

em lugares distantes, para ele alcançar pintando, estimulando-o a esticar o braço.

Diante deste cenário, Carlotto et al (45), em uma pesquisa com

professores da educação especial, mencionam que, às vezes, os educadores se

sentem frustrados devido à lentidão da aprendizagem destes alunos ser maior e

acabam se sentindo menos bem-sucedidos e realizados profissionalmente (48).

A auxiliar demonstrou preocupação com o sentido e significado das cores,

desenhos, letras, que nos pareceram um pouco distantes do nível de desempenho

de Rodrigo na sua etapa atual. Mostrou os desenhos figurativos (coração, flor) que

ela ia produzindo e salientou na fala os nomes das cores, deu ênfase ao fonema R,

e mostrou a letra que escreveu.

Concordo com Reily (110) quando cita em seu livro “Pré-Escola – Usos da

Arte na Pré-Escola: Alternativas” que o educador utiliza o momento em que o aluno

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está se expressando e pede para ele prestar atenção na cor que está usando,

aproveitando para trabalhar os nomes das cores. Outro aspecto que a autora

menciona é com relação aos padrões e valores estéticos e que, inconscientemente,

os educadores acabam por intervir no processo pessoal da criança. “O desenho e

pintura são formas não-verbais de expressão de sentimentos e relações. O adulto,

ao não perceber isso, impõe seus padrões: ensina a desenhar "corretamente’”

(110:41).

O aluno, por sua vez, não demonstrou interesse pelos comentários da

auxiliar – apagou as marcas deixadas no plástico bolha, próximas do seu corpo. Ele

parecia estar envolvido com a sensação que a tinta estava proporcionando, na

mistura das cores, nos movimentos dos braços ou no ato de estourar as bolhinhas.

Conforme diz a autora Reily (108:44), a pintura a dedo traz benefícios

para as crianças, pois “é excelente para desenvolver maior flexibilidade nos

movimentos amplos da criança muito tolhida, ao mesmo tempo em que ajuda a mais

agitada a extravasar suas emoções”.

Episódios 45 e 60 Episódio 45 - Duração: 8´15´´

Educadora: Eleonora

Episódio 60 - Duração: 13´50´´

Aluna: Lucila

Descrição

Oficina com a Eleonora

Eleonora tem 22 anos, é pedagoga e cursa Pós-Graduação em Educação

Especial e Inclusiva – EAD. Trabalhou como estagiária, auxiliar de classe e

atualmente é professora na Escola Vida.

Na oficina da educadora, Eleonora perguntou no início de sua produção

se era para ela desenhar e teve como orientação que pensasse nos seus alunos.

Ela começou a pintar usando somente a mão direita, fez um formato

circular cercado de outra cor e de um fundo verde, criando uma composição

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simétrica ao trabalhar de dentro para fora. Preservou o contraste das cores e

organizou o espaço, cada cor no seu lugar, não as misturando. A atividade plástica

da Eleonora lhe gerou um sentido de produto final e ela pareceu muito satisfeita com

o resultado. Ela indicou isso dizendo, “Terminei!”.

Figura 42 – Eleonora pinta em pé, com a ponta dos Figura 43 – Produção final de Eleonora dedos das mãos

Diferentemente da minha proposta inicial, de que os educadores

tentassem se colocar no lugar dos alunos, explorando os materiais como eles

possivelmente fariam, Eleonora mostrou a sua necessidade de criar uma figura

esteticamente significativa para ela, sem assumir o papel de seus alunos.

Como a minha expectativa era de ampliar o repertório exploratório dos

educadores, ao invés de valorizar a imagem pungente que Eleonora criou, percebi,

ao assistir à videogravação, que desviei as orientações em direção à

experimentação tátil.

Pesquisadora: Agora experimenta, dá uma estourada pintando. Eleonora: Essa é a mais legal. Pesquisadora: Você acha isso o mais legal? Mas o que é legal? Eleonora: Acho que a sensação de estourar. Pesquisadora: A sensação de estourar. E se eu não falasse para você estourar, você ia estourar? Eleonora: Eu já quis estourar antes. Ah! Ah! Pesquisadora: E por que não estourou? (...) Eleonora: Porque eu não sabia que podia estourar. Pesquisadora: Claro que pode, o material é seu. Eu falei pra você, dei alguma regra no começo que não podia? Eleonora: Não. Pesquisadora: Então, podia ter estourado.

Foi interessante observar que, somente após o meu convite, Eleonora se

sentiu autorizada a começar a estourar as bolhas. A educadora comentou que era

melhor estourar as bolhas na posição em pé, com apoio da mão ao estourar.

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Figura 44 – Eleonora estoura o plástico bolha, pintando

No questionário, Eleonora descreveu o material da seguinte forma:

“Macio, com bolhas que proporcionam trabalhar com diversas cores e formas. É

um material muito gostoso de trabalhar, proporciona uma sensação de liberdade e

relaxamento.” (Eleonora – Questionário após a oficina do plástico bolha)

Oficina com Lucila

Lucila é uma criança de 9 anos e apresenta bom funcionamento. Entende

e executa ordens simples. Ela tem interesse específico por desenho e escrita. Já

consegue ler, e conhece e escreve seu nome e reconhece as cores primárias. Sua

fala acontece esporadicamente.

No início da oficina, a educadora estimulou a aluna a estourar as bolhas,

segurando sua mão. Posteriormente, a aluna começou a escolher as cores, apontou

os potes para que a educadora pegasse e despejasse a tinta guache no plástico

bolha para que ela – Lucila – pudesse espalhar as cores. Sentiu a textura da tinta

nas mãos e, em um determinado momento, fez um movimento no plástico bolha com

o dedo e pareceu descobrir que podia desenhar na superfície da mistura de cores.

A aluna tentou estourar sozinha as bolhinhas, mas não pressionou

fortemente, a ponto de estourar. Voltou a realizar ações como: misturar as cores,

pintar com o dorso das mãos, imprimir a mão no plástico bolha, esfregar as mãos

uma na outra, sentir a textura e olhar para as mãos com a tinta. Enquanto a aluna

explorava o plástico bolha de várias maneiras, a educadora envolveu-se na

brincadeira de estourar as bolhinhas.

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Em outro momento, a aluna desenhou uma forma com o indicador da mão

direita, enquanto a educadora imprimiu a mão esquerda da aluna no plástico bolha

para estourar as bolhinhas.

Essa atitude mostra que às vezes o educador busca uma forma de

participar da atividade ou de explorar o material, e de certa forma, não se atenta

para o que o aluno já está realizando com autonomia.

Em dado momento, a educadora se deu conta do desenho da aluna e

buscou dialogar com ela, convidando a aluna: “Vamos desenhar?”. Ao puxar a tinta

com o dedo, ocorre um jogo de figura e fundo, em que o desenho é criado pela

retirada da tinta. A proposta da educadora foi desenhar um coração e depois uma

flor para mostrar como se faz.

A aluna apagou os desenhos da educadora, passando a mão por cima

dos traços, como se assumisse a autoria pelo espaço plástico. Ali quem estava no

comando era Lucila.

Ainda assim, Eleonora fez pedidos verbais à aluna para ela desenhar,

escrever o nome, lembrando coisas que já fazem parte do seu repertório.

Figura 45 – Lucila desenha a Galinha Pintadinha no plástico bolha e escreve o número 4

Eleonora: Faz um desenho. Faz um desenho agora. Faz a Galinha Pintadinha. Lucila: (silêncio) (a aluna começou a desenhar a Galinha Pintadinha) Eleonora: Você tá fazendo a Galinha Pintadinha? Nossa! Essa é a Galinha Pintadinha, Luci? Pesquisadora: Fez sozinha? Eleonora: (não responde) (balançou a cabeça confirmando) Eleonora: Que linda a Galinha Pintadinha da Luci, olha só! A aluna escreveu o número 4. Eleonora: Escreve o nome da Luci agora. Lucila: (silêncio) (A aluna escreveu o nome dela em letra de forma) Eleonora: Que lindo, Lucila. Eleonora: Quem é essa? O que é? Lucila: Galinha Pintadinha. (falou bem baixinho) Eleonora: É a Galinha Pintadinha? E essa?

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Lucila: O quatro. Eleonora: Ah é? Que lindo! Eleonora (para a pesquisadora): A Lucila é a única aluna que faz os desenhos que dá para a gente identificar, e ela fala e reconhece os desenhos que ela faz.

No final da oficina com a aluna, a pesquisadora solicitou para a

educadora registrar no diário de campo sobre a oficina.

“Apresentou um contato satisfatório com o material, interagindo bem com ele. Realizou a mistura de cores e desenhou vários desenhos no plástico bolha e, para finalizar, se atentou em estourar as bolhas; quando não conseguia, segurava a mão da professora para ajudá-la.” (Diário de campo da Eleonora)

Análise dos episódios

Ao analisar os dois episódios, parece que Eleonora se permitiu maior

exploração tátil quando orientou a atividade com a aluna do que quando ela própria

vivenciou a pintura do material.

Percebi, então, uma diferença clara no processo da educadora e da

aluna. Quando sugeri que Eleonora pensasse nos seus alunos, a resposta foi uma

composição circular simétrica, a qual foi significativa para ela, embora não

remetesse ao processo de manuseio do material que os alunos provavelmente

fariam. Cabe pensar que muitos professores não têm experiência frequente de

representação plástica com materiais que demandam contato direto; assim,

transparece a necessidade de produção pessoal e fruição estética, antes de

participar de oficinas “pensando nos alunos”.

A autora Albano (111) ressalta sobre a importância das vivências nas

linguagens artísticas para os alunos de pedagogia, que não são da área de artes. O

contexto da sua reflexão são suas aulas de Educação, Corpo e Arte ministradas no

curso de Pedagogia da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de

Campinas (UNICAMP), cujo objetivo é:

Promover vivências que possibilitem aos alunos reverem e ressignificarem sua relação com a arte, e posteriormente, refletirem por que e como incluí-la (ou não) no currículo. Meu desafio é levar os alunos a reconhecerem este lugar ‘sem lugar’ da arte e, se possível, despertar neles o desejo de fruição e expressão através das linguagens artísticas (111:27).

A autora também indica a auto-observação para os alunos de pedagogia:

Ao convidá-los a freqüentar esta disciplina, minha intenção é aproximá-los das questões que preocupam os futuros professores de arte, possibilitar que

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se familiarizem com os princípios que norteiam a área e observar se, dessa forma, conseguem ir além da resposta padrão de que arte serve para desenvolver “criatividade e sensibilidade” (111:29).

Ao orientar Lucila, Eleonora promoveu um processo mais sensorial por

parte da aluna do que ela parece ter se permitido quando estava realizando sua

própria pintura.

O episódio também mostra que ao explorar a sonoridade proporcionada

pelo material, pintando com o dedo no plástico bolha, a educadora parece que teve

ideias com a vivência da aluna. Surgiu uma outra forma de explorar o plástico, como

a criação de marcas com a ação do desenho e a escrita sobre ele, já pintado

atividade essa que já faz parte do repertório da aluna, que gosta muito de desenhar.

Uma possibilidade que surgiu foi o desenho e apagamento, para refazer outro fundo,

outra figura.

Reily comenta, sobre a versatilidade da pintura a dedo, que

é quase como desenhar na lousa. Nada precisa ser definitivo. A criança pode colorir uma área, e depois puxar a tinta para outra parte com a mão. Pode espalhar outra cor por cima, misturar as duas e riscar na tinta com o dedo, para, em seguida, apagar tudo (108:44).

As autoras Ferraz e Fusari explicam sobre o desenho e a pintura com as

crianças:

são experiências que a criança vivencia e aprende a comunicar. A criança não faz uma preparação para desenhar ou pintar, ela apenas diz: eu quero desenhar, eu vou pintar. O que de fato existe é o divertimento e a conversa que ela elabora consigo e os amiguinhos ou o adulto ao desenhar. Com o desenho e a pintura ela pode contar seus pensamentos, suas fantasias e criar seus símbolos visuais gráficos (87:106).

Freitas nos diz que “esse processo é determinado pelo contexto sócio-

cultural: ninguém pinta, desenha, ou molda aquilo que vê, mas o que aprendeu a

ver” (112:3). Vigotski fala que a criança desenha “o que sabe sobre a coisa; o que

lhe parece mais essencial na coisa, e não aquilo que vê ou o que imagina sobre a

coisa” (101:107).

Lucila desenhou a Galinha Pintadinha e, antes da sua produção, ocorreu

a intervenção da educadora, quando esta solicitou que ela desenhasse a figura que

ela já dominara em outros momentos. Em seguida a aluna fez o numeral.

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Nestes dois episódios, há discrepância no que a aluna está fazendo e o

que a educadora queria que ela fizesse. A aluna atendeu às solicitações da

educadora (estourar as bolhinhas), mas voltou a fazer o que ela queria (espalhar,

misturar a tinta e posteriormente, desenhar). Lucila produziu desenho figurativo, mas

não demonstrou interesse em criar uma composição como produto pronto. Ela se

mobilizou pelo processo, com suas possibilidades de criar e apagar de novo.

Interessantemente, desenhou uma galinha de uma cantiga utilizada na escola,

escreveu o número quatro e escreveu o nome – três ações não relacionadas entre

si, mas que refletem demandas escolares.

Embora Eleonora tivesse vivenciado um pouco de experiência sensorial

no final de sua oficina, ela também expressou a necessidade de explorar o espaço

da aluna, estourando as bolhas, algo que ela pouco fez na sua oficina. Percebo a

necessidade da educadora de ter mais tempo para estourar as bolhinhas, pois a

oficina9 (113) apud Vieira (114) de artes dos educadores teve apenas 30 minutos –

devido à disponibilidade deles e da escola, e eram realizadas antes do início das

aulas e também na hora do almoço. Outra necessidade que constato é de a

educadora poder ampliar as possibilidades de utilização do plástico bolha em sua

oficina, pois ela ficou um pouco contida na expressividade e na exploração de

possibilidades, preocupando-se com a forma (mandala).

Este episódio me levou a pensar que os educadores em geral se

beneficiariam ao participar de vivências lúdicas em outras ocasiões, para poderem

ter experiências de representações plásticas pessoais e também conseguirem uma

interação de forma mais próxima da produção dos alunos, integrando melhor suas

orientações às respostas deles.

No caso de Lucila, havia total autonomia de realização da atividade; não

necessitava de nenhuma ajuda. No diário de campo, a educadora comentou que a

aluna é quem segurava na sua mão, mas vi que foi o contrário, analisando a

videogravação.

Outra sugestão seria a ampliação da vivência, com música de fundo; uso

de diferentes tipos de plástico, com tamanhos diferentes de bolhas; uso de outras

9 É um tempo e um espaço para aprendizagem; um processo ativo de transformação recíproca entre sujeito e objeto; um caminho com alternativas, com equilibrações que nos aproximam progressivamente do objeto a conhecer (113:11).

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texturas nas tintas – por exemplo, acrescentar amido de milho na guache; pintar em

dupla com parceiros; utilizar recurso da autoscopia10.

As autoras Ostetto e Leite (91) indicam que, para ampliarem e refletirem

sobre os fundamentos essenciais para a formação do professor, é interessante para

os educadores cursarem a disciplina de artes na pedagogia e terem vivências com

diferentes materiais de arte e técnicas expressivas.

Análise geral

Tanto no trabalho de Eleonora com Lucila quanto na relação de Roberta e

Rodrigo, nota-se que os educadores têm objetivos próprios e, às vezes,

desconsideram aquilo que o aluno está trazendo para a atividade. Da minha parte

como pesquisadora, observei durante as análises das videogravações que eu

também tinha objetivos que buscava atender no processo de oficina e orientação.

Revela-se a preocupação com o figurativo, com os conteúdos de

aprendizagem relacionados à tradição da “prontidão” para a alfabetização

(repertórios conceituais e musicais da educação infantil). A explicação de porque isto

acontece pode ser resumida com o comentário de Reily sobre a visão da arte dos

profissionais de escola:

As artes são utilizadas para complementar a área pedagógica, com um fim específico em vista: a futura alfabetização das crianças. As atividades não são programadas para favorecer o desenvolvimento da criatividade. Os orientadores de tais programas parecem acreditar que a criança não precisa de criatividade para ser alfabetizada (110:47).

No caso da Roberta, ela atende e corresponde às demandas da função

como auxiliar, mas para o Rodrigo (13 anos), as sugestões são infantilizadoras.

Quais são os interesses de Rodrigo que poderiam ter sido desenhados no plástico

bolha pela professora?

O desafio no trabalho com alunos que têm uma resposta plástica aquém

da sua idade cronológica é encontrar maneiras de envolvê-los sem trazer conteúdos

infantis e que não correspondam àquilo que lhes é significativo.

10

A palavra “autoscopia” é composta pelos termos “auto” e “scopia”. O primeiro trata de uma ação realizada pelo

próprio sujeito e o segundo refere-se a escopo (do grego skoppós e latim scopu), que quer dizer objetivo, finalidade, meta, alvo ou mira. A ideia de autoscopia diz respeito, portanto, a uma ação de objetivar-se, na qual o eu se analisa em torno de uma finalidade (115).

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Outro aspecto que observo nas educadoras destes episódios é a

ansiedade em fazer algo para e pelo aluno, sem aguardar o seu tempo, a sua

resposta, o seu limite. Este sentimento também é citado nos estudos de Esteve (37),

quando comenta que a notável pulverização da atividade como educador e a

multiplicidade das ocupações que assumem no ambiente educacional, não somente

em relação ao social, são consequência das expectativas idealizadas sobre eles, o

que facilita o acréscimo de tensão, gerando a ansiedade.

Nas oficinas em geral, este material foi um dos preferidos pelos alunos;

mesmo aqueles que não gostam muito de sujar as mãos pintaram no plástico bolha.

O som chamou a atenção. Era uma atividade nova, que não fazia parte do repertório

dos educadores. Somente o aluno Bernardo não se interessou pela atividade, não

quis mexer na tinta e se jogou no chão como forma de recusa a participar. (Episódio

51).

“O aluno Bernardo ficou um tanto distante da atividade proposta, não se interessou quando eu coloquei suas mãos sobre a tinta. Ele rejeitou, não quis mais mexer, se jogando no chão. Acredito que por ele ter se negado a realizar a atividade, não gostando do material. Talvez se tentarmos novamente, possa acontecer um contato.” (Diário de campo do educador Fabrício)

Outros alunos que não gostam de sujar as mãos com tinta recusaram-se

a pintar no início. Aos poucos, com o incentivo da educadora e com estímulo que o

próprio material apresenta – o estouro do plástico bolha, que chama atenção, as

cores de guaches para pintar –, eles foram se interessando e interagiram com o

material.

Episódio 59 – Aluno Michel

“Michel apresentou resistência no início da atividade. Entretanto, no decorrer, foi realizando a atividade de acordo com os comandos solicitados pela professora e finalizou a atividade fazendo uma grande mistura de cores”. (Diário de campo da educadora Eleonora)

Na oficina com os educadores, não houve nenhuma rejeição com relação

ao material. Eles gostaram, principalmente das sensações prazerosas

proporcionadas ao pintar com as mãos, utilizando tinta guache. Comentaram que é

um material ondulado e macio e que, ao pintar, utilizar as mãos com guache sobre

ele, as bolhinhas estouram, emitem um som e que é muito gostoso de mexer.

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Respondendo ao questionário, disseram:

“Líquida, às vezes grossa, às vezes aguadinha, a tinta; o plástico bolha chama para várias experiências.” [...] “Achei muito interessante, pois faço pintura em tecido, mas nunca havia sentido a maciez da tinta na mão. Ele dá para ser trabalhado de várias maneiras e dá para mudar de opinião e construir novas formas tudo de novo.” (Marlene - Questionário após a oficina do plástico bolha)

“Gostei de trabalhar com plástico bolha. A sensação foi prazerosa, gostosa, me deixou entretida. Fica mais interessante quando as bolhas começam a estourar com os movimentos das mãos.” [...] “Textura lisa, com bolinhas de ar.” (Janete - Questionário após a oficina do plástico bolha)

“É um material de fácil manuseio e colorido. Misturar as tintas em cima do

plástico me deu a sensação de leveza, uma emoção forte a cada bolha estourada.” [...]

“Leve e colorido.” (Carla - Questionário após a oficina do plástico bolha)

Com relação à utilização do plástico bolha, percebi que alguns

educadores, mais do que explorar a sensação que o material proporcionou no

estouro das bolhinhas, envolveram-se na produção de figuras de seu repertório

imagético. Não faltou imagem de coração, bandeira nacional, flor e céu.

Figura 46 – Coração do Fabrício Figura 47 – Bandeira da Fabiana Figura 48 – Flor e Céu da Janete

O processo dos alunos também ensinou os educadores sobre algumas

possibilidades que eles não tinham vivenciado, como usar o dedo para puxar a tinta

e escrever, desenhar, espalhar tinta na mão, enfim, a troca entre aluno e

educadores permeou o ambiente social e proporcionou o aprendizado para os

envolvidos na relação, inclusive para mim.

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8.4 Material areia colorida

A areia colorida pode ser agrupada, misturada, jogada, peneirada, alisada

e serve de superfície para desenhar com o dedo, ao passo que emergem misturas

de cor, montes, linhas, formas. Também pode acontecer a utilização de instrumentos

como o rodinho, pá, garfo e outros, em iniciativas de desenhos, ou escrita.

Atividades: Manusear, brincar, agrupar, misturar, jogar, alisar, produzir

marcas como o desenho e a escrita na areia colorida, dentro de um suporte plástico

ou na caixa de madeira, com ou sem a utilização de ferramentas: baldinho, pá, garfo

e rodinho.

Episódios 64 e 73

Episódio 64 – Duração: 11’45’’

Educadores: Fabrício e Fabiana

Episódio 73 – Duração: 06´30´´

Aluno: Bernardo

Descrição

Oficina com Fabrício

Fabrício tem 33 anos, é Pedagogo, Pós-Graduado em Psicopedagogia e

Arteterapia; atualmente cursa Pós-Graduação em Educação Especial e Inclusiva –

EAD. Trabalhou em creches como educador e com alunos com deficiência física e

com Síndrome de Down. Trabalhou também na Secretaria de Educação do SENAC.

Na oficina dos educadores, disponibilizei diversas cores de areia no

potinho para o Fabrício escolher. A sua atuação foi intensa desde o princípio: virou o

pote inteiro da areia na caixa de madeira. Orientei, então, que pegasse a areia do

potinho com a mão, pois assim já poderia sentir a textura da areia em seus dedos.

Fabrício perguntou se poderia misturar as cores das areias na caixa de

madeira, pois ele estava com receio de misturar. A experiência de manuseio para

Fabrício pareceu ser muito prazerosa, e ele escreve:

“Gostei muito! Sem contar, esteticamente, que a mistura das areias fica muito

bonita de se olhar”. (Fabrício - Questionário após a oficina com areia)

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Em determinado momento, Fabrício explorou sensações trazidas pelo

manuseio da areia como tranquilidade, relaxamento e massagem.

Figura 49 – Fabrício mistura as cores de areia na caixa de madeira

Figura 50 – Fabrício faz a cortina de areia

Fabrício: Nossa, é muito relaxante. Não sei você, mas parece que até dá um negocinho assim por dentro. Ah! Ah! Não sei explicar. Fabiana: Parece quando você está recebendo massagem. Fabrício: Isso, exatamente. Sabe aquela sensação interna da massagem? É a mesma sensação. Muito relaxante. Se deixar, eu até vou cair. (...) Pesquisadora: Relaxante, né?

Em outro momento, Fabrício realizou, na sequência, cinco vezes o

movimento de jogar a areia de cima para baixo, sobre sua outra mão, como se fosse

uma cortina de areia descendo.

No questionário, Fabrício descreveu o material da seguinte forma:

“Minhas impressões foram as melhores possíveis. Este material me trouxe uma

sensação de tranquilidade e relaxamento. (Fabrício - Questionário após a oficina da areia)

Oficina com Bernardo

Bernardo é um adolescente com 16 anos que, além do autismo, tem

quadro de epilepsia de difícil controle. Ele é dependente para as AVDs e usa fralda.

Seus comportamentos incluem movimentos estereotipados com as mãos, braços, e

apresenta condutas autoagressiva e heteroagressiva esporadicamente. Possui

dificuldade para permanecer na mesma atividade, mesmo por um tempo curto. Ele

não se comunica verbalmente e emite alguns sons, na maioria das vezes não

compreensíveis. Em raros momentos, dirige o olhar ao outro.

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Na oficina do aluno, quem escolheu as cores da areia para o Bernardo foi

o Fabrício, colocando-as em momentos para chamar a atenção do aluno e em boa

quantidade.

No início, foi preciso acomodar Bernardo na cadeira. O educador precisou

dar um apoio significativo para este aluno realizar a atividade. Segurou e levou a

mão esquerda do aluno até o potinho com a areia e mexeram juntos. Logo em

seguida, o aluno fez essa ação sozinho. Mexeu com os dedos da mão esquerda na

areia por uns segundos e retirou a mão. Depois o educador despejou certa

quantidade de areia na caixa, formou um montinho, alinhou-a e falou para o aluno:

Fabrício: Tó! Olha que bonito, Bernardo. Olha o amarelo, que bonito!

Bernardo levou a mão até a caixa com a areia e não fez nenhum

movimento. Então, o educador segurou na mão esquerda do aluno e movimentou-a

de um lado para o outro, fazendo com que tocasse na areia.

Figura 51 – Fabrício movimenta a mão de Bernardo para tocar na areia

Na sequência, o aluno colocou a mão na areia sozinho para senti-la.

Fabrício: Olha Bernardo, gostou? Você gostou? O amarelo, oh! Oh!

Bernardo: (Não responde)

Fabrício fez algumas ações para manter o aluno envolvido na atividade,

como: jogar um pouquinho de areia de cima para baixo, e convidou-o para pegar a

areia no potinho. Bernardo, então, começou a mexer os dedos da mão e sozinho

participou da atividade espontaneamente. Inseriu sua mão no potinho da areia,

pegou um pouquinho e jogou no chão.

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Fabrício: Olha que bonito, Bernardo. Olha, pega. Isso, no chão, tá caindo.

Bernardo: (silêncio)

O educador repetiu este movimento de jogar a areia de cima para baixo,

como se fosse uma cortina de areia algumas vezes, e incentivou verbalmente o

aluno a colocar a(s) mão(s) na areia, dizendo “Põe a mão”, “Olha a chuva”, “Que

legal”. O aluno ficou olhando a areia cair e expressou seu desejo de tocar na areia.

Colocou a mão direita para tocar na areia caindo e depois levou as duas mãos.

Figura 52 – Bernardo insere uma mão para tocar Figura 53 – Bernardo insere as duas mãos para tocar a areia caindo a areia caindo

Fabrício: Põe a mão, põe a mão. Olha a chuva, Bernardo. Olha a chuva, Bernardo. Bernardo: (O aluno inseriu a mão direita e tentou pegar a areia) Fabrício: Olha aqui, oh! Isso, Bernardo. Olha a chuva, chuva de rosa. (o educador despejou a areia rosa do potinho na caixa de madeira) Fabrício: Olha, chuva. Que legal, Bernardo. Que legal. Bernardo: (o aluno inseriu as duas mãos, tocando na areia caindo; permaneceu um pouco, tentou pegá-la e depois comemorou batendo palmas) Fabrício: Eh! Eh! Eh! Pesquisadora: Ah! Ah! Ah! Ele comemora, né?

Figura 54 – Bernardo bate palmas e comemora

Como conhecia a resistência do aluno em participar de atividades em

geral, Fabrício utilizou a estratégia de troca de cores, mencionou o nome da cor,

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estimulou o aluno com movimentos. Buscou retomar a atenção do aluno para a

atividade nos momentos em que Bernardo queria desistir. Alguns movimentos

corporais sinalizaram que ele não queria mais participar da atividade, tais como:

virou o corpo para o lado, curvou-se e começou a jogar o tronco para baixo,

tentando sair da cadeira.

Eu ajudei a sustentar o aluno por trás, tentando fazer com que ele

permanecesse na cadeira e na atividade, pois normalmente ele fica deitado no chão,

algumas vezes com comportamentos autoagressivos (morder a própria mão),

apresenta também movimentos de flapping e não participa das atividades propostas

em sala de aula. Deixado sem nenhuma intervenção, Bernardo ficaria no chão, cada

vez mais isolado. Daí o sentido de insistir que ele fique interagindo com as pessoas

e com os materiais por mais alguns instantes.

Figura 55 – Fabrício e a pesquisadora seguram o braço de Bernardo, que está escapando da atividade

Fabrício: Oh! Bernardo! Olha o azul. Oh, que bonito. Olha que bonito o azul. Olha a chuva. (o educador jogou a areia azul do potinho na caixa de madeira) Fabrício: A chuva, olha a chuva de azul Bernardo. Olha a chuva. Eh! Eh! Eh!

O aluno enrijeceu os braços. Tentei levá-lo a tocar a areia, mas ele tirou a

mão. Mas, depois, Bernardo levou a mão, tocando na chuva de areia caindo e pegou

um pouco de areia. Em seguida, comemorou batendo palmas novamente.

No final da oficina do educador com o aluno, o educador escreveu no

diário de campo:

“O Bernardo foi bastante receptivo com o material apresentado, embora o tenha manipulado em poucos momentos. Entretanto, quando eu manipulava a areia jogando-a para baixo como ‘chuva’, ele demonstrava grande satisfação, colocava as mãos embaixo e em seguida batia palmas. Achei interessante o fato do Bernardo utilizar as duas mãos no momento da atividade. Entendo que nesse momento sua participação e interesse era de 100%. Contudo, embora não tenha permanecido sentado por longo período, os períodos em que permaneceu foram extremamente positivos”. (Diário de campo do Fabrício)

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Análise dos episódios

Nestes episódios, constatei semelhanças entre as atividades realizadas

pelo educador e a oficina com o aluno. Na oficina do educador, Fabrício explorou

qualidades sensoriais da atividade: textura da areia, mistura das cores, sensações

trazidas pelo manuseio, como tranquilidade, relaxamento e massagem.

Nesse sentido, Oaklander (116) e Ammann (117), apud Andion, (118)

comentam que a areia seca é fina, escorregadia, quase líquida e leve, e muitos

experimentos táteis e cinestésicos podem ser efetuados, pois possibilita uma

sensação agradável ao tocar com os dedos e as mãos, como maciez, carinho, o que

remete a elementos fluídos como a água.

No começo, Fabrício ficou preocupado se podia misturar as areias. Seu

receio talvez se relacionava à impossibilidade de separar as cores novamente

depois de misturadas. Ele não ficou preocupado com o sentido figurativo na sua

oficina, não desenhou, não formou nenhuma figura com as areias; manuseou e

focou no sensorial.

Saliento uma ação realizada várias vezes pelo educador, que foi o

movimento de jogar a areia de cima para baixo, como se fosse uma cortina de areia

descendo e caindo na sua mão. Na oficina do aluno, embora Bernardo apresente

algumas limitações, a dedicação, a perseverança, o incentivo e os esforços do

educador entusiasmaram Bernardo a dar algumas respostas aos estímulos

sensoriais e visuais do material, mesmo que momentâneas e sutis.

Meleiro (36) e Naujorks e Barasuol (44) destacam que os professores de

educação especial têm muito carinho, dedicação e empenho com os alunos e, na

maioria das vezes, acabam assumindo o lugar de “educador-cuidador”. No início do

episódio, houve uma aproximação de Fabrício com o Bernardo, no contato corporal,

com ele segurando na mão do Bernardo e ajudando-o a mexer no material. Isso

aconteceu por conta da resistência do aluno à participação nas propostas

pedagógicas em sala de aula, necessitando de um apoio mais significativo.

O processo de participação foi gradativo: o educador segurou e levou a

mão do aluno até o potinho com a areia para mexerem juntos; o aluno foi com uma

mão no potinho sozinho para mexer na areia; pegou um pouquinho de areia no

potinho e jogou no chão; levou uma mão e depois as duas mãos, enquanto a areia

caía como cortina.

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Estas ações estavam provavelmente em estado embrionário, no seu

desenvolvimento na ZPD. A mediação do educador (os incentivos, instruções, pistas

dadas a Bernardo) ajudou o adolescente a fazer algo que ele não teria feito sozinho

no início da oficina.

Como define Vigotski,

A zona de desenvolvimento proximal permite-nos delinear o futuro imediato da criança e seu estado dinâmico de desenvolvimento, propiciando o acesso não somente ao que já foi atingido através do desenvolvimento, como também àquilo que está em processo de maturação (92:113).

Nos momentos em que o aluno queria desistir, Fabrício utilizou a

estratégia de mudar a cor da areia que estava manipulando com o aluno, com a

finalidade de chamar a sua atenção. Em alguns momentos, também segurou e

apoiou o braço de Bernardo; contou também com o meu auxílio para contê-lo. Como

ele apresenta prejuízos cognitivos graves e comportamentos autodestrutivos

severos, se o educador não insistir um pouco na participação nas atividades, ele fica

somente deitado no chão. Às vezes dorme, outras vezes faz estereotipias motoras,

como bater os braços como se fossem asas - flapping; morde as próprias mãos ou

punhos, cutuca a pele, levando até mesmo ao sangramento e a formação de

calosidades (1, 5).

A apresentação de estímulos atrativos, como cores e sons diferenciados,

pode provocar reações de orientações na atenção involuntária. Leite (120) cita Luria

(119) quando define que esta é a forma mais elementar de manifestação da

atenção.

É um fenômeno natural e tem, em sua base, a ocorrência do reflexo orientado e da ativação de respostas a determinados estímulos novos, que se extinguem paulatinamente na medida em que ocorre a adaptação. Corresponde aos casos em que a atenção do homem é atraída por estímulos fortes, novos ou interessantes (119) apud (120:114).

Outra estratégia também empregada pelo educador foi dar o sentido para

as suas ações, procurando significar a areia que caía de cima para baixo, quando

jogada por ele – um conteúdo simbólico, nomeando-a de “chuva”.

Oliveira (93:50) cita as ideias de Vigotski quando ele comenta que o

“sentido refere-se ao significado da palavra para cada indivíduo, composto por

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relações que dizem respeito ao contexto de uso da palavra e às vivências afetivas

do indivíduo”.

Nós não sabemos se o aluno entendeu o significado da palavra “chuva”,

mas a palavra, juntamente com a percepção visual da areia caindo, proporcionou

uma reação motora de colocar a mão na areia. Esta descrição condiz com as ideias

de Vigotski quando ele ressalta que “a palavra tem o significado originalmente, de

uma localização espacial particular” (99:128), e também que a percepção é um

aspecto integrado da atividade motivacional e motora. A literatura nos mostra que

os indivíduos com TEA apresentam dificuldades no jogo simbólico (27), mas de

qualquer maneira, foi uma forma que o educador encontrou para chamar a atenção

do aluno, para ele colocar a mão e interagir na atividade.

Percebo que para alguns adolescentes autistas é impossível separar o

campo do significado do campo da percepção visual, sendo que há uma interação

muito próxima entre o que é visto e o significado.

Evidencia-se também a preocupação do educador com nomeação das

cores das areias, quando destacou: “Olha o amarelo que bonito”; “Olha a chuva,

chuva de rosa”; “A chuva, olha a chuva de azul, Bernardo”. O aluno não pareceu

estar muito preocupado com o aprendizado dos nomes das cores, mas as ações do

professor parecem ter favorecido a percepção das sensações da areia e também a

vivência de momentos de alegria, quando ele bateu palmas comemorando.

O educador reconheceu que foi positiva a interação do aluno com a areia,

mesmo sendo por pouco tempo.

Episódios 65 e 69 Episódio 65 – Duração: 12´30´´

Educadoras: Eleonora e Janete

Episódio 69 – Duração: 10´30´´

Aluno: Leonel

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Descrição

Oficina com Eleonora

Eleonora tem 22 anos, é Pedagoga, cursa Pós-Graduação em Educação

Especial e Inclusiva – EAD. Trabalhou como estagiária, auxiliar de classe, e

atualmente é professora na Escola Vida.

Na oficina das educadoras, respondeu à pergunta sobre o interesse dos

alunos em manusear a areia, comentando sobre o aluno Leonel.

Eleonora: Leonel, que tem resistência, eu acho que ia ser mais difícil para pegar.

Em outro momento, além da exploração da areia colorida ser feita pelas

mãos, ofereci ferramentas e objetos para Eleonora brincar com a areia, como: garfo,

pá, baldinho e rodo; ambas educadoras foram convidadas a utilizá-los.

Quando perguntadas sobre o que elas achavam quanto ao uso de

ferramentas pelos alunos, Eleonora pegou a pá, abriu um sorriso, e comentou que

os alunos iriam gostar. Após experimentar algumas ferramentas, as educadoras

concluíram que preferiam manusear com as mãos.

Janete: É diferente, mas prefiro com a mão. Eleonora: É, também acho. Pesquisadora: Preferem com a mão? Acho que seria para quem não gosta mesmo, tem aflição mesmo. Eleonora: Tipo o Leonel. No caso do Leonel, já seria melhor com as ferramentas. Agora os outros, seria melhor para tatear.

Figura 56 – Eleonora manuseia a areia colorida com a pazinha

No questionário, Eleonora descreveu o material da seguinte forma:

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“Um material gostoso de trabalhar, proporciona sensações como: relaxar,

desenvolver desenhos e atividades diversas, utilizando o mesmo material”. (Eleonora –

Questionário após a oficina com areia).

Oficina com Leonel

Leonel é um adolescente com 12 anos. Apresenta algumas resistências

alimentares e é dependente nas AVDs. Comunica-se verbalmente, mas manifesta

ecolalia, às vezes. Nos conteúdos pedagógicos, consta de seus relatórios que

reconhece as vogais, as cores primárias, escreve e reconhece seu nome e, quando

solicitado, escreve os nomes dos amigos.

Na oficina do aluno, Leonel utilizou movimentos bem delicados e lentos

com a mão, para pegar a areia do potinho e colocar na bandeja. Utilizou pouca

quantidade de areia colorida e salpicou na bandeja retangular, tendo repetido o

movimento várias vezes.

Observei que Leonel não gostou muito quando a educadora jogou a areia

em cima de suas mãos, e, algumas vezes, quando a areia ficava entre seus dedos,

ele limpava, retirando os grãos.

Figura 57 – Leonel limpa os grãos de areia entre os dedos

Foi diminuindo a sua resistência ao toque, e o aluno foi explorando o

material, mediante orientações de Eleonora: “use as duas mãos”; “mexe com as

duas mãos”, “você não quer mais areia?”; “jogue a areia de uma mão para a outra”;

“acrescente uma cor de areia”. Ela mostrou, “olha a areia caindo aqui...”, “olha como

dá para fazer marcas com os dedos”, e pediu para o aluno repetir.

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Dessa forma, a educadora promoveu experiências lúdicas com o material,

e o aluno participou; com isso, ampliou-se o seu repertório. O sorriso no seu rosto

indicou a sua alegria durante a atividade.

Figura 58 – Leonel sente-se feliz ao manusear a areia colorida

Na atividade com o aluno, a educadora pegou o rodinho e deu para o

aluno utilizar, mas percebeu que Leonel não sabia o que fazer com o rodinho; então

ela demonstrou, alisando a areia na caixa com o instrumento. Em seguida, ele

também ficou arrumando a areia com o rodinho, e descobriu que podia utilizá-lo para

escrever, surpreendendo-se com as marcas que deixou na areia com esta

ferramenta. Escreveu o nome do amigo Daniel. Em seguida, a educadora ajeitou a

areia com o rodinho e pediu para o aluno escrever com o dedo. Leonel escreveu o

nome dele e depois do amigo. Repetiu a ação algumas vezes e depois comemorou

com a educadora.

Eleonora: Uh! De novo. Peraí. Escreve o nome do Leonel de novo. Agora escreve o do Daniel. (ajustou e alinhou a areia com o rodinho para ficar uniforme na caixa) Leonel: (silêncio) (o aluno, ao terminar de escrever, deu um sorriso e comemorou emitindo um som e balançando seu corpo e as mãos) Leonel: Eh!! Eh!! Eleonora: Toca aqui. Eleonora e Leonel: (Batem a mão direita, com as palmas abertas e depois fechadas, uma na outra, e comemoram) Eleonora: Parabéns. Que lindo!

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Figura 59 – Leonel escreve com o rodinho Figura 60 – Leonel escreve com o dedo na areia colorida

na areia colorida

Figura 61– Leonel comemora com a educadora a escrita na areia colorida

No final da oficina do educador com o aluno, a educadora escreveu no

diário de campo.

“Realizou a atividade satisfatoriamente. Explorou bastante a textura do material e suas respectivas cores. No decorrer da atividade, escreveu seu nome e do seu amiguinho utilizando a areia e se adaptou bem com os dois tipos de recipientes.” (Diário de campo da educadora Eleonora)

Análise dos episódios

Ao analisar os dois episódios, foi possível observar que a Eleonora pouco

falou durante a atividade, permaneceu concentrada – seja na oficina de formação,

seja na atividade promovida com o aluno.

Eleonora imaginou que, como Leonel é um aluno que não gosta de sujar

as mãos e tem hipersensibilidade ao toque, ele não aceitaria o material ofertado.

Devido à sua preocupação com a possível rejeição ao material, a educadora

respeitou o seu tempo, cativou-o com propostas o tempo todo, algumas sugeridas

por mim e outras por iniciativa própria.

Nesta pesquisa, apenas o aluno Leonel escreveu na areia de maneira

espontânea, sem ser solicitado pela educadora. Percebi como a ferramenta do

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rodinho foi importante para este aluno. O rodinho teve a função de instrumento na

mediação da educadora com o aluno na caixa de areia. Vigotski (92) nos diz sobre a

função do instrumento, que é oferecer um veículo da ação humana sobre o objeto da

prática; ele é conduzido externamente, levando a modificações nos objetos.

Destaca-se a forma como Leonel atuou com a utilização do instrumento

rodinho, escrevendo na areia o nome do seu amigo. Embora ele não tivesse nunca

utilizado o rodinho para escrever, para chegar nisso, foi significativa a experiência

anterior de deixar marcas com os dedos, feito anteriormente na areia com a

educadora, e também os incentivos que ela deu. Estas pistas interferiram na

imaginação do Leonel posteriormente, quando utilizou o rodinho como se fosse um

lápis e a areia como um suporte. Conforme enfatiza Vigotski (101), a imaginação

infantil se constrói, entre outros fatores, a partir de elementos tomados da realidade

e presentes na experiência anterior da pessoa.

Este resultado indica que a experiência prévia da educadora foi

importante para que ela antecipasse a reação do aluno e fosse preparando maneiras

de incentivar a sua interação com o material.

Destaca-se a importância da vivência da educadora na oficina de artes

com o material – areia colorida. Conforme Ander-Egg (121:36) apud Vieira e

Volquind (114:11), “uma oficina é uma prática iluminada pela teoria, com a qual

adquire a capacidade de aplicar os conhecimentos teóricos e de dar às ações uma

perspectiva e significação que transcende enquanto ato concreto”.

Análise geral

Tanto na oficina de Eleonora com Leonel quanto na relação de Fabrício e

Bernardo, os educadores tiveram que cativar os alunos com propostas contínuas e

criativas, considerando e respeitando o tempo e as limitações de cada aluno.

Como Bernardo apresenta comprometimentos mais graves, como a

epilepsia associada ao autismo, comportamentos e condutas de agressividade e a

não participação nas propostas das atividades em sala de aula, Fabrício teve que se

empenhar para garantir e sustentar a participação do aluno na atividade.

Os indivíduos com TEA de nível severo usualmente apresentam atrasos

significativos nas habilidades de comunicação social e pouca iniciativa nas

interações sociais (4).

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Devido à sua hipersensibilidade ao toque, Eleonora achou que Leonel não

aceitaria manusear a areia, mas isto não ocorreu. De acordo com Klin (1), os

autistas podem apresentar tanto hiper ou hipossensibilidade aos estímulos

sensoriais (sons, luzes e toques). A sensibilidade ao toque pode incluir reações

fortes a tecidos específicos ou ao toque social/afetuoso. No caso do Leonel, ele tem

hipersensibilidade com materiais e objetos que são ásperos e apresentam

temperatura fria e quente.

A educadora precisou promover experiências lúdicas para que ele fosse

diminuindo a resistência ao toque e ampliando o repertório. O aluno acabou

surpreendendo a educadora, escrevendo na areia com a ferramenta do rodinho de

maneira espontânea.

Leonel preferiu escrever o nome do amigo e dele em vez de desenhar

algo com o rodinho e com seus dedos na areia colorida. Nesse sentido, Reily

(110:58) aponta sobre esta possível mudança. “O desenvolvimento da linguagem

oral e escrita, que a criança passa a utilizar de forma mais efetiva para sua

expressão pessoal, vai aos poucos substituindo o desenho como veículo de

expressão”.

Ao conhecer e experimentar o material com antecedência nas oficinas, os

educadores anteciparam como seus alunos reagiriam, ajudando-os a elaborar o

processo de interação com alunos com TEA de nível moderado e principalmente os

severos. Na maioria das vezes, os educadores têm uma ideia prévia de que os

alunos não irão gostar, ou não vão participar e interagir, e pode ser que se

surpreendam, como ocorreu nestes dois episódios.

Concordo com Briant e Oliver (122) quando defendem que nos cursos de

formação para a educação inclusiva, a interlocução teórico-prática é necessária, pois

nos cursos técnicos e informativos, são poucas as possibilidades de aplicação.

Também cito Ciantelli et al (78), que enfatizam que os educadores devem buscar

subsídios teórico-operacionais para lidar com os alunos com TEA, que exigem

respostas educacionais diferenciadas.

Nas oficinas dos alunos em geral, ocorreram várias ações sobre o

material, como: misturar as cores, fazer montinho de areia por cor, pegar os grãos

de areia com os dedos, jogar a areia sobre a mão, enterrar a mão na areia e brincar

de esconde-esconde, esfregar a mão na areia, alisar a areia com a mão e com o

rodinho, puxar a areia com o garfo, encher o baldinho de areia utilizando a pazinha,

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despejar o potinho de areia no suporte maior, mudar a areia de uma bandeja para a

outra utilizando a pá, tirar a areia da caixa de madeira e jogar em cima do corpo.

A areia é um material muito prazeroso de lidar e com uma textura

fascinante para a criança brincar. Pode-se juntar, espalhar, deslizar, alisar, e

consegue-se desenhar marcas em sua superfície com o dedo, podendo estas ser

refeitas quantas vezes quiser (108).

Destaquei, entre os episódios, dois alunos que também deixaram marcas

na areia. No Episódio 118, após a educadora solicitar, Lucila desenhou e escreveu

na areia. Josué (Episódio 119) escreveu a 1ª letra do seu nome, ao ser motivado

pela educadora, e depois continuou com as outras letras para completar o seu

nome.

Com relação aos educadores, não houve evidências similares de escrita e

desenhos na areia colorida, embora uma das educadoras, após a sua oficina, tenha

respondido no questionário:

“Trabalhamos com areia colorida, onde prende-se a atenção pelas suas cores. A sensação

é boa, dá vontade de manusear e fazer desenhos.” (Janete – Questionário após a oficina

com areia)

Quanto à rejeição do material da areia colorida, apenas o aluno Michel

não quis pegar a areia com a mão e utilizou as ferramentas como pá, garfinho e

baldinho para manuseá-la. (Episódio 70)

“Inicialmente, o aluno Michel apresentou uma resistência à atividade por não querer colocar as mãos. Entretanto, no decorrer da atividade, realizou-a com os acessórios (pazinha, garfinho e o baldinho). Realizou a troca de recipiente satisfatoriamente e conseguiu tatear o material em ambos.” (Diário de campo de Eleonora)

Somente uma educadora rejeitou o material, comentando que não gosta

de mexer na areia, que achou áspera, e disse que não lhe agradou. (Episódio 68)

Roberta: Depois eu tenho que passar um creme na mão. Pesquisadora: É mesmo? Roberta, então para de mexer. Roberta: Eu não gosto de nada áspero, sabe? Coisas ásperas, não gosto. (fez uma careta de aflição)

Nessa perspectiva, Ostetto e Leite, em relação à contribuição da arte na

formação com educadores, comentam:

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Ela congrega um conhecimento que trabalha com as polaridades: ao possibilitar o gostoso, também engendra o desgostoso; ao dar prazer, também provoca o desprazer; se traz satisfação, igualmente dá frustração; [...] o belo e o feio: está tudo aí, no processo artístico (91:12).

No geral, com os educadores, a areia colorida foi bem aceita. Eles

comentaram sobre as características da areia colorida e as várias sensações que

ela proporcionou ao manuseá-la.

Respondendo ao questionário, disseram:

“O material areia colorida é rústico, colorido, quando ‘esfregado’ transmite som” [...] “A areia é gostosa de se manusear, dá sensação de estar massageando as mãos. Trabalha percepção visual, pois quando misturadas, fica mais bonito ainda”. (Fabiana - Questionário após a oficina da areia)

“Colorido”. “Material leve, que tange, arranha e dá uma sensação tátil maravilhosa. Recordei

momentos da minha infância, onde brincava muito com areia”. (Carla - Questionário após a

oficina da areia)

“O material é leve, colorido, áspero” [...] “As impressões foram interessantes, pois o material é áspero, gelado; conseguimos descobrir várias sensações. Dá para fazer muitas misturas de cores. Com os materiais propostos, como a pá, o rodinho, conseguimos ajuntar o material”. (Marlene - Questionário após a oficina da areia)

8.5 Material massinha caseira

A massinha caseira é um material mole, plástico, e de fácil modelagem

pelas próprias crianças, que pode ser confeccionado com ingredientes caseiros

como: farinha, água, óleo. A modelagem implica na exploração tátil, pois possibilita

um contato imediato com o material. Proporciona o manuseio tridimensional e

também a elaboração de formas e suas combinações, podendo juntar, separar,

jogar, bater, alisar, em ações físicas sobre o material. Estas ações dão espaço para

a expressividade e escolhas, que movimentam o sentido estético à medida que

surgem volumes e texturas. A experiência pode levar à criação de figuras, letras.

Atividades: Preparar a massinha caseira e posteriormente manusear,

brincar, amassar, apertar, esticar, puxar, juntar, separar, jogar, bater, socar e alisar

em uma superfície plana.

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Episódios 88 e 99 Episódio 88 – Duração: 20´00´´

Auxiliares: Elenice e Roberta

Episódio 99 – Duração: 19´00´´

Aluno: Leonardo

Descrição

Oficina com a Roberta

Roberta tem 43 anos, cursa Pedagogia – EAD. Atua como auxiliar de sala

na Escola Vida. Participou de cursos e palestras da abordagem TEACCH oferecidos

pela Escola Vida na área de autismo.

No início da oficina com as auxiliares, propus para a Roberta preparar três

tipos de massinhas caseiras, com o intuito de escolher qual delas seria a mais

adequada para o trabalho com os seus alunos. A primeira massinha foi preparada

com quatro medidas de farinha de trigo, uma medida de óleo, uma medida de água

e um saquinho de suco de uva. A segunda, quatro medidas de farinha de trigo, uma

medida de óleo, uma medida de água, um pouco de guache vermelha. A terceira,

com quatro medidas de farinha de trigo, uma medida de óleo, uma medida de água,

um pouco de anilina na cor roxa.

Quando questionada sobre a preferência da massinha para ser

trabalhada com os alunos, Roberta disse que preferiu a massinha com o suco ou

anilina.

Pesquisadora: Qual você acha que é a mais adequada para a gente poder trabalhar com as crianças? Roberta: Seria com o suco, ou com a anilina. Pesquisadora: Com o suco, por quê? Roberta: Porque a consistência fica melhor, é mais fácil para misturar. Pesquisadora: Você teve vontade de experimentar? Roberta: Sim, tive. Pesquisadora: Por que não fez? Roberta: Porque acabei de almoçar. Mas dá vontade de experimentar, com o suco, o cheiro também. (a auxiliar continuou amassando e colocou no nariz para cheirar) (...) Roberta: Isso aqui para eles ia ser uma experiência nova, entendeu?

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Pesquisadora: Entendi. Roberta: Porque nós damos a massinha e falamos ‘não pode, não pode colocar na boca’. Porque com essa aqui, tudo bem. Pesquisadora: De repente eles vão colocar. Roberta: Eles vão colocar, entendeu? Pesquisadora: Beleza, então. Roberta: A guache eu não gostei não, acho que por ser tinta mesmo, deixa a massa mais mole, ficou difícil de misturar, de dar o ponto.

Figura 62 – Roberta amassa a massinha caseira preparada com suco de uva

Oficina com Leonardo

Leonardo é um adolescente de 13 anos e apresenta o diagnóstico de

Autismo e retardo mental moderado. Seu comportamento inclui movimentos

estereotipados, agressividade com movimentos descoordenados, hiperatividade

física e motora. Não reage aos estímulos propostos em sala de aula, e prefere ficar

isolado na maior parte do tempo. Interage pouco com os colegas e educadores e

não se comunica verbalmente.

No início da atividade, Roberta acrescentou os ingredientes farinha, óleo,

água e o suco para serem misturados na bacia. Ofereceu ajuda física para ele

misturar os ingredientes. Leonardo logo quis experimentar os ingredientes sem

misturá-los, colocando-os na boca. A auxiliar quis tirar sua mão no momento em que

Leonardo levava a massinha para a boca, mas salientei que poderia deixá-lo, pois a

massinha era comestível.

Roberta: Vai, mexe aí, vai. Roberta: Olha, vamos fazer a massinha. Massinha, oh! Leonardo: (silêncio) (o aluno com as duas mãos bem moles, mexeu bem devagarzinho na massa, com ajuda da auxiliar. Colocou um pouco de farinha na boca e mastigou) Roberta: (silêncio) (a auxiliar tentou tirar a mão do aluno da boca) Pesquisadora: Não tem problema, Roberta. Roberta: Não? (a auxiliar continuou a ajudar o aluno a misturar a massa)

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Leonardo: (silêncio) (o aluno mastigou e engoliu a massinha e fez uma cara feia) Pesquisadora: Olha a cara dele. Ah! Ah!

Figura 63 – Leonardo experimenta a massinha

A educadora está habituada com a reação do Leonardo de querer colocar

as coisas na boca, ainda mais quando são coloridas e chamativas.

Roberta: Tá gostosa essa massinha? Pesquisadora: Ele costuma colocar as coisas na boca? Roberta: Sim. Pesquisadora: Ou é por que sentiu o cheiro e colocou? Roberta: Não, ele coloca. (a auxiliar misturou os ingredientes) (...) Roberta: Papel, essas coisas, ele não costuma colocar, mas se ele vê alguma coisa colorida... (a auxiliar misturou os ingredientes) Pesquisadora: Tenta pegar a mão dele também. Roberta: Deixa só eu fazer a massa, para ficar mais fácil. Tipo assim, giz de cera, que é colorido. (a auxiliar amassou a massinha para ficar homogênea) Pesquisadora: Entendi.

À medida que a auxiliar misturava a massinha, ela foi ficando homogênea,

vermelha e cheirosa, pois a pigmentação do suco de morango traz esta cor e cheiro.

Leonardo: (silêncio) (o aluno colocou na boca a massinha, agora com o suco de morango misturado) Pesquisadora: Olha, esse aqui deve ser bom, pois é de morango. Roberta: É de morango, gostoso, Leonardo. (a auxiliar misturou a massinha na mesa) Leonardo: (silêncio) (o aluno pegou um pouco da massa, colocou na boca, mastigou e retirou da boca com a mão) Leonardo: (silêncio) (o aluno, logo em seguida, pegou novamente um pedaço da massinha, colocou na boca e mastigou) Pesquisadora: Ah, você gostou da massa? Roberta: Que legal, Leonardo. Mexe a massa, vai, aperta. (...) Leonardo: (silêncio) (o aluno pegou a massinha e manuseou lentamente separando um pedaço, deixando na mesa, e outro pedaço experimentou.

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Olhou, tirou da boca e experimentou novamente, passando a língua. Tirou novamente, colocando na mesa a massinha) (...) Pesquisadora: Cheira né, Roberta? Roberta: Acho que é o cheiro. Morango que chama a atenção.

Figura 64 – Leonardo cheira a massinha

Em certos momentos, Leonardo, enquanto manuseou a massinha,

encostou e deixou sua cabeça no ombro da auxiliar, bem calmo e tranquilo. A

auxiliar recebeu o gesto do aluno, acolhendo-o com carinho e afetividade, dando um

beijo na testa do adolescente.

Roberta: Divide a massinha, divide. Leonardo: (silêncio) (o aluno olhou para a auxiliar e manuseou a massinha, e continuou puxando-a bem lentamente, de um lado e de outro, com as duas mãos. Ele encostou e ficou com a cabeça no ombro da auxiliar) Roberta: (silêncio) (a auxiliar olhou para a pesquisadora e deu um beijo na testa do aluno)

Figura 65 – Leonardo deita no ombro de Roberta e ela lhe dá um beijo

Roberta: Olha, aperta, olha que gostoso. (a auxiliar começou a juntar as massinhas) Pesquisadora: Ah, Roberta, que coisa linda! Leonardo: (silêncio) (o aluno ainda deitado no ombro da auxiliar e com os braços apoiados no braço dela, separou bem lentamente os pedacinhos) Roberta: Que gostoso. (a auxiliar apertou a massinha e juntou lentamente os pedacinhos em um só) Leonardo: (silêncio) (o aluno ainda com a cabeça no ombro da auxiliar, quis pegar a massinha da mão dela, enquanto ela juntava os pedacinhos)

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Figura 66 – Leonardo, encostado no ombro de Roberta, separa os pedacinhos da massinha

O aluno brincou com a massinha, puxou-a, separou-a em pequenos

pedacinhos e foi colocando em outro local da mesa, arrumando-os em sequência.

Leonardo: (silêncio) (o aluno separou a massinha puxando de um lado e de outro e soltando os pedacinhos na mesa) Pesquisadora: Para ele é o fato de separar. Roberta: Separar. Pesquisadora: Que barato, Roberta. Você vê como a gente se surpreende, né? Leonardo: (silêncio) (o aluno separou em seguida a massinha e foi jogando na mesa os pedacinhos) Roberta: No primeiro momento ele tentou comer, mas ele viu que não agradou. Pesquisadora: Depois... Roberta: A coisa dele é... Pesquisadora: Ele encontrou a maneira dele, né? Roberta: Hum, hum. Pesquisadora: Roberta, e separando no lugar, percebeu? Roberta: É. Leonardo: (silêncio) (o aluno pegou os pedaços que estavam na mesa, separou e começou a colocar em outro monte, arrumando em sequência)

Figura 67 – Leonardo transfere os pedacinhos de um monte para outro

Roberta: Tá legal? Vai separar mais? Leonardo: (o aluno continua separando a massinha e levando para outro montinho) (...)

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Leonardo: (silêncio) (o aluno vai aproximando os pedacinhos de um monte e junta com o outro)

Figura 68 – Leonardo termina de separar o montinho e Roberta observa

Análise dos episódios

Na oficina do aluno, observei que a massinha caseira foi um dos materiais

que mais chamou a atenção do Leonardo, dentre as oficinas de artes realizadas

neste projeto, embora ele tenha participado nas outras oficinas também. Ele se

concentrou e permaneceu na atividade por aproximadamente 20 minutos.

Normalmente, na sala de aula, ele se dispersa, fica andando na sala, de um lado

para o outro, e não se interessa pelas atividades propostas. Percebi que as

atividades de artes chamaram a sua atenção e o levaram a interagir com a auxiliar.

Se fossemos olhar somente para a deficiência biológica, entendendo o

autismo como uma condição que impede a participação social devido a

comportamentos de agitação, hiperatividade e isolamento, não ofereceríamos meios

alternativos para sua participação e compartilhamento de aprendizados. Oliveira cita

Vigotski:

A inserção do indivíduo num determinado ambiente cultural é parte essencial de sua constituição enquanto pessoa. É impossível pensar o ser humano privado do contato com um grupo cultural, que lhes oferecerá os instrumentos e signos que possibilitarão o desenvolvimento de atividades psicológicas mediadas tipicamente humanas (93:78).

Percebi que foi gradativo o envolvimento do Leonardo com a massinha

caseira. Na atividade, o aluno estava tranquilo, bem menos agitado do que em

outros dias. Primeiro, ele experimentou a massinha colocando na boca, passando a

língua, mastigando e engolindo. Esta ação de colocar coisas na boca faz parte das

características dos indivíduos com TEA que apresentam prejuízos cognitivos mais

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graves; às vezes, eles se alimentam de coisas que não são comestíveis – a pica (1).

Diante deste cenário, Zillmer e Dubois oferecem massinhas comestíveis para seus

alunos com TEA nas oficinas de arte:

As crianças experimentam gradativamente as possibilidades de brincar com esses materiais, inclusive colaborando com o preparo. Muitos alunos levam as massas à boca e, por esse motivo, usamos materiais comestíveis para colori-las, como a gelatina e anilinas para uso culinário (89:65).

No decorrer da oficina, Leonardo brincou com a massinha lentamente. De

acordo com Leontiev (100), a brincadeira é uma atividade em que o motivo está no

próprio processo, o alvo da brincadeira não se resume em produzir algo, mas em

fazer, no sentido da ideia da própria ação.

Ressalto também como a ampliação do repertório e a criatividade de

novas possibilidades do uso da massinha são um processo de construção e

aprendizado conjunto. A estagiária aprendeu com a vivência do aluno, as ações que

ele trouxe espontaneamente, como: puxar, esticar, separar, organizar, sequenciar,

sem a solicitação da auxiliar.

Reily (108) nos diz sobre como a criança lida com a massinha caseira

comparando-a como ela organiza os objetos. As crianças arranjam os objetos em

certas posições, para depois mudá-los de lugar e voltar novamente no lugar original.

Com a massinha, seguem o mesmo procedimento:

Arrancam pequenos pedaços de um bolo central, para depois reuni-los novamente. É importante que não se interrompa esta sequência de trabalho que a criança criou, até que ela mesma mostre que completou o jogo (108:100).

A mediação da estagiária com o aluno foi marcada por experiências

afetivas, o beijo na testa, o carinho, a receptividade, acolhimento do aluno no seu

ombro.

Orrú (96) cita Vigotski quando ele salienta como deve ser trabalhado e

entendido no contexto educacional o “ser deficiente”. Este ser deve conceder o

direito a sua conduta ativa na formação de seu desenvolvimento, a partir de sua

competência individual de apoderar-se e internalizar formas sociais de

comportamento, como integrante de seu desenvolvimento de conhecimento como

sujeito histórico. Assim, o aluno Leonardo passou a ser visto e entendido por mim e

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pela auxiliar como um indivíduo detentor de capacidades e potencialidades, as quais

afloraram na atividade de artes. Normalmente ele fica correndo de um lado para o

outro na sala de aula, não se interessa pelas propostas. Na atividade com a

massinha, ele se mostrou capaz de separar, organizar, sequenciar pedaços de

massa, aprendendo sobre as propriedades desse material.

Episódios 88 e 95

Episódio 88 – Duração: 20´00´´

Auxiliares: Elenice e Roberta

Episódio 95 – Duração: 11´20´´

Aluno: Josué

Descrição

Oficina com Elenice

Elenice tem 32 anos e cursa Pedagogia atualmente. Trabalhou durante 4

meses em um berçário e em recreação como monitora. Atua há 20 anos como

voluntária com crianças em evangelização infantil. Trabalhou como auxiliar de classe

na Escola Vida durante 6 meses.

Na oficina das auxiliares, Elenice também preparou as três receitas de

massinha: com suco, com anilina e com guache.

Figura 69 – Elenice mistura a tinta guache na massinha caseira

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Questionada por mim sobre qual a massinha preferida para ser

trabalhada com os alunos, ela disse que foi a do suco e a de guache, pois ambas

dão um destaque no colorido da massinha e chamam mais a atenção dos alunos.

Pesquisadora: Qual você acha que é a mais adequada para trabalhar com as crianças? Elenice: Para trabalhar com a criançada, eu acho que é o suco mesmo. Não trabalharia com a anilina. Pesquisadora: Por quê? Elenice: Porque ela mancha muito e a pigmentação dela não é legal, não sei se é a massa que eu não consegui fazer direito. Para mim, eu acho que a anilina, ela não mistura fácil. Tudo que é mais demorado é mais difícil de trabalhar. Pesquisadora: Ah. Elenice: Trabalharia com a guache, mesmo que a gente converse com as crianças. Assim, para tudo a gente coloca o limite. Esta massinha a gente coloca o limite, não pode colocar na boca. Uma pode, outra não. Pesquisadora: Mas como foi misturar a guache nessa massa? Elenice: A guache, ela lambuza um pouco mais, por causa da tinta. É uma sensação normal, como as outras duas, ela só fica mais pastosa; mas assim, você vê que não tem dificuldade. Consegui amassar, mas não consegui com a anilina. A anilina eu não consegui achar a cor nela, acho que é mais importante para a gente que trabalha com criança, tem que ter cor. E como você vê, fica uma cor de massa. Até o amarelo aqui, ela esconde um pouco a massa, agora aqui não, simplesmente ficou a cor da massa. Pesquisadora: Então você trabalharia? Elenice: Tanto com a essência do suco quanto a guache, sem problemas.

Oficina com Josué Josué tem 11 anos. É dependente nas AVDs. Considerado autista clássico,

apresenta comportamentos com estereotipias, maneirismo, fala ecolálica. Iniciou

processo de alfabetização, reconhece vogais, escreve seu nome e reconhece as

cores primárias e secundárias. Toma medicação.

Na oficina do aluno, em determinado momento, Elenice pediu para que

Josué modelasse o elefante, juntamente com ela, mas o aluno não atendeu à

solicitação. Parecia que estava respondendo à solicitação da auxiliar, mas logo

voltava a manusear a massinha de diversas maneiras, intensamente. Apertou entre

os dedos, juntou, separou e bateu.

Essa atitude mostra que às vezes o educador busca uma forma de

envolver o aluno na atividade ou de explorar o material, e de certa forma, não se

atenta para o que o aluno quer fazer, explorar com autonomia e expressividade.

Josué: (silêncio) (o aluno utilizou as duas mãos e, com intensidade, amassou, apertou, abriu a massinha e também passou por cima da mão)

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Elenice: Vamos fazer um elefante aqui agora. (a auxiliar pegou um pouquinho da massinha do aluno e amassou) Josué: Elefante. (fala baixinho) (o aluno continuou manuseando a massinha e apertando entre os dedos) Elenice: É um elefante? (a auxiliar enrolou a massinha fazendo uma bolinha) Josué: (silêncio) (o aluno continuou apertando a massinha entre os dedos) Elenice: Como faz o elefante? Tem que fazer o corpo. Josué: O corpo do elefante. (o aluno estava entretido com a massinha, apertando, juntando, separando-a na mesa) Elenice: E depois tem que fazer a tromba, não pode esquecer. (a educadora tirou toda a massinha da mão do aluno) Josué: (silêncio) (o aluno olhou para a mão da auxiliar com a massinha) Elenice: Oh. Vou te dar a massinha. (a auxiliar começou a enrolar a massinha para começar a fazer a tromba) Josué: Bem bonito? Elenice: Bem bonito. Agora faz a tromba do elefante para a gente ver, oh. Como a Elenice ensinou a você fazer a tromba do elefante? Não é assim oh! Você lembra? (a auxiliar fez a tromba do elefante sozinha e deixou na mesa) Josué: (o aluno pegou o restante que ficou na mesa e deu tapinhas na massinha, não prestando atenção na educadora, continuando a mexer na massa, apertando com os dedos) Elenice: Vamos fazer o elefante? Josué: (fala incompreensível) Cada castelo. (o aluno pegou a tromba do elefante, juntou com a massinha e apertou com os dedos) Elenice: Ele não deixa separar. (a auxiliar apertou com um dedo a massinha, pegou-a e cobriu a mão do aluno, ajeitando a massinha no dorso da mão dele) Pesquisadora: Prof. Deixa ele. Elenice: (silêncio) (a auxiliar balançou a cabeça concordando)

Figura 70 – Elenice ensina Josué a fazer a tromba do elefante

Em outro momento, Elenice fez perguntas ao aluno (conforme minha

orientação) para saber o que ele queria fazer com a massinha. Em seguida, acabou

direcionando para o tema de bicho.

Elenice: O que que você quer fazer com a massinha? Josué: Massinha do sal. (o aluno olhou e apontou para os ingredientes da massinha que estão na mesa)

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Elenice: Não! Eu quero fazer. Que bicho você sabe fazer na massinha? Josué: O pato. Elenice: O pato, então faz que eu quero ver. Josué: (silêncio) (o aluno juntou a massinha e esticou-a na mesa, deu tapinhas e socos com a mão em cima da massinha, depois uns socos com mais força, e em seguida alternou os tapinhas com uma mão e com a outra) Elenice: É o pato, não é para ele fazer o batuque. Você está fazendo o batuque. Josué: (silêncio) (o aluno continuou a mexer na massinha, amassou entre as mãos e apertou-a intensamente entre os dedos, deixando-a cair e espirrar um pouco na mesa)

Figura 71 – Josué soca a massinha Figura 72 – Josué batuca na massinha

Elenice pediu que ele modelasse uma produção figurativa. “Faz uma bola

de basquete. Sabe fazer uma bola de basquete?”. Neste momento, o aluno começou

a enrolar a massinha na mesa, amassou, e continuou a fazer cobrinhas.

Figura 73 – Josué brincando com a massinha caseira

Elenice: Eita, voou massinha para tudo quanto foi lado. Josué: (silêncio) (o aluno começou a enrolá-la na mesa com a mão direita, fazendo o formato de uma bola; parou, amassou um pouquinho e depois continuou a fazer a cobrinha com a outra mão. Posteriormente, ele apertou a massinha em seus dedos na altura do seu rosto, saindo um pouco de massinha pelos seus dedos. Olhou para a auxiliar e voltou a fazer a cobrinha) Elenice: Faz uma bola de basquete. Sabe fazer uma bola de basquete? Josué: (silêncio) (o aluno começou a fazer o movimento circular com a massinha e depois voltou a amassar, a bater na massa)

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Josué: (emite alguns sons incompreensíveis) Arrr! (emitiu o som alto) (o aluno fez a cobrinha, apertou a massinha)

Figura 74 – Josué enrola a massinha Figura 75 – Josué faz a cobrinha com a massinha

No final da oficina do aluno, a auxiliar perguntou para ele se tinha gostado

de manusear a massinha e acabou se surpreendendo com ele. Josué modelou a

letra “J” do seu nome, sem ela pedir. Trata-se de algo que faz parte do seu

repertório e que ele teve vontade de fazer sozinho.

Elenice: O que você gosta da massinha? Josué: Da massinha do pão. (o aluno amassou a massinha na mão) Elenice: Da massinha do pão? Mas essa massinha é para brincar. Você não gosta de brincar de massinha? Faz casinha, faz bolinha. Josué: (silêncio) (o aluno amassou a massinha na mão, colocou-a na mesa e deu um tapa; depois, enrolou a massinha um pouco em mãos alternadas e fez o formato da letra “J”) Elenice: O que é isto? Fala para a Elenice. Josué: “J” de Josué.

Figura 76 – Josué faz a letra “J” com a massinha caseira e comemora

Elenice: “J” de Josué. (a auxiliar olhou para a pesquisadora, balançou a cabeça surpresa e deu um sorriso) Pesquisadora: Que bonitinho! Elenice: Agora tem que fazer o “O”, já que você fez o “J”. (a auxiliar pegou a letra “J” que o aluno fez com a massinha e juntou as pontas fazendo a letra “O”) Elenice: Este aqui é qual? Josué: (emitiu palavras incompreensíveis)

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Elenice: Não, o outro. Josué: (silêncio) (Ele desfez o formato do “O” e fez novamente a letra “J”) Elenice: Já falei, é o “J” de José. Josué: Hihiee!!! (o aluno comemorou, balançou a cabeça, os braços e deu um sorriso, demonstrando felicidade de fazer a letra do seu nome. Depois amassou o “J” e apertou, soltou e juntou a massinha na mesa, bastante feliz)

No final da oficina com o aluno, a pesquisadora solicitou para a auxiliar

registrar no diário de campo sobre a oficina.

“O aluno teve boa aceitação do material; desde o início, foi sempre participativo, falante, demonstrando interesse em tudo que estava ocorrendo, mesmo na mistura de ingredientes, colocou a mão e misturou tudo. A coloração, ele escolheu pelo suco e não pela cor, interagindo o tempo todo comigo. Esse material também é um material que tem boa aceitação para as crianças”. (Diário de campo da auxiliar Elenice)

Análise dos episódios

Concluí nestes dois episódios que há discrepância entre o que o aluno fez

e o que a auxiliar gostaria que ele fizesse. Na oficina do aluno, constatei que em

grande parte do tempo a auxiliar revelou-se preocupada com o figurativo, querendo

que o aluno modelasse objetos como elefante, pato, bola de basquete, pão; ela

insistiu em trazer conteúdos de aprendizagem relacionados à tradição da “prontidão”

para a alfabetização (letra O), após o aluno confeccionar espontaneamente a letra

“J” do seu nome.

Camargo comenta sobre a importância de outros conteúdos no ensino,

além das matérias, disciplinas:

Não podemos esquecer aquela outra forma de ensino contida nos gestos, na postura, na entonação de voz, que é significativa de uma ética e de uma visão de mundo. Quem ensina X, Y ou Z, ensina, mesmo sem saber – e mesmo sem querer -, modos de entender o mundo, concepções de vida, modos de viver (123:21).

Josué, por sua vez, não demonstrou interesse por esses conteúdos. Em

alguns momentos, parecia que ele estava respondendo aos pedidos verbais da

auxiliar, mas logo em seguida não dava continuidade às criações solicitadas. Ele

queria se divertir, brincar, manusear a massinha de diversas maneiras e

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intensamente: amassar, apertar, juntar, separar, esticar, puxar, apertar, bater, socar

e produzir sons.

Zillmer e Dubois comentam sobre a massinha como um instrumento de

brincadeira para alunos com TEA.

Materiais simples como farinha, água, sal e gelatina se transformam em uma brincadeira sobre a mesa escolar, onde a experimentação da mistura permite as diferentes ações e sensações. As mãos que compartilham a massa ousam no movimento, tocam, amassam, empurram e produzem marcas para estimular a curiosidade (89:65).

Reily (108), em seu livro “Atividades de artes plásticas na escola – Hoje é

Meu Dia, Dona aula de Artes?”, relata o trabalho de artes com deficientes, e aborda

a sequência de fases da modelagem com massinha. No começo, a criança quer ter

a sensação plástica do material, simplesmente manuseando, explorando de forma

primária (usando o nariz, a boca e o tato). Depois, pode amassar, apertar, jogar,

furar e mexer com a massinha (tirar partes do todo e juntá-las novamente).

Posteriormente, ela faz cobras com a massinha na mesa e entre as mãos, e aprende

a dosar sua pressão para fazer cobras grandes, achatadas; finas e uniformes. Na

sequência, vêm as bolinhas na mesa e entre as mãos. Essa criança junta cobras,

bolinhas e outras formas em novas combinações, e nomeia o que está fazendo.

Forma figuras e objetos reconhecíveis, como potes simples, animais, pessoas,

caracóis etc. Dá atenção ao acabamento, alisando a massinha e enfeitando o

trabalho com impressões de objetos, riscos e desenhos.

Na oficina do Josué, o processo foi similar. Enquanto o aluno brincava e

explorava de diversas maneiras a massinha, algumas vezes deu significado às

formas que elaborava e as modificava à medida que se alterava a história que ia

contando e a conversa com a auxiliar. No final da oficina, ele fez a letra “J” do seu

nome de maneira espontânea, causando uma certa surpresa na estagiária, que

durante toda a oficina solicitou criações temáticas e dirigidas para seu aluno.

Na oficina das auxiliares, Elenice teve pouco tempo de exploração com o

material, pois teve que preparar três tipos de massinhas caseiras, com o intuito de

poder escolher a mais adequada para trabalhar com o aluno.

Ela ficou somente na experiência sensorial (amassou, apertou, misturou

os pigmentos – suco, guache e anilina) e expressou a necessidade de explorar o

figurativo na oficina do aluno, querendo fazer o elefante, pato, algo que ela pouco

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fez na sua oficina. Percebi a necessidade da estagiária de ampliar as possibilidades

de utilização, pois como a oficina somente tinha 30 minutos, ela não teve tempo

suficiente para brincar com a massinha, apenas prepará-la.

Entretanto, a percepção que tive é que a auxiliar não ficou completamente

satisfeita com a resposta do aluno e buscou trazê-lo para um funcionamento de

obediência, como se a exploração tátil não atendesse aos seus objetivos

pedagógicos.

Devemos tomar cuidado com as expectativas que temos com os alunos

nas aulas de artes. Reily aborda que os programas de artes podem “levar a criança

a perder um valioso meio de expressão. Artes torna-se mais uma tarefa a ser

executada, uma técnica a ser aprendida” (110:41).

A autora também ressalva que:

É fundamental que saiba discriminar entre sugestões prejudiciais ao processo [...] Além disso, é preciso que tenha sensibilidade para perceber a criança que necessita da presença do adulto e o momento apropriado para falar (110:49).

Análise geral

Tanto no trabalho de Roberta com Leonardo quanto na relação de Elenice

e Josué, nota-se que as auxiliares têm objetivos diferentes. Ressalto também como

a ampliação do repertório e a criatividade de novas possibilidades do uso da

massinha são um processo de construção e aprendizado conjunto que a mediação

proporciona para os envolvidos no processo.

Reily comenta sobre esta troca

A mediação não constitui um processo neutro e passivo. O instrumento sígnico atua dinamicamente sobre o mediador. O professor que atua de uma perspectiva mediadora na sala de aula também se transforma no decorrer do processo de ensino. Isso porque, assim como por intermédio de suas palavras e propostas pedagógicas, ele leva o aluno a novos níveis de conhecimento, ele também se defronta com outras maneiras de conceber que não lhe teriam ocorrido sem esse contato com o jeito de pensar do aluno, revelado pelas palavras ou pelo fazer escolar deste menino (82:19-20)

Foi gradativo o envolvimento do Leonardo com a massinha caseira. Notei

que o aluno Leonardo nesta oficina estava tranquilo. Primeiro ele experimentou a

massinha colocando na boca, depois amassou, separou, sequenciou e brincou.

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Reily nos fala a respeito dos receptores primários e secundários nas crianças

pequenas e nós transferimos a ideia para os autistas mais comprometidos.

A criança pequena, quando está começando a conhecer o mundo, percebe-se através dos receptores primários, que são o olfato, a gustação e o tato. Tudo ela pega, põe na boca, aperta, cutuca, vira e revira nas mãos. Só depois ela começa a falar e conhecer as coisas por meio simbólicos, ou seja, pela palavra é que vai usar como sentidos primordiais de captação de informação os receptores mais complexos, ou seja, a visão e a audição (108:25).

A interação da auxiliar com o aluno foi sinalizada por experiências

afetivas: o beijo na testa, o carinho, a receptividade, acolhendo o aluno no seu

ombro.

Elenice, às vezes, desconsiderou aquilo que o aluno estava trazendo para

a atividade e revelou-se a preocupação com o figurativo, com os conteúdos de

aprendizagem relacionados à tradição da “prontidão” para a alfabetização

(repertórios conceituais). Ela atende e corresponde às solicitações da auxiliar, mas

para o Josué (12 anos), as propostas são infantilizadoras. Quais são os gostos de

Josué que conseguiriam ser modelados na massinha?

Nas oficinas dos alunos em geral, tivemos também várias ações sobre o

material, como: amassar, apertar, juntar, separar, esticar, bater, socar, comer, fazer

bolinhas e cobrinhas.

Um aluno que nos surpreendeu com a preparação da massinha foi o

Tadeu. (Episódio 93)

“Executou a atividade com uma independência que nos surpreendeu. Colocou os ingredientes no pote, misturando e amassando os ingredientes, chegando a inclinar o pote para que o líquido escorresse até a massa. Amassou a massa com as duas mãos, somente não tendo interesse em modelá-la, mas durante a maior parte do processo, executou sozinho, comigo somente orientando-o no momento da modelagem.” (Diário de campo da Janete)

Percebi que alguns alunos, entre eles, Denise, tiveram uma rejeição à

massinha (Episódio 91). No caso de Jamil, a massinha deu nojo (Episódio 14).

“Não interagiu na atividade, rejeitou o material, demonstrando “nojo”. O mediador passou a massinha sobre as mãos do Jamil, no entanto, ele a retirava. Ficou o tempo todo com um “carrinho” na mão. Porém, na sala de aula, ele adora massinha de modelar.” (Diário de campo da Fabiana)

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Teve um aluno que pensou apenas em comer a massinha caseira –

Gilmar (Episódio 94).

“Desde a preparação da massinha, ele começou a comer: colocando a farinha

na boca, depois o suco. Não quis misturar os ingredientes. Quando a massa ficou pronta,

não quis manipulá-la, querendo somente comê-la.” (Diário de campo da Janete)

No geral, a massinha caseira foi bem aceita pelos educadores. Apenas a

educadora Janete mencionou que a massinha não é um material com o qual ela

goste de trabalhar (Episódio 86).

“Particularmente, não é um material que goste de trabalhar, até pelo fato de ficar com atenção redobrada para não comerem, mesmo não tendo o problema de comê-la. A princípio, a sensação ‘é grudenta’, mas fica interessante, pois queremos chegar logo no ponto da massa.” (Janete – Questionário após a oficina da massinha caseira)

Respondendo ao questionário, disseram:

“Macio, gostoso para modelar, de fácil preparo.” [...] “A massinha já é um material do cotidiano dos alunos, porém prepará-la modifica toda sua concepção, afinal aquele material foi você que preparou; por conta disso, as impressões foram positivas, bem como as sensações, embora o material utilizado para colorir que me proporcionou melhor sensação e impressão foi o guache.” (Fabrício – Questionário após a oficina de massinha caseira).

“É um material com textura macia, com diversas cores, possibilitando criar

muitas formas e objetos.” (Eleonora – Questionário após a oficina de massinha caseira)

“Macia, comestível e colorida.” [...] “Material utilizado e confeccionado no local, é

comestível e dá uma agradável sensação de bem-estar”. (Carla - Questionário após a

oficina de massinha caseira)

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9 - CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo tem como relevância o propósito de incentivar pesquisadores

da área da educação especial a focalizar as possibilidades de resposta de pessoas

com TEA de baixo funcionamento. Estes alunos muitas vezes ficam isolados, tanto

em casa quanto na escola, devido aos transtornos de comportamento.

Destaca-se a urgência de investimento, por parte das instituições públicas

e não governamentais, em processos de formação contínua, para que os

educadores possam melhor atender as pessoas com TEA com dignidade, buscando

sua inserção no meio cultural.

A presente pesquisa procurou contribuir no processo de conhecer e

investigar atividades lúdicas de arte para educadores de alunos com TEA de nível

moderado e severo, numa instituição especializada, oferecendo oficinas para

educadores com a intenção de explorar sugestões de materiais para manuseio que

poderiam ser trabalhados com os alunos.

A proposta das oficinas teve como objetivo que os educadores

experienciassem diversos materiais de exploração sensorial nas atividades de arte,

desmitificando algumas ideias sobre materiais que eles achavam de antemão que

incomodariam os alunos com autismo. Como superar tais pressuposições sem que

os alunos tivessem a vivência? As oficinas com os educadores proporcionaram a

possibilidade de contato com novos materiais, gerando sensações e sentimentos

que poderiam emergir ou não com os alunos; com isso, eles perceberam que

poderiam encontrar maneiras de engajar os seus alunos, usando como recurso a

sensação.

Os momentos vividos durante as oficinas proporcionaram trocas e

aprendizados para mim, para os educadores e, consequentemente, para os alunos.

As atividades realizadas na oficina com os educadores, os repertórios construídos,

eram lembrados ora pelos educadores durante a oficina com o aluno, ora por mim. O

processo dos alunos também mostrou aos educadores algumas possibilidades que

eles não tinham vivenciado. Enfim, foi rica a troca entre alunos e educadores, e

proporcionou aprendizados e ampliação de repertórios para os envolvidos na

relação, principalmente ao assistir às videogravações.

Nestas palavras de conclusão, destaco aspectos levantados na pesquisa

concernentes aos resultados relacionados aos educadores e aos alunos, às

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atividades/materiais selecionados, às questões do contexto e ao meu aprendizado

durante o processo.

Quanto aos educadores e aos alunos, foi interessante notar que as

experiências que os educadores viveram nas oficinas foram bastante significativas.

Percebi, principalmente com os estagiários, a necessidade de indicar algumas

estratégias, principalmente sobre como aproveitar aspectos que eu observei da

oficina daquele estagiário, para que ele sugerisse algo semelhante a seu aluno. No

caso dos educadores mais experientes, eles demonstraram maior facilidade de

encontrar meios de engajar os alunos.

As vivências com papel celofane, serragem colorida, plástico bolha, areia

colorida e massinha caseira foram interessantes, porque os educadores puderam

experimentar momentos lúdicos brincando com os materiais para, de certa forma, se

aproximar mais da realidade da população atendida, cuja grande maioria não chega

a ter representações figurativas e espaciais. Para os alunos, principalmente para os

mais comprometidos, a exploração sensorial foi fundamental, pois de forma lúdica,

com a mediação do educador e algumas vezes com a minha interferência, pudemos

envolvê-los, fazendo com que interagissem conosco, mesmo com simples gestos,

sorrisos e olhares rápidos.

A variedade no manuseio de todos os materiais foi muito rica. As ideias,

as experiências foram vivenciadas de tal forma que a brincadeira fez parte da

criação.

Alguns educadores se preocuparam em produzir imagens figurativas e a

expressão plástica revelou o repertório imagético do grupo. Surgiram mandala, flor,

e bandeira nacional na serragem colorida; a expressão de coração, bandeira do

Brasil, flor, céu e mandalas no plástico bolha.

Com relação aos alunos, o processo foi distinto. Somente um aluno se

preocupou em agrupar as serragens de mesma cor, organizando-as na bacia sem

misturá-las; nenhum aluno explorou o plástico bolha elaborando algo figurativo com

a própria pintura da tinta com os dedos, mas alguns usaram o dedo para desenhar

linhas; na areia colorida, apenas dois alunos desenharam com o dedo.

Os alunos fizeram desenhos e também escreveram, destacando-se as

iniciais do nome, os nomes de amigos, ou palavras/imagens que remetiam ao

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universo infantil. O jogo simbólico surgiu na oficina de papel celofane, quando as

educadoras fizeram acessórios como capa, echarpe, roupa, balão e chapéu.

Não aconteceu uma transposição direta de aprendizados e repertório do

professor para o seu trabalho com o aluno. Às vezes, o educador havia tido uma

vivência bem lúdica no seu processo, mas incentivou no aluno uma produção mais

escolar, cobrando desenho de figuras, letras e numerais. Em outros episódios, foi o

contrário – predominou uma representação contida, simétrica no educador,

enquanto o aluno teve uma atuação exploratória ampla. As contradições e

diferenças de estilo são importantes no processo. Neste rico processo, os alunos

têm ações que mobilizam novas respostas dos educadores, e foi importante

valorizar a interação que acontecia na hora, às vezes de maneira imprevisível.

Um dos recursos que tem se mostrado rico em orientações é a

autoscopia, pois utiliza a videogravação e análise das ações dos educadores frente

aos alunos e com o intuito de autoavaliação. Fiz este procedimento somente duas

vezes durante a pesquisa e foi muito curioso ver que os próprios educadores

identificavam possibilidades que eles não perceberam durante a vivência. Imagino

que seria muito instigante dar continuidade ao processo com uma metodologia

dessa natureza.

Os materiais em geral corresponderam bem, quanto aos objetivos de

promover a vontade de tocar, explorar, usar ferramentas, brincar etc. Alguns alunos

que geralmente não participavam de nada que era oferecido pareceram se mobilizar

pelos materiais para exploração sensorial.

Quando se atenta para a expressão facial e a postura corporal dos alunos

nas videogravações, revela-se a aceitação ou não aceitação dos materiais por parte

dos alunos e também dos educadores. Esta linguagem do corpo mostra, por um

lado, amplos movimentos de ação dos alunos com os materiais e sorrisos; por outro

lado, o encolhimento, braços cruzados, queixo no peito, retração, virando de costas

e recusando o toque. De várias maneiras, os alunos buscaram aproximar ou

distanciar o material do corpo.

Cabe apontar o quanto os educadores, e aqui me incluo também, buscam

encorajar a expressão dos alunos, mas não qualquer expressão. A expressão

corporal negativa, de fuga da atividade, de resistência, tende a ser reprimida, em

favor da expressão positiva, de querer participar mais um pouco... Isto justificado

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pelo desejo de evitar que o aluno fique sempre se isolando, sem interagir, sem se

envolver nos acontecimentos em sala.

Todos os materiais despertaram sentimentos e emoções nos educadores,

tais como: carinho ao abraçar o papel celofane em seu corpo como se fosse roupa;

a serragem trouxe a sensação de ser criança, e de liberdade e suavidade ao jogá-la

para cima; lembranças da infância ao brincar com a areia colorida e também de

tranquilidade, relaxamento; sensações prazerosas com o pintar com as mãos

utilizando tinta guache sobre o plástico bolha, como tranquilidade, leveza, conforto,

relaxamento e liberdade; a massinha trouxe uma agradável sensação de bem-estar

e relaxamento.

Nos alunos, também despertaram momentos de expressividade e troca

de sentimentos e emoções. O pedido de beijo do aluno (vestido com o papel

celofane) para a estagiária, e o abraço coletivo; a recusa de um aluno em não

misturar a serragem; o sorriso do aluno ao ouvir o incentivo dos educadores na

pintura do plástico bolha; a alegria do aluno batendo palmas, expressão de

contentamento, alegria comemorando o contato com a areia colorida em suas mãos;

o encostar do rosto no ombro da educadora enquanto manuseava a massinha

caseira.

A expressão de interesse ou desagrado com os materiais não se limitou

aos alunos. Com relação aos educadores, houve pouca rejeição explícita, mas os

educadores mencionaram o seu desconforto com o contato com a serragem e a

areia, e com o papel celofane perto das orelhas. Uma educadora relatou que o

movimento de passá-lo no braço causou “agonia” e arrepio. Outra educadora achou

a massinha grudenta.

Do ponto de vista dos sentidos, alguns materiais possibilitaram uma

atenção sonora, como o papel celofane e o plástico bolha; outros convidaram à

manipulação tátil, como a serragem, a massinha e ainda a areia, que promoveu o

uso de instrumentos como pás e garfos.

Quanto ao contexto em que a pesquisa se desenvolveu, cabe destacar

que houve ampla abertura por parte da instituição para realização do estudo. Eu

providenciei os materiais, mas tive como norte utilizar materiais facilmente

acessíveis para a escola, de modo a encorajar a repetição das atividades em outras

ocasiões.

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Como limitação, destaco o tempo curto aprovado pela direção da escola

para as oficinas dos educadores tempo este definido de acordo com os horários de

aula das classes. Meia hora não foi tempo suficiente para a exploração, produção

estética e avaliação, principalmente em se tratando de adultos com pequena

experiência anterior com materiais artísticos.

Um aspecto que prejudicou o andamento dos trabalhos foi a alta

rotatividade entre os educadores. Desde o início da pesquisa em fevereiro de 2014

até novembro do mesmo ano, cinco profissionais se desligaram por diversas razões

(sendo alguns substituídos por novos educadores/estagiários), reduzindo de nove

para quatro os participantes do estudo. Considero que, diante das especificidades

do quadro de autismo, caberia uma pesquisa aprofundada sobre a Síndrome de

Burnout entre profissionais que trabalham com TEA. Não é possível saber os

motivos exatos que levaram à saída desses educadores. Entretanto, considero de

grande relevância valorizar a educação continuada no contexto da educação para

prevenir processos de desmotivação. Isso porque o professor de educação especial

atua como educador-cuidador, e tem uma sobrecarga de atividades, incluindo:

auxílio nas AVDs, ministrar medicação nos horários certos, construção de um

planejamento pedagógico significativo e adaptado às necessidades individuais.

Nesta área em que há constantes avanços, é preciso continuar

estudando, por intermédio de acesso a pesquisas, capacitações, palestras e cursos

que tenham o direcionamento tanto da teoria quanto da prática.

Entendi que, do ponto de vista da presente pesquisa, o mais importante

foi perceber o quanto aqueles educadores necessitavam de uma rede de apoio,

orientação externa in loco de profissionais especializados em TEA, pois há

momentos em que não sabem como proceder com os alunos, ficando um pouco

inseguros quanto às atitudes que devem tomar com eles. As vivências lúdicas

deveriam ser contínuas, pois os profissionais especialistas na área de artes e TEA

podem ajudar, tanto com informações sobre como lidar com os alunos com TEA,

como também com sugestões de materiais e atividades.

Neste sentido, espero ter contribuído durante os nove meses da pesquisa

em que acompanhei os trabalhos dos educadores, em atividades artísticas com

materiais de exploração sensorial.

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185

APÊNDICE 1

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (TCLE) – EDUCADORES QUE ATUAM COM TEA

Estamos convidando-o para participar como voluntário (a) da pesquisa: “A ARTE SENSORIAL: MEDIAÇÃO COM EDUCADORES DE ALUNOS COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA)”, sob a responsabilidade da pesquisadora Marcieli Cristine do Amaral Santos, para obtenção do título de Mestre em Saúde, Interdisciplinaridade e Reabilitação, sob orientação da Profa. Dra. Lúcia Helena Reily.

Esta pesquisa tem como objetivo a formação de modos de trabalhar para educadores, com realização de reuniões/oficinas utilizando arte sensorial, para posteriormente aplicarem com alunos com Transtorno do Espectro Autista- TEA, nível moderado e severo.

As reuniões/oficinas com os educadores referentes às atividades poderão ou não ser registradas em filmagens, fotos e gravações. Sendo autorizada, ficarão à disposição apenas dos participantes e pesquisadores envolvidos. As imagens, gravações serão armazenadas durante o prazo de 5 anos.

( ) Autorizo a tomada de imagens em filmagens, fotos e gravações.

( ) Não autorizo a tomada de imagens em filmagens, fotos e gravações.

Os dados pessoais serão mantidos em sigilo e os resultados gerais obtidos através da pesquisa serão utilizados apenas para alcançar o objetivo do trabalho, incluída sua publicação na literatura científica especializada.

A pesquisa e as atividades não possuem riscos previsíveis para os participantes, por se tratar atividades de artes, envolvendo pinturas, brincadeiras, movimentos corporais, conteúdos estes do cotidiano dos sujeitos.

As aulas não serão prejudicadas ao educador, em virtude da coleta de dados, pois os mesmos já estarão nos horários respectivos na instituição e o mesmo será avisado com antecedência.

Vale esclarecer que a pesquisa não terá nenhum ônus e também nenhum benefício financeiro aos sujeitos, estará isenta de despesas, pois as mesmas serão de responsabilidade da pesquisadora. Fica assegurado a liberdade de recusar-se e/ou interromper a sua participação na pesquisa a qualquer momento, sem prejuízo na continuidade de suas aulas.

O documento será assinado em duas vias, ficando uma delas em poder do participante ou seu responsável LEGAL e outra com o pesquisador responsável, como previsto na Resolução CNS/MS 466/96. Poderão ser solicitados, em qualquer momento, esclarecimentos sobre a pesquisa e para isso, os participantes poderão entrar em contato com a pesquisadora responsável – Marcieli Cristine do Amaral Santos, pelos telefones: (11) xxx ou (11) xxx ou por e-mail: xxx e ou com a orientadora da pesquisa – Profa. Dra. Lúcia Helena Reily, pelo telefone (19) xxx ou e-mail: xxx, que podem ser

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186

encontradas no CEPRE/FCM/UNICAMP - Rua Tessália Vieira de Camargo,126 - Campinas – SP. O Comitê de Ética em Pesquisa da Unicamp (CEP), órgão que garante e resguarda a integridade e os direitos dos voluntários participantes de pesquisas poderá ser contatado caso tenham reclamações e ou denúncias sobre os aspectos éticos da pesquisa, na Rua Tessália Vieira de Camargo, 126, Bairro Barão Geraldo, Campinas, SP, telefone ( 19) 3521-8936, ou e-mail: [email protected].

Campinas, ____ de ___________________________ de 2014.

Pesquisador responsável

Eu, Marcieli Cristine do Amaral Santos, responsável pela pesquisa: A ARTE

SENSORIAL: MEDIAÇÃO COM EDUCADORES DE ALUNOS COM

TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA), declaro que obtive

espontaneamente o consentimento do profissional para realizar este estudo.

___________________________ _________________________

Assinatura do profissional Assinatura do pesquisador

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APÊNDICE 2

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (TCLE)

PAIS E/OU RESPONSÁVEIS LEGAIS DOS ALUNOS COM TEA

Estamos convidando seu (sua) filho (a) para participar como voluntário da pesquisa: “A ARTE SENSORIAL: MEDIAÇÃO COM EDUCADORES DE ALUNOS COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA)”, sob a responsabilidade da pesquisadora Marcieli Cristine do Amaral Santos, para obtenção do título de Mestre em Saúde, Interdisciplinaridade e Reabilitação, sob orientação da Profa. Dra. Lúcia Helena Reily.

Esta pesquisa tem como objetivo a formação de modos de trabalhar para educadores, com realização de reuniões/oficinas utilizando arte sensorial, para posteriormente aplicarem com alunos com Transtorno do Espectro Autista- TEA, nível moderado e severo.

As oficinas dos educadores com os alunos referentes às atividades poderão ou não ser registradas em filmagens, fotos e gravações. Sendo autorizada, ficarão à disposição apenas dos participantes e pesquisadores envolvidos. As imagens, gravações serão armazenadas durante o prazo de 5 anos.

( ) Autorizo a tomada de imagens em filmagens, fotos e gravações do aluno.

( ) Não autorizo a tomada de imagens em filmagens, fotos e gravações do aluno.

Os dados pessoais serão mantidos em sigilo e os resultados gerais obtidos através da pesquisa serão utilizados apenas para alcançar o objetivo do trabalho, incluída sua publicação na literatura cientifica especializada.

A pesquisa e as atividades não possuem riscos previsíveis para os participantes, por se tratar atividades de artes, envolvendo pinturas, brincadeiras, movimentos corporais, conteúdos estes do cotidiano dos sujeitos.

Os atendimentos à criança/adolescente não serão prejudicados em virtude da coleta de dados, pois os mesmos já estarão nos horários respectivos atendidos na instituição e o mesmo será avisado com antecedência.

Vale esclarecer que a pesquisa não terá nenhum ônus e também nenhum benefício financeiro aos sujeitos, estará isenta de despesas, pois as mesmas serão de responsabilidade da pesquisadora. Fica assegurado a liberdade de recusar-se e/ou interromper a participação do seu (sua) filho (a) na pesquisa a qualquer momento, sem prejuízo na continuidade do atendimento oferecido à criança/adolescente.

O documento será assinado em duas vias, ficando uma delas em poder do participante ou seu responsável LEGAL e outra com o pesquisador responsável, como previsto na Resolução CNS/MS 466/96. Poderão ser solicitados, em qualquer momento, esclarecimentos sobre a pesquisa e para isso, os participantes poderão entrar em contato com a pesquisadora responsável – Marcieli Cristine do Amaral Santos, pelos telefones: (11)

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xxx ou (11) xxx ou por e-mail: e ou com a orientadora da pesquisa – Profa. Dra. Lúcia Helena Reily, pelo telefone (19) xxx ou e-mail: xxx, que podem ser encontradas no CEPRE/FCM/UNICAMP - Rua Tessália Vieira de Camargo,126 - Campinas – SP. O Comitê de Ética em Pesquisa da Unicamp (CEP), órgão que garante e resguarda a integridade e os direitos dos voluntários participantes de pesquisas, poderá ser contatado caso tenham reclamações e ou denúncias sobre os aspectos éticos da pesquisa, na Rua Tessália Vieira de Camargo, 126, Bairro Barão Geraldo, Campinas, SP, telefone ( 19) 3521-8936, ou e-mail: [email protected].

Campinas, ____ de ___________________________ de 2014.

Declaração ( menor de 18 anos)

Eu ________________________________________, RG: ___________________

Responsável LEGAL pelo menor, concordo que meu (minha) filho (a)

_______________________________ participe voluntariamente da pesquisa

descrita acima e declaro que li e entendi todas as informações apresentadas, sendo

os objetivos e procedimentos satisfatoriamente explicados. Entendo que a

participação do meu (minha) filho (a) não será remunerada e que sou livre para

interrompê-la a qualquer momento, sem que isso determine qualquer prejuízo.

Concordo que meu (minha) filho (a) participe deste estudo e tenho o direito de agora

ou mais tarde discutir qualquer outra dúvida que venha ter.

_____________________________ ____________________________

Assinatura do Responsável LEGAL Assinatura do pesquisador

Pesquisador responsável

Eu, Marcieli Cristine do Amaral Santos, responsável pela pesquisa: A ARTE

SENSORIAL: MEDIAÇÃO COM EDUCADORES DE ALUNOS COM

TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA), declaro que obtive

espontaneamente o consentimento do responsável LEGAL pelo sujeito para realizar

este estudo.

_____________________________ ______________________

Assinatura do responsável LEGAL Assinatura do pesquisador

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APÊNDICE 3

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190

ANEXO 1

Lista de sintomas do Transtorno do Espectro Autista de acordo com

os novos critérios oferecidos pelo DSM-5®

Fonte: Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, DSM-5®. 5ª. Edição.

American Psychiatric Association, Artmed, 2014.

Critérios Diagnósticos 299.00 (F84.0)

A. Déficits persistentes na comunicação social e na interação social em

múltiplos contextos, conforme manifestado pelo que segue, atualmente ou por

história prévia

1 . Déficits na reciprocidade socioemocional, variando, por exemplo, de abordagem

social anormal e dificuldade para estabelecer uma conversa normal a

compartilhamento reduzido de interesses, emoções ou afeto, a dificuldade para

iniciar ou responder a interações sociais.

2 . Déficits nos comportamentos comunicativos não verbais usados para interação

social, variando, por exemplo, de comunicação verbal e não verbal pouco integrada a

anormalidade no contato visual linguagem corporal ou déficits na compreensão e uso

gestos, a ausência total de expressões faciais e comunicação não verbal.

3 . Déficits para desenvolver, manter e compreender relacionamentos, variando, por

exemplo, de dificuldade em ajustar o comportamento para se adequar a contextos

sociais diversos a dificuldade em compartilhar brincadeiras imaginativas ou em fazer

amigos, a ausência de interesse por pares.

Especificar a gravidade atual:

A gravidade baseia-se em prejuízos na comunicação social e em padrões

de comportamento restritos e repetitivos (ver Anexo 3).

B. Padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou

atividades, conforme manifestado por pelo menos dois dos seguintes,

atualmente ou por história prévia

1. Movimentos motores, uso de objetos ou fala estereotipados ou repetitivos (p. ex.,

estereotipias motoras simples, alinhar brinquedos ou girar objetos, ecolalia,

frases idiossincráticas).

2. Insistência nas mesmas coisas, adesão inflexível a rotinas ou padrões

ritualizados de comportamento verbal ou não verbal (p. ex., sofrimento extremo

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em relação a pequenas mudanças, dificuldades com transições, padrões rígidos

de pensamentos, rituais de saudação, necessidade de fazer o mesmo caminho

ou ingerir os mesmos alimentos diariamente).

3. Interesses fixos e altamente restritos que são anormais em intensidade ou foco

(p. ex., forte apego a ou preocupação com objetos incomuns, interesses

excessivamente circunscritos ou perseverativos).

4. Hiper ou hiporreatividade a estímulos sensoriais ou interesse incomum por

aspectos sensoriais do ambiente (p. ex., indiferença aparente a dor/ temperatura,

reação contrária a sons ou texturas específicas, cheirar ou tocar objetos de forma

excessiva, fascinação visual por luzes ou movimento).

Especificar a gravidade atual:

A gravidade baseia-se em prejuízos na comunicação social e em

padrões restritos ou repetitivos de comportamento (ver Anexo 3).

C. Os sintomas devem estar presentes precocemente no período do

desenvolvimento (mas podem não se tornar plenamente manifestados até

que as demandas sociais excedam as capacidades limitadas ou podem ser

mascarados por estratégias aprendidas mais tarde na vida).

D. Os sintomas causam prejuízo clinicamente significativo no

funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do

indivíduo no presente.

E. Essas pertubações não são mais bem explicadas por deficiência

intelectual (transtorno de desenvolvimento intelectual) ou atraso global do

desenvolvimento. Deficiência intelectual ou transtorno do espectro autista

costumam ser comórbidos; para fazer o diagnóstico da comorbidade de

transtorno do espectro autista e deficiência intelectual, a comunicação social

deve estar abaixo do esperado para o nível geral do desenvolvimento.

Nota: Indivíduos com um diagnóstico de DSM-IV bem estabelecido de

transtorno autista, transtorno de Asperger ou transtorno global do

desenvolvimento sem outra especificação devem receber o diagnóstico de

transtorno do espectro autista. Indivíduos com déficits acentuados na

comunicação social, cujos sintomas, porém, não atendam, de outra forma,

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critérios de transtorno do espectro autista, devem ser avaliados em relação a

transtorno da comunicação social (pragmática).

Especificar-se: Com ou sem comprometimento intelectual concomitante. Com ou sem comprometimento da linguagem concomitante. Associado a alguma condição médica ou genética conhecida ou a fator ambiental. Associado a outro transtorno do neurodesenvolvimento, mental ou comportamental. Com catatonia.

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ANEXO 2

Níveis de gravidade para transtorno do espectro autista

AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION (APA).Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais. DSM-5®. 5ª. Ed. Porto Alegre: Artmed; 2014.

Nível de gravidade Comunicação Social Comportamentos restritos e repetitivos

Nível 3

“Exigindo muito apoio

substancial”

Déficits graves nas habilidades de comunicação social verbal e não

verbal causam prejuízos graves de funcionamento, grande limitação

em dar inícioa interações sociais e resposta mínima a aberturas

sociais que partem de outros. Por exemplo, uma pessoa que fala

inteligível de poucas palavras que raramente inicia as interações e,

quando o faz, tem abordagens incomuns apenas para satisfazer a

necessidades e reage somente a abordagens sociais muito diretas.

Inflexibilidade de comportamento, extrema dificuldade em

lidar com a mudança ou outros comportamentos restritos

/ repetitivos interferem acentuadamente no

funcionamento em todas as esferas. Grande sofrimento /

dificuldade para mudar o foco ou as ações.

Nível 2

“Exigindo apoio substancial”

Déficits graves nas habilidades de comunicação social verbal e não

verbal; prejuízos sociais aparentes mesmo na presença de apoio;

limitação em dar início a interações sociais e resposta reduzida ou

anormal a aberturas sociais que partem de outros. Por exemplo, uma

pessoa que fala frases simples, cuja interação se limita a interesses

especiais reduzidos e que apresenta comunicação não verbal

acentuadamente estranha.

Inflexibilidade do comportamento, dificuldade de lidar

com a mudança ou outros comportamentos restritos /

repetitivos aparecem com frequência suficiente para

serem óbvios ao observador casual e interferem no

funcionamento em uma variedade de contextos.

Sofrimento e / ou dificuldade de mudar o foco ou as

ações.

Nível 1

“Exigindo apoio”

Na ausência de apoio, déficits na comunicação social causam

prejuízos notáveis. Dificuldade para iniciar interações sociais e

exemplos claros de respostas atípicas ou sem sucesso a aberturas

sociais dos outros. Pode parecer apresentar interesse reduzido por

interações sociais. Por exemplo, uma pessoa que consegue falar

frases completas e envolver-se na comunicação embora apresente

falhas na conversação com os outros e cujas tentativas de fazer

amizades são estranhas e comumente malsucedidas.

Inflexibilidade de comportamento causa interferência

significativa no funcionamento em um ou mais contextos.

Dificuldade em trocar de atividade. Problemas para

organização e planejamento são obstáculos à

independência.

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ANEXO 3

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