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MEDITANDO A PALAVRA – 2

meditando a palavra – 2 - paulus.com.br · Esta palavra, de origem grega,carrega a ideia de tempo especial, certo, para se tomar uma decisão importan- ... na instituição do mandamento

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meditando a palavra – 2

Meditando a Palavra – 2Quaresma

Pe. Augusto César Pereira, SCJ

direção editorial: Claudiano Avelino dos Santosassistente editorial: Jacqueline Mendes Fontesrevisão: Iorlando Rodrigues Fernandes Iranildo Bezerra Lopesdiagramação: Ana Lúcia PerfoncioCapa: Marcelo Campanhãilustrações da capa: © Periodici San Paolo S.r.l. “La Domenica” / Nino Musioimpressão e acabamento: paUlUS

© paUlUS – 2015Rua Francisco Cruz, 229 • 04117-091 • São Paulo (Brasil)Fax (11) 5579-3627 • Tel. (11) 5087-3700www.paulus.com.br • [email protected]

ISBN 978-85-349-4092-4

1ª edição, 2015

Às Equipes de Pastoral Litúrgica, conscientes de seu serviço de animação e educação litúrgica

de nossas comunidades espalhadas por todo o Brasil.

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ABREVIATURAS DOS LIVROS DA BÍBLIA (em ordem alfabética)

ab abdiasag ageuam amósap apocalipseat atos dos apóstolos

Br Baruc

Cl Colossenses1Cor 1ª Coríntios2Cor 2ª Coríntios1Cr 1º Crônicas2Cr 2º CrônicasCt Cântico dos Cânticos

dn danieldt deuteronômio

ecl eclesiasteseclo eclesiásticoef efésiosesd esdrasest esterex Êxodoez ezequiel

Fl FilipensesFm FilêmonGl GálatasGn Gênesis

Hab HabacucHb Hebreus

is isaías

Jd JudasJl JoelJn JonasJó JóJo evangelho segundo João1Jo 1ª João2Jo 2ª João3Jo 3ª JoãoJr Jeremias

Js JosuéJt JuditeJz Juízes

lc evangelho segundo lucaslm lamentaçõeslv levítico

mc evangelho segundo marcos1mc 1º macabeus2mc 2º macabeusml malaquiasmq miqueiasmt evangelho segundo mateus

na naumne neemiasnm números

os oseias

1pd 1ª pedro2pd 2ª pedropr provérbios

rm romanos1rs 1º reis2rs 2º reisrt rute

Sb SabedoriaSf SofoniasSl Salmos1Sm 1º Samuel2Sm 2º Samuel

tb tobiastg tiago1tm 1ª timóteo2tm 2ª timóteo1ts 1ª tessalonicenses2ts 2ª tessalonicensestt tito

Zc Zacarias

Abreviaturas dos livros da Bíblia

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INTRODUÇÃO

Parábola do prédio para a Quaresma

Jesus era exímio inventor e contador de parábolas. O povo adorava. Explica-se, porque a parábola baseia-se em fato conhe-cido ou possível de acontecer.

O fato sempre provoca a atenção das pessoas e elas se sen-tem participantes do acontecido ou possível de acontecer.

O fato da parábola toca mais de perto o povo, porque é vida e, mesmo que não tenha acontecido, é verossímil, isto é, possível de acontecer.

Esta parábola adaptada à Quaresma e à Campanha da Fra-ternidade, em algum ou vários lugares poderá ter acontecido ou ainda acontecer.

Era um edifício antigo, alto, pomposo. Aparentava ser sóli-do, sem perigo para os moradores.

Anualmente, porém, apareciam rachaduras nas paredes dos apartamentos. Os moradores tratavam de reformar seus próprios apartamentos, para ter segurança de que sua salva- ção estaria garantida. Cada qual fazia sua própria festa de res-tauração e tudo continuava bem, até novo período de preocu-pação.

Isso durou muito tempo. Faz pouco mais de quarenta anos que um engenheiro explicou a causa do problema: o fundamen-to do prédio estava bastante abalado. Fazendo-se as necessárias intervenções, a estrutura estaria em condições de garantir a se-gurança dos moradores. Era necessário, dali para a frente, cada ano, examinar a estrutura do fundamento e restaurar a falha que pudesse comprometer mais.

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O trabalho do síndico e dos seus auxiliares foi decisivo para conscientizar as pessoas da necessidade de se convencerem da urgência de preservar o fundamento do prédio.

Passaram a discutir, reunidos, porque perceberam que a causa dos problemas afetava a todos. Logo, todos os interessados eram, também, responsáveis.

Desde que se começou a dar atenção ao fundamento, já fo-ram detectadas e enfrentadas dezenas de sérios problemas. Não foram totalmente resolvidas, mas são conhecidas e devidamente acompanhadas.

O prédio ainda não está “aquela coisa”, mas o clima é de confiança nas novas maneiras de convivência entre os mo-radores. Estão conscientes de que o fundamento não está seguro. A vistoria anual ainda se faz indispensável porque há problemas antigos que reaparecem e novos defeitos que surgem.

Como sempre, há pessoas que se comprometem e se enga-jam no trabalho comum; há também as que deixam tudo sobre as costas dos abnegados; e, inclusive, outras que se esquivam achando que não é com elas.

Embora sabendo da ameaça de que algum dos problemas possa estourar a qualquer momento, os moradores vivem na es-perança de que algo de novo e de melhor vai acontecer.

A espiritualidade do ano litúrgico

O ano litúrgico não se mede pelo tempo cronológico (marcado no relógio), mas é o tempo da ação de Deus em favor de seu povo (o tempo kairológico). Esta palavra, de origem grega, carrega a ideia de tempo especial, certo, para se tomar uma decisão importan-te e realizá-la. Em liturgia, kairós significa o tempo próprio para uma presença especial de Deus. Por exemplo, a presença muito especial de Deus na realização do mistério pascal de Jesus Cristo.

A espiritualidade do ano litúrgico é pascal, porque tem o mistério pascal de Jesus Cristo como eixo em torno do qual tudo gira. O ano litúrgico, portanto, é centrado no Tríduo Pascal. O domingo é o dia especial que o próprio Senhor escolheu para a comunidade celebrar a sua Páscoa.

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A Igreja organizou a celebração litúrgica do mistério pas-cal de Jesus Cristo num ciclo de tempo anual: tempo de Natal, tempo da Páscoa e tempo comum. Daí o nome de ano litúrgico.

O ano litúrgico faz a celebração litúrgica situar-se dentro da história da salvação. Celebra o passado como memória do misté-rio pascal; atualiza o mistério pascal no presente; e refere-se ao futuro acenando para o que será o Reino de Deus que a Igreja espera agora. Só é possível acompanhá-lo e vivê-lo por meio dos símbolos revelados pela fé.

O ano litúrgico é a admirável intuição pastoral da Igreja. O ano litúrgico é uma caminhada pascal que orienta o diálogo entre liturgia e vida. Essa caminhada se dá progressivamente no coti-diano da vida. A comunidade celebra liturgicamente o desenrolar do mistério de Cristo; e recebe a graça que o mistério derrama hoje sobre a comunidade. A celebração litúrgica faz acontecer a Páscoa na e da comunidade. Por isso, o ano litúrgico é o proces-so da santificação das pessoas e da comunidade.

A celebração é litúrgica, porque é celebrada no rito propos-to pela liturgia da Igreja Católica. Liturgia é a celebração que usa símbolos explicados pela fé. Assim sendo, a celebração litúrgica atualiza o mistério pascal de Jesus Cristo.

A celebração litúrgica é memorial, isto é, não só faz uma lembrança do fato celebrado – o mistério pascal, por exemplo –, mas também faz com que ele aconteça realmente por meio dos sinais como o pão entregue e o vinho derramado.

Celebrar consiste em tirar o véu que cobre o mistério – des-vendar – com os símbolos litúrgicos iluminados pela fé.

A liturgia é a fonte e o cume de toda a vida cristã (SC 10). Fonte, porque é na celebração litúrgica que o povo de Deus tem a chance de atualizar a Aliança da salvação da humanidade. É o cume, porque celebra o ponto de chegada da salvação que nos é transmitida.

A atualização do mistério pascal realiza-se também pelo que as pessoas e a comunidade fizerem pelos pobres fora da igreja, depois da missa, como sinal e resultado da participação eucarís-tica animada pelo Espírito.

As celebrações do ano litúrgico não são festas isoladas. O ano litúrgico é lógico, tem sequência, tudo se encadeia como os

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elos de uma corrente (cf. SC 102). Ele penetra no tempo huma-no pela presença real do mistério de Jesus Cristo no tempo. Ele não é o correr do tempo, não é um calendário de sucessão de dias. É litúrgico, porque celebra a presença do mistério de Jesus Cristo no nosso tempo.

O calendário do ano litúrgico é ordenado pela sequên- cia dos domingos. A Páscoa na Ressurreição e a comunicação do Espírito Santo, no domingo, consagram-no como “o dia espe-cial”. Cristo está presente, ontem, hoje e sempre (cf. Hb 13,18).

O ano litúrgico começa e termina na véspera do 1º domingo do Advento, sábado à tarde.

O percurso que o ano litúrgico desenvolve no período de um ano mostra que a liturgia não é parada, é dinâmica, é vida.

Os “tempos fortes” (especiais, destacados) são os períodos em que a liturgia celebra com mais intensidade e profundidade a história da salvação. São formados pelo tempo do Natal do Senhor e o Advento, que celebra a expectativa da segunda vinda de Cristo e a preparação próxima para a solenidade do Natal, que celebra o conjunto de festas: a Epifania e o Batismo do Senhor.

É também forte o tempo da Páscoa na Ressurreição do Se-nhor com a Quaresma como um significativo período de revisão de vida na proposta da conversão para a fraternidade. A Semana Santa incorpora o Tríduo Pascal. Esta consta da Páscoa celebrada na instituição do mandamento do amor e da Eucaristia no espírito do lava-pés; a Páscoa dolorosa com o mistério do sofrimento e a morte redentora; a Páscoa gloriosa celebrada na vigília da Ressur-reição do Senhor com o mistério da vida nova em Cristo.

A Ascensão do Senhor celebra a exaltação de Jesus pelo Pai, que o recebe de volta ao céu como aquele que cumpriu brilhan-temente sua missão salvadora. De volta para junto do Pai, Jesus e o Pai enviarão o Espírito Santo. Portanto, o Espírito Santo comunicado procede do Pai e do Filho.

Coroando o tempo Pascal, é celebrada a solenidade de Pen-tecostes com a comunicação do Espírito Santo e a fundação da Igreja. Entenda-se o Pentecostes do Espírito Santo não só como um momento, embora decisivo para a Igreja, pois o Espírito está sempre em ação mantendo a Igreja viva no cumprimento de sua

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missão até o final dos tempos. A celebração de Pentecostes en-cerra o tempo Pascal, porque o mistério pascal de Cristo só esta-rá completo com a comunicação do Espírito Santo.

A Quaresma no ano litúrgico

A Quaresma é o período de tempo do ano litúrgico em que se celebra algum fato especial, ou seja, a Ressurreição de Cristo e a libertação da humanidade do pecado e da morte para entrar na vida da graça.

A Quaresma já é Páscoa. Está tão intimamente ligada à Pás-coa que, se não houver Páscoa, não haverá Quaresma. Por quê? Porque a Quaresma é um período de tempo suficiente para os exercícios de conversão.

Já pelo ano 200 a comunidade cristã introduziu três dias de preparação para a Páscoa – que antes se celebrava só aos domin-gos. Cerca de 150 anos depois, mais ou menos pelo ano 350, por julgarem os três dias pouco tempo de preparação, introduziram os 40 dias que hoje celebramos. O número 40, muito usado na Bíblia, representa um período de tempo suficiente para se tomar decisões importantes.

Talvez o significado maior do número 40 seja usado para registrar o tempo em que o povo hebreu caminhou pelo deserto. A importância é porque o povo peregrinou pelo deserto quando saiu do Egito não sem rumo, mas consciente de estar se prepa-rando para tomar posse da terra prometida.

A Quaresma é o tempo em que a Igreja nos dá a garantia de que o Pai está de coração mais aberto do que de costume para aceitar o nosso arrependimento e nos dar o perdão (cf. Jl 2,12-18; Jr 3,12-14). Para conseguirmos isso, a Igreja propõe a Campanha da Fraternidade (CF). Durante a Quaresma somos educados para transformar nossa mentalidade egoísta na menta-lidade fraterna, que é a essência do cristianismo.

O modelo clássico disto é a figura daquele pai misericor-dioso que perdoa ao filho pródigo e o reintegra na comunidade familiar. O jovem que procurava um patrão encontrou um pai e uma família. No entanto, o mais velho nada entendeu do que fez o pai, porque tinha uma mentalidade extremamente egoísta que

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não admitia a reintegração do irmão pródigo na família (cf. Lc 15,1-3.11-32).

Quem não for capaz de agir como o Pai misericordioso pre-cisa urgentemente de uma boa Campanha da Fraternidade. A CF não é apenas um remédio que se toma para ficar bem, ela é uma conversão para novo estilo de relacionamento no amor fra-terno. A conversão brota do encontro com o amor infinito do Pai. E, por isso, leva para o amor fraterno entre irmãos. A conversão nos conduz a uma mudança radical de vida, superando o orgu-lho, o egoísmo e o individualismo e, enfim, tudo o que representa o afastamento das pessoas umas das outras.

A conversão é radical, porque desce até a raiz das desigual-dades humanas e sobe como a seiva que alimenta a árvore e seus frutos. E nos convence a fazermos novas opções de vida, as ne-cessárias renúncias e a construir a “nova Jerusalém”, a “cidade santa” (Ap 21,2; LG 5; 48). A humanidade nova será agente pri-vilegiada da chamada “nova evangelização”. Assim, a conversão é questionada pela realidade da injustiça e igualmente ela passa a questionar a injustiça.

A conversão pessoal e, da mesma forma, a conversão comu-nitária da Igreja são fundamentais para a renovação da Igreja. Por aí se percebe a importância tanto de uma como da outra. Portanto, a conversão é agente da construção do Reino de Deus e do mundo novo que há de vir.

O Documento de Aparecida indica o cuidado e a preocupa-ção dos bispos latino-americanos com a “conversão pastoral” para criar condições da conversão pessoal para corresponder à missão da Igreja de transformar o mundo (DAp 347-379).

A credibilidade de Jesus não vem de seus milagres, mas do amor profundo que o levava a fazer tais milagres. Ele próprio invocou o testemunho de sua obra como garantia de que real-mente ele é o enviado do Pai (cf. Jo 5,17-30). É dele a expres-são: “A Igreja não cresce por proselitismo, mas por atração” (EG 14).

O papa Francisco usa muito a palavra “saída” para encorajar a Igreja a sair em missão pelo mundo ao encontro do povo (a “te-ologia do encontro”). Assim como Jesus, que “saiu” do céu para vir à nossa terra e nos encontrar.

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O grande apóstolo São Paulo nos anima, afirmando que este é o tempo favorável para nossa conversão e o perdão do Pai. Fa-vorável é o que está a nosso favor, como o vento favorável ao voo do avião (cf. 2Cor 5,20–6,2).

Todo trabalhador, por exemplo, aguarda o momento fa- vorável para plantar a soja; ou, em casa, aguardamos por um mo-mento favorável para pedir algo ao nosso pai; ou esperamos um momento favorável do chefe para pedir um aumento de salário.

Mas, entendamos que conversão se trata de uma transforma-ção, não é uma simples reforma; por exemplo, alguém que trocou o telhado inteiro para resolver de vez o problema e não ser mais incomodado com vazamento de água na chuva.

Naturalmente, não podemos nos esquecer de aprender que quem recebe a misericórdia abundante do Pai precisa aprender com o Pai a dar misericórdia a seus irmãos e irmãs (cf. Lc 6,36; Mt 5,7). Recebido o perdão, não só temos certeza de estar quites com Deus, mas isso implica o compromisso de novo esforço para nos transformarmos.

O testemunho de conversão pessoal e eclesial é indispensá-vel para implantar o Reino de Deus no mundo novo.

Na Quarta-feira de Cinzas antes de sua eleição, ainda em Buenos Aires, o papa Francisco convocou o povo com estas pa-lavras: “Como Igreja que caminha para a Páscoa e que acredita que o Reino de Deus é possível, necessitamos que, de nossos corações dilacerados pelo desejo de conversão e pelo amor, bro-tem a graça e o gesto eficaz que alivia a dor de tantos irmãos que caminham junto de nós”.

A Quaresma é o tempo favorável para essa transformação. O tempo é agora. O tempo é precioso. Não percamos tempo!

A CF é o passo decisivo no caminho da Páscoa

A Campanha da Fraternidade não faz parte da Quaresma. Ela é Quaresma!

A conversão pascal não é somente mudar do caminho erra-do para o caminho certo. Mesmo a pessoa que já está no caminho certo da Quaresma, a Campanha da Fraternidade mostra que é

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sempre necessário fazer a conversão. De maneira que quanto mais a pessoa entrar no espírito da conversão, mais ainda ela terá que sempre se converter. Por isso, nota-se que a conversão é um processo, é uma caminhada em busca de alcançar a santidade possível.

É sabido que o nosso mundo está estruturado para que os que já tiverem riqueza tenham ainda mais, aumentando sempre mais a desigualdade social. Estamos todos ligados a esta organi-zação da sociedade de maneira tão forte que, querendo ou não, torna-se impossível nos desligarmos do contexto natural e social em que estamos forçadamente incluídos.

O ser humano pode agir sobre a situação social de duas maneiras: apoiando e ajudando a crescer a injustiça; e, graças a Deus, somos também capazes de agir sobre a situação para transformá-la.

Trata-se de uma situação essencialmente social, impossível de ser tomada apenas como individual. Impossível também de ser transformada pelo indivíduo, mas só é possível em comuni-dade.

Essa transformação é o desafio proposto como ação conti-nuada da transformação pela conversão quaresmal. Mas a Qua-resma centrada apenas na conversão individual e dos pecados pessoais não tem condições de fazer essa transformação. A Cam-panha da Fraternidade vem em socorro da Quaresma para con-duzir a conversão social em comunidade. Porque a CF mostra com clareza a extensão social do pecado cometido por pessoas injustas sobre as pessoas pobres e excluídas. Essa situação é cria-da pela falta de amor, gerando muita injustiça.

Essa situação não se resolve só com a conversão da pessoa, enquanto não for a conversão em vista da transformação. Mas a transformação não é só a mudança interna do indivíduo, mas a conversão social em vista da transformação da estrutura injusta sendo substituída pela estrutura justa do Evangelho.

Não é conversão nem Quaresma a pessoa pensar que mu-dar internamente é o bastante, se ela não fizer a transformação pessoal de sua mentalidade, por exemplo, da injustiça para a justiça e do egoísmo individualista e consumista para a frater-nidade.

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É fácil perceber que conversão não é só para os que estão fora da Igreja. Todos precisamos de conversão!

A Campanha da Fraternidade é a originalidade brasileira credenciada pela Igreja para indicar o caminho e os meios da transformação social no simbolismo da Páscoa na Ressurreição do Senhor.

A CF dá um brado de alerta para que a sociedade se preo- cupe muito mais com a falta de amor fraterno do que com as os-cilações da bolsa de valores! O impacto da CF na sociedade civil se percebe pelo número crescente de legislativos que, no âmbi-to municipal, estadual e federal promovem sessões especiais. O mesmo se diga de entidades como a OAB (Ordem dos Advoga-dos do Brasil) que percebem no tema e objetivos da CF certa identidade com os seus próprios princípios.

Li alhures e adaptei para o conhecimento do leitor como se desenrola o processo de evangelização e de cidadania da CF:

– a CF dá uma visão mais ampla do que o simples dia a dia do assunto;

– condições melhores para se conhecer as origens que mos-tram as causas da questão discutida;

– considera a situação atual do problema em âmbito local e nacional;

– faz uma análise mais elaborada da realidade;– ilumina todo o processo sob a luz especial da Palavra de

Deus, comparando a situação com o projeto sonhado por Deus para a humanidade;

– inspirados pelo projeto de solidariedade fraterna, esco-lhe as ações apropriadas para tentar fazer a situação ser transformada.

Sem confundir com o “jeitinho brasileiro”, a CF é o jeito brasileiro da Quaresma.

A espiritualidade da CF é a caridade libertadora (Crônica de 04/06/2010)

A cidade mais rica da América “hospeda” cerca de treze mil pessoas na rua. Num bairro do centro, moradores e comerciantes querem proibir a doação de comida para os sem-teto que “mo-

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ram” nas ruas. Para “limpá-las”, pretendem impedir que institui-ções beneficentes e restaurantes doem comida para os pobres: cansá-los pela fome; crueldade! Pão, água e uma palavra anima-dora não se nega a ninguém.

O problema social existente é o problema que os po-bres sentem na pele. O problema dos miseráveis a quem nada sobrou de sua dignidade humana deve incomodar a cons-ciência da sociedade. Até para querer ajudá-los está difícil. Parece que os que se compadecem da miséria são cúmpli- ces que incentivam a miséria e perturbadores das pessoas “de bem”.

A sociedade deverá resolver o problema dos pobres a par-tir deles e com sua participação real. Eles sabem onde aperta o calo.

Enxotando os pobres do bairro, apenas se transfere o pro-blema de um lugar para outro. E o verdadeiro problema da indi-ferença da administração pública para a questão da moradia vai sendo empurrado com a barriga para ser resolvido nas calendas gregas (dia de são nunca). O problema, portanto, não está nos pobres.

Os pobres não são um incômodo. Eles são incomodados por atitudes como as que acontecem no bairro. Nem na rua têm sos-sego! Tirá-los da rua sim, mas para lhes dar dignidade.

Não é tirando o problema de debaixo dos olhos que ele não existirá mais. É necessário que o problema entre pelos olhos e penetre fundo na consciência dos que sentem alergia à presença dos miseráveis.

Houve quem se manifestasse contra a “caridade”, porque alivia, mas não resolve o problema. Caridade não é dar de comer para manter a miséria matando a fome ou para se livrar dela. A caridade é evangelicamente libertadora. Ela promove ações transformadoras para reverter a situação vergonhosa recuperan-do a dignidade dos pobres. A vergonha não é dos pobres. É da sociedade injusta que produz os pobres. É preciso devolver o teto para quem lhes é negado.

Acrescento a esta reflexão a desumanidade do governo de Israel, que impede que chegue ajuda humanitária a um milhão e quinhentos mil refugiados na Faixa de Gaza. O Deus de Israel

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já os havia admoestado para que o povo hebreu não escravizasse outro povo, mas se lembrasse da opressão, humilhação e da falta de liberdade que eles, os hebreus, experimentaram por quatro séculos de escravidão no Egito (cf. Dt 24,17-18).

A espiritualidade cristã é libertadora, porque coloca no cen-tro sempre a pessoa do outro; e do outro mais pobre. O critério para ver quem é e quem não é de Cristo é verificar quem conse-gue ver Jesus Cristo no rosto do excluído e se coloca a serviço para que todos tenham vida em abundância.

Não se faça ao pobre como favor o que lhe é devido por direito em virtude de sua dignidade humana!

O jejum solidário

A fixação do jejum apenas para a Quarta-feira de Cinzas e a Sexta-feira Santa ainda tem perturbado muitas consciências, com desvirtuamento de sentido.

Infelizmente, a Quaresma está voltando a ser encarada mui-to no aspecto individualista, quando deve ser essencialmente co-munitária ou solidária. É o caso do jejum.

O jejum é solidário, porque solidariedade significa uma ação ou uma atitude assumida em comum por uma ou mais pessoas. Indica uma identidade de sentimentos, ideias ou doutrina entre pessoas, de acordo com os dicionários. Por exemplo, o jejum da Sexta-feira Santa: as pessoas apenas trocam de prato, em vez da carne, comem bacalhau. O bacalhau representa o espírito do jejum? O jejum é para abrir nosso coração aos pobres. O preço do quilo de bacalhau representa isso ou é um bofetão no rosto do pobre?

Mas a solidariedade não existe só entre as pessoas que co-mungam o mesmo sentimento, mas significa também o sentido de nos interessarmos pelo que sente o irmão a quem dirigimos nossas ações e sentimentos solidários. É o jejum. Nós jejuamos por causa de nossos irmãos que jejuam por necessidade da situa-ção social em que são obrigados a viver.

Jejum é tirar do seu e dar ao irmão pobre. Jejuar é partilhar com o pobre aquilo de que foi injustamente privado. Não é ques-tão de dar a sobra, porque a sobra já é do pobre. É preciso que

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o cristão sinta na pele que se priva algo do seu costumeiro para a caridade com o irmão pobre. O papa Francisco é contundente quanto a isso (cf. EG 57).

Na verdade, o jejum não está proibido nem suspenso. Quem quiser pode fazer o jejum nos dias em que desejar. Desde que esse jejum o leve à caridade fraterna.

Na época da Quaresma com jejum obrigatório, havia dis-pensa para os idosos (60 anos) e os mais novos de 18 anos. Po-rém, em qualquer idade ou em qualquer tempo ninguém está dispensado da caridade. Aliás, ninguém tem autoridade para dis-pensar da prática da caridade. Além disso, porque a caridade não se reduz a uma só maneira de ser praticada.

Na Campanha da Fraternidade, a caridade educa as pessoas para expressarem a solidariedade no trato com o irmão pobre. O gesto concreto da coleta da solidariedade não é pedir aos ricos que deem aos pobres, é um exercício de educação para o novo uso do dinheiro e é para os cristãos aprenderem a incluí-lo no orçamento familiar destinado à solidariedade.

O gesto concreto, portanto, é oferta de pessoas solidárias com a fraternidade. A madre priora do mosteiro de Itapecerica da Serra, em São Paulo, testemunhou que as monjas privam-se de alimentos em solidariedade aos pobres.

O jejum continua sua função de educador da vida de fé e se torna pascal quando passa a alimentar o compromisso de frater-nidade transformadora.

Os estudiosos e pessoas empenhadas em criar solidarieda-de para com os que passam fome, dizem que dois bilhões de pessoas no mundo não comem o necessário. Uma das causas principais dessa situação é o desperdício, que custa ao mundo bilhões de dólares. O problema não é a falta de plantação de mais alimentos. O problema é a falta de melhor distribuição, porque o mundo tem alimentos o suficiente para alimentar o dobro de habitantes do nosso planeta. Portanto, é questão de mentalidade para a solidariedade.

Convém lembrar que o jejum deve ser principalmente uma expressão de conversão para a solidariedade. É o que realmente nos purifica durante a caminhada para a Páscoa. Isto é, o amor a Deus se manifesta na solicitude pelo irmão.

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Autorizada pelo Código de Direito Canônico (cân. 1.253), a CNBB orienta a prática do jejum, da abstinência e da penitên-cia no Brasil, para o seguinte: “Toda sexta-feira do ano é dia de penitência, a não ser que coincida com solenidade do calendário litúrgico. Os fiéis neste dia se abstenham de carne ou outro ali-mento, ou pratiquem alguma forma de penitência, principalmen-te obra de caridade ou exercício de piedade.

A Quarta-feira de Cinzas e a Sexta-feira Santa, memória da Paixão e Morte de Cristo, são dias de jejum e de abstinência (de carne). A abstinência pode ser substituída pelos próprios fiéis por outra prática de penitência, caridade ou piedade, particular-mente pela participação nesses dias na Sagrada Liturgia” (abril de 1985).

Por fim, saiba-se que os enfermos, em qualquer dia do ano, devem seguir normalmente a prescrição médica sobre ingestão de remédios ou dietas.

O jejum iluminado do papa Francisco

Em muitas ocasiões durante a Quaresma, o papa Francisco pronunciou-se sobre a prática do jejum. Esta reflexão é baseada na homilia de Quarta-feira de Cinzas, em Buenos Aires, em 25 de fevereiro de 2009.

Ele insiste que o jejum tem como ponto de partida o amor e como ponto de chegada o amor maior. O amor maior é o texto do profeta Isaías no capítulo 58, particularmente os versículos 1 a 12 em que Javé fala primeiro do jejum que ele não quer: “Vejam! O jejum que eu escolhi, o dia que uma pessoa procura se humi-lhar, não deve ser desta maneira, curvar a cabeça como se fosse uma vara, deitar sobre pano de saco e cinza... É isso que vocês chamam de jejum e dia agradável a Javé?”. E, agora, o jejum que Javé quer: “Por acaso o jejum que eu escolhi não é este: romper as amarras da injustiça, desfazer as correntes da canga, pôr em liberdade os oprimidos e despedaçar qualquer canga? Por acaso não é repartir seu pão com quem passa fome, hospedar em casa os pobres sem abrigo, vestir aquele que se encontra nu, e não se fechar diante daquele que é a sua própria carne? Se você assim fizer, sua luz brilhará como a aurora...”. Esse jejum, na verdade,

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era uma prática da justiça. O jejum assim proposto e assim vivido era símbolo da identidade dos judeus e também era sinal de con-versão da pessoa e comovia o coração de Deus para dar o perdão (Is 58,5-12).

Provavelmente Jesus terá se inspirado nesse texto para o Juízo final (cf. Mt 25,31-46).

Afirma o papa Francisco: “Jejuar a partir da solidariedade concreta como manifestação visível da caridade de Cristo. Hoje só se pode jejuar trabalhando para que outros (os pobres) não jejuem (forçados pela pobreza). Hoje só se pode celebrar o jejum assumindo a dor e a impotência de milhões de famintos”.

Nosso papa pede: “não dar tanta importância ao alimento do qual nos privamos, mas ao alimento que possibilitamos aos famintos com as nossas privações”. Inclusive, afirma ele: “Não é mais feliz aquele que mais tem, e sim aquele que mais com-partilha, porque entrou na dinâmica do amor gratuito de Deus”.

Referindo-se ao “gesto solidário da Quaresma” – seme-lhante à nossa “coleta da solidariedade” na Argentina – o então cardeal-arcebispo manifestou o seguinte: “Desejamos que (ele) seja a resposta de uma comunidade de discípulos que se prepa-ram para seguir um caminho de conversão para ‘fazer jejum’ de verdade. Um jejum que seja sinal de solidariedade com os que jejuam contra a sua vontade; um sinal de justiça em um mundo cruel onde a uns se lhes incha o estômago por comer e a outros se lhes incha o ventre por não comer. Um jejum que não seja uma imposição, mas a necessidade de manifestarmos a gratidão pelo amor entregue de Jesus, que nos deu a vida e a continua dando”.

O dia de Javé

Joel é um profeta do Antigo Testamento que alertou o povo de Israel para o significado verdadeiro da conversão que Javé/Deus aprecia.

O dia do julgamento do povo é conhecido como “dia de Javé”, o que nós chamamos de “Juízo final”.

O profeta compara a situação séria e calamitosa do pecado do povo com uma gigantesca praga de gafanhotos que devasta

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as plantações. Chegou a faltar comida e até ofertas para o sa-crifício. O profeta Joel chama o povo para a conversão não só como indivíduos, mas como comunidade: “Rasguem o coração e não as roupas...” – significava penitência e conversão. E o povo procura converter-se pela penitência, a oração e o jejum; e Javé responde com sua misericórdia perdoando (Jl 1,15-16; 2,12-13; Ml 3,2.23).

No entanto, Javé exigia uma conversão interior e não ape-nas um rito vazio de sentido. Assim, pela misericórdia de Javé, o dia do julgamento do pecado torna-se a salvação do povo. Isso é simbolizado pela chance de nova e frutuosa plantação. A colheita abundante é o símbolo do fruto da Ressurreição do Senhor (cf. Jl 1-3).

Outra expressão eloquente da conversão de todo o povo era vestir roupa de pano de saco (1Rs 21,27).

Estas são algumas das significativas passagens bíblicas para ilustrar a situação de pecado do povo e a necessidade da conver-são para conseguir a misericórdia de Javé. Por isso são usados na liturgia da Quarta-feira de Cinzas.

É evidente o quanto esses e outros textos servem de inspira-ção para a Quaresma e a Campanha da Fraternidade. Inspiração, porque, na verdade, hoje essas palavras são iluminadas pela Igre-ja de Cristo, que nos encaminha para a salvação.

A formação de nova mentalidade

A Campanha da Fraternidade tem importante função edu-cativa para transformar as pessoas e as comunidades.

Nós todos sabemos que a vacinação infantil é decisivamente indispensável para o futuro da saúde de nossas crianças. No en-tanto, mesmo sabendo disso, muitos pais não fariam a vacinação se não fosse a campanha da vacinação infantil. É preciso fazer uma campanha para estimular esse gesto essencial.

Nós cristãos sabemos que a caridade entre irmãos – a fra-ternidade – é o máximo do cristianismo. No entanto, uma parte numerosa de cristãos relaxa despreocupadamente a prática da fraternidade, a ponto de ser preciso uma campanha para lembrar a importância decisiva da fraternidade para a vida cristã!

introdução

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O método da CF distingue-se em muito dos métodos de es-piritualidade quaresmal de outrora. A Quaresma adotava a fun-ção educativa pelo castigo do corpo para domá-lo contra os maus instintos e as inclinações pecaminosas. Considerava-se o corpo como causa de pecado. Aliás, a própria educação no lar e na esco-la usava o método punitivo para induzir ao bom comportamento.

A proposta da CF é educar para compromisso com valores. Assumir os valores da fraternidade, da justiça e da solidariedade, entre outros, é formar ou educar a mentalidade. A mentalidade é a mente, a vontade, o espírito. É a mentalidade que orienta as escolhas das pessoas. A mentalidade é a fonte de referência.

A antiga penitência quaresmal é hoje o empenho na trans-formação da mentalidade de acordo com os critérios da Palavra de Deus. É preciso “pôr fé na Palavra” para educar a mentalida-de. É chegar à maturidade da fé. Significa que a penitência é um processo, um itinerário, um caminho, um amadurecimento. Isto é, passo a passo a gente chega lá!

Isso á válido tanto para as pessoas como para as comuni-dades.

Creio que podemos aplicar aqui a expressão de Ezequiel, o profeta do coração novo, com relação à formação de nova men-talidade de coração novo para guiar as relações humanas e cristãs no mundo novo: “Tirarei deles o coração de pedra e lhes darei um coração de carne” (Ez 11,19).

Todavia, o profeta indica os passos para a construção desse mundo novo. Na inspiração dele são três: assumir a responsabi-lidade pelo fracasso histórico de um sistema que se corrompeu completamente, provocando a ruína de toda a nação; compreen-der que a simples reforma de um sistema corrompido não gera nenhuma sociedade nova, apenas reanima o velho sistema que, cedo ou tarde, acabará sempre nos mesmos vícios; finalmente, converter-se a Javé assumindo o seu projeto e, a partir daí, cons-truir uma sociedade justa e fraterna voltada para a liberdade e a vida (cf. Introdução ao livro de Ezequiel, Bíblia Sagrada, edição pastoral, Paulus, 1990; e também a introdução deste mesmo li-vro na Nova Bíblia Pastoral, Paulus, 2014).

Sem dúvida é o projeto encampado pela Quaresma e CF da Igreja profética de hoje.

meditando a palavra – 2

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Sugestões para sua reflexão pessoal diária

Imagino que, para a leitura dos temas propostos penetra-rem na sua vida e você obter maior proveito, ofereço-lhe como sugestão os seguintes passos:

1. Leia, calmamente, ao menos o Evangelho indicado para cada dia.

2. Faça uma oração ao Espírito Santo para que ele inspire o início, o caminho e a conclusão de sua reflexão.

3. Pergunte-se: em que me empenharei hoje para dar algum sinal de esperança do mundo novo ao meu redor dentro da proposta da Campanha da Fraternidade?

4. Encerre, pedindo a força do Espírito para que a resolução que você tomou hoje, o(a) leve a testemunhar realmente o seu compromisso cristão.

Obs.: É interessante dar atenção à reflexão diária do papa Francisco, especialmente nos domingos e quartas-feiras.

Nota: Recomendo, para quem desejar acompanhar a cele-bração do dia a dia de cada tempo litúrgico na liturgia da Igre-ja Católica, que é sumamente útil que tenha em mãos o cha- mado Diretório Litúrgico, ou seja, o calendário litúrgico diário, que se adquire nas livrarias católicas que oferecem vários mo-delos.

Sugestões para a reflexão em grupo

Se este encontro for semanal, é livre a escolha de algum dos temas oferecidos neste livro ou nos subsídios da Campanha da Fraternidade. Neste roteiro, sugiro fazer confronto entre a práti-ca de Jesus Cristo e a prática da comunidade.

1. Como fazia Jesus Cristo?2. Como faz a nossa comunidade?3. O que podemos manter e aperfeiçoar?4. O que precisamos transformar?5. Quais decisões devemos tomar para transformar alguma

situação?

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Durante o encontro, procure manter um clima de oração, durante a reflexão.

Em seguida, convide algum dos participantes a fazer a ora-ção de encerramento.

Bom proveito!

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