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ESTE ENCARTE É PARTE INTEGRANTE DA EDIÇÃO DE Nº 276 DO JORNAL DA IMAGEM São Paulo, agosto de 2001 Meduloblastoma Cerebelar em adultos CASO 1 Dr. Carlos Jorge da Silva Reuniªo Clube Roentgen julho Entidade responsÆvel: Serviço de Diagnóstico por Imagem da Santa Casa de Sªo Paulo Coordenador: Prof. Dr. Roberto Avritchir História Clínica P aciente do sexo feminino, 32 anos, apresenta história de ataxia troncular e cefalØia occi- pital progressiva hÆ dois meses. Realizou TC de crânio sem con- traste (Figs. 1) e RM do crânio (Figs. 2,3 e 4). Diagnóstico Meduloblastoma cerebelar Discussªo Os meduloblastomas cerebela- res sªo responsÆveis por cerca de 15% de todos os tumores cere- brais na infância, sendo que 75% dos casos ocorrem antes dos 15 anos. Sªo incomuns nos adultos, correspondendo a aproximada- mente 0,4 % de todos os tumores cerebrais nesse grupo. HÆ um dis- creto predomínio no sexo mascu- lino, que varia de 1,5:1 a 3:1. Os meduloblastomas parecem origi- nar-se de cØlulas primitivas totipo- tentes da zona germinativa do vØu medular inferior (mais freqüente- mente) ou do superior. Essas cØ- lulas migram superior e lateral- mente para formar a camada gra- nular externa dos hemisfØrios ce- rebelares. Conseqüentemente, o tumor pode originar-se em qual- quer local ao longo desse trajeto. Nos exames de tomografia computadorizada (TC) sem con- traste, tanto os meduloblastomas na infância, quanto em adultos, classicamente apresentam-se como formaçıes expansivas hipe- ratenuantes em relaçªo à substân- cia cinzenta normal. Isso Ø expli- cado pela composiçªo de tais tu- mores, formados por cØlulas com- pactas, com uma relaçªo nœcleo/ citoplasma alta em um estroma vascular, apresentando uma den- sidade maior que a do córtex nor- mal. As calcificaçıes sªo raras. Quanto à localizaçªo, os tumores na infância caracteristicamente ocorrem próximos à linha media- na (vØrmis), enquanto que nos adultos costumam ser mais late- rais nos hemisfØrios cerebelares, correspondendo a cerca de 50 % dos casos nesse grupo. Isso Ø de- corrente, provavelmente, das cØ- lulas totipotentes que jÆ apresen- taram certa migraçªo lateral e su- perior no momento da origem dos tumores nos adultos. Os meduloblastomas tŒm um aspecto variÆvel nos exames de ressonância magnØtica (RM), tanto em crianças, quanto em adultos. Podem apresentar-se hi- pointensos (aspecto mais co- mum) ou isointensos nas se- qüŒncias ponderadas em T1, quando comparados com a substância cinzenta normal. Nas seqüŒncias ponderadas em T2, as lesıes podem mostrar-se com hiper, hipo ou isossinal em rela- çªo à substância cinzenta. Nos adultos, tendem a ser mais hete- rogŒneos, devido a uma maior incidŒncia de degeneraçıes cís- ticas e necróticas. O realce pelo meio de contras- te iodado nos exames de TC e a impregnaçªo pelo agente para- magnØtico (gadolínio) nos exa- mes de RM sªo tipicamente in- tensos e heterogŒneos; porØm, menos acentuados nos medulo- blastomas em adultos. Isso Ø de- vido, provavelmente, a uma mai- or prevalŒncia de lesıes desmo- plÆsicas nesse grupo. Os medu- loblastomas desmoplÆsicos apre- sentam uma grande quantidade de fibras de reticulina no seu es- troma e, de acordo com alguns estudos, representam um pólo do espectro dos meduloblastomas, que se estende dos clÆssicos tu- mores medianos da infância atra- vØs das formas transicionais atØ o meduloblastoma desmoplÆsico hemisfØrico visto nos adultos. Em resumo, a hiperatenuaçªo nos exames de TC sem contras- te e a correlaçªo idade/locali- zaçªo constituem os melhores sinais para o diagnóstico corre- to. Devido à variabilidade da lo- calizaçªo, a atenuaçªo no estu- do tomogrÆfico Ø o melhor de todos os sinais isoladamente. A cirurgia e a radioterapia associ- adas constituem o tratamento de escolha. ReferŒncias bibliogrÆficas: 1. Bourgouin PM, Tampieri D, Grahovac SZ, LØger C, Del Carpio R, Melaçon D. CT and MR imaging findings in adults with cerebellar medulloblasto- ma: comparison with findings in children. AJR 1992; 159: 609-612. 2. Hughes PG. Cerebellar medu- lloblastoma in adults. J Neuro- surg 1984; 60: 994-997. 3. Osborn AG. Diagnóstico neu- rorradiológico. Revinter 1999; 613-618. 4. Taveras JM. Neuroradiology. Williams & Wilkins 1996; 3rd ed; 677-678. 1 Figura 1 – TC de crânio: O corte axial sem contraste demonstra formação expansiva espontaneamente hiperatenuante em relação à substância cinzenta, na topografia do vermis cerebelar. Após a infusão EV do meio de contraste iodado, observa-se intenso realce da lesão descrita. 2 Figuras 2 e 3 – RM de crânio: O corte axial ponderado em T1 demonstra formação expansiva caracterizada por hipossinal em relação à substância cinzenta, na topografia do vermis cerebelar. O corte coronal ponderado em T2 demonstra a referida lesão caracterizada por hipersinal heterogêneo em relação à substância cinzenta.. Figura 4 – RM de crânio: O corte axial ponderado em T1, após a infusão EV do agente paramagnético, demonstra intensa impregnação da lesão descrita. 3 4

Meduloblastoma Cerebelar

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Page 1: Meduloblastoma Cerebelar

ESTE ENCARTE É PARTE INTEGRANTE DA EDIÇÃO DE Nº 276 DO JORNAL DA IMAGEM São Paulo, agosto de 2001

MeduloblastomaCerebelar em adultos

CASO 1 Dr. Carlos Jorge da Silva

Reunião ClubeRoentgen � julho

Entidade responsável:Serviço de Diagnósticopor Imagem da SantaCasa de São Paulo

Coordenador: Prof. Dr.Roberto Avritchir

História Clínica

Paciente do sexo feminino, 32anos, apresenta história de

ataxia troncular e cefaléia occi-pital progressiva há dois meses.Realizou TC de crânio sem con-traste (Figs. 1) e RM do crânio(Figs. 2,3 e 4).

DiagnósticoMeduloblastoma cerebelar

DiscussãoOs meduloblastomas cerebela-

res são responsáveis por cerca de15% de todos os tumores cere-brais na infância, sendo que 75%dos casos ocorrem antes dos 15anos. São incomuns nos adultos,correspondendo a aproximada-mente 0,4 % de todos os tumorescerebrais nesse grupo. Há um dis-creto predomínio no sexo mascu-lino, que varia de 1,5:1 a 3:1. Osmeduloblastomas parecem origi-nar-se de células primitivas totipo-tentes da zona germinativa do véumedular inferior (mais freqüente-mente) ou do superior. Essas cé-lulas migram superior e lateral-mente para formar a camada gra-nular externa dos hemisférios ce-rebelares. Conseqüentemente, otumor pode originar-se em qual-quer local ao longo desse trajeto.

Nos exames de tomografiacomputadorizada (TC) sem con-traste, tanto os meduloblastomasna infância, quanto em adultos,classicamente apresentam-secomo formações expansivas hipe-ratenuantes em relação à substân-cia cinzenta normal. Isso é expli-cado pela composição de tais tu-mores, formados por células com-pactas, com uma relação núcleo/

citoplasma alta em um estromavascular, apresentando uma den-sidade maior que a do córtex nor-mal. As calcificações são raras.Quanto à localização, os tumoresna infância caracteristicamenteocorrem próximos à linha media-na (vérmis), enquanto que nosadultos costumam ser mais late-rais nos hemisférios cerebelares,correspondendo a cerca de 50 %dos casos nesse grupo. Isso é de-corrente, provavelmente, das cé-lulas totipotentes que já apresen-taram certa migração lateral e su-perior no momento da origem dostumores nos adultos.

Os meduloblastomas têm umaspecto variável nos exames deressonância magnética (RM),tanto em crianças, quanto emadultos. Podem apresentar-se hi-pointensos (aspecto mais co-mum) ou isointensos nas se-qüências ponderadas em T1,quando comparados com asubstância cinzenta normal. Nasseqüências ponderadas em T2,as lesões podem mostrar-se comhiper, hipo ou isossinal em rela-ção à substância cinzenta. Nosadultos, tendem a ser mais hete-rogêneos, devido a uma maiorincidência de degenerações cís-ticas e necróticas.

O realce pelo meio de contras-te iodado nos exames de TC e aimpregnação pelo agente para-magnético (gadolínio) nos exa-mes de RM são tipicamente in-tensos e heterogêneos; porém,menos acentuados nos medulo-blastomas em adultos. Isso é de-vido, provavelmente, a uma mai-or prevalência de lesões desmo-plásicas nesse grupo. Os medu-

loblastomas desmoplásicos apre-sentam uma grande quantidadede fibras de reticulina no seu es-troma e, de acordo com algunsestudos, representam um pólo doespectro dos meduloblastomas,que se estende dos clássicos tu-mores medianos da infância atra-vés das formas transicionais atéo meduloblastoma desmoplásicohemisférico visto nos adultos.

Em resumo, a hiperatenuaçãonos exames de TC sem contras-te e a correlação idade/locali-zação constituem os melhoressinais para o diagnóstico corre-to. Devido à variabilidade da lo-calização, a atenuação no estu-do tomográfico é o melhor detodos os sinais isoladamente. Acirurgia e a radioterapia associ-adas constituem o tratamentode escolha.

Referênciasbibliográficas:1. Bourgouin PM, Tampieri D,

Grahovac SZ, Léger C, DelCarpio R, Melaçon D. CT andMR imaging findings in adultswith cerebellar medulloblasto-ma: comparison with findingsin children. AJR 1992; 159:609-612.

2. Hughes PG. Cerebellar medu-lloblastoma in adults. J Neuro-surg 1984; 60: 994-997.

3. Osborn AG. Diagnóstico neu-rorradiológico. Revinter 1999;613-618.

4. Taveras JM. Neuroradiology.Williams & Wilkins 1996; 3rded; 677-678.

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Figura 1 – TC de crânio: O corte axial sem contrastedemonstra formação expansiva espontaneamentehiperatenuante em relação à substância cinzenta,na topografia do vermis cerebelar. Após a infusãoEV do meio de contraste iodado, observa-se intensorealce da lesão descrita.

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Figuras 2 e 3 – RM de crânio: O corte axialponderado em T1 demonstra formaçãoexpansiva caracterizada por hipossinal emrelação à substância cinzenta, na topografia dovermis cerebelar. O corte coronalponderado em T2 demonstra a referida lesãocaracterizada por hipersinal heterogêneo emrelação à substância cinzenta..

Figura 4 – RMde crânio: Ocorte axialponderadoem T1, após ainfusão EV doagenteparamagnético,demonstraintensaimpregnaçãoda lesãodescrita.

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