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MESTRADO EM DIREITODIREITOS HUMANOS
LUIZ ALBERTO DE VARGAS
DIREITO À REABILITAÇÃO PROFISSIONAL:FUNDAMENTALIDADE E CONTEÚDO JURÍDICO
Porto Alegre Fevereiro, 2016
2
LUIZ ALBERTO DE VARGAS
DIREITO À REABILITAÇÃO PROFISSIONAL:FUNDAMENTALIDADE E CONTEÚDO JURÍDICO
Dissertação apresentada no
Mestrado acadêmico em Direito comárea de concentração em DireitosHumanos da Uniritter LaureateInternational Universities, comorequisito para obtenção do grau deMestre.
Orientador: Prof. Dr.
Paulo Gilberto Côgo Leivas
Porto Alegre Fevereiro, 2016
3
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) V297d Vargas, Luiz Alberto de.
Direito à reabilitação profissional: fundamentalida-de e conteúdo jurídico / Luiz Alberto de Vargas. – 2016.
166 f. ; 30 cm. Dissertação (Mestrado em Direito) – Centro Universitário Ritter
dos Reis, Faculdade de Direito, Porto Alegre - RS, 2016.Orientador: Prof. Dr. Paulo Gilberto Cogo Leivas.
1. Direitos Fundamentais. 2. Direito do Trabalho. 3.Reabilitação Profissional. I. Título. II. Leivas, Paulo Gilberto Cogo.
CDU 349.2
Ficha catalográfica elaborada no Setor de ProcessamentoTécnico da Biblioteca Dr. Romeu Ritter dos Reis
4
LUIZ ALBERTO DE VARGAS
DIREITO À REABILITAÇÃO PROFISSIONAL:FUNDAMENTALIDADE E CONTEÚDO JURÍDICO
Dissertação apresentada e aprovada como requisito parcial para a obtençãodo título de Mestre.
Porto Alegre, 16 de fevereiro de 2016.
BANCA EXAMINADORA
¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨Prof. Dr. Paulo Gilberto Côgo Leivas (Uniritter)
¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨Prof. Dr. Roger Raupp Rios (Uniritter)
¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨Profa. Dra. Dolores Sanches Wünsch (Ufrgs)
5
À minha esposa, Lílian Monks Duarte de Var-gas e a meus filhos, Luiz Antônio Duarte deVargas e Leila Duarte de Vargas.
6
Ao Professor Doutor Paulo Gilberto Côgo Lei-vas, orientador, pela condução segura e oapoio generoso durante todo o período de ela-boração dessa dissertação.À Professora Doutora Dolores Wünsch San-ches, que inspirou e colaborou decididamentepara a realização deste trabalho.Aos Professores Doutores José Felipe Ledur eRoger Raupp Rios, também integrantes daBanca de Qualificação, pelas valiosas contri-buições e críticasA todos os professores do Curso de Mestradoem Direitos Humanos da Uniritter.Aos meus colegas, pelo incentivo e pela cama-radagem que tornaram o curso uma alegre einesquecível jornada de conhecimentos e reali-zações.
8
RESUMO:
Discute-se a existência, conteúdo e limites de um direito fundamental à
reabilitação profissional completa e efetiva associado ao direito ao trabalho previsto na
Constituição Brasileira. Faz-se uma descrição crítica do atual modelo de reabilitação
profissional em nosso país, tributário de preocupações com os impactos financeiros dos
benefícios previdenciários e menos preocupado com os direitos sociais que deveriam ser
assegurados pelo ordenamento jurídico pátrio. A efetividade, a aplicabilidade direta e os
efeitos sobre terceiros dos direitos fundamentais são problematizados, abordando-se,
também, a teoria de proibição da insuficiência de Robert Alexy e a teoria da proibição
do retrocesso social. Por fim, preconizam-se critérios para alteração normativa que
satisfaça a proteção devida do direito fundamental à reabilitação profissional.
ABSTRACT:
This work discusses the existence, content and limits of the fundamental
right to full and effective professional rehabilitation as a result of a connection to the
right to work ensured by the Brazilian Constitution. It makes a critical description of the
current vocational rehabilitation model in our country, so concerned with the financial
impacts of social security benefits and less concerned with the social rights that should
be guaranteed by the Brazilian legal system. The effectiveness, the direct applicability
and the effect on third parties of the fundamental rights are questioned. It the Robert
Alexy’s theory is mentioned as well as the prohibition of the social regression. Finally,
it prescribe criteria in order to satisfy the due protetionor changing rules that satisfies
the due protection of the fundamental right to vocational rehabilitation.
PALAVRAS-CHAVE: Reabilitação Profissional – Direitos
sociais – Direitos Fundamentais – Direito ao trabalho – Previdência Social
9
LISTA DE ILUSTRAÇÕES:
Figura 1 - Avaliação (WÜNSCH, 2013)....................................................147
Figura 2 - O programa de reabilitação (WÜNSCH, 2013).........................148
Figura 3 - O programa de reabilitação (reinserção laboral) (WÜNSCH,
2013)..............................................................................................................................149
Figura 4 - Desligamento do programa (WÜNSCH, 2013).........................150
10
LISTA DE SIGLAS:
AET - Análise Ergonômica do Trabalho
APS - Agências de Previdência Social
CID - Código Internacional de Doenças
CIF - Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade Saúde
CPES - Cobertura Previdenciária Estimada
CIPA - Comissão Interna de Prevenção de Acidentes
CRP - Centro de Reabilitação Profissional
DORT - Doença Ocupacional Relacionada ao Trabalho
EPI - Equipamento de Proteção Individual
INSS - Instituto Nacional da Seguridade Social
LER - Lesão por Esforço Repetitivo
LOAS - Lei Orgânica da Assistência Social
LOPS - Lei Orgânica da Previdência Social
M.T.E. –Ministério do Trabalho e Emprego
NTEP - Nexo Técnico Epidemiológico
OIT - Organização Internacional do Trabalho
OMS - Organização Mundial de Saúde
ONU - Organização das Nações Unidas
PcD - Pessoa com deficiência
PRONATEC –Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego
STF - Supremo Tribunal Federal
SUS - Sistema Único de Saúde
TJRS - Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul
TNU - Turma Nacional de Uniformização da Justiça Federal
TRF - Tribunal Regional Federal
TST - Tribunal Superior do Trabalho
11
SUMÁRIO:
1.1 NORMAS ATINENTES À REABILITAÇÃO PROFISSIONAL.....................................16
1.2 A REABILITAÇÃO PROFISSIONAL COMO ENCARGO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL..33
1.2.3.1 Auxílio‐doença e auxílio‐doença acidentário.......................................................43
1.2.3.2 Auxílio‐acidente....................................................................................................46
1.2.3.3 Aposentadoria por invalidez................................................................................47
1.2.4.1 A constatação da incapacidade e a reabilitação.................................................50
1.2.4.2 O difícil retorno ao mercado de trabalho e o inexistente acompanhamento da
reinserção laboral do trabalhador....................................................................................56
1.2.4.3 Uma experiência bem sucedida de um programa de reabilitação profissional. .66
1.3 CRÍTICAS AO MODELO DE REABILITAÇÃO PROFISISONAL BRASILEIRO:
INSUFICIÊNCIAS, OBSTÁCULOS E A REABILIAÇÃO INCOMPLETA.................................................69
1.3.3.1 Definição insuficiente do conceito de incapacidade laborativa..........................75
1.3.3.2 Insuficiente proteção do direito à reinserção no trabalho: a reabilitação
incompleta........................................................................................................................80
1.3.3.3 Proteção insuficiente a uma reabilitação efetiva: garantia de acesso do
reabilitado à ocupação efetiva em um posto de trabalho voluntário, decente,
compatível com sua situação pessoal e suficientemente remunerado...........................83
2.1 O DIREITO AO TRABALHO COMO DIREITO FUNDAMENTAL..............................93
2.1.3.1 ‐ A força vinculante da Constituição..................................................................102
2.1.3.2 – A vinculação dos particulares às normas constitucionais...............................103
2.1.3.3 – Os direitos sociais como pretensão a uma atuação estatal............................105
2.1.3.4 – A indivisibilidade dos direitos civis, políticos e dos direitos sociais................107
2.1.3.5 – Os direitos sociais como normas jusfundamentais.........................................109
2.1.3.6 – As dificuldades de concreção dos direitos fundamentais sociais..................111
2.1.3.7 ‐ A proibição da proteção não‐suficiente...........................................................115
2.1.3.8 – O princípio de não‐retrocesso dos direitos fundamentais sociais.................118
2.2 O direito à uma reabilitação profissional efetiva e completa.........................121
2.3 A PROTEÇÃO SUFICIENTE AO Direito fundamental À reabilitação efetiva e
completa.....................................................................................................................................131
2.3.3.1 Proteção deficiente e a insegurança do trabalhador reabilitando quanto à sua
situação jurídica perante à empresa de vínculo e à Previdência social.........................134
2.3.3.2 Insuficiente definição de capacidade.................................................................135
2.3.3.3 Insegurança jurídica perante à empresa de vínculo:.........................................136
12
2.2.3.4 A proteção contra medidas discriminatórias.....................................................138
2.3.3.5 A reabilitação completa, a proibição do retrocesso social e a interpretação
conforme sem redução de texto....................................................................................140
INTRODUÇÃO
Dados do Anuário Estatístico da Previdência Social (PREVIDÊNCIA
SOCIAL, 2015)1 registram que a reabilitação profissional do INSS atingiu 53,8 mil
pessoas, o que correspondeu a um aumento de 3,48% em relação ao ano anterior. O
número de trabalhadores encaminhados para a reabilitação profissional pela perícia é
relativamente baixo em relação ao número de trabalhadores afastados do trabalho por
incapacidade, considerados cerca de 300 mil auxílios-doença acidentários e mais de 2,5
milhões de auxílios-doença deferidos em 2013.
Dos trabalhadores segurados que tiveram avaliação inicial conclusiva quanto à
necessidade de reabilitação, 7,95% retornaram ao trabalho; 22,93% foram considerados
inelegíveis e 69,12% elegíveis para a reabilitação2. Apenas 16,7 mil trabalhadores
considerados elegíveis pelo programa foram reabilitados (31%), o que correspondeu a um
decréscimo de 3,89% em relação a 2012. A média mensal de trabalhadores segurados do
programa aumentou 11,5% e o valor dos recursos materiais aumentou 86,39% no período.
Tais números preocupam, pois demonstram que apenas um número pequeno
de trabalhadores elegíveis efetivamente alcançam a reabilitação. À tal preocupação devem
somar-se outras duas: o pequeno número de trabalhadores tidos como reabilitados que,
efetivamente, logra sua inserção efetiva ao mercado laboral e a subnotificação dos
acidentes ocorridos3.
Do último tema brevemente se ocupará o presente trabalho, que procurará
enfatizar os outros dois pontos, ou seja, a insuficiência material dos serviços de
reabilitação profissional que se expressa em uma carência geral de estrutura, serviços e
pessoal que atende insuficientemente a demanda existente por reabilitação profissional; e,
em especial, a inexistência de uma reabilitação completa e efetiva.
No presente trabalho, discute-se a existência e conteúdo de um direito
fundamental a uma reabilitação efetiva e completa intimamente associada ao direito ao
trabalho previsto na Constituição Brasileira. Sustenta-se que, em ambas as situações,
descritas, o direito fundamental ao trabalho previsto no art. 6º da Constituição Federal não
está sendo suficientemente cumprido.
1 Os dados previdenciários referem-se apenas ao mercado formal de trabalho. In: BRASIL. INSS. AnuárioEstatístico da Previdência Social. 2013. Disponível em http://www.previdencia.gov.br/aeps-2013. Acessoem 1/7/2015. 2 Ver figura 1, anexo.
3 Como reconhecido pelo próprio INSS na seção “Acidentes de Trabalho” no próprio Anuário referido.
De fato, o modelo atual de reabilitação profissional não se mostra suficiente
quando, por deficiências materiais, pessoais e técnicas, atende um número pequeno de
trabalhadores necessitados, baseando-se em uma visão biomédica e deixando de
considerar os obstáculos psicológicos, sociais e econômicos à reabilitação profissional;
quando não oferece segurança jurídica no retorno do trabalhador à empresa de vínculo;
quando deixa de acompanhar e apoiar o processo de reinserção laboral; e também quando
a Previdência Social dá por finalizado o processo de reabilitação profissional pela mera
assunção ou retorno do trabalhador a um posto de trabalho, mesmo quando ele se mostra
inadequado; ou, mesmo, quando a Previdência Social, sem lograr uma colocação efetiva
do trabalhador, abandona o trabalhador, entendendo que este deve prosseguir, por sua
conta e risco, sua integração no mercado laboral.
O direito fundamental ao trabalho tampouco é atendido quando a integração ao
trabalho se faz de modo insatisfatório, o que ocorre quando o posto de trabalho não é
adequado às reais necessidades do trabalhador. Propõe-se que, em um dos seus aspectos
mais relevantes, o direito fundamental ao trabalho não pode ser compreendido sem um
correspondente direito a uma ocupação efetiva em um posto de trabalho digno, de eleição
do trabalhador, adequado e compatível com sua situação pessoal, suficientemente
remunerado e que lhe permita uma real inserção no mercado de trabalho e na sociedade.
Para tanto, analisa-se o atual modelo de reabilitação profissional, procurando
demonstrar que este não atende o dever de proteção contido em tal direito fundamental,
sendo que as causas desta reabilitação, definida coo incompleta e não-efetiva, situam-se na
inexistência de uma legislação que assegure efetividade ao direito fundamental ao trabalho
do reabilitando. Nesse sentido, pretende indicar alguns pontos que podem ser objeto de
consideração em um reforma legislativa futura.
Inicialmente, descreve-se o processo de reabilitação profissional no Brasil de
hoje e apresenta-se um panorama do arcabouço legal existente e dos serviços prestados
pela Previdência Social, constatando que longe se está de se assegurar ao reabilitando uma
perspectiva alvissareira de reintegração profissional e social, sendo, infelizmente, bastante
comum ao fracasso da reabilitação, seja na forma de abandono do reabilitando à sua
própria sorte, seja na forma de uma indesejada aposentadoria por invalidez.
A seguir, considerando o direito da reabilitação profissional como decorrência
do direito fundamental ao trabalho, descrever-se-á as origens e o contexto histórico em
que este direito foi produzido e sua aceitação pelo ordenamento jurídico nacional,
buscando identificar seu conteúdo e seus possíveis desdobramentos como, provavelmente,
o mais importantes direitos sociais, dos quais todos os demais se originam. Nesse sentido,
enfrentar-se-á a inevitável polêmica a respeito das possibilidades, na efetivação dos
direitos sociais, suas garantias, sua aplicabilidade imediata e seus efeitos sobre terceiros.
Defende-se a tese de que o direito à reabilitação profissional é um relevante
desdobramento do direito fundamental ao trabalho, sustentando-se sua
jusfundamentalidade e, a partir daí, indicando-se concretamente em que o atual modelo de
reabilitação profissional não oferece uma proteção adequada a tal direito fundamental,
deixando de assegurar ao reabilitando uma real inserção social e laboral.
Indo um pouco além, preconizam-se alterações legislativas no rumo uma
reabilitação profissional efetiva e completa que propicie, de fato, aos acidentados e
adoecidos uma reabilitação profissional que represente uma real inclusão profissional e
social.
CAPÍTULO 1: A INSUFICIENTE PROTEÇÃO ATUAL AO
TRABALHADOR REABILITANDO: DESCRIÇÃO CRÍTICA DO
ATUAL MODELO LEGAL
1.1 NORMAS ATINENTES À REABILITAÇÃO PROFISSIONAL
Analisam-se aqui o conceito de reabilitação profissional e as principais normas
aplicáveis à reabilitação profissional e às pessoas com deficiência, nas normas
internacionais, no direito comparado e no ordenamento jurídico brasileiro.
Pretende-se demonstrar que, com base em normas internacionais,
perfeitamente aplicável aos reabilitados profissionais as normas atinentes à habilitação
profissional das pessoas com deficiência.
1.1.1 O conceito de reabilitação profissional
A reabilitação profissional é um conceito amplo que vem sendo utilizado para
designar um processo de intervenção sobre situações que envolvem a redução da
capacidade para o trabalho a partir de agravos sobre a saúde do trabalhador (WÜNSCH,
2013).
Na doutrina trabalhista, conceitua-se a reabilitação profissional como “um
conjunto de medidas tendentes a aproveitar a capacidade residual do indivíduo incapaz por
doença ou acidente, para torna-lo membro ativo da produção” (CARDONE, 1989, p. 115).
Trata-se de um conceito superado, já que centrado no mero aproveitamento da força
laborativa do trabalhador como mero fator produtivo.
Uma definição mais adequada é de Ângelo Márcio Ferreira (2009), pela qual
“a reabilitação profissional é um programa estruturado para desenvolver atividades
terapêuticas e de profissionalização que abrange a integralidade do indivíduo,
fortalecendo-o para lidar e superar as dificuldades impostas por suas incapacidades”.
Ou, ainda, em uma mais completa, a proposta pelo projeto de lei nº. 7.207, de
2010 (Dep. Jô Moraes, PCdoB – MG e outros), ao redefinir o art. 89 da Lei nº 8213/914:
4 A íntegra do projeto em anexo, assim como a relação de projetos de lei que tratam de reabilitaçãoprofissional que tramitaram no Congresso Nacional de 2010 a 2015.
A reabilitação profissional deve proporcionar ao beneficiário incapacitado parcial outotalmente para o trabalho o desenvolvimento de atividades terapêuticas e deprofissionalização que abranjam a integralidade do indivíduo, de forma a superar os limitesimpostos por sua incapacidade, visando à estabilização física e à ampliação de movimentos eforça, atuando no processo de estabilização psicossocial e possibilitando a integração nasrelações sociais, cotidianas e de trabalho.
Ao se propor um direito à reabilitação profissional, pode-se entender a
existência um processo complexo, que envolve prestações fáticas consistentes de ações de
saúde (preventivas e corretivas), de previdência e de assistência sociais (“direito a algo”)
como também a um processo de intervenção prestado pelo Estado através de políticas
públicas capazes de levar a um resultado reabilitatório eficaz, ou seja, a uma reabilitação
profissional efetiva e completa. Do ponto de vista laboral, a eficácia da reabilitação
profissional importa na assunção/manutenção de um posto de trabalho ou, pelo menos, a
capacidade efetiva de obter um posto de trabalho em um mercado competitivo.
Há uma aproximação importante entre as situações jurídicas dos incapacitados
laborais e das pessoas com deficiência, já que ambos são suscetíveis a processos de
habilitação e/ou reabilitação profissionais destinados à integração social por meio do
trabalho. Assim, as normas da Organização Internacional do Trabalho –OIT (OIT, 2015)
tratam em conjunto destes dois temas, muitas vezes assimilando a figura do trabalhador
incapacitado como “pessoa deficiente”, ou seja, “todas as pessoas cujas possibilidades de
obter e conservar um emprego adequado e de progredir no mesmo fiquem
substancialmente reduzidas” (Convenção OIT 159, art. 1º).
O trabalhador reabilitando é alguém que padeceu de um infortúnio, de um
acidente ou de uma doença, que o incapacitou parcial e permanentemente para o trabalho.
Tratando-se o reabilitando de trabalhador com sequelas (incapacidade parcial permanente)
e, por esta condição, incapaz de exercer funções que habitualmente realizava, há de se
proceder sua reabilitação, ou seja, a capacitação para função diversa, de forma a propiciar
sua participação ativa no mercado profissional competitivo e na sociedade. Já as pessoas
com deficiência também uma restrição de capacidade laboral e, para a promoção de seu
direito ao trabalho, devem ser capacitadas (habilitadas) para sua efetiva integração no
(pelo) trabalho e na sociedade. Em ambos os casos, há uma incapacidade permanente que
limita a inserção no mercado de trabalho, com a diferença de que, ao contrário da pessoa
com deficiência, o reabilitando já teve condições plenas de participação e, justamente por
tê-la perdido em parte, precisa de apoio para sua reinserção. O dado essencial de distinção,
portanto, reside na existência de sequela, ou seja, em uma redução de capacidade
adquirida no curso da atividade laboral.
Sob o ângulo de um objetivo comum – o da efetiva inserção laboral do
trabalhador portador de um déficit de capacidade laboral -, assimilam-se as figuras do
reabilitando e da pessoa com deficiência, de forma que boa parte da legislação protetiva à
pessoa com deficiência é aplicável ao reabilitando profissional. Tal assimilação está
presente nas normas internacionais a respeito da inserção laboral de pessoas com
deficiência e, como mencionado, fundamenta-se na literalidade do art. 1º da Convenção nº
159 da OIT.
Diferenciam-se os conceitos de habilitação e de reabilitação profissionais
tendo em conta se o trabalhador esteve ou não anteriormente inserido no mercado laboral.
De forma simples, pode-se dizer que a habilitação visa a inserção do trabalhador no
mercado de trabalho, enquanto que a reabilitação visa o reingresso do trabalhador no
mercado de trabalho. Nesse último caso, há de se caracterizar a impossibilidade de retorno
à mesma função anteriormente exercida ou a existência de sequela que seja definitiva.
Assim, do ponto de vista do processo em si, pode-se dizer que não há diferenças
significativas entre a habilitação e a reabilitação.
Porém, não se confundem os conceitos de deficiência e incapacidade. Como
esclarece Cláudia Angélica Gonçalves Dias (2015), a deficiência traz como consequência
uma incapacidade, pois significa uma restrição física, mental ou múltipla que possui uma
natureza transitória ou permanente, limitando o exercício de atividades diárias; já a
incapacidade é uma barreira cultural, física ou social sofrida por pessoas com deficiência
que impede o acesso a diversos sistemas que estão à disposição dos demais cidadãos.
Logo, incapacidade se tem como a “perda ou limitação das oportunidades de ser incluído
em uma vida em comunidade de forma igual com os demais cidadãos” (DIAS, 2015). Por
tal conceito, pode-se enquadrar o trabalhador incapacitado laboral como uma pessoa com
deficiência que, igualmente, enfrenta obstáculos culturais, físicos ou sociais que impedem
seu acesso ao trabalho com igualdade aos demais cidadãos.
A reabilitação da capacidade funcional do trabalhador, inicialmente
denominada como “readaptação profissional” ou “reaproveitamento do empregado
acidentado”, tinha como objeto restituir, parcial ou totalmente, a todo incapacitado para o
trabalho a “capacidade na primitiva profissão ou em outra compatível com as suas novas
condições físicas” (MAENO, 2010, p. 87). Tinha-se, assim, uma visão restritivamente
laboral, voltada primordialmente ao melhor e mais imediato aproveitamento da força de
trabalho residual do reabilitando.
Modernamente, a reabilitação profissional se propõe a viabilizar a reinclusão
de pessoas incapacitadas na sociedade através de sua integração ao mercado produtivo e,
assim, uma participação ativa na sociedade, mediante procedimentos de educação,
reeducação, treinamento e readaptação dos interessados, incluindo atenções médicas,
terapias, tratamentos, cessão de aparelhos, ou seja, mecanismos que possam a viabilizar o
resgate das condições de trabalho (MARTINEZ, 2002, p. 135).
No que diz respeito à habilitação e à reabilitação profissional, os serviços são
cometidos essencialmente à Previdência Social, ainda que, em tese, a melhor política
pública indicaria a necessidade de uma articulação de várias instituições públicas,
encarregadas da saúde, da assistência social, do seguro social e do trabalho.5
1.1.2 Normas internacionais atinentes às pessoas com deficiência e
aplicáveis à habilitação e à reabilitação profissionais
O ano de 1981 foi proclamado pela Organização das Nações Unidas (ONU)
como o Ano Internacional das Pessoas Deficientes. Um primeiro relatório mundial sobre
deficiência foi realizado em 1969 pela Rehabilitation International, uma rede mundial de
pessoas com deficiência, provedores de serviços e órgãos governamentais destinados a
melhorar a qualidade de vida das pessoas com deficiência. Por tal relatório, uma pessoa
em cada 10 possuía algum tipo de deficiência. Estudos da Organização Mundial de
Saúde, organismo ligado à ONU, na década de 70, confirmaram as proporções
encontradas pela Reabilitation International. No relatório da OMS (6º Relatório sobre a
Situação da Saúde no Mundo, abrangendo o período de 1973 a 1977) previu-se que, no
ano 2000, 10% da população mundial seria portadora de algum tipo de deficiência física,
mental ou sensorial (SASSAKI, 2001).
A maior pesquisa sobre pessoas com deficiência foi realizada em 2002-4 pela
OMS através de sua Pesquisa Mundial de Saúde (OPAS, 2015) e estima uma taxa média
de prevalência de incapacidade de 15,6%, ou seja, cerca de 650 milhões de pessoas dos
estimados 4,2 bilhões de adultos com idades de 18 ou mais, pesquisados em 59 países
(GOVERNO DO ESTADO DE S. PAULO, 2012). O censo demográfico brasileiro de
2010 aponta que 45,6 milhões de pessoas declararam ter algum tipo de deficiência, o que
5 “Tendo como modelo integrador da funcionalidade e incapacidade, a reabilitação pode ser entendida comouma dentre quatro estratégicas de saúde que inclui também a prevenção, cura e suporte” (STUCKI, 2007, p.64).
corresponde a 23,9% da população brasileira. Dos 44 milhões de deficientes que estão em
idade ativa, 53,8% estão desocupados ou fora do mercado de trabalho. A população
ocupada com deficiência representava 23,6% (20,3 milhões) do total ocupado (86,3
milhões). O percentual de trabalhadores com deficiência ocupados que tem carteira
assinada (40,2%) é bem abaixo do índice dos ocupados em geral com carteira assinada
(49,2%)6
No plano internacional, o direito das pessoas com deficiência foi objeto de
diversas normas, devendo ser citadas como das primeiras, a Resolução 71 da Organização
Internacional do Trabalho (OIT), a Convenção 111 da OIT, sobre a igualdade de 1966
(OIT, 2015). De 1975, a Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes, da Organização
das Nações Unidas (Resolução 3447). Em 1981, o Ano Internacional das Pessoas
Deficientes e o Programa de Ação Mundial (ONUBR, 2015). Nestes, pela primeira vez,
foi definido o conceito de desvantagem (handicap) da pessoa deficiente na sua relação
com seu meio. Outro marco foi a Década das Nações Unidas para as Pessoas com
Deficiências (1983-1992).
Em 1993, a Assembleia Geral da ONU adotou a Resolução n. 48, na qual
definiu-se reabilitação como o processo destinado a permitir que as pessoas com
deficiências consigam alcançar e manter os seus melhores níveis funcionais, do ponto de
vista físico, sensorial, intelectual, psíquico e/ou social, de maneira a dotá-las de meios que
lhes permitam modificar a sua própria vida, adquirindo uma maior independência.
Na regulamentação da Resolução n. 48, em 1996, adotaram-se as “Normas
para equiparação de oportunidades para pessoas com deficiência”, a reabilitação é
considerada como um conceito fundamental da política em matéria de deficiência. Ênfase
especial é dada à reabilitação profissional, devendo os Estados apoiar ativamente a
integração das pessoas com deficiências no mercado de trabalho, adotando, entre outras
medidas, esquemas de quotas baseados em incentivos, emprego protegido, empréstimos
ou subsídios para pequenas empresas, isenções fiscais, supervisão contratual ou outro tipo
de assistência técnica e financeira às empresas que empregam trabalhadores com
deficiências. Além disso, os Estados devem garantir a prestação de adequado apoio
financeiro às pessoas com deficiências que, devido à deficiência ou a fatores com ela
relacionados, hajam sofrido uma perda ou redução temporárias dos seus rendimentos ou se
tenham visto privadas de oportunidades de emprego. Finalmente, os subsídios de apoio
aos rendimentos “devem manter-se enquanto persistir o estado de deficiência, de maneira
6 Jornal O Estado de São Paulo, “Brasil tem 45,6 milhões de deficientes”, 29/6/2012, Disponível emwww.estadao.com.br. Acesso em 01/7/2015.
a que não resultem numa falta de incentivo à procura de emprego por parte das pessoas
com deficiências. Tais subsídios só devem ser reduzidos ou retirados quando essas pessoas
conseguirem obter um rendimento adequado e seguro” (art. 8.6 -grifado).
Em 2007, a Assembleia Geral das Nações Unidas aprovou a Convenção sobre
os Direitos de Pessoas com Deficiência (Resolução 61/611 de 2006), que, entre seus
consideranda, reconhece “que a deficiência é um conceito em evolução e que a
deficiência resulta da interação entre pessoas com deficiência e as barreiras devidas às
atitudes e ao ambiente que impedem a plena e efetiva participação dessas pessoas na
sociedade em igualdade de oportunidades com as demais pessoas”.7
A Convenção define pessoa deficiente como sendo “aquela que têm
impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais,
em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na
sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas” (art. 1º). Entre os
princípios gerais da Convenção (art. 3º), citam-se: o da não-discriminação (alínea “b”), o
da plena e efetiva participação e inclusão na sociedade (alínea “c”) e o da igualdade de
oportunidades (alínea “e”). Os Estados se comprometem a “assegurar e promover o pleno
exercício de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais por todas as pessoas
com deficiência, sem qualquer tipo de discriminação por causa de sua deficiência”, bem
como a “adotar todas as medidas legislativas, administrativas e de qualquer outra natureza,
necessárias para a realização dos direitos reconhecidos na presente Convenção” e “levar
em conta, em todos os programas e políticas, a proteção e a promoção dos direitos
humanos das pessoas com deficiência”.
Há um artigo específico sobre Habilitação e Reabilitação (art. 26) e outro
sobre Trabalho e Emprego (art. 27). Os Estados comprometem-se a tomar medidas
efetivas e apropriadas para que as pessoas com deficiência conquistem e conservem o
máximo de autonomia e plena capacidade física, mental, social e profissional, bem como
plena inclusão e participação em todos os aspectos da vida. Para tanto,
“organizarão, fortalecerão e ampliarão serviços e programas completos de habilitação ereabilitação, particularmente nas áreas de saúde, emprego, educação e serviços sociais, demodo que esses serviços e programas: a) comecem no estágio mais precoce possível esejam baseados em avaliação multidisciplinar das necessidades e pontos fortes de cada pessoa;b) apoiem a participação e a inclusão na comunidade e em todos os aspectos da vida social,sejam oferecidos voluntariamente e estejam disponíveis às pessoas com deficiência o maispróximo possível de suas comunidades, inclusive na zona rural (Convenção dos Direitos dePessoas com Deficiência, art. 26.1)”.
7 A Convenção, inclusive seu Protocolo Facultativo, foi ratificada pelo Brasil e aprovada pelo Decreto n.6.949, de 25 de agosto de 2009.
Em relação ao trabalho e emprego, os Estados reconhecem o direito ao
trabalho das pessoas com deficiência ao trabalho, em igualdade de oportunidades com as
demais pessoas, abrangendo o direito de se manter com um trabalho de sua livre escolha
ou aceitação no mercado laboral, em ambiente de trabalho que seja aberto, inclusivo e
acessível a pessoas com deficiência. Os Estados, em especial, devem salvaguardar e
promover a realização do direito ao trabalho, inclusive daqueles que tiverem adquirido
uma deficiência no emprego, adotando medidas apropriadas, incluídas na legislação, com
o fim de, entre outros:
a) Proibir a discriminação baseada na deficiência com respeito a todas as questõesrelacionadas com as formas de emprego, inclusive condições de recrutamento, contratação eadmissão, permanência no emprego, ascensão profissional e condições seguras e salubres detrabalho; b) Proteger os direitos das pessoas com deficiência, em condições de igualdade com as demaispessoas, às condições justas e favoráveis de trabalho, incluindo iguais oportunidades e igualremuneração por trabalho de igual valor, condições seguras e salubres de trabalho, além dereparação de injustiças e proteção contra o assédio no trabalho; c) Assegurar que as pessoas com deficiência possam exercer seus direitos trabalhistas esindicais, em condições de igualdade com as demais pessoas; d) Possibilitar às pessoas com deficiência o acesso efetivo a programas de orientação técnicae profissional e a serviços de colocação no trabalho e de treinamento profissional econtinuado; e) Promover oportunidades de emprego e ascensão profissional para pessoas com deficiênciano mercado de trabalho, bem como assistência na procura, obtenção e manutenção doemprego e no retorno ao emprego; f) Promover oportunidades de trabalho autônomo, empreendedorismo, desenvolvimento decooperativas e estabelecimento de negócio próprio; g) Empregar pessoas com deficiência no setor público; h) Promover o emprego de pessoas com deficiência no setor privado, mediante políticas emedidas apropriadas, que poderão incluir programas de ação afirmativa, incentivos e outrasmedidas; i) Assegurar que adaptações razoáveis sejam feitas para pessoas com deficiência no local detrabalho; j) Promover a aquisição de experiência de trabalho por pessoas com deficiência no mercadoaberto de trabalho; k) Promover reabilitação profissional, manutenção do emprego e programas de retorno aotrabalho para pessoas com deficiência. (Convenção dos Direitos de Pessoas com Deficiência,art. 27)
Em 2008, o Brasil ratificou a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com
Deficiência, bem como seu Protocolo Facultativo. O documento foi aprovado conforme o
procedimento do parágrafo 3º do art. 5º da Constituição, pelo que tem equivalência de
emenda constitucional. Ao nível regional, mencione-se a Convenção Interamericana para
a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra as Pessoas Portadoras de
Deficiência, também conhecida como Convenção da Guatemala, que foi promulgada pelo
Decreto nº 3.956, de 8 de outubro de 2001.
A respeito da proteção da pessoa deficiente no âmbito do trabalho, há de se
mencionar outras normas da Organização Internacional do Trabalho: as Recomendações
87 (sobre a orientação profissional), 88 (sobre formação profissional), 99 (sobre
habilitação e reabilitação profissional de deficientes), 111 (sobre discriminação no
emprego e na profissão) e a 168 (sobre readaptação profissional e emprego de pessoas
deficientes). De suma importância a Convenção 159 (sobre reabilitação profissional e
emprego de pessoas deficientes), que estabelece que “a finalidade da reabilitação
profissional é a de permitir que a pessoa deficiente obtenha e conserve um emprego e
progrida no mesmo, e que se promova, assim, a integração ou a reintegração dessa pessoa
na sociedade”.
Nos termos da Convenção 159, art. 1º, considera-se “pessoa deficiente” toda e
qualquer pessoa, cujas perspectivas de encontrar e de conservar um emprego conveniente,
assim como de progredir profissionalmente, estão sensivelmente diminuídas em
consequência de uma deficiência física ou mental devidamente reconhecida. Assim, o
objetivo da readaptação profissional é o de “permitir aos deficientes obterem e
conservarem um emprego conveniente, de progredir profissionalmente e, portanto, de
facilitar a sua inserção ou reinserção na sociedade (art. 2º).
Para tanto, os Estados-membros se obrigam a, de acordo com suas condições e
suas práticas nacionais e em função de suas possibilidades, formular, executar e rever
periodicamente uma política nacional respeitante à readaptação profissional e ao emprego
de deficientes, tornam-lhes acessíveis medidas de readaptação profissionais apropriadas,
bem como promover as possibilidades de emprego no mercado livre de trabalho (art. 3º).
Aplicando-se a todos os tipos de deficiência (art. 4º), do ponto de vista da OIT, ou seja,
em relação às dificuldades de acesso ao mercado profissional, os Estados estão
comprometidos a proteção tanto dos trabalhadores incapacitados em decorrência do
trabalho como os trabalhadores com deficiência, podendo-se interpretar que ambos estão
contidos no conceito de “pessoa deficiente” e, portanto, abrangidos pela Convenção.
Esta política deverá assentar sobre o princípio da igualdade de oportunidade
entre os trabalhadores deficientes e os trabalhadores em geral, mas de forma que não
entenda como discriminatórias medidas especiais que visem garantir a igualdade efetiva
de oportunidades aos trabalhadores deficientes (art. 4º). Além disso, as organizações
representativas dos trabalhadores e dos empregadores e as organizações representativas
dos deficientes devem ser consultadas sobre a execução dessa política (art. 5º).
Finalmente, a Convenção determina que os serviços de readaptação profissional não se
limitem a zonas urbanas, mas que atinjam as zonas rurais a as coletividades isoladas.
1.1.3 A habilitação profissional da pessoa com deficiência no direito
comparado8
As políticas de proteção às pessoas com deficiência incluem diversas medidas
visando à habilitação profissional e são extensíveis à reabilitação profissional. Tratam-se
de políticas muito diversas, que variam de país para país, mas que permitem evidenciar
um nível de proteção ainda insuficiente em nosso país comparativamente a outros
ordenamentos jurídicos. Em geral, as providências adotadas envolvem a reserva
obrigatória de vagas, incentivos fiscais às empresas e contribuições empresariais em favor
de fundos públicos destinados ao custeio de fundos públicos destinados ao custeio de
programas de formação profissional, no âmbito público e privado.
Em muitos países, adota-se um sistema de cotas de empregos reservados a
pessoas com deficiência. Quando as empresas não podem cumprir a cota, podem optar
por, alternativamente, contribuir para um fundo, pagando por trabalhador não-empregado.
As empresas que superarem a cota, têm direito a postular bônus e deduções junto ao
governo. É bastante utilizado o recurso à isenção do valor das contribuições
previdenciárias a cargo do empregador. Existem proteções especiais contra a despedida de
um trabalhador com deficiência, em alguns casos, a dispensa somente pode ocorrer com
autorização do órgão competente que analisa o motivo dado pelo empregador para
justificar a despedida. A título meramente exemplificativo, a seguir, demonstram-se como
as cotas e os incentivos à contratação variam de país para país:
- Alemanha: cota de 6% dos cargos das empresas públicas e privadas com
mais de 16 empregados;
- Itália: 7%, para empregadores públicos e privados, no caso de empresas com
mais de 50 empregados; duas pessoas, em empesas entre 36 a 50 empregados; uma para
empresas entre 15 e 35 empregados (Lei n. 68/99, art. 3º);
8 Este quadro comparativo baseia-se nos estudos realizados por Gláucia Gomes Vergara Lopes (LOPES,2005, p. 32-52), de Marcelo Neri, Alexandre P. Carvalho e Hessi G. Costilla (NERI, 2002), Clara AngélicaGonçalves Dias (DIAS, 2012), Marco Antonio César Villatore (VILLATORE, 2000) e no site do Ministériodo Trabalho e Emprego (M.T.E. 2015).
- Argentina: cotas apenas para o setor público, incluindo as empresas públicas,
num percentual de 4% (Lei n. 25.687/98);
- Portugal: cota de até 2% de trabalhadores com deficiência para a iniciativa
privada e de 5% para a administração pública;
- Espanha: 2% dos empregos em empresas com mais de 50 empregados (Lei n.
66/97). Há uma redução de 50% no valor das contribuições sociais a cargo dos
empregadores (Lei n. 63/97);
- França: o sistema de cotas abrange tanto o setor público como o privado em
um percentual de 6% das vagas (Código de Trabalho Francês, Lei n. 3231), que são
contadas por estabelecimento. São isentas de tal obrigação empresas com menos de 20
empregados e empresas de alguns setores específicos. O pagamento por vaga não-
preenchida ao fundo varia de 1900 a 2700 euros anuais (dado de 2007);
- Áustria: cota de 4% das vagas para trabalhadores em empresas que tenham
mais de 25 empregados. Como na Alemanha há um controle administrativo severo para as
demissões de pessoas com deficiência.
- Holanda: percentual varia de 3% a 7%, estabelecido por negociação coletiva,
dependendo do ramo de atuação e do tamanho da empresa. Existem incentivos financeiros
e reembolsos às empresas pelos custos estimados pelo emprego de pessoas com
deficiência. Em caso de não-manutenção do emprego, os empregadores são obrigados a
devolver, inteira ou parcialmente, a quantia recebida. Também está prevista uma “ajuda de
custo de reintegração” paga às pessoas com deficiência com intuito de as encorajar na
busca de trabalho e capacitação profissional.
- Estados Unidos da América: não há sistema de cotas e a proteção se situa,
basicamente, no combate à discriminação, havendo toda uma legislação voltada para
empresas com mais de 15 empregados (Americans with Disabilities Act – ADA). Há de se
citar decisões judiciais que, comprovando estatisticamente a falta de correspondência entre
o número de empregados com deficiência existente na empresa e aquele que se encontra
na respectiva comunidade, concluem pela existência de discriminação indireta9 e
condenam as empresas à adoção de políticas afirmativas.
Inglaterra: desde 1944, existem leis de proteção ao emprego das pessoas com
deficiência. Em 1995, a reforma da legislação concentrou-se no combate à discriminação
em substituição à reserva de vagas. De acordo com a nova lei (também conhecida como
DDA), pune os empregadores que discriminem pessoas com deficiência e também prevê
9 A respeito de discriminação indireta (“disparate impact”), em especial no direito norte-americano, RIOS,2008, p. 119-126.
incentivos aos empregadores que os empreguem. Como nos Estados Unidos, o Poder
Judiciário, constando discriminação indireta, pode fixar cotas às empresas;
- Irlanda, a cota é de 3%, sendo aplicável somente para o setor público. No
setor privado, vigora um sistema que permite às empresas, caso contratem uma pessoa
com deficiência com produtividade mais baixa (entre 50% e 80% do que produz uma
pessoa com deficiência) possam pagar o mesmo salário do que não tem deficiência,
recebendo o diferencial de produtividade do governo através de um sistema de bônus
Sistemas de cotas fixadas em lei também estão presentes na Colômbia (Lei
361/97), El Salvador (Decreto Legislativo n. 888), Honduras (Decreto 17/91), Nicarágua
(Lei n. 185), Panamá (Lei nº 42/99), Peru, Uruguai (Lei nº 16.095), Venezuela, Japão e
China.
Portanto, se é possível estabelecer comparações entre modelos de inserção
social tão diversos, duas campos de atuação podem ser claramente visualizados: um
sistema de cotas obrigatórias associado com incentivos aos empregadores e um modelo
situado no combate à discriminação contra a pessoa com deficiência, com ênfase na
(re)integração ao mercado de trabalho e na proteção contra a despedida imotivada.
No Brasil, como se verá, a legislação prevê de 2%`a 5% de acordo com o
número de empregados, mas não há incentivos econômicos para a contratação de
reabilitados ou pessoas com deficiência, nem uma adequada proteção contra a despedida
imotivada visando a manutenção desses empregos.
1.1.4 As normas sobre deficiência no ordenamento jurídico brasileiro
aplicáveis à habilitação e à reabilitação profissionais.
No plano interno, a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do
trabalho são fundamentos do Estado Brasileiro, conforme a Constituição Brasileira (art. 1º,
III e IV), estabelecendo, ainda, que a valorização do trabalho humano com a finalidade de
assegurar a todos uma existência digna é um dos fundamentos da ordem econômica (art.
170).
A habilitação e reabilitação profissional é expressamente mencionada no art.
203, IV da Constituição como um direito à assistência social. A proteção às pessoas com
deficiência e. extensivamente, aos reabilitandos profissionais pode também ser deduzida
de vários outros dispositivos constitucionais, seja o geral princípio de igualdade (art. 5º, I),
seja os direitos específicos de acesso, permanência e atendimento especializado na escola
(art. 206, I e art. 208, III), da garantia da eliminação das barreiras arquitetônicas (§2º, do
art. 227 e art. 244).
O direito à saúde está previsto no art. 196 da Constituição, entendida esta
como um dever de Estado, de implementar políticas sociais e econômicas que visem à
redução do risco de doença e de outros agravos, assegurando o acesso universal e
igualitário às ações e serviços para promoção, proteção e recuperação da saúde.
Também como dever do Estado, o dever de proteção ao direito da pessoa com
deficiência à saúde e à assistência social (art. 23); o de concessão de um benefício mensal
às pessoas com deficiência que não disponham de recursos para prover a própria
manutenção (art. 203, V); a possibilidade de adoção de critérios diferenciados para
concessão de aposentadoria (art. 40, parágrafo 4º, I) e acessibilidade à transporte público e
a logradouros e prédios de acesso público (art. 224 e 227, parágrafo 2º).
Como direitos dos trabalhadores, há de se mencionar os incisos XXII (redução
dos riscos inerentes ao trabalho por meio de normas de saúde, higiene e segurança), XXXI
(proibição de discriminação por motivo de deficiência) e XXVIII (seguro contra
acidentes) do art. 7º da Constituição. Trata-se, aqui, de assegurar ao trabalhador um meio
ambiente laboral sadio e equilibrado, configurando um direito fundamental, de eficácia
horizontal, a vincular diretamente tanto particulares quanto o Poder Público (EBERT,
2012).
Importante norma constitucional está contida no art. 37, VIII, que determina
que a lei reserve percentual de cargos e empregos públicos para pessoas com deficiência.
Tal norma tem sido aplicada também aos casos de reabilitação profissional,
exemplificando a assimilação da figura do reabilitando à normatividade originalmente
concebida apenas aos casos de pessoas com deficiência.
Um marco na regulamentação do dever do Estado na proteção aos direitos das
pessoas com deficiência é a Lei n. 7853/89 (Política Nacional para Integração da Pessoa
Portadora de Deficiência), que, entre outras medidas, em seu art. 2º, inciso III, letra “d”,
prevê
“a adoção de legislação específica que discipline a reserva de mercado de trabalho, em favordas pessoas portadoras de deficiência, nas entidades da Administração Pública e do setorprivado, e que regulamente a organização de oficinas e congêneres integradas ao mercado detrabalho, e a situação, nelas, das pessoas portadoras de deficiência”.
Além disso, vários direitos da pessoa com deficiência à habilitação e do
trabalhador incapacitado à reabilitação, assim como a promoção de sua integração à vida
comunitária encontram guarida na legislação de assistência social e previdenciária. Assim,
constituem um dos objetivos da assistência social, assim definidos na Lei Orgânica de
Assistência Social (Lei n. 8.742/91 -LOAS). Nos termos do Decreto n. 3298/99, art. 15, os
órgãos e as entidades da Administração Pública Federal estão obrigados a prestar direta ou
indiretamente à pessoa com deficiência, entre outras prestações sociais, reabilitação
integral (assim entendida como o desenvolvimento de suas potencialidades, destinada a
facilitar sua atividade laboral, educativa ou social); formação profissional e qualificação
para o trabalho. Nesse Decreto, que regulamenta a Lei n.7853/99, define-se
I - “deficiência”, como toda perda ou anormalidade de uma estrutura ou função psicológica,fisiológica ou anatômica que gere incapacidade para o desempenho de atividade, dentro dopadrão considerado normal para o ser humano;II – ‘deficiência permanente”, como aquela que ocorreu ou se estabilizou durante um períodode tempo suficiente para não permitir recuperação ou ter probabilidade de que se altere, apesarde novos tratamentos; e III – incapacidade, como uma redução efetiva e acentuada da capacidade de integração social,com necessidade de equipamentos, adaptações, meios ou recursos especiais para que a pessoaportadora de deficiência possa receber ou transmitir informações necessárias ao seu bem-estarpessoal e ao desempenho de função ou atividade a ser exercida.
O conceito de pessoa com deficiência (“pessoa deficiente”) está contido
também na Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS): aquela que tem impedimentos de
longo prazo de natureza física, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com
diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade com as
demais pessoas. São considerados impedimentos de longo prazo aqueles que incapacitam
a pessoa com deficiência para a vida independente e para o trabalho por prazo mínimo de
dois anos.
A interface entre as figuras da pessoa com deficiência e o reabilitando
profissional ocorre na definição de “incapacidade” (item III) quando esta de uma
deficiência permanente (que ocorreu ou se estabilizou em um período de tempo suficiente
para não permitir se em recuperação ou ter probabilidade de alteração apesar de novos
tratamentos – item II) relativamente ao meio ambiente laboral.
O conceito de deficiência (item I), entendida como toda perda ou
anormalidade de uma estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica que gere
incapacidade para o desempenho de atividade dentro do padrão considerado normal,
representa um avanço em relação ao adotado pelo Decreto n. 3298/99, que define
deficiência como aquela que se enquadra nas categorias física, auditiva, visual, mental ou
múltipla conforme parâmetros de avaliação biomédica.
O art. 4º, I do Decreto n. 3298/99 exclui das deficiências físicas as
deformidades estéticas e as que não produzam dificuldades para o desempenho de funções
(perda de falange dos dedos, cicatrizes, marcas na pele), já que não reduzem a capacidade
laborativa. Porém não considera que há dificuldades reais para que estas pessoas
obtenham emprego em função do preconceito desmedido de boa parte dos empregadores
brasileiros, revelado em anúncio de vagas de emprego que trazem como requisitos “boa
aparência”, “jovialidade”, “fácil comunicação” (LOPES, 2005, p. 104).
Nesse mesmo Decreto, há diversas disposições em prol da habilitação
profissional da pessoa com deficiência e que são plenamente aplicáveis à reabilitação
profissional: acesso à educação profissional (art. 28); direito à habilitação e reabilitação
profissional independentemente de vínculo previdenciário (art. 30-3); política de emprego
voltada à inserção da pessoa com deficiência no mercado de trabalho ou sua incorporação
ao sistema produtivo mediante regime especial de trabalho protegido (art. 34); reserva de
empregos (art. 36) e reserva de cargos em concursos na Administração Pública (art. 37).
Finalmente, foi aprovada recentemente pelo Congresso Nacional, a Lei n. Lei
n. 13.146/2015 – Lei Brasileira e Inclusão da Pessoa com Deficiência (também
denominada Estatuto da Pessoa com Deficiência, publicada em 6/7/2015, entrando em
vigor 180 dias depois de sua publicação), destinada a assegurar e a promover, em
condições de igualdade, o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais por pessoa
com deficiência, visando à sua inclusão social e cidadania. Expressamente baseada na
Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (homologada pela
Assembleia Geral da ONU em 13/12/2006 e assinada em 2007 e ingressada no direito
nacional pelo Decreto 6949 de 2009), a nova lei altera consideravelmente o conceito de
pessoa deficiente que passa a ser “aquela que tem impedimento de longo prazo de
natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais
barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de
condições com as demais pessoas” (art. 2º). Para tanto, a avaliação da deficiência será
biopsicossocial, realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar e considerará,
além dos impedimentos nas funções e nas estruturas do corpo, os fatores socioambientais,
psicológicos e pessoais, além da limitação no desempenho de atividades e a restrição de
participação (art. 2º, parágrafo 1º). No inciso III do art. 3º conceitua-se como “tecnologia
assistiva” ou ajuda técnica que deve ser propiciada à pessoa com deficiência “produtos,
equipamentos, dispositivos, recursos, metodologias, estratégias, práticas e serviços que
objetivem promover a funcionalidade, relacionada à atividade e a participação da pessoa
com deficiência ou com mobilidade reduzida, visando à sua autonomia, independência
com segurança, qualidade de vida e inclusão social”. No inciso IV do mesmo artigo,
define-se como “barreiras” qualquer entrave, obstáculo, atitude ou comportamento que
limite ou impeça a participação social da pessoa, bem como o gozo e fruição e o exercício
de seus direitos à acessibilidade, à liberdade de movimento e de expressão, à
comunicação, ao acesso à informação, à compreensão, à circulação com segurança, entre
outros”10. Destaque-se, ainda no mesmo artigo, no inciso VI, que expressamente se
conceitua como “adaptações razoáveis” aquelas adaptações, modificações ou ajustes
necessários e adequados que não acarretem ônus desproporcional e indevido, quando
requeridos em cada caso, a fim de assegurar que a pessoa com deficiência possa gozar ou
exercer em igualdade de condições e oportunidades com as demais pessoas, todos os
direitos e liberdades fundamentais”.
A lei claramente se afasta do modelo biomédico e se aproxima do modelo
social11, na esteira da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, o que
tem significativa relevância também na reabilitação profissional. Tal aproximação, como
se verá, tem importantes consequências para a construção de um modelo adequado de
reabilitação profissional.
À pessoa com deficiência – e, consequentemente, ao reabilitando profissional -
é reconhecido, entre tantos outros, o direito à profissionalização, ao trabalho, à
previdência social, à habilitação e à reabilitação (art. 8º). O processo de habilitação e
reabilitação, como um direito da pessoa com deficiência, tem por objetivo “o
desenvolvimento de potencialidades, talentos, habilidades e aptidões físicas, cognitivas,
sensoriais, psicossociais, atitudinais, profissionais e artísticas que contribuam para a
conquista da autonomia da pessoa com deficiência e de sua participação social em
igualdade de condições e oportunidades com as demais pessoas” (art. 14).
Na avaliação do processo de habilitação ou reabilitação está expressamente
prevista que esta seja multidisciplinar (art. 15), observadas, entre outras, as seguintes
diretrizes: diagnóstico e intervenção precoces (inciso I); atuação permanente, integrada e
articulada de políticas públicas que possibilitem a plena participação social da pessoa com
10 Essa definição é baseada na Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF) daOMS que é complementar ao Código Internacional de Doenças (CID).
11 Tal abordagem deixa claro que as deficiências não indicam, necessariamente, a presença de uma doençaou que o indivíduo deva ser considerado doente. Assim, a falta de acesso a bens e serviços deve sersolucionada de forma coletiva e com políticas públicas estruturantes para a equiparação de oportunidades.(SECRETARIA DOS DIREITOS HUMANOS, 2010, p 16).
deficiência (inciso III) e prestação de serviços próximos ao domicílio da pessoa com
deficiência, inclusive na zona rural (inciso V).
Especificamente para os trabalhadores necessitados de habilitação e de
reabilitação profissional são garantidos “organização, serviços, métodos, técnicas e
recursos para atender às características de cada pessoa com deficiência” (art. 16, inciso I)
e “tecnologia assistiva, tecnologia de reabilitação, materiais e equipamentos adequados e
apoio técnico profissional, de acordo com as especificidades de cada pessoa com
deficiência (art. 16, inciso III)12.
Importante modificação foi implementada, também, ao alterar o art. 1º da Lei
n. 9029/95, que é a lei que proíbe a prática de atos discriminatórios nas relações de
trabalho, ao inserir, entre as práticas proibidas, a discriminação por motivo de deficiência
e reabilitação profissional. Nos termos do modificado artigo 2º da referida Lei, o ato
discriminatório, além de constituir crime, sujeita o infrator às penas de multa
administrativa e de proibição de obter empréstimo ou financiamento junto a instituições
financeiras oficiais. Já no novo artigo 3º, aproveitando para corrigir equívoco da lei
anterior (que equivocadamente mencionava o direito do discriminado a ser “readmitido”),
o legislador claramente estabelece, em caso de despedida discriminatória, o direito à
reintegração com “ressarcimento integral de todo o período de afastamento, mediante
pagamento das remunerações devidas, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros
legais”.
Finalmente, há de se citar a reserva de mercado de trabalho tanto para
deficientes físicos como para reabilitados profissionais13, prevista pelo artigo 37, VIII da
Constituição. A reserva de vagas já estava prevista no art. 172 do revogado Decreto n.
48/959-A, de 1960, estabelecendo a cota para empresas com vinte ou mais empregados. A
cota para pessoas com deficiência, elevado ao nível constitucional (art. 37, VIII), prevista
também na Lei n. 7853/89, foi objeto de regulamentação pelo art. 93 da Lei n. 8213/91
que isentou as empresas com menos de cem empregados. Tal norma não foi modificada
pela Lei n. 13.146/2015 (Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência), também
chamada Estatuto da Pessoa Deficiente14. Por ela, tanto incapacitados pelo trabalho como
12 Esse atendimento é prestado através do Sistema Único de Saúde (SUS),
13 Pedro Kalume critica tal opção do legislador ordinário, pois, nos termos previstos pela Constituição e pelaLei n. 7853/89, se exigiria uma legislação especial que, efetivamente, assegurasse um reserva de mercado detrabalho em favor das pessoas com deficiência – e não apenas simples “adoção” da legislação já existente.(KALUME, 2008, p. 53).14 O Estatuto da Pessoa com Deficiência, na versão aprovada pelo Congresso Nacional e objeto de vetopresidencial, previa a obrigatoriedade das empresas com mais de 50 (cinquenta) a 99 (noventa e nove) de ter,pelo menos, um empregado incapacitado ou com deficiência, texto que foi vetado pela Presidência da
deficientes compartilham um sistema de cotas de emprego que prevê que as empresas com
100 ou mais empregados estão obrigadas15 a preencher de um por cento a cinco por cento
de seus cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas com deficiência, na seguinte
proporção16:
I – de 100 (cem) até 200 (duzentos) empregados, 2% (dois por cento) do total de empregados; II – de 201 (duzentos e um) a 500 (quinhentos) empregados, 3% (três por cento) do total deempregados; III – de 501 (quinhentos e um) a 1.000 (mil) empregados, 4% (quatro por cento) do total deempregados; IV – mais de 1.000 (mil) empregados, 5% (cinco por cento) do total de empregados17.
Para assegurar a existência mesmo de tais empregos18, prevê-se que a empresa,
em contratos por prazo indeterminado ou por prazo determinado de mais de 90 (noventa)
dias, somente pode dispensar imotivadamente um trabalhador reabilitado ou deficiente
habilitado depois de contratar um substituto de condição semelhante19. Não há, em
realidade, nenhuma estabilidade ou garantia de emprego, mas apenas uma certa restrição
ao poder empresarial de despedir, que, supostamente, reduz o risco de que a despedida
seja discriminatória, ou seja, seja motivada justamente pela condição laboral reduzida do
trabalhador. Na verdade, não se elimina tal risco, já que nada impede que o substituído
tenha uma condição de trabalho menos desfavorecida do que o trabalhador despedido,
nem se exige que o novo empregado seja contratado para trabalhar na mesma função
(LAZZARI, 2012, p. 220).
A jurisprudência tem entendido que os trabalhadores reabilitados integram a
cota de pessoas com deficiência, tanto que, quando do retorno do trabalhador acidentado,
este preenche a cota do art. 93 da Lei n. 8.213/91.20 Talvez fosse mais apropriado que as
cotas fossem distintas para reabilitados profissionais e pessoas com deficiência, evitando-
se que as empresas pudessem optar por preencher a cota totalmente com pessoas com
República.
15 O descumprimento de tal obrigação importa em multa administrativa proporcional ao tamanho da empresae ao número de trabalhadores que deixaram de ser contratados (art. 133 da Lei n 823/91).16 Redação conforme projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional e vetado pela Presidente da República.17 Para melhor compreender a complexidade que envolve o cálculo das cotas de deficientes, ver KALUME, op. cit. p. 63).18 Também se denomina “emprego protegido” ou, conforme Pedro Kalume, “abertura protegida da possibilidade de emprego”. (Ibid., p. 52-4)19 O descumprimento por parte do empregador enseja a reintegração do trabalhador despedido. Processos TST - 5ª.T.- RR - 346/1998-401-04-00.8, Rel. João Batista Brito Pereira, Julg. 27.05.2009 e 5ª. T. - RR 1619003920045170006 Rel. Maria Cristina Irigoyen Peduzzi – Julg. 21.11.2007.20 TST 4ª T RR 2657000420038.04.5.02.0038 Rel. Milton Moura França, Julg. 26.8;2011.
deficiência ou com trabalhadores reabilitados, conforme suas conveniências.21 Admitida o
sistema de cota única, uma vez que os trabalhadores acidentados dispõem de uma garantia
de emprego de um ano (art. 118 da Lei n. 8.213/91), melhor seria que estes não fossem
simplesmente computados na cota única – e sim acrescidos à cota, o que representaria
uma penalização ao empregador que permite a ocorrência de acidentes no ambiente
laboral.
Como já se mencionou, também na Administração Pública existe a previsão
constitucional de reserva de cargos em favor da pessoa com deficiência, o que é
concretizado pelo artigo 37, parágrafo 1º do Decreto n. 398/99 que estabelece um
percentual de 5% das vagas em concursos públicos.
1.2 A REABILITAÇÃO PROFISSIONAL COMO ENCARGO DA
PREVIDÊNCIA SOCIAL
Procurar-se-á, neste item, apresentar o atual modelo de reabilitação
profissional no Brasil, como encargo da Previdência.
1.2.1 Histórico da reabilitação profissional no Brasil
A reabilitação social surgiu no Brasil como um direito trabalhista e
previdenciário das classes assalariadas urbanas e, assim, marcado pela concepção da
“cidadania regulada”, ou seja, como direito vinculado ao contrato dos trabalhadores com o
setor privado acoplado com um seguro gerenciado pelo Estado – e, portanto, dependente
da inserção formal no mercado de trabalho (FERREIRA, 2009). Dessa forma, desde o
início, não se formou como um direito universal, mas restrito àqueles trabalhadores com
vinculo previdenciário.
Inicialmente como seguro privado, coberto pelas Caixas de Aposentadoria e
Pensões desde 1943, a reabilitação profissional somente passou para a Previdência Pública
em 1967, quando tornou-se obrigação legal a cargo do INSS, Criam-se os Centros de
Reabilitação Profissionais (CRPs). Em 1976, a legislação tornou a reabilitação
profissional obrigatória nos casos de acidentes do trabalho em que o acidentado se torna
incapaz para o exercício da sua atividade. A partir de 1980, a rede de atendimento à
reabilitação profissional expandiu-se, alcançando todas as capitais e as cidades de grande
21 Proposta legislativa nesse sentido foi apresentada, em 2011, pelo Deputado Ricardo Berzoini (PT-SP), Projeto de lei n. 7218/10.
porte. Foi um período de expansão da reabilitação profissional, ainda que esta nunca tenha
adquirido a dimensão e a estrutura necessárias para atendimento integral das demandas de
reabilitação profissional.
A partir dos anos 90, iniciou um processo de implementação de políticas
liberalizantes que, a médio prazo, levaram a um verdadeiro desmonte da reabilitação
profissional no âmbito da Previdência Social (MAENO, 2010, p. 88-92). A reabilitação
profissional do INSS foi alvo de intensas mudanças, de nítida inspiração neoliberal, pelas
quais abandonou-se uma concepção sócio-política de incapacidade para uma visão
biomédica das lesões e suas causas, culminando com o programa REABILITA em 2001
(SIMONELLI, 2015, p. 65). Entre 1993 e 1994, houve um curto período contra
tendencial, concomitantemente à emergência dos movimentos sociais e à implementação
do SUS, surgiram significativos experimentos conveniados, locais e regionais, de natureza
interdisciplinar e interinstitucional, como o projeto terapêutico a Grandes Amputados, o
projeto da Equipe de Doenças Profissionais e o projeto da Equipe de LER (Lesão por
Esforços Repetitivos), desenvolvidos no CRP-Campinas.
Porém, o desmonte prosseguiu em uma nova fase, de 1995 a 2000, com o
advento do Plano de Modernização Profissional do INSS, consolidou-se a hegemonia de
um modelo reducionista da atenção, de delegação da reinserção ao trabalho às empresas e
de completo desmonte dos CRPs22. Tais tendências foram mantidas quando da
implantação do Projeto Reabilita, em 2001, cuja principal característica foi o desmonte
das equipes de reabilitação profissional, atribuindo responsabilidade no processo de
colocação do reabilitado no mercado profissional a orientadores profissionais. Conforme
tal programa, o INSS não se responsabiliza pela reabilitação efetiva do trabalhador,
resumindo-se o programa de reabilitação profissional ao encaminhamento do trabalhador
supostamente fisicamente recuperado de volta à empresa de vínculo para função
compatível com sua nova condição e/ou a realização de curso de requalificação
profissional ou de elevação da escolaridade quando a empresa não oferece função ou
quando o trabalhador não tem vínculo anterior. Em resumo, não há obrigatoriedade de
colocação no emprego pelo programa público de reabilitação profissional.
Da mesma forma, seguindo uma lógica privatizante, promoveu-se um
desmonte nas estruturas dentro do INSS e a delegação da inserção dos trabalhadores às
empresas (MAENO, 2010, p. 87).
22 Conforme Takahashi, houve uma substancial redução dos serviços oficiais de reabilitação profissional; em1993 eram 46 centros profissionais que, em1994, abrigavam 2.122 profissionais em todo o Brasil. Com acriação do Reabilita esses serviços foram totalmente desativados (TAKAHASHI, 2000).
Apesar de algumas alterações positivas, substancialmente tal modelo perverso
ainda persiste, especialmente quanto ao descompromisso estatal relativamente à efetiva
colocação do reabilitado no mercado de trabalho.
Há de se registrar que, felizmente, nos últimos anos, tem-se observado uma
inversão desse processo liberalizante. Conforme Angela Simonelli, o INSS, pressionado
pelo movimento sindical e por pesquisadores das questões relacionadas com o mundo do
trabalho, passou a discutir um modelo de revitalização do Reabilita (2008), que permitisse
a integração das várias instituições que fazem interface com a saúde do trabalhador: saúde,
previdência e trabalho e emprego. Tal medida, reputada como essencial pelo próprio
INSS, permite uma articulação das diversas instituições (INSS, Ministério da Saúde,
Ministério do Trabalho e Emprego) para intervir preventivamente no processo produtivo,
de forma a garantir o não-adoecimento de outros trabalhadores (SIMONELLI, 2010, p.
66). Assim, como consequências dessa nova tendência, houve a ampliação do corpo
técnico e a realização de convênios, bem como a formação de parcerias para
oferecimento de cursos profissionalizantes com Senai, Sesc e outras entidades do chamado
“Sistema S”, com o escopo de possibilitar a formação profissional. Além disso, a partir de
2007, o INSS adotou nova metodologia para a notificação de acidentes baseada no Nexo
Técnico Epidemiológico (NTEP), visando combater a subnotificação acidentária. No
mesmo sentido, em 2009, determinou-se que, na avaliação da incapacidade, além da
análise médica, também fossem considerados os aspectos sociais e pessoais para fins de
concessão de benefícios de prestação continuada. Ainda que não se refira à reabilitação
profissional, trata-se de um avanço na compreensão da necessidade de uma avaliação
social para concessão de todo e qualquer benefício previdenciário. Em outubro de 2011, o
INSS publicou um novo manual de Reabilitação Profissional, implementando novos
critérios a serem adotados nos serviços prestados nas agências da Previdência Social.
Por fim, em 2013, o Projeto “Reabilitação profissional: articulando ações em
saúde do trabalhador e construindo a reabilitação integral”, que se propõe, através da
intersetorialidade (articulação das políticas públicas de saúde, assistência social,
previdência social, trabalho e emprego), “amparar e assistir o cidadão e sua família em
situações de vulnerabilidade, como a velhice, a doença, o desemprego, entre outros”
(BRASIL, 2013). O Projeto reconhece que o trabalho de reabilitação profissional é uma
ação interdisciplinar a ser desenvolvido por equipes multiprofissionais “com vistas a
ampliar a percepção individual e a dimensão coletiva, considerando o trabalho como
fundante para a construção do ser social”. Entre outros pressupostos, o Programa elenca a
prevenção dos riscos ocupacionais, o reconhecimento individualizado das capacitações do
reabilitando, a valorização da sua participação ativa no processo e o direito à informação.
Para a consecução de tais propósitos, se pretende iniciar uma “ampla articulação com os
diversos setores sociais e as administrações públicas e privadas, na perspectiva de articular
uma rede de serviços que busquem e implementem soluções para a reabilitação
profissional. Ao menos em termos de boas intenções, há de se reconhecer que o projeto
em questão aponta um rumo promissor para a reconstrução de um sistema de reabilitação
profissional no país.
1.2.2 O modelo de reabilitação profissional
Pela teoria do risco social, cabe à sociedade assegurar o sustento ao indivíduo
vítima de uma incapacidade, já que toda a coletividade deve prestar solidariedade ao
desafortunados. Tal objetivo é alcançado através da “redistribuição dos riscos sociais
horizontalmente (entre grupos profissionais distintos) e verticalmente (entre gerações)
pelo equacionamento da economia coletiva” (ROCHA, 2004, p. 28), cumprindo a
Previdência Social este papel relativamente aos indivíduos ocupados em uma atividade
laborativa remunerada.
Entretanto, o seguro social não esgota as necessidade da população mais
carente, justamente aquela que não possui uma ocupação definida no mercado formal de
trabalho, ou mesmo, no mercado informal, quando reconhecida a atividade laborativa.
Assim, a assistência social e a proteção à saúde não são objeto da Previdência Social, mas
são concessões gratuitas de serviços sem exigência de contrapartida por parte da grande
maioria dos beneficiários (LAZZARI, 2012, p. 40).
Tal como na maioria dos países ocidentais, a reabilitação profissional foi
atribuída à Previdência Social, sob o argumento de que o sucesso dos esforços na
reabilitação leva à redução dos custos previdenciários, enquanto que o insucesso, ao
contrário, implica, em geral, em uma aposentadoria por invalidez considerada dispendiosa
(TAKAHASHI, 2010). Tal designação da reabilitação profissional como benefício
previdenciário torna potencialmente problemática a universalização de políticas
públicas de reabilitação profissional.
A cobertura previdenciária ao reabilitado se refere ao “risco da incapacidade”,
ou seja, à cobertura pecuniária do risco da incapacidade, o que, na forma da legislação
brasileira, se consubstancia nos riscos da doença e da invalidez. Além desse, o sistema de
seguridade social deve dar conta também no “risco do desemprego”. Assim, a cobertura
previdenciária do “risco da incapacidade” é feita através dos benefícios do auxílio-doença
e da aposentadoria por invalidez, enquanto que a do “risco do desemprego” é feita pelo
“seguro-desemprego”.
A reabilitação profissional, constitucionalmente atribuída à Previdência Social,
é um serviço social destinado à otimização da capacidade laboral do trabalhador. Nesse
contexto, a atribuição do serviço prestado pelo Estado de reabilitação profissional à
Previdência Social se justifica como complementar aos benefícios previdenciários, para o
propósito de garantir a “temporalidade da fruição do benefício de auxílio-doença e a evitar
a fruição prematura de um benefício em princípio permanente: a aposentadoria por
invalidez” (BILHALVA, 2007, p. 461). Assim, é encarada do ponto de vista do
interesse do Erário Público – e não de uma prestação derivada do direito constitucional
ao trabalho.
Constitucionalmente, a Seguridade Social é definida como “um conjunto de
ações estatais que compreendem a proteção dos direitos relativos à saúde, a previdência e
a assistência social’ (art. 194) e, nesse sentido, justifica-se a proteção social dos
incapacitados parcial ou totalmente para o trabalho de forma que a estes se garantam
meios para sua reeducação e readaptação profissional. Para tanto, os órgãos que compõem
a Seguridade Social (Saúde, Assistência Social e Previdência Social) devem elaborar
políticas e programas de inclusão da pessoa com incapacidades no mercado de trabalho,
buscando a igualdade de oportunidades, o que equivale dizer que é preciso buscar
diminuir as barreiras físicas dos espaços públicos e privados, ter programas de
qualificação, conscientizar a sociedade sobre a inclusão dessas pessoas no âmbito familiar
e nos diversos meios sociais (FERREIRA, 2009).
As leis n. 8212/91 (Lei de Organização da Previdência Social) e 8213/91 (Lei
de Benefícios) são a base da organização da Seguridade Social brasileira e dispõem que a
Previdência Social tem por fim assegurar ao seus beneficiários meios indispensáveis de
manutenção por motivo de diversos riscos ali elencados, entre os quais se inclui a
incapacidade. Entre os princípios e diretrizes da organização da Previdência Social estão a
universalidade, valor da renda mensal de benefício não inferior a um salário mínimo e
preservação do valor real dos benefícios (Lei n 8212/91, art. 3º, parágrafo único, “a”, “b” e
“d”).
Tais leis denominam o processo de (re)integração dos trabalhadores parcial ou
totalmente incapacitados como de Habilitação e Reabilitação Profissional e Social, com o
propósito dotá-los das condições materiais e intelectuais necessárias à inclusão ou à
(re)inclusão ao mercado de trabalho e do contexto onde vivem, proporcionando-lhes os
meios para a (re)educação e de (re)adaptação profissional e social (Lei n 8212/91, art. 89,
“caput”).
As normas previdenciárias diferenciam os conceitos de Habilitação
Profissional e de Reabilitação Profissional. Assim, habilitação profissional é “a preparação
do inapto para exercer atividades em decorrência da incapacidade física adquirida ou
deficiência hereditária”. Já a reabilitação profissional pressupõe que “a pessoa ter tido
aptidão ou tê-la perdido por motivo de enfermidade ou acidente, pois tecnicamente, o
deficiente não é reabilitado e, sim, habilitado” (MARTINEZ, 1992).
Uma outra definição é dada por Marcelo Leonardo Tavares (2007, p. 53), pela
qual “a habilitação difere conceitualmente da reabilitação por se referir a serviço que tem
por fim inserir pessoa pela primeira vez no mercado laboral, enquanto que a segunda via a
reintrodução do trabalhador alijado”.
Assim, tanto a Habilitação como a Reabilitação Profissional, constituídas da
(re) adaptação profissional e da assistência (re) educativas são serviços prestados
Previdência Social a pessoas que se encontrem parcial ou totalmente incapacitadas para o
trabalho e a pessoas com deficiência ainda que sem vínculo previdenciário (Decreto
3.048/99, art. 136 e Decreto 3298/99, art. 17). Tem por finalidade primária a de garantir
direitos previdenciários e, secundariamente, de assegurar o (re) ingresso e inclusão no
mercado de trabalho. São prestadas em caráter obrigatório e independentemente de
carência (Lei n. 8213, art. 26, V) pela Previdência Social.
A obrigatoriedade aqui se refere ao dever da Seguridade Social de prestar
assistência aos segurados, do que se pode entender o caráter facultativo para os não-
segurados. Essa é a literalidade do art. 90 da Lei n. 8.213/9123, o que parece ser
confirmado pelo contido no art. 136, parágrafo 1º do Decreto n. 3.048/99 quando
menciona que a prestação a dependentes se faça “de acordo com as possibilidades
administrativas, técnicas, financeiras e as condições do órgão”. No mesmo sentido, a
Instrução Normativa INSS/PRES n. 77/2015, de 27 de março de 2015, artigos 399 e 400,
que diz que são obrigatoriamente atendidos:
I - o segurado em gozo de auxílio-doença, acidentário ou previdenciário;
23 Lei n. 8.213/91, Artigo 90 - A prestação de que trata o artigo anterior é devida em caráter obrigatório aossegurados, inclusive aposentados e, na medida das possibilidades do órgão da Previdência Social, aos seusdependentes.
II - o segurado sem carência para a concessão de auxílio-doença previdenciário, incapaz parao trabalho;III - o segurado em gozo de aposentadoria por invalidez;IV - o segurado em gozo de aposentadoria especial, por tempo de contribuição ou idade que,em atividade laborativa, tenha reduzida sua capacidade funcional em decorrência de doença ouacidente de qualquer natureza ou causa.
E, atendidos, conforme as possibilidades administrativas, técnicas, financeiras
e às características locais:
V - o dependente pensionista inválido;VI - o dependente maior de dezesseis anos, portador de deficiência; eVII - as Pessoas com Deficiência - PcD, ainda que sem vínculo com a Previdência Social.
No entanto, tratando-se de uma prestação assistencial, a universalidade da
prestação social prevista no art. 203, IV da Constituição24 indica não ser melhor
intepretação da expressão “segurados” contida no art. 90 da Lei n. 8213/91 como a sendo
a que restringe a reabilitação profissional apenas aos trabalhadores com vínculo
previdenciário, ainda que sem prazo de carência. De fato, uma interpretação mais generosa
da norma constitucional permite o reconhecimento da possibilidade de políticas públicas
que não se limitem aos segurados, mas que se estendam também aos demais
trabalhadores.
A obrigatoriedade da prestação assistencial de habilitação e de reabilitação
profissional está também garantida pela recente Lei n. 13.146, de 6 de julho de 2015, que,
em seu art. 16, prevê que a toda a pessoa com deficiência é garantida
I - organização, serviços, métodos, técnicas e recursos para atender às características de cadapessoa com deficiência;
II - acessibilidade em todos os ambientes e serviços;
III - tecnologia assistiva, tecnologia de reabilitação, materiais e equipamentos adequados eapoio técnico profissional, de acordo com as especificidades de cada pessoa com deficiência;
IV - capacitação continuada de todos os profissionais que participem dos programas eserviços.
Também há obrigatoriedade da submissão do trabalhador ao processo de
reabilitação quando considerado “insuscetível de recuperação para sua atividade habitual”
24 Constituição, Art. 203 – A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente dacontribuição à seguridade social, e tem pro objetivos:(...) III- a promoção da integração ao mercado detrabalho.
(Lei n. 8213/2004, art. 6225). Tal obrigação constitui-se em “dever de curar-se”26 e está
prevista no art. 101 da mesma lei, sob pena de suspensão - e não cancelamento - do
benefício previdenciário27. A participação no processo compreende a submissão a exame
médico a cargo da Previdência Social; os procedimentos por ela determinados e custeados
e todo o tratamento gratuitamente dispensado, exceto cirurgias e transfusão de sangue que
são facultativos. Além disso, deve o reabilitando acatar e cumprir as normas estabelecidas
nos contratos, acordos e convênios, bem como pautar-se no regulamentos daquelas
organizações (art. 315, parágrafo 2º). Assim, a recusa comprovada de tratamento não
invasivo ou a negativa de submissão à reabilitação profissional enseja “a imediata
suspensão administrativa do benefício, que somente retornará, e apenas dali para diante, se
e quando o segurado atender ao que lhe foi determinado pela autarquia” (BARROS JR.,
2012, p. 114).28
A assistência prevista é ampla e inclui o fornecimento de próteses, órteses e
instrumentos de auxílio à locomoção (art. 89, parágrafo único, alíneas “a” e “b”29), assim
como o transporte urbano do incapacitado (art. 89, parágrafo único, alínea “c”). Tais
prestações são mais detalhadas no Decreto 3048/99, art. 137 parágrafo 2º) e na Instrução
Normativa INSS n 77. Assim, no art. 402 desta, se estabelece, ainda, a possibilidade de
pagamento de diárias, auxílio-alimentação (almoço ou jantar, quando o programa
profissional tiver oito horas) e de auxílio-transporte urbano (inclusive intermunicipal ou
interestadual), se entender o órgão previdenciário indispensável para o programa de
reabilitação profissional. Da mesma forma, os instrumentos de trabalho imprescindíveis à
formação ou treinamento profissionais e os implementos profissionais (material didático,
uniforme, instrumentos e equipamentos técnicos, EPIs e outros).30
O modelo não reconhece maiores diferenças ou particularidades no processo
em si de (re)habilitação de incapacitados e deficientes. De fato, considerado o conceito
25 Art. 62 – O segurado em gozo de auxílio-doença, insuscetível de recuperação para sua atividade habitual,deverá submeter-se a processo de reabilitação profissional para o exercício de outra atividade. Não cessará obenefício até que seja dado como habilitado para o desempenho de nova atividade que lhe garanta asubsistência ou, quando considerado não-recuperável, for aposentado por invalidez.26 “A este direito à saúde corresponde o chamado dever de curar-se que o indivíduo tem frente a si mesmo efrente à sociedade. Dever que se encaixa perfeitamente na reabilitação profissional, que é ao mesmo tempoum direito e um dever” (LEÑERO, Jose Perez. Ideario de la rehabilitación profesional de los inválidos”apud BILHALVA, 2007, p. 471)27 A Lei 13.063/2014 modificou o art. 101 da Lei 8213/91, isentando o aposentado por invalidez desubmeter a exame pericial após completar 60 anos de idade.28 Ver, também, art. 316 da Instrução Normativa n.77/2015.29 O direito à órteses, próteses e meios auxiliares de locomoção como um direito das pessoas comdeficiências está previsto, também no inciso XI do parágrafo quarto do art. 18 da recente lei n. 13.146/2015. 30 Ou, ao menos, deveria ser feito, pois é atribuição do SUS, no âmbito da seguridade social, a assistência à saúde e o fornecimento de órteses e próteses e a reabilitação física, fisioterapia, assistência à saúde, etc.
internacional da OIT de “deficiente”, este deve ser entendido como “pessoa com
perspectivas sensivelmente diminuídas de encontrar ou conservar um emprego
conveniente – ou de progredir profissionalmente – em decorrência de uma deficiência
física ou mensal devidamente reconhecida”. Assim, no que tange ao dever estatal de
inserir o incapacitado, total ou parcial, ao mercado laboral, não deveria haver diferenças
entre deficientes habilitados e incapacitados reabilitados. No plano legal, a diferença,
radica na existência ou não de um vínculo previdenciário anterior: no primeiro caso, trata-
se tecnicamente de uma questão de seguro social; no segundo, trata-se de uma prestação
de benefício sem custeio, que, tecnicamente, seria enquadrado como assistência social.
Tanto a avaliação da deficiência como do grau de incapacidade são feitas por
perícia médica e pelo serviço social do INSS. A análise médica da deficiência e do grau de
incapacidade “considerará as deficiências nas funções e nas estruturas do corpo, e a
análise social considerará os fatores ambientais, sociais e pessoais; ambas com a
observância do grau de desempenho das atividades e a restrição da participação social,
segundo suas especificidades” (BARROS JR., 2012, p. 203).
A responsabilidade pela reabilitação profissional é da União, através do INSS,
mas pode ser delegada a entidades especializadas em recuperação de trabalhadores ou,
mesmo, à própria empresa em que opera o empregado (MARTINEZ, 2002, p. 135).
Em geral, a possibilidade de realização de cursos é fortemente limitada pelo
nível de instrução do reabilitando e pelo pequeno interesse das empresas na reabilitação de
seus empregados31. No caso de estágios em empresas conveniadas, os custos e obrigações
são suportados integralmente pelas entidades, sem encargos previdenciários para as
empresas. Fica expressamente afastada a possibilidade de caracterização de vínculo
empregatício. Ao final do período, embora haja a perspectiva de contratação do
profissional, o que, teoricamente, beneficiaria a empresa32 ou entidade, a maioria das vezes
isso não ocorre.
Nos termos do art. 92 da Lei n. 8213/91, ao término do processo, se emitirá
Individual para a função para a qual o reabilitando foi capacitado profissionalmente, sem
prejuízo do exercício de outra para a qual se julgue capacitado. Aqui, claramente, não se
está diante de uma “reabilitação plena”, que somente se configuraria quando houvesse a
31 Há uma tendência para a reabilitação do trabalhador em funções menos qualificadas (serviços de portaria,tarefas manuais simples, etc.) ou, mesmo, não lhe cometer trabalho algum. Um depoimento sobre asdificuldades para a efetiva reinserção laboral do reabilitado em GESTO-UFRN, 2013.32 O benefício da empresa decorreria do aproveitamento de um trabalhador já treinado à medida, bem comopelo preenchimento da cota legal. Sobre as razões pelas quais as empresas contratariam umincapacitado/pessoa com deficiência, ver BATISTA, 2003.
efetiva reinserção laboral, com a assunção de um posto de trabalho. O modelo se
conforma com a constatação de que o trabalhador está capacitado profissionalmente, sem
que tal decisão administrativa tenha de ser, necessariamente, posta em prática: somente
dever-se-ia entender como concluída a reabilitação quando o trabalhador obtivesse um
posto de trabalho.
Tal certificado individual também é emitido quando concluído o processo de
habilitação ou reabilitação social e profissional, indicando as atividades que poderão ser
exercidas pelo trabalhador, de acordo com suas possibilidades físicas e sua formação
profissional. Nada impede que o reabilitado exerça outra atividade para a qual se
capacitar, não constituindo obrigação da Previdência Social a manutenção do segurado no
mesmo emprego ou sua colocação em outro para o qual foi reabilitado (Decreto 3048/99,
art. 140 parágrafo 1º). Tal documento será apresentado pelo reabilitando às empresas e à
sociedade na busca de um emprego.
Entendendo por concluído o processo de reabilitação, já que, munido com o
certificado e beneficiado com a lei de cotas para pessoas com deficiência, o reabilitando já
está capacitado para concorrer no mercado laboral, a Previdência Social dá por esgotadas
suas obrigações com o reabilitando33.
33 Ao contrário do que dispunha o Ato Normativo n 43, que, ao disciplinar o programa de reabilitaçãoprofissional, definia que o mesmo somente se completaria com o retorno do segurado ao trabalho.
1.2.3 Os benefícios previdenciários no processo de reabilitação
profissional.
1.2.3.1 Auxílio-doença e auxílio-doença acidentário
Os benefícios por incapacidade são pagos mensalmente às pessoas que não
podem exercer sua atividade devido a uma doença, seja mental, seja física, ou sofre um
acidente de qualquer natureza. São eles:
1- Auxílio Doença (espécie 31) 2- Aposentadoria por Invalidez (espécie 32) 3- Auxílio Doença Acidentário (espécie 36) 4- Acidente de Trabalho (espécie 91) 5- Aposentadoria por Invalidez por Acidente de Trabalho (espécie 92) 6- Auxílio Acidente por Acidente de Trabalho (espécie 94) 7- Benefícios de Prestação Continuada da Assistência Social à pessoa com deficiência – BPC– LOAS (espécie 87)
Aqui, tratar-se-á especialmente do auxílio-doença acidentário, do auxílio-
acidente e da aposentadoria por invalidez por acidente do trabalho, pela suas diretas
conexões de tais benefícios com a reabilitação profissional.
O reabilitado profissional, como segurado da INSS tem direito a determinados
benefícios previdenciários durante o processo de reabilitação, findo o qual duas situações
por ocorrer: a) supõe-se que o trabalhador está preparado para retornar com sucesso à
atividade laboral; ou, b) está incapacitado definitivamente para o trabalho, fazendo jus a se
aposentar por invalidez.
O trabalhador incapacitado percebe, inicialmente, o auxílio-doença34 (art. 59
da Lei n. 8.213/91) após os primeiros quinze dias de afastamento que são pagos pelo
empregador. Trata-se, inicialmente, de um benefício provisório, concedido até a
consolidação da situação clínica do trabalhador, quando o órgão previdenciário concluirá
sobre a concessão definitiva do auxílio-doença. O benefício é percebido por prazo
indeterminado até a alta previdenciária que ocorre quando da recuperação da saúde do
trabalhador. Corresponde a 91% do salário-de-benefício, o que importa em um decréscimo
de sua na renda mensal. A partir da inclusão do parágrafo 10 no art. 29 da Lei n. 8.291/91
34 Art. 59 – O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o períodode carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual pormais de 15 (quinze) dias consecutivos”.
(Lei n. 13.135/15), o benefício não pode ultrapassar a média aritmética dos doze últimos
salários de contribuição.
O perito procede uma avaliação da capacidade laborativa do trabalhador, ou
seja, da possiblidade de desempenho de “funções específicas de uma atividade ou
ocupação, em consequência de alterações morfotrópico-fisiológicas provocadas por
doenças ou acidente”.35 É uma avaliação difícil36 e marcada pela tensão e pela
desconfiança37, baseada em informações médicas, mas que exige do Perito amplos
conhecimentos interdisciplinares ao realizar uma difícil estimativa do potencial laborativo
do avaliado em relação às atividades ou ocupações que habitualmente exerce. Idealmente,
deveria haver a interlocução de vários saberes além do médico, envolvendo outros
profissionais, numa soma de conhecimentos para a compreensão da incapacidade em
diversos parâmetros: grau (parcial ou total), duração (temporária ou permanente) e
abrangência (uniprofissional, multiprofissional e omniprofissional) (SCHMIDT;
BARBOSA, 2014, p. 61). Entretanto, é a perícia médica quem decide, praticamente,
sozinha a sorte do trabalhador acidentado.
Na realidade, a avaliação feita por médicos não parece ter como foco a doença,
mas apenas a capacidade laborativa do trabalhador, isto é, trata-se de um prognóstico se
este tem condições de continuar trabalhando apesar da doença (FERREIRA, 2013). O
resultado dessa avaliação define o retorno ao trabalho, cessando o auxílio-doença, ou a
aposentadoria por invalidez.
Os acidentes de trabalho podem ser típicos ou não. Considera-se acidente
típico aquele que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa ou pelo exercício
do trabalho dos segurados, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause
a morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho
(art. 19 da Lei n. 8.213/91)38.
São considerados acidentes não-típicos as doenças profissionais e as doenças
do trabalho. As doenças profissionais são aquelas produzidas ou desencadeadas pelo
exercício do trabalho peculiar a determinada atividade (art. 20, I da Lei n.8.213/91). As
35 “Neste definição destacam-se quatro componentes: alterações mórbidas presentes, exigênciasprofissionais, dispositivos legais pertinentes e risco de vida para si ou para terceiros, que a permanência ematividade pode acarretar”. (BARROS JR., 2012, p. 66).36 Sobre as dificuldades metodológicas da perícia de reabilitação profissional, ver SIMONELLI, 2010, p. 66.
37 Sobre a complexa relação perito-periciado, em que a desconfiança é a tônica e a ênfase do procedimentose volta para a prova do afirmado pelo segurado – e não no diagnóstico médico ver BARROS JR., 2012, p.58.38 Tal conceito é criticado por CASTRO e LAZZARI, para os quais as características do acidente do trabalhosão a exterioridade da causa do acidente, a violência, a subtaneidade e a relação com a atividade laboral.(LAZZARI, J. B. CASTRO, C.A., 2012, p. 194),
doenças do trabalho são as adquiridas ou desencadeadas em função de condições especiais
em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente (art. 20, II da Lei
n.8.213/91). Assim, as doenças profissionais estão diretamente ligadas à profissão do
trabalhador; já as doenças do trabalho estão mais ligadas ao meio ambiente do trabalho.
Estão descritas, no anexo III do Regulamento da Previdência Social (Decreto
n. 3048/99 e anexos), as lesões que autorizam a concessão do auxílio-doença acidentário,
o que torna a concessão do benefício, conforme a doutrina “a questão mais controvertida
no direito infortunístico brasileiro em face do poder legiferante das medidas provisórias e
da confusão criada entre redução da capacidade funcional e laborativa e impedimento para
o exercício de qualquer atividade” (Monteiro: Bertagni39 apud OLIVEIRA, 2005, p. 252).
Tanto as doenças profissionais e as doenças de trabalho constam da relação
elaborada pela Previdência Social. Tal listagem de doenças ocupacionais não é exaustiva,
pois é possível o enquadramento por doença não prevista na relação elaborada pelo
Ministério da Previdência. Essencial é que exista nexo causal entre a enfermidade e o
exercício do trabalho, ou seja, que haja vínculo fático que ligue o efeito (incapacidade
para o trabalho ou morte) à causa (acidente do trabalho ou doença ocupacional)
(CASTRO; LAZZARI, 2012, p. 52).
Em se tratando de acidente de trabalho ou afastamento por doença
ocupacional, é obrigatória a emissão, pelo empregador, da Comunicação de Acidente de
Trabalho (CAT), documento que serve de comunicação à Previdência Social da ocorrência
do acidente de trabalho (art. 22 da Lei 8213/91).40
Na avaliação em que concede ou não o benefício, o perito médico do INSS
deve enquadrar a enfermidade como benefício acidentário (código 91 – b91) ou benefício
previdenciário (código 31 – b31), ou seja, reconhece ou não a natureza acidentária do
benefício, o que afeta substancialmente a situação jurídica do trabalhador. Somente o
benefício acidentário confere ao trabalhador a garantia de emprego de doze meses prevista
no art. 118 da Lei n. 8.213/91, além de assegurar ao trabalhador, durante o período de
suspensão do contrato de trabalho, a integralidade dos depósitos do FGTS (art. 15,
parágrafo 5º da Lei n. 8.036/90).
39 MONTEIRO, Antonio Lopes. BERTAGNI. Roberto Fleury de Souza. “Acidentes do trabalho e doençasocupacionais. 2ª edição atual. São Paulo: Saraiva. 2000. pg. 36. 40 São grandes as queixas dos sindicatos a respeito da “subnotificação acidentária” por parte das empresas.(SALVADOR, 2007). Para um estudo de caso, de uma subnotificação em massa, ainda que mantidos ossalários do período de afastamento dos trabalhadores, tudo para não chamar à atenção sobre a altaprevalência das doenças no ambiente fabril, ver MAENO; WUNSCH FILHO, 2010, p. 53-63).
Além disso, embora não seja decisivo para tanto, o reconhecimento
previdenciário da natureza acidentária do benefício tem papel relevante no
reconhecimento da ocorrência do próprio acidente de trabalho em eventual pedido judicial
de responsabilização do empregador.
Restabelecido plenamente o trabalhador, este retornará ao trabalho, recebendo
a alta previdenciária, devendo apresentar-se à empresa para retomada de sua atividade
laboral. Entretanto, constatada pela Perícia a incapacidade do trabalhador para a retomada
de suas atividades habituais, mantém-se o pagamento do benefício. Além da definição
quanto ao prosseguimento do pagamento do benefício, a avaliação deve dar conta da
questão de ser a incapacidade é parcial ou total, bem como da existência de sequelas
resultantes do acidente ou enfermidade.
Da mesma forma, se a perícia constatar a existência de sequelas, será avaliada
a necessidade do trabalhador submeter-se à reabilitação profissional.
1.2.3.2 Auxílio-acidente
Quando constadas do acidente sequelas que impliquem a redução da
capacidade laborativa habitual do trabalhador41, este tem direito a um auxílio-acidente42
previstos nos artigos 29 e 86 da Lei n. 8.213/91. Para fins de deferimento do auxílio-
acidente, nos termos do art. 104 do Decreto 3048/99, caracteriza-se tal redução quando a
lesão implique em uma das seguintes situações: a) maior esforço para o desempenho da
mesma atividade da época do acidente; b) impossibilidade do desempenho da atividade
que exercia à época do acidente, porém permitindo o desempenho de outra, após processo
de reabilitação profissional. Trata-se de uma indenização tarifada43, consistente de uma
renda mensal vitalícia no valor de 50% do salário-de- benefício. Por seu caráter
indenizatório, esse valor pode ser inferior ao salário mínimo, a despeito no contido no art.
41 Por habitual se compreende a última atividade laborativa desenvolvida pelo segurado, (tida como funçãode origem em relação à concessão do benefício), salvo se, peculiarmente, o segurado tenha desenvolvidooutro tipo de atividade laborativa durante praticamente toda a sua vida profissional (BILHALVA, 2007, p.476).42 Não se confundem auxílio-acidente com auxílio-doença acidentário: o primeiro é uma indenização pelaperda da capacidade para o trabalho; o segundo, uma indenização pelos salários do período em que otrabalhador ficou afastado por motivo da enfermidade.43 “A proteção previdenciária não é plena, mas tarifada pela Lei de Benefícios. Não cobre, por exemplo,lucros cessantes e danos emergentes. Não há imposição da recuperação do “status quo ante” (CASTRO;LAZZARI, 2012, p. 53).
201 parágrafo 2º da Constituição44, já que o salário-de-benefício45 é que não pode ser
inferior ao salário mínimo46.
Tratando-se de parcela indenizatória – e não remuneratória-, a recuperação
parcial da capacidade produtiva não importa em redução do benefício, “pouco importando
se a redução do desempenho em exercer a atividade habitual venha a ser superada pelo
esforço próprio do trabalhador, por processo de reabilitação profissional ou por qualquer
outro tipo de cura ou recuperação” (BILHALVA, 2007, p. 497).
Também ocorre incapacidade parcial quando o trabalhador não é recuperável
para a atividade habitual, mas é suscetível de reabilitação para outra atividade laborativa.
Quando o trabalhador tiver mais de uma atividade concomitante e em apenas
uma ou em alguma delas for considerada incapaz sem possibilidade de recuperação, o
auxílio-acidente será pago indefinidamente, até o trabalhador se aposentar ou falecer.
Araújo e Rubin (2013, p. 85) constatam “certa relutância” do INSS em
determinar administrativamente a concessão do auxílio acidente. Especialmente em
sequelas menores e de funções de menor complexidade, há um tendência de negar o
benefício, o que acarreta sérias consequências para a vida do trabalhador. Na hipótese do
órgão previdenciário indevidamente recusar a concessão do auxílio-doença acidentário e
determinar o retorno prematuro do trabalhador, se criará uma injusta situação em que este
será devolvido ao mercado de trabalho, com déficit funcional permanente, sem qualquer
contrapartida do sistema, como se estivesse 100% apto para todo e qualquer trabalho.
1.2.3.3 Aposentadoria por invalidez
Tecnicamente, há de se diferenciar quatro formas de incapacidade:
uniprofissional (única e exclusivamente para aquela atividade laborativa que o segurado
habitualmente exercia); pauciprofissional (para poucas atividades laborativas);
pluriprofissional (para a maioria das atividades laborativas) e omniprofissional ou
invalidez (para toda e qualquer atividade laborativa). No caso das três primeiras, há
incapacidade parcial e pode ser necessária a reabilitação profissional. Somente no caso da
última, a incapacidade é total e a consequência é a aposentadora por invalidez. Nos
44 Art. 201, parágrafo 2º - Nenhum benefício que substitua o salário de contribuição ou o rendimento dotrabalho do segurado terá valor mensal inferior ao salário mínimo.45 Salário-de-benefício é calculado com base no salário-de-contribuição e é utilizado para cálculo da rendamensal inicial, que é um percentual aplicado sobre o salário-de-benefício.46 TJRS, 10ª Câm.Cível. PRLF Nº 70052297199 2012/CÍVEL.
demais casos, como se viu, o benefício previdenciário a ser concedido é o auxílio-
acidente.
A aposentadoria por invalidez é devida ao trabalhador quando este é
considerado incapaz e insuscetível de reabilitação para atividades que lhe garantam a
subsistência e dependerá de exame médico-pericial a cargo da Previdência Social (Lei n.
8213/91, art. 42). A aposentadoria será concedida pelo reconhecimento da incapacidade
total e definitiva para o trabalho (Lei n. 8213/91, art. 43), ou seja, “uma situação que
impossibilita o segurado da previdência social de exercer atividade laborativa, ficando o
mesmo sem condições de garantir a sua mantença por meio do trabalho” (MUSSI, 2011).
A aposentadoria por invalidez, assim, também pode ser entendida como uma certificação
oficial de que o trabalhador não tem mais condições de manter-se por si só, com a
inevitável consequência do estigma social que tal fato acarreta.47 Assim, a aposentadoria
por invalidez não pode ser interpretada como um “benefício” concedido ao segurado –
nem um “direito” do incapacitado, mas a consequência incontornável de um infortúnio
que se abateu sobre o trabalhador.
O valor do benefício a ser pago ao trabalhador aposentado por invalidez é
calculado na base de 100% do salário de benefício (artigos 24 e 44 da Lei n. 8.213/91),
acrescido de 25% quando o aposentando tiver necessidade de assistência de outra pessoa
(art. 45). Tal benefício tem sempre caráter provisório, devendo o trabalhador se
apresentar para exames médicos periódicos para revisão até que complete 55 anos de
idade.
Há um incentivo ao trabalhador aposentado por invalidez para que retorne ao
trabalho, inclusive voluntariamente (artigos 46). A partir da edição da Súmula n. 160 do
Tribunal Superior do Trabalho (TST)48, dando nova interpretação ao art. 475 da CLT e do
art. 47 da Lei n. 8.213/91, prevaleceu o entendimento que o trabalhador tem direito a
retornar ao emprego, após cancelada a aposentadoria por invalidez, mesmo após cinco
anos, facultado, porém, ao empregador indenizá-lo na forma da lei. Superada, assim, a
Súmula 217 do STF49, que admitia a possibilidade de retorno do empregado somente
47 “O homem tem de ser capaz de viver e garantir o seu sustento por si mesmo e de forma mais adequada àsua natureza e destino: quer dizer, com o seu trabalho, e não com esmola e subsídio” (LEÑERO, Jose Perez.Ideario de la rehabilitación profesional de los inválidos”, p. 38, apud BILHALVA, 2007, p 471.48 Súmula 160 TST: “Cancelada a aposentadoria por invalidez, mesmo após 5 anos, o trabalhador terá direitode retornar ao emprego, facultado, porém, ao empregador, indenizá-lo na forma da lei.”49 Súmula 217 do STF: Tem direito de retornar ao emprego, ou ser indenizado em caso de recusado empregador, o aposentado que recupera a capacidade de trabalho dentro de cinco anos, a contarda aposentadoria, que se torna definitiva após esse prazo.
dentro de cinco anos, entendendo que a aposentadoria por invalidez se tornava definitiva
após tal prazo.
Assim, verificada a recuperação da capacidade para o trabalho, cessa o
pagamento do benefício, de acordo com os seguintes critérios (art. 47):
I – ocorrendo a recuperação dentro do período de cinco anos, a contar do início daaposentadoria por invalidez ou do auxílio-doença que o antecedeu sem interrupção.
Nesse caso, o benefício cessará: - de imediato, para o empregado que tiver direito a retornar à função que
desempenhava na empresa quando se aposentou, na forma da legislação trabalhista, valendocomo documento, para tal fim, o certificado de capacidade fornecido pela Previdência Social;
- após tantos meses quantos forem os anos de duração do auxílio-doença ou daaposentadoria por invalidez, nos demais casos, ou seja, quando o trabalhador não tiver direitoa retornar ao emprego;
II – quando a recuperação for parcial, ou ocorrer fora do período de cinco anosprevistos no inciso I, ou ainda quando o trabalhador for declarado apto para o exercício detrabalho diverso do que habitualmente exercia, a aposentadoria será mantida, da volta àatividade, nos seguintes percentuais:
- no valor integral (100%), durante seis meses contados da data em que for verificadaa recuperação da capacidade;
- com redução de 50% no período seguinte de seis meses;- com redução de 75%, também por igual período de seis meses, ao término do qual
cessará definitivamente.
Assim, nos primeiros cinco anos de percepção da aposentadoria, por invalidez,
em caso de retorno ao trabalho do aposentado (como no caso do acidentado do trabalho), o
benefício cessa de imediato. Porém, quando o trabalhador não tem esse direito assegurado,
terá direito a uma prorrogação do benefício por tantos meses quantos foi percebido o
benefício.
Se o aposentado retornou depois de cinco anos, se a capacidade foi recuperada
apenas parcialmente ou, ainda, se a reabilitação ocorreu para trabalho diverso do que
anteriormente ocupava, o benefício será mantido, integralmente, por seis meses; após esse
período, pago pela metade por outros seis meses; e pago no valor de um quarto por ainda
mais seis meses. Somente, então, será cancelado.
O legislador, assim, procura assegurar alguma segurança econômica ao
trabalhador que retorna de uma aposentadoria por invalidez, esperando que, ao cabo de um
tempo, este recupere integralmente sua capacidade de competir no mercado de trabalho.
A aposentadoria por invalidez nunca pode ser considerada definitiva, tendo em
conta o progresso da medicina e os avanços da reabilitação profissional (SOUZA, 2011, p.
109). Por isso, o art. 42 da Lei n. 8213/91 claramente menciona a transitoriedade da
incapacidade e da transitoriedade da reabilitação e, assim, a provisoriedade do pagamento
do benefício.
Como se deduz das hipóteses do art. 47, o pagamento continuado da
aposentadoria cessa imediatamente quando o trabalhador se recupera totalmente dentro de
um período de cinco anos do início do pagamento do benefício previdenciário (auxílio-
doença ou aposentadoria por invalidez) percebido sem interrupção.
1.2.4 O processo de reabilitação profissional
1.2.4.1 A constatação da incapacidade e a reabilitação 50
Há um grande número de casos em que a reabilitação profissional é
improvável, devido ao grau de deficiência adquirida, sendo considerados “não elegíveis”
para a reabilitação; em outros casos, a dificuldade de reinserção no mercado laborar
decorre do baixo nível de escolaridade do reabilitando. Em tais situações, não resta outra
opção a esses trabalhadores que não a da aposentadoria por invalidez.
O processo de reinserção do reabilitando é complexo51 e exige uma abordagem
multidisciplinar e abrangente, com o objetivo de a “construção de um contexto inclusivo
de trabalho” que compreende tanto serviços de apoio ao reabilitando como ações dirigidas
à sociedade, destinadas à eliminar as barreiras sociais e físicas no ambiente e no local de
trabalho (BUENO, 1993).
Há grande queixas de que a Previdência Social recusa o processo de
reabilitação a muitos trabalhadores que o necessitariam. Conforme Rossal e Rubin,
“tem-se como evidente no Brasil que o INSS não vem cumprindo a contento a determinaçãolegal, não existindo uma clara orientação para que nas perícias de rotina, prorrogadoras debenefício de auxílio-doença, se encaminhe à reabilitação profissional toda uma gama desegurados que se enquadra nas disposições do art. 62 da Lei n. 8.213/91 c/c art. 137 doDecreto n. 3048/99.” (ARAÚJO; RUBIN, 2012, p. 93)
O fato se reveste de gravidade, já que, em tais casos, a perda da capacidade
laborativa é permanente, não haverá plena recuperação e o passar do tempo dificulta ainda
mais a reinserção laboral. Conforme os autores citados, há casos que o trabalhador
permanece em auxílio-doença comum por longuíssimo tempo (às vezes, por quatro, cinco
50 Ver figura 2, em anexo.51 “A reintegração dos trabalhadores que se encontram parcialmente incapacitados, por motivo de doença ouacidente, é um processo complexo que depende do padrão de interação entre as várias instâncias:trabalhador, INSS, empresa e família”. (CESTARI; CARLOTTO, 2012, p. 93-115).
ou mais anos), só fazendo tratamento clínico ou fisioterápico, sem o devido
encaminhamento técnico pela estrutura previdenciária.52
O INSS também não reconhece a existência de incapacidade em muitos casos
em que, apesar da menor gravidade da lesão, esta inviabiliza a reinserção do empregado
na função que ocupava. É o caso, por exemplo, de trabalhadores com LER/DORT de
menor gravidade (níveis 1 e 2), somente determinando a reabilitação em casos mais graves
(nível 3) (LOPES, 2005, p. 104).
Nesses casos, há uma clara insuficiência na compreensão do órgão
previdenciário quanto às reais condições de reinserção laborativa do trabalhador. Tal
limitação na avaliação clínica também se estende à avaliação das dificuldades psicológicas
e sociais da sua reinserção no mercado laboral.
Nesse sentido, o atual processo de reabilitação está muito aquém do que se
poderia ou deveria esperar. Pois, exatamente no momento difícil da recuperação do
trabalhador, em que se exige deste um grande esforço de adaptação e força de vontade
para retomada de um novo ciclo existencial produtivo, é razoável entender que cabe aos
órgãos públicos dispor de estrutura material e pessoal adequadas para, rapidamente,
reconhecer tais necessidades e, prontamente, colocar seus recursos à disposição da melhor
reabilitação profissional possível, em benefício do trabalhador e, também, da sociedade.
Idealmente, ao se propor ao reabilitando a aceitação de um novo horizonte
profissional, adequado à sua nova condição laboral, há de se fazer, dessa encruzilhada
existencial, um momento de descoberta e de tomada de consciência, de autoconhecimento
e de esperança, fornecendo-lhe um amplo leque de possibilidades, dando-lhe o apoio
necessário para a decisão que será adotada. Conforme Carla Leite Ribeiro Bueno:
“A reabilitação profissional promove a descoberta do mundo do trabalho e a tomada dedecisão em relação à vida profissional para cada pessoa envolvida no programa. Descobrir omundo do trabalho significa conhecer as opções profissionais, profissões e funções existentes;conhecer as normas que regem este mundo do trabalho e aprender a lidar com estas normas;desenvolver o comportamento profissional, hábitos e atitudes no trabalho”. (BUENO, 1993).
Por isso, a responsabilidade das equipes multiprofissionais é ampla e abrange
tanto aspectos médicos como socioprofissionais. Conforme Hélio Gustavo Alves (2015, p.
84-85), são duas as etapas que compõem as funções das equipes multiprofissionais:
funções médicas (avaliação de perdas e restrições funcionais físicas; definição de
potencialidades, habilidades e prognóstico de retorno ao trabalho; identificação da
necessidade de reabilitação profissional; solicitação de exames e pareceres especializados,
52 Citam os autores, como exemplo, jurisprudência do TJRS, 9ª Cam Cível, ARN 70035347798, Rel. TassoCauby Soares Delabary, julg. Em 21/7/2010).
bem como prescrição de próteses e órteses e análise da adequação do posto de trabalho à
saúde do trabalhador) e funções socioprofissionais (avaliação de perdas e restrições
funcionais, escolaridade, faixa etária, experiências profissionais, vínculos empregatícios e
mercado de trabalho; definição de potencialidades, habilidades e prognóstico de retorno ao
trabalho; busca de condições para a readaptação do trabalhador na empresa de vínculo ou
orientação para a escolha consciente de nova função/atividade; encaminhamento para a
preparação profissional; acompanhamento do programa de reabilitação e realização de
pesquisa de fixação).
No entanto, ao contrário do que ocorre na avaliação dos benefícios
previdenciários das pessoas com deficiência53, a avaliação prevista no INSS se limita a
uma análise de cunho objetivista, de avaliação do “potencial laborativo” do trabalhador,
com vistas a proporcionar-lhe os meios de adaptação às funções compatíveis com suas
limitações (Decreto n. 3048/99, artigo 137, incisos I). Escapam da análise os aspectos
sociais tão ou mais limitativos do que os aspectos biomédicos na efetiva reinserção laboral
do trabalhador.
Constatado pelo órgão previdenciário que o trabalhador não é suscetível de
recuperação para sua atividade habitual54, este é encaminhado ao processo de reabilitação
profissional, mantendo-se o benefício até que o trabalhador seja considerado habilitado ou
se aposente por invalidez (Lei n. 8213/91, art. 62). O encaminhamento para a reabilitação
também pode ser, além dos órgãos periciais e do Serviço Social do INSS, pelas empresas,
pelas entidades sindicais e pelo órgãos e instituições que firmaram convênio e/ou acordo
de cooperação técnico-financeira.
Em caso de convênio, o INSS poderia colaborar, inclusive, para a
complementação das instalações e equipamentos das entidades de habilitação e
reabilitação profissional ou fornecer outros meios para a melhoria do padrão de
atendimento aos beneficiários (ALVES, 2015, p. 81).
O objetivo do processo de reabilitação é a adaptação do trabalhador a uma
nova profissão, de forma que este possa voltar ao mercado de trabalho, deixando de
receber o benefício.
53 Como se verá mais adiante, item 1.3.2.1.
54 A lei não define critérios mais claros do que se entende por “incapacidade insusceptível de recuperação daatividade habitual”, deixando margem ao alto grau de subjetividade do Perito, conforme crítica de ÂngeloFerreira (2009).
O treinamento para a reabilitação profissional pode ser feito, tanto em
empresas como em oficinas protegidas55 que simulem as condições de trabalho em um
ambiente real. Entretanto, em geral, os convênios para esse tipo de treinamento priorizam
mais empresas que necessitam cumprir a cota de pessoas com deficiência e não tanto as
que efetivamente disponham de condições adequadas para levar a cabo eficientemente o
processo de reabilitação do trabalhador, como determina o Decreto n. 3048/99, art. 137,
parágrafo 1º (ALVES, 2015, p. 81).
Em geral, o processo de reabilitação deve ser feito na localidade de residência
do trabalhador (ou “no contexto em que vive”, na forma do art. 89, “caput” da Lei n.
8213/91), de forma a não afastá-lo da família e da sociedade na qual se insere, sob pena
de, ao invés de preservar sua dignidade, macular a integridade do reabilitando
(BILHALVA, 2007, p. 485).
Além disso, por diversas razões, a reabilitação deveria ser, preferencialmente,
realizada, o mais breve possível, no mesmo ambiente de trabalho ocupado anteriormente
pelo trabalhador: menor o tempo de angústia e incerteza do trabalhador; mais fácil será
sua reinserção no ambiente da empresa; menos desatualizado em termos de atualização de
técnicas e rotinas de produção; menores os custos do processo de reabilitação.
Porém, o treinamento através de subcontratos (especialmente quando
intermediados com Centros de Reabilitação Profissional) oferece algumas vantagens, em
especial porque define os parâmetros de qualidade e produtividade que são utilizados
como critério para avaliação do nível de competitividade de cada trabalhador em
treinamento, bem como medida da elegibilidade do emprego (BUENO, 1993).
A avaliação na reabilitação profissional, até 2010, deveria ser procedida por
uma equipe multiprofissional, encarregada de, além de mensurar a capacidade laborativa
residual do trabalhador; autorizar, se necessário, a aquisição de órteses, próteses e
instrumentais de trabalho e estabelecer um roteiro de treinamento do trabalhador para uma
nova função; pesquisar o mercado, em um prognóstico quanto ao potencial de
empregabilidade do avaliando; orientar e acompanhar sua programação profissional, bem
como promover articulação com a comunidade projetos de reabilitação profissional. De
preferência, o trabalhador deveria ser encaminhado ao Centro de Reabilitação Profissional
(CRP) (BARROS JR., 2012, p. 67) ou para uma empresa ou instituição conveniada, com
55 Oficina protegida de produção é a unidade que funciona em relação de dependência com entidade públicaou beneficente de assistência social, que tem por objetivo desenvolver programa de habilitação profissionalpara adolescentes e adultos portadores de deficiência, provendo o com trabalho remunerado, com vista àemancipação econômica e pessoal relativa (art. 35, § 4º, do Decreto nº 3.298/99).
capacidade de promover uma ampla assistência ao reabilitando tornando possível sua
reinserção laboral e social, sob acompanhamento e supervisão da Previdência Social.
Entretanto, a partir dos anos 90, em função da já referida política de
transferência de responsabilidades, os CRPs foram completamente desativados e a
reabilitação passou a ser, em sua maioria, delegada às empresas, mesmo com “fortes
indícios de que ela não ocorreria de fato” (MAENO; VILELA, 2010, p. 92).
Assim, com a IN 45/2010, verificou-se, além do desmonte das equipes
multidisciplinares e da delegação da reabilitação profissional às empresas, a limitação do
acompanhamento e assistência do reabilitado no processo de reinserção laboral à mera
orientação. Em relação a esse ponto, introduziu-se a figura do “orientador profissional”,
como se o dever do Estado com a inserção social e profissional do trabalhador se
resumisse a mero aconselhamento. Conforme Maeno e Vilela:
“Muitos desses orientadores profissionais não tem familiaridade com o mundo do trabalho reale com as suas exigências. Seus procedimentos restringem-se à homologação de um processoprecário de readaptação que não fica sob a coordenação geral do INSS, mas sim a cargo daempresa de vínculo, com pouca interferência do Estado. Não há sequer um programa dereabilitação profissional para cada caso. Com frequência, seus procedimentos restringem-se aentrevistar o reabilitando e a encaminhá-lo à perícia do órgão, solicitando à empresa devínculo informações sobre o cargo a lhe ser oferecido. Sem uma avaliação criteriosa daatividade laboral oferecida pela empresa, promove-se um estágio que, cumprido de algumaforma, resulta na homologação da reabilitação do segurado, independentemente das condiçõesreais de efetiva reinserção no ambiente de trabalho” (MAENO; VILELA, 2010, p. 91).
Alentador que, recentemente, o INSS, oficialmente assumindo as críticas ao
modelo de reabilitação profissional,56 tem alterado em certo sentido o rumo da política até
então assumida, tendo editado a Instrução Normativa 77/2015, que promove algumas
mudanças significativas.
A principal diz respeito ao atendimento aos reabilitandos, que, até então, era
realizado de forma descentralizada e apenas “preferencialmente” nas Agências de
Previdência Social (APS)57; agora, nos termos da nova Instrução Normativa, tal
atendimento “funcionará” necessariamente nas APS, o que indica a Previdência Social não
pode mais delegar sua responsabilidade para a reabilitação profissional para terceiros a
pretexto de “atendimento descentralizado". Ou seja, ainda que o órgão previdenciário
atribua a terceiros a tarefa de reabilitação profissional, não pode deixar de acompanhar e
supervisionar todo o processo. Em segundo lugar, reverte-se a tendência de desmonte das
56 Conforme documento de 2013, o INSS admite as críticas de que a reabilitação profissional falta aoatendimento à saúde dos trabalhadores e tem um modelo reducionista de avaliação da incapacidade (INSS.2013).
57 IN 77/2015, artigo 401, que alterou o artigo 388 da IN 45/2010.
equipes multidisciplinares de atendimento prestado pelas APS, substituindo-se expressão
“por equipes técnicas constituídas por peritos médicos e por servidores de nível superior”
por “equipes multiprofissionais”.
Há de se esperar que tais determinações sejam efetivamente cumpridas.
Atualmente, apesar da clareza da norma, atualmente as unidades de atendimento à
reabilitação profissional resumem-se a um perito-médico e um orientador profissional
(WÜNSCH, 2013).
Outro ponto a ser destacado o art. 404 da IN 77/2105, que introduz um
parágrafo único ao art. 370 da IN 45/2010, pelo qual “todas as modalidades previstas neste
artigo deverão ser monitoradas pela equipe de Reabilitação Profissional”, o que, ao menos
em tese, indica que a Previdência Social não pode mais deixar de interessar-se pelo
resultado da reabilitação profissional, delegando suas responsabilidades a terceiros, como
parecia admitir a normatividade anterior.
Até o advento do Decreto-lei n. 66 de 1966, que deu nova redação ao art. 24
da Lei n. 3807/60 (LOPS), era assegurada a plena reabilitação profissional, ou seja, a
percepção de auxílio-doença até o momento em que houvesse a efetiva recolocação
profissional ou o emprego do reabilitando, conforme revogada redação do art. 171, alínea
“g”, inciso I do Decreto n. 48.959/60.58 A partir daí, passou-se a admitir que o benefício
previdenciário cessasse no momento em que o órgão previdenciário considere que o
reabilitando está apto para o exercício de qualquer atividade que lhe garanta a subsistência
– mesmo quando tal não ocorre na prática.
Tal situação criou o paradoxo da “reabilitação incompleta”, nome dado por
Jaqueline Michels Bilhalva (BILHALVA, 2007, p. 494) para o estado de desamparo do
trabalhador que, não efetivamente reabilitado de modo a regressar competitivamente no
mercado laboral, recebe da Previdência Social uma “certificação de reabilitado”. Trata-se
de uma mera declaração escrita formal que pouco lhe serve para obter um emprego ou
uma ocupação adequada no, em geral, altamente competitivo mercado laboral. Diante
dessa situação, consideravelmente mais destrei, a referida autora sustenta ser possível
questionar a constitucionalidade de tal alteração normativa por violação do princípio de
“proibição do retrocesso” (BILHALVA, 2007, p. 491).
58 Art. 171. A prestação da reabilitação profissional será realizada pelas instituições, de acordo com asnormas gerais que forem expedidas pelo Departamento Nacional da Previdência Social, com a audiência doConselho de Medicina da Previdência Social e a participação das instituições de previdência social, as quaisobedecerão, entre outras, às seguintes bases técnico-administrativas:
g) acompanhamento do caso até a plena reabilitação profissional;
1.2.4.2 O difícil retorno ao mercado de trabalho e o inexistenteacompanhamento da reinserção laboral do trabalhador 59
A reabilitação ocorre quando há incapacidade laborativa para a atividade
habitualmente exercida – mas há capacidade para outra função -, estando as lesões já
consolidadas60, ou seja, não-agraváveis. Ao final do afastamento previdenciário,
constando-se a aptidão do trabalhador para nova profissão, este volta ao mercado de
trabalho, deixando de receber o benefício previdenciário. Pode-se pensar que, considerada
o trauma ocorrido e as dificuldades intrínsecas de retorno ao trabalho, o processo de
reabilitação profissional seja sempre indispensável, mesmo que seja simples certificação
de uma perfeita adaptação do trabalho a sua nova condição laboral.
Há de se diferenciar reabilitação e readaptação. Ambos os procedimentos
ocorrem quando há o comprometimento parcial da saúde física e/ou psíquica do
trabalhador para as atividades relativas suas atividades habituais. Porém a readaptação
profissional visa tornar o indivíduo apto a retornar às atividades habituais, proporcionando
meios de adaptação à(s) função(ões) compatível(eis) com suas limitações. Já a reabilitação
profissional compreende, além de readaptação, toda a assistência educativa e reeducativa
necessária para o reingresso de incapacitado no mercado de trabalho e no contexto em que
vivem (SUS, 2012). A reabilitação profissional compreende, ainda, a correção do posto de
trabalho, à assistência à recuperação e capacitação do trabalhador e, também, eventual
treinamento às atividades profissionais (SAMPAIO, 2005, p. 31).
Um processo efetivo de reabilitação profissional não pode se limitar à mera
adaptação do trabalhador a um posto de trabalho, ainda que este seja adequado a sua
capacidade. Deve haver, também, um processo de reeducação do trabalhador para que
assuma competentemente sua nova atividade, procedimento que envolve, além do
treinamento, a assistência, a motivação, a qualificação profissional, a conscientização
franca e objetiva de suas potencialidades e suas dificuldades em seu futuro profissional.
Além disso, a adaptação deve ter a preocupação ergonômica de, tanto quanto for possível,
adequar o posto de trabalho ao trabalhador – e não o contrário -, de forma a propiciar o
bem-estar no ambiente de trabalho e facilitar sua reinserção laboral.
As dificuldades de colocação em um mercado de trabalho, por si só altamente
competitivo, são consideravelmente maiores para o reabilitado, constituindo-se em óbices
59 Ver figuras 3 e 4, em anexo.
60 “As lesões são consideradas consolidadas quando o quadro clínico está estabelecido, não havendopossibilidade de se agravarem ou melhorarem os sinas ou sintomas por si só, ainda que necessitem detratamento posterior” (BARROS JR., 2012, p. 115).
para uma reinserção exitosa. São muitos os obstáculos para o emprego enfrentados no
dia-a-dia por pessoas com deficiência e incapacitados profissionais, que vão desde a falta
de transporte adaptado ao desconhecimento das deficiências e doenças por parte da
população em geral (FERREIRA, 2009).
Uma parte de tais obstáculos decorre objetivamente da perda da capacidade
laboral do trabalhador e de sua possível menor produtividade em relação à dos demais
trabalhadores. Tal defasagem será, provavelmente, maior relativamente quanto menor for
o nível de instrução do reabilitando. Assim, parece bastante plausível que, a par da
obrigação de empregar/manter o emprego de trabalhadores reabilitados, o empregador
seja incentivado financeiramente à manutenção do emprego de trabalhadores
reabilitados. Tal incentivo poderia ser feito deduzido do cota patronal da contribuição
previdenciária e teria como justificativa a de compensação dos possíveis prejuízos com a
contratação de trabalhadores, ao menos em tese, menos produtivos.
Entretanto, uma parte também importante dos obstáculos na reinserção do
trabalhador reabilitado decorre, não de fatores reais, mas de visões equivocadas, fruto do
preconceito contra o trabalhador que adoeceu ou sofreu um acidente de trabalho e que, em
função disso, tem sequelas que requerem sua readaptação funcional. A deficiência ou a
redução da capacidade laboral pode dar origem a situações de discriminação que exigem a
adoção de ações e medidas que melhorem substancialmente a situação desses
trabalhadores (FERREIRA, 2009).
Como conceito constitucional de discriminação, a definição de Roger Raupp
Rios (2008, p. 20), como sendo
“qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência que tenha o propósito ou o efeito deanular ou prejudicar o reconhecimento, gozo ou exercício em pé de igualdade de direitoshumanos e liberdades fundamentais nos campos econômico, social, cultural ou qualquercampo da vida pública”.
No ambiente laboral, o preconceito toma forma do estigma do “trabalhador
bichado”, ou seja, a ideia de que se trata de um trabalhador irremediavelmente inapto e que não
mais poderá apresentar um desempenho profissional satisfatório. Conforme pesquisa realizada
em 1980, na cidade de Bauru (BUENO, 1993), para verificar a atitude do empregador com
relação à contratação de pessoas com deficiência, as justificativas apresentadas para a não-
admissão foram calcadas em uma visão preconceituosa em relação ao potencial laborativo
destes trabalhadores. Assim, entre as respostas mais frequentes, estavam as de que pessoas com
deficiência produzem menos; apresentam maior índice de absenteísmo; criam uma imagem
negativa para a empresa; apresentam “risco de contágio”; são mais suscetíveis de sofrer
acidentes e gerar altos custos para a empresa; exigem adaptações no local de trabalho
excessivamente dispendiosas; “tiram o emprego” de pessoas sem deficiência
No retorno do trabalhador reabilitado constatam-se os mesmos preconceitos que
aparecem quando da contratação de pessoas com deficiência. Não raro, trabalhadores com
restrições passam a ser “cidadãos de segunda classe” nos locais de trabalho (MAENO;
VILELA, 2010, p. 92). Em um contexto de uma sociedade capitalista, por si só desigual, o
estigma do incapacitado torna-se instrumento de ampliação da desigualdade, de maior
exploração do trabalho e de exclusão do trabalhador (MACHADO; DORNELLES, 2007, p.
123).
A visão preconceituosa não se restringe ao empregador, mas, muitas vezes, é
compartilhada pelos colegas, pela comunidade e, mesmo, por familiares. Como bem aponta
Lopes (2005, p. 112), a perda incomensurável representada pela perda da capacidade laboral
exige que se encontrem saídas de auxílio e medidas de reabilitação que devem envolver toda a
sociedade. Trata-se de um desafio à toda a sociedade, o de provocar uma mudança do ponto de
vista sociocultural (FERREIRA, 2009). Para tanto, a realização de campanhas de
conscientização com a participação de entidades engajadas na promoção e defesa dos direitos
de pessoas com deficiência e incapacitados podem ser importantes instrumentos para superação
do estigma que recai sobre esse coletivo de trabalhadores.
Por outro lado, o retorno ao trabalho, em função diversa da que
desempenhava, por si só, representa um quebra na autoestima do trabalhador, pela perda
de uma posição profissional que possuía e que constituía parte de sua identidade e de uma
história da qual se orgulhava (BREGALDA; LOPES, 2011, p. 255). A reabilitação
profissional, assim, passa também como um desafio de superação ao trabalhador, de
aceitação de sua nova condição laboral. Depois de um período de afastamento, há sempre
um recomeço, um novo “modus operandi”, decorrente de atuação de um outro papel
profissional, adaptado a novas atribuições: há limites que devem ser incorporados e
aceitos, novas relações interpessoais e intergrupais que se estabelecem do novo átomo
social instituído (gerências, colegas de trabalho, a organização, a equipe, entre outros)
(SCHMIDT; BARBOSA. 2014).
Em teoria, o retorno às atividades laborativas deveria se dar em ambiente e
função adequados, sem risco de reexposição às mesmas condições de trabalho que
vitimaram o trabalhador. Para tanto, de fundamental importância o acompanhamento do
programa de reabilitação profissional, para que seja analisado se está ou não havendo uma
melhora da incapacidade/enfermidade do reabilitado na função disponibilizada (ALVES,
2014, p. 84). Assim, o acompanhamento previsto no inciso IV do art. 137 do Decreto
3048/9961 não pode ser interpretado como uma mera função estatística, pois “fixar o
trabalhador no mercado não é lhe arranjar uma colocação qualquer” (GONÇALVES;
GONÇALVES, 2010).
Ainda em tese, a reabilitação deve ser a mais rápida possível.62 Uma das
maiores dificuldades para a reinserção do trabalhador no anterior ambiente laboral é a
existência de uma distância temporal, tecnológica e organizacional a ser superada:
“O afastamento do trabalhador em decorrência de lesões por acidente ou por doençasocupacionais expõe o trabalhador a constrangimentos de ordem pessoal pelas limitaçõesfísicas, decorrentes de lesão, psicológicas, pelo trauma sofrido, e de ordem social, por excluí-lo (mesmo que temporariamente) do trabalho. Esses constrangimentos são agravados, quandode seu trabalho após o processo de reabilitação, por mudanças ocorridas nos processos deprodução ou na organização. Assim, o deslocamento entre as expectativas do trabalhador e anova realidade do ambiente de trabalho dever ser tanto maior quanto for o tempo deafastamento” (SIMONELLI, 2010, p. 73).
Teoricamente, o melhor cenário é aquele em que o trabalhador utilizasse esse
momento dramático de sua vida para habilitar-se em uma profissão melhor remunerada,
através de cursos de capacitação que lhe dessem uma melhor condição de competir no
mercado de trabalho. Entretanto, a prática demonstra grande dificuldade de atingir tal
desiderato, tendo em conta a baixa instrução de grande parte dos reabilitandos63.
Na maior parte dos casos, durante a reabilitação, o trabalhador está com seu
contrato de trabalho suspenso e, concedida a alta, retorna ao emprego anterior, devendo a
empresa recebê-lo e submetê-lo a um processo de recolocação em função distinta da que
habitualmente desempenhava na empresa.
Ao contrário do que ocorre em outros países, por exemplo, Portugal, onde o
Código de Processo do Trabalho, art. 4464, expressamente prevê a responsabilidade da
empresa pela reabilitação profissional, não há norma expressa a esse respeito, ainda que se
possa deduzir que tal responsabilidade do próprio contrato de trabalho e do dever patronal
de proteção do trabalhador contra os riscos da atividade produtiva.
61 Art.137. O processo de habilitação e de reabilitação profissional do beneficiário será desenvolvido pormeio das funções básicas de: (...)IV - acompanhamento e pesquisa da fixação no mercado de trabalho.62 A reabilitação profissional deveria ser realizada no menor tempo possível para evitar efeitos práticos esimbólicos do seu desligamento do mundo do trabalho. (MUELLER, J.L. Returning to work through jobaccommodation. AAOHN Journal, v. 47, n.3, p. 120-131, 1999 apud BERNANDO, 2006, p. 26).63 Um estudo sobre a relação entre reinserção profissional de acidentados e baixa escolaridade com base empesquisa realizada nas Varas do Trabalho de Salvador – Bahia em NERY, 2014. 64 Código de Processo do Trabalho de Portugal; Art. 44, I – O empregador deve assegurar a reabilitação profissional do trabalhador e a adaptação do posto de trabalho que sejam necessárias ao exercício das funções (PGDL, 2015).
Na impossibilidade de retornar à sua atividade laboral de origem, cabe à
empresa a recolocação do trabalhador, oferecendo-lhe uma variedade de postos de
trabalho, dando-lhe o acolhimento apropriado, promovendo as mudanças necessárias nos
vários aspectos do trabalho, tudo dentro de uma política e de um programa definidos com
o objetivo de se ampliar as suas possibilidades de reinserção (MAENO; VILELA, 2010, p.
94).
Ao desenvolver tais políticas, a empresa não pode agir seguindo apenas seus
interesses exclusivos, já que está, por delegação do órgão previdenciário, a promover um
processo de reabilitação profissional de relevante interesse público, que deve ser
desenvolvido de forma acordada entre reabilitando, empresa, demais trabalhadores e
órgãos governamentais.
Embora a preferência seja para reabilitação em “empregos competitivos”, ou
seja, sem nenhuma adaptação relacionada à deficiência (como é recomendado pela
Convenção 159 da OIT, art. 3º), a reabilitação, em geral, necessita de alguma adaptação
do emprego a ser realizada pela empresa. A lei não apresenta qualquer parâmetro para
a definição a respeito da obrigação do empregador em realizar tais alterações, nem
quando tais modificações, por serem excessivamente onerosas para o empregador,
deixam de ser exigíveis pelo empregado. Tampouco se prevê qualquer compensação
pecuniária ao empregador aos custos de adaptação do posto de trabalho.
Compete ao médico da empresa declarar a capacidade do trabalhador para
reassumir seu posto de trabalho ou indicar as modificações necessárias para seu
reaproveitamento na empresa (readaptação). Poderá ocorrer de o reaproveitamento
somente ser possível em função completamente diversa, implicando uma modificação de
condição essencial ao contrato de trabalho. Em tais casos, é recomendável que tal
alteração contratual seja feita não apenas com a expressa anuência do empregado, mas
também com ciência do sindicato profissional (MARTINEZ, 2002, p. 139).
A inevitável mudança de função do trabalhador reabilitado deve, tanto quanto
for possível, manter o nível profissional do trabalho. Entretanto, é curial que o trabalhador
reabilitado, como o trabalhador com deficiência, provavelmente terão uma produtividade
inferior da dos demais trabalhadores. Como se viu anteriormente (item 1.1.3), no direito
comparado, tal questão foi resolvida com um subsídio à empresa para compensação pela
perda de produtividade. Em comparação com o previsto no ordenamento jurídico de
outros países, são reduzidos os incentivos à empresa para cumprir a cota de emprego
de pessoas com deficiência ou reabilitados.
Na forma do art. 471 da CLT, o empregado afastado tem assegurado, quando
de sua volta, todas as vantagens que, em sua ausência, tenham sido deferidas à categoria a
que pertencia na empresa. Mesmo o aposentado por invalidez que tenha sua aposentadoria
cancelada por recuperação da capacidade de trabalho tem assegurado o direito à função
que ocupava ao tempo da aposentadoria (art. 475, parágrafo 1º, CLT).
Queixam-se os empregadores que a volta do trabalhador reabilitado pode ter
repercussões negativas no ambiente de trabalho. Do ponto de vista do gerenciamento de
pessoal, a situação pode, de fato, tornar-se incômoda para o empregador. O trabalhador
tem direito à percepção do mesmo salário, ainda que o cargo designado tenha um padrão
remuneratório inferior.65 Pode haver o descontentamento dos demais trabalhadores que,
desempenhando a mesma função, recebam salários menores. De qualquer sorte, não há
dúvidas quanto à legalidade do procedimento empresarial, de manter, a despeito do
contido no art. 461 da CLT, trabalhadores exercendo a mesma função com salários
diferentes, tendo em conta o contido no parágrafo 4º do mesmo artigo:
Art. 461 - Sendo idêntica a função, a todo trabalho de igual valor, prestado ao mesmoempregador, na mesma localidade, corresponderá igual salário, sem distinção de sexo,nacionalidade ou idade:(...)§ 4º - O trabalhador readaptado em nova função por motivo de deficiência física ou mentalatestada pelo órgão competente da Previdência Social não servirá de paradigma para fins deequiparação salarial.
Até recentemente, se entendia pela possibilidade de redução salarial do
trabalhador retornado quando este, trocando de função ou profissão, tivesse renda
equivalente ao salário anterior somando-se o novo salário e o auxílio-acidente. Entendia-
se que o trabalhador não poderia alegar a inalterabilidade das condições contratuais
previstas no art. 468 da CLT. Nesse sentido, a Portaria M.T.E. n. 3046/72, que
regulamentava o artigo 118 da Lei n. 8213/91, na sua antiga redação66:
1- É permitido ao empregador alterar o contrato de trabalho, trocando a função ouprofissão do empregado acidentado por outra para a qual tenha sido o referido empregadoreadaptado através de programa de reabilitação profissional, levado a efeito pelo InstitutoNacional de Previdência Social.
2- Fica estabelecido que a troca de função ou profissão só poderá ser feita por outrade nível inferior, quando o valor da remuneração, atribuído a essa função ou profissão somadoao auxílio-acidente, fixado pelo Serviço Atuarial do Ministério do Trabalho e Previdência
65 Hélio Gustavo Alves considera essa possibilidade “absurda”, porque, ainda que preserve o nível salarialdo trabalhador em um primeiro momento, na verdade o prejudica irreparavelmente em caso de despedida,pois, em novo emprego, terá de se submeter ao padrão salarial de mercado (ALVES, 2015, p. 72).66 Art. 118, parágrafo único (antiga redação): “O segurado reabilitado poderá ter remuneração menor do que a da época do acidente, desde que compensada pelo valor do auxílio-acidente, referido no § 1º do art. 86 desta lei”.
Social, resultar em renda total não inferior àquela que o referido empregado recebia antes doacidente.
Porém, a partir da Lei n. 9093/95, que revogou o parágrafo único do art. 118
da Lei n. 8213/91, o valor do auxílio-acidente não pode mais ser descontado do salário
pago pelo empregador ao empregado, entendendo-se o auxílio-acidente não tem natureza
substitutiva do salário, nem natureza alimentar, revestindo-se de natureza indenizatória
(sendo devido em virtude dos danos causados ao trabalhador) (BILHALVA, 2007, p.
495). Assim, o salário do trabalhador não pode ser descontado porque tal redução afronta
a garantia de irredutibilidade salarial prevista no inciso VI do artigo 7º da Constituição.
Em geral, as empresas consideram o retorno do trabalhador como um encargo,
a ponto de cogitarem, como primeira medida a ser adotada, a orientação ao empregado
para recorrer administrativamente da cessação do pagamento do benefício em virtude do
fim da reabilitação ou, elas mesmas, tomam essa providência, Além disso, o mais provável
é que a vaga do reabilitado não mais exista, pois já preenchida por um substituto, sendo a
despedida do trabalhador reabilitado, uma das opções que, lamentavelmente, o
empregador, na prática, lança mão, ainda que com risco das consequências de uma
sentença trabalhista que decrete a nulidade da despedida (MARTINEZ, 2002, p. 138-9).
Como bem apontam Maeno e Vilela (2010, p. 95), para que haja real
reabilitação, “é fundamental que haja uma relação de confiança entre o reabilitando, a
equipe de reabilitação profissional e a empresa, além de uma relação trabalhista por tempo
prolongado”, pois se assim não for, “fácil compreender que, se as possibilidades de
demissão forem grandes, a busca de uma aposentadoria por invalidez passa a ser uma
alternativa, mesmo que inicialmente não desejada pelo trabalhador”.
As visitas de equipes do programa de reabilitação profissional aos postos de
trabalho são “pontuais e restritas aos casos de sistemática resistência no retorno ao
trabalho”, constando-se uma fragilidade estrutural para negociar novos postos de trabalho
com as empresas (desconhecimento dos riscos existentes no ambiente, no processo de
trabalho e nas relações de trabalho), do que resulta um baixo nível de fixação dos
trabalhadores nas novas funções e na ineficácia da reabilitação profissional (SIMONELLI,
2010, p. 67).
O Ministério do Trabalho e Emprego não tem qualquer participação na
conferência da compatibilidade da nova função com as condições originais do
contrato de trabalho do trabalhador, o que representa uma grande responsabilidade das
equipes responsáveis pela reabilitação profissional ao concluir uma certificação
(SIMONELLI, 2010, p. 66).
Uma das consequências dessa omissão é o não-conhecimento das reais
condições de trabalho que vitimam os trabalhadores em acidentes de trabalho e doenças
ocupacional, o que dificulta sobremaneira a implementação de políticas de prevenção.
Poder-se-ia pensar em uma articulação dos programas de reabilitação profissional, não
apenas com o Ministério do Trabalho, mas também o acompanhamento pelas Comissões
de Acidentes de Trabalho (CIPAs) das empresas e com os sindicatos de trabalhadores
como um interessante fator de prevenção dos infortúnios laborais.
Além disso, não basta apenas a colocação no emprego, sendo imprescindível
para o sucesso de um emprego competitivo que haja também treinamento e capacitação
no local de trabalho, avaliação contínua e acompanhamento para a retenção do
emprego.67
O estabelecimento de um ambiente estável e com perspectivas de sucesso
profissional é indispensável para recuperar a autoestima e infundir a confiança necessárias
para superar o trauma e dissipar as dúvidas criadas por um episódico traumático que
interrompeu a trajetória profissional do trabalhador e reduziu-lhe a capacidade laboral.
Assim, não há boas perspectivas de efetiva reinserção laboral em emprego que não
assegura um mínimo de garantia de emprego por um tempo razoável.
Prevê-se a garantia de emprego, por um ano, do trabalhador vítima de acidente
do trabalho ou doença profissional (art. 118 da Lei n. 8.213/9168). A lei menciona que a
garantia inicia após o término do auxílio-doença acidentário, o que tem levado à
jurisprudência a não admitir estabilidade em casos de acidentes de trabalho que não levam
à percepção do benefício previdenciário, que somente é concedido após um prazo mínimo
de quinze dias de afastamento do trabalho – período que o empregador deve pagar pelos
dias parados.69 Não há estabilidade quando a doença não é ocupacional, ou seja, não
tem relação com o ambiente laboral e o benefício não é acidentário. No caso de
67 Estes são os componentes necessários para um emprego apoiado, segundo Wehman e Moon (WehmanPaul e Moon. M. Sherril, Vocational Reabilitation and supported emplayment, Baltimiore: Paul H.Brookes,1988 apud BUENO, 1993).68 Art. 118 – O segurado que sofreu acidente do trabalho tem garantida, pelo prazo mínimo de doze meses, amanutenção de seu contrato de trabalho na empresa, após a cessação do auxílio-doença acidentário,independentemente de percepção do auxílio-acidente.69 SUM-378 ESTABILIDADE PROVISÓRIA. ACIDENTE DO TRABALHO. ART. 118 DA LEI Nº8.213/1991. (,,,) II - São pressupostos para a concessão da estabilidade o afastamento superior a 15 dias e aconseqüente percepção do auxílio-doença acidentário, salvo se constatada, após a despedida, doençaprofissional que guarde relação de causalidade com a execução do contrato de emprego. (primeira parte - ex-OJ nº 230 da SBDI-1 - inserida em 20.06.2001).
trabalhador que retorna de aposentadoria por invalidez, a garantia de emprego somente
ocorre se esta decorreu de acidente de trabalho.
Apesar do contido na lei, por conta do preconceito existente na sociedade, não
há segurança do trabalhador no posto de trabalho reassumido, sendo bastante provável que
este seja despedido tão logo se esgote o período de garantia de emprego.
No Brasil, em que não há proteção geral contra a despedida imotivada, a
despeito do contido no art. 7º, I da Constituição Federal70, em relação ao reabilitado
profissional que não se enquadre art. 118 da Lei n. 8.213/91, há de se a despedida não foi
discriminatória, ou seja, se não foi motivada pela capacidade laboral reduzida do
trabalhador, caso em que configura a despedida deve ser considerada prática proibida, já
que limitativa do direito de acesso do trabalhador à relação de trabalho.
Ainda que se constate algum avanço a partir do novo Estatuto do Deficiente e
a inclusão do reabilitado profissional entre as hipóteses de discriminação vedadas pela Lei
nº 9029/05, a dificuldade de demonstração probatória de que o ato patronal de despedida
tenha tido motivação discriminatória, torna quase inócua tal disposição legal.
A despedida discriminatória ocorre, com especial frequência, sobre coletivos
mais vulneráveis de trabalhadores, no caso os mais idosos, grandes lesionados e os de
menor nível de instrução.
Por vezes, apesar da boa-vontade e dos esforços do empregador em oferecer
um posto de trabalho ao reabilitado, efetivamente, não há, no quadro de atividades da
empresa, uma função satisfatória, criando-se um impasse: o trabalhador detém uma
garantia de emprego de doze meses, mas não tem como ser aproveitado na empresa. Tal
poderá ocorrer por diversos motivos: as funções existentes são inadequadas ao potencial
laborativo do trabalhador; são por ele justificadamente recusadas por muito aquém de seu
nível de instrução/qualificação ou insuficientemente remuneradas; porque a reabilitação
profissional foi feita em área completamente diversa da do emprego anterior; porque as
atividades anteriormente desempenhadas criaram um trauma psicológico insuperável;
porque as adaptações necessárias são de tal monta que não podem ser razoavelmente
exigidas do empregador; etc.
Em todos esses casos, a reintegração no emprego anterior deixa de ser a
melhor solução e, nesse caso, a garantia de emprego assegurada pelo art. 118 da Lei n.
8.213/91 perde sua finalidade. Talvez fosse possível cogitar de um arranjo jurídico, pelo
70 Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de suacondição social: (...) I - relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nostermos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos;
qual esse trabalhador possa ser cedido, no período de garantia de emprego, a outro
empregador, que se responsabilizaria pela ocupação do trabalhador e pelo pagamento de,
pelo menos, parte dos salários. A outra parte poderia ser paga pelo empregador original, o
que, certamente, representaria um custo menor do que pagar os salários do trabalhador
deixando-o em casa sem trabalhar ou - a pior das soluções- sem ocupação efetiva, em
situação de verdadeiro assédio moral
Quando não é possível a reinserção na empresa, são buscadas outras opções
em outras empresas e, mesmo, formas alternativas de emprego domiciliar, trabalho
autônomo, atividade ocupacional no lar, emprego em atividade rural e cooperativas
(BUENO, 1993). Conforme Daniel Pulino71 (apud BILHALVA, 2007, p.483), devem ser
levadas em consideração as condições pessoais do segurado, entre as quais, a
escolaridade; a formação e a experiência profissional; a idade e a dificuldade do mercado
de trabalho).
Em tais casos, uma eficácia das medidas de integração no mercado de trabalho
exige dos profissionais encarregados da reabilitação profissional um conhecimento
aprofundado das alternativas de emprego existentes na comunidade, suas tendências e
peculiaridades, pelo que se exige o levantamento do mercado laboral; a identificação do
tipos de empresa e dos negócios existentes na área industrial, comercial, rural e urbana; a
identificação e análise das funções, critérios para contratação e os requisitos necessários
para desempenho das funções existentes; identificação se a empresa já contratou
trabalhadores deficientes no passado; identificação de que, na empresa, tem autoridade
para contratar os empregados para fins declarados; qual a filosofia da empresa e a atitude
da pessoa responsável pela contratação; quais as exigências da empresa em relação à
capacitação e experiência (BUENO, 1993).
Muitas72 vezes não se logra o reemprego do trabalhador, nem mesmo sua
recolocação profissional73. Nesses casos, há grande possibilidade de que o órgão
previdenciário conclua, mesmo assim, que o trabalhador esteja apto para sua inserção no
mercado laboral, dando por concluída a tarefa da reabilitação profissional. Em tais casos,
71 PULINO, Daniel. “A aposentadoria por invalidez no Direito Positivo Brasileiro”. São Paulo: LTr, 2001, p.127 apud BILHALVA, 2007, p.483.
72 Um impressionante estudo sobre as condições de trabalho do trabalhadores informais em MATSUO, 2009.
73 Recolocação profissional é mais ampla que o reemprego, ambos conceitos diretamente ligados à ideia depostos de trabalho no marcado laboral. A recolocação abrange não apenas o emprego propriamente dito, mastambém todas as outras formas de exercício profissional ou laborativo (BILHALVA, 2007, p. 481).
infelizmente, pesam mais critérios de mero cálculo econômico, ainda que isso represente o
abandono do trabalhador à sua própria sorte.
Outras vezes, a solução é buscada na qualificação para trabalho em
modalidade por conta própria.74 Conhecidas as dificuldades do empreendedorismo no
Brasil, em boa desses casos não se logra um resultado satisfatório, mas apenas se
direciona o reabilitado a um trabalho precário ou incerto, em geral mal remunerado e
informal.
Em todos esses casos não se responsabiliza a Previdência Social, que,
nesses casos, se limita à expedição do certificado individual de habilitação (art. 140
parágrafo primeiro, Decreto 3048/99)75. Restará ao trabalhador, apenas, requerer a
concessão de benefício assistencial ou a aposentadoria por invalidez que, caso indeferida,
poderá ser buscada judicialmente.
Não precisaria ser necessariamente assim. Quando o trabalhador não logra
uma reinserção satisfatória no mercado de trabalho, não é justo que seja jogado ao
desemprego com a supressão do benefício previdenciário. Se não encontra trabalho, não
pode ser entendido como reabilitado. Se o trabalho que encontra não é adequado e
suficientemente remunerado, da mesma forma, não se pode aceitar que haja supressão
total do benefício previdenciário. Nesse último caso, poder-se-ia cogitar de um benefício
progressivo, que protegesse a reinserção laboral no caso do trabalhador não ser
absorvido pelo mercado.
Para exemplificar como o modelo legal se mostra insuficiente, traz-se o relato
de um programa de reabilitação profissional reconhecidamente bem-sucedido, mas que, na
voz dos seus próprios responsáveis, mostra-se insuficiente e deve ser aperfeiçoado por
medidas que implicam, em parte, em alterações legislativas.
1.2.4.3 Uma experiência bem sucedida de um programa de reabilitaçãoprofissional
A seguir, relata-se uma experiência de um programa de reabilitação
profissional que tem sido destacado como dos melhores do país, o da agência do INSS de
Jundiaí, fruto de um trabalho conjunto da Previdência Social, da Prefeitura de Jundiaí e da
74 Assim considerado o trabalho autônomo, cooperativado ou em regime de economia familiar, com vista àemancipação econômica e pessoal (art. 35, III do Decreto n. 3298/99). 75 Art. 140 § 1º - “Não constitui obrigação da previdência social a manutenção do segurado no mesmoemprego ou a sua colocação em outro para o qual foi reabilitado, cessando o processo de reabilitaçãoprofissional com a emissão do certificado a que se refere o caput.”
Coordenadoria de Pessoa com Deficiência (PREFEITURA DE JUNDIAÍ. 2015).. Num
esforço de envolvimento de toda a comunidade de Jundiaí e de outras oito cidades da
região, o programa se dedica ao convencimento das empresas para que desempenhem seu
papel social, abrindo espaço para a contratação de pessoas com incapacidade ou com
deficiência. Ao segurado é garantida a manutenção do benefício previdenciário até ser
efetivamente contratado, período no qual é encaminhado a estágio de, no mínimo, 60 dias em
alguma empresa, que pode ou não ser o local onde ele trabalhava. Ainda proporciona formação
profissional através de convênios com o Sesc e Senai por meio do programa Pronatec. As
empresas são encorajadas a cumprir sua função social oferecendo contratos por experiência
para habilitandos e reabilitandos, ao final dos quais pode haver a contratação definitiva. Mesmo
depois que esta acontece, há o acompanhamento da vida profissional do ex-segurado por parte
do programa.
A seguir, descreve-se o procedimento padrão do Programa de Reabilitação
Profissional de Jundiaí. 76
Em geral, a inserção do reabilitado ao trabalho ocorre em duas situações
distintas, dependendo se o trabalhador tem ou não um vínculo empregatício.
No primeiro caso, a empresa é contatada, por ofício, para providenciar a
readaptação do trabalhador que a ela retorna. O retorno pode ser para a mesma função, o
que, naturalmente, o que exigirá adaptações do ambiente para acomodar o trabalhador que,
agora, apresenta restrições em relação à capacidade funcional que anteriormente detinha.
Ou pode ocorrer para função diversa, o que exigirá esforços adaptativos treinamento
maiores, tanto do trabalhador como da empresa. Em qualquer caso, um período de
adaptação do trabalhador à nova atividade é sempre necessário. Em muitos casos, será
necessária a elevação da escolaridade e a realização de cursos profissionalizantes e/ou de
elevação de aperfeiçoamento e qualificação profissional. Assim, a empresa é formalmente
solicitada a readaptar o trabalhador em função compatível com suas restrições, pelo que a
empresa deve indicar, se for o caso, uma nova função, o que será avaliado pela equipe do
programa, após a oitiva do trabalhador. Nesse ponto, eventuais dúvidas podem justificar a
inspeção do posto de trabalho pela equipe do programa. Como o procedimento
naturalmente causa grande angústia no trabalhador (medo, insegurança e desvalorização
pessoal), em alguns casos, há o atendimento por psicólogos e terapeutas ocupacionais.
A partir da aprovação do emprego proposto, estipula-se um período de
treinamento de trinta dias. Todo o processo de treinamento é acompanhado por terapeutas
76 Resumo baseado no detalhado relato da experiência de reabilitação profissional do programa da agênciade Jundiaí do INSS em BREGALDA; LOPES, 2011.
ocupacionais, com visitas à empresa com a finalidade de verificação das reais condições
de treinamento e/ou se o mesmo deve ser interrompido a fim de se construam outras
estratégias para reinserção do trabalhador no mercado laboral.
Ao final do treinamento, a empresa envia ao Programa relatórios de frequência
e de avaliação, concluindo pela aptidão ou inaptidão do trabalhador à função.
Caso a empresa considere apto o trabalhador, nova perícia é agendada e, se há
concordância do trabalhador e da equipe do Programa, dá-se o trabalhador como
reabilitado, emitindo-se o Certificado de Reabilitação Profissional.
No caso do trabalhador ser considerado inapto, a equipe do Programa avalia
se, efetivamente, não foram oferecidas condições favoráveis à reabilitação. Se tal ocorreu,
busca um consenso entre trabalhador e empresa para o retorno em outra função disponível.
Tal estratégia depende da boa-vontade da empresa que concorde com em disponibilizar ao
trabalhador outro posto de trabalho.
Se tal não for possível, opta, em geral, pela realização de atividades de
qualificação profissional em área de interesse do trabalhador, ainda que não relacionada ao
cargo exercido ou ao ramo de atuação da empresa. A tônica é a busca de alguma atividade
compatível com as condições de trabalho presentes do trabalhador e que lhe possibilite
angariar recursos para o sustento próprio.
O segundo caso é o do trabalhador que não tem vínculo empregatício. Tal
como no trabalhador com vínculo não-aproveitado na empresa de vínculo, a estratégia é
de buscar, a partir do interesse do trabalhador, ações que levem o trabalhador a outra área
de atuação profissional, com ênfase na elevação de escolaridade do trabalhador e no
encaminhamento/acompanhamento em cursos em variadas áreas de interesse.
O programa não prevê a efetiva inserção no mercado formal de trabalho ou o
acompanhamento do desenvolvimento do trabalho autônomo para o qual o trabalhador se
qualificou. Há uma Pesquisa de Fixação para acompanhamento da inserção dos
reabilitados depois de um ano de desligamento do programa, apenas para fins estatísticos
visando o aperfeiçoamento do sistema. Também há um acompanhamento do trabalhador
readaptado na empresa de vínculo para fins de cumprimento da garantia de emprego
prevista no art. 118 da Lei n. 8113/91. Em caso de constatação de descumprimento, há
comunicação do fato à fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego e ao Ministério
Público do Trabalho.
Do relato conclui-se que tal programa busca aproveitar ao máximo as
possibilidades que permitem um modelo de reabilitação profissional insuficiente regulado.
Tal como corretamente apontam Bregalda e Lopes (2011, p. 253), há uma insuficiência da
legislação atual que não determina a obrigatoriedade da efetivação da reabilitação
profissional por parte da empresa, nem estabelece um procedimento razoável em caso de
efetiva inexistência de funções compatíveis na empresa para acolhimento do trabalhador
reabilitando. Constatam os autores, como fatores que reduzem significativamente as
chances de reabilitação dos trabalhadores com vínculo empregatício a indisponibilidade
da empresa em reinserir seu funcionário com capacidade laborativa reduzida, a
inexistência de um programa empresarial para receber os funcionários que retornar da
licença previdenciária, além do descaso e/ou despreparo de grande parte das empresas
para lidar com essas questões. (BREGALDA; LOPES, 2011, p. 253, grifado).
1.3 CRÍTICAS AO MODELO DE REABILITAÇÃO PROFISISONAL
BRASILEIRO: INSUFICIÊNCIAS, OBSTÁCULOS E A REABILIAÇÃO
INCOMPLETA.
Da própria apresentação do modelo atual de reabilitação profissional é
possível constatar grandes insuficiências que, a partir de agora, são aprofundadas em
relação a, pelo menos três aspectos: insuficiências materiais, insuficiência de fomento à
criação/manutenção de empregos para reabilitados profissionais e insuficiente proteção
jurídica. Em relação a esta última, abordam-se os aspectos da insuficiente conceituação de
incapacidade laborativa, a insuficiente proteção do direito do reabilitado em sua reinserção
profissional e a insuficiente proteção a uma reabilitação efetiva, assim entendida como a
garantia de acesso, em ocupação efetiva, a um posto de trabalho adequado (voluntário,
decente, compatível com a situação pessoal do reabilitado e suficientemente remunerado).
1.3.1 Insuficiências materiais
O desmonte da reabilitação profissional no Brasil e do processo de resgate da
capacidade para o trabalho ocorrido dentro da Previdência Social brasileira nos últimos
quarenta anos, consistiu, conforme Hélio Gustavo Alves, numa das maiores afrontas à
dignidade humana (ALVES, 2015, p.15). Assim, o modelo de reabilitação profissional
tem sido caracterizado como um mero “mecanismo burocrático para redução de custos
com benefícios previdenciários”77.
77 Expressão utilizada por Maeno e Vilela (2010, p. 87)
Em 2012, dados do Instituto Nacional de Previdência Social (BRASIL, 2013)
davam conta que 18% das aposentadorias concedidas eram por invalidez, percentual que o
órgão estima como muito elevado; na verdade, o dobro do que o próprio INSS considera
como razoável. Por tais cálculos, metade desses aposentados poderia voltar ao mercado de
trabalho se a reabilitação profissional fosse mais eficaz. Além disso, os próprios serviços
de reabilitação profissional são subdimensionados, já que, embora alcancem 22 mil
trabalhadores por ano, com um despesa anual de R$15 milhões, estima o próprio INSS
que poderiam ser ampliados para atingir 600 mil trabalhadores. É relativamente pequeno o
número de municípios que contam com Centros de Reabilitação Profissional e, nos
existentes, há grandes insuficiências materiais e pessoais na prestação dos serviços.
Manifestando sua preocupação com a importância social do tema e, também,
com o impacto econômico sobre as contas da Previdência Social, o governo, em 2013,
buscando melhorar as condições de retorno dos acidentados ao mercado de trabalho,
anunciou a adoção do Cadastro Nacional de Trabalhadores Reabilitados e a
implementação do Programa Nacional de Reabilitação Profissional. Tratam-se de medidas
recentes que ainda não permitem uma melhor avaliação sobre sua efetividade na resolução
do identificado problema de baixa eficiência do modelo de reabilitação profissional na
reinserção do acidentado no mercado profissional, mas que podem iniciar um processo de
mudança no modelo de reabilitação profissional que altere substancialmente uma triste
realidade que os números oficiais parecem claramente indicar: para um número
inaceitavelmente alto de brasileiros vítimas de acidentes de trabalho ou doenças
profissionais não lhes é oferecida uma real oportunidade para reinserção no mercado de
trabalho, não lhe restando outro caminho do que uma precoce aposentadoria por invalidez,
com valores reduzidos e sem perspectivas de retorno à vida laboral.
De fato, constatadas as inconsistências do programa REABILITA, observou-
se, nos últimos anos, uma salutar mudança de rumos na legislação previdenciária
buscando constituir uma rede de proteção mais eficaz ao trabalhador reabilitado.
Entretanto, ainda são grandes as insuficiências da atual política pública, em especial no
que concerne ao descompromisso do Estado com a efetiva ocupação do trabalhador em
um emprego digno, estável e adequado às suas reais condições de trabalho como
reconhecimento de seu direito fundamental ao trabalho assegurado pela Constituição
brasileira.
A reabilitação profissional deve ser um programa para desenvolver atividades
terapêuticas e de profissionalização que abranjam a integralidade do indivíduo,
fortalecendo-o para lidar e superar as dificuldades impostas por suas incapacidades,
visando, além de sua estabilização física e a ampliação de movimentos sociais, cotidianos
e de trabalho através de uma identidade (CESTARI, 2012, p. 95). Para isso, o objetivo do
programa de reabilitação profissional somente pode ser tido como alcançado quando
resulta na inserção da pessoa em um trabalho que permita sua integração social plena.
São grandes as insuficiências na prestação assistencial e previdenciária no que
diz respeito à habilitação e à reabilitação profissionais: há falta de profissionais
especializados em reabilitação profissional; relutância no fornecimento de equipamentos
imprescindíveis ao processo de reabilitação (FERREIRA, 2009); dificuldades de acesso
aos serviços de saúde78; demora no encaminhamento aos serviços de reabilitação; não são
realizadas pesquisas eficientes que retratem as exigências atuais do mercado de trabalho
(DIAS, 2006). Em decorrência de problemas orçamentários, a realidade constatada em
todo o país é a da falta dos serviços de reabilitação profissional na maior parte das cidades
brasileiras. Onde estes existem, tais serviços não são prestados suficientemente: faltam
equipes multiprofissionais, médicos especialistas, peritos, verba para concessão os
auxílios previstos em lei aos reabilitandos, recursos para pesquisas e para
acompanhamento dos estágios nas empresas (COSTA, 2013, p. 112).
Mais grave, ainda, é a adoção de política pública privatizante com a
preocupação prevalente com os custos previdenciários, como ocorrido a partir dos anos
90, culminando com o programa REABILITA em 2001, que implicou em um verdadeiro
desmonte da reabilitação profissional no país, com o sucateamento da capacidade
instalada e dos recursos humanos anteriormente existentes nos CRPs (MAENO; VILELA,
2010, p. 87-92). Medidas particularmente grave – e, aparentemente já em vias de reversão,
como se viu - foram a extinção das equipes multidisciplinares na avaliação do processo de
reabilitação e a completa desobrigação da Previdência Social e sua delegação – sem
qualquer acompanhamento e supervisão-, às empresas na inserção do trabalhador no
ambiente laboral.
Capítulo especial reserva-se à problemática do reconhecimento da ocorrência
de acidente de trabalho ou de doença profissional, tanto pelas empresas como pelos órgãos
previdenciários, fenômeno conhecido como “subnotificação” acidentária. O não-
reconhecimento do acidente do trabalho tem grande impacto sobre o contrato de trabalho,
pois a descaracterização da enfermidade como acidentária fragiliza o trabalhador perante a
78 Em parte por conta da incorreta compreensão da reabilitação profissional apenas como um benefício daPrevidência Social – e não um cuidado à saúde. (TAKAHASHI, 2008)
empresa, seja pelo não-asseguramento da garantia de emprego, seja na assunção pela
empresa de suas responsabilidades de oferecer ao trabalhador reabilitado nova função.
Da mesma forma, a própria inscrição nos processos de reabilitação
profissional é deficiente, seja porque não é feita a devida eleição para participação no
processo, seja pela inexistência de oferta suficiente de programas de reabilitação
profissional.
Por outro lado, há enormes queixas quanto ao encerramento prematuro do
processo de reabilitação profissional, dando-se por “completo” a partir tão-somente da
alta médica, não se atentando para as reais condições materiais e sociais do trabalhador
retornar ao mercado de trabalho.
Não há dúvidas de que há um enorme caminho a percorrer na construção de
uma política integrada, envolvendo a Saúde, a Previdência Social, a Assistência Social e o
Ministério do Trabalho e Emprego no sentido de construir políticas integradas
consistentes, em projetos nacionais e locais, com o envolvimento da comunidade e com
apoio de políticas públicas complementares no campo da educação, da prevenção da
saúde, do combate ao trabalho inseguro e precário, entre outros.
Do ponto de vista jurídico, cabe indagar quais as possibilidades do cidadão
alcançar de forma suficiente e tempestiva os serviços de reabilitação profissionais que lhe
promete a Constituição e a legislação ordinária quando tais serviços não são prestados de
forma satisfatória pela Previdência Social.
A par da possibilidade de judicialização dos conflitos decorrentes de tais
insuficiências materiais, a medida mais efetiva é a reforma imediata de um modelo
preocupado com os custos orçamentários para outro, que coloque no centro de suas
políticas o melhor interesse do reabilitando e da sociedade, proporcionando ao trabalhador
a melhor assistência possível.
1.3.2 Insuficiente fomento ao emprego para os reabilitados profissionais
Entre o elenco de possíveis medidas legislativas que podem ser adotadas,
destaca-se um possível aperfeiçoamento da lei de cotas e na criação de um incentivo
pecuniário com vistas a assegurar efetividade à reserva de percentual de postos de trabalho
das empresas para pessoas com deficiência e reabilitados profissionais (art. 93 da Lei n.
8213/91).
Como visto, atualmente a cota de empregos existentes é obrigatória apenas
para empresas com mais de cem empregados, quando são as pequenas empresas as que
empregam pessoas com deficiência – e não as grandes.79 Faltam incentivos às empresas
para cumprimento da lei de cotas e nos estágios profissionais. Embora exista isenção de
encargos previdenciário para o aproveitamento de reabilitados/habilitados em estágios em
empresas conveniadas, este não existe nos contratos de emprego. Este é um dos motivos
pelos quais, em geral, os estagiários não são contratados ao final do estágio.
Deve-se reconhecer que a legislação existente não tem obtido bons resultados,
constando-se um “flagrante descumprimento da reserva de vaga por grande parte dos
empregadores” (LOPES, 2005, p. 113). Algumas empresas preferem, mesmo, sofrer
sanções a cumprir a cota de contratação de reabilitados/pessoas com deficiência. Villatore
(apud LOPES, ob. cit., p. 110) denuncia a “pseudocontratação”, na qual muitas empresas
simulam um contrato de trabalho apenas para cumprir a cota de pessoas com deficiência,
remunerando o trabalhador mas não permitindo que exerça qualquer função.
Em algumas empresas, o trabalho de pessoas com deficiência é difícil – ou
mesmo impossível -, em decorrência da atividade que desenvolvem (trabalho em minas e
subsolo, de alto grau de insalubridade, por exemplo), já que nestas se exige que o
empregado que esteja em perfeitas condições físicas, e até psíquicas, para o exercício da
função. Em tais casos, seria perfeitamente aplicável o exemplo do direito comparado (item
1.1.3), permitindo que tais empresas pudessem, alternativamente, contribuir para
determinado fundo que seria revertido para custear uma melhor estrutura material para os
centros de reabilitação. Seria uma maneira de angariar recursos para ampliar e melhorar a
estrutura dos serviços de reabilitação profissional. O mesmo poderia se pensar como
opção alternativa para empresas que tenham comprovada dificuldade de cumprir a cota,
ficando claro que o valor de tal contribuição alternativa deva ser de tal monta que tal
possiblidade não represente uma porta para um injustificado descumprimento tolerado da
lei.
Gláucia Lopes (2005, p.113) detecta a falta de incentivo e facilitação às
empresas para adaptações dos locais de trabalho e aquisição de equipamentos. Além disso,
no reaproveitamento do trabalhador reabilitado, há a necessidade de articular os cursos de
capacitação às reais necessidades das empresas, permitindo convênios em que as
empresas, em troca de contribuições a entidades especializadas possam utilizar desta mão-
79 Trinta e um por cento (31%) do total dos pessoas com deficiência encontram-se empregados em empresascom menos de cem (100) empregados. (NERI, Marcelo. CARVALHO, Alexandre Pinto de. COSTILLA,Hessi Guillermo. “Política de cotas e inclusão trabalhista das pessoas com deficiência. Site BNDES.Disponível em http://www.bndespar.com.br. Acesso em 13/4/2015)
de-obra treinada “a la carte” em postos de trabalho que necessitem. (LOPES, 2005, p. 109-
110). É apropriado que, nesse processo, haja um incentivo financeiro (seja por subsídio,
seja por isenção fiscal) às empresas que dele participassem80.
Na Argentina e Espanha, há uma isenção de 50% das contribuições patronais.
Na Itália, um desconto entre 50 e 100% (conforme o grau de incapacidade do trabalhador)
das contribuições previdenciárias e assistenciais durante um período que varia entre cinco
e oito anos. Além disso, o empregador tem reembolso parcial para as transformações
ocorridas em melhoria das condições de trabalho das pessoas com deficiência ou para
remoção de barreiras arquitetônicas (I.SOCIAL, 2015). A comparação com outros países
evidencia o atraso da legislação brasileira nesse sentido, o que afeta negativamente o êxito
do programa de inserção laboral do reabilitando em, pelo menos, três aspectos:
- não se incentiva a contratação, apenas se cria uma obrigação ás empresas,
apostando-se em medidas coercitivas, ao invés de promocionais;
- exige-se de todas empresas a contratação, quando nem sempre é possível,
não se oferecendo uma alternativa, que poderia ser uma compensação econômica que
reverteria a um fundo de fomento ao emprego de pessoas com deficiência e em
reabilitação profissional;
- incentiva a contratação em geral, mas não se incentiva a manutenção do
emprego, já que basta ao empregador substituir o reabilitando por outro, com deficiência
ou reabilitado, deixando o reabilitado despedido às vicissitudes do desemprego.
No caso brasileiro, em que a contribuição previdenciária é relativamente
elevada, haveria um espaço para isenção de parte da cota previdenciária patronal em
contratos em reabilitação profissional, o que teria um significativo impacto na
contratação desses trabalhadores. A certeza desse tipo de incentivo decorre no sucesso
desse tipo de política premial obtida por legislações recentes.
Assim, no Brasil, a isenção dos descontos previdenciários patronais para
incentivar a contratação de reabilitados e de pessoas com deficiência seria uma medida
recomendável, mesmo que fosse provisória. Marco Antônio Villatore admitiria até uma
isenção que variasse entre um ano e dezoito meses. Através dela poder-se-ia
“criar a aplicação e, por consequência, uma mais rápida conscientização dos empregadoressobre o ótimo trabalho desempenhado pelas pessoas portadoras de deficiência, desde quecontratadas em situações compatíveis, pois para cada deficiência normalmente existe, emcontrapartida, uma hipereficiência”.81
80 Maria Aparecida Gurgel chega a sugerir que, para incentivar as empresas, nesses casos, possa oempregador computar duplamente este posto de trabalho, tanto para fins da cota de pessoas com deficiênciaou reabilitados profissional, como também na cota dos aprendizes (art. 429, CLT) (LOPES, op. cit., p. 110).81 VILLATORE, op. cit.
A contrapartida de tais incentivos por parte dos empresários será a da
manutenção/criação de empregos para incapacitados e pessoas com deficiências, o que
justificaria um controle mais estrito a respeito de despedidas imotivadas e de medidas
imputadas como discriminatórias.
1.3.3 Insuficiências de proteção jurídica
1.3.3.1 Definição insuficiente do conceito de incapacidade laborativa
O conceito de reabilitação profissional, no âmbito da Previdência Social, é
demasiadamente restritivo e marcado pelo modelo biomédico, cuja tônica é a da
avaliação pericial pelo médico do INSS.
A avaliação da capacidade do trabalhador, no âmbito do setor de perícias da
Previdência Social, é uma operação marcada pela precariedade de informações82 e pela
desconfiança recíproca entre os atores decorrente de
“uma pré-compreensão equivocada e deturpadora das relações havidas entre médicos esegurados: os primeiros, mesmo subconscientemente, prejulgam os segundos comofalsificadores da realidade, aumentando as doenças e seus sintomas, e os segundos, na pré-compreensão de que os peritos são seus verdadeiros inimigos, únicos responsáveis peloindeferimento de suas pretensões” (COSTA, 2013, p. 112).
Sob tais condições, há de se reconhecer as grandes dificuldades para que o
Perito Médico do INSS consiga manter um equilíbrio entre os interesses tão contrastantes
em uma relação tensa e de tão graves consequências pessoais e sociais. Assim, os exames
periciais são realizados em um clima de desconfiança por parte dos profissionais de saúde
de que o trabalhador possa estar simulando os sintomas de sua doença, o que causa
inegável sofrimento ao trabalhador que, por conta de tal desconfiança, carrega “o peso de
uma dor não compreendida e nem aceita pelos outros”.83
Entretanto, a principal dificuldade reside na existência de um modelo
biomédico da deficiência que sustenta haver uma relação de causalidade e dependência
entre os impedimentos corporais e as desvantagens sociais vivenciadas pelas pessoas com
deficiência.
EDMILSON BARROS critica o modelo biomédico, relatando que, até
recentemente, a análise da capacidade para fins de assistência exigia que, para
82 “Nessa relação, o paciente tenta, ao máximo, omitir determinadas informações sobre os fatos que lheconvêm. Não há cooperação, tampouco confiança entre os envolvidos na perícia” (BARROS, 2012, p. 56).83 NARDI, H.C. “Saúde, trabalho e discurso médico” a relação médico-paciente e o conflito capital-trabalho.São Leopoldo: Ed. da UNISINOS, 1999. 140 p. apud BERNARDO, 2006, p. 27.
comprovação da deficiência, o periciado possuísse, além de uma doença incapacitante
para toda e qualquer profissão (omniprofissional), ainda incapacidade para os atos da vida
independente (não se alimentar nem se higienizar sozinho, por exemplo, necessitando
permanentemente de terceiros). A partir de decisões judiciais, passou-se a considerar, para
fins de comprovação de deficiência e como definição de incapacidade para a vida
independente, a incapacidade econômica de prover a própria manutenção por outros meios
que não o trabalho; bem como deixar de avaliar, para fins de comprovação da deficiência,
critérios e características relacionados à incapacidade para os atos da vida diária, entre os
quais a higiene, alimentação, vestuário, locomoção, instrução, excretores, manutenção
permanente de cuidados médicos, de enfermagem ou de terceiros. Tal mudança aproxima
significativamente, para fins de assistência social, o reconhecimento da situação de
incapacidade das pessoas com deficiência da que ocorre no caso dos incapacitados
profissionais. Em ambas, foca-se como principal fator de reconhecimento de déficit para
uma vida independente a ser reconhecido pelos órgãos assistenciais e previdenciários
exatamente o da incapacidade econômica de prover a própria manutenção pelo trabalho.
Apesar de tal avanço na compreensão das dificuldades de inclusão das pessoas com
deficiência, tal visão ainda é limitada, pois ainda permanece presa a critérios
eminentemente médicos, não considerando o ambiente social em que a pessoa com
deficiência está inserida.
A tese do modelo biomédico é contestada pelo modelo social que gerou a
Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF) e, assim, “não
apenas desafiou o poder médico sobre os impedimentos corporais, mas principalmente
demonstrou o quanto o corpo não é um destino de exclusão para as pessoas com
deficiência” (DINIZ, 2009).
O modelo internacional da CIF se constitui em um instrumento de avaliação
mais adequado para identificar as reais barreiras para a integração social do indivíduo
incapacitado ou com deficiência. Por este modelo, são analisadas, as funções e as
estruturas do corpo (fisiológicas e psicológicas), as atividades e a participação social,
aferindo-se holisticamente a incapacidade como resultante da interação entre a disfunção
apresentada pelo indivíduo (orgânica e estrutural), a limitação de suas atividades e a
restrição na participação social, correlacionando-se com os fatores ambientais que possam
atuar como facilitadores ou dificultadores do desempenho das atividades e da participação
(COSTA, 2013, p. 132).
A ideia básica do modelo social de incapacidade desenvolvido no Reino Unido
desde a década de 60 é que a incapacidade não deve ser entendida como um problema
individual, mas como uma questão eminentemente social. O ponto de partida teórica é que
a incapacidade “é uma experiência resultante da interação entre características corporais
do indivíduo e as condições da sociedade em que ele vive, isto é, da combinação de
limitações impostas pelo corpo com algum tipo de perda ou redução da funcionalidade
(lesão) a uma organização social pouco sensível à diversidade corporal”84. Assim, o
modelo social aposta em uma resposta política, de mudança de um ambiente não-
acomodatório trazido por atitudes e outras características do ambiente social
(SIMONELLI, 2010, p. 67).
Oliver critica os modelos de avaliação que superestimam a funcionalidade,
subestimando a subjetividade dos que vivem a experiência da deficiência ou da
incapacidade: ao procurar curar e manter dentro do funcionamento “normal” os
indivíduos, confunde-se incapacidade ou deficiência com doença e trata-se indivíduos
como se formassem um grupo homogêneo. Assim, uma incapacidade não significa,
necessariamente, não ter saúde (SIMONELLI, 2010, p. 67).
Como alternativa ao modelo biomédico, José Ricardo Caetano Costa propõe
uma investigação antropológico-filosófico existencial, de matriz fenomenológica em que
se procure “conhecer o outro” – ao invés de procurar-se o desvelamento do que ele é “a
partir do que (se pensa) que ele não é” (COSTA, 2013, p. 113). Para tanto, o “ato pericial
não pode se esgotar somente na avaliação das funções e estruturas do corpo” mas evoluir,
em uma mudança paradigmática, para uma “perícia complexa” que incorpore os novos
conceitos de incapacidade trazidos pela CIF e pela Convenção Internacional sobre os
Direitos das Pessoas com Deficiência, fornecendo um modelo etiológico das condições de
saúde em que se avalie, além das estruturas do corpo, as atividades e a participação
(SIMONELLI, 2010, p. 67, p. 117-13). A perícia complexa, assim, se situaria na transição
do modelo biomédico para o modelo social, calcada em uma nova visão sobre a
deficiência e a incapacidade.
Conforme Débora Diniz,
“há, pelo menos duas maneiras de compreender a deficiência. A primeira a entende como umamanifestação da diversidade humana. Um corpo com impedimentos é o de alguém quevivencia impedimentos de ordem física, intelectual ou sensorial. Mas são as barreiras sociaisque, ao ignorar os corpos com impedimentos, provocam a experiência da desigualdade. Aopressão não é um atributo dos impedimentos corporais, mas resultado de sociedades nãoinclusivas. Já a segunda forma de entender a deficiência sustenta que ela é uma desvantagem
84 OLIVER, M. “The politics of disablement”. London: Macmillan, 1990 apud SIMONELLI, 2010, p. 67.
natural, devendo os esforços se concentrarem em reparar os impedimentos corporais, a fim degarantir a todas as pessoas um padrão de funcionamento típico à espécie. Nesse movimentointerpretativo, os impedimentos corporais são classificados como indesejáveis e nãosimplesmente como uma expressão neutra da diversidade humana, tal como se deve entender adiversidade racial, geracional ou de gênero. Por isso, o corpo com impedimentos deve sesubmeter à metamorfose para a normalidade, seja pela reabilitação, pela genética ou porpráticas educacionais. Essas duas narrativas não são excludentes, muito embora apontem paradiferentes ângulos do desafio imposto pela deficiência no campo dos direitos humanos.”(DINIZ, 2009).
Assim, ao contrário de considerar um corpo com impedimentos como objeto
de saberes biomédicos, muitas vezes obrigatórios, em uma lógica de “medicalização dos
impedimentos”85, o modelo social de deficiência visa garantir a igualdade entre as pessoas
com e sem impedimentos corporais não se resumindo à oferta de bens e serviços
biomédicos, mas entendendo-a como uma questão de direitos humanos (DINIZ, 2009).
Através da adoção da CIF, supera-se “uma classificação de corpos por lesões
para uma avaliação complexa da inter-relação indivíduo e sociedade: uma pessoa com
doença não é simplesmente um corpo com lesões, mas um ser humano com lesões,
vivendo em um ambiente que normalmente oprime e segrega” (DINIZ, 2009).
Como já se mencionou, os conceitos mais avançados da Convenção
Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência foram incorporados pelo
recente Lei n. 13.146/2015, Estatuto da Pessoa com Deficiência, o que preconiza uma
significativa mudança na avaliação da incapacidade pelo órgãos previdenciários.
Conforme a nova lei,
“O processo de habilitação e de reabilitação tem por objetivo o desenvolvimento depotencialidades, talentos, habilidades e aptidões físicas, cognitivas, sensoriais, psicossociais,atitudinais, profissionais e artísticas que contribuam para a conquista da autonomia da pessoacom deficiência e de sua participação social em igualdade de condições e oportunidades comas demais pessoas.”
Assim, não é mais possível sustentar a manutenção de conceito superado de
incapacidade laborativa que se limite às avaliações biomédicas e subestime a avaliação
social.
O início desse processo de revisão do conceito de incapacidade laborativa já
começou, ainda antes do novo Estatuto. Assim, em 2008, para fins de concessão de
benefícios de prestação continuada, o Decreto n. 6564/08 já determinava que a avaliação
médica da deficiência e do grau de incapacidade considerasse as funções e estruturas de
corpo; que a avaliação social considerasse os fatores ambientais, sociais e pessoais; e que
85 “A presença somente da patologia não é pressuposto de uma incapacidade ou invalidez”. Por outro lado,“é possível que o indivíduo não tenha nenhuma patologia e seja considerado incapaz, haja vista uma série debarreiras sociais, limites pessoais e familiares, por exemplo, que o conduzem a esta condição” (COSTA,2013, p. 132).
ambas considerassem a limitação do desempenho de atividades e a restrição da
participação social, segundo suas especificidades. Conforme Instrução Normativa n. 45,
de 6 de agosto de 2010, art. 385, parágrafo 4º, “a avaliação social em conjunto com a
avaliação médica da pessoa com deficiência, consiste num instrumento destinado a
caracterização da deficiência e do grau de incapacidade, e considerará os fatores
ambientais, sociais, pessoais, a limitação do desempenho de atividades e a restrição da
participação social dos requerentes do Benefício de Prestação Continuada”.86
Os pressupostos do modelo CIF, ao adotar um modelo biopsicossocial em
substituição ao modelo biomédico, deve servir de parâmetro para uma avaliação de
incapacidade profissional que não se limite ao enquadramento formal de uma aptidão
funcional em abstrato para o trabalho, mas para uma concreta verificação das reais
condições do trabalhador de inserção no mercado laboral, identificando, além das
limitações biológicas e psicológicas, também as barreiras econômicas, ambientais e
sociais à efetiva reintegração.87
Outro importante aspecto na alteração do modelo médico para o modelo
social baseado na CIF é a compreensão de que o fator limitador é o meio em que a pessoa
está inserida - não a deficiência em si. Tal abordagem deixa claro que as deficiências não
indicam, necessariamente, a presença de uma doença ou que o indivíduo deva ser
considerado doente. Assim, a falta de acesso a bens e serviços deve ser solucionada de
forma coletiva e com políticas públicas estruturantes para a equiparação de oportunidades.
A isso se denomina “invalidez social”, conceito que tem embasado inúmeras ações
judiciais bem-sucedidas contra o INSS.88
Além disso, na abordagem da adaptação das condições de trabalho quando do
retorno do trabalhador ao seu local de trabalho, também há de se ter em conta uma
avaliação abrangente, compreendendo o trabalho em suas dimensões física, cognitiva e
organizacional, para o que tem relevante papel a análise ergonômica do trabalho (AET)
(SIMONELLI, 2010, p. 70). Esta é “uma abordagem de situações de trabalho que
86 Texto mantido pela IN 77/2015, conforme 409, parágrafo 4º.
87 Uma aplicação prática da CIF como modelo de avaliação de capacidade funcional em TOLDRÁ, 2011, p.10-22.88 A esse respeito, como exemplo, o caso de um trabalhador de 38 anos, amputado do braço direito, comescolaridade até a quinta série do primeiro grau, pedreiro e que sempre trabalhou em atividades braças aquem foi deferido benefício assistencial por ser reconhecida sua total incapacidade para prover seu sustentoe pela improbabilidade de sua reabilitação profissional (Processo da Justiça Federal- PR, 1ª T.Rec. n.201070610006935, Rel. José Antonio Savaris, 31/5/2010).
privilegia a relação entre as condições de trabalho e as atividades desenvolvidas pelos
operadores privilegiando estes últimos como foco central da análise”.89
Conforme Verbrugge90, a incapacidade, compreendida como um “gap” entre a
capacidade pessoal e a demandas das tarefas, pode ser reduzida por dois tipos de
intervenção: incrementando a capacidade das pessoas, seguindo o modelo biomédico mais
frequentemente usado ou ajustando a demanda das tarefas e, nesse caso, seguido os
pressupostos do modelo social da deficiência e da análise da atividade. Assim, na AET,
são analisadas as dimensões fática, cognitiva e organizacional do trabalho, finalizando
com um diagnóstico explicativo que possibilita uma intervenção adequada que permita
regular e administrar a distância do que foi proposto pela organização e o que é realmente
feito pelo operador. Situam-se, nessa regulação, as distâncias temporal, tecnológica e
organizacional entre a saída do trabalhador do seu local de trabalho antes do afastamento
por acidente ou doença ocupacional e seu retorno após a liberação pelo INSS. Trata-se,
portanto, de adaptar as exigências do trabalho à capacidade de quem o realiza, analisando
as atividades de trabalho, compreendendo adaptações dos meios físicos, seus conteúdos
organizacionais e processos técnicos às pessoas, reduzindo a distância entre a
incapacidade funcional e os objetivos da produção (SIMONELLI, 2010, p. 70).
Por fim, a AES pode, também, ser um auxiliar poderoso na identificação de
desequilíbrios entre o processo de trabalho e o ser humano para fins de prevenção de
adoecimentos, despertando um olhar crítico sobre outros processos e situações que ainda
apresentem potencial risco à saúde (SIMONELLI, 2010, p. 72).
Parece urgente que os avanços já acolhidos na avaliação de incapacidade para
concessão de benefícios de prestação continuada sejam também estendidos na avaliação
da incapacidade laboral para fins de concessão de reabilitação profissional ou da
aposentadoria por invalidez.
1.3.3.2 Insuficiente proteção do direito à reinserção no trabalho: a reabilitaçãoincompleta
A atual legislação não assegura ao trabalhador em processo de reabilitação o
acesso a uma efetiva recolocação profissional ou a um emprego concreto, dando-se por
finda a responsabilidade da Previdência Social quando esta entende que o trabalhador já se
89 GUERIN, et al. “Compreender o trabalho para transformá-lo: a prática da ergonomia”, 2ª ed, São Paulo:Edgar Blucher, 2007, p. 331-342, apud SIMONELLI, 2010, p. 67.90 VERBRUGGE, L.M; JETTE, A.M. The disablement proces. “Social Science Medicine”, v. 38, n. 1, p. 1-14, 1994 apud SIMONELLI, 2010, p. 67.
encontra apto para ser reinserido no mercado laboral. Assim, dá-se por terminado o
processo de reabilitação antes de que o processo de reinserção laboral efetivamente se
complete, ou seja, de que o reabilitando acesse realmente a um posto de trabalho. Tal
decisão é marcadamente arbitrária, baseada em considerações predominantemente
biomédicas e afastada de uma avaliação das reais condições sociais e pessoais do
reabilitando
Ao contrário do que se poderia esperar de uma legislação suficientemente
protetiva ao direito ao trabalho do reabilitando, atribui-se a responsabilidade de tal
insucesso ao próprio trabalhador, desconhecendo a existência de múltiplos fatores que
inviabilizam a reinserção laboral e que configuram uma situação psicossocial que se pode
caracterizar como uma verdadeira “invalidez social”. Por isso, como bem expressa
Jaqueline Michels Bilhalva, trata-se de uma reabilitação incompleta, que representa uma
situação consideravelmente menos protegida da prevista no ordenamento jurídico
brasileiro anterior a 1977. De fato, o revogado artigo 24 da Lei n. 3807/60 assegurava a
“plena reabilitação profissional”, garantindo ao trabalhador em reabilitação a percepção do
auxílio-doença até a efetiva recolocação profissional ou o emprego do reabilitando, o que
leva a mencionada autora a sustentar ser possível questionar mesmo a constitucionalidade
de tal alteração normativa por violação ao princípio de “proibição do retrocesso”
(BILHALVA, 2007, p. 491). Em tais casos, a Justiça, muitas vezes, reconhecendo a
reabilitação incompleta, determina a continuidade do benefício ou a aposentadoria por
invalidez do trabalhador.
A citar, jurisprudência do TRF da 4ª. Região:
“Restando demonstrada nos autos a incapacidade do autor para o exercício de sua profissãohabitual, e mostrando-se inviável – face às condições pessoais desfavoráveis – sua reabilitaçãoprofissional, defere-se o benefício de aposentadoria por invalidez. Precedente desta Corte.”(TRF-4, AC 1070 RS 2001.71.01.001070-9, 12/1/2005).
No mesmo sentido, decisão da Turma Nacional de Uniformização da Justiça
Federal:
“A interpretação sistemática da legislação permite a concessão da aposentadoria por invalidezse, diante do caso concreto, os fatores pessoais e sociais impossibilitarem a reinserção dosegurado no mercado de trabalho, conforme livre convencimento do juiz que, conforme obrocardo judex peritus peritorum é o perito dos peritos, ainda que a incapacidade seja parcial.Na concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, a incapacidade para o trabalhodeve ser avaliada do ponto de vista médico e social. (...) Segurado com 62 anos de idade,portador de hipertensão arterial e doença degenerativa. Baixa escolaridade. Baixíssimaperspectiva de reinserção no mercado de trabalho. A aplicação do princípio da dignidade dapessoa humana e a interpretação sistemática da legislação que trata da incapacidade conduzemà aposentadoria por invalidez, ainda que atestada a capacidade parcial do ponto de vistaestritamente médico.” (JUSTIÇA FEDERAL, TNU, 200583005060902, Julgamento17/12/2007).
Muitas vezes a reabilitação profissional sequer começa e o trabalhador-
segurado é dado como “apto” e jogado às vicissitudes do mercado laboral, com cessação
da percepção do auxílio-doença. Também nesses casos não se pode dizer que se
desrespeita o direito fundamental ao trabalho, negando-se o direito à uma reabilitação
profissional completa.
Lembrando o duro alerta de Robert Castell em relação aos “inválidos pela
conjuntura” (CASTEL, 2000, p. 68), ou seja, os excluídos do competitivo mercado laboral
imposto pela globalização econômica, Miguel Horvath Júnior propõe a criação de uma
“aposentadoria diferida por invalidez social” como um benefício previdenciário
continuado destinado a trabalhadores que comprovassem a sua não-absorção após tantos
meses pelo mercado de trabalho, apesar dos esforços para o retorno à atividade laboral
(HORVATH JR., 2008).
Por outro lado, o direito à aposentadoria por invalidez não pode ser encarado
como um sucedâneo adequado à uma reabilitação profissional, tendo em conta que o
direito ao trabalho não se limita à retribuição remuneratória, já que o trabalho é em si
mesmo um meio de autorrealização pessoal.
É equivocado pensar que a aposentadoria por invalidez representa uma saída
satisfatória para tal impasse. Tal pensamento é tributário da compreensão equivocada de
que o incapacitado, tal como a pessoa com deficiência, deva ser tratado de forma
assistencialista, ou seja, de que deva ficar permanentemente assistido por instituições não-
governamentais ou pelo Estado, o que caracterizaria “um cunho excessivamente
paternalista que acaba por tolher ou retirar mesmo, o inarredável direito de cidadania
plena, como constituir família, exercitar suas vocações ou inibindo seu desejo – e mesmo
necessidade – de entrar no mercado de trabalho” (FONSECA, 2000).
Mais importante é considerar a grave limitação existencial que caracteriza uma
aposentadoria precoce, uma verdadeira abdicação do trabalhador de uma dimensão de vida
tão importante como o trabalho, quando, pelo avanço das técnicas assistenciais e pela
evolução mesmo das formas de prestação laboral, tal abdicação não é, muitas vezes,
necessária. Nas palavras de Ricardo Tadeu Marques da Fonseca,
“o que hoje é consenso é a inexistência de limitações que não possam ser superadas com aconcessão de instrumentos adequados, instrumentos esses que retiram o deficiente da condiçãode assistido, colocando-o na de cidadão produtivo e contribuinte inclusive da SeguridadeSocial, útil à sociedade e ao país” (FONSECA, 2000).
Dessa maneira, a negação do direito ao trabalho pode ser dar tanto pela
negativa de eleição do trabalhador ao processo de reabilitação profissional, como pela
prestação incompleta do direito à reabilitação profissional plena, mas, também, pela
aposentadoria precoce e desnecessária, que se constitui, dessa forma, outra forma de
reabilitação incompleta.
Se a aposentadoria por invalidez pode ser a única alternativa nos casos de uma
reabilitação profissional impossível, há de se ter claro que tal decisão deva ser adotada em
última instância, como um reconhecimento do fracasso coletivo, também da sociedade e
do Estado, em obter a reinserção laboral do trabalhador.
Pelo exposto, há de se questionar se a legislação atual protege suficientemente
o trabalhador e, assim, cumpre o direito fundamental ao trabalho do reabilitado
profissional.
1.3.3.3 Proteção insuficiente a uma reabilitação efetiva: garantia de acesso doreabilitado à ocupação efetiva em um posto de trabalho voluntário, decente, compatívelcom sua situação pessoal e suficientemente remunerado.
Há grande incertezas quanto à definição da situação jurídica do reabilitando
durante todo seu processo de reabilitação, desde seu enquadramento de seu benefício
como acidentário ou previdenciário; quanto à manutenção de seu benefício previdenciário
em reavaliações; quanto ao seu direito à reintegração funcional no emprego de origem;
quanto à assunção de um posto de trabalho adequado no seu retorno à empresa; quanto ao
seu concreto aproveitamento nesse posto de trabalho; quanto à manutenção de seu
emprego. Algumas dessas incertezas tomam contornos mais graves e exigem imediata
regulamentação legal.
A primeira questão a ser enfrentada diz respeito à insegurança do trabalhador
quanto à sua situação jurídica no retorno ao trabalho, o que muitos autores, denominam de
“limbo jurídico” (MASSONI, 2012. Não raro, cria-se uma grave situação de insegurança
jurídica para o trabalhador já no retorno ao emprego de vínculo. Após a alta
previdenciária, o trabalhador se apresenta na empresa, e esta deve providenciar sua
reintegração ao emprego, podendo, para tanto, se necessário alterar as condições de
trabalho para bem de reaproveitar o trabalhador na mesma função ou readaptá-lo para
função diversa. Porém, muitas vezes, os empregadores se recusam a proceder à
reintegração apesar da alta previdenciária. Contrariando o laudo oficial, as empresas
negam o retorno do trabalhador com base em declaração de incapacidade do médico da
empresa e criam um impasse: o INSS considera o trabalhador apto para retornar ao
trabalho, mas, com isso, a empresa não concorda e, por isso, não permite o retorno do
trabalhador. Na maior parte das vezes, o médico da empresa declara a incapacidade do
trabalhador e reencaminha o trabalhador de volta ao INSS. Tal retorno, quando
formalizado, implica (ou deveria implicar) a continuidade do pagamento de salários
durante o período de afastamento do trabalhador até a data em que o órgão previdenciário
reestabeleça o pagamento do auxílio-doença, se tal ocorrer91. Assim tem entendido a
jurisprudência:
“PAGAMENTO DOS SALÁRIOS DO PERÍODO DE AFASTAMENTO POR MOTIVO DESAÚDE NO QUAL O DIREITO AO BENEFÍCIO JUNTO AO INSS NÃO ÉRECONHECIDO. RESPONSABILIDADE DO EMPREGADOR. Os efeitos das decisõesdivergentes entre a empresa e o INSS quanto à aptidão do empregado para o trabalho nãopodem ser meramente transferidos a ele, sob pena de impor-se ao empregado situação de totalinsegurança e de desprovimento dos meios para sua subsistência, em nítida afronta aoprincípio da dignidade da pessoa constitucionalmente assegurado. Invocada a responsabilidadesocial das empresas e a função social do contrato como respaldo à atribuição deresponsabilidade da empregadora. (TRT da 04ª Região, 6a. Turma, 0000290-94.2012.5.04.0733 RO, em 21/08/2013, Desembargadora Beatriz Renck - Relatora.Participaram do julgamento: Desembargador José Felipe Ledur, Desembargadora MariaCristina Schaan Ferreira)”
"SUSPENSÃO DO CONTRATO DE TRABALHO. CESSAÇÃO DO BENEFÍCIOPREVIDENCIÁRIO. DEVER DE REINTEGRAÇÃO IMEDIATA DO EMPREGADO.Dispõe o artigo 63, da Lei n. 8.212/91, cujo redação é transcrita no artigo 80, do decreto3.048/99 que "O segurado empregado em gozo de auxílio-doença será considerado pelaempresa como licenciado". Considerando-se que o empregado em auxílio-doença éconsiderado licenciado tem-se, como única peroração lógica que, "contrario sensu", findo obenefício previdenciário, cessa o período de suspensão e o contrato tem sua vigênciaretomada incontinente e, por consequência, devem ser adimplidas todas as obrigaçõeslegais e contratuais existentes entre as partes, eis que se considera de forma automática oempregado à disposição do empregado"(TRT-SP-2ª Região-Proc.00285006920095020361-Ac. 4ª Turma 20110199043-Rel. Desemb. Ivani ContiniBramante-Publ. no DOE de 04.03.2011).
EMENTA: RETENÇÃO SALARIAL INJUSTIFICADA - CONDENAÇÃO AOPAGAMENTO DOS SALÁRIOS RETIDOS MANTIDA. Esgotado o período de suspensãodo contrato de trabalho, a regra impositiva de pagamento de salários volta a ter eficácia,mormente quando há prova inconteste, como “in casu”, de que o obreiro se apresentouimediatamente ao serviço para retorno às atividades laborais. Nesse contexto, se aempregadora entendia que o empregado ainda não teria condições de saúde adequadas auma rotina laboral, caberia a ela, para se eximir de sua obrigação de pagamento de salários,recorrer contra a decisão do INSS de cessação do referido benefício previdenciário, da qualresultou o término do período de suspensão do contrato de trabalho. Não tendo a reclamadaassim procedido, deve arcar com a indenização relativa aos salários injustificadamenteretidos, nos termos da condenação imposta em primeiro grau"((TRT da 3.ª Região;Processo: 00577-2011-065-03-00-1 RO; Data de Publicação: 11/11/2011; Órgão Julgador:Primeira Turma; Relator: Marcus Moura Ferreira; Revisor: Convocado Eduardo Aurélio P.Ferri; Divulgação: 10/11/2011. DEJT. Página 127)
91 Se o exame de retorno ao trabalho resultar na inaptidão para a nova função, um atestado de saúdeocupacional (ASO) de inaptidão deve ser lavrado pelo empregador (Ibid., p. 140).
RESPONSABILIDADE POR SALÁRIOS DE EMPREGADO CONSIDERADO INAPTOPELA EMPRESA APÓS ALTA PREVIDENCIÁRIA É DO EMPREGADOR TRT/SP - Altamédica do INSS. Recusa do trabalhador pela empresa. Impossibilidade Data da publicação dadecisão - 27/10/2010. PREVIDÊNCIA SOCIAL Auxílio-doença Alta médica do INSS.Recusa do trabalhador pela empresa. Impossibilidade. A alta médica é um ato administrativo eeste goza de presunção de boa-fé e correção. Não pode o particular (empregador) descumpriro ato administrativo e impedir o acesso da trabalhadora ao trabalho e respectivos salários. Se aempresa entende que não deve receber o empregado nas suas dependências porque ainda estádoente, deve questionar a alta médica no Juízo competente. E, até obter decisão favorável,deve pagar os salários do período. O que não se admite é que, diante da alta do INSS, com acessação do benefício previdenciário e a recusa do empregador e ausência de salários, oempregado fique à própria sorte, sem obter sua subsistência de qualquer dos lados. Recursoordinário não provido. (TRT/SP - 00585200831202007 (00585200831202007) - RO - Ac. 3ªT20101083593 - Rel. ANTERO ARANTES MARTINS - DOE 27/10/2010)
Ocorre que nem sempre o retorno à Previdência Social é formalizado pelo
empregador e nem sempre a empresa mantém ou se responsabiliza pelos salários do
trabalhador, deixando-o em um “limbo”. É uma situação de completo desamparo na qual
as saídas possíveis para o trabalhador parecem ser: ou uma difícil, incerta e demorada ação
judicial contra a Previdência Social (recorrendo da decisão que negou a continuidade de
pagamento do benefício ou requerendo a aposentadoria por invalidez) ou o acionamento
do empregador na Justiça do Trabalho (onde é seu o ônus da prova de que houve recusa de
reintegração por parte da empresa – e não o abandono de emprego que, provavelmente,
será alegado pelo empregador).
Há uma proliferação de casos judiciais similares, em que a controvérsia se
situa justamente na definição da situação jurídica do trabalhador retornado, ou seja, na
suspensão ou não do contrato laboral por conta de benefício previdenciário ainda pendente
de decisão administrativa.
Exatamente dessa situação confusa92 têm se aproveitado empregadores mal-
intencionados que, aproveitando-se da dubiedade da situação, deixam de formalizar sua
recusa de reintegração e simplesmente “aconselham” informalmente o trabalhador a
recorrer administrativa ou judicialmente, eximindo-se de qualquer responsabilidade pelo
período de afastamento. Por desconhecimento de seus direitos ou por temor reverencial,
muitos trabalhadores aceitam tal situação e submetem-se a aguardar uma decisão
definitiva, administrativa ou judicial, mesmo sem qualquer salário ou benefício para sua
manutenção durante esse período. Ainda pior: em caso de indeferimento definitivo da
prorrogação do benefício, não raramente os empregadores alegam “abandono de
92 Confusão que se agrava a partir da “alta programada”, modificação introduzida pelo Decreto nº 5.844, de13 de julho de 2.006, que alterou o artigo 78, do Decreto nº 3.048/99 dentro do programa CPES (CoberturaPrevidenciária Estimada).
emprego”, transferindo a responsabilidade pela inexecução do contrato de trabalho ao
empregado.
Tenha-se em conta o teor da Súmula 72 do TST, pela qual “presume-se o
abandono de emprego se o trabalhador não retornar ao serviço no prazo de 30 (trinta) dias
após a cessação do benefício previdenciário, nem justificar o motivo de não o fazer”. Tal
entendimento, adotado muitas vezes de maneira acrítica, tem justificado decisões judiciais
que chancelam uma despedida sumária do trabalhador por justa causa em razão de
abandono de emprego. Cria-se uma situação de grave injustiça: o trabalhador doente não
tem prorrogado seu benefício e perde os salários por ter o empregador recusado seu
trabalho depois da alta previdenciária; como reabilitado profissional que não retornou ao
trabalho, perde, também, a garantia de emprego que lhe é assegurada por lei; e, por fim,
não recebe boa parte de seus direitos rescisórios.
Em tais casos, necessariamente a recusa da empresa em reintegrar o
trabalhador deveria ser formalizada à Previdência Social e ao próprio trabalhador através
de comunicado escrito acompanhado do laudo do médico da empresa. A recusa, nesses
casos, deveria tomar a forma de recurso administrativo da empresa sem prejuízo do
recurso que poderia ser feito pelo próprio trabalhador. No período, o contrato seria
entendido como interrompido, sem a prestação de serviços mas com a manutenção do
pagamento dos salários do período. Se a Previdência Social, ao decidir o recurso
administrativo, recusasse a continuidade do pagamento do benefício (confirmando a
decisão administrativa anterior, de não-ocorrência de incapacidade laboral do trabalhador),
os salários do período de afastamento serão de inteira responsabilidade da empresa. Em
caso de decisão favorável ao empregado, o valor dos benefícios retroativos poderão ser
objeto de compensação com os salários pagos pelo empregador.
Nos casos (pouco prováveis) que o empregado, efetivamente, optou por não
trabalhar, assumindo todos os riscos inerentes à essa recusa; em não se apresentar na
empresa para trabalhar; ou na constatação de um (sempre algo duvidoso) “acordo tácito”
entre trabalhador e empresa quanto à não prestação de trabalho; no mínimo, em uma
interpretação mais conforme do direito fundamental ao trabalho, haveria de entender pela
ocorrência de suspensão do contrato de trabalho (sem o pagamento de salários), não se
configurando a hipótese de abandono de emprego.93 A aceitação de tal acordo, como
93 Podem ser citadas decisões nesse sentido: Proc. 00436200926102000 – RO TRT 2ª Reg – 2ª T. - Rel.Rosa Maria Zuccaro) e TRT 12ª Reg. Proc. RO 0002074-22.2013.5.12.0021 – (Ac. 3ª T 17.9.13) – RelªJuíza Lígia Maria Teixeira Gouvêa. TRT-SC/DOE 30.9.13. Data de Publ. 1.10.13)
garantia de sua idoneidade, poderia ser objeto de homologação necessária do sindicato
profissional.
Urge que se regulamente a situação, definindo claramente as
responsabilidades de INSS e empresas quanto à manutenção dos ganhos do trabalhador
durante o período em que este recorre da recusa de prorrogação do benefício
previdenciário.
Um segundo ponto a ser abordado diz respeito aos problemas que surgem no
processo de reintegração do trabalhador na empresa de vínculo, suas necessidades
adaptativas, seu reenquadramento funcional e a redefinição de tarefas e seu direito à
ocupação efetiva.
Como se viu anteriormente (item 1.2.4.2), o retorno às atividades laborativas
anteriores deveria se dar, o mais breve possível, em atividades isentas do risco de
reexposição aos riscos que vitimaram o trabalhador ou que possam agravar sua
enfermidade/incapacidade. Assim, o trabalhador reabilitado precisa ser acompanhado e
assistido durante todo o processo, tanto em possíveis necessidades de readaptação das
condições laborais na função primitiva, seja no caso de reenquadramento em outra função
dentro da empresa.
Como se constatou dos relatos anteriores, é considerável a resistência das
empresas em reintegrar adequadamente o trabalhador reabilitado quando de seu retorno
com alta previdenciária. Como afirma Toldrá (2011, p. 32), empiricamente
“de maneira geral, quando os trabalhadores retornam ao trabalho são, por vezes, lotados emfunções incompatíveis com seu quadro clínico-funcional e/ou com a sua formação equalificação, ou simplesmente deixados à margem do processo produtivos ou “encostados”,reforçando, às vezes, experiências de fracasso vivenciadas pelos trabalhadores do estudo”.
Embora a legislação laboral preveja o retorno do trabalhador às condições
anteriores como uma simples retomada do curso de um contrato de trabalho suspenso, a
realidade é bastante mais complexa, sem que existam normas adequadas a dar conta de tal
complexidade. A proteção ao trabalhador retornado se faz nos termos da regra geral do art.
468 da CLT, aquele que determina que, em obediência ao princípio da continuidade e
tendo-se em conta que o contrato de trabalho é de trato sucessivo, presume-se que, em
regra, o pactuado anteriormente entre as partes deve-se entender como indefinidamente
prorrogado e insuscetível de alterações unilaterais. Parece evidente a insuficiência de tal
disposição normativa pela simples evidência de, no caso do reabilitado profissional,
houve, pelo menos, uma alteração fática importante: a modificação das possibilidades de
prestação da obrigação por uma das partes.
Tal artigo, que visa estabelecer limites ao poder de direção empresarial,
embora estabeleça a inalterabilidade das condições essenciais do pacto laboral, não se
destina a estabelecer proteção especial ao trabalho, mas justamente assegurar que, dentro
de parâmetros razoáveis, o contrato de trabalho seja suficientemente flexível para
viabilizar a gestão produtiva. A aplicação direta da referida norma ao caso concreto, sem a
ponderação de outras possivelmente incidentes (como, por exemplo, normas de segurança
de medicina do trabalho, de limitação da jornada ou, mesmo, para contingentes específicos
de trabalhadores, como no caso, do reabilitado profissional), termina por oferecer uma
ampla margem de autonomia ao empregador na determinação no conteúdo da prestação de
trabalho, de forma que, na prática, será o empregador que decidirá qual função e que
atividades prestará o trabalhador no seu retorno. Não existe qualquer disposição legal que
regule, na forma e no conteúdo, tão relevante decisão sobre a vida profissional do
trabalhador reabilitado, deixando nas mãos do empregador – na realidade, na sua boa-
vontade e boa-fé – se o trabalhador retornará ou não à função anterior ou se será designada
para atividades adequadas às suas novas condições.
Também competirá exclusivamente ao empregador decidir sobre adaptações
eventualmente necessárias no processo de reabilitação. Ainda que o inciso VI do artigo
sexto do Estatuto da Pessoa Deficiente mencione o conceito de “adaptações razoáveis”94,
não há uma norma trabalhista que transponha tal conceito para o âmbito laboral,
embasando o direito do reabilitado a compelir o empregador a adaptar o posto de trabalho
às necessidades de suas condições pessoais.
Em caso em que a alteração da função desempenhada pelo trabalhador seja
necessária por conta da incapacidade relativa do trabalhador, não há falar em proibição
das condições essenciais do contrato de trabalho prevista no art. 468 da CLT e a
inexistência de outra norma específica que regule a matéria abre margem à interpretação
de que não haja qualquer limite ao poder de direção empresarial, podendo o empregador
transferir o trabalhador como melhor lhe aprouver. Nesse caso, dever-se-ia entender pela
ocorrência de novação contratual, sendo que a decisão de alterar o conteúdo da prestação
94 Art. 3, VI – “Adaptações razoáveis: aquelas adaptações, modificações ou ajustes necessários e adequadosque não acarretem ônus desproporcional e indevido, quando requeridos em cada caso, a fim de assegurar quea pessoa com deficiência possa gozar ou exercer em igualdade de condições e oportunidades com as demaispessoas, todos os direitos e liberdades fundamentais”.
laboral não poderia caber exclusivamente ao empregador, mas deveria decorrer de um
consenso entre trabalhadores, empresa e Previdência Social.
Como anteriormente mencionado, em muitos casos, o empregador
simplesmente opta por não atribuir ao empregado qualquer função, deixando-o na
“prateleira”, ou seja, em total inatividade, o que tem sido entendido, pela jurisprudência,
como uma lesão ao patrimônio moral do trabalhador, ensejando, mesmo, indenização por
dano moral:
EMPREGADO COLOCADO EM SITUAÇÃO DE OCIOSIDADE NO SERVIÇO.ATENTADO CONTRA A DIGNIDADE DO TRABALHADOR. DANOS MORAIS. Ocontrato de trabalho é contrato de atividade, de trato sucessivo e sinalagmático. As principaisobrigações do empregador são as de oferecer trabalho e de pagar os salários referentes aosserviços realizados. Nessa medida, o trabalho presta-se como veículo de inserção profissionale social, de modo a contribuir para a elevação da dignidade da pessoa que labora (art. 1º, IIIe IV, da CF/88). Então, colocado o empregado em situação de ociosidade, de forma aimpingir-lhe a conotação de que é importante para a consecução dos fins normais da empresa,revela-se patente o contexto vexatório, apto a ensejar a reparação monetária dos danos moraisadvindos da conduta ilícita do empregador. (TRT 3, 3ª. T. -RO 01054201000403001 0001054Rel. Marcio José Zebende- julg. 09/5/2011.
Além disso, a lei não estabelece uma obrigação do empregador de
acompanhar e assistir o empregado em seu processo de reinserção laboral, ainda que se
pudesse razoavelmente concluir que tal pudesse estar inserida em um dever geral de boa-
fé do empregador decorrente do contrato de trabalho. Nesse sentido, há um grande vácuo
legislativo no que concerne à responsabilidade da empresa quanto ao reabilitando, tanto
no que concerne à obrigatoriedade de oferecimento de um posto de trabalho compatível
às condições laborativas do trabalhador, quanto à existência de um programa de
acolhimento do reabilitando, em especial o respeito de seu direito à ocupação efetiva no
posto oferecido.
Por certo, as avaliações, acompanhamento e ajustes necessários em um
processo adaptativo do trabalhador ao posto de trabalho não podem ser atribuição
exclusiva das empresas, tal como foi desenhado institucionalmente no Projeto Reabitado
(2001) mas são, precipuamente, de responsabilidade do INSS, que tem o dever legal de
acompanhamento e supervisão de todo o processo. Nesse sentido, a omissão estatal
termina por deixar a cargo unicamente da empresa todos os encargos de acompanhamento,
o que tem sido também objeto de queixa dos empresários.
Além disso, a obrigação do empregador não se limita ao mero oferecimento do
emprego, mas inclui o dever de dar conteúdo concreto à prestação laboral, o que se
denomina de dever de “ocupação efetiva” a um posto de trabalho adequado (MARRERO,
1993, p. 27). Assim, pode-se falar de um direito do trabalhador reabilitado a uma
ocupação efetiva.
Tal dever corresponde ao interesse do trabalhador em satisfazer seu direito à
realização profissional através do trabalho. Assim, não se admite que o empregador
injustificadamente mantenha o trabalhador inativo, sem dar-lhe qualquer tarefa, ainda que
pagando-lhe os salários. Tal situação fere a dignidade do trabalhador, abala sua
autoestima, causando-lhe incerteza quanto ao seu futuro, compromete sua imagem e
constitui motivo de desvalorização profissional. Além disso, a ocupação efetiva é
instrumento de efetivação de outros direitos laborais, como a não-discriminação, a
promoção profissional e a participação em assuntos coletivos dos trabalhadores.
Assim, entende-se que a não-ocupação efetiva do trabalhador representa uma
violação do princípio de boa-fé e um abuso de direito por parte do empregador. A
privação do trabalhador de executar tarefas para as quais foi contratado, muitas vezes, é
uma forma de pressioná-lo a pedir demissão, o que configura uma forma de assédio moral.
Um terceiro ponto é ser observado é de que o direito ao trabalho do reabilitado
não pode se resumir ao acesso a qualquer posto de trabalho, o que implica, em tese, na
existência de um direito do reabilitado a, justificadamente, recusar o posto oferecido
quando ele não atende a determinadas condições, sem prejuízo do prosseguimento do
processo de reabilitação, que somente se completa quando, efetivamente, o reabilitando
obtém um trabalho satisfatório.
Curial que a aceitação do posto oferecido pelo trabalhador deve ser voluntária,
de modo que não há como obrigar o reabilitando a trabalhar contra sua vontade, ainda que
seja possível suspender a concessão do benefício previdenciário em caso de recusa
injustificada. A reinserção laboral do trabalhador deve ser real, ou seja, o trabalho a ser
prestado pelo trabalhador deve ter sentido para este, o que implica na afirmação dessa
natureza necessariamente voluntária do direito ao trabalho e, por consequência, em um
direito a recusar justificadamente um posto de trabalho que lhe seja intimamente
incompatível. Como exemplo, pode-se citar evangélico que se recuse a laborar, como
garçom, em uma casa noturna.
A escolha de uma atividade profissional, especialmente em momento crucial
de retomada de uma carreira ou início de um novo ciclo produtivo em atividade diversa é
decisão difícil e de grande peso para o projeto existencial do trabalhador. Assim, há de se
reconhecer uma grande margem de subjetividade na escolha de uma nova profissão ou na
assunção de novas tarefas, sendo admissível a justificativa de que o trabalhador com nova
atividade não se identifica e nela não se reconhece e que, assim, possa exercer seu direito
de recusa. Por certo, a justificativa não pode se basear em simples capricho ou exigências
excessivas, competindo ao trabalhador aportar razões relevantes que permitam qualificar a
recusa como justa e razoável.
Pode-se elencar outras características de um posto de trabalho adequado, que,
em contrário senso, definiriam as possibilidades de recusa do reabilitando quando tais
condições determinadas não se verificassem.
Antes de tudo, o posto de trabalho deve atender, como requisito mínimo, o de
ser um trabalho decente ou digno dentro dos padrões da Organização Internacional do
Trabalho, ou seja, que respeite os direitos no trabalho, em especial os definidos pela
Declaração Relativa aos Direitos e Princípios Fundamentais no Trabalho de 1988 OIT
(OITBRASIL, 2015)95. Também conforme a OIT o trabalho decente deve corresponder
às aspirações do ser humano no domínio profissional, abarcando vários elementos:
“oportunidades para realizar um trabalho produtivo com uma remuneração equitativa;segurança no local de trabalho e proteção social para as famílias; melhores perspectivas dedesenvolvimento pessoal e integração social; liberdade para expressar as suas preocupações;organização e participação nas decisões que afetam as suas vidas; e igualdade deoportunidades e de tratamento para todas as mulheres e homens”. (OIT-Lisboa, 2010).
Não é aceitável, assim, um trabalho oferecido em condições discriminatórias,
degradantes ou que não lhe garantias as condições existenciais mínimas para uma vida
saudável.
Além disso, o posto oferecido deve ser compatível com as condições pessoais
do reabilitando, do que se deduz que não se pode exigir do reabilitando nem que supra as
exigências de capacitação de um posto de trabalho demasiadamente exigente, nem que se
lhe ofereça um posto de trabalho muito abaixo de suas potencialidades laborativas.
De um posto de vista remuneratório, de um posto de vista ideal, o trabalho
oferecido não deve ter um retribuição pecuniária inferior ao da atividade anterior do
reabilitando, mas, ao contrário, deveria ser ainda melhor retribuída que aquela.96 A
retribuição do trabalho anterior do acidentado seria um parâmetro a ser perseguido no
processo de reinserção laboral do reabilitando, tarefa que, no mínimo, deve-se reconhecer
como complexa, tendo em conta as vicissitudes do atual mercado de trabalho e o
conhecido baixo nível de instrução do trabalhador brasileiro.
95 Tais direitos e princípios são: (i) liberdade sindical e reconhecimento efetivo do direito de negociaçãocoletiva; (ii)eliminação de todas as formas de trabalho forçado; (iii) abolição efetiva do trabalho infantil; (iv)eliminação de todas as formas de discriminação em matéria de emprego e ocupação), a promoção doemprego produtivo e de qualidade, a extensão da proteção social e o fortalecimento do diálogo social. 96 O que, de um ponto de vista, simbólico, representaria uma “volta por cima” do reabilitando!
Visto sob o ângulo da possibilidade de recusa do trabalhador reabilitando, não
se pode estabelecer a retribuição anterior como um limite rígido, patamar abaixo do qual a
retribuição pecuniária seria considerada insuficiente. O critério de suficiência, assim, pode
ser melhor balizado pela retribuição que perceberia o trabalhador caso se aposentasse por
invalidez.
Em decorrência, pode-se pensar, simetricamente ao direito de recusa
justificada do trabalhador, um dever do empregador oferecer um leque de alternativas de
colocação dentro das possibilidades existentes em seu quadro de pessoal. Por certo não se
pode falar em obrigação do empregador em “criar” um posto de trabalho adequado ao
reabilitado, mas, tampouco, não poderá o empregador, injustificadamente, não oferecer
um posto de trabalho vago, o que, em tese, poderia configurar tratamento discriminatório.
CAPÍTULO 2 – O DIREITO DO REABILITADO
PROFISSIONAL À UMA PROTEÇÃO LEGAL
SUFICIENTE
Defende-se a existência de um direito fundamental à reabilitação profissional,
ligado ao direito ao trabalho previsto na Constituição. Para tanto, inicia-se com um
necessário breve histórico deste direito e como se apresenta como um dos mais
importantes direitos sociais. Enfrenta-se a polêmica sobre a força normativa das normas
constitucionais, sua vinculação a terceiros, a indivisibilidade dos direitos civis, políticos e
sociais, bem como as dificuldades de concreção dos direitos sociais.
A seguir, abordam-se dois temas que serão relevantes ao analisarmos conteúdo
e limites do direito fundamental à reabilitação profissional no direito brasileiro: o
princípio da proteção não-suficiente e o princípio de não retrocesso dos direitos
fundamentais sociais.
Enfim, analisam-se a fundamentalidade e o conteúdo do direito à reabilitação
profissional e, sustentando que a atual legislação não propicia uma proteção suficiente,
propõem-se alterações normativas que fomentem a criação de empregos adequados ao
trabalhador reabilitado, estabeleçam normas especiais de garantia do emprego e que
garantam uma regulação suficientemente protetiva perante a empresa de vínculo, em uma
definição de (in)capacidade profissional, em situações de discriminação e uma assistência
que assegure a possibilidade de uma reabilitação plena.
2.1 O DIREITO AO TRABALHO COMO DIREITO FUNDAMENTAL
2.1.1 Uma compreensão atual do direito ao trabalho.
Conforme Robert Alexy (1997, p. 443-5), os direitos fundamentais sociais são
direitos do indivíduo em face do Estado. Nesse sentido, em função da autopreservação do
ser humano – que se obtém não apenas a partir da liberdade de agir, mas sim de uma
liberdade de fato – há de se ter um conteúdo mínimo a ser provido para assegurar as
condições mínimas de uma vida digna. Por outro lado, se existe um dever fundamental,
deve existir também um dever fundamental de proteção, pois
“quando o Direito utiliza-se da regulamentação jurídica significa, antes de tudo, que eleservirá como suporte de valor para proteger o homem em seus direitos. Por isso, a declaraçãoe a efetivação dos direitos fundamentais dever ser compreendidas como o ponto de chegada domomento ético de um Estado Democrático de Direito” (DELGADO, 2006, p. 208).
Nos dias de hoje, o direito ao trabalho aparece como um direito fundamental
social no artigo 6º da CF/8821 e também como uma diretriz para ordenar o
desenvolvimento da política urbana no desenvolvimento das funções sociais da cidade e
propriedade urbana. Além disso o trabalho é um “valor social”, conforme prevê o artigo
1º, inc. IV da CF/88.
Os direitos sociais são direitos fundamentais do homem, caracterizando-se
como verdadeiras liberdades positivas, de observância obrigatória em um Estado Social
de direito, tendo por finalidade a melhoria das condições de vida aos hipossuficientes,
visando à concretização da igualdade social, consagrados como fundamentos do Estado
democrático, pelo art.1º, IV da Constituição Federal. (MORAIS, 2014, p. 233)
O direito ao trabalho é um dos mais significativos direitos fundamentais
sociais previstos no sistema constitucional brasileiro, sempre entendido como um mega-
direito, do qual decorrem todos os demais direitos fundamentais do trabalho. Está previsto
no art. 6º, no capítulo dos Direitos e Garantias Fundamentais e dele decorrem múltiplas e
relevantes consequências, entre as quais as mais lembradas são a proteção da relação
empregatícia contra a despedida imotivada, a proteção contra o desemprego, assim como
todas as políticas de emprego e renda. De fato, o trabalho pode e deve ser entendido como
“possibilidade de realização das necessidades, autorrealização, participação societária,reconhecimento e construção da subjetividade, fortalecimento da saúde psíquica,escolha e consecução de um projeto de vida, integração cultural e a perspectivacotidiana de transformação das estruturas econômicos sociais. Em suma, uma parcelasignificativa de tudo que ocorre de mais relevante no tempo de vida das pessoas”.(WANDELLI, 2012, p. 222)
Ademais, a prestação do trabalho é indissociável da pessoa do trabalhador e,
assim, a ausência da possibilidade de trabalho é ausência de possibilidade de uma vida
digna ( WANDELLI, Ibid.). Não se confundem os conceitos de “direito ao trabalho” e “direito do
trabalho”. O direito fundamental do trabalho se refere às normas materialmente
fundamentais de proteção ao trabalho. Já o direito fundamental ao trabalho, como conceito
mais amplo e o “primeiro direito social historicamente reivindicado” (AMORIM, p. 87), a
par de uma normatividade própria, também constitui, com outros direitos, o fundamento
desses conteúdos jusfundamentais, nos quais se desdobre e especifica (WANDELLI, p.
223).
Uma das vertentes da interpretação constitucional das consequências jurídicas
do direito fundamental ao trabalho está em questão menos debatida, ainda que diretamente
relacionada com o conteúdo do trabalho, qual seja, a do atendimento ou não do posto de
trabalho à função social que dele se espera: não apenas garantir de subsistência do
trabalhador e de sua família, mas de ser um efetivo fator de inserção social do trabalho.No caso de trabalhador reabilitado, como se viu no capítulo anterior, este
enfrenta graves obstáculos, materiais e jurídicos, para alcançar uma efetiva reabilitação do
ponto de vista meramente clínico, de obter uma (re) qualificação que lhe propicie sua
reinserção ao mercado laboral e social e, ao final, lograr um trabalho digno e compatível
com suas novas condições laborais. Entretanto, a “via crucis” do trabalhador reabilitado
não termina com sua reintegração ao um posto de trabalho, ainda que, nos limites da
prestação concedida pela Previdência Social, esta declare o término de suas
responsabilidades a partir da entrega do certificado de reabilitação.O retorno do trabalhador ao antigo posto de trabalho é marcado por frustrações
e incertezas, sendo-lhe opostas inúmeras dificuldades, algumas decorrentes do pensamento
discriminatório ainda existente na sociedade relativamente ao trabalhador incapacitado ou
com deficiência; outras, decorrentes da pouca disposição do empregador no processo de
reabilitação do trabalhador, somada à inexistência de uma legislação protetiva mais
detalhada e clara que exija do empregador assegure ao trabalhador uma ocupação efetiva
em um posto de trabalho adequado, bem como faça com que o INSS acompanhe, como
deveria, o processo completo de reabilitação do trabalhador dentro da empresa até sua
reintegração ou, na impossibilidade disso, até que se ofereça ao trabalhador um emprego
satisfatório e compatível com suas condições de trabalho.Aqui, sustenta-se que, como consequência do direito fundamental ao trabalho
contido na Constituição brasileira, existe um direito do trabalhador reabilitado, além do
próprio processo de intervenção assistiva que viabilize sua reabilitação profissional,
também a uma proteção legal suficiente que se expresse em políticas públicas eficazes que
lhe proporcione uma reinserção efetiva e completa no mercado laboral. Tal reinserção
deve se constituir, não apenas no oferecimento de um posto de trabalho adequado, ou seja,
digno, voluntariamente aceito, compatível com suas condições laborais e suficientemente
remunerado – mas, também, no acompanhamento, assistência e apoio econômico que lhe
proporcione uma real integração profissional. Até que se alcance tal integração, não há
falar em reabilitação plena e não cessa o direito do reabilitando ao apoio assistencial e
previdenciário, nem pode o Estado dar por cumprida sua missão constitucional.Nesse sentido, passamos, a seguir, a situar o direito ao trabalho no
ordenamento jurídico brasileiro, iniciando por um breve exposição histórica do surgimento
desse direito nas Constituições modernas; prosseguindo com a discussão a respeito do
conteúdo e dos limites desse direito para, por fim, relacioná-lo com o tema em debate,
qual seja, o direito à reinserção laboral completa e efetiva.
2.1.2. Evolução histórica do direito ao trabalho
O direito ao trabalho se constitui no primeiro dos direitos sociais no tempo,
podendo-se afirmar que dele se origina todo o direito social. Assim, é comum entendê-lo
como o arquétipo dos direitos sociais (IBARRECHE, 1996, p. 54) e, nessa condição, está
expresso nas principais Constituições modernas, inclusive na Constituição brasileira.
Internacionalmente, o pleno emprego aparece como objetivo político no
preâmbulo da Constituição da OIT de 191997 e, especialmente, na Declaração de Filadélfia
de 1944. O direito ao trabalho, como livre eleição, condições satisfatórias e proteção
contra desemprego surge no artigo 23.1 da Declaração Universal dos Direitos Humanos,
de 10 de dezembro de 1948. Como expressão de um direito ao trabalho livremente
escolhido e suficiente no artigo 6.1 do Pacto Internacional de Direitos Econômicos,
Sociais e Culturas, de 16 de dezembro de 1966. Também o Convênio sobre a política de
emprego n. 122 da OIT, de 1964, completado pela Recomendação n. 122, do mesmo ano,
art. 1. Dentro da âmbito europeu, cita-se a Carta Social Europeia, de 18 de outubro de
1961 (IBARRECHE, 1996, p. 35 -43
Como direito humano fundamental, o direito ao trabalho deve ser situado no
tempo e no espaço, como resultado de processos históricos, que, ao longo dos séculos,
desde a Ilustração (último terço do século XVIII), acompanhou a mudança na concepção e
na valorização do trabalho, passando de uma visão francamente depreciativa para um
reconhecimento do trabalho como princípio e de todo valor e de toda riqueza (SMITH,
1983, p. 17). Como todo direito fundamental, o direito ao trabalho, se forma, primeiro,
como valor no plano filosófico para, em seguida, ser incorporado como direito positivo
(PECEZ-BARBA, 1982, p. 20). Nesse sentido, pode ser entendido na perspectiva de um
processo institucional e cultural capaz de abrir e consolidar espaços de luta pela dignidade
humana (HERRERA FLORES, 2005).
Para melhor entender como se conformou o direito ao trabalho no presente, há
de atentar que tal situação não formou pronta e linearmente, mas foi o resultado de um
largo e heterogêneo processo de reforma global da sociedade, desembocado no século
XVIII que, em muitos aspectos, mostra-se contraditório e incoerente.
97 Textos de convenções internacionais disponíveis em OIT, 2015.
John Locke, um dos primeiros formuladores do moderno conceito de direito
ao trabalho, vinculou-o ao direito à existência, já que este somente pode ser assegurado
pelo Estado quando também se garanta a todo cidadão o direito de ganhar a vida por meio
do trabalho (LOCKE, 2003, p.40). Além disso, sendo para este autor a propriedade o
principal motivo para a vida em sociedade e, como a propriedade se funda no direito ao
trabalho, este é erigido à condição de um dos direitos naturais que o Estado deve assegurar
para viabilizar o exercício da cidadania. Locke é um dos principais pensadores do então
incipiente pensamento liberal-burguês e, por isso, o direito ao trabalho surge no bojo do
movimento político da burguesia ascendente, que erige o trabalho como o fundamento da
riqueza em uma clara crítica à ociosidade da aristocracia. Portanto, a ênfase de tal direito
não é dada tanto como um “direito natural à existência”, mas como justificativa para a
apropriação privada da riqueza, na medida em que “ao trabalhar a natureza, o homem
transforma e inclui algo a mais nela, apropriando-se legitimamente disso” (SOUZA
ALVES, p. 55).
No início da Idade Moderna, houve um tempo em que, em meio aos embates
da “questão social”, as primeiras reivindicações por tal “garantia de existência” falsamente
coincidiam com os reclamos da burguesia por uma liberação do mercado laboral das
amarras corporativas. Assim, sob a consigna de um “direito ao trabalho” conviviam duas
acepções bastante diferentes desse direito: um ligado às reivindicações obreiras pela
garantia de trabalho a todos que dele necessitassem; outro, da burguesia ascendente, de
que não existissem qualquer limitação à liberdade de contratar.
Tal dicotomia, oriunda da Revolução Francesa, revela as duas concepções que,
historicamente, marcaram o direito ao trabalho. Na visão dos trabalhadores, se trata de
assegurar a todo trabalhador o direito a um posto de trabalho, sendo esta a condição de seu
ingresso ao “status” de cidadão (“portal da cidadania”). Já, na visão dos burgueses, se
pretende, basicamente, a abolição das “corporações de ofício” e das organizações obreiras.
Nessa última acepção, o direito ao trabalho se refere à liberdade de trabalhar, ou seja, à
possibilidade de desenvolver livremente uma atividade laboral sem sujeição aos
condicionamentos e restrições impostos pelos regimes gremiais (IBARRECHE, 1996, p.
26). Historicamente, a vitória coube à segunda alternativa, tanto assim é que o resultado
efetivo foi o desmonte do sistema das corporações de ofício através da Lei Le Chapelier
(14 de junho de 1791), dotando a classe emergente, a burguesia, de uma abundante e
barata mão-de-obra, tão necessária para o florescimento do capitalismo. Para o
proletariado, a abolição do sistema corporativo não significou uma melhoria e, assim,
apesar dos inegáveis avanços políticos e sociais promovidos pela Revolução Francesa,
esta não deixou de ter graves consequências sociais para os trabalhadores.98
Uma encruzilhada histórica para a conformação atual das ideias de direito ao
trabalho encontra-se no processo revolucionário de Paris (fevereiro a junho de 1848). Na
França empobrecida, marcada pela recessão e pelo desemprego, uma das principais
reivindicações populares feitas ao novo governo revolucionário é a de que o Estado
promova a provisão de emprego remunerado a todos que dele necessitem. Em 25/2/1848,
redigido por Louis Blanc, um decreto editado pelo o Governo Provisório estabelece o
compromisso governamental de assegurar o trabalho a todos os cidadãos.
Tratava-se de dar resposta política à insuportável situação social, do
desemprego massivo e redução dos salários, na linha preconizada pelos socialistas
utópicos (Fourrier, Considérant, Proudhon, Blanc) que apontavam o direito ao trabalho
como o primeiro e fundamento dos direitos humanos. Assim, criam-se as “oficinas
nacionais”, destinadas a dar trabalho público aos desempregados que, logo, são criticadas
pelos liberais por suprimir o gosto pelo trabalho e pela concorrência, por criar um
irrealizável direito para os pobres e, finalmente, por se caracterizar em uma indevida
intervenção do Estado no plano econômico.99
A experiência das Oficinas Nacionais resultou desastrosamente, seguindo o
fracasso do próprio movimento revolucionário. A partir de então, vence o pensamento
liberal e não mais se pensará em “garantir o trabalho por um simples decreto”100, limitando
fortemente a compreensão do direito ao trabalho, que se torna apenas em um direito à
assistência pública.101 Ocorre a desistência tácita de preocupação original de garantir a
todos um posto de trabalho como condição para aquisição do status de “cidadão e sua
98 Conforme R. CASTEL (1998, p. 212), o desmantelamento da estrutura corporativa em si não melhorou –e sim, agravou – a já miserável situação da classe trabalhadora.
99 Os pensadores liberais sempre acreditaram que qualquer intervenção do Estado na esfera econômica éprejudicial ao desenvolvimento natural da economia e do enriquecimento geral da população, de modo que,ao Estado, cabe apenas velar para que o processo econômica nunca se interrompa. (BEZERRA DINIZ,1999, p. 72).
100 De fato, calcado em uma visão individualista, o liberalismo sempre rechaçou um maior envolvimento doEstado na questão social e, quando o admitiu, jamais reconheceu tal intervenção como um direito docidadão. (IBARRECHE, 1996, p. 31)
101 Na visão liberal clássica, a causa da miséria é a carência, cuja resposta é a filantropia. No períodoposterior à organização do proletariado como classe (pós-1835), o pauperismo é visto como mendicância ecrime, que se combate pela repressão e pela reclusão. Já para o pensamento neoliberal (Hayek), opauperismo é um problema individual-pessoal que se “devolve” à filantropia (individual ou organizacional)– ainda que não se exclua uma pontual, e mínima ação estatal na área social -, substituindo esta o direitoconstitucional do cidadão de resposta estatal (keynesianismo). (MONTAGÑO, 2010).
substituição por um direito de assistência que, na prática e mais concretamente, importa
apenas em uma garantia de remuneração ao trabalhador para sua manutenção vital.
A Constituição francesa de 1848 consagrará apenas que é dever do Estado
assegurar com assistência fraternal a existência dos cidadãos franceses necessitados, seja
procurando-lhes trabalho na medida de suas possibilidades, seja prestando ajuda aos que
não sejam capazes de trabalho ou que não tenham família102
Assim, é a concepção burguesa de direito ao trabalho que vence103,
transmutando-se na solução liberal para a “questão social”, assim entendida a perigosa
instabilidade causada pela inexistência de suficiente trabalho para a sustentação material
de extensos setores da população (CASTEL, 1998, p. 495). Tal pensamento, que está na
raiz também liberalismo de nossos dias, limitam os efeitos práticos do direito ao trabalho
ao assistencialismo e às políticas de pleno emprego, ligadas preferentemente a fatores de
índole econômica (IBARRECHE, 1996, p. 20).
Porém, como direito à existência – e não somente liberdade de trabalhar –
subsiste ainda a primeira concepção de direito ao trabalho, como legítima aspiração
obreira, conservando suas exigências de reconhecimento frente ao Estado da
essencialidade e da dignidade do trabalhador na sociedade.
Conforme PALOMEQUE LÓPEZ (1989, p. 19):
“A legislação obreira, expressão adiantada do Direito do Trabalho, responde prima facie àuma solução defensiva do Estado burguês para, através de uma normativa protetora em favordos trabalhadores, prover a integração e institucionalização do conflito entre o capital e otrabalho em termos compatíveis com a viabilidade do sistema estabelecido. Sem deixar deser por isso o instrumento normativo adequado à dominação, uma vez que certifica aconstituição e reprodução das relações de produção capitalistas (extração da mais-valia) ¨.
Os direitos sociais surgem da convicção de que a evolução e o enriquecimento da
pessoa humana depende de suas condições materiais e estas não podem ser criadas pelo
indivíduo atomizado da sociedade liberal (Canotilho citado por MARTINS ESTAY, 1997,
p. 70). Surgem assim, conforme Maurício Godinho Delgado (DELGADO, 2006, p. 207),
um conjunto de ações estatais protetoras como fruto das lutas anteriores pelo direito ao102 Art. 13 da Constituição francesa de 1848: “A Constituição garante aos cidadãos a liberdade de trabalho ede indústria. A sociedade favorece e encoraja o desenvolvimento do trabalho, pelo ensino primário gratuitoprofissional, a igualdade nas relações entre o patrão e o operário, as instituições de previdência e de crédito,as instituições agrícolas, as associações voluntárias e o estabelecimento, pelo Estado, os Departamentos e osMunicípios, de obras públicas capazes de empregar os braços desocupados; ela fornece assistência àscrianças abandonadas, aos doentes e idosos sem recurso e que não podem ser socorridos por suas famílias”(tradução nossa).
103 À importante pergunta se o Estado deve propiciar individualmente trabalho a todos que dele necessitam, aresposta dos revolucionários franceses foi negativa, pois bastaria criar um marco institucional que garantissea liberdade e a iniciativa dos indivíduos, as quais representariam o melhor estímulo para o trabalho. Dessaforma, a instalação de um livre mercado de trabalho asseguraria, praticamente de forma automática, oemprego para todos (IBARRECHE, 1996, p. 27).
trabalho, que se incorporam a nossas sociedades como um “patamar mínimo
civilizatório”104, que constituem a possibilidade de integração dos trabalhadores – ainda
que subordinada – à sociedade industrial. De um ponto de vista laboral, tal compromisso
mínimo inclui a ação estatal de promoção da igualdade material, a cobertura dos riscos de
desemprego, de trabalho não-digno e de retribuição insuficiente. Assim, se estabelece um
dever dos Estados de empenhar-se para que todo cidadão tenha acesso a um trabalho livre
e digno e, assim, prover o sustento próprio e de sua familia; de promover a elevação de
vida dos trabalhadores em busca da igualdade efetiva (igualdade material); de mediação
da relação económica entre capital e trabalho105 e de dar assistência aos inválidos ou os
que, querendo, não possam trabalhar.
Mesmo assim, na realidade, longe se está de assegurar a cada pessoa um posto
de trabalho adequado dentro da estrutura produtiva pela simples razão de que a maior
parte da oferta de trabalho está em mãos de particulares, cuja decisão de criar empregos
não está sujeita diretamente às decisões dos poderes públicos. Conforme Manoel-Carlos
Palomeque106 (apud IBARRECHE, 1996, p. 153), o direito ao trabalho efetivo poderia ser
garantido de modo pleno e sem fissuras tão somente na hipótese de uma organização
econômica em que o próprio Estado que proclama o direito subjetivo fosse, ao mesmo
tempo, titular da estrutura ocupacional do país ou, pelo menos, estivesse em condições de
decidir, conjuntamente e de modo significativo, pela criação de empregos.
Desvirtuado de sua concepção original de um direito subjetivo do cidadão
frente ao Estado, é nesse sentido mitigado (de um direito a políticas públicas de promoção
do emprego e de assistência ao desempregado) que se reconhece o direito ao trabalho nas
Convenções internacionais e nas Constituições modernas. De todo modo, tal fato não lhe
retira a importância de representar um dos mais importantes direitos fundamentais
modernos, mormente por indicar ao Estado os deveres sociais com a classe trabalhadora107.
Disposição semelhante foi adotada nas Constituições Mexicana (1917) e de Weimar
(1919). Nesta, consta expressamente o dever de assegurar a todo cidadão a possibilidade
de ganhar seu sustento mediante o trabalho ou, pelo menos, se tal não for possível,
oferecer-lhe um trabalho apropriado, o dever de prover-lhe o indispensável sustento.
104Expressão utilizada em GODINHO DELGADO, M. “Introdução ao direito do trabalho: relações de trabalho e relação de emprego”. 2ª edição. São Paulo, LTr, 1999.
105 Seria uma “jurisdificação do conflito” conforme Palomeque Lopez (1989, p. 19.
106 PALOMEQUE LOPEZ, M.C. “El derecho al trabalho de los penados y la efectividad de los derechosfundamentales”. REDT 42, 1990, p. 308.
107 Conforme Fabio Konder Comparato, o art. 13 da Constituição Francesa de 1848 aponta para a criação doque viria a ser o Estado do Bem-Estar Social no século XX (COMPARATO, 2001, p. 182).
Como vetores de tal propósito identificam-se as políticas públicas de
promoção da igualdade material, de cobertura de riscos do desemprego, do trabalho
indigno ou da retribuição insuficiente. A esse propósito, pode-se citar, ainda, como
complementares ao compromisso social dos Estados constitucionais modernos, o dever do
Estado promover a elevação do nível de vida dos trabalhadores, na busca da igualdade
efetiva (promoção da igualdade material) e a implicação do Estado na mediação da relação
econômica entre capital e trabalho, em uma lógica de jurisdificação do conflito (direito do
trabalho), bem como um dever do Estado de assistência e previdência contra os riscos do
trabalho (direito de assistência e previdência).
Assim, o que remanesceu, definitivamente, foi um compromisso do Estado,
vinculado às ideias de igualdade e dignidade, com um caráter prestacional fortemente
marcado, com conteúdo difuso que apresenta, como todo direito social, um conjunto de
dificuldades para sua efetivação (IBARRECHE, 1996, p. 73).
2.1.3 O direito ao trabalho como direito social108
2.1.3.1 - A força vinculante da Constituição
Um dos aspectos mais importantes na análise do valor normativo das normas
constitucionais diz respeito à aceitação ou não de que determinadas normas
constitucionais seriam destituídas de juridicidade, não tendo capacidade de tutelar
qualquer tipo de direito ou de interesse.
Tal equívoco decorre da ideia de que parte da Constituição possa constitui
apenas uma “promessa política”, destituída de força normativa, desconhecendo-se seu
compromisso histórico-institucional e invertendo-se a hierarquia interpretativa, de forma a
dar prevalência à regra ordinária em relação à constitucional (VARGAS, 2010).
Ainda que a exigibilidade não seja direta (ou seja, não configure um direito
subjetivo que possa ser reivindicado diretamente pelo cidadão aos Tribunais), não se pode
deixar de reconhecer que qualquer norma constitucional seja vinculante.
No que tange à Constituição brasileira, é possível interpretar que o seu artigo
6º ali definhada “princípios diretores”, tal como sucede com a Constituição espanhola. Tal
interpretação, porém, não é melhor, na medida em que, ao contrário do que ocorre na
Constituição espanhola, não há na brasileira qualquer disposição que autorize tal
diferenciação entre normas constitucionais. De qualquer sorte, mesmo que assim não
fosse, haveria de se reconhecer que normas contidas no art. 6º. vinculariam, pelo menos,
os poderes públicos.
Conforme Jose Felipe Ledur,
¨a vigência da norma do artigo 6º. da Constituição é direta para o Estado e seus distintosPoderes. Por outro lado, há “vigência indireta” para a Sociedade, a qual poderá fruir dosdireitos previstos nessa norma constitucional na exata medida com que for sendo preenchidade conteúdo. Trata-se de direitos cujo conteúdo em geral terá de ser definido pelo legislador[...] Os indivíduos, a Sociedade possuem o direito de reivindicar esses direitos. Mas é aolegislador que cabe encontrar a solução ante os interesses relativos que entrem em colisão,seguindo um processo público de formação da vontade política¨ (LEDUR, 1998, p. 117).
Nesse contexto, não há mais falar em normas constitucionais destituídas de
valor jurídico, podendo-se dar por superada a polêmica histórica sobre “normas
108 Esta seção incorpora parcialmente estudo apresentado em trabalho anterior (VARGAS, L.A.de. “A auto-aplicabilidade da norma constitucional que prevê o aviso prévio proporcional”. Monografia. Disponível emwww.lavargas.com.br. Acesso em 1/10/2015.
programáticas” que, tradicionalmente, serviu para “abrir portas” para o ingresso das
teorias constitucionais que, na prática, negam a efetividade de direitos constitucionais, em
especial os direitos sociais.
2.1.3.2 – A vinculação dos particulares às normas constitucionais
A força vinculante das normas constitucionais não afeta apenas a relação
cidadão-Estado, mas também se estende à relação entre particulares, algo que tem
particular relevância em se tratando de normas constitucionais que prescrevem direitos
fundamentais, pois, em caso de violação, o judiciário pode ser acionado para resolver o
conflito.
Esse campo de atuação do Estado, que se aparta da missão tradicional de
proteção dos cidadãos frente ao Estado, cada vez mais assume relevância nos dias atuais,
já que existe um campo abundante para muitos e diversos direitos fundamentais sejam
menosprezados e atacados por outros sujeitos, em especial por particulares (MARTÍN-
RETORTILHO BEQUER, 1991, p. 620).
A aplicabilidade das normas constitucionais, especialmente as que contêm
direitos fundamentais nas relações entre os particulares não foi pacífica, vencendo uma
larga tradição que associa tais direitos unicamente aos conceitos negativos da liberdade,
em oposição ao Estado.
A aplicabilidade das normas constitucionais às relações privadas se relaciona
significativamente com a noção de que papel o Estado deve ter na sociedade: de um lado,
como substituto da “autoproteção privada” e que se adapta perfeitamente à noção liberal
dos direitos fundamentais; de outro, como promotor de determinados valores sociais que a
Constituição é portadora e que são “primordiais e básicos para a vida coletiva” - algo que
não se encaixa perfeitamente na tradição liberal (GARCÍA DE ENTERRÍA, 1994, p. 98).
Formulada originalmente pela doutrina alemã, a ideia da “eficácia horizontal”
(¨Drittwirkung der grundrechte¨) dos direitos fundamentais constitucionais, estipula que os
direitos fundamentais exercem sua eficácia vinculante, não apenas para todos os poderes
públicos, mas também na esfera jurídico-privada, isto é, no âmbito das relações jurídicas
entre particulares. Explica-se tal efeito pela perspectiva jurídico objetiva dos direitos
fundamentais, de acordo com a qual estes exprimem determinados valores que o Estado
não apenas deve respeitar, mas também promover e zelar pelo seu respeito, mediante uma
postura ativa, sendo, portanto, devedor de um proteção global dos direitos fundamentais
(SARLET, 1998, p. 335).109
Para o judiciário, a consequência central é a de que os valores constitucionais
que vinculam os juízes operam no direito privado, em uma eficácia indireta ou mediata
(ALEXY, 1997 p. 512-5).
Para ALEXY, em um plano objetivo, as normas jusfundamentais, além de serem
regras, se comportam como princípios que se irradiam a todo sistema jurídico, o que tem
sido denominado como teoria da eficácia irradiante dos direitos fundamentais (CUNHA,
2010, p. 106). Sem desconhecer a realidade das normas infraconstitucionais, os princípios
jusfundamentais “conduzem a direitos e deveres em relações entre iguais que, devido a
vigência destes princípios em relação à Constituição, são necessários, mas que, sem sua
vigência, não o seriam”. Unificando diversas doutrinas sobre a eficácia horizontal das
normas fundamentais (VARGAS, 2010), ALEXY chega à conclusão que, na prática, estas
atuam com eficácia direta ou imediata nas relações cidadão-cidadão.
Para ALEXY, quanto ao efeito sobre terceiros: Há de se excluir, de pronto, duas coisas. Primeiro (...) não é consistente pensar que os direitosdo cidadão frente ao Estado sejam, ao mesmo tempo, direitos do cidadão frente aos cidadãos(...) Segundo, não se pode chegar a um efeito imediato em terceiros, apenas trocando odestinatário dos direitos frente ao Estado. (...) Por efeito imediato em terceiros há de seentender uma terceira coisa. Ela consiste em que, por razões jusfundamentais, na relaçãocidadão-cidadão existem determinados direitos e não-direitos, liberdades e não-liberdades,competências e não-competências que, sem estas razões, não existiriam. Se assim se define oconceito de efeito imediato em terceiros, da teoria dos efeitos mediatos em terceiros e dosefeitos em terceiros através da mediação do Estado, surge um efeito imediato emterceiros. (ALEXY, 1997, p.520).
Esta dupla função que as normas podem desempenhar (como fonte de direitos
subjetivos frente ao Estado ou como emanação de princípios objetivos que alcançam
também as relações privadas) é claramente evidenciada nas situações em que se há de
proteger o cidadão de intervenção de terceiros. Nesse caso, conforme ALEXY, o direito
do cidadão a uma ação concreta do Estado contra a intervenção de um terceiro configura
um “direito à proteção” que se afasta do conceito clássico de “direito de defesa” – que é
um direito frente ao Estado para que este se omita de intervir. No caso, não se pede a
abstenção do Estado, mas, ao contrário, se trata de um direito frente ao Estado para que
este atue contra terceiros, para que estes omitam intervenções. Trata-se, portanto, de
suplantar o pensamento tradicional que resiste a reconhecer que, mesmo no direito privado
109 No âmbito de trabalho, tendo em conta a desigualdade entre as partes, alguns autores chilenos chegam afalar em uma “eficácia diagonal” onde o poder público atua como fator de compensação de um relaçãodesequilibrada (GAMONAL, 2011, p. 28).
ou penal, é possível sustentar a eficácia horizontal ou imediata das normas constitucionais.
(VARGAS, 2010).
As objeções tradicionais à eficácia dos direitos fundamentais em relação a
terceiros são particularmente maiores no que diz respeito aos direitos sociais110. Para
alguns autores, como Cascajo Castro (1998, p; 67), os direitos socais somente obrigariam
os terceiros privados quando assim o dispusessem os poderes públicos, em especial o
poder legislativo. No mesmo sentido, García Macho (1982, p. 91) quando afirma que a
introdução de particulares no círculo de destinatários dos direitos fundamentais sociais
significaria o fim da liberdade pessoal, da autonomia privada, da liberdade de contrato e
do direito privado. Outros, entretanto, como Perez Luño (1984, p. 22-23), são enfáticos ao
sustentar a eficácia dos direitos sociais frente a terceiros como uma consequência do valor
da igualdade material inerente ao Estado Social de Direito, o que leva à atuação dos
poderes públicos a fim de fazer eficaz a liberdade e a igualdade dos indivíduos.
Apesar das objeções, admite-se, em geral, que as normas constitucionais
prescrevam ao Estado ações positivas, de proteção dos valores sociais básicos, inclusive
contra terceiros. Assim, a polêmica se traslada para a efetividade das normas sociais,
especificamente a respeito de seu conteúdo positivo ou promocional, em especial
relativamente aos direitos fundamentais.
2.1.3.3 – Os direitos sociais como pretensão a uma atuação estatal
Elemento importante do conceito de direito fundamental é o de que o
destinatário destes direitos é o Estado (LEIVAS,2006, p. 89). Os direitos sociais
compreendem os direitos de créditos ou de prestações, ou seja, direitos que tornam o
Estado (e, em decorrência, também os particulares) devedores dos indivíduos,
particularmente os menos favorecidos, exigindo ações concretas com o fim de assegurar a
estes um mínimo de igualdade e bem-estar social.
Citando Alexy, Emerson Garcia (2005, p. 66), diz que longe de interditarem a
ação do Estado, os direitos sociais indicam a necessidade de ação estatal, incumbindo ao
Estado o fornecimento ao indivíduo de certos bens essenciais não disponíveis no mercado
ou que a eles não tivesse acesso por não dispor de meios financeiros suficientes. Assim,
são direitos a ações positivas, que não se limitam às obrigações prestacionais (que
estabelecem uma relação direta entre o Estado e o beneficiário da prestação e que exigem
110 . Um relato expressivo dessas objeções é feito por Martínez Estay (1997, p. 81-3, resumido emVARGAS, 2010)
a disponibilização de reservas orçamentárias), mas podem implicar em outro tipo de
obrigações, em que o Estado assegura o gozo do direito por outros meios, em que podem
tomar parte ativa outros sujeitos obrigados. Alguns desses direitos podem se caracterizar
pela obrigação do Estado de estabelecer algum tipo de regulação, sem a qual o exercício
do direito não tem sentido. No caso, a obrigação do Estado se situa, não em despender
recursos, mas estabelecer normas que concedam relevância a uma situação determinada ou
assegurar a existência de uma estrutura que se encarregue de pôr em prática uma atividade
determinada. Em outros casos, a obrigação exige que a regulação estabelecida pelo Estado
limite ou restrinja as faculdades das pessoas privadas ou lhes imponha obrigações de
algum tipo. Trata-se de uma regulação que se estende também aos particulares Por
exemplo, o direito do trabalho. Por fim, o Estado pode cumprir sua obrigação provendo a
população de serviços, seja de forma exclusiva, seja através de formas de cobertura mista
que incluam, além de aporte de recursos públicos, uma regulação em que certas pessoas
privadas se vejam afetadas através de restrições, limitações ou obrigações. Como
exemplo, o sistema público de saúde. (VARGAS, 2010).
Autores como Fried van Hoof sustentam a ideia de que o Estado não é o único
a quem cabe satisfazer os direitos econômicos, sociais e culturais. Entendendo que é o
indivíduo o sujeito ativo de todo desenvolvimento econômico e social, de toda forma um
papel crucial na satisfação dos direitos sociais. Assim, incumbiria ao Estado (em um
esquema similar tanto aos direitos econômicos, sociais e culturais como aos direitos civis
e políticos) as obrigações de respeitar, proteger, garantir e promover o direito em questão
(BARRIGUETE, 2008). As obrigações de respeitar se definem pelo dever do Estado de
não interferir, obstaculizar ou impedir o acesso ao gozo dos bens que constituem o objeto
do direito. As obrigações de proteger consistem em impedir que terceiros interfiram,
obstaculizem ou impeçam o acesso a esses bens. As obrigações de garantir supõem
assegurar que o titular do direito aceda aos bens quando não puder fazê-lo por si mesmo.
As obrigações de promover se caracterizam pelo dever de desenvolver condições para que
os titulares do direito acedam ao bem. Nenhum desses níveis pode se caracterizar
unicamente através de obrigações positivas/negativas ou obrigações de resultado/de
meios, o que reforça a unidade entre os direitos civis e políticos e os direitos econômicos,
sociais e culturais.
Os direitos sociais, conforme Oscar Olvera (1998, p. 256-61), são “direitos do
homem contextualizado” (contrapondo-se à concepção abstrata dos direitos humanos), “de
titularidade individual e coletiva”, cuja finalidade é “garantir um piso social básico” (a
satisfação das necessidades mais importantes e relevantes para a vida humana) e
“de tendência universalista” (de caráter evolutivo, destinam-se a albergar a maior
quantidade possível de necessitados, mesmo que não cidadãos).
Para José Afonso da Silva (2003, p. 285-286), os direitos sociais, como
dimensão dos direitos fundamentais do homem, são “prestações positivas prestadas pelo
Estado direta ou indiretamente, enunciadas em normas constitucionais que possibilitam
melhores condições de vida aos mais fracos” e, assim, são direitos que se ligam ao direito
de igualdade.
2.1.3.4 – A indivisibilidade dos direitos civis, políticos e dos direitos sociais
Na doutrina tradicional, há uma clara diferenciação entre os direitos sociais
“latu sensu” (englobando os sociais propriamente ditos, econômicos, culturais e, mesmo,
os ambientais) e os direitos civis e políticos. O argumento central dos que diferenciam
essencialmente os direitos sociais dos civis e políticos se refere à natureza supostamente
distinta entre os chamados “direitos de promoção” e os chamados “direitos de defesa”. De
um ponto de vista tradicional, nos direitos de defesa, ao direito de liberdade de um
determinado sujeito corresponde um dever de caráter negativo para todos os demais,
incluído o Estado, que se obriga a não realizar atos que afetem o âmbito da autonomia do
sujeito. Por isso, as possibilidades de o Estado exigir o cumprimento dos deveres de
abstenção seriam altas, porque estes se cumprem por simples inação, o que permite que se
transfira às partes da relação jurídica todo o peso da denotação da vulneração, limitando-
se a ação positiva do Estado à aplicação de alguma medida de caráter coativo que impila o
infrator a cessar sua atividade lesiva quando esta se haja verificado como tal. Em outro
caso, quando se trata de direito a prestações, as ações positivas são mais difíceis, já que
exigem uma complexa atividade estatal para denotação ou comprovação do fato da
violação, algo “suscetível de diversas expressões ou de interpretações também variáveis”,
pois, ao não estar precisamente delimitado o conteúdo do direito envolvido, tampouco se
pode limitar os atos que o vulneram (PEÑA FREIRE, 1997, p. 158-9).
Por outro lado, tal diferenciação se baseia em um critério formal de
diferenciação entre direitos prestacionais (que exigiriam basicamente ações positivas) e
direitos de defesa (que exigiriam basicamente ações negativas). A par dessa diferenciação,
é possível um critério de diferenciação material entre ações positivas e ações omissivas
que dependa da fundamentação do direito, independentemente de ocasionalmente surgir
uma pretensão a uma ação positiva ou negativa como meio para se alcançar a realização
do direito no material (LEIVAS, 2006, p. 83). Por tal critério, os direitos de defesa em
sentido material são direitos que asseguram uma esfera de liberdade perante o Estado,
independentemente de gerarem um direito a uma ação positiva como meio para se
alcançar a liberdade; já os direitos promocionais em sentido material garantem direitos a
ações positivas – normativas ou fáticas. Convém, assim, adotar uma classificação de
direitos fundamentais com base em um critério material, baseado na fundamentação do
direito – e não mais por um critério formal entre ações positivas ou omissivas (LEIVAS,
2006, p. 83-4).
De tal raciocínio conclui-se que o Estado, como destinatário das normas de
proteção, tem um amplo campo de ação dentro do qual pode eleger como deseja cumprir
com o mandado entre as várias opções disponíveis que importem em uma proteção ou
promoção do direito. Porém, tal dever estatal de proteção existe e essencialmente não é
distinto da proteção da dos direitos de defesa. Os direitos de defesa também necessitam da
proteção do Estado e, portanto, exigem um “fazer” (prestações positivas) – para além da
mera omissão –, o que, por sua vez, também demanda recursos do Erário Público. Se não
fosse assim, sequer se poderia pensar em “direitos” civis e políticos, pois as prescrições
normativas se limitariam a impor obrigações negativas ou sanções (COURTIS, 2009).
Boa parte da motivação para tão drástica diferenciação entre direitos sociais e
direitos políticos decorreriam de uma “tensão pela igualdade” dos primeiros em oposição
a uma “tensão pela liberdade” que caracterizaria os últimos. Trata-se de uma discussão
superada em prol de uma conceituação mais ampla de liberdade – “liberdade real” -, cujo
núcleo envolve também a proteção dos direitos sociais, já que envolve a satisfação dos
direitos civis, políticos e sociais, cujo exercício está vinculado tanto a imunidades
negativas como a faculdades positivas (SCHWARZ, 2013, p. 49-50).
Em realidade, a noção de radical diferença entre direitos sociais e direitos civis
e políticos coincide com a noção liberal de “Estado mínimo”, para a qual ao Estado
incumbiria lidar com as questões de justiça, de segurança pública e de defesa. Dessa
forma, não mais se justifica a pretensão de negar eficácia aos direitos sociais por uma
diferença tipológica com os direitos políticos, nem mesmo no campo do pensamento
liberal. Há claramente uma interrelação entre as obrigações positivas e negativas e tal
ocorre também quanto se trata de garantir a liberdade individual. As instituições políticas,
judiciais, de segurança pública e de defesa necessitam também, para consecução de seus
fins, que exercitem uma larga série de obrigações positivas. Da mesma forma, exige-se
que o Estado desenvolva um papel ativo na criação das condições institucionais e legais
para consolidação, funcionamento e expansão do mercado. O mesmo ocorre quando se
pensa em outros direitos civis e políticos, como o do devido processo legal, do acesso à
justiça, do direito de casar, de associar-se ou de exercer os direitos eleitorais.
Como resumo, pode-se entender que tal distinção tem um valor meramente
classificatório: alguns direitos, por suas características principais, remetem mais a
obrigações negativas pelo Estado (direitos civis e políticos); outros se caracterizam
fundamentalmente por exigir obrigações positivas do Estado (direitos econômicos, sociais
e culturais).111 No espaço intermediário entre os dois tipos se situam um espectro de
direitos que combinam obrigações positivas e negativas em proporções diversas, sem que
se possa enquadrá-los em um ou outro tipo, exceto como resultado de uma decisão mais
ou menos arbitrária.
Abre-se espaço, assim, a uma concepção mais integradora que proclama a
unidade dos direitos fundamentais em que, essencialmente, se procura garantir o papel
central do cidadão no processo político com um triplo e simultâneo objetivo: a) o respeito
de sua esfera privativa de vida pessoal, não passível de coerção pelo poder político; b) a
elevação do cidadão como “dominus” da coisa pública , sujeito e não objeto da mesma,
mediante sua determinante participação na formação da vontade política do Estado e nas
instâncias pública e socialmente relevantes e c) organização de um sistema de prestações
positivas do Estado em favor do cidadão que tornam permanentemente possíveis sua
existência, seu livre desenvolvimento e a manutenção de seu papel central no sistema
(IBARRECHE, 1996, p. 102).
Finalmente, a indivisibilidade dos direitos civis e políticos também se justifica
ante um visão moderna de direitos humanos, onde se afasta equivocada noção de que
apensa uma classe de direitos (civis e políticos) merece inteiro reconhecimento e respeito,
enquanto outra classe de direitos (a dos direitos sociais, econômicos e culturais) ao revés,
não merece qualquer observância: a ideia da não-acionabilidade dos direitos sociais é
meramente ideológica e não científica. (PIOVESAN, 2004, p. 82).
2.1.3.5 – Os direitos sociais como normas jusfundamentais
111 “Todos los derechos cuestan y deben protegerse” sintetiza Luis Ernesto Vargas Silva (Presidente da CorteConstitucional da Colombia, afirmando que “a sustentabilidade fiscal não é um princípio constitucional, masapenas ferramenta para atingir os fins do Estado Social. (VARGAS SILVA, 2014).
Os direitos fundamentais sociais explicitam o que corresponde à pessoa
humana ser e ter para que vida com dignidade em uma sociedade livre, justa e solidária
(LEDUR, 2009, p.83).
Conforme Paulo Leivas (2006, p. 87) os direitos fundamentais sociais
integram uma categoria mais ampla, juntamente com os direitos à organização e os
direitos à proteção, a dos direitos prestacionais em sentido amplo, que se caracterizam
como direitos a ações positivas, ainda que cada tipo de direitos tenha suas características
próprias.
Os direitos fundamentais à organização (e procedimento) podem ser tanto
direitos a determinadas normas procedimentais quanto a direito a determinada
interpretação de aplicação concreta de direitos procedimentais. Os direitos fundamentais
de proteção são direitos contra o Estado para que ele proteja os titulares de direitos
fundamentais contra intervenção de terceiros (LEIVAS, 2006, p. 84-5),
Em tal classificação, os direitos fundamentais sociais podem ser denominados
como direitos prestacionais em sentido estrito (LEIVAS, 2006, p. 85) e tem como
principal característica a ser mencionada a de serem direitos e ações positivas fáticas
(“direito a algo”). Não são quaisquer ações fáticas, mas aquelas que, se o indivíduo
possuísse meios financeiros suficientes e, se encontrasse no mercado uma oferta
suficiente, poderia obtê-las também de particulares. À primeira característica importa
acrescer outra, a da importância: nem tudo que pode ser encontrado no mercado pode ser
objeto de direito fundamental, social, mas aquelas ações reconhecidas como fundamentais
(“concepção formal dos direitos fundamentais”), expressando “posições tão importantes
que sua outorga ou não-outorga não pode permanecer nas mãos de simples maioria
parlamentar” (LEIVAS, 2006, p. 88).
Em ALEXY (1997, p. 62), se pode dizer que os direitos fundamentais sejam
aqueles que se extraem de normas de direito fundamental ou jusfundamentais. Os direitos
sociais são um gênero, que inclui diferentes espécies de direito (previdenciários,
trabalhistas, à moradia, à saúde, etc.) e, desde 1967, no Brasil, são considerados
“implicitamente fundamentais” (ACCA, 2013, p. 107).
Em uma definição possível de normas fundamentais, estas são aquelas
expressas nas disposições de direito fundamental contidas essencialmente na Constituição.
Tal definição contém um critério formal ou topográfico de norma fundamental que se
afasta de critérios materiais ou estruturais (que, por exemplo, restringiriam as normas
jusfundamentais àquelas que expressassem os direitos individuais de liberdade ou que
limitariam essas normas aquelas que conferissem direitos subjetivos). Porém, tal definição
não pode ser estreitamente interpretada, pois é possível argumentar validamente que
outras normas, ainda que não previstas formalmente na Constituição, sejam a ela
associadas (ALEXY, 1997, p. 70) e, assim, sejam também normas jusfundamentais
(LEIVAS, 2006, p.10-1 e 89-90).
É possível identificar os direitos fundamentais sociais, ainda quando não
expressamente expressos na Constituição, como integrados a um conjunto de normas que
constituem uma “ordem objetiva” constitucional, superando-se uma visão tradicional que
procura diferenciar os direitos sociais dos direitos políticos (Canotilho, 1991, p.532).
Desta forma, potencialmente, podem ser utilizados por qualquer pessoa em determinadas
circunstâncias, embasados na consciência social de viver todos em dignidade (fator de
coesão social, com base na solidariedade social).
2.1.3.6 – As dificuldades de concreção dos direitos fundamentais sociais
Intensa polêmica marca o debate quanto à efetividade e à aplicabilidade direta
dos direitos sociais. Quando se trata de fazer valer os direitos sociais constitucionais, em
especial os ligados ao trabalho, a tensão política cresce de dimensão, especialmente no que
diz respeito às suas reais possibilidades de efetivação desse direito constitucional. Alguns
autores, com base na judiciabilidade deficiente dos direitos sociais, negam a eles qualquer
pretensão de vinculação dos poderes públicos, entendendo que a definição de seu
conteúdo é um assunto da política. Outros, como Carl Schmitt (1982), apontam uma
suposta incompatibilidade dos direitos sociais como outros valores constitucionais, como a
liberdade. Ou, pelo menos, identificam um “ciclo de baixa normatividade” dos direitos
sociais (BONAVIDES, 2007, p. 564-565).
Entretanto, as dificuldades de reconhecimento dos direitos sociais não são
maiores que as dos direitos políticos: a identificação das violações dos direitos políticos
não difere essencialmente da dos direitos sociais. Ainda que se reconheça que a carga
promocional dos direitos de defesa crie maiores problemas por razões teórico-estruturais –
o que afeta sua justiciabilidade, tal distinção não é essencial no que tange a um dever de
proteção do Estado. Conforme Alexy (1997, p. 446), a diferença, no caso, radica no fato
de que os direitos de liberdade ou de autonomia assumem a forma de “expectativas
negativas” a que corresponde o dever dos poderes públicos de “não fazer” (proibições), ao
passo que os direitos sociais impõem deveres de “fazer” (obrigações) e sua violação não
se manifesta, como no caso dos de liberdade, na falta de validade de atos (legislativos,
administrativos ou judiciais) – que podem ser anulados pela via jurisdicional, mas em
“lacunas de disposições e/ou carências que reclamariam medidas coercitivas nem sempre
acionáveis” (FERRAJOLI, 1999, p. 109).
Por outro lado, como se viu, não se pode falar em mera omissão estatal de
agir, seja em face a direitos sociais, seja em face de direitos civis e políticos. Haverá
sempre um campo de ação dentro do qual o administrador poderá eleger sua ação
protetiva, sem que se possa pretender que ser admissível a omissão no exercício de seu
dever de agir (e de, assim, necessariamente, escolher por uma das ações possíveis,
parecendo racional que escolha a que seja mais efetiva!) sob a alegação de que tal escolha
deve ser feita pelo legislador.
O conteúdo promocional das normas sociais pode exigir diversas formas de
intervenção pública para sua concreção. As dificuldades residem, mais uma vez, na
natureza e alcance de tal ação estatal. A inexistência ou a inconveniência de direitos
subjetivos públicos tem sido oposta à efetividade dos direitos fundamentais, em especiais
os direitos fundamentais sociais.
A título de ilustrar essa polêmica, dois autores são trazidos à colação,
problematizando as possibilidades de judiciabilidade dos direitos sociais: PEÑA FREIRE
(1997, p. 154-66) e FERRAJOLI (1999, p. 101-119).
PEÑA FREIRE entende que os direitos subjetivos não oferecem um nível de
garantia adequado aos direitos fundamentais, pois são “expedientes de garantia individual,
reacional, negativo e processual” e, portanto, são uma garantia válida para relações com
estas mesmas características, ao passo que “a centralidade da pessoa que vincula o poder
político e o sistema jurídico” exige-se a “maximização da garantia”, de forma que se atinja
um nível mais elevado de garantia do que a simples habilitação processual. Apontando as
dificuldades para tomar os direitos subjetivos em peça-chave de um sistema de garantia
constitucional, o autor assinala óbices políticos (tendência de maximização não-prevista
na Constituição dos direitos através da atuação do mesmo órgão responsável pelas
garantias); axiológicos (não-adequação do direito subjetivo, próprio para situações de
desigualdade, para proteção e garantia de situações de igualdade) e estruturais (direitos
fundamentais são entendidos como prévios e originários ao ordenamento jurídico; são
faculdades que se usufruem sem necessidade de imputação normativa e, assim, não são
assinaláveis a indivíduos; são indisponíveis, ao contrário dos direitos subjetivos).
Claramente aposta PEÑA FREIRE no reconhecimento – não de direitos
subjetivos – mas de interesses legítimos112, que, nas suas próprias palavras, se
caracterizariam por sua estrutura imperfeita e por permitir somente uma tutela indireta – já
que se refere ao exercício de uma potestade administrativa em que não são afetados
direitos substanciais. Assim, o interesse legítimo teria uma “natureza instrumental,
vinculada ao procedimento administrativo e somente se veria expressada a partir da
derivação ou exercício ilegítimo do poder público administrativo”.
Em um certo contraponto a tal ceticismo, FERRAJOLI entende que as
dificuldades para as garantias dos direitos sociais não são razão suficiente para negar o
reconhecimento destes como verdadeiros direitos. Para ele, a razão jurídica atual, para
além da tradição juspositivista clássica, beneficiando-se dos progressos do
constitucionalismo do século passado, pode hoje configurar e construir o direito como
“um sistema artificial de garantias constitucionalmente pré-ordenado para a tutela dos
direitos fundamentais”.
Segundo Ferrajoli, em sentido amplo, os direitos fundamentais podem ser
considerados estratégias dirigidas a proteger interesses relevantes, às vezes vitais. A
proteção consiste, basicamente, na invocação desses interesses para que alguém resulte
obrigado a não interferir ou a atuar positivamente na preservação dos mesmos, criando-se,
conforme a formulação e o alcance prático das obrigações, diferentes níveis de garantia
dos direitos. A inexistência ou a insuficiência de tais garantias em alguns desses níveis
pode reduzir os direitos, no melhor dos casos, a simples declarações bem-intencionadas e,
no pior dos casos, em velado instrumento de manipulação de poder. Desde ponto de vista,
não há direitos sem deveres correlatos e, portanto, sem sujeitos que se obriguem a
respeitá-los. Mas, por outro lado, não há sujeitos obrigados sem sujeitos capazes de
obrigar.
Ainda conforme Ferrajoli, os direitos subjetivos se caracterizam como
expectativas de prestações e de não-lesões frente aos poderes públicos e privados. As
garantias, por sua vez, são apresentadas como obrigações destinadas à proteção dos
direitos. Estas obrigações podem assumir conteúdo de deveres positivos (de fazer) ou
negativos (de não fazer). Ferrajoli distingue dois tipos de garantias: as primárias (legais) e
as secundárias (jurisdicionais). As garantias primárias compreendem as obrigações em
que, em matéria de direitos fundamentais, as normas se impõem ao legislador (e,
112 O “interesse legítimo” seria o “irmão menor” do direito subjetivo. “Conforme José Afonso da Silva,citando Barile, ao contrário do direito subjetivo, em que a proteção é direta, plena e específica, a proteção dointeresse é indireta, limitada e genérica” (AFONSO DA SILVA, 2000, p. 170).
indiretamente, ao administrador). As garantias secundárias, por sua parte, estão
constituídas por deveres em que, também em relação aos direitos, as normas destinam-se
aos órgãos jurisdicionais. A relação entre umas e outras seria de subsidiariedade, ou seja,
as garantias secundárias operariam somente em caso de insuficiência ou não cumprimento
das garantias primárias. Ambas seriam, em suma, deveres a cargo dos poderes públicos,
isto é, garantias em que se estabelece com os direitos uma relação de imputação
normativa, um “dever-ser” do ordenamento jurídico (FERRAJOLI, 1999, p. 12).
Assim, não se deve confundir conceitualmente “direitos subjetivos” (que são
as expectativas positivas - de prestações- ou negativas – de não-lesões-) atribuídas a um
sujeito por uma norma jurídica com as garantias (deveres correspondentes a estes direitos).
A distinção entre as garantias primárias e garantias secundárias se baseia na teoria de
Kelsen (1998, p. 190-2), para quem as primeiras consistem em obrigações (de prestação) e
proibições (de lesões); as segundas são as obrigações de reparar ou sancionar
judicialmente as lesões dos direitos, quer dizer, as violações de suas garantias primárias A
teoria kelseniana é apropriada para explicar os direitos patrimoniais, pois toma estes como
figuras paradigmáticas do direito subjetivo. Entretanto, não pode dar conta dos chamados
sistemas fotodinâmicos em que, teoricamente, é possível tanto a existência de antinomias
(contradições entre normas) como de lacunas (pela ausência de normas que propiciem a
completude). Em tais sistemas – que são próprios para o caso dos direitos fundamentais -,
não se pode meramente negar a existência do direito ante a constatação da presença de
uma antinomia (normas contraditórias) ou de uma lacuna (como a ausência de garantias
secundárias).
Conforme o autor citado, nem sempre se estabelece uma relação normativa
entre as garantias primárias e as garantias secundárias. Assim, ante a inexistência das
segundas não há porque negar a existência das primeiras, mas, ao contrário, há de se
apontar para uma “inobservância dos direitos positivamente estipulados, porque o que
ocorre é uma indevida lacuna que deve ser preenchida pelo legislador”.
Como consequência prática de tais posicionamentos teóricos, nada autoriza
concluir que, tecnicamente, os direitos sociais não sejam garantizáveis do mesmo modo
que os demais direitos porque os atos requeridos para sua satisfação seriam
inevitavelmente discricionais, não formalizáveis ou não suscetíveis de controles e
coerções jurisdicionais. Devem-se buscar as razões da não-efetividade dos direitos sociais,
portanto, no âmbito da vontade política – e não da impossibilidade técnico-jurídica.
Conclui Ferrajoli que a existência de direitos constitucionais não supõe
somente a obrigação do legislador de preencher as lacunas de garantias com disposições
normativas e políticas orçamentárias orientadas a sua satisfação, mas também “o
estabelecimento de tantas outras diretivas dotadas de relevância decisiva na atividade
interpretativa da jurisprudência ordinária e, sobretudo, na dos Tribunais superiores”.
A discussão a respeito da aplicabilidade dos direitos sociais, especificamente o
direito ao trabalho no contexto do direito alemão, é problematizada também por Robert
Alexy (1997, p. 432-501) que expõe os argumentos favoráveis e contrários em um modelo
de direitos fundamentais sociais. No primeiro sentido, são expostos duas teses: que a
liberdade jurídica não tem sentido se não se transforma na liberdade fática que assegura ao
indivíduo a possiblidade de escolher o que lhe é permitido; que cabe ao Estado assegurar
ao indivíduo o exercício dos direitos fundamentais para que ele possa desenvolver-se livre
e dignamente na comunidade social. No sentido oposto, arrolam-se as teses de que os
direitos sociais não são judiciáveis porque tal implicaria a transferência de decisões
políticas do Parlamento para os Tribunais e de que os direitos sociais mostram-se
inconciliáveis com as normas constitucionais que asseguram os direitos de liberdade.
Como solução, Alexy propõe um modelo de direitos sociais que considere
tanto os argumentos favoráveis quanto os desfavoráveis, sustentando que “os direitos
sociais são tão importantes que sua outorga não pode ficar à mercê de simples maioria
parlamentar” (ALEXY, 1997, p. 432). Assim, através de uma ponderação dos princípios
em conflito, tarefa designada ao intérprete constitucional, é possível determinar dos
direitos sociais definitivos que o indivíduo possui. (LEDUR, 1998, p. 73-7).
2.1.3.7 - A proibição da proteção não-suficiente.
Conforme Paulo Leivas (2006, p. 76), o conceito de proibição de não-
suficiência surgiu na Alemanha e designa a exigência de que o legislador (e também o
administrador), se está obrigado a determinada ação, deve atuar de forma que tal ação
alcance resultados mínimos. Tal conceito é simétrico ao que ocorre com a proibição do
excesso, que obriga o Estado, sua ação, a observar limites máximos (LEIVAS, 2006, p.
76).
A teoria constitucional de Alexy admite que os direitos fundamentais,
compreendidos como mandados de otimização prima facie possam sofrer restrições
mediante outras normas de nível constitucional ou por meio de normas infraconstitucional
autorizadas pela constituição e, nesse caso, decide-se o caso através do exame de
proporcionalidade (teoria externa das restrições) (LEIVAS, 2006, p. 61-2). No que tange
às obrigações positivas, que necessitam de ação do Estado para serem efetivadas,
questiona-se sobre as possibilidades fáticas de ações positivas adequadas que levem a seu
cumprimento. A análise permite um abordagem dúplice: os direitos à ações positivas
podem ser entendidos como princípios prima facie ou como direitos definitivos. Se as
obrigações positivas são entendidas como princípios, podem ser tomadas como mandados
que ordenam prima facie sua otimização dentro das possibilidades fáticas e jurídicas e,
portanto, constituem mandados de ação universal, ou seja, ordenam todas as ações que
promovam o objeto de otimização. Nesse sentido, a estrutura teleológica desse mandado
de ação universal determina que, ordenado um objetivo Z e existente um meio M que
promove ou alcança o objetivo Z, a utilização do meio M é ordenada. (LEIVAS, 2006, p.
74).
Já as obrigações positivas como direitos definitivos dependem do preceito da
proporcionalidade. Se, nos direitos de defesa, existe a “proibição do excesso”, em relação
aos direitos que exigem ações positivas do Estado, a aplicação do preceito da
proporcionalidade aplica-se a “proibição da não-suficiência”. Tratam-se de conceito
equivalentes que se deduzem-se logicamente do caráter principiológico das obrigações de
ação estatal (LEIVAS, 2006, p. 76).
Considerando a existência de diferentes ações promocionais decorrentes de
diferentes medidas, sendo que muitas delas acabam por eliminar posições jurídicas
constitucionais contrárias, há de se indagar, para cada uma dessas medidas, se e em que
medida, sua aplicação é ordenada pela Constituição. Para tanto, aplica-se a ponderação,
nos seus três preceitos parciais: adequação, necessidade e proporcionalidade estrita
(LEIVAS, 2006, p. 77).
A adequação no sentido da proibição da não-suficiência implica que uma
medida M será adequada quando for apta para alcançar ou promover o objetivo exigido
pela norma que obriga o Estado a agir (princípio P1); caso contrário, ou seja, caso o meio
M1 não seja apto, ele será proibido, impondo-se que outros meios, adequados, sejam
buscados para a realização do princípio P1.
A necessidade no sentido da proibição da não-suficiência implica que não
exista outro meio pelo qual o objetivo exigido pela norma que obriga o Estado a agir seja
igual ou em maior medida alcançado, porém preservando ou atingindo menos fortemente
posições jusfundamentais colidentes. Assim, existindo, a par de um meio M1, um outro
meio M2, sendo ambos adequados a realização do princípio P1 no sentido da proibição da
não-suficiência, será preferível o meio que em menor medida prejudica a realização do
princípio colidente P2 e, assim, se este for M2, tem-se que o preceito da necessidade
proíbe a utilização de M1.
A proporcionalidade estrita no sentido da proibição da não-suficiência implica
que se realize uma ponderação segundo a regra de que “quanto maior é o grau de não-
satisfação ou de afetação de um princípio, tanto maior tem de ser a importância da
satisfação do outro”. Trabalha-se, aqui, com princípios dirigidos contra o Estado e que,
por seu caráter teleológico, exigem a ação mais ampla possível no sentido de otimização
de um objetivo. Existindo mais um meio adequado e necessário para promover ou
alcançar o princípio P1, procede-se um juízo com base na regra de ponderação, pela qual
se avalia o grau de afetação ou não satisfação entre os meios concorrentes em relação ao
princípio concorrente P2. A regra de ponderação pode adotar uma escala de
satisfação/afetação triádica (leve, média e grave) ou triádica dupla (leve-leve, leve-média,
leve-grave, média-leve, média-média, média-grave, grave-leve, grave-média ou grave-
grave). Assim, um meio M2 que prejudica a satisfação do princípio concorrente P2 de
forma grave e satisfaz o princípio P1 de forma média, tal meio está proibido, devendo ser
buscados outros meios que promovam ou realizem o princípio P1.
Da ponderação pode ocorrer que nenhum meio satisfaça o princípio P1 e,
portanto, nenhum meio é exigido; ou que apenas um meio satisfaça o princípio P1, o que
determina que este meio seja exigido definitivamente. Existindo mais um meio adequado,
necessário e proporcional em sentido estrito que satisfaça o princípio P1, discute-se se
cabe ao Estado discricionariamente escolher qualquer dos meios ou, então, adotar-se outro
meio de escolha. Considerando que a livre escolha do meio pelo Estado implica a
possibilidade um espaço de ação que permite que este termine por não adotar o meio de
maior assistência (contrariando o mandado de otimização), parece mais correto que se
busque meio alternativos de escolha: a) maximização da intensidade de assistência; b)
maximização da proporção entre intensidade de assistência e intensidade de prejuízo. O
primeiro significa que, abstraindo-se do eventual prejuízo em princípios colidentes,
escolhe-se o meio que oferece a mais alta satisfação do princípio que impõe uma
obrigação de ação positiva do Estado. O segundo implica uma ponderação de segundo
nível, pela qual se metrificam a intensidade da realização e do prejuízo, em um cálculo de
subtração (realização menos prejuízo) ou de proporção (realização dividida por prejuízo),
recaindo a escolha sobre a meio de melhor resultado (LEIVAS, 2006, p. 77-81).
Demonstra-se, assim, que os direitos e as ações positivas são estruturalmente
determináveis, podendo resultar em obrigações definitivas judicializáveis. Em caso de
duas ou mais ações proporcionais em sentido amplo (adequadas, necessárias e
proporcionais em sentido estrito), tendo em conta as dificuldades para uma aplicação de
segundo nível, prefere-se a ação com a máxima intensidade de assistência (LEIVAS,
2006, p. 82).
2.1.3.8 – O princípio de não-retrocesso dos direitos fundamentais sociais
A ideia originalmente se encontra em Konrad Hesse como irreversibilidade
das conquistas sociais em seu manual de direito constitucional em 1978, mas somente
reaparece mais de dez anos depois, já como o nome de princípio do não-retrocesso social
(ACCA, 2013, p. 100). Em tal período, a Alemanha atravessou período de dificuldade
econômica, tendo-se instalado um debate sobre o futuro do Estado Social alemão e sobre a
legitimidade de restringirem-se e/ou suprimirem-se benefícios sociais assegurados aos
cidadãos (CONTINENTINO, 2015).
Tal princípio preconiza, basicamente, que ganhos sociais garantidos pelo
Estado aos seus cidadãos não podem posteriormente ser suprimidos. De um ponto de vista
prático, trata-se de questionar quais os limites em que uma nova legislação possa suprimir
conquistas sociais, ou, conforme Ingo Sarlet (2005), “saber se e até que ponto pode o
legislador infraconstitucional (assim como os demais órgãos estatais, quando for o caso)
voltar atrás no que diz com a implementação dos direitos fundamentais sociais, assim
como dos objetivos estabelecidos pelo Constituinte (...) ainda que não o faça com efeitos
retroativos e que não esteja em causa uma alteração do texto constitucional”. Cogita-se,
aqui, dos efeitos prospectivos de tais da alteração legislativa, não se confundindo com a
proteção geral a respeito de direitos adquiridos (SARLET, 2005). Além disso, pode-se
interpretar tal princípio como sendo um dever geral de progressidade”, que criaria um
ônus para o administrador e para o legislador de justificar a necessidade das medidas
regressivas, pois, conforme Rodrigo Schwarz (2013, p. 59), ainda que se admita que, em
certas circunstâncias, os poderes públicos promovam certas reformas prima facie
regressivas, “devem sempre demonstrar à cidadania que as alterações que pretendem
promover redundam, ao final, em maior “promoção dos direitos sociais, justificando-as
amplamente”.
De um ponto de vista prático, trata-se de questionar quais os limites em que
uma nova legislação possa suprimir conquistas sociais, ou, conforme Ingo Sarlet (2005),
“saber se e até que ponto pode o legislador infraconstitucional (assim como os demais
órgãos estatais, quando for o caso) voltar atrás no que diz com a implementação dos
direitos fundamentais sociais, assim como dos objetivos estabelecidos pelo Constituinte
(...) ainda que não o faça com efeitos retroativos e que não esteja em causa uma alteração
do texto constitucional”.
Essa obrigação de não-regressividade em matéria de direitos sociais se
relaciona com uma obrigação de progressividade e, assim, em sua versão mais ampla e
ideológica, configuraria um “princípio da proibição da evolução reacionária”, pressupondo
a inevitabilidade de um progresso, uma direção e uma meta emancipatório e
unilateralmente definidas: aumento contínuo de prestações sociais”. Tal princípio,
aplicado de forma rígida, anteriomente enfatizado por Canotilho (1999, p. 320), foi pelo
mesmo repensado, e passou a ser defendido de forma relativizada (CANOTILHO apud
Continentino, 2015).
No Brasil, o embate também evoluiu para uma posição mais flexível. Entre os
que afirmavam a inconstitucionalidade de qualquer norma que tenha como meta a
relativização, supressão ou aniquilação dos direitos sociais (Túlio Afonso) e os que
achavam que o legislador pode reduzir, mas não suprimir políticas públicas (Cláudia
Gonçalves), surgiu um terceiro grupo.de doutrinadores que aceitava uma redução desde
que não fosse atingido o núcleo essencial do direito social em questão (ACCA, 2013, p.
101-2). Surge, assim, uma doutrina restrita do princípio do não-retrocesso, como base no
inatingibilidade do núcleo essencial dos direitos sociais. 113
A doutrina da garantia do núcleo essencial dos direitos fundamentais foi
especialmente desenvolvida na Alemanha em razão da existência da Lei Fundamental de
Bonn no art. 19.2 de que as leis restritivas de direitos fundamentais não podem atingir o
núcleo dos direitos, verdadeiramente “um espaço de maior intensidade valorativa” (o
“coração do direito”), sem o qual o direito deixa verdadeiramente de existir (ADAMY,
2011, p. 129)
Conforme Ingo Sarlet (2006, p. 25), o princípio do não-retrocesso encontra-se
implícito na Carta de 1988 como decorrência da noção de Estado Democrático de Direito
e em consonância com o princípio da dignidade da pessoa humana. Intimamente ligada à
noção de segurança jurídica, a proibição de retrocesso se justifica pela necessidade da
dignidade das pessoas serem suficientemente protegida e respeitada ficando a salvo da
instabilidade jurídica de maneira a terem um mínimo de segurança e tranquilidade,
113 Outros autores, como o português Jorge Novais sustenta uma proibição restrita de normas regressivas,porém com base no princípio da proteção da confiança (NOVAIS, 2014, p 262-262).
confiança nas instituições sociais e estatais (incluindo o Direito) e em uma certa
estabilidade de suas próprias posições jurídicas.
Citando Jorge Miranda, Sarlet (2005) afirma a conexão do princípio do não-
retrocesso social com o direito à segurança jurídica, sustentando que
“o legislador não pode simplesmente eliminar as normas (legais) concretizadoras de direitossociais, por isso equivaleria a subtrair às normas constitucionais a sua eficácia jurídica, já queo cumprimento do comando constitucional acaba por converter-se em uma proibição do dedestruir a situação instaurada pelo legislador”.
Portanto, reconhece-se que, uma vez alcançado pelo cidadão um núcleo
essencial de direitos sociais contido na ordem constitucional, que se constitui em um
patamar mínimo de segurança social que não pode ser anulado pura e simplesmente pelo
administrador e, nem mesmo, pelo legislador ordinário, já que corresponde ao núcleo do
direito à um mínimo de existência digna” (SARLET, 2005).
Tal conteúdo mínimo não é alterável mediante interpretação, nem pode ser
disposto por maiorias conjunturais114, de forma que não se pode utilizar a realidade
econômica ou social de um momento dado como critério para que não sejam aplicados os
princípios constitucionais (BERCOVICI, 2004, p. 110). Assim, diversos tribunais tem
desenvolvido a tese da existência de marcos mínimos ou essenciais em matéria de direitos
sociais, obrigatórios tanto para os poderes públicos como para particulares, como por
exemplo, a teoria do mínimo de existência vital pelo Tribunal Constitucional alemão
(SCHWARTZ, 2013, p. 65).
114 Conforme Sarlet (2005), em relação a tal conteúdo mínimo, não se aplicam nem a cláusula da “reserva dopossível”, nem a objeção da separação do poderes.
2.2 O DIREITO À UMA REABILITAÇÃO PROFISSIONAL EFETIVA E
COMPLETA
2.2.1 O direito ao trabalho na Constituição brasileira
Ao contrário de outras constituições (como a Lei Fundamental de Bonn, por
exemplo), a Constituição brasileira cataloga uma série de direitos sociais, no Capítulo II
do Título II, sendo que este dispõe sobre Direitos e Garantias Fundamentais. Nesse
capítulo estão contidos os artigos 6º (que descreve genericamente os direitos sociais,
enumerando expressamente os relativos à educação, à saúde, ao trabalho, ao lazer, à
segurança, a previdência social, à proteção à maternidade, à infância e à assistência aos
desamparados), 7º (que prevê os direitos trabalhistas), 8º (que dispõe sobre direitos e
garantias às associações sindicais), 9º (que garante o direito de greve), 10º (que assegura a
participação de trabalhadores e empregados, por suas entidades representativas, em
colegiados de órgãos públicos) e 11 (que prevê a eleição de representante dos
trabalhadores em empresas com mais de 200 empregados para fins de entendimento
direto). Por fim, deve-se ter em conta o controvertido art. 10 das Disposições Transitórias
Constitucionais que limita a proteção contida no art. 7º, I “ao aumento para quatro vezes
da porcentagem prevista no art. 6º caput e parágrafo 1º da Lei n. 5.107 de 13 de novembro
de 1966” ou seja, passa a ser uma indenização compensatória no valor de 40% sobre os
depósitos do FGTS
Assim, não deve pairar dúvidas de que, na Constituição brasileira, os direitos
sociais são inequivocamente normas jusfundamentais (SARLET, 1998, p. 255). Optou,
portanto, o legislador constituinte pela inclusão dos direitos sociais no capitulo dos
direitos fundamentais, assegurando-os a todos os trabalhadores urbanos e rurais, ao lado
de outros que visem à melhoria de sua condição social. Pelos mesmos motivos, os direitos
sociais tem aplicação imediata, conforme artigo 5o, parágrafo 1o da Constituição Federal.
Interpretando sistemicamente as normas de proteção ao direito ao trabalho
teríamos, em primeiro lugar, os artigos 6º e 7º da Constituição Federal. Analisando a
eficácia de ambos os dispositivos, Luís Afonso Heck115 afirma que, no art. 6º, situa-se uma
norma relacionada com o direito ao trabalho, enquanto que, no art. 7º, encontram-se
normas relacionadas com o direito do trabalho, ou seja, normas que se aplicam no trabalho
115 In: Prefácio do livro LEDUR, José Felipe. “A realização do direito ao trabalho”. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1998,
assentado sobre uma situação jurídica. Do fato, entende o autor que, no primeiro caso, “a
tarefa de interpretação da constituição, histórico-concreta, que não está na obtenção do
sentido por meio uma aproximação reflexiva do problema a ser resolvido, cabe antes ao
legislador do que ao judiciário”. Portanto, para o autor, trata-se de um direito fundamental
que exige, por seu conteúdo indefinido, primeiro, a atividade configuradora do legislativo
e a organizadora do executivo (art. 174). Já quanto ao art. 7º, trata-se de uma relação
jurídica violada e que, assim, está a cargo do judiciário, mesmo no caso de omissão do
legislador. Entretanto, não se pode deixar de considerar que, nesse processo de clivagem
interpretativa, de algum modo se enfraquece o direito como um todo que, como se viu,
deflui diretamente de todo o sistema constitucional, estabelecendo um plano global
normativo para o Estado e da sociedade.
Conforme Ivan Amorin, “o direito ao trabalho, enquanto previsto na
Constituição, não impõe o dever de se garantir emprego para todos, mas se refere à
possibilidade de se exercer licitamente a atividade”. (AMORIN, 2009, p. 85) Assim, não
haveria um direito subjetivo de se exigir uma prestação na obtenção do emprego, nem uma
obrigação do Estado em conseguir trabalho para todos os que estejam desocupados, mas
apenas um compromisso do Estado empregar recursos para proporcionar ocupação aos
que dela careçam (AMORIN, ibidem).
Já Leonardo Vieira Wandelli (2012, p. 224) entende que os diversos direitos
referidos nos artigos 7º a 11 da Constituição são desdobramentos parciais do direito
fundamental ao trabalho contido no art. 6º, que não esgotam todos seus efeitos, já que uma
parte importante do conteúdo desse direito se refere à sua dimensão objetiva, ou seja,
inclui a obrigação do Estado de promover um plexo de normas reguladoras e protetivas da
relação de emprego. Esta é apenas uma das múltiplas facetas do direito ao trabalho.
Assim, qualquer pessoa pode ser titular ao direito ao trabalho, ao passo que somente os
trabalhadores são titulares do direito do trabalho. A importância de tal pensamento é a de
que, especificamente para uma parcela dos trabalhadores (aqueles que já detêm um posto
de trabalho), a proteção contra a despedida tal como prevista no art. 7º constitui, mais de
que um direito individual, é um dever de Estado, emanado diretamente do art. 6º
constitucional.
Tais dispositivos constitucionais devem ser interpretados em conjunto com
outros que também conferem ao trabalho elevado valor social, a ponto de situá-lo,
juntamente com a livre iniciativa, como fundamento da República (art.1, IV), ligado
intimamente à dignidade da pessoa humana (art. 1, III).
No sentido no sentido constitucional da palavra, como leciona Ingo Sarlet
(2004, 1, p. 59-60), a dignidade é entendida como sendo
“a qualidade intrínseca e distintiva reconhecida em cada ser humano que o faz merecedor domesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, nestesentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contratodo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir ascondições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover suaparticipação ativa e corresponsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhãocom os demais seres humanos” (SARLET, 2004, 1, p. 59-60).
O princípio constitucional de dignidade não apenas impõe ao Estado e aos
particulares um dever de respeito e abstenção, mas também exige a realização de condutas
positivas por agentes públicos e privados tendentes a efetivar e promover a existência
digna do indivíduo (SOARES, 2010, p. 145).
Há de citar, também, os dispositivos constitucionais que se referem à ordem
econômica (art. 170 a 192), em especial, o art. 170 que funda esta última na valorização
do trabalho humano e na livre iniciativa, tendo como fim assegurar a todos existência
digna, conforme os ditames da justiça social, observados determinados princípios, dentre
os quais, o que mais nos interessa mais aqui é o contido no inciso VIII (busca do pleno
emprego). Como bem observa Rafael da Silva Marques (2007, p. 98), “a livre iniciativa
está referida após a valorização do trabalho humano, donde se conclui que a ordem
econômica deve ter por base, primeiro, a valorização do trabalho humano, em detrimento
dos demais valores econômicos e de mercado”.
Como bem observa Wandelli, o contexto normativo é amplamente favorável
ao fortalecimento do direito ao trabalho por meio de um amplo leque de razões normativas
decorrentes do próprio texto constitucional, desdobrando-se em inúmeros princípios e
direitos parcelares, o que não deve servir de pretexto para a diluição de sua normatividade
autônoma (WANDELLI, 2012, p. 228-9).
2.2.2 Conteúdo e limites do direito ao trabalho do reabilitado profissional
O reabilitado profissional faz parte de um contingente de trabalhadores
vulneráveis, o que justifica uma especial proteção por parte do legislador, tanto
assegurando a efetividade do direito fundamental ao trabalho do reabilitado por meio de
normas adequadas como prevendo garantias legais116 que possam ser eficazmente
acionadas em caso de lesão desse direito.
Entendida a reabilitação profissional como um conceito complexo, que
abrange prestações fáticas no âmbito da saúde, da assistência social e da previdência
social, o direito social à reabilitação profissional implica em um direito prestacional em
sentido estrito, pelo qual o reabilitando faz jus a ações positivas fáticas por parte do
Estado que lhe assegurem o acesso a bens e serviços que, de outra forma, não lhe seriam
disponíveis. Por outro lado, como direito prestacional, o direito à reabilitação profissional
implica também uma dimensão protetiva, qual seja, uma pretensão normativa de poderes
públicos desenvolvem políticas públicas que visem a uma reinserção laboral adequada,
inclusive com a criação/manutenção de uma legislação suficientemente protetiva que
propicie uma reabilitação plena. O núcleo de tal direito é uma reabilitação plena, ou seja,
simultaneamente efetiva na medida que assegure ao trabalhador a possibilidade de
assunção a um posto de trabalho adequado como completa de forma que o processo
reabilitatório não cesse sem que se complete sem a reinserção real inserção a um posto de
trabalho - ou, configurada sua impossibilidade, sem o asseguramento ao trabalhador de um
prestação assistencial suficiente.
Um tal direito à reabilitação profissional não está expresso na Constituição,
mas sua existência pode ser deduzida como um direito materialmente fundamental, ligado
ao direito ao trabalho, tendo em conta os princípios da dignidade da pessoa humana e de
valorização do trabalho humano com a finalidade de assegurar a todos uma existência
digna. O direito à reabilitação profissional, como direito à assistência social, é
expressamente previsto no art. 204, IV da Constituição. Da mesma forma, como
decorrência do direito à saúde, também deve ser deduzido tal direito, como dever do
Estado de promover políticas públicas igualitárias e universais de promoção, proteção e
recuperação da saúde. Porém, essencialmente como desdobramento do princípio
constitucional da igualdade, configura-se o direito à reabilitação profissional como direito
à uma integração não-discriminada no mercado laboral, o que, em uma visão
substantivista do conceito de antidiscriminação (RIOS, 2008, p. 27-31), implica no direito
a ações afirmativas por parte dos poderes públicos no sentido de compensações das
desvantagens e de remoção dos obstáculos a uma plena reinserção laboral.
116 “As garantias traduzem-se quer no direito dos cidadãos a exigir dos poderes públicos a proteção de seusdireitos, quer no reconhecimento de meios processuais adequados a essa finalidade”. (MORAES, 2006, p.171).
Os tratados internacionais ratificados pelo Brasil e que fazem parte integrante
do ordenamento jurídico brasileiro, reconhecem ao reabilitado profissional uma posição
destacada entre os cidadãos merecedores de proteção e assistência, tendo em conta sua
peculiar situação de ser, simultaneamente, vítima do infortúnio, portador de deficiência
que lhe reduz a capacidade de prover seu próprio sustento e, ainda, potencial alvo de
discriminação (ver item 1.1.2). Da mesma forma, aplicável aos reabilitados profissionais,
no que diz respeito à reinserção laboral, a normatividade prevista na legislação protetiva
aos deficientes físicos, como já se mencionou (ver item 1.1.1). A aplicação das normas
relativas a pessoas com deficiência aos reabilitados profissionais, decorre da assimilação,
no que concerne à tutela específica do tema da inserção laboral, das figuras jurídicas do
reabilitado profissional às pessoas com deficiência, especialmente a partir das normas
internacionais, como no caso da Convenção nº 159 da OIT.
Assim, a ratificação do Brasil à Convenção sobre os Direitos de Pessoas com
Deficiência expressa o compromisso do país em assegurar o pleno exercício dos direitos
humanos e liberdades fundamentais ao reabilitado profissional como portador de
deficiência, sem qualquer tipo de discriminação por sua deficiência.
Para cumprimento de tal desiderato, o Estado brasileiro deve proibir toda a
discriminação com base na deficiência, garantindo proteção jurídica igual e efetiva contra
a discriminação de qualquer natureza e promovendo a igualdade, eliminando a
discriminação e tomando as medidas apropriadas para garantir a disponibilização de
adaptações razoáveis (art. 3º). Deve, também, adotar todas as medidas legislativas,
administrativas e de qualquer outra natureza apropriadas para a plena inclusão laboral e
social do reabilitado profissional, medidas que, necessariamente, incluem a organização,
fortalecimento e ampliação de programas completos de habilitação e reabilitação
profissional, particularmente nas áreas de saúde, emprego, educação e serviços sociais
(art. 4º).
Há expressa previsão de que tais serviços e programas comecem no estágio
mais precoce possível e que sejam baseados em avaliações multidisciplinar (art. 26, “a”);
que se apoiem nas necessidades e aptidões individualizadas do reabitando e que sejam
voltados para sua inclusão na comunidade (art. 26, “b”). Em especial, devem promover e
salvaguardar o direito ao trabalho, adotando medidas apropriadas, incluídas na legislação,
para que o emprego oferecido seja digno, voluntário, oferecido em condições de igualdade
com as demais pessoas, protegido contra a injustiça, o assédio e a discriminação (art. 27).
Preveem, com ênfase, o acesso efetivo a programas de orientação profissional e técnica
(art. 27, “c”) e a serviços de colocação no trabalho e de treinamento profissional e
continuado (art. 26, “d”), além da promoção de oportunidades de emprego e de ascensão
profissional, bem como assistência na procura, na obtenção e no retorno ao emprego (art.
26, “e”). Cabe, ainda, destacar a previsão de ações afirmativas, incentivos e outras
medidas que promovam o emprego no mercado regular de trabalho (art. 26, “g” e “h”); do
direito a adaptações razoáveis no local de trabalho (art. 26, “i”) e da promoção da
manutenção do emprego e de programas de retorno ao trabalho (art. 26, “k”).
Como se verificou nas seções anteriores, na legislação brasileira, há diversas
normas que visam desenvolver tais comandos constitucionais, sendo mais destacadas a Lei
n. 8.213/91 e Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei n. 13.146/2015) -, recentemente
aprovado - que tem uma seção dedicada ao tema da reabilitação profissional (ver item
1.1.4). Entretanto, tal normatividade está distante de desenvolver satisfatoriamente todo o
conteúdo prestacional previsto no texto constitucional.
Um dos desdobramento deste direito fundamental ao trabalho do reabilitando
profissional é o de efetiva assistência que, nos termos da lei, deve ser prestada, de forma
integrada, pelos órgãos estatais encarregados da Saúde, da Assistência Social e da
Previdência Social. Outro, o direito a uma proteção suficiente por parte do Estado
consistente em uma regulação estatal que promova eficazmente o direito à reabilitação
profissional.
Portanto, há, no sistema constitucional brasileiro, para o trabalhador
reabilitado um direito fundamental à reabilitação profissional diretamente ligado ao direito
ao trabalho, mais além da afirmação formal do direito a um posto de trabalho que lhe
ofereça o mercado, mas, também, a uma atuação eficaz do Estado (proteção) na
assistência efetiva ao reabilitando profissional e na criação das condições materiais e
jurídicas que propiciem um posto de trabalho adequado que permita reinserção laboral e
social. Há, em tal direito fundamental, uma pretensão fática do tipo prestacional, típica
dos direitos sociais, mas também uma pretensão normativa, ou seja, a uma ação estatal
protetiva que assegure uma regulação eficiente para a consecução da missão constitucional
do Estado de assegurar ao trabalhador uma reabilitação plena.
Decorre daí um direito subjetivo do trabalhador a receber toda assistência à
saude, assistencial e previdenciária durante todo o processo de reabilitação, a começar por
uma avaliação correta de suas condições físicas, psicológicas e sociais por uma equipe
multidisciplinar e pela identificação correta de sua incapacidade e sua devida inscrição no
processo de reabilitação profissional. Em seguida, por designação de um programa eficaz
de reabilitação profissional, em que o trabalhador receba toda a assistência e orientação
necessárias para sua reabilitação efetiva e sua reintegração ao mercado profissional. Por
fim, o direito do trabalhador receber uma prestação de benefício continuado até que sua
reintegração efetivamente se complete.
Tal direito à uma reabilitação efetiva e completa decorre do direito
fundamental ao trabalho, cabendo, nesse ponto, inteiramente a discussão sobre a
justicibilidade dos direitos sociais em uma visão maximalista, pela qual a jurisdição
constitucional é um instrumento institucional de garantia da efetividade do projeto
constitucional (Lenio Streck, ciado em MELLO, 2004, p. 99). Instrumento a ser utilizado,
não para substituir os órgãos de expressão política, mas “para corrigir os excessos e
omissões que são contrários a uma perspectiva mais elevada que orienta, em seu conteúdo,
os atos de todas as autoridades (ARANGO, 2005, p. 99), pois, conforme Canotilho (1999,
p. 351), se a plena eficácia e exequibilidade dos direitos sociais dependesse apenas da
intervenção configuradora e conformadora do legislativo estar-se-ia diante de um “zero de
garantias”.
Por outro lado, um dos mais importantes conteúdos lembrados do direito ao
trabalho é um possível direito à manutenção do posto de trabalho. Trata-se da delicada
questão de se reconhecer ou não algum tipo de estabilidade do trabalhador ou, pelo menos,
alguma limitação ao poder de despedida do empregador. Algum tipo de proteção, na
forma de estabilidade ou de compensação econômica consta dos sistemas jurídicos da
maior parte dos países, embora muito diferenciada de país para país, sendo objeto de acesa
polêmica tanto na doutrina como na jurisprudência.
A despeito do direito contra a despedida arbitrária ou imotivada estar contido
no art. 7º, I da Constituição, a interpretação literal do art. 10, I ADCT, tem levado a
grande maioria dos doutrinadores a entender que toda a proteção prevista no art. 7º, I se
resume, até a promulgação de lei complementar, à uma indenização compensatória.
Alexandre de Morais (2014, p. 204), por exemplo, comentando o tema, afirma existir um
“direito à segurança no emprego”, mas que este necessita ser regulamentado por lei
complementar. Criticando tal posição, Wandelli (2012, p. 318) sustenta a incidência direta
da norma constitucional, sob pena de esvaziamento do núcleo essencial do direito
fundamental ao trabalho.
No que tange ao reabilitado profissional, o direito à manutenção do posto de
trabalho relaciona-se diretamente ao contido na lei que prevê garantia de emprego ao
trabalhador acidentado que retorna do auxílio-doença-acidentário (art. 118 da Lei n.
8.213/91) e na inexistência de outra norma legal que assegure qualquer garantia de
emprego nos demais casos. A lei n. 9029/95, que proíbe práticas discriminatórias, tem se
mostrado, sua insuficiência para conferir alguma segurança no emprego de trabalhadores
com deficiência ou reabilitados que retornam de benefício não-acidentário e que sofrem
discriminação por sua condição laboral reduzida. Tampouco satisfatória a proteção a esse
contingente vulnerável de trabalhadores conferida pela Lei de Cotas, que sequer assegura
alguma garantia de emprego, limitando-se a prever que, em caso de despedida do
trabalhador com deficiência ou reabilitado, que seja previamente contratado substituto em
condição semelhante.
Por outro lado, é possível pensar de um conteúdo do direito do trabalho além
do acesso e manutenção a um posto de trabalho, “desenvolvendo dogmaticamente
categorias jurídicas que resgatem o trabalho não só como obrigação contratual, mas como
uma contra força jurídica que dimensione todo o direito do trabalho” (WANDELLI, 2012,
p. 293)
No caso particular do reabilitado profissional, trata-se de uma relação jurídica
que se desenvolve no interior de um contrato de trabalho assalariado, onde
“a normatividade do direito ao trabalho incide diretamente na solução do caso concretopropiciando posições jurídicas subjetivas, seja restringindo o âmbito da incidência de outrosdireitos, seja impondo deveres objetivos ao Estado e a particulares, seja atuando com eficáciaintegradora e interpretativa de direitos já reconhecidos, seja apenas enriquecendo o conteúdoou mesmo reforçando e posicionando mais adequadamente a fundamentação de outros direitose deveres” (WANDELI, 2012, p. 294)
Um dos desdobramentos possíveis ocorre, para além das exigências de
condições mínimas de trabalho nos termos das normas legais, em uma dimensão
meramente negativa de exclusão de aspectos nocivos ao trabalhador, mas também em
dimensão positiva, em que se recupere para o trabalhador o sentido do trabalho.
Em tal contexto, as potencialidades do direito fundamental ao trabalho não se
limitam ao mero reconhecimento do direito do trabalhador a contraprestações decorrentes
do exercício do poder de direção do empregador, mas tendo em conta o trabalho como
instrumento de autodesenvolvimento e de autorrealização. Nas palavras de Wandelli,
assume-se, dessa forma, o direito ao trabalho
em uma dimensão positiva, incluindo parâmetros de conteúdo necessários à atividade, aosprocessos e à organização do trabalho, para que este seja capaz de permitir o desenvolver dascapacidades humanas, em termos de conteúdo significativo, potencialidade para odesenvolvimento das próprias capacidades e dons (art. 1º da Convenção n. 122 da OIT), bemcomo para que seja possível reconhecer-se e ser reconhecido pelo trabalho bem feito ou, emuma síntese precisa, ocupação efetiva e produtiva em condições que garantam as liberdades
políticas e econômicas fundamentais da pessoa humana (art. 6º do PIDESC)” (WANDELLI,2012, p. 293)
Na realização do direito ao trabalho em sua dimensão positiva, têm também as
empresas um papel a desempenhar, sendo a elas oponível um direito do trabalhador
reabilitado a não apenas ser reintegrado na mesmas funções e no mesmo salário anteriores,
mas, no caso de isso não ser possível, que lhe seja oferecida outra função, compatível com
suas condições profissionais e adequado às suas possibilidades laborativas.
Há uma evidente tensão entre valores constitucionais colidentes, que se deve
resolver com base na ponderação de princípios de Alexy. De um lado, tem-se o direito ao
reabilitação profissional, em sua dimensão positiva do direito ao trabalho, pela qual o
trabalhador tem acesso, não apenas ao posto de trabalho com garantia de emprego, mas a
um trabalho adequado, assim entendido um trabalho decente, voluntariamente assumido,
compatível com a situação pessoal do reabilitando e suficientemente remunerado; por
outro, há o direito de propriedade da empresa, com o consequente poder de gestão e de
auto-organização.
Conforme Alexy, na colisão de princípios conflitantes, há de se aplicar a “lei
de ponderação” que pode ser expressada na seguinte regra: “quanto maior o grau de não-
satisfação ou de afetação de um princípio, tanto maior tem de ser a importância da
satisfação do outro”, o que significa que, segundo o próprio Alexy, que o peso dos
princípios não é determinado em si mesmo ou absolutamente, senão que sempre se pode
falar tão somente em pesos relativos (LEIVAS, ob. cit., p. 49-51).
No caso concreto, há de se ponderar se a satisfação do direito à reabilitação
profissional justifica o prejuízo do direito empresarial pela limitação em seu poder de
gestão e de auto-organização. Como resultado, temos que a importância que a
Constituição atribui ao direito ao trabalho e ao direito à reabilitação profissional
justificam a não-realização parcial do direito de propriedade do empresário e, assim, de
uma imposição de um dever de oferecer ao trabalhador um posto de trabalho adequado,
de ocupação efetiva, dentro de sua estrutura organizacional, que seja voluntariamente
aceito pelo trabalhador e que seja mantido, pelo menos, durante o período de garantia
de emprego. Simetricamente, reconhece-se um direito do trabalhador à recusa de um
posto de trabalho que não atenda tais condições, mas tal recusa deve ser justificada e
razoável, sob pena de desvirtuamento do caráter bilateral que caracteriza o contrato de
trabalho. Sinaliza-se para a necessidade de um acordo entre trabalhador e empresa, o
que se caracteriza como verdadeira novação contratual.
No mesmo sentido de ponderação entre valores constitucionais contraditórios,
tem direito o trabalhador, também, a uma “readaptação razoável” do próprio posto de
trabalho, na forma de alterações estruturais e organizativas, de modo que, sem que se
imponha ao empregador ônus excessivos, modificar as condições de trabalho de modo a
melhor adequar o trabalho existente às peculiares condições de trabalho do trabalhador
reabilitado.
Não se trata, aqui, de um dever geral do tomador dos serviços de propiciar ao
trabalhador um adequado ambiente laboral, matéria de que trata a ergonomia. A obrigação
do empregador vai além de propiciar condições adequadas para realização da atividade
laborais para os trabalhadores em geral, mas de um dever específico e individualizado
para com o reabilitado profissional de adequar o posto de trabalho às possibilidades
laborativas limitadas do trabalhador. Mais uma vez, a ponderação de princípios
constitucionais colidentes, leva a reconhecer um direito do trabalhador a uma adaptação
razoável, tal como prevê o art. 5º, inciso 3 da Convenção sobre os Direitos das Pessoas
com Deficiência. Tal adaptação será razoável na medida em que não imponha um
sacrifício, financeiro e/ou organizativo, exagerado ao empregador, admitindo-se a hipótese
também de compensação financeira, parcial ou total, de tais prejuízos por conta do Estado.
Em suma, cabe afirmar a possibilidade o direito subjetivo a prestações fáticas
decorrentes do direito social fundamental à reabilitação profissional e sua plena
judiciabilidade.
Por outro lado, há de se reconhecer, também, o direito à reabilitação
profissional no sentido de uma pretensão normativa à existência de uma legislação
suficientemente protetiva e que assegure garantias suficientes ao exercício desse direito
fundamental. Aplicada a teoria da proibição da proteção insuficiente de Alexy, temos que,
em consonância com o preceito da proporcionalidade estrita, há de se realizar a
ponderação tendo-se em conta a necessidade de buscar a ação estatal mais ampla possível
no sentido de otimização de um objetivo e realizar o princípio constitucional. Existindo
vários meios, todos adequados e necessário para alcançar tal princípio, avalia-se o grau de
afetação ou de não-satisfação entre os meios concorrentes em relação ao princípio
concorrente P2, utilizando-se a escala triádica. A ponderação leva em conta em que grau o
princípio P2 pode ser afetado por cada meio concorrente e, em caso de mais de um meio
cumprir também o critério da proporcionalidade estrita, opta-se por aquele que
proporcione maior assistência (maximização da intensidade da assistência).
No caso de um proteção suficiente ao direito fundamental à reabilitação
efetiva e completa, a intervenção estatal que proporciona mais intensa assistência é a
construção de uma legislação que, nos termos que seguem, propicie ao reabilitando
maiores e melhores oportunidades de lograr uma reabilitação plena, criando-se uma
legislação que fomente a criação/manutenção de empregos adequados ao trabalhador
reabilitado; que estabeleça uma garantia de emprego por prazo razoável para todo
trabalhador reabilitado e uma reformulação completa da regulação do processo de
reinserção laboral, de forma que se esclareça a situação jurídica do reabilitado após a alta
previdenciária; que adote o modelo CIF nas avaliações de saúde, incapacidade,
funcionalidade e do potencial laborativo, com a definição de benefício de prestação
continuada para os chamados casos de “invalidez social”; que proteja contra medidas
discriminatórias, com especial reforço a coletivos mais vulneráveis e que estabeleça
regras na relação triangular (entre INSS, reabilitado e empresa) que eliminem a atual
insegurança jurídica perante à empresa de vínculo. Por fim, ainda em relação ao término
do processo de reinserção laboral, sustenta-se que a reabilitação somente pode ser
entendida como completa quando da efetiva obtenção de um posto de trabalho, por recusa
injustificada do trabalhador em assumir qualquer posto de trabalho oferecido ou por
aposentadoria por invalidez ou concessão de um benefício previdenciário equivalente.
2.3 A PROTEÇÃO SUFICIENTE AO DIREITO FUNDAMENTAL À
REABILITAÇÃO EFETIVA E COMPLETA
2.3.1 Direito à uma legislação que fomente a criação de empregos
adequados ao trabalhador reabilitado
Como se mencionou anteriormente (item 1.3.2), a legislação brasileira está
longe de cumprir a missão constitucional de propiciar as condições materiais que
fomentem a criação de empregos adequados aos egressos da reabilitação profissional.
Dessa forma, parece altamente recomendável a criação de incentivos
financeiros às empresas para a contratação/manutenção de postos de trabalho para
reabilitados profissionais, também como forma de compensação por possíveis prejuízos
decorrentes de redução de produtividade e para custear despesas com mudanças
adaptativas dos postos de trabalho. Esses incentivos podem tomar a forma de isenções das
contribuições previdenciárias patronais e servirão para constituir um fundo público
destinado exclusivamente para os serviços de reabilitação profissional. Entre outras
possibilidades de financiamento de tal fundo, pode estar contribuições feitas pelas
empresas que não possuam comprovadamente condições de cumprir a reserva legal de
empregos para incapacitados e pessoas com deficiência (Lei n. 7853/89), podendo
cumprir, como obrigação alternativa, a de pagar uma taxa fixada em lei por emprego não-
oferecido.
Nesse sentido, obter-se-ia uma legislação mais adequada que viria a preencher
a lacuna normativa que torna pouco efetiva a reserva de empregos para deficientes e
incapacitados. Como no direito comparado, seria uma legislação de cunho premial que
procuraria contornar as enormes dificuldades do reabilitando em encontrar um posto de
trabalho, efetivamente fomente o emprego, estabelecendo:
a) Criação de um fundo destinado ao fomento ao emprego para reabilitados profissionais,constituído por empresas que, comprovadamente não puderem cumprir a cota prevista em lei,que, em compensação, pagarão uma taxa substitutiva em valor determinado, por emprego nãooferecido;b) Incentivo fiscal para empresas que contratem reabilitados profissionais;c) Extensão da cota de empregos para reabilitados profissionais às pequenas e mediasempresas sob o enfoque premial;d) Especial proteção para coletivos específicos (idosos, mulheres, grandes lesionados)
Por certo, não há como estabelecer, de plano, quanto deveriam representar
economicamente tais incentivos, mas se pode afirmar, com alguma convicção, que, por
maiores que sejam tais custos para o erário púbico, estes não deverão superar o valor total
de aposentadorias precoces que decorrem, na maior parte dos casos, de reabilitações
desnecessariamente mal sucedidas.
2.3.2 Proteção especial do emprego para os reabilitados profissionais
Por outro lado, a possibilidade de contratação incentivada seria insuficiente se
não acompanhada, também, de medidas de proteção do emprego contra a despedida
discriminatória. Parece curial que os setores mais vulneráveis são vítimas de tratamento
discriminatório não apenas na contratação, mas também na manutenção do emprego. Por
si só tal fato justificaria que a lei, como acontece em outros países, tivesse proteção
específica contra a discriminação contra a despedida relativamente aos reabilitados
profissionais e pessoas com deficiência, como se viu anteriormente (seção 1.1.3)
É de se lembrar que, no Brasil, o nível de proteção ao emprego em geral é
bastante baixo117, o que agrava a situação dos trabalhadores mais vulneráveis, já que estes
são os primeiros a serem lembrados quando as empresas optam pela redução de pessoal.
A legislação brasileira, como já se demonstrou, é escassa quanto à proteção
contra discriminação no emprego, podendo-se citar apenas a já referida Lei n. 9029/95. As
dificuldades de tornar efetiva a proteção já existente tornam necessário que se reforce a
aparato protetivo através de disposições legais que determinem, nos casos de
discriminação no emprego de pessoas com deficiência e incapacitados, a inversão do ônus
probatório, devendo o empregador demonstrar a necessidade e a proporcionalidade da
medida imputada como discriminatória.
Além disso, no caso em que uma legislação premial fosse adotada, maiores
razões existiriam para que a relação de emprego estabelecida com apoio de isenções
fiscais fosse protegida. Ainda que não se adotasse uma legislação mais rígida (como por
exemplo, condicionar a despedida à autorização administrativa), dever-se-ia, pelo menos,
dotar o reabilitado de uma garantia de emprego por um período relativamente longo (dois
ou três anos no caso do acidentado que retorna do benefício previdenciário e de, no
mínimo, uma ano para benefícios não-acidentários), dando-lhe oportunidade de ter tempo
para sua completa adaptação ao emprego e de mostrar a valia de seu trabalho para a
empresa.
A existência de uma garantia de um ano para acidentados que percebem
auxílio-doença-acidentário contrasta com a situação precária dos reabilitados não-
acidentários, que não dispõem de qualquer garantia de emprego e apenas compartilham a
reserva legal de empregos com os demais reabilitados e com as pessoas com deficiência.
O motivo de tal discriminação decorre de critérios previdenciários – e, portanto, no final,
apenas financeiros -, já que, em face da necessidade de proteção do direito do
habilitado/reabilitado profissionais não se justifica que se diferenciem as situações pela
ocorrência ou não de nexo causal entre a lesão e o ambiente laboral.
Conclui-se que a legislação atual não oferece proteção adequada do emprego
ao trabalhador reabilitado, descumprindo o Estado o direito fundamental ao trabalho ao
deixar de desenvolver normatividade que estabeleça um período razoável de permanência
do reabilitado no emprego, que lhe permita uma melhor adaptação às suas novas
condições laborais, seja exigindo do empregador uma real chance de que o trabalhador
117 Os dados do Banco Mundial (“Doing Bussiness, 2008) mostram que o custo da despedida no Brasil estáabaixo da média dos países da América Latina e, também, da maioria dos países europeus. Custo no Brasil:37 semanas de salário; Custo na Argentina: 139 semanas de salário; Alemanha: 69 semanas de salário;Chile, 52 semanas; Espanha, 56 semanas; Portugal, 95 semanas. (ARAÚJO, 2005)
reabilitado comprove que suas capacidades e sua valia, em pé de igualdade com os demais
trabalhadores.
Assim, uma proposta legislativa poderia, por coerência, equalizar essa
situação de injustificada discriminação, estendendo a garantia de emprego, hoje somente
assegurada aos trabalhadores que retornam do benefício acidentária a todos os casos de
reabilitação profissional. Admitido que tais empregos sejam fortemente incentivados por
isenções fiscais, razoável que, em contrapartida, o período de garantia de emprego seja
estendido, dos atuais doze meses para, pelo menos, vinte e quatro meses.
Além disso, na esteira da recente modificação da lei n. 9085/95, a nova lei
deve conter especial proteção contra qualquer medida discriminatória contra o
reabilitado profissional, especialmente para coletivos mais vulneráveis como idosos,
grandes lesionados e trabalhadores de baixa instrução.
2.3.3 Proteção jurídica insuficiente pela ausência de normas regulatórias
2.3.3.1 Proteção deficiente e a insegurança do trabalhador reabilitando quantoà sua situação jurídica perante à empresa de vínculo e à Previdência social.
A falta de compromisso dos órgãos públicos com a sorte do trabalhador
reabilitado após a alta previdenciária pouca vezes fica tão evidente como pela ausência de
normas claras que definam claramente sua situação jurídica em relação aos efeitos do
contrato de trabalho a partir do cancelamento do pagamento do benefício previdenciário.
Com o propósito de paliar tão grave situação de insegurança jurídica, não
somente do trabalhador, mas também da empresa, quanto à real situação de
interrupção/suspensão ou continuidade do contrato de trabalho, em geral decorrente de
negativa de prorrogação do benefício (item 2.3.3.1), justifica-se plenamente que haja uma
norma específica que, claramente, exija do empregador uma comunicação formal ao órgão
previdenciário, com cópias ao próprio trabalhador e ao sindicato profissional. Tal
comunicação deveria ser feita dentro dos cinco dias depois da comunicação oficial da alta
previdenciária, esclarecendo:
- se houve ou não apresentação do trabalhador na empresa;- em caso positivo, em que data;- cópia do laudo do médico da empresa sobre a aptidão atual do trabalhador, em especial emrelação à sua reintegração na função anterior, bem como, se for o caso, em nova função dentroda empresa;- comunicação formal ao trabalhador para que se apresente para trabalhar, com data, local efunção determinadas;
- interesse da empresa na liberação do trabalhador, nesse caso, necessariamente compagamento dos salários do período de afastamento.
A norma, ainda, deverá prever o direito do empregado contestar a decisão
empresarial de não-reintegração (mesmo com o pagamento dos salários), já que, na
prática, tal decisão, em tese, viola o direito do empregado à ocupação efetiva.
Dessa forma, se obteriam regras mais claras, um procedimento mais
equilibrado e uma maior transparência na relação triangular (trabalhador, empresa e
INSS), hoje marcada pela insegurança jurídica.
2.3.3.2 Insuficiente definição de capacidade
Como já se mencionou anteriormente (item 1.3.3.1), não mais se admite a
manutenção de um superado conceito de incapacidade laborativa, limitado à avaliação
biomédica e que desconsidera a avaliação social.
A alteração do modelo biomédico por um mais adequado conceito,
biopsicossocial, que já se iniciou dentro da Previdência Social na avaliação dos benefícios
de prestação continuada, deve também ocorrer nos processos de avaliação da reabilitação
profissional, mormente nos laudos de alta previdenciária, em que as reais condições do
segurado são subestimadas nos seus aspectos sociais.
Para tanto, os conceitos mais modernos de funcionalidade e de incapacidade
saiam do âmbito interno da Previdência Social e sejam albergados na lei, de forma que
proporcione maior certeza às avaliações de incapacidade laboral e maior segurança ao
reabilitando.
Assim, como se mencionou anteriormente (item 1.3.3.1) o chamado modelo
“CIF” deve ser adotado integralmente pela Previdência Social para fins de avaliação no
processo de reabilitação profissional, tal como já ocorre na definição dos chamados
“benefícios de prestação continuada”, não se limitando tão-somente para a concessão de
direitos, mas também na definição de critérios para a adoção de políticas públicas.
Proposta de alteração neste sentido foi apresentada pelo já referido projeto de
lei nº 7207/2010, que, ao dar nova redação ao art. 89 da Lei nº 8213/91, estabelece no
inciso 2º do parágrafo único que
“a avaliação de saúde, da incapacidade, da funcionalidade e do potencial laborativo, tendo
como base a Classificação Internacional de Funcionalidade ( CIF), da Organização Mundial
de Saúde, sob responsabilidade de equipe multidisciplinar do Instituto Nacional do Seguro
Social (INSS)”.
Com base em tais parâmetros, a ideia de criação de um benefício
previdenciário continuado destinado a trabalhadores, a despeito de todos os esforços, que
não fossem absorvidos pelo mercado (invalidez social), como proposto por Miguel
Horvath Jr. (ver item 1.3.3.2).
2.3.3.3 Insegurança jurídica perante à empresa de vínculo:
Ao contrário do que ocorre em outros países118, não há qualquer norma que
estabeleça um procedimento administrativo de controle no processo de reinserção laboral
do reabilitado na empresa. Atribui-se a responsabilidade unicamente à empresa, o que
desagrada tanto o empregado (já que apenas reforça a assimetria da relação contratual
laboral) quanto o empregador (que se torna responsável único pelo sucesso ou insucesso
do processo de reabilitação).
Assim, parece altamente conveniente a existência de normatividade detalhada
em que se estabeleça critérios objetivos para os quais se justifique eventual recusa
patronal em reintegrar o empregado nas mesmas funções que ocupava antes do
afastamento previdenciário ou, na impossibilidade desta, justifique o não-oferecimento de
outro posto de trabalho na empresa. De outro lado, tal norma também haverá de definir
melhor o conteúdo e os limites do direito do empregado a uma “adaptação razoável” do
posto de trabalho, de forma que tais modificações não impliquem um ônus excessivo para
o empregador. Uma das possibilidades para encontrar, na prática, parâmetros para
determinar a onerosidade excessiva poderia ser um valor proporcional aos incentivos
estatais concedidos ao empregador justamente como prêmio à manutenção do emprego,
que seria concedido nos moldes da legislação holandesa (ver item 1.1.3).
Já a legislação portuguesa (Decreto-lei nº 247/89)119 prevê incentivo financeiro
às empresas para facilitar o acesso de pessoas com deficiência ao trabalho, prevendo
quatro tipos de subsídios:
a) De compensação;b) Para adaptação de postos de trabalho;c) Para eliminação de barreiras arquitetônicas;d) De acolhimento personalizado na empresa.
118 Como no Alemanha e Áustria, como citado no item 1.3.3.
119 Disponível em http://www.inr.pt/bibliopac/diplomas/dl_247_89.htm (acesso em 5/12/2015).
Diferencia, portanto, a “adaptação de posto de trabalho” da adaptação
necessária para “acolhimento personalizado na empresa”: o primeiro, para compensar as
empresas que empreguem ou mantenham o emprego de pessoas com deficiência e que
“necessitem de adaptar o equipamento ou postos de trabalho às dificuldades funcionais
daqueles trabalhadores”; o segundo, compensando o “acompanhamento e o apoio da
pessoa deficiente no seu processo de integração socioprofissional de adaptação ao
esquema produtivo da entidade empregadora e ao posto de trabalho que lhe foi destinado”.
Ambos os subsídios são pagos por um período de três a seis meses a partir da admissão: o
primeiro pode não pode exceder doze meses o valor da remuneração mínima mensal
garantida no seu valor mais elevado (art. 33); o segundo, não pode exceder em cada mês
duas vezes a remuneração mínima mensal garantida no seu valor mais elevado.
Por outro lado, em caso de não ser possível o aproveitamento do trabalhador
na função anteriormente desempenhada, impondo-se seu reenquadramento no quadro
funcional da empresa, a falta de normatividade implica em atribuir-se ao empregador a
decisão unilateral de tornar ou não viável o exercício do direito ao trabalho do reabilitado
– o que parece inaceitável. Em tal caso, deve haver norma reguladora que determine ao
empregador o oferecimento de um número mínimo de opções ao empregado (todas que
atendam os parâmetros mínimos de um emprego), que livremente optará por um deles,
sempre sob a supervisão e controle de órgão administrativo (que, nesse caso, deverá ser o
Ministério do Trabalho e Emprego).
Propõe-se a edição de uma norma legal detalhada que assegure que as decisões
sobre a reinserção do trabalhador reabilitado na empresa de origem seja feito de forma
consensual entre o próprio reabilitado, a empresa, os demais trabalhadores representados
pelo sindicato, e os órgãos governamentais, em especial a Previdência Social e o
Ministério do Trabalho e Emprego. O processo de reabilitação profissional se
desenvolverá no melhor interesse do reabilitado, que será integralmente assistido e
acompanhado durante todo o processo por equipe multidisciplinar e terá como escopo a
completa e efetiva reinserção laboral do reabilitado em um trabalho digno, voluntário,
suficientemente remunerado e compatível com suas condições pessoais. O treinamento e
capacitação profissional serão objeto de especial atenção, visando, se possível, que a
elevação da qualificação profissional do trabalhador. Todo o processo deverá ser
acompanhado pela Previdência Social, não se limitando a mera apreciação burocrática de
um relatório.
As obrigações do empregador no caso de reintegração de trabalhador
reabilitado devem estar claramente definidas em norma legal, regulando todo o processo
no intuito de encontrar a melhor forma de reinserção do trabalhador na empresa – e não no
exclusivo interesse produtivo da empresa ou de exonerar, de forma mais breve possível, a
Previdência com os gastos com benefício acidentário. Assim, a lei deverá assegurar o
direito de informação do empregado aos postos de trabalho disponíveis e garantir seu
direito de escolha e, se for o caso de recusa, sem os constrangimentos da ameaça de
imediato corte de pagamento do benefício previdenciário. A lei deverá estabelecer
parâmetros a respeito do conceito de “direito a uma adaptação razoável” do posto de
trabalho, obrigação que deverá ser cumprida pelo empregador, ressalvado seu direito de
oposição quando as modificações necessárias implicarem um custo excessivamente
oneroso para o empregador. Em caso de comprovada e objetiva impossibilidade de
reinserção do trabalhador na empresa de origem ou no melhor interesse do próprio
trabalhador, a lei poderá estabelecer a possibilidade de parcerias interempresariais, nas
quais a empresa poderia ceder o trabalhador, pelo período de garantia de emprego, a outro
empregador, dividindo os custos com os salários. Tendo em vista os custos
previdenciários, seria também plausível que a própria Previdência Social se encarregasse
com parte do pagamento dos salários.
Por fim, a legislação pode e deverá contemplar hipóteses de dura penalização
de empregadores que violarem o direito à ocupação efetiva do trabalhador reabilitado,
pondo fim à nociva prática discriminatória da “prateleira”, atentado inaceitável ao
patrimônio moral do trabalhador.
2.2.3.4 A proteção contra medidas discriminatórias
A deficiência é, sobretudo, uma identidade social, cultural e institucionalmente
construída, na qual as pessoas que são portadoras de algum tipo de deficiência são vistas
não só como diferentes, mas também como excluídas da ordem do “normal”: ocorre,
assim, uma “naturalização” da desigualdade, pela qual a visão do “normal” impõe-se
como neutra e não tem necessidade de se enunciar em discursos que visem a legitimá-la
(MACHADO; DORNELLES, 2007, p. 119-120).
Em tal contexto, o reabilitado, no seu retorno ao trabalho, é estigmatizado por
fugir dos padrões da normalidade, sendo tal discriminação, muitas vezes, não intencional,
mas previsível, já que baseado em um critério aparentemente neutro que na verdade, é
fruto do fenômeno da transparência e, assim, discriminatório (RIOS, 2008, p. 148). A
teoria da previsibilidade da consideração diferenciada em práticas aparentemente neutras
oferece um modelo eficaz para reconhecimento da discriminação. Porém é em um modelo
mais substancial, como a teoria das alternativas, parece mais adequado no caso de
discriminação na reabilitação profissional. Por tal modelo, a discriminação poderia ser
presumida, já que, da análise da estrutura do ambiente de trabalho e de organização
marcado pela naturalização de uma maioria “normal” (sem deficiência), haveria de se
adotar uma desconfiança sistemática” diante de todas as decisões e medidas relevantes,
sempre que houver medidas de consideração diferenciada.
Compreendido que a completa reabilitação profissional é um caminho longo e
difícil, há de se dar tempo para que o trabalhador paulatinamente vença todos os
obstáculos para sua reintegração ao mercado laboral. Nesse processo, considerado o
princípio da igualdade, não há justificativa constitucional para discriminar a situação dos
beneficiários acidentários (que possuem garantia de emprego de doze meses) com os que
recebem benefício não-acidentário (que não possuem qualquer garantia). Uma equalização
de benefícios deve ser feita, ao mesmo tempo em que se reconheça que o prazo de um ano
ainda é pequeno para assegurar uma boa chance de reinserção na empresa. Assim, pode
ser uma boa medida a ampliação da garantia de emprego por dois anos, período no qual a
despedida deverá ser motivada pelo empregador com base em razões técnicas, econômicas
ou financeiras, tal como sucede com a estabilidade provisória dos cipeiros (art. 165 da
CLT). Sendo muito provável a oposição dos empresários à medida, há de se pensar em
medidas complementares em sentido oposto; por um lado, reforçando mecanismos de
punição ao empregador que se recusar a cumprir a reserva legal de empregos, dificultar ou
inviabilizar a reinserção laboral de reabilitados, adotar práticas discriminatórias (como a
“prateleira”) ou despedir imotivadamente trabalhador no curso de estabilidade provisória
(nesse caso, adotando-se a inversão do ônus probatório); por outro lado, adotar medidas
premiais, de compensação financeiras significativas aos empregadores que cumprem suas
obrigações com a legislação protetiva ao trabalho do reabilitado profissional e, assim,
além de contribuírem pela redução da desigualdade e do desemprego de setores
vulneráveis, também ajudam a aliviar o Erário Público com custos previdenciários e
assistenciais que, de outra forma, inevitavelmente recairiam sobre a própria Previdência
Social. Sobre o enfoque premial, a reserva de empregos deverá atingir todas as empresas,
em especial as pequenas e médias, que são as que mais empregam no país.
A lei deverá dedicar especial atenção aos trabalhadores idosos, de baixa
instrução e grande acidentados, mais sujeitos à discriminação e com mais dificuldades de
colocação no mercado laboral.
2.3.3.5 A reabilitação completa, a proibição do retrocesso social e ainterpretação conforme sem redução de texto.
A partir de tal compreensão de que a Constituição brasileira agasalha o
princípio da proibição do retrocesso social (item 2.1.3.7), sustenta-se a revogação do art.
171, alínea “g” do Decreto n. 48.959/60 pela Lei n. 6438/77 configura-se inconstitucional,
já que retira do cidadão reabilitado seu direito ao acompanhamento de seu caso até a
“plena reabilitação profissional”. A partir da revogação de tal dispositivo legal, introduziu-
se a sistemática atual, a da “reabilitação incompleta”, de maneira que, por decisão
unilateral da Previdência Social, o trabalhador é dado por “reabilitado” sem que tenha sido
efetivamente reinserido no mercado laboral, cessando a percepção de auxílio-doença. O
retrocesso é inequívoco, porque, a partir de então, o reabilitando é abandonado à própria
sorte, pois desacompanhado da instituição que lhe deveria assistir, sem ter tido ainda a
“plena reabilitação”, ou seja, a efetiva recolocação profissional ou o emprego do
reabilitando.
A alteração legislativa implicou drástico retrocesso na proteção ao direito
fundamental do reabilitando a ter assistência social, médica e previdenciária até que
realmente encontre um posto de trabalho, implicando em um completo descompromisso
dos poderes públicos com seu dever constitucional de amparar o trabalhador necessitado.
Configura-se uma situação de “supressão do mínimo existencial ou, como leciona Ingo
Sarlet (2004, 2, p.145-6), uma supressão pura e simples do próprio núcleo essencial
legislativamente concretizado de determinado direito social vinculado ao mínimo
existencial, ferindo a própria dignidade da pessoa. Nesse sentido, não há falar de “reserva
do possível”, nem em restrição de direito social, pois se trata de pura e simples extinção
do direito – e não de sua redução.
Não se pode também sustentar que, quando da introdução da possibilidade
legal da Previdência cancelar o benefício previdenciário sem que houvesse real
reabilitação, nenhuma medida foi adotada, como compensação ao direito suprimido.
Assim, é incompatível com o direito fundamental à reabilitação profissional a
interpretação literal do art. 140 parágrafo primeiro do Decreto 3048/99, pelo qual, cessa o
processo de reabilitação profissional pela simples emissão do certificado de habilitação,
desresponsabilizando-se a Previdência Social com a manutenção do emprego do
trabalhador ou com sua colocação em outro trabalho.
É de se reconhecer a inconstitucionalidade da alteração normativa que revogou
a lei n. 6438/77, dado nova redação ao art. 24 da Lei n. 3807/60 (LOPS), por violação ao
princípio da proibição do retrocesso.
Trata-se, no caso, de inconstitucionalidade material, pela qual a norma (ou
ato), ainda que elaborada em harmonia com os pressupostos formais do texto
constitucional, viola os princípios e o conteúdo da Constituição, pois as políticas públicas,
assim, podem ser controladas, assim, não apenas em seus aspectos de legalidade formal,
mas também no tocante à sua adequação ao conteúdo e aos fins da Constituição
(BERCOVICI, 2004, p. 105).
Porém, em nome da segurança jurídica, sem prejuízo da justiça material, é
possível adotar-se o método da interpretação conforme a Constituição, através de uma
técnica hermenêutica alternativa que promove a conformação constitucional em um dos
sentidos compatíveis com a Lei Maior sem declarar inválida a norma legal (SANGOI;
TESSMANN, 2010, p. 170). Por tal modelo, diante de normas que possuem mais de uma
interpretação, deve-se preferir aquela mais próxima da Constituição120.
Segundo Alexandre de Morais (2014, p. 785-9), há três formas possíveis de
interpretação conforme:
- interpretação conforme com redução do texto, quando for possível, em virtude da redação dotexto impugnado, declarar a inconstitucionalidade de determinada expressão, possibilitando, apartir dessa exclusão de texto, uma interpretação compatível com a Constituição Federal;- interpretação conforme sem redução do texto, conferindo à norma impugnada umadeterminada interpretação que lhe preserve a constitucionalidade;- interpretação conforme sem redução do texto, excluindo da norma impugnada umainterpretação que lhe acarretaria a inconstitucionalidade.
No caso sob análise, de fato, houve a revogação do art. 171, alínea “g” do
Decreto n. 48.959/60, mas não necessariamente o parágrafo primeiro do art. 141 do
Decreto n. 3048/99121 deve ser interpretado como tendo revogado o direito à uma
reabilitação plena. De fato, não constitui obrigação da Previdência a colocação em outro
emprego, mas disso não decorre necessariamente que, enquanto o emprego não for
encontrado, possa o reabilitado ficar desassistido; nem que, em caso de impossibilidade de
120 Conforme o STF, tal técnica “só é utilizável quando a norma impugnada admite, dentre as váriasinterpretações possíveis, uma que a compatibilize com a Carta Magna, e não quando o sentido da norma éunívoco” (STF - Pleno – ADIN 21344, Rel. Moreira Alves)121 Art. 171 § 1º - Não constitui obrigação da previdência social a manutenção do segurado no mesmoemprego ou a sua colocação em outro para o qual foi reabilitado, cessando o processo de reabilitaçãoprofissional com a emissão do certificado a que se refere o caput.
obter outro emprego, deixe o reabilitado de ser reconhecido seu direito a uma
aposentadoria por invalidez. Tal interpretação é inconstitucional, por contrariar tanto o
princípio do não-retrocesso social como a proibição da proteção insuficiente. Pode-se, ao
revés, interpretar tal disposição legal como a definição de quando se completa
formalmente o ciclo reabilitatório, ou seja, pela emissão de certificado individual.
Entretanto, a melhor interpretação é a de que se trata de mero ato formal, já que, nos
termos da lei e em respeito ao direito fundamental à reabilitação completa, tal certificado
individual somente pode ser emitido depois de que o reabilitado obtenha um posto de
trabalho.
Assim, em uma interpretação conforme sem redução de texto do art. 171
parágrafo 1º da Decreto nº 3048/99, pode-se excluir a interpretação de que a expressão
“cessando o processo de reabilitação profissional com a emissão do certificado” referira-se
ao término das responsabilidades dos poderes públicos com o reabilitado, implicando a
supressão do pagamento de benefícios previdenciários ou outros tipos de prestação
assistencial. Por outro lado, também em uma interpretação conforme sem redução de
texto, o entendimento que melhor preserva a Constituição do texto legal “não constitui
obrigação da previdência social à manutenção do segurado no mesmo emprego ou à sua
colocação em outro para o qual foi reabilitado” é o de que tal obrigação somente cessa (ou
a inexistência de obrigação somente acontece) quando se mostra inviável a reinserção
laboral do reabilitado (e, nesse caso, há de ser deferida a aposentadoria por invalidez ou
assegurado ao trabalhador benefício previdenciário que assegure sua sobrevivência).
Na esteira de jurisprudência que entende-se como incompleta a reabilitação até
a efetiva obtenção de um posto de trabalho ao reabilitado, em uma interpretação conforme
a Constituição e, assim, deve ser mantida a prestação previdenciária até que se verifique
uma de três possibilidades:
- a obtenção efetiva de um posto de trabalho;
- a recusa injustificada pelo reabilitado de um posto de trabalho compatível com suascondições laborais;
- a aposentadoria por invalidez.
A inconstitucionalidade da alteração legislativa que revogou o direito do
acompanhamento à plena reabilitação profissional também poderá ser superada por edição
de norma legal que reconstitua o texto revogado ou que expressamente preveja o
pagamento de benefício previdenciário até a completa e efetiva assunção a um posto de
trabalho.
Na primeira hipótese, o futuro texto legal poderia adotar a proposta legislativa
já mencionada (Projeto de lei n º 7207/2010), com introdução de inciso ao art. 89 da Lei nº
7213/91:
Art. 89, § 2º O processo de reabilitação profissional só será concluído quando constatada, peloINSS, a reinserção do segurado no trabalho, em local e atividade que permita sua reintegraçãosocial plena, respeitadas suas limitações físicas, psíquicas e laborais.
Em uma segunda hipótese, o término do processo reabilitatório não implicaria
o fim da percepção do benefício previdenciário. Assim, a recusa do trabalhador a aceitar
um posto de trabalho que não atenda suas necessidades objetivas (decente, compatível
com sua situação pessoal, voluntário, suficientemente remunerado e de ocupação efetiva)
seria admitida, sem que tenha como consequência o cancelamento/redução do benefício
previdenciário.
Nada impede que tal benefício seja progressivo, de modo a não desestimular o
trabalhador na procura do emprego. Porém, em caso de real impossibilidade de
recolocação deve ser garantido o direito à aposentadoria por invalidez, ainda que esta seja
reconhecida como recurso de última instância, já que o valor do trabalho para o ser
humano vai bem além da retribuição econômica.
CONCLUSÕES:
O ordenamento jurídico brasileiro contempla, como importante
desdobramento do direito ao trabalho previsto constitucionalmente, um direito
fundamental do trabalho a uma reabilitação completa e efetiva.
Assim entendida a reabilitação profissional como um direito fundamental do
trabalhador à reinserção no mercado laboral, há de se reconhecer que esta deva ser
completa, ou seja, deve efetivamente propiciar o acesso a um posto de trabalho. Por outro
lado, não pode ser considerada efetiva se o emprego a ser acessado não oferece condições
mínimas que permitam enquadrá-lo como um trabalho digno, compatível com sua
situação pessoal, voluntário, suficientemente remunerado e se caracterize como de
ocupação efetiva.
Entretanto, o descaso com a reabilitação profissional em nosso país expressa
perfeitamente o “caráter de urgência” na proteção dos direitos humanos de que fala
Arango (2005, p. 93) em um quadro de omissões estatais tipicamente latino-americano. O
direito fundamental à reabilitação profissional não está sendo suficientemente protegido
pela ausência de políticas adequadas de habilitação/reabilitação profissionais públicas e
universais, que não se limitem aos segurados da Previdência Social e que se constituam
em ações integradas de Saúde, Previdência Social e Ministério do Trabalho e Emprego, de
preferência em estrutura própria, dispondo de suficientes recursos materiais e de pessoal
adequadas para, rapidamente, reconhecer necessidades e, prontamente, colocar seus
recursos à disposição da melhor reabilitação profissional possível, em benefício do
trabalhador.
Será importante que se compreenda que pouco se avançará sem o
envolvimento da sociedade e, por isso, serão necessárias campanhas de conscientização com
a participação de entidades engajadas na promoção e defesa dos direitos de pessoas com
deficiência e incapacitados que podem ser importantes instrumentos para superação do estigma
que recai sobre esse coletivo de trabalhadores.
A superação das visões preconceituosas que, infelizmente, ainda estão
presentes no atendimento da Previdência Social devem ensejar procedimentos específicos,
como o adotado recentemente pela Perícia do INSS, de obrigatória apreciação sobre a
natureza ocupacional de acidente de trabalho/doença ocupacional na concessão de auxílio-
doença. Assim, em caso de acidente de trabalho, com o reconhecimento de sequelas, o
procedimento padrão deve ser o do encaminhamento à reabilitação profissional, na
suposição de que, provavelmente, algum processo de readaptação ao trabalho será
necessário.
Reconhece-se, além disso, a existência de um direito subjetivo do trabalhador,
perfeitamente judicializável, a receber toda assistência à saúde, assistencial e
previdenciária durante todo o processo de reabilitação, a começar por uma avaliação
correta de suas condições físicas, psicológicas e sociais por uma equipe multidisciplinar e
pela identificação correta de sua incapacidade e sua devida inscrição no processo de
reabilitação profissional. Em seguida, por designação de um programa eficaz de
reabilitação profissional, em que o trabalhador receba toda a assistência e orientação
necessárias para sua reabilitação efetiva e sua reintegração ao mercado profissional. Por
fim, o direito do trabalhador receber uma prestação de benefício continuado até que sua
reintegração efetivamente se complete.
Por outro lado, há insuficiente proteção ao direito fundamental do reabilitado
pela insuficiência de normas legais que amparem esse trabalhador em todo o processo de
reabilitação. A carência de tais normas constitui, assim, uma violação do princípio da
proibição da proteção não-suficiente. Sustenta-se o dever dos órgãos públicos em realizar
reforma legislativa imediata que promova a proteção do direito fundamental à reabilitação
profissional, que deverá abordar algumas questões essenciais que envolvem, entre outras
medidas: a adoção de uma política de cotas específica para os reabilitados profissionais; a
previsão de compensações financeiras às empresas para os casos em que sejam necessárias
adaptações no posto de trabalho ou de acolhimento personalizado do trabalhador ao posto
de trabalho, além da criação de incentivos financeiros à empresa com base em uma
política premial que fomente a criação/manutenção de empregos para
habilitação/reabilitação; uma mudança do conceito de incapacidade na avaliação da
reabilitação profissional; ampliação e extensão da garantia de emprego para todos os casos
de reabilitação profissional, mesmo em caso de acidente de trabalho e de doença não-
ocupacionais, bem como maior proteção em caso de despedidas e outras medidas patronais
discriminatórias, com especial ênfase aos coletivos mais vulneráveis, como idosos, grandes
lesionados e trabalhadores com menor nível de instrução; clarificação da situação jurídica
do contrato de trabalho do trabalhador retornado; reinserção laboral consensual, entre o
próprio reabilitando, empresa, sindicato profissional e os órgãos governamentais, feita no
melhor interesse do reabilitando, que deverá contar com ampla assistência e
acompanhamento em todo o processo de reabilitação; de um direito de recusa do
trabalhador, desde que razoável e justificada, à oferta de um posto de trabalho não-
adequado; de um direito a uma adaptação razoável do posto de trabalho às suas
necessidades; da possibilidade de cedência entre-empresas do trabalhador reabilitado, com
a concordância do trabalhador, de forma que, no período de garantia de emprego, o
cessionário se responsabilizaria pela ocupação do trabalhador e pelo pagamento de, pelo
menos, parte dos salários; a criação de uma “aposentadoria diferida por invalidez social”
como um benefício previdenciário continuado.
Sem dúvida, a criação de tal normatividade será um importante passo para a
efetivação do direito fundamental do reabilitado profissional. Mas será apenas um passo
de uma caminhada a ser feita por toda a sociedade. Hoje, a reabilitação efetiva e completa
desse trabalhador conta basicamente com abnegados profissionais da área de reabilitação
profissionais e dos esforços do próprio reabilitando e de seus familiares que não perdem a
esperança e os sonhos de uma reinserção profissional e social.
.
RELAÇÃO DE PROJETOS DE LEI APRESENTADOS NO CONGRESSO NA-
CIONAL SOBRE REABILITAÇÃO PROFISSIONAL ENTRE 2010 E 2015:
- Câmara dos Deputados:
- PL 2567/2011 – Rodrigo Rollemberg (PSB-DF)
- PL 2037/1999 - Medeiros (PFL-SP)
- PL 7207/2010- Jô Moraes (PCdoB-MG) e outros
- PL 1217/2011 - Tião Viana (PT-AC)
- PL 6587/2013 - Fábio Faria (PSD-RN)
- PL 3163/2008 - Vanessa Grazziotin (PCdoB/AM)
- PL 325/1999 - Cunha Bueno (PPB-SP)
- PL 7201/2010 - Ricardo Berzoini (PT/SP) e outros
Não foram encontradas proposições no Senado Federal.
PROJETO DE LEI Nº , DE 2010(Dos Srs. Ricardo Berzoini, Pepe Vargas, Jô Moraes, Paulo Pereira da Silva e
Roberto Santiago)
Altera a Subseção II da Seção VI do Capítulo IIdo Título III da Lei nº 8.213, de
24 de julho de 1991, para dispor sobre aReabilitação Profissional.
O Congresso Nacional decreta:
Art. 1º A Subseção II da Seção VI do Capítulo II do Título III da Lei nº8.213, de 24 de julho de 1991, passa a ter a seguinte redação:
“Subseção IIDa Reabilitação Profissional
Art. 89. A reabilitação profissional deve proporcionar aobeneficiário incapacitado parcial ou totalmente para o trabalho odesenvolvimento de atividades terapêuticas e de profissionalização queabranjam a integralidade do indivíduo, de forma a superar os limitesimpostos por sua incapacidade, visando à estabilização física e à ampliaçãode movimentos e força, atuando no processo de estabilização psicossocial epossibilitando a integração nas relações sociais, cotidianas e de trabalho.
§ 1º A reabilitação profissional compreende: I –O processo terapêutico multidisciplinar;
II – A avaliação de saúde, da incapacidade, da funcionalidade e dopotencial laborativo, tendo como base a Classificação Internacional deFuncionalidade ( CIF), da Organização Mundial de Saúde, sobresponsabilidade de equipe multidisciplinar do Instituto Nacional do SeguroSocial (INSS);
III – O programa de reinserção do segurado na empresa de vínculo, que in-clui ações no indivíduo, no local e no posto de trabalho, na atividade labo-ral;IV – A qualificação do segurado, quando necessária, sob responsabilidadeda empresa e supervisionada pela equipe multidisciplinar do INSS;V – A orientação e avaliação do processo de reabilitação profissional peloINSS, antes da cessação do benefício, após dois meses, seis meses, um anoe dois anos do retorno ao trabalho;VI – O fornecimento, pelo INSS, de aparelho de prótese, órtese e instru-mentos de auxílio para locomoção quando a perda ou redução da capacida-de funcional puder ser atenuada por seu uso e dos equipamentos necessá-rios à reabilitação social e profissional;VII – A reparação ou a substituição, pelo INSS, dos aparelhos menciona-dos no inciso VI deste parágrafo, desgastados pelo uso normal ou por ocor-rência estranha à vontade do beneficiário;VIII – o transporte do acidentado do trabalho, quando necessário;IX – o auxílio para tratamento ou exame fora do domicílio do beneficiário,quando for o caso.
§ 2º O processo de reabilitação profissional só será concluído quando constatada, pelo INSS, areinserção do segurado no trabalho, em local e atividade que permita sua reintegração social plena,respeitadas suas limitações físicas, psíquicas e laborais.
§ 3º Para cumprir as etapas da reabilitação profissional previstas no § 1º deste artigo, o INSSdeve articular-se com o Sistema Único de Saúde (SUS), o Ministério do Trabalho e Emprego, com aSecretaria de Assistência Social, com órgãos formadores, bem como promover internamente aintegração entre os grupos pericial e da reabilitação profissional.
§ 4º A execução das funções previstas neste artigo deverá ser de responsabilidade de equipesmultidisciplinares de reabilitação profissional do INSS nos diferentes níveis de gerência e nas agênciasde previdência social dos municípios com mais de cem mil habitantes.
§ 5º Cada gerência regional deverá ter um plano diretor de reabilitação profissional,elaborado com a participação das gerências executivas e com o Conselho Regional de PrevidênciaSocial, contemplando as necessidades loco- regionais e entidades parceiras, incluindo as locais eregionais.
§ 6º O segurado poderá interpor recurso, conforme art. 126 desta Lei, ao Conselho deRecursos da Previdência Social, caso considere que o seu processo de reabilitação profissional nãoesteja ocorrendo conforme previsto em lei .
§ 7º O benefício por incapacidade só poderá ser cessado quando o segurado iniciarefetivamente suas atividades laborais ou for considerado apto para ser reinserido no mercado detrabalho.
Art. 90. ................................................................................§ 1º O encaminhamento para a avaliação da equipe de reabilitação profissional deverá ser
feito pela perícia nos seguintes casos:I - duração do benefício por incapacidade maior que seis meses, indepen-dentemente dos pedidos de prorrogação e reconsideração;II - três ou mais pedidos de prorrogação de benefício por incapacidade;III - um ou mais pedidos de reconsideração de benefício por incapacidade.
§ 2º A avaliação da equipe de reabilitação profissional deverá ser considerada como períciamultiprofissional.
§ 3º A equipe de reabilitação profissional deverá ter instalações distintas de perícia habitual doINSS.
.............................................................................................Art. 93. A empresa com 50 (cinquenta) ou mais empregados está obrigada a preencher de 2%
(dois por cento) a 5% (cinco por cento) dos seus cargos com reabilitados, na seguinte proporção:.............................................................................................§ 3º O trabalhador cuja redução de capacidade laboral for decorrente de acidente de trabalho
ou doença de origem ocupacional, será reabilitado obrigatoriamente na empresa em que trabalhava nadata do início do beneficio.” (NR)
Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
153
JUSTIFICAÇÃO
A reabilitação profissional é um dos serviços mais complexos prestadospela Previdência Social a seus segurados e dependentes. O texto legal, no entanto, não reflete essacomplexidade, definindo-a de forma bastante sucinta. Esse fato faz com que todo o detalhamento dosprocedimentos de reabilitação profissional seja remetido à regulamentação. O que se tem observado éque essa regulamentação não se dá de forma satisfatória, resultando em serviço ineficiente e ineficaz.
Além disso, o texto original da Lei no
8.213, de 1991, não faz distinçãoentre pessoa com deficiência e trabalhador com redução de capacidade laborativa adquirida já nacondição de segurado, ao tratar, na Subseção II da Seção VI do Capítulo II do Título III, de habilitadose reabilitados.
Essa diferença embora possa parecer sem importância, acaba por gerar umconflito de interesses entre as duas espécies de segurados, pois, na definição das cotas deobrigatoriedade de contratação, as empresas podem optar por cumpri-la totalmente com um ou comoutro tipo de situação, de acordo com suas conveniências.
A presente proposta pretende definir vários procedimentos obrigatórios,para que se tenha a real possibilidade de reinserir no trabalho segurados que apresentam redução decapacidade laboral ao término de seus benefícios por incapacidade. Da mesma forma, visa a resolver aatual situação conflituosa entre o trabalhador com sequela adquirida e a pessoa com deficiência,diferenciando os tipos de procedimentos, de acordo com a realidade própria e individualizada dapessoa com deficiência e o trabalhador reabilitado.
Tendo em vista a relevância da matéria, contamos com o apoio dos ilustrespares para a aprovação desta proposição.
Sala das Sessões, em 28 de abril de 2010.
154
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