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 JUL-AGO DE 2015      E    x    e    m    p      l    a    r    a    v    u      l    s    o    :     R      $     1     2  ,     6     8 DEUS E O CONFLITO CÓSMICO Uma revista para pastores e líderes de igreja COMO VIVER NA ATMOSFERA DO REAVIVAMENTO

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    DEUS E O CONFLITO CSMICO

    Uma revista para pastores e lderes de igreja

    COMO VIVER NA ATMOSFERA DO REAVIVAMENTO

  • | JUL-AGO 20152

    Assistir a telejornais, ler jornais e revistas so hbi-tos de todos ns que desejamos estar bem infor-mados. Mas, qual a pauta de notcias que nos oferecida diariamente? Como se tambm assistisse a tudo o que vemos hoje, Ellen G. White responde: Vive-mos em meio de uma epidemia de crime, diante da qual ficam estupefatos os homens pensantes e tementes a Deus em toda parte. A corrupo que predomina est alm da descrio humana. Cada dia traz novas revela-es de conflitos polticos, de subornos e fraudes. Cada dia traz seu doloroso registro de violncia e ilegalidade, de indiferena aos sofrimentos do prximo, de brutal e diablica destruio de vidas humanas. Cada dia testi-fica do aumento da loucura, do assassnio, do suicdio (A Cincia do Bom Viver, p. 142, 143).

    Em busca de explicao para o que veem, algumas pessoas tm sugerido a falta de educao, desigualdade social, pssima gesto governamental e outros fatores como responsveis pelo cenrio to desolador. Porm, essas realidades so apenas o resultado das aes de um agente maior: Satans, o arqui-inimigo destruidor. Afinal, quem pode duvidar que agentes satnicos se achem em operao entre os homens, numa atividade crescente, para perturbar e corromper a mente, contaminar e destruir o corpo? (Ibid.).

    Infelizmente, h quem duvide e chegue at mesmo a questionar o carter, o poder e o amor de Deus. No poucos parecem seguir na esteira do pensamento alimentado por Epicuro, filsofo grego do perodo helenstico: Deus ou quer impedir os males e no pode; ou pode e no quer; ou nem quer nem pode, ou quer e pode. [...] Se pode e quer, que o nico conveniente a Deus, de onde provm, ento, a existncia dos males? Por que Ele no os impede? (Reinholdo A. Ullmann, Epicuro: o Filsofo da Alegria, p. 112).

    De fato, o ser humano no pode entender plenamente todas as nuanas do sofrimento, a menos que o analise luz do milenar conflito entre Deus e Satans. Rebelando-se contra a ordem e a autoridade divinas, o inimigo foi

    expulso do Cu e estabeleceu sua base na Terra. Desde ento, tem-se empenhado em levar os seres humanos destruio, atacando como leo que ruge procurando algum para devorar (1Pe 5:8), ou valendo-se da sutileza de adulaes e enganos quase imperceptveis.

    O telogo Ricardo Norton, em artigo nesta edio, enumera alguns desses enganos, diretamente relacionados tambm vida pastoral. Entre eles est, por exemplo, a excessiva atividade que tende a nos roubar o tempo que deve ser dedicado comunho com Deus. Nunca exaustivo insistir nesse ponto, pois h sempre o perigo de que o pastor tenha as mos to cheias do que fazer, que o corao seja esvaziado de Deus e Sua Palavra. Ento, ser tambm esvaziado de poder e sabedoria, a cidadela da alma ser avariada e o inimigo encontrar brecha para agir.

    Outro ardil empregado pelo inimigo, na tentativa de destruir o pastor, a iluso do xito. Conforme escreveu o erudito francs Theodore Monod, o sucesso pode nos levar a duas veredas perigosas: (1) atribuio da glria a ns mesmos e (2) arrefecimento do nimo, acomodao, justamente quando deveramos continuar investido nosso melhor esforo no trabalho. Isso tudo o que Satans deseja. Por isso, lembra Monod, Deus no nos imps a obrigao de ter sucesso, mas a necessidade de ser fiis e diligentes em todas as coisas. Tambm devemos ser vigilantes sobre ns mesmos, nossas debilidades, tendncias e propenses humanas, a fim de que, em Jesus Cristo, sejamos vencedores sobre o mal e seu autor.

    Os dias atuais exigem que, como pastores, preguemos e vivamos de maneira a desmascarar o grande adversrio diante do mundo e da igreja. As pessoas precisam ouvir e entender claramente o fato de que Deus permite o sofrimento para que, ao observarmos os feitos dEle e os do inimigo, entendamos quem o verdadeiro facnora do Universo, e quem a fonte do amor. Porm, um dia, muito brevemente, o inimigo ser destrudo para sempre. Aleluia! Deus sempre o vencedor!

    Zinaldo A. Santos

    Os dias atuais exigem que,

    como pastores, preguemos e vivamos

    de maneira a desmascarar

    o grande adversrio diante

    do mundo e da igreja

    Mirando o adversrio

    EDITORIAL

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    SUMRIO

    8 Espiritualidade e misso Marcelo Dias Autor chama a ateno para o estilo de vida que caracteriza o missionrio de xito.

    10 Abrindo portas missionrias S. Costa Pastor diz o que tem feito para levar o evangelho em regies difceis para o cristianismo.

    12 Atmosfera celestial Shawn Brace As lies de uma reunio de reavivamento realizada em South Lancaster.

    15 Deus no o ru Douglas Reis Por que um Deus de amor ordenou a eliminao de povos no Antigo Testamento?

    18 Falso ou verdadeiro? Ricardo Norton Como se livrar de enganos sutis que ameaam a igreja e o trabalho do pastor.

    22 Teodiceia do grande conflito Richard Rice A existncia do sofrimento um desafio para a religio, mas no intransponvel.

    25 Filho do Homem Eduardo Rueda Conhea as origens do ttulo mais usado por Jesus para Ele mesmo.

    28 O chamado e o mandato Roberval Moura Marinho Nos ensinamentos e exemplo de Cristo, o caminho para o verdadeiro discipulado.

    2 Editorial

    4 Entrelinhas

    5 Entrevista

    30 AFAM

    33 Mural

    34 Recursos

    35 Ponto final

    Uma publicao da Igreja Adventista do Stimo DiaAno 87 Nmero 519 Jul/Ago 2015 Peridico Bimestral ISSN 2236-7071

    EditorZinaldo A. SantosEditor AssociadoMrcio NastriniAssistente de EditoriaLenice F. Santos

    Projeto GrficoLevi GruberCapaMontagem sobre imagens do Fotolia

    Colaboradores EspeciaisCarlos Hein; Herbert Boger; Jerry Page; Derek Morris

    ColaboradoresAntnio Moreira; Ccero Gama; Cludio Leal; Edilson Valiante; Edinson Vasquez; Eliezer Jnior; Enzo Chaves; Eufracio Quispe; Fabian Marcos; Geovane Souza; Horcio Cayrus; Jair Garcia Gis; Mitchel Urbano; Nelson Filho; Pablo C. Garcia; Waldony Fiza

    Ministrio na Internetwww.dsa.org.br/revistaministeriowww.dsa.org.br/revistaelministerioRedao: [email protected]

    Todo artigo, ou correspondncia, para a revista Ministrio deve ser enviado para o seguinte endereo:Caixa Postal 2600 70279-970 Braslia, DF

    CASA PUBLICADORA BRASILEIRA

    Editora da Igreja Adventista do Stimo DiaRodovia SP 127 km 106 Caixa Postal 3418270-970 Tatu, SP

    Diretor-GeralJos Carlos de LimaDiretor FinanceiroEdson Erthal de MedeirosRedator-ChefeMarcos De BenedictoRedator-Chefe AssociadoVanderlei DornelesChefe de ArteMarcelo de Souza

    SERVIO DE ATENDIMENTO AO CLIENTE

    Ligue Grtis: 0800 979 06 06Segunda a quinta, das 8h s 20hSexta, das 7h30 s 15h45Domingo, das 8h30 s 14hSite: www.cpb.com.brE-mail: [email protected]

    Assinatura: R$ 61,60Exemplar Avulso: R$ 12,68

    Todos os direitos reservados. Proibida a reproduo total ou parcial, por qualquer meio, sem prvia autorizao escrita

    do autor e da Editora.

    Tiragem: 6.500 5953 / 32589

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    O ttulo acima o mesmo do ltimo captulo do livro Ministrio Pastoral, de autoria de Ellen G. White, traduzido e lanado neste ano pela Asso-ciao Ministerial da Diviso Sul-Americana e pela Casa Publicadora Brasileira. A leitura desse livro vai renovar seu ministrio. Ele nos apresenta Cristo, o Pastor prin-cipal, que prov o modelo perfeito para Seus subpas-tores. Aponta-lhes Seu exemplo de amor que O levou a dar a vida para libertar Suas ovelhas. Se cada pastor, hoje, imitar Seu exemplo de abnegao, o rebanho sob seus cuidados prosperar.

    Cada caracterstica da vida do grande exemplo deve ser cuidadosamente estudada. Convido voc a refletir sobre estas caractersticas:

    Comunho A orao foi o centro do ministrio de Cristo. Nas montanhas da Galileia e no monte das Oliveiras, o Amado de Deus orou pelos pecadores. Ento, saiu para ministrar-lhes. Esse exemplo de Jesus nos mostra como podemos enfrentar os embates pastorais.

    Relacionamento Cristo Se identificou com Seu povo. Identificou-Se com as necessidades das pessoas. Os sofrimentos delas eram tambm Seus sofrimentos. Em certa ocasio, disse Ele: Tive fome, e Me destes de comer; tive sede, e Me destes de beber; era forasteiro, e Me hospedastes; estava nu, e Me vestistes; enfermo, e Me visitastes; preso, e fostes ver-Me (Mt 25:35, 36).

    O amor, a misericrdia e a compaixo estavam presentes em cada ato do ministrio de Jesus.

    Ele foi o Lder-Servo. Portanto, a fim de que tenha xito como Jesus, voc deve liderar humildemente, semelhana dEle. Os pastores desprezados por aqueles aos quais serve devem recordar que Jesus tambm foi desprezado.

    Jesus costumava organizar Seu dia de tal modo que, tardinha pudesse ministrar classe trabalhadora. Assim, ande com Ele, fale dEle, imite-O. No Se exalte nem por palavras nem por aes. Fale de Cristo, ore em nome dEle, seja dependente dEle e pregue sobre Ele. Essa a qualidade ministerial que atesta a realidade de que o pastor foi chamado e escolhido por Deus.

    Misso Cristo veio dar um exemplo correto do que significa ser um pastor conquistador de pessoas para o reino dEle. Trabalhou constantemente por um objetivo, ou seja, todos os Seus poderes foram empregados em favor da salvao de seres humanos. Assim, o bom pastor busca diligentemente ovelhas perdidas e as recebe amorosamente no redil.

    O ministrio de Jesus consistiu em pregar e educar as pessoas; Ele foi o Pregador-Mestre, que hoje acompanha e inspira os modernos subpastores. Embora tenham passado muitos sculos, a passagem do tempo no mudou Sua promessa feita aos Seus discpulos: Eis que estou convosco todos os dias at consumao do sculo (Mt 28:20).

    Desde a ascenso de Cristo at nossos dias, os ho-mens ordenados por Deus se tornaram mestres da f. Cristo, o Supremo Pastor, realiza e supervisiona Sua obra por meio desses subpastores. Assim, a posio ocupada por aqueles que trabalham na pregao e no ensino da Palavra est revestida de especial importncia. Como embaixadores de Cristo, eles rogam s pessoas que se reconciliem com Deus. No negligenciemos o cumpri-mento dessa misso.

    Herbert Boger

    Cristo veio dar

    um exemplo correto do

    que significa ser um pastor conquistador

    de pessoas para o reino dEle. Somos chamados a

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    O Pastor modelo

    ENTRELINHAS Herbert Boger

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    ENTREVISTA ARTUR STELE, EKKEHARDT MUELLER, ELIAS BRASIL DE SOUZA, KWABENA DONKOR, CLINTON WAHLEN

    Excelncia a servio da igreja

    No estamos aqui para ser colocados em um pedestal e ser admirados, mas para servir

    por Derek Morris e Willie Hucks II

    O Instituto de Pesquisa Bblica, IPB, foi estabelecido h 40 anos, por iniciati-

    va da Comisso Diretiva da Associao Geral da Igreja Adventista, com o obje-tivo de facilitar a pesquisa teolgica, apologtica e servir igreja. Porm, suas razes remontam a 1943, quando foi criada a Comisso de Defesa da Literatu-ra, e a 1952, com o estabelecimento da Comisso de Estudo Bblico e Pesquisa. O IPB cresceu e tem contribudo para o fortalecimento espiritual de pastores, telogos, estudantes, lderes e membros da igreja em todo o mundo. Isso feito por meio da publicao de farta literatura impressa e digital, alm da realizao de semi-nrios. O IPB tem como diretor titular o pastor Artur Stele, nascido no Casaquisto. Seus associados so os pastores Ekkehardt Mueller, natural da Alemanha, o brasi-leiro Elias Brasil de Souza, Kwabena Donkor, nascido na frica, e o norte-americano Clinton Wahlen. Todos eles so possuidores de slida experincia pastoral, adminis-trativa e acadmica.

    Nesta entrevista concedida aos editores da revista Ministry, eles descrevem o tra-balho do Instituto de Pesquisa Bblica e enfatizam a necessidade que tem o pastor adventista de buscar a excelncia. Tudo para a glria de Deus e aprimoramento do servio prestado igreja e comunidade.

    Qual o propsito primordial do Instituto de Pesquisa Bblica?Clinton: Com o crescimento da Igreja em todo o mundo, e em culturas variadas, um dos desafios fundamentais nutrir e manter a unidade teolgica, e a fidelidade Palavra de Deus. Exaltar a Bblia uma das muitas formas de se fazer isso. Portanto, trabalha-mos junto s comisses de pesquisa de cada Diviso mundial da Igreja Adventista, re-alizando seminrios teolgicos, buscando aprofundar o estudo das Escrituras e nutrir a unidade. Esses seminrios alcanam pastores, administradores, professores de teo-logia e outros lderes. Tambm publicamos livros e disponibilizamos muitos recursos

    que podem ser encontrados no site www.AdventistBiblicalResearch.org.Mueller: Podemos resumir nossas tare-fas em trs categorias: pesquisa teolgica, apologtica e servio igreja. A pesquisa teolgica inclui identificar reas de estu-do que necessitam de fortalecimento e fa-zer pesquisas com esse objetivo, alm da-quelas que geram aplicaes prticas. Ou seja, se necessitamos ampliar nossa com-preenso sobre eclesiologia, por exemplo, a pesquisa ser direcionada a essa rea, envolvendo os melhores eruditos da igre-ja. Apologtica outra categoria. Alguns pensam que essa seja a principal parte do que fazemos, mas apenas uma das mui-tas reas de nosso engajamento. Ento, temos o servio: ajudamos a liderana da igreja em todo o mundo e servimos ao Campo Mundial, disponibilizando recursos,

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    Ekkehardt Mueller

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    materiais para estudo e realizando semi-nrios. Cuidamos dos pastores, seminaris-tas e professores de teologia.

    Em termos prticos, de que maneira o Instituto de Pesquisa Bblica atende as necessidades dos pastores?Donkor: Uma necessidade comum en-tre os pastores a de desenvolver uma hermenutica apropriada. Para isso, o IPB disponibiliza dois volumes intitulados Un-derstanding Scripture [Compreendendo as Escrituras] e Interpreting Scripture In-terpretando as Escrituras]. O primeiro tra-ta da interpretao de profecias, poesia, salmos e parbolas, por exemplo. O se-gundo trata de questes e textos mais difceis.Mueller: O Manual de Teologia Adventista do Stimo Dia aborda as crenas fun-damentais do movimento adventista. Considerando ser um dever de todo pastor compreender a teologia adven-tista, esse volume no pode faltar em sua biblioteca. Clinton: Alm dessas, temos publi-cado outras obras importantes como Message, Mission and Unity of the Church [Mensagem, Misso e Unidade da igreja], um livro prtico contendo ideias e princpios do cumprimento da misso. Todos os materiais e recursos disponibilizados pelo IPB podem ser acessados em nosso site, onde tambm pode ser encontrado nosso boletim tri-mestral, Reflections. Tambm atuamos como consultores. Sempre que pastores e lderes das igrejas necessitarem de escla-recimento sobre alguma questo, podem entrar em contato conosco.

    Algumas vezes pensamos no pastor como sendo algum prtico, no como telogo. Como podemos equilibrar os dois conceitos?Stele: Infelizmente, ns separamos pasto-res e telogos. Na verdade, em certo senti-do todo pastor precisa ser um telogo, pois os pastores so trombetas da teologia, isto

    , falam de teologia. Eles proclamam a Palavra, esse seu trabalho. Quer estejam pregando, aconselhando ou orando, tudo deve soar teologicamente. Se os pastores consideram seriamente as Escrituras como Palavra de Deus, eles devem estud-las.

    E ao fazerem isso, eles esto efetiva-mente fazendo teologia. Desejamos ver os pastores envolvidos no estudo e pesqui-sa da Bblia. Ler literatura teolgica im-portante, mas isso jamais deve substituir o profundo e regular estudo da Palavra de Deus. No podemos criar rtulos, dizendo que os telogos trabalham no escritrio e os pastores no campo. Em ltima instncia, ambos esto envolvidos na mesma tarefa, ou seja, so pastores que tm a Bblia como fundamento de suas crenas, seu ensino, sua pregao e suas atividades dirias.

    Quais so os maiores desafios que os senhores identificam hoje para a igreja?Mueller: Hermenutica um deles. Diferentes estudiosos dizem usar o mesmo mtodo de interpretao bblica, mas che-

    gam a concluses diferentes. Isso peri-goso, pois pode pavimentar o caminho para que algum diga: Esqueamos o mtodo adventista de intepretao das Escrituras e adotemos qualquer um.Clinton: Somos uma igreja fundamen-tada na Bblia, cremos que surgimos das Escrituras. Assim, nossas respos-tas para questes de f e prtica devem estar aliceradas nas Escrituras. Muitos no tm um claro senso do que signifi-ca dizer que somos o remanescente da profecia bblica e que temos um papel a desempenhar no tempo do fim, ou seja, a proclamao das trs mensagens an-glicas, preparando um povo para a se-gunda vinda de Jesus.Elias: Criao e evoluo tm sido outro desafio, e isso tem srias implicaes

    para a hermenutica e nossa viso das Escrituras. De fato, h uma rejeio cres-cente da viso bblica na sociedade moder-na, o que se torna um desafio real para a comunicao da teologia.Stele: Os jovens tm viso totalmente di-ferente de muitas coisas estabelecidas. Precisamos encontrar maneiras de tornar mais atraente nossa mensagem para eles. Adorao outro desafio. Algumas vezes, fazemos coisas que deviam suscitar gran-des perguntas. Necessitamos encontrar um caminho para realmente adorar em es-prito e em verdade.Donkor: Alguns desafios podem ser re-gionais, o que pode requerer contextuali-zao da mensagem em uma regio, a fim de abordar necessidades especficas. Por exemplo, o rastejar das crenas e prticas tribais da frica para dentro da igreja cris-t. Aqui est o risco do sincretismo.

    Alguns pastores negligenciam o hbito de ler, depois que saem do

    Elias Brasil

    Kwabena Donkor

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    seminrio, ocupando-se unicamente dos negcios do ministrio pastoral. Como podemos ajud-los a retomar a prtica do estudo e leitura?Clinton: Sei o que significa pregar vrias vezes na semana, alm do envolvimento com outras atividades ministeriais e ad-ministrativas. No fcil. Contudo, profis-sionais de todas as reas precisam cavar tempo para o crescimento pessoal e a educao contnua. No ministrio pasto-ral isso ainda mais prioritrio.Donkor: Quando um pastor negligencia o estudo e a leitura, seu ministrio entra em uma zona perigosa. Muitas igrejas ad-ventistas podem sobreviver a duras pe-nas sem nenhuma viso. Porm, viso o que prov um alvo e direo ao ministrio pastoral. Enquanto voc conservar vivo o alvo, voc no poder deixar de estudar, por que precisa criar e executar progra-mas, projetos, que levam ao cumprimen-to do prprio alvo. Porm, quando entra-mos em uma rotina em que fazemos as mesmas coisas, pregamos os mesmos ser-mes, esse o sinal de que chegou o mo-mento de ler, estudar e criar uma viso.Stele: Quando dizemos aos pastores: Vocs devem ler, eles reagem dizen-do que no tm tempo disponvel para isso. Mas, preciso que desenvolvamos uma cultura que diga: Vocs no podem deixar de ler. Se eu no visitar os mem-bros nem estudar, no saberei o que pre-gar. Os pastores no podem negligenciar o estudo, porque isso facilita o trabalho deles. Alm disso, ao ouvir sermes re-petitivos, os membros da igreja rapida-mente sabem reconhecer que o pastor no estuda.Elias: Os pastores devem estabelecer al-vos para si mesmos. Em algumas partes do mundo eles tm alvos de batismos, d-zimos, e sabem como medir esses alvos. Se importante ter alvos de batismos, d-zimos, estabelecimento de congregaes, visitao, tambm devemos ter alvos inte-lectuais. Nesse sentido, cada pastor deve iniciar o ano com alguns alvos especficos.

    Por exemplo, estudar alguns temas ou par-tes das Escrituras. Ento, no fim do ano, poder avaliar-se luz desses alvos. Pode ser que a Associao no enfatize esse as-pecto do trabalho, mas devemos pessoal-mente fazer isso, para nosso crescimento e a fim de melhor servir igreja.

    Que conselhos os senhores gostariam de transmitir aos pastores, estudan-tes e professores de Teologia, incluin-do quem deseja fazer ps-graduao?Elias: Quando fui professor no Seminrio Teolgico da Faculdade Adventista da Bahia, alguns estudantes me faziam a mesma pergunta. Minha resposta tem

    quatro itens. Primeiro, tenham uma vida devocional consistente. Os estudan-tes so acostumados a uma abordagem mais devocional nas respectivas congre-gaes. Quando eles pregam ou do es-tudos bblicos, fazem isso de maneira de-vocional. Mas quando chegam ao semi-nrio, eles tendem a desenvolver uma abordagem mais acadmica do estudo da Bblia. Nesse contexto, frequentemente negligenciam a apropriao pessoal das Escrituras. Porm, no devem se esque-cer de estudar a Bblia devocionalmente e manter sua vida de orao. Segundo item, desenvolvam uma viso da autoridade e inspirao das Escrituras, e aprendam a

    pensar biblicamente. Terceiro, leiam tan-to quando puderem. Quem deseja fazer uma carreira acadmica precisa gostar de aprender, ler e pesquisar, para encontrar respostas escritursticas para questes teolgicas. Finalmente, escolham a rea de seu interesse e leiam o mximo sobre esse assunto. Quando uma pessoa com-petente em uma rea de estudo, a igreja bem servida. Donkor: H pessoas que avanam nos es-tudos teolgicos, desconsiderando a in-tegridade da teologia adventista. Porm, temos somente uma forma de fazer teo-logia. Portanto, conservem em mente a integridade da teologia adventista.Clinton: Tambm importante manter em mente os interesses e as necessida-des da igreja. Se algum investir recursos e tempo, dedicando-se ao estudo de al-gum tema ou rea da teologia, precisa es-tar certo de que isso ser proveitoso para a igreja em sua compreenso dos prop-sitos para os quais ela existe e da misso que lhe foi confiada.Mueller: O pastor deve buscar a exce-lncia em tudo o que fizer. No estamos aqui para ser colocados em um pedestal e ser admirados, mas para servir. Todo pas-tor deve se esforar para fazer seu me-lhor, permanecer humilde, aprender com outros, ouvir a igreja e os colegas. Um dos aspectos positivos aqui no Instituto de Pesquisa Bblica que compartilha-mos ideias.Clinton: Seguindo essa linha de pensa-mento, lembro-me de um professor de teologia, a quem respeito e aprecio muito. Certa ocasio, ele me disse: Voc pode me chamar de doutor, se quiser, mas eu prefi-ro ser chamado de pastor, porque a con-fiana que foi colocada sobre mim quan-do fui ordenado ao ministrio adventista do stimo dia significa o mximo para mim. superior a qualquer graduao acadmi-ca, superior ao doutorado e ps-doutora-do. O chamado de Deus como pastor o mais importante para mim. Esse o ideal que desejamos imitar.

    Clinton Mueller

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    MISSIOLOGIA Marcelo DiasProfessor de Teologia no Unasp, campus Engenheiro Coelho, SP,

    doutorando na Universidade Andrews

    Vrios temas e trechos da Bblia so importantes para a compreenso sobre a misso e a espiritualidade. David J. Bosch, influente missilogo, suge-riu que a segunda carta de Paulo aos co-rntios o melhor estudo de caso sobre espiritualidade missionria j publicado.1 Ele mostra como a espiritualidade bbli-ca mantm o equilbrio entre o relaciona-mento com Deus e o envolvimento com o mundo, uma espiritualidade marcada pelo servio e pela cruz.

    As circunstncias desfavorveis relati-vas desconfiana por parte dos membros da igreja de Corinto tornaram essa carta de Paulo uma resposta pessoal aos falsos mis-sionrios que haviam inflamado os con-versos contra ele e uma exposio da sua espiritualidade missionria. Talvez nenhum outro livro do Novo Testamento descreva com tamanha profundidade e extenso as dinmicas emocionais, fsicas e espirituais de um cristo missionrio.2 Uma das princi-pais lies nesse sentido que a mensagem

    e o mensageiro so inseparveis. Portanto, o apstolo Paulo defendeu sua reputao, seu carter e credibilidade em favor da re-putao do evangelho (2Co 13:7, 8). Parado-xalmente, isso significa se identificar como um vaso de barro (4:7).

    Estilo de vida missionrioAo descrever a atitude e o modo de vi-

    ver missionrio, por intermdio dessa carta, Paulo enfatizou a graa de Cristo e a indig-nidade daqueles que a recebem (12:9, 10).

    Espiritualidade e misso Ns tambm somos fracos nEle, mas viveremos, com Ele, para vs outros pelo poder de Deus

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    O apstolo chamou a ateno para a graa expressa na sua misso e na sua vida de po-breza, rejeio e perseguio (6:4, 5; 11:23). A mensagem que o cristianismo mais forte quando fraco e sofrendo rejeio, suspeita e preconceito (12:10; 13:4).3 Fre-quentemente, esse o caso no contexto da janela 10/40 e em outros lugares, no tem-po que precede a segunda vinda de Cristo.

    O relacionamento com Deus e o en-gajamento com o mundo, de forma in-separvel, a essncia da experincia do apstolo. Paulo afirmou que Ele que nos conforta em toda a nossa tribulao, para podermos consolar os que estiverem em angstia, com a consolao com que ns mesmos somos contemplados por Deus (1:4). Deus nos reconciliou consigo mes-mo por meio de Cristo e nos deu a mis-so da reconciliao (5:18), e nos tornamos cooperadores na Sua misso (6:1). o amor de Cristo que nos constrange, transforma os que esto nEle em novas criaturas, pro-duz vidas que no mais vivem para si, mas para Aquele que por elas morreu e res-suscitou (5:14-17). O relacionamento com Deus s pode verdadeiramente aconte-cer no contexto do engajamento com o mundo, enquanto o envolvimento com o mundo s pode verdadeiramente ocorrer no contexto do relacionamento com Deus.

    As metforas missionrias de Paulo em sua segunda carta aos corntios tambm descrevem esse relacionamento. A fragrn-cia que por meio do missionrio se mani-festa em todo o lugar o bom perfume de Cristo (2:15). A carta lida por todos os ho-mens carta de Cristo, escrita no com tin-ta, mas pelo Esprito do Deus vivente (3:3). Somos embaixadores em nome de Cristo, como se Deus exortasse por nosso interm-dio (5:20). Ns nos tornamos santurios do Deus vivente (6:16). E colaboramos na pre-parao do povo de Deus como de uma vir-gem pura para seu esposo, que Cristo (11:1). Assim, no pregamos a ns mesmos, mas a Cristo Jesus como Senhor, porque Deus resplandeceu em nosso corao e iluminou

    o conhecimento da glria de Deus na face de Cristo (4:6). Assim Deus, por intermdio de Cristo, nos habilita para ser missionrios (3:6); dessa maneira vasos de barro podem conter o tesouro, para que a excelncia do poder seja de Deus e no nossa (4:7).

    No desenvolvimento da espiritualida-de, pela perspectiva da eternidade, a nossa leve e momentnea tribulao (incluindo aflies, privaes, angstias, aoites, pri-ses, tumultos, viglias e jejuns), frequente-mente resultante do testemunho, produz renovao e eterno peso de glria (4:6-17). So os trabalhos e fadigas, as prises, os aoites e os perigos de morte, os naufr-gios, os perigos (inclusive entre gentios, na cidade e entre falsos irmos), e at preocupao com aqueles que recebem o evangelho, que nos fazem ainda mais mis-sionrios de Cristo (11:23-28). Esse o andar pela f e no pelo que vemos (5:7).

    De forma transparente, o apstolo Pau-lo discutiu a dinmica da espiritualidade na misso, lembrando que, embora an-dando na carne, no militamos segundo a carne, mas sim no poder de Deus (10:3, 4). Para isso, necessrio ser de Cristo e no permitir que o ato de anunciar do evan-gelho resulte em glria para ns mesmos, mas em glorificar ao Senhor e ser louva-do por Ele (10:16-18). A nica exceo per-mitida gloriar-se em relao fraqueza (11:30; 12:9) para que o poder de Cristo re-pouse sobre ns de acordo com a graa suficiente de Deus. Porque na fraqueza que somos fortes para a misso (12:10). As-sim como a teologia de Paulo uma teolo-gia missionria, importante compreender que a espiritualidade de Paulo foi uma es-piritualidade missionria.

    Espiritualidade missionria e missionrio espiritual

    Fica evidente que espiritualidade e misso no podem existir desconecta-das. Por demasiadas vezes, a espirituali-dade tem sido caracterizada como prtica isolada, introspectiva e contemplativa que

    negligencia a dimenso missionria desen-volvida atravs do engajamento no teste-munho. Isso seria mera religiosidade, no espiritualidade. Seria o resultado de uma desconexo entre palavra e ao, sacro e secular, espiritualidade e misso.

    Se tivssemos que resumir esse tema em trs aspectos, seriam estes: (1) de-pendncia genuna de Deus, (2) humilda-de e disposio para aprender e (3) fruto do Esprito.4 De modo mais especfico, es-pecialistas tm apontado para uma expe-rincia que inclui o seguinte: (1) converso genuna, (2) discpulado que se desenvol-ve e que multiplica, (3) profundo sentido de chamado, (4) mensagem vital, (5) co-rao disposto a servir, (6) compromisso firme com a igreja, (7) corpo saudvel e mente vigorosa, (8) estilo de vida atrati-vo e (9) dons espirituais.5

    Uma espiritualidade missionria ou um missionrio espiritual se define pelo modo de viver e servir. Por isso, Bosch sugere uma espiritualidade que no o resultado de obras, nem um esforo individualista, mas o desenvolvimento dinmico de um relacionamento com Cristo que resulta em envolvimento no mundo, a qual ele cha-ma de a espiritualidade do caminhar.

    Referncias:

    1 David J. Bosch, A Spirituality of the Road (Eugene, OR: Wipf & Stock, 1979), p. 12, 13.

    2 Simon J. Kistemaker e William Hendricksen, Exposition of the Second Epistle to the Corinthians, New Testament Commentary (Grand Rapids, MI: Baker Book House, 1953-2001), v. 19, p. 19.

    3 Introduo a 2 Corntios, Andrews Study Bible, p. 1516.

    4 A. Scott Moreau, Gary R. Corwin, Gary B. McGee (ee), Introducing World Missions: A Biblical, Historical and Practical Survey (Grand Rapids, MI: Baker Academic, 2004), p. 176-178; Claude Hickman, Steven C. Hawthorne and Todd Ahrend, em Ralph D. Winter e Steven C. Hawthorne (ee), Perspectives on the World Christian Movement: A Reader (Pasadena, CA: William Carey Library, 2009), p. 725-730.

    5 Marion G. Fray, Strategies for the Development of the Sipiritual Life Missionaries em John Mark Terry, Ebbie Smith and Justice Anderson (ee), Missiology (Nashville, TN: Broadman & Holman, 1998), p. 589-594.

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    TESTEMUNHO S. CostaMissionrio

    H poucos anos, quando recebemos nosso chamado para o campo mis-sionrio, sentimos que havamos recebido a resposta para um plano que cul-tivvamos durante algum tempo, e que havamos partilhado com Deus. O convi-te nos trouxe grande alegria e, ao mesmo tempo, uma interrogao: Como seria esse novo caminho?

    Passado o perodo de adaptao, o sentimento de misso e o desejo de servir afloraram com intensidade singular. Ape-sar de termos lido livros sobre o assun-to, e traado estratgias, com o passar do tempo o foco na misso foi gerando ape-nas frustraes. Os resultados no pare-ciam vir, ao menos na viso e no tempo humanos.

    Ficamos isolados por muito tempo no pas, realizando cultos em nossa casa, sem ningum com quem pudssemos nos unir em adorao a Deus durante os sbados. Nossas filhas eram acostumadas a fre-quentar a igreja e sempre gostaram muito da Escola Sabatina, mas estavam impe-didas disso. Foi um processo doloroso de adaptao. Nossa f foi posta prova, bem como o propsito do nosso ministrio. Fo-mos desafiados a aprender como desen-volver uma espiritualidade mais profunda, num contexto completamente diferente daquele com o qual estvamos acostu-mados. Nesse caminho de aprendizagem, continuamos buscando vencer a ns mes-mos, uma cosmoviso culturalmente con-dicionada e uma viso limitada do grande conflito csmico e do amor de Deus pela humanidade.

    Que Allah cuide de vocNo prdio em que moramos, convive-

    mos com um cl familiar incluindo vrios parentes. Certo dia, ofereci-me para ajudar uma senhora idosa e doente. Admirada, ela me olhou e disse: Sabe que voc a ni-ca pessoa que me oferece ajuda? Nem meu esposo, meu genro, minha filha ou meus netos tm esse tipo de carinho e cuida-do comigo. Que Allah o abenoe e proteja! Que Allah cuide de voc e sempre o man-tenha assim, atencioso para com aqueles que precisam.

    Fiquei surpreso com aquela declarao e agradecido por ver que pequenas atitu-des podem ser o caminho para despertar-mos o interesse das pessoas em Cristo, o exemplo maior. Especialmente as regies do mundo de minoria crist desafiam o desenvolvimento de uma espiritualida-de missionria genuna, caracterizada pelo testemunho do evangelho atravs de pequenas atitudes e contatos de ami-zade desinteressada. Isso parte de um modo de viver dirio resultante de cres-cente senso de responsabilidade e bus-ca espiritual.

    O livro da paz

    Minha esposa tambm tem seus de-safios como missionria e, para mim, ela um grande testemunho de como devemos conciliar a espiritualidade e a misso. Quan-do aqui chegamos, ela voltou a estudar. Na universidade, ela conheceu uma jovem mu-ulmana que se mostrou acessvel ao conhe-cimento do cristianismo.

    Depois de alguns anos de amizade com

    essa moa, minha esposa perguntou a ela se poderia lhe dar um presente muito es-pecial, numa data tambm especial para os cristos, o Natal. Diante da resposta positi-va, minha esposa preparou carinhosamen-te uma cesta com alguns itens interessantes e colocou entre eles uma Bblia. A jovem foi muito receptiva ao presente, o que poste-riormente motivou algumas conversas so-bre pores da Bblia.

    Recentemente, ao iniciar um novo se-mestre letivo, as duas amigas se reencon-traram. A amiga muulmana procurou minha esposa e disse que, durante as f-rias, havia visitado algumas vezes uma igreja crist em seu pas, e que estava len-do a Bblia. Disse ainda que sentia muita paz quando lia as Escrituras. Isso nos trou-xe grande alegria!

    Todo verdadeiro missionrio deve bus-car, cada dia, a verdadeira espiritualida-de e no a mera religiosidade. O apstolo Paulo entendeu isso muito bem: Os es-foros do apstolo no estavam restrin-gidos pregao pblica; havia muitos que no poderiam ser alcanados dessa maneira. Ele despendeu muito tempo no trabalho de casa em casa, prevalecendo--se assim das relaes familiares do cr-culo domstico. Visitava os enfermos e tristes, confortava os aflitos, animava os oprimidos. Em tudo o que dizia e fazia en-grandecia o nome de Jesus (Ellen G. Whi-te, Atos dos Apstolos, p. 139).

    Deus nos usar como vasos de barro (2Co 4:7-12), fazendo com que Seu poder seja realidade em nossa vida, mesmo em meio aos maiores desafios.

    Abrindo portas missionrias Pequenas atitudes podem ser o caminho para despertarmos o interesse das pessoas em conhecer Cristo

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    REAVIVAMENTO Shawn Brace Pastor em Bangor,

    Estados Unidos

    Ao longo dos ltimos anos, a Igreja Adventista do Stimo Dia tem en-fatizado o reavivamento, em con-sonncia com a declarao feita por Ellen G. White, por volta de 1887: Um reaviva-mento da verdadeira piedade entre ns, eis a nossa maior e mais urgente neces-sidade.1 Mas o que realmente esse rea-vivamento? Como identificar os frutos do reavivamento? E o mais importante: O que deve acontecer para que possamos final-mente perceber o reavivamento que Deus deseja que experimentemos?

    A experincia vivenciada por Ellen G. Whi-te pode nos ajudar a compreender e ava-liar os movimentos atuais de reavivamento. Aproximadamente dois anos depois de ape-lar para houvesse um genuno reavivamento entre o povo de Deus, ela comentou sobre um dos mais gloriosos eventos que a deixou to eufrica a ponto de exclamar: Parecia-nos estar respirando a prpria atmosfera do Cu.2 Na verdade, ela nem conseguiu dor-mir noite, regozijando-se com o fato de que Deus havia visitado Seu povo.

    Embora esse reavivamento no tenha sido o ltimo do qual ela participou, talvez a anlise de seu testemunho possa nos aju-dar a redescobrir sua experincia e a pe-dir por aquilo que aconteceu naquele dia.

    Reunies em South Lancaster

    Logo aps a controversa assembleia ge-ral realizada em Minepolis, em 1888, Ellen G. White uniu-se a A. T. Jones e E. J. Waggo-ner a fim de ajud-los a divulgar a mensa-gem que haviam apresentado. Segundo ela, a luz que deveria iluminar toda a Ter-ra com seu resplendor foi rejeitada em Minepolis, e pela atitude de nossos pr-prios irmos tem se conservado, em gran-de medida, afastada de todo o mundo.3 A mensagem que ela levava estava em es-treita harmonia com a prpria mensagem que Jones e Waggoner apresentavam.4 O primeiro lugar em que eles pregaram foi South Lancaster, Massachusetts, Es-tados Unidos.

    As reunies, iniciadas em 11 de janei-ro de 1888, estavam previstas para durar trs dias. No entanto, o Esprito Santo ti-nha outros planos. A poderosa atuao do Esprito de Deus estava l, comentou El-len G. White.5 Cada um desejava [...] tes-temunhar, ela acrescentou.6 Isso levou os administradores a fechar o colgio du-rante o perodo em que se estenderam as apresentaes. Os alunos foram envolvi-dos por uma atmosfera celestial to inten-sa, que os testemunhos dados superaram

    at mesmo os depoimentos de 1844 an-tes do desapontamento. Aprenderam o que significa render o corao a Deus e es-tar convertido.7

    Assim, a conferncia prevista para durar trs dias foi transformada num evento de dez dias. Os participantes ficavam reuni-dos desde as primeiras horas da manh at tarde da noite. A. T. Jones apresentou suas mensagens, duas ou trs vezes por dia.8 El-len G. White ficou encarregada de apresen-tar as mensagens devocionais da manh e pregou o sermo no sbado. Eu nun-ca vi uma obra de reavivamento avanar com tamanha profundidade, ela lembrou.9

    Mas, o que fez com que as reunies fos-sem to eficazes a ponto de os administra-dores fecharem a escola? Que mensagem foi compartilhada que levou os participan-tes a declarar que eles haviam obtido uma experincia alm de qualquer coisa que ha-viam visto antes?10

    Lies aprendidasEllen G. White falou em vrias ocasies

    a respeito da experincia vivida em South Lancaster, obviamente, desejosa de que tal evento de repetisse em outros luga-res tambm. Cada um dos presentes pde sentir que os anjos do Senhor circulavam

    Atmosfera celestialO que podemos aprender sobre reavivamento, a partir do que aconteceu em South Lancaster? Como experimentar novamente e reproduzir o que ocorreu ali?

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    ao redor daquele ambiente.11 Tendo como base uma srie de artigos que ela e S. N. Haskell escreveram relatando o evento e os sermes que ela pregou durante aque-las reunies, podemos unir algumas peas para construir um quadro do que foi apre-sentado ali.12

    Quando se examina a evidncia de South Lancaster, o segmento principal, apresentado ao longo das vrias refle-xes de Ellen G. White a grande nfase que foi colocada sobre o amor, o perdo a misericrdia e a graa de Deus. O conheci-mento do amor de Deus o conhecimento mais eficaz a se obter.13 Com essas pala-vras, ela iniciou seu sermo no sbado pela manh, dia 19 de janeiro, e continuou: Es-tou ansiosa para que todos desfrutem da misericrdia e do amor de Jesus. Quanto mais falarmos de Seu amor e poder, mais teremos para dizer de Sua ternura, com-paixo e verdade. Continuando, ela per-guntou: Por que nosso corao tem sido to insensvel ao amor de Deus? Por que fazemos to duro julgamento de nosso Pai celestial? Segundo a luz que me foi dada, sei que Satans tem deturpado o carter de Deus, de todas as formas possveis. Lan-ou sua sombra infernal atravessando nos-so caminho, impossibilitando-nos de ver Deus como um Ser pleno em misericr-dia, compaixo e verdade. Ento, apelou: Existe algum corao aqui que no ir se render ao amor de Jesus?14

    Essas novas foram como msica aos ouvidos dos participantes. Eles enxer-garam Cristo como um Salvador que no est longe, mas sim, ao alcance de todo aquele que O procura.15 Muitos teste-munharam da alegria de que Cristo havia perdoado seus pecados... e sentiram que podiam descansar no amor de Deus.16

    No primeiro sbado tarde, dia 12 de ja-neiro, Ellen G. White ficou feliz por ter tido a liberdade de falar sobre a necessidade de obedecer lei de Deus, e a importncia de termos a f genuna que opera por amor.17 Ela destacou a lei como a perfeita norma de justia, e convenceu muitos participantes

    de que eles eram transgressores dessa lei. Muitos tm confiado em sua prpria justi-a, ela comentou. Agora, eles a veem como trapos imundos, em comparao com a jus-tia de Cristo, a nica aceitvel a Deus.18

    A juno da lei com o amor de Deus o que Ellen G. White frequentemente men-cionou como a lei e o evangelho cami-nhando lado a lado.19 Sendo a lei de Deus o padro perfeito pelo qual a humanidade julgada, e pelo fato de a obedincia me-ramente humana no ser aceita por Deus, os seres humanos esto condenados por seus pecados e, assim, preparados para re-ceber a justia de Cristo. O corao trans-formado pelo amor, perdo e pela graa de Deus, e entra em comunho com Ele. Sen-do que o corao foi transformado, Cris-to pode ento viver Sua vida no pecador.

    Isso no era um paradigma to difcil de experimentar, no entanto, Ellen G. Whi-te, A. T. Jones e E. J. Waggoner no pro-moveram tal mentalidade. Ellen G. White, por exemplo, mencionou em seu sermo do ltimo sbado daquelas reunies: H aqueles que acham que devem se tornar um pouco melhores antes de ir a Jesus. [...] Mas no podemos fazer isso. Nossa nica esperana olhar e viver.20Refle-tindo sobre aquelas reunies, ela comen-tou a respeito dos participantes: Eles estavam lutando para se abster do pe-cado, mas confiavam em sua prpria for-a. Tais tentativas eram inteis. Portanto, ela convidou todos a ir para Jesus, assim como estavam, confessar seus pecados, e lanar-se desamparados sobre nosso compassivo Redentor.21 Quando vamos a Jesus, em seguida, podemos ficar em paz, acreditando que o que Deus prome-teu, Ele capaz de cumprir.22

    Os frutosRepetidamente, Ellen G. White falou

    do poder de Deus [que] assistiu mensa-gem onde quer que ela fosse pregada.23 Em vez de ser apenas um poder sentimen-tal que fazia ccegas nas emoes das pessoas, muitos eram convertidos e se

    reconciliavam um com o outro. Eles fo-ram transformados, refletindo essa mu-dana atravs de sua prpria imagem.24 Confisses foram feitas, erros foram con-sertados, o eu foi crucificado, coraes que estavam separados voltaram harmonia um com o outro. Isso aconteceu porque o plano de salvao ficou to claro que mesmo uma criana em sua simplicidade podia entend-lo.25 Ellen G. White disse: No se poderia convencer aquelas pes-soas em South Lancaster, de que aquela no era uma mensagem de luz que tinha vindo diretamente para elas.26

    Curiosamente, esses resultados no eram forados. As reunies transcorreram livres de toda euforia indevida. No hou-ve nenhum apelo nem convite. As pessoas no foram chamadas para ir frente.27

    Poucas semanas depois, escreven-do para a Review and Herald, S. N. Has-kell destacou o mesmo fato em uma das mais profundas reflexes sobre aquelas reunies. Ele mencionou o seguinte: O grande desejo manifesto era pela pureza de corao. Todos pareciam compreender que estvamos sob o juzo investigativo, e que tudo devia estar bem com Deus e en-tre os irmos. A obra foi profunda e com-pleta. Houve grande espontaneidade nas confisses apresentadas, o que raramen-te testemunhado, e nada era forado. Nenhuma presso foi exercida sobre os participantes. Quando os pecados foram confessados, cnticos de louvor e aes de graas se seguiram de forma revivifica-dora. Foram ouvidas expresses como: Eu nunca havia experimentado nada pareci-do com isso; parece que temos um novo evangelho; eu nunca havia entendido o amor de Deus assim como foi apresenta-do aqui. A impresso solene que ficou para muitos era a de que aquilo era apenas al-gumas gotas do que ser experimentado por aqueles que desempenharem seu pa-pel no fechamento da obra de Deus o alto clamor da terceira mensagem anglica, que ir amadurecer o gro para a colheita.28

    Esse autoexame profundo e essas

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    confisses somente puderam acontecer porque aquelas pessoas tiveram a certeza do perdo divino para seus pecados. Has-kell concluiu seu artigo com as seguintes perguntas para reflexo: Ser realmente verdade que estamos recebendo o der-ramamento do Esprito Santo, o qual ir crescer em poder e extenso at atingir o alto clamor da mensagem do terceiro anjo? Ser que compreendemos que estamos no limiar do tempo de provas e das cenas do mundo eterno? Quase sem acreditar em si mesmo, ele exclamou: Estas coisas so verdadeiras!

    No encerramento daquelas reunies, 17 pessoas foram batizadas, e muitas outras saram dali com o mesmo desejo.

    Reavivamento hojeAlguns poderiam argumentar que o

    ambiente em que se encontrava o ad-ventismo, mais de 120 anos atrs, foi to-talmente mudado, e o que foi relevante para nossos irmos em South Lancaster no importante para ns hoje. Porm, creio que Ellen G. White discordaria dis-so. Eles difundiram a mensagem do amor de Jesus e da justificao pela f em Cristo no apenas em South Lancaster, mas tam-bm em inmeras cidades nos meses se-guintes ao do reavivamento. Essa nfase dupla o protegeu contra os extremos do legalismo de tentar estabelecer sua jus-tia prpria e merecer o amor divino e do liberalismo de proclamar que Deus nos ama tanto que no Se importa com o que fazemos. Tal equilbrio ainda necessrio e relevante para ns hoje.

    Um ano depois das reunies em South Lancaster, Ellen G. White compartilhou esta reflexo: Essa mensagem, assim como foi apresentada, deveria estar em cada igreja que afirma crer na verdade e levar nossos irmos a alcanar um n-vel mais elevado.29 Lamentavelmente, seu desejo ainda no havia sido realizado completamente.30

    O que podemos aprender sobre reavi-vamento, a partir do que aconteceu em

    South Lancaster? Como podemos nova-mente experimentar e reproduzir o que ocorreu ali? Para comear, pensando no adgio popular, no podemos dar o que no temos. Portanto, ns mesmos pre-cisamos estar intimamente familiarizados com o verdadeiro evangelho que tocou o corao de Ellen G. White. Para que isso acontea, podemos ler, por exemplo The Glad Tidings e Christ and His Righteou-ness, de E. J. Waggoner,31 ou, mais fre-quentemente, o livro Caminho a Cristo, da prpria Ellen G. White. Estudar a Bblia e, em suas pginas, buscar Cristo e Este crucificado.

    Quando formos contagiados pela men-sagem do ilimitado amor de Cristo e de Sua poderosa graa, isso ser refletido em nossa pregao. Encontraremos manei-ras para pregar sobre todos os assuntos: mordomia crist, profecias, sade, qual-quer que seja o tema, atravs das lentes deste evangelho motivador.

    O que aconteceria se, em nossos conc-lios pastorais e assembleias, dedicssemos mais tempo ao estudo desses temas? Se realizssemos um retiro espiritual de dois ou trs dias, para aprofundar nosso conhe-cimento nesse assunto, o qual, como bem expressou Ellen G. White, vai absorver to-dos os outros?32 Temos experimentado isso nos ltimos anos em nossa Associa-o (Nordeste da Nova Inglaterra, Estados Unidos). Como pastores, temos passado alguns dias em nosso acampamento du-rante o outono, simplesmente orando e juntos estudando a Bblia. Para ns, eles tm sido doces e emocionantes momentos de comunho que nos deixam reavivados, revigorados e mais bem preparados para apresentar o Po da vida aos membros de nossas igrejas.

    Quando cada um de ns experimentar um reavivamento por meio dessas expe-rincias, contagiaremos os irmos em nos-sas igrejas e avanaremos para a vitria, desfrutando o reavivamento pleno e final que Deus ansiosamente deseja que expe-rimentemos.

    Referncias:

    1 Ellen G. White, Review and Herald, 22 de maro de 1887, p. 177.

    2 _______________ , Ibid., 5 de maro de 1889, p. 146.

    3 The Ellen G. White 1888 Materials (Washington, DC: Ellen G. White Estate, 1987), v. 4, p. 1575.

    4 Ibid., v. 2, p. 542.

    5 Ibid., p. 543.

    6 Ellen G. White, Review and Herald, 5 de maro de 1889, p. 146.

    7 _______________ , Draw Nigh to God, Review and Herald, 4 de maro de 1890.

    8 Com base nos dados disponveis, no me parece que E. J. Waggoner estivesse presente nas reunies em South Lancaster.

    9 Ellen G. White, Review and Herald, 5 de maro de 1889, p. 146.

    10 Ibid.

    11 Ibid.

    12 Para material auxiliar sobre o assunto, acesse http://www.adventistarchives.org/docsRH/RH18890129-V66-05_B/index.djvu.

    13 Ellen G. White, Review and Herald, 5 de maro de 1889, p. 145.

    14 _______________ , Ibid., 26 de fevereiro de 1889, p. 129.

    15 _______________ , Ibid., 5 de maro de 1889, p. 145.

    16 Ibid., p. 146.

    17 Ibid., p. 145.

    18 Ibid., p. 146.

    19 Ver 1888 Materials, v. 1, p. 217.

    20 Ellen G. White, Review and Herald, 26 de fevereiro de 1889, p. 130.

    21 _______________ , Ibid., 5 de maro de 1889, p. 146.

    22 Ibid., p. 145.

    23 Ellen G. White, Review and Herald, 18 de maro de 1890, p. 161.

    24 _______________ , Ibid., 5 de maro de 1889, p. 146.

    25 1888 Materials, v. 1, p. 371.

    26 Ellen G. White, Review and Herald, 18 de maro de 1890, p. 161.

    27 _______________ , Ibid., 5 de maro de 1889, p. 146.

    28 S. N. Haskell, Review and Herald, 29 de janeiro de 1889, p. 73.

    29 Ellen G. White, Ibid., 18 de maro de 1890, p. 161.

    30 Ver Ron Duffield, The Return of the Latter Rain: A Historical Review of Seventh-day Adventist History From 1844 Through 1891 (n.p.: 4th Angel, 2010).

    31 E. J. Waggoner, The Glad Tidings (Oakland, CA: Pacific Press, 1900); Christ and His Rightneousnes (Oakland, CA: Pacific press, 1890).

    32 Ellen G. White, Review and Herald Extra, 23 de dezembro de 1890, p. 2.

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    PESQUISA Douglas Reis Pastor no Instituto

    Adventista Paranaense

    Em 7 de janeiro, um ataque terrorista em Paris causou comoo em todo o mundo. Os irmos Cherif e Said Kouachi (e outros dois cmplices) ataca-ram a revista satrica Charlie Hebdo, dei-xando 12 mortos. A tragdia comoveu, ao despertar sentimentos de insegurana. Afinal, no horizonte cultural, ainda est clara a imagem do atentado ocorrido em 11 de setembro de 2001 nos Estados Uni-dos, e considerado o maior da Histria. Tais fatos trazem de volta uma questo bastante discutida: Atentados so frutos legtimos da religio muulmana, que pro-moveria o Jihad ou Guerra Santa con-tra os infiis?1

    Para os cristos, voltar a discutir sobre a Guerra Santa em pleno sculo 21 adquire um significado mais abrangente. De fato, certo autor faz um levantamento de como cristos ainda tm aplicado textos de livros como Josu para contextos blicos. Por exemplo, em novembro de 2004, depois de um ataque cidade de Falluya, usando textos de Josu, o capito militar Kenny

    Lee animou os sobreviventes a atacar os inimigos. Cristos tm repetidamente usado acontecimentos como a invaso de Jeric para assegurar para si mesmos que eles esto causando terror no mundo em nome de Deus e com a Sua bno.2

    Ademais, a prpria Bblia igualmente endossa e narra eventos que tratam do que poderia ser enquadrado como guer-ra santa. Dessa forma, cresce a opinio popular de que o fundamentalismo reli-gioso pode conduzir a uma expresso to radical de religiosidade que toda liberda-de perderia o sentido, dando margem possibilidade de extermnio das minorias.3

    Essas questes mencionadas mere-cem ser claramente respondidas. William Dembinski escreveu: A questo, por-tanto, no o que as pessoas fizeram em nome do cristianismo, mas o que o cristia-nismo em essncia.4 A questo central : Como um Deus de amor pode incum-bir um povo de matar outro? Teria Deus algum prazer na guerra e no sofrimento dos inocentes?

    Guerras na BbliaYahweh convocou Moiss para libertar

    Seu povo escravizado pela nao egpcia. O xodo, alm de livramento, foi tambm uma autorrevelao divina e um juzo con-tra o Egito (x 12:12). De to notrias, as pragas que deram liberdade a Israel di-fundiram o nome de Deus at em Cana (Js 2:10). Alis, a ordem divina a Israel re-queria a destruio dos povos de alm do Jordo (Nm 33:51-56; Js 11:20).5 Cumpre re-cordar que Deus o verdadeiro dono da Terra e a d a quem quiser. A terra tanto um dom de Deus, quanto algo que exigia a conquista dos israelitas.6

    Aparentemente, houve uma ao geno-cida, envolvendo a matana indiscrimina-da de centenas de milhares de inocentes. Porm, ao atentarmos para a situao que os israelitas teriam que enfrentar, verifica-mos que eles no estavam lutando contra povos pacficos. O prprio Jeov preveniu Moiss a respeito dos anaquins (Dt 9:1, 2).

    Vale ressaltar que as leis bblicas in-cluam normas para a guerra (ver Dt 20),

    Deus no o ruPor que um Deus de amor teria ordenado o extermnio de naes inteiras?

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    o que integrava a cultura estabelecida.7 Contudo, Israel no reproduzia simples-mente a prtica cultural. Israel no praticou a sangrenta crueldade presente nas inscri-es assrias, e houve proibio violao de mulheres. At rvores frutferas esta-vam protegidas.8

    No h um padro uniforme, quando estudamos as guerras retratadas na B-blia.9 Nem sempre o extermnio dos ini-migos era ordenado na guerra. Isso difere da atitude dos inimigos de Israel, conheci-dos por atos cruis (Lm 5:2-15).

    Por que Deus ordenou especificamente o extermnio dos povos de Cana? Muitos comentaristas bblicos se sentem pouco vontade com a narrativa de extermnio,10 a ponto de a questo ser apontada como a mais difcil para a tica do Antigo Testa-mento.11 Algumas formas de interpretar o texto foram propostas, muitas das quais acabam desqualificando o Antigo Testa-mento como Palavra de Deus, ou sublo-cando-o a uma categoria de revelao menor em relao ao Novo Testamento.12

    De acordo com os registros histricos, os povos espalhados pela regio eram proverbiais por sua maldade extrema, e o prprio Deus anunciou que a conquista da terra se daria em consequncia das prti-cas inquas daqueles povos (Dt 9:5).

    Durante sculos, Deus havia permitido que os cananeus mantivessem sua rejeio ao que conheciam a respeito dEle. Eles ti-veram e desprezaram oportunidades para obedecer-Lhe.13 Se compararmos Deutero-nmio 2:20 com Gnesis 15:5, 6, veremos que as mesmas naes inter-relacionadas aparecem nos dois textos: refains, zuzins (ou zazumins), emins e anaquins.

    Essas e outras naes cananeias tive-ram contato com Abrao e puderam co-nhecer algo do Deus ao qual ele servia. Para os habitantes de Cana haveria ain-da um tempo de graa. Porm, tanto Deus sabia que os cananeus continuariam im-penitentes, que prometeu a ocupao da terra deles pela descendncia de Abrao (Gn 15:16).14

    Existem fatos que nos ajudam a recor-dar o grau de depravao a que desceram as naes de gigantes e seus conterr-neos.15 Examinaremos mais de perto os costumes de Cana para entender por que Deus ordenou a eliminao daque-les povos.

    O cncer contaminou CanaH um princpio bblico de que o obje-

    to de nossa adorao tem o poder de nos transformar, moldando nossa cultura, nos-sas preferncias, reaes e percepes (Jr 2:5; 2Co 3:18). Quando examinamos o panteo dos cananeus, entendemos os motivos para a subverso de sua cultura.

    Os principais deuses, El e Asser, eram um casal que teria gerado 70 filhos. Um deles, Baal, casou-se com uma de suas ir-ms, Anat. Asser seduziu Baal e ele con-tou o fato a seu pai. El encorajou o filho a aceitar relacionar-se com a me. Alm dis-so, Baal tinha como consorte sua primeira filha, Pidary.16 Paralelamente, a sociedade canaanita orientou sua viso sobre inces-to em conformidade com seus deuses. As primeiras leis canaanitas prescreviam mor-te ou exlio para o incesto, observa Clay Jones. Depois do sculo 14 a.C., as penali-dades foram reduzidas para no mais que um pagamento de uma multa, ele con-clui.17 Vale recordar que o sculo 16 a.C. justamente a data do xodo, a sada de Israel do Egito. Os cananeus estavam ma-duros para o juzo.

    A imoralidade dos cananeus tambm fazia parte de seu culto: os sacerdotes provavelmente realizassem os rituais nus. Sexo era parte do culto cananeu, porque a religio deles consistia um culto de fertili-dade.18 A sexualidade canaanita estava to-talmente depravada por ocasio do xodo. O 199 estatuto das leis hititas dizia: Se al-gum tiver relaes sexuais com um porco ou um co, ele morrer. Se um homem ti-ver relaes com um cavalo ou mula, no haver punies.19

    Diante disso, o que um Deus de amor deveria fazer? Se Deus no interviesse,

    periodicamente, refreando o pecado e pu-nindo os culpados, o que seria do mundo? Nas palavras de um estudioso, gostara-mos de crer que tais coisas nunca aconte-ceram, ou se aconteceram, que elas nunca foram recomendadas por Deus.20 Entre-tanto, se uma mulher descobrisse um cn-cer de mama em estgio inicial, no iria operar antes que ele se instalasse irrever-sivelmente pelo corpo? Por mais traum-tica que fosse a cirurgia, perder a mama e continuar viva no lhe seria melhor do que definhar at a morte? Os cananeus eram a parte afetada pelo cncer. Deus os amava, mas deix-los vivos seria o mesmo que contaminar a humanidade com sua in-fluncia malfica.21

    Tal afirmao verificvel. Note que os israelitas no cumpriram completamente a ordem divina, deixando alguns resqu-cios dos cananeus nas terras que passa-ram a habitar (Jz 2:1-4). Eis o resultado: A lio de juzes que Israel se corrompeu porque eles no erradicaram os cananeus. Gideo ergueu um dolo, Jeft sacrificou a filha, Sanso fez sexo com uma mulher ca-naneia. Isso mostrado como evidncia da corrupo dificilmente tolervel deles.22

    No restam dvidas da malignidade dos cananeus. Eles sacrificavam crianas ao deus Moloque, praticavam a pedofilia, a homossexualidade, a bestialidade e eram extremamente sanguinolentos. Conquan-to seja assim, acaso Deus tinha o direito de ordenar o extermnio de naes inteiras?

    Justo JuizO erudito adventista Roy Gane ques-

    tiona se h diferena entre o que Israel fez e outros casos de genocdio. Ele assume que Israel agiu com base na direta reve-lao de Deus e levou a justia retributiva em Seu nome. Embora, segundo Gane, muulmanos extremistas pudessem argu-mentar, alegando agir sob a orientao de Al, em casos de atentados, h um ponto a ser considerado: Qual divindade ver-dadeira e, acima de tudo, tem autoridade final sobre a vida humana?23

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    Ao contrrio de outras guerras religio-sas, aquelas retratadas na Bblia explicitam a participao de Jeov, principalmen-te por meio de fenmenos extraordin-rios dirigidos contra os inimigos (x 14:24; 2Cr 20:22-26; 32:21, 22).24 claro que a par-ticipao divina criava um contexto espe-cial que jamais poderia ser reproduzido em outras circunstncias.

    Algumas medidas militares s tinham sentido no contexto de Israel com a pre-sena do Senhor assegurada entre eles. Copan definiu bem esse aspecto do proble-ma quando escreveu: Alguns espetculos televisivos alertavam as crianas: Meni-nos, no tentem fazer isso em casa. Seme-lhantemente, ns poderamos dizer sobre a situao da guerra santa de Israel: no tente fazer isso sem revelao especial.25

    Outra razo para no aplicarmos literal-mente as orientaes dadas a Israel que Deus instrui Seu povo de forma crescente, medida que esse povo se relacione com Ele (2Pe 1:19). No caso em estudo, era pri-mordial preservar o povo de um convvio venenoso, que impediria nao de Israel o desenvolvimento suficiente, a fim de que por meio dela viesse o Messias.

    Deus tinha que ser justo, punindo no apenas os pagos que ameaavam a es-piritualidade e segurana de Israel, mas punindo at Seu prprio povo eleito, me-dida que este tambm se separava de Seus ideais.26 Deus nunca permitiu que Seu povo fosse completamente aniquilado27 sempre haveria um remanescente do povo chama-do a cumprir a obra dos que se afastaram do ideal. Quando finalmente Israel falhou como nao, Deus convocou Sua igreja, formada a partir de um pequeno grupo de judeus.

    Logo chegar a vez de Deus julgar o mundo (Ec 12:17). Uns entraro pelos por-tais eternos, outros, por desprezarem a graa, sero exterminados como os ca-naneus, pela glria divina que retribuir a cada um segundo as suas obras. O cncer ser ento finalmente extirpado de uma vez por todas! A destruio dos cananeus foi o ensaio, o concerto ser em breve.

    Infelizmente, mesmo os cristos vm perdendo o senso de que todos nos re-portaremos diante do Juiz universal. Mui-tas vezes, alguns questionam se Deus no est agindo contra o livre-arbtrio dado aos seres humanos. Porm, certo que o peca-do traz consequncias, as piores possveis.

    Qual a razo de um rigor to grande na punio do pecado? O pecado separa as criaturas de seu Criador, impedindo-as de ter uma vida til e plena de amor. Aqueles que se identificam com o pecado e rejei-tam a graa de Deus se afastam da fonte de vida e s podero sofrer e fazer outros sofrerem. Por isso, necessrio que o ju-zo de Deus elimine aqueles que se apegam indissoluvelmente ao mal.

    Considerando o grau de degradao em nossos dias, so vlidas as seguintes con-sideraes: Este o meu ponto: ns no compreendemos as profundezas da nos-sa prpria depravao, o horror do peca-do e a justia de Deus. Consequentemente, no de surpreender quando vemos o jul-gamento divino sobre aqueles que come-teram os pecados que cometemos, que queixas e protestos se ergam em nosso corao: Isto barbrie divina!, ou: Isto genocdio divino! Mas o estudo dessas coisas ao longo dos anos tem me levado a perguntar se os cananeus no poderiam se erguer no juzo e condenar esta gerao.28

    O Deus que odeia o pecado punir o mun-do de forma ainda mais terrvel, para salvar aqueles que no se contaminaram com o pecado, mas escolheram lavar suas vestes (Ap 22:14), o que significa confiar na purifi-cadora justia de Cristo, permitindo que Ele remova toda mancha de pecado. Ainda tempo de ser puros em meio corrupo que impera neste mundo que, semelhana de Cana, caminha para o juzo.

    Referncias:

    1 Ver John Paulien, Armagedon at the Door: An Insiders Guide to the Book of Revelation (Hagerstown, MD: Review and Herald Publishing, 2008) 9-ss.

    2 Nick Solly Megoran, The War on Terror: How Should Christian Respond? (Nottingham, UK: Intervarsity Press, 2007), p. 72.

    3 Hlio Schwartsman, Folha de S. Paulo 18/09/2012, p. A2.

    4 William Dembinski, The End of Christianity: Finding a Good God in an Evil World (Nashville, TENN: Broadman & Holman, 2009), p. 15.

    5 Ver outros exemplos: Dt 7:2; 20:16; Js 6:21; 10:1, 28, 30, 32, 35, 37, 39, 40; 11:9, 11, 12, 20-22.

    6 Barna Magyarosi, Holy War and Cosmic Conflict in the Old Testament: From the Exodus to Exile (Berrien Spring, MI: Adventist Theological Society, 2010), p. 27, 30, 32, 33.

    7 Daniel L. Gard em Stanley Gundri (ed), Deus Mandou Matar? Quatro Pontos de Vista Sobre o Genocdio Cananeu (So Paulo, SP: Editora Vida, 2006), p. 128.

    8 Walther Eichrodt, Teologia do Antigo Testamento (So Paulo, SP: Hagnos, 2005), p. 118.

    9 Hans K. Larrondelle, Armagedom: O Verdadeiro Cenrio da Guerra Final (Tatu, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2004), p. 25.

    10 Ver Roy E. Gane, Israelite Genocide and Islamic Jihad, Spectrum, 34, v. 3 (2006), p. 61.

    11 Paul Copan, Is God a Moral Monster? Making Sense of the Old Testament God (Grand Rapids, MI: Baker Publishing Group, 2011), p. 158.

    12 Ver A. James Reimer, Christian and War: A Brief History of the Churchs Teachings and Practices (Minepolis, MN: Fortres Press, 2010), p. 26-34.

    13 Ellen G. White, Patriarcas e Profetas, p. 434, 435.

    14 Tremper Longman III, O ponto de vista da continuidade espiritual, em Gundri, Op. Cit, p. 181.

    15 Gleason L. Archer Jr., Merece Confiana o Antigo Testamento? (So Paulo, SP: Sociedade Religiosa edies Vida Nova, 2000), p. 196.

    16 Clay Jones, We dont Understand what Happened to the Canaanites: An Addendum to Divine Genocide Arguments, philosophia Christi, v. 11, n 1 (2009), p. 57.

    17 Ibid., p. 57, 58.

    18 Ibid., p. 62; Francis D. Nichol (ed) SDABC, v. 1, p. 315.

    19 Harry A. Hoffner Jr., Incest and Beastiality in the Ancient Near East Orient and Ocident (Germany: Neukirchen, 1973), citado em Clay Jones, Op. Cit., p. 64.

    20 Gordon J. Wenhan, Nmeros: Introduo e Comentrios (So Paulo, SP: Mundo Cristo, 1985), p. 219.

    21 Ver Gleason Archer Jr., Enciclopdia de Dificuldades Bblicas (So Paulo, SP: Editora Vida, 1997), p. 153.

    22 Clay Jones, Op. Cit., p. 62.

    23 Hans K. Larondelle, Op. Cit., p. 27.

    24 Paul Copan, Op. Cit., p. 161.

    25 Gordon J. Wenhan, Op. Cit., p. 219.

    26 Daniel L. Gard, Op. Cit., p. 131, 132.

    27 Ibid., p. 192.

    28 Clay Jones, Op. Cit., p. 71, 72.

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    VIDA PASTORAL Ricardo Norton Professor de Teologia na Universidade Andrews,

    Estados Unidos

    Por muitos sculos, cristos devo-tos, bem como crentes de outras religies, tm buscado proximidade espiritual com o Criador por meio de peni-tncias, meditao, solido e at sacrifcios. As pessoas identificam sua espiritualida-de tendo como base critrios pessoais que nem sempre respeitam a teologia bblica. Nos dias do Antigo Testamento, Deus re-preendeu pessoas que sacrificavam os prprios filhos para conquistar a aceita-o de seus deuses (Dt 12:2; 1Rs 3:2; 12:31). Esse tipo de devoo no aceitvel ao Deus da Bblia; pertence a um gnero de enganos espirituais que tm confundido muitos adoradores.

    A palavra engano definida como levar uma pessoa a crer que algo no verdade ou falhar em admitir que algo verdade.1 O engano espiritual pode ocor-rer por pelo menos duas maneiras. A pri-meira quando intencionalmente uma pessoa induzida a crer que algo no ver-dade. Isso ocorre mais facilmente quando a distncia entre a verdade e a mentira cur-ta e quando na pessoa sistematicamen-te inculcada a mentira, atividade conhecida como lavagem cerebral. Jesus advertiu contra os falsos profetas que, para enga-nar as pessoas, apresentam-se disfara-dos em ovelhas, mas por dentro so lobos roubadores (Mt 7:15). Por outro lado, exis-te o autoengano. Esse fenmeno ocorre no contexto religioso cristo, quando o crente aceita sinceramente uma crena ou prti-ca falsa como se fosse verdade.

    O autoengano definido como a ao ou prtica de crer em algo falso ou que no tem sido validado.2 Ento, o autoengano pode representar pessoas que intencionalmente tm descartado evidncia emprica contr-ria realidade. Tambm representa pessoas que acreditam sinceramente em algo incor-reto. Exemplo disso a atitude de algum acreditar que, matando certas pessoas est fazendo a vontade de Deus (Jo 16:2).3

    Pessoas que buscam ligao espiri-tual com Deus podem estar autoengana-das, fazendo algo errado pensando que esto certas. O apstolo Paulo repreen-deu os cristos corntios por pretenderem ser espirituais ao passo que seu estilo de vida era igual ao do mundo. Entre eles ha-via cimes e contendas. Embora fossem cristos adultos, o apstolo teve que tra-t-los como crianas em Cristo (1Co 3:1-3). Paulo encontrou problemas semelhantes na igreja da Galcia. Ali, alguns membros haviam abandonado a f, cedendo in-fluncia de faltos mestres (Gl 3:1). Cristos que no esto firmemente alicerados na verdade podem facilmente ser confundi-dos e levados a aceitar crenas e prticas enganosas.

    O prprio Cristo advertiu que, antes de Sua vinda, muitas pessoas enganadas rei-vindicaro o reino do Cu, mostrando si-nais e prodgios supostamente genunos, embora para Jesus no passem de enganos espirituais. Sua resposta ser: Apartem-se de Mim (Mt 7:23). O mais alarmante que alguns enganos realizados por tais pessoas

    incluem a expulso de demnios em nome de Jesus (Mt 7:22).

    Satans especialista em falsificar a verdade para desencaminhar os segui-dores de Cristo. Para isso, ele usa falsos e eloquentes mestres capazes de enganar, se possvel, os prprios eleitos (Mt 24:24). H falsos mestres que, sabendo estar errados, enganam pessoas com objeti-vos malficos. Na igreja tambm existem mestres autoenganados que ensinam er-ros crendo sinceramente que esto sendo guiados pelo Esprito Santo. Porm, o fru-to de seu trabalho destrutivo.

    Cristos autoenganados costumam ser crticos, acusadores e com frequncia cau-sam sofrimento congregao. Analise-mos alguns dos enganos espirituais mais comuns, a fim de protegermos nossas igre-jas e nosso ministrio.

    Comportamento externoO comportamento externo frequen-

    temente usado como uma das regras para avaliar a espiritualidade das pessoas. Sendo que o comportamento externo geralmente controlado pelo que a pessoa cr e enten-de, natural que ele seja critrio para julgar a conduta. Ellen G. White afirma que as aes dos seres humanos determinam a santida-de do corao, e que a ausncia de espiri-tualidade e santidade leva s ms aes e a todo pecado odioso e abominvel.4

    Embora as aes humanas sejam dirigi-das pela mente, a pessoa pode acomodar hipocritamente sua conduta para enganar

    Falso ou verdadeiro?Esteja atento a alguns dos enganos espirituais mais comuns, a fim de proteger sua igreja e seu ministrio

    Gen

    tilez

    a do

    aut

    or

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    o ambiente social em que vive ou para dis-farar seu verdadeiro comportamento. A Bblia rejeita a hipocrisia e assinala que Deus valoriza um corao puro e o enfeite incorruptvel de um esprito honesto, sin-cero, afvel e aprazvel (1Pe 3:3, 4).

    O comportamento externo falso se-veramente denunciado pelas Escrituras. Cristo repreendeu os fariseus que oravam eloquentemente nas praas, dizimavam meticulosamente de tudo, incluindo da hortel, do endro e do cominho, mas ig-noravam a justia, a misericrdia e a f (Mt 23:23; 6:5).

    Paulo outro escritor bblico que ad-vertiu contra o comportamento censur-vel coberto pela aparncia de piedade, porm negando a eficcia da f. Ele reco-mendou que seus leitores descartassem essas pessoas (2Tm 3:1-6). Pedro fez ad-vertncias semelhantes, ao escrever so-bre crentes que usavam a liberdade como pretexto da malcia e os aconselhou a vi-ver como servos de Deus (1Pe 2:16).

    O comportamento espiritual falso ge-ralmente caracterizado pela contradio entre discurso e conduta. Em contraste, a verdadeira espiritualidade atestada por integridade e consequente compor-tamento. No suficiente dizer que so-mos bons, devemos demonstrar isso com fatos. O mais eloquente sermo nem sem-pre necessita de palavras; ele pode ser feito por aes motivadas pelo amor. As obras de amor so mais poderosas e influentes do que a eloquncia das palavras vazias. O que uma pessoa tem mais influncia do que o que ela diz.5

    O falso comportamento externo ser desmascarado. Conforme as palavras de Jesus, nada h encoberto que no venha a ser revelado; e oculto que no venha a ser conhecido (Lc 12:2). Com isso, o Senhor animou Seus seguidores a ser verdadeiros e a no temer declarar publicamente a ver-dade, pois a verdade prevalecer sempre.

    A verdadeira espiritualidade mais que atos pretenciosos externos; revelada por atitudes genunas de amor dirigidas pelo

    Esprito Santo. Atos pretenciosos falsos podem enganar temporariamente as pes-soas, mas nunca podero enganar a Deus.

    Identificao subcultural

    Nos dias de Jesus, muitos judeus se or-gulhavam de ser descendentes de Abrao (Mt 3:39). Acreditavam que a herana ge-nealgica do patriarca os tornava supe-riores a outras pessoas. Essa crena foi criticada por Jesus, que enfatizou a disso-nncia do comportamento deles com as expectativas assinaladas nas Escrituras. Firmemente, Ele revelou a verdadeira des-cendncia deles: Vocs so do diabo, que pai de vocs e querem satisfazer os desejos dele (Jo 8:37-44). Se eles fossem verdadei-ros seguidores de Abrao, teriam reconhe-cido Jesus como Filho de Deus e O teriam aceitado como Salvador. Em vez disso, rejei-taram Sua autenticidade messinica, Seus ensinamentos e trataram de destru-Lo por meio de subterfgios e mentiras.

    A identificao subcultural um en-gano muito comum entre pessoas que se orgulham da prpria herana, ascendn-cia, origem, cultura ou tradio. Pessoas cujos antepassados tm a mesma religio por vrias geraes podem pensar que so melhores que as demais; porm, devem lembrar-se de que o que somos mais im-portante do que nossa origem. O carter mais importante que a herana ou tradi-o. Algum pode ser membro da verda-deira igreja de Deus, vestir-se de maneira conservadora, manter as normas crists tradicionais, assistir regularmente aos cul-tos e ter o diabo como pai.

    O veredito de Jesus sobre os fariseus e saduceus tinha como base as pretenses ambiciosas e o comportamento vazio de-les. Isso ocorre em nossos dias com cristos que se orgulham de uma espiritualidade que no podem atestar com os frutos do Esprito, o verdadeiro selo da identidade crist. Pessoas que so detalhistas na letra, porm, se esquecem do mais importante dos orculos divinos (a justia, a misericr-dia e a f). A sentena final de Deus para

    tais pessoas ser: Apartem-se de Mim os que praticam a iniquidade (Mt 7:22).

    Pureza doutrinriaFrequentemente o conhecimento te-

    rico das doutrinas considerado sinal de verdadeira espiritualidade. Contudo, inter-pretaes particulares das doutrinas bbli-cas no garantem pureza doutrinria nem so provas da direo do Esprito Santo. A posse da verdadeira interpretao b-blica no garante comportamento cristo apropriado. Assim, a jactncia na pureza doutrinria pode ser includa na lista dos enganos espirituais.

    A Bblia a infalvel Palavra de Deus. Po-rm, as construes teolgicas individuais no so infalveis. O raciocnio e a imagina-o humana so falhos e geralmente sua interpretao das Escrituras est sujeita a erros. A existncia de tantas denomina-es crists indica que a interpretao da Bblia responsvel por isso. Estima-se que haja mais de 41 mil denominaes cris-ts no mundo, reivindicando pureza dou-trinria e a direo do Esprito Santo.6

    Pureza doutrinria significa a cristali-zao correta de ensinos bblicos. A Igreja Adventista do Stimo Dia tem 28 cren-as fundamentais, claramente definidas no Manual da Igreja. Essas crenas con-ferem denominao uma frente unida das principais crenas bblicas e se consti-tuem salvaguarda contra os lobos rouba-dores, cujo objetivo subverter o rebanho e destruir sua f (At 20:29, 30). Alm disso, as crenas fundamentais provm direo e estabilidade ao corpo de Cristo, Sua igreja.

    So muito comuns pontos de vista dou-trinrios em uma denominao. Algumas crenas tm sido interpretadas de modo controverso por alguns membros da igre-ja adventista. Entre essas crenas esto a Trindade, encarnao de Cristo, normas crists, ordenao da mulher, entre ou-tros assuntos. Interpretaes particulares da Bblia, com frequncia, so a razo pela qual algumas pessoas acreditam ser mais espirituais do que outras.

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    As diferenas doutrinrias tm dividi-do a igreja crist desde os tempos bbli-cos. Em suas cartas s igrejas de Corinto e Galcia, Paulo buscou a unidade em te-mas doutrinais que causavam diviso. Al-guns membros se uniam a Cefas, outros a Apolo e ainda outros a Paulo (1Co 1;12; 3:4). Hoje, lderes de movimentos dissidentes se ocupam em mostrar que so portado-res da doutrina pura, julgando instituies e pessoas tendo como base seu juzo finito e com frequncia desinformado.

    O Novo Testamento assinala que no tem-po do fim, alguns seguidores de Cristo sero seduzidos por doutrinas vrias e estranhas (Hb 13:9) que os submetero a precei-tos humanos (Cl 2:21, 22). Paulo observa que o acolhimento a tais crenas leva-r alguns ao abandono da f (1Tm 4:1). Jesus e Pedro advertiram contra o pe-rigo de falsos mestres e profetas que, reivindicando ter a verdade, introdu-ziro dissimuladamente heresias des-truidores (2Pe 2:1; Lc 17:23).

    Jesus comparou ao fermento as doutrinas mal interpretadas dos fari-seus e saduceus (Mt 16:11, 12); Lc 12:1). Por causa de seu poder de decomposi-o7, o fermento, do latim fermentum, no era permitido pela Bblia em algu-mas ofertas de po (x 23:18; 34:25; Lv 2:11; 6:17). Uma vez diludo, o fer-mento leveda o produto com o qual entra em contato. Assim, Jesus comparou a influncia dos falsos ensinos dos fari-seus e saduceus influncia do fermen-to. A interpretao errnea das profecias os levou a rejeitar Jesus como o Salvador e a impor observncias de tradies hu-manas. Para eles, lavar as mos antes de comer era mais importante que a prpria vida de Jesus a quem procuravam matar (Mt 15:1-3; Jo 7:1, 2).

    As crenas fundamentais da Igreja Ad-ventista do Stimo Dia tm como objeti-vo manter a pureza doutrinria e a unidade eclesistica. Alm disso protegem os crentes contra falsas crenas e os detratores que rei-vindicam ser mais espirituais que os demais.

    Envolvimento com a igrejaDe acordo com Ellen G. White, embora

    seja verdade que a f que nos une a Cristo nos motiva atividade, nossas atarefadas atividades no nos asseguram, por si mes-mas, a salvao.8 O envolvimento ativo no trabalho da igreja que leva ao descui-do da vida devocional e da famlia, sinal de decadncia espiritual. Esse engano es-piritual muito usado por muitos cristos como vu para esconder pecados secre-tos e comportamento cristo imprprio. Ele se constitui um mecanismo de defesa para apaziguar uma conscincia culpada ou para ocultar uma vida desequilibrada.

    Por mais benfica que seja, a partici-pao nas atividades da igreja no pode substituir a verdadeira espiritualidade e a harmonia com os princpios morais divinos. A verdadeira espiritualidade combina a de-voo vertical com a participao horizon-tal caracterizada pelo amor. A obedincia e os atos de amor no podem ser substi-tudos por nenhuma atividade diligente, nem o zelo desprovido de Cristo.9 O bu-lcio e a ostentao levam ao descuido da meditao e da orao. A atividade in-tensa na igreja de Deus pode obstruir a mente a ponto de substituir a verdadeira bondade, mansido e humildade de cora-o por autossuficincia.10

    A participao como nico meio para obter espiritualidade ou disfarce para es-conder a verdadeira espiritualidade resul-ta em uma religio fria e calculista.

    SucessoDe todos os enganos espirituais, o xi-

    to ministerial e em qualquer outra rea de trabalho constitui-se o engano mais pe-rigoso, porque Deus prometeu abenoar Seus filhos fiis com o xito (Sl 1:1-3; Pv 13:4; 3Jo 2). Deus fez Jos prosperar no Egito e respondeu positivamente quando Nee-mias orou pedindo xito (Ne 1:11). Acaso isso significaria que todo xito conseguido

    por cristos provm de Deus? O problema de ter o xito como

    base para a espiritualidade a pre-sena do xito sem carter, o tipo que obtido por meio de estrata-gemas, enganos e outros meios cen-surveis. A palavra carter, do grego dokim, usada uma vez no Novo Testamento pelo apstolo Paulo (Rm 5:4) para se referir a cristos ge-nunos, que tm sido examinados, provados, e aprovados.11 Assim, o xito espiritual e o carter so dois aspectos cristos que no podem ser separados.

    O xito sem carter comum en-tre pessoas que no temem a Deus e que transgridem abertamente as

    leis divinas em benefcio prprio ou por desejos particulares. Infelizmente, nem a igreja nem o ministrio esto imunes a esse tipo de doena espiritual. Para obter xito, o cristo tem que vencer a tenta-o e se abster de usar meios antiticos. Por exemplo, Judas era considerado de grande influncia pelos discpulos, e exer-cia grande influncia sobre eles. Porm, nunca renunciou s suas ambies ter-renas, nem a seu amor ao dinheiro.12 Sua histria apresenta o triste fim de uma vida que podia ter sido aceita por Deus, porm, por causa da ambio, terminou em mor-te sem esperana. Essa histria foi pre-servada na Bblia como advertncia para

    De todos os enganos

    espirituais, o xito ministerial

    e em qualquer outra rea de

    trabalho constitui-se o engano

    mais perigoso. O problema

    o xito sem carter, o tipo

    que obtido por meio de

    estratagemas, enganos e

    outros meios censurveis

  • todos quantos, como ele, trassem sagra-dos depsitos.13

    Pastores, evangelistas e administrado-res podem sucumbir presso imposta por nmeros e resultados, e se esquecer da im-portncia do carter cristo. Sob presso de exigncias financeiras, tesoureiros po-dem no ser exatos nas informaes. Pre-midos pela tirania de alvos batismais, um evangelista pode se esquecer de que h princpios bblicos associados evangeliza-o, tais como discipulado e a conservao dos conversos. Constrangido pelo tempo e pelos rigores acadmicos, o estudante pode recorrer ao plgio e a outras tticas desonestas para completar seus estudos. Esse tipo de xito comum em uma socie-dade materialista e secular, mas rechaa-da por Deus, Aquele que onisciente, que conhece tudo e julga tudo.

    O conceito de espiritualidade provm da terceira Pessoa da Divindade, o Espri-to Santo. De acordo com Paulo, os que so guiados pelo Esprito de Deus so filhos de

    Deus (Rm 8:14); de maneira que uma pes-soa espiritual a que mostra uma relao prxima com o Esprito Santo e que fruti-fica. Paulo assegurou que o principal fruto do Esprito o amor, do qual emana uma srie de circunstncias descritas igreja da Galcia (Gl 5:22, 23).

    Ao longo da Histria tm surgido mui-tos enganos como substitutos da verda-deira espiritualidade. Apesar disso, a Bblia declara que o fruto do Esprito Santo, o amor, a verdadeira identidade das pes-soas que so guiadas pelo Esprito Santo. Uma pessoa espiritual aquela que mani-festa o fruto do Esprito em seu estilo de vida. Outros meios para se obter a espiri-tualidade podem cair na categoria de en-ganos espirituais.

    Referncias:

    1 Michael Agnes, Websters New World College Dictionary (Foster City, CA: IDG Books Worldwide, 2001), p. 374.

    2 Concise Oxford English Dictionary, Self-deception.

    3 Outro exemplo pode ser o que a Bblia chama de pecar por ignorncia (Lv 4:2), tambm chamado de pecado desconhecido. Embora no sejam intencionais, esses pecados ofendem a Deus, ao ponto de que, uma vez revelados, os ofensores deviam apresentar a Deus um sacrifcio de animal em reconhecimento de sua ofensa (Lv 4:13, 22, 23). Semelhantemente, pessoas que buscam proximidade espiritual com Deus devem corrigir qualquer comportamento errneo, to logo seja revelado.

    4 Ellen G. White, Testemunhos Para a Igreja, v. 2, p. 396.

    5 _______________ , A Cincia do Bom Viver, 372.

    6 Estudo publicado em 2011, pela revista Christianity Today, http://christianity.about.com/od/denominations/p/christiantoday.htm

    7 Geoffrey W. Bromiley, The International Standard Bible Encyclopedia (Grand Rapids, MI: Eerdmans Publiching Company, 1986), v. 3, p. 97, 98.

    8 Ellen G. White, Mensagens Escolhidas, v. 2, p. 20.

    9 _______________ , O Maior Discurso de Cristo (Mountain View, CA: Pacific Press Publishing, 1964), p. 107.

    10 _______________ , Testemunhos Para a Igreja, v. 4, p. 526, 527.

    11 Geoffrey W. Bromiley, Op. Cit., v. 1, p. 634.

    12 Ellen G. White, O Desejado de Todas as Naes, p. 717.

    13 Ibid., p. 716.

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    TEOLOGIA Richard RiceProfessor de Religio na

    Universidade Loma Linda, Estados Unidos

    Um dos meus professores favoritos na faculdade foi o professor de Re-ligio. Aquele professor apreciava os temas que ensinava. Era bom comunicador e gostava de estar com os alunos. Tinha um tremendo senso de humor e era estudioso.

    Dois anos depois de minha formatu-ra, eu soube que ele estava enfrentando problemas de sade. O diagnstico logo se tornou conhecido: esclerose mltipla. Ento, a faculdade me pediu que cobrisse uma de suas aulas por algumas semanas durante sua licena mdica. Ele conseguiu voltar sala de aulas e ensinar durante al-gum tempo, mesmo estando em uma ca-deira de rodas. Mas o avano da doena tornou isso impossvel. Finalmente se apo-sentou e foi morar em outra comunida-de. Certo dia, durante a visita do pastor da igreja, ele comentou: Toda guerra tem v-timas. H uma grande guerra acontecendo no Universo entre o bem e o mal, e eu sou uma das vtimas desse conflito.

    A presena e propagao do sofrimen-to no mundo um grande desafio nossa crena religiosa. Se Deus perfeito, bon-doso e poderoso, perguntam os filsofos, como Ele pode, ento, permitir a existncia do sofrimento? Se Deus realmente Se im-porta comigo, por que Ele permite que eu sofra? Ao longo dos anos, as pessoas tm respondido a essas questes de maneiras diversas. Algumas acreditam que os planos de Deus so perfeitos, e embora no pos-sam compreender tudo, creem que o sofri-mento seja parte do plano divino. Outras

    pessoas acreditam que o sofrimento no da vontade de Deus, mas resultou dos erros que algumas de Suas criaturas cometeram. E ainda outras argumentam que o sofri-mento tem seus benefcios, e ns pode-mos aprender e crescer em resposta a ele.

    Essas e outras formas de responder ao sofrimento, as teodiceias como so frequen-temente chamadas, tm recebido ateno especial dos estudiosos. Cada uma tem seus pontos fortes, cada uma levanta algumas questes e, o mais importante, as pessoas que sofrem descobrem no sofrimento uma fonte de encorajamento pessoal.

    Um inimigo fez issoDiante de sua grande perda, meu pro-

    fessor chamou de teodiceia do conflito csmico a batalha em que os seres hu-manos esto envolvidos entre as foras do bem e do mal. No centro desse conflito est a imponente figura do arqui-inimigo de Deus. Esse inimigo o nico respon-svel por tudo o que est errado e enfer-mo nas coisas criadas por Deus. Essa figura aparece em diversas partes da Bblia. Um exemplo bem conhecido o prlogo do li-vro de J (captulos 1 e 2).

    O Senhor permitiu que Satans testas-se Seu servo fiel. Alm disso, o diabo tam-bm apareceu como grande adversrio de Jesus, tentando-O no deserto (Mt 4:1-11; Lc 4:1-13). O livro do Apocalipse apresen-ta um vvido retrato desse conflito csmi-co: Houve peleja no Cu. Miguel e os Seus anjos pelejaram contra o drago. Tambm

    pelejaram o drago e seus anjos; todavia, no prevaleceram; nem mais se achou no Cu o lugar deles. E foi expulso o grande drago, a antiga serpente, que se chama diabo e Satans, o sedutor de todo o mun-do, sim, foi atirado para a Terra, e, com ele, os seus anjos (Ap 12:7-9).

    Para muitos que sofrem, a ideia de um conflito csmico de particular ajuda. Com-preendem que seu sofrimento no vem de Deus, mas de algo totalmente oposto a Deus e causado por um poder diablico que faz tudo o que pode a fim de tornar mi-servel nossa vida. Assim, em vez de ficar-mos perguntando por que Deus permite, ou se Ele tem a inteno de usar o sofrimento para algum propsito, nossa resposta deve ser: Um inimigo fez isso (Mt 13:28), e lan-ar a culpa sobre esse inimigo.

    Nos ltimos anos, a figura do diabo tem aparecido com pouca frequncia nas discusses filosficas sobre o mal. Con-tudo, para alguns pensadores, a ideia do arqui-inimigo de Deus indispensvel para uma abordagem correta do sofrimento. Por exemplo, Gregory A. Boyd, em sua cosmoviso da guerra trinitria, coloca a responsabilidade pelos sofrimentos do mundo diretamente sobre o diabo.1

    Em relao pergunta: Devemos culpar Deus pelo sofrimento?, Boyd responde com um enftico no!2 Deus tem inimigos, ele argumenta, e esses tm grande poder. Eles so os responsveis pelas tristezas e des-graas do mundo. Satans e sua corte, que uma vez foi angelical e agora demonaca,

    Teodiceia do grande conflito A certeza de que estamos ligados a um poder maior do que qualquer inimigo uma fonte de conforto e fora

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    so as foras que atuam por trs do conflito e do derramamento de sangue da histria humana. Sua interferncia com os proces-sos da natureza tem transformado o mun-do, de um lar perfeito planejado por Deus, em um ambiente sinistro e ameaador, mar-cado pela dor, enfermidade e morte.3

    Ainda de acordo com Boyd, o conceito de uma guerra csmica responde s inda-gaes e aos questionamentos suscitados pelo sofrimento: Como pode um Ser perfei-to permitir isso? Por que tenho que sofrer? A existncia do sofrimento no foi algo confu-so para os que viveram durante a poca da histria bblica, ele observa, nem para aque-les dos sculos seguintes. Ao contrrio, eles estavam cientes da presena dos poderes do mal, e atriburam os males da vida a esses poderes, no a Deus. Se o Universo habi-tado por uma hoste de seres que se opem a Deus, e causam morte e destruio, no de surpreender o fato de que sofremos. Surpreendente seria se no sofrssemos.

    Do ponto de vista da teodiceia do con-flito csmico, no sofremos porque Deus deseja que soframos, mas sim, porque vi-vemos em uma zona de guerra. Sofremos porque os inimigos de Deus esto ativos no mundo e nos tornamos vulnerveis a seus ataques.4 Assim, intil procurar uma razo ou finalidade especfica para o sofrimento