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O SILÊNCIO DAS ÁRVORES - FIORELO PICOLI - 1

AMAZÔNIA

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AMAZÔNIA

IMPRESSÃO:Amazônia Gráfica e Editora (66) 531-6991Av. das Itaúbas, 2062 – Jd. Botânico – Sinop MT

CAPA:Sidinei Novais

EDITORAÇÃO:Arte Design (66) 531-6097 / 9985-9722E-mail:[email protected]

ORIENTAÇÃO:Prof. Dr. Nildo Domingos OuriquesDepartamento de Ciências EconômicasPrograma de Pós Graduação em Economia IndustrialUniversidade Federal de Santa CatarinaProf. Dr. José Luiz Vázquez BurgueteDepartamento de Direción y Economía de la EmpresaPrograma de Doutorado em Gestión y Comercialización Internacional dela EmpresaUniversidad de León, España

REVISÃO:Renato Gomes TapadoMaria da Paz SabinoJosete Mori

REVISÃO FINAL:Lúzia A. Oliveira do Santos

PICOLI, FioreloAmazônia: o silêncio das árvores - uma abordagemsobre a indústria de transformação de madeiras.Sinop: Editora Fiorelo, 2004.124 p.1 – Amazônia. 2 – Devastação. 3 – Madeireira.4 – Capitalismo. 5 – Agropecuária. 6 – Exclusão Social.ISBN - 85-904199-3-2 / Prefixo Editorial N° 904199

Todos os Direitos Reservados. É proibida a reprodução total ou parcial, dequalquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos de autor (Lei n°5610/98) é crime estabelecido pelo artigo 184 do Código Penal.

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“o dia em que vocês envenenarem o último rio,abaterem a última árvore, assassinarem o último animal,

(...) quando não existirem nem flores, nem pássaros,se darão conta de que dinheiro não se come”.

Índio Hamawt´a

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SUMÁRIO

PREFÁCIO .................................................................................... 7

APRESENTAÇÃO .......................................................................... 9

Diagnóstico geral das empresas madeireirasnacionais e multinacionais ................................................... 13

Os incentivos governamentais aos capitalistas do setor ....... 41

A estrutura capitalista do setor madeireiro ........................... 55

Os capitalistas madeireiros .................................................. 61

O desperdício das madeiras e a devastação ........................ 73

A grilagem de madeiras e as formas de apurar os lucros ..... 87

RESUMO ....................................................................................... 99

CONCLUSÃO ................................................................................ 107

LISTA DE ABREVIATURAS ............................................................ 111

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................ 113

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PREFÁCIO

Assim como em suas duas obras anteriores, Amazônia: domel ao sangue e Amazônia: ilusão da terra prometida, Fiorelo maisuma vez, volta sua crítica ferrenha e sem meias palavras aos gruposeconômicos nacionais e internacionais que, patrocinados pelaestrutura do Estado Brasileiro, “silenciam as árvores”.

O silêncio das árvores é uma metáfora que de maneiracrítica e criativa o autor construiu para mostrar que independentedos “benefícios” sócio-econômicos que o setor de transformaçãode madeira proporciona, ele representa a fase mais nova daexpansão capitalista que se deleita em uma imensidão de terras erecursos naturais, fazendo da Amazônia Legal Brasileira, um espaço“... de submissão, obediência e controle dos marginalizados edespossuídos” em busca de melhores condições de vida, em buscado “mel”. E tudo isso, nos fala o autor, foi o resultado de umagressivo e ambicioso projeto de expansão e acumulação quepossuía e ainda possui, um objetivo ainda maior e que se concretizaa cada dia no que o autor denomina de segunda fase do projetoamazônico: a agropecuária extensiva.

Fiorelo denuncia nesta obra, o que Vital Farias denunciaem sua canção Saga da Amazônia:

“ Veio CAIPORA de fora para a mata definharE trouxe dragão de ferro pra comer muita madeiraE trouxe em estilo gigante pra acabar com a capoeiraFizeram, logo o PROJETO sem ninguém testemunharPra o dragão cortar madeira e toda a mata derrubar...”Quem são os “caiporas” apontados por Vital Farias? São

os mesmos grupos econômicos denunciados por Fiorelo. E osórgãos e projetos que ambos também denunciam? São órgãos

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como Sudam, Basa, Incra, que fomentaram projetos como Carajás,Jarí, entre outros que “além de intensificarem a exploração dosrecursos naturais, contemplam quase na totalidade os gruposeconômicos...”, evidenciando a vocação da Amazônia Brasileira queé ser a serviçal do mercado internacional.

A estratégia para o domínio da Amazônia, por parte dosgrupos econômicos, foi sem dúvida, ressalta o autor, os incentivosfiscais oferecidos, aliados à infraestrutura. Estas ações, facilitarama penetração na densa floresta amazônica e transformou os povosda floresta e as massas advindas de outras regiões do país, em“exército industrial de reserva”.

Fiorelo é enfático em dizer que o plano de depredação daAmazônia é tão ardiloso que as madeireiras fazem “simplesmente”parte de um projeto econômico temporário, visto que, apenaspreparam o espaço para “o grande projeto da região”: asmonoculturas da agricultura e da pecuária, o que ele denomina deprojetos “pé de boi” e “grão de soja”. Uma das trágicas, porém,verdadeiras constatações de Fiorelo é que o “aproveitamentoeconômico das árvores”, trabalho realizado pelas indústriasmadeireiras, aliado à monocultura, estão levando a Amazônia aomesmo caminho da Mata Atlântica: à destruição.

Neste sentido, falar de sustentabilidade, de preservaçãoambiental na região amazônica é o mesmo que gritar no deserto,visto que, “a degradação florestal (...) é arquitetada de formaconsciente e racional dentro das metas estabelecidas pelo modode produção capitalista”, denuncia o autor.

Enfim, ler esta obra, é entrar no âmago do sentimento doautor e junto com ele, indignar-se com a realidade que poucospercebem, apesar de estarmos todos inseridos nela, realidade estaonde “o dragão continua na floresta a devorar” (Saga da Amazônia– Vital Farias).

Sinop, Agosto de 2004.

Prof. Ms. Josivaldo Constantino dos SantosProfessor de Filosofia da Educação do

Departamento de Pedagogia da UNEMAT – Campos

Universitário de Sinop.

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APRESENTAÇÃO

Este é o terceiro livro, de uma série de quatro, que versaacerca da Amazônia e mantém a mesma estratégia de análiseadotada nos dois primeiros1 . Trata das relações estabelecidas entreos grupos econômicos, que se instalam na região afim deacumularem riquezas, e da expansão que ocorre, seguindo a lógicamundial. Para o entendimento do assunto discutido aqui, não sefaz necessário que o leitor tenha lido as outras obras do autor. Issodeve-se à autonomia do texto quanto ao recorte e aos dadosobservados.

Sentimo-nos muito à vontade quando discorremos comreferência ao processo de transformação de madeiras. Mesmodiante da amplitude da temática e do espaço, a preocupaçãoconstante em pesquisar a Amazônia tem o intuito de verificar averacidade dos fatos já postos em discussão por estudiosos daárea. Para relacionar a indústria de transformação de madeirascom o meio ambiente, com as estratégias capitalistas, com o Estadoe com a força de trabalho, sentimo-nos diante de uma tarefacomplexa, não impossível de ser realizada, certamente, mas quenos leva a percorrer difíceis caminhos por entre a selva densa.

Além disso, o estudo ora apresentado não pode serentendido como acabado. Os conceitos necessitam, ainda, deapuração, pois não atingem o estágio final das reflexões a que sepropõe. São apresentados de forma simples, conforme

1 Livros do mesmo autor. PICOLI, Fiorelo. Amazônia: do mel ao sangue – os extremos daexpansão capitalista. Sinop: Editora Fiorelo, 2004a e PICOLI, Fiorelo. Amazônia: a ilusãoda terra prometida. Sinop: Editora Fiorelo, 2004b.

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entendimento do pesquisador, e são suscetíveis a críticas e leiturasdiferentes, o que o torna objeto próprio da ciência mantendo seumovimento e evolução. É necessário, para tanto, entender oscaminhos já percorridos até então, dos que realizaram trabalhosde investigação, as hipóteses comprovadas pelas diferentesmetodologias e áreas voltadas às questões amazônicas.

A primeira parte deste livro apresenta o perfil dosempresários madeireiros, aqueles que coordenam e fazem aacumulação de capital neste setor. Faz o diagnóstico geral dasmadeireiras e sua representação econômica no comércio nacionale internacional, proporcionada pela extração dos recursos naturaisda floresta tropical.

Aponta, também, o volume de madeireiras nacionais emultinacionais existentes na região, o processo crescente deexploração dos recursos nos últimos anos e a vinda de madeireirasasiáticas que se instalam com o objetivo de agregar valor a seucapital. Assim, aponta para o movimento que caracterizou acrescente internacionalização da região voltada ao comércio demadeiras.

O papel do Estado foi determinante no fornecimento deincentivos fiscais aos grupos econômicos organizados,proporcionados por órgãos governamentais criadospropositadamente para servirem às classes dominantes,principalmente por meio da ditadura de 1964. Estes foram decisivospara o sucesso da nova fase de acumulação regional, econtribuíram para o desenvolvimento e a concentração de riquezas.As empresas que tiveram acesso aos recursos do Estado sãorepresentadas por grupos econômicos que dominam a política, aeconomia e as forças produtivas do País e, na maioria das vezes,ditam as regras do mercado nacional e global.

Esses grupos utilizam táticas e estratégias de dominação,concentrando a terra em suas mãos, em detrimento da não-realização da reforma agrária no País. Também se verifica que amaioria dos projetos criados por estes recursos vai servir para doisfins: o desvio de verbas públicas e a devastação ambiental. O projetoproposto pela dinâmica capitalista regional não contempla asmadeireiras, pois estas realizam o aproveitamento das árvores,para, em seguida, realizar a expansão da agropecuária extensivapor meio das monoculturas.

Pretendemos demonstrar, ainda, a estrutura econômica dasmadeireiras na região, representadas por seu volume produtivo, a

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quantidade de empregos oferecidos e as formas como os gruposeconômicos participam da dinâmica do enriquecimento de suasempresas, em detrimento da subsistência da força da classetrabalhadora. Diante dos fatos, serão feitos apontamentos a respeitodos proprietários das indústrias, do grau de dependência entrepequenos, médios e grandes empresários do setor. Além disso,serão observados os contratos dos trabalhadores da extração demadeira por meio do agenciamento da mão-de-obra feita pelo“gato”, que fica com toda a responsabilidade trabalhista para eximiro capitalista de qualquer compromisso.

O projeto de expansão da Amazônia brasileira seráidentificado nas suas duas fases bem distintas: na primeira, omadeireiro faz a coleta das árvores com o objetivo de aproveitareconomicamente a madeira; na segunda, a concretização do projetocapitalista, com a fixação da agropecuária por meio dasmonoculturas de soja e gado bovino. Assim, pode-se demonstrarque a coleta das árvores não recebe cuidados para preservar afloresta, sendo os empresários, na maioria das vezes, apenascoletores das árvores, para, depois, se instalarem grandes núcleosde agropecuária extensiva no lugar devastado.

A madeireira, muitas vezes, faz um papel insignificante narelação concentradora da região, pois apenas aproveitaeconomicamente as árvores. Em outros casos, a madeira équeimada sem aproveitamento para que se permita a entrada dasmonoculturas. Isso comprova que, com ou sem madeireiras, aAmazônia é devastada em nome de um grande projeto que nãocontempla a indústria de transformação na região.

Essa perspectiva não utiliza técnicas de manejo florestal eos ecossistemas passam a ser agredidos de forma irreversível. Oprocedimento pode ser visto em todas as fases do processoprodutivo, pois, além de não se utilizarem tais técnicas na maioriados projetos, os que se utilizam delas, não as aplicam bem. Muitasvezes, não passam de palavras que enfeitam os projetos e servempara legalizar a devastação da floresta, visto que o objetivo maiorda estratégia capitalista na região, não visa a fortalecer o setormadeireiro. O processo de destruição ambiental leva aodeslocamento das indústrias, após a coleta predatória. Em seu lugar,são formadas grandes áreas com monoculturas, exatamente comoprevê o projeto do grande capital para a região, e a madeireirapassa a fazer um circuito itinerante.

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Além de não utilizar formas adequadas de manejo, podemser vistas outras causas para tal destruição: a falta de tecnologiaadequada, com máquinas e equipamentos sucateados; o mauaproveitamento que reduz a lucratividade da empresa; a grandequantidade de florestas disponíveis, fazendo com que sejaaproveitada somente a que proporciona mais lucro; a dificuldadena comercialização do aproveitamento das madeiras, bem como oprocessamento final que, em grande parte, é feito fora da regiãoprodutora.

As formas de obtenção de maior lucratividade para aempresa, segundo a lógica capitalista, são observadas noaproveitamento da madeira de melhor qualidade, desperdiçando-se 2/3 nas várias fases do processo produtivo. Outros adicionaisfinanceiros são conseguidos, quando a empresa, por exemplo,sonega imposto, ou trabalha com o sistema de grilagem de terras ede madeiras, principalmente, as conseguidas ilegalmente de áreasindígenas, de posseiros, de preservação ambiental e/ou da União.

Tal atitude orienta o mercado, pois define os preços damadeira no comércio nacional e internacional, determina a formade transformação de madeira, assegura o benefício dos incentivosfiscais, e, principalmente, força a participação do Estado, que sepõe a serviço do capital, fornecendo toda a estrutura para a expansãoe concentração dos grupos econômicos, jogo político que torna aregião um objeto de cobiça.

O Estado e o capital em conjunto regulam as ações dedominação na região. Eles usam da força conjunta para favorecergrupos organizados na economia e na política, tendo como objetivofinal a expansão e a concentração de capital na região. Nessaestratégia, utilizam a superexploração e colocam a natureza a serviçode grandes conglomerados econômicos. A exploração do homem edo seu ambiente passa a ser a regra, e a determinação docapitalismo sistêmico quer o lucro fácil, por meio da fabricação dederivados da madeira das florestas tropicais nativas. De acordocom o que foi dito, deixa-se ao leitor a oportunidade de fazer emergirdo texto as leituras possíveis no que diz respeito à ocupação eexploração da Amazônia.

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DIAGNÓSTICO GERAL DAS EMPRESASMADEIREIRAS NACIONAIS E

MULTINACIONAIS

Quando tratamos da indústria de transformação de madeirasda região amazônica, e, quando fazemos as conexões da vida aliexistentes, por meio das relações econômicas, produtivas,ambientais, trabalhistas e estatais, objetivamos relacionar o homemao seu ambiente. Da perspectiva capitalista de ocupação da região,e do intuito de formar uma nova trajetória para a representaçãoeconômica regional, nasceu uma nova fase da expansão capitalistaque acontece por meio da extração e da comercialização demadeiras. O modelo de produção regional é fruto da investida doEstado e do capital em conjunto, e teve início mais acentuado apartir da tomada de poder da ditadura de 1964.

O setor de transformação de madeiras desenvolveu-se coma finalidade de servir ao modo capitalista de produção e abastecercom seus produtos o comércio interno e externo, bem como paracriar mecanismos de submissão, obediência e controle dosmarginalizados e despossuídos que clamavam por oportunidades.Nesta perspectiva, “nos últimos decênios, a expansão da fronteirase constitui para o Estado um meio de controlar sua população ede responder aos interesses dos mercados internacionais” (PASSOS,1998: 58).

A fase da expansão da nova fronteira deve ser entendidacomo uma estratégia para criar valor por meio do modo capitalistade produção, apoiando-se nos recursos do extrativismo florestal,tendo como finalidade principal a realização da acumulação e daexpansão dos grupos econômicos nacionais e multinacionais na

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região. É essa dinâmica que concebe o modelo capitalista na região,os grupos econômicos cumprem a necessidade de acumulação demaneira extensiva, pois “o sistema capitalista é um modelo decontrole sociometabólico incontrolavelmente voltado para aexpansão” (MÉSZÁROS, 2002: 131). A nova investida capitalista temà sua disposição vastas áreas de terras e de recursos naturais,para ali fazer a reprodução e instalar-se, afim de efetuar aacumulação com a produção e comércio dos derivados de madeiras.

Os proprietários das indústrias de transformação demadeiras e a formação do sistema capitalista global necessitaramintroduzir seus projetos nos vários pontos da Amazônia Legalbrasileira. Para que se concretizasse esta dinâmica, o Estado serviude ponto de apoio, oferecendo incentivos para facilitar a ocupaçãoe o desenvolvimento empresarial, e colocou à disposição toda ainfra-estrutura necessária e o acompanhamento na instalação dasindústrias. É importante lembrar que o capital e o próprio Estadosão vistos como representações atentas aos movimentos sistêmicosdo mundo da concentração global.

Fizeram parte das estratégias do Estado, o controle e aorganização da ocupação da região amazônica, pois a partir de1964, através do projeto capitalista mundial, efetivou-se na prática,a desnacionalização desta parte do território que compõe aAmazônia brasileira, e por meio dessa lógica, os benefícios foramoferecidos também às empresas transnacionais. Nesta nova fasede acumulação, “as empresas transnacionais seriam as principaisbeneficiadas desta política” (FURTADO, 1981: 39), pois o controlepassou ao grande capital nacional e internacional, por meio dosmovimentos articulados pelo centro mundial hegemônico capitalistados estadunidenses.

Na mesma época, o Estado brasileiro, no período dosmilitares, viabilizou um projeto capitalista mais agressivo, com finsde oportunizar grandes conglomerados na expansão e naacumulação. As táticas da expansão se apresentam de maneiraagressiva e planejada, e passaram a abrir a região para o livreacesso de grandes projetos organizados pelo capital e o Estado.Estes tinham o objetivo de servir ao mercado globalizado, usandosuas forças representativas nacionais e internacionais.

Os projetos beneficiados foram aqueles que representaramos interesses econômicos, militares e políticos, pois a origem doempreendimento e a forma de sustentação foram facilitadas para

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se realizar na região, a reprodução capitalista, através da lógica daprodução de mercadorias e da exploração do trabalho, com o apoiodo Estado. Os projetos econômicos ali instalados objetivaram acolocação dos produtos regionais para servirem às necessidadese às expectativas do comércio mundial, por meio da lógica daconcentração e centralização de capital.

Para que se cumpra essa dinâmica que rege a expansãoda fronteira amazônica, “o controle do capital circulante é o objetivo,enquanto o controle do território e da população é o meio” (ARRIGHI,1997: 34), faz-se necessário manter a ordem e as relações. Aditadura passou a servir de instrumento para viabilizar a corrida nanova fronteira de expansão. Com esta lógica, a região passou aser demarcada e dominada pelos interesses do capital através dasrelações de mercado e de suas ações, com movimentos arquitetadospara a expansão, apoiados pela ditadura que coordenou este grandeprojeto. A Amazônia serviu de alternativa para a crise da acumulaçãodo capital dos anos 70, sendo direcionada à nova investida poroferecer vantagens econômicas e pela sua flexibilidade ilimitadaem opções no processo produtivo.

Dessa forma, fez-se necessário criar uma situação deequilíbrio através de um lucro aceitável. A intenção capitalista emilitar na região tinha como objetivo principal superar “as crises desuperprodução que manifestam a existência de um capital excedentepara uma tendência decrescente da taxa de lucro” (COGGIOLA, 1998:79). Para resolver esta problemática, foi oportuno ao capital quenão existissem limites geográficos para se reproduzir por meio daexpansão.

A Amazônia tornou-se a extensão territorial sem limitesgeográficos, bem como uma região de livre trânsito para a expansãocapitalista, com a finalidade única de acumulação de capitais. Alémdisso, não se faz necessário respeitar o homem e os ecossistemasregionais, pois o casamento entre o Estado e o capital se pauta naomissão, na conivência e no descaso aos demais atores sociaisque fazem a história da Amazônia brasileira. A extração dos recursosnaturais foi uma das alternativas dos projetos econômicos na região.O Estado faz o papel de protetor, organizador e viabilizador dasações direcionadas, para promover o lucro nas mãos das elitesdetentoras da concentração da terra e do capital disponível para,na prática, ocorrer a acumulação.

Este novo espaço expansionista foi fruto do modelo global

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capitalista, mas utilizou-se da fronteira geográfica da Amazônia comofonte de recursos naturais através do modelo extrativista, bem comona agropecuária e na industrialização de forma geral. Nesta lógica,desenvolveu-se a indústria de transformação de madeiras, atravésda floresta tropical nativa, que tem como finalidade agregar valorna expansão com os produtos destas empresas. Os projetoseconômicos do setor da indústria madeireira nasceram com afinalidade de explorar a região pela grande quantidade de recursosnaturais florestais existentes e, assim, foram introduzidas formasde produção através da coleta seletiva das árvores nativas.

Desta forma, o projeto constituído interferiu nosecossistemas da região, tendo em vista que a extração das árvorespara a transformação de madeiras é uma agressão irreversível ànatureza, devido às formas primitivas aplicadas na coleta das toras,que não são acompanhadas de projetos sustentáveis. Este fatofica evidente pelas práticas de exploração das áreas florestaisnativas, que vão da retirada das árvores até a queima da vegetação,quando abrem caminho para a agropecuária extensiva, por meioda segunda fase do projeto amazônico.

É bom lembrar que o grande projeto para a região não foitraçado para madeireiras, elas contemplam uma primeira fase dainvestida capitalista regional, que acontece através doaproveitamento econômico das árvores, para em seguida realizarema entrada das monoculturas da agropecuária, para servirem aomercado mundial e sua lógica. Nesta tendência, os danos causadospela ação nefasta do homem em busca da expansão da riquezasão visíveis em toda a região, provocando prejuízos ao meioambiente, aos povos originários e aos posseiros, que dependemda natureza como fonte de subsistência e sua relação com a vida éa floresta.

O acesso dos capitalistas nacionais e internacionais à regiãonão objetiva assistir às populações ali existentes, mas se projetarna região com a finalidade de concentrar e centralizar a riqueza deforma associada e global. Os grupos econômicos instalados na novafronteira recebem como impulso os incentivos fiscais do Estado, aoportunidade de concentrar a terra, sem o compromisso de respeitaro meio ambiente e o homem ali existente. Por outro lado, o Estadopassa a fazer o papel de passivo, pois “os índios, os caboclosamazonenses e os posseiros eram expulsos de suas terras pelosgrileiros latifundiários, fazendeiros ou empresários que chegavam

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com a proteção econômica e política do poder estatal” (IANNI, 78:1986).

Nesta dinâmica, as empresas interessadas em expandir osseus projetos na Amazônia passaram a contar de forma mais efetivacom o poder do Estado, por meio de seu aliado protetor. Os gruposeconômicos e políticos foram beneficiados através de ampla infra-estrutura fornecida pelas instituições públicas de representaçãoregional, proporcionada principalmente, pela abertura de grandesrodovias por parte do governo federal, e assim, foram criados osmecanismos necessários para a entrada dos capitalistas nacionaise internacionais, por meio da lógica da expansão, que faz acontecerna prática a expropriação do homem e do seu ambiente.

Através dos incentivos fiscais e da estrutura recebida peloEstado, os grupos econômicos passaram a explorar a região. Estesrecursos foram aplicados na mineração, na agricultura, na pecuáriae no setor de transformação de madeiras. O setor de transformaçãode madeiras instala-se conjuntamente com as demais formas deexpansão capitalista na região, tendo como finalidade principal oaproveitamento das florestas nativas. Nesta modalidade produtivarealizam o aproveitamento econômico das árvores e objetivam altastaxas de lucro, através da coleta seletiva para atender aos padrõesde mercado.

A nova fase de expansão, através do setor de transformaçãode madeiras, requereu também a necessidade de utilização da forçade trabalho para conduzir o processo produtivo. Neste sentido,criou-se na região uma relação de maior dependência entre oscapitalistas da extração de madeiras e os proletários – a relaçãode superexploração no trabalho. São trabalhadores marginalizadosno processo histórico e expropriados de suas terras que vãooxigenar a indústria de transformação de madeiras na região. Estespassam a se reproduzir e a subsistir através de uma relaçãodesigual, e o valor de seu trabalho fica determinado abaixo do valorde uma relação normal de trabalho capitalista. Na tendência docapitalismo periférico, a força de trabalho se reproduz por meio daimposição do capitalismo central, e ocorre o aniquilamento da classeque oxigena o processo produtivo.

Para melhor atender aos reais objetivos do Estado, comfins de beneficiar o capital na estratégia de ocupação da Amazônianos últimos cinqüenta anos, faz-se necessário acompanhar asquatro fases de formação e valorização da região. A primeira fase

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iniciou-se em 1946, com término em 1964. Neste período foramdirecionados para a região benefícios como: determinação de 3%da renda tributária do País, com a finalidade de valorização daregião; criação do plano de valorização econômica da Amazônia;execução de obras estratégicas para a transferência da capitalbrasileira do Rio de Janeiro para a nova capital construída emBrasília, no Centro-Oeste brasileiro, e a construção da rodoviaBelém-Brasília (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 1998: 27).

A segunda fase, administrada pelo regime da ditadura militar,que vai de 1964 até 1985, concentrou-se na estratégia de políticade integração nacional, sendo a Amazônia seu principal alvo com acriação da Zona Franca de Manaus – Suframa em 1967, com afinalidade de organizar o comércio da região. Também houve acriação de mecanismos para a instalação dos grupos econômicos,através do uso dos recursos naturais minerais e florestais, bemcomo uma maior intensificação de grandes projetos naagropecuária.

Neste período, a ocupação foi realizada através dosinstrumentos de incentivos fiscais oferecidos pelo Estado,principalmente da Sudam. Esta era a estratégia do governo daditadura para a ocupação da região, por meio da criação demecanismos de favorecimento aos grupos econômicos nacionais einternacionais, para assim viabilizar a reprodução capitalista comauxílio e proteção do Estado. O plano de ocupação, tambémpromovido pela interferência das madeireiras na região,proporcionou um aumento considerável na produção demercadorias, sem, no entanto, observar formas de manejo dasáreas. Os produtos oriundos da coleta seletiva, que visaram apenasao aproveitamento econômico das árvores, serviram ao mercadointerno e externo de madeiras. Por outro lado, “o desflorestamentona Amazônia Legal passou de 9,2 milhões de hectares em 1975,para 22,5 milhões em 1985” (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 1998: 30).

A terceira fase vai de 1985 até 1994, caracterizada pelapolítica de integração através das reservas ambientais. Foi umperíodo que se identificou com a continuidade de projetos deincentivos como: Sudam, Basa e Incra, entre outros, e a criação deum plano de defesa da Amazônia, idealizado pelo programa “nossanatureza”. Neste ínterim, foram suspensos pela Sudam os novosprojetos agropecuários que implicassem a conversão da florestaem pastagem.

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AMAZÔNIA

No período, ocorreram avanços no que diz respeito àproteção da natureza, como por exemplo, a preservação e a criaçãode áreas de proteção nacional e a demarcação de algumas áreasindígenas. Embora muitas das leis que regulavam e normatizavama devastação e a extração de árvores para as madeireiras tenhamficado apenas no papel, outras serviram para legalizar a devastaçãoe a arbitrariedade de forma geral, sem, no entanto, uma efetivademarcação das áreas de preservação ambiental, públicas eindígenas.

A Amazônia chegou a um novo estágio expansionista nesteperíodo. Este fato fica demonstrado, principalmente pelo equilíbriona transferência do exército industrial de reserva, oriundo de outrasregiões do Brasil. Podemos identificar um estágio avançado deacumulação dos projetos econômicos, que provocaram odesemprego na região, pois necessitaram de força de trabalho commais intensidade na abertura das áreas e na estruturação dosprojetos. Os projetos ali instalados passaram a necessitar menorquantidade de trabalhadores, porém mais qualificados. Por outrolado, efetivou-se de forma mais clara, a consolidação do projetoeconômico na região, com respostas condizentes às estratégiasglobais para fornecimento de produtos de interesse do mercadomundial.

A quarta fase da presença capitalista na região,compreendida a partir de 1995 até dias atuais, acentuou-se o planode aceleração e internacionalização da Amazônia. Para DREIFUSS

(1999: 162), “a globalização se sustenta em impulsionar processosde concentração empresarial e econômica”. Assim, o domíniocapitalista da última década nasceu deste propósito: a extraçãodos recursos florestais permitiu abrir a região de forma maisacentuada ao mercado e, com isso, à entrada de grandes gruposmadeireiros internacionais.

Por um lado, foram criados mecanismos mais concretos pararespeitar o meio ambiente, por outro, proporcionou-se o livre acessode empresas no extrativismo florestal. Contudo, a atividademadeireira desta última fase foi “a principal fonte de empregos naregião, depois dos empregos públicos” (CÂMARA DOS DEPUTADOS,1998: 50). Neste sentido, para melhor precisar os dados, segundoo Laboratório de Produtos Florestais – LPF/Direm/Ibama, “o setorde base florestal brasileiro oferece cerca de 2 milhões de empregosdiretos e indiretos” (DEUSDARÁ e PEREIRA, 2001).

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O acesso aos capitalistas na região para explorar osrecursos naturais, também aconteceu através das privatizações;exemplo desta natureza foi o leilão da Vale do Rio Doce, no final dadécada de 90 do último século. Fatos desta natureza contrariam osprincípios de práticas sustentáveis da floresta, e marcam a entregado patrimônio público aos grandes conglomerados internacionais.Assim, através da abertura comercial e do desencadeamento doprocesso de privatizações do País, contribuíram para oaprofundamento da abertura da região através dainternacionalização da Amazônia, tornando a região mais integradaao mercado mundial, subestimando o mercado nacional.

Neste período foram criadas estratégias para a entrada dasmadeireiras transnacionais na região, através da expansão docapital internacional e da estrutura fornecida pelo Estado brasileiro.A nova política florestal assentou-se em duas diretrizes básicas:“atração de investimentos de capital transnacional, principalmenteasiático; e abertura das florestas públicas à exploração privada”(CÂMARA DOS DEPUTADOS, 1998: 32). Neste sentido, “três dos cincomaiores grupos madeireiros da Malásia se estabeleceram naAmazônia brasileira ao longo dos anos 1996-97” (CÂMARA DOS

DEPUTADOS, 1998: 105).Os projetos recentes na Amazônia, além de intensificarem

a exploração dos recursos naturais, contemplam quase natotalidade os grupos econômicos, muitos com sede fora do País.Para melhor entender as proporções da destruição promovida pelaabertura ao capital estrangeiro na região, proporcionadaprincipalmente pelas indústrias de transformação de madeiras, énecessário entender como se processa o desmatamento.

As indústrias de transformação de madeira entram primeiro,para, depois, formar-se a agropecuária na região, pois asmadeireiras objetivam apenas a retirada dos recursos florestais efazem apenas o aproveitamento econômico das árvores. A retiradaacontece com ou sem planos de manejo, e raramente se faz oaproveitamento da floresta com métodos que visem às formasadequadas de preservação ambiental. O processo de retirada dasárvores obedece apenas à lógica da produção: abastecer asindústrias de transformação de madeiras com a finalidade defornecer matéria-prima com fins econômicos e abastecer osmercados interno e externo. Na última década, tivemos umprogressivo aumento da produção, do consumo e da exportaçãode madeiras, bem como uma projeção futura de contínuo aumentona capacidade produtiva.

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AMAZÔNIA

EVOLUÇÃO DA PRODUÇÃO DE MADEIRAS SERRADAS NOPERÍODO DE 1990 A 2000 (EM 1.000 m³).

OS PRINCIPAIS PRODUTOS MADEIREIROS, O CONSUMO E ASEXPORTAÇÕES NO ANO DE 2000 (EM 1.000 m³).

PROJEÇÃO DA PRODUÇÃO FUTURA DE MADEIRA PROCESSADA(EM 1.000 m³) PARA O PERÍODO DE 2001 E 2004.

Fonte: Elaboração própria com base no Laboratório de Produtos Florestais –LPF/Diren/Ibama (2001).*Estimativa. Fonte: Abimci, Stcp, Abpm, SBS.

Fonte: Elaboração própria com base no Laboratório de Produtos Florestais – LPF/ Diren/Ibama (2001)e Abipa, Secex

Fonte: Elaboração própria com base no Laboratório de Produtos Florestais – LPF Diren/Ibama (2001)e Abipa, Abimci, STCP, SBS.

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Através dos resultados obtidos com as madeiras serradas,entre 1990 a 2000 houve um aumento na produção dos 42,12%, ea projeção deste mesmo produto para 2004, aponta que teremosum novo aumento na casa de 16,17%. Contudo, o que nossurpreende é a grande capacidade de consumo interno, pois89,10% das madeiras serradas são consumidas no próprio País,demonstrando que o Brasil é um país altamente consumidor demadeiras duras tropicais, pois cerca de 80% do que produz no totalé consumido internamente (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 1998: 49). ParaSMERALDI e VERÍSSIMO (1999: 13), da produção de madeiras daAmazônia, 10% é consumida na própria região, 76% no Brasil, forada Amazônia e 14% é exportada.

O consumo interno das madeiras serradas vincula-sebasicamente a três segmentos: às indústrias de embalagens, àindústria moveleira e à indústria da construção civil. Neste sentido,historicamente a Amazônia destina seus produtos ao mercadointernacional, e assim, o fato de se consumir no próprio País amaioria dos produtos derivados de madeiras, é algo inédito para aregião. No entanto, as projeções futuras apontam para um novoordenamento na colocação dos produtos derivados das indústriasde transformação de madeiras da floresta tropical.

Outro fato que nos chama a atenção são os Estadosdetentores do mercado moveleiro do País. Segundo a AssociaçãoBrasileira das Indústrias do Mobiliário – Abimovel, em 2001 asexportações do setor atingiram US$ 483.524.924,00. Os principaisexportadores foram: o Estado de Santa Catarina, com 46,84%; oRio Grande do Sul, com 31,24%; o Paraná e São Paulo, em tornode 8% cada. Nesse processo, a indústria brasileira de móveis éformada por 13.500 empresas micros, pequenas e médias, e estassão formadas com capital nacional na sua maioria. Essas empresasestão localizadas no Centro-Sul do País, constituindo-se em algunsEstados pólos moveleiros, a exemplo de Bento Gonçalves, no RioGrande do Sul; São Bento do Sul, em Santa Catarina; Arapongas,no Paraná; Mirassol, Votuporanga e São Paulo, em São Paulo; Ubá,em Minas Gerais, e Linhares, no Espírito Santo (ABIMOVEL, 2002).

Os Estados da Amazônia brasileira, que detêm a maiorcapacidade produtiva de serrados do Brasil, pouco representamem termos de produção e mercado de móveis, pois as exportaçõesdo Pará ficaram em 0,32%, e as do Amazonas, em 0,10% (ABIMOVEL,2002). No entanto, no Brasil “o consumo de toras das florestas

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nativas é da ordem de 35 milhões de metros cúbicos por ano, 85%dos quais provenientes da Região Amazônica” (DEUSDARÁ e PEREIRA,2001).

Os Estados do Centro-Sul compram a madeira dos Estadosamazônicos, e parte desta madeira é transformada em móveis queservem para o mercado interno e/ou para as exportações. Estaestratégia se deve a cinco fatores: pelo grande consumo internodo País concentrar-se no Centro-Sul; a existência de pólostradicionais na industrialização de móveis na região; tecnologiasde ponta; pessoal qualificado para o trabalho e, principalmente,pela itinerância do processo produtivo das florestas tropicais. Noúltimo fator analisado, as madeireiras da Amazônia têm um ciclocurto de vida, pois objetivam apenas fazer o aproveitamentoeconômico das árvores, para em seguida ser colocado em práticao grande projeto do capital na região, o da agropecuária atravésdas monoculturas.

Estes fatores, aliados à farta quantidade de madeiras naAmazônia, são determinantes para contribuir com a devastação dafloresta tropical, pois o mercado moveleiro exige madeiras dequalidade, e os custos no aproveitamento dos resíduos ficaminviáveis pela distância no deslocamento da matéria-prima, pelafalta de tecnologias adequadas na região, mas principalmente pelafalta de uma política de preservação ambiental do País que coíbaos desperdícios da madeira.

Os índices de desmatamento das últimas décadas e aprogressão futura, que ocorrem na região são entendidos atravésde duas amplitudes diferentes. Primeiro, são resultados da entradadas madeireira para a coleta das árvores, tendo finalidade apenaseconômica e o aproveitamento dos recursos florestais uma únicavez. Segundo, pela formação de grandes empreendimentoseconômicos, através das empresas agropecuárias, pois nestesprojetos necessitam fazer a retirada de toda a cobertura florestal.Estabelecem projetos de contínua exploração, mas ambas as formasnecessitam interferir no meio ambiente através da devastaçãodefinitiva. Segundo a CÂMARA DOS DEPUTADOS (1988: 34),

no período 1995-1997 estima-se que a taxa de destruição anual dafloresta amazônica pode ser assim estimada: 1,7 milhões dehectares de desmatamento (Inpe) [Instituto Nacional de PesquisaEspacial]; 1,1 milhão de alteração promovida pela exploração florestal/

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AMAZÔNIAmadeireira (Imazon) – [Instituto do homem e do Meio Ambiente]; cercade 1,0 milhão segmentação da floresta (provocados por projetos dereforma agrária); e cerca de 2,0 milhões pelos incêndios florestaisacidentais; totalizando 5,8 milhões de hectares, dos quais se devediminuir a área de superposição de alterações por incêndio,exploração madeireira, produzindo afinal uma taxa de devastação daordem de quatro a cinco milhões de hectares por ano.

Nesta perspectiva, o Brasil possui uma política florestal queatende o grande capital, em detrimento dos povos originários edos posseiros. A mesma política que destruiu a floresta atlânticabrasileira apresenta-se também através da interferência da indústriamadeireira na Amazônia. Faz-se necessário lembrar que a produçãooriunda do setor de transformação de madeiras cresce em volumea cada ano, proporcionado pela interferência de capital nacional einternacional, mas não com práticas sustentáveis que venham arespeitar o meio ambiente. O projeto estabelecido na região nãocontempla madeireiras para sempre, mas é itinerante, com o objetivode aproveitar as árvores sem sustentabilidade.

O setor madeireiro obteve sensível crescimento nasexportações nos últimos anos; como foi visto, “com exceção damadeira serrada, os demais itens aumentaram sua relaçãoexportação/importação: o papel e o papelão, passou de 5,9% em1980 para 26,7% em 1993; celulose de 28,8% para 44,5%; chapasde fibra, de 23,5% para 38,7%; aglomerados de 0,5% para 2,0%;compensado de 11,0% para 55,3%” (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 1998:40), com crescimento acima dos níveis mundiais destes produtos.A evolução continua através das vendas e a produção está emcontínuo aumento, mesmo sendo o País um grande consumidor demadeiras e seus derivados. O Brasil é o maior consumidor dederivados de madeiras do mundo.

Na indústria de transformação de madeiras, “o setor florestalbrasileiro exportou em 1996 US$ 3,45 bilhões, ou seja, 7,2% dovalor total de exportação do país” (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 1998:40). Neste propósito, segundo o Laboratório de Produtos Florestais– LPF/Diren/Ibama, “o setor de transformação madeireira contribuiu,em 1999, com US$ 3 bilhões em impostos e participou com 3,9% doPIB nacional. O faturamento do setor brasileiro de base florestal,em 1999, foi de US$ 21 bilhões, período em que exportou cerca deUS$ 4 bilhões, o que corresponde a 8% das exportações totaisbrasileiras” (DEUSDARÁ e PEREIRA, 2001).

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Tudo indica que a estratégia de tornar o Brasil grandeexportador de produtos naturais da floresta tropical amazônica estáse encaminhando em largas passadas. Ampliar os produtosmadeireiros da região e torná-los mais integrados ao comérciomundial, bem como abrir caminhos para as exportações do conjuntodos produtos florestais, minerais, agrícolas e pecuários é a grandemeta dos últimos governos e dos capitalistas que fazem a expansãona região. Nos últimos anos, o mercado mundial “manteve-se estávelno período 1988-1995, [no Brasil] os serrados tiveram umincremento de 6,0%, os compensados de 108,1% e os laminadosem 121,65%, ou seja, os produtos com maior agregação de valortiveram maior incremento de produção” (CÂMARA DOS DEPUTADOS,1998: 43-44).

Fazendo projeção mundial, podemos observar que “aMalásia e a Indonésia juntas perfizeram 82,43% das exportaçõesde madeiras tropicais em 1989 e 72,01% em 1995 - revelando umdeclínio de 10,02% pontos percentuais sobre o total. A grandenovidade é a ascensão do Brasil, que passou de 2,20% em 1989para 8,05% em 1995 - em volume equivalente em toras” (CÂMARA

DOS DEPUTADOS, 1998: 46). No Brasil o comércio de madeiras continuaem ascensão, proporcionada pela intensificação do extrativismo naAmazônia. A CÂMARA DOS DEPUTADOS (1998: 47) demonstra que:

comparando-se a relação exportação/produção dos vários paísesfiliados à ITTO [International Trade Timber Organization], vê-se que aMalásia exportou 84,89% da sua produção em 1989 e 74,11% em1995; a Indonésia, 79,48% e 59,16%, respectivamente; Papua NovaGuiné, 74,41% e 84,45%; Costa do Marfim, 64,75% e 70,05%; Gabão,82,75% e 95,98%; Camarões, 61,29% e 46,58%, enquanto o Brasilexportou 5,55% da sua produção em 1989 e 19,54% em 1995. Ouseja, a Malásia e a Indonésia já não conseguem exportar uma parcelatão alta da sua produção, o que ainda acontece com países africanos– de baixo consumo interno. Para os padrões destes paísesexportadores da ITTO, o Brasil exporta muito pouco de sua produção.O Brasil aumentou sua participação absoluta e relativa, nasexportações mundiais de madeiras duras (hardwood) tropicais, aosaltar a sua participação percentual de 2,20% em 1989 para 8,05%em 1995 em volume, em equivalente em tora; e tem possibilidadede aumentá-la ainda mais.

Por outro lado, o Brasil é alto consumidor interno de produtosderivados da transformação de madeiras, como foi apontado através

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de dados. Mas o que chama a atenção são os países grandesexportadores, que começam a perder gradativamente seu poderde exportação, e estão transferindo suas empresas para aAmazônia. O Brasil dá saltos qualitativos em seus índices deexportação, proporcionados por políticas que facilitam a implantaçãodo capital nacional e internacional na região, com fins de extraçãoe beneficiamento da madeira de forma não sustentável.

O que fortaleceu o aumento da produção e dos produtosderivados da floresta tropical foi o crescimento do mercado nacionale internacional, mas principalmente a transferência das madeireirasasiáticas para a Amazônia nos últimos anos. Contudo, para o capitala floresta amazônica apresenta-se como potencial disponível àsnecessidades e aos interesses da burguesia mundial e uma formaconcreta de apuração dos lucros na região. Esta fonte de recursosé colocada a baixos custos à disposição dos grupos econômicos, eestes podem transformar-se em produção para suprir asnecessidades do mercado mundial.

Dos produtos derivados de madeiras no Brasil, “os principaispaíses consumidores em 1995 foram: o Japão, com 29,95% do total;a União Européia, com 16,29%; Taiwan, com 9,60%; a Coréia doSul, com 8,85%; a China, com 8,52% e os Estados Unidos, com4,0% – notando-se claramente que o bloco asiático absorveu56,60% das exportações mundiais de madeira dura tropical, quandoem 1989 absorvia 53,41%” (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 1998: 47). Em2000, temos um novo destino para as madeiras serradas, pois,segundo o Laboratório de Produtos Florestais – LPF/Diren/Ibama,“os principais países de destino das exportações brasileiras demadeira serrada são os EUA, a Espanha e a França. Dentre ospaíses que integram o Mercosul, a Argentina destaca-se como oprincipal país importador” (DEUSDARÁ e PEREIRA, 2001).

Neste sentido, a floresta tropical brasileira é uma grandefonte de recursos naturais. Porém, da forma predatória como estásendo feita a coleta das árvores na Amazônia, possivelmente odestino da floresta tropical é o mesmo destino da floresta atlântica,e assim podemos chegar a sua quase completa destruição em futuropróximo. O lucro fácil é um dos fatores determinantes da devastaçãoda região, pois motiva a interferência de grandes projetoseconômicos na Amazônia, mas principalmente porque sãoimpulsionados pela liberdade na utilização da matéria-prima.

Em potencial, é a maior floresta do mundo, mas poderá num

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futuro próximo ser completamente absorvida e transformada emprodução através das estratégias e interesses dos gruposeconômicos nacionais e internacionais ali instalados, bem como osque poderão vir a instalar-se no futuro. A Amazônia tem grandepotencial extrativo, torna-se uma grande promessa para a investidacapitalista nacional e internacional. Este é um fator determinantepara o futuro da região, pois existe a possibilidade de intensificaçãomaior na investida de grandes conglomerados nacionais einternacionais. Os grupos madeireiros se concentram hoje nocontinente asiático, mas podem ser impulsionados pela alternativaamazônica com mais determinação e vir a concentrar a riquezaatravés da entrada na região, de suas empresas voltadas à indústriade transformação e beneficiamento de madeiras.

Mesmo que o domínio das exportações seja dos paísesasiáticos, os índices revelam que o Brasil é o terceiro exportadorde madeiras, perdendo apenas para a Malásia e a Indonésia. Outrofato interessante é a posição do consumo interno, pois, “o Brasil étambém o primeiro país consumidor de madeiras duras tropicais,consumindo internamente mais de 80% do que produz” (CÂMARA

DOS DEPUTADOS, 1998: 49). Por outro lado, as empresas extrativistastêm aplicado pouco na região onde acontece o movimento deexploração dos recursos florestais.

Os recursos financeiros provenientes do setor madeireirosão transferidos para outras regiões do Brasil, ou possivelmentepara outros países, devido à grande facilidade em deslocá-los, sejade forma legal, seja de forma ilegal. Os empresários do setor, alémde conduzirem suas operações de forma predatória, agridem osecossistemas e superexploram a força de trabalho. Isto pode servisto através do aprimoramento da extração da mais-valia e dodeslocamento dos recursos obtidos na produção para fora da região.

Fatos desta natureza são possíveis, porque a região temuma grande quantidade de madeiras. Segundo dados oficiais,“estima-se seu potencial em seis bilhões de metros cúbicos. Hoje,o acesso à região é livre. Há uma grande exploração ilegal demadeira nas áreas que seriam teoricamente protegidas” (CÂMARA

DOS DEPUTADOS, 1998: 51). Estas terras de extração irregular sãoindígenas, terras da União e de reservas ambientais, e passaram aser o alvo preferido da nova investida capitalista das últimas décadas.

As irregularidades praticadas na origem das madeiras estãoaliadas a uma grande carência de experiências práticas de manejo

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florestal na região. Também a precária fiscalização por parte dosórgãos competentes apresenta-se de forma articulada e identifica-se com o projeto ali instalado, pois o efetivo para orientar e coibiros abusos torna-se impotente, omisso e conivente, com fins depreservar os interesses do Estado e o capital em conjunto. A omissãoe a conivência com os projetos por parte do Estado fazem-sepresentes para consolidar as formas capitalistas ali instaladas. Apolítica oficial da ditadura para abertura da região é de cumplicidadee identifica-se por meio do comprometimento com os objetivos dosprojetos econômicos ali beneficiados, através da concentração daterra, pois o capital é a representação do poder estatal.

Além de criar os incentivos fiscais, serve, também, parafornecer mecanismos de sustentação e torna-se conivente paraatender aos interesses capitalistas. Este é o objetivo maior dapresença do capital na região, pois a estratégia é a acumulação ea preservação da lógica de criação dos projetos, com a finalidadede se expandir e agregar valor. Na Amazônia brasileira, ainterferência do poder público acontece de forma mais contundenteque em outras regiões do Brasil, pois “o Estado foi levado a favorecero desenvolvimento intensivo do capitalismo” (IANNI, 1986: 16).

O projeto arquitetado e planejado de expansão eacumulação na região, objetiva dar livre acesso ao capital e colocaros produtos da região no mercado mundial, mesmo que estaestratégia seja contra os interesses econômicos, sociais eambientais da grande maioria dos brasileiros e, principalmente, dospovos das florestas que dependem deste espaço para suasubsistência. Torna-se evidente que o Estado está a serviço docapital monopolista, em detrimento dos povos amazônicos, que usama natureza em comunidade.

A nova estratégia dos capitalistas internacionais apresentaa determinação de usufruir os recursos naturais florestais; elesobjetivam a transformação de madeiras na Amazônia brasileira deforma mais acentuada. Neste processo, as empresas transnacionaismadeireiras começaram a instalar-se na região, a partir dos anos70 e 80 em pequena quantidade, sendo oriundas dos paísesconsumidores, como é o caso da Alemanha, dos Estados Unidos,da China Popular e outros. Na metade da década de 90, ocorreuuma nova investida internacional por parte dos grupos madeireirosasiáticos, destacando-se os da Malásia.

Em 2001, estes grupos continuaram se instalando,principalmente nos estados do Pará e do Amazonas, por serem

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áreas de menor interferência da expansão no processo deocupação. Eles têm livre acesso a imensas áreas da floresta tropical.E estes locais são preferidos, visto serem locais de florestasexuberantes, tornando assim o processo produtivo muito lucrativo.Outro motivo é a grande quantidade de rios navegáveis, tornando-se mais fácil o acesso ao mercado mundial, pois fica garantido ofluxo das exportações dos produtos derivados da madeira aospaíses consumidores, principalmente os Estados Unidos, o Japãoe a Europa.

Embora em número menor, os grupos transnacionais – mascom alto poder econômico e tecnológico – já dominam toda estaregião. Para melhor entender este processo de ocupação, “nouniverso das 3.000 empresas madeireiras registradas nos Estadodo Pará e do Amazonas, e aproximadamente 6.000 na AmazôniaLegal [em 1997], o número de 21 empresas transnacionais épequeno, o que não significa que não tenha importância econômica”(CÂMARA DOS DEPUTADOS, 1998: 71). “No Estado do Amazonas, ogrupo de empresas madeireiras transnacionais é realmentepequeno, mas domina o setor industrial da produção de laminados,representando mais de 50% da capacidade instalada e 93,9% dovalor de exportação”. (CÂMARA DOS DEPUTADOS,1998: 72). É possívelque muitas empresas nacionais transfiram as madeiras serradas,os laminados e os aglomerados para os grupos transnacionaisfazerem a comercialização e a apuração dos lucros.

Para o GREENPEACE (2001: 1), os números são contraditórios.Porém, no ano de 2000, existiam “7.595 serrarias e indústriasbeneficiadoras de madeiras na Amazônia Legal registradas noIBAMA. Estima-se que 50% delas não estejam operando”. Nestesentido, as empresas transnacionais instaladas na Amazôniabrasileira vêm dotadas de estrutura econômica e tecnológicasuperior à das nacionais. Um relatório da Câmara dos Deputados,através da Comissão Externa destinada para averigüar a aquisiçãode madeireiras, serrarias e extensas porções de terras brasileiraspor grupos asiáticos, nos demonstra um pouco da estrutura e dasáreas de terras para a exploração florestal. Apresentaremos algunsdos grupos econômicos situados nos Estados do Pará e doAmazonas, onde houve a mais recente investida dos gruposinternacionais.

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ALGUMAS DAS MAIORES EMPRESAS TRANSNACIONAISINSTALADAS NO ESTADO DO AMAZONAS NOS ÚLTIMOS ANOS.

Fonte: Elaboração própria com base na Câmara dos Deputados (1998: 73 -75)

ALGUMAS DAS MAIORES EMPRESAS TRANSNACIONAISINSTALADAS NO ESTADO DO PARÁ NOS ÚLTIMOS ANOS.

Fonte: Elaboração própria com base na Câmara dos Deputados (1998: 95-96).

São empresas multinacionais que já controlam asexportações na região, através dos produtos derivados de madeiras,principalmente nos Estados do Pará e do Amazonas. Estas empresasse estabeleceram nesta região, graças aos incentivos e àsfacilidades promovidos pelos governos dos dois Estados. Sãogrupos econômicos que produzem para exportação e mercadointerno, sendo a madeira na sua totalidade, oriunda da florestatropical nativa dos Estados da Amazônia. Estes grupos atuam naregião através da superexploração da força de trabalho e daexploração irregular dos recursos naturais ali abundantes.

Os projetos econômicos ali instalados adotam estaestratégia, e a eles são colocados à disposição os recursos dasflorestas tropicais brasileiras. Com a força de trabalho e os recursos

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florestais à sua disposição e sem limites na exploração, oscapitalistas processam as formas mais apuradas que objetivam aconcentração e, conseqüentemente, a centralização da riqueza naregião. Estes grupos econômicos não objetivam contemplar osinteresses das populações da Amazônia, muito menos preservar omeio ambiente para as populações futuras.

As empresas transnacionais que se deslocam para a regiãoamazônica têm o firme propósito de “oprimir e explorar os povosdeixando para trás de si um rastro de miséria, pobreza, devastaçãoe degradação do meio ambiente” (VASCONCELLOS e VIDAL, 2001: 153).As irregularidades são apontadas em todas as fases do processoprodutivo. Com esta estratégia, estes grupos transnacionais naregião, fazem o extrativismo florestal, com a finalidade de realizar oaproveitamento econômico das árvores. Assim, realizam areprodução do sistema capitalista e os produtos vão servir aomercado capitalista nacional e internacional, conforme as metasdo mercado.

Para demonstrar as irregularidades na região, de cada 13empresas avaliadas na região, 12 estão com atividades de caráterirregular em algum aspecto ambiental, sem contar a ilegalidade fiscale, principalmente, a trabalhista (CÂMARA DOS DEPUTADOS: 1998: 79).Em 1999, no Estado do Amazonas, seis das maiores empresasexportadoras de compensados e laminados estão ou estiveramilegalmente envolvidas com madeiras nos últimos dois anos e meio.As empresas envolvidas são: Amaplac, Carolina, Cifec, Compensa,Cim e Gethal (ADÁRIO e D’ ÁVILA, 1999).

Desta forma, tanto as empresas nacionais quanto astransnacionais, além de contribuírem com a destruição dosecossistemas e superexplorar a força de trabalho, também usamcomo estratégia empresarial a sonegação fiscal, o contrabando demadeiras, a grilagem de terras e de madeiras, o uso indevido dosincentivos fiscais e infrações das mais diversas.

No atual estágio de desenvolvimento do setor detransformação de madeiras, as empresas asiáticas vêm ao Brasilcom objetivos claros, tirar proveito das florestas abundantes. Estesgrupos recebem tratamento diferenciado em relação aos gruposbrasileiros, são incentivados para realizarem seus projetos atravésdos governos onde se instalam. Mesmo que as empresastransnacionais tenham tratamento diferenciado das demaisempresas para instalação na região, todas usam das mesmas

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prerrogativas, que é tirar proveito dos recursos naturaisindiscriminadamente.

As formas para tirar proveito na região em benefício doscapitalistas vão da superexploração do trabalho aos desequilíbriosambientais e às irregularidades fiscais, conforme apontadoanteriormente, bem como a retirada de madeira de áreas depreservação ambiental, áreas da União e dos povos originários.Dentro desta perspectiva, a CÂMARA DOS DEPUTADOS (1998: 80)esclarece que:

este padrão de atuação das madeireiras transnacionais, inclusiveasiáticas, é o padrão do conjunto da indústria madeireira na Amazônia:compra de madeiras extraídas irregularmente; transporte ou comprade madeira sem origem definida; quando tem planos de manejo,em geral, são fontes complementares de madeira em tora e quasesempre não resistem a uma análise, tais as irregularidades, quevão desde a ausência de responsável técnico, até a recusa deregistrar a averbação da área de manejo; e algumas pilhas emnegociações ilegais (às vezes com conivência de funcionários dogoverno) para explorar ou comprar madeira de terras indígenas. Oindicativo mais recente e escandaloso deste padrão predatório deexportação florestal/madeireiro está nos resultados da operaçãoMacauã – operação de fiscalização levada a cabo pelo Ibama naAmazônia até 29-10-97: 2.802 autos de infração referentes à flora,545.763,6m³ de madeira aprendidos por extração e transporte ilegal,dos quais 48,8% em Mato Grosso, 30,1% no Pará e 16,7% noAmazonas; e 194 autos de infração referentes à fauna: 18.615 animaisresgatados vivos e 11.050 peixes ornamentais, quase todos (99%)apreendidos no Estado do Amazonas.

Em 1995 ocorreu um fato político que justifica a entradadas multinacionais, com a finalidade de atrair “empresas madeireirasda Malásia à Amazônia Brasileira: a viagem de uma delegação doGoverno do Pará à Malásia” (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 1998: 67).Porém, no conjunto das oportunidades e nas formas de atuaçãodas empresas, pouco se diferenciam, sejam elas nacionais, sejammultinacionais.

Os dados da fiscalização acima não retratam o que realmenteacontece, pois nesta região a impunidade está presente noprocesso de transformação de madeiras em todas as fases da

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acumulação, e estas vão da coleta das árvores até a venda dasmadeiras beneficiadas. Mesmo que as estatísticas apontem algumasapreensões por órgãos do governo, elas representam apenas omínimo do que aconteceu e ocorre na região somente nos últimosanos. Hoje, está ocorrendo uma maior interferência de grupos depreservação ambiental na região, que se fazem presentes em algunspontos estratégicos.

Por outro lado, os grupos econômicos posteriormente searmam juridicamente para reaver as toras apreendidas edesqualificar os processos, tornando regulares as irregularidadescometidas. Como é sabido, para alguns grupos madeireiros o custofinanceiro de investir em projetos de manejo florestal, empreservação de acidentes de trabalho e/ou trabalhar legalmente, émaior do que contratar um bom jurista para defesa nos tribunais.

É possível que os resultados apresentados pela Câmarados Deputados não demonstrem a realidade da região. Os dadosapresentados podem ser algumas dezenas de vezes superioresàquelas apreensões realizadas, isto se fossem consideradas todasas irregularidades ali praticadas na extração e na comercializaçãode madeiras. Neste sentido, o Estado do “Pará produz 65% damadeira em toras do Brasil, extraídas inclusive dos 376.188 km² deflorestas, cuja exploração é legalmente proibida (terras indígenas,terras militares e reservas da natureza)” (CÂMARA DOS DEPUTADOS,1998: 95).

O crescimento do setor madeireiro no Estado paraense ébastante acentuado; nos anos 90 era de 2.000 o número demadeireiras, “e em 1997 o número se aproxima de 3.000 empresasmadeireiras – das quais 30% inativas, mas sem cancelamento deregistro” (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 1999: 97). Um dos fatores queeleva o número de madeireiras no Estado do Pará, de 1990 até1997, com 1.000 novas empresas, é a nova investida nacional einternacional na região, devido às facilidades oferecidas pelogoverno local, que incentiva a instalação de novas empresas. Ainvestida capitalista para a extração de árvores na região é na buscado mogno; esta espécie de madeira foi a mais exportada do Brasilentre os anos 1983-2000, embora esteja ficando escassa nos últimosanos.

No Estado de Mato Grosso, segundo dados oficiais, existeum total de 1.391 indústrias de transformação de madeiras, sendo

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789 localizadas no norte do Estado e, destas, 196 no município deSinop, local da pesquisa, dados referentes ao ano de 19992 . Naregião de Sinop, a intensificação da instalação das indústriasmadeireiras ocorreu na década de 80 do século XX. Observa-se“que a partir de 1982 a quantidade de empresas efetivamenteestabelecidas em Sinop – MT, passa de 602 para 428 em 1997,uma redução na ordem de 19%, das firmas ali instaladas”3 (SOUZA,1999: 7).

O desflorestamento está presente em todas as partes daAmazônia, embora dados do Ibama estimem a produção de madeirado Brasil em 60 milhões de m³/ano, dos quais mais de 80%procedentes da Amazônia (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 1998: 125). Aprocedência das árvores é dos desmatamentos legais e ilegais,bem como dos cortes seletivos autorizados ou não, mas a maioriados projetos ali implantados é de forma insustentável.

A extração das árvores na região efetua-se por gruposeconômicos, sendo realizada através da conivência e do aval doEstado brasileiro. Porém, o número elevado de indústrias detransformação de madeiras, está ligado ao nível de desmatamentoe à entrada dos grupos econômicos que atuam na agropecuária efazem a segunda fase da expansão, já que a primeira fase é oaproveitamento econômico das árvores.

Assim, “nos Estados do Mato Grosso, Amazonas e Acre,constata-se que o desmatamento autorizado [pelo Estado]

2 Os dados se referem às empresas que possuem seu registro. Podemos observar quemuitas das empresas não fazem parte destas estatísticas. Desta forma, deduzimos aexistência de um número maior de empresas de transformação de madeiras irregulares.

3 Quanto aos dados referentes à quantidade de indústrias de transformação de madeirasinstaladas em Sinop – MT, deve-se considerar que no período de 1997 a 1999 foramdesmembrados novos municípios. Este fator leva à redução do número de indústrias detransformação de madeiras em Sinop, mas não necessariamente na região. Outro fatorque deve ser levado em consideração é a grande quantidade de empresas que estãoinativas, sem baixa em seus registros. A situação se agrava através das empresasfantasmas, criadas com a finalidade de sonegação fiscal, que são abertas somente nopapel para praticar a fraude, e em pouco tempo são abandonadas. Estas empresas,criadas por especialistas em sonegação, servem para fornecer notas fiscais para otransporte e a comercialização dos derivados de madeira e são colocadas em nome de“laranjas”. As quadrilhas de sonegação são formadas por grupos organizados paraeste fim. Além disso, os órgãos que representam o Estado são omissos e coniventespropositalmente, pois estabelecem relação de cumplicidade com a formação capitalistaestabelecida.

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corresponde a 47,82% da área desmatada” (CÂMARA DOS DEPUTADOS,1998: 126). O Estado autoriza e os grupos constituídos conseguemefetivar o desmatamento. Segundo o mesmo relatório, “na medidaem que 52,18% do desflorestamento é ilegal, aproximadamente52,18% da madeira originária do desflorestamento é extraídailegalmente” (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 1998: 127).

A influência do projeto capitalista instalado na Amazôniabrasileira denuncia o desmatamento. Este pode ser visto atravésda produção de derivados de madeira na região. Os dadosapresentados revelam que no ano de 1976, a Amazôniarepresentava apenas 14% da produção brasileira de derivados demadeiras, em 1997 representa 90% da produção, e 71,21% dodesflorestamento foi realizado na região nos últimos 20 anos(CÂMARA DOS DEPUTADOS, 1998: 129). Para o GREENPEACE (2001: 1),“em 1970 a Amazônia era responsável por apenas 12% da madeiratropical no Brasil. Hoje [2000] chega a 90% da produção de madeiratropical, estimada em 30 milhões de metros cúbicos por ano”.

Por outro lado, somente no Estado do Amazonas houve o“desflorestamento [1996] legal 8.789,83 ha - 8,59% e ilegal93.510,17 ha - 91,14%, com um total de 102.300,00 ha” (CÂMARA

DOS DEPUTADOS, 1998: 131). São estes dados que nos fazem ter acerteza da omissão e da conivência do Estado através de seusórgãos, em detrimento dos grupos organizados que representam opoder econômico e político na região. Do contrário, não estaria aregião tão vulnerável às táticas ilegais no processo detransformação de madeiras.

O setor de transformação de madeiras da Amazônia épredatório, visto que o madeireiro faz o aproveitamento das árvorespara depois instalar os grandes projetos agropecuários na região.Esta tendência pode ser observada em Sinop, a cada 10 indústriasmadeireiras que fecham, 4 novas são abertas. Elas estão mudandopara a agropecuária. Neste sentido, “a pecuária parece ser o estágiofinal para a paisagem de grande parte da Amazônia” (UHL, BEZERRA

e MARTINI, 1997: 22). A outra parte das terras é reservada para aagricultura, através da monocultura da soja, quase em suatotalidade.

Desta forma, os grupos organizados desmatam de maneiracontínua. OLIVEIRA (1997, 12) orienta:

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AMAZÔNIAcom a mesma sanha com que devastaram as florestas do EspíritoSanto e Sul da Bahia à procura de jacarandá, ou o estado do Paranáà procura de araucária. Este processo de devastação anda “de braçosdados” com a expansão da pecuária na região, pois costuma-sedizer por lá entre os madeireiros que eles são os “soldados” dospecuaristas.

Efetiva-se o desmatamento através do projeto capitalistaem cadeia: no primeiro momento, a retirada das árvores, e nosegundo, a formação da agropecuária extensiva, por meio dasmonoculturas. As etapas são definidas pelas necessidades dasoperações e o modo de expansão dos projetos. Os limites e asformas da devastação são definidos pelas necessidades daexploração das árvores na região, bem como no aproveitamentoeconômico das áreas que farão parte do futuro empreendimentoda agropecuária. Os objetivos não fogem da finalidade de atingiras metas e os propósitos do capital, que buscam aproveitar asalternativas de lucro para a acumulação.

As empresas madeireiras permanecem com suas atividadesna região amazônica, e para que isso ocorra, basta deslocar-separa locais ainda não devastados. A indústria madeireira cede lugaraos projetos agropecuários e o Estado oferece toda a estruturanecessária no novo local dos projetos. Este fato pode ser visto comas indústrias madeireiras de Sinop e região, quando muitas destasempresas estão se deslocando para Novo Progresso, no Estadoparaense, às margens da BR-163, e desta forma o ciclo de produçãoe acumulação continua de forma predatória.

Este processo é facilitado, visto que poucos investimentossão usados na construção das instalações das empresas, e pelafacilidade de deslocar a força de trabalho para os novos locais daprodução. Por isso se formou na região uma grande quantidade deexército industrial de reserva disponível e de fácil transferência,vista a marginalização dessa força de trabalho Além disso, essamão-de-obra do setor não exige qualificação alguma a estestrabalhadores, basta a força física para desempenharem asatividades do dia-a-dia com eficiência.

O extrativismo não é realizado com práticas de manejoflorestal adequadas, que retira as árvores maduras e tem cuidadospara não danificar as árvores jovens. Se fossem usadas práticasadequadas, poder-se-ia minimizar um pouco a destruição e não

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haveria a necessidade de deslocar empresas e a força de trabalho.Também estariam oportunizando aos povos nativos formas desubsistir com tranqüilidade e o processo de transformação demadeiras seria para sempre.

Neste sentido, fica clara a vocação da Amazônia brasileiraem servir ao mercado internacional ao longo dos tempos. Aprodução madeireira serve hoje, na maioria das vezes, ao mercadointerno do País, mas o projeto da região é a agropecuária paraexportação que contraria a lógica de servir apenas ao mercadoglobal. Este é um dos motivos por que as madeireiras, emboratenham altas taxas de lucratividade, façam apenas o aproveitamentoeconômico das árvores. Esta é primeira etapa do processoprodutivo, para depois introduzir a agropecuária expansiva.

Os capitalistas instalados nesta região não vislumbramalternativas no aproveitamento das matas, a não ser a depredaçãoda natureza e a superexploração da força de trabalho. Estes gruposorganizados buscam a concentração através do imediatismo e nãoobjetivam um projeto madeireiro de longo prazo. A extração damadeira da floresta tropical é vista como uma alternativa empresarialmomentânea e serve para efetuar apenas o aproveitamentoeconômico da floresta. Isso contribui para o aproveitamento dasárvores antes da derrubada das matas, e para o fenômeno daqueimada para fins agropecuários.

Estrategicamente a região é atraída pela lógica do capitalpara ali implantar grandes projetos com vinculação na agricultura ena pecuária, pois estes objetivam as monoculturas, principalmenteda soja e do boi, para a exportação. Demonstra-se assim, que aAmazônia brasileira objetiva seus produtos ao mercado mundial eque a devastação regional está ligada à colocação dos seusprodutos no mercado externo. O que determina a produção e aforma de produzir são as exportações dos produtos para servir aomercado mundial. Se a região está sendo devastada em nome destecomércio, isto se deve aos países centrais com maior poder decompra, pois são estes que determinam o grau de devastação pelocomércio e sua interferência direta como exploradores na região.

O projeto capitalista pretende extrair mais-valia da força detrabalho e, ao mesmo tempo, exaurir as riquezas florestaisdisponíveis para formar os lucros empresariais. O que constatamosnesta região é que, retirando ou não as árvores paraaproveitamento econômico das madeiras, a devastação acontece

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da mesma forma. Nos projetos agropecuários, o chamado “pé deboi” e o “grão de soja” se encarregam de fazer o desmatamento davegetação nativa, pois nestes empreendimentos necessita-se cortara totalidade da vegetação e depois colocar fogo para espalharsementes de pasto ou destocamento e preparo do solo para o plantiodos grãos de soja. A produção da agropecuária tem espaçogarantido nas exportações, e este é exatamente o ponto-chave daentrada de grandes capitais na região: servir ao mercado externo.

Assim, “dos 400 milhões de hectares da floresta amazônicaoriginal, estima-se que 150 milhões de hectares sofreram alteraçõesmais ou menos graves, dos quais 53 milhões de hectares com danosirrecuperáveis por desmatamento; 37,7 milhões de hectares delesdesmatados nos últimos 20 anos” (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 1998:195). Nesta perspectiva, podemos afirmar que “a Amazônia estátransbordando vida. Porém, as atividades humanas estão cada vezmais em conflito com a saúde e a longevidade dessa vida natural”(UHL, BEZERRA e MARTINI, 1997: 1).

As madeireiras da Amazônia brasileira, no atual estágio dedesmatamento, são as principais causadoras da interferência dohomem no meio ambiente local, pois elas chegam primeiro, paradepois se instalarem os projetos agropecuários de forma definitiva.Embora o processo revele os interesses econômicos nas váriasetapas da investida capitalista através da devastação, o projetocapitalista instalado na região com empresas nacionais etransnacionais não contempla formas de manejo sustentável, e nemas estruturas sociais e econômicas da sociedade que ali vive. ACÂMARA DOS DEPUTADOS (1998: 197-98) conclui que:

o padrão de atuação da indústria madeireira na Amazônia é altamentepredatório; este padrão é comparado e praticado pelas empresasestrangeiras inclusive, as asiáticas já instaladas, cuja presençalevanta temor de que não apenas acompanhe o padrão predatórioatual, mas possa, pela sua capacidade tecnológica, densidade decapital e controle de mercado internacional, exacerbar o que já épredatório e superdimensionar os danos ambientais (...). Quatroconceitos fundamentais suportam as propostas e sugestões daComissão: 1 – a floresta amazônica é patrimônio nacional, conceitodefinido pelo artigo 225 da Constituição Federal; 2 – a florestaamazônica, independente de cadeias dominiais, de posse oupropriedade, é um bem público cuja ocupação, uso e exploraçãoestão sujeitos à autorização e controle do Estado; 3 – a florestaamazônica é um recurso natural não renovável, quando explorada

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AMAZÔNIAirracionalmente, e como bem comum da humanidade seu padrãode ocupação não pode estar sujeito à lógica exclusivista de interesseprivado; 4 – a floresta amazônica, como parte do território brasileiro,está sujeita à inalienável soberania nacional, exercida com asabedoria que respeite o compartilhamento dos seus serviçosambientais por toda a humanidade.

A devastação e os interesses dos grupos econômicosinstalados na região afastam cada vez mais os colonos, os posseiros,os povos originários, os “sem-terra” e a população de forma geral,do acesso ao “mel”4 . O pote dourado, a cada dia que passa,distancia-se mais dos despossuídos e marginalizados da região edos que chegam no intuito de alcançar a doçura tanto almejada.Por outro lado, a natureza, sendo destruída, possivelmente diminuidas massas, as chances de tomarem posse do produto querepresenta o sonho para chegar a esta realidade. O “mel” podeestar sendo transportado para lugares do além-pátria, pois apirataria está conseguindo aos poucos tirar toda e qualquerpossibilidade de vida vegetal e animal na região. Mesmo assim, ohomem sofrido continua sob o sol tropical da região em busca do“mel”, como forma de livrar-se da lógica imposta pela acumulação.

4 A busca do “mel”, bem como o encontro com este doce dourado, é uma metáfora usadaao longo do texto para demonstrar que as pessoas que se deslocam para a Amazôniabuscam um sonho. Mesmo aos marginalizados e despossuídos no processo histórico, aregião apresenta-se como um novo “eldorado”, e este veio acompanhado de muito brilhoe luz intensa. Assim, o “mel” representa o alimento, a riqueza e a esperança de uma novavida a todos os que chegam com o firme propósito de ver seus sonhos realizados. Ametáfora que passamos a utilizar neste livro, também foi muito útil no livro “Amazônia: domel ao sangue – os extremos da expansão capitalista” (PICOLI, 2004a: 16 e PICOLI,2004b: 11).

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OS INCENTIVOS GOVERNAMENTAIS AOSCAPITALISTAS DO SETOR

Através da política de colonização e da necessidadecapitalista em colocar a Amazônia no mercado mundial, o Estadocria mecanismos de estímulo à acumulação privada, através dosincentivos fiscais. A Sudam, órgão vinculado ao Ministério doInterior5 , criada em 1966 com a finalidade de planejar, coordenar,orientar, executar e promover a ação federal na região amazônicabrasileira, é determinante para incentivar a ocupação por parte dosgrupos econômicos nacionais e internacionais. A sua criação surgiuda tentativa de revigorar o Plano de Valorização da Amazônia criadoem 1953, mas com mecanismos direcionados para promover aexpansão da empresa privada com recursos do próprio Estado, nogoverno da ditadura.

Os órgãos que iriam servir para incentivar a ocupaçãonasceram com as seguintes funções: ampliar a rede de transportese comunicação; ordenar o povoamento e a colonização; incentivara agricultura e a pecuária; fazer o reaparelhamento das indústriasexistentes e a criação de novas; incentivar mecanismos para asexportações; dar condições sanitárias, de educação e habitação.Com estas estratégias, criaram mecanismos para viabilizar a

5 No ano de 1990, a Sudam, através do Plano Collor, passou a ter vínculo com o Ministérioda Infra-Estrutura. A área coberta pela sua ação de 5.029.232 quilômetros quadrados,corresponde a cerca de 60% do território brasileiro, embora possua o menor índicedemográfico do País (SANDRONI, 1994: 340). O órgão foi extinto através de medidaProvisória nº 2.157-5 de 24 de agosto de 2001. Em seu lugar foi criada a Agência deDesenvolvimento da Amazônia – ADA. Esta estratégia foi para minimizar os escândalosde desvio do dinheiro público do órgão e a pouca aplicação na região, pois uma grandeparcela destes recursos destinados foi desviada de sua verdadeira função, através docrime organizado na política brasileira.

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concentração econômica através da expansão dos gruposorganizados e colocar a região à disposição do mercado mundial.

Foram criados vários programas para a região, sendoacompanhados e controlados pelo Estado em conjunto com ocapital, através de um projeto de expansão conjunto e articulado.Foi através dos incentivos fiscais que se efetivou a transferênciados grupos econômicos para a região, pois este era o diferencialpara facilitar a acumulação. O projeto Sudam foi criadoexclusivamente para beneficiar o grande capital, que efetivou aacumulação na região, por meio da expansão da nova fronteira.

Aos pequenos produtores do extrativismo e da agropecuárianão foi concedido este benefício, pois esta vantagem foi prevista earquitetada somente aos grandes grupos organizados, querepresentavam o poder econômico e político no Brasil. O órgão foicriado para “exercer a política financeira de incentivos fiscais paraa Amazônia” (SOUZA, 2002: 208). PORTELA e OLIVEIRA (1991: 24) noscertificam:

a Sudam foi criada em 1966 para atrair capitais e empresas para aregião amazônica, visando o seu desenvolvimento. No entanto, odinheiro dos incentivos fiscais não foi totalmente aplicado, sendodesviado, em muitos casos, por empresas do Centro-Sul do paísque se comprometeram a investir na região. Além disso, muitascompanhias que se apossaram de terras incentivadas pela Sudamacabaram se envolvendo em conflitos com posseiros, pois adquiriramterras já ocupadas. Até 1984, a legislação brasileira previa que asempresas que não cumprissem as exigências da Sudam, após orecebimento dos incentivos fiscais, teriam de devolver os incentivosao Tesouro Nacional sem juros, nem correção monetária. Isso querdizer que o dinheiro seria devolvido como se fosse de 1970. O cruzeiro,como todo mundo sabe, foi uma das moedas mais desvalorizadasdo mundo. O ganho das empresas que legalmente “devolveram” osincentivos atingiu uma porcentagem fantástica.

Esta nova estratégia de promover a expansão na novafronteira da agropecuária, do extrativismo e da industrialização daregião nasceu principalmente a partir de 1964 através do golpe deEstado brasileiro, como vimos anteriormente. O poder nacionalpassou às mãos do grupo militar, impondo o regime ditatorial e secriaram então, os mecanismos para expansão capitalista naAmazônia. Foi a ditadura da burguesia que se instalou no Paísatravés do capital nacional, estrangeiro e associado. Estes grupos

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já dominavam “a vida econômica e política brasileira desde muitasdécadas antes de 1964. Em especial, durante o governo doPresidente Juscelino Kubitschek de Oliveira de 1956 a 1960” (IANNI,1986: 35).

Neste período, “o governo de Kubitschek representava aburguesia cosmopolita do Brasil, interessada na industrialização aqualquer preço” (MONIZ BANDEIRA, 1978: 391). Porém, na nova faseda expansão dos militares, os incentivos governamentais tiveram afinalidade de promover a ocupação da Amazônia e foram oferecidoscom mais eficiência depois de 1966. Esta foi a dinâmica encontradapara contemplar e beneficiar o grande capital nacional einternacional, que sustentava politicamente a ditadura.

Impulsionado por esta lógica, o capital transnacional tinhacomo grande meta sua fixação nos “países do Terceiro Mundo queconstituem o elo mais débil da corrente de exploração planetáriana hierarquia do poder internacional” (CHOMSKY e DIETERICH, 1999:97). Neste novo espaço de expansão os acumuladores utilizam-sedo Estado, e assim passaram a beneficiar-se de “suas própriasestruturas estatais no apoio à acumulação” (WALLERSTEIN, 2001:51).

Neste sentido, sob a ditadura do Estado brasileiro, abriram-se as fronteiras da Amazônia ao capital, com a imagem de estarrealizando a reforma agrária, via assentamentos agropecuários aospovos marginalizados e despossuídos do País. Foi através datransferência dessas massas que passaram esta visão, quando naverdade a maioria dos atores que migraram foram oxigenar osgrandes projetos econômicos, através de sua força de trabalho etornarem-se proletários por meio da ordem sistêmica imposta naregião.

Além disso, serviram de base e estrutura de trabalho nascidades planejadas, como também deram estrutura ao sistema deconcentração econômica na região de modo geral. Neste período,deslocou-se para a região o maior volume de exército industrial dereserva flutuante de que temos conhecimento no País. Em 1960,na Amazônia Legal brasileira existiam pouco mais de 3.6 milhõesde habitantes, em 1996 havia em torno de 18.7 milhões dehabitantes e em 2004, a população da região ultrapassou a casados 22 milhões de habitantes.

Podemos resumir as estratégias do Estado brasileiro paraocupação da Amazônia nos últimos cinqüenta anos, através de

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quatro períodos, tais como: de 1946-1964: política de valorizaçãoda Amazônia; de 1965-1984: política de integração nacional; 1985-1994: política de integração com ressalvas ambientais; a partir de1995: política de globalização da Amazônia. Nas últimas cincodécadas efetivou-se o plano de internacionalização e abertura aomercado mundial, tornando a região mais integrada ao mercadoexterno e menos integrada ainda ao mercado interno, econseqüentemente, aos brasileiros.

Os incentivos fiscais aplicados na Amazônia passaram aefetivar uma contra-reforma agrária no País, pois entre 1950 e 1960,864,6% das terras da Amazônia eram ocupadas porestabelecimentos agrícolas com menos de 100 hectares. Entre 1960a 1970, apenas 35,3% das terras pertenciam aos estabelecimentoscom menos de 100 hectares. No ano de 1975, efetivou-se aconcentração da terra, pois 99,8% das áreas passaram a mãos deestabelecimentos com mais de 100 hectares, e cerca de 75% destaspara estabelecimentos com áreas acima de 1.000 hectares (MARTINS,1995: 97).

Através dos incentivos oferecidos pelo Estado, ocorreramna prática a concentração da terra, o empobrecimento das massase a expropriação da terra dos indígenas e dos posseiros, bem comoo não acesso aos que chegaram em busca da terra e do trabalho.Este fato veio a agravar o processo de marginalização daquelesque, no processo histórico, buscam a terra e o trabalho para finsde subsistência. Enquanto isso, ocorreu o processo de transferênciae implantação dos grupos econômicos ali constituídos, ou paraconstituírem a expansão e a concentração. Efetivou-se oempobrecimento e a marginalização das pessoas e,conseqüentemente, a proletarização dessas massas oprimidas.MARTINS (1995: 96-97) explica assim o fenômeno:

a grande extensão disponível seria justamente a da região amazônicado Centro-Oeste, sobretudo Mato Grosso. Essa única válvula dereforma agrária, no entanto, foi em grande parte fechada apenasdois anos após a promulgação do Estatuto, quando o governo federalestabeleceu uma política de subsídios para estimular aimplementação de empresas industriais e agropecuárias na regiãoamazônica. Por meio dela, as empresas são estimuladas a deixarde pagar metade do imposto de renda, sob condições de aplicá-lana implantação de outras empresas naquela área. Assim sendo, amesma região que o estatuto destinava formalmente à ocupação

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AMAZÔNIApelos camponeses deslocados das regiões onde exercia seu efeitoconcentracionista passou a ser destinada também aos grandesgrupos econômicos, além do mais estimulados pelos incentivosfiscais. Além da parte de capitais próprios nessas novas empresasconstituir apenas um quarto do total, freqüentemente esse quartoestá sobrestimado mediante superavaliação do preço da terra e outrositens do capital próprio. Basicamente, a sociedade inteira subsidiaos grandes grupos econômicos nesse deslocamento geográfico,privando-se dos impostos que seriam destinados a bens e serviçospúblicos. Enquanto isso, não há qualquer política de subsídio paraos camponeses instalados nessas mesmas áreas.

O governo da ditadura buscava empréstimos estrangeirospara dotar a região de infra-estrutura, facilitando a penetração daseguinte forma: construção de rodovias, usinas elétricas,aeroportos, redes de comunicação, entre outros. As pessoasjurídicas com propostas para realizar projetos na região receberiamdeduções do imposto de renda a ser pago. Enquanto isso,marginalizavam os “sem-terra” e os povos das florestas, masestimulavam e beneficiavam o grande capital. Através desta iniciativa,foram criados pólos na agricultura, na pecuária, no extrativismoflorestal e no extrativismo mineral.

Esta forma encontrada foi estratégica para a ocupação dosespaços geográficos pois ao mesmo tempo beneficiava empresasinteressadas na acumulação capitalista que sustentavam a políticados governos militares, principalmente no período da ditadura, quevai de 1964 até 1985.

Neste sentido, “Sinop é um município que foi colonizado soba ordem da colonização privada, beneficiada com os incentivosfiscais federais da Sudam” (SOUZA, 2001: 222). Entendemos queSinop é um exemplo que não ficou somente nos benefíciosrecebidos para formação da cidade como núcleo da produção edas forças produtivas; mas foi, também, construída pelo Estadobrasileiro para servir de centro do capital monopolista na regiãonorte mato-grossense.

O projeto capitalista para a região consolidou-se atravésdas forças políticas e econômicas, ficando assim o Estado viaditadura, completamente submetido e a serviço do grande capitalmonopolista. Os pequenos e médios empreendimentos nãoreceberam qualquer tipo de incentivos fiscais ou de crédito (ARIMA

e UHL, 1996: 23). O plano de expansão não foi elaborado para

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assistir os pequenos agropecuaristas na nova investida, pois oprojeto capitalista implantado na região foi para beneficiar a grandeempresa, e contemplava poucos recursos aos pequenos e médiosprodutores rurais. A estes proprietários foi incumbida a tarefa deservirem de força de trabalho, dando suporte aos projetos aliinstalados através da superexploração do trabalho; esta foi aestratégia do Estado e do capital em conjunto, pois estes visam àconcentração de capitais e ao domínio econômico, político e militarna região, por meio das elites dominantes do país e do exterior.

As estratégias nascidas em função das iniciativas do Estadopara efetivar a ocupação da região amazônica foram uma forma deconsolidar um projeto de expansão articulado pelas forçaseconômicas e governamentais, por meio das forças militares, compráticas de violência física, moral e psicológica. Neste entendimento,podemos “constatar como ocorreu a internacionalização crescenteda economia do país, e no caso particular da Amazônia, como istodeterminou a execução de um dos maiores projetos dedesenvolvimento do mundo capitalista dependente – o ProgramaGrande Carajás6 “ (KOWARICK, 1995: 21). Este é o objetivo maior,tornar a Amazônia integrada ao mercado mundial e fazer oaproveitamento do grande potencial natural ali existente, atravésdas concessões do Estado aos detentores do poder.

No processo de ocupação das empresas beneficiadas pelosincentivos fiscais do Estado, elas passaram a representar, de 1966até o final de 1985, no final da ditadura militar brasileira, um volumeelevado de projetos agropecuários e extrativistas na Amazônia

6 O Projeto Carajás é o maior projeto de exploração mineral do mundo, sendo formadocom participação de capital estrangeiro, do Estado e de empresas privadas brasileiras.O projeto localiza-se numa região cortada pelos rios Araguaia, Tocantins e Xingu,abrangendo terras do sul do Pará, de Tocantins e do Maranhão. É uma área de grandepotencial para instalação de hidrelétricas, coberta por uma consistente floresta comárvores de qualidade para o extrativismo, sendo uma área muito rica em minérios, comjazidas de ferro, com estimativa de 18 a 20 bilhões de toneladas, sendo 66% de alto teor,sendo possível suportar 400 anos de exploração intensa. Existem também jazidas decobre, estanho, ouro, alumínio, manganês e níquel. O projeto, além de aproveitar osrecursos minerais e extração dos recursos florestais, também utiliza os recursosenergéticos, hídricos e agrícolas. O projeto conta com a Ferrovia Carajás, com 890quilômetros (concluída em 1984), e a hidrelétrica Tucuruí, no rio Tocantins, comcapacidade de 550 a 780 quilowatts de energia (SANDRONI, 1994: 288-89).

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Legal. Mesmo sendo a marca da ditadura a distribuição de dinheiroaos grupos econômicos, esta estratégia é adotada atérecentemente.

PROJETOS INCENTIVADOS PELOS RECURSOS DA SUDAM ENTRE1966 E 2001 NA AMAZÔNIA LEGAL.

Fonte: Elaboração própria com base na Sudam (2001).

Segundo a própria Sudam (2001), de 1966, época decriação do órgão, até 25/9/2001, foram distribuídos R$10.684.474.105,07, e este montante foi destinado aos projetosaprovados nos nove Estados da Federação que compõem aAmazônia Legal brasileira. Deste montante de dinheiro destinadoao desenvolvimento da Amazônia, pouco foi investido na região,pois o principal objetivo do órgão foi beneficiar grupos econômicose políticos que sustentam o projeto capitalista brasileiro, e poucaimportância foi dada à aplicabilidade do dinheiro público nos locaisdestinados ao desenvolvimento da Amazônia. Tudo não passou deuma grande farsa, pois o objetivo era extorquir e desviar o dinheiropúblico, por meio das influências das elites na política e na economiabrasileira.

Neste episódio, dois exemplos de corrupção movimentaramrecentemente a nação brasileira com acusações de desvio de verbasda Sudam que envolveram altos personagens da política brasileira.Na metade de 2001, o senador e presidente do Senado JaderBarbalho foi obrigado a renunciar ao cargo sob pena deimpeachment por acusações fraudulentas pelo Ministério Público.Através da intervenção no órgão em 2001, constatou-se o desviode 1,7 bilhões de reais, e pesa sobre Jader e pessoas ligadas àfamília, políticos e empresários de suas relações, graves suspeitase acusações de irregularidades nos projetos destinados aodesenvolvimento da Amazônia, via recursos da Sudam. Para BORTONI

e MOURA (2002: 69), “as fraudes na Sudam podem chegar a 2 bilhõesde reais”.

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O processo tramita no Ministério Público e na Polícia Federal,e estes apontando indícios e provas que qualificam o senador comoo principal envolvido no desvio das verbas. O fato foi amplamentedivulgado na imprensa brasileira, pois o referido Senador é um dosprincipais políticos do Estado do Pará, e na última década foramdelegados amplos poderes para intervir na região amazônica viaprojetos da Sudam, bem como para indicar as chefias deste órgãoe decidir sobre a aprovação ou não dos projetos.

No governo “Fernando Henrique Cardoso, a Sudam semprecoube ao cacique paraense Jader Barbalho, ex-ministro, ex-senador,ex-governador e ex-presidente do PMDB. Era ele que indicava ossuperintendentes” (BORTONI e MOURA, 2002: 54). Contudo, em 2002foi eleito deputado federal pelo Estado do Pará através do votopopular, e até o momento as denúncias não foram apuradas natotalidade. É possível que o episódio não chegue a ser esclarecidona sua íntegra, pois, assim, as estruturas continuam e o povobrasileiro continuará fazendo o papel de expectador passivo.

Outro fato desta natureza, com graves denúncias na região,envolveu a ex-governadora do Estado do Maranhão, RoseanaSarney, que em 2002 foi eleita senadora da República. Ela é filhado ex-presidente da República José Sarney, que é hoje tambémsenador representando a região. Pesa sobre ela e seu marido JorgeMurad, ex-gerente de Planejamento do Estado do Maranhão, aacusação de desvio de R$ 44 milhões de reais provenientes deprojetos com recursos da Sudam. A empresa Usimar ComponentesAutomotivos recebeu o montante citado, mas o projeto não saiu dopapel.

Neste sentido, vasto material com indícios de envolvimentoforam apreendidos pela Polícia Federal na empresa Lunes, tambémde propriedade de Roseana e Murad. Os documentos apreendidosforam anexados ao processo de denúncia, formalizado peloMinistério Público (Jornal o Estado de São Paulo, 7/4/2002).

Podemos citar vários outros escândalos no órgão, mas osdois apontados demonstram o grau e as proporções de indícios decorrupção e fraudes na distribuição de dinheiro público e quemsão os proponentes dos atos intrigantes que ocorrem na região.Mesmo que as denúncias ainda não tenham sido esclarecidas, epossivelmente nunca serão, fatos desta natureza demonstramrealmente como é o projeto capitalista introduzido na Amazônia.Nesta investida econômica, política e militar ocorrida principalmente

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a partir de 1964, e através da expansão capitalista, desenvolveu-se a sanha desvairada da lógica da acumulação de qualquer forma.O projeto ali implantado, além de ter o controle e o monopólio daterra, também explora e superexplora a força de trabalho, bem comoas outras formas de produção que são colocadas à disposição dosgrupos políticos e econômicos através do Estado.

Estes indivíduos citados são exemplos de administradoresque controlam a região através do poder governamental, impondoseu comando e determinando as regras do jogo capitalista de poder,através do planejamento e das estratégias que oprimem os jádespossuídos e marginalizados povos da Amazônia. Colocam à suadisposição o poder governamental com a finalidade de extorquirpara si os benefícios direcionados aos problemas sociais dasmassas e determinam o aniquilamento do Estado e a exclusão socialdas pessoas através dessas atitudes. É força e o poderdeterminando a forma de acumulação, sem a participação dostrabalhadores, via produção de mercadorias e exploração da forçade trabalho.

Esta atitude contradiz a lógica da acumulação, pois ela saido processo produtivo e da forma tradicional de concentrar riqueza,mas acontece através do desvio do dinheiro público. Possivelmenteestes fatos fiquem somente no campo das acusações, pois é muitodifícil que se chegue ao final de um processo no Brasil, quandoenvolve altos figurões da política e da economia, e assim aimpunidade continua fazendo a diferença no País. No entanto, ospresídios do Brasil estão superlotados de ladrões de galinhas, poisestes são qualificados na forma da lei e considerados culpados porseus atos previstos na legislação.

Por outro lado, a extinção da Superintendência doDesenvolvimento da Amazônia e a criação da Agência deDesenvolvimento da Amazônia – ADA, em 2001, são uma formapolítica de omitir e camuflar a problemática do desvio dos recursosprovenientes do órgão. O desgaste da autarquia deve-se aosabusos políticos e econômicos das administrações nos mais de 30anos prestando benefícios e privilégios aos grupos organizados doPaís. A troca de nome de Sudam para ADA nada muda, pois osobjetivos continuam os mesmos, promover o desenvolvimento daAmazônia através dos projetos econômicos capitalistas e com aassistência do Estado brasileiro.

A troca de nome do órgão é uma maneira de camuflar os

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escândalos ocorridos, um modo bem tradicional de preservar osinteresses da elite beneficiada e efetivar, na prática, a impunidade.A estratégia foi colocar a culpa no órgão e puni-lo com sua extinção,porém a má versão do dinheiro público é função dos homens queadministraram, orientaram e controlaram esta autarquia em nomedo capital.

A função verdadeira do órgão foi promover odesenvolvimento da região através da via capitalista. A estratégia éfornecer recursos aos projetos e colocá-los em prática, além dereceber incentivos financeiros; foi colocada toda a estrutura parafacilitar seu funcionamento, o desvio do dinheiro público tornou-seuma alternativa a mais de concentrar riqueza. Por outro lado, estesprojetos formam um grande complexo de exploração dos recursosnaturais, destacando-se os de exploração de minérios,agropecuários e industriais, principalmente de transformação demadeiras.

Além do elevado número de projetos implantados noperíodo, podem ser ponderadas as proporções e as interferênciasna região através da concentração da terra e a posse dos recursosnaturais existentes. Contudo, “urge uma avaliação dasconseqüências de mais este grandioso projeto destinado a ‘salvara pátria’, mas que na verdade enriquece pátrias de além-mar egrandes bilionários do mundo” (KOWARICK, 1995: 105).

Assim, nasceu o Projeto Jari7 , o maior investimento realizadona Amazônia brasileira. Segundo CARNEIRO (1988: 31-32), foi

7 Segundo SANDRONI (1994: 289), o Jari é um dos maiores projetos do mundo e foiidealizado por uma empresa privada. Isto demonstra a intervenção internacional naAmazônia nas últimas décadas. É considerado símbolo de maior privilégio ao capitalestrangeiro no período pós-64. O projeto começou suas atividades em 1966 através doscontatos entre o ex-ministro Roberto Campos e o empresário norte-americano DanielKeith Ludwig. Este complexo empresarial conta com 12.000 quilômetros quadrados,delimitando-se a leste pelos rios Jari e Cajari, afluentes do rio Amazonas, a oeste comoutros afluentes, o Peru, e ao sul pelo próprio Amazonas. Ao norte o projeto encontraterras devolutas da União que se estendem até o Suriname. A exploração é feita pelascompanhias Jari Florestal e Agropecuária e a empresa de Comércio e Navegação JariLtda. O principal investimento é a instalação de uma fábrica de celulose no porto fluvialde Mangaba, com capacidade de 750 toneladas diárias de pasta de papel, destinandosua produção total para exportações à Europa e aos Estados Unidos, sendo o extrativismoflorestal o maior projeto do empresário americano entre outros investimentos realizadosna região.

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implantado por iniciativa do milionário estadunidense Daniel KeithLudwig, a quarta maior fortuna do mundo, ao lado de HawardHughes, Jean-Paul Getty e Calouste Guilbenkian. Ludwig, umsolitário idealizador com a idade de 70 anos em 1966, no início doprojeto Jari, e ano da criação do projeto Sudam, vislumbrou grandesinvestimentos na região com incentivos e apoio do Estado.

A maioria destes projetos com incentivos do governonasceram para produzir mais miséria para a região, que, ao invésde estarem assentando famílias, desapropriam e produzem aviolência. As vítimas da investida capitalista são as áreas dos povosoriginários, dos posseiros e dos pequenos proprietários das terras,bem como áreas de preservação ambiental e militar. Os empresários,através dos incentivos fiscais à sua disposição e uma grandequantidade de exército industrial de reserva que migrou de outrasregiões do País, conseguem se reproduzir economicamente naAmazônia brasileira, tendo à disposição os recursos naturais e aestrutura necessária para efetivar a concentração da riqueza.

Através dos recursos financeiros oferecidos pelo Estado,os seus benefícios são econômicos, proporcionados pelo plano deexpansão; em contrapartida, marginalizam e oprimem grande partedos brasileiros, formando um elo de desigualdade na região. Acriação e a presença destas empresas representam mudançasconsideráveis, no que diz respeito à estrutura capitalista e àformação econômica regional. Neste sentido, é possível ainternacionalização da Amazônia ao mundo do capital, que evoluino que tange à produção de carne, à produção de grãos, àprodução de minérios e à fabricação de produtos derivados dasflorestas, produtos estes que fazem parte da estratégia demundialização da região, produzir para servir ao mercadointernacional.

Por outro lado, enquanto o Estado contempla aqueles que,por tradição, foram sempre privilegiados por inúmeros favores ebenefícios, os verdadeiros representantes da Amazônia, os povosdas florestas, ficam sem assistência e expropriados das suas terras.Os benefícios lhes são negados, pois não fazem parte do grandeprojeto ali instituído, que foi arquitetado com a finalidade dereproduzir a lógica da acumulação capitalista. São instaladas naregião as formas de produção através do aparelho estatal, e estesagregados conseguem determinar os limites das forças produtivase a exclusão do homem e do seu ambiente.

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As massas, além de não estarem incluídas no projeto geral,ficaram à margem do acesso à terra, sendo expropriadas noprocesso histórico, quase sempre de forma violenta e repressiva,tornando-se parte do exército industrial de reserva. Elas desistemda busca da terra como meio de subsistência para si, sua família eseu grupo, sobrando como única alternativa a proletarização e ainformalidade. Muitos desses despossuídos e marginalizados servempara dar estrutura e suporte às cidades organizadas pelo capital,outros foram totalmente marginalizados e colocados fora doprocesso produtivo.

Na Amazônia, criou-se uma nova formação detrabalhadores, que pode ser identificada da seguinte maneira: deexpropriados a marginalizados, de marginalizados a explorados, deexplorados a superexplorados. Isto é possível na região através dapresença dos grupos econômicos, impulsionados pelos incentivosfiscais do Estado e pela forma capitalista organizada implantada naregião. Trata-se do capitalismo de centro, que transfere suasestratégias para o capitalismo periférico. Os limites da exploraçãopassam a ser regidos por meio do exército industrial de reserva,que é formado na região através da engenhosa fórmula que apurao processo de mais-valia.

Nesta perspectiva, um único projeto econômico beneficiadopelos incentivos fiscais expulsa da terra centenas e até milhares depessoas. Para o Estado, coube a tarefa de reprimir as massas, nãoatendendo às reivindicações e aos anseios dos marginalizados, epassando a considerá-los sem nenhum valor, visto estar a serviçodos grandes conglomerados nacionais e internacionais organizadosde forma econômica e política. Através dos incentivos fiscais, atingemos objetivos propostos, tanto os capitalistas como o Estado, esteúltimo a serviço da burguesia, dando apoio e tratamentodiferenciado, sustentando os projetos de expansão.

Neste sentido, “a atual ocupação da Amazônia deriva deum modelo de desenvolvimento desigual, onde madeireiros,pecuaristas, garimpeiros e comerciantes acumulam riqueza” (UHL,BEZERRA e MARTINI, 1997: 29), e, para o restante da população, nãoresta outra alternativa, apenas se aprofunda cada vez mais oprocesso de marginalização. O projeto implantado na Amazôniabrasileira, com auxílio dos incentivos fiscais, consegue implantarcom sucesso o modelo de expansão capitalista em detrimento dasmassas. As estratégias e as formas utilizadas na expansão

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consolidam os objetivos propostos pela lógica sistêmica e tornam aregião, área de livre acesso ao capital mundial e,conseqüentemente, aberta a este mercado.

Desta vez o Estado limita as pretensões das massasconseguirem chegar ao “mel”. A tirania da ditadura com os oprimidose marginalizados desvia o local da busca do “mel”, fazendo prolongaras expectativas de um dia encontrá-lo. Enquanto isso, mostra àelite burguesa os caminhos da busca através de tratamentodiferenciado. Contudo, deixa claro a todos que é possível encontraro cobiçado produto. Os que fracassarem na busca, são colocadoscomo únicos culpados, afinal, todos tiveram a oportunidade deconseguir chegar à taça sagrada, mesmo em condições desiguais.Contudo, o “mel” existe, é possível encontrá-lo, mas é preciso termuita paciência e empenho na sua procura. Nesta lógica, a vidatenta seguir...

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A ESTRUTURA CAPITALISTA DO SETORMADEIREIRO

Com o entendimento do processo de ocupação da regiãoatravés dos incentivos fiscais, torna-se mais fácil entender omovimento de acumulação madeireiro. Neste sentido, o significadoeconômico da floresta amazônica brasileira atrai a especulaçãonacional e a internacional. A motivação e o interesse sãoproporcionados pelo fato de que “o Brasil é o único país do mundoque tem uma vasta área coberta por uma floresta tropical e quenão tem uma política florestal definida” (CÂMARA DOS DEPUTADOS,1998: 39).

É preciso ponderar a tese de que o Brasil não tem umapolítica federal que venha contemplar as florestas tropicais, mesmocom leis que coíbam a devastação e o desvio de recursos. O Paístem a política do grande capital, e a devastação na Amazônia,corresponde ao projeto ali implantado e às formas de apoiorecebido. Um projeto que apresenta objetivos claros e bemdeterminados: sugar os recursos naturais florestais, com a finalidadede obter lucro de forma exponencial, tendo como único beneficiárioo capital, através dos projetos econômicos. Isto torna o setor detransformação de madeiras a representação de uma próspera formade economia da Amazônia brasileira, através da expansão viaextrativismo florestal.

Os grupos econômicos da indústria madeireira conseguemtransformar a paisagem da região, bem como tornar possível agrande produção para o mercado interno e para a exportação.Segundo a CÂMARA DOS DEPUTADOS (1998: 96):

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AMAZÔNIAem 1996 o Pará participou com 27,0% do valor de exportaçãobrasileira de madeiras, correspondendo a 65% do total dasexportações pela região Amazônica – o que revela a importância daindústria madeireira do Estado. Em 1997, de janeiro a outubro oEstado do Pará manteve a participação de 26,4 % do total dasexportações do país. (...) Em valor, a exportação relativa do Pará nototal exportado pelo Brasil, nestes últimos 15 anos, tem mantido emtorno de 30%; sendo que em madeira serrada sua participaçãoalcançou 64% do valor total exportado pelo Brasil em 1996, ou seja,exporta-se mais produtos com menos valor.

O Estado do Amazonas possui as maiores reservas deflorestas tropicais do País. Estas ainda são submetidas “a um graude exploração relativamente baixo para os padrões de exportaçãodos Estados do Pará, Mato Grosso e Rondônia; razão fundamentalpara atração de madeireiros transnacionais, como as madeireirasde origem asiáticas, mais precisamente na Malásia” (CÂMARA DOS

DEPUTADOS, 1998: 131). O setor somente recebeu as madeireirasasiáticas na metade da década dos anos 90, com a abertura deforma globalizada da economia brasileira, mas os grupos do setorjá eram fortes e existiam na região nas últimas décadas. Aintensificação das explorações das florestas tropicais ocorre pelafacilidade da abertura da região, aos mercados externo e interno,bem como pelo interesse dos Estados em atrair empresas.

Para VIDAL et al. (1999: 13) e SMERALDI e VERÍSSIMO (1999:7), atualmente 86% da madeira extraída na Amazônia Legal brasileiraé consumida no mercado interno, enquanto apenas 14% éexportada. O Estado mato-grossense, um dos maiores produtoresde madeiras da região amazônica, concentra sua produção maisdirecionada ao abastecimento do mercado interno brasileiro. Istose evidencia através do destino da comercialização dos produtosmadeireiros sinopenses.

Este núcleo de transformação de madeiras é o maior doEstado do Mato Grosso e possivelmente um dos maiores do Brasil.As exportações desse polo madeireiro para outros países atingemapenas 5,3%, enquanto 78,9% da produção é comercializada nosdemais Estados brasileiros, e parte consumida no próprio Estadomato-grossense (SOUZA: 1999: 77). Para FAGANELLO (2001), “apenas10% das madeiras da região são vendidas no exterior. Não são osmadeireiros que efetuam a venda, ela é realizada por empresas

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especializadas que se encontram no Sul do país”8 . PERTILE (2001)diz:

temos tendência em fornecer madeiras para o mercado brasileiro,visto nossa localização geográfica. Vendemos principalmente parao Sul do país, local para o qual é transferida a grande quantidade denossos produtos. As exportações estão aumentando, hoje cerca de10 a 12% é exportada para outros países, com tendência parachegarmos nos próximos anos a 30% de nosso volume de vendas.Devido a ampla abertura do mercado, nossos produtos estão seadequando ao mercado mundial, assim podemos vender produtosde qualidade para o exterior9 .

Nesta região o destino das madeiras é o Centro-Sulbrasileiro, com facilidade de mercado, pois existe maior proximidadecom o centro consumidor de madeiras do País. Nas regiõescompradoras de madeiras concentram-se as indústrias moveleirasdo País, que fabricam e vendem seus produtos nos mercadosinterno e externo. O que motiva os Estados do Pará e do Amazonasa exportarem para outros países os produtos derivados de madeiraé a facilidade das exportações serem enviadas fluvialmente, atravésda ligação dos rios com o mercado mundial, tornando-se possívelpelo fato de os rios serem navegáveis.

Das 6.000 empresas do setor de transformação demadeiras, com registros de funcionamento na Amazônia brasileirana virada do milênio, muitas delas não estão em atividade. Algumasdas baixas de registros não foram efetivadas pelo fato de que osempresários do ramo fecharam a indústria e não pediram a retiradados registros que as formavam e também, pela existência deinúmeras empresas fantasmas, que objetivam a sonegação fiscal.Contudo, consideramos elevado o número de registros, bem comoa facilidade em consegui-los. Os empresários do setor conseguema licença para extrair árvores e transformá-las em produtosderivados para a comercialização.

8 Entrevista ao autor realizada em Sinop – Mato Grosso, no dia 20/10/2001, na sede doSindicato dos Madeireiros do Norte do Mato Grosso – Sindusmad, com o representantesindical Pertile.

9 Entrevista ao autor realizada em Sinop – Mato Grosso, no dia 21/10/2001, através daAssociação dos Madeireiros de Feliz Natal, Mato Grosso – AMFN, com o representantedessa associação Faganello.

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INDÚSTRIAS DE TRANSFORMAÇÃO DE MADEIRAS, NO ANO DE1999, NO ESTADO DE MATO GROSSO.

Fonte: Elaboração própria com base na Fiemt/Iel (1999).

Através dos dados, podemos verificar que o Estado de MatoGrosso é um grande produtor de madeiras e seus derivados, com1.391 indústrias, e que a região norte do Estado destaca-se nonúmero de indústrias do setor, perfazendo um total de 789. O quechama a atenção é que no município de Sinop, situado na regiãonorte mato-grossense, existem 196 empresas do ramo detransformação de madeiras.

Na Amazônia Legal brasileira, podem ser vistos dois pólosmadeireiros de maior intensidade. Um no estado do Pará, nomunicípio de Paragominas e o outro, no Estado de Mato Grosso,no município de Sinop. Nestes dois pólos de transformação demadeiras, a economia local fundamenta-se basicamente nestaatividade, embora aos poucos estejam se fixando a agricultura e apecuária, após o extrativismo florestal. Neste sentido, no Estado doPará, “no período de dez anos, de 1980 a 1990, 188 novas serrariasforam estabelecidas na região de Paragominas” (JOHNS, BARRETO eUHL, 1998: 36-37).

A investida capitalista provoca a perda da capacidadeflorestal, mas não da economia regional, portanto a agropecuáriaé o segundo estágio da investida dos grupos econômicos, atravésda utilização das áreas parcialmente devastadas. Os empresáriosdo setor aproveitam a estrutura criada na extração das árvores,tais como: abertura de estradas; áreas demarcadas; acesso àsmatas através das trilhas; parte da mata já derrubada e outrasvantagens criadas para implementarem a agropecuária extensiva.No período entre 1980 e 1996 a produção de madeira/tora no Estado

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mato-grossense obteve um aumento no percentual de 1.072, 64%.(FIEMT/IEL, 1999: 19).

O setor de transformação de madeiras representa para oEstado de Mato Grosso um dos pilares de arrecadação de ImpostoSobre Circulação de Mercadorias e Serviços. Neste período,observamos que o Estado de Mato Grosso obteve um aumentosensível na arrecadação geral de impostos: acima de 60%. Aatividade industrial é a mais representativa em termos dearrecadação, sendo a indústria de transformação/extrativa a quemais cresceu nos últimos anos (FIEMT/IEL, 1999: 27).

Os projetos econômicos implantados no Estado mato-grossense fazem evoluir todos os setores da economia, seja aagricultura, seja a pecuária, a indústria, o comércio e os serviços.O comércio representou no ano de 1997, uma arrecadação de R$248.899.843,09, com uma participação do ICMS de 25,50%,enquanto a indústria, neste mesmo ano, representou R$303.558.713,28, com participação de 31,12%. O total daarrecadação no ano de 1997 foi de R$ 975.541.273,02, o restantedo ICMS ficou nas demais atividades (FIEMT/IEL, 1999: 26). O nortemato-grossense representa 32,84% das indústrias do Mato Grosso,e quase a totalidade concentra suas atividades na transformaçãode madeiras (FIEMT/IEL, 1999: 30).

Os trabalhadores da indústria da região norte do Estado deMato Grosso, representam 27,36% do Estado, formado por umparque industrial praticamente do setor madeireiro (FIEMT/IEL,1999: 30). O norte do Estado mato-grossense faz parte de nossoestudo, e concentram-se aí 789 indústrias do setor de transformaçãode madeiras. Neste sentido, 1/4 das indústrias madeireiras do nortemato-grossense concentram suas atividades na transformação demadeiras no município sinopense.

Assim, das 789 indústrias do setor de transformação demadeiras do norte do Estado, 196 estão estabelecidas no municípiode Sinop, representando um índice de 24,84%, as outras 75,16%encontram-se nos demais municípios da região. Isso reforça a idéiade que o município de Sinop representa um pólo madeireiro daAmazônia brasileira e uma forte economia para o Estado de MatoGrosso, como também um local de acumulação e expansão dosgrupos econômicos para reprodução de capitais no extrativismoflorestal.

Entendemos que esta região é significativa no estudo da

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questão madeireira da Amazônia pela sua representação política,social e econômica, tanto no que diz respeito à acumulaçãocapitalista, como nas relações com a força de trabalho. Por outrolado, podemos identificar os vários fatores que facilitam aacumulação capitalista, através dos recursos florestais desta região.Também pode ser visto o avançado estágio de agressão ao meioambiente, que transforma áreas de vegetação nativa em áreas paraprodutos de transformação de madeiras e, no último estágio, asáreas são transformadas em extensas agropecuárias, por meio dasmonoculturas.

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OS CAPITALISTAS MADEIREIROS

A indústria de transformação de madeiras sinopense, nasceusob a submissão do trabalho e da natureza ao capital concentrador.Dentro desta perspectiva histórica surge o acumulador, o regenteda orquestra do capital, o proprietário da indústria de transformaçãoe beneficiamento de madeiras. Neste sentido, os projetos capitalistassó adquirem valor nas representaçãoes quando têm o firme objetivode personificar o capital.

Esta é a dinâmica que movimenta os empresários do setormadeireiro de Sinop e região. É através do processo histórico queeles se tornaram capitalistas, e suas atitudes foram direcionadasatravés da lógica do capital na forma de acumuladores. Porém,não é o setor madeireiro que os transforma em capitalistas, poisestes poderiam estar em outra forma de acumulação na região oufora dela. Ser capitalista na Amazônia e através das madeireiras,representa uma oportunidade a mais no movimento da expansão,oportunizado pela estratégia dos tempos modernos.

O aproveitamento dos recursos naturais das florestas daAmazônia, através das indústrias de transformação de madeiras, éuma forma de obter o benefício econômico das árvores. Esteprocesso acontece de forma peculiar na região, pois objetiva obterprodutos para servir aos mercados nacional e internacional atravésda floresta nativa. Por outro lado, não podemos nos ater apenas àmera forma de aproveitamento econômico dos recursos florestais,ou à finalidade de transformar as áreas de extração florestal emprojetos de agropecuária extensiva, mas a uma forma de extraçãode lucro dentro da lógica da acumulação. Nesta perspectiva, sãodirecionados para a região os grupos econômicos, com a finalidade

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de agregar valor em seus capitais, principalmente nas últimasdécadas, e são colocados a produzir para satisfazer àsnecessidades dos mercados interno e externo.

O madeireiro se constitui acumulador através de seuempreendimento industrial e usa o extrativismo como modo e formade acumulação, mas é o proletário quem transforma o capital emmais capital através da mais-valia e não participa dos frutos de seutrabalho. O fato de ser em Sinop e no território mato-grossense, ouna Amazônia de modo geral, é apenas o uso de um local geográficopara implantar o empreendimento que transforma o trabalho emcapital. O extrativismo originado na floresta tropical nativa é umacondição oportuna para continuamente acumular e expandir o modocapitalista de produção. Esta forma de empreendimento não nascedo caráter unitário, mas da associação e da cadeia de capitais.Contudo, a forma de produzir a riqueza é através do aproveitamentoeconômico dos recursos naturais florestais.

O município sinopense e a região são parte do grandeprojeto madeireiro da Amazônia, pois este foi escolhido no final dosanos 70 para ser o local de inserção das indústrias de transformaçãode madeiras, e assim servir ao sistema capitalista nos moldesexpansionistas. O capitalista usa a natureza em duplo sentido noprocesso produtivo, pois primeiro faz o aproveitamento econômicodas árvores, depois transforma estas áreas em grandes projetosna agricultura ou na pecuária10 . Para o GREENPEACE (2001: 3), aatividade madeireira, no atual estágio de desenvolvimento, faz partede um projeto econômico temporário na região amazônica.

O capitalista do setor de transformação de madeiras, aotransformar os recursos naturais através da extração de árvores,apenas inicia o duplo processo de acumulação. Primeiro ele extraias árvores com fins de aproveitamento econômico e as transformaem produtos de madeira para o mercado; depois constitui aagricultura ou a pecuária no local, sendo o segundo passo na cadeiareprodutiva do capital na região. Mesmo assim, não podemos levarem consideração o processo de transformação de madeiras comindústria fixa, pois ele é um projeto capitalista que faz a coleta dasárvores de forma itinerante. A própria indústria também se deslocapara lugares de farta matéria-prima, sempre que necessário.

10 “A faculdade da terra de proporcionar frutos a investimentos sucessivos de capital,sem se perder os anteriores, abrange a possibilidade da diferença nos rendimentosdessas aplicações sucessivas do capital.” (MARX, 1981: 896).

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Contudo, o capitalista, ao lançar-se no processo produtivo,se apresenta como detentor dos meios de produção, e osproletários são uma mercadoria como qualquer outra, que vendemsua força de trabalho ao proprietário do empreendimento. Esta é alógica da acumulação, esta é a dinâmica do capital na reprodução,mesmo que o possuidor dos meios de produção necessariamenteseja fruto de acumulações anteriores através da mais-valia jáacumulada. Nesta lógica, a força de trabalho deve vender o seutrabalho pelo valor determinado, através do tempo de produçãosocial das mercadorias.

É através deste princípio que as indústrias de transformaçãode madeiras nascem na região sinopense, ou são transferidas deoutros desmatamentos do País, mas sempre com a finalidade deproduzir excedentes para agregar valor nos capitais. A maioria dosproprietários do setor de transformação de madeireira, são pessoasque de alguma forma já têm tradição e histórias de acumulaçãoatravés do extrativismo madeireiro.

Neste sentido, se demonstra na prática, que os recursosaplicados na nova frente de expansão de capitais são aoportunidade de expandir o capital já existente, não importa suaorigem, se nacional ou internacional, pois a finalidade é agregarvalor para efetuar nova acumulação. As estratégias capitalistas sãofacilitadas na região, e o projeto constituído pode usufruir tambémdos incentivos fiscais determinados pelo Estado.

Esta estratégia proporciona aos capitalistas a oportunidadede expansão, e garante, através da nova fronteira geográfica, asfacilidades financeiras de crescimento no ramo empresarialmadeireiro. Estas estratégias são aliadas à abundância de árvores,que serão transformadas em produtos derivados de madeira parao mercado. No processo de transformação de madeiras são criadasformas que garantem a acumulação, estas necessariamente estãoligadas à oferta de trabalhadores no mercado, que hoje seapresenta regularizada na região.

Na maioria das vezes, o setor industrial madeireiro,consegue reproduzir as mesmas práticas de extrativismo já utilizadasnas décadas passadas, utilizando-se das florestas tropicais de formapredatória, sem respeitar o solo, a vegetação, o ar e o manancialde água e, superexplorando a força de trabalho. O capitalista dosetor consegue obter lucro mesmo usando máquinas, equipamentose técnicas ultrapassadas.

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Isto é possível porque a região Amazônica é uma área desuperexploração da força de trabalho e de transferência detrabalhadores de outras regiões do País, através do exércitoindustrial de reserva. Além disso, os madeireiros têm à disposiçãograndes áreas de terras e recursos naturais florestais com valoresbaixos, e isto lhes dá o direito de fazer a coleta seletiva das árvores.Através destas facilidades é possível obter lucratividade mesmoatuando com máquinas e equipamentos ultrapassados, oriundosde outros núcleos madeireiros já desativados.

O setor de transformação de madeiras é composto depequenos, médios e grandes empreendimentos, ficando a maioriadeles entre micro e pequenos proprietários, sendo muitos delesfonte de reprodução das médias e grandes empresas, pois a microe a pequena empresa em muitos casos servem para fazer areprodução em nome dos capitais maiores. Neste caso, à pequenaempresa do setor é fornecida toda a estrutura necessária, pois elapode fabricar produtos de transformação de madeiras paraincorporá-los ao médio e ao grande empreendimentos. Esta é umaestratégia muito usada para suprir as deficiências econômicas eestruturais das menores empresas. Por outro lado, é uma maneirade garantir a produção dos grandes empreendimentos e sua maiorlucratividade.

As empresas menores, muitas vezes, servem para fabricaros produtos que estão fora da produção das grandes empresas,pois as empresas de médio e grande porte produzemprioritariamente para abastecer o mercado interno e as exportaçõesatravés das vendas previamente estabelecidas, observando asnecessidades dos mercados nacional e internacional. Assim, quandonão fazem as vendas diretamente, possuem compradores quefazem o canal para a comercialização, intermediando a negociação.Neste sentido, as empresas trabalham com dependência nasvendas da produção entre pequenas, médias e grandes. SegundoFAGANELLO (2001), “não somos nós os pequenos madeireiros quemrealizam as exportações, são organizadas as vendas por empresasespecializadas que se encontram no Sul do país no centroexportador dos produtos derivados de madeiras”.

Para o Laboratório de Produtos Florestais – LPF/Diren/Ibama, no Brasil “cerca de 75% das serrarias são de pequeno porte,cuja capacidade instalada é inferior a 10.000 m3/ano, e 24% situam-se entre 10.000 e 30.000 m3/ano. Apenas 1% dessas unidades

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apresenta capacidade de produção acima de 30.000 m3/ano”(DEUSDARÁ e PEREIRA, 2001). Ao tratarmos das indústrias detransformação de madeiras sinopenses na região amazônica, podeser constatada uma avaliação um pouco diferente, pois 50,9% sãopequenas, 40,3%, médias, e 8,8%, grandes (SOUZA, 1999: 62).

Os tamanhos das empresas pequenas, médias e grandesrevelam características e extremos diferentes, pois “as primeirasapresentam mão-de-obra familiar e uma estrutura organizacionaldeficiente, tanto administrativa como produtiva. As últimas possuemuma mão-de-obra especializada, organização administrativa,financeira e técnica, produtos organizados, e têm influências sobreo setor” (SOUZA, 1999: 62). Comparando os dados, para PERTILE

(2001), “das 280 indústrias instaladas em Sinop, 10% são grandesempresas, com mais de 100 trabalhadores. As médias são 48% dototal, tendo em seus quadros entre 20 a 100 trabalhadores. Já aspequenas são 42% e empregam até 20 trabalhadores”.

Neste sentido, a formação de capitais menores não resisteaos movimentos da acumulação, tendo extrema facilidade paranascer e desaparecer no processo produtivo. Assim, em Sinop,devemos levar em consideração que “93,0% delas são matrizes eapenas 7,0% são filiais de outros centros” (SOUZA, 1999: 64). Estefato é também proporcionado pela extração predatória e irregularnesta atividade. Estas empresas, ao exaurir os recursos florestaisde uma região, se mudam para outra e formam nova empresajurídica, com origem no próprio local da extração e de produção,porém muitas vezes com máquinas sucateadas de outrosdesmatamentos. Isto também faz parte da estratégia empresarialpara não criar problemas com as irregularidades da antiga empresa.

Outro fato que chama a atenção é o tempo de instalaçãodas empresas sinopenses, pois o novo espaço foi criado no finaldos anos 70 e no início dos anos 80, na época em que ocorreu agrande corrida para a instalação das indústrias de transformaçãode madeiras na região. No entanto, no ano de 1999, somente 8,7%das empresas ali funcionando tinham mais de 15 anos de atividade,revelando uma alta rotatividade das empresas, visto 64,9% delasterem menos de dez anos de atividade (SOUZA, 1999: 59). Nestesentido, “observou-se que, de um modo geral, há uma coincidênciae tendência entre tamanho e tempo de existência das empresas,ou mais claramente, as empresas maiores são mais antigas, apesarda instalação, também recente, de empresas com porte mais

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elevado, principalmente, no ramo de laminados e compensados”(SOUZA, 1999: 59).

As empresas maiores dedicam-se aos produtos maiselaborados, tais como: compensados, laminados e aglomerados. Amadeira serrada, para as empresas maiores, em muitos casos, nãoé a meta principal da produção, tornando-se um segundo produtoque faz parte do modo produtivo. Neste caso, as empresas maioresfornecem toda a estrutura necessária aos empresários madeireirosmenores e descapitalizados. Estes são incumbidos de fabricar osprodutos secundários dentro de seus interesses e estratégias devendas, visto os grupos maiores terem o controle do comércio.

As empresas pequenas, familiares, que utilizam poucostrabalhadores, são usadas para facilitar a reprodução das grandesempresas. A família trabalha em seu pequeno negócio, fazendo afunção de força de trabalho que vai beneficiar os grandes gruposeconômicos no final do processo produtivo, tornando-se umproletário explorado na rede da acumulação. Estes trabalham dentroda lógica e são superexplorados através da tática fantasiosa deserem donos de seu próprio negócio. Esta é uma relação enganosae legaliza a relação do pequeno empresário/trabalhador, que passade força de trabalho a proprietário legalmente.

Podemos identificar dentro desta estrutura que os pequenosproprietários das indústrias de transformação de madeiras sãocompostos de pessoas simples, sendo em muitos casos constituídosde empresários com pouca escolaridade, sem estrutura financeiraadequada e organizacional. Além disso, produzem para gruposeconômicos mais bem estruturados, e estes se beneficiam atravésde sua força de trabalho e sua produção, por meio da lógica damais-valia. As empresas menores necessitam de pequenaquantidade de força de trabalho, e esta é realizada pelos própriosfamiliares do pequeno empreendimento.

Quando necessário, completam o quadro de trabalhadorescontratando a mão-de-obra que falta para realizar o trabalho braçalmais pesado. Para ZABALA (2003: 77), a maioria das empresas seextingue no processo produtivo, porém, poucas conseguem crescere consolidar-se no mercado. Estas empresas são criadas e extintascom muita facilidade, muitas delas são fechadas, sem dar baixa emseus registros, mas o mais interessante nesta trama é que a relaçãonão deixa vínculos trabalhistas entre a pequena e a grande empresa,como também com o modo de agenciar trabalhadores no sistema“gato”.

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Os trabalhadores das empresas pequenas “se aventurama ser também proprietários de rústicas serrarias. Vivem hoje comoontem na pobreza. Alguns, com partes do corpo mutiladas pelasserras, temem que seu futuro seja de pedinte de esmolas” (PROCÓPIO,2000: 143). Esta realidade nos leva a definir formas de afinamentodo processo produtivo, que esconde a relação de trabalho e capital,porém cria um grau mais elevado na exploração, que se identificaatravés da superexploração.

Para SODRÉ (2002: 447), “a concentração capitalista geraantagonismos no seio da burguesia: as categorias médias einferiores tendem a ser absorvidas pelos monopólios”. Os gruposmaiores e melhor constituídos na sua estrutura física, financeira,mercadológica e legal monopolizam o setor, tanto no que diz respeitoà produção, quanto à comercialização dos produtos. Dependendoda estrutura da empresa, muitas vezes as pequenas recebem astoras no próprio pátio da madeireira, como forma de garantir aprodução e o comprometimento das empresas menores com asmaiores ou com a comercialização.

Existem também profissionais que se especializam noextrativismo, visto que na maioria das vezes, não possuem empresasconstituídas, mas dedicam suas atividades à extração das madeiraspara revendê-las a terceiros. Estes geralmente recebem toda aestrutura necessária dos grandes grupos madeireiros, pois afinalidade desta tática é garantir a matéria-prima no processoprodutivo e não caracterizar vínculo empregatício com a força detrabalho. Esta tática se qualifica através do engenhoso plano deterceirização do processo produtivo: retira as responsabilidadesdas empresas no que tange aos problemas ambientais, fiscais etrabalhistas.

O homem e seu ambiente passam a não ter valor, emdetrimento da astúcia de agregar valor a qualquer custo. AExploração do homem pelo próprio homem se transforma numarelação não de fetiche, mas um relacionamento de enganação, quevem acompanhado da falta de respeito e consciência aossemelhantes. Nesta relação se bestializa o homem, para numsegundo momento coisificá-lo, torná-lo ser sem importância. Poroutro lado, se personifica a coisa, tornando a mercadoria, a vedeteda relação.

Em muitos casos, os grupos mais estruturados oferecemaos empresários da extração de madeiras em toras toda a estrutura

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necessária para realizarem o trabalho, que pode ser: trator,motosserras, caminhões, notas fiscais, e viabilizam as áreas para acoleta das árvores, ficando a produção hipotecada por direito, emtroca dos benefícios recebidos. Estes pequenos empresários, quasetodos na ilegalidade, não possuem firma constituída e fazem aextração das árvores sem práticas de manejo florestal, de formapredatória e com irregularidades trabalhistas, pois agenciam acontratação da força de trabalho sem vínculo de emprego. Estetrabalho, como vimos, é realizado através do sistema “gato”, cujoagenciador de mão-de-obra realiza toda a operação de formaclandestina e irregular, em nome da falsa terceirização.

Na Amazônia, o grande empresário oferece toda a estruturanecessária, assim garante a matéria-prima para a sua segurançaempresarial, bem como para fugir das responsabilidades fiscais,no que tange às exigências da legislação florestal, trabalhista e,principalmente, da procedência das madeiras. Estas, em muitoscasos, são provenientes da grilagem de terras tribais, depreservação ambiental e da União, e de áreas não credenciadas eirregulares. O principal objetivo é burlar a legislação vigente ereproduzir capitais através da cadeia de superexploração,camuflando a destruição da floresta.

Neste processo, que trata de forma irregular a relaçãoprodutiva, se acentua a extração de mais-valia da força de trabalho,fazendo afinar as formas exploratórias, e se evidenciam as formasenganosas através do sistema “gato”. A relação produtiva, atravésdas táticas usadas pelo sistema de agenciamento de mão-de-obra,faz o “gato” sentir-se proprietário da relação de trabalho e umpequeno empresário; no entanto, não passa de um proletário queexplora outros proletários. Esta relação assume uma posturadiferente na hierarquia da cadeia de superexplorados, subordinandooutros trabalhadores em nome dos grupos econômicos aliinstalados, mas evidencia uma relação própria da Amazôniabrasileira.

Esta forma de trabalho é uma estratégia importantíssimapara o modelo extrativista de árvores da Amazônia. Um ato de astúciaque viabiliza o processo produtivo e beneficia os grupos empresariaismelhor estruturados, fazendo a produção com mais lucro aos gruposeconômicos, determinando o preço da venda das madeiras. Estatática para concentrar e centralizar as riquezas oriundas de váriasmãos é estratégia para poder centralizar em poucas mãos, mas

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produz mudanças na composição do capital na região11 .Quando acontece um acidente grave ou uma fiscalização

mais séria, a empresa responsável não assume culpa alguma noque diz respeito às responsabilidades fiscais e legais, ficando estaspor conta dos profissionais do ramo da tora. O sistema “gato”, tendofirma legalmente constituída ou não no setor de transformação demadeiras, quando algo der errado, foge para outras regiões, e otrabalhador fica desamparado. Esta forma de agenciamento de mão-de-obra é flutuante na retirada da tora na floresta. O agenciadornão tem condições de pagar as multas e indenizações por suasirregularidades cometidas e abandona os trabalhadores, que ficamsem assistência alguma, porém a acumulação se realiza por meiodesta tática.

Esta estratégia diminui os custos com benefícios sociais etrabalhistas com a força de trabalho, sem assumir responsabilidadesnos atos irregulares no local do extrativismo. Assim, quem sai comvantagens é a classe madeireira mais bem estruturada, vindo abeneficiar-se deste ato engenhoso. Esta modalidade de contrataçãofoi arquitetada com a finalidade de superexplorar a força de trabalhoe produzir mais lucro no final do processo produtivo.

Hoje, os empresários do setor têm preferência na contrataçãode trabalho entre a empresa e o “gato”, que ambos tenham empresajuridicamente construída e que seja firmado um contrato deterceirização do trabalho na coleta das árvores. Esta atitude dosgrupos madeireiros é para prevenir futuras ações na justiça, pois,se ficar comprovado o envolvimento direto com os trabalhadores, oempresário é obrigado a arcar com os custos das irregularidades.

Com isso, se a empresa se envolver juridicamente, existe atransação contratual; mesmo que o agenciador de mão-de-obraabandone a força de trabalho, ele consegue provar juridicamenteque está legal. Esta nova forma jurídica só passou a acontecer nosúltimos anos e ainda é pouco usada. O interessante neste processo,é que esta preocupação até há pouco tempo não se fazianecessária, pois a omissão e a conivência dos órgãos do Estadoeram uma prática, contudo hoje, estes órgãos ainda continuam comatuação medíocre, omissos e coniventes.

11 “O capital se acumula aqui nas mãos de um só, porque escapou das mãos de muitosnoutra parte. Esta é a centralização propriamente dita, que não se confunde com aacumulação e concentração.” (MARX, 1998: 729).

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Os trabalhadores que prestam serviço aos agenciadoresde mão-de-obra no sistema “gato”, trabalham por tarefas e de formaclandestina, bem como a maioria dos envolvidos na teia destesistema de superexploração da coleta das árvores. Nestaperspectiva, um único agenciador dentro da hierarquia de trabalhocomanda vários grupos de trabalhadores, dividindo-os entre:derrubada das árvores, arrasto das toras, carregamento das toras,transporte até a indústria e lascadores de palanques para cerca.

Esta divisão de trabalho é sempre distribuída em setorescom o objetivo de melhor controle da força de trabalho. Assim,através da superexploração garantem o máximo de produção e,conseqüentemente, de lucros aos empresários que se camuflampara não terem responsabilidades diretas, mas centralizam para sios lucros da cadeia produtiva. Mesmo que esta sistemática tenhasempre ocorrido na clandestinidade, na extração de toras, o sistema“gato” está sofrendo algumas alterações nos últimos anos. Conformeavalia GALVÃO (2001),

a figura do “gato” na extração de árvores está mudando. Esta atividadepara sair da clandestinidade está sendo terceirizada. O sistema “gato”muito utilizado até nossos dias, da forma como ainda é utilizadotornou-se muito arriscado aos empresários do setor. Estãotransformando o sistema “gato” em empresas com a finalidadeextrativista, assim legalizam a atividade pelo menos aparentemente,tornando-se empresas de extração de árvores que atuam de formaterceirizada. Nestes locais não temos o controle das jornadas detrabalho, sendo uma prática nova constituída para tirar aresponsabilidade dos madeireiros e legalizar a situação de formadefinitiva. No entanto, tudo continua como era antes, as relações detrabalho continuam as mesmas12 .

Esta nova tática por parte das organizações madeireiras éuma forma de ampliar a marginalização e o empobrecimento daclasse trabalhadora do setor, dilatar as margens de lucro, e afinara exploração da força de trabalho, vindo a caracterizar-se emsuperexploração de forma mais efetiva. Os grupos organizados,

12 Entrevista ao autor realizada em Sinop – Mato Grosso, no dia 22/10/2001, na sede doSindicato dos Trabalhadores da Indústria do Mobiliário da Região Norte de Mato Grosso- SITICOM, com o representante sindical Galvão.

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cada vez mais, necessitam introduzir mecanismos mais eficientespara apurar a extração da mais-valia e, conseqüentemente, apuraro lucro. Estes artifícios devem vir acompanhados de estratégiasnovas, de maneira que possibilitem negar o envolvimento com asresponsabilidades fiscais, ambientais e trabalhistas.

O que podemos observar no setor de transformação demadeiras é que o processo de acumulação capitalista é altamenteestratégico na forma de tirar proveito dos recursos florestais e passaa fazer uso da força de trabalho com táticas que exploram maistrabalho e não caracterizam responsabilidades trabalhistas; bemcomo são utilizadas várias formas para burlar a legislação vigenteno País. Este setor representa para a região amazônica e,principalmente, a sinopense, a base econômica capitalista, mas aomesmo tempo a base para a marginalização das massas.

O setor madeireiro da “região mato-grossense,particularmente a sinopense, estrutura-se em uma organizaçãoindustrial mercadológica tendendo para a oligopolização” (SOUZA,1999: 104). No atual estágio da acumulação, as micros e aspequenas empresas com atividades madeireiras tendem a deixar oextrativismo. Na atual fase da reprodução capitalista, as micros eas pequenas empresas servem para oxigenar a produção,possibilitando maior acumulação aos grupos econômicos mais bemconstituídos. Estes são representados por empresários quedominam a produção e o mercado de madeiras, através dacomercialização e das relações de trabalho13 .

Aos pequenos madeireiros, que servem de suporte aosgrandes grupos econômicos, também não foi possível colocar asmãos no favo de “mel” para si, mas tiveram a oportunidade de ficarpróximos deste favo cobiçado, porém este pertence aos detentoresdos meios de produção, ou seja, aos grandes empresárioscapitalistas. Contudo, aos pequenos empresários é oportunizadoconfundirem-se quanto a seu verdadeiro papel na estratégiaprodutiva do capital e do sistema reprodutivo na região.

É dito aos pequenos madeireiros, aos agenciadores de mão-de-obra do sistema “gato” e aos trabalhadores de forma geral, que

13 “A acumulação aparece, de um lado, através da concentração crescente dos meiosde produção e do comando sobre o trabalho e, do outro, através da repulsão recíprocade muitos capitais individuais.” (MARX, 1998: 729).

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o “mel” pode ser de todos, basta atrelar-se ao mundo do capitalatravés da dádiva de ser dono de seu próprio negócio. Na verdadeé uma astúcia para criar fantasias, e assim o homem simples podesonhar com a produção. No entanto, serve para enganá-los esubmetê-los com mais afinco na busca ao pote de “mel”, mas deforma mágica o ouro que tanto procuram, foge de suas mãos e vaiparar nas mãos dos capitalistas. Só assim a investigação e a procurade novas alternativas de mudanças para si e os seus continuam...

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O DESPERDÍCIO DAS MADEIRAS E A DEVASTAÇÃO

Os grupos madeireiros, ao instalarem-se na Amazôniabrasileira através do capital nacional e internacional, objetivamapenas a acumulação através da exploração dos recursos naturaisda floresta tropical. Eles têm o lucro como meta principal, pois éatravés da expansão geográfica oferecida aos grupos econômicosque se torna oportuna a expansão na região para fins deacumulação. Neste sentido, os desperdícios de madeira no processoprodutivo fazem parte da forma de extração ali executada, e asárvores apresentam-se com a finalidade de obter lucro imediato enão para preservar o meio ambiente. Neste espaço de expansãocapitalista “a atividade madeireira na Amazônia é economicamenteimportante e ecologicamente depredatória” (VIANA, 2001: 283)

A degradação florestal não ocorre por falta de planejamento,ela é arquitetada de forma consciente e racional dentro das metasestabelecidas pelo modo de produção capitalista. Se, de um lado,a exploração das florestas de forma não organizada e não planejadapara sustentabilidade, gera aos capitalistas a possibilidade deexternalizarem custos, por outro lado, gera “alto custo coletivo, masquase nenhum custo para as empresas” (WALLERSTEIN, 2002: 148).Nesta lógica, a extração e o processamento das toras estãoassociados ao desperdício e à falta de respeito com a natureza,mas dentro das estratégias de expansão e da acumulação. Isto foipossível ao longo dos tempos, e ainda é praticável na região graçasà incompetência, à conivência e à omissão por parte do Estadobrasileiro, pois este torna esta prática realizável em toda a regiãoamazônica.

Nos últimos 25 anos, a Amazônia gradativamente tornou-se

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a principal produtora de produtos madeireiros do País, e nospróximos anos poderá ser a maior do mundo pelo grande potencialde florestas que oferece como alternativa econômica. Hoje, quasea totalidade da extração das florestas nativas é realizada nos Estadosque fazem parte da Amazônia Legal brasileira, acima de 80% daprodução nacional. Neste sentido, através dos princípios e dasperspectivas ecológicas, a floresta tropical revela uma exploraçãodos recursos naturais de forma desordenada e predatória, comtécnicas bastante atrasadas que degradam os ecossistemas, massatisfazem o modo capitalista de produção e apuram a concentraçãode capitais.

Os grupos organizados estabelecidos na região visamapenas ao lucro nas operações de extração e fazem a seleção damatéria-prima que melhor lhes convém, sem, no entanto, observaro respeito ao meio ambiente e às comunidades da floresta. Estefato pode ser sentido ao longo dos tempos pelo modo expansionistarealizado pelo capital na região e também, através do modeloimplantado pelo Estado para conduzir o processo produtivo, poiseste ficou a serviço da acumulação de grandes conglomerados decapital. Em todas as fases produtivas não se realizou umplanejamento adequado com a interferência do homem na região,e não se previu esta expansão econômica com táticas desustentabilidade.

Fatos desta magnitude se agravam na região, visto que “aAmazônia tem vocação florestal, uma vez que suas florestas sãode grande porte e fazem parte de um sistema ecológico muitosensível, onde a manutenção da diversidade florestal é para amanutenção da fertilidade do solo” (SCOLFORO, 1998: 100). Atravésde estudos realizados na região, uma operação típica de extraçãode toras consegue remover entre 25 a 50 m³ de madeira porhectare, podendo ser retiradas de 30 a 50 espécies de madeirasem média. Além disso, no processo tradicional, em torno de 26%das árvores são mortas e a cobertura natural é reduzida em 50%(VIDAL et al., 1997: 2).

Por outro lado, somente na árvore escolhida para coleta, odesperdício acontece de duas formas distintas: na primeira, no atoda derrubada das árvores de forma tradicional, 6,8% do volume detoras derrubadas são perdidas por falta de técnicas de manejoflorestal; na segunda situação, com madeira manejada e técnicasde aproveitamento a perda fica em 1%. As causas dessas perdas

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são rachaduras na tora, erros de desponte e erros na altura docorte (BARRETO et al., 1998: 15).

Estes estudos demonstram que somente no ato daderrubada das árvores, aproximadamente 7% das toras colhidassão perdidas por falta de técnicas adequadas. O meio ambiente eo projeto capitalista ali instalado formam dois extremos que nãocombinam. Na medida em que as florestas vão sendo exploradascom o processo de retirada das madeiras de forma predatória, osmadeireiros avançam na área, pois precisam da matéria-prima paraa produção, fazendo com que as indústrias também se mudem paraperto da extração. Os grupos econômicos objetivam minimizar oscustos e apurar os lucros com a floresta à sua disposição, sempreocupar-se com a degradação do meio ambiente. FAGANELLO

(2001) nos orienta:

quanto à devastação da floresta, a lei diz que só podemos abrir 20%das áreas, mas não existe uma fiscalização rigorosa. Por outro lado,nas áreas destinadas aos projetos de manejo florestal podemosretirar 100% das árvores. Isto levou a criar muitos projetos de manejona região. Hoje, 30% do município de Feliz Natal é área de projetosde manejo florestal. Por exemplo, uma empresa possuidora de umaárea de 1.000 hectares de floresta, quando manejada, pode serretirada toda em um ano, facilita assim nossa estratégia de extraçãode árvores. No ano seguinte, o madeireiro adquire outra área. Nãotemos condições de adquirir grandes áreas de uma só vez paraobtenção da matéria-prima necessária para 25 anos do projeto, vistoser o prazo para a nova retirada de madeiras. Na região existemgrandes grupos econômicos especializando-se em manejo florestal,fazem a terceirização destas áreas para empresas sem projetos.Esta estratégia facilitou muito a obtenção de toras para as indústrias.Neste sentido, em caso de agressão além do previsto sãoresponsabilizados o proprietário do manejo, o engenheiro e odetentor do projeto. Por outro lado, para verificar abusos, o Ibamanão tem a necessidade de ir até o mato por terra para verificar o nívelde desmatamento, pode ser visto via satélite, e quando o órgão seomite, ou é conivente, ou faz propositalmente. Na região podem sercoletados em torno de 30 m³ por hectares, esta é a média da região,a segunda coleta só pode ser realizada depois de 25 anos. Hojeexiste uma tendência de devastar a floresta sem retirar a madeira,esta prática se deve aos projetos agropecuários e às penalidadesdas leis ambientais. Uma multa em tora é alta, varia de R$ 100,00 a500,00 [dólar 2,65 em outubro de 2001], enquanto que a multa porhectare devastado fica em torno de R$ 1.000,00. Neste sentido, osempresários pagam as quantias exigidas, mas ficam com a áreaaberta para sempre. Com esta tática, os projetos agropecuáriospagam menos e usam quanto querem da área depois de devastada.

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Dentro desta amplitude, podemos avaliar o depoimento dePERTILE (2001), que certifica:

o manejo florestal em Sinop é praticado em 90% das áreas de

extrativismo florestal. Os empresários do setor madeireiro não

objetivam destruir as matas, pois precisamos das florestas para

sempre, do contrário, não existiremos no futuro. Quem devasta são

os projetos ligados a empresas agropecuárias. Em muitos casos,

os madeireiros fazem a coleta das árvores para aproveitamento das

madeiras, pois os projetos agropecuários, independentes da coleta

ou não, fazem a abertura com o objetivo maior de implantar a

agropecuária. Temos vários casos de grupos econômicos que

preferem abrir vastas áreas sem aproveitar as madeiras, fazem a

derrubada das árvores depois colocam fogo para facilitar a abertura.

Esta prática está se tornando muito freqüente na região.

Podemos observar duas situações em Faganello e Pertile:na primeira, nos projetos de manejo florestal da região de FelizNatal, em que cerca de 30% das madeiras são provenientes deáreas com projetos de manejo para a retirada das madeiras; nasegunda, em Sinop, em que aproximadamente 90% das áreas sãocom manejo florestal. A explicação da diferença é que, em FelizNatal, as áreas são distantes e pouco exploradas, além da omissãoe conivência dos órgãos encarregados de fazer a vistoria. Em Sinop,a extração de árvores acontece há mais de 20 anos, e são poucasas áreas ainda disponíveis, além de localizar-se dentro do pólomadeireiro sinopense, é de fácil acesso pela presença da BR-163– Cuiabá-Santarém. O que ficou bem evidente na preocupaçãodos entrevistados, é o projeto agropecuário previsto para a regiãoe a dificuldade de manejar áreas para sustentar o processo deprodução de madeiras no futuro.

Fazer projetos de manejo florestal é uma exigência legalpara retirar a madeira da Amazônia. No entanto, os projetos sãorealizados na maioria das vezes apenas burocraticamente no papel,mas raramente cumprem os objetivos propostos, e servem comoinstrumento legal para realizar a devastação das áreas. Nestesentido, os madeireiros não cumprem com os planos de manejo, eapenas 14% resistem a uma avaliação do próprio Ibama(GREENPEACE, 2001: 3).

Existem leis que coíbem o desrespeito e a interferência do

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homem com os ecossistemas, os povos originários e os proletários,mas os mecanismos para fugir da legislação são muitos, e quandoestão em jogo o respeito ao homem, ao meio ambiente e o lucro,raramente há espaço pelo respeito ao meio ambiente e o homem. Alegislação muitas vezes contribui para atos de ilegalidade, pois “ovalor médio da multa aplicada por metro cúbico de madeira ilegalcaiu” (ADÁRIO e D’ÁVILA, 1999: 13).

Contudo, a nova estratégia dos agropecuaristas é a nãoretirada da madeira das áreas devastadas, destruindo-a para nãoter problemas com a fiscalização. Este fato vem provar que, com ousem projetos de manejo florestal e com madeireiras ou sem elas, adestruição acontece da mesma forma na região. A madeireira, emmuitos casos, apenas faz o aproveitamento do potencial econômicoda floresta tropical como forma de apurar os lucros doempreendimento. A finalidade dos projetos econômicos na Amazôniasão a agricultura e a pecuária, pois ambos vão formar asmonoculturas que mais interessam ao mercado mundial, e assim,se efetiva na prática o grande projeto da região.

Quando acabam as áreas que abastecem as madeireiras,essas indústrias são transferidas aos lugares próximos da coletadas árvores. O que interessa é produzir próximo ao local da extraçãodas árvores (VIDAL et al., 1997: 2-3). Foi o que aconteceu com afloresta atlântica e as araucárias do Paraná. A mesma cena se repetehoje na Amazônia. Além disso, a produção visa aos mercados internoe externo, pois não interessa como e onde a madeira foi produzida.Esta estratégia faz parte do modelo econômico ali implantado, e odeslocamento do processo produtivo acontece sem, sair do objetivomaior, que é a acumulação. Assim, quem determina a forma deextração é o processo capitalista mundial e o local de extração édeterminado pelo processo produtivo regional, com formas própriaspara apurar a lucratividade dos empreendimentos ali instalados.

Ao término da extração em uma região localizada, oscomponentes do processo produtivo mudam-se para outro local. Éo que está acontecendo com as madeireiras sinopenses, muitas jámudaram para Novo Progresso, no Estado do Pará e para outrasregiões com áreas florestais disponíveis. Os mercados nacional einternacional, quando compram os produtos derivados da madeira,não querem saber a procedência dos produtos, pois interessa-lhesprodutos que atendam aos requisitos do mercado. Os compradoresexigem a qualidade dos produtos, e os empresários da extração

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precisam vender produtos o mais próximo possível do padrão edas condições exigidas. Assim, os extrativistas fazem coletasseletivas, que contribuem para a devastação e o desperdício damadeira sem planejamento.

Segundo DÍAS (1993: 31), para atingir os objetivos faz-senecessários a planificação, a programação e o controle dos projetos.As implicações ecológicas estão ligadas às questões econômicas,pois é o sistema quem determina as formas e as regras de mercado,bem como o nível de destruição das florestas tropicais. A partir dainternacionalização da Amazônia e sua integração ao mercadomundial, não é permitida somente a comercialização dos produtosderivados de madeiras, mas é oportunizado aos grupos econômicosali se instalarem com seus projetos de expansão de formadiversificada. A destruição das florestas está ligada ao volume daentrada dos grupos econômicos e à investida econômica naprodução regional para servir ao mercado global.

Por outro lado, existem estudos na região sobre manejo dafloresta de forma racional, que minimizam os desperdícios dasárvores e a agressão ao meio ambiente. Os componentes da áreamanejada incluem: inventário e mapeamento dos recursos; cortedos cipós14 ; planejamento das picadas e arraste; derrubadaorientada; uso de máquinas adequadas (VIDAL et al., 1997: 3;MARTINI, ROSA e UHL, 1998: 14, e SANTOS: 1996: 15). Assim, o uso deestratégias que contemplem “um planejamento correto evita odesempenho medíocre” (HARRINGTON e KNIGHT, 1999: 185).

Os estudos apontam para ganhos com manejo florestal, masestes benefícios são de longo prazo. Através da coleta planejada,as florestas podem aumentar a receita em até 58% em relação aoscustos para formar pastagens e sua manutenção, sendo maislucrativo o manejo das florestas, só que os resultados são de longoprazo, e os empresários objetivam lucros imediatos (SANTOS, 1996:45). A agropecuária na região, tem a preferência pelos lucros rápidos

14 “As florestas são formadas por povoamentos altos, médios e baixos, representandodiferentes fases de desenvolvimento. Nas áreas de floresta alta (madura), as árvoresmedem de 30 a 40 metros de altura, e a presença de cipós não é comum. Nas áreas deflorestas de porte médio (fase intermediária de crescimento), as árvores medemgeralmente de 15 a 25 metros de altura, e a presença de cipós é moderada. Enquanto nafloresta baixa (fase inicial de crescimento) as árvores têm em média 10 metros de alturae a cobertura de cipós é densa.” (VIDAL et al., 1998: 3).

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e contínuos, enquanto que na preservação das áreas o lucro é delongo prazo.

Quando comparamos apenas táticas de extração com e semmanejo florestal, sem, no entanto, considerar os projetosagropecuários de forma generalizada no local, as diferenças podempassar despercebidas. Neste sentido, quando comparamos áreasmanejadas com as não manejadas, “em uma área com 20m³/ha demadeira explorável, o lucro seria cerca de 29% maior que naexploração sem planejamento” (JOHNS, BARRETO e UHL, 1998: 35).

Contudo, 29% de lucro é a meta de qualquer projetocapitalista, mas esta é de longo prazo também, pois só pode serfeita nova coleta depois de 25 a 30 anos de pousio, e faz-senecessário preservar as áreas e aguardar o ciclo da coleta dasárvores. Esses estudos não servem para nada no atual projetoque visa a lucros imediatos, visto ser a não preservação ambientala forma de exploração instalada na região. Além disso, é a formacapitalista ali instalada que determina a forma de produção, poisviabiliza a lógica capitalista por meio da extração das árvores. Oprojeto de extração de árvores objetiva do início ao fim do processoa concentração da riqueza, por meio do imediatismo.

Quem ganha com a sanha desvairada da concentração é ocapital, mas quem perde são o meio ambiente e as massasdespossuídas e marginalizadas, pois o projeto elaborado pelocapital para a região é para atender à lógica sistêmica daacumulação, que visa à produção de mercadorias. Se ainda hoje aprodução madeireira é para servir ao mercado interno, as projeçõesde futuro são para tornar a região grande exportadora de derivadosda floresta, no primeiro estágio, e no segundo estágio, asmonoculturas de soja e gado bovino. Da forma como se apresentao processo produtivo, os lucros ficam somente com os gruposcapitalistas. A força de trabalho e os povos da floresta continuamapenas mais explorados e desassistidos, pois o projeto capitalistada região não contempla os proletários, os povos originários e osecossistemas bem definidos.

Além disso, manejar florestas sempre dá lucros de longoprazo, os projetos capitalistas historicamente, quando se trata deextração de árvores, querem o retorno imediato. É o que aconteceucom a floresta atlântica, ela foi praticamente exterminada no passado.Na Amazônia, hoje, não é diferente, pois o processo é muito maisagressivo, e existe a tecnologia presente representada pelas

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motosserras e tratores. Nesta estratégia podemos observar osinteresses da produção, usando técnicas mais agressivas para serviro mercado com produtos derivados de madeira. Se estes produtosservem aos interesses dos mercados nacional e internacional, entãoquem determina a forma de exploração e a destruição da naturezaé a lógica deste comércio.

Pelo fato de representarem pouco valor econômico e delongo prazo, as árvores jovens são destruídas nas várias fases decoleta e podem ser observadas diferentes formas de desperdício.Estes acontecem primeiro na floresta, “quando as toras sãoderrubadas, mas não são encontradas pelas equipes de arraste.Além disso, árvores jovens de valor comercial sãodesnecessariamente destruídas. Nas fábricas, os desperdíciosocorrem quando as toras são degradadas durante a estocagem equando uma excessiva quantidade de madeira é serradaincorretamente” (VIDAL et al., 1997: 3).

Numa análise mais conjuntural, podemos avaliar as perdasno processo produtivo com mais profundidade. No caso dosdesperdícios nas operações das florestas, elas se apresentam deforma agressiva, pois “cerca de 7 m³ de madeira por hectare sãoliteralmente deixados para trás na floresta. Isto porque osoperadores de máquinas não conseguem localizar as árvoresderrubadas” (UHL et al., 1997: 21). Concordando e aproximando osdados, há cerca de “6,6% m³/ha de madeiras aproveitáveis queforam cortadas, mas não foram encontradas” (VIDAL et al., 1997:6).

Os estudos realizados comprovam o que realmenteacontece na região, pois a extração das árvores é feita semplanejamento e a equipe de derrubada não é a mesma do arrastedas toras, assim não existe um trabalho seqüencial nas operações.Além disso, o sistema “gato” de extração de árvores é realizadosem um mínimo de conhecimento dos agenciadores de mão-de-obra que administram as várias etapas da extração até chegar àindústria de transformação de madeiras, de modo desarticulado.Por outro lado, existem árvores em abundância na região e sãooferecidas pela natureza gratuitamente, isto é, elas possuem poucovalor econômico nas matas, e seu processo de retirada é realizadode forma predatória.

Contudo, “a riqueza da floresta não inclui produtos não-madeireiros - óleos, resinas, fibras, entre outros que também podem

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ser manejados” (UHL et al., 1997: 21). A Amazônia possui árvoresem abundância, porém “somente um terço de cada tora extraída étransformada em produtos serrados” (UHL et al., 1997: 19). É atravésdo processo produtivo e dentro da indústria de transformação demadeiras que se evidencia o desperdício, pois cerca de 66,33% datora não são aproveitados no processamento.

Para melhor esclarecer e não sobrar dúvidas sobre oelevado volume de madeiras desperdiçadas no processo detransformação, é possível apresentar outra experiência realizadana região. Neste estudo, “apenas 36% do volume de uma tora típicaera transformada em madeira serrada, quando a madeira eraproduzida para o mercado brasileiro, e 32% quando era destinadaà exportação. Toras processadas para lâminas produzem uma médiade 39% do seu volume” (VIDAL et al., 1997: 11).

Estes dados também são confirmados por GERWING et al.(2001: 7). Neste sentido, a eficiência no processamento é baixa,pois “são necessários até 3,5 m³ de madeira em tora para produzir1 m³ de madeira serrada” (VIDAL et al., 1999: 11). Os dadosapresentados provam que o mercado mundial é exigente e determinao tipo de madeira e a qualidade dos produtos. Esta atitude contribuipara maior desperdício das madeiras e, conseqüentemente, maiordevastação na floresta tropical da Amazônia.

Segundo estudos realizados por GERWING et al. (2001: 7),quando planejado e organizado o processo de transformação demadeiras dentro da indústria madeireira, através de melhoramentosna armazenagem das toras, o uso de melhores equipamentos e otreinamento da mão-de-obra, podem resultar em sensível aumentono rendimento da tora de 12% a 18% para serrarias e laminados.Por outro lado, segundo a mesma equipe de pesquisadores, quandonão observado todo o processo produtivo, que vai da coleta dasárvores até o seu beneficiamento na indústria, o aproveitamentodo produto final é menor que 1/3. Se realizado o planejamento emtodas as fases deste processo produtivo, os rendimentos totaisresultam em 57% para laminados e 47% para as serrarias (GERWING

et al., 2001: 23).O madeireiro, além de desperdiçar parte das florestas na

forma de coletar as árvores, no armazenamento das toras e noprocessamento da madeira, não respeita áreas legalmenteproibidas. SOUZA Jr. (1997: 12-14) diz que:

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AMAZÔNIAO Estado do Pará possui 29% de suas terras legalmente proibidaspara a exploração madeireira. Em outros 3%, a atividade madeireiraé restrita (por exemplo, Reservas de Produção). No restante do Estado(68%) não há restrição à exploração. A maioria das árvores legalmenteprotegidas da atividade madeireira encontram-se em ReservasIndígenas (22% dos 29% totais de áreas protegidas), em TerrasMilitares (5,5%) e Reservas naturais (1,5%). É importante observarque as terras proibidas para a atividade madeireira são protegidasna maioria das vezes apenas teoricamente. (...) Em resumo, nossaanálise revela que aproximadamente 70% das áreas legalmenteprotegidas no Pará são atualmente acessíveis à atividade madeireira.Dois terços das Terras Indígenas são acessíveis à extraçãomadeireira - especialmente para extração de mogno, uma vez que amaior parte do cinturão do mogno encontra-se nestas reservas. Domesmo modo, cerca de 75% das Áreas Militares estão sob o alcanceeconômico da atividade madeireira. Finalmente todas as Reservasda Natureza e de Produção são também economicamenteacessíveis para extração madeireira seletiva e intensa.

No processo de industrialização das madeiras, a agressãoe o desperdício das árvores estão aliados ao desrespeito àlegislação ambiental. As práticas predatórias tornam vulneráveisas florestas tropicais da região. Um projeto de manejo adequadopode preservar a floresta e ao mesmo tempo prevenir perdasmaiores com incêndios15 nas florestas tropicais. Como foi visto, omanejo florestal traz vantagens aos projetos econômicos, mesmocom os custos do projeto e a sua manutenção, através do uso detecnologia moderna e pessoal mais qualificado. Uma coleta seletivadentro das regras de planejamento é o “meio de romper o ciclo dedegradação de florestas na região, que inclui tanto os danos diretosda extração como com o fogo subseqüente” (VIDAL et al., 1997: 17).Se for comparado o processo madeireiro e o da agropecuária,podemos observar vantagens na primeira alternativa, pois amadeireira gera mais empregos, distribui mais renda e preserva o

15 “O incêndio reduz o valor da floresta. Entretanto, a redução do tamanho das clareirasda exploração, através do planejamento da extração, pode reduzir o risco de incêndios,uma vez que o chão da floresta receberia menos luz solar direta. A exploração commanejo no sítio 2 [área de estudo] reduz em 53% a média do tamanho das clareiras emrelação às clareiras da exploração sem manejo. Além deste benefício, a exploração demadeiras com manejo reduz o desperdício na extração, oferece custos mais baixos deoperação das máquinas e intensifica o potencial de regeneração da floresta. Estudoaponta que a redução da suscetibilidade a incêndios é um benefício adicional.”(HOLDSWORTH e UHL, 1998: 31).

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meio ambiente, mas deve ser de forma manejada para se terflorestas para sempre.

O problema é a exploração da floresta amazônica predatória,sendo realizada de forma não sustentável, pois o projeto instaladona região vislumbra resultados imediatos, e não leva emconsideração os povos da floresta e o meio ambiente, porém,contempla as metas capitalistas de transformar a Amazônia emagropecuária. Os planos de manejo, da forma como são tratadosna região servem para legalizar a devastação e o desperdício dasmadeiras16 . Para o capitalista a extração de árvores é umaalternativa econômica viável para satisfazer as necessidades doprojeto de expansão na região. Esta estratégia contempla a investidacapitalista como uma das fases da acumulação da Amazôniabrasileira. A legislação é mais um mecanismo feito e colocado aserviço dos grupos econômicos, pois torna viável a devastação e,conseqüentemente, o desrespeito com os povos da floresta.

Neste sentido, são poucos os projetos de manejo na regiãoque se fundamentam em dois imperativos: os “critérios desustentabilidade e garantia de sobrevivência de populaçõestradicionais, para que se possa garantir a persistência da florestae seus serviços estratégicos globais para gerações atuais e futuras”(CÂMARA DOS DEPUTADOS, 1998: 39). Na região amazônica torna-sedifícil propor conceitos de sustentabilidade, de preservaçãoambiental e muito menos, pregar a não degradação e a nãoexpropriação das populações tradicionais, bem como dos migrantesdespossuídos que chegam ao local em busca de subsistênciaatravés dos frutos da floresta. Como foi apontado, a região foiprojetada e arquitetada para servir aos grupos econômicosnacionais e transnacionais, para neste local efetivarem aconcentração e a centralização de capitais, pois o projeto objetivaa devastação para implantar uma agropecuária extensivacapitalista.

16 “Desde 1965, existe a existência legal de só explorar a floresta amazônica sob manejo(Código Florestal, Lei n.º 4.771/95, art. 15), mas só teve uma regulamentação abrangentecom a Portaria n.º 48, de 10-7-95, em complemento ao Decreto n.º 1.282, de 19-10-94- isto é, 30 anos depois. Só em 1986, foi definido (Lei n.º 7.511/86) e regulamentado(Portaria n.º 486/86-P, de 20-1086), que só teve detalhamento com a Instrução Normativan.º 80, de 24-9-91. A Portaria n.º 48/95 foi uma resposta às críticas de cientistas epesquisadores, quanto à fragilidade do plano de manejo, e algumas críticas aindapersistem, particularmente no que diz respeito à duração do ciclo de 30 anos.” (CÂMARA

DOS DEPUTADOS, 1998: 56).

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Alternativas existem, e as leis são bem definidas, mas oprojeto ali implantado é muito mais claro e transparente, ele buscaa concentração e o lucro imediatamente, independente dasconseqüências da investida regional. Trata-se do projeto deexpansão com fins de extrair da natureza ali abundante toda acapacidade econômica para a acumulação, mesmo que sejanecessário transformar radicalmente o ambiente natural doecossistema, e a vida dos homens e das mulheres ali existentes. Afloresta amazônica é fruto de anos de evolução da natureza, ela égratuita aos empresários do setor, e pode ser obtida com custosbaixos. Estes sabem que, exaurindo as reservas florestais em umlocal, podem conseguir outras áreas em locais diferentes, bastafazer o deslocamento geográfico do aparelho produtivo madeireiroque o ciclo se repete.

A exploração capitalista na região nasce com a lógica daconcentração, e não com a finalidade de assistir as populaçõesmenos favorecidas, e muito menos para preservar os ecossistemaspara a humanidade atual e futura. O projeto nasce da vontade dosgrupos econômicos, através da ordem da concentração de capitais.A produção madeireira, objeto dos mercados nacional einternacional, é determinada pelas necessidades do capital paraefetivar a acumulação. Evitar desperdícios é uma forma poucoatraente para os objetivos da atual expansão, pois isto requertecnologia mais apurada, força de trabalho mais especializada,maiores custos no atual estágio, e os lucros são de longo prazo. Oque motivaria um empresário do setor a colocar tecnologias maisavançadas, ou qualificar sua força de trabalho, e, além disso,esperar pelos lucros de longo prazo?

Dentro desta perspectiva, estes grupos se instalam naAmazônia com a finalidade de aproveitar os recursos naturais noprocesso produtivo, bem como superexplorar a força de trabalhoque forma o meio para chegar ao objetivo final, que é o lucro. Oprojeto extrativista não pode fugir da regra que o estabelece, elesintetiza o modelo global, torna transparente o seu projeto em doispontos: primeiro, extrair a maior quantidade de mais-valia; segundo,explorar os recursos naturais da Amazônia de forma ilimitada. Nocaso específico da Amazônia, também é explorar os recursosflorestais e superexplorar a força de trabalho, conseqüentemente,obter a maior quantidade de lucro possível, com a finalidade deexpandir-se e concentrar riqueza.

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No processo de extração das árvores, o capitalista tem aliberdade de selecionar a floresta para a coleta, e assim escolher amatéria-prima mais rentável, deixando para trás tudo o que nãorepresenta o valor econômico desejado. Também lhe é dada aliberdade de não fazer o aproveitamento no processo detransformação da tora em madeiras e seus derivados.

Para FAGANELLO (2001), o desperdício pode ser justificadotambém pela “falta de tecnologia adequada e máquinasespecializadas à distância para o transporte, a farta quantidade deárvores, pouca estrutura para competir no mercado e poucosfinanciamentos para o setor”. Neste sentido, “os estados brasileirosque compram nossa madeira, como: Rio Grande do Sul, SantaCatarina, Paraná e São Paulo, os principais compradores nãoquerem nosso aproveitamento. Eles preferem a madeira serrada ede boa qualidade, para transformá-la em produtos derivados nosestados compradores” (PERTILE, 2001).

No processo madeireiro existe uma legislação própria queorienta as formas de interferência na floresta, mas esta pode serburlada ou tornar-se palavra morta através da corrupção, daconivência e da omissão do Estado. A força de trabalho faz partedo processo produtivo, sendo um componente da produção, masela não pode praticar o desperdício de tempo de trabalho, ela deveser impulsionada a prolongar as jornadas de trabalho, intensificandoas atividades dos trabalhadores e reduzindo os salários. Naexploração da força de trabalho e da natureza, são usadas táticaspara apurar o lucro até o limite máximo. Esta é a regra geral usadana região e a meta do capital empenhado no extrativismo dasflorestas tropicais, pois este se desenvolve na Amazônia dentro dalógica da acumulação global.

O projeto capitalista implantado nesta região, não nasce daperspectiva de preservação para subsistência dos povos da floresta,ele é arquitetado para produzir excedentes da força de trabalho,tendo a natureza à sua disposição como alavanca para produzirmais lucro. Neste sentido, nada poderá deter a determinaçãocapitalista sobre o projeto de expansão na floresta tropical brasileira.Enquanto grupos ambientalistas protestam contra a destruição eos desperdícios, os grupos organizados continuam adentrando amata para retirar madeiras, sem a preocupação de preservaçãoambiental ou com o futuro dos povos da floresta.

Nesta lógica, o “mel” está sendo destruído e pode não

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chegar até a mesa da força de trabalho, porém está sendoconquistado pelo mundo do capital através da sanha dos interesseseconômicos na região, por meio da destruição. Esta estratégia foiimplantada no seio da sociedade a partir do surgimento do modocapitalista de produção no passado, e vem ampliar seus interessespelas oportunidades oferecidas na nova fronteira de expansão.

Através da devastação, o potencial econômico das florestastropicais é destruído, assim as possibilidades de encontrar o “mel”tornam-se cada vez mais remotas a todos. Contudo, existe apossibilidade de encontrar a colméia através dos povos da floresta,dos proletários, dos pequenos madeireiros e principalmente, pelosgrandes conglomerados econômicos. Nesta perspectiva, a luta e abusca continuam sempre vivas e os atores sociais são impulsionadospor meio da dinâmica de permanecer acesa a chama da busca doouro e do “mel”, símbolo das representações da conquista. Assim,uma legião de pobres almas caminham em busca do paraíso e avida os convida a prosseguir na caminhada...

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A GRILAGEM DE MADEIRAS E AS FORMAS DEAPURAR OS LUCROS

Alguns grupos extrativistas, através da empresa detransformação de madeiras, sendo elas legalmente constituídas ounão, nascem com a sanha da acumulação do capital e com fins deespoliação da natureza, como também o direito de ter para si todosos benefícios inerentes ao processo produtivo na região amazônica.No entanto, o leque de alternativas para a expansão não pode serlimitado, muito menos ser alvo de interferências contrárias aos seusobjetivos propostos. Os grupos econômicos, além de serconstituídos com a finalidade de expandir-se na região, necessitamreceber apoio do Estado através dos incentivos fiscais e toda aestrutura necessária, e as facilidades para aquisição de grandesáreas de terras a custos baixos.

Estas são as necessidades básicas para concentração eexpansão capitalistas na região, pois esta é a lógica que determinaa existência do capital, e este é o modo de agir onde quer que eleesteja concentrando riqueza. O projeto ali instalado vai além, precisada compreensão do Estado nas atividades ilegais através dosórgãos encarregados de orientar e disciplinar as atividadesmadeireiras. Além de toda estrutura necessária e dos benefíciosoferecidos pelo Estado, faz-se necessário seu consentimentoatravés do apoio ilimitado em suas ações, sendo elas regulares ouirregulares. Comprovando esta perspectiva, no ano de 1996, naAmazônia brasileira, “92,3% das empresas avaliadas praticavamou estão praticando irregularidades com impacto ambiental” (CÂMARA

DOS DEPUTADOS, 1998: 73). Segundo o GREENPEACE (2001: 3), dos30 milhões de metros cúbicos explorados em 2000, cerca de 24

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milhões de metros cúbicos teriam sido explorados ilegalmente, ouseja, 82% do total.

O Estado tem um papel importante neste episódio. A omissãoe a conivência se fazem necessárias, mas isto só não basta, épreciso virem acompanhadas da corrupção das representaçõesestatais em muitas oportunidades. O representante do capital, comacesso aos benefícios criados para expansão e concentração naregião amazônica através da extração de madeiras, parte para umasegunda etapa, a grilagem e o contrabando de madeiras, bem comoa sonegação fiscal.

Se, de um lado, o Estado surge da necessidade de garantiras estruturas de poder, e para beneficiar a propriedade privadaatravés da venda da força de trabalho, por outro lado, “aorganização do crime confunde-se com a própria organização doEstado” (ROCCO, 2000: 109). Neste sentido, a baixa transparênciados órgãos do Estado favoreceu a corrupção. Assim, vários gerentesdo Ibama foram substituídos, e inquéritos foram abertos nos últimosanos (GREENPEACE, 2001: 3).

Fatos desta natureza são possíveis pela forma como oprojeto de expansão foi instalado e, principalmente, pelo sincronismoexistente, pois se observa um certo comprometimento entre capital/Estado através das forças políticas e econômicas representadas.O corte ilegal de madeiras em terras indígenas, de preservaçãoambiental e da União é incentivado, pois os profissionais da extraçãode árvores retiram a madeira para terceiros, “garantindo-lhes aposterior aquisição da madeira. Em seguida, a madeira éesquentada por meio de documentação irregular, beneficiada ecomercializada, inclusive para o mercado externo” (CÂMARA DOS

DEPUTADOS, 1998: 111).Para alguns grupos do extrativismo, não basta ter acesso

às terras de forma legal, é preciso conseguir mais. Isto é possíveldevido às facilidades em obter documentos falsos através daindústria da grilagem na Amazônia, que permite legalizar o que éilegal. E assim isso é oportunizado aos grupos organizados, atravésdas influências políticas e econômicas para usufruírem dos recursosnaturais da região, como também para tirarem proveito em seubenefício das oportunidades estrategicamente oferecidas peloEstado.

Segundo denúncias do Ministério do DesenvolvimentoAgrário, 93.620.587 hectares são fruto da grilagem ou tem duplo

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documento no Brasil e, destes, acima de 95% encontram-se naAmazônia e muitos deles estão com seus cadastros canceladosjunto ao Incra. Isto só não basta, como apontamos, os gruposeconômicos vão além, para usufruir em muitos casos de terras daUnião, de preservação ambiental e, principalmente, de terras dospovos originários. Para o movimento da grilagem de madeiras, poucoou nenhum valor é atribuído à terra. Assim, em terras indígenas ede preservação ambiental em que ocorre a grilagem de madeiras épara o aproveitamento econômico das árvores. A terra somentetem valor econômico quando objetiva uma segunda etapa noprocesso de acumulação, e isso acontece através dos projetosagropecuários.

Neste sentido, “quando a madeira não é simplesmenteroubada, o preço formalmente pago a lideranças indígenascooptadas equivale a cerca de 4% do valor real da madeira e, assimmesmo, não há controle pelos índios da quantidade de madeiraefetivamente extraída das suas terras” (CÂMARA DOS DEPUTADOS,1998: 112). Para os grupos econômicos não podem existir limites,e muito menos restrições em suas ações, pois nas terras indígenasencontram-se as maiores reservas de árvores nobres do País, sendoelas objeto de riqueza e lucro fácil. O respeito com a natureza e aspessoas que dependem da floresta para reproduzir seus gruposatravés da subsistência, acabam na meta maior do capitalista, olucro a qualquer preço e de qualquer forma, mesmo que sejanecessário destruir o reino vegetal e animal amazônico, incluindo opróprio homem.

No processo madeireiro “a imensa quantidade de madeirailegal comercializada acaba definindo o preço de mercado einviabilizando a remuneração dos custos ambientais de eventuaisproduções sustentáveis” (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 1998: 112).Através desta perspectiva regional, quem não pratica a ilegalidadeestá fora do mercado, isto é, o aprofundamento da forma capitalistade produção e a ilegalidade determinam o preço dos produtos vindosdas florestas, quem não a pratica está fora da concorrência e,conseqüentemente, tem dificuldades em manter-se no mercadomadeireiro.

Através da procedência irregular das madeiras, fruto dagrilagem das árvores e da compra destas com valor abaixo dospraticados no mercado, é possível garantir adicionais nas margensde lucro. Assim, parte da madeira, como foi visto, é obtida

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gratuitamente ou a preços insignificantes, em torno de 4% do valorde mercado. Neste sentido, a lógica da produção e dacomercialização se fundamentam nas determinações dos preçosdo mercado, e este passa a se constituir e a ser determinado pelasirregularidades na procedência das toras.

São muitas as formas de tirar proveito em benefício dosgrupos econômicos, e a floresta é usada como alternativa sem limitespara a concentração. Isto é possível através da fiscalizaçãoconivente e possivelmente corrupta, aliada à falta de punição daspráticas criminosas contra o homem, o Estado e o meio ambiente.Assim, alguns empresários do setor são levados a buscar estaalternativa, invadir e extrair madeiras de terras do Estado, depreservação ambiental e dos povos originários.

Esta alternativa se justifica, porque a coleta das árvores emcondições legais é menos lucrativa que as ilegais. Partir para aextração irregular, torna-se uma obrigação do capitalista que instalaseu projeto econômico na região, vindo a ter capacidade paracompetir com preços na venda das madeiras. Ele objetiva apenaso lucro, e quanto maior, melhor, então expropriar, extorquir e roubarsão as formas certas para competir no mercado e obter maiorlucratividade.

Pelas facilidades com que alguns grupos madeireirosorganizados conseguem grilar as madeiras das terras dos gruposoriginários, se evidencia a problemática das terras, principalmentedos indígenas. A CÂMARA DOS DEPUTADOS (1998: 113) comprova:

em suma, fica evidente: (1) a ocorrência em larga escala daexploração predatória e ilegal de madeiras em terras indígenas; (2)o abandono das comunidades indígenas à sanha dos madeireiros;(3) a fragilidade das ações de fiscalização nas terras indígenas; (4)a inexistência de alternativas sustentáveis para a exploração demadeiras pelos próprios índios e em seu benefício; (5) a inexistênciade uma política oficial frente ao problema. Vale destacar que,considerando a estratégia de penetração das madeireiras asiáticaspor intermédio da compra de empresas brasileiras, inclusive deempresas com tradição na exploração predatória e ilegal de madeirasem terras indígenas, o problema deverá se agravar no que dizrespeito a estas terras.

O que torna evidente a problemática da Amazônia é afacilidade encontrada pelos grupos madeireiros para se apoderaremdas madeiras, bem como para legalizarem as condições da

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grilagem, ficando assim facilitada a entrada nesta atividade. O quenos chama a atenção não são os abusos praticados até hoje com anatureza e os povos da região, mas as formas de praticarirregularidades com as áreas de terras e com as madeiras nativas.A preocupação vai além, é o agravamento da investida extrativistaocorrida na metade dos anos 90, através da entrada dasmadeireiras asiáticas. Estes grupos transnacionais estãotransferindo suas atividades para a Amazônia de forma predatóriae atuam na região irregularmente.

Além disso, existe na região a indústria do crime organizadoatravés das empresas de transformação de madeireiras comconstituição fantasma17 , que nascem com a finalidade de fornecernotas fiscais e legalizar às transações comerciais do setor. O objetivomaior é a agressão ao meio ambiente, lesar o Estado, expropriar apopulação de modo geral e produzir mais lucro aos gruposorganizados. Neste processo, as empresas fantasmas são criadaspor escritórios especializados através das táticas criminosas dasonegação e da fraude.

Estas empresas recém-criadas recebem todo o tratamentodentro da normalidade e legalidade de criação para deixar aimpressão de estarem atuando de forma legal. Na formação dasempresas são usados os CPFs de pessoas já falecidas, de pessoassimples que recebem alguma quantia em dinheiro para emprestarseu nome, e muitas vezes sem o conhecimento dos envolvidos. Asempresas criadas objetivam vender notas aos demais madeireirosque tenham alguma dificuldade legal com as exigências ambientaise fiscais com o Estado.

Estas empresas operam na região por um período de tempocurto, visto existir um regime especial para recolher o Imposto Sobrea Circulação de Mercadorias depois de 30 dias de toda a transaçãocomercial. Nesta perspectiva, o ciclo da sonegação exige sempre aatração de empresas novas para não apontar problemas fiscais e,quando identificadas, já deixaram de operar na região. Assim, asempresas fraudulentas são abandonadas sem baixa em seus

17 A formação das indústrias madeireiras fantasmas é uma prática muito comum naregião. Este conhecimento é de domínio público na região, pois muitas das pessoasentrevistadas conhecem esta operação com uma certa riqueza de detalhes, porémtodas recomendam a não utilização de seus nomes. Neste sentido, narramos os fatospreservando a identidade dos entrevistados.

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registros de constituição. Este é um dos motivos da grandequantidade de empresas na região que não atuam no mercado,são abandonadas e não é possível localizar seus responsáveis.

Neste esquema, a indústria da sonegação e falsificaçãoconsegue criar mecanismos de dependência dos demais madeireirosque não fazem parte desta forma de lucro fácil. São alvos destesgrupos organizados, principalmente as pequenas e médiasindústrias de transformação de madeiras, mas especialmente o meioambiente, o Estado e a população que deixa de receber seusbenefícios. O esquema organizado possui ramificações, e em muitoscasos foge dos domínios estaduais, atingindo um certo controleregional, pois pode ocorrer o uso de notas fiscais com origem emoutros Estados da Amazônia.

As empresas especializadas na formação das indústriasfantasmas nascem com a finalidade de sonegar o dinheiro público,de destruir o meio ambiente e produzir lucros fáceis. Para serempossíveis as táticas de sonegação fiscal e terem êxito na operaçãocriminosa, faz-se necessário o comprometimento do Estado atravésde seus órgãos responsáveis. Isto só é possível através de umgrande esquema de corrupção que necessita do envolvimento dasrepresentações estatais de alguma forma. Nesta lógica, não bastama omissão do Estado e sua conivência, bem como a corrupção dealguns setores e pessoas encarregadas em orientar asdeterminações do Estado, é preciso o envolvimento direto noesquema da fraude. Esta modalidade ilícita é amplamente conhecidana região amazônica. Parece um pouco estranho que o Estado eseus órgãos não atuem de forma efetiva para coibir estas práticascriminosas.

Fatos desta natureza fortalecem a necessidade de ampliaras irregularidades na busca do lucro fácil. Por outro lado, osproblemas existentes já denunciam a total falta de respeito,principalmente às terras indígenas, praticadas por alguns gruposde madeireiros instalados na Amazônia. Assim, para ilustrar,podemos usar como exemplo o ocorrido em Tucumã, no sul do Pará,e em Guarantã do Norte, no norte mato-grossense. Em Tucumã,existe um centro madeireiro, enquanto a exploração de madeiras éa principal atividade econômica do município. A cidade está situadaentre cinco terras indígenas, sendo objeto da exploração madeireirailegal.

As terras pertencem aos grupos indígenas Kaiapó, Xicrin

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do Cateté, Apyterewa (índios Parakanã), Trincheira-Bacaju (índiosXicrin do Bacajá) e Araweté. Foi realizada a venda de seis mil metroscúbicos de mogno18 entre a Funai e a Empresa Magnífco da terrados índios Kaiapó. Também a Funai contratou com a Ipanema,Indústria Paraense de Madeiras Ltda., a venda de oito mil metroscúbicos de madeira das terras dos índios Xicrin do Cateté. Em 1988,a Funai vendeu para a firma Maginco e Peracchi sete mil equinhentos metros cúbicos de mogno das terras dos índios Arawetée Apyterewa (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 1998: 114).

A partir de 1989 a Funai deixou de subscrever este tipo decontrato. Porém, funcionários continuam incentivando aformalização de contratos entre os madeireiros e os povosoriginários. No mês de junho de 1989, a indústria madeireiraBannach negociou diretamente com as lideranças indígenas dosXicrin do Cateté, vinte mil metros cúbicos de mogno. Estes sãoapenas alguns casos ocorridos em Tucumã, promovidos pelagrilagem de madeiras. Atos desta natureza não se realizam sem acolaboração de órgãos governamentais.

Assim, a Funai, criada para proteger os índios, em muitoscasos, serve para legalizar a depredação de suas áreas, devido àcorrupção e aos mecanismos legais disponíveis para legalizar atosfraudulentos e corruptos. Os grupos madeireiros envolvidos, alémde contar com a conivência do Estado, usam todo o tipo deartimanhas inerentes para burlar a legalidade. Isto pode ser vistotambém pelo uso da tática de extração com o sistema “gato”. Comofoi apontado anteriormente, muitas vezes o representante daempresa não aparece na operação de grilagem e da fraude, poiseste recebe as madeiras em toras no pátio da indústria detransformação.

Em 1997, ainda estavam presentes estas práticas deextração, inclusive com prisões de alguns madeireiros pela Polícia

18 Mogno – árvore muito comum a partir da América Central, estendendo-se até osEstados de Goiás e Mato Grosso, na Amazônia brasileira. Produz uma das melhoresmadeiras para exportação. Devido à sua belíssima cor avermelhada é muito cobiçadapara o mercado mobiliário. A sua intensa exploração nos últimos anos está reduzindosensivelmente a espécie. É em busca desta árvore que os grupos econômicos daextração de madeira fazem acordos com os órgãos encarregados em proteger osíndios, ou direto com os líderes indígenas para extração da árvore. Em muitos casos aretirada se realiza por grupos grileiros através da invasão e roubo das madeiras. Hoje,a maior quantidade de mogno encontra-se na Amazônia, em terras indígenas.

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Federal (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 1998: 115). Em Tucumã, em terrasdos Trincheira-Bacaju, houve inclusive atritos entre indígenas epequenos grupos madeireiros, “índios e madeireiros têm sido mortosa tiros em decorrência dos conflitos” (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 1998:116). Estas atitudes por parte de alguns grupos madeireiros, aliadascom a fraca atuação dos órgãos que fiscalizam, e com suasatividades, legalizam a impunidade e nos deixam a certeza de que,enquanto não devastarem a Amazônia em sua totalidade, a sanhada concentração não deixará de investir na grilagem.

Outro exemplo ocorre em Guarantã do Norte e em municípiosvizinhos, no norte do Estado mato-grossense, onde se situam asterras dos índios Baú, Menkragnoti, Kapoto-Jarina, Kaiapó ePanará, além de terras do Estado. Nesta região a situação não édiferente; além das áreas indígenas, existem na região muitas áreaspúblicas que vêm sendo demarcadas ou em processos dedemarcação. A CÂMARA DOS DEPUTADOS (1998: 117) diz que:

embora constituída basicamente por terras públicas federais, a regiãode Guarantã vem sendo assediada nos últimos anos por frentes degrilagem que atuam em terras oficialmente destinadas ao Incra, quese incluem em gleba denominada Irani que, por sua vez, se estendeao Norte do Mato Grosso até a linha de fronteira com o Pará, a partirda qual se estendem, para o norte, outras glebas oficialmentedestinadas ao uso exclusivo das Forças Armadas, tambémassediadas. Inúmeros conflitos com mortes vêm ocorrendo na regiãoem conseqüência das disputas entre grupos organizados degrilagem. (...) faz referência à existência de um certo “grupo dos 10”,publicamente reconhecido na região, que reúne políticos e outrasfiguras locais com o objetivo de dominar as frentes de grilo emproveito próprio. O núcleo deste grupo estaria sediado em Guarantãe ele se oporia, fundamentalmente, a outro grupo organizado comfinalidades similares e sediado em Matupá.

A grilagem de madeiras é provocada por grupos madeireirospara explorar principalmente a grande quantidade de mogno naregião. A cobiça pela madeira deve-se ao alto valor comercial, pois“em 2001, um metro cúbico de mogno de qualidade foi vendido porUS$ 1.200” (GROGON, BARRETO e VERÍSSIMO, 2002: 6). Segundo oGREENPEACE (2001, 8), o mogno das terras indígenas da Amazônia,mesmo proibido por lei, é muito rentável na ilegalidade, pois éadquirido por US$ 30 nas terras dos índios Kayapó e revendidopor US$ 1.390.

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Neste cenário, a árvore se torna muito cobiçada pela altalucratividade, e assim “nenhuma área tem sido poupada, nemmesmo a Base Aérea do Cachimbo ou as terras indígenas da região”(CÂMARA DOS DEPUTADOS, 1998: 117). Para o GREENPEACE (2001: 3),o mogno é muito requisitado no mercado externo, pois, da produçãodeste tipo de madeira, 70% é para atender o mercado mundialatravés das exportações. Os abusos e escândalos na regiãotornaram-se públicos. Em 25 de julho de 1996, através de DecretoPresidencial, se proíbe a concessão de novas licenças paraexploração de mogno em terras dos índios Panará.

Muitas das empresas que atuam na região “adotam, há anoso procedimento de abrir e fechar empresas com o único objetivo deburlar as punições que já lhes foram impostas pelo Ibama paraprosseguir com a exploração ilegal e predatória de madeiras”(CÂMARA DOS DEPUTADOS, 1998: 118). Em 1996 temos conhecimentode um empresário da extração de madeiras que foi multado emquatro milhões de dólares, sendo também apreendidos 16.000metros cúbicos de madeira ilegal (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 1998:118). Os problemas com as irregularidades existentes na região deGuarantã do Norte também são citados pela COMISSÃO PARLAMENTAR

DE INQUÉRITO DA ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA mato-grossense (1995: 32).Estes são alguns atos irregulares na Amazônia, mas poucas

são as ações de fiscalização levadas a sério até o final, pois existemmecanismos jurídicos para legalizar a madeira apreendida edesqualificar as multas. Estas facilidades são usadas comoestratégias adotadas pelos grupos econômicos para fraudarem alegislação de forma geral. Mesmo pegos pela fiscalização em rarasocasiões, os mecanismos jurídicos para usufruir desta madeira sãomuitos. Assim, através da contratação de bons juristas eprincipalmente pela corrupção e conivência, se realiza a grilagemna região e se torna o processo lucrativo, por meio da devastaçãosem controle.

Na região amazônica, “culturalmente o maior número deterras indígenas usurpadas em suas madeiras está no Estado deMato Grosso, seguido do Estado do Amazonas, mas em todos osestados da Amazônia Legal observa-se atividade ilegal demadeireiros em terras indígenas” (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 1998:119). São estas as formas encontradas por grupos econômicospara expandir-se, sendo através da indústria da ilegalidade o

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aprofundamento da grilagem para obter mais lucro na expansãoda última fronteira brasileira19 .

Usamos a região de Guarantã do Norte e Tucumã parailustrar o episódio da extração ilegal e a grilagem de madeira, masestes fatos são corriqueiros em toda a Amazônia Legal. Nestaperspectiva o Ibama, através da Operação Macauã, no ano de 1997,através de 2.802 autos de infração, fez apreensão de 600.000metros cúbicos de madeira de origem desconhecida, ou seja, ilegal(CÂMARA DOS DEPUTADOS, 1998: 134).

Por outro lado, o artigo 38º da Lei de Crimes Ambientais diz:“Destruir ou danificar floresta considerada de preservaçãopermanente, mesmo que em formação, ou utilizá-la com infringênciadas normas de proteção: Pena - detenção, de um a três anos, oumulta, ou ambas as penas cumulativamente”. O Artigo 67, queregulamenta sobre os crimes contra a administração ambiental, diz:“Conceder o funcionário público licença, autorização ou permissãoem desacordo com as normas ambientais, para as atividades, obrasou serviços cuja realização depende de ato autorizativo do PoderPúblico: Pena - detenção, de um a três anos, e multa”.

Leis que orientam e determinam as formas de prevençãodo meio ambiente e a fiscalização, bem como os direitos e obrigaçõesdos indivíduos e das empresas, existem, mas em muitas ocasiõeselas não são respeitadas, principalmente quando de interesse paraobtenção de mais lucro. Fatos desta natureza não podem ficaromissos, pois, além de prejudicar o meio ambiente, os povos dafloresta e o Estado, prejudicam o madeireiro que ainda conseguetrabalhar dentro das regularidades na região. É necessário coibiros abusos existentes para preservar as empresas e seusempresários, como também preservar as instituições e seusquadros funcionais.

Para o presidente da Associação dos Madeireiros de FelizNatal, “a grilagem de madeiras é vista como a determinação dopreço de pauta da madeira. A tora vinda do desmatamento ilegaloferece vantagem em torno de 30 a 40% em relação à que vem dedesmatamento legal, este fator determina o preço no mercado”(FAGANELLO, 2001). Com opinião semelhante, o representante do

19 “Cada nova expansão colonial é acompanhada, naturalmente, dessa luta encarniçadado capital contra a situação social e econômica dos indígenas e da apropriação violentade seus meios de produção.” (LUXEMBURG, 1976: 319).

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Sindicato dos Madeireiros do Norte do Estado do Mato Grosso,PERTILE (2001), entende que:

o que determina o valor de mercado são as condições deste mercado.Aqueles que trabalham no dia-a-dia legalmente têm um custo, osque trabalham na ilegalidade têm outro custos, sendo a ilegalidadeque determina o valor das mercadorias. São as empresas quetrabalham na ilegalidade que determinam o preço dos produtos nosmercados nacional e mundial. Este fato nos deixa em situação muitodifícil, tanto para o setor de transformação de madeiras, quanto parao sindicato.

Como indicado, na Amazônia existe uma vantagem muitogrande em operar de forma irregular. As vantagens nos atosfraudulentos e corruptos determinam as formas de ser e agir demuitos projetos econômicos ali instalados. Enquanto isto, o tesouronão é encontrado mais uma vez, ou será que já foi encontrado poralguém? Na dúvida, resta a alternativa de continuar a sua procura,mesmo que o tesouro esteja longe, e as possibilidades a cada diafiquem mais remotas para este encontro.

Se o “mel” é negado para as massas, pode não ter sidonegado aos grupos econômicos nacionais e internacionais que alise instalam. A história não acabou, este não é o fim da investidacapitalista na região e muito menos, o fim da esperança dosdespossuídos e marginalizados para encontrarem o pote de “mel”prometido. O “mel” pode ser muito difícil de ser encontrado, masnão é impossível realizar esta façanha. A vida segue em largospassos rumo ao brilho dourado das ilusões, e esta busca incessantesegue na companhia da luz do Sol tropical...

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RESUMO

Nos anos 70 e 80, acentuou-se a fase capitalista regionalatravés do extrativismo florestal, e este nasceu da finalidade deaproveitar economicamente as árvores para em seguida, instalarem-se grandes projetos agropecuários na Amazônia. O processo detransformação de madeiras passou a necessitar de um grandecontingente de força de trabalho com a finalidade de oxigenar oprocesso produtivo, e este ocorre da coleta das árvores até atransformação das madeiras serradas para o comércio. Oscapitalistas têm ao seu dispor incentivos fiscais para colocar emfuncionamento as indústrias de transformação de madeiras e anatureza exuberante à sua disposição.

Em nome do progresso e da Segurança Nacional, os gruposorganizados se voltam também ao extrativismo florestal para produzirriqueza através da coleta de árvores. Nas três últimas décadas, ainterferência foi mais voltada às indústrias locais, porém, a partirda metade dos anos 90 do século XX começaram a entrar no Paísde forma mais acentuada, madeireiras da Malásia. Estas madeireirasmultinacionais chegam com uma grande capacidade produtiva evêm para transformar a região em grande exportadora dos derivadosde madeiras.

Ao contrário do que se pensava antes da pesquisa, o Brasilé um grande consumidor de madeiras, pois, segundo dados daCâmara dos Deputados, é consumido mais de 80% da madeiraproduzida. A madeira serrada é o produto que serve mais aomercado interno, enquanto os produtos mais elaborados servemaos mercados externos. Segundo dados, das madeiras daAmazônia, 10% é consumida na região, 76% é consumida no Brasilfora da Amazônia e 14% é exportada para outros países.

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Na Amazônia se trabalha a tora apenas de forma tradicional,produzir serrados, aglomerados, laminados e compensados, masa grande maioria das empresas se dedica aos serrados apenas.As indústrias do mobiliário que trabalham com produtos acabadosse encontram no sul do País. Neste sentido, o Estado de SantaCatarina foi o maior exportador de móveis do Brasil em 2002, com46,84%, e em seguida o Estado do Rio Grande do Sul, com 31,24%.

Se hoje exportamos pouco e consumimos a maioria dasmadeiras, a projeção futura nos leva a concluir que passaremos aser grandes exportadores de madeiras serradas e seus derivados.A Malásia e a Indonésia juntas, vendiam 82,43% das madeirastropicais em 1989, e passaram vender em 1995 um índice um poucomenor, 72,01%, revelando um declínio de 10,02% sobre o total. Anovidade é o Brasil, que passou de 2,20% em 1989 para 8,05% em1995, e mais de 12% em 2002.

Neste sentido uma grande quantidade de empresastransnacionais entraram no País nos últimos anos: a Amaplac/WTKda Malásia, a Carolina/Rimbunam Hijau da Malásia, a Compensa/Tianjin da China, o Grupo Ghetal Alemanha, o Grupo Mil da Suiça,o Grupo HTS da Malásia, a Mag. Rimbunam Hijau da Malásia, aMag. Madeira da China, a Selvaplac de países associados, aAmacol/Samling dos Estados Unidos, a Edai/Mitsubishi do Japão ea Nordisk Timer Ltda da Dinamarca entre outras. Cito estasempresas transnacionais pela grande capacidade produtiva, poismuitas delas passaram a dominar regiões muito vastas, algumascom áreas de até 400.000 hectares.

A presença destas empresas está mudando de forma radicala região, pois passam a dominar o mercado de madeiras e trabalhamsomente com madeiras nobres e mais elaboradas. No entanto,segundo a Câmara do Deputados, de cada 13 empresaspesquisadas, 12 encontram-se com algumas irregularidadesambientais, fiscais e principalmente trabalhistas. As empresasmultinacionais vêm para o Brasil com objetivos claros, tirar proveitodos incentivos recebidos pelo Estado brasileiro, sugar as riquezasnaturais e assim buscar o lucro de forma fácil, fazendo a coletaapenas de árvores de interesse do comércio de madeiras.

Quanto ao destino das madeiras exportadas, em 1995 osnossos principais países compradores foram: o Japão com 29,95%,a União Européia com 16,29%, o Tawan, com 9,60%, a Coréia doSul com 8,85%, a China com 8,25% e os Estados Unidos com 4,0%.

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Em 2.000 tivemos um novo destino das madeiras brasileiras: osEstados Unidos, a Espanha e a França como principaiscompradores.

Na região amazônica existem hoje em torno de 6.000madeireiras espalhadas nos nove Estados da região. Destas, acimade 2.000 encontram-se no Estado do Pará, e 1.391 no Estado deMato Grosso, mas somente no norte do Estado mato-grossenseexistem 789 empresas; destas, 196 no município de Sinop, que fazparte desta região norte mato-grossense, e também região de nossapesquisa. Calcula-se que 1/3 destas madeiras encontram-seinativas, paralisaram suas atividades e não deram baixa em seusregistros.

Outro fator que eleva o número das empresas detransformação madeireiras inativas é a sua constituição de formafantasma, ou fictícia que são constituídas com o objetivo de burlara legislação vigente no País. Estas servem para realizar todo tipode sonegação e fraudes, com a finalidade de obter mais lucros aosfraudadores, pois muitas são empresas paralelas a dedocumentação regular. As empresas fictícias nascem e deixam deatuar no mercado em pouco tempo, para logo em seguida seremcriadas outras, assim a fiscalização não consegue localizá-las e ociclo de sonegação se repete.

Para o setor de transformação de madeiras, os incentivosfiscais são fundamentais, e desta maneira muitas empresas sedeslocaram para a região com o objetivo de usufruir destes recursos.A Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia – Sudam,criada em 1966 no início do governo militar, foi o principalinstrumento nas mãos do capital nacional e estrangeiro. Sua funçãofoi criar incentivos fiscais e financeiros com a finalidade de atrairinvestidores privados. Estes benefícios foram colocados àdisposição dos grupos organizados nos empreendimentos daagropecuária, da mineração e da indústria.

Foi com esta política de colonização que a Amazônia sedesenvolveu nas últimas décadas. Assim, nasceram grandesprojetos na região através dos grupos organizados que podiamusufruir dos benefícios para desenvolver os empreendimentos naregião com recursos do Estado. Em contrapartida, o Estado nadaoferecia aos pequenos agricultores, aos comerciantes, aosindustriais e às massas de forma geral. Os grupos que passaram ausufruir deste dinheiro público tinham certa influência na política e

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na economia, e assim eram distribuídas as verbas aos que estavamem acordo com a ditadura, principalmente no período de 1964 a1985.

Os projetos envolvidos na indústria de transformação demadeiras estão nesta mesma estratégia. De 1966 a 2001 totalizaram-se 550 grandes projetos para a região, ficando distribuídos daseguinte forma: 235 na agropecuária, 160 na indústria, 112 naagroindústria e 43 na prestação de serviços. Muitos destes projetosnasceram para fraudar a nação, pois recebiam a primeira parte dodinheiro e devastavam grandes áreas, pois esta era a condiçãopara receber a segunda e a terceira prestações, e depoisabandonavam os projetos. Os projetos não realizados eramobrigados a devolver o dinheiro, porém, depois de dez anos e semjuros, o governo não tinha mais o direito de cobrar a dívida. Atéhoje não temos notícias de que algum empresário devolveu odinheiro, pois os mecanismos legais sempre protegem oscapitalistas, e as leis que os favorecem foram feitas pelo poderpolítico que eles próprios detêm.

Em 2001, a Sudam foi extinta pela grande quantidade dedenúncias envolvendo políticos e grupos econômicos. Nos episódiosestavam envolvidos senadores, deputados, governadores,autoridades governamentais e empresários. Ao extinguir a Sudam,foi criada a Agência de Desenvolvimento da Amazônia – ADA, quefoi uma maneira política de omitir e camuflar os desvios dos recursosprovenientes do Estado.

Porém, os mesmos denunciados no Ministério Públicocontinuam na política, assumindo funções importantes na economiae na política, apesar de que, com a posse do novo Presidente daRepública, está se tentando moralizar o País, diminuindo acorrupção, mas parece que é uma missão bastante complicada edemorada. Assim, se constrói a história da Amazônia, através dodesmando, da opressão e do descaso com os povos marginalizadose despossuídos. Foram criados dois extremos, de um lado os gruposeconômicos que recebem os benefícios e usufruem do dinheiropúblico, de outro lado muitos pobres que nada têm e são excluídosda sociedade em que vivem.

Neste mesmo sentido, podemos observar que as madeireirasde Sinop e região são consideradas grandes, médias e pequenas.A maioria não teve acesso a estes benefícios, pois eram destinadosapenas aos grandes grupos com uma certa influência na política e

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na economia. Segundo o representante do sindicato madeireiroem Sinop, região de estudo, 10% das empresas são grandes eempregam mais de 100 trabalhadores, 48% são médias e empregamentre 20 a 100 trabalhadores, e 42% são pequenas e empregammenos de 20 trabalhadores.

A formação jurídica destas empresas é recente, embora agrande maioria delas tenha maquinário sucateado e velho. É a velhaforma de fraudar e sonegar a nação, fazendo fusões, incorporações,falências e fechamentos para abrirem outras e prosseguirem asatividades empresariais. No ano de 1999, somente 8,7% dasempresas de transformação de madeiras de Sinop tinham mais de15 anos de atividade. Nesta região as pequenas empresas ficamsubordinadas às médias e principalmente às grandes, pois nãopossuem a estrutura necessária e, assim, as pequenas ficamtrabalhando atreladas às grandes empresas. As grandes têmprioridade com alguns tipos de madeiras, ou se especializam naindustrialização de compensados, laminados e aglomerados.

Alguns tipos de madeira que não servem aos objetivosprincipais da empresa são transferidos aos pequenosempreendimentos. Nesta estratégia, quem domina o mercado e aindustrialização são os grandes empreendimentos, pois acomercialização muitas vezes, fica por conta dos grandesempresários. Na equipe de coleta das árvores muitas vezes, entraem cena o “gato” que é o mesmo agenciador de trabalhadores daagropecuária. Neste sentido, o grande madeireiro fornece tratores,caminhões e toda a estrutura em dinheiro para poder contrataroperários e viabilizar o trabalho. Este fica comprometido em fornecertoda a matéria-prima, dados o acordo e o comprometimento entreas partes.

Na lógica da coleta das árvores, interessam apenasmadeiras nobres e de qualidade, e assim o desperdício de madeirascontribui com a devastação. Nos últimos anos a Amazônia dominaa produção nacional de madeiras, a região produz 80% dasmadeiras brasileiras. Estudos realizados na região apontam que,quando realizada coleta de forma seletiva, através de manejoflorestal, podemos coletar árvores a cada 25 anos e com umaprodução de 25 a 50 m³ por hectares. Para que isto aconteça énecessário uma área para cada ano da coleta multiplicado por 25.Exemplificando, se são utilizados 100 hectares por ano paraabastecer a indústria, multiplica-se 25 X 100 = 2.500, desta forma

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são necessários 2.500 hectares para obter produção continuamentenos 25 anos do projeto.

A coleta hoje, na Amazônia, é realizada de qualquer forma,os dados do desperdício são bastante alarmantes. Das torascoletadas, 7% m³ por hectare são perdidos somente no ato daderrubada das árvores. Outros 6,6% m³ por hectare são cortadose não são encontrados pelas equipes de arraste, e assim não existeplanejamento entre a equipe de derrubada e a equipe de arraste.No final do processo, cada 3,5 m³ de madeira coletada resulta em 1m³ de madeira serrada. Se fosse realizado o planejamento em todasas fases do processo produtivo, os rendimentos totais de cada m³seriam de 57% para laminados e 47% para as serrarias.

Analisando os dados, qualquer empresário inteligentegostaria de obter este lucro do desperdício das madeiras que ficaramperdidas no caminho. Porém, na Amazônia o processo de retiradade madeiras é apenas como aproveitamento econômico das árvores,para em seguida implantar os grandes projetos na agricultura e napecuária. Este é o grande projeto da região, produzir gado de cortee soja, de forma extensiva. Em muitas oportunidades pode ser vistaa derrubada das árvores sem o aproveitamento das madeiras,comprovando que na Amazônia os projetos de manejo florestal, namaioria das vezes servem para agravar a depredação da naturezae legalizar a derrubada.

Por exemplo, se uma empresa possui 2.500 hectares deárea manejada, ela pode fazer a retirada das árvores de uma sóvez e voltar a trabalhar com serrarias depois de 25 anos. Por outrolado, a mata, quando nativa, fica imune aos incêndios na região,porém quando recebe interferência do homem através da coleta,mesmo sendo seletiva, fica vulnerável às queimadas. Esta é umaforma de legalizar a situação dos madeireiros e dos agropecuaristas,aliada com uma fiscalização muitas vezes conivente e corrupta, alémdo protecionismo político e econômico, bem como leis que protegeme incentivam todas as formas de agressão aos ecossistemas destavasta região. Leis que orientam, coíbem e determinam as ações naAmazônia, elas existem e são bem claras e rígidas, mas osmecanismos para burlá-las e proteger as irregularidades tambémestão presentes.

Outro fator que chama atenção é a grilagem e o roubo demadeiras como forma de apurar os lucros, bem como todas asirregularidades possíveis na atividade madeireira. Assim, os grupos

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econômicos, além de expandir-se com todos os benefícios eestrutura do Estado, partem para as irregularidades, passam a fazerparte da competição e da estratégia de manter o negócio. No anode 1996, na Amazônia, 92,3% das empresas avaliadas estavampraticando alguma irregularidade ambiental. Em 2000, dos 30milhões de metros cúbicos explorados na região, cerca de 24milhões teriam sido explorados de forma irregular, ou seja, 82% dototal.

Nesta região, a organização do crime confunde-se com aprópria organização do Estado, sendo beneficiado ao longo dostempos pela falta de transparência dos órgãos do Estado quefavoreceram a corrupção. O objetivo de alguns madeireiros é aárea indígena, ou áreas de preservação ambiental e da União. Amadeira é retirada irregularmente, depois a indústria do crimeorganizado apresenta documentação falsa sobre a procedência damadeira, e parte desta é vendida inclusive ao mercado externo.

Como foi apontado anteriormente, 93.620.587 hectares deterras no Brasil são fruto da grilagem, e, destes, mais de 95%encontram-se na Amazônia. Quando a madeira não é roubada, opreço pago às lideranças indígenas não condiz com o valor demercado, não chega a 10% do valor normal. Neste sentido, asirregularidades na comercialização de madeiras acabam definindoo preço de venda e inviabilizando os projetos de manejo ambiental.Este é um dos pontos fortes da pesquisa, o roubo, a grilagem etodas as irregularidades definem o preço das madeiras no mercado.Desta forma, fica difícil àquelas empresas que trabalham de formaregular se manterem no mercado.

Além disso, como foi apontado, existem as empresasfantasmas, que cumprem um papel muito importante na indústriado crime organizado e servem para legalizar as exigências ambientaise fiscais perante o Estado. Nestas áreas teoricamente proibidas deextração de madeiras, existem madeiras nobres como mogno, árvoremuito cobiçada para servir ao comércio externo. Segundo dadosfornecidos pelo Greenpeace, em 2001 o mogno foi adquirido porUS$ 30 nas terras dos índios Kaiapó e revendido por US$ 1.390,pois 70% desta madeira nobre é para atender ao mercado externo.

Esta trama só é possível pela conivência e corrupção dosórgãos encarregados pelo Estado de proteger e dar assistência naregião, e assim o crime organizado assume proporções eramificações das mais estratégicas. Conforme dados dos

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madeireiros, a grilagem, o roubo e o desmatamento irregulardetermina o preço de pauta da madeira e oferecem vantagens emtorno de 30 a 40% em relação à que vem do desmatamento legal.Estas são as condições que encontramos nas indústrias detransformação de madeiras da Amazônia. As irregularidadesdeterminam o valor do comércio da madeira bruta ou beneficiada equem pode ou não permanecer nesta atividade.

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CONCLUSÃO DO ESTUDO REALIZADO

As empresas de transformação de madeiras passaram poruma nova formação estrutural na Amazônia. Com a entrada degrandes grupos econômicos madeireiros, transferindo-se da Ásiapara a Amazônia, a partir da metade da década de 90, foram criadasnovas perspectivas ao setor. A primeira foi um acentuado aumentona devastação da floresta e a possibilidade de uma invasão destasindústrias multinacionais nos próximos anos; a segunda, aeliminação das pequenas e médias indústrias pela nova tecnologiaque começou a ser implantada, bem como pela competitividade nomercado e a legislação mais rigorosa para funcionamento dasempresas; a terceira, a formação de cartéis regionalizados, comdomínio político e econômico, e a quarta, uma mudança napaisagem, transformando as áreas de extração em projetosagropecuários.

Hoje, existem mais de 6.000 indústrias madeireiras naAmazônia, sendo possível reduzi-las pela metade nos próximosanos, através dos mecanismos de exclusão implantados. Isto podeser visto em 2002, quando a fiscalização do Ministério do Trabalhofoi intensificada, que claramente pode ser vista como estratégia deeliminação das pequenas e médias, pela não-adequação àlegislação trabalhista e ambiental. A redução da quantidade deindústrias não significa redução da produção e muito menos, dadevastação florestal. O aumento da devastação está relacionadocom a entrada dos grupos multinacionais na região, pela capacidadeprodutiva através da tecnologia e pela necessidade de produtospara servir ao comércio mundial. Este fato pode ser comprovadopela diminuição gradativa da produção das madeireiras asiáticas epelo aumento progressivo das madeireiras da Amazônia.

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Outro fator que deve ser levado em consideração é adeterminação do preço dos produtos derivados de madeira. O preçode pauta na região é determinado pela grilagem das árvores deterras indígenas, terras da União, de preservação ambiental e doroubo de forma generalizada. Também pela indústria da sonegaçãode impostos, principalmente pelas empresas fantasmas a serviçodesses grupos organizados, que fornecem notas frias no processoprodutivo e na comercialização das madeiras. Estas práticasprejudicam os empresários que não se utilizam deste mecanismoe, principalmente, os cofres públicos, sonegando impostos,prejudicando a arrecadação, vindo a prejudicar a população demodo geral, que não é atendida em seus benefícios, e causando adevastação do meio ambiente.

Possivelmente nas próximas décadas a devastação podeatingir níveis elevados de desertificação da região. Isto é possívelpelas peculiaridades dos solos da Amazônia. A maioria das terras éfraca para o cultivo e as florestas exuberantes possuem acapacidade de auto-sustentação pelos seus próprios resíduos,galhos, flores e frutos. Depois de retirada a camada protetora, suaregeneração só é possível em longo prazo, comprometendo abiodiversidade. Contudo, as madeireiras fazem um papel secundáriona devastação. A meta capitalista para a região são os projetosagropecuários. O madeireiro chega primeiro, com o propósito deaproveitar o valor econômico das florestas, para depois entrarem opé de boi e o grão de soja, transformando a região em projetos demonocultura para servir ao mercado mundial.

Na Amazônia, com madeireiras ou não, a devastação sealastra em toda região, porém o projeto madeireiro é muito lucrativoe se fundamenta nas vastas áreas florestais. Em muitos casos, osgrupos agropecuários de maior poder econômico, ao se instalaremna região, não objetivam o aproveitamento das árvores, devastama área pretendida para depois queimá-la, para facilitar a instalaçãodos grandes projetos. Esta é uma prática que se tornou muitocomum, principalmente na última década. Os grupos econômicos,para não criarem problemas com a procedência da tora, acabamdestruindo as madeiras na abertura das matas.

Os projetos de manejo florestal são uma farsa; mesmoprevistos na legislação, autorizam a coleta das árvores em toda aárea projetada. Esta estratégia torna vulnerável toda a florestaamazônica e legaliza a devastação. Os projetos com áreas

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manejadas, na maioria das vezes, não passam de palavras mortas,contribuem com a devastação. Leis que coíbem o desrespeito coma natureza e orientam a coleta das árvores existem, mas não sãorespeitadas em sua totalidade, pois muitos destes projetos nascemda fraude, da corrupção, da omissão, das astúcias, do calote e daconivência dos órgãos encarregados em zelar e fiscalizar em nomedo Estado. Isto é possível pela influência que estes grupos exercem,através do poder político e econômico, nos limites onde se instalam.

Neste sentido, a devastação da Amazônia é também adestruição dos povos da floresta. É preciso pensar a região comnovas perspectivas para o aproveitamento da biomassa, dando valoreconômico e criando alternativas que venham a preservá-la. Darvalor econômico à floresta minimizaria a devastação, contribuindocom a preservação do meio ambiente; mas é preciso ir além,socializar estes recursos com as populações ali existentes.

Não podemos colocar o aproveitamento da biomassa somentecomo alternativa econômica através da lógica capitalista. Esta deveser vista na lógica da socialização dos frutos deste potencial, paraassistir os marginalizados do País e principalmente, os quedependem das florestas como alternativa para subsistência. Hoje,o grande projeto proposto para a região serve para criar doisextremos: um para concentrar a renda em mãos de poucos e ooutro para criar a pobreza e a miséria para muitos.

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AMAZÔNIA

LISTA DE ABREVIATURAS

ABIMCI....................... Associação Brasileira da Indústria de MadeiraProcessada Mecanicamente.

ABIMOVEL ................ Associação Brasileira das Indústrias doMobiliário.

ABIPA ........................ Associação Brasileira da Indústria de Painéisde Madeira.

ABPM ........................ Associação Brasileira de Preservadores deMadeira.

ADA ........................... Agência de Desenvolvimento da Amazônia.AMFN ........................ Associação dos Madeireiros de Feliz Natal.BRACELPA................ Associação Brasileira de Celulose e Papel.BASA ......................... Banco de Crédito da Amazônia S. A.CIPA ........................... Comissão Interna de Prevenção de

Acidentes.CLT ........................... Consolidação das Leis Trabalhistas.CPI ............................ Comissão Parlamentar de Inquérito.CVRD ........................ Companhia Vale do Rio Doce.DIREN........................ Diretoria de Recursos Naturais Renováveis.EPI ............................. Equipamento de Proteção Individual.GEBAM ..................... Grupo Executivo para a Região do Baixo

Amazonas.FEMA ........................ Fundação Nacional do Meio Ambiente.FIEMT........................ Federação das Indústrias no Estado de Mato

Grosso.FUNAI ........................ Fundação Nacional do Índio.GETAT....................... Grupo Executivo de Terras do Araguaia.IBAMA........................ Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos

Recursos Naturais Renováveis.

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AMAZÔNIA

IBDF .......................... Instituto Brasileiro de DesenvolvimentoFlorestal.

IBGE .......................... Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.ICMS.......................... Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e

Serviços.IMAZON ..................... Instituto do Homem e do Meio Ambiente da

Amazônia.INCRA........................ Instituto Nacional de Colonização e Reforma

Agrária.INSS .......................... Instituto Nacional de Seguridade Social.IPI .............................. Imposto Sobre Produtos Industrializados.LPF ........................... Laboratório de Produtos Florestais.ITTO .......................... International Trade Timber Organization.MIRAD ....................... Ministério da Reforma e Desenvolvimento

Agrário.NASA ......................... National Aeronautics And Space

Administration.PGC .......................... Programa Grande Carajás.PCN ........................... Projeto Calha Norte.PIN ............................. Programa de Integração Nacional.PND ........................... Plano Nacional de Desenvolvimento.PROTERRA .............. Programa de Redistribuição de Terras.POLAMAZÔNIA ......... Programa de Pólos Agropecuários e

Agrominerais da Amazônia.POLONOROESTE .... Programa Integrado de Desenvolvimento

Rural do Noroeste do Brasil.STCP......................... Engenharia de Projetos e Empresa de

Consultoria do Ramo Madeireiro.SBS ........................... Sociedade Brasileira de Silvicultura.SECEX....................... Secretaria de Comércio Exterior.SINDUSMAD .............. Sindicato dos Madeireiros do Norte do Mato

Grosso.SITICOM.................... Sindicato dos Trabalhadores da Indústria do

Mobiliário da Região Norte do Mato Grosso.SPVEA....................... Superintendência do Plano de Valorização

Econômica da Amazônia.SUDAM ...................... Superintendência do Desenvolvimento da

Amazônia.SUFRAMA ................. Superintendência da Zona Franca de

Manaus.SIVAM ........................ Sistema de Vigilância da Amazônia.

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O SILÊNCIO DAS ÁRVORES - FIORELO PICOLI - 123

AMAZÔNIA

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