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Prefeitura Municipal de Belo Horizonte Secretaria Municipal de Sade Fernando Damata Pimentel Prefeito Helvcio Miranda Magalhes Jnior Secretrio Municipal de Sade Maria do Carmo Secretria Municipal Adjunta de Sade Distribuio e Informaes: Secretaria Municipal de Sade Assessoria de Comunicao Av. Afonso Pena 2336 - 12 andar CEP 30130-006 Tel: (31) 32775271 e-mail: [email protected] Reviso ortogrfica e copidesque Esmeralda Madureira

Ficha catalogrfica elaborada pela Bibliotecria Ana Cristina de Vasconcellos - CRB6/505Avanos e desafios na organizao da ateno de sade em Belo Horizonte / A946 organizadora, Maria Aparecida Turci. Belo Horizonte : Secretaria Municipal de Sade de Belo Horizonte : HMP Comunicao, 2008. 432 p. : il., p&b, tabs., grafs., maps. Inclui bibliografia. 1. Sade da famlia . 2. Ateno primria sade. 3. Programas nacionais de sade. 4. Sade pblica Belo Horizonte (MG). I. Turci, Maria Aparecida. II. Belo Horizonte (MG). Secretaria Municipal de Sade. CDD: 362.1042 CDU: 614.063

ApresentaoO municpio de Belo Horizonte tem longa trajetria na organizao do seu sistema de sade e na implementao do Sistema nico de Sade. So mais de duas dcadas seguindo os passos da estruturao da prestao de servios, sempre em busca de inovao, qualidade e justia social. A gesto da sade municipal optou por vigoroso movimento em prol do fortalecimento da rede de ateno bsica, entendendo-a como um ponto do sistema capaz de propiciar populao a ateno necessria para a soluo da maioria de seus problemas de sade, a criao de vnculo e a longitudinalidade do cuidado. Com a implantao de mais de 500 equipes de sade da famlia no municpio, a rede de sade cresceu e se renovou. Enfrentamos muitas dificuldades: ainda sofremos com a insuficincia de profissionais em quantidade e formao adequada para esta proposta assistencial, e as tentativas de soluo, no mbito local ou nacional, ainda no causaram impacto significativo na problemtica da fixao do mdico na ateno bsica; ainda enorme a necessidade de investimentos em infra-estrutura para que a ateno bsica alcance a abrangncia necessria; a atuao em rede do sistema municipal ainda no constituiu a articulao adequada para propiciar a integralidade e garantir o papel de coordenao do cuidado pela ateno bsica. Mas a realidade tem mostrado que o potencial desta proposta bem maior que seus desafios. Hoje a populao de Belo Horizonte reconhece a rede de ateno bsica e suas equipes como referncia na ateno sade. Os vnculos esto sendo criados e os profissionais tm dado demonstrao de seu

compromisso com a proposta e de sua responsabilizao pela populao sob seus cuidados. Esta publicao procura responder necessidade de avano. Reflete o que a instituio responsvel pela gesto municipal pensa sobre as formas de organizar o trabalho no mbito dos centros de sade. Longe de ser uma tentativa de normatizar a organizao local, pretende servir de ferramenta para que as equipes tornem seu processo de trabalho mais organizado, eficiente e, conseqentemente, mais prazeroso. A partir da observao das experincias exitosas, da discusso com os profissionais, gerentes locais, distritos e tambm do controle social, foi possvel acumular contedos para elaborar as propostas apresentadas neste documento. Em enorme movimento de horizontalizao e escuta, foi realizada a reflexo a partir da prtica, a avaliao, o redirecionamento e a proposio de mudanas com segurana. As discusses aqui relatadas visam explicitar o que a Secretaria Municipal pensa e pretende com o grande investimento feito na ateno bsica. Por fim, visam apoiar esta enorme rede, que se compe das equipes de sade da famlia articuladas com as equipes matriciais e profissionais de apoio, para que, a partir do dilogo permanente entre si, com a gesto e a populao da cidade, possam concretizar seu papel no processo histrico de reforma do sistema de sade em Belo Horizonte. com muito orgulho que apresentamos a edio deste livro que, planejado e organizado como material de estudo e consulta para os profissionais de Belo Horizonte, poder certamente ajudar gestores, trabalhadores, usurios, pesquisadores e interessados na militncia por um sistema de sade mais prximo da populao e de suas necessidades.

Helvcio Miranda Magalhes Jnior Secretrio Municipal de Sade de Belo Horizonte

PrefcioA profunda discusso e a bagagem conceitual presentes nesta publicao est em consonncia com a necessidade de expressar para a rede de sade de Belo Horizonte o que a Secretaria Municipal de Sade, entendida como o conjunto de seus gestores e trabalhadores, pensa e espera da Ateno Bsica no municpio. Aps a implantao de 500 equipes de sade da famlia e a busca de sua articulao com a totalidade da rede de ateno bsica, foi possvel perceber que, superados os desafios iniciais, outros se apresentaram, mudaram de intensidade, mas ainda continuam enormes. A ampliao do acesso da populao aos Centros de Sade, dado pelo incremento de recursos, pela instituio de processos de trabalho mais acolhedores, por um lado demonstrou o fortalecimento do vnculo da populao com as equipes e colocou a ateno bsica como a principal porta de entrada do sistema de sade municipal, mas, por outro, levou as equipes a priorizar o atendimento da demanda em detrimento do acompanhamento e seguimento dos usurios e famlias. Outro enorme desafio o de disseminar e coletivizar as diversas reflexes no mbito da gesto central, compartilhando com os demais nveis de gesto, com trabalhadores e usurios. Esse debate se faz imprescindvel para a permanente reviso e retroalimentao do projeto. Foi em busca de propostas e contribuies para as equipes locais que se realizou a ampla discusso, documentada nesta publicao. A Gerncia de Assistncia, com o total apoio da Gesto do municpio, constituiu diversos grupos de trabalho,

compostos por trabalhadores das unidades de sade, distritos e nvel central, bem como gerentes dos diversos nveis da gesto. Foram mais de 200 profissionais envolvidas no processo. Esses grupos se reuniram por cerca de seis meses e apresentaram o produto de suas discusses para anlise e discusso das propostas. Foi o fruto do trabalho desses grupos que gerou o documento que aqui se apresenta. Ao final de 2006, o contedo deste documento foi amplamente discutido em todos os distritos e todos os centros de sade do municpio, para conhecimento de todos e para que as equipes locais pudessem iniciar as mudanas necessrias na sua organizao. O objetivo final, portanto, propiciar aos inmeros trabalhadores da rede bsica de sade, a partir da declarao do que se espera de cada um e da viabilizao de estratgias, um melhor e mais solidrio ambiente de trabalho. populao da nossa cidade, o objetivo permanece oferecer uma assistncia sade qualificada e resolutiva. Temos muito a agradecer a todos os que se envolveram neste processo e contriburam para a sua elaborao. A toda a rede que acredita ser possvel transformar a realidade a partir da reflexo sobre a prtica e da ousadia de operar as mudanas necessrias.

Snia Gesteira e Matos Gerente de Assistncia da Secretaria Municipal de Sade

Organizadoresorganizao geral Maria Aparecida Turci estratgia SF Maria Aparecida Turci apoio a Estratgia SF Snia Gesteira e Matos sade mental Rosemeire Silva Miriam Nadim Abou-Yd sade bucal Carlos Alberto Tenrio Cavalcante Eliana Maria de Oliveira S processo de trabalho no CS Jussara Melo Serafim Barbosa Santos Filho vigilncia e promoo sade Celeste de Souza Rodrigues ngela Parrela ateno domiciliar Maria Aparecida Carvalho Ribeiro Silvana Martins Rosa regulao assistencial Maria Terezinha Gariglio rede assistencial de urgncia Andra Fonseca e Silva Lilian C. Fulgncio Neiva Mariza Aparecida Amorim informaes em sade Cristina Nogueira Patrcia Alves Evangelista acolhimento e demanda espontnea Maria Aparecida Turci

Lista de SiglasAA - rea de Abrangncia ACS - Agente(s) Comunitrio de Sade AIH - Autorizao de Internao Hospitalar CDS - Comisso Distrital de Sade CERSAM - Centro de Referncia em Sade Mental CLS - Comisso Local de Sade CMC - Central de Marcao de Consultas CMS - Conselho Municipal de Sade CS - Centro(s) de Sade DST - Doena Sexualmente Transmissvel ESF - Equipe(s) de Sade Famlia ESM - Equipe(s) de Sade Mental GEAS - Gerncia de Assistncia GEEPI - Gerncia de Epidemiologia e Informao GERASA - Gerncia de Ateno Sade GEREPI - Gerncia de Regulao Epidemiologia e Informao GERG - Gerncia de Regulao

HC - Hospital das Clnicas HOB - Hospital Odilon Behrens IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica IRA - Infeco Respiratria Aguda MS - Ministrio da Sade ONG - Organizao No-Governamental OMS - Organizao Mundial de Sade PAD - Programa de Ateno Domiciliar PROESF - Projeto de Expanso e Consolidao da Sade da Famlia ProGRAB - Programao para Gesto por Resultados na Ateno Bsica SIAB - Sistema de Informao da Ateno Bsica SIH - Sistema de Informao Hospitalar SISREG - Sistema de Regulao SINASC - Sistema de Informao sobre Nascidos Vivos SISPRENATAL - Sistema de Informao do Pr-Natal SMSA - Secretaria Municipal de Sade SINAN - Sistema de Informao de Agravos de Notificao SUS - Sistema nico de Sade TRO - Terapia de Reidratao Oral UPA - Unidade de Pronto Atendimento URS - Unidade de Referncia Secundria

Sumrio

4. SADE BUCAL Justificativa e compromissos Metodologia Gesto Educao permanente

3. SADE MENTAL Principios e diretrizes do cuidado ao portador de sofrimento mental Principios e diretrizes da interface Sade Mental e SF Politica de capacitao

104 104 107 112 114 114 115 119 120

2. CONSTRUO DA ATENO BSICA EM BELO HORIZONTE Papel da rede bsica dentro do sistema Papel da Estratgia de Sade da Famlia Atribuies das Equipes de Sade da Famlia (ESF) Bilogos e Veterinrios Papel do gerente do Centro de Sade Atividades matriciais do CS

INTRODUO Belo Horizonte e a Regio Metropolitana Sistema nico de Sade em Belo Horizonte Breve histrico da Sade da Famlia em Belo Horizonte

13 13 23 32

44 46 53 57 77 81 83

10. REGULAO ASSISTENCIAL Recomendaes para consultas especializadas, procedimentos e exames de mdia complexidade Procedimentos de apoio diagnstico Estratgias para a reorganizao em cada distrito

9. ATENO DOMICILIAR Conceitos e princpios I - Ateno domiciliar na SMSA-BH Propostas A visita domiciliar Padronizao, protocolos e fluxos

8. ACOLHIMENTO E DEMANDA ESPONTNEA O acolhimento no momento atual A organizao da porta de entrada do CS

7. CUIDADO INTEGRAL NOS CICLOS DE VIDA

6. VIGILNCIA E PROMOO SADE Aes de vigilncia na SMSA-BH Projeto Promoo de Modos de Vida Saudveis BH-Sade Papel da rede bsica

Processo de trabalho em sade Estratgias de reorganizao do processo de trabalho A integrao no CS e o trabalho em equipe

5. ORGANIZAO DO PROCESSO DE TRABALHO NOS CENTROS DE SADE

121 124 128 173 183 185 187 188 194 210 211 215 223 224 226 230 232 234 235

237 246 249

REFERNCIAS

AUTORES

12. EXPERINCIAS DOS DISTRITOS SANITRIOS NA ORGANIZAO DOS SERVIOS Promoo em sade no Distrito Sanitrio Barreiro Prticas de telessade no Distrito Sanitrio Oeste Estratgia de ateno sade de populao vulnervel - Distrito Sanitrio Centro-Sul Experincia consolidada de regulao assistencial - Distrito Sanitrio Leste Distrito Sanitrio Nordeste - Grupo Temtico da Criana e do Adolescente Integrao entre poltica de sade mental e a Estratgia de SF - Distrito Sanitrio Noroeste Implantao da Estratgia de SF no Distrito Sanitrio Norte - 100% de populao SUS dependente DS Pampulha: implantao da Estratgia de SF em rea com 50% de cobertura Integrao entre rede assistencial de urgncia e ateno bsica: a experincia de Venda Nova

11. REDE ASSISTENCIAL DE URGNCIA Diretrizes propostas Conceitos de urgncia A interface servios de urgncias e CS Papel e responsabilidade da rede de atendimento Fluxogramas definidos junto rede bsica Organizao de insumos para urgncia/ emergncia no CS Monitoramento, acompanhamento e avaliao de urgncia/emergncia Relao dos anexos

250 255 256 267 267 278 283 284 288

335 335 348 356 365 371 379

392 399 406 414 422

IntroduoBelo Horizonte e a Regio Metropolitana - RMBHBelo Horizonte foi inaugurada em 1897 para ser a nova capital de Minas Gerais. Projetada para abrigar 200 mil moradores, hoje possui cerca de 2,4 milhes de habitantes e ocupa rea de 330,9 Km. Com localizao privilegiada e estratgica em relao aos principais centros do pas e da Amrica Latina, conta com facilidade de acesso areo e rodovirio, o que lhe tem conferido, dentre outras, a caracterstica de ser "aquilo que os gegrafos chamam de cidade funcional" (GOMES, 2000) e, por isso mesmo, tem se transformado em importante plo nacional de turismo de eventos e negcios, alm de plo tecnolgico (PBH, 2005). Para gesto e planejamento da cidade, Belo Horizonte subdividida em nove reas administrativas regionais, que coincidem com nove distritos sanitrios (Figura 1). A Figura 2 apresenta a distribuio da populao de Belo Horizonte por distrito sanitrio, em 2000.

Avanos e Desafios na Organizao da Ateno Bsica Sade em Belo Horizonte

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FIGURA 1 Unidades Administrativas Regionais

Fonte: Relatrio de Gesto/SMSA - 2006

FIGURA 2 Populao de Belo Horizonte por unidades Administrativas/ distritos sanitrios (2000)

Fonte: Relatrio de Gesto/SMSA - 2006

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Avanos e Desafios na Organizao da Ateno Bsica Sade em Belo Horizonte

A Regio Metropolitana de Belo Horizonte - RMBH integra 34 municpios, incluindo-se a capital mineira (Figura 3). Abriga em torno de 4,5 milhes de habitantes em uma rea de 9.459,1 Km. Dos 34 municpios, Vespasiano, Santa Luzia, Ribeiro das Neves, Contagem, Sabar, Nova Lima, Brumadinho e Ibirit estabelecem com Belo Horizonte o seu limite geogrfico.

Figura 3 Mapa da Regio Metropolitana de Belo Horizonte

Fonte: Relatrio de Gesto/SMSA - 2006

Indicadores sociodemogrficos Entre 1991 e 2000, Belo Horizonte cresceu a 1,1% , demostrando claro processo de saldo migratrio negativo, como em outras capitais do pas - 1,2% / Brasil (MACHADO, 2003). O processo de queda da fecundidade e de aumento da esperana de vida ocorrido nos ltimos 20 anos na RMBHAvanos e Desafios na Organizao da Ateno Bsica Sade em Belo Horizonte

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e, especialmente, em Belo Horizonte, segue tendncia geral ocorrida em todo o Brasil. A conjugao destes dois fatores implica no envelhecimento da populao (MACHADO, 2003): enquanto o grupo etrio de 0 a 4 anos perde quase 40% de participao relativa entre os censos de 1980 e 2000, o grupo mais avanado ganha entre 50% a 100% de participao. Na RMBH, as anlises demonstram que o envelhecimento ocorre mais em Belo Horizonte e entre as mulheres e que a populao da Capital mais velha que a dos outros municpios. Em Belo Horizonte, entre as 9 regies administrativas, observa-se que a regio Centro-Sul possui estrutura etria mais idosa, com participao feminina proporcionalmente maior. Em contrapartida, as regies Barreiro e Norte possuem estrutura etria mais jovem, semelhante aos municpios perifricos, coincidindo com as reas que ainda tm um crecimento populacional significativo. A taxa de fecundidade de Belo Horizonte, que j era menor do que 2,0 em 1991, chega a 1,65 em 2000: so valores abaixo do nvel de reposio. Isto significa que, no mdio e longo prazo, a populao no conseguir repor-se, isto , a populao comea a diminuir em termos absolutos. Sabendo-se que o saldo lquido migratrio do municpio negativo, no est longe o dia no qual a populao de Belo Horizonte ir decrescer. No que se refere ao saneamento bsico, considerando que no Brasil menos de 50% da populao urbana atendida por rede geral de esgoto, a cobertura deste servio em Belo Horizonte muito boa. O municpio possui quase 93% dos domiclios atendidos por rede de esgoto, sendo que este percentual alcana 98% na Regional Centro-Sul. Os demais municpios da RMBH tm uma mdia de 64% de cobertura. O abastecimento de gua e a coleta de lixo tm ndices de atendimento ainda melhores do que o acesso ao esgoto16Avanos e Desafios na Organizao da Ateno Bsica Sade em Belo Horizonte

tanto em Belo Horizonte como nos demais municpios, embora seja mantido o diferencial de atendimento de Belo Horizonte em relao a estes. Com referncia aos padres do IDH - ndice de Desenvolvimento Humano, Belo Horizonte (IDH = 0,780) situavase, em 1991, muito proximamente ao limite a partir do qual os municpios so includos no grupo de nvel mais elevado. guisa de comparao, o IDH de Minas Gerais, em 1996, foi de 0,823. Em 2000, Belo Horizonte atingiu o IDH-M 0,839. Destaques econmicos A RMBH, sob vrios aspectos, a mais dinmica do Estado de Minas Gerais. responsvel por 34,44% do PIB estadual, cujo peso maior atribudo ao setor de servios (42,80%), seguido pelo setor industrial (33,83%). No ano de 2000, o municpio de Belo Horizonte participou com 21,46% do PIB estadual e com 62, 31% daquele da regio metropolitana, ou seja, quase trs vezes mais que a somatria dos municpios que ocupavam a segunda e a terceira colocao (Betim e Contagem). Assim, o municpio de Belo Horizonte possui forte valor agregado em sua capacidade produtiva em relao aos demais municpios da regio. As principais indstrias hierarquicamente ordenadas para o ano de 2002 foram representadas pela indstria metalrgica (16,95%), indstria de bebidas (15,43%), de material eltrico, eletrnico e de comunicao (9,18%), de produtos alimentares (8,48%) e do vesturio, calado e artefatos de tecidos (7,25%). Se a participao de Belo Horizonte no segmento industrial alta, a participao do municpio em relao regio metropolitana no setor de servios pode ser considerada de uma primazia quase absoluta (77,4% do PIB setorial em 1999).Avanos e Desafios na Organizao da Ateno Bsica Sade em Belo Horizonte

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De acordo com os dados acima, verifica-se que a cidade de Belo Horizonte continua centralizando grande parte das atividades econmicas desenvolvidas na regio metropolitana e no Estado de Minas Gerais. Nesta direo, Belo Horizonte pode se constituir como plo concentrador de servios estratgicos que alimentam a cadeia produtiva de cadeias industriais de alta tecnologia (ARAJO, 2003). Controle social em sade e participao popular O Conselho Municipal de Sade de Belo Horizonte - CMS - exemplo de participao e controle social em sade exercido de forma democrtica e atuante na construo de um sistema de sade pblico de qualidade. Em 2007 o CMS de Belo Horizonte completa 16 anos de atuao e, desde ento, diversas conferncias e plenrias tm sido realizadas. A primeira conferncia municipal de sade de Belo Horizonte, intitulada Pr-Conferncia, ocorreu no primeiro semestre de 1986, foi organizada por tcnicos da Secretaria Municipal de Sade de Belo Horizonte, precedendo a Pr-Conferncia Estadual preparatria para a VIII Conferncia Nacional de Sade. A II Conferncia Municipal de Sade foi realizada em novembro de 1990 e teve como objetivos discutir as polticas de sade para o municpio e constituir um Conselho de Sade, incluindo a elaborao e a aprovao de seu estatuto. Desde ento sete novas conferncias municipais de sade foram realizadas em Belo Horizonte, sendo estas efetivas e importantes na construo do SUS e do controle social neste municpio. A cada nova conferncia a participao e o envolvimento da populao de Belo Horizonte cresceram em quantidade e qualidade. Os temas desenvolvidos nessas conferncias demonstram preocupao com os rumos do SUS no18Avanos e Desafios na Organizao da Ateno Bsica Sade em Belo Horizonte

municpio e compreenso da complexidade para garantir sade de forma eqnime, universal e de qualidade. Em Belo Horizonte, a participao popular ocorre nas Comisses Locais de Sade - CLS (que funcionam em todas as unidades de sade), nas nove Comisses Distritais de Sade - CDS e no Conselho Municipal de Sade - CMS. Pode-se dizer que o controle social exercido efetivamente na ponta do sistema, onde ocorre a ao de sade coletiva e individual. Os resultados dessa conquista e das lutas constantes so demonstrados na efetivao e crescimento do SUS em Belo Horizonte, plo estadual e municipal de assistncia em sade, exemplo de gesto participativa e de inovao nos modelos de ateno em sade. Alm da participao efetiva do Conselho Municipal de Sade de Belo Horizonte na gesto do SUS/BH, os muncipes tm o privilgio e a responsabilidade de construir um processo democrtico e descentralizado de tomada de deciso atravs do Oramento Participativo - OP incluindo , um recente formato digital que mobilizou diretamente cerca de 500 mil votos em obras estruturantes na cidade. Perfil epidemiolgico da populao O quadro de sade do municpio no difere muito daquele das grandes cidades brasileiras. Usando a base de dados de 2004, com relao mortalidade as doenas do aparelho circulatrio representaram 28,1% dos bitos de residentes em BH. Em segundo lugar esto as neoplasias, com 16,1% dos bitos, e as causas externas, representando 14,2% do total de bitos. Na anlise histrica da mortalidade proporcional por grupos de causa na srie 1980, 2000 e 2003, pode ser19

Avanos e Desafios na Organizao da Ateno Bsica Sade em Belo Horizonte

observada queda sustentada na mortalidade por doenas infecciosas, mesmo a despeito da mudana da codificao de causa bsica ocorrida com a implantao da CID 10 edio a partir de 1996. A mortalidade por doenas endcrinas apresentou declnio no perodo, devendo ser ressaltado que os bitos por diabetes representaram cerca de 65% deste grupo em 2003. Houve aumento da importncia da mortalidade por neoplasias e causas externas. Com relao s doenas cardiovasculares, registrou-se aumento entre 1980 e 1991 e declnio entre 2000 e 2003. Fato significativo o aumento da tendncia de crescimento das causas externas aps 1995. Apesar da queda no perodo de 1999 a 2002, h novo crescimento em 2003 e 2004. O coeficiente de mortalidade por homicdios comea a apresentar aumento sustentado, saltando de 11,5/100.000 em 1994 para 47,1/100.000 em 2004. Apesar do aumento em ambos os sexos e em todas as faixas etrias, est entre os homens de 15 a 29 e entre 30 a 59 anos seu maior nvel. Este impacto geral no grupo foi parcialmente compensado pelo decrscimo da mortalidade por acidentes de trnsito, que vai de 27,8/100.000 em 1997 para 14,2/100.000 em 2004, certamente resultado do conjunto de polticas pblicas articuladas em vrios campos pelo governo municipal com apoio no advento do novo Cdigo de Trnsito Brasileiro. A mortalidade infantil vem caindo sistematicamente desde 1993, com reduo de taxas de 34,4 para 13,3/1000 em 2004. A reduo mais significativa ocorreu no componente psneonatal, relacionada s doenas infecciosas e desnutrio, mas tambm ocorreu na mortalidade neonatal que se relaciona com a qualidade da assistncia perinatal. Para efeito comparativo e com relao s internaes e aos respectivos percentuais de gastos financeiros, as principais causas foram: gravidez, parto e puerprio (16,3% das internaes e 8,1% dos pagamentos), doenas do aparelho respiratrio (12,2% e 8,9%), doenas do aparelho circulatrio (11,4% e 19,9%), causas externas (11,1% e 12,8%) e neoplasias (8,5% e 10,8%).20

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ndice de vulnerabilidade sade O indice de vulnerabilidade sade utilizado pela SMSA/ PBH uma combinao de diferentes variveis num indicador que busca resumir informaes relevantes que traduzem as desigualdades intra-urbanas, apontando reas prioritrias para interveno e alocao de recursos, favorecendo a proposio de aes intersetoriais. O Quadro 1 apresenta as fontes de informao e os indicadores utilizados na construo das reas de vulnerabilidade sade.

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Aps o clculo do ndice de vulnerabilidade sade, os setores censitrios foram classificados nas seguintes categorias:

A distribuio da populao de Belo Horizonte, segundo o ndice de vulnerabilidade sade e a regional administrativa, pode ser vista na tabela a seguir.

Tabela 1 Distribuio da populao de Belo Horizonte por regional e rea de risco

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O mapa a seguir demonstra o ndice de vulnerabilidade sade por setor censitrio em Belo Horizonte.

Figura 04 ndice de vulnerabilidade sade 2003

Sistema nico de Sade em Belo HorizonteOrganizao territorial em sade A organizao territorial estabelecida na SMSA/PBH dse de acordo com as necessidades e possibilidades das prticas de interveno. So adotadas as seguintes subdivises:23

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Os Distritos Sanitrios seguem a delimitao das Administraes Regionais e correspondem organizao administrativo-assistencial da SMSA/PBH. As definies territoriais das reas de abrangncia tm sido estabelecidas com base nos setores censitrios definidos pelo IBGE, sendo constitudas por um agrupamento de setores contguos, respeitados seus limites, e com possibilidades de modificaes dinmicas de acordo com a mobilidade da populao. A definio dos setores censitrios que formam uma determinada rea feita atravs de avaliao pelas equipes locais e distritais, considerando a demanda atendida, o perfil epidemiolgico da regio, o acesso unidade de sade, a existncia de barreiras geogrficas, o tamanho populacional, o fluxo de transporte, dentre outros fatores. Desta forma, tem sido possvel a quantificao e a classificao socioeconmica da populao adscrita, das condies de infra-estrutura e de demais informaes, disponibilizadas de modo agregado por setor censitrio nos censos populacionais feitos pelo IBGE. Um outro instrumento importante construdo foi o Censo BH Social, cadastro municipal dos usurios dos servios24Avanos e Desafios na Organizao da Ateno Bsica Sade em Belo Horizonte

pblicos, com o cadastramento ativo de cerca de 1,5 milho de habitantes e atualizao pelos agentes comunitrios de sade a partir de suas visitas domiciliares mensais. Este processo permite a atualizao permanente das informaes a respeito da populao preferencialmente usuria do SUS. Unidades assistenciais da Rede SUS/BH O SUS-BH conta com uma srie de unidades assistenciais que compem sua rede, constituda com o objetivo de garantir a integralidade da ateno, conforme pode ser verificado abaixo.

Tabela 2 Distribuio das unidades assistenciais do SUS-BH 2007

Fonte: Gerncia de Regulao/SMSA - dez/2007

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A rede de Ateno Bsica A base de organizao da rede municipal so os 144 centros de sade, distribudos no municpio com base nas regies de responsabilidade sanitria, chamadas de reas de abrangncia.

Figura 5 Mapa das reas de abrangncia dos centros de sade de Belo Horizonte.

Fonte: Gerncia de Vigilncia Sade e InformaoI/ SMSA - dez/2007

As equipes de sade da famlia e de sade bucal atuam no espao dos centros de sade em conjunto com os demais profissionais que compem a ateno bsica (clnicos, pediatras, ginecologistas, assistentes sociais, equipes de sade mental, etc.)26

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Esta rede de centros de sade responsvel por enorme volume de atendimentos, expresso no quadro abaixo.

Quadro 2 Produo da Rede Bsica em Belo Horizonte - 2006

Fonte: Relatrio de Gesto /SMSA - 2007

Servios de urgncia/emergncia So quatorze portas de entrada de urgncia no municpio, sendo sete unidades de pronto atendimento e sete de pronto-socorro hospitalar. O servio mvel de urgncia conta com dezoito ambulncias de suporte bsico e quatro de suporte avanado e atende traumas, urgncias clnicas, obsttricas e psiquitricas. Rede hospitalar e leitos SUS-BH A rede hospitalar contratada/conveniada ao SUS-BH, com 36 unidades, constitui-se de hospitais de diferentes27

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naturezas (municipal, estaduais, universitrios, filantrpicos e privados), sendo apenas um pblico municipal, o Hospital Municipal Odilon Behrens - HOB. Somente cerca de 15% do total dos leitos hospitalares da rede hospitalar de Belo Horizonte so leitos pblicos, o que impe um desempenho especial de articulao e negociao gesto SUS-BH.

Figura 06 Rede hospitalar de Belo Horizonte por rea administrativa regional

Fonte: GVSI/SMSA - dez/2007

Quadro 03 Distribuio de hospitais segundo natureza em Belo Horizonte

Rede Hospitalar Pblico municipal: 1 Pblicos estaduais: 9 Pblicos federais: 2 Filantrpicos: 12 Privados: 12 Total: 36

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Os leitos da rede hospitalar conveniada com o SUS-BH, na sua totalidade, a includos aqueles da rede prpria (HOB), so utilizados pelos usurios atravs da regulao feita pela Central de Internao - CINT. Nos ltimos doze anos, aps o advento da gesto plena do SUS no municpio, houve um processo intenso de reorganizao da rede hospitalar do SUS-BH motivados por diversas razes, como o processo avanado da reforma psiquitrica (mais de 1.000 leitos fechados), avaliao e controle de qualidade, em alguns casos pelo desinteresse dos prestadores pelo SUS em decorrncia do padro de financiamento e, principalmente, fechamento de hospitais por m gesto em todos os seus sentidos. Outros leitos foram abertos dentro do padro de qualidade e perfil exigido pela gesto, mostrando uma reestruturao produtiva no sistema. Ainda agora percebe-se a necessidade de maior nmero dos chamados leitos de mdia complexidade, em especial na clnica mdica e terapia intensiva adulto e, topicamente, em algumas especialidades cirrgicas. Deve se observar que a questo grave do incio da dcada de 90 de insuficincia de leitos neonatais e peditricos foi razoavelmente equacionada a partir de um grande esforo de investimentos por parte da governo municipal e apoio das demais esferas de gesto. Merece destaque o processo articulado com o Ministrio da Sade e a Secretaria de Estado da Sade, sob coordenao da SMSA, de reestruturao completa da Santa Casa de Misericrdia de Belo Horizonte, hoje o maior prestador do SUS no Estado de MG, que estava h quatro anos praticamente fechada. Hoje conta com quase 800 leitos, 100% regulados pela CInt da SMSA, e a grande base de internaes do sistema de urgncia da cidade e da rede bsica municipal. Outros processos semelhantes, em menor dimenso, foram necessrios em vrios

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prestadores hospitalares do municpio, de forma a se tornarem mais sustentveis financeiramente e com gesto mais profissionalizada. Completa este ciclo a implantao de servios ambulatoriais e de urgncia substitutivos, na rea da sade mental, de cuidados-dia e cirurgia ambulatorial e de ateno domiciliar, este com projeto de grande expanso a curto prazo. Houve um esforo e investimento na introduo de mecanismos refinados e rigorosos de regulao assistencial, com ferramentas tecnolgicas mais modernas e grande contingente de equipes de superviso e controle. Ateno especializada Os servios abaixo compem a rede de ateno especializada no municpio. Servios prprios: URS Campos Sales URS Padre Eustquio URS Sagrada Famlia URS Saudade Policlnica Centro-Sul Ambulatrio Hospital Municipal Odilon Behrens/ CEM Pampulha e Noroeste Centro Municipal de Oftalmologia Ncleo de Cirurgia Ambulatorial Centro de Reabilitao Sagrada Famlia (CREAB) Servio de Reabilitao Padre Eustquio Centro Geral de Reabilitao Centro de Especialidades Odontolgicas30

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Servios contratados: ambulatoriais) Hospital das Clnicas Santa Casa

(maiores

prestadores

Hospital Universitrio So Jos Faculdade de Cincias Mdicas Hospital da Baleia Hospital Evanglico Hospital Sofia Feldman Com relao ateno especializada, a tabela a seguir mostra o nmero de consultas agendadas pela Central de Marcao de Consultas (CMC), atendendo a populao residente em Belo Horizonte e em outros municpios. Em mdia 55% das consultas produzidas so realizadas na rede prpria.

Quadro 4 Consultas marcadas pela Central de Marcao de Consultas - CMC, ano 2006

Fonte: Relatrio de Gesto/SMSA - 2007

Alm do investimento na ampliao da oferta de maior demanda reprimida, como oftalmologia e cardiologia, houve uma mudana conceitual significativa na organizao do ncleo da ateno especializada, procurando dar consistncia ao discurso das linhas articuladas de cuidado, com a implantao progressiva eAvanos e Desafios na Organizao da Ateno Bsica Sade em Belo Horizonte

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em curso dos CEM - Centros de Especialidades Mdicas. So estruturas leves, compostas pelas sete principais especialidades, vinculando um conjunto de equipes de sade da famlia com equipes de especialistas, utilizando o conceito da vinculao entre estes dois plos, aproximando-os inclusive com definio territorial e contribuindo para a educao permanente dos mdicos. Completa este projeto, a modernizao do sistema informatizado de informao secundria (SISREG modificado em BH) e o grande projeto do TELESSADE, nas reas de medicina, enfermagem e odontologia.

Breve histrico da sade da famlia em Belo HorizonteImplantao As primeiras equipes de sade da famlia em Belo Horizonte foram implantadas em fevereiro de 2002. No incio da implantao, a SMSA pretendia utilizar os recursos humanos existentes na rede para formatar as equipes e desenvolveu, para tanto, uma proposta de adeso dos profissionais, na qual estes concordavam com as alteraes de carga horria, salariais e do processo de trabalho e tambm se inscreviam para o recebimento de uma gratificao salarial denominada "plus do PSF". As primeiras ESF cadastradas - cerca de 176 - foram, portanto, organizadas com profissionais da rede. exceo destes, ao longo dos dois anos de implantao, poucos foram os mdicos e enfermeiros da rede que aderiram Estratgia de Sade da Famlia, sendo que vrios se descredenciaram. As equipes foram implantadas nos centros de sade do municpio, ficando responsveis pela assistncia sade das populaes consideradas de maior risco para adoecer32

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e morrer, conforme ndice de vulnerabilidade. Para estas populaes a estratgia de SF viria substituir a forma de organizao anterior, significando, ainda, uma mudana processual por dentro da rede de servios, sem redes paralelas e concorrentes. No primeiro ano de implantao, os profissionais que no aderiram ESF (pediatras, ginecologistas, clnicos e pessoal de enfermagem) permaneceram nos centros de sade de origem. A SMSA incentivou a formatao de equipes chamadas "ampliadas", que agregavam o especialista equipe bsica, havendo um incremento da populao sob sua responsabilidade. Em outros casos, os CS se organizaram com "equipes de apoio", nas quais os especialistas funcionavam como retaguarda para as ESF bsicas, atendendo os casos agudos ou os casos mais complexos. Estes profissionais mantiveram sua carga horria original e passaram tambm a receber o "plus PSF". Em outros centros, os profissionais que no aderiram Estratgia de Sade da Famlia ficaram responsveis pelo atendimento da populao no coberta (baixo risco) nos moldes do atendimento demanda e agendamento de consultas. Com o objetivo de implantar mais de 500 ESF e com apenas 44% desta meta composta por profissionais da rede, foi necessrio viabilizar a contratao administrativa de mdicos e enfermeiros para as ESF restantes. Com isto, nos primeiros anos da implantao houve contratao de inmeros mdicos e enfermeiros, gerando enorme incremento na capacidade assistencial da rede bsica de sade. BH-Vida: Sade Integral No incio de 2003, percebeu-se a necessidade de um processo de discusso na SMSA que avaliasse o momento33

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da poltica de sade do municpio, agregando os diversos atores polticos em torno do projeto para a ateno bsica. Alm disto, foram revistos os projetos para outros setores da SMSA (ateno especializada, vigilncias), traduzidos no documento BH-Vida: Sade Integral. Houve, ainda, a deciso de resgatar a gesto colegiada em todas as instncias da SMSA. Com isto, vrios espaos de discusses foram institudos, e criou-se um ambiente propcio para a criao de consensos em torno do projeto da SMSA. No mbito da ateno bsica foram levantados os problemas que mais comumente afetavam o funcionamento dos CS e, conseqentemente, a qualidade do atendimento prestado. Avaliou-se, por exemplo, que havia pouca clareza quanto ao formato dos diversos tipos de equipes existentes naquele momento e do seu funcionamento nas unidades. Mesmo passados trs anos de experincia, a insero do agente comunitrio de sade nos CS era confusa e seu processo de trabalho pouco definido. Havia impreciso da proposta de organizao do processo de trabalho em nvel micropoltico e na insero dos projetos da sade mental e sade bucal. Havia indefinio quanto diviso territorial e populacional a ser trabalhada, bem como estavam defasados os critrios populacionais e quantitativos de cobertura das ESF. Aps intensa discusso no mbito da gesto municipal, foram feitas definies estratgicas, descritas no documento Recomendaes para a organizao da ateno bsica na rede municipal - 2003". Como diretriz do modelo assistencial para a ateno bsica, a SMSA reafirmou a sade da famlia como eixo norteador da organizao da ateno bsica e props a reinsero de todos os profissionais dos CS neste projeto,34

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no sentido de possibilitar a integrao entre as equipes, inclusive com a extenso da gratificao financeira para todos os profissionais da rede bsica. A ateno bsica passou a ser compreendida num nico modelo de ateno, pautado em diretrizes comuns, a ser implementado pelos diversos profissionais dos CS. Mantevese a priorizao de implantao de ESF para as reas de risco muito elevado, elevado e mdio, com a novidade da previso de cobertura para a populao de baixo risco naqueles centros de sade onde esta representasse menos de 20% da populao total. Outra importante deciso foi a opo por no ter equipes no formato "ampliadas", apenas bsicas, organizando os mdicos clnicos, pediatras e ginecologistas em equipes de apoio e referncia s ESF e estendendo a gratificao do SF para a totalidade dos profissionais da rede bsica de servios. Foram definidas as diretrizes assistenciais do processo de trabalho: o acesso universal, o estabelecimento de vnculo e a responsabilizao do cuidado, a autonomizao do usurio, a atuao em equipe, a assistncia integral e resolutiva, a ateno generalista do mdico da sade da famlia, a eqidade, a participao no planejamento e desenvolvimento de aes intersetoriais e o acolhimento. Manteve-se a diretriz da gesto participativa com a reestruturao dos colegiados gestores locais, a participao popular e o controle social na gesto local. As aes Aps todas estas definies, foi instalado amplo processo de discusso e pactuao na rede municipal de sade, que passou a trabalhar na implementao de um projeto nico para a ateno bsica em consenso comAvanos e Desafios na Organizao da Ateno Bsica Sade em Belo Horizonte

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todos os nveis gerenciais. Todos os distritos compuseram "grupos de conduo" que, de maneiras diversas, realizaram aproximaes sucessivas dos CS e dos trabalhadores para discusso e implementao do projeto. Em 2003 foi realizada, ainda, a atualizao do ndice de vulnerabilidade sade, com a utilizao de novos indicadores e dos dados do censo 2000. Os novos setores censitrios foram classificados levando-se em conta esta nova situao. A partir da foi feito o clculo da previso de equipes de sade da famlia por centro de sade. Os distritos sanitrios avaliaram as novas propostas e fizeram as adequaes necessrias. Para adequao aos critrios pactuados e ao nmero total de ESF propostas para o municpio, algumas equipes foram remanejadas de reas onde a cobertura era baixa ou de populao de baixo risco para reas mais perifricas do municpio, onde a mdia de habitantes por equipe era muito alta ou mesmo para reas de maior crescimento populacional. No total foram deslocadas 27 equipes e at meados de 2004 foram implantadas as equipes restantes at completar o total previsto. Alm disto, vrios mdicos das especialidades bsicas foram remanejados de centros de sade com mais de um profissional por especialidade, para que fosse garantido o apoio aos generalistas, a referncia e resolutividade neste nvel da ateno. Em 2003 tambm foram aprofundadas as discusses sobre atribuies do ACS e critrios de seleo, elaborao do Roteiro de Visitas do ACS bem como do formulrio de registro das atividades dirias e seu manual de preenchimento. Foi implantado, em 2004, o citado formulrio e os dados provenientes do mesmo vm propiciando a alimentao do SIAB - Sistema de36

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Informaes da Ateno Bsica por parte do municpio de Belo Horizonte. No sentido de estabilizar as equipes e garantir o vnculo dos profissionais com a comunidade, foi realizado em 2004 o primeiro concurso pblico para mdicos e enfermeiros de famlia. Foram nomeados todos os 170 mdicos concursados e 286 enfermeiros, possibilitando maior estabilidade do trabalho das equipes. Houve manuteno das estratgias de capacitao das equipes, com o incio de novas turmas no curso de especializao em sade da famlia, totalizando 1.000 profissionais com este ttulo. Tambm esto sendo formados 100 odontlogos na especialidade Sade da Famlia e est prevista a formao de mais 200. Avanos e desafios O processo de implantao da Estratgia de Sade da Famlia no municpio de Belo Horizonte trouxe vrios avanos: incremento de recursos humanos; reorganizao do processo de trabalho; mudana na forma de abordargem da populao usuria; diversificao da oferta de aes de promoo da sade nos CS; ampliao do acesso aos servios de sade, em especial da populao adulta, com a configurao da ateno bsica como porta de entrada - no a nica, mas a principal - para o sistema de sade municipal; identificao da populao dependente de cuidados domiciliares, que antes era invisvel aos centros de sade, com ampliao da ateno prestada nos domiclios pelos diversos profissionais da ESF; aumento na complexidade do cuidado mdico e de enfermagem, no sendo raro usurios com problemas de sade complexos, ou em observao, ou mesmo em crises agudas sob os cuidados das equipes; estabilizao de boa37

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parte das equipes e conseqente ampliao do vnculo entre a populao e os centros de sade; responsabilizao das equipes e possibilidade de se prestar cuidado continuado. Decorre da, certamente, o reconhecimento pela populao usuria da melhoria dos servios. Por outro lado, a implantao da Estratgia de SF em Belo Horizonte desnudou questes amplas e delicadas: a violncia de todos os matizes, a pobreza extrema e outras dificuldades da vida familiar. As equipes dos centros de sade se deslocaram at as comunidades, aproximaramse da realidade da populao e, agora, tm que aprender a mobilizar novos atores e parceiros. Na verdade, como se trata da prestao de um servio universal e de portas abertas, o sistema de sade vem assumindo responsabilidades que extrapolam seu campo de atuao. Isto exige cada vez mais a articulao com o conjunto das polticas pblicas sociais e urbanas. Apesar de todos os investimentos na melhoria de infraestrutura por meio de reformas e construes de novos centros de sade, aquisio de instrumentais, equipamentos e mobilirio, os equipamentos e insumos no foram adequadamente dimensionados para a ampliao da ateno e para o modelo proposto. Muitas reas fsicas ainda so inadequadas e em nmero insuficiente para o desenvolvimento das atividades das equipes em reas de abrangncia bastante extensas. H grande nmero de trabalhadores e equipes no mesmo centro de sade, dificultando o gerenciamento, o processo de trabalho, o acesso da populao e, conseqentemente, a qualidade do atendimento. Especificamente na rea da sade bucal, a situao de infra-estrutura ainda mais grave e constitui, ainda hoje, um dos principais fatores que impedem o desenvolvimento do trabalho destas equipes.

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Mesmo com a realizao de concurso pblico para os cargos de sade da famlia e a concluso da implantao das equipes ainda existem dificuldades para a estabilizao das ESF, principalmente no tocante contratao e estabilizao do mdico. Os fatores que concorrem so: a ampla competio entre os municpios que ampliaram suas redes de sade, abrindo novas possibilidades de trabalho para os profissionais; o insuficiente quadro de oferta de profissionais com formao, perfil e interesse na rea; e, no caso dos mdicos, observa-se que esta oferta muitas vezes uma opo profissional temporria. Muitos outros profissionais enfermeiros, auxiliares de enfermagem ou agentes comunitrios, tambm enfrentam dificuldades de adaptao proposta da sade da famlia. H grande necessidade de fortalecimento da prtica da medicina de famlia, de sua especialidade e da valorizao profissional e social. A realizao do curso de Especializao em Sade da Famlia, em parceria com a UFMG, com a titulao de 1.000 mdicos e enfermeiros, a criao do Centro de Educao em Sade e as diversas capacitaes ainda no foram suficientes para dar conta da qualificao profissional para a prtica da ateno primria e para a ampla abordagem dos problemas sociais e suas repercusses na rea de sade. Outro desafio que se enfrenta o da garantia da integralidade. A ateno bsica, por mais resolutiva que seja, no pode abarcar todas as necessidades de sade da populao, sendo necessrio o fortalecimento da rede de sade em todos os seus pontos. Tal necessidade foi evidenciada com a ampliao do acesso ateno bsica que aumentou a demanda para os outros nveis do sistema. Apesar dos investimentos em curso para ampliao de oferta nos servios de apoio diagnstico,

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na ateno secundria e na urgncia, alm da implantao de ferramentas que possibilitem uso mais adequado dos recursos disponveis - regulao assistencial e SISREG -, so necessrios esforos para a articulao da rede de servios existente (ateno especializada, hospitalar e de urgncia, bem como apoio diagnstico e teraputico) e sua organizao em modelo assistencial voltado para o cidado e para a rede bsica. Tambm so muitas as lacunas em relao ao modelo assistencial da rede bsica e o processo de trabalho local. H dificuldade no trabalho em equipe agravada pela pouca clareza das atribuies dos diversos profissionais (ACS, mdicos, enfermeiros, odontologia, profissionais de apoio). So muitas as particularidades do trabalho de cada profissional e de cada equipe numa mesma unidade, o que torna relativa a autonomia desses trabalhadores e dificulta a implementao de diretrizes mais gerais para a cidade. O grande movimento em prol de se propiciar a ateno demanda dos usurios nos centros de sade dificultou melhor organizao das aes programadas e de vigilncia; ainda falta efetiva integrao com as reas de ao coletiva, como a vigilncia sanitria, a zoonoses e a sade do trabalhador. Esta dicotomia entre aes curativas e aes de promoo e preveno precisa ser melhor processada. Ainda se faz necessrio esclarecer qual o potencial do trabalho de promoo sade para que se possibilite o avano da prtica baseada em evidncias cientficas, com realizao de aes comprovadamente eficazes na promoo da sade e preveno de doenas. Tais questes citadas no podem ser desvinculadas da discusso sobre a persistncia do modelo biomdico na prtica dos profissionais e a conseqente medicalizao da ateno. E a reflexo que se prope tambm no pode reduzir o papel da clnica na ateno bsica sade 40Avanos e Desafios na Organizao da Ateno Bsica Sade em Belo Horizonte

parmetro considerado o grande passo para a to sonhada mudana do modelo assistencial: o atendimento ao usurio tem papel importante na legitimao deste nvel da ateno; as equipes ainda no possuem tecnologia adequada para o cuidado com usurios portadores de doenas crnicas, e a resolutividade fica comprometida; alm disto, os protocolos da SMSA no esto adequados suficientemente e no so utilizados correntemente. H tambm enorme expectativa de outros nveis de ateno com relao ateno bsica referentes a cuidado no domiclio, ateno urgncia e regulao do acesso a outros nveis assistenciais. As aes propostas A SMSA-BH realizou, em 2006, o segundo concurso pblico para a sade da famlia e para outros pontos do sistema. Com a nomeao de mais de 400 mdicos, 250 deles para a sade da famlia, pretende-se completar o quadro de profissionais das equipes locais, ampliando a estabilidade das mesmas e o vnculo com a populao. Com o esgotamento dos concursados, foi realizado um outro concurso ainda ano de 2007 para se completar as vagas ainda em aberto. Ainda assim, insuficiente a oferta de profissionais com perfil adequado, principalmente na categoria mdica. A formao ainda inadequada para a proposta assistencial da ateno bsica que contempla a integralidade da ateno. O aspecto ideolgico da formao acadmica, com forte iderio liberal, aliado origem social dos acadmicos de medicina tornam a ao na ateno bsica uma opo estranha ao mdico. Este quadro agravado pela pequena insero da prtica da medicina de famlia na graduao e pouca valorizao no meio acadmico.41

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Como estratgia de enfrentamento desse problema, o municpio vem trabalhando no reforo das residncias de medicina de famlia que ocorrem em instituies do municpio - atualmente o Hospital Municipal Odilon Behrens e o Hospital das Clnicas da UFMG se colocam como campo de estgio, provendo preceptores para as residncias e trabalhando na melhoria dos projetos. Aes de valorizao da rede bsica, como a realizao de seminrios, participao em congressos, realizao de estudos e acompanhamento diferenciados, alm de trocas de experincias com outros municpios esto em andamento. Um plano de capacitao, que contempla as necessidades dos diversos profissionais e avana no sentido da qualificao da assistncia, est sendo colocado em prtica no ano corrente. Discusses sobre trabalho em equipe, abordagem da violncia, educao em sade, dentre outros temas, precisam estar presentes em conjunto com os contedos tradicionais. Ainda na perspectiva de valorizao da ateno bsica, amplo plano de adequao fsica e tecnolgica est em curso, sinal da aposta numa ateno bsica qualificada e resolutiva. Vrios centros de sade esto sofrendo intervenes, reformas, adequaes, e novas unidades esto em construo. Concomitantemente esto sendo feitas adequaes em setores de suporte como apoio diagnstico, transporte, aparato das centrais de esterilizao e lavanderia, alm da implantao de ampla reformulao da assistncia farmacutica no municpio. A implantao de Centros de Especialidades Mdicas (CEM) nos distritos, do grande Centro Metropolitano de Especialidades Mdicas e a definio de linhas de cuidado prioritrias, concretizando a integralidade na rede42

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assistencial, so as principais estratgias para se garantir a resolutividade da ateno rede bsica. Vem sendo aprofundada a desafiadora articulao da grade de referncia em urgncia, visando clarear papis e responsabilidades dos diversos servios no atendimento dos casos de urgncia/emergncia e agudos. Destaca-se tambm o avano do Projeto de Ateno Domiciliar que ter ampliao significativa das equipes ainda neste ano. Muitos desafios na organizao do processo de trabalho local, como os dilemas da ateno programada e da gesto da demanda espontnea, a promoo sade to necessria - e a integrao, tambm as demais polticas, sero tratados com as propostas contidas nesta publicao.

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CAteno Bsica onstruo daem Belo HorizonteAteno bsica a terminologia utilizada no pas e internacionalmente para denominar ateno primria sade - atualmente um componente essencial para o bom desempenho dos sistemas de sade. Orientados para a ateno primria, os sistemas de sade alcanam melhores resultados, conforme demonstram diversos estudos: propiciam maior satisfao aos usurios, possuem custos mais aceitveis e promovem a eqidade (Starfield, 1994; Macinko 2003; Who Europe, 2004). O conceito de ateno bsica vem sendo entendido, ao longo do tempo, de maneiras diversas (Vuori, 1986; OPAS, 2005): conjunto especfico de atividades e servios voltados populao menos favorecida socialmente, com o objetivo de enfrentar os problemas de sade mais prevalentes, chamado Ateno Primria Sade (APS) seletiva; um dos nveis do sistema de sade, o de menor complexidade, tambm referido como a porta de entrada do sistema e o local dos cuidados contnuos, chamado Ateno Primria; estratgia para organizao dos servios de sade, com relevncia s necessidades de sade da populao e com previso de reorientao dos recursos dos outros nveis de ateno, objetivando seu44Avanos e Desafios na Organizao da Ateno Bsica Sade em Belo Horizonte

fortalecimento bem como o enfrentamento de determinantes de sade mais amplos, ou seja, a APS abrangente; por fim, uma filosofia que deve permear todo sistema de sade. So equivocadas as interpretaes, comuns em anlises de cunho economicista, que consideram a ateno bsica uma assistncia de baixa qualidade ou uma medicina pobre e rudimentar para povos e cidados pobres (Zurro, 1999). O entendimento de programa de medicina simplificada e focalizao - dado pelo carter dos cuidados primrios sade de Alma Ata1 - fez com que, no Brasil, este conceito fosse disseminado com o sentido de ateno primitiva sade (CONASS, 2004). A partir disto, houve fortalecimento do uso do termo ateno bsica para nomear a estratgia de reorganizao no mbito da ateno primria, com potencial para provocar o reordenamento dos outros pontos do sistema. Mais recentemente, no Brasil, a ateno bsica foi definida como: "(...) um conjunto de aes de sade no mbito individual e coletivo que abrangem a promoo e proteo da sade, preveno de agravos, diagnstico, tratamento, reabilitao e manuteno da sade. desenvolvido atravs do exerccio de prticas gerenciais e sanitrias democrticas e participativas, sob forma de trabalho em equipe, dirigidas a populaes de territrios bem delimitados, pelas quais assume a responsabilidade sanitria, considerando a dinamicidade existente no territrio em que vivem essas populaes (...)" (Brasil, 2006).1

A Conferncia Internacional sobre Cuidados Primrios de Sade foi realizada pela OMS em Alma Ata, URSS, de 6 a 12 de setembro de 1978, com a participao de representantes de governos, organizaes internacionais, agncias financeiras e comunidade internacional, quando formulou-se a Declarao de Alma Ata, referncia para a reforma de sistemas de sade em todo o mundo, influenciando o movimento sanitrio brasileiro.

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No Municpio de Belo Horizonte, a ateno bsica reconhecida como a rede de centros de sade que se configuram como a porta de entrada preferencial da populao aos servios de sade e realizam diversas aes na busca de ateno integral aos indivduos e comunidade. Esta rede, organizada a partir da definio de territrios, ou reas de abrangncia, sobre os quais os centros de sade tm responsabilidade sanitria, utiliza tecnologias de elevada complexidade e baixa densidade que devem resolver os problemas de sade de maior freqncia e relevncia em cada territrio, bem como levar em conta as necessidades da populao.

Papel da rede bsica dentro do sistemaA rede de ateno bsica de Belo Horizonte conta atualmente com 508 equipes de sade da famlia responsveis pela ateno bsica de aproximadamente 75% dos habitantes da cidade e distribudas em 142 Centros de sade que contam, ainda, com diversos outros profissionais atuando articuladamente com as equipes de sade da famlia. Com isto, ampliam-se as possibilidades de atendimento pela ateno bsica bem como permitese ateno populao que no recebe cobertura pela sade da famlia (Quadro 1).

Atual Rede Bsica de Sade de Belo Horizonte

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importante destacar que a rede bsica de sade de Belo Horizonte conta, enormemente, com as potencialidades da Estratgia SF, mas tambm possui uma srie de outros recursos que contribuem para a sua qualificao e resolutividade. Tambm esta rede sofreu e sofre influncias de vrias proposies de interveno em sade. Por exemplo, no incio dos anos 90, a reorganizao da rede e da assistncia a partir da criao dos distritos sanitrios definiu territrios e reas de abrangncia das unidades prprias e municipalizadas e fortaleceu a vigilncia em sade; as aes programticas ou oferta organizada definiu e implantou diversos protocolos assistenciais; o modelo em defesa da vida implementou o dispositivo do acolhimento desde 1996; e, mais recentemente, a sade da famlia que proporcionou a incorporao de propostas, de novos profissionais e saberes. O modelo assistencial para a ateno bsica em Belo Horizonte, atualmente em discusso, permeia-se dessas e de outras influncias, no sendo possvel, nem desejvel, a reproduo estrita de um padro nacionalmente definido. Faz-se necessria a construo permanente baseada em avaliaes e anlises das novas demandas que so apresentadas para o SUS-BH. Faz-se importante, agora, que as prticas desenvolvidas pela rede de ateno bsica do SUS-BH sejam regidas por princpios e diretrizes que explicitem a intencionalidade poltica do modelo de organizao proposto. Descritos a seguir, podem ser implementados e executados de formas diversas, mas devem nortear toda a organizao dos servios. Os princpios da Ateno Bsica Os princpios constituem a base de determinada poltica de sade e atuam como ponte entre os valores sociais47

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mais amplos - o direito sade - e os elementos estruturais ou diretrizes dessa poltica. So aqui apresentados os princpios de todo o sistema de sade, no entanto em conformidade com o modelo proposto na ateno bsica: Universalidade: todos os cidados tm direito de acesso ao Sistema nico de Sade, independentemente da estratgia organizada para o seu cuidado, ou seja, se so residentes ou no na rea de abrangncia. Este um princpio fundamental do SUS que no prescinde da necessidade de se organizar os servios com dispositivos como territorializao ou adscrio de clientela. Eqidade: o princpio que prope tratamento diferenciado a pessoas ou populaes sujeitas a diferentes riscos de adoecer e morrer e que possuem diferentes padres e possibilidades de acesso aos servios. Para implement-lo necessria a definio de prioridades a serem encaminhadas no processo de organizao da assistncia sade. Integralidade: reconhecimento do direito e garantia do acesso de todo cidado a todos os tipos de servios de ateno sade. Participao Social: princpio pelo qual todas as pessoas envolvidas tornam-se parceiros ativos na tomada de decises sobre recursos e formas de organizao. Deve transcender os espaos formais de controle social e de gesto colegiada, propiciando o efetivo envolvimento dos diversos atores do setor sade. Os pressupostos da Ateno Bsica A seguir os pressupostos do SUS-BH, que so tambm condies mais amplas as quais devem reger as diretrizes

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do modelo assistencial para a Ateno Bsica de Belo Horizonte. Acessibilidade: conjunto de circunstncias, de diversas naturezas, que viabilizam ou impedem a entrada do usurio na rede de servios, sejam fsicas (distncia, transporte, geografia), de natureza cultural, administrativa da organizao dos servios (horrios de funcionamento, de disponibilidade dos servios, grau de tolerncia para atendimentos no programados), sejam ligadas s caractersticas da oferta e da disponibilidade de recursos. Possibilita medir o quanto a populao percebe a convenincia e acessibilidade dos servios prestados. Educao Permanente: o servio de sade deve ser compreendido como local de aprendizagem contnua, participativa e potencialmente transformadora dos processos de trabalho, podendo operar em direo ao fortalecimento dos princpios da humanizao e da gesto participativa. Nesta concepo, o papel do trabalhador ganha dimenso nova, a de educador. Intersetorialidade: os servios de ateno bsica devem participar do planejamento e do desenvolvimento de aes intersetoriais com definio de prioridades; devem buscar a articulao com as diversas polticas sociais e urbanas implementadas no municpio, incluindo as iniciativas da prpria comunidade e de instituies atuantes na rea, tornando mais efetivas as intervenes nos diversos problemas demandados pela populao. Gesto Democrtica: todos os envolvidos no mbito da ateno sade - gestores, usurios e trabalhadores - so atores importantes na construo cotidiana dos modos de se operar o processo de trabalho e devem participar das decises na gesto local, por meio dos espaos de controle social ou de gesto colegiada.49

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Humanizao: entendido como a valorizao dos diferentes sujeitos implicados no processo de produo de sade - usurios, trabalhadores e gestores, pressupe a autonomia e o protagonismo dos sujeitos, a coresponsabilidade entre eles, o estabelecimento de vnculos solidrios e a participao coletiva no processo de gesto. Qualidade da Ateno: o quanto das necessidades de sade, existentes ou em potencial, esto sendo atendidas de forma otimizada pelos servios de sade, dado o conhecimento atual a respeito de distribuio, reconhecimento, diagnstico e manejo dos problemas de sade (Starfield, 2002). As diretrizes da Ateno Bsica As diretrizes podem ser entendidas como as caractersticas ou propriedades que a rede bsica de sade deve apresentar no seu modo de organizao; a traduo do modelo proposto em elementos estruturais e funcionais. Abrangncia: capacidade de oferecer aes adequadas s necessidades de sade da populao, incluindo os problemas mais freqentes, a partir da integrao de aes programadas e atendimento demanda espontnea, bem como da articulao de aes clnicas individuais e aes coletivas de carter preventivo e promocional. Ateno Generalizada: oferecimento de cuidado a qualquer problema de sade, em qualquer estgio do ciclo de vida do paciente, sem restrio a grupos de idade ou de gnero e a problemas de sade. Primeiro Contato: a ateno bsica a porta de entrada - no a nica, mas a preferencial - do sistema de sade, pois o Centro de sade encontra-se mais prximo das pessoas, devendo ser, portanto, o local preferencial do50Avanos e Desafios na Organizao da Ateno Bsica Sade em Belo Horizonte

primeiro contato e implicando acessibilidade e uso dos servios pelos quais as pessoas buscam a cada novo problema ou a cada episdio/ fase de um problema enfrentado. Acolhimento: entendida como expresso de escuta qualificada, relao cidad e humanizada, esta diretriz propicia a resposta mais adequada possvel quele problema de sade mediante o encaminhamento para resoluo da demanda identificada. Longitudinalidade: a oferta regular da ateno bsica ao longo de perodos substanciais da vida, propiciando continuidade do cuidado ao longo do tempo. Vinculao: as equipes so responsveis por populao especfica, adscrita a elas, e devem estabelecer vnculo com esses usurios, o qual pode se dar por meio de relaes claras e prximas, integrao com a comunidade e com os indivduos, atravs da afetividade, relao teraputica e continuidade do cuidado nos diversos momentos de encontro ocorridos no territrio, nos servios, no consultrio ou nos grupos. Significa tornar-se referncia, individual e/ou coletiva, para os pacientes manifestada em fortes laos interpessoais que reflitam a cooperao mtua entre usurios e profissionais de sade. Responsabilizao: responsabilidade pela ateno sade do cidado, em certa possibilidade de interveno, sem burocratizao ou impessoalidade. Coordenao do cuidado: capacidade de a ateno bsica proporcionar o acompanhamento do usurio no sistema, quer dizer, alm de se fazer referncia, quando necessrio, seguir o usurio no uso de outros pontos do sistema e manter a vinculao e a responsabilizao pelo cuidado, integrando os recursos que precisaram ser utilizados.Avanos e Desafios na Organizao da Ateno Bsica Sade em Belo Horizonte

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Resolutividade: os centros de sade devem estar preparados para enfrentar os problemas de sade mais freqentes naquele territrio, os quais, por serem comuns, no so banais, ao contrrio, exigem mximas habilidades clnica, comunicacional e de interao, alm de capacidade de negociao. Neste sentido devem ser utilizados todos os recursos operacionais possveis naquele espao da assistncia, usando os demais pontos do sistema apenas quando necessrio. Ateno centrada na pessoa: cuidado comprometido com as singularidades, complexidades e necessidades de sade da pessoa e no somente com a enfermidade ou evento. Ateno orientada famlia e comunidade: entendimento das condies de vida, da dinmica familiar e da rede social do indivduo, incluindo reconhecimento dos antecedentes culturais referentes comunidade local, bem como do contexto scio-cultural, das caractersticas e necessidades especficas das famlias e dos sujeitos, propiciando ganho de competncia cultural. Neste aspecto ressalta-se a importncia do Agente Comunitrio de Sade (ACS) nas equipes. Valorizao do saber e autonomizao do usurio: busca permanente de possibilidades para que o usurio ganhe autonomia e co-responsabilidade com o seu cuidado, reconhecendo-se e valorizando-se o saber do usurio adquirido em experincias pessoais e de vida e esclarecendo-lhe sobre o processo de sua sade e doena e as opes teraputicas admissveis para que ele possa participar dessa conduo. Trabalho em equipe: diretriz para reorganizao do processo de trabalho na sade da famlia que visa abordagem mais integral e resolutiva e pressupe mudanas na organizao e nos padres de atuao individual e coletiva, favorecendo maior integrao entre os profissionais e as aes por eles desenvolvidas, superao da relao hierrquica entre os52

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profissionais e isolamento nos diversos ncleos de competncia. Os profissionais das equipes ainda precisam buscar, para alm da articulao tcnica, a construo em comum de projetos assistenciais. Uso do planejamento e da programao: o planejamento e a programao das aes devem ser entendidos, alm de ferramenta para a organizao do trabalho das equipes, como diretriz que pressupe grande esforo de organizao interna, estabelecimento de objetivos e amplo conhecimento da situao de sade daquela populao e da organizao do trabalho daquelas equipes, podendo representar a superao das dificuldades atuais na implementao das diretrizes. Vigilncia Sade: modelo tecnolgico de interveno para a reorganizao das prticas de sade do municpio, por meio da reviso dos principais mtodos e tcnicas que contribuem nesse processo. Est comprometida com o princpio da integralidade, contempla a discusso de problemas, necessidades e determinantes da sade e tem como principais caractersticas a interveno sobre problemas de sade que requerem ateno e acompanhamento contnuos, a adoo do conceito de risco, a articulao entre as aes de promoo, preveno, cura e reabilitao e a atuao intersetorial. Organizao baseada no territrio: ocorre no somente do ponto de vista geogrfico e de organizao da clientela, mas do ponto de vista do territrio-processo.

Papel da Estratgia de Sade da FamliaFeita a contextualizao e compreendidas as diretrizes, pressupostos e princpios da ateno bsica no municpio de Belo Horizonte, torna-se possvel a anlise de questes relativas Estratgia de SF no SUS-BH, esperando que, com53

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o acordo sobre os objetivos dessa proposta no municpio, as ESF, em conjunto com os demais trabalhadores e gerentes dos centros de sade, possam organizar o seu processo de trabalho de forma mais harmnica; alis, ao longo da discusso com os atores envolvidos, perceberam-se mais acordos do que divergncias a respeito do entendimento do papel da sade da famlia em Belo Horizonte. De modo genrico, diz-se que o papel primordial da sade da famlia no SUS-BH propiciar a reorganizao da assistncia sade a partir da ateno bsica, mediante reorganizao do processo de trabalho nos Centros de sade e insero de novos saberes e prticas no cotidiano desses servios. Assim, a Estratgia SF seria potencializadora para a efetiva implementao dos princpios dos SUS, integralidade, universalidade e eqidade. Se a sade da famlia , ento, a principal provedora dos cuidados da ateno bsica aos cidados adscritos a cada equipe, pode-se depreender que dela se espera a adequao s diretrizes gerais propostas. Pelas caractersticas de sua organizao - alta cobertura, profissionais generalistas, presena do ACS, jornada de trabalho integral, etc -, a sade da famlia tem potencial maior para implementao das diretrizes descritas anteriormente, e espera-se que as equipes de sade da famlia utilizem novas tecnologias e mtodos para propiciar o cuidado e organizar a assistncia e o processo de trabalho. importante esclarecer que, em Belo Horizonte, a Estratgia de sade da famlia deve ser a principal porta de entrada para a populao a ela adscrita e, para isto, as equipes precisam estabelecer estratgias de atendimento demanda espontnea e fazer valer o dispositivo do acolhimento, ampliando o acesso e viabilizando a ateno integral e multidisciplinar.54Avanos e Desafios na Organizao da Ateno Bsica Sade em Belo Horizonte

Com o estabelecimento de vnculo, as equipes demonstram sensibilidade e reconhecimento em relao s necessidades de sade da populao e, ainda, devem representar a interface entre essas necessidades e a oferta de assistncia no mbito global das demandas. Espera-se que a sade da famlia em Belo Horizonte preste populao ateno integral de modo oportuno e qualificado, porque, sendo o primeiro ponto de contato da populao, onde os usurios criam vnculo e recebem o cuidado longitudinal, percebe-se como equivocado o entendimento de que o papel primordial da Estratgia SF fazer preveno e promoo apenas. A compreenso da SMSA-BH de que, conforme as necessidades da populao, e o quadro de sade da comunidade, as aes de mbito individual e coletivo, sejam elas de carter promocional, de preveno, curativas, de ateno s doenas em suas manifestaes crnicas ou agudas, devem ser articuladas entre si no mbito da ateno bsica e dentro das possibilidades operacionais de cada Centro de sade. Este entendimento representa grande desafio tanto para os profissionais quanto para os gestores, pois demanda o uso das ferramentas de planejamento e de programao na organizao do trabalho; mas acredita-se que o primeiro passo a ser dado pelas equipes nesta direo a busca de conhecimento referente populao sob sua responsabilidade - por exemplo, conhecer os riscos que aquela populao est submetida, apontados com base epidemiolgica, para priorizar grupos mais vulnerveis, realizar aes de preveno e vigilncia e, ao mesmo tempo, possibilitar a entrada de indivduos que no apresentam problemas j estruturados, mas novas necessidades em sade.

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Outro item importante da mesma discusso o atendimento queles usurios que se apresentam em quadros agudos. Entende-se que, num modelo que prev adscrio de clientela, responsabilizao, vinculao e atendimento integral, os centros de sade devem se organizar para possibilitar a entrada e o atendimento a esses usurios. Sem este pressuposto, dificilmente um servio de ateno primria torna-se referncia para a populao, no significando que as equipes devem utilizar todo o seu tempo de trabalho no atendimento a esses casos. Faz-se necessrio tambm que a rede de urgncia, seja por meio do atendimento mvel ou das unidades de urgncia, cumpra o relevante papel de retaguarda. Pelas caractersticas da Estratgia de Sade da Famlia em Belo Horizonte -localizar-se nos centros de sade, ter as suas equipes como responsveis pelo cuidado populao, conforme as divises de suas respectivas reas -, faz-se importante ressaltar que as diversas aes prprias dos centros de sade so e sero realizadas por tais equipes. Desta forma, cada membro de equipe o responsvel, junto com os demais profissionais da unidade, pelas atividades matriciais do Centro de sade, como vacinas, procedimentos de enfermagem e algumas aes ligadas vigilncia epidemiolgica (controle de surtos, notificaes); primeiramente, porque entende-se que essas so aes de tecnologia leves-dura e no comprometem o estabelecimento do vnculo com a populao e a continuidade do cuidado e, segundo, porque vrias dessas atividades esto ligadas intimamente s competncias e atribuies das diversas categorias profissionais abrigadas pelos centros de sade, independentemente de estarem os profissionais tambm compondo equipes de sade da famlia. Por outro lado, a existncia de vrias equipes em centros de sade pode levar unificao de competncias em56Avanos e Desafios na Organizao da Ateno Bsica Sade em Belo Horizonte

algumas atividades, conforme o tamanho da populao alvo, otimizando o tempo de trabalho das equipes. Grupos de orientao - gestantes, por exemplo, controle de surtos, dentre outros - demandam aes que podem ser realizadas por revezamento das equipes. Por causa de seu maior potencial em articulao com a comunidade e na abrangncia dos problemas de sade reconhecidos, espera-se tambm que a Sade da Famlia faa parcerias com organizaes comunitrias e outras instituies, bem como com outros setores da Prefeitura que tenham aes voltadas para a populao adscrita, e que as equipes consigam integrao em suas comunidades, realizando discusses que contemplem a organizao dos servios e outros temas necessrios e de interesse. importante ressaltar que, embora a rea de abrangncia dos centros de sade e a clientela sejam definidas, fica mantida a orientao de garantia do atendimento de casos agudos a qualquer usurio que procure o Centro de sade, mesmo de outra rea de abrangncia ou municpio. Somente aps o atendimento, o usurio dever ser orientado e encaminhado, de forma responsvel, a procurar o Centro de sade de referncia da sua residncia, onde o cuidado contnuo deve ser, prioritariamente, ofertado e a ateno sade poder ocorrer de forma mais adequada, incluindo aes de vigilncia sade.

Atribuies das Equipes de Sade da FamliaCom o objetivo de dar maior concretude s questes levantadas, definiram-se as atribuies, em conjunto ou isoladamente, de todos os profissionais que compem as equipes de sade da famlia.Avanos e Desafios na Organizao da Ateno Bsica Sade em Belo Horizonte

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Atribuies comuns a todos os profissionais participar da territorializao e mapeamento de sua rea de atuao, realizando e mantendo atualizado o cadastro da rea de abrangncia; analisar os dados relativos populao da rea de abrangncia para conhecimento e planejamento das atividades, identificando e conhecendo grupos populacionais prioritrios no mbito da sade e indivduos expostos a riscos, priorizando situaes a serem acompanhadas; garantir acesso da populao adscrita aos servios de sade no mbito da ateno bsica; realizar o cuidado em sade da populao adscrita, promovendo assistncia individual, segundo as situaes de vulnerabilidade, prioritariamente no mbito do Centro de sade, mas tambm no domiclio, nos espaos comunitrios (escolas, associaes, asilos, creches) e nas aes coletivas ou de vigilncia, de acordo com os protocolos vigentes; realizar aes clnicas de ateno integral previstas nos protocolos existentes; fazer acompanhamento contnuo, seja nos casos agudos ou nos casos crnicos; utilizar eficientemente os recursos da sade, responsabilizando-se pelo usurio, mesmo quando este necessitar de ateno prestada em outros pontos do sistema, mantendo a coordenao do cuidado; realizar escuta qualificada das necessidades dos usurios em todas as aes realizadas, proporcionando atendimento humanizado e estabelecimento de vnculo;58

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realizar aes de vigilncia sade, entendida como monitoramento de aes em grupos prioritrios, na comunidade e na famlia, como busca ativa, visitas domiciliares, etc; planejar, coordenar e participar de grupos operativos, visando preveno e controle de doenas e promoo da sade do indivduo e da famlia; promover aes para construo da co-responsabilidade familiar e da comunidade; trabalhar em equipe, levando em conta o saber das diversas categorias que atuam no contexto da ateno primria, sem estabelecimento de relaes de hierarquia, mas de reconhecimento das diversas competncias profissionais; promover e participar das atividades de planejamento e avaliao da equipe e do Centro de sade a partir da utilizao dos dados e ferramentas disponveis; realizar aes de promoo, que estejam no mbito do trabalho da equipe, levando em considerao as evidncias cientficas correntes; identificar, na comunidade, parceiros e recursos que possam potencializar aes intersetoriais e contribuir nessas aes; identificar cuidadores ou rede social de apoio para os usurios dependentes de cuidados; planejar, coordenar, executar e avaliar, no nvel de sua competncia, aes de vigilncia epidemiolgica, sanitria e ambiental nos diferentes espaos da rea de abrangncia do CS; garantir a qualidade do registro das atividades nos sistemas de informao;59

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contribuir com as aes gerais desenvolvidas pelo Centro de sade, como regulao assistencial, aes matriciais (vacinas, curativo, farmcia), grupos, dando suporte ao atendimento dos casos das demais equipes, quando estas no se encontrarem no CS ou com desfalque de profissionais; avaliar as condies tcnicas de funcionamento dos equipamentos e materiais do CS; atualizar sistematicamente seus conhecimentos tcnicos, cientficos e culturais, buscando o desenvolvimento profissional e a qualificao da assistncia prestada; participar de reunies comunitrias, seja em comisses locais ou na comunidade em geral; comunicar os agravos de notificao compulsria para o municpio de BH de acordo com a competncia de cada categoria profissional; participar do planejamento, execuo e aes de educao permanente propriamente ditas; participar das reunies das ESF e do CS, com o intuito de promover a interlocuo entre todas as categorias, a identificao de novas demandas, o planejamento do trabalho e a avaliao coletiva permanente, bem como de indicar participante para o colegiado gestor da unidade; contribuir com o acompanhamento dos procedimentos propeduticos e/ou teraputicos realizados pela rede prpria e servios conveniados contratados pelo SUS-BH, encaminhando avaliao sobre os atendimentos prestados (qualidade tcnica, dentre outros) e sugesto aos setores competentes. Apesar de se reconhecer as dificuldades relativas ao profissional mdico na sade da famlia - a insuficincia de

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profissionais com formao especfica, a dificuldade de lotao em alguns centros de sade e a rotatividade dos mesmos nas equipes -, h, atualmente, enorme aposta no potencial de nova prtica mdica na ateno bsica pelo mdico de famlia. Sabe-se que o novo profissional no est pronto e, embora haja vultosos investimentos na formao de mdicos e enfermeiros com especializao em sade da famlia, ainda muito h de ser feito. Para a efetivao da ESF, espera-se que o mdico exera as tarefas clnicas com alta competncia, faa a gesto da prtica clnica - j que o cuidado ao usurio deve se dar de forma contnua, e os indivduos apresentam novas necessidades de sade ao longo da vida -, estabelea novas dimenses de comunicao com os usurios e adotem abordagem crtica sobre a prtica clnica, levando em conta as evidncias cientficas. Caracterizam o trabalho do mdico de famlia a abordagem centrada no indivduo e no na doena, a orientao para o contexto familiar e comunitrio, as atividades determinadas pelas necessidades de sade da populao, o lidar com problemas de sade complexos e no pr-selecionados com baixa incidncia de doenas graves e alta incidncia de doenas em estgio precoce (no significando que a ateno apresente baixa complexidade, ao contrrio, utiliza baixa densidade tecnolgica, mas intensos recursos congnitivos e requer complexo manejo) (Wonca, 2002). Em sua prtica o mdico de sade da famlia deve estar apto a gerir simultaneamente mltiplas queixas e patologias crnicas, com eficincia, bem como a coordenar os cuidados mdicos quando acionadas outras especialidades ou recursos de diagnstico.

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Atribuies do mdico ser a referncia mdica da populao adscrita, realizando atendimento aos usurios independentemente de idade, sexo ou qualquer outra caracterstica do indivduo e lidando com todos os problemas de sade, em suas diversas dimenses fsicas, psicolgicas, sociais, culturais e existenciais; responsabilizar-se pela prestao dos cuidados mdicos continuados, longitudinalmente, levando em conta as necessidades do usurio, e gerir simultaneamente os problemas de sade, tanto agudos como crnicos; desenvolver abordagem centrada no indivduo, fazendo consultas clnicas, procedimentos, atividades coletivas e visitas domiciliares; buscar estabelecer efetiva relao mdico-paciente ao longo do tempo, por meio de intervenes apropriadas e efetivas, com tomada de deciso determinada pela prevalncia e incidncia de doenas na comunidade; realizar a gesto do cuidado e coordenar a prestao dos cuidados mdicos, gerindo a interface com as demais especialidades; indicar as necessidades de internao hospitalar ou domiciliar e de utilizao da ateno especializada disponvel no municpio, com base em evidncias e em indicaes definidas nos protocolos assistenciais do municpio; registrar consultas e aes realizadas no pronturio do paciente, em formulrios do sistema de informao e outros documentos da instituio; participar do planejamento e execuo da educao permanente da equipe de sade e dos ACS, junto aos demais membros da equipe do centro de sade;62

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participar de atividade de regulao assistencial, buscando o uso racional e a priorizao dos recursos disponveis para casos de maior necessidade clnica e fazendo a avaliao de qualidade tcnica dos servios prestados pela ateno especializada, servios de apoio ao diagnstico e de urgncia para o devido retorno instituio. A enfermagem compe a equipe de SF e desempenha papel primordial na garantia dos princpios anteriormente citados, no somente pelo grande quantitativo de profissionais atuantes na ateno bsica, mas tambm pela diversidade de aes e atividades desenvolvidas (Belo Horizonte, 2004). Estudos mostram que os enfermeiros tm procurado modificar sua prtica de forma a avanar na qualidade do atendimento integral ao paciente. No entanto, esses profissionais tm encontrado dificuldades na definio de sua competncia no trabalho em equipe e na indefinio da programao da assistncia sade em nvel local (Witt & Almeida,2003). A observao do trabalho das equipes de sade nos CS da rede municipal de Belo Horizonte permite reconhecer que as caractersticas do trabalho da enfermagem mudaram, tendo incorporado e ampliado, sobremaneira, em seu cotidiano as atividades assistenciais. Hoje, seu espao de ao estende-se alm dos muros dos centros de sade, ampliando-se at as famlias, comunidade e outras instituies sociais da rea. Os auxiliares de enfermagem lidam com novos desafios no trabalho das ESF e grande parte de seu tempo consumido com atividades-meio, que so imprescindveis para a realizao das atividades-fins, mas no so quantificadas pelo sistema de informao e, muitas vezes, no ganham visibilidade no processo final.

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So identificadas situaes em que aspectos de gerncia da ao assistencial no so assumidos pelos enfermeiros; e tambm lacunas referentes assuno desses profissionais nas atividades de super viso, vacinao, curativos, farmcia, controle de populao microbiana, superviso da limpeza da rea fsica, treinamentos para auxiliares, etc. geradas, talvez, pela incorporao de novos profissionais, dificuldades de integrao entre as equipes de sade da famlia num mesmo CS e das equipes com os profissionais de apoio, alm de falta de discusso e reorganizao do processo de trabalho, entre outros fatores. A enfermagem, nesse quadro da rede bsica de BH, encontra-se frente a desafios. preciso garantir as aes tradicionais da ateno bsica - ateno a hipertensos, crianas, diabticos, pr-natal, etc. -, mas tambm reconhecer os novos problemas apresentados s equipes - impactos provenientes do trabalho, da violncia, da vida moderna atual, do envelhecimento - e incorporar tecnologias adequadas para seu enfrentamento: planejamento, uso da epidemiologia, aes intersetoriais e, acima de tudo, desenvolvimento de competncias que permitam o reconhecimento das necessidades de sade nas dimenses individual, singular e tambm coletiva. So competncias gerais para os profissionais de sade a ateno sade, tomada de decises, comunicao, liderana, administrao e gerenciamento, alm da educao permanente, sendo imprescindvel que os enfermeiros assumam sua responsabilidade intrnseca ao desenvolvimento de tais competncias. importante salientar a natureza cuidadora das aes de enfermagem. O cuidado, que a essncia da enfermagem, no apresenta apenas a conotao da ao (confortar, alimentar, trocar, ouvir, hidratar, etc), mas64Avanos e Desafios na Organizao da Ateno Bsica Sade em Belo Horizonte

tambm o aspecto subjetivo, de colocar-se ao lado do outro, perceber, procurar e ajudar a resolver o problema, vincular-se ao paciente. Portanto, as aes teraputicas e propeduticas especficas da enfermagem so majoritariamente aes de cuidado. A sistematizao da consulta de enfermagem, atividade privativa do enfermeiro, utiliza mtodo cientfico para identificao de situaes de sade/doena (Resoluo COFEN - Conselho Federal de Enfermagem n 272/2002). A prescrio de enfermagem decorrente da avaliao realizada durante a consulta. Quando necessrio e conforme as especificaes contidas na legislao (Resoluo COFEN n 271/2002), a prescrio de medicamentos padronizados em protocolos assistnciais est respaldada legalmente. Atribuies do enfermeiro planejar, coordenar, executar e avaliar as aes de assistncia de enfermagem integral em todas as fases do ciclo de vida do indivduo, tendo como estratgia o contexto sociocultural e familiar; supervisionar (planejar, coordenar, executar e avaliar) a assistncia de enfermagem, merecendo destaque as aes de imunizao, preparo e esterilizao de material, administrao de medicamentos e curativos, bem como avaliar o procedimento de coleta de material para exame e a dispensao de medicamentos realizados pelos auxiliares de enfermagem; realizar consulta de enfermagem e prescrever a assistncia de enfermagem, de acordo com as disposies legais da profisso previstas pela Resoluo COFEN n 159/ 1993;65

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Solicitar exames complementares, quando necessrio, e prescrever medicamentos, aps avaliao do estado de sade do indivduo e em conformidade com os protocolos estabelecidos pelos programas do Ministrio da Sade, da SMSA e com as disposies legais da profisso previstas pelas Resolues COFEN n 195/1997 e 271/2002 e documento da regulao de patologia clnica; realizar cuidados diretos de enfermagem nas urgncias e emergncias clnicas, fazendo a indicao para a continuidade da assistncia prestada; planejar, coordenar e avaliar as atividades da equipe de enfermagem no CS; planejar, coordenar e avaliar as atividades desenvolvidas pelos Agentes Comunitrios de Sade (ACS); planejar e coordenar a capacitao e a educao permanente da equipe de enfermagem e dos ACS, executando-as com participao dos demais membros da equipe do CS; coordenar e avaliar o processo de limpeza, desinfeco e esterilizao dos artigos e superfcies do CS; promover e coordenar reunies peridicas da equipe de enfermagem, visando o entrosamento e tambm o enfrentamento dos problemas identificados; registrar as aes de enfermagem no pronturio do paciente, em formulrios do sistema de informao e outros documentos da instituio; realizar consultoria, auditoria e emitir parecer em matria de enfermagem, no mbito da instituio; participar de atividade de regulao assistencial, buscando o uso racional e a priorizao dos recursos disponveis para casos com maior necessidade clnica.66Avanos e Desafios na Organizao da Ateno Bsica Sade em Belo Horizonte

Atribuies do auxiliar de enfermagem (AE) planejar, executar e avaliar as aes de assistncia de enfermagem integral ao indivduo, famlia e/ou comunidade, conforme sua competncia tcnico-legal, utilizando como estratgia o conhecimento do contexto sociocultural e fam