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revista família cristã 72 panorama M Criança da escola de música do convento franciscano da cidade de San Ignacio de Velasco

Missões de Chiquitos

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fotodocumentario sobre as reduções jesuitas na bolívia

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Missões

Criança da escola de música do convento franciscano da cidade de San Ignacio de Velasco

73outubro de 2012

Há certas realidades que estão tão distantes de nós, tanto ge-ograficamente quanto tem-

poralmente, que se pode cair no es-quecimento. Essa pode ser uma das sensações vividas por muitos dos visitantes de uma região boliviana conhecida por Chiquitanía, antiga redução jesuíta, que guarda, ainda hoje, marcas de um modelo de evangelização audacioso, radical e comprometido com a realidade do povo. A continuidade das reduções jesuítas na Bolívia se dá com a própria Chiquitanía, o patrimônio material e imaterial dos Jesuítas.

O nome Chiquitanía provém de chiquitos, “pequenos” em espanhol, nome dado pelos colonizadores es-panhóis devido à impressão que lhes causara o tamanho das portas das casas dos nativos, pois eram muito pequenas, em proporção ao tamanho da casa. Isso chamou a atenção dos colonizadores que imaginaram se tratar de povos pequenos, chiquitos, mas logo entenderiam que o tamanho da porta era uma proteção contra animais grandes, uma vez que toda a região chiquitana era parte da vegetação que hoje chamamos amazônica. No entanto, mesmo sa-

As Missões Jesuítasde Chiquitos estão localizadas ao nordeste da Bolívia, a pouco mais de 200 quilômetros da cidade de Santa Cruz de la Sierra

Missões

bendo do motivo de as portas serem pequenas, os colonizadores mantive-ram o nome chiquitos, e consequente-mente a região passou a ser chamada de Chiquitanía.

Com o avanço da colonização foram organizados vários povoados nessa região. Dos que se mantiveram até hoje como cidade e que fazem parte da região chamada Chiquitanía constam San José de Chiquitos, Concepción, San Ignacio de Zamucos, San Miguel, San Ramón, San Rafael, San Javier, San Ignacio de Velasco, Santiago de Otu-quis e San Ignacio de Moxos, sendo que este último se encontra numa região mais distante e é a única cidade para a qual voltaram os Jesuítas depois de sua supressão em 1767. Nas demais cidades, as paróquias, em sua maioria, estão hoje sob a responsabilidade dos Franciscanos.

Como é bem conhecida, a ação dos Jesuítas se deu por meio de um grande aglomerado de etnias bem organizadas, com um projeto de evangelização, ritos e diversas prá-ticas religiosas bem próprios. Além disso, também desenvolveram um projeto de urbanização e economia importantes, historicamente conhe-cidos como Reduções Jesuítas.

de Chiquitos

Texto e fotos Paulo Maia

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A preservação − Contrariamente à experiência no extremo sul brasi-leiro, pois das Reduções restaram poucos sinais do que representaram na colônia portuguesa, na Chiqui-tanía foram preservados não só os povoados, como até hoje se conser- va o mesmo projeto urbano de dis- tribuição de ruas e organização es- pacial das atuais cidades.

Mas a região chiquitana impres-siona também por manter a mesma arquitetura das Igrejas, alguns ritos religiosos, a música barroca e seu ar-tesanato também barroco. E no caso destes últimos, tanto a música, co- mo o artesanato, são caracterizados por um barroco internacionalmente conhecido como Barroco Chiqui-tano, dada à sua especificidade da expressão barroca.

Atualmente se pode dizer que o

Igreja de San Miguel, visão do presbitério para a entrada da igreja

Nova construção da Igreja de San Miguel em que se procurou manter o estilo original

75outubro de 2012

povo ajudou os Jesuítas a seguir com sua ação evangelizadora entre outros grupos étnicos. E uma vez realizada essa “conquista jesuítica”, o passo seguinte significou a unificação do idioma, dada à grande diversidade de povos distintos aglomerados na Chi-quitanía, com idiomas de raízes bem distintas umas das outras. Com isso se convencionou como idioma local o chiquitano, ainda falado até hoje, embora já bastante escasso entre sua população, na maioria septuagená-ria, que com seu idioma materno levará consigo a memória de uma cultura que nos remete às primeiras experiências da formação do povo latino-americano.

As oficinas de artesanato em madeira são o resgate

da cultura das Missões Jesuítas

legado Jesuíta foi conservado tanto em seu aspecto material, sobretu-do na arquitetura de suas Igrejas, quanto imaterial. Neste último caso, pode-se evidenciá-lo num modo de fazer suas atividades, tanto religio-sa como artística e artesanal. E tal evidência provoca uma pergunta: o que houve de tão particular nessas reduções jesuítas que permitiu um certo nível de fortalecimento socio-cultural e conservação de alguns costumes da primeira evangelização latino-americana?

Há um consenso entre os historia-dores das reduções e da Chiquitanía que diz respeito ao tipo de evangeli-zação ali realizado. Apesar das várias controvérsias a respeito da evange-lização jesuíta no período colonial espanhol e português, é indiscutível que houve uma evangelização cuja aplicação e vivência bíblico-teológi-co se aproximou consideravelmente da experiência que os povos nativos viviam naturalmente.

Uma dessas práticas comuns aos nativos trata-se do seu gosto pela música, e dizem alguns historiadores que não só se trata de gosto musical, senão uma facilidade de afeiçoamen-to e prática da arte. Eram dados à música e à dança, e, com muita agi-lidade, aprendiam a produzir outros tipos de arte, como a escultura, por exemplo.

Os Jesuítas compreenderam essa realidade já presente na cultura au-tóctone e a partir disso adaptaram sua compreensão teológico-catequética para aquilo que os chiquitanos enten-deram e acolheram como algo parti-lhado entre duas expressões culturais tão distintas, o cristianismo.

Desse modo, foi implementada uma ação evangelizadora encarnada na experiência do povo chiquitano. Os frutos dessa “ousadia cristã” resul-taram em que posteriormente esse