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SISTEMA VOLVO DE PRODUÇÃO: UMA EVOLUÇÃO NA MANUFATURA AUTOMOBILÍSTICA OU UMA TENTATIVA FRACASSADA DE PRODUÇÃO SOCIOTÉCNICA? Adauto Farias Bueno (UNEMAT) [email protected] Rodrigo Alessandro de Oliveira (UNEMAT) [email protected] Uddewala foi projetada para ser a fábrica do futuro onde pessoas e sistema produtivo convergiam para o desenvolvimento continuo da organização inteligente, o caráter experimental com que a produção sociotécnica foi implantada na Volvo comprrometeu sua produtividade, mais baixa em relação a média com os outros concorrentes mundiais. O mundo da manufatura industrial com um todo é altamente competitivo e em especifico da manufatura automobilística ainda mais, nesse contexto as empresas da Europa nas décadas de 70 com a crise do petróleo e queda na demanda por automóveis, assim como a criação de fortes sindicatos e operários politizados se viram cercadas por problemas potencias de competitividade e mão-de-obra, elevado pedido de demissão, constrangimentos públicos, absenteísmo e greves radicais fizeram os produtores europeus a repensarem suas relações produtivas e reorganizarem suas relações trabalhistas com vistas à manutenção de pessoal capacitado e de alta produção nas plantas de fabricação automotiva. Nessa perspectiva a Volvo Company, lança sua inovadora planta de Kalmar com características médias de inovação sociotécnica, ou seja, o projeto e trabalho na unidade fabril adaptado às necessidades humanas e não o trabalhador adaptando-se ao status quo fabril. Contudo a evolução extrema do projeto de engenharia e projeto dos métodos produtivos veio com a planta de Uddewalla citada em muitos artigos como a fábrica do futuro, uma evolução da inovação média de Kalmar, Uddewalla foi a evolução máxima que qualquer modelo de produção já conseguiu atingir e operar em termos organizacionais. Uddewalla fechada em 1992 encerra seu formato produtivo sociotécnico volvista por motivos de orientação estratégica e pressão de acionistas, o grupo acabou concentrando-se mais adiante na produção de caminhões somente, mas a experiência sóciotécnica é destacada como inovadora, positiva, eficiente dando margem a um novo sistema de produção: O sistema Volvo de Produção. Palavras-chaves: Produtividade, organização do trabalho, volvo XXIX ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO A Engenharia de Produção e o Desenvolvimento Sustentável: Integrando Tecnologia e Gestão. Salvador, BA, Brasil, 06 a 09 de outubro de 2009

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SISTEMA VOLVO DE PRODUÇÃO: UMA

EVOLUÇÃO NA MANUFATURA

AUTOMOBILÍSTICA OU UMA

TENTATIVA FRACASSADA DE

PRODUÇÃO SOCIOTÉCNICA?

Adauto Farias Bueno (UNEMAT)

[email protected]

Rodrigo Alessandro de Oliveira (UNEMAT)

[email protected]

Uddewala foi projetada para ser a fábrica do futuro onde pessoas e

sistema produtivo convergiam para o desenvolvimento continuo da

organização inteligente, o caráter experimental com que a produção

sociotécnica foi implantada na Volvo comprrometeu sua produtividade,

mais baixa em relação a média com os outros concorrentes mundiais.

O mundo da manufatura industrial com um todo é altamente

competitivo e em especifico da manufatura automobilística ainda mais,

nesse contexto as empresas da Europa nas décadas de 70 com a crise

do petróleo e queda na demanda por automóveis, assim como a

criação de fortes sindicatos e operários politizados se viram cercadas

por problemas potencias de competitividade e mão-de-obra, elevado

pedido de demissão, constrangimentos públicos, absenteísmo e greves

radicais fizeram os produtores europeus a repensarem suas relações

produtivas e reorganizarem suas relações trabalhistas com vistas à

manutenção de pessoal capacitado e de alta produção nas plantas de

fabricação automotiva. Nessa perspectiva a Volvo Company, lança sua

inovadora planta de Kalmar com características médias de inovação

sociotécnica, ou seja, o projeto e trabalho na unidade fabril adaptado

às necessidades humanas e não o trabalhador adaptando-se ao status

quo fabril. Contudo a evolução extrema do projeto de engenharia e

projeto dos métodos produtivos veio com a planta de Uddewalla citada

em muitos artigos como a fábrica do futuro, uma evolução da inovação

média de Kalmar, Uddewalla foi a evolução máxima que qualquer

modelo de produção já conseguiu atingir e operar em termos

organizacionais. Uddewalla fechada em 1992 encerra seu formato

produtivo sociotécnico volvista por motivos de orientação estratégica e

pressão de acionistas, o grupo acabou concentrando-se mais adiante

na produção de caminhões somente, mas a experiência sóciotécnica é

destacada como inovadora, positiva, eficiente dando margem a um

novo sistema de produção: O sistema Volvo de Produção.

Palavras-chaves: Produtividade, organização do trabalho, volvo

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1. Introdução

Desde o surgimento do vapor a industria vem se desenvolvendo num processo dinâmico de

adaptações e repostas aos mercados aos quais atendem. Em praticamente um século foi

constituído várias transformações e avanços tecnológicos que determinaram o

desenvolvimento de novas formas de gestão da produção, assim como a concepção de

diferentes sistemas produtivos e organizacionais.

Os conhecimentos de gestão desenvolvidos por Taylor, Ford e Sloan trouxeram, desde o

início do século XX até essa data, avanços sem precedentes à produtividade das empresas dos

EUA O ano de 1955 marca o início do sistema produtivo de produção em massa”, em sua

forma amadurecida. Alguns dos fatores foram: produção em grande escala e em grandes lotes

com correspondente redução dos custos unitários; elevada especialização do trabalho no chão-

de- fábrica; inexistência de envolvimento do trabalhador com qualidade, sugestões ou

melhoria das operações; o máximo possível em termos de verticalização da produção, etc. Os

princípios e condições ambientais que haviam sustentado o paradigma da produtividade em

massa, porém, já não eram suficientes para garantir a competitividade de que as empresas

precisavam (CELLI, 2008).

Sob a liderança de Taichi Ohno a Toyota Motor Company, buscava uma forma alternativa à

produção em massa para gerenciar o sistema de produção. Surge, então, a produção enxuta.

Algumas das bases desse novo modo de produção era o Just-in-time, a automação

(automação com um toque humano), a polivalência dos trabalhadores, o defeito zero, o

Kaizen, a produção em pequenos lotes, entre outros. A década de 1970 possibilitou o seu

amadurecimento e, durante os anos de 1980, o Japão, com a adoção parcial ou integral da

nova forma de produção, alcançou índices de crescimento fantásticos em vários setores

econômicos, lançando o país numa época de prosperidade jamais alcançada antes.

A Volvo Company desenvolveu na Suécia nas décadas de 1970 e 1980 em relação à criação

de alternativas á forma baseada na produção em massa. Tais experiências tiveram origem nos

estudos realizados pelo Instituto Tavistock, em Londres, ainda nas décadas de 1940 e 1950, e

visavam compatibilizar os aspectos humanos e tecnológicos presentes no sistema produtivo,

como alternativa ao fordismo. Na Volvo os trabalhadores, organizados através de sindicatos

fortes, manifestavam insatisfação com as práticas da produção em massa, o que levou a

empresa a testar alternativas para a organização do trabalho chão-de-fábrica, de modo que

este se tornasse menos repetitivo, com maior conteúdo e, portanto, com maior significado e

motivação para o trabalhador. No entanto, muitas de suas inovações são hoje utilizadas em

fábricas de ônibus e caminhões – inclusive no Brasil – como kits de peças enviados à linha de

montagem, elevação do grau de autonomia das equipes, redução de níveis hierárquicos, etc.

Tais experiências representam uma proposta relevante de quebra do paradigma fordista,

constituindo-se, talvez, em um sistema de produção avançado demais para a época(CELLI,

2008).

2. A perspectiva de produção e trabalho no sistema Taylorista – Fordista (Produção em

Massa)

Quando em 1911 Taylor publicou sua ilustre obra “The Principles of Scientific Management”

deu inicio à chamada Administração Cientifica que marcou a expansão industrial americana

sob a lógica de separação do trabalho mental do fisico e pela fragmentação de tarefas e/ou

especialização. O efeito real da aplicação dos principios da Administração científica foi a

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elevação brutal da produtividade e por outro lado o surgimento de problemas crônicos da

produção industrial moderna: o absenteismo e turnover.

Wood Jr. (1992) define o sistema gerencial desenvolvido por Taylor como mecanicista onde

as organizações são administradas como máquinas, possuindo metas fixadas e formas de

atingi-las, organização racional, simples, eficiente e controle de todas as partes da organizaçao

de forma rigida, inibindo o autocontrole por parte do operario sobre o trabalho, resultando em

um grau minimo de envolvimento e responsabilidade do mesmo com o processo em que é

autor, fragilizando assim o ambiente produtivo.

Ford foi o homem que pôs em pratica os conceitos tayloristas e em 1913 revoluciona a

indústria do automóvel ao inaugurar a primeira linha de montagem em cadeia, na nova fábrica

de Highland Park, Michigan. Utilizando o "scientific management" em conjunto com o

trabalho em linha com plataforma móvel, tornava-se absolutamente dispensável o operário de

ofício configurando-se as potencialidades da produção em grande série (SANTOS, 2003).

A intensificação do ritmo de trabalho, graças à especialização, parcelarização e

individualização das tarefas em linhas de montagem mecanizadas, permitiu um considerável

aumento da produtividade, e também a redução dos custos de produção, segundo Wood Jr

(1992) antes da introdução da linha continua Ford tinha conseguido reduzir o tempo de ciclo

de 514 para 2 minutos, com a implementação da linha continua/cadeia caiu para 1 minuto.

Com uma produção anual de aproximadamente 250 mil unidades, Ford consegue baixar o

preço do seu modelo T para os 500 dólares. Desta maneira os lucros tornam-se fabulosos

(CELLI, 2008).

Em contrapartida, o novo sistema de produção em massa tinha feito aumentar o turnover do

pessoal operário na ordem dos 50% ao mês. É então que Ford, no início de 1914, decide

introduzir U$5,00 por dia de trabalho de oito horas (quando a média era U$ 2,34 por 9 horas

de trabalho diário), além de um esquema de participação nos lucros como forma de resolução

desses problemas ameçadores.

Segundo Wood Jr (1992) a principal raiz do declinio da produção em massa foi a falta de

visão de Ford de como gerenciar globalmente suas decisões a nao ser centralizado-as com um

sistema de controle altamente burocratizado.

Até 1941 Ford mantém um braço de ferro com os sindicatos e, em 1939, perde a supremacia

no mercado norte-americano para a General Motors, que gerenciada por Sloan conseguiu

maior participação de mercado com cinco variedades diferentes de automóveis e amenizou o

efeito da burocratização e centralização das decisões divisionalizando com rígido sistema de

controle a GM, criando ainda os departamentos de marketing e finanças.

Mesmo com as inovações de Sloan na GM a partir de 1950 um novo cenario mundial de

organização de sindicatos fortes e incertezas de demanda do mercado estagnam a industria

automobilistica que com a crise do petroleo de 1970 e a ascenção da produção flexivel da

Toyota Motors vem definitivamente colocar em revisão a produção em massa e requerer

adaptação aos novos tempos e cenarios econômicos.

Surgi então a crise sustentada no mecanicismo baseado na racionalidade funcional, mesmo

tendo sido popularizado e sendo a chave do sucesso de muitas empresas durante longos anos,

o mecanicismo começou a ser questionado enquanto formato organizacional eficiente devido

as crises economicas e periodos de estagnação assim como pelas mudanças socioculturais

ocorridas no século XX, diferentes sociedades como a japonesa e européia engajadas na

industrialização redesenharam a forma Taylorista-Fordista de gerir a produção industrial e

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inauguraram algumas variantes de sistemas produtivos como o SPT (Sistema Toyota de

Produção) com a filosofia enxuta/flexivel e os neo-sistemas europeus como NUMMI e o SVP

(Sistema Volvo de Produção ou Produção Sociotécnica).

3. A perspectiva de produção e trabalho no produção no Sistema Toyota de Produção

(Enxuto)

Na produção em massa o aspecto de que funcionários eram agentes produtivos com

necessidades especiais que devem ser percebidas para otimizar desempenho no trabalho não

era nada obvia (Wood Jr., 1992), dentro dessa perspectiva Mitzberg coloca que a burocracia

mecânica do sistema de produção em massa só é eficiente em ambiente estáveis e executando

tarefas simples, numa visita de Eiji Toyoda as instalações da Ford em Detroit em 1955 ele

constatou bem essa realidade e juntamente com Ohno no Japão examinaram o momento

histórico em que viviam levantando fatores como cultura, mão de obra e mercado doméstico

pequeno que exigia grande variedade, constituindo elementos que não vingaria a produção em

massa no Japão, logo surge para o mundo a manufatura flexível, alicerçando a Toyota como a

empresa automobilística mais eficiente no mundo.

A crise do petróleo de 1970 foi crucial para debilitar ainda mais as indústrias de produção em

massa americana e européia, com essa mesma crise a Toyota foi buscar nos revendedores

parcerias e estratégias para flexibilizar a produção via capitalização das necessidades do

mercado consumidor e adaptação as mudanças tecnológicas da época.

Os japoneses inovaram de montante a jusante na cadeia produtiva, fizeram alianças com

fornecedores numa bem montada rede de suprimentos coisa nunca conseguida pelos

produtores em massa, assim como alianças com redes de vendas aonde vinha a orientação de

produção puxada pelo mercado por isso a sincronia e coordenação de informações deviam ser

rigorosamente simétricas para que o processo de Just-in-time seja suave e nivele a produção

reduzindo estoques intermediários e antecipando a ocorrência de falhas e problemas.

A TRF (Troca rápida de ferramentas) foi à base para sustentação do JIT no modelo flexível da

Toyota, com ele houve significativa redução do setup tanto para pequenos lotes heterogêneos

quanto pra grandes lotes homogêneos.

O novo sistema produtivo foi um marco na manufatura moderna, mas a forma com que o fator

trabalho era utilizado mudou pouca coisa em relação à produção em massa como cita

(SANTOS, 2003).

“Com a lean production, o trabalho de montagem continuou a ser especializado e

parcelarizado, os postos de trabalho individualizados e os ciclos operatórios muito

curtos (ou seja, com fortes constrangimentos de tempo). Isto era visto como uma

vantagem em termos de aprendizagem. A rotação de tarefas era incentivada,

sobretudo como forma de suprir eventuais falhas de mão-de-obra. Rotação e

flexibilidade não significam, no entanto, enriquecimento de tarefas. O novo samurai

é flexível e polivalente, mas luta sozinho. As regras do jogo, não estão sob seu

controle. Gestão do tempo, nem pensar nisso. O método operatório bem como o

ritmo de trabalho são-lhe impostos e são uniformes.” (SANTOS, 2003. p.77 )

O turnover do pessoal no modelo japonês era um problema crônico assim como na produção

em massa, sobretudo dos mais jovens que, tal como os suecos no final dos anos 60 e

princípios de 70, dificilmente se identificavam com o trabalho taylorizado, isto é,

individualizado, especializado, parcelarizado, penoso, repetitivo e monótono. Outro fator

problemático era o elevado nível de stress no trabalho, em grande parte resultante do ritmo de

produção e da sub-carga mental ligada à monotonia e repetividade das tarefas. Os seres

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humanos que participam do sistema "enxuto" são empurrados para seus limites e aumentam,

assustadoramente, os casos de hipertensão e de suicídio nas cidades japonesas, bem como a

alta incidência de outros riscos profissionais, nomeadamente os de aspecto de doenças

ocupacionais, em conseqüência das posturas corporais de elevado risco, exigidas pelo trabalho

de montagem.

Com o final da 2ª Guerra a Toyota para enfrentar a crise pela queda da demanda demitiu ¼ da

sua força de trabalho, fato este que gerou enorme insatisfação e culminou numa crise

institucional que levou a ao que conhecemos hoje de modelo japonês de trabalho com

empregos vitalícios, participação nos lucros e promoção por critérios de tempo de serviço.

Wood Jr. (1992) ainda chama atenção a um fator pouco mencionado quando falamos do

sistema japonês de produção, baseado nos trabalhos de Kuniyasu Sakay (The feudal world

japanese of manufacturing) e Bob King ( Hoshin Planning: The development aproach) o autor

afirma que os grandes grupos industriais japoneses tem uma configuração piramidal, sendo a

base constituída por milhares de pequenas empresas que emprega a grande parte da mão de

obra e que sofre com a transferência de custos e margem de lucros mínimas, fatores que

afetam a sustentabilidade econômica dessas empresas assim como o nível de satisfação de

seus empregados, a queda relativa da devoção dos empregados dessas pequenas empresas é

um exemplo que reflete esse esgotamento além de uma mudança sensível aos padrões

comportamentais e culturais no trabalho.

4. A perspectiva de produção e trabalho no sistema Volvo de produção (Sociotécnico)

A Volvo Company fundada em 1926 por Assar Gabrielsson e Gustaf Larson tinha como

objetivo produzir veículos que fossem seguros, resistentes e adequados ao clima frio do país,

somava-se a isso ainda, a falta de estradas adequadas ao trafego de veículos na Suécia. A

Volvo voltou sua produção até 1970 apenas para o mercado interno sueco quando em 1974

adquiriu a DAF uma montadora holandesa, iniciando a internacionalização de mercado e

produção (BONDARIK & PILATTI, 2007a).

Wood Jr. (1992) destaca que a evolução produtiva da Volvo se deu guiada por um alto grau

de experimentalismo com introduções gradativas de inovações tecnológicas e conceituais, nas

plantas de Kalmar em 1974, Torslanda 1980/1981 e a mais revolucionaria de todas as plantas

que foi Uddevala inaugurada em 1989, Moniz & Machado (2001) relata que a inovação foi

resposta à crise com mão-de-obra que surgiu com a rejeição ao modelo fordista de trabalho

especializado e parcelarizado que a companhia operava desde 1960.

4.1 A primeira parte da inovação sociotécnica Volvista: Planta de Kalmar

Em 1973, a Volvo inaugura em Kalmar na Suécia um pioneiro projeto Sociotécnico em sua

nova unidade fabril automotiva, que possuia a meta de fabricar 30000 unidades por ano.

Especificações como forma dos prédios, o layout de distribuição do pessoal, as condições de

meio ambiente (temperatura, iluminação, ruídos, etc..), foram concebidos visando

proporcionar uma organização das condições de trabalho da maneira mais otimizada possível

em conjunto com o projeto de engenharia da instalação industrial (SANTOS, 2003).

Bondarik & Pilatti (2007a) ressalta que Kalmar pode ser considerada como, provavelmente, o

primeiro exemplo de uma planta para manufatura automobilística, onde a técnica é planejada

às necessidades dos homens, em contraposto a prática até então praticada pelos sistemas de

produção em massa e japonês, dando assim um passo decisivo na concepção de uma nova

tecnologia para a organização do trabalho.

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A fábrica foi inaugurada para operar com 25 equipes de trabalho, de 15 montadores cada

equipe. Cada grupo trabalha independente, em uma área de trabalho reservada, se

especializando numa parte do veículo. Cada montador tem a polivalência necessária para

participar em qualquer etapa do processo da equipe, além de participar ativamente da

elaboração dos planos de trabalho, dos esquemas de montagem, da distribuição do trabalho

entre os componentes da equipe, assim como, se julgar necessário, propor modificações no

ritmo de trabalho adotado e eleger seus supervisores em padrão democrático

(BERGGREN,2003).

A nível de prédio, a fábrica tem uma forma com quatro hexágonos interligados, agrupados a

um centro comum, onde ficam os almoxarifados e estoques de peças. Cada hexágono é

ocupado pôr um conjunto de equipes, sendo que a lateral do hexágono é envidraçada, para

permitir uma iluminação natural o mais forte possível. O layout dentro do hexágono foi

desenhado para permitir um ambiente de trabalho o mais agradável possível, como por

exemplo, do ponto de vista acústico, foi elaborado um projeto que permitisse a comunicação

sem precisar elevar a voz, com um nível máximo aceitável de 65 Decibéis. O espaço

reservado para as pessoas é composto de um local de repouso e refeição, de um vestiário

equipado com pias, duchas, sauna, banheiros, armários individuais (SANTOS, 2003).

Além disso, um telefone está disponibilizado para as chamadas particulares de cada um. O

sistema de movimentação de peças e subconjuntos, em Kalmar era feito por um sistema

flexível (automated guided vehicles), sendo comandados pelos operadores, para

movimentação tanto dentro de uma equipe como entre equipes e almoxarifados (MONIZ &

MACHADO, 2001).

As três grandes funções destes carrinhos eram:

Abastecimento e fornecimento de componentes e conjuntos;

Transporte de carrocerias e chassis;

Serviam como plataforma de trabalho.

Cada equipe tinha de fazer seu trabalho dentro de um tempo pré-determinado, porém, para

evitar paradas e stress dos operários, entre as áreas foram formados pulmões de

amortecimento, que eram dimensionados pelas próprias equipes, visando atender estes dois

fatores.

O procedimento de montagem tinha dois tipos:

Clássico: As carrocerias teleguiadas permanecem em cada posto de trabalho o tempo

necessário para realização da operação. Em Kalmar os operadores gerenciavam e decidiam

este tempo e até mesmo permaneciam dentro do carrinho fazendo a operação enquanto o

mesmo avançava.

Semi-autônoma: As equipes dividiam-se em pequenos grupos de 03 ou 04 homens, cada

sub-equipe elaborava o trabalho completo da zona desta equipe, permitindo trabalhar em

várias carrocerias ao mesmo tempo.

Todo este esforço inovador empreendido em Kalmar teve como resultado a queda do índice

de turnover na época, a taxa de absenteísmo, amenização das dificuldades de recrutamento,

inibição das greves reinantes características da historia industrial sueca, alem do aumento do

tempo de ciclo de 4 minutos para meia hora.

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4.2 A segunda parte da experiência sociotécnica Volvista: Planta de Uddewalla

A nova planta da Volvo foi projetada para ser uma evolução da experiência em Kalmar,

fazendo de Uddevalla um projeto antropocêntrico (Modelo “centrado no homem”)

(SANTOS, 2003).

O governo forçou à empresa para que os sindicatos de trabalhadores fossem envolvidos com o

desenvolvimento do projeto desde o seu início e a participação dos trabalhadores ocorreu

inclusive na organização da produção. O objetivo do sindicato, além de garantir empregos, era

inicialmente garantir a qualidade do trabalho a ser desenvolvido na nova planta.

Segundo Bondarik & Pillati (2007b) na negociação e participação do sindicato junto ao

projeto antropocêntrico de Uddewala os sindicato colocou quatro condições fundamentais

para uma otimização da produção fabril: ciclo de trabalho com máximo de 20 minutos cada,

ritmo de trabalho não fixados pela maquina, montagem estacionaria sem a presença de

esteiras rolantes ou móveis e que o processo de montagem do veiculo não excederia 60% do

tempo de trabalho, todas as condições foram executadas satisfatoriamente com exceção do

padrão de 60% da carga de trabalho na montagem.

As equipes participavam efetivamente na seleção e na formação de pessoal. O líder de cada

grupo era eleito. Em Uddewalla, cada equipe auto dirigida, construía um carro

completamente, dentro de uma área pré-estabelecida, permitindo, assim, a participação de

todos em todas as etapas da montagem de um veículo. A organização do trabalho era guiada

por grupos autodirigidos. Nas equipes de trabalho não existiam as tradicionais chefias diretas,

sendo os próprios membros da equipe quem fazia a gestão da qualidade, dos custos, da

manutenção, etc. Além disso, incentivava-se a polivalência. O objetivo era fazer rodar estas

tarefas todos os meses (BONDARIK & PILLATI, 2007b).

Em 1991 Uddevalla detinha a todos esses fatores de projeto de instalação e ergonomia voltado

para atender necessidades do trabalho humano, logo resultaram no índice de qualidade mais

alta das três fábricas suecas da Volvo. E depois de certa estagnação em 1990, a produtividade

continuava a melhorar. De qualquer modo, esta experiência era considerada como importante

para o desenvolvimento organizacional e o crescimento estratégico da Volvo que lutava então

com problemas de produtividade e competitividade, se bem que esses problemas fossem

comuns a outros fabricantes de automóveis, seus concorrentes (principalmente os europeus e

os norte-americanos).

Quando projetada a fábrica de Uddevalla tinha como objetivo ser tão rápida quanto às outras

duas (em território sueco). Os melhores resultados em relação à mudança de séries ou de

modelos sugeriam que os métodos de trabalho em Uddevalla eram mais vantajosos e racionais

do que o trabalho em cadeia, na medida em que a produção era mais flexível e prestava-se

melhor a mudanças técnicas e organizacionais, a flutuações do mercado, etc. Por outro lado, e

uma vez que o futuro na indústria do automóvel apontava no sentido de serem cada vez mais

freqüentes as variedades de modelos, e haver uma maior exigência do mercado em relação à

novos modelos e à qualidade dos produtos, esperava-se que a forma de organização do

trabalho em Uddevalla passasse a ser devidamente valorizada (SANTOS, 2003).

O layout produtivo é construído com um armazém no centro da fabrica que distribui material

para seis centros de produção totalmente independentes, com capacidade de produção de

40.000 carros ao ano em um turno de trabalho normal, instalação que tinha configuração de

centros de produção semelhantes à planta de Kalmar. A montagem é estacionaria e não com

linha móvel como no sistema de produção em massa, eliminou-se esteiras, os ciclos de

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trabalho possuem limite máximo de 20 minutos, as maquinas não podem fixar o ritmo de

produção. O layout e forma organizacional e de produção em Uddevala buscava flexibilidade

com alto grau de automação e informatização (SANTOS, 2003).

A experiência sueca de construção (montagem) de um carro pôr inteiro, tendo pôr base os

princípios sociotécnicos e as equipes autodirigidas tinham algumas vantagens em relação ao

modelo convencional como, por exemplo, o japonês conforme representado na figura 1:

Sistemas de Produção

Convencinal Sociotécnico

Tempo para o operador pegar e

manusear as ferramentas e

materiais mais o tempo necessário

para controlar e ajustar o próprio

trabalho

Fatores

Eficência

135 40

Espaço em metros quadrados

necessário para a montagem e um

carro-ano0,6 0,4

Espaço em metros quadrados

necessários para reajustamentos 0,2 0,1

Nº de máquinas e unidades de

equipamentos mecanizados por

unidade de produção 1,6 0,6

Nº de diferentes componentes

existentes na fabrica de montagem 50001500

Limite de aumento percentual da

cadência individual15 Sem limites

Fonte: Adaptado Santos (2003)

Figura 1: Vantagens do modelo de produção sociotécnico

A planta no final de 1989 possui cerca de mil empregados e era dividida em três partes:

oficina de materiais, de montagem e administração. Em cada um dos seis centros de

montagem trabalhavam cerca de 80 a 100 operários divididos em grupos de 8 a 10 pessoas,

todo o transporte de materiais é automatizado. Cada grupo possui todas as peças para montar

três veículos simultaneamente, as competências que regem as tarefas a serem realizadas e a

supervisão de todos os grupos é feita por um único gerente, 45 % da mão de obra era feminina

(BERGGREN, 2003).

A fábrica de Uddevalla (que era apenas de montagem, não de fabricação) tinha vantagens em

termos de custo/benefício. Uma das suas vantagens era a flexibilidade:

Lidava-se melhor com os reajustamentos da produção, o que foi testado quando, no verão

de 1990, foi lançada uma nova série de carros;

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Os custos de formação e de reajustamento técnico também eram menores do que nas outras

duas fábricas (Torslanda e Kalmar).

Em contrapartida, o ponto fraco da fábrica de Uddevalla era a sua produtividade menor (40

horas de trabalho/homem com a montagem de um veículo enquanto na NUMMI da

Gm/Toyota levava-se 28 horas para execução), de fato em 1990 ainda levava mais tempo

construir um carro em Uddevalla do que em Torslanda ou em Kalmar, para não falar de Gand

outra fábrica da Volvo na Bélgica (SANTOS, 2003).

A partir de então começa a falar-se de Volvísmo enquanto modelo de organização do trabalho

alternativo ao Fordismo e Toyotismo na indústria automóvel. Esse modelo fazia parte da

estratégia do grupo sueco para se afirmar internacionalmente como um pequeno construtor

independente com prestígio. Kalmar e Uddewala tornam-se, assim, um símbolo das novas

formas de organização do trabalho na Europa e no resto do mundo e, decididamente, o ponto

de partida para a era do pós-fordismo, como relatam (GRAÇA 1992).

5. O sistema Volvo discutido do ponto de vista da organização do trabalho

Shingo (1998) afirma que o sistema Volvo não foi além do sistema Ford como designa o

subtitulo do livro de Perer Gyllenhmmar (Pessoas no trabalho: Ultrapassando o sistema Ford)

e simplesmente compensou o que o sistema Ford negligenciou no campo das emoções

humanas, uma afirmação um tanto quanto vaga pois dentro da função produção o fator

trabalho não é apenas composto da emoção em si com o trabalho, mas da inter-relação de

fatores psíquicos, físicos, ambientais. Shingo ainda descreve que a manufatura enxuta

praticada na indústria automobilística do Japão trata os trabalhadores que compõem seu

quadro como indivíduos do tipo Y segundo a classificação de Douglas Maccgregor da Teroria

XY da Administração, a falta de recursos naturais do Japão segundo Shingo, obrigou a

sociedade a enxergar o trabalhador japonês como único recurso que pode levar a prosperidade

nacional, empregos vitalícios, sindicatos por empresas são medidas que segundo o autor

incentivam o lado Y no trabalhador, o mesmo autor afirma que o sistema Volvo de produção

representou a aceitação e concessão das características humanas do tipo X e não incentiva as

características Y.

O trabalhador do tipo X possui certas características como: indolente por natureza e trabalha

tão quanto possível; é preguiçoso e portanto, precisa ser persuadido, premiado, punido e

controlado para atender as necessidades das organizações; o trabalhador não tem ambição,

não aceita responsabilidades, prefere ser comandado e escolhe o método mais seguro entre

todos os métodos disponíveis (SHINGO, 1998).

O trabalhador do tipo Y possui as seguintes características: É natural utilizar mente e corpo no

trabalho; os mesmos trabalham voluntariamente tendo em vista um objetivo; os trabalhadores

trabalham mediante um pagamento apropriado; possuem responsabilidades em condições

aceitáveis; possuem habilidades para resolver problemas (SHINGO, 1998).

Segundo a teoria XY, as características da teoria X e da teoria Y coexistem em todos os seres

humanos, Shingo (1998) afirma que trabalhadores da Europa e América são tratados como

pessoas do tipo X, e no Japão como tipo Y.

A principio não pode-se dizer com convicção que o sistema Volvo é conveniente e

incentivador de pessoas do tipo X, nem que deixa de incentivar as características Y dos

trabalhadores, numa análise genérica o programa de trabalho da Volvo contempla o incentivo

de praticamente todas as características Y, na medida que a Volvo montou um programa com

eliminação de alguns esforços dispendidos e incentivo de comprometimento e trabalho em

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grupo perdeu em produtividade, e a literatura japonesa usa certas desvantagens competitivas

como a queda na produtividade que surgiram com a produção sociotécnica para diminuir sua

importância enquanto evolução em sistema produtivo e elevar o a sociedade e sistema japonês

como um modelo mais eficaz de pessoas e produção, a eficácia produtiva alcançada durante o

século XX pelas empresas japonesas é inegável, mas aspectos de alto índice de suicídio e

descontrole psicológico são algumas dos efeitos colaterais do sistema enxuto que possibilita a

geração de indústrias excepcionalmente competitivas mas, ao mesmo tempo, exige muito de

toda a sociedade em todos os setores.

Ainda nessa perspectiva de validação do sistema Volvo como uma das maiores evoluções nos

paradigmas da organização do trabalho na era industrial o MIT sob a liderança de Johnes P.

Womack lança uma série de trabalhos sobre a produção enxuta (lean production)

popularizando o conceito de produção flexível/ puxada para o mundo industrial ocidental,

influenciando decisivamente a orientação de produção das empresas, logo a critica ao sistema

sociotécnico foi rapidamente exposto nos trabalhos do mentores “lean”, Womack autor da

obra “ A maquina que mudou o mundo” um dos livros específicos em manufatura automotiva

mais comentados na atualidade, declarou que o sistema Volvo era o “Dead Horse” da

industria automobilística, ou seja, apenas um cavalo morto, uma experiência fracassada que

refletiu a falta de competitividade pela falta de produtividade em padrões com seus maiores

concorrentes, talvez Womack estaria em parte certo com sua afirmação quando por motivos

de orientação e fusão fracassada com a Renault a Volvo fechou as fabricas de Kalmar e

Uddewala.

O acordo de fusão com a Renault, anunciado em 1993, acabou por fracassar. Houve então

mudanças de orientação estratégica no grupo Volvo com recentragem nas actividades de base

(core business), prioridade aos interesses dos acionistas e fim das experiências de

reorganização do trabalho, cessando a consolidação da produção sociotécnica no grupo e o

possível kaizen em sua trajetória como sistema produtivo, mas a afirmação de Womack do

Dead Horse num ponto de vista global é errônea no sentido de que a experiência de Kalmar e

Uddewala não fracassou em termos de inovação, aprendizagem e evolução de paradigmas

técnicos, trabalhistas/produtivos, isso pode ser comprovado pela orientação das plantas da

Toyota no oriente as chamadas worker friendly plantas, os próprios japoneses aproveitaram

algumas das lições das intervenções sociotécnicas na Suécia. Pelo menos, foram obrigados a

ter em conta aspectos do ambiente psicossocial de trabalho e problemas de natureza

ergonómica completamente ignorados ou escamoteados até meados da década de 1980 e

inovaram suas plantas que mesmo em menor grau levavam o fator trabalho humano no

projeto de engenharia e produção.

6. O surgimento do trabalhador reflexivo no sistema Volvo de produção

A evolução do homem enquanto sujeito da criação de um produto e parte componente da

produção passou por varias transformações na industria automotiva mundial desde a sua

criação, visto com diferentes maneiras de integração com a produção foi identificado como

homem Operacinal no sistema de produção em massa, Homem Reativo no sistema de

produção enxuta e Homem reflexivo no sistema de produção sociotécnico, homem é o mesmo

que trabalhador ou uma unidade de força de trabalho.

O Homem operacional caracteristico do sistema mecanicista e burocratico da produção em

massa tem sido considerado ao longo do século XX e em especial nas plantas da Ford como

um recurso organizacional a ser maximizado em termos de produto físico mensurável. De

fato, as implicações desse modelo de homem para o formato organizacional podem ser

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descritas como: um método autoritário de alocação de recursos, no qual o trabalhador é visto

como um ser passivo que deve ser programado por especialistas para atuar dentro da

organização; uma concepção de treinamento como uma técnica destinada a programar o

indivíduo aos imperativos da maximização da produção; a visão de que o homem é calculista,

motivado por recompensas materiais e econômicas e, enquanto trabalhador, um ser

psicologicamente isolado e independente de outros indivíduos; a crença de que a

administração e a teoria administrativa são imparciais, isentas ou neutras; uma indiferença

sistemática às premissas éticas e de valor do ambiente externo; o ponto de vista de que

questões de liberdade pessoal são estranhas ao padrão organizacional; a convicção de que o

trabalho é essencialmente um adiamento da satisfação (RAMOS, 2001).

Já o sistema de produção enxuta era composto de um ambiente e projeto de trabalho que

concebia o homem como um ser mais complexo do que supunham os idealizadores da

produção em massa com seu Homem Operacional, este sistema que tem como simbolo

experimental o Sistema Toyota de Produção condicionava a existência de um Homem

Reativo dentro de uma organização formatada como organismo vivo onde a sobrevivencia é o

objetivo central, compreensaão entre relaçao da organização e o meio, impreende uma busca

de harmonia entre estratégia, estrutura, tecnologia e as dimensões humanas (BONDARAKI

& PILLATI, 2007a).

O trabalhador criado nesse sistema produtivo era concebido com uma visão mais sofisticada

sobre a natureza da motivação humana; as chefias não negligenciavam o ambiente social

externo da organização e, por isso, definiam a organização como um sistema social aberto; e

não desconsideravam o papel desempenhado por valores, sentimentos e atitudes sobre o

processo de produção. Embora os japoneses estivessem aparentemente mais preocupados

com os trabalhadores e conhecessem melhor suas motivações, os objetivos que buscavam não

haviam realmente mudado. Para despertar reações positivas em favor das metas da empresa

concebiam o trabalhador como um ser reativo, seu objetivo principal era ajustar os indivíduos

aos contextos de trabalho, e não ao seu crescimento individual. O resultado final da utilização

maciça de “relações humanas” era a inserção total do indivíduo na organização transformado-

o no homem organizacional com visão global do processo, mas decisão limitada (RAMOS,

2001).

O modelo mecanicista (Fordista) concebia a organização como um conjunto de partes ligadas

por uma rede de comando e controle, o modelo organico (enxuto) concebia a organização

através dos conceitos de integração ao ambiente, flexibilidade, estrutura matricial e

motivação, mas nenhum modelo ou sistema supera em termos evolutivos o sistema de

organização como cerébro onde a organização aprende e processa novas técnicas e

informações constatemente (WOOD JR., 1992).

Surge então no sistema sociotécnico de produção da Volvo Company o ultimo tipo de

homem criado nos sitemas produtivos modernos -o Homem reflexivo- este homem é

caracterizado em uma organização do tipo cerebro, possui uma consciência ou capacidade

crítica-analítica bastante desenvolvida em relação a sua existência e aos fatores relacionados,

possui poder de voto, é sujeito ativo no processo de produção a partir do momento que tem

voz sobre as decisões de seu grupo e é polivalente em varias funções, o homem reflexivo é

informado, possui bom nível de educação e alto poder de aprendizado, resultando em

crescimento individual. O aprendizado-do- aprendizado é o mecanismo que possibilita que o

excesso de flexibilidade desse sistema o leve ao caos, o objetivo é dar a organização o

máximo de flexibilidade e capacidade de inovação, dando possibilidade de sustentabilidade da

sonhada e não impossível organização inteligente.

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Sustentado no crescimento e aprendizagem individual surge o crescimento organizacional na

produção sociotécnica, os conceitos de single loop (aprendizado) e double loop (apredizado-

do-aprendizado) são a filosofia para tornar as organizações mais inteligentes com quatro

princípios elementares: capacidade de sentir ou monitorar o ambiente, relacionamento de

informações colhidas com normas pré-definidas, detecção das variações, inicio da correção

(WOOD JR, 1992).

7. Conclusões

A concepção de diferentes tipos de trabalhadores nos diferentes sistemas produtivos e

organizacionais nos leva a compreensao de qual a importancia e a dimensão das inovações do

sistema Volvo de produção, deixando claro que a experiencia sociotécnica foi efetivamente

positiva, e que resultados mais sólidos seriam explicitos com a melhoria continua da chamada

fábrica do futuro O sistema Volvo equacionou em partes mas com resultados nunca vistos

antes o problema da organização do trabalho que era latente desde os primordios da

manufatura automobilistica, ou seja, de aproveitamento das potencialidades da tecnologia e

das capacidades humanas (GRAÇA, 2002).

Como afirma Bondaraki & Pillati (2007a) os principios produtivos adotados na produção

sociotecnica da Volvo estavam além de seu tempo, mesmo com o fechamentos das fabricas a

experiencia serviu de modelo para diversas outras no mundo como os projetos das worker

frienfly plants abertas em 1992 pela Nissan e Toyota com caracteristicas de influencia

sóciotecnica, isso foi um claro resultado da rejeição imediata ao trabalho especializado que

essas empresas enfrentaram na Europa quando instalaram as chamadas transplants que eram

plantas automotivas de empresas japonesas de produção enxuta em operação no continente

europeu.

O fechamento das fábricas de Kalmar e Uddevalla nao significou a morte do sistema Volvo de

Produção que foi concebido nas plantas de Kalmar e Uddewalla, significou o êxito de um

sistema que projeta sua produção conforme a necessidade e enriquecimento do trabalho

humano, numa perspectiva de dotar a organização de inteligencia e aprendizado sustentando a

melhoria continua. O trabalhador reflexivo mais do que o resultado de um projeto voltado as

necessidades humanas representou a validação de que foi positivo os projetos de produção

sociotécnica e que a fábrica do futuro pode existir e que para isso é necessario novas

experiências que otimizem e conciliem produtividade/flexibilidade com vistas à satisfação do

trabalho humano.

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