Monografia 01 - Contrato de Assistência Médica

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PONTIFCIA UNIVERSIDADE CATLICA DE SO PAULO Faculdade de Direito e Coordenadoria Geral de Especializao, Aperfeioamento e Extenso (COGEAE)

Amanda Cristina de Oliveira Ana Paula da Silva Ribeiro Carolina Cardoso Ribeiro Fernandez Luciana Palma de Godoi Manoel Gomes Nikolas Lenk Gomes

CONTRATO DE ASSISTNCIA MDICA

SO PAULO

Amanda Cristina de Oliveira Ana Paula da Silva Ribeiro Carolina Cardoso Ribeiro Fernandez Luciana Palma de Godoi Manoel Gomes Nikolas Lenk Gomes

CONTRATO DE ASSISTNCIA MDICA

Monografia apresentada no curso de Especializao em Direito Contratual da Faculdade de Direito e da Coordenadoria Geral de Especializao, Aperfeioamento e Extenso (COGEAE) da Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo, como requisito aos estudos semestrais.

So Paulo 2011

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RESUMO SUMRIO Captulo I Histrico Captulo II Conceito 2.1 Seguro-sade e planos de assistncia mdica CAPTULO III OBJETO CAPTULO IV CLASSIFICAO 4.1 Quanto aos Efeitos 4.2 Quanto s Vantagens Patrimoniais 4.3 Quanto aos Riscos 4.4 Quanto ao Momento de sua Execuo 4.5 Quanto Formao 4.6 Quanto Forma CAPTULO V - REQUISITOS CAPTULO VI - ESPCIES CAPTULO VII - PARTES CAPTULO VIII DIREITOS E OBRIGAES DAS PARTES CAPTULO IX RESCISO CAPTULO X RESPONSABILIDADE CIVIL CAPTULO XI ASPECTOS POLMICOS E JURISPRUDNCIA

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INTRODUO No estudo de qualquer espcie contratual, em geral, temos como foco o aspecto econmico do contrato, ou seja, as vantagens financeiras e negociais que cada uma das partes pretende obter ao celebrar a avena. No entanto, h alguns tipos contratuais que, alm do aspecto econmico comum a todos os contratos, esto imbudos de uma conotao social, vez que tem como foco um bem mais relevante do que o financeiro propriamente dito, hiptese na qual podemos enquadrar o denominado Contrato de Assistncia Mdica. O legislador constituinte preceitua, no artigo 196 da Carta Magna, que:A sade direito de todos e dever do Estado, garantido mediante polticas sociais e econmicas que visem reduo do risco de doena e de outros agravos e ao acesso universal e igualitrio s aes e servios para sua promoo, proteo e recuperao.

V-se, que na concepo constitucional, a sade, direito de todos, um bem que deveria ser garantido pelo Estado, de forma gratuita, ou seja, o acesso a tratamentos mdicos, hospitalares e laboratoriais de qualidade deveria ser garantido pelo Estado, sem que a populao precisasse pagar por eles, e de forma igualitrias, no fazendo distino entre ricos e pobres. No entanto, essa uma verdadeira utopia, o Estado Brasileiro jamais conseguiu cumprir o aludido ditame constitucional em sua plenitude, sendo notrio o fato de que o sistema pblico de sade altamente defeituoso, os mdicos e demais profissionais da sade so mal remunerados, as instalaes so precrias, os tratamentos disponibilizados no abarcam toda e qualquer doena, e, pior, no se prestam instantaneamente queles que os procuram. Diante dessa realidade, tonou-se imperiosa a atuao da iniciativa privada no campo da sade, como complemento da atuao estatal, mas, tendo em vista o seu alto custo, restrita s classes mais abastadas da sociedade. Assim, aquelas pessoas que possuem uma condio financeira mais confortvel procuram na iniciativa privada a sade de qualidade que no se encontra no sistema pblico de sade, e o fazem celebrando contratos de assistncia mdica com operadoras de plano de sade, por meio dos quais pagam a estas uma remunerao mensal, e, como contraprestao, tm a sua disposio uma rede de mdicos, clnicas, hospitais, e

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laboratrios, aos quais podem recorrer sempre que acometidos por uma enfermidade, ou simplesmente de forma preventiva. Por terem por objeto a sade, bem essencial e que consiste em dever do Estado, os contratos de assistncia mdica sofrem grande regulao estatal, tanto que grande parte de suas clusulas tm o contedo pr-definido em resolues e instrues normativas, o que visa garantir um maior equilbrio ao contrato, e preservar os direitos do assistido. Considerando a riqueza do tema ora em estudo, o presente trabalho tem por objeto a anlise de todas as caractersticas do contrato de assistncia mdica, desde os aspectos histricos que culminaram em sua atual condio, at a responsabilidade das operadoras de plano de sade, profissionais e instituies envolvidos na prestao dos servios pelos danos sofridos pelo assistido, bem como os pontos de maior debate doutrinrio e jurisprudencial. por meio deste estudo que se pretende demonstrar como um contrato pode envolver em si, ao mesmo tempo, o aspecto negocial e econmico comum a todos os contratos, e uma conotao social cuja funo complementar a atuao estatal, garantindo populao um acesso mais justo e igualitrio a uma sade de qualidade.

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CAPTULO I HISTRICO O seguro surgiu visando proteo aos prejuzos financeiros, pela necessidade do homem controlar os riscos. H indcio da existncia do seguro na Babilnia, sculo 23 antes de cristo, para proteger as caravanas de cameleiros que cruzavam o deserto para vender os camelos nas cidades vizinhas, conhecendo o risco eles assumiam o dever de ressarcir o custo do camelo ao dono, caso o animal viesse a morrer. O seguro ganhou maior importncia no direito martimo, na Idade Mdia, objetivando cobrir sinistros em navios e cargas. Os navegantes realizavam um acordo que garantia a quem perdesse o navio a construo de um novo, pago pelos demais participantes da viagem. No sculo XII, na era crist, surgiu a modalidade de seguro denominada Contrato de Dinheiro e Risco Martimo, no qual uma parte emprestava uma certa quantia em dinheiro a outra parte, o navegador, para garantir o valor do barco e das mercadorias, se durante a viagem o barco e/ou a mercadoria sofressem avarias o dinheiro emprestado no era devolvido. Se no houvesse qualquer dano o dinheiro tinha que ser devolvido acrescido de juros. Entretanto, em 1234 o papa Gregrio IX proibiu, na Europa, esse tipo de Contrato. Ento, foi criada uma nova modalidade para a prtica de tais garantias, os Banqueiros compravam os barcos e as mercadorias, caso houvesse o naufrgio o dinheiro adiantado era o preo da compra, garantia. Caso o barco chegasse ao seu destino, sem danos, a clusula de compra era considerada nula e o dinheiro devolvido ao banqueiro acrescido de juros. Naquela poca segurar o transporte martimo garantia o interesse econmico, por ser a principal atividade do comrcio. A primeira emisso de aplice ocorreu em 1347, em Gnova, objetivando garantir o transporte martimo e nele continham diversas clusulas que garantiam ou isentavam os seguradores de pagarem a indenizao. Desde ento o seguro garante o funcionamento da economia, aumentando as grandes navegaes e com o surgimento das teorias da probabilidade e estatstica impulsionou, ainda mais, a realizao dos contratos, visto que os valores puderam ser definidos de forma mais justa. No sculo XVI surgiram duas empresas especializadas neste tipo de contrato, as Tontinas, na Frana e Lloyds, e Londres. As Tontinas foi criada em 1653 por Lorenzo Tonti. A Lloyds foi criada em 1678 por Edward Lloyds, proprietrio de um bar que era

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ponto de encontro de navegantes, portanto os freqentadores se interessavam pelo seguro. A Lloyds tornou-se uma bolsa de seguros e opera at hoje. No sculo XVII o mercado de seguro aumentou e ganhou novos produtos e com a revoluo industrial, o seguro tornou-se obrigatrio nas atividades, devido aos avanos tecnolgicos e os altos valores das atividades. No Sculo XIX apareceu o primeiro seguro social, na Alemanha, em 1880, objetivando garantir os imprevistos da vida nos setores: acidentes de trabalho, enfermidades, velhice e morte. No Brasil a implantao do seguro ocorreu em 1808, com a vinda da famlia real e abertura dos portos. A primeira seguradora, a Companhia de Seguros Boa-F, estabelecida na Bahia, tinha como objetivo operar seguros martimos. O contrato era regulado pelas leis portuguesas e somente em 1850, com o Cdigo Comercial, foi regulado pelas normas brasileiras. Portanto, o Cdigo Comercial foi fundamental para o desenvolvimento do seguro, surgindo diversas seguradoras, que no apenas operavam com seguros martimos, mas tambm terrestre. Inicialmente o seguro de vida era proibido pelo Cdigo Comercial, mas foi autorizado em 1855. Neste ano foi fundada a Companhia de Seguros Tranquilidade, no Rio de Janeiro, sendo a primeira a comercializar seguro de vida no pas. Com o surgimento de outras modalidades de seguros, as empresas estrangeiras comearam a operar no mercado nacional em 1862, quando instalaram as primeiras sucursais, sendo que o lucro obtido no pas era enviado as matrizes no exterior e por isso em 1895, a lei 294, disps que as companhias estrangeiras deveriam constituir reservas e aplicar os recursos no pas. Com a promulgao do Cdigo Civil, em 1916, houve a regulamentao de todos os demais seguros existentes, inclusive o seguro de vida. A Constituio de 1937 estabeleceu o Princpio da Nacionalizao do Seguro, e em consequncia foi promulgado o Decreto 5901 de 20 de junho de 1940, tornando-se o seguro obrigatrio para os comerciantes, industriais e concessionrios de servios pblicos, pessoas fsicas e jurdicas contra os riscos de incndios e transportes (ferrovirio, rodovirio, areo, martimo e fluvial). Em 1939, Getlio Vargas criou o Instituto de Resseguro do Brasil (IRB), estabelecendo o monoplio da atividade, visto que as operadoras foram obrigadas a ressegurar as responsabilidades no IRB, compartilhando o risco. Esta medida visou evitar

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que os valores obtidos por estes contratos fossem remetidos s matrizes das empresas estrangeiras, sendo obrigadas a se organizar com empresas nacionais, aplicando as reservas no Brasil. Em 1966 foi criada a Superintendncia de Seguros Privados (SUSEP), em substituio ao Departamento Nacional de Seguros Privados e Capitalizao, como rgo fiscalizador das operaes de seguro, existente at hoje, sendo estabelecido, ento, o Sistema Nacional de Seguros Privados. O seguro de assistncia mdica comeou a se desenvolver no Brasil nas dcadas de 40 e 50. As empresas pblicas investiram recursos prprios e de empregados para financiar a assistncia sade. As empresas automobilsticas, estrangeiras, foram as precursoras na implantao desta assistncia. Ento, em 1950 surgiram as primeiras organizaes de assistncia sade, destinadas aos funcionrios estaduais, pois no eram abrangidos pela Previdncia Social. Sendo que em 1960 os convnios mdicos, firmados entre empresas com funcionrios e empresas mdicas, mediante interveno da Previdncia Social, estimularam o processo desta contratao no pas. A Constituio Federal de 1988 estabeleceu ao Estado o dever de assegurar o direito sade, e com este fundamento foi criado o Sistema Nacional de Sade, garantindo a assistncia mdico-hospitalar e a assistncia sade pela iniciativa privada. Entretanto, a regulamentao da assistncia sade pelo setor privado apenas surgiu em 1998, com a Lei 9656, em 03 de junho de 1998, que determinou regras para o funcionamento da sade complementar. Tal norma institui diversas garantias aos usurios. A Agncia Nacional de Sade Suplementar (ANS) foi criada em 1999 e apesar da ANS ser criada apenas em 1999, j existia no pas um grande setor de planos de sade, que atuava sem qualquer regulamentao prpria, estava, ento, a sociedade a merc da manipulao das seguradoras e operadoras dos planos, e com sua criao coube a ANS organizar e regulamentar tais servios, fiscalizando a constituio, organizao e funcionamento das operadoras de plano de sade.

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CAPTULO II - CONCEITO O seguro pertence ao direito social e por isto possui interveno estatal e dirigismo contratual. No atual Cdigo Civil o seguro encontra-se regulado nos artigos 757 a 802, portanto, so 46 artigos sobre a matria. Entretanto alm das disposies no Cdigo Civil, determinadas como regras gerais, existem diversos normas regulamentadoras especficas para cada espcie de Seguros. O Cdigo Civil, em seu artigo 757, conceitua o contrato de seguro, sendo: Pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prmio, a garantir interesse legtimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos pretederminados. O Cdigo Civil de 1916 definia o contrato de seguro como aquele pelo qual uma das partes se obriga para com a outra, mediante a paga de um prmio, a indeniz-la do prejuzo resultante de riscos futuros, previstos no contrato. A conceituao do Cdigo de 1916 restringia a abrangncia do seguro, visto que com sua interpretao limitava a indenizao do prejuzo, vinculado ao ressarcimento do dano, no podia ser ampliada a aplicao do conceito de seguro, por isto o legislador do Cdigo de 2002 alterou a definio. Carlos Roberto Gonalves cita em seu livro a conceituao de seguro de Pedro Alvim:Seguro o contrato pelo qual o segurador, mediante o recebimento de um prmio, assume perante o segurado a obrigao de pagamento de uma prestao, se ocorrer o risco a que est exposto1.

O contrato de seguro visa garantir o segurado contra os riscos predeterminados na contratao. Alguns doutrinadores, como Slvio Venosa e Carlos Roberto Gonalves, definem que a essncia deste contrato a transferncia do risco de uma pessoa a outra, mas existe outra corrente doutrinria que entende que no h a transferncia de risco para o segurador, pois o risco de sofrer algum sinistro permanece com o segurado, e no com a seguradora. Caso ocorra o sinistro a seguradora dever ressarcir os prejuzos. O contrato de seguro gnero que possui espcies, de acordo com o bem que pretende segurar, mas todos com a mesma ideia de garantir o ressarcimento ou compensao de um dano, patrimonial ou pessoal. As espcies so:

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Gonalves, Carlos Roberto, 2009, p. 476

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Seguros pessoais e seguros de coisas materiais; Seguros de responsabilidade e os de obrigaes, sendo de responsabilidade os que abrange tanto a responsabilidade contratual ou extracontratual, tais como: proprietrios de automveis, navios, avies, barcos, elevadores, objetiva indenizar o prejudicado por todas as perdas materiais. Nos seguros de obrigaes, entende que o fato ocorre independente da vontade do segurado, tal como ocorre em empreitadas;

Seguro a prmio fixo e a seguro mtuo ou varivel. Os tipos de seguros mais comuns so:

Seguro de automvel; Seguro de bicicleta Seguro obrigatrio de automveis (DPVAT Seguro de vida Seguro incndio Seguro de roubo Seguro viagem Seguro sade

2.1 SEGURO-SADE E PLANOS DE ASSISTNCIA MDICA O seguro sade objetiva garantir o reembolso das despesas mdico-hospitalares, dentro dos limites estabelecidos na aplice, decorrentes de acidentes ou doenas, efetuados pelo segurado titular e respectivo dependentes. Arnaldo Rizzardo conceitua como:no campo da sade, visa a garantir o pagamento de determinadas importncias pela ocorrncia de fatos previstos como riscos. Trata-se do contrato pelo qual o segurador se obriga a cobrir a indenizao por riscos ligados sade e hospitalizao, mediante o pagamento do prmio em determinado nmero de prestaes. Fica a pessoa protegida dos riscos da enfermidade, pois contar com recursos para custear as acarretadas pelas doenas, com a garantia da assistncia mdico hospitalar.2

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RIZZARDO, Arnaldo, Contratos, Rio de Janeiro, Forense, 2009, p. 897.

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O seguro de assistncia mdica visa garantir o atendimento mdico e hospitalar em eventual risco de doena. Cumpre distinguir o seguro-sade do plano de assistncia. Seguro sade caracteriza pelo reembolso de despesas, sendo que neste caso o segurado escolhe o prestador de servio, mdico e hospital, cabendo a seguradora ressarcir as despesas. No plano de assistncia existe o credenciamento de mdicos e hospitais, sendo que o segurado dever escolher o prestador entre os credenciados, e o plano pagar os servios diretamente ao prestador e no ao segurado. Esta modalidade conhecida como Convnios, assim as pessoas que firmam o contrato pagam parcelas mensais, para usufruir dos servios mdicos e hospitalares oferecidos. Existem trs modalidades de convnios, a saber: Os que possuem redes independentes de hospitais, mdicos e clnicas, nestes casos cabem aos segurados escolher obrigatoriamente entre os credeciados; Existem os convnios que possuem hospitais prprios e mdicos contratados pelo prprio convnio, sendo o segurando indicado para um determinado mdico ou hospital. E ainda, o seguro sade, conforme j exposto, nesta modalidade o prprio segurado escolhe o mdico e hospital, tendo sua despesa ressarcida, de acordo com o valor preestabelecido com a seguradora. Para melhor entender o contrato de assistncia mdica, importante conceituar as palavras usuamente usadas neste tipo de contratos: Sinistro: consiste no acontecimento do evento incerto e previsto no contrato; Prmio: o pagamento feito pelo segurado seguradora, devendo ser pago independente da necessidade de contraprestao do segurador, ou seja, do acontecimento do sinistro; Aplice: o instrumento contratual do seguro, podendo ser nominativa, a ordem e ao portador, sendo que as relativas ao seguro de vida no podem ser ao portador.

CAPTULO III - OBJETO

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O objeto de todo e qualquer contrato item de extrema importncia, vez que, alm de guardar em si a essncia do contrato, determina, em parte, a sua validade ou no, vez que, se ilcito, impossvel, ou indeterminvel o objeto, o contrato ser reputado invlido, nos termos do artigo 104, inciso II3, do Cdigo Civil. Carlos Roberto Gonalves4 divide o objeto do contrato em imediato e mediato, segundo ele, objeto imediato do negcio sempre uma conduta humana e se denomina prestao: dar, fazer ou no fazer. Objeto mediato so os bens ou prestaes sobre as quais incide a relao jurdica obrigacional. Assim, combinando a noo de objeto mediato e imediato, tem-se que o objeto de um contrato consiste naquilo que as Partes objetivam diretamente por meio de sua celebrao, ou seja, o resultado que as partes contratantes pretendem produzir por meio da composio de suas vontades, a funo que elas, partes, conferem ao contrato que celebram. Pois bem, com base neste entendimento, podemos afirmar que aquele que celebra um contrato de assistncia mdica na qualidade de parte assistida objetiva, por meio disso, ter acesso a uma rede credenciada de mdicos, hospitais, clnicas, e laboratrios aos quais possa recorrer na hiptese de vir a sofrer alguma enfermidade, ou, simplesmente, no intuito de prevenir eventuais doenas, garantindo sua qualidade de vida. J a outra parte do contrato de assistncia mdica, a operadora do plano de sade, objetiva, por meio do aludido contrato, oferecer parte assistida os servios a serem prestados pelos mdicos, hospitais, clnicas e laboratrios da rede credenciada mencionada acima, recebendo, como contraprestao, uma remunerao mensal a ser paga pelo assistido. Quando combinamos as pretenses diretas das partes contratantes, temos o objeto do contrato de assistncia mdica, objeto este que, segundo entendimento de Arnaldo Rizzardo5, consiste na prestao de servio de atendimento mdico mediante profissionais, hospitais, clnicas, e laboratrios previamente indicados, cujas despesas so pagas diretamente pela operadora do plano de sade, mediante remunerao mensal a cujo pagamento se obriga o assistido.

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Art. 104. A validade do negcio jurdico requer: I - agente capaz; II - objeto lcito, possvel, determinado ou determinvel; III - forma prescrita ou no defesa em lei. 4 GONALVES, Carlos Roberto, 2004, p.16. 5 RIZZARDO, Arnaldo, Contratos, Rio de Janeiro, Forense, 2009, p. 898.

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Ao celebrar esse tipo de contrato a pessoa assistida fica protegida dos riscos representados pelas enfermidades, vez que passa a contar com recursos para custear as despesas mdicas e hospitalares. H que se atentar, contudo, ao fato de que o objeto do contrato de assistncia mdica no se confunde com o objeto do contrato de seguro sade, este no envolve a idia de prestao de servio, mas sim tpica modalidade de contrato de seguro, sendo que, na lio de Plcido e Silva6, o seguro o contrato em virtude do qual um dos contratantes assume a obrigao de pagar ao outro, ou a quem este designar, uma indenizao, um capital, ou uma renda, no caso em que advenha o risco indicado e temido, obrigando-se o segurado, por sua vez, a lhe pagar o prmio, que se tenha estabelecido. O contrato de seguro sade uma modalidade de seguro pela qual o pagamento da indenizao pelo segurador est ligado ocorrncia de riscos relativos sade e hospitalizao, sendo que o segurado obriga-se ao pagamento do prmio em vrias prestaes mensais. O seguro-sade diferencia-se do contrato de assistncia mdica ao passo que, no primeiro, o segurado tem liberdade de escolha, ou seja, se pagar a remunerao regularmente, poder consultar-se com o mdico de sua preferncia, bem como internarse no hospital que entender mais adequado, sendo-lhe garantido, posteriormente, o direito de ser reembolsado pelo segurador. J no contrato de assistncia mdica, a operadora do plano de sade apresenta ao assistido uma rede de profissionais, hospitais, clnicas e laboratrios previamente credenciados, sendo que apenas quando o assistido se submeter aos servios prestados por tal rede que a operadora ter a obrigao de custear as despesas efetuadas por ele, o que feito diretamente pela operadora, no sendo verificada a operao de reembolso caracterstica do seguro sade. O objeto do contrato de seguro sade , pois, o pagamento, pela seguradora, de uma indenizao ao segurado quando da ocorrncia do risco, ou seja, o reembolso das despesas efetuadas pelo segurado com consultas e tratamentos mdicos, internaes e exames laboratoriais realizados em locais e com profissionais de sua preferncia, devendo o segurando, em contraprestao, pagar seguradora, o respectivo prmio.

CAPTULO IV CLASSIFICAO6

SILVA, Plcido e, p. 1268.

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4.1 QUANTO AOS EFEITOS Quanto aos efeitos, os contratos se dividem em unilaterais, bilaterais e plurilaterais, e, ainda, em gratuitos e onerosos. Dentro desta classificao, iremos nos ater apenas s condies de bilateralidade e onerosidade, nas quais se enquadra o contrato de assistncia mdica, conforme ser demonstrado a seguir. Diz-se bilateral o contrato que gera obrigaes recprocas para ambas as partes contratantes. Carlos Roberto Gonalves7, citando Karl Larenz, preceitua o quanto segue sobre a caracterstica da bilateralidade:Karl Larenz conceitua o contrato bilateral como aquele em que ambas as partes contraem obrigaes e ao menos alguns dos deveres recprocos de prestao esto vinculados entre si, de modo que a prestao de um representa de acordo com a vontade de ambas as partes, a contraprestao, a compensao pela outra. Para caracterizar a bilateralidade, no entanto, aduz, no necessrio que essas prestaes sejam equivalentes, segundo um critrio objetivo: basta que cada parte veja na prestao da outra uma compensao suficiente sua prpria prestao.

Considerando o conceito supra, podemos afirmar que o contrato de assistncia mdica tpico contrato bilateral, vez que gera obrigaes recprocas para ambas as partes, ou seja, a operadora do plano de sade obriga-se a garantir ao assistido e aos seus eventuais beneficirios acesso aos mdicos, clnicas, hospitais, e laboratrios da rede credenciada, e aos servios por eles prestados, pagando diretamente as despesas efetuadas pelo assistido, e este, por sua vez, obriga-se a pagar operadora do plano de sade uma contraprestao mensal. Tem-se, portanto, que a bilateralidade do contrato de assistncia mdica encontra-se consubstanciada na cobertura de determinados eventos relacionados sade do assistido e de seus beneficirios, e no pagamento, via remunerao mensal, por tal prestao de servio. 4.2 QUANTO S VANTANGES PATRIMONIAIS Quantos s vantagens patrimoniais que podem trazer s partes contratantes, os contratos podem ser gratuitos ou onerosos, sendo que nesta ltima condio que se enquadra o contrato de assistncia mdica, vez que ambos os contratantes obtm vantagens s quais corresponde um determinado sacrifcio. Ou seja, ao mesmo tempo em que a operadora do plano de sade suporta o sacrifcio representado pela obrigao de pagar as despesas efetuadas pelo assistido e

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GONALVES, Carlos Roberto, 2004, pp. 68 e 69.

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seus beneficirios junto rede credenciada, ela beneficia-se pela remunerao mensal que lhe paga pelo assistido. De outro lado, ao mesmo tempo em que o assistido suporta o nus relacionado obrigao de pagar operadora do plano de sade uma remunerao mensal, ele beneficia-se pelo acesso que garantido a ele e seus beneficirios aos servios prestados pelos mdicos, hospitais, clnicas, e laboratrios da rede credenciada. 4.3 QUANTO AOS RISCOS Uma vez caracterizado como contrato oneroso, o contrato de assistncia mdica passa, necessariamente, por uma segunda classificao, qual seja, aquela que divide os contratos onerosos em comutativos e aleatrios. Neste sentido, o contrato de assistncia mdica essencialmente aleatrio, ou seja, diversamente do que se verifica nos contratos comutativos, aqui, as prestaes s quais se obrigam as partes contratantes no tm seu contedo certo e determinado, vez que os ganhos e as perdas aos quais as partes se sujeitam neste tipo contratual dependem de eventos futuros e incertos. Na verdade, a aleatoriedade do contrato de assistncia mdica reside na prestao a que se obriga a operadora do plano de sade, que dever arcar com as despesas mdicas efetuadas pelo assistido e seus beneficirios junto aos integrantes da rede credenciada durante toda a vigncia do contrato, no podendo prever, contudo, quando da celebrao do contrato, que despesas sero estas, e qual o seu valor exato. J a prestao a que se obriga o assistido no traz qualquer lea, vez que, desde o momento da celebrao do contrato, o assistido sabe o valor da remunerao que dever pagar mensalmente operadora do plano de sade, da mesma forma como conhece as condies de reajuste deste valor ao longo da vigncia do contrato. No que concerne aleatoriedade do contrato de assistncia mdica, o Tribunal de Justia de So Paulo8 enfrentou o seguinte caso, que diz respeito possibilidade de reajuste do valor da remunerao mensal a ser paga pelo assistido em funo da modificao de sua faixa etria e, portanto, incremento dos riscos a que se sujeita a operadora do plano de sade:Portanto, pode se dizer que o contrato de prestao de servios mdicos, na forma de plano de sade, tem natureza aleatria, j que a prestadora8

Apelao 9100253-33.2006.8.26.0000, Desembargador Relator Erickson Gavazza Marques, rgo Julgador 5 Cmara de Direito Privado, Data do Julgamento 28/09/2011, Data do Registro 30/09/2011.

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do servio se compromete, mediante uma contraprestao pecuniria, a suportar riscos futuros e incertos. Dessa forma, h de se reconhecer que da natureza de tal contrato que a prestadora do servio, tanto para aceitar a contratao quanto para determinar o valor do prmio, proceda a uma anlise minuciosa dos riscos que eventualmente ter que suportar, sendo normal e aceitvel que qualquer alterao significativa do risco venha agravar proporcionalmente o valor do prmio, sob pena de se desequilibrar o sistema atuarial. Por sua vez, no se pode discutir o fato de que o avano da idade do indivduo constitui um dos principais fatores que alteram o risco no contrato de plano de sade, na medida em que a pessoa mais idosa tem uma probabilidade muito maior de enfrentar problemas que requeiram interveno mdica e hospitalar, razo pela qual, a princpio, no se pode taxar de abusiva a clusula contratual que prev o reajuste das prestaes em razo da alterao de faixa etria. Todavia, independentemente de ter sido o contrato firmado antes ou depois da Lei n 9.656/98, o certo que, em 1 de outubro de 2003, foi institudo pela Lei Federal n 10.741 o Estatuto do Idoso que, sendo destinado a regular os direitos assegurados s pessoas com idade igual ou superior a 60 anos, dispe, em seu artigo 15, 3, que: 3. vedada a discriminao do idoso nos planos de sade pela cobrana de valores diferenciados em razo da idade. Observe-se que tal norma de ordem pblica, sendo, pois, aplicvel aos contratos em curso, notadamente porque o contrato de plano de sade revela obrigao de trato sucessivo. Destarte, conquanto se reconhea a legalidade do reajuste da mensalidade em razo da alterao de faixa etria, no pode ele, por disposio legal expressa, ter incidncia quando o consumidor j conta com mais de sessenta anos de idade.

4.4 QUANTO AO MOMENTO DE SUA EXECUO Quanto ao momento em que devem ser cumpridos, os contratos dividem-se em de execuo imediata, diferida, ou continuada, sendo que nessa ltima classificao que se enquadra o contrato de assistncia mdica, ou seja, a classificao dos contratos que se cumprem por meio de atos reiterados. Assim, o contrato de assistncia mdica um contrato de execuo continuada, ou seja, destina-se a subsistir durante um perodo determinado de tempo ou at que uma das partes opte pela sua resciso, no se extinguindo com o simples cumprimento de uma ou outra obrigao. O fato de ser um contrato de execuo continuada faz com que o contrato de assistncia mdica possa ser resolvido com base na teoria da impreviso, ou seja, pelo fato de a prestao a que se obrigou uma das partes ter se tornado excessivamente onerosa em funo de fato incerto e extraordinrio. 4.5 QUANTO FORMAO No que tange a sua formao, o contrato de assistncia mdica tpico contrato de adeso, ou seja, todas as suas clusulas so elaboradas pela operadora do plano de

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sade, cabendo ao assistido aderir ao modelo de contrato previamente confeccionado, ou deixar de celebrar a avena. Arnaldo Rizzardo9 pontua a condio do contrato de assistncia mdica de contrato de adeso, e o faz lecionando o seguinte ensinamento:Na adesividade estava o cunho mais ntido do contrato, especialmente antes da Lei n 8.078, de 11.09.1990 e da Lei n 9.656. As clusulas j vinham prontas e uniformes na generalidade dos contratos, com uma grande quantidade de restries contra o segurado. E ainda assim continua, embora com reduo das limitaes dos direitos dos segurados. Alis, a natureza tcnico-operacional que envolve as operaes impe a elaborao de contratos atravs de formulrios uniformes, que reproduzem clusulas extradas de regulamentos e estatutos de entidades.

4.6 QUANTO FORMA Por fim, quanto forma da qual se revestem, os contratos podem ser solenes ou no solenes, e, ainda, reais ou consensuais, sendo que o contrato ora em estudo pode ser classificado, neste aspecto, como contrato solene e consensual. O contrato de assistncia mdica solene, pois depende da forma escrita para ser considerado vlido, e consensual, pois se aperfeioa pelo simples acordo de vontades entre as partes, independentemente da adoo de qualquer outra providncia.

CAPTULO V - REQUISITOS CAPTULO VI - ESPCIES CAPTULO VII - PARTES CAPTULO VIII DIREITOS E OBRIGAES DAS PARTES

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RIZZARDO, Arnaldo, Contratos, Rio de Janeiro, Forense, 2009, p. 899.

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CAPTULO IX RESCISO A forma de extino dos contratos de assistncia mdica deve observar obrigatoriamente a natureza de referido contrato, haja vista que, nesta espcie de negcio pode surgir relaes de carter civil ou de consumo. Com efeito, toda vez que o contrato realizado entre mdico e paciente possuir natureza civil (obrigao de meio), aplicar-se- as regras de extino dos contratos de prestao/locao de servio do Cdigo Civil, quais sejam:

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a) A morte de qualquer das partes; b) O escoamento do prazo; c) A concluso da obra/servio; d) A resciso contratual mediante aviso prvio; e) Destrato; f) Inadimplemento de qualquer das partes;

g) Impossibilidade, motivada por fora maior, de cumprir o avenado. Contudo, possuindo o contrato natureza consumerista, aproveita-se s hipteses acima elencadas, todas em favor do consumidor, principalmente no que concerne o campo coletivo, nos termos das Leis 8078/90 e 9656/98. A necessidade de se proteger o consumidor de plano coletivo extinto reclama a aplicao, por analogia, dos dispositivos legais que lhe conferem continuidade na fruio dos servios de sade a cargo da operadora. Para evitar que certos eventos, a exemplo do desligamento da empresa estipulante, coloquem em risco a continuidade e qualidade do atendimento sade dos usurios, o jurista tem que fazer opo pela construo da soluo jurdica mais justa. Ainda que o legislador brasileiro, ao regular os planos e seguros privados de assistncia sade, no tenha tratado da situao especfica da extino do plano por desligamento ou inadimplncia da empresa ou associao estipulante, os princpios e regras de proteo ao consumidor impem a continuidade da prestao dos servios a cargo da operadora, por meio de oferecimento de aplices individuais aos beneficirios titulares do plano extinto. O Conselho de Sade Suplementar - CONSU, rgo institudo pela Lei n. 9.656/98, para desempenhar as atribuies normativas da prestao do servios de sade suplementar - antes da criao da ANS (15)-, levou em considerao a importncia da manuteno da assistncia sade aos consumidores de planos coletivos e baixou resoluo estabelecendo como obrigao das operadoras a absoro do universo de consumidores oriundos de planos coletivos liquidados ou encerrados. De fato, a Resoluo n. 19 do CONSU, estabelece no seu art. 1 que:As operadoras de planos ou seguros de assistncia sade, que administram ou operam planos coletivos empresariais ou por adeso para empresas que concedem esse benefcio a seus empregados, ou exempregados, devero disponibilizar plano ou seguro de assistncia

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sade na modalidade individual ou familiar ao universo de beneficirios, no caso de cancelamento desse benefcio, sem necessidade de cumprimento de novos prazos de carncia.

O pargrafo segundo desse mesmo artigo estende a obrigao da operadora, quanto continuidade da prestao dos servios de assistncia sade, a todo o grupo familiar vinculado ao beneficirio titular. Como se v, se por qualquer motivo o plano coletivo vem a ser encerrado, aos beneficirios deve ser assegurada a opo pela continuidade da prestao dos servios em planos individuais, devendo o empregador (estipulante) informar aos seus empregados no prazo oportuno para que possam exercer essa opo (art. 2o. e pargrafo nico). A Resoluo n. 19 do Consu contm apenas um nico dispositivo que deve ser afastado, por ser contrrio s disposies e princpios da Lei 9.656/98 e do CDC. Trata-se do seu art. 3, que dispensa da obrigao da continuidade da prestao dos servios, em caso de cancelamento do contrato coletivo, as operadoras que no mantenham plano na modalidade individual ou familiar. Tal artigo incompatvel com o princpio da conservao do contrato de consumo de longa durao e representa uma vlvula de escape para operadoras, para fugirem s suas obrigaes de continuidade da prestao do servio de assistncia sade. Entendemos inclusive que a ANS deve negar autorizao para funcionamento de operadora que pretenda atuar no mercado somente oferecendo plano de contratao coletiva, justamente para evitar prejuzo para consumidores em caso de cancelamento do plano.

A jurisprudncia10 mais abalizada j vem reconhecendo que a operadora, em todo e qualquer caso em que ocorra o encerramento ou cancelamento do plano coletivo, por razes outras que no a falta de pagamento ou desistncia por parte dos beneficirios, est obrigada a dar continuidade prestao dos servios de assistncia sade, atravs de novos planos individuais. Expressiva dessa posio o aresto abaixo ementado:CIVIL E PROCESSUAL CIVIL - CONTRATO DE PLANO DE SADE - NOVA CONTRATAO - MERA CONTINUAO DO CONTRATO ORIGINALMENTE PACTUADO - APROVEITAMENTO DE CARNCIA DO PLANO ANTERIOR.

Quando h encerramento do plano de sade coletivo e esse vem a ser cancelado, tem o segurado o direito de optar pela continuao de cobertura de plano individual. As empresas que atuam no setor de planos de seguro e assistncia sade suplementar devem garantir ao consumidor, no caso de cancelamento de seguro de sade empresarial,

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TJDF, Ap. Cv. 2001.01.1.103462-7, 6a. Turma Cvel, rel. Des. Otavio Augusto, j. 08.11.04

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um plano de sade individual ou familiar e aproveitar o prazo de carncia j contado durante o plano de sade empresarial. Recurso improvido. Unnime. CAPTULO X RESPONSABILIDADE CIVIL 10.1. Pressupostos da responsabilidade civil Fixada o conhecimento elementar de que a responsabilidade civil baseia-se no fundamento de que aquele quem causa dano a outrem, impe-se o dever de o reparar. No Novo Cdigo Civil, o artigo 186 consagra tal princpio, ipsis literis: "Aquele que por ao ou omisso voluntria, negligncia, ou imprudncia, violar direito eu causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilcito." Na redao do texto da lei possvel identificar os elementos essenciais da responsabilidade civil, ou seja, seus pressupostos: a) Ao ou Omisso do Agente: O prejuzo causado deve ser produzido pela conduta humana. Dessa forma, a responsabilidade do agente pode resultar de ato prprio, de ato de terceiro que esteja sob a responsabilidade do agente, ou danos causados por coisas (animais) que estejam sob a guarda deste. O comportamento humano pode ser positivo ou negativo (omisso). A violao pode ser sob o ponto de vista contratual: descumprimento da obrigao prevista contratualmente; legal: conduta contrria ao mandamento legal; ou social: o comportamento no chega a infringir a lei, mas foge finalidade social a qual se destina, como nos atos praticados com abuso de direito. Para ilustrar o comportamento humano omissivo, que pode oferecer alguma dificuldade de visualizao, faz-se necessrio que se tenha presente o dever de praticar determinado fato e que do descumprimento deste dever advenha o dano (nexo de causalidade). Esse dever de agir pode decorrer da lei: dever de prestar socorro s vtimas de acidente; de conveno: pessoa que assume a guarda, vigilncia ou custdia de outra; ou da prpria criao de alguma situao de perigo: pois criado o perigo, surge a obrigao de quem o gerou de afast-lo. Como j observado, a responsabilidade civil decorre de ato prprio ou por ato de outrem, o qual o agente responsvel permanente ou temporrio. O maior interesse est na responsabilidade por ato de terceiro, porque permite estender a obrigao de reparar o dano pessoa diversa daquela que praticou a conduta danosa. Tal extenso, s se verifica com a presena de uma relao jurdica entre os dois agentes (o causador do dano e o responsvel) geradores do dever de fiscalizao, que quando violado permite que o

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subordinado pratique um comportamento culposo e ocasione, direta ou indiretamente, dano vtima. A responsabilidade civil com esse carter consiste no descuido do dever de vigilncia (culpa in vigilando) ou do dever de escolha (culpa in eligendo). Segundo o legislador de 1916, tal culpa presumida, ao cabendo vtima prov-la. No Cdigo Civil de 2002, a presuno de culpa desaparece, pois a teoria da culpa cede espao teoria do risco, na qual no se perquire a culpa do agente, recai a responsabilidade somente pela decorrncia do dano a terceiros. O legislador tratou como de responsabilidade objetiva, os casos de danos cometidos por atos de terceiros, conforme os artigos 932, 936, 937 e 938. A responsabilidade civil por ato de terceiro provia da disposio legal, e a jurisprudncia a aperfeioou, atendendo a segurana da vtima e visando proteg-la. Neste sentido, cita-se o artigo 933 do novo Cdigo: "As pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo antecedente, ainda que no haja culpa de sua parte, respondero pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos." O artigo antecedente mencionado refere-se aos pais responsveis pelos atos de seus filhos, aos patres responsveis pelos atos de seus empregados, os donos de hotis e hospedadas, pelos atos de seus hspedes. b) Culpa ou dolo do Agente: A culpa um elemento necessrio responsabilidade civil subjetiva. No basta para a caracterizao da responsabilidade o cometimento de um ato contrrio ao direito, sendo necessrio o elemento culpa. O conceito de culpa da definio de responsabilidade civil dada pelo Cdigo Civil de 1916 a chamada culpa latu senso. Porm, ela pode adotar a formastricto sensu ou dolo. O agente procede com dolo quando causa o dano deliberadamente, isto , quis o resultado. A culpa stricto sensu amolda-se ao critrio do homem mdio, quando esse no se ateve ao cuidado que lhe era exigido, seja pela falta de vigilncia ou pela escolha errada. Ainda, a culpa{stricto sensu) abarca os conceitos de impercia, imprudncia e negligncia. O dever de indenizar proveniente da culpa em sentido estrito impele o homem a conviver em sociedade de modo a respeitar aos outros seres e seus patrimnios, no bastando agir com conduta lcita, sendo preciso o comportamento cauteloso de no causar dano a outrem. A responsabilidade sendo vista sob o ponto de vista objetivo, a culpa deixa de ser fundamental para a sua caracterizao, pois admite a responsabilizao do agente infrator pelo simples prejuzo que trouxe vtima, sem perquirir seu elemento volitivo de culpa lato sensu.

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Tendo em vista estes parmetros, a teoria do risco elimina a idia de culpa do conceito de responsabilidade civil. E seguindo a tendncia determinada por algumas leis esparsas especializadas o novo Cdigo Civil no artigo 927, pargrafo nico impe que haver obrigao de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. Assim, a regra que a responsabilidade seja subjetiva, dependendo do elemento culpa, proveniente da vontade do agente causador do dano. Quando a lei determinar ou quando a atividade praticada pelo autor do dano apresentar riscos, a responsabilidade torna-se objetiva. Portanto, as determinaes legais especiais, citadas anteriormente, ganham o respaldo do novo Cdigo Civil. A questo da diferena entre a responsabilidade objetiva e subjetiva ser mais bem tratada em item apropriado. c) Nexo de Causalidade: A obrigao de reparao civil s surge quando h uma relao de causalidade entre a ao ou omisso do agente e o dano sofrido pela vtima. Torna-se obrigatrio que o dano seja decorrncia clara e explcita da atitude danificadora do ru A questo traz dificuldades quando no possvel identificar o elo de causalidade entre o ato de uma pessoa e o dano causado, principalmente quando h presena de vrios comportamentos, que de alguma forma, contriburam para a produo do resultado danoso. Tambm importante mencionar as excludentes de responsabilidade, como por exemplo, a culpa exclusiva da vtima, o fato de terceiro, o caso fortuito ou fora maior e clusula de no indenizar (correspondente responsabilidade civil contratual). So situaes em que no h obrigao de indenizar por parte do autor do ilcito, pois sua conduta, apesar de danosa no foi a causa direta do prejuzo sofrido pela vtima. d) Dano: O dano um elemento fundamental para a imposio da obrigao de indenizar, sem o prejuzo, um comportamento ilcito pode passar desapercebido pelo mundo jurdico. O principal argumento para tal afirmativa est na finalidade exclusiva da indenizao imposta ao autor da conduta ilcita: repara o dano sofrido. O elemento dano da responsabilidade civil serve igualmente para o conceito de responsabilidade objetiva como para a subjetiva, j que significa leso a qualquer direito, podendo ser material ou moral.

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Quanto responsabilidade penal, o dano no estritamente necessrio para gerla, pois o Direito Penal possui o conceito de tentativa, na qual o direito pode ser violado sem trazer prejuzo para a vtima. H que se salientar a viso de Teresa Ancona Lopes11 (1999, p.66), que entende o dano composto de dois elementos diferenciados: "1) elemento de fato - o prejuzo; 2) elemento de direito - as violao ao direito, ou seja, a leso jurdica. E preciso que haja um prejuzo decorrente de uma leso de um direito." Assim, deve-se observar no apenas a leso material ou moral causada vtima, mas tambm, seno mais importante, a leso jurdica deflagrada pela violao ao direito. 10.2. Responsabilidade civil objetiva e responsabilidade civil subjetiva cedio na doutrina e na jurisprudncia o entendimento de que a responsabilidade civil se trata de uma fonte obrigacional do direito, razo pela qual, o causador do dano responde a reparao pessoa ou aos bens da vtima. A grande discusso est em determinar o fundamento da responsabilidade civil: alguns defendem a doutrina subjetiva ou teoria da culpa, e outros, a doutrina objetiva, que abstrai a culpa, concebe a responsabilidade sem culpa e se concentra na teoria do risco. A teoria da responsabilidade subjetiva origina-se no Cdigo Napolenico, e foi inserto no Direito Civil brasileiro pelo artigo 159 do Cdigo de 1916. Para descobrir a pessoa do responsvel, a teoria manda buscar aquele cuja culpa causou o dano. Para tanto, preciso deixar claro que a responsabilidade subjetiva exige a figura do ato ilcito, o qual pode ser conceituado como procedimentos ou atividade em desconformidade com o ordenamento jurdico, violando uma proibio ou mandamento legal. A idia de dolo no importa muito para a caracterizao da doutrina da culpa, sendo o principal fundamento a conduta do agente, Nesse sentido, o magistrio do civilista Caio Mrio da Silva Pereira12 (1998, p.29):A essncia da responsabilidade subjetiva vai se assentar, fundamentalmente, na pesquisa ou indagao de como o comportamento contribui para o prejuzo sofrido pela vtima.

A principal exigncia da teoria subjetivista a conduta culposa do agente, ou apenas a sua culpa (culpa propriamente dita ou dolo), ficando a reparao do dano ou a obrigao de indenizar, em segundo plano. Se a responsabilidade civil restasse acomodada sobre esta afirmativa, no haveria responsabilidade sem culpa, e a11 12

LOPES, Teresa Ancona, O Dano esttico: Responsabilidade Civil, 2 edio, So Paulo, p.29 PEREIRA, Caio Mrio da Silva, Responsabilidade Civil, 9 Edio, p, 29.

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responsabilidade seria uma exceo e a irresponsabilidade, a regra. No entanto, no o que ocorre, pois, a culpabilidade do agente est objetivada, como se ver adiante. Com o escopo de acabar com as injustias provocadas pelas regras rgidas da teoria da culpa, surgiu a teoria do risco. a teoria da responsabilidade objetiva, na qual o agente que, por intermdio de sua conduta, criou o risco de produzir dano, tem o dever de repar-lo, mesmo que no haja a presena de culpa. A caracterstica dominante da doutrina objetiva que o dano pode ser resultado de uma conduta eximida do elemento culpa. Portanto, o dever de indenizar no se vincula idia de comportamento culposo. No Direito Brasileiro, Jos de Aguiar Dias13 vm sendo considerado (1997, p.9) o maior defensor da doutrina subjetiva, e cita em sua obra uma frase de Josserand que resume por completo o verdadeiro princpio dessa viso sobre a responsabilidade civil:[...] abandonando essa noo de culpa, to desacreditada, para admitir que somos responsveis, no somente pelos atos culposos, mas pelos nossos atos, pura e simplesmente, desde que tenham causado um dano injusto, anormal.

De acordo afirmaes anteriores, o nosso Cdigo Civil adota o princpio fundamental da culpa, embora possua vrias disposies influenciadas pela doutrina objetiva. Embora esta viso predominantemente subjetiva do Cdigo anterior, havia doutrinadores que entendiam ser os artigos 1.519 e 1.520 claros exemplos da insero da doutrina objetiva no Cdigo Civil. Destarte, o Direito evolui no sentido de adotar em suas legislaes atuais, a teoria objetiva da responsabilidade, tais como o Cdigo de Defesa do Consumidor, que mesmo disfaradamente abraa a responsabilidade independente de prova de culpa do causador do dano. Portanto, o novo Cdigo somente vem confirmar uma tendncia presente h tempos no Direito brasileiro. 10.3. Responsabilidade Civil das Operadoras de Plano de Sade As operadoras de planos de sade esto sujeitas regulamentao imposta pela Lei 9656/1998, e encontram-se submetidas regulamentao e fiscalizao da Agncia Nacional de Sade Suplementar (ANS), conforme j explicado no presente estudo. Alm13

DIAS, Jos de Aguiar, Clusula de No-Indenizar, Da Responsabilidade Civil, 10 edio, Rio de Janeiro, Forense, p, 9.

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de se submeterem lei especial e s normas de fiscalizao administrativa expedidas pela agncia governamental, os contratos de planos de sade e a prestao de servios por eles estabelecidas, esto submetidos s normas insculpidas na Lei 8078/90. Cabe tambm notar que a obrigao assumida pelos planos de sade de resultado. Da relao contratual estabelecida entre a operadora e seus associados surge uma obrigao de resultado, devendo o servio possuir a qualidade e adequao imposta em face da nova doutrina contratual. Por esse contrato a operadora se obriga a prestar servios mdicos, reembolsar quantias, fornecer exames, alimentao, medicamentos e internaes, independente do consumidor se curar ou no. Com efeito, as empresas operadoras de planos de sade so solidariamente responsveis, juntamente com os mdicos e hospitais credenciados, que agem, em verdade, como seus verdadeiros prepostos. Apesar de haver discordncia sobre referido tema, fica estampado que ao disponibilizar uma relao de hospitais ou profissionais credenciados, possuem o dever de fornecer ao consumidor garantias mnimas de que tais entidades esto aptas para prestar um servio de boa qualidade, no podendo se eximir ao argumento de que a escolha foi feita pelo usurio de servios. Nesse sentido, o jurista Aldir Passarinho Junior14, enquanto ainda integrava o Tribunal da Cidadania, foi enftico ao proferir voto cuja ementa segue o teor:A prestadora de servios de plano de sade responsvel, concorrentemente, pela qualidade do atendimento oferecido ao contratante em hospitais e por mdicos por ela credenciados, aos quais aquele teve de obrigatoriamente se socorrer sob pena de no fruir da cobertura respectiva.

Divergindo desse posicionamento, alega Rui Stoco15 que as empresas de segurosade apenas reembolsam as despesas efetuadas por seus consorciados; logo, qualquer dano sofrido em face desse atendimento que lhe foi prestado pelo mdico ou hospital conveniado, no lhe diz respeito, porque no h como estabelecer um liame de causalidade entre a empresa que contratou o plano de sade e o dano sofrido pelo associado. 10.4. Responsabilidade Civil dos Hospitais Necessrio se faz abordar responsabilidade das clnicas e hospitais naquilo que diz respeito s falhas de pessoal e de equipamentos. Nesses casos, Nehemias Domingos de Melo16, ensina que:14 15

STJ, 4 t. REsp. 164.084/SP. STOCO, Rui,Tratado de Responsabilidade Civil, p,423 16 MELO, Nehemias Domingos, Dano Moral nas Relaes de Consumo, So Paulo, Saraiva, p, 199.

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[...] o hospital responde na condio de patro ou comitente, a teor do que dispe o Cdigo Civil (art.932,III); a culpa presumida, respondendo objetivamente o hospital pelo ato culposo de seu empregado ou preposto, incluindo-se o mdico empregado.

Portanto, cabe observar que, embora o assunto no seja pacificado de forma absoluta na doutrina, os hospitais por serem prestadores de servios, podem ser enquadrados nas regras estatudas no artigo 14 do Cdigo de Defesa do Consumidor. Nesse diapaso, o Min. Cezar Peluso17, nos ensina no brilhante julgamento de sua relatoria, realizado enquanto ainda era Desembargador do Tribunal de Justia de So Paulo, nos seguintes termos:Indenizao. Responsabilidade Civil. Relao de Consumo. Internao Hospitalar de criana com gastroenterocolite e desidatrao leve. Morte do Paciente. Hemorragia Aguda causada por puno venosa, durante manobra de ressuscitao. Falha do Servio. Responsabilidade Objetiva do Hospital. Verba devida. Ao Indenizatria julgada procedente. Improvimento ao Recurso da r. Aplicao do art. 14 do CDC. O hospital que no prova culpa de terceiro no evento, responde objetivamente, pela morte de criana que, internada com quadro de gastroenterocolite e desidratao leve, vem a falecer de hemorragia aguda, causada em puno venosa, durante manobra de ressuscitao.

No mesmo prisma, o Min. Ruy Rosado de Aguiar18, com a sabedoria que lhe peculiar, j sentenciou que:[...] a responsabilidade dos hospitais, como pessoa jurdica, objetiva, e at mesmo nas atividades de natureza mdica, segundo a corrente doutrinria majoritria no tema, no se incluindo na exceo feita pela lei quanto aos profissionais liberais (cuja culpa tem natureza subjetiva).

No obstante, com relao aos servios mdicos hospitalares, h de se fazer uma ressalva extremamente importante, qual seja, o hospital no responsabilizado pelo o dano causado ao paciente, quando utilizado apenas como instalao de atendimento por mdico no pertencente ao quadro de funcionrios do referido hospital. Vale frisar ainda que, quando o paciente sofreu danos em hospitais pblicos, tornase o Estado a pessoa legtima para responder por tais prejuzos de forma objetiva, na forma do 6, do artigo 37 da Carta da Repblica. 10.5. Responsabilidade civil do mdico Embora muito j se discutiu a respeito da responsabilidade civil do mdico e a sua natureza jurdica, se contratual ou extracontratual, modernamente no pairam mais

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TJSP. Apelao n. 112.588-4, j.4-9-2001 STJ, 4T, REsp 259.816/RJ.

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dvidas, sendo inquestionvel o carter contratual existente entre a relao mdicopaciente. Porm um pouco antes desse entendimento pacfico atual, o mdico tinha uma certa liberdade na forma de exercer suas funes, sendo qualquer dano decorrente dessas prticas s deveria ser reparado em casos de erro, configurando, desse modo, a responsabilidade do mdico como extracontratual ou aquiliana. Com o advento do Cdigo de Defesa do Consumidor que as atividades dos mdicos e demais profissionais liberais passaram a ser consideradas de natureza contratual, mesmo quando estabelecidas de forma tcita. Nessa esteira temos o ensinamento de Maria Eleonor de Souza Khn19:A responsabilidade civil do mdico de natureza contratual, porque ainda que sua atividade seja fruto do intelecto, um fato suscetvel de mensurar-se economicamente, no havendo, portanto, nenhum obstculo para que constitua o objeto de um contrato, ou seja, um ato jurdico e patrimonial celebrado entre vivos. Este contrato dever ser examinado, investigando-se a vontade dos agentes diante do caso concreto. Bueres admite, entretanto, que possa excees que justifiquem a aplicao de normas delituais.

Na maior parte dos casos a obrigao assumida pelo mdico com o paciente de meio, pois o mdico somente se responsabiliza atender a este com prudncia e cuidado e excepcionalmente est em jogo uma obrigao de resultado, lembrando que esta presuno existe nos casos dos anatomopatologistas ou patologistas clnicos, cujas anlises de laboratrio no apresentam riscos e dependem ainda de preciso tcnica, acrescentando ainda as intervenes cirrgicas de notria simplicidade e as cirurgias estticas. Com efeito, no entendimento de Pontes de Miranda20, a responsabilidade mdica contratual, mas o ato ilcito d origem a responsabilidade extranegocial. Entretanto, ocorrem casos em que a responsabilidade ser extracontratual. Assim, por exemplo, o mdico que socorre uma vtima de acidente, ou quando presta atendimento a um suicida, ou quando atende um incapaz em situao de emergncia, a responsabilidade nesses casos, ser extracontratual, visto que o mdico no teve como avenar com o paciente os termos em que se daria a sua interveno profissional ante a enfermidade que lhe era apresentada.

19

KHN, Maria Leonor de Souza, Responsabilidade Civil: Natureza Jurdica da Relao MdicoPaciente, So Paulo, Manole, p. 45. 20 MIRANDA, Pontes de, Tratado de Direito Privado, 2 edio, Rio de Janeiro, Borso, p. 439

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Deveras, pacfico o entendimento de que se reveste a responsabilidade do mdico em natureza contratual. Ocorre que ainda restam dvidas sobre a natureza relao contratual, no havendo um consenso doutrinrio quanto ao tipo de contrato que se estabelece entre mdico e paciente. Na prtica, parcela respeitvel da doutrina, sustenta que, independentemente da fixao da natureza desse contrato, assim como, do fato dos mdicos estarem elencados como profissionais liberais pelo Cdigo de Defesa ao Consumidor, caber ao paciente provar a inexecuo por parte do profissional, haja vista que este prprio diploma abriu uma exceo responsabilidade objetiva por ele acolhida. Porm permitido dizer que entre o mdico e o paciente surge o chamado contrato sui generis, que se mostra mais compatvel com as atividades desse profissional, haja vista ser ele aquele que no vem determinado pela lei, mas tem sido aceito como vlido diante da liceidade dos seus termos. Ainda o douto Jos Aguiar Dias, tambm defende a tese de que se trata de contrato sui generis, pois os servios mdicos estariam acima da simples locao de servios, devido sua feio especial, onde h um evidente desequilbrio entre as partes, de um lado o mdico e seus poderes, sua atividade de orientao, proteo e guarda e de outro lado o enfermo. Em sentido contrrio, Pontes de Miranda diz que o contrato do profissional mdico de locao de servios, locao de obra, ou menos freqentemente, de empreitada, admitindo ainda a gesto de negcios sem outorgas de poderes, nos casos em que atenda de emergncia um menor desacompanhado, doente que no fala ou no est em estado de discernimento. Na viso de Genival Veloso de Frana21, a responsabilidade mdica contratual, sendo que a natureza desse contrato de locao de servios, ainda que o atendimento seja gratuito. Essa tambm a opinio de Wanberdy Lacerda Panasco22, que v o mdico como locador, em se tratando de consultrio particular. Em relao ao hospital, o mdico ser o locador e o hospital o locatrio e em relao ao paciente, o hospital ser o locador e o paciente o locatrio.o autor ainda explica que "neste caso, o mdico em relao ao paciente, elabora um contrato sui generis, implicando ao locador (hospital) a responsabilidade dos danos apreciados".

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FRANA, Genival Veloso de, Direito Mdico, So Paulo, Fundo Editorial Byk Proliense, p,51. PANASCO, Wanberdy Lacerda, A Responsabilidade Civil, Penal e tica dos Mdicos, 2 edio, Rio de Janeiro, Forense, p. 51

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Constata-se no presente trabalho monogrfico que a segunda posio de que a natureza do contrato entre mdico e paciente de locao de servios constituda de mais acertos, tendo em vista que na obrigao de meios, o que se exige do devedor aplicao de meios e formas adequadas sem ter em vista o resultado. E a prpria atividade do devedor que se questiona e avalia, posto que o objeto do contrato. E esse tipo de obrigao que aparece em todos os contratos de prestao de servios entre profissionais liberais como advogados, publicitrios, mdicos, etc. 10.6 Obrigao de meio e de resultado Ao se falar de obrigao de meio e de resultado faz-se necessrio aluso ao estudo da Teoria Geral das Obrigaes, que estuda as relaes negociais entre partes, dando ateno especial ao aspecto do cumprimento por parte do devedor de uma prestao que se comprometeu perante o credor. As obrigaes so classificadas sob inmeros aspectos, dentre estes: quanto ao objeto (positiva ou negativa), quanto ao sujeito (indivisibilidade e solidariedade) e quanto aos elementos no fundamentais. Como o vocbulo sugere, a obrigao de resultado configura-se como aquela em que o ato a ser praticado dever atingir um fim previamente acordado, ou seja, atingir um resultado de utilidade para o paciente. Desse modo, caso o resultado no venha a ocorrer ou se tiver resultado diverso daquele determinado previamente, se verifica por parte do parte do mdico. Nesse tipo de obrigao o nus da prova caber o devedor. No que concerne s obrigaes de meio, estas se caracterizam pela obrigao em que o devedor se obriga a usar com prudncia e diligncia todos os meios necessrios e recursos disponveis para atingir um resultado, contudo, irrelevante a verificao do mesmo. O objeto de tais obrigaes a prpria atividade do devedor, ou seja quais foram os meios utilizados para os objetivos almejados, de forma que a inexecuo da obrigao se caracteriza pela omisso do devedor em tomar certas precaues sem, entretanto, ter por escopo um resultado final. em regra, a obrigao do mdico de meio, visto que o mdico ao tratar de um paciente a este no est imposta a cura do enfermo, mas os meios e formas utilizadas para que se chegue a um resultado satisfatrio. No se questiona o resultado, mas se o profissional agiu de forma diligente e prudente. O mdico s poder ser responsabilizado se deixou de empregar os meios e mtodos necessrios, prprios e corretos, incorrendo em culpa, seja por negligncia, por imprudncia ou impercia, lesando o paciente, de fundamental importncia ressaltar que dever ser provado que o dano realmente resultou de um ato mdico, para que dessa forma se extraia o nexo causai.

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Conforme afirmado, constitui-se, em regra a obrigao do mdico ser de meio. A regra comporta excees: h casos em que o mdico responder por uma obrigao de resultado. o que ocorre nas cirurgias plsticas, onde as partes convencionaram, previamente ao incio do tratamento e da interveno cirrgica, a obteno de um resultado pretendido. Dessa forma, verifica-se que, pelos prprios termos do acordo h uma obrigao de resultado. Nesses casos no h que se falar em comprovao de culpa, recair o dever de indenizar, com base na obrigao de resultado assumida e no cumprida. No Cdigo de Defesa do Consumidor em seu artigo 14, dispe sobre a responsabilidade por danos aos consumidores por defeitos relativos prestao de servios, consagrando assim a presena da responsabilidade objetiva que permeia esse diploma legal, tendo apenas uma exceo presente no 4 deste mesmo dispositivo, que dispe: "A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais ser apurada mediante a verificao de culpa". Consoante j afirmado, o contrato de locao de servio o tipo de contrato celebrado entre paciente e mdico, constituindo em obrigaes de meio ou de resultado. Trata-se de responsabilidade subjetiva quando se referir obrigao de meio, cabendo ao paciente a comprovao da culpa do profissional, e quando da obrigao de resultado, apesar de ainda se tratar de responsabilidade subjetiva como alguns defendem e outros ao contrrio dizem trata-se mesmo de responsabilidade objetiva, a responsabilizao do profissional mdico dar-se- pela presuno de culpa, havendo a inverso do nus da prova, com fulcro no Cdigo de Defesa do Consumidor. 10.7 Responsabilidade civil em cirurgia plstica Norteada pelos princpios da responsabilidade mdica, a responsabilidade civil do mdico, possui algumas singularidades principalmente no que tange ao mbito da natureza esttica sem finalidade teraputica. Hodiernamente no mais se discute se a cirurgia plstica esttica sem necessidade teraputica, constitui-se em mero capricho, uma cirurgia de luxo, ou ainda uma prtica ftil. A doutrina, tanto a nacional, como a aliengena, tem evoludo no sentido de pacificar o entendimento de que a cirurgia plstica para fins exclusivamente estticos seja considerada uma atividade normal, e uma especialidade mdica como qualquer outra. Ocorre que a cirurgia plstica puramente esttica dotada sim, de diversas particularidades, sendo a mais marcante, e outrora bastante discutida, a que versa sobre a

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natureza dessa obrigao, se possui os contornos de uma obrigao de meio ou de resultado. Por outro lado, cirurgia plstica pode ser considerada tambm como para fins teraputicos, onde nesse caso, ser exigido do cirurgio plstico apenas que ele utilize toda prudncia e diligncia necessria ao caso, empregando todos os meios disponveis, no podendo, porm, o paciente cobrar-lhe determinado resultado, haja vista que essa espcie de cirurgia plstica, constituir-se em uma obrigao de meio e no de resultado. Cite-se o exemplo do cirurgio que opera lbios leporinos, onde ele apenas empregar tcnica recomendvel para esse caso, no intuito de remediar, ou ainda tentar corrigir um defeito congnito, sem, contudo, assumir a obrigao por um resultado esteticamente perfeito. Contudo, alguns autores pertencentes a uma corrente minoritria consideram que esse tipo de cirurgia sem fins teraputicos, exclusivamente estticos como um procedimento fora da verdadeira medicina e ainda defendem o rtulo de prtica imoral, leviana, como observa-se das palavras de Genival Veloso de Frana23 :Cabe, portanto repetir mais uma vez a diferena entre a cirurgia reparadora, lcita e necessria, de valor indiscutvel e medico entre os direitos profissionais do mdico, e a cirurgia cosmetolgica, fora do mbito da verdadeira Medicina, e que tem por base interesses escusos de quem a procura, e objetivos nem sempre confessveis de quem realiza.

Isso posto, verifica-se que apesar da esmagadora doutrina entender a cirurgia plstica com fins exclusivamente estticos como sendo igual a qualquer outro especialidade mdica, o posicionamento adotado deve consistir em distinguir as duas modalidades de cirurgia de cirurgia plstica. Devendo o operador do Direito, na verdade no se ater a vertentes, mais sim ao caso concreto. 10.8. Dano No seria razovel falar em indenizao se no houver prejuzo, se no houver dano, j que este um dos pressupostos da responsabilidade civil, portanto sua ausncia leva, inexoravelmente, a inexistncia da obrigao de indenizar. Nesse sentido, Maria Helena Diniz24 leciona:No pode haver responsabilidade civil sem a existncia de um dano a um bem jurdico, sendo imprescindvel a prova real e completa dessa leso. Deveras, para que haja pagamento de indenizao23 24

FRANA, Genival Veloso de, Direito Mdico, So Paulo, Fundo Editorial Byk Proliense, p. 142. DINIZ, Maria Helena, Curso de Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil, 5 edio, So Paulo, Saraiva, p. 55-56.

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pleiteada necessrio comprovar a ocorrncia de um dano patrimonial ou moral, fundados no na ndole dos direitos subjetivos afetados, mas nos efeitos da leso jurdica.

Os danos so leses que atingem direto ou indiretamente a integridade fsica ou moral, um prejuzo ressarcvel experimentado pelo lesado, traduzindo-se, se patrimonial, pela diminuio patrimonial sofrida por algum em razo de ao deflagrada pelo agente, mas pode atingir elementos de cunho pecunirio e moral. Outros requisitos so imprescindveis para que ocorra o dever de indenizar, quais sejam, o dano deve ser suficiente para que ocorra uma desvalorizao ou uma leso de um bem jurdico patrimonial ou moral devendo ser danos reais causados pelo ato lesivo. Faz-se mister a certeza do dano, ou seja, o dano dever ser efetivo e real, pois dever evidenciar-se a sua ocorrncia diante dos acontecimentos, bem como a situao em que a pessoa se encontra e se o seu patrimnio foi realmente lesado. Como se analisou em linhas anteriores, deve haver causalidade entre a falta e o dano, pois que o mdico s responder pelo dano a que deu causa, assim se o dano no foi resultante do ato do profissional, no h que se cogitar a indenizao. Alm do mais a vtima ou os seus beneficirios dever ter legitimidade para pleitear a reparao, podendo seus dependentes reclamar alimentos necessrios para a sua sobrevivncia, se a vtima era a mantenedora da renda familiar. Pode-se falar em vtima direta e indireta. A primeira sofre a leso e a segunda refere-se aos familiares ou terceiros da vtima, assim, por exemplo, se a vtima vier a falecer, sero os familiares que devero requerer a indenizao. No obstante, preciso que no haja nem um caso de excludente de responsabilidade do mdico no qual ficar desobrigado a reparar por no ser o responsvel pelo dano ocorrido por fatos alheios sua vontade. Passa-se a partir dessas linhas a tratar do dano mdico, ou seja, aquele gerado por um ato comissivo ou omissivo de um profissional da rea mdica que esteja eivado de negligncia, imprudncia ou impercia, experimentado pelo paciente. Para que ocorra a responsabilidade um dano ao paciente deve existir, de qualquer tipo ou espcie: leso a um direto ( vida, integridade fsica, sade), leso de um interesse legtimo, danos patrimoniais ou morais. Portanto o dano pode atingir o patrimnio tanto fsico, quanto material e, ainda moral do paciente. O dano mdico atinge, de uma maneira geral a integridade fsica do ofendido, porque a atividade mdica feita, em regra no corpo do paciente. nesse caso que ocorrem as mais variveis formas de indenizao,

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no interessando se a leso foi total ou parcial. O certo que se o paciente se sentir lesado, dever pleitear a reparao. Quando o dano atinge o patrimnio propriamente dito do lesado, estes so denominados materiais. Estes ocorrem na maioria das vezes por conseqncia de dano fsico, visto que este impossibilita a vtima de exercer suas atividades laborais, portanto, atingindo o patrimnio. Existem, ainda, os danos morais, onde, nessa classe, para a maioria dos doutrinadores esto inseridos os danos estticos, ora preocupao do presente trabalho. Aqui se observa um prejuzo no no exterior do ser humano, mas no interior. Existe um constrangimento, o mal-estar do paciente, a sensao de no aceitao social, traumas, como, por exemplo, a amputao do membro inferior de uma bailarina decorrente de uma cirurgia desastrada.

10.9. Dano moral Partindo-se do geral para o particular, do gnero para a espcie, estudar-se- o dano moral previamente, para se chegar no dano esttico, pois que seguir esta monografia, a torrencial doutrina, que considera o dano esttico como um tipo de dano moral. O Cdigo Civil de 2002, no artigo 186 e a Constituio Federal no artigo 5, V e X, prevem a reparao do dano moral. Estes dispositivos asseguram indenizao por dano moral e consideram inviolveis a intimidade, a vida, a honra e a imagem do indivduo, cabendo indenizao moral caso ocorra violao de tais direitos. Ressalta-se que este rol meramente exemplificativo, podendo a legislao ordinria acrescentar no que for necessrio. bem verdade que o patrimnio das pessoas, seja de quem for, merece respeito, no deve ser lesado impunemente. Desse mesmo modo, e at com maior importncia, deve-se agir sem lesar a honra, os sentimentos de um ser humano. Portanto, quando algum lesa a honra de outrem, estar provocando um dano moral. O jurista Antonio Chaves25, em sua obra Tratado de Responsabilidade Civil, usa um comentrio de que mostra que poder ocorrer dano moral a um cidado, dizendo o seguinte:[...] prejuzo no no exterior do ser humano, mas no interior. Existe um constrangimento, o mal-estar do paciente, a sensao de no aceitao social, traumas, como, por exemplo, a amputao do25

CHAVES, Antnio, Tratado de Direito Civil, v. II, So Paulo, Saraiva, p. 605

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membro inferior de uma bailarina decorrente de uma cirurgia desastrada.

Inseparvel do conceito de personalidade humana, a sua origem assenta na natural reao que opomos contra a ofensa, seja que magoe o corpo, modifique a beleza, perturbe a paz, seja que lese a honra, obscurea a estima, comprometa a felicidade. o conceito da personalidade com suas necessidades, com os seus direitos, que mostra o fundamento do prejuzo moral: mais o conceito da personalidade, se tenha elevado, mais delicado e extenso torna-se o conceito de dano em geral, mais perfeito e humano o modo de ressarcilo: vingana e talio de outrora, tornaram-se compensaes e indenizaes pecunirias por obra da civilizao. Percebe-se que o autor ao falar do dano moral faz ligao com a personalidade da pessoa. na personalidade que esto os sentimentos, a honra, a dignidade da pessoa, e o dano moral ocorre quando esses quesitos so lesados, infringidos. O cerne da questo do dano moral saber at que ponto a vtima foi lesada ou at mesmo se aconteceu esse dano efetivamente. Porm, se estudar isso adiante, pois para se chegar a esse ponto interessante, deve-se compreender o dano moral. Dano moral aquele que no atinge o patrimnio fsico ou moral da vtima, e sim, o ntimo da vtima, o seu eu, constituindo-se em uma leso a um bem que no tem valor pecunirio. Ele caracterizado pela dor psicolgica sofrida pela vtima. No caso do dano esttico no s a dor do dano fsico, mas a dor do dano moral, por estar se sentindo deformado diante dos padres do fsico impostos pela sociedade. Nesse sentido, Carlos Alberto Gonalves26, em sua obra Comentrios ao Cdigo Civil nos d o seguinte conceito:Dano moral o que atinge o ofendido como pessoa, no lesando o seu patrimnio. leso de bem que integra o direito da personalidade, como a honra, o bom nome etc. como se interfere dos Art. 1, III e 5a, V e X, da Constituio Federal, e que acarreta ao lesado dois sofrimentos tristeza, vexame e humilhao.

Por fim, pode-se resumir o conceito de dano moral, com o ensinamento de Maria Helena Diniz27, em sua obra Curso de Direito Civil Brasileiro que diz que:[...] dano moral vem a ser a leso de interesses no patrimoniais de pessoas fsica ou jurdica, provocado pelo fato lesivo.

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GONALVES, Carlos Roberto, Comentrios ao Cdigo Civil, Parte Especial, Do Direito das Obrigaes, v. 11, So Paulo, Editora Saraiva, p. 339 27 DINIZ, Maria Helena, Curso de Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil, 5 edio, So Paulo, Saraiva, p. 80.

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Apesar de vrios conceitos dados por diversos autores, a dificuldade se dizer quanto o dano moral est configurado, ou seja, que qual angstia, qual humilhao ser suficiente para acarretar o dano moral. Assim, no ser qualquer dor que configurar o dano moral, esse dever estar intimamente ligado vtima pelo dano sofrido. Pode-se dizer o dano moral est entrelaado na dor, no vexame, na humilhao. Desse modo se for de alta gravidade o dano nem mesmo precisa ser provado, ele de per si, evidencia-se. Entende-se melhor utilizando-se um exemplo que mostra claramente que o dano moral aquele dor que sente a vtima, ou um ente intimamente ligado a ela, logo, os lesados indiretos e a vtima podero reclamar a reparao pecuniria em razo de dano moral. Encontra-se, pois, diante de dois questionamentos, quais sejam, quem so os legitimados para pleitear o dano moral e como ser configurado e provado o dano moral. A respeito do primeiro questionamento so legitimados para pleitear ao de indenizao por danos morais o ofendido, o cnjuge, o companheiro, membros da famlia, noivos e at scios. De incio, citou-se que os companheiros, noivos, os scios podero pleitear ao de indenizao por dano moral. Pois bem, aps inmeras discusses doutrinrias, hoje j aceitar essas aes desde que tenham ralaes de intimidade, relao negociai que em virtude do fato gerou dano moral, e admite-se ainda empregados e empregadores. Assim, desde que, o dano cause comoo, embora essa perturbao no possa ser expressa, visto que existe a perturbao anmica, que ocorre quando a pessoa se sente lesada, mas no consegue expressar como. Por exemplo, atravs das lgrimas ou sentir essa dor espiritualmente. Portanto, no h distino de pessoas para pleitear a ao por danos morais, sejam pessoas naturais, que j nascem ou que ainda vo nascer, capazes (incapazes devendo ser representados), pois o mdico causador do dano no poder ficar impune por dano causado ao seu paciente. Qualquer pessoa poder sofrer um dano moral, independentemente ser pobre ou rico, se mais culto ou analfabeto, todos possuem os bens caracterizados da chamada personalidade. Assim todos so portadores de dignidade humana. O dano moral uma reao do psicolgico do ser humano, quando o lesado sofre dor, vexame e humilhao nessa dignidade.

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A gravidade do dano h de medir-se por um padro objetivo (conquanto a apreciao deva ter em linha de conta a circunstncia de cada casa); e no luz de fatores subjetivos (de uma sensibilidade particularmente embotada ou especialmente requintada). Por outra lada, a gravidade apreciar-se- em funo da tutela do direito o dano deve ser de tal modo grave que justifique a concesso de uma satisfao de ordem pecuniria ao lesado. Srgio Cavaliere Filho28 ensina e exemplifica a respeito, em seu programa de Responsabilidade Civil, da seguinte maneira:O dano moral existe in re ipsa; deriva inexoravelmente do prprio falo ofensivo, de tal modo que provada a ofensa, ipso facto, est demonstrado o dano moral guisa de uma presuno natural, uma presuno hominis ou Tctil, que ocorre ds regras de experincia comum. Assim por exemplo, provocada perda de um filho, do cnjuge ou outro entre querido, no h que se exigir a prova do sofrimento, porque isso decorre do prprio fato de acordo com as regras de experincia comum.

Portanto, o dano moral independe de uma prova tcnica a ser produzida por um psiclogo ou um psiquiatra. Entretanto, o Tribunal da Justia de So Paulo foi contrrio em uma de suas decises, admitindo prova pericial para verificar se houve ou no abalo emocional. Mas o que prevalece a regra geral de que o dano moral a ser indenizado, no precisa ser provado por meios tcnicos, por exemplo, uma me leva seu filho para consulta de rotina e o mdico por falta de observao s regras necessrias, lhe receita um remdio que causa a morte do paciente, no tem que se provar o dano moral da me, visto que este de fcil percepo, pois uma me que perde um filho de modo inesperado e por irresponsabilidade de outrem sofre um abalo psquico evidente. Em resumo, conclui-se que o dano moral j faz parte do cotidiano forense e no caso das indenizaes por erro mdico, que em sua grande maioria, lesam no s o fisco do paciente mais tambm o seu psiquismo, a situao no diferente. 10.10. Dano esttico Acerca da base legal do dano esttico, pacfico o entendimento de sua existncia no mundo jurdico, independentemente do tratamento legal especfico ou genrico. Assim no tocante ao dano esttico, mister se faz entender que o dano esttico uma modalidade de dano, ou seja, uma categoria ao lado do dano moral e do dano material. Aps vrias discusses doutrinrias, atualmente verifica-se que o dano esttico est compreendido no dano moral. Desse modo, admiti-se a cumulao do dano28

CAVALIERI FILHO, Srgio, Programa de Responsabilidade Civil, 4 edio, So Paulo, Malheiros, p.102

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patrimonial com o dano esttico com carter de dano moral. J cumulao de dano moral com dano esttico tem controvrsias. Com efeito, o dano esttico sempre acarreta o dano moral que gera desgosto. constrangimento, sofrimento vtima. Mas tambm, poder ocorrer dano esttico com reflexos nos danos materiais, como, por exemplo, uma atriz que foi lesada por um mdico sofrendo um dano esttico que a impossibilitou de trabalhar diminuindo assim seu patrimnio. Em resumo o dano esttico sempre um dano moral e, na maioria das vezes, concomitantemente, dano material, mas se dele somente advierem prejuzos pela ocorrncia pode-se, quando muito falar em ofensa passageira esttica pessoal ou em dano esttico transitrio, pois, para ns, para que exista tal tipo de leso necessrio, pelo menos, a existncia. O dano esttico, a priori ligado s deformidades fsicas que provocam aleijo e repugnncia, passou gradativamente a abranger tambm, casos de marcas, deformidades e defeitos, ainda que mnimos, mas que possam causar a vtima desgosto ou complexo de inferioridade. Segundo Maria Helena Diniz29, o dano esttico configura-se como:Toda alterao morfolgica do indivduo que, alm do aleijo, abrange as deformidades ou deformaes, marcas e defeitos, ainda que mnimos, e que impliquem sob qualquer aspecto um afeamento da vtima, consistindo numa simples leso desgostante ou num permanente ou motivo de exposio ao ridculo ou de complexo de inferioridade, exercendo ou no influncia sobre sua capacidade laborativa.

Verifica-se que o dano esttico compreende no s a aparncia da pessoa, o defeito fsico a ser percebido no prprio corpo, mas nos seus movimentos que comprometem a dinmica do ofendido, como por exemplo, um mdico ao proceder tratamento em seu paciente, administra remdios e submete-o a interveno cirrgica e por um erro compromete a fala do paciente. Nota-se que o dano esttico qualquer alterao que cause constrangimento ao lesado, que comprometa a normalidade de aceitao no meio social, tendo em vista que se vive numa sociedade que supervaloriza a beleza, a boa aparncia e a harmonia dos traos. O dano esttico, assim como moral, considerado uma ofensa a direito de personalidade, porque atinge a integridade fsica e moral. Trata-se, portanto, de direito personalssimo, segundo o qual apenas a vtima que foi atingida pela leso parte legtima29

DINIZ, Maria Helena, Curso de Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil, 5 Edio, So Paulo, Saraiva, p. 73

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para pleitear a indenizao e no se admite por parte do lesado a renncia antecipada a esse direito de ao, sendo cabvel apenas o seu no exerccio em caso de dano esttica. Muito inexpressiva a corrente que defende o dano por ricochete onde terceiros prejudicados, com quem a vtima do dano esttico convivia mais podem pleitear reparao. Essa possibilidade mais bem vista quando do dano resultar morte. Aps iniciais esclarecimentos, passa-se a enfocar quais as diretrizes adotadas para dimensionar o dano esttico, torna-se imperioso fazer-se, portanto, referncia dogmtica geral referente ao dano moral, pois as avaliaes seguem a mesma lgica, com algumas singularidades. Com relativa fora no passado havia um entendimento de que o dano extrapatrimonial no era passvel de indenizao, ante a imoralidade que seria o pagamento em dinheiro para aplacar a dor. Essa orientao encontra-se, definitivamente superada, mormente com o advento da Constituio Federal de 1988 que estatui, no ponto mais alto da estrutura jurdica ptria, a possibilidade de indenizao do dano moral. A inexistncia de critrios objetivos de avaliao constitui um bice para compensao do dano moral, posto que a dor moral no pode ser medida dentro de linhas matemticas. pblico e notrio, que impossvel valorar-se pecuniariamente a tristeza, a angstia, a vergonha etc, no dano esttico, o problema ganha propores maiores, porque se tem ainda, a dificuldade em mensurar, por exemplo, oquantum de uma cicatriz ou perda de um membro. O que talvez possa mitigar referida preocupao que, nem mesmo, a adequao do dano patrimonial sua reparao pode ser medida com transferidor, havendo, tambm nesse caso, empecilhos em chegar-se a essa equivalncia, mormente no que tange aos lucros cessantes. Diante da ausncia de critrios objetivos de avaliao do dano reclamados, pode-se dizer ento, que ao julgador lhe foi conferido o poder de arbitrar o valor da compensao do dano esttico pautado no princpio da razoabilidade que destingue os seres humanos dos demais seres vivos. Para a devida quantificao do dano esttico quais seriam os parmetros? No demasiado dizer, que se tem que recorrer em alguns momentos, dogmtica geral dos danos estranhos rbita patrimonial, sem, contudo, afastar-se da questo esttica. Primeiramente, necessrio aferir a gravidade objetiva do dano, isto . determinar, no corpo do ofendido o alcance da leso. Assim com o escopo de ilustrar, as cicatrizes de um rosto, cicatrizes nas costas, deformaes nos membros, perda dos membros,

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modificao da voz. Nessa anlise ser possvel vislumbrar diferenas gradativas de danos. A perda de um brao ser sempre maior que a perda de um dedo. Em um segundo momento, imperioso analisar o ofendido dentro das circunstncias que o particulariza, como sexo, idade, profisso, beleza, posio social e poltica. Adiante, importar a culpabilidade do mdico, em que deve haver uma indagao escrupulosa do grau de impercia, negligncia ou imprudncia do ato mdico. Outrossim, dever ser considerada a situao econmica do mdico responsvel pela compensao do dano, bem como seus antecedentes de cunho profissional. Com efeito, so premissas extradas do campo doutrinrio e jurisprudencial que por este motivo, no vinculam a autoridade judiciria na avaliao do dano esttico, como em nem um outro. No obstante, com as anlises feitas em linhas anteriores, a avaliao fica menos obstaculizada e o julgador passa a ter em mos os parmetros to reclamados podendo com maior segurana, passar para etapa seguinte que a da quantificao pecuniria do dano esttico. Nesse ltimo passo que com muito mais acuidade o magistrado ter que se utilizar o arbtrio mediante ao legislador silente quanto aos limites indenizatrios. Porm, de suma importncia frisar, que no poder deixar de lado os princpios da razoabilidade e da eqidade. Cabe-lhe, sobretudo, agir com bom senso, com escopode sua qualificao de magistrado no seja apenas uma retrica. Portanto, a materializao a compensao do dano esttico dever, o quanto possvel amenizar o sofrimento do ofendido e servir de preveno especial e geral, ou seja, fazer com que no apenas o prprio mdico causador do dano passe a agir com mais cautela e esmero em sua atividade, como tambm toda a classe mdica. Noutro giro devese repudiar as solues que procurem ridicularizar o profissional, bem como aquelas que o levem miserabilidade. No demasiado dizer que a cassao do diploma do mdico no pode ser obtido por essa via, havendo os caminhos judiciais e administrativos prprios, nos casos em que essa medida se faa necessria.

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CAPTULO XI ASPECTOS POLMICOS E JURISPRUDNCIA Aps termos abordado os conceitos tericos do contrato de assistncia sade, passaremos a destacar alguns dos pontos polmicos do assunto, juntamente com jurisprudncia recente a fim de tentarmos elucidar estas questes to recorrentes nos tribunais. Em primeiro lugar, apontamos como um tema polmico a obrigatoriedade ou no das seguradoras de planos de sade em atender as necessidades dos dependentes qumicos e se as clusulas que excluem tais dependentes qumicos so consideradas abusivas ou no. Neste sentido temos a jurisprudncia extremamente dividida. Vejamos:Clusula excludente de doenas ou leses decorrentes de uso agudo ouo crnico de substncias entorpecentes ou txicas, inclusive lcool Contratante que no tinha condies de prever e compreender o alcance de todas as limitaes e excluses Ausncia de um exame admissional ao plano de sade ausncia de m-f do segurado Recurso Provido. O alcoolismo se abate mesmo sobre pessoas que fazem uso moderado da bebida por causas diversas e uma delas a predisposio orgnica (causa interna), mas muitas delas so de origem externas (uma perda ou conflito familiar, perda de emprego, desiluso amorosa, etc), assim, a excluso contratual de cobertura abusiva, pois se as pessoas soubessem de antemo como se defender das doenas e ficar imunes a elas, no precisariam firmar contrato visando proteger a sade e pelo qual se paga valores considerveis. (Apelao n 196.036.4-5/00 TJ/SP Rel. Carlos de Souza D.O.E 17/08/05) A pessoa que procura a proteo de um plano de sade tem em mira a preservao de sua integridade fsica como um todo. Em princpio, a sade um bem indivisvel. No faz sentido lotear o corpo humano, seus

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aparelhos e sistemas, para proteger uns e outros no. (TJSP AC 265.646-2 Rel. Des. Franciulli Neto. D.O.E. 01.04.1997)

Agora vejamos o entendimento contrrio:EMENTA. Plano de sade - inexistncia de prova da ocorrncia de emergncia mdica - agregado dependente qumico - uso abusivo de lcool com cocana - clausulas contratuais com excluso de transporte e tratamento para esses casos; inexistncia de abusividade - os planos e seguros sade so contratados para no serem usados pois o instinto de preservao da sade e da vida faz o homem mdio zelar por esses dons; esse fator considervel, ao contrrio da busca das drogas pelos dependentes - sentena condenatria reformada. RELATRIO. A r. sentena de fi. 571, cujo relatrio fica adotado, julgou procedente a presente Ao Cominatria declarando abusiva as clusulas de excluso de cobertura para transporte e tratamento de dependentes qumicos e alteraes psiquitricas, condenando a r a reembolsar as despesas realizadas pela autora com o tratamento do filho. (TJSP Apelao n 327.420-4/6-00 Rel. Des. Silvio Marques Neto D.O.E 19/08/04)

Aps analisarmos os julgados acima podemos verificar que os tribunais no esto uniformizados no tocante a este tema. Sendo assim, entendemos, aps a anlise do contrato em questo, entendemos que necessria a anlise pontual de cada caso. Isso por que imprescindvel a existncia da boa-f e a veracidade de declaraes do segurado no momento da contratao do seguro. Contudo, tambm obrigao da seguradora avaliar o segurado previamente para que possa averiguar a existncia ou no de possveis informaes que no foram transmitidas pelo segurado. Estando todos os elementos presentes, acreditamos que vlida a clusula de excluso das doenas decorrentes de consumo de entorpecentes. Caso no exista algum dos elementos acima mencionados, a seguradora deve arcar com os custos do tratamento em questo. Passaremos a um novo tema polmico, o qual, pelo nosso entendimento, esta pacificado desde a edio da smula 302 do STJ, qual seja a nulidade da clusula contratual limitando o tempo de internao do segurado. A Smula em questo apresenta a seguinte redao:Smula 302 do STJ de 18/10/2004: abusiva a clusula contratual de plano de sade que limita no tempo a internao hospitalar do segurado.

Vejamos alguns julgados neste sentido:Ementa: PLANO DE SADE. INTERNAO. LIMITAO TEMPORAL. ABUSIVIDADE. Embora o contrato celebrado entre as partes preveja limitao no prazo de internao hospitalar, tal limitao considerada abusiva. Art. 115, do CC de 1916, ento vigente. Smula n 302 do STJ. Exames de tomografia computadorizada, no entanto, que se encontram excludos da cobertura contratual. Apelo provido em parte. (Apelao

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Cvel N 70018951566, Quinta Cmara Cvel, Tribunal de Justia do RS, Relator: Leo Lima, Julgado em 25/04/2007) Ementa: SEGURO. PLANO DE SADE EMPRESARIAL. AO DECLARATRIA DE NULIDADE DE CLUSULA LIMITATIVA DO TEMPO DE INTERNAO HOSPITALAR. ABUSIVIDADE FRENTE AO CDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. PRECEDENTES. Considerase abusiva, frente ao CDC, a clusula que limita o tempo de internao do segurado. Isto porque tal situao constitui uma flagrante quebra do princpio da eqidade, previsto no art. 51, IV, da Lei Protetiva, alm de que o tempo de internao risco do negcio. Precedentes desta Corte e do STJ. Apelo provido. (Apelao Cvel N 70010404192, Sexta Cmara Cvel, T