MultiplicadorPolComunitaria 2 edição

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Curso Nacional de Multiplicador de Polcia Comunitria

2 Edio

1Ministrio da Justia

PRESIDENTE DA REPBLICA Luiz Incio Lula da Silva MINISTRO DA JUSTIA Tarso Fernando Herz Genro SECRETRIO NACIONAL DE SEGURANA PBLICA Antnio Carlos Biscaia DIRETOR DO DEPARTAMENTO DE POLTICAS, PROGRAMAS E PROJETOS Cristiana Gross Villanova DIRETOR DO DEPARTAMENTO DE PESQUISA, ANLISE DA INFORMAO E DESENVOLVIMENTO DE PESSOAL EM SEGURANA PBLICA Ricardo Brisola Balestreri COORDENADOR GERAL DO DEPARTAMENTO DE POLTICAS, PROGRAMAS E PROJETOS Eraldo Marques Viegas TC PMDF COORDENADORA GERAL DE DESENVOLVIMENTO DE PESSOAL EM SEGURANA PBLICA Juliana Mrcia Barroso Elaborao: Alexandre Magno de Oliveira - Cap PMMG Carlos Henrique M. Gonalves Maj PMRJ Clia Regina Zappanolli - Adv-SP Crisitiano C. Guedes - SENASP Eraldo Marques Viegas SENASP Jari Luiz Dalbosco - Coronel PMSC Juliana Mrcia Barroso - SENASP Maria Jlia Belota Lopes Del PCAM Suamy Santana da Silva - TC - PMDF 2

Wilquerson Felizardo Santos - TC PMMT Colaborao: Bernadete M. P. Cordeiro Pedagoga Mrcio Simeone Henriques Prof. UFMG Matheus Couto Santana DPPP/ SENASP Miguel Librio C. Neto CEL PMSP Pehkx Jones G. da Silveira SENASP Vera Regina Muller SENASP Secretaria de Estado de Planejamento e Gesto (SEPLAG) do Estado de Minas Gerais

Informaes: Telefones: (61) 3429-9285/3339/3465 Fax: (61) 3429-9324 Correio Eletrnico; [email protected] Site: www.mj.gov.br/senasp

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MINISTRIO DA JUSTIA SECRETARIA NACIONAL DE SEGURANA PBLICA

Curso Nacional de Multiplicador de Polcia Comunitria

Braslia DF 2007

3Ministrio da Justia

COORDENAO EDITORIAL / REVISO DE TEXTO Secretario Nacional de Segurana Pblica CAPA : Matheus Couto Santana Tiragem: 2.000 exemplares

Permitida a reproduo total ou parcial desta publicao desde que citada a fonte

Curso Nacional de Polcia Comunitria/Grupo de Trabalho, Portaria SENASP n 014/2006 - Braslia DF: Secretaria Nacional de Segurana Pblica SENASP.2006. Total de paginas 502 p. 1.Direitos Humanos, 2. Estruturao dos Conselhos Comunitrios, 3.Gesto de Projetos, 4. Gesto pela Qualidade na Segurana Pblica, 5. Mobilizao Social, 6. Polcia Comunitria Comparada & Troca de Experincias de Polcia Comunitria, 7. Polcia Comunitria e Sociedade, 8. Relaes Interpessoais, Conflitos e as formas de Interveno, 9. Teoria e Pratica de Ensino, 10. Teorias Sobre Polcia Comunitria, 11.Resoluo Pacifica de Conflitos Mediao Aplicada Polcia Comunitria.

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Nota Segunda EdioO livro Curso Nacional de Multiplicador de Polcia Comunitria produto do Grupo de Trabalho, constitudo por profissionais estudiosos do tema representativos de todo o Brasil e coordenado pela SENASP/MJ. Tem a finalidade de ser aplicado na capacitao de profissionais da rea de segurana pblica, capacitando-os docncia em Cursos de Polcia Comunitria nos Estados e Municpios. Alcanado o sucesso da primeira edio que teve uma tiragem de 750 exemplares, da sua aplicao nas 12 edies de cursos de Multiplicador, realizadas nas cidades de Cuiab, Belm, Fortaleza e Rio de Janeiro, centros difusores de Polcia Comunitria, colhemos as importantes observaes e recomendaes dos corpos docentes e discentes sobre a obra. Nesta segunda edio revisada e ampliada, editamos os captulos de Direitos Humanos, Mediao e demais meios de resoluo pacfica de conflitos e a Polcia Comunitria, e teoria em prtica de ensino de maneira a melhorar e modernizar o texto, adaptando-o realidade do cotidiano dos agentes de segurana no Pas. Tais acrscimos em nada modificam a substncia do conjunto do livro, preservando toda doutrina construda pelo Grupo de Trabalho. O livro mantm sua densidade e vocao para ser aplicado na sua finalidade, qual seja, de preparar o multiplicador de Polcia Comunitria, servindo ainda como fonte permanente de consulta e subsdio para a capacitao dos promotores de Polcia Comunitria, considerando que alguns captulos deste livro fazem parte tambm do livro do Curso Nacional de Promotor de Polcia Comunitria, cuja tiragem foi de 29 mil livros que subsidiam cursos em todo o Brasil. Nesta segunda edio, em tiragem de 2 mil exemplares, aplica-se para alimentar os diversos centros de ensino dos rgos de segurana, robustecendo os acervos bibliogrficos das academias de Polcia Militar e Civil do Brasil bem como dos centros de formao das Guardas Municipais, aplicando-se tambm, formao de liderana comunitrias. Tal doutrina, aplicada capacitao dos agentes pblicos e lideres de comunidade, tem trazido bons resultados e quem se apropria dela declara que este o caminho para a gerao de segurana pblica com cidadania.

5Ministrio da Justia

Ns, SENASP/MJ, ficamos satisfeitos e orgulhosos com os resultados e aceitao dos trabalhos de Polcia Comunitria apresentados pelos Estados. Na condio de integrantes desse processo, por nossa vez, fomos sensveis aos diversos pedidos realizados pelas instituies de segurana pblica para o fornecimento de mais exemplares para propiciar mais acesso e difuso da doutrina e assim nasce esta segunda edio. Uma boa leitura e aprendizado a todos. ROBSON ROBIN DA SILVA Diretor do Departamento de Polticas Programas e Projetos SENASP/MJ

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Apresentao (1 edio)O presente Curso Nacional de Multiplicador de Polcia Comunitria (CNMPC) fruto do esforo concentrado fomentado pela Secretaria Nacional de Segurana Pblica SENASP/MJ, em parceria com todos os Estados membros, a partir das propostas do Grupo de Trabalho denominado MATRIZ CURRICULAR NACIONAL PARA POLCIA COMUNITRIA, nomeado pela Portaria SENASP N 14, de 26/04/06, cujo objetivo principal a capacitao de profissionais da rea de segurana pblica para o gerenciamento da segurana pblica orientado pela filosofia e estratgia organizacional de polcia comunitria, bem como a formao de multiplicadores (instrutores), para atuar na docncia da filosofia de polcia comunitria e na mobilizao social das lideranas comunitrias, visando garantir ao mximo a difuso dessa filosofia e estratgia organizacional no mbito das instituies integrantes do sistema de segurana pblica ou defesa social, em todos os Estados federados. Da o seu carter de matriz curricular nacional. Neste aspecto, pode-se consider-la como um marco doutrinrio fundado na expertise e nas boas prticas, que se aprimora e se conduz em direo a efetividade de uma poltica pblica de segurana cidad voltada aos espaos urbanos, onde efetivamente os conflitos interpessoais e a conseqente violncia da gerada tm recorrentemente levado a todos ns a uma busca permanente no aperfeioamento de aes desta envergadura. A Poltica de Polcia Comunitria, como espcie do gnero segurana e convivncia cidad, , portanto, uma filosofia e uma estratgia organizacional fundamentadas, principalmente, na parceria entre a populao e as instituies de segurana pblica e/ou defesa social. Baseiam-se na premissa de que tanto as instituies estatais, quanto populao local, devem trabalhar juntas para identificar, priorizar e resolver problemas que afetam a segurana pblica, tais como o crime, o medo do crime, a excluso e a desigualdade social que acentuam os problemas relativos criminalidade e dificultam o propsito de melhorar a qualidade de vida dos cidados. Eis porqu se leva em considerao conceitos diretamente ligados ao respeito dignidade humana dentre outros princpios constitucionais democrticos insculpidos na Constituio Cidad, marco legal e inspirador das aes levadas a efeito pela SENASP/MJ na induo de polticas pblicas de segurana e convivncia cidad.

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Nos ltimos 5 (cinco) anos, o Ministrio da Justia, por intermdio da SENASP, investiu vultosos recursos para implantao da polcia comunitria no Brasil. Atualmente, temos a estratgia de polcia comunitria implantada em praticamente todas as Unidades da Federao. No entanto, a falta de uma orientao doutrinria, clara, precisa e qualificada sobre a implantao e implementao deste tipo de ao fez com que, por detrs do nome polcia comunitria, surgisse um conjunto extenso e heterogneo de aes que muitas vezes no tm relao direta com as diretrizes ora apresentadas. Com isso, a partir do melhor delineamento do papel da polcia comunitria no mbito do Sistema nico de Segurana Pblica - SUSP, passamos a dar efetividade, em mais este ponto, ao Plano Nacional de Segurana Pblica, dentro da vertente estruturante FORMAO E VALORIZAO PROFISSIONAL, que estabelece no seu bojo a diretriz n 5 Adoo do policiamento comunitrio, como poltica de segurana pblica descentralizada e integrada, e a Lei n 10.201, de 14/02/01, que institui o Fundo Nacional de Segurana Pblica FNSP, que tambm estabelece no seu bojo o incentivo e o apoio qualificao de policiais civis e militares, bombeiros militares e guardas municipais, em programas de polcia comunitria. Nesta linha, e subsidiariamente consecuo dos objetivos dessa ao, tem-se a profcua parceria consolidada entre a SENASP/MJ e o Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento PNUD, por intermdio Projeto de Cooperao Tcnica Segurana Cidad, que busca recorrentemente induzir e ofertar os meios tcnicos e materiais, alm da colaborao conceitual, para a realizao dos cursos que sero levados a efeito em 2006, nas cidades de Fortaleza - CE, Cuiab MT, e Belm PA, como ponto de partida de aplicao da Matriz doutrinria nacional de Polcia Comunitria, que ora se apresenta. Neste ponto, urge destacar, ainda, a interface das aes com aquelas em desenvolvimento no bojo de um segundo Projeto de Cooperao Tcnica Medalha de Ouro - construindo Segurana Cidad, que mesmo concebido em quase sua integralidade para dar efetividade s polticas do Ministrio da Justias no mbito da segurana dos Jogos Pan-americanos de 2007, dever apoiar e induzir integralmente a realizao dos cursos que sero levados a efeito no Estado do Rio de Janeiro RJ, o que denota sobejamente a opo estratgica do Governo Federal e dos parceiros envolvidos em levar a efeito polticas pblicas de segurana e convivncia cidad de carter nacional de forma concatenada, articulada, primando pela concentrao e otimizao de esforos, de recursos humanos e materiais e a amplitude de resultados prticos positivos.8

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Dessa forma, a polcia comunitria associa e valoriza dois fatores, que freqentemente so dissociados e desvalorizados pelas instituies de segurana pblica e/ou defesa social tradicionais: a identificao e resoluo de problemas de defesa social com a participao da comunidade e a preveno criminal. Esses pilares gravitam em torno de um elemento central, que a parceria com a comunidade, que retroalimenta o processo de preveno da criminalidade, melhorando a qualidade de vida da prpria comunidade. Na referida parceria, a comunidade tem o direito de no apenas ser consultada, ou de atuar simplesmente como delatora, mas tambm participar das decises sobre as prioridades das instituies de segurana e defesa social, e as estratgias de gesto, como contrapartida da sua obrigao de colaborar com o trabalho da polcia no controle da criminalidade e na preservao da ordem pblica e defesa civil. o empoderamento da cidadania. As estratgias da filosofia de polcia comunitria tm um carter preferencialmente preventivo. Mas, alm disso, estas estratgias visam no apenas reduzir o nmero de crimes, mas tambm reduzir o dano da vtima e da comunidade e modificar os fatores ambientais e comportamentais. Tendo em vista que a proposta da polcia comunitria implica numa mudana de paradigma no modo de ser e estar a servio da comunidade e, conseqentemente, numa mudana de postura profissional perante o cidado, este tema tambm trabalhado dentro de uma abordagem transversal, estando presente em todas as prticas pedaggicas. A filosofia de polcia comunitria uma estratgia organizacional que deve ser conhecida e utilizada por todas as instituies que prestam servio de defesa social e/ou segurana pblica comunidade, que tem como objetivo promover uma cultura de paz social. Sendo assim, torna-se imprescindvel formao de multiplicadores nesta temtica. Diante deste contexto, o Curso Nacional de Multiplicador de Polcia Comunitria se justifica pela sua proposta inovadora de propiciar aos participantes um elenco de conhecimentos multidisciplinares capazes de desenvolver aptides cognitivas e comportamentais na adoo da temtica especfica de Polcia Comunitria e no gerenciamento da segurana pblica, capazes de estimular resultados desencadeadores de mudanas de performances do profissional da segurana pblica, tendo como conseqncia a evoluo para a filosofia e estratgia de polcia comunitria, por apresentar-se como a ideologia mais apropriada para nortear a conduta de uma polcia do sculo XXI, tendo como finalidade o Bem Comum, respeitadora das leis e dos direitos fundamentais da pessoa humana, garantidora do livre exerccio dos direitos e liberdades, proporcionando segurana aos cidados, posto que nas Democracias a liberdade um valor supremo, a par da segurana.9Ministrio da Justia

Sem sombra de dvida, um desafio a implementao de uma poltica pblica balizada na transmisso de um conhecimento fundado na Cultura da Paz e na Cidadania Ativa que venha agregar valor concreto e tcnico ao trabalho policial e vida da comunidade, possibilitando a transformao de padres arraigados que, de uma forma geral, naturalizam a violncia. Contudo, que no venha desvirtuar as caractersticas culturais fundamentais das comunidades e a natureza das atividades fim das polcias, imprescindveis garantia da segurana e demais prerrogativas constitucionais e legais que identificam a sua ao. Este curso tem por objetivo contribuir ampliao do instrumental de atuao das polcias perante as comunidades, a partir de uma nova postura destas e dos gestores e tcnicos envolvidos no tema, levando em conta os mais variados sistemas, contextos, culturas, cdigos, diversidades no seio social. Da a iniciativa de se publicar, j nesta edio, dez mil (10.000) exemplares da apostila do Curso de Multiplicador de Polcia Comunitria, para que seja apropriada no s pelos alunos diretamente matriculados, mas, tambm, pelas Academias dos rgos da segurana pblica, pelas entidades civis e pela comunidade.

Luiz Fernando Corra Secretrio Nacional de Segurana Pblica

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Grupo de trabalho designado pelo Secretrio Nacional de Segurana Pblica, atravs da Portaria N 14, de 26 de abril de 2006, como Membros do Grupo de Trabalho denominado: MATRIZ CURRICULAR NACIONAL PARA POLCIA COMUNITARIA, para o desenvolvimento dos trabalhos cujo objetivo apresentao de propostas das ementas das disciplinas do Currculo do Curso de Multiplicador de Polcia Comunitria proposto de SENASP. (em ordem alfabtica)

Alexandre Magno de Oliveira, Capito da Polcia Militar de Minas Gerais, Curso de Formao de Oficiais da PMMG em 1994, Curso de Licenciatura em Geogrfica pela UFMG (1993-1998), Mestre em Geografia pela UFMG (19982002), Assessor de Polcia Comunitria da PMMG (2003-2007), Professor das disciplinas Direito Ambiental (1997-2005) e Polcia Comunitria (2003-2007), possuidor dos cursos (principais): Multiplicador de Polcia Comunitria pela SENASP, em Belo Horizonte/MG (2002), Mobilizao Social para o Desenvolvimento do Policiamento Comunitrio pela Faculdade de Comunicao / UFMG, em Belo Horizonte/MG (2004), Curso Orientador do Programa Jovens Construindo a Cidadania - JCC pela PMESP, em So Paulo/SP (2005), Curso de Planejamento Estratgico pela Faculdade de Estudos Administrativos - FEAD, em Belo Horizonte/MG (2007) e Curso de Elaborao e Gesto de Projetos pela Faculdade Pitgoras, em Belo Horizonte/MG (2007).

Carlos Henrique Martins Gonalves, Major da Polcia Militar do Estado do Rio de Janeiro, Coordenador de Polcia Comunitria, Curso de Formao de Oficiais ESFO/RJ, Curso de Aperfeioamento de Oficiais ESPM/RJ, Curso de Pos Graduao em Polticas de Justia Criminal e Segurana Pblica pela Universidade Federal Fluminense UFF, Curso de Policia Judiciria CQPS/ RJ.

Eraldo Marques Viegas, Tenente Coronel da Polcia Militar do Distrito Federal, graduado em Tecnologia da Informao pela Faculdade Unio Educacional de Braslia - UNEB, Curso Superior de Licenciatura Curta em Matemtica pela Faculdade de Formao de Professores de Pernambuco - FFPP, Coordenador Geral do Departamento de Programas Polticas e Projetos da SENASP, Coordenador Nacional de Polcia Comunitria de 2004 a 2006, Coordenador Nacional dos Gabinetes de Gesto Integrada de Segurana Pblica.

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Jar Luiz Dalbosco, Coronel da Polcia Militar do Estado Maior de SC, Curso de Formao de Oficiais da PMSC, Curso em Geogrfica Licenciatura Plena pela UDESC,Curso de Geografia Bacharelado pela UDESC, MBA em Planejamento e Gesto Estratgica, Especializao pela Fundao Getulio Vargas FGV Rio de Janeiro, Coordenador Estadual de Policia Comunitria em SC, Presidente da Comisso Coordenadora dos Conselhos Comunitrios de Segurana CONSEG, no Estado de SC.

Juliana Marcia Barroso, Sociloga pela Universidade de Braslia (2000); Gerente de Projetos de Segurana Pblica (2001), integrante da Comisso Tcnica Segurana Cidad do MERCOSUL (2002), Coordenadora de Acompanhamento e Execuo do Plano Nacional de Segurana Pblica (2003-2004), Coordenadora Geral de Desenvolvimento de Pessoal em Segurana Pblica (2005) pela Secretaria Nacional de Segurana Pblica.

Maria Julia Belota Lopes, Graduada em Direito pela Universidade do Amazonas, Delegada de Policia Civil do Estado do Amazonas, Chefe do Gabinete da Polcia Civil AM,Chefe de Gabinete da Secretaria de Estado da Segurana Pblica-AM , Delegada Geral Adjunta da Polcia Civil- AM, Diretora de Planejamento da Polcia Civil- AM, Diretora da Academia de Polcia Civil-AM, Curso Nacional de Multiplicadores de Polcia Comunitria- RR, Curso de Atualizao de Polcias Integradas para o Sistema de Defesa Social, Curso Prtico de Processo Penal, Curso Desenvolvimento e Controle de Mente, Curso de Documentoscopia, Curso Anlise e Elaborao de Projetos Especficos, Curso de Administrao e Gerncia, Curso de Medicina Legal. Curso de Planejamento e Gesto Estratgica FGV-RJ.

Nlia Mauricio Pires Lopes Vieira, Delegada de Policia Civil do Distrito Federal, Subsecretaria de Programas Comunitrios da SSPDS, Graduada em Direito pela Universidade Federal de Juiz de Fora MG, Pos Graduao Curso Superior de Polcia, Universidade Catlica de Braslia, Curso Nacional de Polcia Comunitria realizada pelo MJ/SENASP, Curso de Extenso em Poltica de Polcia Interativa Comunitria pela Universidade Federal do Esprito Santo ES.

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Roberson Luiz Bondaruk, TC QOPM/PR, Comandante do Regimento de Polcia Montada Cel. Dulcdio da PMPR, Conselheiro do Conselho Permanente de Direitos Humanos do Paran, Curso de Formao de Oficiais da PMPR, Bacharel em Direito pela Pontifcia, Universidade Catlica do Paran, autor dos Livros Polcia Comunitria: polcia cidad para um povo cidado em parceria com o Maj. PM Csar A. de Souza edo livro O imprio das casa abandonadas: crianas e adolescentes de rua e a polcia.

Roberta Shirley Alves de Oliveira, Assistente Tcnica do Departamento de Pesquisa, Anlise da Informao e Desenvolvimento de Pessoal em Segurana Pblica, Coordenao de Ensino, Graduada em Pedagogia, Habilitao em Magistrio da Educao Infantil e Ensino Superior Sries Iniciais e Orientao Educacional pela Faculdade AD1, Curso de Formao de Tutores na modalidade de Ensino a Distancia pela Universidade Catlica de Braslia, Curso de Redao Oficial e Legistaltiva na Modalidade de Ensino a Distncia pela CEAD/UNB, Curso de Tutores na Modalidade a Distancia SENASP/MJ.

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SumrioPrefcio .................................................................................................. 05 Apresentao ......................................................................................... 07 DISCIPLINA I Direitos Humanos ........................................................ Apresentao ........................................................................................... Parte I Conceitos e Caractersticas ................................................... 1. Direitos Humanos: Conceito .............................................................. 2. Direitos Humanos: Caractersticas .................................................... Parte II Relao Direitos Humanos e o Estado ................................ 3. Direitos Humanos: Primeiros Passos ................................................ 4. A Declarao Universal dos Direitos Humanos .................................. 5. Sistema Interamericano de Proteo dos Direitos Humanos * A Constituio Brasileira e os Direitos Humanos ............................ 6. A Constituio Brasileira e os Direitos Humanos .............................. 7. A Aplicao da Lei nos Estados Democrticos ................................. Parte III Direitos Humanos e Polcia ................................................ 8. Os Direitos Humanos so apenas para Proteger Bandidos? ............. 9. Conduta tica e Legal na Aplicao da Lei ....................................... 10. Treze Reflexes sobre Polcia e Direitos Humanos .......................... DISCIPLINA II Estruturao dos Conselhos Comunitrios .............. 1. Introduo ..................................................................................... 2. Conceitos bsicos ......................................................................... 3. Fundamentao jurdica dos conselhos comunitrios de segurana . 4. Estatuto dos conselhos comunitrios ........................................... 5. Autonomia e iseno poltico - partidria dos conselhos ............... 6. Finalidades dos conselhos comunitrios de segurana ................. 7. Condies para funcionamento dos conselhos comunitrios de segurana ................................................................................. 8. Sensibilizao do pblico interno e da comunidade ...................... 23 25 25 25 26 27 27 33 34 35 36 42 42 50 57 67 69 72 75 75 77 78 79 80

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9. Dissoluo, reativao e eleio dos conselhos comunitrios de segurana ................................................................................. 81 10. Dificuldades .................................................................................. 82 11. Medidas complementares .............................................................. 82 12. Conselhos comunitrios de segurana no Brasil .......................... 83 13. Situao atual dos conselhos comunitrios de segurana nos estados brasileiros ........................................................................ 85 14. Apndices ..................................................................................... 92 15. Conselhos comunitrios de segurana pblica (CONSEPS), desafios ao debate e organizao .............................................. 93 16. Parbolas ..................................................................................... 97 17. Depende de cada um .................................................................... 98 18. Insista ........................................................................................... 99 19. Modelo do estatuto do estado de minas gerais- estatuto do CONSEP (diretriz 05/02 CG) .................................................... 100 DISCIPLINA III Gesto de Projetos .................................................. 117 Apresentao ........................................................................................ 120 1. Gerncia de projetos ..................................................................... 122 2. Ciclo de vida do projeto ................................................................. 128 3. Processos da gerncia de projetos ............................................... 130 4. Processo de inicializao ............................................................. 133 5. Processo de planejamento: elaborao de projetos ...................... 135 5.1. Plano de Trabalho ................................................................. 135 5.1.1. Resumo do projeto ....................................................... 135 5.1.1.1.Ttulo do projeto ................................................... 137 5.1.1.2. Gerente do projeto .............................................. 137 5.1.1.3 Clientes do projeto .............................................. 138 5.1.1.4. Parceiros ............................................................ 139 5.1.1.5. Objetivo .............................................................. 139 5.1.1.6. Meta ................................................................... 140 5.1.1.7. Justificativa ......................................................... 140 5.1.1.8. Escopo do projeto .............................................. 140 5.1.2. Detalhamento do projeto .............................................. 141 5.1.2.1. Cronograma fsico .............................................. 141 5.1.3. Consideraes Estratgicas e Gerenciais .................... 14216

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6. Anlise de riscos ........................................................................ 6.1. Neutralizando os riscos ...................................................... 7. Fatores crticos de sucesso ........................................................ 7.1. Gerente do Projeto ............................................................. 7.2. Equipe competente ............................................................. 7.3. Planejamento e Controle adequados .................................. 7.4. Inexistncia de itens de alto risco ...................................... 7.5. Ateno especial s ferramentas gerenciais mais estratgicas 8. Ferramentas gerenciais .............................................................. 8.1. Acompanhamento de projetos ............................................. 8.2. Priorizao e avaliao de projetos ..................................... 9. Processo de execuo e controle ............................................... 10. Processo de encerramento ......................................................... 11. Gerncia de projetos nas organizaes ...................................... 1.1. Escritrio de Projetos ......................................................... Anexos .............................................................................................

143 146 147 148 148 148 149 149 149 149 156 157 158 161 162 167

DISCIPLINA IV Gesto Pela Qualidade na Segurana Pblica .. 181 1. Introduo ................................................................................... 183 2. Estratgias institucionais para o policiamento ............................ 185 3. Princpios de gesto da polcia moderna ..................................... 191 4. A gesto e as estratgias (modelos) de polcia ........................... 194 5. Diagrama 5W2H OU 4Q1POC gerencia de um plano de ao . 197 6. Diagrama 4Q1POC modelo de polcia tradicional e polcia comunitria ....................................................................... 198 7. Mtodo I.A.RA. ........................................................................... 199 8. Mtodo IARA 1 passo ............................................................ 202 9. Anlise: corao do modelo de soluo de problemas: ............... 202 10. Mtodo IARA 2 passo ............................................................ 206 11. Diagrama causa efeito (6m) ou diagrama espinha de peixe ...... 206 12. Diagrama causa efeito no policiamento comunitrio ................. 207 13. Respostas: formulando estratgias adequadas ........................... 207 14. Mtodo IARA 3 passo ............................................................ 209 15. Avaliao: avaliando a efetividade total: ....................................... 210 16. Mtodo IARA 4 passo ............................................................. 211

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DISCIPLINA V Mobilizao Social .................................................. 1. Definio de comunidade ............................................................ 2. Comunidade ................................................................................ 3. Polcia ......................................................................................... 4. Organizao comunitria ............................................................. 5. Nveis de organizao comunitria .............................................. 6. A autonomia das organizaes em relao polcia ................... 7. Estratgias de organizao comunitria: meio de controle social, de auto-ajuda ou de parceria decisria? ........................... 8. Organizao comunitria como meio de controle social ............. 9. Organizao comunitria como meio de auto-ajuda .................... 10. Os perigos .................................................................................. 11. Organizao comunitria como meio de parceria decisria ......... 12. Projeto local de polcia comunitria ............................................. 13. Objetivos gerais ........................................................................... 14. Planejamento estratgico ............................................................ 15. Atividades que podero ser desenvolvidas na comunidade, como forma de participao social na preveno e preparao da comunidade ............................................................................ 16. Projeto modelo-parque COCAIA zona sul da cidade de So Paulo - como vivem ou sobrevivem os moradores da regio do GRAJA/PARELHEIROS ............................................. 17. Projeto parque COCAIA .............................................................. 18. Informaes gerais ...................................................................... 19. Comit parque COCAIA .............................................................. 20. Reunies realizadas por rua ........................................................ 21. Aes do comit parque COCAIA ............................................... 22.Sugestes de atividades a serem desenvolvidas na comunidade: .. 23.Sugestes de melhoria no bairro .................................................. 24.Oficinas de cidadania ................................................................... 25.Anexo 1 ....................................................................................... 26.Anexo 2 .......................................................................................

213 215 215 216 217 217 219 221 221 223 224 225 226 228 228

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DISCIPLINA VI Polcia Comunitria Comparada & Troca de Experincias de Polcia Comunitria .......................................... 1. Polcia comunitria comparada Internacional ........................... 2. Os Estados Unidos da Amrica .................................................. 3. Rei fez NY trocar energia vital por ordem e paz .......................... 4. Ao agressiva caracteriza polcia .............................................. 5. Canad ........................................................................................ 6. Japo .......................................................................................... 7. A polcia de proximidade na Europa ............................................ 8. A polcia de proximidade na Espanha um modelo europeu ....... 9. A polcia comunitria na Amrica do sul ...................................... 10. Colmbia ..................................................................................... 11. Equador ....................................................................................... 12. Paraguai ...................................................................................... 13. El Salvador .................................................................................. 14. Programa estadual de direitos humanos ..................................... 15. Por uma polcia cidad. ............................................................... 16. Policiamento comunitrio em So Paulo: Histrico .....................

249 251 251 253 254 256 259 263 263 266 267 270 274 276 279 281 286

Troca de Experincias de Polcia Comunitria ............................... 288 Esperincias no Brasil 2000-2002 1. Caso Vitria ES - Gangues fora do Morro .................................... 288 2. Caso Macap AP -Anjos da Paz Eram Marginais ......................... 296 3. Caso Jardim Angela SP O Lugar Mais Violneto do Mundo ......... 303 Concurso Nacional de Polcia Comunitria 2005 - Projetos 4. Introduo ................................................................................... 311 5. 1 Colocado: Estado de Gois .................................................... 313 6. 2 Colocado: Estado de So Paulo ............................................. 323 7. 3 Colocado: Estado de Rondnia .............................................. 337

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DISCIPLINA VII Polcia Comunitria e Sociedade ........................ 1. Os problemas da sociedade atual ............................................... 2. Os problemas sociais da violncia na sociedade moderna .......... 3. As cidades como centros convergentes da vida comunitria ....... 4. O bairro, unidade urbana ............................................................. 5. O relacionamento social durante a atividade de policiamento ..... 6. Diretrizes para a integrao com a comunidade .......................... 7. A integrao com entidades representativas da comunidade ...... 8. A identificao dos problemas sociais locais .............................. 9. Coleta de informaes ................................................................. 10. Anlise da comunidade ............................................................... 11. Identificao dos grupos relevantes ............................................. 12. A identificao da liderana ......................................................... 13. Reunio dos lderes dos grupos relevantes ................................. 14. Identificao das reas de aceitao comum e das reas de discordncia ........................................................................... 15. Implantao ................................................................................ 16. Controle de qualidade, desenvolvimento contnuo e atualizao .. 17. Proao, preveno e represso ................................................. 18. Anlise do antes e depois da polcia comunitria ........................ 19. Condies para a continuidade da polcia comunitria ................

357 359 362 363 367 368 371 374 381 381 382 382 383 384 385 385 386 386 387 387

DISCIPLINA VIII Relaes Interpessoais, Conflitos e as Formas de Interveno .................................................................................... 389 1. O homem como ser social ............................................................ 391 2. Conflito .......................................................................................... 394 3. Administrao de conflitos interpessoais ...................................... 397 4. Importncia da hierarquia e da disciplina na polcia comunitria ... 404 5. Padres operacionais de comportamento ..................................... 409 6. Anexo: textos e dinmicas ............................................................ 411 6.1.Texto 1(A cenoura, o ovo e o caf) ........................................ 412 6.2.Texto 2(Diferenas) ................................................................ 413 6.3.Texto 3(Fbula da convivncia) .............................................. 414 6.4.Texto 4(O marceneiro e as ferramentas) ................................ 415 6.5.Dinmica 1(Dinmica do tungo-tungo) ................................... 416 6.6.Dinmica 2(Dinmica dos elos) ............................................. 41620

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DISCIPLINA IX Teoria e Prtica do Ensino: Formao de Multiplicadores do Curso Nacional de Polcia Comunitria ..... Introduo ......................................................................................... 1. Esforos governamentais para a formao e democratizao do ensino dos profissionais de Segurana Pblica (2000-2006) ....... 2. Principais correntes e abordagens educacionais ......................... 2.1. Aprendizagem significativa .................................................... 2.2. Outro ngulo do sistema de ensino .................................... 2.3. Novas atitudes dos educadores ............................................ 2.4. O que saber ensinar? ........................................................ 2.5. Pirmide da aprendizagem ................................................... 2.6. O significado de educar: os pilares da educao segundo a Unesco .............................................................................. 2.7. O que uma excelente aula? ............................................... 3. Planejamento do ensino .............................................................. 4. Didtica do ensino ........................................................................ 4.1. Formulao de objetivos ....................................................... 4.2. Dicas de comunicao durante um aula expositiva ............... 4.3. Utilizao de recursos tecnolgicos ..................................... 4.4. Avaliao da aprendizagem .................................................. 4.5. Tcnicas de ensino de contedos ......................................... Referncias ....................................................................................... DISCIPLINA X Teorias Sobre Polcia Comunitria ........................ 1. A emergncia de novos modelos ................................................. 2. A importncia da polcia .............................................................. 3. O ideal da instituio policial ...................................................... 4. Segurana como necessidade bsica ......................................... 5. A polcia na satisfao das necessidades de segurana ............. 6. Polcia comunitria: conceitos e interpretaes bsicas ............. 7. Comunidade ................................................................................ 8. Segurana ................................................................................... 9. Diferenas bsicas da polcia tradicional com a polcia comunitria 10. O 10 princpios da polcia comunitria .........................................

419 421 422 426 427 429 431 432 434 435 436 437 438 438 439 440 441 442 449 451 453 454 455 456 456 457 459 459 462 464

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11. O que no policiamento comunitrio ......................................... 12. Relao com a comunidade ........................................................ 13. As duas polcias ......................................................................... 14. Como a polcia de investigao pode agir como polcia comunitria ................................................................................. 15. Implantao do modelo de polcia comunitria: condies bsicas ....................................................................................... 16. Quanto a comunidade ................................................................. 17. Quanto aos policiais .................................................................... 18. Princpios da polcia moderna .....................................................

465 468 469 471 472 473 473 474

DISCIPLINA XI Mediao e demais Meios de Resoluo Pacfica de Conflitos e a Polcia Comunitria ................................................ 475 1. Texto para Reflexo Inicial ........................................................... 2. Conflito Interpessoal .................................................................... 3. Conflitos Interpessoais e as Relaes com a Segurana Pblica .. 3.1. Aspectos Relevantes Sobre a Questo ................................ 3.2. Meios de Resoluo Pacfica de Conflitos ............................ 4. Contextualizando a Mediao de Conflitos ................................. 5. Mediao de Conflitos Interpessoais ........................................... 5.1. Caractersticas do Processo de Mediao ........................... 477 478 478 478 481 485 486 486

5.2. Objetivo da Mediao ........................................................... 486 5.3. O Mediador........................................................................... 487 5.4. O Que no Mediao? ...................................................... 488 5.5. Modelos de Mediao .......................................................... 489 5.6. Sntese da Metodologia de Mediao e demais meios de Resoluo Pacfica de Conflitos, em Execuo na Ao Segurana Cidad (SENASP-PNUD-SRJ), Adaptada Filosofia da Polcia Comunitria ......................... 6. Mediao Comunitria ................................................................. 7. Procedimento Operacional Padro para Aplicao das ADRS nos Conflitos Inter-Pessoais ........................................................ Referncias Bibliogrficas .................................................................22

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DISCIPLINA 01

DIREITOS HUMANOS

Organizao e Sistematizao: Ten Cel PMDF Suamy Santana da Silva

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APRESENTAOEste trabalho foi organizado a partir texto de diversos autores e tem por objetivo apresentar temas que esto presentes na relao Direitos Humanos Estado Polcia. A filosofia de Polcia Comunitria estrutura-se com base no Estado democrtico de direito e no respeito aos direitos humanos. incoerente e desconexa a implementao dessa filosofia como modelo de gesto operacional das instituies policiais sem que seus integrantes tenham a perfeita noo da importncia deles no processo de democratizao dos pais e na construo e alargamento da percepo da cidadania no seio da sociedade. Acredito que a razo do insucesso de vrias experincias de implementao de policiamento comunitrio no pas foi o desconhecimento e descomprometimento dos policiais planejadores e executores, com a dimenso pedaggica de suas aes para a consolidao da doutrina e principalmente, pelo descrdito no trato com as questes que envolvem a promoo dos direitos humanos no Estado brasileiro. Assim, fundamental para o xito de polticas pblicas fundamentadas na interao dos agentes do Estado e a sociedade em geral, que a cultura de respeito e promoo dos direitos humanos esteja arraigada nas bases conceituais e prticas das aes que forem desencadeadas. Passo, pois, a discorrer um contedo conceitual mnimo sobre o tema, para a reflexo do leitor.

PARTE I CONCEITOS E CARACTERSTICAS1. DIREITOS HUMANOS: CONCEITO Direitos Humanos uma expresso moderna, mas o princpio que invoca to antigo quanto a prpria humanidade. que determinados direitos e liberdades so fundamentais para a existncia humana. No se trata de privilgios, nem tampouco de presentes oferecidos conforme o capricho de governantes ou governados. Tambm no podem ser retirados por nenhum poder arbitrrio. No podem ser negados, nem so perdidos se o indivduo cometer algum delito ou violar alguma lei. De incio, essas afirmaes no tinham base jurdica. Em vez disto, eram consideradas como afirmaes morais. Com o tempo, esses direitos foram formalmente reconhecidos e protegidos pela lei25Ministrio da Justia

O ncleo do conceito de Direitos Humanos se encontra no reconhecimento da dignidade da pessoa humana. Essa dignidade expressa num sistema de valores, exerce uma funo orientadora sobre a ordem jurdica porquanto estabelece o bom e o justo para o homem. A expresso Direitos Humanos uma forma abreviada de mencionar os direitos fundamentais da pessoa humana. Esses direitos so considerados fundamentais porque sem eles a pessoa humana no consegue existir ou no capaz de se desenvolver e de participar plenamente da vida. Todos os seres humanos devem ter assegurados, desde o nascimento, as condies mnimas necessrias para se tornarem teis humanidade, como tambm devem ter a possibilidade de receber os benefcios que a vida em sociedade pode proporcionar. Esse conjunto de condies e de possibilidades adquiridos no processo histrico de civilizao da humanidade, associados capacidade natural de cada pessoa em se organizar socialmente, d-se o nome de Direitos Humanos. A construo desse sistema de proteo de direitos constante, num processo contnuo de adaptao das leis e costumes s novas realidades sociais que se apresentam. Deste modo, atualmente no basta aos Estados nacionais e aos sistemas polticos internacionais a preservao da integridade fsica dos cidados, mas tambm seus direitos sociais, econmicos, culturais, ambientais e demais necessidades que, possibilitem uma melhor qualidade de vida e felicidade ao ser humano durante sua existncia. 2. DIREITOS HUMANOS: CARACTERSTICAS Os Direitos Humanos apresentam as seguintes caractersticas: - Imprescritibilidade: Os Direitos Humanos fundamentais no se perdem pelo decurso de prazo. Eles so permanentes; - Inalienabilidade: No se transferem de uma para outra pessoa os direitos fundamentais, seja gratuitamente, seja mediante pagamento; - Irrenunciabilidade: Os Direitos Humanos fundamentais no so renunciveis. No se pode exigir de ningum que renuncie vida (no se pode pedir a um doente terminal que aceite a eutansia, por exemplo) ou liberdade (no se pode pedir a algum que v para a priso no lugar de outro) em favor de outra pessoa. - Inviolabilidade: Nenhuma lei infraconstitucional e nenhuma autoridade podem desrespeitar os direitos fundamentais de outrem, sob pena26

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de responsabilizao civil, administrativa e criminal; - Universalidade: Os direitos fundamentais aplicam-se a todos os indivduos, independentemente de sua nacionalidade, sexo, raa, credo ou convico poltico-filosfica; - Efetividade: O Poder Pblico deve atuar de modo a garantir a efetivao dos direitos e garantias fundamentais, usando inclusive mecanismos coercitivos quando necessrio, porque esses direitos no se satisfazem com o simples reconhecimento abstrato; - Interdependncia: As vrias previses constitucionais e infraconstitucionais no podem se chocar com os direitos fundamentais; antes, devem se relacionar de modo a atingirem suas finalidades; - Complementaridade: Os Direitos Humanos fundamentais no devem ser interpretados isoladamente, mas sim de forma conjunta, com a finalidade da sua plena realizao.

PARTE II RELAO DIREITOS HUMANOS E ESTADO3. DIREITOS HUMANOS: PRIMEIROS PASSOS Evoluo dos Direitos Humanos. Texto disponvel em < http://www.dhnet.org.br/dados/cursos/dh/br/sc/scdh/parte1/2c1.html>. Adaptado para fins didticos. Os direitos traduzem com fidelidade o seu tempo. As inquietaes daquele exato momento histrico, so, portanto, resultado de um dado momento na evoluo da mentalidade dos seres humanos, podendo, por vezes, parecer eventualmente absurdos, excessivamente dogmticos, rgidos ou lcidos e liberais, mas em seu permanente movimento, sero sempre a traduo mais autntica de um povo. At a produo dos primeiros cdigos, os governantes exerciam seu poder despoticamente, sem qualquer limitao, variando as suas decises - e mesmo alguns princpios e leis esparsas existentes - de acordo com a vontade e o humor do momento. Deste modo, os sditos no contavam com qualquer referncia comportamental que lhes garantisse os direitos mais fundamentais. Nesse27Ministrio da Justia

aspecto, a obedincia atravs do temor exigia ser absoluta, sem qualquer restrio ou hesitao. A Lei de Talio, antiga pena proveniente do chamado direito vindicativo que constitua em infligir ao condenado mal completamente idntico ao praticado - colaborou com todas as primitivas ordenaes jurdicas atravs do princpio: olho por olho, dente por dente, brao por brao, vida por vida. Em sua maioria, inspirados pelos deuses, os dspotas oniscientes ordenaram a confeco de leis e cdigos que foram espelhos de suas pocas, at porque a lei , invariavelmente, a expresso do poder de quem a faz. O prprio Cdigo de Hamurabi (1690 a.C.) exibe a figura de Schamasch, o deus Sol, confiando capacidade do imperador a garantia do toque divino ao ordenamento jurdico ento imposto. Mesmo os legisladores da Revoluo Francesa invocaram os auspcios divinos para inspirar suas pretenses. A civilizao ocidental, da qual fazemos parte, se confunde com a noo de cristandade, principalmente em decorrncia da influncia das fortes concepes religiosas introduzidas pelas igrejas nas culturas atravs do processo de evangelizao dos povos. A influncia filosfico-religiosa se manifestou identicamente no Oriente com a mensagem de Buda (500 A.C), fundamentada na igualdade entre todos os homens. Desde que sentiram a necessidade da existncia do direito, os homens comearam a converter em leis as necessidades sociais, deixando para trs a era da prevalncia da fora fsica e da esperteza com as quais se defenderam desde as cavernas. A afirmao do direito se d com sua projeo em todas as partes do mundo antigo atravs das religies que facilitam sua identificao com os princpios morais estabelecidos, bem como sua assimilao e seguimento. essa linha de argumentao, surge um novo paradoxo, desta feita verificado a partir da confrontao do dogma religioso, de contedo sagrado e esttico, com a lei profana, de caractersticas dinmicas e evolutivas, Inversamente, pode-se perceber a existncia de um outro paradoxo: os Direitos Humanos representam uma imperatividade absoluta, e a tica e a moral se traduzem pela relatividade e pela adaptao s circunstncias temporais e espaciais. De todo modo, os direitos naturais e sua doutrina foram se caracterizando, par e passo, com a evoluo da humanidade a partir de situaes concre28

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tas que iam surgindo, configurando sua historicidade. Por conseguinte, exigindo soluo desses conflitos por parte dos governantes. A partir de um determinado momento a palavra oral j no mais bastava para justificar e garantir os seus atos, surgindo dai a produo da lei escrita manifestada inicialmente atravs de inscries no barro e em papiros, bem como gravadas em ossos de animais, No terceiro milnio a.C, j eram previstos alguns mecanismos legais de proteo individual em relao ao Estado. Entretanto, h um reconhecimento geral no sentido de que o Cdigo de Hamurabi -sexto rei da primeira dinastia da Babilnia - tenha sido provavelmente o primeiro ordenamento jurdico escrito do Ocidente. Com 282 artigos gravados em um nico bloco de pedra, continha uma seleo de casos jurisprudncias que ajudavam na soluo das demandas jurdicas que se apresentavam ao arbtrio do rei. Para os atenienses, a lei escrita o grande antdoto contra o arbtrio governamental, pois, como escreveu Eurpides na pea As Suplicantes (verso 432), uma vez escritas as leis, o fraco e o rico gozam de um direito igual. (Fbio Konder Comparato - A Afirmao Histrica dos Direitos Humanos) Em linhas gerais, esse diploma abrigava preceitos que deveriam ser observados pelos sditos no relacionamento que mantinham entre si, e destes em relao ao Estado, o qual, por sua vez, no devia satisfao a ningum. Nem existiam mecanismos que efetivamente impusessem qualquer limitao ao poder real. Previa a supremacia das leis frente s variaes de humor dos governantes. Versava tanto sobre sortilgios, juzo de Deus, falso acusao e falso testemunho, prevaricao de juizes etc., como dedicava-se aos crimes de furto e roubo, estupro, injria e difamao, coibia a tortura e a aplicao de penas cruis, tratando ainda de reivindicaes sobre imveis, locaes, mtuo, depsito, dao em pagamento, processo de execuo de dividas, tributos etc. Regulava ainda as relaes entre os comerciantes e os agentes do governo, as relaes de matrimnio, o regime de comunho de bens, os dotes, a adoo e as relaes familiares, o abandono do lar, o repdio, a obrigatoriedade de prover de alimentos, os direitos das crianas e a sucesso. Na rea penal, entretanto, manteve-se fiel ao postulado de Talio. Os gregos, principalmente atravs dos princpios enfocados pela democracia direta proposta por Pricles, igualmente contriburam para a constru29Ministrio da Justia

o do edifcio jurdico onde se amparam os fundamentos dos direitos essenciais do homem. Moiss (sc. XIII a.C.) subiu ao alto do Sinai para elevar o esprito e trazer consigo a palavra inscrita no Declogo, seguindo-se o Pentateuco, cujo quinto livro, o Deuteronmio, uma consolidao das antigas leis imemoriais acrescidas da sua experincia como estadista, resultando no estabelecimento do ordenamento jurdico dos hebreus. A legislao mosaica superou todas as anteriores, introduzindo princpios de Direito Constitucional e Internacional, regras gerais de direito como: No matars (5,17); No furtars (5,19); No dirs falso testemunho contra teu prximo (5,20) etc. Alm dessas, muitas outras no mbito da assistncia social, no Direito do Trabalho, como o descanso semanal etc. Criou novas normas processuais, tratou de limites de propriedades, da impenhorabilidade de bens e da inviolabilidade de domiclio, bem como de questes como o adultrio e o divrcio, do homicdio involuntrio, da represso ao charlatanismo, regulamentou ainda a usura e estabeleceu pesos e medidas justas, revelando uma moral diferente das civilizaes antigas. Com a Lei das XII Tbuas, considerada como a origem dos textos escritos consagradores da liberdade, da propriedade e da proteo aos direitos do cidado, a lei deixava de possuir uma condio essencialmente sagrada, exprimindo-se atravs de um cdigo sucinto e extremamente autoritrio, que reconhecia e consolidava a legislao anterior, bem como introduzia novas normas ao direito romano tabulrio, podendo, entretanto, ser consultada e invocada por todos, uma vez que resultava do clamor e da aspirao do povo, estabelecendo, ao menos no mundo romano, o seu carter de universalidade. Quanto substituio do sagrado pelo esprito democrtico, cabe lembrar que os romanos conferiam extrema importncia aos comcios como mecanismo de deciso. Assim , que por deciso manifestada em comcio, o povo romano aprovou as tbuas decenvirais, diploma que se constituiu no fundamento das cartas jurdicas elaboradas a partir de ento. Dentre os princpios ento institudos, cabe ressaltar alguns que do bem a medida dos valores emprestados racionalidade naquela poca: No se far coisa alguma sem a prvia consulta aos ugures. (1); 0 povo deve acreditar nos Magistrados. (IV); As leis so imparciais. (V); A guerra no ser feita sem previa consulta aos comcios. (VI); Aquele que matar o pai ou a me,30

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ter a cabea cortada. (IX); No se deve dizer coisas desonestas na presena das senhoras. (X); Deve-se andar na cidade com a tnica at os calcanhares. (XI); lcito matar os que nascem monstruosos (XII); Compartilhe a mulher, com o marido, das coisas existentes no seu lar. (XV); lcito ao marido e aos irmos castigar convenientemente a mulher adltera (XVII); Se uma mulher se embriaga em sua casa, ser punida como se tivesse sido encontrada em adultrio. (XVIII); Seja lcito ao pai e a me banir , vender e matar os prprios filhos. (XIX) etc. (Lei das XII Tbuas) Nesse contexto, a Lex Duodecim Tabularum previa normas acerca do chamamento a juzo, estabelecia instncias judicirias, normatizava critrios de confisso, condenao e execuo, o exerccio do ptrio poder, a tutela hereditria, a posse e a propriedade, legislando ainda acerca dos imveis e dos prdios, bem como dos delitos (dentre estes o de que os juros no poderiam exceder de um por cento ao ms). Na Inglaterra governada entre 1199 e 1216 por Joo Sem Terra (Lackland) (Oxford 1167 1216 Nottinghamshire), quarto filho de Henrique II, no contemplado com herana paterna, se imps uma lei de salvao nacional, principalmente em virtude do exacerbado conflito existente entre o governante e o clero, a nobreza, a burguesia e, mais indiretamente, com as classes servis. A inabilidade na conduo das assuntos de Estada, aliada s reivindicaes dos bares apoiadas pelo poder papal, deixaram finalmente encurralado o soberano, culminando com a assinatura de um documento bem a contragosto do governante, que sequer permitiu seu registro, possivelmente premeditando sua destruio to logo os ventos polticos voltassem a soprar em seu favor. Vale lembrar que a inexistncia de registro impedia que fosse formalmente copiada e divulgada e, em conseqncia, cumprida. A Magna Carta (Magna Charta Libertatum) no se constitua em uma criao original ou num modelo constitucional, Era redigida em latim, propositadamente com a finalidade de dificultar o acesso aos letrados, mantendo as normas virtualmente inacessveis s massas, tanto que foi traduzida para o idioma ingls apenas no sculo XVI. Mesmo assim, se constituiu num importante avano, uma vez inegvel a sua influncia em todas as constituies modernas. Firmada em 15 de junho de 1215, na localidade de Runnymede, condado de Surrey, com 67 clusulas que, pela primeira vez afrontavam o poder dificultou de um soberano, sendo que ao menos 12 delas beneficiavam diretamente o povo,31Ministrio da Justia

embora no criassem nenhum direito novo. Entretanto, foram institudas diversas normas de carter pioneiro para a fundamentao dos Direitos Humanos. Entre as mais importantes esto as consignadas nos Artigos 48 e 49: 48) Ningum poder ser detido, preso ou despojado dos seus bens, costumes e liberdades, seno em virtude de julgamento de seus Pares segundo as leis do pas. 49) No venderemos, nem recusaremos, nem dilataremos a quem quer que seja, a administrao da justia. Estabeleceu ainda, e de forma precursora, a unificao de pesos e medidas, que protegeria os ento consumidores contra as adulteraes promovidas pelos espertalhes e pelos poderosos. Entre outras garantias, a Magna Carta estabelecia a proporcionalidade entre delito e sano, a previso do devido processo legal, o livre acesso Justia, assim como a liberdade de locomoo e a livre entrada e sada do pas, lanando as sementes dos princpios da legalidade, da reserva legal e da anterioridade da lei penal que iremos ver mais adiante. Importante lembrar que o servo no podia, ento, sequer entrar ou sair do feudo, comprar ou vender qualquer coisa sem autorizao de seu senhor, subtrado do poder de exercer qualquer direito de manifestao. A partir desse divisor de guas na relao de poder entre governantes e governados, que ensejaria a derrocada do absolutismo, a burguesia europia, ento emergente, assumiu posies cada vez mais exigentes para com seus dirigentes. Cabe ressaltar a importncia do fato histrico dessa conquista, principalmente sob a tica de reafirmar que os governos so, e sempre foram, os maiores violadores dos Direitos Humanos. A inveno da imprensa foi igualmente decisiva na multiplicao, acesso e utilizao dos cdigos como mecanismo de balizamento de conduta social, Entretanto, foi apenas com o surgimento dos Estados contemporneos que se produziram cdigos capazes de efetivamente garantir os direitos neles consignados. O principio j ento vigente de que s o Estado poderia criar normas jurdicas, atribui aos cdigos a inestimvel condio de instrumento coletivo de referncia legal. Petition of Right, de 1628, elencava diversas protees tributrias que garantiam a liberdade do indivduo em hiptese de inadimplncia. O Habeas Corpus Amendment Act, de 1679, regulamentava esse instituto jurdico de garantia pessoal anteriormente previsto na Common Law.32

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Em 1689 surgiu a Declarao de Direitos (BilI of Rights), dotada de 13 artigos que cristalizavam e consolidavam os ideais polticos do povo ingls, expressando significativas restries ao poder estatal, regulamentando o principio da legalidade, criando o direito de petio, assim como imunidades parlamentares. Entretanto, restringia vigorosamente a liberdade religiosa. A Declarao de Virgnia, considerada a primeira declarao fundamentais, em sentido moderno, proclamava, entre outros direitos, o direito vida , liberdade e propriedade, prevendo o princpio da legalidade, o devido processo lega[, o Tribunal de Jri, o principio do juiz natural e imparcial, a liberdade religiosa e de imprensa, antecipando-se em pouco mais de um ms Declarao de Independncia dos Estados Unidos da Amrica, esta ltima redigida por Thomas Jefferson a partir de trabalho conjunto com Benjamin Franklin e John Adams, tendo como diapaso a limitao do poder estatal, sendo proclamada em reunio do Congresso de 4 de julho de 1776, ambas antecedendo em alguns anos a Declarao dos Direitos do Homem e do Cidado editada na Frana. 4. A DECLARAO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS As violaes generalizadas dos direitos e liberdades humanas na dcada de 1930, que culminaram com as atrocidades da Segunda Guerra Mundial (1939 a 1945), marcaram o fim da noo de que os Estados no tinham de prestar contas a nenhuma outra instncia a respeito da maneira como tratavam seus cidados. A assinatura da Carta das Naes Unidas em junho de 1945 levou os Direitos Humanos para a esfera do direito internacional. Todos os pases membros das Naes Unidas concordaram em tomar medidas salvaguardar os Direitos Humanos. Desde ento, a atividade para-legislativa das Naes Unidas produziu diversos instrumentos de reafirmao dos Direitos Humanos. Para o propsito do curso ora desenvolvido , os mais importantes so a Declarao Universal dos Direitos Humanos de 1948 e os dois pactos que a implementam e so juridicamente vinculantes: o Pacto Internacional sobre Direitos Econmicos, Sociais e Culturais e o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Polticos. Juntos, estes trs instrumentos costumam serem chamados de Carta Internacional dos Direitos Humanos. A Declarao Universal constitui um grande passo frente dado pela comunidade internacional em 1948. Seu carter moral persuasivo decorrente do consenso de que se trata de uma declarao de regras internacionais de aceitao geral. Este esboo de objetivos e termos de Direitos Humanos 33Ministrio da Justia

redigido em termos amplos e gerais, e foi a fonte o marco substantivo dos outros dois instrumentos que compem a carta Internacional dos Direitos Humanos. So de vital importncia para a administrao da justia os artigos 3, 5, 9, 10 e 11 da Declarao Universal. Estes artigos tratam, respectivamente, do direito vida, liberdade e segurana pessoal; da proibio da priso arbitrria; do direito a um julgamento justo; do direito a ser considerado inocente at prova em contrrio; e da proibio de medidas penais retroativas. Estes artigos esto mais diretamente relacionados com a aplicao da lei, ao passo que a totalidade do texto da declarao Universal proporciona uma orientao para o trabalho do pessoal penitencirio. 5. SISTEMA INTERAMERICANO DE PROTEO DOS DIREITOS HUMANOS Diferentemente da Declarao Universal dos Direitos do Homem, o Pacto de San Jos da Costa Rica (22-11-1969) que reafirma o propsito dos Estados Americanos em consolidar no Continente um regime de liberdade pessoal e de justia social no traz somente normas de carter material, prevendo rgos competentes para conhecer dos assuntos relacionados com o cumprimento dos compromissos assumidos pelos Estados-partes: a Comisso Interamericana de Direitos Humanos e a Corte Interamericana de Direitos Humanos. Cada um deles est composto por sete membros, nomeados e eleitos pelos Estados na Assemblia-Geral da OEA. Os membros atuam individualmente, isto , sem nenhuma vinculao com os seus governos, e tambm no representam o pas de sua nacionalidade. A Comisso e a Corte atuam de acordo com as faculdades que lhes foram outorgadas por distintos instrumentos legais, no decorrer da evoluo do sistema interamericano. Apesar das especificidades de cada rgo, em linhas gerais os dois supervisionam o cumprimento, por parte dos Estados, dos tratados interamericanos de Direitos Humanos e tm competncia para receber denncias individuais de violao desses tratados. Isso quer dizer que os rgos do sistema tm competncia para atuar quando um Estado-Parte for acusado da violao de alguma clusula contida em um tratado ou conveno. claro que devero ser cumpridos previamente alguns requisitos formais e substantivos que tanto a Corte quanto a Comisso estabelecem para que tal interveno seja vivel. A Comisso o primeiro rgo a tomar conhecimento de uma denncia individual, e s em uma segunda etapa a prpria Comisso poder levar a denncia perante a Corte. Como o Brasil s reconheceu a jurisdio contenciosa34

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da Corte em 10 de dezembro de 1998, s podem ser apresentadas a ela denncias de violaes ocorridas aps essa data. Porm, a Comisso pode receber denncias de violaes anteriores, isso porque sua competncia se estende anlise de violaes da Declarao Americana 62.(1948) e da Conveno Americana desde a ratificao pelo Brasil em 1992. rgo judicirio que , a Corte no relata, nem prope, nem recomenda, mas profere sentenas, que o Pacto aponta como definitivas e inapelveis, determinando seja o direito violado prontamente restaurado, e ordenando, se for o caso, o pagamento de indenizao justa parte lesada. Em termos gerais, a assinatura e ratificao de um tratado ou conveno internacional gera para os Estados um compromisso de respeito por seu contedo.

6. A CONSTITUIO BRASILEIRA E OS DIREITOS HUMANOS Flvia Piovesan Texto extrado do livro Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional 3 Edio. So Paulo. Max Limonad. 1997. A Constituio Brasileira de 1988 institucionaliza a instaurao de um regime poltico democrtico no Brasil. Introduz tambm indiscutvel avano na consolidao legislativa das garantias e direitos fundamentais e na proteo de setores vulnerveis da sociedade brasileira. A partir dela, os Direitos Humanos ganham relevo extraordinrio, situando-se a Carta de 1988 como documento abrangente e pormenorizado sobre os Direitos Humanos jamais adotado no Brasil. A consolidao das liberdades fundamentais e das instituies democrticas no pas, por sua vez, mudam substancialmente a poltica brasileira de Direitos Humanos, possibilitando um progresso significativo no reconhecimento de obrigaes internacionais neste mbito. Desde seu prembulo a Carta de 1988 projeta a construo de um Estado Democrtico de Direito, destinado a assegurar o exerccio dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurana, o bem estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justia, como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos (....) (Jos Joaquim Gomes Canotilho).

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7. A APLICAO DA LEI NOS ESTADOS DEMOCRTICOS Texto extrado do Manual Servir e Proteger Comit Internacional da Cruz Vermelha - CICV A lei e a ordem, assim como a paz e a segurana, so questes de responsabilidade do Estado. A maioria dos Estados escolheu incumbir das responsabilidades operacionais desta rea uma organizao de aplicao da lei, seja ela civil, militar ou paramilitar. Este tpico busca examinar a funo e a posio da aplicao da lei nas sociedades democrticas, assim como seu papel e sua importncia na promoo e proteo dos Direitos Humanos. Democracia e o Estado de Direito O artigo 25 do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Polticos (PIDCP) estipula que: Todo cidado tem o direito e a possibilidade, sem nenhuma das discriminaes referidas no artigo 20 e sem restries infundadas:a) de tomar parte na conduo dos assuntos pblicos, diretamente ou por intermdio de representantes livremente eleitos;b) de votar e ser eleito, em eleies peridicas e legtimas, por sufrgio universal e igualitrio, realizadas por voto secreto, assegurando a livre expresso da vontade dos eleitores;c) de ter acesso, em condies gerais de igualdade, s funes pblicas do seu pas. Apesar da dificuldade em identificar precisamente o que seja o direito a um regime democrtico, as disposies do PIDCP (como estipula o artigo 25 acima) protegem claramente o direito do indivduo de participar na conduo dos assuntos pblicos. Este direito obriga os Estados a no s se absterem de cometer certos atos, mas tambm a tomarem medidas especficas que garantam populao o exerccio livre e igual deste direito. , de igual forma, difcil chegar a uma definio satisfatria de democracia. A tentativa de definir democracia, provavelmente, levar ao estabelecimento de caractersticas de um regime democrtico que possam ser consideradas denominadores comuns, independente do sistema vigente em determi36

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nado Estado. Tais caractersticas incluem um governo democraticamente eleito que represente o povo - e seja responsvel perante ele; a existncia do estado de direito - e o respeito por ele; e o respeito pelos Direitos Humanos e liberdades. O artigo 21 da Declarao Universal dos Direitos Humanos (DUDH) estipula que a vontade do povo o fundamento da autoridade do governo... Eleies livres e legtimas, realizadas a intervalos regulares, so de importncia vital ao estabelecimento do governo democrtico. responsabilidade do Estado garantir as eleies e assegurar a todas as pessoas seu direito de votar e de ser eleito, livres de coero ou presso de qualquer natureza. Um governo representativo no significa somente uma representao adequada da vontade do povo, mas significa, tambm, que o governo, em sua composio, reflete a sociedade. A representao igual de homens e mulheres, assim como a representao proporcional de minorias, so os meios pelos quais o objetivo do governo representativo ser alcanado. A existncia do estado de direito e o respeito por ele origina uma situao onde direitos, liberdades, obrigaes e deveres esto incorporados na lei para todos, em plena igualdade, e com a garantia de que as pessoas sero tratadas eqitativamente em circunstncias similares. Um aspecto fundamental deste direito tambm pode ser encontrado no artigo 26 do PIDCP, que estipula que Todas as pessoas so iguais perante a lei e tm direito, sem discriminao, igual proteo da lei ... A existncia das leis nesse sentido serve para gerar um sentimento de segurana com relao aos direitos e deveres, j que estes direitos e deveres esto inseridos no direito positivo. Sempre que necessrio, as pessoas podem aprender sobre os seus direitos e deveres de acordo com a lei, assim como obter proteo da lei contra interferncia ilegal e/ou arbitrria em seus direitos e liberdades por outrem. 7.1 A FUNO DE APLICAO DA LEI ORIGEM E ORGANIZAO A necessidade de se aplicar a legislao nacional, no sentido de assegurar o respeito pela lei e de estipular as conseqncias dos delitos, provavelmente to antiga quanto a prpria lei. Em certas reas, as sanes pelo no cumprimento da lei so impostas como resultado de procedimentos principalmente administrativos, como, por exemplo, na legislao tributria. No h nenhum componente visvel da aplicao da lei nessas legislaes. Em outras reas, no entanto, especialmente, aquelas relacionadas vida pblica e ordem pblica, a maior parte dos Estados fundou um rgo de aplicao da lei que, na maioria dos casos, de origem e natureza civis, ficando vincu37Ministrio da Justia

lado ao Ministrio da Justia ou do Interior. H tambm Estados que confiam a responsabilidade da aplicao da lei a rgos militares ou paramilitares vinculados ao Ministrio da Defesa. A maioria dos rgos de aplicao da lei, de maneira geral, so sistemas fechados, estritamente hierrquicos. Sua estrutura freqentemente quase militar, assim como seu sistema de patentes. Operam normalmente obedecendo a uma cadeia rgida de comando, com separaes estritas de poder e autoridade, na qual o processo de tomada de decises feito de cima para baixo. A capacidade deste tipo de organizao de aplicao da lei em responder a estmulos externos fica limitada a respostas padronizadas, demonstrando pouca ou nenhuma antecipao pr ativa dos desenvolvimentos atuais e futuros que no se encaixem no sistema. A organizao de aplicao da lei como um sistema fechado passar invariavelmente por dificuldades em estabelecer e manter relaes eficazes com o pblico. Tambm ter dificuldades em determinar os desejos, as necessidades e as expectativas do pblico em dado momento. A mudana gradual, partindo de um sistema fechado para um sistema mais aberto na rea da aplicao da lei, bem recente. As palavras chaves na aplicao da lei democrtica, como no prprio regime democrtico, so antecipao e reao, representao e responsabilidade. 7.2 FUNES E DEVERES As funes das organizaes de aplicao da lei, independente de suas origens, estrutura ou vinculao, esto geralmente relacionadas a: - manuteno da ordem pblica; - prestao de auxlio e assistncia em todos os tipos de emergncia; e - preveno e deteco do crime. Apesar da maioria das exigncias para com as organizaes concentrar-se na manuteno da ordem pblica ou na prestao de auxlio e assistncia em emergncias, seu comando tende a dar prioridade preveno e deteco do crime. E, nessa rea, a maioria dos recursos disponveis so gastos na deteco do crime. Pode-se dizer que esta nfase seja peculiar, considerando o sucesso e a eficcia limitada dos rgos de aplicao da lei neste campo em particular. Os ndices de soluo de crimes so decepcionantes em todos os pases, assim como o so os esforos dirigidos38

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para o desenvolvimento e a implantao de tticas para uma preveno (mais) eficaz do crime e o interesse demonstrado por este tipo de trabalho. No resta muita dvida de que essa situao faz parte do legado de uma poca em que prevalecia o sistema fechado nas organizaes. Uma caracterstica que se destacava nessa poca era a forte internalizao das tomadas de decises relativas distribuio de recursos e determinao das prioridades da aplicao da lei. Apanhar criminosos ainda , na maioria dos casos, a principal prioridade para os encarregados e suas organizaes. O servio prestado comunidade, a proteo das vtimas e a preveno de uma maior vitimizao apresentam desafios aplicao da lei que parecem interessar menos do que o jogo tradicional de tiras e ladres. 7.3 PODERES E AUTORIDADE Aos encarregados concedida uma srie de poderes que podem ser exercidos para alcanar os objetivos legtimos da lei: entre aqueles mais conhecidos e utilizados esto a captura e deteno, e a autoridade para empregar a fora quando necessrio. A autoridade legal para utilizar a fora - incluindo a obrigao de empreg-la quando inevitvel - exclusiva organizao de aplicao da lei. A captura, a deteno e o emprego da fora e armas de fogo so tpicos tratados em captulos separados nesta apostila. Consulte-os para obter descries mais detalhadas das implicaes de cada um desses tpicos nas prticas de aplicao da lei. Alm dos poderes de captura, de deteno e o emprego de fora, os encarregados da aplicao da lei so investidos de vrios outros poderes para o cumprimento eficaz de seus deveres e funes. Alguns desses poderes esto relacionados preveno e deteco do crime, incluindo poderes para busca e apreenso: entrada em lugares, localidades e casas onde crimes foram cometidos ou vestgios destes foram deixados; busca de provas e seu confisco para a promotoria; e a captura de pessoas e/ou apreenso de objetos relativos a um crime cometido ou a ser cometido. Cada um desses poderes definido claramente pela lei e deve ser exercido somente para fins legais. So essenciais, para se exercer qualquer poder ou autoridade, as perguntas de legalidade, necessidade e proporcionalidade: O poder ou a autoridade utilizados em uma determinada situao tm fundamento na legislao nacional? E o exerccio deste poder e/ou autoridade estritamente necessrio, dadas s circunstncias da respectiva situao? E o poder ou a39Ministrio da Justia

autoridade utilizada so proporcionais seriedade do delito e o objetivo legtimo de aplicao da lei a ser alcanado? Somente nas situaes em que as trs perguntas podem ser respondidas afirmativamente que o exerccio de determinado poder ou autoridade pode ser justificado. Pode-se encontrar tanto no direito internacional dos Direitos Humanos como no direito internacional humanitrio os princpios de humanidade, respeito pela vida, liberdade e segurana pessoal e os princpios de proteo s vtimas de crimes e/ou abuso de poder, assim como as disposies especiais para a proteo de grupos vulnerveis (como as mulheres, crianas, refugiados). Sempre que os encarregados da aplicao da lei exercerem seu poder e autoridade, devem respeitar e proteger os direitos e liberdades de todas as pessoas - estejam estes expressos no direito internacional de Direitos Humanos ou no direito internacional humanitrio. O fato de que um Estado se encontra em uma situao de conflito armado, distrbios e tenses internos ou em estado declarado de emergncia, no o livra da obrigao de assegurar os direitos e liberdades fundamentais, nem tal situao pode servir como justificativa para no os assegurar. 7.4 PROMOO E PROTEO crucial que os encarregados da aplicao da lei demonstrem sensibilidade com relao aos direitos e liberdades individuais, assim como tomem conscincia de sua prpria capacidade (individual) de proteger - ou violar - os Direitos Humanos e liberdades. A aplicao da lei um componente visvel da prtica dos Estados, sendo as aes de seus encarregados raramente vistas ou avaliadas como individuais, e, na verdade, muitas vezes vistas como um indicador do comportamento da organizao como um todo. exatamente por isso que certas aes individuais de aplicao da lei (como o uso excessivo de fora, corrupo, tortura) podem ter um efeito to devastador na imagem de toda a organizao. Como j foi dito acima, as obrigaes dos Estados perante o direito internacional comeam, no atual contexto, com a adaptao da legislao nacional s disposies dos tratados em questo. No obstante, a responsabilidade no pra por a. A prtica do Estado em relao aos seus cidados deve comprovar a conscincia e o respeito s exigncias do direito internacional (independente do estado atual da incorporao na legislao nacional). Conseqentemente, exige-se que os encarregados da aplicao da lei promovam, protejam e respeitem os Direitos Humanos de todas as pessoas sem40

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nenhuma distino adversa. Esta obrigao impe implicaes claras formao e ao treinamento dos encarregados: eles devem adquirir conhecimento adequado sobre o direito interno, o direito internacional de Direitos Humanos e o direito internacional humanitrio. No entanto, o simples conhecimento no o bastante. Os encarregados da aplicao da lei tambm precisam adquirir e manter certas habilidades, tcnicas e tticas para assegurar a aplicao constante e adequada das exigncias impostas por lei para que possam respeitar e proteger os direitos e liberdades individuais. As limitaes aos direitos e liberdades pessoais s podem provir de limitaes inerentes ao prprio direito, limitaes legais e/ou derrogaes permitidas em casos de emergncia pblica que ameacem a vida da nao. Tais limitaes e/ou derrogaes no devero ser o resultado de prticas ilegais e/ou arbitrrias de aplicao da lei. Estas prticas no s vo contra o direito interno, mas tambm so prejudiciais percepo do pblico e a experincia individual dos direitos e liberdades humanos. Os encarregados da aplicao da lei devem tomar conscincia de sua capacidade individual e coletiva de influenciar a percepo pblica e a experincia individual dos direitos e liberdades humanos. Tambm devem estar conscientes de como suas aes interferem com a organizao de aplicao da lei como um todo. A responsabilidade individual e a responsabilidade por seus prprios atos devem ser reconhecidas como fatores cruciais no estabelecimento de prticas corretas de aplicao da lei. Os programas de formao e treinamento devem levar esses fatores em considerao em sua abordagem. Os encarregados pela superviso e reviso e os responsveis pelo comando devem levar esses fatores em considerao ao desenvolverem sistemas voltados reviso, superviso e acompanhamento profissional. A formao e o treinamento dos encarregados da aplicao da lei uma responsabilidade primordial em nvel nacional. No entanto, no pode ser excluda a possibilidade de cooperao e assistncia internacional nesta rea, nem se deve desviar do papel importante que as organizaes internacionais no campo de Direitos Humanos e/ou direito internacional humanitrio podem desempenhar ao prestar servios e assistncia aos Estados. Esta assistncia nunca poder ser um fim em si mesmo. A finalidade do auxlio deve ser a de facilitar os Estados a alcanarem os objetivos claramente definidos, e este deve ficar restrito s situaes em que o servio e a assistncia necessrios no so encontrados no Estado que pede auxlio.

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PARTE III DIREITOS HUMANOS E POLCIA8. OS DIREITOS HUMANOS SO APENAS PARA PROTEGER BANDIDOS? TC Suamy Santana da Silva- PMDF Artigo publicado no Boletim do Instituto Brasileiro de Cincias CriminaisIBCCRIM, Maro 2004 Ao nos depararmos com a expresso Direitos Humanos s para proteger bandido proferida por policiais, ou mesmo pela sociedade em geral, exteriorizando com essa afirmao a revolta e a mgoa contra aqueles que militam na senda da defesa e promoo dos Direitos Humanos, nos causa estranheza e perplexidade. Nos traz a indagar porque este tema, to importante para a paz social, encarado de forma distorcida e preconceituosa, em especial por aqueles profissionais que, em primeiro lugar, deveriam ter no respeito aos Direitos Humanos sua bandeira de luta, seu objetivo maior de servir e proteger a sociedade. Muitos autores buscam analisar este comportamento fundamentado na teoria que tal postura fruto dos reflexos deixados pela histria recente de ditadura e represso ocorrida durante o regime militar no Brasil, os quais trouxeram como resqucio para os militantes de Direitos Humanos, o estigma de subversivos e perigosos para a segurana nacional, por lutarem contra atitudes violentas e desumanas praticadas por agentes do Estado daquela poca. Alguns mais entendem ser o desrespeito aos direitos e garantias fundamentais, expressos sob a forma de violncia policial, ao instrumental da polcia no combate criminalidade e, portanto, tem no respeito aos Direitos Humanos um obstculo para o cumprimento da tarefa de retirar de circulao os criminosos que molestam as pessoas de bem. Outros, por sua vez, vem na ndole violenta, autoritria e preconceituosa do povo brasileiro, a averso proposta de humanizao das relaes entre o Estado e as categorias, tidas como perigosas, da sociedade. Considerando a importncia do tema para a construo de um Estado democrtico de direito, onde as instituies pblicas, em particular a polcia, desempenhem suas atividades com base nos princpios de respeito dignidade humana, cabe tecer algumas consideraes sobre a falha de percepo do tema Direitos Humanos no meio policial.

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A primeira hiptese que emerge para discusso se tal reao decorre do desconhecimento dos policiais sobre a temtica dos Direitos Humanos; a segunda, se os mesmos discordam dos procedimentos prticos e legais de proteo desses direitos, adotados por instituies de defesa dos Direitos Humanos; e a terceira, se ocorre um erro conceitual acarretado pela falta de balizamento terico sobre as dimenses ideolgicas dos Direitos Humanos, seja no campo tico-filosfico, religioso ou poltico. Apesar da extenso e a abrangncia dos Direitos Humanos no estarem claramente delimitadas na conscincia coletiva e mesmo no serem evidente para um grande segmento de cidados, seus direitos e as obrigaes decorrentes vida em sociedade, nos parece aceitvel que entre os policiais exista o consenso da necessidade das pessoas pautarem suas condutas de forma digna e fraterna, assim como de que a liberdade e a igualdade so postulados fundamentais para a vida. Assim, passamos a analisar a questo a partir dessa premissa. A matria Direitos Humanos at pouco tempo no fazia parte da grade curricular das escolas de formao policial no Brasil. O estudo dos Direitos Humanos nas polcias brasileiras surgiu da necessidade das instituies de segurana pblica se adaptarem aos novos tempos democrticos, os quais exigiam mudanas profundas na mquina estatal. As constantes denncias de violaes sistemticas dos Direitos Humanos daqueles que estavam sob a custdia da polcia e as presses sociais para a extino de alguns rgos de segurana pblica que desrespeitavam os direitos inalienveis vida e a integridade fsica, permitiram que, pelo menos, a discusso sobre o tema penetrasse atravs dos muros dos quartis e dos prdios das delegacias. Ocorre, contudo, que o tema Direitos Humanos apresentado ainda envolto em um manto nebuloso de teorias e de conjecturas utpicas, sem nenhum contedo prtico para atividade profissional do cidado policial, e o que pior, sem uma indicao metodolgica que o transporte do campo filosfico para o real. Apesar disso, no entanto, podemos afirmar hoje que o policial de uma forma geral ouviu falar de Direitos Humanos, mesmo que teoricamente, porm no vislumbra como esse discurso poderia ser incorporado a sua prtica diria profissional, principalmente porque no percebe a dimenso pedaggica de sua profisso para a construo de uma sociedade democrtica, restringindo-se a encarar sua atividade como a de um caador de bandidos e lixeiro da sociedade, como, alis, a maioria da sociedade assim o tem. A partir da segunda hiptese levantada, qual seja, que h discordncia entre os policiais dos procedimentos prticos e legais de proteo dos Direitos Humanos, importante encarar o tema sem preconceitos e corporativismo.43Ministrio da Justia

Buscar explicaes para as distores e enfoques equivocados das pessoas sobre o tema, mesmo que passe pela anlise crtica das prticas adotadas por aqueles que lutam para manter acessa luz dos Direitos Humanos. Helena Singer, pesquisadora do Ncleo de Estudos da Violncia USP, alerta que a prtica conservadora da penalizao, faz parte do discurso da militncia dos Direitos Humanos. Na discusso sobre o racismo, busca-se leis mais severas visando punir aqueles que discriminam; na proteo contra a violncia policial, procura-se ampliar o conceito do crime de tortura; contra o desrespeito mulher cria-se leis que regulamentem a prtica do assdio sexual, e vai por ai. No que se reprove a elaborao de instrumentos formais que regulem a vida em sociedade, principalmente em um pas como o nosso, repleto de disparidades sociais e desrespeito aos mais pobres, mas o que Helena Singer enfatiza que a penalizao se tornou o centro do debate em torno dos Direitos Humanos, e as prticas denunciativas o nico instrumento de proteo desses direitos. Ou seja, Os discursos e as prticas sobre os Direitos Humanos no chegam populao sob a forma de igualdade, felicidade e liberdade mas sim, de culpabilizao, penalizao e punio, integrando um movimento mundial de obsesso punitiva crescente.(Helena Singer) Refora essa idia Srgio Adorno ao discorrer sobre a viso punitiva existente entre aqueles que defendem os Direitos Humanos e os outros contrrios. Nos cenrios e horizontes reveladores dos confrontos entre defensores e opositores dos Direitos Humanos inclusive para aqueles encarcerados, julgados e condenados pela justia criminal, tudo converge para um nico e mesmo propsito: o de punir mais, com maior eficincia e maior exemplaridade. No entanto, como podem os defensores dos Direitos Humanos criticar as prises e a prtica do encarceramento e buscarem unicamente nela a soluo para a reduo das violaes dos Direitos Humanos? Dizem eles mesmos: a priso ineficaz, cara, desumana, degradante. Alis, foi por essas crticas que acabaram sendo identificados como defensores de bandidos (Helena Singer) Por outro lado, como podem conceber tal prtica coercitiva, sem a ao de um Estado forte, por intermdio de sua polcia? Alis, nesse ponto, engrossam o coro daqueles que hostilizam e descriminam a fora pblica. Mas que simplesmente denunciar as violaes dos Direitos Humanos praticados pelos policiais e clamar pela priso dos violadores, h de se buscar discutir aes efetivas de reduo dessa prtica, ou seja, construir o como fazer para modificar a cultura de violncia e represso existente, no s no entremeio policial mas na sociedade como um todo. Inclui-se nesse vis a44

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reformulao dos mtodos de treinamento e tcnicas de emprego da fora policial. Conclui Helena: No seria mais coerente centrar os esforos para construir outras formas de os agressores restiturem suas vtimas e a sociedade como um todo pelos danos que causaram? Ou, melhor ainda, no seria mais conveniente buscar formas de tornar a prpria sociedade intolerante com esse tipo de comportamento, fazendo o forte investimento na educao para a cidadania, sugerida por Ribeiro?. Ou ainda, que tenham na polcia uma aliada na construo de uma sociedade cidad, promovendo esforos que visem contribuir para as mudanas no aparelho policial do Estado e a valorizao dos seus integrantes, encarando-os como legtimos representantes do poder de um Estado democrtico e indivduos tambm sujeitos de direito e proteo. Nessa perspectiva, qual seja, de adoo de mecanismos de proteo dos Direitos Humanos limitado, sob uma perspectiva polarizada, preconceituosa e rancorosa, contra as foras p