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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS NÚCLEO INTERINSTITUCIONAL DE ESTUDOS DA VIOLÊNCIA E CIDADANIA CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM GESTÃO DE SEGURANÇA
PÚBLICA
A LEGÍTIMA DEFESA E A POLÍCIA
Autor: MÁRIO DERMEVAL ARAVECHIA DE RESENDE
Cuiabá-MT
2015
1
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS NÚCLEO INTERINSTITUCIONAL DE ESTUDOS DA VIOLÊNCIA E CIDADANIA CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM GESTÃO DE SEGURANÇA
PÚBLICA
A LEGÍTIMA DEFESA E A POLÍCIA
Monografia apresentada como
requisito obrigatório para a obtenção
do título de Especial ista em Gestão
de Segurança Pública, pela UFMT –
ICHS, sob a orientação da
Professora Maria Aparecida de
Amorim Fernandes
MÁRIO DERMEVAL ARAVECHIA DE RESENDE
Cuiabá-MT
Janeiro/2015
2
MÁRIO DERMEVAL ARAVECHIA DE RESENDE
A LEGÍTIMA DEFESA E A POLÍCIA
Monografia submetida à Banca Examinadora e julgada
adequada para a concessão do Grau de ESPECIALISTA EM GESTÃO
DE SEGURANÇA PÚBLICA.
Nota Obtida):________
_________________________________________
Profª. Maria Aparecida de Amorim Fernandes
__________________________________________
Prof. Examinador
__________________________________________
Prof. Examinador
3
À minha família
4
“UMA NAÇÃO QUE CONFIA EM SEUS
DIREITOS EM VEZ DE CONFIAR EM
SEUS SOLDADOS, ENGANA-SE A SI
MESMA E PREPARA A PRÓPRIA
QUEDA”. (RUY BARBOSA)
5
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 10
CAPITULO 1
DO CRIME E SEUS ELEMENTOS ....................................................................... 12
1.1 Do conceito de crime ................................................................................ 12
1.2 Dos elementos do crime ........................................................................... 13
1.2.1 Fato típico .................................................................................................. 13
1.2.2 Culpabilidade ............................................................................................. 13
1.2.3 Ilicitude ....................................................................................................... 14
1.2.3.1 Do conceito de ilicitude ....................................................................... 14
1.2.3.2 Das causas de exclusão da Ilicitude ................................................... 15
1.2.3.3 Das causas supralegais ....................................................................... 16
CAPÍTULO 2
DA LEGÍTIMA DEFESA........................................................................................ 17
2.1 Do conceito de legítima defesa ............................................................... 17
2.2 Do histórico da legítima defesa .............................................................. 18
2.3 Da natureza jurídica e fundamento ......................................................... 18
2.4 Dos elementos da legítima defesa .......................................................... 19
2.5 Da legitima defesa x Do estado de necessidade ................................... 20
2.6 Da legítima defesa x Do estrito cumprimento do dever legal ............... 20
2.7 Dos requisitos da legitima defesa........................................................... 21
2.7.1 Dos bens tuteláveis .................................................................................. 21
2.7.2 Da atualidade ou iminência ..................................................................... 23
2.7.3 Dos meios necessários ............................................................................ 24
2.7.4 Da moderação ........................................................................................... 24
2.7.5 Da defesa de outrem ................................................................................ 25
2.7.6 Dos elementos subjetivos ...................................................................... 26
2.8 Das espécies de legítima defesa ............................................................. 27
2.8.1 Da legítima defesa putativa ..................................................................... 27
2.8.2 Dos ofendículos ........................................................................................ 27
6
2.8.3 Da legítima defesa recíproca ................................................................... 28
2.8.4 Da legítima defesa sucessiva .................................................................. 29
2.8.5 Da legítima defesa da honra .................................................................... 29
2.8.6 Da legítima defesa da honra no adultério ............................................... 30
2.8.7 Da justiça com as próprias mãos ............................................................ 32
2.8.8 Da legítima defesa de terceiro e do consentimento do ofendido ......... 32
CAPÍTULO 3
DO EXCESSO NA LEGÍTIMA DEFESA ............................................................... 34
3.1 Do conceito de excesso ........................................................................... 34
3.2 Dos tipos de excesso ............................................................................... 34
3.2.1 Do excesso intensivo ............................................................................... 35
3.2.2 Do excesso extensivo .............................................................................. 35
3.2.3 Do excesso exculpante ............................................................................ 36
3.2.4 Do excesso culposo ................................................................................. 37
3.2.5 Do excesso doloso ................................................................................... 37
CAPÍTULO 4
A LEGÍTIMA DEFESA E A POLÍCIA ................................................................... 39
4.1 Breve comentário sobre o artigo “A Arma e a Flor” ................................. 46
4.2 Breve comentário sobre o artigo “Polícias brasileiras matam quatro
vezes mais que a dos EUA” .............................................................................. 48
4.3 Breve comentário sobre artigo de instrutor de tiro da Polícia Federal
“Quem quiser que faça o meu trabalho” ........................................................... 49
4.4 Breve comentário sobre o artigo “Abuso policial mancha direitos
humanos no Brasil, dizem EUA” ........................................................................ 52
4.5 O sequestro do ônibus 174 ......................................................................... 53
4.6 Policiais que participaram do massacre do Carandiru são condenados
a 48 anos de prisão ............................................................................................ 55
4.7 Vídeo do policial baleando bandido que roubou moto ............................ 56
4.8 Delegado mata criminoso durante assalto ............................................... 57
4.9 PM é preso suspeito de matar ambulante durante tumulto em SP ......... 58
4.10 “Na melhor das hipóteses foi despreparo” ............................................... 59
7
4.11 Homem morre após ser imobilizado por pistola taser na cidade de
Florianópolis ........................................................................................................ 61
4.12 Confronto polícia e manifestantes deixa 37 feridos ................................. 62
CONCLUSÃO ....................................................................................................... 64
REFERÊNCIAS ..................................................................................................... 68
8
RESUMO
Este trabalho apresenta um estudo sobre a legít ima defesa e sua
util ização por parte da polícia . Iniciamos realizando levantamento
doutrinário sobre as teorias do crime e verif icamos que este é um fato
típico, i l ícito e culpável. Desse entendimento, verif icamos que a
legítima defesa encontra-se como uma excludente da il ici tude,
excludente esta que afasta a il icitude do fa to típico. A pesquisa
bibl iográf ica indica que o legislador, para evitar que a legít ima defesa
fosse util izada de maneira abusiva, cuidou de criar elementos
essenciais para a justif icante. Dessa forma, se depois de iniciada,
forem ultrapassados alguns dos elementos necessários, nasce o
excesso na legítima defesa. Também, abordamos o poder de polícia
atribuído ao policial através da Constituição Federal, procurando
delimitar até onde seria legít ima sua aplicação. Por f im, procurou -se, a
partir de artigos e matérias jornalísticas , efetuar uma análise de alguns
casos envolvendo policiais que acabam por util izarem -se da força, e de
como este prof issional tem se saído em ações relacionadas à
excludente de il icitude abordada.
Palavras-chave: Legít ima defesa. Legitima defesa e a polícia.
I l icitude.
9
ABSTRACT
This paper presents a study about self -defense and its use by police
off icers. We began with a doctrinal survey about the crime theories and
we verif ied that it is a typical fact, i l legal and culpable. Thus, we
verif ied that self -defense works as an excluder of i l legality, this
excluder removes the il legality of the typical fact. The research
indicates that the legislator, to avoid that self -defense is used in an
abusive way, created essential elements to the proof. As a result, if
after it was started, some of the necessary elements were exceeded,
the excess of self -defense is originated. We also addressed to the
police powers that are assigned to the police off icers through The
Federal Constitution, we tried to delimit its applicat ion to check its
authenticity. At last, an analysis of the everyday police off icer’s l ife was
made, we also researched about how this safety professional has been
acting in actions related to the i l legality excluder that was mentioned.
Articles and newspapers publicat ions were col lected and related to the
theme.
Key words: Typical fact. I l legality. Culpability. I l legality excluder. Self -
defense. Police.
10
INTRODUÇÃO
A lei brasi leira prevê como sendo causas de exclusão de
il icitude o disposto junto ao artigo 23 do Código Penal. Diz a lei que o
agente, quando praticar atos típicos para o Direito Penal e que por
ventura se encontrem previstos junto ao artigo 23 do Código Penal
Brasileiro, terá excluída a ilegit imidade de sua ação, ou seja, mesmo o
fato sendo típico e culpável, é antijurídico, não sendo o agente
responsabil izado pelos seus atos.
Assim sendo, a lei é clara ao dizer que “não há crime” quando o
agente o pratica em estado de necessidade , estrito cumprimento do
dever legal , exercício regular do direito e legítima defesa , sendo
que esta últ ima será a excludente a ser melhor estudada no presente
trabalho.
Discutiremos a legít ima defesa em seu conceito e espécies,
dando-se enfoque à mesma quando praticada de forma excessiva, de
acordo com que dispõe o artigo 23, § único do Código Penal.
Ainda procuraremos situar o papel do policial brasileir o perante
ações que estejam amparadas pela legít ima defesa, bem como
citaremos casos reais e outras matérias de jornal e art igos onde a ação
policial é deveras questionada, tendo em vista eventuais excessos
cometidos.
Neste sentido, em nossa conclusão, procuraremos analisar qual
tem sido a postura do policial brasileiro quando em ações que
envolvam a excludente da legítima defesa.
Diante do que foi brevemente exposto, apresentamos os quatro
capítulos que dividirão este trabalho, sendo que:
O primeiro capítulo def inirá os conceitos de crime, dando-se
destaque a um de seus elementos, a il ic itude, mostrando o seu
enquadramento jurídico e suas causas de exclusão, dando -se ênfase
aos aspectos objetivos e subjet ivos, bem como aos elementos
definidores fundamentais para a garantia da exclusão da antijudicidade.
O segundo capítulo conceituará a legít ima defesa. Neste
mesmo capítulo, também será estudada sua natureza jurídica e seus
11
fundamentos, que são a garantia dos direitos individuais e da ordem
pública. Também mencionaremos, neste capítulo, as diferenças entre a
legítima defesa, o estado de necessidade e por f im o estrito
cumprimento do dever legal. Prosseguiremos analisando os requisitos
da legítima defesa, abordando os bens tuteláveis, a moderação, a
proporcionalidade, o excesso não punível, os meios necessários, a
injusta agressão e a atualidade ou iminência nas ações que invocam a
legítima defesa. Por f im, relacionaremos as espécies de legít ima
defesa.
O terceiro capítulo tratará do excesso na legítima defesa, bem
como definirá os seus t ipos. Definiremos os excessos intensivo ,
extensivo, exculpante, doloso e culposo.
O quarto capítulo abordará as atribuições dadas ao policial por
meio da Constituição Federal Brasi leira, definindo o que vem a ser
Poder de Polícia, bem como de que forma o policial deveria ut il izá -lo de
forma lícita. Prosseguiremos pesquisando, em art igos e notícias de
jornais, casos relacionados ao cotidiano policial brasi leiro, dando -se
ênfase a ações que envolvam prof issionais de segurança pública , que,
em trabalho ou fora dele, agiram em legít ima defesa de seu s interesses
ou de terceiros.
Concluiremos este trabalho buscando analisar, nos dias atuais, a
violência exacerbada presente cotidianamente na ação policial , bem
como a sensação de insegurança que acaba afetando em cheio a forma
de se “encarar” uma injusta agressão. Ainda, como a forma como isto
vem afetando o comportamento policial , procurando, com tudo que se
expôs, responder ao questionamento a que se propõe.
12
CAPITULO 1
DO CRIME E SEUS ELEMENTOS
1.1 Do conceito de crime
Para que uma conduta seja passível de punição, deverá já haver
uma prévia definição legal de que aquilo é crime. Só assim é que será
possível sua aplicação em desfavor de quem a enfrentou. Ocorre que o
Código Penal Brasileiro não possui , em seu bojo, nenhum conceito do
que venha a ser crime, cabendo ao doutrinador tal definição. Vejamos o
que diz NUCCI:
Em verdade, é a sociedade a criadora inaugural do crime, qualificativo que reserva às condutas ilícitas mais gravosas e merecedoras de maior rigor punitivo. Após, cabe ao legislador transformar esse intento em figura típica, criando a lei que permitirá a aplicação do anseio social aos casos
concretos.1
Complementando, NUCCI conceitua CRIME de forma completa
como sendo:
Trata-se de uma conduta típica, antijurídica e culpável, vale dizer, uma ação ou omissão ajustada a um modelo legal de conduta proibida (tipicidade), contrária ao direito (antijuricidade) e sujeita a um juízo de reprovação social incidente sobre o fato e seu autor, desde que existam imputabilidade, consciência potencial de ilicitude e exigibilidade e possibilidade de agir
conforme o direito.2
Assim, podemos f inal izar dizendo que a formatação do que
venha a ser crime independe de fatores naturais, sendo a própria
sociedade a sua fundadora, responsável por defini -lo, aplicando às
condutas típicas uma punição. Tal formatação cabe ao legislador, que é
quem procederá a esta “tradução” entre o que a sociedade como um
todo deseja e a aplicação da punição a quem afronta a lei.
1 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Direito Penal. 2. ed. São Paulo: RT, 2006. p. 157.
2 idem. p.158.
13
1.2 Dos elementos do crime
O crime é constituído de 03 (três) elementos, sendo eles a
TIPICIDADE, CULPABILIDADE e a ILICITUDE (anti juridicidade). Assim,
para que seja considerado crime, o fato deverá ser considerado típico,
i l ícito e culpável. Veremos abaixo e de forma detalhada cada um destes
elementos.
1.2.1 Fato típico
Tipicidade nada mais é do que a prática de uma conduta em
consonância com o que diz a lei, ou seja, ocorre quando a ati tude do
agente se encaixa no que a define como crime. Segundo NUCCI:
É a descrição abstrata de uma conduta, tratando-se de uma conceituação puramente funcional, que permite concretizar o princípio da reserva legal (não há crime sem lei anterior que o defina). [...] Note-se que o tipo não cria a conduta, mas apenas a valora, transformando-a em crime.
3
1.2.2 Culpabilidade
Sendo o fato típico e il ícito, por f im é necessário verif icar se a
ação é culpável, devendo-se estarem presentes os seguintes elementos
essenciais da culpabilidade, quais sejam: a) imputabil idade; b)
potencial consciência sobre a i l icitude do fato; c) exigibil idade de
conduta diversa. Segundo NUCCI, “a culpabilidade é, ao mesmo tempo,
fundamento da pena, pois elemento do crime, e l imite da pena, por
representar grau de censura do fato e de seu autor ”.4
3 NUCCI, Gui lherme de Souza. Código Penal Comentado , 14ª Edição, São Paulo,
Edi tora Forense, 2014 , pag. 146. 4 idem, pag. 107.
14
1.2.3 Ilicitude (antijuridicidade)
Para se confirmar se uma ação é ilícita, deve -se verif icar se não
há a presença de nenhuma das excludentes de i l icitude dispostas junto
ao artigo 23 do CP, quais sejam, o estado de necessidade, a legít ima
defesa, o estrito cumprimento de dever legal e o exercício regular de
direito. Se estiverem presentes, não há que se falar em crime. A seguir,
conceituaremos a il ici tude, para que assim possamos seguir nosso
caminho neste estudo em busca da eximente da legít ima defesa.
1.2.3.1 Do conceito de ilicitude
A il icitude (também chamada de antijudicidade ) nada mais é do
que contrariedade da conduta com o ordenamento jurídico. Melhor
explicando, podemos dizer que o termo ANTI, vem de contrário,
enquanto que o termo JURIDICIDADE, refere -se a legalidade, l icitude.
Ocorre que o conceito de anti juridicidade é mais amplo, não f icando
restrito apenas ao Direito Penal, sendo de natureza civi l, comercial,
tributária etc. Se o agente, ao praticar uma atitude comissiva ou
omissiva, ferir o t ipo legal, estaremos diante da antijuridicidade penal .
Como já vimos anteriormente, a ilicitude é um dos três elementos que
constituem o crime, sendo os demais a culpabilidade e a tipicidade .
De maneira objet iva, Guilherme de Souza NUCCI define il ici tude
como sendo:
É a contrariedade de uma conduta com o direito, causando lesão a um bem jurídico protegido. Trata-se de um prisma que leva em consideração o aspecto formal da antijuridicidade (contrariedade da conduta com o direito), bem como seu lado material (causando lesão a um bem jurídico tutelado).
5
5 idem, pag. 234.
.
15
1.2.3.2 Das causas de exclusão da ilicitude
Na falta de um dos elementos fundamentais de constituição do
crime, no caso a i l ic itude, t ipicidade e a culpabilidade, não podemos
falar em crime. Todas as condutas previstas em lei, são via de regra,
condutas típicas. Podemos citar como exemplo o sujeito que pratica um
crime de homicídio. Havendo em tal prática uma conduta excludente de
antijuridicidade, esta conduta deixa de ser criminosa. As causas de
exclusão de i l icitude são tratadas como causas just if icativas e, nesta
hipótese, o agente pode ser isentado do crime que cometeu. As causas
excludentes de i l ici tude também são denominadas como causas
eximentes, descriminantes, causas de exclusão de crime, t ipos
permissivos, tratando-se todos de nomes sinônimos. O art. 23 do
Código Penal prevê todas as excludentes de antijuridicidade, senão
vejamos:
Art. 23 - Não há crime quando o agente pratica o fato:
I - em estado de necessidade;
II - em legítima defesa;
III - em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito.
Excesso punível
Parágrafo único - O agente, em qualquer das hipóteses deste artigo,
responderá pelo excesso doloso ou culposo.6
No mesmo art igo observa-se que estão expressos, além da
legítima defesa, o estado de necessidade, o estrito cumprimento do
dever legal e o exercício regular do direito. No artigo seguinte, no caso
o artigo 24 do Código Penal, o estado de necessidade obtém sua
definição legal, o mesmo ocorrendo no art igo 25 para a legít ima defesa.
Quanto às demais causas de exclusão de i l icitude, não há previsão
legal, cabendo à doutrina e à jurisprudência suas respectivas
definições.
Há, também, as causas de exclusão de culpabilidade ou
imputabil idade e ocorrem, diferentemente das hipóteses previstas junto
6 Decreto Lei nº 2.848 de 07 de Dezembro de 1940 – Código Penal Brasileiro
16
ao artigo 23 do CP, em casos de doença mental, desenvolvimento
mental retardado ou incompleto, dependência ou intoxicação por
drogas il ícitas, embriaguez completa ocasionada por caso fortuito,
embriaguez patológica e, por f im, a menoridade. Encontram-se
dispostas junto aos art igos 26, 27 e 28 do CP e não se confundem com
as excludentes de i l icitude previstas no artigo 23 do CP, tendo em vista
que, nesta situação (de exclusão de culpabil idade), o crime ainda
persiste, porém os autores não são passiveis de punição.
1.2.3.3 Das causas supralegais
As causas supralegais de exclusão de il icitude são aquelas
just if icativas de condutas humanas que ultrapassam a descrição legal.
Não se encontram elencadas junto ao Art. 23 do Código Penal, mas
devem ser consideradas, tendo em vista seu relevante valor para a
sociedade. Podemos citar como exemplo o consentimento do ofendido
quando a vítima vê seu bem jurídico sendo atacado , mas não se
importa com isso. Segundo Aníbal Bruno:
Os crimes contra o patrimônio constituem a grande categoria de fatos cuja antijuricidade pode ser impelida pelo consentimento. Aí, o interesse predominante é evidentemente de ordem privada, salvo os casos de exceção, em que o interesse público torna o bem irrenunciável. Mesmo naqueles em que o fato de ser o ato do agente contrário à vontade do ofendido não é elemento do tipo, o consentimento exclui a possibilidade de crime, por ausência de antijuricidade. Não há, por exemplo, crime de dano, se o dono da coisa consente na sua destruição, nem viola direito de autor quem age com o consentimento do titular do bem.
7
Assim sendo, podemos concluir dizendo que o agente, ao
defender a si ou a terceiro, em um caso em que o esteja fazendo em
ação de legít ima defesa, deverá ter plena consciência do que se passa,
agindo de forma lúcida e sabedora de que está se defendendo ou
valendo-se de um direito ou dever o qual lhe é disponível legalmente.
7 BRUNO, Aníbal, Direito penal, volume I, 1967, pág. 21.
17
CAPÍTULO 2
DA LEGÍTIMA DEFESA
2.1 Conceito de legítima defesa
O Estado, a part ir do momento em que chamou para si a
responsabil idade de promover justiça, aplicando -se a lei ao caso
concreto, visou assim acabar com a prática da vingança privada.
Ocorre que não há como este Estado estar em todos os locais de forma
completa e através de seus agentes, sendo assim facultado ao
agredido que possa reagir, pois do contrário , o direito haveria de ceder
ao injusto, circunstância esta, inadmissível. Segundo Guilherme de
Souza NUCCI, legít ima defesa consiste :
[...] é a defesa necessária empreendida contra agressão injusta, atual ou iminente, contra direito próprio ou de terceiro, usando para tanto, moderadamente, os meios necessários. Trata-se de mais tradicional exemplo de justificação para a prática de fatos típicos. Por isso sempre foi acolhida, em inúmeros ordenamentos jurídicos, desde o direito romano, passando pelo canônico, passando pela legislação moderna. Valendo-se da legítima defesa, o indivíduo consegue repelir agressões indevidas a direito seu ou de outrem, subsistindo a atuação da sociedade e do estado, que não pode estar em todos os lugares ao mesmo tempo, através de seus agentes. A ordem jurídica precisa ser mantida, cabendo ao particular assegurá-la de modo eficiente e dinâmico.
8
A legít ima defesa vem assim assegurar à vít ima o direito de se
autodefender, porém, esta defesa terá regras que deverão ser
obedecidas. Observemos o tipo penal disposto junto ao artigo 25 do
Código Penal:
Artigo 25 – Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem. (Redação dada pela Lei de nº 7.209/84)
9
8 NUCCI, Guiherme de Souza, Código Penal Comentado, 14 Ed., 2014, pag 244.
9 Decreto Lei nº 2.848 de 07 de Dezembro de 1940.
18
2.2 Do histórico da legítima defesa
A legítima defesa, na antiguidade, encontrava-se relacionada às
práticas dos crimes de homicídio e de agressões f ísicas. Porém, com o
passar dos anos, sofreu mudanças, evoluindo. Encontram-se
referências da legitima defesa nas legislações das mais antigas
civil izações, como na Lei Mosaica, no Código de Manu, nas Leis
atenienses de Sólon, bem como nas legislações do mundo antigo. Até
mesmo na Bíblia é possível encontrarmos passagens que nos remet em
ao tema legít ima defesa, senão vejamos: “Se o ladrão for achado a
minar e for ferido e morrer, o que o fe riu não será culpado do sangue ”. 10
Segundo Cícero, a legítima defesa correspondia à:
Lei sagrada, lei não escrita, mas que nasceu com o homem, lei anterior aos legistas, à tradição, aos livros, e que a natureza nos oferece gravada em seu código imortal [...] lei pensada num perigo iminente, preparado pela astúcia ou pela violência, sob o punhal da cupidez ou do ódio, diante disso todo meio de salvação é legítima.
11
2.3 Da natureza jurídica e fundamento
A legítima defesa, por lei, constitui causa de exclusão da
il icitude prevista pelo art igo 23, II do Código Penal, estando por
completo definida junto ao artigo 25: “Entende-se em legítima defesa
quem, usando moderadamente os meios necessários, repele injusta
agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem”. Guilherme de
Souza NUCCI bem a define como sendo:
[...] a defesa necessária empreendida contra agressão injusta, atual ou iminente, contra direito próprio ou de terceiro, usando, para tanto, moderadamente, os meios necessários.
E prossegue melhor explicando:
10
LEITE,José Edivânio - Do excesso na legítima defesa- disponível em ARTIGONAL - http://www.artigonal.com/doutrina-artigos/do-excessona-legitima-defesa-1369246.html – acesso em 23/07/2014. 11
Disponível em: http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=6346. Acessado em 26/01/2015.
19
Valendo-se da legítima defesa, o indivíduo consegue repelir as agressões a direito seu ou de outrem, substituindo a atuação da sociedade ou do Estado, que não pode estar em todos os lugares ao mesmo tempo, através dos seus agentes. A ordem jurídica precisa ser mantida, cabendo ao particular assegurá-la de modo eficiente e dinâmico.
12
Cuida-se assim de um direito natural, legalizado por força da
previsão legal, o respeito à integridade patrimonial, f ísica e , por f im, à
vida. Aliás, quando falamos de integridade física e vida, estamos
tratando-se um direito indeclinável. Assim, mesmo que não houvesse
dispositivo legal estabelecendo a legít ima defesa, a util ização dela
seria identicamente util izada, mesmo que posteriormente o agente
viesse a responder na esfera criminal perante o Estado , visto que,
conforme os dizeres de ZAFARONI: “[ ...] ninguém pode ser obrigado a
suportar o injusto ”. 13
Já Damásio Evangelista de JESUS define a natureza jurídica da
legítima defesa como sendo:
Entendemos que a legít ima defesa const i tui um dire ito e causa de exc lusão da ant i jur id ic idade. O homic íd io comet ido em legít ima defesa é voluntár io, não se cast igando o autor porque se fundamenta na conservação da ex istência
14.
2.4 Dos elementos da legítima defesa:
Quanto aos elementos, podemos dizer que são eles os relat ivos
à agressão (que poderá ser injusta, atual ou iminente e a direito seu
ou de outrem), à repulsa (uti l izando-se moderadamente dos meios
necessários) e ao ânimo do agente (elemento subjetivo que consiste
na vontade de se defender), conhecido por animus defendi , os quais
melhor explicaremos a seguir.
12
NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: parte geral: parte especial – São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2005, p. 222 13
ZAFFARONI, Eugênio Raul. Manual de Direito Penal-Parte Geral- Volume 1. Rio de Janeiro, Editora RT, 2007,Página: 499. 14
JESUS, Damásio E. de. Direito Penal, Vol. I. 18ª Edição, São Paulo, Editora Saraiva, 2007, pag.
383.
20
2.5 Da legitima defesa x Do estado de necessidade
Enquanto no estado de necessidade há um conflito entre vários
bens jurídicos diante de uma situação de perigo, na legít ima defesa há
a ameaça ou ataque, por parte de pessoa imputável, a um bem jurídico,
podendo este ser inclusive de outrem. Neste, trata-se de agressão
oriunda de ser humano, com destinatário certo, sendo os interesses do
agressor clandestinos.
No estado de necessidade, a agressão não é prevista e o perigo
advém tanto de um humano, como de um animal ou evento da natureza.
Encontra-se previsto no artigo 23, I, do Código Penal, sendo tipif icado
no artigo 24 da mesma Lei.
Na legítima defesa por sua vez, é obrigatório a existência do
requisito subjet ivo por parte do que se defende, ou seja, o mesmo
deverá ter consciência, conhecimento da situação do fato justif icante,
agindo conforme preceitua o Código Penal em seu artigo 25. Nos
dizeres de Celso DELMANTO:
Na legítima defesa há uma reação em face de uma agressão, enquanto no estado de necessidade existe ação em razão de um perigo e não de uma agressão. Portanto, a legítima defesa só é válida contra uma agressão humana. Já o estado de necessidade decorre de uma ação de qualquer outra causa que não seja uma agressão por parte de alguém.
15
2.6 Da legítima defesa X Do estrito cumprimento do dever legal
O estrito cumprimento do dever legal encontra -se disposto junto
ao artigo 23 do Código Penal, tratando-se de uma das quatro causas de
excludentes de i l ici tude, consistindo na realização de fato tipif icado em
lei, por força de uma obrigação legalmente imposta.
NUCCI conceitua o estrito cumprimento do dever legal como
sendo: “Trata-se de ação praticada em cumprimento de um dever
15
DELMANTO Celso, Código Penal Comentado. 6. ed. Rio de Janeiro, Ed. Renovar, 2002, pág. 49.
21
imposto por lei penal ou extrapenal, mesmo que cause lesão ao bem
jurídico de terceiro ”16.
Já FÜHRER afirma que:
[...] não há crime quando o agente pratica o fato em estrito cumprimento do dever legal, como no caso do policial que prende em flagrante ou que revida
a tiros de assaltante e acaba matando um deles17.
ALVARENGA, por sua vez, diverge de FÜHRER quando cita o
exemplo da atividade Policial Mil itar, af irmando o seguinte:
[...] o policial que fere ou mata alguém que resiste, de forma violenta, à prisão em flagrante pode alegar, em seu favor, o contratipo imperativo do estrito cumprimento de dever legal? Não, pois inexiste, no caso, norma jurídica que determine ferir ou matar. A conduta do policial perfaz, então, um fato típico de lesão corporal ou de homicídio, embora justificado pela legítima defesa, se ocorrerem, é claro, os requisitos desta causa de exclusão da antijuridicidade. Quero crer, contudo, que o cumprimento do dever legal de efetuar a prisão em flagrante, e que, associado à violenta resistência, legitima a reação de defesa oposta pelo policial, merece impedir que se produza a função própria da tipicidade de ser indiciária da ilicitude do fato.
18
2.7 DOS REQUISITOS DA LEGITIMA DEFESA
2.7.1 Dos bens tuteláveis
Faz-se necessário observamos que o bem jurídico mais
importante a ser tutelado pelo ser humano é a vida. Porém , nem
sempre isto ocorreu, sendo que, no passado, a vida humana tinha
pouco valor, menos que bens materia is valiosos. Na idade média, por
exemplo, a vida humana nada valia, conforme observamos a seguir , no
relato de MEREJÉ:
16
NUCCI, Gui lherme de Souza. Código Penal Comentado, 14ª Edição, São Paulo, Edi tora Forense, 2014, pag. 244. 17
FÜHRER, Maximil ianus Cláudio Américo; FÜHRER, Maximil iano Rober to Ernesto. Resumo de d ire ito penal . 15 ed. São Paulo: Malheiros, 1999, pag. 84 18
ALVARENGA, Dílio Procópio Drummond de. Teoria da contratipicidade penal. Disponível em JUS NAVIGANDI - http://jus.com.br/artigos/963 - Acessado em 07/12/2014.
22
Na idade média, a vida humana nada valia. Duelava-se a três por dois, por me dá lá aquela palha. Quem não afivelasse no rosto um título de nobreza, não possuía nenhuma dignidade. O maior delito, naquela época de misticismo e de obscurantismo, era a blasfêmia. A feitiçaria incorria em penalidade gravíssima. Somente nos tempos modernos se proclama a
dignidade humana e a vida humana constitui o maior bem.19
Atualmente, isto seria inconcebível, sendo o bem da vida
indiscutivelmente o bem mais precioso, incomparável com qualquer
outra propriedade jurídica. Ocorre que, além da vida, há diversos
outros bens passiveis de tutela pelo ser humano, pod endo ser
defendidos legit imamente por quem quer que seja , conforme
AMARANTE:
São defendidos legitimamente quaisquer direitos do individuo, inclusive a
prova de direitos, as pretensões, ações, exceções. Pode ser a própria
pessoa, os direitos de personalidade, o patrimônio, os direitos públicos ou
privados, a posse, os direitos obrigacionais.” 20
Podemos discriminar, como bens tuteláveis passíveis de
Legít ima Defesa, vários itens, a começar pela vida, como já citado.
Também podemos tutelar as diversas formas de liberdade (pessoal, de
correspondência, de trabalho), a propriedade, a honra, os direitos
cívicos etc. Segundo AMARANTE:
Não tem importância se a ameaça consiste em agressão corporal de leve
gravidade, ou mediana arma, se é contra a propriedade, contra a honra,
contra a vida; a legítima defesa é consentida em qualquer caso.”21
Quanto à tutela do bem da vida, vale destacar que , quando da
defesa própria, o instituto da legítima defesa venha , em dados
momentos, a se confundir com a também excludente de il icitude do
estado de necessidade, visto que ambas possuem as mesmas
peculiaridades. A integridade física e a saúde, tal qual como a vida,
constituem relevante valor social, sendo passíveis de defesa própria.
19
MEREJÉ, João Rodrigues de. Legítima Defesa, 2ª ed. São Paulo, Ed.Linográfica, 1962, pag 33. 20
AMARANTE, Aparecida. Excludentes da Ilicitude Civil, Legítima Defesa\Exercício Regular De Direito Reconhecido: Estado de Necessidade: Doutrina Prática, 2ª ed. Belo Horizonte: Del Rey, 1999, pag. 53. 21
idem
23
Assim, são perfeitamente tutelados, podendo citar, neste
contexto, a prát ica da legít ima defesa em casos de crimes de lesão
corporal e tentativa de homicídio, dentre outros. Quanto à liberdade,
trata-se de preceito previsto em nossa Constituição Federal , que nos
legit ima a ir e vir, sem rest rições. A l iberdade constitui direito de suma
importância, sendo qualquer atitude que possa cerceá -la, passível de
legítima defesa. Quanto ao patrimônio, o artigo 5º da Constituição
Federal Brasi leira diz:
Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes.22
Assim sendo, a propriedade ou o patrimônio são bens
perfeitamente alcançados pela Legít ima Defesa. MEJERÉ acrescenta:
O patrimônio constitui o conjunto de bens utilizados pelo individuo, para
satisfazer às suas necessidades vitais. O bem material que avulta sobre os
demais, pela sua importância, embora fosse muito maior noutras eras do
que no presente, é a propriedade fundiária, a propriedade da terra, do
solo.23
2.7.2 Da atualidade ou iminência
Refere-se ao que está ocorrendo ou ao que está prestes a
ocorrer. Diferentemente do estado de necessidade, a legítima defesa
admite duas formas de agressão: a atual e a iminente. Assim sendo,
conclui-se que não há possibi l idade de se agir em legítima defesa em
caso de agressão futura ou passada, sendo que , neste últ imo caso,
tratar-se-ia de evidente prática de vingança.
22
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm - acessado em 06/12/2014. 23
MEREJÉ, João Rodrigues de. Legítima Defesa.2ª ed. São Paulo: Linográfica Editora, 1962, pag 36.
24
A reação deve ser imediata à agressão ou tentativa dela; a demora na reação desfigura a discriminante. Quem, provocado pela vítima, se dirige à sua residência, apanha uma arma e volta para o acerto de contas não age licitamente. Só estará protegido pela lei, aquele que reagir a uma agressão injusta. Injusta é a agressão não autorizada pelo direito.
24
2.7.3 Dos meios necessários
Meios necessários são aqueles que, na atualidade ou iminência
de sofrer uma agressão injusta, a vít ima tenha ao seu dispor para agir.
São aqueles ef icazes e suficientes naquele momento para fazer cessar
a agressão. Diferentemente do que ocorre no estado de necessidade,
não se exige a fuga da vít ima na legítima defesa, até por que a mesma
está sofrendo uma agressão injusta.
Neste sentido, NUCCI diz que:
Meios necessários são os eficazes e suficientes para repelir a agressão ao direito, causando o menor dano possível ao atacante. [...] O agressor pode estar, por exemplo, desarmado, e mesmo assim a defesa ser realizada com o emprego de arma de fogo, se esta for o único meio que o agredido tem ao seu alcance. O direito não deve ceder ao injusto, seja a que pretexto for.
25
2.7.4 Da moderação
Para configurar a legít ima defesa, se faz necessária que a
agressão seja atual ou iminente, seguida de injusta agressão da vít ima,
com o uso dos meios necessários e moderados para o resguardo do
bem jurídico atacado, nos termos do artigo 25 do Código Penal.
Assim, podemos definir o uso moderado dos meios, em legítima
defesa, como sendo a razoável proporção entre a defesa empreendida
e o ataque sofrido, sendo prevista no artigo 25 de nosso Código Penal
como sendo a “medida dos meios necessários”. Trata -se da razoável
proporção entre a defesa empreendida e o ataque sofrido. Já aquele
agente que, ao defender-se de uma agressão injusta, atual ou iminente,
se uti l iza de um meio não necessário ou de imoderação, responderá
24
Disponível em http://resumos.netsaber.com.br/resumo-1888/agressao-atual-ou-iminente-de-injusta - acessado em 06/12/2014. 25 NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado, 14ª Edição, São Paulo, Editora Forense, 2014. pag. 258.
25
pelo excesso configurado. Complementando, citamos Guilherme de
Souza NUCCI, que diz:
PROPORCIONALIDADE NA LEGÍTIMA DEFESA. O art. 25 do Código Penal exige uma reação moderada com os meios necessários. Diversamente do previsto pelo estado de necessidade (art. 24, CP), não se demanda "proporcionalidade". Portanto, em tese, se um furtador sair correndo, carregando o produto do crime, poderia a vítima desferir um tiro (meio necessário) para detê-lo, salvando a propriedade. Se ele sofrer lesão corporal, entende-se proporcional, logo, há legítima defesa. Se ele morrer, entende-se desproporcional e o autor do disparo responderá por excesso. Portanto, há de se acrescer, no estudo da legítima defesa, no Brasil, o requisito da proporcionalidade.
26
2.7.5 Da Defesa de Outrem
Tal qual o que define o estado de necessidade, a legít ima defesa
só pode vir a ser invocada por quem estiver defendendo bem ou
interesse juridicamente protegido. A proteção por parte do agente, de
terceiros que sequer conhece , é hipótese admitida em nosso
ordenamento jurídico, por incentivar a solidariedade. A lei procura
prest igiar, através da legítima defesa de terceiro, o sentimento de
solidariedade humana.
NUCCI diz que: “Permitir que o agente defenda terceiros que
nem mesmo conhece é uma das hipóteses em que o direito admite e
incentiva a solidariedade ”27.
Assim, legítima defesa de terceiro é legítima em sua aplicação,
principalmente se o titular do direito ofendido não possuir condições de
defesa no momento. Tal intervenção de terceiro será amparada por lei,
ainda que aquele consinta na lesão, como no caso da prática da
eutanásia.
Quanto ao patrimônio público em face de um dano iminente, é
passível de legít ima defesa, porém, não nos confundamos com a ordem
pública, que, por se tratar de bem indefinido, não é passível de legít ima
defesa.
26
Disponível em: FACEBOOK - https://ptbr.facebook.com/guilhermenucci2/posts/214921671995245. Acessado em: 16/11/2014. 27
NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado, 14ª Edição, São Paulo, Editora Forense, 2014. pag.264.
26
2.7.6 Dos elementos subjetivos
As excludentes de il icitude tem normalmente de serem dotadas
de elementos objetivos, que se referem ao que está disposto no
ordenamento jurídico e de elementos subjetivos, que correspondem à
atuação do agente, consciente do que está fazendo. Assim, só será
possível se excluir a anti ju ridicidade quando houver uma tipicidade
objetiva e subjet iva justif icadora. Desta forma, podemos concluir que é
necessário para que se exclua a il icitude de um f ato típico, além do
disposto em lei (requisitos objetivos), a total ciência da situação
just if icadora por parte do agente . Ou seja: o mesmo deverá estar
agindo sabendo que sua conduta está amparada por uma das situações
excludentes de anti juridicidade.
Assim sendo, conforme COELHO, podemos citar tal
diferenciação da seguinte maneira:
A antijuridicidade, entendida como relação de contrariedade entre o fato e a norma jurídica, tem sido definida, por um setor doutrinário, como puramente objetiva, sendo indiferente a relação anímica entre o agente e o fato justificado. [...]. Por isso, não basta que estejam presentes os pressupostos objetivos de uma causa de justificação, sendo necessário que o agente tenha consciência de agir acobertado por uma excludente, isto é, com a vontade de evitar um dano pessoal ou alheio.
28
Desta maneira, o “animus defendi” vem a ser a consciência,
ciência, o entendimento que a vít ima tem de possuir no momento em
que estiver sofrendo uma agressão injusta. Ou seja, é a vontade que a
mesma possui de se defender. Enquanto os elementos objetivos da
legítima defesa são aqueles previstos junto ao art igo 25 de nosso
Código Penal, os elementos subjet ivos consistem no fato d e a vítima
estar ciente de sua defesa, oriunda de mal injusto. Caso esteja
ausente, o elemento subjet ivo da legítima defesa ou de qualquer outra
causa de just if icação (estado de necessidade, estrito cumprimento do
28
COELHO,Bruna F. Disponível em: http://jus.com.br/artigos/17781/a-legitima-defesa-putativa-como-causa-de-justificacao-exculpante-a-luz-do-direito-penal-brasileiro. Acessado em 23/01/2015.
27
dever legal ou exercício regular do direito), es taremos perante um fato
típico, i l íci to e culpável. Neste sentido, Damásio de JESUS explica que:
Segundo passamos a entender, nos termos do finalismo, a conduta, para justificar a exclusão da ilicitude, deve revestir-se dos requisitos objetivos e subjetivos da discriminante. Assim, não é suficiente que o fato apresente os dados objetivos da causa excludente da antijuridicidade. É necessário que o sujeito conheça a situação justificante.
29
2.8 Das espécies de legitima defesa
2.8.1 Da legítima defesa putativa
Podemos resumi-la como sendo uma atitude equivocada. Neste
caso de legít ima defesa muito comum, o indivíduo imagina estar em
situação de perigo, agindo em legít ima defesa contra uma agressão
inexistente. Trata-se de descriminante putativa, pois há , na
interpretação do agente, a existência de uma situação justif icante,
permissiva legalmente. É também chamado pela doutrina de erro de
proibição indireto ou de permissão. Para ZAFFARONI, trata -se a
legítima defesa putativa de "uma causa de ausência de culpabil idade,
motivada no erro, que impede a compreensão da anti juridicidade da
conduta".30 Neste sentido, podemos dizer que, conforme o disposto nos
artigos 20, § 1º e 21 do Código Penal, quando nos referimos às
descriminantes putativas, “é isento de pena o agente que acredita agir
de modo lícito, supondo situação que, se existente, tornaria legít ima
sua conduta ”31.
2.8.2 Dos ofendículos
É termo proveniente da palavra offendiculum , signif icando
obstáculo, impedimento que visa à proteção de bens e de interesses.
29
JESUS, Damásio E. Direito Penal, 1º Volume, Parte Geral, Saraiva, 23ª. Edição, página 357. 30
ZAFFARONI, Eugenio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual do Direito Penal Brasileiro: parte geral. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 639. 31
Disponível em: http://www.rkladvocacia.com/arquivos/artigos/art_srt_arquivo20100919222603.pdf, Acessado em 26/12/2014.
28
São aparatos instalados para impedir agressão alheia futura. A doutrina
se divide a respeito, sendo que uns os identif icam como sendo uma
causa de legít ima defesa pré-ordenada e outros como sendo forma de
exercício regular do direito. São facilmente perceptíveis, sempre
destinados à defesa da propriedade e de qualquer outro bem jurídico.
Podemos citar como exemplos, cacos de vidro em muros, cercas
elétr icas, cães etc. Quanto aos ofendículos, BITENCOURT
complementa que:
Na verdade, a decisão de instalar os ofendículos constitui exercício regular de direito, isto é, exercício do direito de auto-proteger-se. No entanto, quando se reage ao ataque esperado, inegavelmente, constitui legítima defesa preordenada.
32
No caso dos ofendículos, a moderação sempre deverá estar
presente quando de suas instalações/uti l izações. Assim sendo, os
limites eximentes deverão ser sempre respeitados, pois , em contrário,
caso f ique confirmado o excesso, deixa de exist ir a excludente de
il icitude. Podemos citar como exemplo prática de uma cerca elétrica
que, oculta, venha a matar o invasor de uma residência. Outro exemplo
de excesso seria colocar uma arma predisposta a at irar no caso de
invasão, com o gati lho da arma amarrado na fechadura .
2.8.3 Da legítima defesa recíproca
É a legít ima defesa contra a legítima defesa. Ocorre quando há
agressão mútua, entre ambas as partes, não se sabendo ao certo quem
iniciou a agressão. Trata-se de modalidade de legít ima defesa que
normalmente não se sustenta. Podemos citar como exemplo quando
ocorre uma briga entre A e B, mas não se sabe quem iniciou a
confusão. Assim sendo, caso não seja possível se identif icar quem
iniciou a agressão, o magistrado deverá valer -se do princípio do in
dúbio pro réu , absolvendo os dois agentes. NUCCI entende que “não
32
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. 12. ed. São Paulo: Saraiva. 2008, pag. 88.
29
existe tal possibi l idade, pois a agressão não pode ser injusta, ao
mesmo tempo, para as duas partes distintas e opostas” 33.
2.8.4 Da legítima defesa sucessiva
A legít ima defesa sucessiva ocorre quando, ao defender-se
legit imamente, o agente, que inicialmente era o agressor , passa então
a agir em legítima defesa. Literalmente, o que estava agredindo passa
a ser agredido, agido de forma revez ao que inicialmente pretendia.
Conforme o material disposto abaixo e obtido junto à revista eletrônica
CARTA FORENSE:
Quem saca um revólver por motivo banal, na medida em que resolveu tirar satisfação por qualquer besteira, está agredindo injustamente. Autoriza, por isso, a pessoa ameaçada a reagir, inclusive buscando retirar-lhe a arma e agredi-lo, desde que necessário e com moderação. Se, porventura, a reação for excessiva com relação a quem sacou o revólver, ingressamos no contexto da denominada legítima defesa sucessiva, ou seja, a legítima defesa contra o excesso de legítima defesa.
34
2.8.5 Da legítima defesa da honra
Trata-se de questão controversa o fato de se saber se a honra
pode de alguma forma ser defendida de forma legal, amparada pela
excludente de il icitude da legítima defesa. Uma vez ofendida, a vít ima
pode, na esfera judicial , ter seu dano reparado. Assim, não seria vál ido
agir de forma a repelir , com a legít ima defesa, algum dano contra a
honra da vít ima. Este entendimento, porém, é minoritário perante a
doutrina. Nossa Constituição Federal garante o direito à honra, sendo
que, em reforço, nosso Código Penal não apresenta distinção em seu
artigo 25 quanto aos direitos passiveis de proteção através do insti tuto
da legítima defesa. A maioria da nossa doutrina assim entende , que é
legítima a reação a uma agressão a honra, estando a vít ima amparada
pela lei. Neste sentido, citemos o espanhol MEZGER, que diz:
33
NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado, 14ª Edição, São Paulo, Editora Forense, 2014. pag. 268. 34
Disponível em: CARTA FORENSE - http://www.cartaforense.com.br/conteudo/colunas/a-complexa-analise-da-agressao-injusta-na-legitima-defesa/3314. Acessado em: 16/11/2014.
30
É indiferente a índole do interesse juridicamente protegido contra o qual o ataque se dirige: pode ser o corpo ou a vida, a liberdade, a honra, a honestidade, a inviolabilidade de domicílio, a situação jurídica familiar, o patrimônio, a posse, etc. [...] Todo bem jurídico é suscetível de ser defendido legitimamente.
35
Rogério GRECO complementa:
Bens amparados pela legítima defesa: o instituto da legítima defesa tem aplicação na proteção de qualquer bem juridicamente tutelado pela lei. Alguns autores afirmam que os bens jurídicos comunitários não podem ser objeto de legítima defesa.
36
Assim sendo, tendo em vista o nosso Código Penal não ter
imposto l imites quanto à abrangência dos bens a serem alcançados
pela legít ima defesa, concluímos o entendimento de que é plenamente
cabível a prát ica da legít ima defesa da honra. Apesar de ser
aceita, deve ser utilizada de forma moderada e com meios
necessários quando de sua ocorrência . Desta forma, não seria
legítimo que alguém fosse morto por conta da legít ima defesa da honra.
Assim, caso a caso, deverão ser verif icados os requisitos dispostos no
artigo 25 do Código Penal, não havendo ilegalidade, caso se aja em
legítima defesa da honra.
2.8.6 Da legítima defesa da honra no adultério:
No caso do adultério, a honra do ofendido não poderá vir a ser
resolvida com derramamento de sangue, como no passado se admit ia.
Neste caso, há a evidente desproporção, descaracterizando assim a
eximente da legít ima defesa. Francisco de Assis TOLEDO levanta
dúvidas sobre a hipótese de poder situá -lo no quadro da necessidade e
moderação, discorrendo que:
35
MEZGER, Edmundo. Tratado de Derecho Penal, Madri, 1955, Revista de Derecho Privada, t.I, p.454. 36
GRECO, Rogério, Curso de Direito Penal, Parte Geral, 4ª Edição, pag 96.
31
Uma vez sendo o adultério prejudicial ou desonroso ao próprio agente, não há justificativa que conceba o homicídio como reação equilibrada daquele. Também a mera suspeita de infidelidade, que descaracteriza a existência do fato concreto atual ou iminente, afasta a tese da defesa legítima.
37
Atualmente, a nossa doutrina e jurisprudência tem adotado o
entendimento maçante no sentido de que, em caso de adultério, a
legítima defesa não deva ser considerada . Até os idos de 2005,
valorizando-se os princípios morais e de proteção à entidade familiar, o
nosso Código Penal ainda considerava crime o adultério, punindo quem
o praticasse. Previa a lei que a prát ica de tal delito at ingia
especialmente a honra do cônjuge traído, podendo este valer -se do
inst ituto da legít ima defesa para se defender dos atos de lesão
empreendidos contra o parceiro inf iel e seu amante.
Antes mesmo da descr iminalização do adultério, já se
questionava a legit imidade da defesa da honra conjugal. Por f im, após
2005, o adultério deixou de ser crime no Brasil . Atualmente tem-se
observado forte tendência dos tribunais brasileiros, no sentido de não
conceder a absolvição sumária dos que alegam terem agido em
legítima defesa da honra, principalmente quando se trata de homicídio,
consumado ou tentado. São raras as exceções em que alguns tribunais
admitem absolvições àqueles que ilegit imamente assim agiram.
Fernando CAPEZ reforça:
Em princípio, todos os direitos são suscetíveis de legítima defesa, tais como a vida, a liberdade, a integridade física, o patrimônio, a honra etc., bastando que esteja tutelado pela ordem jurídica. Dessa forma, o que se discute não é a possibilidade da legítima defesa da honra e sim a proporcionalidade entre a ofensa e a intensidade da repulsa. Nessa medida, não poderá, por exemplo, o ofendido, em defesa da honra, matar o agressor, ante a manifesta ausência de moderação. No caso de adultério, nada justifica a supressão da vida do cônjuge adúltero, não apenas pela falta de moderação, mas também devido ao fato de que a honra é um atributo de ordem personalíssima, não podendo ser considerada ultrajada por um ato imputável a terceiro, mesmo que este seja a esposa ou o marido do adúltero.
38
37
TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios Básicos de Direito Penal. 4ª Ed., São Paulo: Saraiva,
1991, pag. 121. 38
CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. Volume 1, 15ª. ed., pag. 309-310.
32
2.8.7 Da justiça com as próprias mãos
O legislador, conforme o artigo 25 do Código Penal, diz que a
agressão poderá ser repelida, a seu direito ou de outrem, permit indo ao
cidadão que reaja de ofício , desde que constate situação de perigo,
seu ou de terceiro. Ocorre, porém, que esse dispositivo não é um
salvo-conduto para prát icas abusivas de homicídios e lesões corporais,
bem como não concede ao cidadão o direito de “fazer justiça com as
próprias mãos”.
Abaixo, consta art igo extraído do site do jornal “O Estado de São
Paulo”, onde o tema é abordado com bastante propriedade:
O surgimento de grupos de justiceiros no Rio de Janeiro, revelados quando um garoto foi espancado e preso pelo pescoço a um poste, é um sinal de alerta que não pode ser negligenciado. Ele aponta numa direção muito perigosa, na qual as pessoas não reconhecem mais a noção de Estado, retornando da civilização à barbárie. Se parece exagero, é bom lembrar que para muitos o momento fundador da civilização é quando todas as pessoas abrem mão do uso da força física, delegando exclusivamente ao Estado essa prerrogativa. Fazer justiça com as próprias mãos seria, literalmente, barbaridade. Ocorre que o senso de injustiça é muito arraigado em nós. [...] Quer por falta de ação do Estado, quer por excesso de violações com que se deparam, elas considerarem que seu senso de justiça não está satisfeito e resolvem agir por si mesmas. A gravidade está no fato de isso indicar uma situação de anemia, na qual os fundamentos da sociedade colapsam levando à ausência de regras e consequente incapacidade de adequação aos padrões de conduta. Forma-se um círculo vicioso no qual as pessoas se sentem injustiçadas, não creem na ação do Estado e por isso rompem o pacto social, o que gera mais injustiça. É um dos poucos momentos em que não há muita margem para debate: tanto quem está à esquerda como quem está à direita concorda que a única saída é o resgate da legitimidade do Estado.
39
2.8.8 Da legítima defesa de terceiro e do consentimento do
ofendido
Não há dúvida de que em alguns casos o consentimento do
ofendido inf luencia no juízo da tipicidade, fugindo ao âmbito da
antijuridicidade. Assim, enquanto houver em uma ação que envolva
legítima defesa, a discordância do ofendido com a situação, afasta -se
por completo da t ipicidade, ou seja, estará legit imada sua reação,
deste que sem excesso. Casos de consentimento do ofendido junto aos
39
Disponível em ESTADAO - http://vida-estilo.estadao.com.br/blogs/daniel-martins-de-barros/justica-com-as-proprias-maos/. Acessado em 06/12/2014.
33
delitos contra o patrimônio, violação de correspondência, invasão de
domicíl io etc, nestas circunstâncias, não há que se falar em crime,
tratando-se de fato atípico. Agora, em casos que ocorram del itos contra
a integridade física e contra a honra, se houver o consentimento do
ofendido, prevalece a exclusão da antijudicidade. É certo que , em
casos como os até então citados, se faz possível haver o
consentimento do ofendido.
Agora, em crimes cometidos com violência ou grave ameaça,
não se pode admitir que o consentimento do ofendido isente o autor da
prática il ícita, visto que trata-se de conduta que interessa à sociedade
punir. Existem requisitos que legit imam a excludente do consentimento
do ofendido, sendo eles, a concordância do ofendido, o consentimento
dado de maneira explicita ou implícita, a capacidade para consentir, a
disponibil idade do bem ou interesse, consentimento dado antes ou
durante a prática e, por f im, consentimento revogável a qualquer
tempo.
Segundo NUCCI, “é fundamental que o autor da conduta saiba
que a vítima aquiesceu na perda do bem ou interesse, como se dá ,
aliás, nas demais excludentes de il icitude ”.40 Assim sendo, concluímos
dizendo que o consentimento do ofendido até pode excluir a i l ic itude do
crime, porém não de forma absoluta, devendo atender a alguns
requisitos. Dentre eles, que o ofendido seja capaz de aquiescer, o
fazendo de forma livre e consciente, bem como que o bem renunciado
pelo mesmo esteja disponível. Também vale destacar que tal
“autorização” deverá se dar de forma expressa, anteriormente ou
concomitantemente à prática do fato.
40
NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado, 14ª Edição, São Paulo, Editora Forense, 2014. pag. 239.
34
CAPÍTULO 3
DO EXCESSO NA LEGÍTIMA DEFESA
3.1 Conceito de excesso
A lei brasileira prevê o excesso punível quando da prática de
qualquer das excludentes de anti juridicidade, junto ao art igo 23, §
único do Código Penal. ZAFARONI o conceitua da seguinte maneira:
Isso significa que o excesso não é o mesmo que a falta de qualquer dos requisitos das eximentes do artigo 23. Consequentemente, excesso significa passar dos limites de uma dessas causas eximentes, mas para passar dos limites, será sempre necessário se ter estado, em algum momento, dentro deles.
41
O dicionário Aurélio define a palavra “excesso ” da seguinte
forma: “Excesso: sm 1. Diferença para mais entre duas qualidades. 2.
Aquilo que excede o permit ido, o legal, o normal. 3. Sobra. 4.
Desmando ”. 42
Referente ao assunto abordado, no presente trabalho se aplica
dizer que excesso signif ica exceder o permitido, exceder os limites,
exagerar .
3.2 Dos Tipos De Excesso
Ocorrem de diversas formas e tipos, podendo vir a ser
praticados das formas dolosa ou culposa. Mesmo se excedendo,
existem situações que podem culminar com a absolvição do sujeito que
se defendeu além da conta. Vejamos abaixo, os t ipos de excesso.
41
ZAFFARONI, Eugênio Raul. Manual De Direito Penal-Parte Geral- Volume 1. Rio de janeiro Ed. RT,2007. Página:566. 42
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. - Dicionário Prático da Língua Portuguesa - editora Nova fronteira, AS, Rio de janeiro, 1993.
35
3.2.1 Excesso intensivo
Ocorre em casos em que o ofendido, ao se defender de u m ato
injusto contra si ou terceiro, ultrapassa os l imites da necessidade do
meio ou da moderação. É o conhecido excesso clássico, onde o sujeito
que se defende extrapola o l imiar que lhe permitia a defesa . Aqui, o
sujeito, ao se defender, acaba não dimensionando sua maneira de agir,
exagerando. Segundo Ney Moura TELLES:
É na legítima defesa que o excesso adquire grande importância. Diz-se que o excesso é intensivo quando o agente utiliza um meio com potencial lesivo além do necessário ou utiliza o meio necessário com desproporcionalidade em relação à agressão.
43
3.2.2 Excesso extensivo
O excesso extensivo segue o intensivo, sendo seu conceito sem
maiores complicações. Aqui, o excesso nasce quando o agente
continua a agir para repelir agressão injusta, mesmo após a mesma já
ter sido repelida. Dessa forma, o agente estava em legít ima defesa e
util izou de certo mecanismo de defesa, prosseguindo sua conduta de
defesa, ocorrendo assim o excesso. Luiz Flávio GOMES assim resume:
Excesso intensivo é aquele que se verifica a partir dos meios utilizados para repelir a agressão, ou ao grau de utilização deles. Já o excesso extensivo se configura quando a defesa se prolonga no tempo além do que dura a atualidade da agressão, ou seja, quando a agressão já tenha cessado e não exista mais o perigo de sua continuação.
44
Assim sendo, o excesso extensivo ocorre quando o agente age
para defender-se e sem que cometa excesso, consegue cessar a
agressão, porém, mesmo após cessada, continua a agir.
43
TELES, Ney Moura. Direito Penal: Parte Geral. São Paulo: Atlas, 2004. p. 276. 44
Disponível em: LFG -http://www.lfg.com.br/public_html/article.php?story=2008042815411791.
Acessado em: 16/11/2014.
36
3.2.3 Excesso exculpante
Trata-se de modalidade supralegal, pois não encontra -se
prevista em nosso ordenamento jurídico. Neste caso, o excesso se dá
tendo em vista o agredido, ao reagir, entrar em estado de transe,
pânico, pavor, furor, situações estas que just if icariam sua resposta à
agressão. Assim, podemos citar, como exemplo, um sujeito que em
uma situação destas se apavora e , ao invés de disparar um único tiro ,
para conter seu agressor, mesmo após a agressão já repelida, dispara
várias vezes de forma desnecessária, tendo em vista não dominar sua
consciência. Assim, sua ação estaria just if icada, visto que o mesmo
não dominava seus inst intos pelo pavor do momento de stress . Neste
caso, sua conduta estaria amparada por uma excludente de
culpabilidade, diferentemente da excludente de i l icitude . Sobre essa
modalidade de excesso, extrai-se, das lições de Guilherme de Souza
NUCCI:
O excesso exculpante seria o decorrente de medo, surpresa ou perturbação de ânimo, fundamentadas na inexigibilidade de conduta diversa. O agente, ao se defender de um ataque inesperado e violento, apavora-se e dispara seu revólver mais vezes do que seria necessário para repelir o ataque, matando o agressor. [...] Registre-se a lição de Welzel na mesma esteira, mencionando que os estados de cansaço e excitação, sem culpabilidade, dificultam a observância do cuidado objetivo por um agente inteligente, não se lhe reprovando a inobservância do dever de cuidado objetivo, em virtude de medo, consternação, susto, fadiga e outros estados semelhantes, ainda que atue imprudentemente (Derecho penal alemán, p. 216). [...] Para a apreciação dessa excludente é imprescindível que o medo seja o móvel único da ação (Psicologia forense y tratamiento jurídico legal de la discapacidad, p. 124). Embora no direito brasileiro não se possa considerar o medo como excludente de culpabilidade, é certo que ele pode dar margem a reações inesperadas por aquele que o sente, valendo levar esse estado de espírito em conta na análise da legítima defesa e do estado de necessidade, em especial quando se discute ter havido excesso. Finalmente, deve-se considerar que a hipótese do excesso exculpante vem prevista no Código Penal Militar (art. 45, parágrafo único:"Não é punível o excesso quando resulta de escusável surpresa ou perturbação de ânimo, em face da situação"), inexistindo razão para deixar de considerá-lo também no direito penal comum [...].
45
Rogério GRECO também ensina que:
45
NUCCI, Guilherme de Souza Nucci. Código Penal Comentado, 11ª. Ed, rev., atual. E ampl. São
Paulo: RT, 2012, pag. 264.
37
[...] o pavor da situação em que se encontra envolvido o agente é tão grande que não lhe permite avaliá-la com perfeição, fazendo com que atue além do necessário para fazer cessar a agressão. Essa sua perturbação mental o leva, em alguns casos, a afastar a culpabilidade. Dissemos em alguns casos porque, como regra, uma situação de agressão que justifique a defesa nos traz uma perturbação de espírito, natural para aquela situação. O homem, como criatura de Deus, tem sentimentos. Se esses sentimentos, avaliados no caso concreto, forem exacerbados a ponto de não permitirem um raciocínio sobre a situação em que estava envolvido o agente, podem conduzir à exclusão da culpabilidade, sob a alegação do excesso exculpante.46
3.2.4 Excesso culposo
Ocorre esta modalidade de excesso quando a pessoa que se
defende, de forma extremada, provoca um resultado que não o que a
mesma pretendia. Ou seja, ela age corretamente enquanto se defende,
porém, por imprudência, negligência ou imperícia, acaba provocando
um resultado inesperado.
Neste caso, a conduta excessiva do agente lhe será atribuída
judicialmente a t ítulo de culpa. Assim sendo, devem estar presentes na
conduta do agente a imprudência, negligência ou imperícia.
Segundo Rogério GRECO, o excesso será culposo quando:
O agente, em virtude da má avaliação dos fatos e da sua negligência no que diz respeito a aferição das circunstâncias que o cercavam, excede-se em virtude de um ‘erro de cálculo’ quanto à gravidade do perigo ou quanto ao modus da reação.
47
3.2.5 Excesso doloso
Ocorre esta modalidade de excesso quando a pessoa , que vem a
se defender, opta, por sua própria vontade, após conter seu agressor,
prosseguir em sua atitude agressiva, de forma desnecessária. Neste
caso, o mesmo estará ainda respaldado pela legít ima defesa, porém
responderá pelo excesso doloso. Como exemplo, se um sujeito contém
com um soco seu agressor, que mesmo caído e imóvel ao chão vem a
sofrer uma facada no coração e morre, f icara a primeira conduta , no
46
GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal – Parte Geral, v.1., 4ª Edição, p. 366. 47
GRECO, Rogério. Código Penal Comentado, 6ª Edição, Editora Impetus, 2012, pag.80.
38
caso o soco amparado pela excludente, o que não ocorrerá com a
facada e consequentemente o homicídio . Para Rogério GRECO, o
excesso doloso se dá da seguinte forma:
Quando o agente, mesmo depois de fazer cessar a agressão, continua o ataque por que quer causar mais lesões ou mesmo a morte do agressor inicial ou quando o agente, mesmo depois de fazer cessar a agressão que era praticada contra sua pessoa, pelo fato de ter sido agredido inicialmente, em virtude de erro de proibição indireto, acredita que possa ir até o fim, matando seu agressor, por exemplo.
48
48
idem, pag.80.
39
CAPÍTULO 4
A LEGÍTIMA DEFESA E A POLÍCIA
É atribuído ao Policial, seja ele Federal, Civi l ou Mil itar, o poder
de polícia. Este poder garante a este agente público que possa agir em
nome do Estado de forma coercit iva, visando assim a manutenção da
ordem pública. Assim dispõe a Constituição Federal Brasi leira:
Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos: I polícia federal; II polícia rodoviária federal; III polícia ferroviária federal; IV polícias civis; V polícias militares e corpos de bombeiros militares.
49
Esta “autorização” é legít ima de seu cargo, independentemente
de autorização do Poder Judiciário, estando o mesmo autorizado,
dentro do que dispõe a lei, a util izar-se até do uso proporcional da
força. Quanto à manutenção da ordem pública, entendemos tratar -se de
atividade de extrema complexidade, tendo em vista a ampla variedade
da abrangência que possui. Vai desde o auxíl io a alunos na travessia
de via pública, à contenção de vias de fato em bares, à confrontações
violentas em assaltos etc. Assim, o policial se vê agindo dentro de uma
grande variável de situações, tendo que , apesar do “uso da força” que
lhe é permit ido, não afrontar os direitos fundamenta is dos cidadãos,
mantendo a integridade física dos mesmos, o direito de ir e de vir e , o
mais importante, o direito à vida, que só poderá ser aviltado em
situações extremas. Assim, o policial, ao executar suas funções diárias
visando à manutenção da garant ia da ordem pública, uti l iza-se do
PODER DE POLÍCIA , que segundo MEIRELES:
49
Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm - acessado em 07/12/2014.
40
[...] é a faculdade de que dispõe a administração pública para condicionar e restringir o uso e gozo de bens, atividades e direitos individuais em benefício da coletividade ou do próprio Estado. [...] é um mecanismo que o Estado dispõe para conter os abusos dos direitos individuais.
50
Utilizando-se de seu poder de polícia, o policial então se
encontra legalmente autorizado para que possa agir de forma
coercit iva. Ocorre que este poder deverá ser utilizado dentro das
situações excludentes já estudadas junto ao artigo 23 do C ódigo
Penal . Dentre elas, as mais uti l izadas durante o desenvolver da
atividade policial seriam o estrito cumprimento do dever legal e a
legítima defesa , esta últ ima, tema de nosso estudo. Nestes casos,
conforme a própria lei dispõe, a força deverá ser ut il izada de forma
necessária e moderada.
Assim, se faz imprescindível que o agente público tenha total
conhecimento de como e até quando esta força deva ser emp regada.
Portanto, diante de uma situação fática que necessite da util ização da
força, o policial , ao agir, deverá o fazer dentro de parâmetros
determinados pela lei e esperados pela sociedade em geral. Do
contrário, poderá incorrer no excesso, previsto junto ao artigo 23, §
único do Código Penal, sendo responsabil izado dolosa e culposamente
pelos seus atos.
Já quando falamos de vida, a Constituição Federal Brasileira , em
seu art igo 5º, vem a protegê-la como bem maior. Tendo em vista que a
Constituição representa a vontade do povo, este deve ser o maior
objetivo do Estado e de seus agentes. De outro lado, a própria Carta
Magna, de modo implícito, estabelece que o direito à vida não é
absoluto, já que traz, em seu bojo, que haverá pena de morte em caso
de guerra declarada (art. 5, inciso XLVII). Ademais, ao proteger a vida
como direito fundamental do ser humano, a CF acaba por garantir que
alguém assegure sua própria vida em detrimento da de seu agressor,
se não houver outra forma de se defender.
50
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 30ª Ed. São Paulo, Ed. Malheiros, 2005, pag.131.
41
A sociedade, por sua vez, tendo este conhecimento , poderá
cobrar, com mais propriedade, que o Estado f iscalize e responsabil ize
eventuais abusos por parte dos policiais que se encontram disponíveis
para garantir a ordem pública. Portanto, entende-se que somente em
medidas extremas é que o uso da força e, por f im, da arma de fogo,
serão indicados, devendo-se antes serem esgotadas todas as
possibil idades de resolução do problema, com a util ização de meios
não violentos. Senão, vejamos o que diz a apostila da Secretaria
Nacional de Segurança Pública - SENASP, “USO LEGAL DA FORÇA” :
Ao fazer o uso da força, o policial deve ter o conhecimento da lei, deve estar
preparado tecnicamente, através da formação e do treinamento, bem como
ter princípios éticos solidificados que possam nortear sua atuação. Ao
ultrapassar qualquer desses limites não se esqueça que você estará
igualando-se às ações de criminosos. Você deixa de fazer o uso legítimo da
força para usar a força e se tornar um criminoso.51
Assim, observamos a importância da necessidade de uma boa
qualif icação aos policiais, visto que , ao serem responsabil izados pela
manutenção da ordem pública, deverão saber se ut i l izar de forma
legítima, do relevante poder de polícia lhes atribuído e,
consequentemente, da sua força sobre a sociedade como um todo.
Neste sentido, o Código de Conduta dos Encarregados da Aplicação da
Lei, apresentado pela Organização das Nações Unidas - ONU, em
1979, orientou, em seu tópico “20” , os governos e organismos na
formação de seus policiais:
Na formação dos policiais, os Governos e os organismos de aplicação da lei devem conceder uma atenção particular às questões de ética policial e de direitos do homem, em particular no âmbito da investigação, às alternativas para o uso da força ou de armas de fogo, incluindo a resolução pacífica de conflitos, ao conhecimento do comportamento de multidões e aos métodos de persuasão, de negociação e mediação, bem como aos meios técnicos, visando limitar a utilização da força ou de armas de fogo. Os organismos de aplicação da lei deveriam rever o seu programa de formação e procedimentos operacionais à luz de casos concretos.
52
51
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. Uso Legal da Força. Secretaria Nacional de Segurança Pública. Florianópolis, 2006, pag. 15. 52
ONU. Organização das Nações Unidas. Código de Conduta para os Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei. Assembleia Geral das Nações Unidas, resolução 34/169, de 17 de Dezembro de 1979. Disponível em: http://www.gddc.pt/direitos-humanos/textos-internacionais-dh/tidhuniversai s/ dhaj-pcjp-18.html. Acessado em 07/12/2014
42
Cabe, ao f inal, explicitar que, segundo o Manual de Formação
dos Direitos Humanos para Forças Policiais da ONU, os funcionários
responsáveis pela aplicação da lei, obrigatoriamente , deverão agir
dentro do que dispõe a legislação internacional dos direitos humanos,
senão, vejamos:
Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei deverão respeitar e proteger a dignidade humana, bem como defender e garantir direitos humanos de todas as pessoas.[...] Todas as atividades de polícia deverão respeitar os princípios da legalidade, necessidade, não discriminação, proporcionalidade e humanidade.
53
Também se faz interessante citar que já existem diversos
projetos de le, i a serem discutidos no Congresso Nacional Brasi leiro,
visando um maior controle quanto às ações policiais que possam ser
consideradas violentas, sendo que, dentre os diversos, podemos citar o
PROJETO DE LEI 4471/2012, proposto pelos Deputados Paulo
Teixeira, Delegado Protógenes e outros, que visa implementar
f iscalização cobrando um maior r igor na realização do exame de corpo
de delito junto à vít ima e outros, quando da ocorrência de mortes
violentas provocadas pelo uso da força estatal. Vejamos a justif icat iva
dos autores apresentada durante a elaboração do projeto:
Destaca-se que, na análise dos inquéritos instaurados para apurar os casos que envolvem letalidade na ação policial, é comum a adoção da tese da excludente de ilicitude da ação, o que prejudica a adequada apuração dos fatos e suas circunstâncias, contrapondo, assim, o Estado Brasileiro à sua própria Constituição e às regras internacionais de proteção aos direitos humanos. [...] Nesse sentido, a aprovação do referido projeto proporciona a ampliação do controle e da fiscalização sobre a atividade de segurança pública, de maneira eficiente e independente, de modo a diminuir excessos e garantir a responsabilização pelos atos que não estejam condizentes com as conquistas do Estado Democrático de Direito e com os anseios sociais pela redução da violência estatal e da letalidade de suas ações.
54
53
Direi tos Humanos e Aplicação da Lei, Manual de formação em Dire itos Humanos para Forças Pol ic ia is , pag. 47, d isponível em: ht tp:/ /www.conseg.pr.gov.br/arquivos/Fi le/manual_direi tos_humanos.pdf ,acessado em 24/12/2014. 54
Disponível em: ht tp:/ /www.camara.gov.br /s i leg/ integras/1027001.pdf , acessado em 24/12/2014.
43
Neste mesmo sentido podemos também citar resolução difundida
pelas Organizações das Nações Unidas, através da qual se defende a
realização de investigação completa e independente em casos
relacionados ações violentas prat icadas por parte de agentes públicos.
Vejamos:
Deve haver uma investigação completa, imediata e imparcial de todos os casos suspeitos de execução sumária, arbitrária e extralegal, inclusive de casos em que a queixa de parentes ou outros relatos confiáveis sugiram óbito por razões anormais nessas circunstâncias. Os Governos devem manter oficiais de investigação e procedimentos a fim de realizar tais inquéritos. O propósito da investigação deve ser determinar as causas, as razões e a hora da morte, o autor do crime, e qualquer ato ou prática que possa ter causado a morte. Deve incluir ainda autópsia adequada, coleta e análise de qualquer prova física ou documental, bem como relatos de testemunhas. A investigação deve distinguir entre morte natural, morte acidental, suicídio e homicídio.
55
Cabe, por f im, destacar ainda a nova lei 13060/2014, publicada
aos 23/12/2014, ou seja, recentíssima. No mesmo sentido do que já
fora dito anteriormente, agora, de maneira mais específ ica, esta
prioriza, por parte dos policiais brasileiros, a util ização de armas não
letais, desde que essa opção não coloque em risco a vida do s mesmos.
Cita, como exemplo de armas não letais , pistolas taser, armas de
eletrochoque, cassetetes, gás lacrimogênio, balas de borracha etc.
De acordo com o parlamentar autor da lei, estes t ipos de armas
têm baixa probabilidade de causar mortes ou lesões graves, sendo
suas uti l izações indicadas para conter, debil itar ou incapacitar pessoas
temporariamente. Esta lei ainda proíbe a util ização de armas de fogo
em casos que envolvam abordagem de pessoa que esteja m
desarmadas em fuga ou contra automóvel que, por exemplo, vislumbre
“furar” uma barreira policial.
Mas, a mesma lei faz ressaltar que se a vida do policial estiver
em risco e o armamento de menor potencial ofensivo não for suf iciente
para conter a agressão, a arma de fogo poderá ser ut i l izada. Por f im,
55
NAÇÕES UNIDAS, disponível em: http://www.unodc.org/documents/justice-and-prison-reform/projects/UN_Standards_and_Norms_CPCJ_-_Portuguese1.pdf. Acesso em 24/12/2014.
44
tal lei, debatida no Congresso nacional durante vários anos, acabou por
ser aprovada, vislumbrando se adequar à util ização da força por parte
das polícias, a f im de reduzir os resultados gravosos que ult imamente
temos visto. Abaixo, segue um trecho da lei:
Sempre que do uso da força praticada pelos agentes de segurança pública decorrerem ferimentos em pessoas, deverá ser assegurada a imediata prestação de assistência e socorro médico aos feridos, bem como a comunicação do ocorrido à família ou à pessoa por eles indicada.
56
Assim, com tal promulgação, f ica disciplinada a uti l ização dos
instrumentos de menor potencial ofensivo por parte dos agentes de
segurança pública no Brasil. As polícias deverão , agora, priorizar a
util ização de meios não letais, até o l imite do risco da integridade física
e psíquica dos policiais, obedecendo-se assim aos princípios da
legalidade, razoabil idade e proporcionalidade. A expectativa desta
medida é que se reduzam as ocorrências policiais com resultados
gravosos, senão vejamos:
Debatida por nove anos no Congresso, no dia da aprovação vários parlamentares destacaram a importância da lei, tendo em vista o crescimento da violência na ação policial que, todos os anos, resulta em grande número de mortes, especialmente de jovens. A expectativa é adequar o uso da força por parte do Poder Público para reduzir as ocorrências graves.
57
Por f im, vamos apresentar tabela elaborada por parte da Polícia
Militar Barriga Verde (catarinense), que recentemente adaptou modelo
de uso progressivo da força, baseado nos modelos já conhecidos,
tendo o material sido divulgado durante o Curso de Uso Progressivo da
Força (2010), baseando-se no modelo criado por FLETC58.
56
Jus Brasil, Disponível em: http://presrepublica.jusbrasil.com.br/legislacao/159374253/lei-13060-14, acessado em: 29/12/2014. 57
EBC – Agência Brasil, Disponível em: http://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2014-12/uso-de-armas-nao-letais-por-policiais-e-prioridade-no-pais-partir-de-hoje, acessado em: 29/12/2014. 58
Curso De Uso Diferenciado Da Força, Disponível em: http://www.iconeeditora.com.br/pdf/683874119Curso_de_UDF_FOTOS.pdf, acessado em 30/11/2014.
45
59
Sintetizando o que vimos até então e observando a tabela acima
disposta, temos sete cores que representam níveis diferentes do gráfico de força.
Podemos dizer que a uti l ização, por parte do policial , da força letal,
deverá ser feita em último caso, a f im de cessar ação violenta letal por
parte do causador do problema. Como veremos adiante, além da arma
de fogo, comumente util izada pelo policial, há outros armamentos não
letais que podem prel iminarmente serem util izados com sucesso, sem
que a vida humana seja colocada, em tese, em risco.
Podemos citar, como exemplos de armas não letais, cacetetes ,
bastões de choque, spray de pimenta, pistola taser, balas de borracha,
bombas de efeito moral, algemas etc. Todos estes instrumentos
poderão ser util izados de forma antecedente à util ização das armas de
fogo, privi legiando-se pelo menos a princípio e inicialmente, a vida.
Já falamos de poder de polícia e da responsabil idade do agente
público de segurança perante a sociedade, o qual, por meio do seu
poder de polícia, deverá agir dentro dos limites legais, ou seja, dentro
do que dispõe as excludentes previs tas junto ao artigo 23 do Código
Penal. Agora, passaremos adiante a relatar casos envolvendo a ações
violentas prat icadas por policiais, consideradas pela justiça como
lícitas ou não. Também trataremos artigos que discutem o mesmo
assunto, ou seja, a forma da polícia ao agir.
59
Idesp.Brasil: Disponível em: http://www.idespbrasil.org/arquivos/Artigo_117.pdf., Acessado em: 29/12/2014.
46
4.1 BREVE COMENTÁRIO SOBRE O ARTIGO “A ARMA E A FLOR”
Após se abordar de forma minuciosa o conceito da legítima
defesa e suas peculiaridades, passaremos neste tópico a estudar,
primeiramente sob um enfoque sociológico, qual seria a função da
Polícia como máquina repressiva do Estado, e de como ela vem sendo
compreendida em uma sociedade ainda em processo de formação
democrática. No artigo desenvolvido pelo professor da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul, José Vicente Tavares dos Santos,
denominado “A arma e a f lor”, publicado em 1997, o mesmo descreve
como objetivo de seu estudo a realização de:
[...] uma abordagem sociológica acerca da organização policial, de sua formação enquanto aparelho repressivo do Estado e das estratégias de construção de um consenso acerca da função social da instituição policial nas sociedades modernas e contemporâneas, enfatizando o efeito da violência legítima e ilegítima, sobre tal processo de institucionalização de uma legitimidade política.
60
Segundo José Vicente Tavares, na Inglaterra, nos idos de 1829 ,
inst itui-se uma nova insti tuição de controle da ordem pública dir igida às
classes populares. Cita , que a tardia formação da polícia inglesa
derivou de “modelo inglês de polícia”, que se baseava, naquela época,
em uma espécie de polícia comunitária, mantendo -se uma relação
próxima entre os policiais e a sociedade da época. Cita ainda em seu
trabalho estudo publicado por GLEIZAL, que, conforme o disposto logo
abaixo, dizia: “reconhecer que o indicador de eficácia da polícia é a
ausência do crime e da desordem ”. Vejamos o que o autor diz:
Esta “polícia comunitária” acentuava sua legitimidade seguindo alguns princípios: prevenir o crime e a desordem; reconhecer que o poder policial depende da aprovação do público e deste modo ganhar sua cooperação voluntária; reconhecer que a cooperação do público está na razão inversa da necessidade de utilizar a coerção física; empregar a força física minimamente; oferecer um serviço a todos os cidadãos; manter a relação polícia-público; respeitar o Poder Judiciário; reconhecer que o indicador de eficácia da polícia é a ausência do crime e da desordem (cf. Gleizal, Gatti-Domenach & Journés, 1993, p.87-108).[...]
61
60
TAVARES DOS SANTOS, José Vicente. A arma e a flor: formação da organização social, consenso e violência. Tempo Social; Ver. Sociol. USP, S. Paulo, 9(1): 155-167, maio de 1997. 61
idem
47
Assim, o autor complementa seu texto fazendo menção ao fato
de que, atualmente, os modelos de polícia inglês (comunitário) e o
francês (centralizado/estatal), al iados ao exercício da coerção física
legal, com a busca de legit imidade de sua ação social, são essenciais
para um equilíbrio organizacional da polícia. Ainda , no mesmo artigo,
ao citar o trabalho policial perante à sociedade brasileira, o autor
enfatiza as dif iculdades em se compreender os fenômenos da viol ência
em nosso país, e que esta violência, cada vez mais presente no
cotidiano do brasi leiro, vem afetando diretamente o trabalho da polícia .
Conforme o disposto no texto abaixo, vale destacar o trecho que diz
que “pouco a pouco vai se el iminando a violênc ia do tecido social, a
qual passa a ser monopolizada pelo Estado, exercida pela organização
policial”. Vejamos:
As dificuldades em se compreender os fenômenos da violência, cada vez mais presentes na sociedade brasileira, e que afetam diretamente o trabalho policial, derivam da ausência de uma noção capaz de inserir a violência nas relações sociais de produção do social e, portanto, nas instituições. Sabemos que, no processo civilizatório, vincula-se a supressão da violência a uma transformação da agressividade e a um investimento no controle social: pouco a pouco vai se eliminando a violência do tecido social, a qual passa a ser monopolizada pelo Estado, exercida pela organização policial, produzindo-se nos homens um maior autocontrole de suas paixões e de seus medos (cf. Elias, 1993).
62
Conclui dizendo que as lutas sociais contra a violência t êm
desempenhado ação histórica e inovadora, fato este que precisa ser
incorporado ao saber sociológico da organização das polícias.
[...] o exercício da violência ilegítima, a construção do consenso e as práticas de excesso de poder, a violência ilegítima. As relações dinâmicas e combinatórias desses três vetores vão definir a função social da organização policial no Brasil, na época contemporânea. [...] Nossa sociedade ainda se encontra em um processo de consolidação da ordem democrática e, portanto, com urgência de compreender as estruturas e práticas sociais da organização policial, movimento no qual as lutas sociais contra a violência tem desempenhado uma ação historicamente inovadora que precisa ser incorporada ao saber sociológico sobre a organização da policia, desvendando o enigma da arma e da flor.
63
Assim, o autor f inaliza dizendo que a sociedade brasileira, por
ainda se encontrar em processo de consolidação democrática, está a
62
idem 63
idem
48
procura de compreender qual o verdadeiro papel da organização
policial perante a sociedade, sendo este o enigma da arma e a f lor.
4.2 BREVE COMENTÁRIO SOBRE O ARTIGO “POLÍCIAS
BRASILEIRAS MATAM QUATRO VEZES MAIS QUE A DOS EUA”
Após estudarmos singelamente, no tópico passado, a
organização policial sob um enfoque sociológico e sua função como
máquina repressiva do Estado, passaremos a analisar o que fora
apresentado junto ao 7º Anuário Brasileiro de Segurança Pública,
ocorrida aos 05/11/2013, em São Paulo, pelo Fórum Brasileiro de
Segurança Pública, Nesta ocasião divulgou-se que a Polícia brasi leira
mata, em ações policiais, quatro vezes mais do que a Polícia
americana, duas vezes mais que a Venezuelana e mais do que a
Polícia mexicana. Vejamos abaixo:
As polícias Civil e Militar no Brasil mataram, em média, mais de quatro vezes mais civis que a dos Estados Unidos, em 2012, e mais de duas vezes que as polícias da Venezuela, país que têm o dobro da taxa de homicídios do Brasil, hoje, em 24,3 pessoas a cada grupo de 100 mil habitantes. No Reino Unido, onde a taxa de homicídios do ano passado foi de uma pessoa para cada grupo de 100 mil habitantes, uma das menores do mundo, foram registradas 15 mortes em confronto com as polícias --126 vezes menos que no Brasil. Na Venezuela, onde a taxa anual é de 45,1, foram 704 mortos pelas polícias, menos da metade dos mortos pelas polícias brasileiras. Os dados integram o 7º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, divulgado nesta terça-feira, (05/11/2013), em São Paulo, pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública. A pesquisa traçou um panorama das estruturas de segurança pública no Brasil no ano de 2012 e, no caso das mortes por policiais, considerou apenas aquelas praticadas em serviço. De acordo com o estudo, ao menos 1.890 brasileiros morreram em confronto com as polícias do país, ano passado, o que dá uma média de cinco mortos ao dia. O índice é mais alto nos Estados de São Paulo (563 mortes em 2012), Rio de Janeiro (415), Bahia (344) e Paraná (167). [...]Lá, foram 1.652 mortos por ação de policiais em confronto, em 2011 (dados mais recentes obtidos), em um país onde a taxa de homicídios ficou em 23,7 homicídios a cada grupo de 100 mil habitantes."E é sabido que, no México, há muito mais problema de confronto com a polícia em conflitos de fronteira, por exemplo, do que no Brasil", disse. Em relação aos Estados Unidos, o índice de letalidade das polícias brasileiras é quase cinco vezes maior --lá, foram 410 mortos em confrontos, ano passado, e uma taxa anual de homicídios de 4,09.
64
64
UOL – disponível em: http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2013/11/05/policias-brasileiras-mataram-126-vezes-mais-que-a-do-reino-unido-em-2012-diz-estudo.htm - acessado em 08/12/2014.
49
Em contrapartida, o índice de policiais mortos, trabalhando ou
fora das funções, também apresenta resultados alarmantes. Consta do
estudo que, no ano de 2012, cerca de 89 policiais mil itares e civis no
Brasil perderam suas vidas em confronto com marginais. Vejamos
notícia disposta abaixo:
[...] As mais altas foram verificadas em relação a policiais militares, 58,7; PMs em serviço, por outro lado, tiveram 17,8 baixas a cada grupo de 100 mil habitantes. Já o índice de policiais civis mortos fora de serviço ficou em 42,9, enquanto que os policiais civis mortos em serviço tiveram índice de 13,7. Ao todo, em 2012, 89 policiais civis e militares morreram em confronto; no Reino Unido, foram dez. E nos Estados Unidos, onde a letalidade policial foi menor em confrontos com cidadãos comuns, morreram mais policiais que no Brasil em 2012: 95. [...] "O padrão atual das polícias se mostra inaceitável. Elas estão matando muito e morrendo muito também: acima, até, da média de homicídios da sociedade brasileira. Não estamos protegendo nem a população, nem o policial".
65
Assim, pudemos observar nos artigos , que os índices de
letal idade provocado pelas polícias brasi leiras encontra m-se em uma
ascendente, ocorrendo mortes deste tipo com muito mais frequência
aqui do que em países que até então, como México e Venezuela, pelo
menos a princípio, aparentavam serem mais violentos que o Brasil. De
carona na crescente da violência provocada pela força policial,
observamos que o número de policiais morrendo em confronto também
é grande e crescente, concluindo-se que algo não vem funcionando
como deveria, f icando, assim, tanto o policial quanto a sociedade em
situação de risco.
4.3 BREVE COMENTÁR IO SOBRE O ARTIGO “QUEM QUISER QUE
FAÇA O MEU TRABALHO!”
Em Artigo publicado aos 21/11/2014, junto ao site da Federação
Nacional dos Policiais Federais, Humberto Wendling, Agente Especial e
Professor de Armamento e Tiro da Polícia Federal, que é autor do livro
“Autodefesa Contra o Crime e a Violência – Um guia para Civis e
Policiais” , fez contundente desabafo contra a ideia de que o policial
65
UOL – disponível em: http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2013/11/05/policias-brasileiras-mataram-126-vezes-mais-que-a-do-reino-unido-em-2012-diz-estudo.htm - acessado em 08/12/2014.
50
somente deveria reagir após ser alvejado , frase esta dita e defendida
por um palestrante que não conseguimos a identidade, o qual, junto ao
Ministério Público Federal, proferiu uma palestra a policiais no segundo
semestre do ano de 2014. Vejamos trecho abaixo, o que diz o Agente
da Polícia Federal:
Como cidadão, que acredita na autodefesa, estou bastante incomodado.
Como policial, que tem o dever de proteger as pessoas e o Estado, seus
direitos e propriedades, eu estou impressionado, no pior sentido da palavra.
E como instrutor de armamento e tiro, que tem a intenção de ensinar
policiais a sobreviverem aos confrontos armados,eu estou pensativo. A
partir de agora, todas as instituições policiais brasileiras terão um
desafio NUNCA imaginado. É um desafio fora do comum e que pode servir
de base para um filme de ficção científica capaz de vencer todas as
categorias do Prêmio Oscar. Se as polícias brasileiras conseguirem vencer
esse desafio, todas as polícias e forças armadas no Planeta Terra, do
Espaço Sideral e do Além nos enxergarão como exemplo único de
eficiência e eficácia profissional. 66
E no mesmo artigo o autor prossegue:
De agora em diante, as escolas e centros de treinamento policial precisam
desenvolver e aplicar uma técnica de tiro que permita ao policial REAGIR
SOMENTE DEPOIS DE TER SIDO ALVEJADO. É isso mesmo: ele só pode
usar sua arma depois de ter sido alvejado, gravemente ferido ou morto. E
como pai (mas não mentor) dessa esplendorosa técnica de tiro e
comportamento policial, vou chamá-la de “Técnica do Homem Morto”
ou “Dead Man Drill”, para os estrangeiros. Sete bilhões de habitantes no
planeta Terra e ninguém pensou nisso antes?! A técnica é simples: o policial
será alvejado por um tiro real. Se ele sobreviver, poderá reagir e atirar no
alvo. Se ele morrer, poderá utilizar métodos de interação além-túmulo para
reagir e atirar no alvo.. 67
Humberto Wendling ainda ressalta que não se deve colocar a
vida de terceiros inocentes em risco ao se prender criminosos, pois o
risco nesta situação seria maior que o benefício. Vejamos abaixo:
Considerando o perigo do trabalho policial, os baixos salários e o
desrespeito que enfrentam em razão da profissão, essa ideia é bastante
interessante. Segundo, armas nas mãos de policiais profissionais e
cidadãos de bem são, sim, instrumentos de defesa. Porém, a mesma arma
de fogo só serve para ataque quando está nas mãos dos delinquentes. Por
último, não se deve colocar a vida de terceiros (inocentes) em risco para
66
FENAPEF disponível em - http://www.fenapef.org.br/fenapef/noticia/index/45547 - acessado em 08/12/2014 67
idem
51
prender criminosos, pois o risco não vale o benefício. Entretanto, como o
policial não vai colocar sua vida em risco se for obrigado a ser alvejado
primeiro antes de se defender? [...]68
O mesmo autor, no ano de 2007, escreveu artigo denominado “O
DESCONHECIMENTO QUE MATA...NA LEGÍTIMA DEFESA! ”, fazendo
uma crít ica à falsa ideia que muitos policiais possuem de que devam
esperar até o últ imo momento para reagir a uma ação criminosa em seu
desfavor ou de terceiros. Desse art igo, seguem abaixo alguns tópicos
importantes destacados pelo autor:
[...] muitas pessoas acreditam que o risco de vida não existe até que a
ameaça ou agressão seja imediata. Essa ideia perigosa força muitos
policiais a esperarem até que os criminosos saquem e apontem suas armas
para eles ou para pessoas inocentes antes que esses policiais possam
neutralizá-los. Pesquisas americanas demonstram que um criminoso é
capaz de sacar uma arma escondida e atirar contra um policial antes que
esse policial consiga simplesmente apertar o gatilho de sua arma já
apontada para o criminoso (Firearms Response Time by Thomas A. Hontz).
[...] a ação é mais rápida que a reação. Já em 2008, publiquei o texto “Eu
vou atirar na perna dele!" Informações sobre confrontos armados indicam
que um policial acerta um em cada seis tiros disparados contra o alvo. Isso
produz cerca de 17% de aproveitamento, e se já parece ruim, espere até
você analisar outro dado que demonstra que aproximadamente 50% dos
tiroteios ocorrem em distâncias de até 1,70 m entre o policial e o suspeito.
Outros 20% ocorrem em distâncias entre 2 e 3,40 metros. Agora, um
homem com uma faca – e com o caminho livre – é capaz de correr 5 m em
apenas 1.28 segundo. Assim, não importa quantos disparos sejam feitos,
você vai errar a maioria deles, mesmo à queima roupa. Então, quão realista
seria se muitas das pessoas que tiveram a SORTE de acertar o criminoso
em ação tivessem que calmamente mirar e disparar contra uma das
menores partes do corpo? E se essa área ainda tivesse grande chance de
estar em movimento? Então, quanto tempo sobraria para a visada perfeita
na perna, no braço ou no ombro? NENHUM. [...]69
Humberto Wendling cita , neste trecho, que, na iminência de
sofrer um ataque injusto, já estará autorizado pela eximente da legít ima
defesa a agir. Denomina esta necessidade de ação do policial de
“DURA REALIDADE”. Vejamos:
68
idem 69
idem
52
Agora, imagine que você (policial, juiz, promotor ou cidadão armado) tenha
que aguardar o criminoso alvejá-lo para, a partir daí, adotar uma reação
armada. Quão realista isso parece? Quem pode garantir que esse ferimento
não será fatal? Será que esse novo conceito será utilizado pelos
delinquentes? [...]. A própria norma que trata da legítima defesa, garante a
autodefesa na iminência ou atualidade de um ataque injusto. Ora, se a lei
permite uma defesa no prenúncio do ataque, porque esperar o pior
desfecho? Já disse e repito: quem entende o trabalho policial e sabe como
ele deve ser feito é a polícia. [...] 70
Por f im, o autor encerra seu artigo desafiando aos que defendem
a técnica do “só atirar depois de alvejado”, convidando -os a combater
os traf icantes dos morros cariocas e o PCC em São Paulo. Finaliza
dizendo que se passarmos a agir calados e imóveis, esperando que
cada policial seja primeiro alvejado, só para depois agir, em breve os
policiais estarão “extintos”.
Policiais que arriscam suas vidas diariamente em benefício de pessoas desconhecidas não podem ser abandonados e colocados na linha de tiro dos que acreditam que eles devem aceitar, CALADOS E IMÓVEIS, o alvejamento, o ferimento ou a morte. Quem acredita na “Técnica do Homem Morto” não tem permissão para “achar”, interferir, julgar, decidir ou avaliar o instinto natural de sobrevivência que todo ser humano possui. Quem acredita nessa técnica deveria, por respeito ao próprio pensamento, ser unir aos policiais do Rio de Janeiro e enfrentar os traficantes nos morros cariocas. Deveria se unir, lado a lado, aos policiais de São Paulo que lutam contra o PCC, por exemplo. Deveria perguntar aos policiais, juízes, promotores, políticos e cidadãos de países desenvolvidos o que é melhor para o mundo: um policial vivo ou um criminoso. A vida é preciosa demais para ser entregue de modo tão fácil. E quem acredita que a vida do policial não vale nada que faça o nosso trabalho, principalmente no pior momento. SE ESPERARMOS QUE CADA POLICIAL SEJA ALVEJADO PARA QUE ELE POSSA REAGIR AO CRIME, EM BREVE NÃO TEREMOS MAIS POLICIAIS NO BRASIL.
71
4.4 BREVE COMENTÁRIO SOBRE O ARTIGO “ABUSO POLICIAL
MANCHA DIREITOS HUMANOS NO BRASIL, DIZEM EUA”
Esta noticia foi extraída do site da BBC, onde consta reportagem
que relata a visão do Departamento de Estado Americano quanto à
forma com que a segurança pública é trabalhada no Brasil , dizendo que
o abuso da polícia “mancha a imagem” do país no exterior.
70
idem 71
idem
53
As prisões superlotadas e os abusos cometidos pelas polícias Civil e Militar dos Estados, junto com a exploração sexual de crianças e adolescentes, continuam a ser os principais calcanhares de Aquiles da situação dos direitos humanos no Brasil, na visão do Departamento de Estado americano. Ao publicar seu relatório anual sobre a situação dos direitos humanos no mundo – esta edição dedicada a 2011 [...]"Outros abusos incluem o uso da força excessiva, agressões, abuso e tortura de detentos e encarcerados por parte da polícia e autoridades prisionais; longas detenções sem julgamento e demora nos processos judiciais." [...].
72
Vale comentar a importância deste relatório anual, visto por
cerca de 1 (um) milhão de pessoas só no ano de 2011, tendo o
documento crit icado a util ização da força excessiva por parte tanto da
polícia quanto por parte de agentes prisionais no Brasil . Explicita-se
ainda que, apesar de as autoridades que cometem os abusos serem
processadas pelo Estado, longos prazos de recursos acabam
privi legiando a impunidade.
Assim, após termos apresentado, nos tópicos anteriores, quatro
artigos, através dos quais , estudos e opiniões dos respectivos autores
foram divulgadas, citadas e comentadas, passaremos, nos tópicos
seguintes, a apresentar noticias jornalísticas relacionadas a casos
reais, envolvendo policiais em ações que, muito questionadas,
acabaram ou não sendo consideradas legítimas.
4.5 O sequestro do ônibus 174
Este acontecimento foi , na ocasião, transmitido ao vivo pelos
canais de televisão brasileiros e demonstrou a falta de planejamento e
preparo dos Policiais brasileiros da época, quando em ações
dramáticas que envolvem sequestros. Aqui, a vít ima , ao f inal, foi
atingida por disparos efetuados pelo sequestrador, que mesmo após
ser preso, acabou morrendo asfixiado por parte dos policiais na viatura
da polícia. Os policiais , segundo suas versões, o teriam imobilizado na
viatura em ação de legít ima defesa, tendo em vista ter o sequestrador
72
Disponível em: http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2012/05/120524_eua_dh_brasil_pu_ac.shtml. acessado em 06/12/2014.
54
quebrado o braço de um policial, bem como tentado retirar a arma de
fogo de outro.
Às 18h47 do dia 12 de junho de 2000, Sandro desceu do ônibus 174 abraçado à professora Geisa Firmo Gonçalves, moradora da Rocinha. Apontava a arma para a refém. Sorrateiramente, um policial do Bope saiu de trás do veículo e disparou contra o criminoso. Mas o tiro acabou atingindo de raspão a professora. Sandro acabou caindo, levando Geisa junto, e disparando três vezes contra a professora [...]. Sandro morreu asfixiado por policiais do Bope, dentro de um camburão.
73
Neste caso, observa-se, conforme o disposto em notícia de
jornal abaixo, que os três policiais militares diretamente envolvidos
com a ação, acabaram, por f im, absolvidos pelo Tribunal de Justiça do
Estado do Rio de Janeiro. Vale destacar que a defesa dos PMs
considerou o sequestrador como sendo um “terrorista fora de si” e que ,
se os policiais fossem condenados, estaríamos “ indo contra os nossos ”
e valorizando o crime. Vejamos trecho abaixo:
Um júri popular absolveu o capitão Ricardo Soares, de 42 anos, e os soldados Flávio Dias e Marcio Araújo, ambos de 32 anos, por quatro votos a três. Eles eram acusados de prática de homicídio qualificado, que prevê pena de 12 a 30 anos. O sequestrador foi morto dentro de um camburão da polícia depois de aterrorizar por quatro horas passageiros do ônibus que faz a linha 174, no dia 12 de junho de 2000. [...] Nos depoimentos, o capitão declarou que não teve a intenção de matar o sequestrador e tentou apenas imobilizá-lo. Os policiais militares disseram que "Sandro estava transtornado e tentou pegar a arma de um policial"."Se condenássemos os PMs, estaríamos indo contra os nossos e valorizando o crime. Ele não era um bandido, era um terrorista fora de si", disse o advogado dos policiais, Clóvis Sahione. "Eles em nenhum momento tentaram asfixiar o sequestrador. Eles deram uma gravata em Sandro para imobilizá-lo. Como ele não se debateu, quem se asfixiou foi ele", acrescentou o advogado.
74
O jornal o Estado de São Paulo ainda divulgou: A 8ª Camara Criminal manteve a decisão do 4º Tribunal do Juri que absolveu os Policiais Militares Ricardo de Souza Soares, Flávio do Val Dias e Márcio de Araújo David da acusação de matar o sequestrador do ônibus 174, Sandro do Nascimento em 12 de junho de 2000. Os três desembargadores que votaram foram favoráveis à manutenção da sentença, que saiu no dia 11 de dezembro de 2002. Segundo a defesa, Sandro do Nascimento provocou a própria morte ao se debater dentro do carro da PM, onde estavam os Policiais.
75
73
Disponível em: http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2010/06/apos-10-anos-sequestro-do-onibus-174-vive-na-memoria-de-testemunhas.html – acesso em: 19/09/2014. 74
Disponível em: UOL - http://noticias.uol.com.br/inter/reuters/2002/12/11/ult27u29409.jhtm - acessado em: 02/10/2014. 75
Disponível em http://brasil.estadao.com.br/noticias/geral,mantida-absolvicao-de-policiais-no-caso-do-onibus-174,20030814p8682 – acessado em 06/12/2014.
55
4.6 Policiais que participaram do massacre do Carandiru são
condenados a 48 anos de prisão
Neste famoso caso, ocorrido aos 02 de outubro de 1992, um
pelotão de Policiais Mil ita res, para conter uma rebelião junto ao
pavilhão 09, da hoje inexistente Casa de Detenção, em São Paulo,
invadiram a unidade prisional , enfrentando os presos, que, no loca, se
encontravam rebelados. A ação acabou contabilizando um saldo de 111
presos mortos e f icou conhecida como o "MASSACRE DO
CARANDIRU", tendo até se tornado tema de f i lme. A defesa dos
policiais arguiu, em seus favores, que os mesmos teriam agido de
forma lícita, amparados pelas excludentes de antijuridicidade da
legítima defesa e estrito cumprimento do dever legal , o que não foi
assim assimilado pela just iça. Conforme a notícia de jornal abaixo, no
ano de 2013, vários Policiais envolvidos acabaram sendo condenados
pela ação, f icando evidente a prática do excesso.
Os sete jurados que fazem parte do Conselho de Sentença decidiram hoje
condenar os 15 policiais militares (PMs) pela ação policial que culminou
com a morte de quatro detentos no quarto pavimento (terceiro andar) do
Pavilhão 9 da extinta Casa de Detenção do Carandiru, no episódio que ficou
conhecido como Massacre do Carandiru. Os policiais foram absolvidos pela
tentativa de homicídio de dois detentos e pela morte de outros quatro,
provocada por armas brancas. Os policiais foram condenados a 48 anos de
prisão, cada um, por homicídio qualificado [pena mínima de seis anos para
cada homicídio cometido somado à pena de mais seis anos por
impossibilidade de defesa das vítimas]. O juiz Rodrigo Tellini de Aguirre
Camargo também determinou a perda do cargo público para os policiais que
continuam na ativa. Os réus poderão responder em liberdade. [...]76
Prosseguindo na mesma notícia, ainda consta que vários
policiais mil itares, inclusive um Coronel, foram responsabil izados por
suas condutas excessivas:
76
Disponível em http://jovempan.uol.com.br/noticias/brasil/sao-paulo/policiais-que-participaram-do-massacre-do-carandiru-sao-condenados-48-anos-de-prisao.html - acessado em 06/12/2014.
56
Os jurados demoraram quase três horas para responder a 630 quesitos que
decidiram a sentença. Eles tiveram que responder a várias perguntas
referentes a cada uma das vítimas do massacre, multiplicado pelo número
de réus.[...]. Nesta etapa, 15 policiais militares, integrantes do Comando de
Operações Especiais (COE), foram julgados pela morte de oito presos e
pela tentativa de homicídio de outras duas vítimas que ocupavam o quarto
pavimento (terceiro andar) do Carandiru. [...] Com isso, o número de
policiais que foram condenados pelo massacre do Carandiru neste processo
chega a 73. Eles foram responsabilizados pela morte de 77 detentos. Das
111 mortes no massacre, nove foram provocadas por armas brancas e
permanecem sem responsabilização. [...]
Na primeira etapa do julgamento, ocorrida em abril do ano passado, 23
policiais foram condenados a 156 anos de reclusão cada um pela morte de
13 detentos. Na segunda etapa, ocorrida em agosto, 25 policiais foram
condenados a 624 anos de reclusão cada um pela morte de 52 detentos
que ocupavam o terceiro pavimento do Pavilhão 9. No dia 19 de março, os
sete jurados que fazem parte do Conselho de Sentença condenaram dez
policiais militares pela morte de oito detentos do quinto pavimento: nove dos
policiais foram condenados a 96 anos de prisão cada um, enquanto o outro
foi condenado a 104 anos por já ter uma condenação anterior.77
4.7 Vídeo do policial baleando bandido que roubou moto
Este caso f icou muito conhecido no Brasil todo, sendo veiculado
maçantemente pela mídia policial. Aqui, um policial militar , em
12/10/2013, que tinha acabado de deixar seu turno de trabalho, f lagrou
um assalto a um motoqueiro, tendo agido em legítima defesa do
mesmo, atirando e atingindo certeiramente, impedindo o assalto e
prendendo o assaltante. Detalhe desta ação foi o fato de que no
capacete da vít ima havia uma câmera acoplada, tendo toda a ação sido
f i lmada.
Uma câmera acoplada no capacete de um motociclista registrou uma tentativa de assalto na zona leste de São Paulo, no sábado (12/10/2013). Após a abordagem dos assaltantes, o vídeo mostra um PM atirando contra o criminoso. A imagem se tornou viral na rede social Facebook com o título “Foi roubar Hornet e levou bala”. A Polícia Militar de São Paulo confirmou a veracidade do vídeo. A vítima seguia em moto de luxo, às 14h, quando foi abordada no cruzamento das avenidas Dr. Assis Ribeiro e Gabriela Mistral. [...].“Ao intervir na ocorrência, percebeu o criminoso apontando a arma em sua direção e efetuou dois disparos com sua pistola ponto 40″. Ainda de acordo com o texto, a atuação do PM “foi legítima e correta, com a observância das técnicas policiais”.
78
77
idem. 78
Disponível em BEDELHO.COM - http://bedelho.com/video-completo-do-policial-baleando assaltante-que-roubou-moto/ - acesso em 19.09.2014 ;
57
O of icial da Polícia Mil itar que evitou o roubo da motocicleta e
baleou o suspeito foi condecorado com a Láurea de Mér ito Pessoal em
1º Grau, o mais alto da honraria da corporação, segundo a Secretaria
da Segurança Pública. A condecoração é concedida a policiais que se
destacam em atos de bravura. Ele também recebeu um elogio público
no Quartel do Comando-Geral durante a entrega da honraria. Neste
caso, a precisão na ação do Policial Militar, repelindo injusta agressão
a direito de outrem, de forma moderada e util izando-se dos meios
necessários, legit imaram sua atitude.
4.8 Delegado mata criminoso durante assalto
Aqui, Delegado de Mato Grosso, que se encontrava de férias no
Estado de Goiás, reagiu a assalto, provocando o óbito do assaltante,
fato ocorrido em 06/01/2014. Detalhe foi que a arma util izada pelo
assaltante era de brinquedo, tendo a nota f iscal da aquisição da mesma
sido achada no bolso do mesmo, após ser atingido e morto pelo
Delegado. Vejamos:
O delegado Deuel Paixão de Santana que atuou em Colniza, reagiu a um assalto e matou a tiros o assaltante identificado como Richard Michel (21), o mesmo portava uma pistola de brinquedo idêntica a uma arma de verdade. O caso aconteceu nesta segunda-feira (06/01/2014), em Goiânia (GO). Antes de atirar no criminoso, o delegado chegou a dar voz de prisão ao suspeito que correu de costas empunhando a arma em direção ao delegado. Michel foi baleado na altura do peito e ainda correu cerca de 300 metros, antes de ser baleado novamente na perna e cair. Peritos acionados para analisar a cena do crime encontraram no bolso do assaltante, inclusive, a nota fiscal de compra da arma de brinquedo. Michel possuía passagem pela Polícia pelo crime de posse de entorpecente. Deuel Paixão de Santana estava com a esposa quando foi abordado pelo assaltante, que utilizava uma motocicleta. Michel conseguiu recolher R$ 50,00 e um celular e se preparava para fugir quando o delegado se identificou.
79
Neste caso típico de ação em legítima defesa, o Poder Judiciári o
de Goiânia foi taxativo, conforme o disposto em notícia disposta
abaixo, arquivando o Inquérito instaurado em desfavor do Delegado de
Polícia, por entender ter o mesmo agido amparado pela excludente. O
79
Disponível em DIÁRIO DO NORTÃO: http://www.dnnoticias.com.br/2014/01/delegado-que-atuou-em-colniza-mata.html - acesso em 18.09.2014.
58
próprio Ministério Público goiano foi quem requereu que o Inquérito
Policial fosse arquivado, entendendo que o Delegado teria sim agido de
forma lícita, amparado pela eximente da legít ima defesa, util izando -se
dos meios necessários que possuiria no momento da agressão e de
forma moderada, repelindo a injusta agressão. Também fo i
considerado, na decisão, que o assaltante morto já vinha cometendo
vários crimes naquela região. Segue abaixo a notícia:
O juiz Jesseir Coelho de Alcântara, da 1ª Vara Criminal de Goiânia, determinou o arquivamento de inquérito policial instaurado para apurar o homicídio de Richard Michel de Lima Pinheiro, envolvendo o delegado da Polícia Civil do Mato Grosso, Deuel Paixão de Santana. O magistrado observou que o policial agiu em legítima defesa, no crime ocorrido no dia 6 de janeiro, em Goiânia. [...] Foi apurado que Richard vinha praticando assaltos na região. O Ministério Público de Goiás (MPGO) requereu arquivamento do inquérito, por estar caracterizada a excludente de criminalidade de legítima defesa. O magistrado citou o artigo 25 do Código Penal Brasileiro que diz, "age em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem". Ele observou que há nos autos os elementos de legítima defesa: agressão injusta - Richard abordou o investigado e sua esposa para assaltá-los; direitos do agredido - Deuel agiu em legítima defesa própria e de terceiros; uso moderado dos meios necessários - o investigado usou do único meio que dispunha para repelir a agressão sofrida, pois disparou com o intuito de se defender. Diante disso, Jesseir Coelho concluiu que o investigado "agiu amparado pela excludente
da legítima defesa". 80
4.9 PM é preso suspeito de matar ambulante durante tumulto em SP
A Policia Mil itar paulista, na data de 18/09/2014, realizava
operação junto ao centro da cidade de São Paulo, visando o combate à
pirataria, quando um dos seus policiais, ao ter puxado de uma de suas
mãos um tubo de spray de pimenta, por parte de um manifestante ,
enquanto efetuava uma contenção, acabou por sacar sua arma com a
mão restante, disparando contra o mesmo, que veio a óbito em
decorrência de ferimentos na cabeça. Abaixo, consta noticia de jornal ,
derivada do site G1.com, informando que o policial mil itar causador da
80
Disponível em TJGO - http://www.tjgo.jus.br/index.php/home/imprensa/noticias/119-tribunal/7166-juiz-determina-arquivamento-de-inquerito-policial-em-que-vitima-agiu-em-legitima-defesa.
59
morte do manifestante acabou preso em f lagrante pelo homicídio
cometido.
O policial militar que baleou e matou um ambulante foi preso em flagrante e prestava depoimento no Departamento de Homícidios e Proteção à Pessoa (DHPP) na noite desta quinta-feira (18), de acordo com a Polícia Militar. Ele seria indiciado por homícidio por ter disparado à queima roupa contra a cabeça de um camelô que teria tentado tirar um spray de pimenta da mão dele durante um tumulto na Lapa, Zona Oeste de São Paulo,[...]. Na confusão, um ônibus também foi depredado. [...] Segundo a PM, os camelôs se revoltaram e passaram a atacar os fiscais da Prefeitura e os policiais militares.[...]. Um policial perdeu parte do colete à prova de balas na confusão. Ao menos seis pessoas foram detidas durante o tumulto na Lapa.
81
Neste caso em questão, não houve julgamento, não se podendo
exprimir opinião mais contundente, mas, prel iminarmente, f ica claro o
despreparo e precipitação do policial na ação, bem como que o mesmo
acabou por agir de forma desproporcional, f icando salvo, melhor juízo,
configurado o excesso.
4.10 “Na melhor das hipóteses foi despreparo”
Aqui consta notícia de jornal referente a fato ocorrido em
22/01/2013, na cidade de Porto Alegre (RS), onde um Policial Militar
teria atingido um sujeito, sob o argumento de que este estaria de posse
de uma faca, ameaçando usuários do sistema de trens daquele
município. Na notícia, nota-se evidente discordância entre o que diz o
Delegado de Polícia que atuou na apuração do caso e n ão efetuou a
prisão em f lagrante do Policial, com especialista em Segurança Pública
e Direitos Humanos daquele Estado, quanto à necessidade de o Policial
ter atingido o homem que portava a faca.
O episódio envolvendo dois usuários do Trensurb e um policial militar nesta terça-feira (22) não deverá ser apurado pela Corregedoria da Brigada Militar. O inquérito seria feito para apurar a reação do soldado Vinícius Alves de Souza (28 anos) durante abordagem a José Betamin Nunes (33 anos), por volta das 17h30, na estação Anchieta.
82
81
Disponível em GLOBO.COM - http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2014/09/pm-e-preso-suspeito-de-matar-camelo-durante-tumulto-em-sp.html, acessado em 06/12/2014. 82
Disponível em http://www.sul21.com.br/jornal/na-melhor-das-hipoteses-foi-despreparo-diz-especialista-sobre-ocorrencia-no-trensurb/ - acessado em 06/12/2014.
60
Já o especialista em Segurança Púbica Marcos Rolim considerou
a atitude do policial gaúcho um despreparo , arguindo que a arma
branca ut il izada pelo agressor não trazia risco aos usuários do trem.
No entanto, o especialista em Segurança Pública e Direitos Humanos, Marcos Rolim alerta para um possível despreparo da Brigada Militar na ação durante a ocorrência e discorda sobre o risco representado pelo indivíduo com a arma branca. “Na melhor das hipóteses, estamos diante de mais um caso de despreparo; na pior, frente a um possível homicídio”, avalia após assistir a vídeo feito por usuário na hora da ocorrência, veiculado pelo jornal Zero Hora. Conforme o delegado Filipe Bringhenti, titular da 2ª Delegacia de Polícia de Homicídios e Proteção à Pessoa, o suspeito vinha sendo monitorado pela empresa privada de segurança do Trensurb e uma intervenção seria feita na estação Niterói. “Porém, o brigadiano estava fardado na estação Anchieta e foi abordado pelos passageiros que pediram sua intervenção. Ele tinha que agir”, relata. [...].
83
Segundo o Delegado que apurou a ação do Policial Militar, a
legislação penal aceita a legítima defesa apenas mediante risco
iminente à vida e emprego de meio proporcional na defesa, e diz que a
arma de fogo era o único meio disponível que o policial possuía
naquele momento. Vide abaixo o complemento da matéria jornalíst ica:
Na análise do especialista em segurança pública Marcos Rolim, o vídeo não permite concluir se tratou-se de uma atitude de legítima defesa parte do policial – entretanto, pelo que se percebe no vídeo, a agressão do abordado contra o PM armado seria, no mínimo, pouco provável. “O sujeito sai do trem sem qualquer agressividade, em conformidade com o comando policial. Uma fração de segundos depois é alvejado. O mais provável é que o soldado tenha se assustado com algum movimento da vítima e como estava com a arma apontada, disparou”, acredita. Para Rolim, sem acesso às imagens do circuito interno do Trensurb ou depoimentos de testemunhas não se pode afirmar teses taxativas sobre ter sido legítima defesa ou não. Porém, a certeza que se tem diante das imagens filmadas pelo usuário é que o policial não deveria ter enquadrado o indivíduo, por ele estar sentado no chão. “Isto não oferecia risco nenhum, portanto, não se justifica o uso da arma de fogo. A arma que um policial porta não deve ser sacada para “amedrontar” alguém. Se havia algum risco pela conduta anterior do abordado, ele deveria ter sido algemado quando estava no chão e não enquadrado na mira do revólver”, argumenta. “Só restava a legítima defesa. A ação foi correta”, diz delegado.
Já o Delegado que anal isou a ocorrência admit iu que o policial
teria agido em ação legít ima, tendo em vista o iminente risco de vida
83
Disponível em http://www.sul21.com.br/jornal/na-melhor-das-hipoteses-foi-despreparo-diz-especialista-sobre-ocorrencia-no-trensurb/ - acessado em 06/12/2014.
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que o agressor representava naquele momento aos usuários do sistema
de trens, naquela ocasião:
O delegado Filipe Bringhenti reconhece que a legislação penal aceita a legítima defesa apenas mediante risco iminente à vida ou emprego de meio proporcional na defesa, mas diz que a arma de fogo era a única coisa que o policial tinha no momento. “A arma é mais do que a faca, mas era a única coisa que ele tinha e ele deveria agir naquela situação. O suspeito avançou para matar o policial, só restava legítima defesa. Foi uma ação correta”, diz.[...] O tiro atravessou o suspeito e atingiu o passageiro Jorge Luis da Rosa Vidal (50 anos). Ambos estão internados no Hospital Cristo Redentor. O suspeito, José Betamin Nunes, está sob custódia da Brigada Militar e teve prisão decretada por tentativa de homicídio ao policial. Ao se recuperar, prestará depoimento e será conduzido ao Presídio Central, diz o delegado Bringhenti. “Penso que este seja outro ponto no exame da conduta profissional do servidor (policial militar). Disparar em locais públicos com pessoas próximas ao alvo deve ser evitado pelos agentes encarregados de fazer cumprir a lei. A boa técnica policial assim o recomenda. No caso, o Estado poderá ser acionado, sim, pelo terceiro atingido, em ação cível de indenização por danos”, alerta Marcos Rolim.
84
O corregedor-geral da Brigada Militar, coronel João Gilberto
Fritz, disse que a conduta do soldado na ocorrência não ser ia apurada
por inquérito militar por ser um “ fato do dia-a-dia”. Ele salientou que a
investigação se daria pela Polícia Civil , uma vez que apenas “casos
complexos são enviados para Corregedoria”.
No caso a ação foi severamente crit icada por parte do
especialista em segurança, que apontou o despreparo do policial
militar, que efetuou disparo desnecessário, em local público, tendo o
tiro, além de atingir o suspeito, também atingido um usuário do trem
que se encontrava próximo.
4.11 Homem morre após ser imobilizado por pistola taser em
Florianópolis
De todas as armas disponíveis atualmente no mercado , das não
letais às letais , podemos dizer que nenhuma delas é isenta de risco
84
Disponível em SUL21 - http://www.sul21.com.br/jornal/na-melhor-das-hipoteses-foi-despreparo-diz-especialista-sobre-ocorrencia-no-trensurb/ - acessado em 06/12/2014.
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contra quem as forem eventualmente util izadas. Desde uma pistola de
choque a um spray de pimenta, todos trazem riscos à integridade física
do alvo e até mesmo à vida. Além disso, a polícia brasi leira ainda está
em fase de adequação quanto à ut i l ização de tais novidades. Além do
mais, falta treinamento quanto ao manuseio e, sobretudo, não existe
uma legislação específ ica destinada a se regulamentar o uso e se
coibir os excessos que representam. Assim, procuramos notícia
referente à util ização trágica de armas deste tipo, como a disposta
abaixo.
Na madrugada deste domingo, um homem de 33 anos de idade morreu após ser imobilizado por policiais com uma pistola taser, no bairro Ingleses, Norte da Ilha. Por volta das 2h30min, dois PMs do 21º Batalhão foram atender uma ocorrência de violência contra mulher em um apartamento nos Ingleses. O chamado veio de uma administradora de empresas de 31 anos. Ela estava com medo do companheiro, um assistente de controladoria de 33 anos. — Não sei a quantidade de cocaína que ele usou, mas estava muito alterado, com alucinações, surtado. Não me agrediu nem ameaçou, mas fiquei com muito medo. Liguei para o hospital e depois para a polícia que primeiro tentou conversar, algemar e segurar. Mas ele não parava de se debater. Daí dispararam aquele negócio (taser) nele. A primeira vez não fez efeito. Só na terceira vez — contou a dona da casa, que pediu para os nomes não serem divulgados. [...] No registro de óbito da vítima consta parada cardiorrespiratória. [...] Enquanto isso, no Estado de Nova Gales do Sul, na Austrália, onde morreu o brasileiro, a polícia pode suspender o uso do taser, pelo menos até o esclarecimento da morte do estudante.
85
4.12 Confronto entre polícia e manifestantes deixa 37 feridos
Eis uma questão controversa e muito discutida na atualidade.
Em rápida pesquisa pela internet, observamos diversos antropólogos,
sociólogos, policiais e juristas, todos debatendo este tema, havendo ,
para todos os lados, POLÍCIA X MANIFESTANTES, quem emita
opiniões polêmicas. Achamos outra matéria de jornal interessante, que
resume bem a forma com que a sociedade vem pensando tão gravoso
assunto.
85
Disponível em GGN - http://jornalggn.com.br/blog/luisnassif/o-taser-nao-letal-mata-outro-em-florianopolis - acessado em 06/12/2014
63
Do total de feridos, quatro foram encaminhados para o Hospital de Base e outros quatro foram para o Hospital Regional da Asa Norte. Os confrontos entre a Polícia Militar e manifestantes, deixaram 37 pessoas feridas nesta sábado (15/06/2014). [...]. Dos 37 feridos, quatro foram encaminhados para o Hospital de Base e outros quatro foram para o Hospital Regional da Asa Norte. Além disso, do total de feridos, 26 estavam envolvidos nas manifestações. Há suspeita que quatro dos manifestantes feridos tenham sido atingidos por balas de borracha. Uma estudante precisou levar nove pontos próximo à nuca, depois de ser atingida por uma bala de borracha disparada por policiais do Bope contra manifestantes no Eixo Monumental.[...].
86
No mesmo sentido:
Rio - A ação da Polícia Militar durante as manifestações, atingindo inocentes, entre eles idosos e crianças, dividiu especialistas no assunto. O antropólogo Paulo Storani, ex-capitão do Bope e especialista em negociação de conflitos, lamentou a atuação policial, mas criticou duramente os Black Blocks, e pediu mais rigor à polícia civil para a prisão dos criminosos que fazem parte do grupo. "É um grupo sem pretensões políticas, que não quer o poder, que não quer nada. Quer apenas a violência pela violência. E que se aproveitam do anonimato e de manifestações legítimas para atacar o patrimônio público, privado e, claro, a Polícia Militar. É fundamental a prisão destas pessoas, mas através de investigação e da identificação de cada um", disse Storani. O antropólogo concordou que houve excessos por parte da Polícia Militar e ressaltou a importância do papel da imprensa nestes conflitos. "A PM tem que revidar. Às vezes, usa os meios adequados, noutras não. Infelizmente, há abusos. E têm de ser punidos exemplarmente. A mídia tem o dever de apontar isso porque a polícia não pode ter carta branca para atuar e fazer o que quiser", avaliou Storani. Para Margarida Pressburguer, presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB-RJ, foi mais além. [...]. Enquanto não desmilitarizar, será sempre assim. A polícia olha o cidadão como inimigo, em qualquer situação. Se você estiver dirigindo falando ao celular, por exemplo, te abordam como bandido. Imagina num protesto?", questionou Margarida.” 87
86
Disponível em Correio Braziliense - http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/cidades/2013/06/15/interna_cidadesdf,371638/comandante-da-pm-chama-manifestantes-de-criminosos-e-nega-excesso-policial.shtml - acesso em 22.09.2014; 87
Disponível em Jornal Odia - http://odia.ig.com.br/noticia/rio-de-janeiro/2013-09-07/acao-da-policia-durante-manifestacoes-divide-especialistas.html - acessado em 02/11/2014.
64
CONCLUSÃO
Ao longo deste trabalho, observou-se a complexidade do
inst ituto da Legít ima Defesa, que, para valer, necessita da presença
dos requisitos objetivos dispostos no artigo 25 do Código Penal, bem
como do requisito de ordem subjetiva , que é o conhecimento, por parte
do agredido, da situação da injusta agressão e da necessidade da
repulsa. Neste sentido, podemos dizer que o excesso da legít ima
defesa se inicia, na prática, sob o amparo de uma excludente de
il icitude, que, devido ao excesso por parte de agente, transforma-se em
conduta punível, por ter sido realizada desnecessariamente, dolosa ou
culposamente. Por isso, obrigatoriamente , uma conduta para ser
considerada criminosa deverá conter os três elementos do crime, que
são a tipicidade , culpabilidade e a ilicitude . Na falta de um deles,
não há que se falar em crime.
As excludentes de il icitude encontram-se devidamente dispostas
junto a art igo 23 do Código Penal, sendo, porém, admitidas causas
supralegais de exclusão de il icitude, causas estas não expressas em
lei, mas que são admitidas por conta do seu relevante cunho social ,
sendo previstas e estabelecidas por doutrina e jurisprudência .
Aprendemos, ainda, que não são cabíveis, no caso da legítima
defesa, a doutrina da teoria da paridade de armas e do uso da menos
lesiva, quando do uso dos meios necessários para repelir injusta
agressão.
Assim, o mais coerente, em uma reação em legít ima defesa,
seria a adoção da teoria de que a vít ima e/ou terceiro pode util izar-se
do meio que estiver disponível (seja ele qual for) no momento em que
estiver sofrendo a atual ou iminente agressão, desde que este meio
seja uti l izado com moderação. Assim, os meios necessários deverão
ser uti l izados até que a agressão cesse, não importando , às vezes, que
o mesmo venha ser util izado, buscando-se, assim, que a agressão
termine. O bom senso é imprescindível quando da reação, pois , do
contrário, estaremos adentrando a seara do excesso, o que fatalmente
65
trará responsabil ização pelas eventuais ati tudes tanto culposas quanto
dolosas.
Por f im, abordou-se o Poder de Polícia concedido pelo Estado
ao policial, bem como a forma com que o mesmo deve ser colocado em
prática, observando-se o limite previsto pelas excludentes de i l icitude.
Vale dar destaque aos artigos dispostos no capítulo 4 do
trabalho, denominados Polícias brasileiras matam quatro vezes mais
que a dos EUA, Quem quiser que faça o meu trabalho! e A Arma e a
Flor, onde há bastante controvérsia dos respectivos autores quanto à
interpretação da forma ideal que a polícia deveria agir e de como
atualmente o vem fazendo. Quanto aos casos reais citados, como o do
Massacre do Carandiru, o do Sequestro do Ônibus 174, ocorridos há
mais de uma década e os outros, observam-se que as ações
“desastrosas” por parte da polícia se deram, a nosso ver, mais por falta
de experiência, preparo e planejamento, do que necessariamente por
dolo ou intenção de cometer o delito.
Já atualmente, como prof issional da segurança que somos há
mais de uma década, podemos dizer que há, sim, um esforço, t ímido
por sinal, por parte dos governos, visando a melhor qua lif icação e
preparo dos policiais brasileiros, diga-se de passagem a melhoria que a
própria Polícia Federal tem apresentado em sua estrutura na últ ima
década. Tal esforço, porém, f ica muito aquém do que seria o ideal,
permitindo ainda que ocorram episódios que acabam por abalar a
sociedade, prejudicando a reputação policial brasileira, tanto no país
quanto no exterior.
Como se não bastasse, podemos ainda dizer que a sociedade,
como um todo, não vem recebendo do Estado a devida atenção. Assim,
o desespero tem tomado conta de muitos, que , quando agem em
legítima defesa, até mesmo de seu patrimônio, têm dif iculdades de
dimensionar o que representa ria, naquele momento, a moderação,
situação esta muito bem sintetizada em trecho de artigo “Legít ima
defesa pré-ordenada, inusitada e desesperada! ”. Este art igo foi
publicado pelo advogado Fabrício da Mata Correa. Neste o advogado
diz que o desespero tem tomado conta de muitos, os quais, na hora de
66
optarem por meios “inusitados de defesa”, acabam lançando mão de
meios exagerados, no afã de solucionar o problema, tendo em vista a
inércia do Estado, como se esta fosse a sua única alternativa . Para ele,
um “mal diário e aparentemente sem solução”. 88
Neste cenário, o agente de segurança pública, em grande parte
com baixos salários e mal treinados, como qualquer ser humano,
muitas das vezes pode se deixar levar pela emoção, desespero, raiva,
irracionalidade e temor, disparando, em vez de um único tiro contra seu
agressor desarmado (ou de terceiro) , vários. Isto decorrente, naquele
momento por não dominar o seu raciocínio , repelindo um simples
empurrão com golpe de cassetete ou com a aplicação de spray de
pimenta, de forma totalmente excessiva e desnecessária . Tais atitudes,
por f im, lhe trarão responsabilização pelo evidente excesso.
Entendemos que a moderação e os meios necessários, quando
util izados pelos cidadãos de bem, devam ser uti l izados de forma
racional e equilibrada. Já quanto aos policiais, cujos meios
necessários, na maioria das vezes, se resumem a armas de fogo, esta
racionalidade deveria ser de maior comprometimento e relevância, pois
o resultado danoso, provocado por tal instrumento em mãos de
prof issional preparado para lidar com a mesma, normalmente tem
resultados gravosos e muitas das vezes letais . Até por que, como já
dissemos anteriormente, o uso da força e por f im da arma de fogo, será
indicada, devendo-se antes serem esgotadas todas as possibil idades
de resolução do problema, com a util ização de meios não violentos ou
de armas não letais.
Assim, diante do que fora apresentado, esperamos ter
respondido ao questionamento de nosso trabalho, relembrando que os
meios necessários, no momento da iminência ou atualidade do ataque ,
deverão ser ut il izados pelo policial de forma moderada, a f im de que
excessos não se constatem, o que, se assim o for, lhe trará
responsabil idades perante a Justiça.
88
Disponível em http: / / fabr ic iocorrea. jusbrasi l .com.br /ar t igos/121941330/ legi t ima -defesa-pre-ordenada- inus i tada-e-desesperada. Acessado em 24/11/2015.
67
Nossa pesquisa continuará, pois se trata de matéria em
constante evolução e presente no cotidiano e no seio social. Tivemos a
grande honra e orgulho de trabalhar com o tema de tamanha
relevância, principalmente, para aqueles que tanto se importam e
amam o Direito Penal.
68
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