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XIII Reunião de Antropologia do Mercosul GT 45 - Entidades religiosas: agenciamentos, materialidades, fluxos e diásporas No rastro dos Orixás: agenciamentos, materialidades e formas de existência nas práticas rituais umbandistas realizadas na natureza Lucía Copelotti Universidad Católica del Uruguay (UCU) [email protected] 22 a 25 de Julho de 2019 Porto Alegre (RS)

No rastro dos Orixás: agenciamentos, materialidades e

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Page 1: No rastro dos Orixás: agenciamentos, materialidades e

XIII Reunião de Antropologia do Mercosul

GT 45 - Entidades religiosas: agenciamentos, materialidades, fluxos e

diásporas

No rastro dos Orixás: agenciamentos, materialidades e formas

de existência nas práticas rituais umbandistas realizadas na

natureza

Lucía Copelotti

Universidad Católica del Uruguay (UCU)

[email protected]

22 a 25 de Julho de 2019

Porto Alegre (RS)

Page 2: No rastro dos Orixás: agenciamentos, materialidades e

Introdução

A possibilidade de direcionar os esforços à produção da simetria entre

diferentes regimes de conhecimento e entre humanos e não humanos tem

emergido com força nos últimos anos, caracterizando um debate que ganha

cada vez mais concretude na disciplina antropológica. A partir do que tem se

enunciado como uma virada ontológica1, mediante a proposição de esquemas

teóricos que acentuam a necessidade de ir além de abordagens consagradas

na tradição intelectual do Ocidente Moderno que operam através de “grandes

divisores”, tais proposições apontam para o fato de que a visão dualista do

universo, que atua pela afirmação de oposições binárias – como

natureza/cultura, mente/corpo, sujeito/objeto, indivíduo/sociedade – não deve

ser projetada como um paradigma ontológico sobre outras culturas. Tal visão,

longe de ser universal, não corresponde aos modos como os diferentes grupos

e povos não ocidentais concebem e organizam o(s) cosmo(s).

Trata-se não apenas de romper com a universalização das categorias,

avançando na superação do etnocentrismo, como abandonar uma ontologia

antropocêntrica (DE LANDA, 2003), na qual o real e o não real são definidos a

partir do que nós humanos somos capazes de observar e perceber. A proposta

é investir na efetivação de uma ontologia simétrica que busca não “apenas

reconhecer a diversidade cultural e levar em conta o ponto de vista do "outro"

humano, mas de considerar o ponto de vista das coisas e dos organismos não

humanos que habitam o mundo” (STEIL & CARVALHO, 2014:166).

Concebendo o conhecimento não como um saber sobre o mundo e os seres

que o habitam, mas como o resultado da relação com e no mundo que a

multiplicidade de seres, entidades, coisas, estabelecem entre si. Em outros

termos, para se conhecer o mundo é fundamental o engajamento, atendendo

ao “fluxo generativo dessas relações de mútua afecção”, de forma que sejamos

capazes de reconhecer aquilo que “torna possível aos organismos humanos e

1 De acordo com Taddei e Gamboggi (2016), “A expressão “virada ontológica” refere-se a uma transformação em parte importante da produção acadêmica contemporânea, onde preocupações mais propriamente epistemológicas cedem espaço à reflexão sobre a dimensão ontológica da existência; em outras palavras, onde o estatuto de verdade dos enunciados, e mesmo a reflexão a respeito das dimensões discursivas de enunciação, dão lugar à preocupação com o estatuto dos existentes enquanto tais”.

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não humanos existirem, conviverem e constituírem a si mesmos e ao mundo

em contínua relação” (CARVALHO, 2014: 79).

Partindo desses pressupostos, o exercício que me proponho nesta

comunicação está orientado pelo interesse de indagar a respeito das

associações entre humanos e não humanos na produção e reprodução da

Umbanda, tomando como foco de interesse empírico as práticas religiosas

realizadas em paisagens naturais. Os dados apresentados ao longo do

trabalho são produto da etnografia desenvolvida no meu mestrado em

Antropologia, no qual busquei compreender a concepção de natureza presente

na cosmologia umbandista a partir da centralidade concedida aos rituais

realizados nos espaços naturais, mais precisamente nos “pontos de força”. Em

um primeiro momento, procuro privilegiar uma descrição detalhada e extensa

dos rituais atendendo para o agenciamento das coisas e dos corpos implicados

em tais situações, de forma a evidenciar a malha de relações entre a

diversidade de seres que conformam o cosmos umbandista e explorar os

processos por meio dos quais as entidades espirituais adquirem forma e

eficácia nos contextos etnografados. Em um segundo momento, busco tecer

algumas reflexões (provisórias) sobre a possibilidade de considerar a

relevância da minha interlocução com as entidades espirituais na produção do

conhecimento antropológico sobre o contexto investigado, reconhecendo a

singularidade das perspectivas dos diversos seres no seu habitar o mundo

(INGOLD, 2012).

1. O ritual de Obrigação da Cachoeira

Ao longo da minha pesquisa de campo acompanhando as atividades da

Tenda Espírita Vovó Nazareth e Povo Baiano, localizada no município de

Cachoeiras de Macacu, Rio de Janeiro, pude perceber que nas ocasiões em

que fazia-se necessário realizar algum ritual fora do espaço do terreiro, fosse

este uma obrigação, uma oferenda, um ebó, um despacho, ou mesmo nas

ocasiões em que Mãe Neide reivindicava o direito de acesso e uso das áreas

naturais, raramente essa necessidade era expressa aludindo à necessidade

de “ir à natureza”. Na maioria das vezes, falava-se da exigência de visitar os

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“pontos de força”, de modo a cumprir com a realização do ritual ou concluir

alguma das etapas do trabalho mágico-religioso em curso.

Na cosmologia umbandista, os diferentes “pontos de força” apresentam-

se enquanto locais que concentram as energias e frequências vibracionais dos

Orixás. Esses espaços, habitados por uma multiplicidade de entidades

espirituais e constituídos mediante a identificação e correspondência das

divindades aos elementos e fenômenos naturais – como rios, campinas,

florestas, raio, trovão, vento, etc. – são primordiais na produção e reprodução

da Umbanda. Nesses ambientes encontram-se a energia e a força dos Orixás e

dos guias espirituais; ambientes onde os praticantes podem sintonizar-se a

essa energia fundamental através da interação e da comunicação que se

estabelece com esses seres mediante a execução dos pontos cantados, a

realização de preces, de danças, do desenvolvimento de práticas mágico-

religiosas e da oferta de presentes, sobretudo, dádivas alimentares.

Nessa direção, a significação dos diferentes espaços naturais enquanto

“pontos de forças” não podem ser dissociados dos sentidos atribuídos às

práticas ali desenvolvidas. Ir aos pontos de força é, dessa forma, restabelecer o

equilíbrio do médium por meio do contato com as divindades e entidades que lá

habitam. Dentre as práticas realizadas nos “pontos de força” com a finalidade

de renovação da vitalidade e do reequilíbrio energético do médium, os rituais

denominados como obrigações apresentam-se como fundamentais para esse

objetivo. Nesse contexto, o ritual de Obrigação da Cachoeira configura-se,

dessa forma, como um dos ritos coletivos anuais que devem ser realizados

pelos médiuns visando a limpeza espiritual e fortalecimento da “coroa

mediúnica”2, protegendo e possibilitando o bom desempenho das pessoas

envolvidas com o trabalho mediúnico da casa.

O ritual realizado simboliza o trabalho nas “águas puras e límpidas de

Oxalá”3. Pede-se a purificação de todas as “águas sujas”, isto é, de tudo de

ruim que se passou na vida do filho de santo, afastando todas as negatividades 2 A “coroa mediúnica”, conforme explicou Vovó Mariquita em uma das sessões de trabalho de desenvolvimento, é composta da seguinte forma: no centro, no topo da cabeça, temos o “Ori”, ocupado por Oxalá, divindade suprema do cosmos umbandista; a região da testa é ocupada pelo o Orixá principal da pessoa, chamado de pai ou mãe de cabeça; nas laterais esquerda e direita, tanto na parte frontal quanto na parte traseira da cabeça, assentam-se mais quatro Orixás, os quais conformam o chamado “pedestal”, essencial na sustentação da coroa mediúnica. 3 Essa explicação me foi dada por Vovó Nazareth no dia seguinte ao ritual.

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que possam estar interferindo no seu bem estar e no seu equilíbrio, com a

intenção de assim possibilitar a sua renovação energética e o refortalecimento

da vitalidade do médium.

Assim, por ocasião da Obrigação da Cachoeira, o primeiro ato da mãe

de santo ao ingressar no espaço no qual foi realizado o ritual foi pedir licença

aos seres que lá habitam para adentrar o local. Os filhos foram caminhando na

frente de Mãe Neide enquanto esta acendia uma vela que foi deixada no início

de uma das trilhas que leva até a margem do rio. Sacudindo o adjá4, ela foi se

perdendo na mata enquanto pedia licença e gritava “Salve! Salve o povo das

matas!”.

Já na beira do rio Mãe Neide chamou uma vez mais a atenção dos

médiuns para a importância de saudar as entidades espirituais, pois todo

espaço sagrado – seja o terreiro, ou os pontos de força – tem os seus

guardiões. Com certa impaciência, a mãe de santo falou para aqueles filhos

que estavam preocupados em deixar tudo arrumado para o momento da

cerimônia que ela já havia mandado “todo mundo ficar virado de frente para o

rio”, afirmando que ela não começa a “trabalhar sem pedir licença”. Saudaram-

se assim as sete linhas da Umbanda5, evocando cada Orixá e sua saudação

correspondente, e encerrou-se esse momento dizendo “com a proteção de

Ogum, a força de Oxalá, o sol a me esquentar, a lua a me clarear, são as

águas abençoadas do meu Pai Oxalá. Em nome do Pai, do Filho e do Espírito

Santo. Em nome de todo santo, na força dos Orixás”.

Para escolher o local adequado para a realização do ritual, a mãe de

santo, de pé sobre uma pedra, olhou atentamente o rio, analisando o fluxo das

águas. Depois de observar o local, retrocedeu um pouco, contornou outra

pedra e entrou na água posicionando-se no ponto exato onde ficaria até

finalizar a sequência ritual correspondente à “lavação da coroa”. Era o ponto de

maior fluxo d’água, onde se produz a queda e o rio precipita-se para em

seguida confluir e formar uma pequena piscina natural. Esse é o ponto exato

onde as águas correm com maior intensidade, possibilitando, nesse sentido,

4 O adjá é uma espécie de sineta usada pelo sacerdote para sinalização ou ativação de alguma linha espiritual de trabalho, apresentando-se como um instrumento essencial na comunicação entre os devotos e seus guias. 5 A linha refere-se à uma faixa vibracional ou energética específica dentro da corrente vibratória

espiritual, a partir da qual se efetua a organização dos espíritos. A Umbanda seria, assim, constituída por sete linhas principais e cada uma delas está sob a direção de um Orixá.

Page 6: No rastro dos Orixás: agenciamentos, materialidades e

que os fluídos negativos sejam carregados pela correnteza e a renovação das

energias do filho de santo se concretize.

Os aspectos ligados à escolha do local dentro do rio para execução da

prática ritual é fundamental para a compreensão dos diversos simbolismos

associados à “Obrigação da Cachoeira”. Tal dimensão é relevante não apenas

para o entendimento da função que as águas cumprem no processo de

renovação energética dos médiuns, mas também pela associação que se

estabelece entre os elementos naturais e as divindades que, tendo o domínio

sobre esses elementos, agem sobre os filhos de santo. Nesse âmbito, ora os

elementos e fenômenos naturais apresentam-se como objetos que propiciam a

comunicação entre as deidades e seus devotos; ora as deidades apresentam-

se como donas desses elementos, confundindo-se, assim, com os próprios

elementos.

Chegado o momento de dar início à etapa correspondente à “lavação da

coroa”, Mãe Neide me pediu que não registrasse com a câmera fotográfica o

instante em que a pessoa é mergulhada e disse que depois que ela lavasse a

cabeça de cada filho e a cobrisse com o pano branco, eu poderia voltar a

fotografar. Em respeito ao pedido da mãe de santo, não realizei nenhum

registro dessa sequência ritual, voltando a utilizar a câmera fotográfica após

receber a autorização de Vovó Nazareth. Assim, sentada sobre uma grande

pedra, de frente para Mãe Neide, observei mais uma etapa do ritual de

Obrigação da Cachoeira.

A etapa realizada dentro do rio é antecedida pelo agraciamento de

“mamãe Oxum” e o “povo das águas” mediante oferecimento de um melão,

com o qual se faz uma espécie de vasilha e é preenchido com mingau de

creme de arroz regado com um pouco de mel, e de uma vela, acesa ao lado da

oferenda. Ao entregar o melão, deve-se agradecer por todas as bênçãos

recebidas e também pedir a estes seres que lhes concedam “força e firmeza” e

que suas energias sejam renovadas. Desse modo, à medida que os filhos

concluíam a “oferenda de firmeza”6 foram sendo chamados por Mãe Neide

6 Na Umbanda, “firmar” significa assentar ou estabelecer um ponto de força espiritual. Acontece

quando acionamos o plano espiritual pela ação de nossa vontade e nosso pensamento. Assim, uma firmeza para Oxalá pode ser, por exemplo, uma vela acesa junto a uma prece feita à imagem de Jesus Cristo.

Page 7: No rastro dos Orixás: agenciamentos, materialidades e

para, então, passarem pelo processo de “fortalecimento e confirmação da

coroa”.

A fórmula ritual executada nessa etapa é constituída por uma série de

gestos, repetidos sequencialmente, que consistem em mergulhar a cabeça do

filho de santo por três vezes sucessivas na água; em seguida, a mãe de santo

pede que lhe seja entregue a primeira bebida a ser utilizada para a “lavar a

coroa”. Derrama-se então, vagarosamente, o líquido na moleira do filho,

esfregando-o em sentido circular, salvando a linha ou entidade que está sendo

evocada. Em outras palavras, a ação consiste em ir lavando a “coroa” e

“gritando em cima do Orixá”, isto é, pedindo para que as divindades concedam

a renovação da força da “coroa” e sua firmeza, e, através da manifestação no

corpo do filho de santo – em um estágio preliminar de incorporação –

confirmem a “obrigação”.

Os médiuns que não estavam de obrigação encarregavam-se de auxiliar

Mãe Neide, alcançando os elementos necessários para a “lavagem da coroa” e

mantendo a “firmeza” do ritual pela evocação constante dos pontos cantados

em homenagem a Oxum. Usa-se nesse ritual as bebidas correspondentes a

cada Orixá ou à linha, no caso dos guias espirituais. Na ocasião, os filhos

receberam na “coroa” a cerveja branca (pilsen) de Ogum; cerveja preta de

Xangô; o espumante Chuva de Prata para as iabás, Orixás femininos

correspondentes a Oxum, Iansã, Iemanjá e Nanã; vinho tinto de Oxóssi;

guaraná e soda limonada para os Ibejis, entidades infantis; vinho moscatel do

povo da Bahia; e, finalmente, a água mineral de Oxalá.

Cada bebida aciona a entidade à qual se associa, coagindo os guias

espirituais a se fazerem presentes e, com isso, propiciarem a renovação das

forças da “coroa”. Essas bebidas são utilizadas na cabeça de todos os filhos,

contudo, a ordem varia segundo a intuição de Mãe Neide. À medida que o ritual

vai se desenvolvendo, ela vai gritando a ordem das bebidas para os filhos que

a auxiliam, segundo o conhecimento das características da coroa do médium.

Ou seja, se trata-se de um filho de Xangô, a primeira bebida utilizada pela mãe

de santo para lavar a cabeça será a cerveja preta, pois é a bebida

correspondente a esse Orixá.

Concluída essa sequência, a mãe de santo amarra um pano branco na

cabeça do médium, garantindo a proteção de sua coroa. Nesse momento lhe

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são entregues seis palmas7, sendo três brancas e três vermelhas, simbolizando

o lado direito e o lado esquerdo que constituem a Umbanda8. Com as palmas

em mãos, a mãe de santo passa o ramalhete na testa, em um ombro, no outro,

nas costas e na frente do filho, sem encostar no corpo. Feito isto, o médium,

em um ato de oferecimento, entrega as flores para as águas.

Findado o processo de “confirmação da coroa” propriamente dito, Mãe

Neide incorporou Vovó Nazareth para dar seguimento à etapa final do ritual.

Apoiando-se no seu bastão, a preta velha caminhou até a beira do rio, e

acomodando-se em uma pedra, pediu que lhe alcançassem uma vela, seu

fumo e seu cachimbo. Em seguida, ordenou que aqueles filhos que estavam de

obrigação entrassem no rio, formassem um círculo e, a seguir, ficassem de

costas uns para os outros. Enquanto aguardava os filhos se organizarem, Vovó

permaneceu ali sentada, calada por alguns segundos, apenas fumando. Após

esse instante de silêncio, trocamos algumas palavras, ela mencionou que

agora eu poderia fazer registros fotográficos novamente e que esse ritual trazia

“o ensinamento de não colocar louças que tão lá reclamando”, referindo-se ao

uso do melão para ofertar o mingau ao “povo das águas” em substituição das

“panelas”9.

Com os filhos perfilados segundo suas orientações, Vovó os instruiu

acerca de como deveriam saudar as entidades espirituais e nesse ato ir

pedindo a “força e a firmeza”. Deste modo, a saudação ao “povo dos astros” foi

feita com as mãos direcionadas ao céu e os braços bem estendidos, batendo

palmas em seguida; para saudar Oxum, os médiuns posicionaram as mãos na

altura do tronco, como se estivessem transmitindo alguma bênção, e assim

bateram palmas; finalmente, para a saudação ao “povo das águas” os médiuns

posicionaram os braços ao lado do corpo e bateram suavemente na superfície

da água por alguns segundos.

7 As palmas, palma-de-santa-rita ou gladíolo são flores de formato campanulado reunidas duas

a duas em uma espiga longa e ereta na ponta de um talo cilíndrico e firme. 8 De acordo com o que foi explicado certa vez por Mãe Neide a Umbanda constitui-se pela

divisão em duas linhas ou lados complementares: lado direito e lado esquerdo. Basicamente, o lado direito é composto por entidades como Caboclos, Pretos-Velhos, Erês. Já, o lado esquerdo, corresponde à linha espiritual na qual trabalham os Exus e Pomba-giras. 9 Também conhecidas como alguidares, as panelas são potes de barro utilizados para

depositar a comida que é ofertada aos Orixás e aos guias espirituais. A frase proferida pela Vovó fazia referência às discussões desenvolvidas no âmbito do Grupo de Trabalho Florestas Sagradas, criado no âmbito do Parque Estadual dos Três Picos, sobre os “impactos” da realização de oferendas no interior da Unidade de Conservação e suas possíveis soluções.

Page 9: No rastro dos Orixás: agenciamentos, materialidades e

Enquanto os filhos faziam suas saudações Vovó Nazareth chamou um

dos médiuns que auxiliava no ritual, e pediu a ele que entrasse na água e

distribuísse três palmas brancas para cada um. Depois que todos estavam com

as flores em mãos Vovó os orientou para que abrissem as palmas em forma de

leque, com o cabo em direção ao corpo, e mantendo-as assim, fizessem suas

súplicas ao “povo das águas”, pedindo também que esses lhes concedessem

“vitória, luz, força, firmeza e prosperidade”. Em seguida, seguindo as instruções

da Vovó, eles soltaram o leque, empurrando-o para frente. À ação de “entrega”

das flores em leque, seguiu-se uma salva de palmas, entusiasmada pela preta

velha, que gritando “salve o povo das águas, na sua luz, na sua força, na sua

firmeza” e com o braço levantado, como abençoando aquele instante,

cumprimentou os seres que habitam as águas do rio.

O momento da “soltura do leque” demandou toda a atenção e

concentração dos filhos de santo, uma vez que é fundamental observar o

trajeto das flores no instante em que estas são entregues. É através do

percurso do leque no rio que o “povo das águas” confirma a aceitação do ritual

realizado. Na ocasião, nenhuma palma cruzou, confirmando o êxito da

obrigação e a aceitação daquilo que havia sido ofertado. Caso as palmas

tivessem assumido outra disposição, seria preciso esperar alguns meses para

saber o desejo do “povo das águas” e, então, executar novamente o ritual,

seguindo as especificidades apontadas pelas entidades espirituais.

Além dessa dimensão relativa à eficácia do ritual, o ato de soltar as

palmas em leque indica que se está ofertando e agraciando o povo das águas

e também o povo dos astros10. Trata-se, como apontou Mãe Neide, de

agradecer pela licença que lhes foi concedida pelos seres que habitam naquele

“ponto de força” para que pudessem não apenas ingressar no espaço físico,

mas, fundamentalmente, “pelo momento que permitiu que pudéssemos ter

chegado até ali”, realizando com tranquilidade os trabalhos.

10

De acordo com o que me explicou Mãe Neide no dia que a entrevistei, o “povo dos astros é um lado espiritual também, mas é dos astros. Normalmente eles não incorporam, é justamente ai onde entra a agua; visão. Então aquele médium que tem a mediunidade dele, mas ele não incorpora, ele consegue ver naquele copo de água. [...] Tem aqueles médiuns que curam, que interpretam algo pra você, eles vem isso através da agua”. Normalmente, essa visão ocorre pela visualização de uma imagem que pode formar-se no copo ou mesmo na mente do médium. A menção nas orações e pontos cantados ao “sol que esquenta, a lua que ilumina e as estrelas que brilham” refere-se, dessa forma, à força dos astros.

Page 10: No rastro dos Orixás: agenciamentos, materialidades e

A dimensão do encontro, ressaltada na fala de Mãe Neide, apresenta-se

como um aspecto de extrema relevância na reflexão acerca da concepção de

“natureza” que emerge no cosmos umbandista. Nada se faz sem que haja o

encontro; sem a interação entre os humanos e os seres sencientes que

habitam e reverberam no mundo.

Como é possível depreender pela análise do ritual de Obrigação da

Cachoeira, há diferentes formas de entrar em contato com o sagrado. A

sequência ritual executada nessa ocasião aponta para as interações

estabelecidas, na qual as flores, a água do rio, o mingau ofertado, constituem-

se como canais de mediação importantes na comunicação entre os humanos e

os não humanos, entre o plano visível e invisível – físico e metafisico – desse

mundo. As entidades e guias espirituais manifestam sua agência a través de

ordens distintas de materialização. No contexto investigado, esses seres são

entendidos como presenças fugazes que infundem objetos, plantas, alimentos,

substâncias, mobilizadas ritualmente, ou que causam sensações e

transformações corporais, como no caso das bebidas utilizadas no ritual que

instavam as entidades a trabalhar. Desse modo, as manipulações de materiais

e as intervenções rituais são condições necessárias para as interações e

materializações espirituais.

2. Da calunga pequena à calunga grande: a entrega do barco para

Iemanjá

No fundo do mar tem areia

No fundo do mar tem gongá

Tem tanta gente jogando flor pra mamãe sereia

Tem tanta preta velha fazendo cantiga na beira da areia

(Ponto cantado por Vovó Catarina ao iniciar os trabalhos do

ritual de entrega do barco para Iemanjá)

Na cosmologia religiosa umbandista, reconhece-se na praia e no mar,

isto é, na calunga grande um espaço de devoção habitado por uma infinidade

de seres, desde grandes Orixás como Iemanjá e Ogum, entidades como as

sereias, caboclas das águas, exus, pomba-giras, marinheiros, assim como de

Page 11: No rastro dos Orixás: agenciamentos, materialidades e

almas esquecidas e espíritos sofredores a espera de redenção. Espaço de

muitos mistérios e grandes segredos, o seu governo é atribuído

fundamentalmente a Iemanjá, entretanto, como sinalizou Vovó Nazareth em

uma das nossas conversas, embora seja dela o poder maior sobre as águas

salgadas, ela não governa sozinha. Junto com ela também estão Ogum e

Iansã, e esses outros tantos seres que habitam a beira da praia e as

profundezas do mar.

A existência dessas outras entidades é reafirmada pelo ponto cantado

por Vovó Catarina ao iniciar os trabalhos do ritual de entrega do barco de

Iemanjá que ao aludir à presença dessa variedade de seres menciona que “no

fundo do mar tem gongá”, tem um altar. Ao chamar minha atenção para esse

fato, Vovó Nazareth fez questão de apontar que “a religião é uma coisa

maravilhosa, mas ela é cheia de segredos”. Por esse motivo, segundo Vovó

Nazareth, a entrega de barcos e presentes para Iemanjá nos dias festivos e em

outras ocasiões não deve ser feita de qualquer maneira, nem tampouco a

qualquer tempo, justamente por esses outros seres que habitam a calunga

grande e que muitas vezes são esquecidos por aqueles que vão fazer suas

oferendas e seus pedidos. O que ilustra tal assertiva, de acordo com a entidade

espiritual, é a quantidade de barcos que ficam na beira da praia após serem

entregues no mar nos dias dos festejos para a Mamãe Sereia.

Para além dos contornos que assumem as representações em torno à

crença em Iemanjá no imaginário nacional, na cosmologia umbandista a

devoção à “rainha do mar” pode adquirir, em suas diferentes modalidades, um

estatuto primordial na vida de um “zelador de santo”. Tal é o caso da Obrigação

de Entrega do Barco de Iemanjá realizada pelo pai ou mãe de santo a cada

sete anos. A soltura do barco para Iemanjá é um momento fundamental na

trajetória espiritual de um “zelador”. Como me foi explicado por Mãe Neide, isto

se deve ao fato de que o percurso do barco no mar indica quanto tempo de

missão o pai ou mãe de santo ainda tem pela frente. Assim, quanto mais longo

o trajeto que o barco percorrer no mar e mais tempo ele permanecer sem virar

ou afundar maior a certeza de que se têm muitos anos mais de sacerdócio pela

frente.

Page 12: No rastro dos Orixás: agenciamentos, materialidades e

Mãe Neide escolheu a praia da Barra de Maricá para realizar o ritual de

entrega do barco no dia 02 de fevereiro de 201611. Quando cheguei à praia, a

mãe de santo, junto dos filhos escolhidos para acompanharem a cerimônia –

acabara de dar início aos trabalhos. Na beira da água, posicionados de frente

para o mar, salvavam os habitantes da “calunga grande”, pedindo força,

firmeza e proteção na execução dos trabalhos. Quando terminou a “salva”, Mãe

Neide incorporou, recebendo Vovó Catarina, Guia espiritual que comandou o

ritual. A preta velha, após cumprimentar a todos, começou a cantar e, enquanto

se dirigia ao seu banquinho, posicionado baixo a sombra do guarda sol,

orientou os filhos a “firmar o ponto”12 para abrir os trabalhos.

Poucos minutos da chegada de Vovó Catarina à “terra fria”, outro

médium também incorporou seu preto velho, Pai José de Angola, que

acomodou-se ao lado da vovó. Fumando o seu cachimbo, a Preta Velha

“puxou” outro ponto, o qual fazia referências diretas ao ritual de entrega13,

pedindo para que Iemanjá, “rainha do mar”, recebesse o barquinho que lhe

seria ofertado naquela manhã.

Por se tratar de um ritual de extrema centralidade para a vida do zelador

é indispensável o cuidado na preparação do barco que será entregue a

Iemanjá. A preocupação diz respeito tanto à apresentação do barco, aos

presentes que serão entregues para a “rainha do mar”, quanto à intenção e ao

modo como são realizados os pedidos direcionados à divindade e depositados

no interior do barco.

Vovó Catarina, ao iniciar a preparação do barco, pegou cada um dos

pedidos - escritos a lápis e em papel de seda -, abriu um a um, lendo-os

atentamente. À medida que foi lendo os pedidos, a preta velha foi depositando-

os novamente no barco, desta vez abertos, e também emitindo alguns

11

Conforme me explicou Mãe Neide, em seu terreiro, a “soltura” do barco costuma ser realizada, normalmente, nos dias 31 de dezembro. Este ano, devido a uma série de imprevistos e impedimentos de ordem material, como o fato da mãe de santo ter que trabalhar no dia, o barco teve que ser entregue no dia 02 de fevereiro. 12

A expressão “firmar o ponto” refere-se à busca pela concentração coletiva, que se alcança cantando um ponto “puxado” pelo Guia responsável pelos trabalhos. O “ponto firmado” pode ser tanto cantado como também riscado ou a combinação de ambos. Ainda, a expressão remete também às situações em que o Guia “dá” o seu ponto cantado e/ou riscado como prova de sua identidade. 13

O ponto cantado foi o seguinte: “Nas ondas do mar tem uma rainha que é Iemanjá/ Mamãe, mamãe, o lhes ajude, lhes ajude eles precisam trabalhar/ Com a tua força, tua firmeza, tua ajuda/O seu barquinho, o seu barquinho eles querem entregar/Mamãe, mamãe, oh lhes ajude, lhes ajude eles querem trabalhar/Odociaba!”.

Page 13: No rastro dos Orixás: agenciamentos, materialidades e

comentários sobre alguns deles como: “Esses filhos não sabem nem pedir, ta

escutando?”, ou observações que ressaltavam a beleza e humildade de outros

pedidos, os quais, por mobilizarem energias positivas por meio dos bons

desejos emitidos14, contribuiriam para tornar o barco mais “formoso”.

Outro cuidado que se deve ter com relação aos pedidos é que esses não

podem, de forma alguma, ser assinados ou conter nomes, nem mesmo quando

o nome que aparece no texto não é o do autor do pedido, mas o nome da

pessoa para quem se pede algum tipo de bênção. Esse preceito, segundo me

disse Vovó Catarina na ocasião, assenta-se no princípio de que são as

entidades espirituais que devem nos identificar, e não o contrário; “não tem que

se identificar para o santo, o santo que identifica você”. Para exemplificar a

situação, Vovó deu como exemplo os casos de atendimento espiritual no

terreiro nos quais uma pessoa vai pedir intercessão por outra, nessas

circunstâncias, deve-se falar o nome da pessoa, não escrever, e o guia que

está dando a consulta confirma ou não se a “criança”15 mencionada é a que

ele está vendo, pois a identificação dá-se pelo reconhecimento da energia.

Assim, dos pedidos com nomes, somente aqueles nos quais foi possível

suprimi-los cortando parte do papel, puderam ser entregues.

Do mesmo modo que os pedidos foram ganhando seu lugar específico

dentro do barco, os pentes, de cor branca, e os pequenos espelhos

arredondados, de cor azul celeste - ambos de plástico-, foram acomodados nas

laterais da embarcação de aproximadamente 50 centímetros de comprimento.

Os pequenos frascos de perfume, saquinhos com talco e sabonetes, que

estavam em caixinhas estampadas com a imagem de Iemanjá, foram retirados

das embalagens e espalhados no fundo do barco. Além desses objetos de

perfumaria presenteados à “rainha do mar”, que evocam a feminilidade e

beleza desse Orixá, cinco barquinhos feitos de papel de seda de diferentes

cores – os fuxicos16 de Mãe Neide – compunham também a oferenda.

14 De acordo com o que expressou Vovó Catarina na ocasião, os pedidos mais “formosos”, mais bonitos, são aqueles que priorizam os agradecimentos, ao invés dos pedidos. 15 Na linguagem dos pretos-velhos, o termo “criança” pode ser entendido como um sinônimo de pessoa, uma vez que mesmo indivíduos em idade adulta são também referidas como “crianças”. 16

Segundo me explicou Mãe Neide, os fuxicos são pedidos de firmeza realizados pelo médium aos guias que conformam os pilares de sua coroa. Os fuxicos são permeados pelo segredo, não podendo ser revelados a ninguém.

Page 14: No rastro dos Orixás: agenciamentos, materialidades e

As flores ofertadas, sete palmas brancas, foram acomodadas por Vovó

Catarina em toda a extensão do barco. Na popa, fixaram-se quatro velas

brancas acesas. Por fim, Vovó pediu que uma das filhas de santo fosse até a

água, submergisse a garrafa do espumante Chuva de Prata, o abrisse e,

jogando um gole da bebida no mar, “salvasse” as “águas”. Quando Liana

retornou, a entidade, com a garrafa em mãos, saudou as iabás ao grito

continuo de “Eparrei, Odoiá, Ora ieieo” e ofertou a bebida banhando com ela a

embarcação.

Enquanto arrumava o barco, Vovó conversava com os filhos. Explicava

algum preceito ao indicar como se deve pedir; o que deve ou não ser entregue

no barco; e esclarecia como seria feita a entrega (“Eu vejo que não precisa

entrar, só ficar na beira d’água, contar as sete ondas e entregar”). Esse último

aspecto é especialmente relevante para compreender os contornos do

processo de comunicação que se estabelece entre os devotos e suas

deidades. E explicando alguns dos significados atribuídos aos percursos do

barco no mar, complementou:

Se tivermos o tempo pela frente, ele vai, ta escutando? É assim. Se o tempo ta na metade ele vai até ali e vai virar. Se o tempo não é pra ir, ele vai e vai voltar. É assim, cabe a firmeza de vocês e a busca de vocês. Por isso, quando um zelador vai soltar um barco, não se carrega muita gente e tem que ver os pedidos que bota no barco, que acaba virando tudo de cabeça pra baixo. (Vovó Catarina, Ritual de Entrega do Barco de Iemanjá, 02 de fevereiro de 2016)

Nessa direção, além da qualidade dos pedidos, como já foi apontado

anteriormente, o pensamento e a energia desprendida por aqueles que

acompanham tal ritual é também um aspecto primordial para o sucesso da

obrigação. A centralidade dessa dimensão diz respeito ao princípio da

cosmologia umbandista que afirma a importância da qualidade e da força do

pensamento, bem como da intenção emanada em qualquer entrega ou

“trabalho” que deva ser realizado.

As preces e os pontos cantados são fundamentais para a mobilização

das energias com as quais se procura trabalhar. Nesse âmbito, o jogo de

palavras acionado nos pontos cantados mobiliza diferentes temporalidades e

espaços, explicitando por meio das palavras o contato entre mundos. Conforme

cantou Vovó Catarina:

Page 15: No rastro dos Orixás: agenciamentos, materialidades e

Oh minha mãe, minha mãe Odociaba Oh minha mãe, minha mãe Iemanjá E olha o tempo, olha o tempo que passou por lá (x2) Oh mamãe Iemanjá Tu es força e poder, tu es luz e alegria Com a força e firmeza do nosso pai Oxalá Oh minha mãe, minha mãe Iemanjá Oh minha mãe, minha mãe Odociaba vem ca Está nas tuas mãos o mamãe Iemanjá, o barquinho para velejar Oh minha mãe, minha mãe, seu fuxico é no fundo do mar Oh minha mãe, minha mãe, mas tu sabe bem se afirmar Oh minha mãe, minha mãe, minha mãe Iemanjá Minha mãe Odociaba Receba o seu barco e veleje ele lá Mas dê força e firmeza pra esses filhos de cá Sabedoria precisa, equilíbrio também Mamãe tu mais do que ninguém sabe se equilibrar Oh mamãe, oh mamãe, oh mamãe Iemanjá(x2) Tua força vem me dar Odociaba!

O ponto cantado por Vovó Catarina faz uma súplica para que “mamãe

Iemanjá” atenda a seu chamado e receba o barco que lhe está sendo ofertado.

Ao longo do canto se estabelece uma relação de contraponto entre dimensões

de tempo e espaço distintas pelo jogo que é feito ao mencionar o lá e o cá.

Exaltam-se as qualidades de “mamãe Iemanjá”, atribuindo a ela o poder sobre

a direção do barco e, consequentemente, sobre o destino de Mãe Neide e seus

filhos de santo.

Nesse contexto, a salva, não é apenas objeto de intenção, mas de ação.

Associando palavras e gestos se mobilizam e ativam as forças e energias. Na

comunicação entre a dimensão visível e a invisível do cosmos umbandista, a

palavra, seja em forma de oração, de “salva” ou de ponto cantado17, adquire

uma função primordial, pois a mobilização de determinados termos,

sintonizados e ampliados pelos gestos e pela força do pensamento,

constituem-se como elementos centrais na produção do ritual. É mediante

essas invocações que se estabelece o contato com as entidades espirituais

com as quais se busca trabalhar; com as quais se pretende entrar em interação

e cooperação. As “salvas” e pontos cantados ganham, desse modo, condição

de preces. As palavras pronunciadas, associadas aos gestos executados, bem

17

As cantigas ou pontos, geralmente, são compostos de pequenas estrofes que se repetem ao menos duas vezes consecutivas. O ponto cantado desempenha a função fundamental de estabelecer a conexão com as entidades espirituais; é uma saudação direcionada aos guias e Orixás, a fim de que estes se manifestem; um chamado à comunicação entre os seres humanos e não-humanos do cosmos.

Page 16: No rastro dos Orixás: agenciamentos, materialidades e

como à mobilização de certos artefatos rituais, como o “adjá”, são

fundamentais para a produção da eficácia do ritual, dando materialidade à

cosmovisão do contexto religioso umbandista. Nessa direção, como sugere

Santos (1986:18), “as palavras tem um poder de ação. Ignorar aquilo que é

pronunciado no decorrer de um rito é o mesmo que amputar um de seus

elementos constitutivos mais importantes e provavelmente mais revelador”.

Ainda, deve-se atender também aos componentes não verbais, centrais

na execução dos ritos. Nesse contexto, o conjunto de gestos e a entonação

constituem-se enquanto informações adicionais, que complementam o sentido

daquilo que se fala, uma vez que a “transmissão oral é uma técnica a serviço

de um sistema dinâmico. A linguagem oral está indissoluvelmente ligada à dos

gestos, expressões e distância corporal. Proferir uma palavra, uma fórmula é

acompanhá-la no decorrer de uma atividade ritual dada” (SANTOS, 1986:47).

O agenciamento das energias e bons fluidos, mediante a manipulação

das palavras evocadas, e os atos mágico-religiosos desenvolvidos pelo guia

espiritual no comando do ritual, são fundamentais na preparação do barco.

Assim, ao ponto cantado, seguiu-se uma prece evocatória. Com a mão direita

no ar, abençoando a embarcação, Vovó Catarina suplicou:

A tua força, a tua firmeza, minha mãe Iemanjá. É o barco que ta em tuas mãos, é você que tem o remo e é você que sabe velejar, é você que sabe ajudar e é você que sabe afirmar. Assim como você sabe descarregar e limpar; limpar todos esses negativos, limpar todas essas perturbações, todas essas quizilas, essas demandas, essas feitiçarias que se encontra em cima da terra fria. Por isso, veleja seu barco, sacoleja suas ondas e ajude a trabalhar. Proteja a coroa desse burro, dá a luz e a sabedoria pra ela; pra ela dar sua continuação, com força, com firmeza e com sabedoria. Não se entregando nas mãos daqueles inimigos, daqueles que querem ver suas fraqueza, daqueles que querem ver ela botar o pé pra trás. E firme o pé dela para que saiba seguir em frente. Caminhando, acendendo suas luzes e firmando a coroa dela. Dando paz, dando saúde, alegria e satisfação como sempre teve, em tudo o que faz, em tudo que fez. Para que ela tenha sabedoria, não de olhar aquilo que ta errado só, aquilo que ta ruim, mas de olhar o bom, o que ficou pra trás e de todas as luz que ela já soube acender e já soube firmar. Salve minha mãe Iemanjá, salve Janaína, salve todas as caboclas do mar, salve todo o povo do fundo do mar, salve a calunga grande, salve o dia de hoje e salve as horas que são! É na tua força e na tua firmeza. Ta entregue, minha mãe!

Imantado pelas energias e palavras emitidas por Vovó Catarina, o barco

destinado à “rainha do mar” estava pronto para ser lançado às águas. No

momento em que concluiu suas preces Vovó Catarina se dirigiu ao Pai José de

Page 17: No rastro dos Orixás: agenciamentos, materialidades e

Angola avisando: “ta entregue, malungo18!”. Desse modo, o preto velho, que

estava na “terra fria” para ajudar a Vovó a firmar os “trabalhos”, desincorporou

e Flávio juntou-se aos seus irmãos para levar o barco até a beira d’água.

Orientados por Vovó Catarina, antes de entregarem o barco, os médiuns

caminharam até o montinho de areia que havia sido levantado poucos minutos

atrás por uma das filhas de santo e que serviu, nesse momento, para apoiar a

embarcação. O morro tinha de cada lado uma canaleta, nas quais ofereceram-

se as velas que haviam sido depositadas no barco junto com os pedidos, no dia

em que este foi arriado no terreiro por ocasião da gira de encerramento.

Ajoelhados na areia e com o olhar firme em direção ao mar os quatro

permaneceram em silêncio por alguns minutos, mentalizando e firmando o

pensamento.

Em seguida, o médium encarregado da soltura, tomou o barco, o apoiou

no topo de sua cabeça e todos caminharam em direção à água. Enquanto duas

filhas de santo e Vovó Catarina pararam na beira d’água, os dois médiuns

homens que acompanhavam o ritual adentraram no mar e seguindo as

orientações transmitidas por Vovó Catarina alguns minutos antes, no quebrar

da sétima onda, soltaram o barco. Da areia, os cinco observavam com um

semblante apreensivo o sacolejar das ondas. A embarcação passou a primeira

onda, passou a segunda, na terceira, a proa deu uma pequena levantada,

ameaçando virar e produzindo alguns segundos de tensão naqueles que

acompanhavam a cena.

Na beira d’água, Vovó Catarina gritava, clamava para que a Mamãe

Sereia levasse o barco, determinasse seu rumo no mar, aceitando a oferenda

que lhe estava sendo entregue; “Leva o seu barco! Leva o seu barco! Com luz,

firmeza e proteção. Confirma essa coroa”. Apoiada em seu bastão, a Vovó se

manteve firme na beira do mar. Com a feição séria ela acompanhava o rumo

da embarcação. Mais uma vez Vovó advertiu em seu pedido que “não se pode

virar o barco”, pedindo que Iemanjá o levasse; pedindo aos Orixás e entidades

– Ogum, Xangô, Oxóssi, Oxum, Iansã, os Ibejis e à Pomba Gira – para que

ajudassem Iemanjá, que ela levasse o que lhe pertencia e não o devolvesse.

18

O termo malungo ou malunga significa companheiro, camarada, parente. Nos tempos da escravidão o termo também era usado por um escravo para se referir a outro que tivesse vindo da mesma região do que a sua na África.

Page 18: No rastro dos Orixás: agenciamentos, materialidades e

Vendo o barco distanciar-se, Vovó assentiu diante da mensagem dada

por Iemanjá: “Esse, minha mãe! Ainda tem muito tempo de fucumba

[macumba] na terra!”. O percurso do barco não se desenhou em direção

retilínea ao alto mar; foi navegando paralelo à faixa de areia. Como nos

explicou Vovó Catarina em seguida, “O barco vai de acordo com as

correntezas no mar, não trabalha contra a correnteza. Você entregou, agora ela

[Iemanjá] faz o caminho dele, ta escutando? Ou ela leva ou ela devolve. Ele ta

indo de acordo com o caminho que ela traçou”.

Vovó havia cumprido assim a sua incumbência. O barco foi entregue e a

confirmação foi dada por Iemanjá que definiu o seu percurso no mar,

desvelando, desse modo, o futuro da vida espiritual de Mãe Neide e,

consequentemente, de seus filhos de santo. Antes de partir Vovó Catarina

pediu para os filhos transmitirem à mãe de santo esse desígnio: “Fala pro burro

que o tempo espiritual ainda ta longo”. Assim, Mãe Neide desincorporou e

agradeceu à “rainha do mar” por toda a força, pela confirmação e “por todas as

horas e todos os dias de bênçãos e luz”.

Passadas algumas semanas da feitura do ritual tive a oportunidade de

conversar profundamente com a Vovó Nazareth acerca dos significados

atribuídos àquela prática19. Ela me explicou que a entrega do barco a cada sete

anos objetiva a “confirmação e firmeza”. A confirmação do tempo de missão

que a mãe ou o pai de santo tem pela frente, e o pedido para que ele tenha

“firmeza, força, luz e proteção” em sua caminhada. Assim, por se tratar de um

ritual tão fundamental e determinante na vida de um zelador é que deve ser

realizado com menos periodicidade.

Tal como me disse Vovó Nazareth existem quatro possibilidades quando

da entrega de um “barco de confirmação e firmeza”. Essas situações variam de

acordo com o destino traçado por Iemanjá para aquele médium, a partir de uma

espécie de avaliação realizada pela divindade, do modo como aquele pai ou

mãe de santo vem desenvolvendo sua “missão espiritual”.

Dessa forma, a primeira possibilidade refere-se àquelas situações nas

quais o barco vira totalmente e os objetos que compunham a oferenda vão

para o fundo do mar. Nesse caso, os desígnios de Iemanjá indicam que o

19 Refiro-me aqui à conversa ocorrida no dia 23 de fevereiro de 2016 na Tenda Espírita Vovó Nazareth e Povo Baiano.

Page 19: No rastro dos Orixás: agenciamentos, materialidades e

“zelador” deve fechar o terreiro por tempo indeterminado. Se apesar do mau

presságio ele optar por manter a casa aberta é imprescindível que seja

consciente em relação ao fato de que precisará enfrentar muitos desafios, não

apenas para manter as portas do terreiro abertas, mas para manter-se forte e

equilibrado no cumprimento de sua missão.

A segunda possibilidade faz menção aos casos em que o barco

entregue volta para a beira da praia, sinalizando que pai ou mãe de santo deve

se recolher por um tempo, suspender momentaneamente os trabalhos no

terreiro e cuidar de si, fortalecer-se, observar seu caminho até então, a forma

como o trabalho espiritual é desenvolvido, de modo a reconfigurar e ajustar

situações que possibilitem a continuidade de sua caminhada espiritual. Neste

caso é fundamental que seja feita a entrega de outro barco sete meses após a

primeira para confirmar os desígnios de Iemanjá.

A terceira possibilidade refere-se às situações nos quais o balanço do

mar levanta o barco fazendo-o virar levemente e, em seguida, pelo próprio

movimento da onda, retorna-o para a superfície. Ao traçar assim o destino da

embarcação Iemanjá indica que haverá barreiras e desafios a vencer pela

frente, portanto, o zelador deverá fortalecer-se, manter-se firme e equilibrado,

para enfrentar os percalços que se apresentarem em seu caminho.

Por fim, a quarta possibilidade, e poderíamos dizer a mais tranquilizante

entre elas, é quando o barco percorre uma longa distância no mar, não

havendo dúvidas de que foi muito bem aceito por Iemanjá. Nessa situação, o

barco enquanto oráculo, enquanto objeto mediador da comunicação entre os

religiosos e as divindades, prenuncia uma trajetória longa e firme para o

zelador da casa, com muitos anos de missão pela frente, indicando, também,

que a forma como estão dirigindo-se os trabalhos espirituais é a correta.

Nessa direção, o barco oferecido a Iemanjá ou mesmo as ondas do mar

não são apenas objetos passivos no processo de interação entre os religiosos

e a divindade. As ondas do mar são expressão da “santa”, e são também

mediadoras no processo de comunicação que se estabelece entre a “Mãe

d’Água” e seus devotos, pois é através da onda e da função oracular

desempenhada pelo barco nesse contexto, que Iemanjá se expressa e

evidencia a aceitação do presente. Assim, os artefatos religiosos, como

sugerem Espirito Santo & Tassi (2013 apud MELLO, 2016), longe de serem

Page 20: No rastro dos Orixás: agenciamentos, materialidades e

simples mediadores ou projeções dos vínculos e das relações entre os

humanos e as entidades espirituais, “transgridem o estatuto ontológico de

meros objetos, participando ativamente da criação de cosmologias”, uma vez

que se configuram como agentes ativos na interlocução e interação entre seres

de distintas ordens, e ganham existência, “traçam caminhos, forjam relações,

geram efeitos na vida das pessoas” (ibdem).

Entidades espirituais e a coprodução do conhecimento etnográfico

Ao longo do meu trabalho de campo acompanhando as sessões de

desenvolvimento mediúnico e os diversos rituais realizados nos espaços fora

do terreiro, tive a oportunidade de aprender não apenas junto com a mãe de

santo e os médiuns da casa, mas de receber o ensinamento dos guias e

entidades espirituais. Em mais de uma ocasião, percebendo meu olhar

interessado, se aproximavam e me esclareciam certos aspectos constituintes

da ritualística umbandista; questionavam qual a minha opinião acerca dos

rituais que tive a oportunidade de acompanhar ou então respondiam

gentilmente minhas dúvidas com relação a certos preceitos religiosos.

Certa vez, quando acompanhava o trabalho de desenvolvimento

mediúnico no terreiro, minha atenção aos ensinamentos dados por Vovó

Mariquita foi momentaneamente perturbada ao perceber a quantidade de

alimentos e bebidas que estavam arriados no quarto de Exu e Pomba Gira. Na

ocasião, os médiuns desenvolviam um trabalho com as entidades conhecidas

como mineiros e boiadeiros20. Entre um ponto e outro, as incorporações foram

acontecendo e as entidades dos filhos de santo foram chegando na “terra fria”.

Ao ver o meu olhar curioso em relação às oferendas o boiadeiro de um dos

filhos de santo aproximou-se e explicou-me que é “difícil as pessoas

entenderem”, mas que eles, entidades espirituais, tal como nós, também se

“alimentam”; alimentam-se com o cheiro e a energia contida nas comidas e

bebidas a eles oferecidas. Então, perguntei à entidade se eram “eles” que

pediam quando queriam comer, ao que o boiadeiro me respondeu

20

Mineiros e boiadeiros são entidades espirituais que trabalham na linha dos caboclos, representativas, fundamentalmente, do homem do campo e cujo principal ensinamento, conforme me disseram, é a importância da força de vontade e a simplicidade.

Page 21: No rastro dos Orixás: agenciamentos, materialidades e

afirmativamente, complementando que às vezes essas entregas votivas

correspondiam a agradecimentos, a pedidos de força na realização de algum

“trabalho”, pedidos de equilíbrio para algum filho, ou ainda, feitas com a

intenção de “quebrar quizila”21.

Situação similar ocorreu em mais de uma oportunidade na qual Vovó

Nazareth indagou acerca da minha percepção sobre os rituais que havia

acompanhado. Lembro especialmente da ocasião na qual a Preta Velha me

perguntou o que havia achado do ritual de entrega do barco para Iemanjá e,

enquanto conversávamos, mencionou que a relação entre as duas “calungas” –

o cemitério e o mar – seria um aspecto importante para a compreensão dos

significados atribuídos ao ritual e aos contornos que a natureza assume no

cosmos umbandista. Ao estabelecer essa ponte entre a calunga grande e a

calunga pequena a entidade chamou minha atenção para a dimensão

concernente às qualidades das energias presentes em cada um desses

“pontos de força”.

As conversas com as entidades espirituais configuraram-se como

instâncias de diálogo fundamentais no desenvolvimento subsequente da

pesquisa e, sobretudo, na construção da própria dissertação, uma vez que

essas interações não se limitaram às instâncias de transmissão de

ensinamentos aos médiuns da casa ou de esclarecimento de dúvidas sobre os

rituais observados. As reflexões que me foram oferecidas por Vovó Nazareth

sugerem um fazer conjunto e colaborativo, pois não apenas esclareciam

diferentes aspectos da cosmovisão e das práticas rituais, como estavam

articuladas a certos interesses centrais de minha pesquisa referente à

compreensão da concepção de natureza na Umbanda.

Nesse sentido, parece que cada vez mais devemos assumir que os

nossos interlocutores, sejam estes religiosos ou entidades espirituais, não

estão somente para ser conhecidos ou para que possamos acessar

concepções de mundo diversas e múltiplas. Mais do que isso, são agentes

ativos e coprodutores, na medida em que influenciam tanto a tomada de

decisões em relação aos rumos da pesquisa quanto à própria formulação do

21

A expressão “quebrar quizila”, no contexto umbandista, corresponde ao ato de combater as energias consideradas desequilibradas e desequilibrantes e produtoras de malefícios àquele a quem são endereçadas.

Page 22: No rastro dos Orixás: agenciamentos, materialidades e

conhecimento antropológico. Desse modo, na esteira das proposições que

apontam para a possibilidade de reformulação dos modos de saber apostando

em regimes de conhecimento simétricos, tanto em relação aos sujeitos da

pesquisa quanto ao tratamento concedido aos sistemas de pensamento

nativos, torna-se fundamental “alçar o status desses novos interlocutores de

campo à condição efetiva de coprodutores do conhecimento etnográfico e,

mais do que nunca, de dar-lhes crédito por essa atuação” (FONSECA & SÁ,

2011: 10).

Considerações provisórias

Como nos fala Isabelle Stengers em sua proposição cosmopolítica

(2014), o saber construído pelo pensamento ocidental é opressor, pois ao

impor-se sobre outros modos de pensamento impede a emergência do

inusitado. Trata-se de um convite à desaceleração, para tornar nosso

pensamento mais vagaroso, na medida em que incorporamos mais elementos

nesse pensar. É uma proposição, um programa para se pensar, mas não para

ser efetivado; uma proposição que busca romper com as certezas a partir das

quais observamos e falamos sobre diferentes acontecimentos. Constitui-se,

dessa forma, como um estímulo, uma utopia que nos leva a considerar outras

questões do mundo, e nos desafia a perturbar os modos dominantes de

pensar.

O idiota, personagem conceitual mobilizado pela autora (remetendo à

Deleuze e à Dostoievsky), é aquele que resiste à forma como as situações são

apresentadas, e à forma que as urgências mobilizam o pensamento e ação.

Lembra-nos, assim, que é preciso que “[...] não nos precipitemos, que não nos

sintamos autorizados a pensar que dispomos do significado do que sabemos

”(STENGERS, 2014: 19, tradução livre). O idiota e seu “murmúrio” nos alertam

de que é preciso, dessa forma, ir mais devagar, com o cuidado para não cair na

busca de uma chave universal que seja válida para tudo e para todos.

Nessa direção, refletir sobre as formas pelas quais seres intangíveis

como entidades espirituais ganham concretude e incidem na vida social parece

implicar a necessidade de “integrar a alteridade perceptiva e sensorial na

prática antropológica” (MELLO, 2016:223) para que sejamos capazes não

Page 23: No rastro dos Orixás: agenciamentos, materialidades e

apenas de traçar os efeitos da ação e a própria condição de existência de uma

multiplicidade de seres e coisas no mundo, mas também para considerarmos a

sua contribuição na produção do(s) mundo(s) e do conhecimento etnográfico. A

suposição aqui é que as entidades podem existir e fazer-se presença tanto fora

quanto dentro deste domínio sensorial em virtude dos traços, sinais e efeitos

que elas geram social e materialmente.

Observando não só o que se diz sobre as coisas, mas também o que se

faz com elas (VOGEL, MELLO & PESSOA DE BARROS, 2012:31), ao longo

deste trabalho busquei privilegiar a descrição das relações, das interações, da

comunicação entre humanos e entidades. Minha intenção ao descrever

extensamente as sequências rituais, foi evitar definir a priori os contornos que

assumem as teias de interação e cooperação tecidas entre humanos e não

humanos a partir da mobilização de agências materiais e espirituais correntes

nesse contexto, permitindo que eles fossem emergindo a partir dos sentidos

atribuídos às práticas que se desenvolvem nos diferentes espaços e paisagens

naturais.

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