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Novembro_2009

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EvangelizaçãoCenários Contemporâneos: Interpelações e Perspectivas

Pós-graduação lato sensuObjetivos• Refletir,demaneirasistemática,sobreapráticaevangelizadoranocontextodatradiçãopós-conciliarlatino-americana,naperspectivaevangélico-franciscana,ecumênicaeinter-religiosa.

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dasdecisõesdecaráterpolítico, tanto locaiscomonacionaise internacionais,desembocandonotemaescolhido:apoliticaexercidanaperspectivadasmaio-rias,cométicaeparticipaçãopopular.ACFEcumênicade2010nosconvidaaaprofundaretransformararelaçãoentreaeconomiaeavida.O curso é oferecido peloCentroEcumênico deServiços àEvangelização eEducaçãoPopular-CESEPerealizadoemparceriacomaPUC-SP,noqualoparticipanterecebeumcertificadodeparticipaçãonofinaldocurso.Gruposde5pessoasquefizeremsuasinscrições,pagarãoapenas4.

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3- Novembro 2009

SUMÁRIOnovembro 2009/09

Mural ----------------------------------------------------04 Cartas OPINIÃO -------------------------------------------------05 Consciência renovada Ênio José da Costa Brito

ÁfrIca ---------------------------------------------------06 A Missão: quantidade ou qualidade? Michael Mutinda

PrÓ-VOcaÇÕES ---------------------------------------07 O compromisso do cristão Rosa Clara Franzoi

VOlTa aO MuNDO ------------------------------------08 Notícias do Mundo Fides / ZENIT

ESPIrITualIDaDE ---------------------------------------10 O Reino de Deus está próximo Patrick Gomes Silva

TESTEMuNHO ElIO raMa ---------------------------12 Jubileu sacerdotal: voltar para agradecer Jaime Carlos Patias

fÉ E POlÍTIca ------------------------------------------14 Sem fazer média! Humberto Dantas

fOrMaÇÃO MISSIONÁrIa --------------------------15 Religião e ecologia Dirceu Benincá

JuVENTuDE MISSIONÁrIa ---------------------------19 Honduras: sangue em nuestra América Latina Vanessa Ramos DESTaQuE DO MÊS ----------------------------------20 Vitória contra o preconceito Karla Maria

ESPEcIal ------------------------------------------------22 Cafelândia recebe a Mãe Peregrina Cristina Ribeiro Silva

IGrEJa ---------------------------------------------------23 O fundamentalismo não tem futuro Mário de Carli

INfâNcIa MISSIONÁrIa -----------------------------24 Vem! Entra na roda com a gente! Roseane de Araújo Silva

ENTrEVISTa MIcHEllE DO NaScIMENTO --------26 A Missão no coração Jaime Carlos Patias

aTualIDaDE ---------------------------------------------28 Saterés Mawés com nível superior Emerson Quaresma

VOlTa aO braSIl --------------------------------------30 CNBB / CCM / revista Missões

E D I T O R I A L

A MISSãO nO MUndO plURAl

1. Participante do Fórum Social Mundial, 2009, Belém, PA..

Foto: Jaime C. Patias

2 - Irmã Michelle doNascimento da Cruz

Foto: Júlio César Caldeira

tenta aos sinais dos tempos, apesar de certas resistências, a Igreja ao longo dos séculos tem se mostrado inteligente e flexível em responder aos desafios nas mais diversas situações. Peregrina num mundo plural, sabiamente ela têm reconhecido os valores religiosos e culturais dos diversos povos.

Na carta encíclica Redemptoris Missio (1990), o papa João Paulo II afirma que o anúncio explícito revela-se como a “prioridade perma-nente” da missão, exigindo a proclamação clara da salvação oferecida por Jesus Cristo (RM 44). Na visão da encíclica, este anúncio não pode ser substituído pelo empenho em favor da promoção humana, ou pelo diálogo inter-religioso, mas deve ser permanentemente proposto. Faz também parte da tradição da Igreja a íntima relação entre a evangelização e a ação social. Paulo VI (1975) concebia a evangelização como o exercício essencial de “tornar nova a própria humanidade” (EN 18) estabelecendo uma estreita ligação entre o anúncio do Evangelho e a promoção humana.

O conceito de evangelização que inclui não só a promoção hu-mana, mas também o diálogo inter-religioso, apareceu em 1984, no documento Diálogo e Missão, do Secretariado para os não-cristãos. O mundo atual, marcado pela dupla realidade da pobreza e do pluralismo, exige da Igreja uma compreensão mais ampla da evangelização. Há hoje, apesar de resistências, uma positiva acolhida das várias denominações religio-sas. O grande desafio é avançar para além das fronteiras da própria tradição, reconhecen-do a riqueza presente no outro. Quando essa abertura acontece, se o coração muda, nasce uma consciência reno-vada. Como vemos, o anúncio e o diálogo constituem os dois pó-los complementares da ação evangelizadora da Igreja no mundo contemporâneo que começa com o exercício de empatia, compaixão, solidariedade, colaboração e diálogo. Nessa perspectiva o fundamentalismo e a discriminação não encontram mais espaço.

Esta edição é mais uma contribuição para a convivência harmo-niosa no mundo plural. A missão encontra sua razão na experiên cia do amor de Deus. A motivação mais importante é, portanto, o amor, no desejo de compartilhá-lo aos outros. Foi exatamente essa motivação que levou a jovem irmã Michelle do Nascimento, do Rio de Janeiro, a aceitar o convite de partir para o Djibuti, África, onde 98,2% da população é muçulmana, conforme ela mesma conta na entrevista. O mesmo amor é vivido pelo padre Silvano Zoccarato e seus cole-gas entre os muçulmanos argelinos, no testemunho do padre Elio Rama, que celebra seus 25 anos de sacerdócio missionário, 18 dos quais vividos em Moçambique e na ação que motivou a comunidade paroquial do Imirim, em São Paulo, a acolher e cuidar de crianças que convivem com o vírus HIV. Por fim, esta consciência renovada nos ajuda a entender melhor o significado do dia 20 de novembro. Numa visão abrangente, estes e outros gestos da missão no plural, associados a uma estreita relação entre religião e ecologia consti-tuem uma força extraordinária para cuidar da vida e da integridade da Criação no respeito, diálogo e anúncio.

FranciscoLóp

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Crianças quenianas.

A

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Ano XXXVI - Nº 09 Novembro 2009

Rua Dom Domingos de Silos, 11002526-030 - São PauloFone/Fax: (11) 2256.8820Site: www.revistamissoes.org.bre-mail: [email protected]

redação

Diretor: Jaime Carlos Patias

Editor: Maria Emerenciana Raia

Equipe de Redação: Patrick Gomes Silva, Rosa Clara Franzoi, Júlio César Caldeira, Karla Maria, Mário de Carli eMichael Mutinda

Colaboradores: Vitor Hugo Gerhard, Roseane de Araújo Silva, Humberto Dantas, Dirceu Benincá, Gianfranco Graziola e Cecília Soares de Paiva

Agências: Adital, Adista, CIMI,CNBB, Fides, IPS, MISNA, Radioagência Notícias do Planalto e Vaticano

Diagramação e Arte: Cleber P. Pires

Jornalista responsável:Maria Emerenciana Raia (MTB 17532)

Administração: Luiz Andriolo

Sociedade responsável: Instituto Missões Consolata(CNPJ 60.915.477/0001-29)

Impressão: Editora ParmaFone: (11) 2462.4000

Colaboração anual: R$ 50,00BRADESCO - AG: 545-2 CC: 38163-2Instituto Missões Consolata(a publicação anual de Missões é de 10 números)

MISSõES é produzida pelosMissionários e Missionárias da ConsolataFone: (11) 2256.7599 - São Paulo/SP (11) 2231.0500 - São Paulo/SP (95) 3224.4109 - Boa Vista/RR

Membro da PREMLA (Federação de Imprensa Missionária Latino-Americana) e da UCBC (União Cristã Brasileira de Comunicação Social)

Novembro 2009 -

Mural do Leitorrevista missões

A revista Missões transformou a ela-boração dos encontros aqui na diocese de São José dos Campos. Aconteceu uma mudança criativa também na Liturgia. Ela nos permite levar formação e informação às nossas CEBs. Podemos dizer que a revista Missões contribuiu muito para o nosso agir. Na questão da transposição do Rio São Francisco, ela foi fonte para elaboração de encontros e auxiliou nas pesquisas escolares das crianças. Missões mostra também outra realidade da Igreja e os artigos são completos!

Maria Aparecida Matsutacke, Jacareí, SP.

Com tantas pessoas que pensam em seu bem-estar, vemos missionários empenhados em alimentar e transformar sonhos em realidade, num país tão distante como a Índia! Li a reportagem “Bangla-desh, terra de um mar de gente”, (edição jan/fev 2009) e achei o padre missionário xaveriano Luiz Augusto Ramos com uma visão linda em relação aos nossos irmãos e irmãs que estão naquele país. Que Deus o abençoe muito.

Marcello Possi, Minas Gerais.

Conheci a revista em 2009, durante o Fórum Mundial de Teologia e Libertação. E desde então, passei a usá-la para leitura pessoal e apresentação de seminários. Atualmente moro no Canadá e interessa-me saber o que é pautado no Brasil. Com a revista me formo e me informo. Destaco a cobertura realizada no Fórum Social Mundial em Belém, PA, e o 12° Interecleisal das CEBs em Porto Velho, RO.

Padre Ernst Jean-Robert Michel, Montreal, Canadá.

A revista Missões faz parte da minha leitura pessoal, utilizo os artigos nos grupos de Crisma e Jovens de minha comunidade. Além da qualidade gráfica, a revista tem uma cara moderna, atrativa e textos excelentes, tanto em conteúdo, quanto na maneira como são escritos. Neste ano, o que mais gostei foram as entrevistas com dom Angélico Sândalo (edição jul/ago) e com a irmã Julieta Amaral (edição set).

Leonardo Cândido, Região Episcopal Brasilândia,São Paulo, SP.

“Trem das Cebs”Gostaria de compartilhar um pouco de

nossos trabalhos junto às CEBs no estado do Maranhão. Logo após o 12º Intereclesial realizado no mês de julho em Porto Velho, RO, organizamos um planejamento de repasse em todas as paróquias nas doze dioceses que compõem o regional Nor-deste 5 da CNBB. No momento estamos vivenciando e trocando as experiências vividas durante o Intereclesial, oferecendo às pessoas um pouco da alegria, espiritua-lidade e riqueza do encontro, para dar novo ânimo e vitalidade às CEBs maranhenses. Temos um programa de rádio chamado “Trem das CEBs”, que resiste e persiste há 15 anos. Mas, infelizmente, diante da crise financeira que nos atinge, estamos prestes a perder este importante espaço radiofônico. Com muita luta, a nossa equipe, graças ao bom Deus, já conseguiu cobrir quatro Intereclesiais (1997 – São Luís, MA; 2000 – Ilhéus, BA; 2005 – Ipa-tinga, MG e 2009 – Porto Velho, RO). Se alguém puder nos ajudar com patrocínio ou parceria, ficaremos muito felizes. E-mail: [email protected]

Carlos César Soeiro BarrosEquipe de Articulação das CEBsArquidiocese de São Luís, MA.

Zé martinsMorreu na noite do dia 16 de outubro

em Pouso Alegre, MG, o cantor e composi-tor mineiro Zé Martins. O artista teve uma infecção generalizada, segundo a suspeita dos médicos devido ao caso mais grave da dengue, ou seja, dengue hemorrágica.

Zé Martins foi sepul-tado no dia 17, no cemitério de Pouso Alegre. Zé Martins nasceu na cidade mineira de Mantena a aproximadamente 460 quilômetros de Belo Horizonte, na divisa com o estado do Espírito Santo. Era

jesuíta, filósofo, teólogo, advogado, e sempre foi muito ligado às Comunidades Eclesiais de Base - CEBs, onde atuou nos últimos dois encontros, em Ipatinga, MG, em 2005 e em Porto Velho, RO, em 2009, como animador. Tinha laços estreitos com a Pastoral da Juventude de todo país.

ArquivoMissões

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OPI

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- Novembro 2009

belo calendário 2009 da Drogaria São Paulo ao destacar os feriados do mês de novembro assinala no dia 20: consciência negra. Depois que o dia dedicado a Zumbi ganhou status de feriado em mais de 250 municípios brasileiros, a informação fria e seca dos calendários revestiu-se de um novo brilho. Feriado ou não, temos

nesse dia um bom motivo para colocarmos na nossa agenda questões antigas que continuam a nos desafiar no campo das ideias e principalmente da prática cotidiana.

Somos convidados a entender porque a nação brasileira mesmo ostentando práticas mestiças, continua praticando um racismo silencioso, racismo de posição social. Somos convidados a não esquecer que o débito social, especialmente para com a população negra já se arrasta em nosso país há séculos.

Somos convidados a ter presentes que a reversão da dis-criminação racial passa por um processo educativo na medida em que esta, entre nós é um componente cultural exercitado em nosso dia-a-dia. É na verdade, uma via de duas mãos: em um sentido temos a sociedade como um todo discriminando a população negra em diversos aspectos, e, em outro, temos a própria população negra com a discriminação já introjetada em si mesmo.

Discurso racistaNão é recente a preocupação com essa imensa massa de

afro-brasileiros, como também com outros de diferentes origens étnicas, que não tiveram dos poderes públicos ajuda para se

O

Consciência renovada

“A nossa impotência para elaborar um discurso contra o

racismo talvez venha do fato de termos sempre elaborado

discursos anti-racistas, quando fosse o caso de elaborar um

discurso não-racista”(Marilena Chauí).

de Ênio José da Costa Brito

estabelecer de maneira digna, tanto no campo quanto na cidade. No entanto, eles contribuíram competentemente para forjar as bases do Brasil atual, sem, contudo, participar dos benefícios. Enfrentar a discriminação racial, velada e eficaz que se comete contra a população negra, exige sabedoria.

“Ora, não se serra madeira com martelos e nem se prega pregos com serrotes” (Dito popular). Deve-se evitar o perigo de transformar essa antiga e justa luta por melhores condições de vida em um movimento racista que ponha brasileiros como inimigos por causa da coloração da pele. Não é difícil constatar, como nos relembra Marilena Chauí que “o discurso e as ideias anti-racistas acabam operando como espelho para o racismo e oferecendo a este último, argumentos para renovar-se e atualizar-se”.

O discurso racista possui níveis e tipos, segundo Marilena Chauí. Um é o discurso universalista que deita raízes em solo burguês e afirma um modelo universal de humanidade, hierarqui-zando a espécie em raças superiores e inferiores. Ao naturalizar a desigualdade e a hierarquia da raça, oferece suporte para um racismo biológico e etnocêntrico.

O outro tipo é um discurso comunitarista, próprio do racismo contemporâneo, que soube cooptar pontos centrais do anti-racismo, isto é, que raça não é natureza, mas cultura e etnia,

para absolutizar a diferença. Discurso que sacraliza a co-munidade, a identi-dade do grupo ou da nação e convo-ca todos a defende-rem a integridade, a identidade e a especificidade. O nacionalismo e o fundamentalismo

religioso bebem dessa água, pois, o discurso racista comunitarista é xenófobo e sua opção preferencial é por fórmulas legais de separação e exclusão. Muita coisa está mudando, lentamente, é verdade, mas formas de intolerância vêm sendo superadas, graças à luta que irmana negros e brancos na reconstrução da democracia, direitos sociais, religiosos e cidadania.

A reiteração dessa comemoração tem uma grande poten-cialidade pedagógica, cabe a nós passá-la aos atos. Só assim a data de 20 de novembro passará a emitir sinais, significações e intuições que antes não tinha.

Ênio José da Costa Brito é professor titular da PUC-SP no Programa de Estudos Pós-Graduados em Ciências da Religião e orientador didático do ITESP.

Fotos:JaimeC.P

atias

6º Encontro Nacional de Fé e Política, Nova Iguaçu, RJ.

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6 Novembro 2009 -

á poucos meses nesta mesma coluna escrevemos sobre a África como continente que possui 53 países. Neste número, dividimos a África em cinco regiões, que são: a Setentrional ou do Norte, a Ocidental, a Central, a Oriental e a Meridional. A África Oriental é a parte banhada pelo Oceano Índico e inclui, não só os países costeiros e insulares, Etiópia, Quênia, Somália,

Tanzânia e Seicheles, mas, também alguns do interior como Burundi, Ruanda e Uganda. Hoje, ao falarmos das Seicheles, é sempre um prazer realçar sua beleza e podermos elencar os numerosos benefícios dos quais desfruta.

Cultura e religiãoAs Seicheles são abençoadas pela Providência não apenas

com uma grandiosa beleza natural e com uma sólida vida eco-nômica, mas também com a harmonia social e com uma coesão derivada de valores compartilhados e de um vigoroso compromisso de solidariedade na busca do bem comum. Com efeito, a nação pode dar graças pelo seu elevado padrão de vida, que é fruto da visão e do sacrifício de muitas gerações de cidadãos. No contexto mais vasto do continente africano, as Seicheles são conhecidas pela qualidade e pela extensão do seu sistema educativo, bem como pela difusão da sua rede de serviços médicos, disponí-veis a todos os cidadãos. Ao contrário de muitas sociedades africanas, a seichlelense é essencialmente matriarcal. E um dos

de Michael Mutinda

Hprincipais recursos é a sua vigorosa vida familiar, fundamentada na monogamia e fortalecida pelo dom dos filhos. A família busca na sociedade o ânimo de que tem necessidade para cumprir sua missão insubstituível.

orgulho de vidaHá poucos missionários estrangeiros nas Seicheles, dentre

os quais se encontram os missionários da Caridade e a socie-dade religiosa católica romana. Por seu lado, a Igreja local não poupa esforços para acompanhar as famílias, oferecendo-lhes a luz do Evangelho que põe em realce toda a grandeza e beleza do seu “mistério”, ajudando-as a assumir as suas responsabi-lidades educativas. Em relação às que vivem em dificuldades, ela preocupa-se por contribuir para a pacificação das relações e educar os corações para a reconciliação. A Igreja que está em Seicheles orgulha-se, justamente, da sua contribuição para a vida da nação, de maneira particular através do seu compromisso histórico nos campos da educação dos jovens, da formação dos fiéis nas virtudes essenciais para o desenvolvimento humano integral e da construção de uma sociedade livre, justa e prós-pera. A missão não mede o tamanho. A missão é a qualidade não é quantidade; é o compromisso com o Reino de Deus na promoção da vida.

Michael Mutinda, imc, é seminarista queniano, estudante de Teologia no ITESP, São Paulo.

A Missãoquantidade ou qualidade?As Seychelles ou Seicheles são umanação insular localizada no OceanoÍndico, África Oriental. Além de Madagáscar,suas vizinhas mais próximas são Maurícia,Comores, Mayotte e as Ilhas Gloriosas.As Seicheles foram proclamadas independentes dos britânicos em 29 de junho de 1976. A capital do país é Victoria. As línguas oficiais são inglês, francês e crioulo. A população estimada das ilhas é de 87 mil pessoas. Dados de 2005 revelam que cerca de 96,4% dos seichelenses são cristãos. Católicos representam 87,4% da população.Os dados ainda revelam que ateus e sem religião representam 2,3% e os que professam religiões não-cristãs somam 1,3% da população do país.

Divulga

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- Novembro 2009

Quer ser um missionário/a?Irmãs Missionárias da Consolata - Ir. Dinalva MoratelliAv. Parada Pinto, 3002 - Mandaqui - 02611-001 - São Paulo - SPTel. (11) 2231-0500 - E-mail: [email protected]

Centro Missionário “José Allamano” - padre Patrick Gomes SilvaRua Itá, 381 - Pedra Branca - 02636-030 - São Paulo - SPTel. (11) 2232-2383 - E-mail: [email protected]

Missionários da Consolata - padre César AvellanedaRua da Igreja, 70-A - CXP 3253 - 69072-970 - Manaus - AMTel. (92) 3624-3044 - E-mail: [email protected]

de Rosa Clara Franzoi

izíamos em nossa reflexão anterior que toda pessoa é chamada a participar da santidade de Deus. Pare-ce uma ousadia, mas, não é, porque fomos criados à imagem e semelhança Dele. Também definimos a vocação à santidade como sendo um chamado comum a todos. A presente reflexão quer dar mais

um passo: embora comum a todos, as maneiras de vivê-la são diferentes. Cada pessoa dará sua resposta de acordo com o seu estado de vida.

o que é estado de vida?É a maneira que cada pessoa escolhe para viver a sua

existência terrena. Todos, sem distinção, nos enquadramos num estado de vida: casado ou solteiro – estado laical, religioso ou sacerdotal. E nesta condição de vida é que a pessoa irá res-ponder ao chamado de Deus à santidade. Aqui falaremos um pouco apenas do primeiro estado.

Deixar pai e mãe...O matrimônio, descrito como “vocação” querida por Deus no

sentido de colaborar com Ele para a continuidade da espécie humana, exigiria tempo e espaço. O que aqui nos interessa dizer é que, embora esteja passando por dificuldades de estruturação, a família ainda hoje continua sendo um valor inestimável. Poderá mudar a forma, mas não mudará o papel importante que repre-senta para os filhos. Infelizmente, nós, seres humanos, somos muito lentos para perceber a grandeza e a beleza da mensagem que Deus deixou estampada no corpo humano, quando nos fez homem e mulher à sua imagem e semelhança. Criando-nos, Deus queria que compreendêssemos que a complementariedade dos sexos tem uma meta. Diz a Bíblia: “Deixará o homem seu pai e sua mãe e se unirá à sua mulher e serão uma só carne”

(Cf. Gn 2, 24). Nos tempos modernos, falar de casamento como aquela instituição onde o amor fiel e exclusivo, assumido pelos cônjuges é levado até a morte, e onde a fidelidade é considerada algo nobre e responsável, é difícil. Olhando as famílias de hoje, continuaremos ainda por muito tempo a perguntar-nos: Qual será o modelo ideal de família para os nossos dias?

A vocação laicalNa Igreja, os batizados, sejam casados ou solteiros fazem

parte da chamada vocação laical. Leigos e leigas são as pessoas que não estão ligadas às Instituições Religiosas ou Congrega-ções. Como tais, são chamadas a dar testemunho de vida cristã, através da prática dos valores evangélicos. O próprio Jesus diz: “Vós sois o sal da terra e a luz do mundo” (Mt 5, 13-16). São chamadas a promover e defender a vida humana, a ecologia e a ser protagonistas e destinatárias da vida social, cultural, política e econômica do próprio país. E com o Concílio Vaticano II, são chamadas ao exercício dos ministérios não ordenados nas diversas pastorais: catequética, litúrgica, promoção huma-na, juventude, ministério da Palavra, da Eucaristia, diáconos permanentes e outros...

Cada qual vai prestando este serviço como resposta a Deus, que quer que seus filhos e filhas se sintam responsá-veis também pela salvação dos seus irmãos e irmãs. A vida humana é um dom maravilhoso, mas que compromete. Se não nos esforçarmos por descobrir a finalidade para a qual fomos criados, passaremos a vida toda num individualismo escandaloso, curtindo insatisfação e vazio.

Rosa Clara Franzoi, MC, é animadora vocacional.

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O compromisso do cristão

Para refletir:Ler Mt 5, 13-16 e se questionar:

1. O que significa, na vida real, ser sal e luz?2. Como podemos expressar, em atos concretos, este convite

que Deus nos faz?3. Que valores deveríamos resgatar hoje, em relação à vocação

matrimonial?

ArquivoPessoal

Descobrir a finalidade para a qual fomos criados é o que dá

sentido à vida.

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vaticanoCinco novos santos

No dia 11 de outubro o papa Bento XVI canonizou cinco beatos: Jozef Daamian De Veuster, Zygmunt Szczesny Felinski, Francisco Coll y Guitart, Rafael Arnáiz Barón e Marie de la Croix Jugan.

O padre Jozef Daamian De Veuster (1840-1889), da Congregação dos Sagrados Corações de Jesus e de Maria, ficou conhecido como apóstolo dos leprosos. “Não sem medo e repugnância, o padre Jozef fez a escolha de ir para a ilha de Molokai a serviço dos lepro-sos que lá se encontravam, abandonados por todos, e assim se expôs à doença que eles sofriam. Para seguir o Cristo, padre Daamian não apenas deixou a sua pátria, mas também colocou em jogo a sua saúde, por isso ele recebeu a vida eterna”, afirmou Bento XVI. O arcebispo de Varsóvia, dom Zygmunt Szczesny Felinski (1822-1895), fundador da Congregação das Francis-canas da Família de Maria, pela sua corajosa defesa dos oprimidos, passou 20 anos em exílio, sem poder retornar à sua diocese. São Francisco Coll y Guitart (1812-1875), sacerdote da Ordem dos Dominicanos, fundador da Congregação das Irmãs Dominicanas da Anunciação da Beata Virgem Maria, realizou fielmen-te a sua vocação. A sua paixão era evangelizar, em grande parte de maneira itinerante, seguindo a forma das missões populares, com a finalidade de anunciar e entusiasmar nas pessoas e nas cidades da Catalunha, a Palavra de Deus. Rafael Arnáiz Barón (1911-1938), religioso da Ordem Cisterciense da Estrita Observância, morreu com apenas 27 anos de idade, como oblato de Santo Isidro de Dueñas. Mesmo sendo de família abastada, “respondeu positivamente à proposta de seguir o Senhor, de maneira imediata e decidida, sem limites nem condições”. Pela sua obra admirável a serviço das pessoas idosas mais pobres, Marie de la Croix (Jeanne) Jugan (1792-1879), fundadora da Congregação das Irmãzinhas dos Pobres, “é como um farol para guiar nossas sociedades, que devem sempre redescobrir o lugar e a contribuição única deste período da vida”, afirmou o papa.

Sínodo para a ÁfricaEntre os dias 13 e 24 de outubro realizou-se em

Roma o 2º Sínodo dos Bispos da África. Um relatório parcial, publicado antes ainda do término do evento, pelo relator geral do sínodo, o cardeal Peter Kodwo Appiah Turkson, relacionou 20 grandes temas, que refletiram as 195 intervenções dos padres sinodais. Fontes: Fides, ZENIT.

Nas exposições há alusões a muitas conquistas obtidas nos últimos 15 anos, especialmente pela aplicação do 1º Sínodo da África (1994). Mas também foram muitas as problemáticas apresentadas. O cardeal Turkson insistiu no caráter pastoral do Sínodo, que deve im-pulsionar a Igreja na África a seguir sua peregrinação acompanhando os povos, buscando a melhoria das condições sociais, políticas e econômicas e reforçando a fé em Cristo nos habitantes do continente. Os 20 temas recolhidos pelo relator vão desde a natureza da reunião, passando pela revisão das estruturas de comunhão eclesial e abordando as esferas sociocultu-ral e sociopolítica. As partes finais das discussões do Sínodo foram dedicadas a temas específicos, como a família, a dignidade da mulher e seu papel na sociedade e na Igreja, os leigos, o clero, a vida consagrada e a atuação da mídia na África. Muitos padres sinodais lamentam o destino da família, a “destruição de uma autêntica ideia de matrimônio e da noção de uma fa-mília sólida”; além disso, consideram a instituição sob uma séria ameaça de instabilidade e dissolução por causa da pobreza, dos conflitos, das crenças e práticas tradicionais e das doenças, principalmente a malária e a AIDS. Mas os padres sinodais descrevem também, de várias formas, o ataque à família e a instituição do matrimônio, vindo de fora da África. As crianças são descritas como maltratadas (crianças-soldado, trabalho infantil, tráfico) e lhes é negado o direito à educação. A juventude também é mencionada entre os problemas da África por causa de sua exposição ao abuso de drogas, infecção pelo HIV, gestações na adolescência, migração e tráfico humano. Os padres sinodais apresentam ainda a necessidade de se ter governos e políticos que exerçam uma liderança de serviço, visando o bem-estar público.

FilipinasSequestrado um missionário

Os sequestros continuam afligindo a comunidade católica no sul das Filipinas. No dia 11 de outubro, um missionário da Sociedade de São Colombo caiu em mãos de um comando de sequestradores, que até o fechamento desta edição não havia divulgado notícias sobre o religioso, nem feito pedido de resgate. A vítima do sequestro é o padre Michael Sinnott, 78 anos, que foi agredido no jardim da casa dos missionários, em Pagadian, na província de Zamboanga City, no extre-mo sul da ilha de Mindanao. Quatro homens armados pegaram à força o religioso e levaram-no em um furgão até a praia, onde abandonaram o veículo e fugiram em uma lancha. As autoridades governamentais locais, junto com a polícia, criaram uma unidade para tentar a liberação de padre Sinnott. “É triste observar que esses grupos violentos continuam a aterrorizar a área e a sequestrar missionários e sacerdotes cristãos. Pedimos às autoridades que intervenham e rezamos pela paz”, disse o arcebispo de Zamboanga, dom Romulo Valles. Segundo a polícia, o comando dos sequestradores poderia estar ligado aos grupos terroristas ou aos se-paratistas muçulmanos ativos no sul das Filipinas. Para muitos desses grupos, os sequestros com objetivo de extorsão representam um verdadeiro “negócio” para o autofinanciamento e aquisição de armas.

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9- Novembro 2009

este “Advento” de expectativa e ansiedade pela chegada e instauração do Reino de Deus, somos convidados a testemunhar em nossa vida que Ele deseja a paz para toda a humanidade, e não apenas para um grupo restrito. Infelizmente não precisamos ir longe para notar que esta paz ainda é uma realidade distante para muitos.

A paz não é ainda uma realidade porque uma das maiores tristezas entre os “crentes” em Deus tem sido a sua incapacidade para dialogar. Apesar de alguns progressos, por vezes, Deus em vez de ser um motivo para a união, acabou sendo mais um mo-tivo para dividir e mesmo para gerar conflitos. Assim, a intenção missionária deste mês é pertinente e nos convida a nos juntarmos a todos os que acreditam em Deus, de todas as religiões, para

Intenção Missionária

de Patrick Gomes Silva

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Um belo exemplo de diálogo inter-religioso aplicado com êxito (o “diálogo de vida”, não o teológico) está acontecendo na Argélia, país atormentado por uma guerra civil e por atos de terrorismo que dificultam o desenvolvimento.

Os cristãos argelinos são uma minoria em um grande país de 36 milhões de habitantes, muito rico em recursos naturais, mas cujo desenvolvimento foi bloqueado pela instabilidade política, e com mais de 30% de analfabetos.

Há alguns milhares de católicos entre os técnicos e os trabalhadores do petróleo nos poços do deserto.

Nos primeiros anos do cristianismo, a Argélia era cristã; nos tempos modernos, os Padres Brancos (“Missionários da África”) do cardeal Carlo Marziale Lavigerie (1825-1892), arcebispo de Argel, refundaram a Igreja na Argélia, que hoje está presente através de quatro dioceses: Argel, Costantina, Orán e Laghouat-Ghardaia. Por convite do bispo dessa úl-tima, “a diocese do deserto do Sahara”, os missionários do Pontifício Instituto de Missões Exteriores (PIME) assumiram a paróquia de Touggourt, onde residiam também as irmãs do beato padre De Foucauld. Padre Silvano Zoccarato, que foi missionário em Camarões durante 30 anos, permanece ali desde o ano 2006 com dois jovens sacerdotes missionários, Emanuele Cardani (da diocese de Novara, associado ao PIME) e Davide Carraro.

Após três anos em uma cidade islâmica tradicional, padre Silvano publicou um livro de notável força expressiva sobre sua breve experiência de vida entre os muçulmanos argeli-nos: Cartoline dall’Ageria (Postais da Argélia) (PIME, Milão 2009, 64 páginas).

Trata-se não do resumo de sua experiência, mas de quase um pequeno blog que recolhe sua jornada, os encontros com as pessoas, as visitas aos chefes islâmicos e suas famílias, o ensino do francês e do italiano a jovens desejosos de conhe-cer e aprender, e a Santa Missa ao amanhecer com três ou quatro irmãs do Beato De Foucauld, presentes também em Touggourt na casa onde foi fundada sua congregação.

A Argélia está experimentando outro tipo de presença missionária entre os não-cristãos e tem a humanidade e a flexibilidade de aceitar isso com simplicidade e com alegria, sem lamentar o passado. Um dia, um pároco me dizia: “o que estou fazendo entre esta gente? Tentei de tudo e quase ninguém me segue!”. Também Silvano teve estas dúvidas e tentações, mas experimentou que a fé na ação misteriosa mas real do Espírito Santo lhe dá serenidade e alegria para continuar em sua missão.

Sua vida é oração, estudo, acolhida, relações, amizades e ajuda mútua com as pessoas de Touggourt. Em definitivo, “o diálogo da vida” e pouco mais. Fonte: ZENIT

Argélia: um exemplo de diálogo inter-religioso

“A fim de que os fiéis das diversas religiões, com o

testemunho de vida e mediante um diálogo fraterno, deem clara

demonstração de que o nome de Deus é porta-voz de paz”.

construir o seu “reinado”. Tal só será possível quando a nossa vida testemunhar em quem acreditamos. Não basta afirmarmos que acreditamos em Deus, precisamos viver de maneira coe-rente com a fé que professamos. Muitos dos primeiros cristãos foram mártires e derramaram o seu sangue pela sua fé. Hoje con tinuamos sendo chamados a sermos “mártires” (a palavra ‘mártir’ vem do grego ‘martureu’ e significa ‘testemunhar’), isto é, a dar testemunho de Deus com a nossa vida cotidiana. Neste percurso do testemunhar a nossa fé é necessário saber dialogar com todos. Essa é hoje uma virtude mais que necessária para poder dar um bom testemunho de Deus. Só através do diálogo será possível alcançar a Paz desejada por Ele. Um diálogo respeitador, mas também construtivo e profundo, que deseja alcançar a paz. Uma paz que não deve ser apenas entendida como ausência de guerra, mas que é o “shalom” de Deus. A palavra hebraica “shalom” nas línguas semíticas aparece com o sentido de ser completo, ser cheio ou ser pleno. Assim é a paz que Deus deseja para a humanidade, não é uma qualquer, mas uma paz completa, plena. Por isso, ser construtores desta paz é o maior testemunho que podemos dar de Deus.

Patrick Gomes Silva, imc, é diretor do Centro Missionário José Allamano, SP.

ArquivoMissões

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Advento: tempo de preparação, de alegria e

de expectativa pela vinda do Salvador.

dvento, palavra que nos chega através do latim Adventus, sig-nifica chegada, sendo o primeiro período do chamado Ano Litúr-gico. Advento é um tempo de preparação e alegria, aliado à

expectativa da vinda do Salvador. Convite para nos colocarmos à espera da chegada do Reino de Deus. Neste caminho, nada melhor que “usar” a Palavra para nos ensinar o melhor rumo a seguir. Desta vez vamos rezar com o texto de Marcos 1, 14-16. Ele está inserido na primeira parte do Evangelho (cf. Marcos 1, 14-8,30) e tem como objetivo fundamental levar à descoberta de Jesus como o Messias. Ao longo de um percurso que é mais catequético do que geográfico, somos convidados a acompanhar a revelação de Jesus, a escutar as suas palavras e o seu anúncio, a tornarmo-nos discípulos que aderem à sua proposta de salvação. Este percurso de descoberta do Messias termina em Marcos 8, 29-30, com a con-fissão messiânica de Pedro, em Cesareia de Felipe: “Tu és o Messias”.

LeituraO texto proposto está bem no início

desta caminhada de encontro com o Messias e com o seu anúncio de sal-vação. Marcos apresenta os primeiros passos da ação de Jesus libertador. O lugar geográfico em que o texto nos situa é a Galileia, uma região em permanente contato com os pagãos e, por isso, con-siderada pelas autoridades religiosas de Jerusalém uma terra de onde “não podia vir nada de bom”. Terra insignificante e sem especial relevo na história religiosa do Povo de Deus. A “Galileia dos gentios” parecia condenada a continuar uma re-gião esquecida, marginalizada, por onde nunca passariam os caminhos de Deus e a proposta libertadora do Messias.

Ade Patrick Gomes Silva

O Reino de Deusestá próximo

No breve resumo da pregação ini-cial (cf. Marcos 1, 14-15), o evangelista coloca na boca de Jesus as seguintes palavras: “cumpriu-se o tempo e está próximo o Reino de Deus. Arrependei-vos e acrediteis no Evangelho” (Marcos 1, 15). Na expressão “cumpriu-se o tempo”, a palavra grega utilizada por Marcos e que traduzimos por “tempo” (kairós) refere-se a um tempo bem distinto do tempo material (chronos), que é o tempo medido pelos relógios. Poderíamos traduzir como “de acordo com o projeto de salvação que Deus tem para o mundo, chegou o tempo determinado por Deus para o cumprimento das suas promessas”.

Que “tempo” é esse que “se aproximou” e que está para começar? É o “tempo” do “Reino de Deus”. A expressão frequente

no Evangelho de Marcos, nos leva a um dos grandes sonhos do Povo de Deus... A catequese de Israel referia-se, com fre-quência a Javé como a um rei que, sentado no seu trono, governava o seu Povo. Mesmo quando Israel passou a ter reis terrenos, esses eram considerados apenas como homens escolhidos e ungidos por Javé para governar o Povo, em lugar do verdadeiro rei que era Deus. O exemplo mais típico foi o rei Davi. A saudade deste rei ideal e do tempo de paz e de felicidade em que Javé reinava (através de Davi) sobre o seu Povo, vai marcar toda a história futura de Israel. Os profetas vão alimentar a espe-rança do Povo anunciando a chegada de um tempo em que Javé vai voltar a reinar sobre Israel e vai restabelecer a situação ideal da época de Davi. Essa missão, na perspectiva profética, será confiada a um “ungido” que Deus vai enviar ao seu Povo. Esse “ungido” (em hebraico “Messias”, em grego “Cristo”) estabelecerá, então, um tempo de paz, de justiça, de abundância, de felicidade sem fim, isto é, o tempo do “reinado de Deus”.

O “Reino de Deus” é, portanto, uma noção que resume a esperança de Israel

Grupo de reflexão durante Curso de Verão 2009, PUC-SP.

JaimeC.P

atias

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Passos da Leitura Orante da PalavraDisposição: é importante criar um ambiente adequado que favoreça orecolhimento e a escuta da Palavra de Deus.

1. Invocação ao espírito SantoPeça o auxílio do Espírito Santo para acolher a Palavra. Você não vai “estudar”a Palavra, vai escutar o que Deus tem a lhe dizer. Repita: “Envia, Senhor,o teu Espírito”.

2. Leitura (o que a Palavra diz em si) Objetivo: Conhecer bem o texto (Mc 1,14-16)• Ler devagar e sem pressa!• Sublinhar o que achar importante• Ler os comentários presentes na Bíblia• Transcrever algumas frases ou palavras, se achar útil Algumas perguntas podem ajudar:Quais são as personagens? Onde decorre a ação?Quando acontece? O que fazem as personagens?

3. meditação (o que a Palavra diz hoje a mim)Reler o texto em primeira pessoa, colocando-se na pele da personagem!Encontrar a afirmação central, depois: Repetir - MemorizarConfrontar a sua vida atual com a Palavra escutada:a. Sua vida com Deusb. Sua vida com os outrosc. Sua vida consigo mesmo

4. oração (o que a Palavra me faz dizer)Responder à Palavra escutada através da oração. Fazer isto em três etapas:1. Pedindo perdão pela Palavra não vivida2. Agradecendo e louvando pelas maravilhas que Deus operou e operaem sua vida3. Fazendo seus pedidos a Deus, de modo especial, pedindo o dom doEspírito Santo.

5. Contemplação (a Palavra me leva ao Coração de Deus)Sinta a presença de Deus, não é tempo de palavras, mas apenas de silêncio.Permita que Deus fale no silêncio, lugar privilegiado de Sua presença.

6. missão e Ação (a Palavra me leva aos outros)A Palavra não nos pode deixar indiferentes, depois de escutar o que Deustem a dizer, é tempo de descer da montanha e ir ao encontro dos irmãos eirmãs e de se colocar em ação/missão: “Faça-se em mim segundo a tua Palavra”.

torne uma realidade, sem que a pessoa renuncie ao egoísmo, ao orgulho, à auto-suficiência e passe a escutar de novo Deus e as suas propostas.

“Acreditar” não é apenas aceitar um conjunto de verdades, mas é, sobretudo, aderir à pessoa de Jesus, escutar a sua proposta, acolhê-la no coração, fazer dela o guia da própria vida. “Acreditar” é escutar essa “Boa Notícia” de salvação e de libertação que Jesus propõe e fazer dela o centro à volta do qual se constrói toda a existência.

“Conversão” e “adesão ao projeto de Jesus” são duas faces de uma mesma moeda: a construção de uma nova hu-manidade, com uma nova mentalidade, com novos valores, com uma postura vital inteiramente nova.

meditandoContemplando a realidade que nos

circunda, notamos a existência de som-bras que criam tantas vezes, angústia, desilusão, desespero e sofrimento na vida das pessoas. No entanto, o projeto de Deus é um mundo diferente, um mundo de harmonia, de justiça, de reconciliação, de amor e de paz. A esse mundo novo, Jesus chama de “Reino de Deus”. É a tal projeto que Jesus nos apresenta e ao qual nos convida a aderir. Somos chamados a construir, com Ele, um mundo onde Deus esteja presente e que se edifique de acordo com a Sua visão.

Estamos disponíveis para entrar nessa aventura? Para que o “Reino de Deus” se torne uma realidade, o que é necessário fazer? Na perspectiva de Jesus, o “Reino de Deus” exige, antes de mais nada, a “conversão”. Temos de modificar a nossa maneira de pensar, os nossos valores, as nossas atitudes, a nossa forma de “ver” Deus, o mundo e os outros para que se torne possível o nascimento de uma realidade diferente. Temos de mudar as nossas atitudes de egoísmo, de orgulho, de auto-suficiência, de comodismo e voltar a escutar Deus e suas propostas. O que é que temos de “converter” para que se manifeste, realmente, esse Reino de Deus tão esperado?

Segundo a Palavra de Deus que nos é proposta, o “Reino de Deus” exige “acreditar” no Evangelho. “Acreditar” não é a aceitação de certas afirmações teóricas ou a concordância com um con-junto de definições a propósito de Deus, de Jesus ou da Igreja; mas é, sobretudo, uma adesão total à pessoa de Jesus e ao seu projeto de vida. O que á “acreditar” para mim?

Patrick Gomes Silva, imc, é diretor do Centro Missionário José Allamano, SP.

num mundo novo, de paz e de abundância, preparado por Deus para o seu Povo. Esta esperança está bem viva no coração de Israel na época em que Jesus aparece e começa a dizer: “o tempo completou-se e o Reino de Deus aproximou-se”. Certas afirmações de Jesus mostram que Ele tinha consciência de estar pessoalmente ligado ao Reino e de que a sua chegada dependia de sua ação.

Jesus começa, precisamente, a cons-

trução deste “Reino” pedindo a conversão (“metanoia”) e o acolhimento da Boa Nova (“evangelho”). “Converter-se” significa transformar a mentalidade e o compor-tamento, assumir uma nova atitude de base, reformular os valores que orientam a própria vida. É “reformular” a vida, de modo a que Deus passe a estar no cen-tro e ocupe sempre o primeiro lugar. Na perspectiva de Jesus, não é possível que esse mundo novo de amor e de paz se

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12 Novembro 2009 -

de Jaime Carlos Patias

ntre os municípios de Três de Maio e Tucunduva, Região Noroeste do Rio Grande do Sul, encontra-se Rocinha, localidade a 450 quilô-metros de Porto Alegre. Passan-do pelas estradas que cortam as

lavouras, de longe já é possível avistar a torre da capela Nossa Senhora da Saúde, construída há 50 anos pelo padre José Radicci, imc, o vigário da roça. A terra fértil atraiu famílias de imigrantes que fundaram comunidades e criaram muitos filhos. Em 1953, lá nasceu Elio Rama, o sétimo de oito filhos do casal João Rama e Justina Fiorentini Rama. A região é berço de 14 padres missionários e 17 missionárias da Consolata. Elio é um entre centenas de rapazes que, em 1967, ingressou no antigo Seminário Nossa Senhora de Fátima, do Instituto Missões Consolata, em Três de Maio. Cursou o segundo grau em Erechim, RS, os estudos de Filosofia em São Paulo e fez o ano de Noviciado em Aparecida de São Manuel, SP. A Teologia estudou em Roma, Itália, na Universidade Urbaniana, com especialização em missiologia. Foi ordenado padre no dia 10 de novembro de 1984, na igreja Matriz de Três de Maio. Este ano comemora seu jubileu de prata sacerdotal.

Padre Elio avalia sua trajetória de vida destacando que Jesus chamou seus dis-cípulos para estar com Ele e os enviar em Missão. “Chamou os doze discípulos, começou a enviá-los dois a dois...” (Mc 6, 7). Lendo essa passagem do Evangelho, Elio entendeu que depois do chamado o Senhor o enviaria em Missão. Isto acon-teceu logo após a sua ordenação, no mês de fevereiro de 1985, quando deixou o Brasil rumo a Moçambique, na África. Chegando, foi imediatamente indicado para trabalhar na Missão de Vilankulos, diocese

E

Jubileu sacerdotal:voltar para agradecer

“Chamou os doze discípulos, começou a enviá-los dois

a dois...” (Mc 6, 7).

de Inhambane, na costa do Pacífico, a 750 km de Maputo, a capital do país, naquela altura mergulhado numa terrível guerra civil. Quem o recebeu foi o seu conterrâneo e primo, padre Aquileo Fiorentini, imc, hoje Superior Geral do IMC. Em Vilankulos os missionários tinham que assistir a mais duas Missões: Santa Ana de Maimelane, distante 60 km e São José de Mapinhane, a 50 km. “Tratava-se de três grandes áreas de evangelização que no passado chega-ram a ser atendidas por seis padres, dois irmãos religiosos e nove religiosas. Quando cheguei éramos apenas dois padres e três irmãs, para toda aquela vasta área pastoral, abrangendo cerca de 300 quilômetros de extensão”, lembra o missionário.

InculturaçãoAo pisar numa nova realidade, uma das

maiores preocupações é estudar a língua e a cultura, para respeitar os valores locais e mergulhar na vida do povo. Seguindo a experiência, padre Elio iniciou logo o es-tudo do Xitshwa, idioma falado pelo povo Matswa, que habita a região. Ele lembra que aqueles “eram anos difíceis devido à situação que o país atravessava como ex-colônia portuguesa governada, desde a independência em 1975, por um partido único de inspiração marxista, a Frente de Libertação de Moçambique - Frelimo. Não havia muita liberdade religiosa e professar a fé era algo que somente gente corajosa podia fazer. A Igreja era perseguida e o povo proibido de frequentar a comunidade, de se reunir para a catequese, para cursos de formação e celebrações”, recorda. “Para se ter uma ideia, os missionários deveriam pedir licença para se deslocar até as al-deias, o que nem sempre era concedido. Os nossos passos eram seguidos dia e noite e qualquer coisa que se fazia fora da norma, era sujeita a castigos”, explica o padre.

No embate ideológico, a Resistência Nacional Moçambicana – Renamo, fazia oposição, intensificando a guerra civil. Pa-dre Elio descreve o cenário: “A Frelimo e a Renamo lutavam entre si, mas quem mais sofria as consequências era o povo. Foram mais de dez anos de tragédias marcadas

Fotos:A

rquivoPessoal

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13- Novembro 2009

pelo medo. Circular pelas estradas era muito perigoso. O povo só dormia nas cidades, as aldeias eram regularmente atacadas, saqueadas e destruídas, muitas pessoas eram maltratadas, espancadas e mortas brutalmente. Centenas de crianças foram mutiladas, raptadas, feitas órfãs, deixando traumas profundos. Com o passar do tempo, o sofrimento levou os pais ao desespero. Então as autoridades no poder começaram a pensar em algo para mudar a triste situação que representava um atraso para todos”. Padre Elio faz uma leitura evangélica dos fatos: “os meus primeiros oito anos de Missão foram marcados por essas realidades, mas ao mesmo tempo, foi nas dificuldades que pude viver concretamente o chamado de Jesus e o envio como discípulo em meio de ‘lobos’, levando a consolação libertadora, socorrendo os órfãos, as vítimas da guer-ra, da fome, da violência e do abandono. Foram anos desafiantes com a presença da guerrilha, a implantação do regime comunista leninista marxista e para piorar, uma seca que causou uma grande fome e muitas mortes”, recorda.

Formação de liderançasPadre Elio explica que, além do serviço

religioso nas comunidades e nas famílias, na sede da Missão se realizavam clandes-tinamente vários cursos de formação para as lideranças, alicerçados em três pilares: Fé, Esperança e Caridade. “Durante esse período foram ministrados cursos para mais de 650 pessoas, que ao regressarem às suas comunidades de origem exerciam os ministérios. Eu diria que os animadores e animadoras da época eram verdadeiros heróis da fé que professavam. Durante o período de perseguição religiosa, aqueles leigos e leigas formaram muitos cristãos, numa proporção bem maior do que os anos anteriores quando se tinha liberda-de”, observa. Segundo o religioso, nos anos 90 o relacionamento entre Igreja e governo começou a mudar. “O presidente da época, Joaquim Chissano, passou a deixar de lado certos princípios da ideologia marxista, depois de perceber o fracasso do socialismo científico, abrindo as portas à Igreja, dando mais liberdade em todos os sentidos. Foi quando no dia 4 de outubro de 1992, dia de São Francisco de Assis, em Roma, a Frelimo e a Renamo assinaram o Acordo Geral de Paz. Nessa altura, eu já me encontrava em Nampula, província no norte do país, para dar início à construção do Seminário da Congregação. Além disso, assumi os cuidados de uma paróquia com seis comunidades, na periferia da cidade”, relata padre Elio.

A falta de missionários em alguns paí-ses sobrecarrega os poucos disponíveis a aceitar o desafio de partir. Padre Elio conta

obras de Deus, entre os povos. Isso faz parte da dinâmica da Missão e estabelece uma ponte entre as Igrejas e os povos. O missionário é aquele que sabe partir, mas, também é capaz de regressar à Igreja de origem”. Foi isso que aconteceu ao padre Elio. Em agosto de 2002 regressou ao Brasil para, em São Paulo, trabalhar na formação dos seminaristas estudantes de Teologia provenientes de vários países, numa comunidade internacional e multi-cultural. Assumiu a nova tarefa narrando com a vida a missão que teve o privilégio de conhecer e viver em Moçambique. “Procuro ter sempre confiança em Deus e admiração por Maria, a mulher missionária que soube acolher a Palavra e seguir os passos do seu filho Jesus. Foram outros seis anos vividos na doação, como serviço pelo Reino”, destaca.

Hoje padre Rama encontra-se em Cascavel, PR, no Centro de Animação Missionária e Vocacional, colaborando na paróquia São Paulo e na Ação Missionária da Arquidiocese. “Faço isso procurando ser discípulo missionário e transmitindo esta convicção a todos os cristãos”, costuma afirmar. “Ao celebrar meus 25 anos de vida sacerdotal, considero-me um homem curado por Jesus. Então, devo voltar para agradecer. É este sentimento que tenho: agradecer a Deus e a Jesus por me conser-varem perseverante na Missão. Agradeço também aos meus familiares, amigos, colegas, irmãs missionárias e, sobretudo, ao povo que partilhou comigo a alegria da Missão, ensinando-me a ser verdadeiro na minha vocação”, conclui padre Elio.

A missa de ação de graças pelo jubileu será celebrada no dia 22 de novembro em Rocinha. Na véspera acontecerá um encontro de Amigos do IMC, colegas e ex-seminaristas da região de Três de Maio. No dia 6 de dezembro, padre Elio participará da celebração dos 80 anos da paróquia Imacu-lada Conceição, na mesma cidade. Outras celebrações, com colegas de congregação, amigos e familiares, serão realizadas em São Paulo e em Cascavel.

Jaime Carlos Patias, imc, é diretor da revista Missões.

que dividia seu tempo entre a formação de 25 jovens, a construção do edifício para o Seminário e a pastoral na paróquia. “Também neste período de trabalho intenso sentia o crescimento dos cristãos católicos, livres para viver o seu batismo sem as perseguições do passado. Foram quatro anos de alegrias por ver jovens dispostos a seguir a vocação missionária. Quatro deles já são padres em outros países”, comemora feliz. Outra atitude importante na vida do missionário é a disponibilidade para assumir responsabilidades em diversas frentes. Foi assim que em junho de 1996, padre Elio foi eleito para o cargo de superior provin-cial do IMC em Moçambique, serviço que desempenhou até o ano de 2002. “Assumi aquele trabalho com certa insegurança, mas aos poucos fui me habituando e, com simplicidade e dedicação procurei fazer o melhor. A tarefa de superior foi de grande ajuda para conhecer e acompanhar os missionários nos seus trabalhos. Algo que sempre me chamava a atenção era o em-penho dos leigos nos diversos ministérios das comunidades”, observa.

Ele resume os 18 anos que passou nas missões de Moçambique como tem-po de grande aprendizado. “Aprendi dos leigos catequistas o valor da dedicação, da doação, até da própria vida. Naqueles anos, dezenas de catequistas morreram por causa da fé. O maior massacre ocorreu no dia 22 de março de 1992, no Centro de Promoção Humana de Guiúa, na diocese de Inhambane, quando um grupo armado invadiu o local e assassinou 24 pessoas, homens, mulheres e crianças. Estes são os mártires da fé. Os Centros Catequéticos recebiam famílias para, durante dois anos, proporcionarem uma intensa formação humana, social e apostólica. Enfim, a Mis-são enriqueceu a minha vida como padre missionário. Aprendi a escutar as pessoas com paciência e dar orientação às suas inquietudes”, avalia.

De volta ao brasil“No Evangelho e nos Atos dos Apóstolos

não existe só o ir, mas também o voltar, para narrar os principais acontecimentos,

Padre Elio no Seminário Teológico Padre Bísio, Ipiranga, SP.

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Sem fazer média!

o preço da democraciaReportagem recente do Portal R7 mostra que o Legislativo

brasileiro é pouco menos caro que o Congresso do país mais rico do mundo: os Estados Unidos da América. Gastamos mais do que França, Alemanha e Reino Unido juntos, lembrando que nesse último um escândalo de proporções imensamente inferiores puniu severa e velozmente os parlamentares acusados. Países de nossa envergadura social e econômica, como México, Chile, Argentina gastam entre cinco e dez vezes menos com suas casas parlamentares.

A democracia, afirmam alguns analistas, não tem preço, conceito com o qual concordo. Mas uma de suas principais características é estabelecer regras aceitas por quem participa do Estado, e nes-se caso estamos absolutamente incluídos. Não existe qualquer motivo, uma única razão sequer, para um senador ganhar mais de R$ 16 mil mensais, 15º salário, verba indenizatória de R$ 15 mil, carro com motorista, plano de saúde ilimitado, R$ 25 por dia de gasolina, cotas de passagens aéreas que chegam a R$ 27 mil mensais, R$ 82 mil para contratar suas respectivas equipes, R$ 500 para telefonemas residenciais, celular sem limite de despesa e R$ 3,8 mil de auxílio-moradia. Existiria algum senador desse país capaz de avaliar nossa realidade social, comparar esses gastos com outros países mais desenvolvidos, ou próximos de nossa realidade, e justificar tamanho conjunto de obscenidades? Acredito, ou gostaria de acreditar, que não. Mas, em um mundo onde parece vigorar a insensibilidade e a hipocrisia, todos devem conseguir construir um argumento que encubra os favores, os desmandos e os abusos que esses recursos patrocinam ao longo de oito anos de mandato. Pior: de forma natural, com a cara limpa, acreditando na normalidade do fato, pois isso se tornou um traço apodrecido de nossa paupérrima cultura política.

A única alternativa, para um povo que pretende assistir a manutenção do Senado é responder com o mais essencial ins-trumento que temos à mão: o voto. A renovação absoluta de dois terços do Senado em 2010 pode não representar a limpeza e a aproximação com a ética, e sequer qualquer garantia de melhora. Mas, certamente serviria de mensagem para um grupo de 81 brasileiros que herdou uma instituição apodrecida por décadas de história e nunca demonstrou qualquer coragem para alterar o cenário fétido de seu cotidiano despreocupado com o país. E que não venham justificar as raras ações positivas em nome do Brasil. O pouco que se vê nesse sentido é pura obrigação, a um preço que infelizmente não cabe moralmente em nossos bolsos.

Humberto Dantas é cientista político, coordenador de cursos na Assembleia Legislativa de São Paulo e apresentador do programa Despertar da Cidadania na rede Canção Nova de Rádio.

os últimos meses assistimos a escândalos sucessivos no Senado Federal. Mas como as eleições se aproximam e as pesquisas mostraram um desgaste imenso junto à opinião pública, o ritmo do conflito baixou. Isso porque os 54 senadores que colocarão seus cargos em disputa no ano que vem, perceberam que teriam dificuldades de

voltar a encontrar os 27 que têm mandato até 2014. A manutenção da crise não interessava ao povo, segundo pseudo-análise dos senadores. Mas, na verdade o objetivo é arrefecer as mágoas e fortalecer as candidaturas, com prejuízo inestimável à nossa democracia, que mais uma vez dá claros sinais de ser incapaz de punir ilegalidades e, sobretudo, assaltos à ética e à moral de um povo facilmente tapeado.

Outra pesquisa recente, no entanto, mostrou uma luz no fim do túnel. As pessoas se manifestaram insatisfeitas com os sena-dores, mas afirmaram que o Senado não pode ser fechado. Ou seja, a instituição deve resistir à corrosão da cáustica atitude de seus membros – sem exceção alguma, pois até mesmo aqueles que choram na qualidade de representantes do que é correto, se apequenam na fraqueza de atitudes que se confundem com discursos vazios e atuações teatrais. O Senado esconde atos, nomeia familiares, beneficia fantasmas, gasta demais. A verdade é essa, a despeito de época, partido e posição em relação ao governo. Não podemos negar. E a gastança beneficia o “honesto” e o corrupto, o cara de pau e o “beatificado”. Não existe distinção entre o que gasta o mais acusado e o que despende aquele visto como o mais correto. Estamos diante do caos.

de Humberto Dantas

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A renovação de dois terços do Senado Federal nas eleições de 2010 pode ajudar a democracia e demonstrar a insatisfação popular por tanto desmando.

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Religião e ecologia

No planeta, nossa Casa Comum, religião e ecologia convergem e precisam caminhar juntas.

FORMAÇÃO mISSIONÁRIA

iante dos múltiplos e comple-xos problemas da atualidade, religião e ecologia adqui-rem importância central pelo significado que possuem e papel que exercem. Para

além de seus terrenos específicos, apontam princípios e valores; sugerem reflexões e atitudes integradoras básicas para a preservação da vida e do meio ambiente. No que tange ao cuidado com a sustentabilidade e com o bom relacionamento entre tudo o que vive e existe na Casa Comum, convergem e precisam caminhar juntas.

Funções da religiãoA função principal da religião con-

siste em ajudar o ser humano a refazer ligações rompidas, essenciais à sua vida e convivência. É de sua natureza

Dde Dirceu Benincá indicar a meta fundamental da existên-

cia humana e a maneira equilibrada de estar-no-mundo. De acordo com Leonardo Boff, no livro O casamento entre o céu e a terra (2001:59), a religião “confere um sentido supremo e um sumo valor à vida e ao universo. Por causa disso, é a maior força de coesão social que conhecemos”. Um meio útil para religar, cuidar e libertar.

a) Religar: A tradição judaico-cristã fala da possibilidade do rompimento das relações entre o homem e seu Criador e entre os próprios seres humanos. Referindo-se a isso, a Bíblia utiliza narrativas clássicas como a apropria-ção do fruto proibido (Gn 3,1-7) e a rivalidade assassina de Caim com Abel (Gn 4, 1-16). O objetivo dos textos é demonstrar que a auto-suficiência humana e a violência são frontalmente opostas à vontade divina.

Com a descrição do Paraíso, perdido por Adão e Eva, alude-se à transgressão

da liberdade e ao desrespeito à fideli-dade filial. Na narrativa de Caim e Abel evidencia-se a violação do princípio da fraternidade. Outros textos reprovam comportamentos que ferem a igualdade e a justiça, o que é demonstrado por meio da narrativa do dilúvio (Gn 7, 6-24), expressão de corrupção gene-ralizada. A subsequente história sobre a Arca de Noé (Gn 7) pode ser lida como denúncia aos diversos tipos de “dilúvios” provocados pelos sistemas sociais ao longo dos tempos. Por outro lado, sugere a essencial atitude de construir uma sociedade justa, capaz de promover a vida de todos.

b) Cuidar: Rompimentos e atitudes devastadoras também podem ocorrer em relação a toda a natureza, o que, aliás, se verifica de muitos modos, in-clusive com fundamentações bíblicas. Em uma das narrativas da Criação (Gn 1,28), utilizam-se os verbos kabash (submeter, subjugar a terra) e radah

Momento de espiritualidade entre osarticuladores regionais do Grito dosExcluídos, Centro de Formação SagradaFamília, Ipiranga, 2009.

GianfrancoGraziola

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16 Novembro 2009 -

(dominar os animais), pondo o ser humano numa posição nefasta. Vi-sões com esta perspectiva dominadora serviram à civilização ocidental para legitimar a exploração e depredação indiscriminada da natureza, bem como dar suporte a processos violentos de colonização.

Hoje, essa compreensão é com-batida por muitos que defendem a necessidade de fortalecer a dimensão do cuidado, atitude sustentada por outra narrativa da Criação (Gn 2, 4b-25). Nela se afirma que o ser humano recebeu de Deus a tarefa de cultivar (abad) e guardar (shamar) o Jardim do Éden (Gn 2,15). Em nossos dias, a postura do cuidado vem sendo cada vez mais ressaltada como princípio e como tarefa comum das pessoas, organizações, governos, culturas e povos diante das eminentes crises, riscos e desastres socioambientais. O cuidado é a base que possibilita a vida humana enquanto humana e a existência de todos os demais seres dentro da Casa Comum.

c) Libertar: A cultura ocidental é muito marcada por concepções frag-mentadoras, materialistas, lineares e excludentes, perpassando o mundo da

técnica, da economia, da política e do mercado. Nesse contexto, religiões, igrejas, grupos, movimentos religio-sos e espiritualidades muitas vezes também se tornam terreno fértil para práticas fundamentalistas, inclusive com interesses escusos. Ao invés de cumprirem com a função de libertar as pessoas das diferentes “prisões”, constituem-se em mecanismos que legitimam desigualdades e formas de exploração e opressão.

Porém, na tradição recente dentro do cristianismo tem-se consagrado a Teologia da Libertação, que trouxe a reflexão de que à teologia e às igrejas cabe o papel profético de denunciar as estruturas injustas e organizar o povo para buscar a libertação integral. Isso mostra que se pretende avançar no com-promisso libertador da religião diante dos múltiplos e complexos problemas sociais, econômicos, políticos, culturais,

Poluição no rio Guamá, Belém, PA.

Extração de areia às margensdo Rio Guaíba, Porto Alegre, RS.

JaimeC.`Patias

JaimeC.P

atias

"A terra é suficiente para todos, mas nãopara a voracidade dos consumistas" (Gandhi)

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17- Novembro 2009

FORMAÇÃO mISSIONÁRIA

religiosos e ambientais. Essa perspec-tiva, aliás, é defendida historicamente por outras religiões, sobretudo de matriz indígena e africana, assentadas em uma visão de interdependência harmônica do ser humano com o cosmos. Portanto, a religião tem sob sua responsabilidade a missão de promover religações com o objetivo de libertar e cuidar da vida e da integridade da Criação.

Dimensões da ecologiaO conceito ecologia tem múltiplos

enfoques, leituras e aplicações. No início da década de 70, o filósofo no-rueguês Arne Naess fez a distinção entre ecologia rasa e ecologia profunda. A ecologia rasa é antropocêntrica, ou seja, vê o ser humano como senhor da natureza e atribui a esta apenas valor instrumental e utilitário. A ecolo-gia profunda, ao contrário, percebe o mundo como uma rede de fenômenos

interconectados e interdependentes da qual o ser humano faz parte. Desde uma concepção integradora, ela pos-sibilita perguntas profundas a respeito do sentido da vida, da orientação da técnica e da ciência.

Em suas reflexões, Leonardo Boff aborda a ecologia a partir de quatro dimensões: social, ambiental, mental e integral. O enfoque social da ecologia estuda as formas como a sociedade se relaciona com a natureza; como produz e distribui os bens produzidos; como trata os dejetos, preserva os bens naturais etc. No livro Ecologia, mundia-lização, espiritualidade (2008:112), Boff afirma que a ecologia social relaciona a injustiça social com a injustiça eco-lógica, mostrando que o ser humano mais agredido é o pobre. A pobreza revela-se pela falta de infraestrutura à subsistência e à vida digna; águas contaminadas, ar poluído, moradias insalubres, transporte poluente e re-lações sociais de violência.

A nossa civilização tornou-se con-sumista e excludente. Entramos numa dinâmica de produzir sempre mais para as pessoas consumirem cada vez mais e de uma forma irresponsável. Enquanto 20% da humanidade conso-mem 80% dos bens da natureza; 80% da população acabam ficando com apenas 20% dos produtos. Por isso, a palavra-chave para a ecologia ambiental é qualidade de vida para todos, o que requer mudança no modo de produção e no padrão de consumo. Trata-se de criar outro tipo de relacionamento entre os seres humanos e a natureza, fortalecendo o cuidado, a equidade, a justiça, a democracia e o respeito aos direitos humanos de todos.

A ecologia mental refere-se às vi-sões de mundo, aos valores e contra-valores, aos conceitos e preconceitos, aos vícios culturais adquiridos, os quais podem distorcer a reta conduta da mente em relação à natureza. Assim, uma nova consciência ecológica implica uma nova prática. A nova ecologia mental concebe o ser humano como um elo ético e responsável no universo. Para tanto, é fundamental a entre-ajuda e a cooperação, a fim de impedir que uma parte da humanidade se apro-prie de forma ilimitada dos recursos enquanto outra parte seja condenada a definhar na exclusão e na miséria. A essa compreensão se junta a busca cada vez mais explícita de valores e espiritualidades capazes de dar signi-ficação à vida.

A religião tem a missão de promover religações com o objetivo de libertar e cuidar da vida e da integridade da Criação.

JaimeC.P

atias

Oração dos Povos Indígenas harmoniza o ser humano e a natureza. Belém, PA.

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FORMAÇÃO mISSIONÁRIA

Novembro 2009 -

A noção de ecologia integral traz a ideia de que o planeta Terra é um corpo ao lado de muitos outros corpos. Entretanto, todos eles estão vincula-dos entre si à semelhança da relação que se estabelece com as células do corpo humano. Nos povos antigos, essa concepção achava-se mais evi-denciada. Em geral, os Povos Indíge-nas sentem-se intimamente ligados ao universo e consideram-se irmãos das estrelas e filhos do sol. Entre as culturas ocidentais modernas, porém, verifica-se uma maior inclinação às práticas predatórias decorrentes da visão utilitarista e mercadológica da natureza.

A perspectiva de uma ecologia integral não inclui somente a preocupa-ção com outro tipo de sociedade e um novo modelo de desenvolvimento, mas implica necessariamente o bem-estar da natureza. A propósito, Boff afirma no livro citado: “Tudo o que existe, coexiste. Tudo o que coexiste, preexiste. E tudo o que coexiste e preexistente subsiste por meio de uma teia infinita de relações onicompreensivas. Nada existe fora da relação. Tudo se relaciona com tudo em todos os pontos” (2008:21).

Uma relação estreitaComo percebemos, há uma relação

estreita entre religião e ecologia na me-dida em que defendem a integralidade da vida e do meio ambiente. Novamente, vale destacar a importância dos saberes tradicionais e seus modos de vida como, por exemplo, dos Povos Indígenas. Eles veem a Terra como Mãe (Pacha

Mama) e os rios que a irrigam como seu sangue. Muitos mitos e rituais ex-pressam sua relação ecológico-religiosa com a natureza.

Os Tupis Guaranis, por exemplo, alimentam historicamente o sonho de uma Terra Sem Males à semelhança da Terra Prometida para o povo hebreu. Naquele lugar imaginado reinaria a paz, a abundância, a felicidade, a harmonia e não se morreria jamais. Tal desejo tem servido como motivação e resis-tência diante de problemas de diversas ordens. Ao tratar a Terra como “Mãe”, não admitem que ela seja comprada, vendida ou agredida. Ao revestirem a natureza de sacralidade, esses povos imprimem uma radical crítica ao sistema de mercado no qual todas as coisas são tratadas como mercadorias, inclusive o próprio ser humano.

Conforme apontamos, entre as fun-ções principais da religião está a de estabelecer religações. Significa dizer aproximar o ser humano de seu Deus; fortalecer a relação de fraternidade entre os semelhantes; estimular a capacidade do cuidado com a vida e com o conjun-to dos elementos da natureza. Nesse empenho, a mística e a espiritualidade ecológica adquirem importância capital, como demonstrou São Francisco de As-sis. Há cerca de 800 anos, ele já chamava a atenção para o macro-ecumenismo, tratando todos e tudo, inclusive os lobos ferozes, de irmãos e irmãs. A fraternidade universal e o zelo pelo que é coletivo são regras essenciais tanto para a religião quanto para a ecologia como ciência e prática cotidiana.

Ante os graves males que ameaçam o planeta – todos eles gerados pela racionalidade ocidental – é necessário uma nova ética que afirme a alteridade do outro. Uma sociedade ética é aquela que se esmera pela dignidade de todos os seus integrantes e pelo cuidado com o ambiente coletivo de habitação. Essa consciência traz o desafio iminente de um novo paradigma civilizatório, como sugere a Declaração dos Direitos Hu-manos e a Carta da Terra. Esta enfatiza que não é possível pensar alternativas ao desenvolvimento capitalista sem pensar na interconexão profunda entre ética e política; ética e ecologia; ética e economia; ética e cultura; ética e relações socioambientais.

A questão é séria demais para ficar apenas nas mãos dos ambientalis-tas. Diante da situação de devastação ambiental em que nos encontramos, não bastam soluções provincianas, localizadas e paliativas. É fundamental construir alternativas ao modelo de desenvolvimento cumulativo e preda-tório. Nunca a humanidade se uniu em torno de uma causa comum. Agora tem razões de sobra para isso, buscando impedir catástrofes globais. O desafio planetário requer religações, solida-riedade, precaução, princípios éticos, cuidado, lucidez, equilíbrio, luta pela justiça e pela igualdade. Essa tarefa é de todas as ciências, de todas as expressões religiosas, de todas as pessoas e povos.

Dirceu Benincá é doutorando em Ciências Sociaispela PUC-SP.

Fórum Social Mundial, 2009, Belém, PA.

KarlaMaria

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Manifestantes pedem o retorno de Zelaya.

ANP

1919- Novembro 2009

forma tão globalizada e manipulada por meios de comunica-ção elitistas? Mas nesta caminhada de juventudes presentes, reagindo, indo às ruas, usando os espaços das universidades, criando ferramentas como a internet para fazer denúncias e para a defesa de seu povo, a chama da luta reacende.

Torna-se importante exemplo de ação das diversas juventudes existentes no mundo todo, as mobilizações e questionamentos destes jovens num processo de resistência contra um modelo que gera morte, em nome, inclusive, de um “bem da ordem constitucional”. Compreender o processo leva-nos, até mesmo, a relembrar o combate e a resistência no período da ditadura no Brasil, com tamanhas sequelas, dor e lembranças que não se apagam dos corpos dos familiares e vítimas que ainda buscam provas e vestígios escondidos ou apagados.

Todos os países da América Latina que passaram por ditaduras militares carregam, até hoje, a dor tamanha do não reconhecimento do poder público dos que foram torturados e mortos, dos corpos desaparecidos, da falsa história militar no papel, apoiado por grupos oligárquicos e mídias elitistas. O mais difícil, literalmente, é assistir, ainda hoje, a esses modelos.

Com isso, emerge a necessidade de aproximar os povos do mundo todo nestes canais de comunicação comunitários e populares para que de fato tenham informações a partir da versão contada pelo povo, dos que resistem aos modelos de barbárie.

E, apesar de tudo isso, ainda me colocando nas madruga-das a escutar muitas rádios de Honduras (quando não eram boicotadas por golpistas) que permitiam ao povo denunciar ao vivo seus sofrimentos, ataques e mortes, quisera eu ao ir dormir, despertar e perceber que tudo não tivesse passado de um fenômeno chamado pesadelo!

Vanessa Ramos é do CIMI-SP e colaboradora dos jornais Brasil de Fato e Porantim e das revistas Missões e Mundo e Missão.

Para refletir:1. O que conheço da história da América Latina, a partir dos

excluídos?2. Diante de conflitos como estes, sendo cristão, como me

posiciono?3. O que posso fazer para ser agente de transformação?

roteiro de encontroTema do mês: Honduras: sangue em nuestra América Latinaa) Acolhidab) Mística inicial e Oraçãoc) Apresentação do tema, questionamentos e debatesd) Dinâmicae) Divididos em grupo: Responder às três perguntas do Para refletirf ) Apresentação de propostas, a partir dos gruposg) Oração conclusiva

Hondurassangue em nuestraAmérica Latina

de Vanessa Ramos

s notícias dos últimos meses sobre a nossa América Latina, através dos meios de comunicação democráticos e populares, evidenciam a conjuntura política conflituo-sa nos diversos países deste continente, através de elites e governos que adotam posturas opostas aos

interesses das classes populares. O ano de 2009 traz uma intensificação da violência que

revela a expressão mais cruel de um processo atroz continuado como, por exemplo, o massacre ocorrido com os Povos Indíge-nas no Peru, a ação contínua de fazendeiros contra indígenas, quilombolas e sem-terra no Brasil, a intensificação da corrida armamentista com apoio dos EUA e, mais recentemente, o golpe em Honduras.

Quanto a Honduras, ademais as análises jurídicas da Cons-tituição hondurenha e a justificativa dos que tomaram à força o poder, a chamada democracia apresentada como justa após tal golpe, esteve na rua sendo sequestrada, morta, ferida a balas, cassetetes, com jovens sofrendo violência sexual e vendo a polícia e os militares quebrando vidros de carros e motos das pessoas em resistência.

No processo hondurenho, em relação à Igreja Católica, algumas gotas de esperança surgiram dos mais progressistas. Alguns religiosos, membros da Igreja e de institutos religiosos, enviavam mensagens via internet apontando e reconhecendo a necessidade de um compromisso concreto e uma postura de anúncio e denúncia desses fatos como resposta ao seguimento radical de Jesus Cristo e seu Evangelho. Como pensar que, neste ano, assistiríamos a um processo ditatorial? E, ainda mais, de

A

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20 Novembro 2009 -

Síndrome de Imunodeficiência Adquirida - Aids, fez sua primeira vítima no Congo, em 1959. Hoje se sabe que só no continente africano já morreram mais de 17 milhões de pessoas. A dis-

seminação da doença, assim como os primeiros testes laboratoriais, começou na década de 80. No início da década de 90 o

de Karla Maria

A

Vitória contra o preconceito

número de infectados chegou à casa de 10 milhões no mundo. Em 1987, com o apoio da Organização das Nações Unidas (ONU), a Organização Mundial de Saúde (OMS) decidiu transformar o 1º de dezembro no Dia Mundial de Luta contra a Aids.

É neste momento que a sociedade brasileira passa a ver na TV e jornais suas primeiras vítimas famosas: o cartunista Henrique de Souza Filho, o Henfil (1988), o ator Lauro Corona (1989), o cantor e compositor Cazuza (1990) e o sociólogo Betinho (1997) – contaminado por trans-fusão de sangue. Em 1994, o governo federal cria sua estratégia de combate à Aids, aproveitando-se do fato de, na época, não haver uma lei de patentes no país. Copia a fórmula dos medicamentos anti-HIV e começa a produzi-los interna-mente. Sem o pagamento de royalties para os laboratórios multinacionais, inicia a distribuição gratuita dos coquetéis aos portadores do vírus HIV no país.

No mesmo ano de 1994, um missionário da Consolata teve a iniciativa de entrar na luta contra a Aids. Padre Valeriano Paitoni, italiano de Breccia, fundou a Sociedade Padre Costanzo Dalbésio, junto à Paró-quia Nossa Senhora de Fátima, no Imirim, Zona Norte de São Paulo. Esta iniciativa foi inspirada pelo V COMLA – Congresso Missionário Latino-Americano, realiza-do em Belo Horizonte, MG, e se tornou

“É uma vitória ver crianças soropositivas chegarem à maioridade”.

uma resposta concreta da comunidade à dimensão missionária. Em outubro de 1991, padre Valeriano já havia fundado o Lar Betania, obra do Instituto Missões Consolata - IMC destinada a acolher e apoiar homens portadores do vírus HIV.

Inicialmente a comunidade se as-sustou, até porque na década de 90 a disseminação do vírus HIV era grande, bem como a falta de informação e de diálogo sobre a doença. Passou a ser preconceituosamente definida como um mal que atingia apenas determinados grupos da sociedade - homossexuais, prostitutas, e usuários de drogas.

A Sociedade Padre Costanzo Dalbésio que hoje conta com três casas de apoio - Casa Siloé, Lar Suzanne e Vila Vitória, é mantida por 50% do dízimo da paróquia, pelo grupo dos sócios fundadores, que através de um carnê todos os meses dão uma pequena oferta, o apoio do IMC e pela parceria com as Irmãs Missionárias da Consolata, que oferecem bolsas de estudo para as crianças no Colégio do Imirim. O atendimento médico é da rede pública, exceto para algumas patologias que exigem exames específicos.

Segundo a coordenadora da Casa Siloé, Marlene da Silva Ribeiro, o início foi difícil. Foi necessário buscar parcerias, formação e informação “estávamos no escuro, tivemos reuniões com médicos e Funcionárias do Lar Suzanne.

Vitória, 5 anos, com padre Valeriano Paitoni.

ChiaraGiovane

tti

KarlaMaria

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21- Novembro 2009

psicólogos para esclarecer as inúmeras dúvidas, mas o nosso desejo de ajudar era maior”, afirma.

Desde sua fundação, a Sociedade Pa-dre Costanzo acolhe crianças soropositivas e de famílias carentes, que chegam até as casas por meio do Serviço Social do Fórum de Santana da Vara de Infância e Juventude. O juiz da Vara, dr. Raul Felice é quem defere o destino das crianças, garantindo a tutela delas ao Estado, de-terminando padre Valeriano como seu guardião até a maioridade.

vila vitóriaA Casa Siloé foi inaugurada em 1995,

o Lar Suzanne em 1998 e a Vila Vitória em 2006. Esta última é destinada aos jovens que já completaram 18 anos e não foram adotadas ou não voltaram para seus familiares. “É uma grande vitória ver estas crianças chegarem à maioridade, por isso a terceira casa se chama Vila Vitória, para significar as grandes vitórias que conseguimos ao longo de todos estes anos”, revela padre Valeriano com um sorriso largo no rosto.

Desde a fundação das casas de apoio foram atendidas 94 crianças. A Vila Vitória é resultado de um trabalho comprometido com a dignidade da pessoa humana, com o desenvolvimento da criança, que chega debilitada e doente. Aos poucos com alimentação saudável, educação de qualidade, acompanhamento médico e o carinho da “família”, ela se torna uma jovem cheia de vida. Como é o caso de Glaucia Michelle, que chegou pequeni-na ao Lar Suzanne e hoje, aos 18 anos segue com o projeto do salão de beleza “La Bella”, que funciona na garagem do Lar e é fruto do apoio do padre Valeriano à profissionalização das jovens.

até hospital e colégio. Estão junto com as crianças também nas tarefas escola-res, passam algumas noites na casa e controlam a medicação, que tem escalas e horários rígidos. “Eles são como meus filhos, eu cozinho, dou bronca, choro quando um vai embora”, afirma Jurema Ralba, que começou como voluntária há 11 anos no Lar Suzanne e hoje é a cozinheira responsável pela alimentação da criançada.

O tratamento por vezes apresenta sintomas desagradáveis, por isso a pre-sença carinhosa é essencial. Há inúmeros coquetéis e nem sempre a criança se adapta

ao medicamento, há efeitos colaterais. “No começo foi difícil, eu chorava escondida, mas a gente supera tudo, a gente aprende muito com eles, a gente para de reclamar”, afirma dona Olinda Rosa, que trabalha há três anos no Lar Suzanne.

A luta continuaO preconceito e a ignorância ainda são

os maiores desafios na luta contra a Aids e padre Valeriano confirma: “ao dar pales-tras ouço perguntas que revelam como é grande a ignorância e a falta de informação, há muitos que ainda pensam que a Aids está ligada a grupos, mas hoje em dia, ela está presente em todas as camadas da sociedade. Estes preconceitos ainda são grandes e continuam”, conclui.

No Brasil não há todos os tipos de coquetéis. Juliano chegou a Casa Siloé aos 8 anos e hoje reside na Vila Vitória. Aos 17 anos precisou de uma nova com-binação de remédios, que não existia no país. A Sociedade Padre Costanzo importou a medicação por dois mil reais ao mês, e em paralelo entrou com um processo na Justiça contra o governo para garantir que os outros jovens fossem atendidos. “Conseguimos mais esta luta, depois de cinco meses, o governo pas-sou a arcar com o medicamento e hoje ele recebe gratuitamente”, conta aliviado padre Valeriano. E, continua, “temos que juntar as forças, nós, comunidade cató-lica, igrejas cristãs, devemos continuar a pregar os valores evangélicos, porém, vamos acolher ou não criticar aqueles que têm uma missão mais ampla, como a Organização Mundial de Saúde, que me diz que o preservativo ainda hoje é o melhor método para ir contra a pandemia da Aids. Então eu tenho o direito e o dever de dizer também aquilo que a OMS diz para poder fazer frente a esta pandemia”, desabafa o missionário.

De acordo com o último relatório apresentado nas Nações Unidas, cerca de 33 milhões de pessoas viviam com o HIV em 2007 no mundo. A taxa anual de novas infecções pelo vírus diminuiu nos últimos dez anos: enquanto em 1998, 3,2 milhões de pessoas foram infectadas, em 2007 este número caiu para 2,5 milhões. O número anual de mortes pela doença também diminuiu: de quase quatro milhões em 2001 para cerca de dois milhões em 2007. Embora a taxa mundial de novas infecções tenha baixado, o número de pessoas infectadas pela primeira vez aumentou em países como China, Indonésia, Rússia e Ucrânia e em alguns países da União Européia e América do Norte.

Karla Maria, LMC, é estudante de jornalismo.

Como salvar o bebêO risco de transmissão do vírus HIV da mãe para o filho diminuiu para 8%depois que se descobriu o tratamento com remédios (AZT). Os médicosaconselham todas as mulheres grávidas a fazer o exame. A mãe que possui o vírus não pode amamentar o filho. Você pode ajudar as crianças mantidas pela Sociedade Padre Costanzo Dalbésio, sendo um sócio colaborador.

mais informações pelo telefone (11) 2256-7415

Glaucia Michelle.

KarlaMaria

KarlaMaria

As casas se distinguem das demais Instituições, por se constituirem uma família, conforme o espírito do Bem-aventurado José Allamano, o fundador de duas Congregações missionárias. Abrigam no máximo 12 crianças, para que seja possível acompanhá-las individual-mente. Nelas trabalham funcionários e voluntários que se dividem na manutenção e limpeza, cozinha, logística das crianças

Marlene da Silva Ribeiro.

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22 Novembro 2009 -

Cafelândia recebea Mãe Peregrina

“O teu amor de Mãe é um amor que não passa. Este povo te ama.

Este povo te abraça. Tão cheia de vida. Tão cheia de graça”.

de Cristina Ribeiro Silva

s irmãs Missionárias da Consolata trabalham em Ca-felândia, região oeste do Paraná, desde fevereiro de 1964. A principal missão tem sido a educação na Escola Primária e diversos serviços pastorais que resultaram em frutos abundantes de evangelização. As irmãs provenientes da região são sete. Os missionários

da Consolata chegaram à região em 1963 com a finalidade de acompanhar os colonos que chegavam principalmente do sul. Os padres assumiram também as paróquias de Nova Aurora, Formosa do Oeste e Jesuítas. Desde o início, padre Luís Luíse, foi grande incentivador da vida cristã através da catequese, pro-movendo também projetos em benefício dos agricultores como a Cooperativa Agro Industrial Consolata – conhecida como Copacol. Construiu em 1966 o seminário São José Cafasso, onde cente-nas de jovens estudaram. Ele foi fechado em 1990, e em 1992 a paróquia passou aos cuidados da Arquidiocese de Cascavel, mas as Irmãs da Consolata continuam presentes.

Consolata PeregrinaSeguindo os preparativos para a celebração do Centenário

de fundação das irmãs Missionárias da Consolata, marcada para o dia 31 de janeiro de 2010, o Quadro da Mãe Peregrina chegou à Cafelândia no dia 6 de maio de 2009, proveniente de Dourados, MS. O ícone foi acompanhado pelas irmãs Gabriella Bono, superiora Geral MC, Renata Conti, conselheira Geral, Edite Cobalchini, superiora Provincial e as irmãs da Comunidade de Dourados, onde terminara sua visita.

A solene recepção aconteceu no pátio da casa das irmãs que ficou todo iluminado com tochas de diferentes cores. Centenas de devotos se reuniram para saudar a Mãe que veio de longe para visitá-los e confirmar a obra de evangelização. Ao anoitecer as luzes se acenderam e o carro trazendo o Quadro da Mãe Pere-grina foi acolhido. Irmã Bernadete Pickler explicou os motivos da visita: “dos 100 anos de fundação do Instituto das Missionárias da Consolata, durante 45 anos, ele esteve sob doação em Cafelândia. Referência na educação, catequese e nas diversas pastorais, sempre em vista da missão consolação”. O povo aclamou o Quadro com grande salva de palmas.

Padre Cláudio Cobalchini, imc, pároco da paróquia São Paulo, em Cascavel, liderou a reza do terço luminoso celebrado entre cânticos de júbilo e reflexão. Logo após, com a queima de fogos, Nossa Senhora percorreu a cidade e seus bairros em carreata, para mais tarde ser introduzido na capela do Santíssimo numa vigília de oração. Durante quase dois meses de permanência em Cafelândia, o Quadro percorreu a periferia da cidade, as escolas, estabelecimentos comerciais, instituições e as capelas do interior. Nos bairros da cidade os fiéis o receberam com devoção e muito entusiasmo. “Velai sobre nossas famílias tão fragilizadas em

Asua estrutura. Vinde a nós e indicai-nos o caminho que conduz à plenitude da vida: Teu Filho Jesus”, pediam em oração. Nas escolas a Mãe acolheu e abençoou as crianças, adolescentes, jovens e professores e escutou preces: “Mãe querida fica co-nosco! Derrama as tuas bênçãos sobre todos nós. Conduz-nos pelo caminho do amor. Toca cada coração para que entenda a grandeza do educar”.

Durante oito dias a Virgem peregrinou pelas Unidades da Co-pacol na região onde os associados, colaboradores e comunidades tiveram a oportunidade de conhecer sua história e participar da celebração centenária. Ela passou também nas dependências da Prefeitura. “Receber a Mãe Peregrina é para nós motivo de gratidão, ternura e bênção. Nós somos servidores desse povo amado pela Mãe Consolata e como tal, queremos reverenciá-la, honrá-la e colocar esta cidade sob sua proteção maternal”, dizia a mensagem lida na recepção do Quadro. As visitas pelas comunidades rurais foram feitas em carreatas com grande participação do povo. No dia 20 de junho, Festa de Nossa Senhora Consolata, padroeira da Paróquia, do Município, das missionárias e missionários, dom Mauro Aparecido dos Santos, arcebispo de Cascavel presidiu uma missa festiva na Matriz. Maria tocou corações, moveu famílias, sensibilizou indiferentes. “O povo demonstrou um amor profundo a Nossa Senhora Consolata. Parabéns às irmãs que motivaram as peregrinações. Deus seja louvado”, disse dom Mauro.

Avaliando a peregrinação, padre Valdecir Freitas Camilo, pá-roco da cidade, afirmou: “temos certeza que o trabalho realizado na paróquia, com o Quadro Peregrino, despertou e motivou ainda mais a fé. A comunidade tomou mais consciência da missão e do compromisso com o outro. Muitas sementes foram lançadas e muitas bênçãos já foram colhidas”, concluiu o padre.

No dia 1 de julho, o Quadro retornou a São Paulo. Irmã Ber-nadete Pickler, em nome de todas as missionárias agradeceu: “obrigada Mãe terníssima! Sinto profunda alegria em pertencer a essa Família Missionária que há cem anos proclama com fideli-dade a Glória de Maria! Obrigada por tantas vidas doadas, vidas feita consolação. Obrigada pelos 45 anos de nossa presença em Cafelândia”, exclamou.

Cristina Ribeiro Silva, MC, é educadora em Brasília, DF.

Berna

rdetePickler

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23- Novembro 2009

Num mundo pluricultural, a Ásia tem muito a contribuir.

O fundamentalismonão tem futuro

de Mário de Carli

requentemente quem olha e procura conhecer a Ásia, imediatamente fica fascinado e surpreendido.Vê um continente vasto, diferente, desigual e percebe que nele está 62% da população mundial (4 bilhões). A maioria das civilizações e religiões remonta os primórdios da humanidade. Neste continente encontramos algumas

das expressões mais ricas da humanidade no meio dos seus contrastes. Começamos então a entender que há um longo caminho a percorrer com estes povos, entre sombras e luzes e sobretudo, no campo religioso há contrastes e desafios, mas há iniciativas louváveis que nos levam a crer que é possível um outro mundo para “as religiões”.

Diálogo inter-religiosoNa Índia, que é um grande país com uma milenária tradição

de tolerância religiosa, “o fanatismo religioso não tem futuro, pois os grupos fundamentalistas têm seus programas, de uma Índia que tenha uma única cultura, língua e religião, pretendendo transformá-la num país hindu, mas nós devemos continuar a senda do diálogo” – afirma dom Telephore Toppo, arcebispo de Ranchi. A missão da Igreja é a de educar as comunidades cristãs para a abertura e para o diálogo, para que todos vejam quem são os cristãos e o que querem. O anúncio do Evangelho aos grupos étnicos “dalit” e “adivasi”, marginalizados pelos hindus, provocam grande abertura à mensagem do Evangelho devido à promoção humana desenvolvida pelos cristãos. Estes grupos são alfabetizados, conhecem e reivindicam os seus direitos. Vendo o desenrolar disso tudo, acreditamos que o fanatismo não tem futuro. “Implodirá em si, porque procura bloquear o progresso e o desenvolvimento humano da população. Em um contexto multicultural e multireligioso, o diálogo é para nós uma prioridade pastoral, uma estrada mestra”, continua o arcebispo. Seu olhar sobre os cristãos das várias Igrejas sente que o diá-logo ecumênico deve crescer e conclui com esperança: “estou otimista pelo futuro dos cristãos na Índia, como era Madre

FTeresa, como é hoje o Santo Padre. A Índia é um grande país, com espírito tolerante, que a maioria da população conserva”. O Congresso Missionário Indiano realizado no mês de outubro de 2009 e a celebração dos 2000 anos do cristianismo no país, são um apelo para renovar a fé e a necessidade de proclamar Cristo ao mundo inteiro.

outro exemploDa Índia, passamos ao Japão, onde o povo Kimoci, na sua

sociedade e na própria cultura buscam a harmonia em tudo, com o bem e o mal coexistindo lado a lado. Afirmam que "os inimigos de ontem são os amigos de hoje” e procuram viver juntos na harmonia. Para quem olha de fora, tudo pode parecer uma organização baseada em leis, mas na realidade atingem a harmonia nas relações internas de suas comunidades. Das coisas pequenas dependem a paz, a serenidade e a força para viver. Desta forma, caminhar com os Kimoci é mergulhar na sua cultura, estar com eles, sobretudo onde os antigos costumes e tradições ancestrais ainda são preservados.

novas atitudesO melhor que podemos fazer é começar a ter uma atitude de

escuta diante de nossos interlocutores e de ver a novidade que eles nos trazem, de relativizarmos determinadas posturas como o dogmatismo e o campo estreito de determinadas leis. Na formação de novos líderes religiosos, buscar a vontade de Deus com um coração aberto e fraterno a todos, não cultivar exclusivismos, nem tampouco se impor, proclamando-se como os melhores no anúncio da salvação de Deus. Colocar o povo em sintonia para sentir, pensar e comunicar quem é Deus neste mundo. Quando tivermos a coragem de ultrapassar as linhas do puro "pensar" e atingir mais o coração com uma atitude de abertura, de acolhida ao diferente e de valorização do que há de bom e de melhor nas outras religiões, venceremos barreiras e medos que impedem a convivência harmoniosa num mundo plural.

Mário de Carli, imc, é vigário paroquial na Paróquia Nossa Senhora da Penha,Jardim Peri, São Paulo.

ÁlvaroPache

co

I Congresso Missionário da Ásia.Delegações da Coreia e Mongólia com o simbolo do Congresso.

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InfânciaMissionáriaInfânciaMissionária

24 Novembro 2009 -

de Roseane de Araújo Silva

Sugestão para o grupoAcolhida (neste mês destacaremos nosso continente americano, trazer imagens de diferentes famílias em festa, preparar o am-biente com os símbolos missionários, as cores dos continentes e a Bíblia)motivação (objetivo): em grupo, refletir as dificuldades sentidas pelas crianças e adolescentes que vivem sem família.oração espontânea pelas crianças e adolescentes que vivem sem a referência de suas famílias.Partilha dos compromissos semanaisLeitura da Palavra de Deus (sugestões para os quatro encontros):realidade missionária: Mc 3, 31-35 Fortalecido pela sua família de fé, Jesus nos mostra que sua verdadeira família é formada por aqueles que realizam na sua própria vida a vontade de Deus, ao segui-lo. Participamos de nossa comunidade com alegria? Refletir em grupo o sentido de pertencer a uma comunidade.espiritualidade missionária: Jo 15, 7-17 Jesus nos convida a testemunhar o seu amor como seus amigos, não como seus ser-vos. Servimos a Deus com alegria, porque Deus é amor e vida. A missão da comunidade não nasce da obediência a uma lei, mas da tarefa de testemunhar o amor de Deus, que quer dar vida.Compromisso missionário: Jo 10, 7-21 Jesus é o modelo de pastor, porque Ele não busca seus próprios interesses, mas dá a própria vida a todos aqueles que aceitam sua proposta. Para uns, suas palavras são loucura; para outros, sua ação é sinal de libertação. Neste mês faremos o sacrifício pelas crianças que vivem em orfanatos.vida de Grupo: Jo 8, 12-20 Jesus nos fala que é a luz do mundo e nos convida a segui-lo. A decisão é nossa: seguir a Jesus ou ir em outra direção, longe da presença de Deus. Como está o nosso compromisso como missionário ou missionária? Há em nossa comunidade grupos de reflexão que reúne famílias como a Pastoral Familiar? Conhecemos outro grupo semelhante em nossa comunidade? Marcar uma visita ao grupo na comunidade ou paróquia e montar juntos um painel para tornar conhecido o trabalho visitado.momento de agradecimento (fazer preces espontâneas a partir do tema e da reflexão do Evangelho).Canto e despedida.

empre ouvimos falar que as crianças são o futuro do mundo, mas afinal que mundo preparamos para os nossos pequeninos? Sim, porque a cada movimento que fazemos direta ou indiretamente, somos percebidos e deixamos “marcas” neles. A primeira e mais significativa “marca”

outros referenciais básicos para sua maturação. Em muitos casos, a criança e o adolescente são deixados de lado e precisarão criar condições para sobreviver, muitas vezes sem o domínio de valores familiares, necessários ao seu crescimento pessoal.Até bem pouco tempo, as famílias costumavam ser bem numerosas e seus membros estavam sempre juntos, mas nos dias atuais elas são bem pequenas e os encontros estão se tornando mais raros. Com a família aprendemos muita coisa, a começar pelos nossos primeiros passos, recebemos nossa educação religiosa, o nosso contato com a comunidade de fé, sendo também o primeiro exemplo de vida comunitária que temos. Esta marca carregaremos por toda a vida. Com nossos pais e irmãos aprendemos a olhar para a frente, a tomar decisões, aprendemos a chorar nos momentos tristes e a gargalhar quando alguma coisa nos traz felicidade. O testemunho da nossa família ajuda-nos a amadurecer com responsabilidade. Nos países orientais, o conceito de família é ampliado, envolvendo ainda tios, avós, sendo todos responsáveis pelas crianças menores, independente de ser filho biológico, a participação na educação dos pequenos é de todos.Em nossa comunidade, somos convidados a estar presentes compondo a família comunitária, assumindo o nosso batismo, nos tornando membros da família de Deus. Pelo batismo que recebemos nos colocamos a serviço do Reino do Pai, como missionários e mis-sionárias, com o compromisso de levar a Boa Notícia do Evangelho. A exemplo de Maria, mãe de Jesus e nossa mãe, que nos pede “Façam o que ele mandar” (Jo 2, 1-12), precisamos estar atentos ao convite de Jesus sem desanimar, porque somos membros da família de Deus e da família da Infância e Adolescência Missionárias. É dessa maneira que Jesus nos convoca a participar do banquete festivo e comemorar o reencontro com o amor de Deus em nossas vidas. De todas as crianças do mundo – sempre amigas!

Roseane de Araújo Silva é missionária leiga e pedagoga da Rede Pública do Paraná.

Vem! Entra na roda com a gente!

S que recebemos, é o exemplo dos nossos familiares. Ao conversar outro dia, com as crianças do 4º ano da Escola Edvino Nowak, na cidade paranaense de Araucária, a respeito do significa-do da família, elas afirmaram que é muito importante. Pertencer a uma família é se sentir amado. No sentido literal da palavra, família significa um grupo que vive na mesma casa, como pai, mãe e filhos. Atualmente em nossa sociedade, as alternativas de vida familiar são bem diversas por vários fatores; principalmente no que se refere à falta de amor e carinho para os nossos pequeninos, bem como

“Pelo batismo recebi uma missão,vou trabalhar pelo Reino do Senhor!” E

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Guaranis Kaiwoás à beira da estrada com suas famílias em Laranjeira Nhanderu, MS.

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jibuti, na África, é um dos paí-ses mais quentes e áridos do planeta. Com aproximadamente 640 mil habitantes, os cristãos somam apenas 2,8% da popu-lação. 97,2% são muçulmanos.

É para lá que, no dia 18 de outubro, foi enviada a jovem irmã missionária da Consolata, Michelle do Nascimento da Cruz, 29, natural do bairro Benfica, zona norte da cidade do Rio de Janeiro. Michelle era professora do ensino fundamental e ajudava na alfabetização de adultos. Havia sido aprovada no curso de Pedagogia, mas, abandonou tudo pela Missão. Antes de começar a entrevista, ela avisou: “sou uma pessoa muito simples, sem muitas pa-lavras”. Mal sabia que, com isso, colocava em evidência uma das maiores virtudes missionárias: o testemunho de vida sem ruído, ensinamento do Bem-aventurado

de Jaime Carlos Patias

Dnão entendia. Feita a Primeira Eucaristia entrei no grupo da Perseverança para me preparar para a Crisma. Por conta de me acompanhar, minha mãe também começou a frequentar mais a Igreja e se engajou nas pastorais. Posso dizer que a minha iniciação cristã foi seguindo o exemplo das catequistas. Na época, entre os anos de 1987 e 1988, a dimensão missionária era muito forte nos padres da Consolata, responsáveis pela paróquia.

Poderíamos dizer que essa realidade desperta a sua vocação à Vida Religiosa e missionária?

Acredito que sim, pois via missionários de várias nacionalidades trabalhando jun-tos numa comunidade internacional, isso chamava a atenção. Pela origem deles, percebia a vontade de abraçar todos os povos mostrando uma paróquia muito aberta à África, Ásia e realidades como o sertão da Bahia e os Povos Indígenas. Uma figura muito significativa na minha vida foi o padre Dante Possamai, imc, que eu conheci ainda criança. Quando ele chegou na paróquia, pela segunda vez, eu tinha de 10 para 11 anos.

Como foi que conheceu as missio-nárias da Consolata?

Entre 1991 e 1996 elas tiveram uma comunidade no Rio, mas eu não cheguei a conhecê-las. Quando procurei entrar na Congregação eu tinha 20 anos. Fui falar com o pároco, padre Albino Braz, imc, e ele me aconselhou pegar a revista Missões, ver o endereço e escrever di-retamente para as irmãs em São Paulo. Eu escrevi e começamos a dialogar. Na paróquia eu dava catequese, ajudava na liturgia e na pastoral nas comunidades. Passei a participar de encontros em São Paulo a cada dois meses. Foi assim que em 2001 entrei na comunidade, passei as diversas etapas como o Postulantado e o Noviciado, sempre na mesma casa, no Jardim Consolata, zona norte de São

A Missãono coração

Eu fiz esta opção e agora tudo gira em torno da Vida

Consagrada e missionária.

Allamano de quem é seguidora. Michelle é filha de Rosângela do Nascimento e Diógenes José da Cruz, mas agora todos os cristãos da paróquia Nossa Senhora Consolata, no Rio de Janeiro a acompa-nham como sua predileta.

Irmã Michelle, poderia nos falar sobre a sua infância e origens?

Eu vivia muito unida com os tios e primos da família de minha mãe. Minha avó era católica e Mãe de Santo na um-banda, mas deixava os filhos livres para escolher. Na umbanda tem essa tradição de se seguir o catolicismo e batizar num contexto de sincretismo. Quando eu tinha seis anos comecei a catequese para a Primeira Eucaristia e gostei. Os meus primos também foram, mas depois da Primeira Comunhão não perseveraram, com exceção de um. Eu fui ficando, talvez porque nunca tinha me identificado muito com a religião da minha avó. Sentia um pouco de medo daqueles rituais que eu

JaimeC.P

atias

Ir. Michelle no Grito dos Excluídos 2009, Ipiranga, São Paulo.

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não se podia fazer muito, além de partilhar as diferenças. Uma missionária é sempre estrangeira, de uma forma ou de outra. Essa condição que parece uma desvanta-gem passa a ser um valor, justamente por proporcionar aproximação das pessoas, em especial daquelas que mesmo vivendo na sua própria pátria sofrem algum tipo de discriminação.

Como você vê o papel da mulher religiosa na Igreja hoje?

A mulher é aquela que está na base da família, por isso é importante que ela atue nas bases da comunidade. Essa postura de proximidade com as necessidades do povo, mesmo como leiga, reforça a posição da Igreja em favor das causas. Muitas coisas podem mudar, mas, não precisa pertencer à hierarquia para exercer um papel importante. A presença da Vida Consagrada, em sua maioria mulheres, é uma grande força que serve para estimular a participação das mulheres na Igreja e na sociedade. A Vida Consagrada tem sua especificidade. A mulher consagrada não constitui família nem é do clero, mas é um sinal de doação na Igreja. Na sociedade a mulher sofre alguns preconceitos. Dentro da Igreja a mulher é vista como aquela que tem menos qualificação. Mesmo aquelas que são qualificadas sofrem o precon-ceito de ser mulher e acabam não tendo o mesmo espaço do que o homem, nas horas das decisões.

Na sua paróquia existe um grupo de Leigos Missionários e o movimento Amigos das Missões Consolata - AMICO. O que teria a dizer para eles?

Eu também pertenci ao grupo de leigos em outra época, quando alguns leigos e leigas foram em missão nas comuni-dades da Bahia. Diria que o leigo pode entrar em mais lugares do que o padre ou a religiosa: no trabalho, nas escolas, na educação das crianças, nos grupos... É importante valorizar a vocação dos leigos missionários. O grupo dos Leigos Missionários da Consolata - LMC é aquela semente pequenina, ou aquele fermento na massa que tem muita força interior. A abertura missionária é uma abertura para o mundo para incluir a todos. Partilhando o Carisma, os LMC completam a família que inclui padres, irmãos, irmãs, leigos e leigas. Os jovens não deveriam ter medo de assumir compromissos e fazer opções. Quando se faz uma escolha, a vida toma outro significado. Quando não se faz uma opção, a gente dá voltas e a vida passa. Eu fiz esta opção e agora tudo gira em torno da Vida Consagrada e missionária.

Jaime Carlos Patias, imc, é diretor da revista Missões.

no Noviciado. A notícia despertou em mim o desejo de ir para lá. Djibuti é um país predominantemente muçulmano, e a nova perspectiva da missão como diálogo me chamou a atenção. Essa novidade que já faz parte do Carisma é o que me animou a pedir para ser enviada ao país. Tenho também algumas inquietações e medos, pois, é um lugar que não conheço e a figura da mulher tem pouca importância. Num primeiro momento não poderei falar muito, procurando me inserir na vida e no trabalho. Agora tem cinco irmãs da Consolata lá, eu serei a sexta. Um dos principais trabalhos é acompanhar uma grande comunidade de somalis refugiados na capital, Djibuti. Outras irmãs trabalham em um hospital e na promoção da mulher. Além disso, estão para abrir uma nova comunidade no norte do país.

Como é essa sensação de não saber o que vai fazer? Não conhece a cultura, a língua e os estudos de catequese não vão servir muito para dialogar com muçulmanos...

Falei recentemente com uma das irmãs que trabalha lá. Vejo como positivo o fato de não saber muito, porque quando se sabe, a tentação é de chegar e impor um projeto. O desconhecimento leva a abrir os olhos para ver a realidade. Ainda que eu conte com as irmãs que estão lá há muito tempo, é diferente da experiência que eu vou fazer. Vou com o coração aberto e numa atitude de acolhida.

O que faz uma irmã religiosa, ca-tólica, mulher, no meio dos muçul-manos?

Eu acredito que essa irmã é mais do que simples presença. Abre-se uma oportunidade para partilhar a vida e a fé. Em Roma já vivi de certa forma isso com os imigrantes muçulmanos, com quem

Paulo. Depois de fazer a minha primeira profissão religiosa, fui fazer trabalhos pastorais durante um ano em Monte Santo, no sertão da Bahia. Em 2005 prossegui a formação e os estudos em Roma, na Itália, frequentando na Universidade Urbaniana o curso de Catequese Missionária, saindo com o diploma de bacharel.

Você abriu mão de ser mãe e cons-tituir uma família para assumir a vida religiosa. Quais os valores que dão suporte a essa sua escolha?

Faço isso em nome de Jesus, para poder trabalhar mais a serviço do Reino de Deus. Se não fosse por Ele não teria valor. Não deixei valores e não vejo nenhum peso nessa opção. Eu comecei o caminho e sei que na minha opção não cabe constituir uma família minha, ser mãe e fazer outras tantas coisas. Acredito que o projeto de Deus me chama a trabalhar de maneira diferente. Essa diversidade de dons e carismas é o que faz a vida mais bonita, como um jardim com variedade de flores. A mulher consagrada é uma dessas flores.

O Brasil tem cerca de 1.800 missio-nários e missionárias além-fronteiras. 77% são mulheres. Como você se sente ao fazer parte desse grupo?

Às vezes temos medo de enviar porque achamos que vai faltar aqui, mas eu acre-dito que enviar além-fronteiras e acolher outros que chegam é o que movimenta a dimensão missionária da Igreja. A pessoa que sai do seu país, de sua cultura, se enriquece muito mais porque se encontra com o diferente e isso renova a Igreja.

Como surgiu a ideia de ir ao Djibuti e o que fazem as missionárias lá?

Quando em 2004 os primeiros mis-sionários e missionárias da Consolata abriram comunidades no Djibuti, eu estava

JúlioCésarCalde

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Ir. Michelle com seus pais durante o envio para Djibuti, 18 de outubro. Paróquia N. S. Consolata, Rio de Janeiro.

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Novembro 2009 -

de Emerson Quaresma

inquenta anos depois de receber a primeira escola que levaria o conhecimento dos não-índios para o seu povo, a terra indígena Sateré Mawé, localizada a duas horas de lancha da sede de

Maués (município a 267 quilômetros de Manaus), assistiu sob o pôr do sol do dia 7 de setembro de 2009 e a poeira do seu chão, 39 professores saterés entrarem para a história do país como a primeira turma indígena a se graduar em nível superior pelo curso de Licenciatura Plena em Ciências Naturais.

O curso, realizado em parceria com a prefeitura de Maués e a Universidade Federal do Amazonas (UFAM) foi iniciado em fevereiro de 2004 com 42 professores, segundo o secretário municipal de educa-ção, João Libanio Cavalcante. Apenas três não conseguiram colar grau por pendên-cias em algumas disciplinas. A formação pioneira foi custeada pela prefeitura no valor total de R$ 790.555,00.

Com a graduação, os professores indígenas que se formaram pelo progra-ma Pirayawara, da Secretaria de Estado da Educação, poderão agora ampliar o ensino para alunos de 5º ao 9º ano do Ensino Fundamental. “Lutamos muito

Saterés Mawéscom nívelsuperior39 professores indígenas entram para a história da educação no Brasil.

Francisco Adilson dos Santos Hara, a professora sateré Aliete Maria da Silva, 32, foi a primeira a receber o diploma. Ela está entre as seis mulheres que viveram a experiência. “Nós, mulheres, somos responsáveis pela família. Agora com essa formação a responsabilidade aumenta sobre as nossas crianças da comunidade”, disse Aliete que leciona há dez anos, e já passou pelas comunidades Nova América, São José, Santa Maria e Menino de Deus.

O chefe do departamento de educa-ção indígena da Secretaria Municipal de Educação de Manués, Euro Alves, disse que a graduação dos saterés mawés ajudará a evitar o êxodo indígena. “So-nhamos uma escola diferenciada. Essa titulação vai contribuir para realizarmos esse sonho. Estamos conseguindo agora implantar o Ensino Fundamental completo na comunidade”, afirmou.

com as nossas lideranças para avançar com esse curso. Agora vamos lutar para preparar nossos alunos a fim de que sintam a mesma vontade de chegar ao nível superior”, disse o professor recém-graduado Inácio Cristino da Silva, 47. Orador da turma, Inácio leciona há 20 anos nas comunidades Santa Maria e São Bento, situadas da terra indígena.

evitando o êxodoPor quatro anos os professores re-

cém-formados passaram a maior parte do tempo estudando por três turnos as 54 disciplinas ministradas por 48 pro-fessores da UFAM na sede de Maués, bem longe das suas comunidades e de suas famílias. Emocionado em assistir seu povo construir o próprio caminho da educação com coragem, Inácio disse no seu discurso que foi possível chegar até o fim da empreitada por conta da união dos seus parentes.

“Sentimos na pele todas as dificul-dades enfrentadas nesse percurso, das doenças, do cansaço. Cada colega passou por essa dificuldade, e para chegarmos até aqui cada um foi apoiando e incentivando o outro. Agora estamos com tudo o que precisamos para levar o conhecimento na língua portuguesa e na sateré”, disse o orador. Pelas mãos do pró-reitor de ensino de graduação da UFAM, professor

C

Números1.978 é a quantidade de alunos

indígenas entre 14 mil registrados na rede municipal de educação de Maués, segundo o secretário João Libanio. São 33 escolas indígenas e mais seis anexos para 44 comunidades indígenas do município.

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Coordenador do curso Takeshi Matsuura, coordenador

do curso de Licenciatura em Ciências Naturais, professor de microbiologia disse que é a primeira experiência da UFAM na graduação de professores indígenas. Para organizar o curso, a instituição venceu licitação e concorreu com outras universidades. “O curso já é dado aos não-índios em vários estados para aplicação das discipli-nas de Física, Química e Biologia no Ensino Fundamental. Para ministrar aos professores saterés tivemos que fazer adaptação voltada para uma relação de necessidades deles. Foi possível principalmente com a discipli-na de Atividade Acadêmica Científica e Cultural. Durante os sete períodos eles disseram o que é a sua necessida-de”, disse. Takeshi reconheceu que a maior dificuldade dos recém-graduados durante o curso foi o uso da lingua-gem acadêmica. “Mas a maioria deles prestava bastante atenção, o que não encontramos na maioria dos não-índios. No início eles reclamaram bastante, mas no decorrer das aulas com ajuda do dicionário eles foram aprendendo”, relatou o coordenador.

Secretário municipalJoão Libanio informou que desde

o ano 2000 professores não-índios deixaram de lecionar nas comunidades indígenas, e por isso nasceu a neces-sidade de avançar com a formação dos professores indígenas para que eles dessem continuidade à formação das crianças da comunidade. “Precisávamos formá-los para que as crianças não saiam do campo”, disse Libanio.

A experiência da UFAM com os saterés mawés está se repetindo com a etnia mura do município de Autazes (a 108 quilômetros de Manaus), segundo afirmou o coordenador administrativo do Programa Especial de Formação Docente da UFAM, José Felício da Silva. Os muras iniciaram o curso de Licenciatura em Ciências Naturais em fevereiro de 2008 por meio do Programa de Apoio à Implantação e Desenvolvi-mento de Cursos de Licenciatura para

Formação de Professores Indígenas (Prolind), desenvolvido pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC).

José Felício afirmou ainda que a UFAM está se preparando para aumen-tar o número de ofertas de cursos de graduação a indígenas. “O MEC está vindo com esse grande projeto para formação de professores indígenas com licenciatura. A vantagem é que ninguém

melhor para passar o conhecimento aos seus que eles mesmos. Muitos alunos ainda não falam o idioma português, e os novos graduados poderão passar os novos conhecimentos de forma bilíngue”, avaliou.

o prefeito de mauésMiguel Paiva Belexo (PR), foi orien-

tado a organizar a colação de grau dos saterés graduados na sede do município. Mas ele fez questão de que a cerimônia acontecesse na terra indígena Sateré Mawé, na comunidade Vila Nova do Marau. Ele lembrou que a primeira escola instalada na terra indígena partiu do ex-deputado esta-dual Darcy Augusto Michiles, pai do ex-deputado federal Humberto Michiles, que esteve presente na cerimônia. “Isso é o resultado do sacrifício do esforço dos professores. Todo inves-timento na educação é pouco porque o conhecimento adquirido ninguém vai tirar deles e eles vão passar para toda uma geração. Estamos fazendo história na região do Marau”, disse o prefeito Belexo.

Personalidadesnotícia que se tem de Maués é por inter-médio de relatório feito durante a visita do superior provincial jesuíta padre Batendorf, o qual referiu-se a Maués como “Vila dos Maguases”. A chegada dos portugueses modificou a vida dos mawés, pois eles eram obrigados a trabalhar para os bran-cos, falar sua língua e adotar sua religião. Várias doenças também vieram com os portugueses e muitos morreram. Culturas desapareceram neste processo.

Em 1669 os jesuítas fundaram a aldeia missionária de Maguases cons-truindo uma capela às margens do atual rio Maués-Açu, mas a missão religiosa

fracassou em 1759. Em 1798, os por-tugueses Luís Pereira da Cruz e José Rodrigues Porto fundaram o povoado de Luséa. Nesse mesmo ano foi criada pelo bispo do Grão-Pará, dom Manuel de Almeida Carvalho, a paróquia de Nossa Senhora da Conceição de Maués do Amazonas, sendo construída uma ca-pela de palha e barro pelo carmelita frei José Álvares da Chagas, que também trouxe a imagem de madeira de Nossa Senhora da Conceição, conservada até os dias de hoje na atual igreja da Matriz. Em 1803 foi criada a missão de Maués, e o trabalho missionário entregue aos capuchinhos. Em 1832 acontece a revolta dos índios mawés contra a escravidão e pela autonomia política em relação ao domínio paraense, tendo à frente o tuxaua Manuel Marques.

No dia 11 de setembro de 1865, a Vila Maués passou a se chamar Conceição (Mello. 1967.p.86). Este nome foi dado em homenagem à padroeira municipal Nossa Senhora da Conceição. Em 4 de novembro de 1892 o município finalmente recebe o nome de Maués, homenagem aos primeiros habitantes os índios mawés, que significa papagaio falante e inteligente, (na língua Tupi mau significa curioso, inteligente; ueu significa ave da família dos papagaios e s é o plural em português).

Emerson Quaresma é jornalista em Manaus.

Um pouco de históriaA história de Maués tem início com

os antigos habitantes, os índios mundu-rucus e mawés. As duas etnias viviam em

constante conflito devido às diferenças culturais e a disputa da posse das terras da região, conhecida como Mundurucânia, em meados do século XVIII. A primeira

Professores indígenas saterés durante cerimônia de formatura.

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manaus - AmMissionários(as) na Amazônia

Aproximadamente 130 pessoas, entre religiosos(as), leigos(as) e padres diocesanos, se reuniram, entre os dias 5 e 7 de outubro, em Manaus, para o primeiro Encontro de missionários e missionárias da e na Amazônia, promovido pela Conferência Nacional dos Religiosos do Brasil - CRB. Iluminado pelo tema “Vida e missão neste chão”, o encontro serviu para refletir e debater a presença da ação evangelizadora da Igreja na Amazônia. A realidade humana das famílias e da juventude ocupou os debates. “Constatou-se o fato de que cada vez mais estamos longe dos jovens, do seu mundo, dos seus anseios, por isso devemos procurar novas maneiras, novos métodos para nos aproximar deles e com eles estabelecer relações a partir de uma vida simples, profética e testemunhal”, afirmou a coordenação do encontro. A participação de pessoas de todos os estados que compõem a Ama-zônia favoreceu a partilha das riquezas de presenças nas diferentes realidades da missão, desde a cidade, o campo, as fronteiras e os interiores.

Indaiatuba - SP3ª Semana Brasileira de Catequese

Com a aprovação de uma “Carta aos Catequistas” e de três propostas dos Regionais para a coordenação nacional da catequese, foi encerrada no dia 11 de outubro a 3ª Semana Brasileira de Catequese (SBC), iniciada no dia 6, em Itaici. O evento foi realizado pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), através da Comissão Bíblico-Catequética. O presi-dente da Comissão, dom Eugênio Rixen, destacou o grande número de bispos que participaram do evento e conclamou os padres a apoiarem mais a catequese. Participaram do evento 238 leigos, 89 religiosos (irmãos e irmãs), três diáconos, 127 padres e 25 bispos. “Esta foi a Semana Brasileira que mais reuniu bispos. Isso foi motivo de alegria para todos nós. A 3ª SBC superou minhas expectativas”, disse dom Eugênio. Irmã Zélia Batista, assessora da Comissão, disse que a Semana a confirmou no serviço junto ao povo. Já Cecília Ro-ver, também assessora da Comissão, conclamou os catequistas a terem “paixão pela catequese bíblica”. Com o refrão “Ó mamãe, embala eu, mamãe; abraça eu, mamãe; cuida de mim”, cantado por liderança da pastoral afro-brasileira, os participantes prestaram breve homenagem a Nossa Senhora Aparecida. As propostas dos Regionais foram: produzir subsídios para a formação de catequistas com enfoque na Iniciação à Vida Cristã; sistematizar um projeto de mobilização nacional para divulgar o processo de Iniciação à Vida Cristã junto aos Meios de Comunicação Social, pastorais, serviços, movimentos e organismos da CNBB e proporcionar a socialização das experiências de Iniciação à Vida Cristã; retomar a Catequese com Adultos na linha da formação para o discipulado em comunidade.

boa vista – rrViolência contra missionário

No dia 10 de outubro o padre Joaquim Fonseca, 61, missionário comboniano que trabalha em Roraima foi vítima de insultos com palavrões e agressão física por parte de um fazendeiro. O fato ocorreu quando o missionário esperava uma balsa para ir à terra indígena

São Marcos, em Boa Vista. O religioso não reagiu. O bispo da diocese de Roraima, dom Roque Paloschi, divulgou uma nota, repudiando o ato de violência de que foi vítima o padre.

"Felizes sois vós, quando vos injuriarem e perse-guirem e, mentindo, disserem todo o mal contra vós por causa de mim" (Mt 5, 11). A diocese de Roraima vem a público repudiar a agressão física sofrida por um de seus missionários, o padre comboniano Joaquim Fonseca na manhã do dia 10 de outubro. O missio-nário foi agredido ao responder afirmativamente à indagação se era padre da diocese de Roraima. O agressor iniciou sua abominável conduta dirigindo palavrões ao sacerdote e declarando que a Igreja era a pior desgraça que tinha em Roraima. Ao perceber que o padre Joaquim anotava a placa de seu carro, o agressor lhe deu um soco, derrubando-o por terra. O padre em momento algum esboçou reação. O caso foi registrado perante a autoridade policial competente para as devidas providências. A liberdade de expressão é um direito de todo cidadão. A ninguém, porém, é per-mitido abordar e ofender uma pessoa pelo simples fato desta professar uma fé ou defender ideais religiosos. A atitude do agressor revela intolerância e desrespeito, inconcebíveis num Estado Democrático de Direito, que devem ser urgentemente extirpados do seio social. A diocese de Roraima continuará sua Ação Evangeli-zadora, na fidelidade à Cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo, e não se abaterá diante daqueles que se julgam donos desta terra. Unidos na certeza de que é Cristo que caminha à nossa frente, invocamos a proteção da Virgem Maria, mãe dos perseguidos, para que a Igreja Diocesana de Roraima seja fiel à sua missão", disse, dom Roque Paloschi, no comunicado.

brasíliaCentro Cultural Missionário

No Dia Mundial da Missões, 18 de outubro, o Cen-tro Cultural Missionário - CCM renovou seu website lançando oficialmente sua programação para 2010. O endereço é: www.ccm.org.br. O CCM é um organis-mo da CNBB voltado para a animação e a formação missionária e tem como finalidade: promover cursos de formação missionária; realizar eventos de estudo e aprofundamento sobre teologia, espiritualidade e prática de missão; fomentar o surgimento e a capacitação específica de animadores missionários na Igreja no Brasil. Foi criado em Brasília, em 1982, e reúne três departamentos: o Centro de Formação Intercultural - CENFI, que se dedica à formação cultural e eclesial das missionárias e dos missionários estrangeiros; o Serviço de Colaboração Apostólica Internacional - SCAI, que oferece assistência jurídica e orientação às missionárias e missionários; o Centro de Animação e Estudos Missionários - CAEM, que proporciona cursos de formação. Além disso, a partir de 2010, oferecerá um Curso de animação missionária para Coordenadores de Conselhos Missionários Diocesanos, um curso de formação missionária para presbíteros e uma semana de estudos sobre a Missão Continental. No lugar do curso de formação missionária para seminaristas será realizado o 1º Congresso Missionário Nacional de Seminaristas em Brasília, de 4 a 10 de julho.

Fontes: CNBB, CCM, revista Missões.

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Os subsídios produzidos pela Comissão respon-sável pelo Projeto “O Brasil na Missão Con-tinental”, encontram-se

disponíveis para download em pági-na eletrônica criada especialmente para divulgar o Projeto. Para baixar conteúdos como a explicação do Tríptico (Capelinha Missionária), a Apresentação do Projeto Nacional de Evangelização, vídeos, artigos e fotos, basta acessar a página:http://www.revistamissoes.org.br/missaocontinental/home.htm

Comunidades, paróquias, dio-ceses, grupos e organismos podem utilizar o material em eventos e pro-gramas de formação e animação missionária.

O site recebe e divulga produções, notícias, artigos e experiências no contexto da Missão Continental em curso no Brasil. Contribuições podem ser enviadas para a assessoria de imprensa.

Pe. Jaime C. PatiasComunicação Missioná[email protected]

Subsídios MissionáriosO Brasil na Missão Continental

Sites:www.alemfronteiras.org.brwww.missiologia.org.brwww.ccm.org.br

www.pimenet.org.brwww.cimi.org.brwww.catolicanet.com

www.revistamissoes.org.brestádecaranova!

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