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O BULLYING ESCOLAR E AS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: reflexões para a
prevenção
Ana Lúcia Alves De Souza1
Letícia Cristina Ribeiro Dos Santos1
Edmarcius Carvalho Novaes2
RESUMO: Apesar de se tratar de um fenômeno social de conhecimento popular, o conceito de
bullying escolar carece de trabalhos acadêmicos que o correlacione com mídias sociais e as
práticas de gestão escolar com um intuito preventivo – uma vez que os trabalhos a respeito
buscam compreender tal prática, causas e consequências. Por outro lado, a escola mudou seus
formatos, concepções e formas de gestão, o que interfere diretamente nos modos de discussão e
prevenção da prática de bullying. Trata-se de uma pesquisa cuja metodologia é de revisão
bibliográfica. Neste artigo, propomos uma análise do fenômeno junto à escola, que hoje é vista
para além de seus muros, através das comunidades nas quais está inserida, e dos sujeitos que
caracterizam as relações naquele espaço. Indaga-se sobre as possibilidades de identificar as
práticas de bullying na escola, de modo que a prevenção se torne mais eficaz; as formas de se
trabalhar as identidades da escola e da comunidade, a favor da prevenção em casos de bullying;
bem como, o trabalho da gestão escolar, envolvendo todos os profissionais da instituição, nesta
atuação preventiva.
PALAVRAS-CHAVE: bullying escolar; práticas pedagógicas; atuação preventiva.
1. INTRODUÇÃO:
Bullying, palavra de origem inglesa, que etimologicamente significa “bruto,
valentão” (FANTE, 2005). Isto se deve ao fato de se possuir uma larga produção
jornalística provenientes de casos reportados em escolas em todo o país.
Nesse sentido, é possível inferir que as pessoas, de um modo geral possuem, ao
menos, uma pequena noção do que seja bullying e conseguem identificá-lo, caso se
deparem com algo do gênero. Por vezes confundido com preconceito, este fenômeno
ganha corpo na atualidade, quando se observa sua ocorrência em redes sociais.
Este trabalho busca as definições conceituais, mas também entender de forma
ampliada, como esse fenômeno se materializa, e suas respectivas consequências. Neste
sentido, problematiza-se: é possível prevenir (ou pelo menos minimizar), de forma
pedagógica, as práticas nocivas do bullying, sobretudo no ensino fundamental, em razão
da vivência da adolescência?
Para tanto, aponta-se as origens dos estudos sobre o bullying, com destaque ao
processo educativo brasileiro. Segundo Fante (2005), a partir dos anos 1970, os
1 Aluna do Curso de Pedagogia – Universidade Vale do Rio Doce 2 Professor Titular no Curso de Pedagogia – Universidade Vale do Rio Doce. Orientador do TCC
2
trabalhos sobre este assunto aumentaram. As práticas de bullying em escola ganharam
destaque e preocupação social, algo que gerou buscas de alternativas para tratá-lo de
forma prática e preventiva.
Assim, estudos voltados para compreendê-lo, com foco em suas causas tomaram
forma, mas não diminuiriam a importância de ser tratado através de outros olhares, até
porque um fenômeno social ganha novos contornos à medida em que a própria
sociedade produz novas formas de analisar seus problemas (ROSSETTO et. al, 2001).
Estes novos formatos impactam a sociedade e a escola.
Na educação, as Tecnologias de Informação e Comunicação3 modificaram as
relações escolares, com novos sujeitos e outros formatos de se obter informação e de se
relacionarem socialmente a partir do conhecimento desenvolvido. Tudo isto acabou
moldando também as práticas de bullying.
É a partir destas novas roupagens sociais, que este trabalho tem por objetivo
geral verificar como as práticas pedagógicas, de cunho preventivo, podem se mostrar
mais eficazes, ao observarmos a gestão escolar e sua relação com a comunidade,
sobretudo, no ensino fundamental.
Para tanto, apresentam-se como objetivos específicos: identificar e conceituar às
práticas de bullying entre os alunos, e suas consequências; compreender o papel
preventivo da escola diante da ocorrência de bullying, discutindo as práticas
pedagógicas e a importância da escola para que esse aluno que o pratique aprenda
valores sobre a convivência social e formação cidadã, de respeito à coletividade e
diversidade; e, apontar a importância de um planejamento pedagógico que problematize
a gestão escolar diante da ocorrência do bullying.
Trata-se de uma pesquisa cuja metodologia é a revisão bibliográfica (FANTE,
2005), e que se justifica considerando a necessidade de problematizar a importância de
um planejamento pedagógico, de cunho preventivo no combate à prática do bullying.
3 Por tecnologias de informação e comunicação entende-se Chamamos Tecnologias de Informação e
Comunicação (TIC) aos procedimentos, métodos e equipamentos para processar informação e comunicar
que surgiram no contexto da Revolução Informática, Revolução Telemática ou Terceira Revolução
Industrial, desenvolvidos gradualmente desde a segunda metade da década de 1970 e, principalmente, nos
anos 90 do mesmo século. Estas tecnologias agilizaram e tornaram menos palpável o conteúdo da
comunicação, por meio da digitalização e da comunicação em redes para a captação, transmissão e
distribuição das informações, que podem assumir a forma de texto, imagem estática, vídeo ou som.
Considera-se que o advento destas novas tecnologias e a forma como foram utilizadas por governos,
empresas, indivíduos e sectores sociais possibilitaram o surgimento da Sociedade da Informação.
(RAMOS, 2008).
3
Portanto, este artigo encontra-se dividido em três seções: na primeira, aborda-se
as práticas de bullying entre os alunos no ensino fundamental; na segunda, aponta-se o
papel preventivo da escola face à este fenômeno; e na terceira, reflete-se sobre como a
gestão escolar deve agir diante de tais problemáticas, dando ênfase à importância no
planejamento pedagógico.
2. AS PRÁTICAS DE BULLYING ENTRE OS ALUNOS NA ESCOLA
Quando o assunto é bullying, qualquer tentativa de falar a respeito remete à um
fenômeno mundial que tem como definição as práticas agressivas repetitivas
intencionalmente, que ocorrem sem motivação evidente, adotado por um ou mais
indivíduos, causando diversos problemas pessoais e sociais (FANTE, 2005; SILVA,
2010). Apesar de parecer muito genérico, cada indivíduo percebe este problema de um
modo muito particular, com reações físicas ou verbais no dia a dia.
Apesar de ter sido estudado de forma acadêmica na década de 1970, por Dan
Olweus, professor da Universidade da Noruega (FANTE, 2005), o bullying é uma
prática que sempre existiu. Isto mostra que foram as notícias que cresceram sobre a
prática corriqueira, o que torna seu conceito popularizado. Outro fato que deve ser
destacado é que este momento de “fama” da prática não trouxe melhores discussões em
ambientes nos quais ele mais ocorre: o ambiente escolar.
Considerando que o bullying é um fenômeno social nocivo, recorrente em
ambientes escolares entre pré-adolescentes, adolescentes e jovens. Fante (2005) enfatiza
os transtornos sociais e comportamentais que uma vítima pode carregar, seja com
sequelas psicológicas mais duradouras, ou por reações imediatas – que muitas vezes,
são tão violentas quanto o próprio bullying. Ainda segundo a autora, para que seja
considerado como tal, estes ataques pessoais, físicos ou verbais, precisam acontecer no
mínimo três vezes à mesma pessoa.
No Brasil, há casos de práticas de bullying que terminaram tragicamente. Uma
pesquisa feita pelo IBGE (2016)4, em que foram entrevistados alunos de 13 a 17 anos,
constatou que 46,6% sofreram algum tipo de bullying; outros 53,4% não sofreram;
4 A pesquisa foi objeto de matéria do Portal G1, acessível em: Acesso
em 18 maio 2017.
http://g1.globo.com/jornal-hoje/noticia/2016/08/casos-de-bullying-nas-escolas-cresce-no-brasil-diz-pesquisa-do-ibge.htmlhttp://g1.globo.com/jornal-hoje/noticia/2016/08/casos-de-bullying-nas-escolas-cresce-no-brasil-diz-pesquisa-do-ibge.html
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39,2% se sentiram humilhados, às vezes ou raramente; e 7,4% disseram que a
humilhação acontece com frequência – o que equivale a 195 mil alunos, e entre os
principais motivos aspectos relacionados à aparência.
Como todo ambiente social, há hierarquias, regras sociais específicas que ali
funcionam para manter padrões que serão exigidos na vida adulta, tais como a ordem, o
reconhecimento das obrigações, e horários. É exatamente neste terreno que o bullying
encontra possibilidades. Nos intervalos das aulas, no momento de socialização entre os
alunos do ensino fundamental que se encontram nos pátios para a alimentação;
normalmente, longe dos olhares dos professores e de um profissional que identifique os
problemas que podem surgir, o bullying ocorre (FANTE, 2005).
Segundo CHALITA (2008) existem duas formas claras para a prática do
bullying, sendo causadas de formas diretas ou indiretas. A forma direta é quando há
agressões físicas como, chutes, empurrões, palavrões, acusações, intimidação à vítima –
agressões normalmente feitas por meninos. A forma indireta é a verbal: são os rumores
espalhados, mensagens anônimas de ameaças, apelidos repetidos com frequência e
repassados para a escola, até mesmo o cyberbullying (bullying que se utiliza das redes
sociais para ser praticado).
O agressor, normalmente procura manter seu “status” como uma espécie de
comandante. Ele se percebe também em uma hierarquia em que o agredido está no
degrau mais abaixo. Devido à essas ameaças é que, muitas vezes, a vítima não faz
denúncia, tomando como única atitude o isolamento e preferindo não compartilhar,
guardando todo sentimento.
As vítimas ou alvos do Bullying são personagens escolhidos, sem
motivo evidente, para sofrer ameaças, humilhações, intimidações. O
comportamento, os hábitos, a maneira de se vestir, a falta de
habilidade em algum esporte, a deficiência física ou aparência fora do
padrão de beleza imposto pelo grupo, o sotaque, a gagueira, a raça
podem ser motivos para a escolha de uma vítima. (CHALITA, 2008,
p. 87).
Tudo começa por um simples desprezo, depois apelidos, visto que este começo
nem sempre é percebido para a maioria dos educadores como um princípio de bullying,
e assim os que o praticam, escolhem as suas vítimas não importando os motivos: elas só
não estão no “padrão social” em vista das outras pessoas: normalmente, são os que
usam óculos e aparelhos, tímidos que não conversam com ninguém, o aluno mais
dedicado da turma sempre elogiado pelo professor, a gordinha, a baixinha, entre outras
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características – bastam apenas demostrarem temor e não terem a coragem de reagir que
logo se tornam alvos fáceis.
A maioria dos casos relatados de bullying é mais frequente no Ensino
Fundamental, pois os adolescentes e jovens são mais suscetíveis à influências em grupo
(SPRINTHALL, N.A. & COLLINS, W.A., 1994).
Elkind (1972) afirma que os adolescentes não conseguem separar o que pensam
de si mesmos e o que os outros pensam deles, algo que o autor chama de “audiência
imaginária”, como se estivessem sendo testados, todo o tempo. Nesta “fase de
transição”, as mudanças não se limitam ao corpo. Afeta o comportamento, a
socialização, o discernimento entre as reais necessidades.
É comum encontrar nos lares dos praticantes de bullying, problemas associados
como falta de atenção, separação dos pais, brigas constantes, agressões verbais e físicas
entre pais e filhos – com todos estes problemas familiares aliados com as mudanças
corporais, não é difícil imaginar que este agressor, sem acompanhamentos necessários,
passa a ter problemas de comportamentos que às vezes refletem em suas atitudes dentro
da escola (AZEVEDO & GERRA, 2001 apud ROSAS & CIONEK, 2006).
Para o agredido, há inúmeros problemas resultantes destes atos, sendo tanto
psicológicos quanto físicos; agressores, vítimas e testemunhas sofrem consequências
que às vezes podem ser fatais, porém, segundo Fante (2005),
[...] especialmente a vítima, que pode continuar a sofrer seus efeitos
negativos muito além do período escolar. Pode trazer prejuízos em suas
relações de trabalho, em sua futura constituição familiar e criação de filhos,
além de acarretar prejuízo para a sua saúde física e mental (FANTE, 2005, p.
79)
É sempre a vítima que mais passa por problemas constantes, gerando baixo
rendimento escolar, sofrimentos dos mais variados possíveis, constantes medo e
desconfiança com as pessoas ao seu redor, depressão profunda, ansiedade, dificuldade
de se relacionar e socializar, falta ou o aumento excessivo do apetite, estima baixa,
sentimento de vingança e medo de voltar a escola – que em sua maioria, permanecem
em sequelas futuras (FANTE, 2005).
Pessoas com problemas de dicção, com voz baixa, tímidas, que possuem poucos
amigos, problemas de saúde são associadas com algo específico na infância. A falta de
confiança nas tomadas de decisões por vezes simples, são associadas pela psicologia à
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algum tipo de sequela traumática no passado, e aqui, obviamente, não há como deixar
de associar à uma possível agressão de bullying (CHALITA, 2008).
Segundo Martins (2016), normalmente, a vítima ganha mais visibilidade por
causas das consequências, por vezes trágicas, mas o agressor não pode ser ignorado.
Uma constatação é que a pré-disposição de agressão não é algo que se encontra em
muitos jovens e adolescentes. O comum é encontrar um líder que pode ser “seguido” ou
“imitado” pelo poder que este exerce no meio escolar, de sua turma. Esta força exercida
por ele acaba convencendo outros a seguir, copiar suas decisões – seja para ganhar
visibilidade, seja para ser aceito de certa forma na “turma”, ou seja, para evitar ser o
outro, aquele que será a vítima, agredido.
Fazer parte de uma turma de amigos na escola é quase que uma ação estratégica
para não se tornar excluído. Percebe-se muito este comportamento de “aceitação e não
aceitação” quando um aluno é novato na classe e na escola. O período de transição,
muitas vezes, ditará como será a vida escolar nos próximos meses ou até mesmo anos.
É neste ponto que a ação pedagógica deverá intervir. O profissional de educação
deve estar preparado para estas peculiaridades nas escolas. Segundo Chalita (2008) são
muitas histórias em um mesmo ambiente, muitas gerações, crenças, costumes que se
chocam diante da pressão da escolarização. Apesar de a função escolar estar bem
definida e a convivência permitir um certo distanciamento para essas questões, que ao
olhar adulto não aparentam importância, a pedagogia pressupõe a constante busca do
aperfeiçoamento.
O tradicionalismo didático5, que tanto é questionado hoje, ainda perdura através
dos costumes, da cultura, das distâncias com a geração informatizada, com novos
formatos de comunicação não podem tornar apático às práticas e provisões que poderão
ser tomadas nestes casos.
2 – ALGUMAS ESTRATÉGIAS DA ESCOLA FACE ÀS PRÁTICAS DE
BULLYING
Não há uma postura mais ativa do corpo docente escolar que a prática daquilo
que é compreendido e valorizado nas teorias, isto é, da vivência daquilo que se
5 O tradicionalismo didático ocorre quando “(...) o professor já traz o conteúdo pronto e o aluno se limita
passivamente à escutá-lo. A didática tradicional quase que poderia ser resumida em: “dar a lição” e
“tomar a lição”. (MIZUKAMI, 1986, p. 17-18).
7
(de)mostra pelo discurso. Desta forma, “os profissionais da educação, tomam
consciência dos problemas da violência quando estes já alcançaram altos níveis
incidência e periculosidade.” (FANTE, 2005).
É diante deste contexto, que o papel preventivo da escola como um todo precisa
do conhecimento e conscientização de todos os envolvidos, antes que as práticas do
bullying ocorram e que as ações a serem tomadas não sejam somente repressivas.
É necessário, portanto, tratar tais problemas não apenas como algo que foge às
regras que a escola propõe, mas também como um fenômeno que deve ser proposto
estrategicamente dentro da instituição, de forma preventiva, envolvendo todos os
profissionais da escola. Tais estratégias devem estar diretamente direcionadas para a
postura dos profissionais da educação. A intenção é a prevenção: tratar do problema
antes que ele se estabeleça de modo mais perceptível e nocivo.
Pensando na instituição escolar e observando que todo seu corpo é estruturado
em partes para maior qualidade no ensino ao aluno, é necessário, portanto, compreender
as funções dos setores e seus profissionais para que o bom funcionamento também seja
mais uma estratégia contra o bullying (REICHERT, 2008).
Neste sentido, entendemos que o calendário escolar, que normalmente é
disponibilizado no início das aulas, e surge como uma ferramenta para planejamento do
ano, bem como os jogos escolares que, na maioria das escolas, é o único momento em
que as turmas competem entre si, sob a orientação dos professores e pedagogos, são
ótimas oportunidades para promover a boa convivência, expor as atitudes exemplares,
valorizar os acertos e procurar tratar os problemas.
Agregar no calendário escolar eventos confraternizadores, buscando sempre
motivos para atrair a atenção para o respeito ao outro, também nunca deixará de ser uma
estratégia eficiente. As ressalvas ficam para as repercussões destes eventos em sala de
aula, para que os professores não deixem que sejam discussões esporádicas, mas sim,
sempre relembradas para que não apresentem-se apenas nos calendários escolares, mas
com o tempo, em práticas atitudinais cotidianas.
Para que tais eventos assim possam prosseguir como costume escolar, e de modo
continuo, todos os profissionais da educação precisam compreender sua importância
(MELLO, 2005). Não basta apenas colocar como projeto pedagógico da instituição. É
necessário formação, discussão sobre o assunto nos estudos entre os professores e
pedagogos, nas reuniões ordinárias entre os funcionários da escola. Todos devem estar
8
cientes de suas obrigações na soma de ações contra o bullying e outros tipos de
violência escolar.
Outra estratégia interessante que sugerimos e que pode ser feita para integração
escolar é criar mecanismos de expressão na escola, aproximando a instituição do aluno
para que nenhum destes se sinta inibido no ambiente, podendo expressar de alguma
forma, o que pensa e sente. Quando se dá voz, mesmo que de modo anônimo, a
socialização entre os alunos ajuda a ampliar as possibilidades que estes enxergam do
mundo, da escola e deles mesmos – porém, ressalta-se que tais ações precisam estar
focadas, conscientes de suas intenções.
Uma escola é feita também de comunidade. É extremamente necessário que a
comunidade abrace, sinta-se parte da escola, dos eventos, do cuidado de modo geral,
dos seus alunos. A escola pode e tem ferramentas suficientes para conseguir uma
comunidade atuante e presente. Desta forma, problemas como o bullying fora da escola,
mas que possuem sua origem nela, podem ser estancados com mais eficiência. É preciso
estimular a participação da comunidade e da família na vida escolar dos filhos
(CHALITA, 2008). A percepção de mudança comportamental sempre é nítida e deve
ser acompanhada tanto pela família quanto pela escola.
Estabelecer um vínculo duradouro entre a comunidade e a escola não é simples e
nem tão rápido. O bullying, entretanto, pode ser rápido e extremamente destrutivo. Não
cabe aqui procurar extinguir o problema, embora seja o desejo de todos, mas cabe
ressaltar a continuidade de trabalhos que buscam a prevenção. De modo direto, dito aos
alunos, para tratar o assunto não basta apontar o caminho e esperar o melhor.
Para a sala de aula, as sugestões são simples, mas tão eficiente quanto todas as
outras: filmes, literatura, roda de discussões, trabalhos em grupos, são estratégias que a
pedagogia aplica para a prática da didática (VYGOTYSKY, 1988) e consequentemente
são aberturas que devem ser utilizadas para abordar o assunto.
Para o cyberbullying, chamado assim o bullying praticado nas redes sociais
(TOGNETTA & VINHA, 2008) e que se mostra muitas vezes mais nocivo que o físico
praticado nas escolas, sugerimos a produção de novos estudos, de caráter
interdisciplinar, que procurem respostas que possam ajudar na prevenção. Muitas
pesquisas hoje apontam para as práticas e estudos interdisciplinares como alternativa
eficiente na busca de metodologias eficazes (LÜCK, 1994). As Tecnologias e
Informação e Comunicação, como reflexos dos avanços tecnológicos acabam trazendo
9
novas problemáticas sociais e comportamentais, e que as disciplinas sozinhas, com seus
métodos, não alcançam a eficiência esperada para resolvê-los.
Assim, como sugerido, estudos interdisciplinares e os incentivos de pesquisas
nas universidades, com vistas na continuidade da formação profissional do educador,
podem auxiliá-lo em suas estratégias para casos de bullying escolar.
Ainda em relação ao bullying praticado no contexto escolar, o aumento da
supervisão nos horários de recreação também deve ser incluído nas práticas preventivas
(FANTE, 2005). Uma vez que se assumem os riscos de ocorrerem, com a supervisão em
prontidão, identificar agressores e vítimas ajuda nos processos atitudinais posteriores.
Além disso, contar na escola com um psicólogo (ou visitas de um) ajuda nas orientações
a serem tomadas pelos profissionais da instituição, bem como para as vítimas e
agressores. É deste profissional que deve partir as orientações práticas para os alunos
que ajudam a prevenir tal fenômeno: como a estima sendo trabalhado, a voz ser
utilizada no momento certo, como olhar nos olhos dos outros, aprender a ouvir, se
utilizar de posturas confiantes, não levar dúvidas para casa – tudo isto ajuda na
prevenção do bullying escolar.
Portanto, compreende-se que a escola não é só um lugar de ensino formal, mas
também de partilhas, construção para algo bom, saudável, um lugar de se sentir
abraçado, respeitado, visto, ouvido, compreendido, e com formação de projetos de vida.
Sendo assim, seu foco deve estar diretamente ligado ao bem estar dos alunos, pois
(...) a escola é um lugar que reúne muita gente. Diferentes olhares, gostos,
caprichos, talentos, sentimentos, sonhos, necessidades, histórias de vida,
contextos. E esse lugar tão especial também guarda uma missão igualmente
especial: fazer toda essa gente feliz, com princípios de justiça e eqüidade
social. Essa missão pode parecer óbvia, mas não é nada simples, pois cada
pessoa tem sua maneira peculiar de ser feliz. Todavia, desejam ser felizes,
mas ninguém alcança a felicidade sozinho. (CHALITA, 2008, p. 201).
A convivência com o diferente é boa, é preciso, pois por meio de tantas
diferenças é que se aprende coisas novas, mistura-se sonhos, pensamentos e vivências,
porém, se não for ensinado que tais diferenças são não somente comuns ao cotidiano
mas também necessárias para convivência social desde cedo, dificilmente os
procedimentos atitudinais focados no respeito surtirão efeitos.
3. A GESTÃO ESCOLAR E O PLANEJAMENTO PEDAGÓGICO COMO
POSSIBILIDADE DE PREVENÇÃO AO BULLYING
10
Uma escola que queira combater o fenômeno bullying só terá um bom resultado
se todos os funcionários envolvidos estejam totalmente conscientes de seu significado,
suas causas e como ele é gerado. É aqui que a gestão escolar torna-se responsável por
precaver situações de desconfortos e possíveis práticas deste fenômeno, devendo atuar
de forma contínua com uma organização de um planejamento pedagógico. E para isso, é
preciso ter conhecimento das várias realidades dos alunos inseridos na instituição.
Segundo Lück (2005),
(...) o conceito de gestão está associado à mobilização de talentos e
esforços coletivamente organizados, à ação construtiva conjunta de
seus componentes, pelo trabalho associado, mediante reciprocidade
que cria um “todo” orientado por uma vontade coletiva (p. 17).
Quando se fala em coletividade, pressupõe-se o envolvimento de todos em uma
mesma direção; o que inclui não só os gestores e funcionários de uma escola, mas
também, as famílias dos alunos, a comunidade que permeia a escola. Portanto, a gestão
só torna-se democrática quando todos participam.
É preciso que a gestão caminhe e acompanhe tudo o que se passa por dentro e ao
arredor do ambiente escolar, para melhor se organizarem e ir ao encontro das
atualidades de todos os acontecimentos no cotidiano dos alunos. Sendo assim, por meio
de uma reflexão e pesquisa, é possível fazer um planejamento que não só pensem em
prevenir atitudes relacionadas ao bullying, mas também, garantir que diante de tais
fatos, a escola estará sempre atenta.
Neste sentido, Vasconcellos (2000) afirma que o planejamento não se produz
apenas por meio da reflexão do que deverá ser feito, mas o agir a partir desta reflexão,
gerando uma ação a partir de uma mediação teórica, devendo esta ser de forma
consciente e intencional. Nesta mesma linha de pensamento, Martinez & Oliveira
Lahone (1977) definem planejamento como
(...) um processo de previsão de necessidades e racionalização de emprego
dos meios materiais e dos recursos humanos disponíveis, a fim de alcançar
objetivos concretos, em prazos determinados e em etapas definidas, a partir
do conhecimento e avaliação cientifica da situação original (p. 11)
A partir de tais definições, a gestão e o planejamento escolar passam a ser
compreendido como elementos de suma importância em ambientes escolares. Para que
leve a problematização de temas relacionados ao fenômeno bullying é preciso muito
mais que ter estes aspectos para a sua prevenção, não bastando somente o pensar e o
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agir quando os atos de violência já aconteceram, mas fazer com que as atitudes de uma
prevenção se materializem como uma forma natural de observação continuamente em
torno do cotidiano escolar.
É sempre bom conhecer a realidade de cada aluno, uma vez que as escolas estão
se tornando cada vez mais um lugar de refúgio para muitos, pois a carência e a falta de
apoio familiar e social se faz presente constantemente (FORQUIN,1993). É necessária
uma aproximação que não pode ser de maneira brusca, desconfortável, expondo suas
vidas. Nesse sentido, os professores tendem a ter este papel além do ensino.
A prática da alteridade ajuda nessa proximidade, pois com isso o docente
conseguirá ter uma compreensão melhor das realidades sociais e culturais daquele
aluno; disposição para ouvi-lo e sempre pronto para intervir nos momentos em que há
vestígios de agressões, nunca deixando de lado ao pensar que se trata de uma simples
brincadeira – e isto fará com que o aluno passe a confiar e se sentir seguro. Toda esta
bagagem contribui nos momentos de construção coletiva do planejamento escolar.
Neste sentido, remete-se aos ensinamentos de Freire (1996):
(...) como educador, devo estar constantemente advertido com relação a este
respeito que implica igualmente o que devo ter por mim mesmo. ...o respeito
à autonomia e à dignidade de cada um é um imperativo ético e não um favor
que podemos ou não conceder uns aos outros. (FREIRE,1996, p. 59).
A escola pode criar juntamente com os alunos projetos que envolvam os
professores como, por exemplo, gincanas que tem um professor e um aluno como líder,
na ausência do professor a equipe pode pedir ajuda ao determinado aluno, motivar tanto
alunos quanto professores a correr atrás da mesma causa, a repensarem suas ações no
ambiente escolar otimizando o ensino e aprendizagem dos sujeitos.
Sempre obter um planejamento além do ensino das matérias, sair um pouco do
cotidiano, inserir algo lúdico que traga mais o envolvimento dos alunos entre si, aulas
com mais interações com todos da turma, rodas de conversas, dinâmicas, enfim, algo
que possa fazer com que a afetividade se desenvolva de forma mais eficaz.
É evidente que não só o professor é responsável por precaver as ações contra o
bullying. Como vimos, a gestão é responsável por reunir e ouvir os demais
profissionais, família e comunidade para levantar tais problemas e possíveis soluções na
instituição. Portanto, é necessário reunir e ouvir os pais ou responsáveis sobre como se
desenvolve o relacionamento com seus filhos em casa, demonstrando confiança e
12
satisfação ao ajudar. Tudo isso porque assim como os alunos, alguns pais também
podem se recusar a tratar sobre os problemas familiares.
De forma comparativa, tem-se que muitas empresas de grandes portes usam em
seu campo de trabalho, pesquisas de clima organizacional, em que se identifica o grau
de satisfação e motivação dos indivíduos. O resultado da pesquisa permite a realização
de atividades que agregam no crescimento profissional dos funcionários e institucional.
Observando tal método empresarial, não seria difícil ver como uma gestão escolar
ajudaria no crescimento institucional e auxiliaria em soluções. Como sugestão,
apontamos que cada sala, no meio do ano, deveria fazer uma pesquisa de clima, com
variadas perguntas para atender a satisfação da escola, ate mesmo com espaço para eles
se expressarem no final com uma parte de dar opinião com tudo que eles já vivenciaram
na escola, podendo falar se sofrem bullying, se o professor está atendendo a demanda; o
que o professor poderia fazer para ajudar os alunos.
Espaços assim na escola são construídos para além da gestão, mas fazem partem
dela. É preciso ouvir os lados, dar oportunidade de trazerem ideias vinda dos alunos,
criar um vínculo recíproco de construção de projetos institucionais que serão colocados
em prática.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Podemos concluir que o bullying é um fenômeno corriqueiro no ambiente
escolar, e que é possível preveni-lo por meio de discussões sobre mudanças de
comportamentos, a partir de planejamento que envolvam todo o corpo escolar, família e
comunidade, para que juntos construam vínculos que solucionem os problemas
rotineiros.
Ao aprofundarmos no assunto, compreendemos que o conceito de bullying
possui algumas características específicas, tais como: o fato de sê-lo considerado
somente quando há intencionalidade nas agressões feitas e repetidas diversas vezes,
podendo ser concretizado de diferentes formas (físicas, verbais ou pelas redes sociais);
os envolvidos, tanto as vítimas quanto os agressores, sofrem de algum modo, pois se de
um lado a vítima passa por constrangimentos, por outro, os agressores trazem consigo
marcas, e as reproduzem nas relações dentro da escola.
13
Portanto, nas análises de casos, o olhar ambivalente é extremamente necessário.
Tais posturas diante deste fenômeno social ajuda a repensar a organização do espaço
escolar para que pedagogicamente, possa atingir todos os discentes.
Percebemos também que o professor, apesar de estar na linha de frente e
geralmente ser o primeiro a ter contato com tais atos, não possui o papel exclusivo de
intervenção e/ou de pensar práticas pedagógicas e metodológicas para evitar o bullying,
mas o todo corpo escolar tem que se responsabilizar e agir em prol desta prevenção,
buscando soluções e respeitando as opiniões, de funcionários e comunidade dentro e
fora do ambiente escolar. Criar espaços para dar voz ao corpo discente é essencial para
um começo de projetos com finalidades preventivas, levantando questionamentos e
mostrando determinação e preocupação com o tema.
A escola não é limitada em seus muros; se estende, ganha e dá características, se
comunica, participa, se torna referência das comunidades em que estão inseridas. Sendo
assim, a mesma comunidade que utiliza redes sociais para se comunicar e interagir,
também conecta a escola nestes espaços virtuais.
Assim, cabe mais uma vez, a intervenção escolar, com base comunitária e tendo
como foco uma prevenção planejada, não somente em seu caráter de conscientização ou
de tratamento das consequências das práticas ocorridas de bullying.
REFERÊNCIAS
AZEVEDO, Maria Amélia; GERRA, Viviane Nogueira de Azevedo. Mania de bater: a
punição corporal doméstica de crianças e adolescentes no Brasil. São Paulo: Editora iglu,
2001. BZUNECK, José Aloyseo. As crenças de auto-eficácia e o seu papel na motivação do aluno.
In: BORUCHOVITCH, Evely; BZUNECK, José Aloyseo. A motivação do aluno: contribuições
da psicologia contemporânea. Petrópolis: Vozes, 2001.
CHALITA, Gabriel. Pedagogia da amizade: o sofrimento das vitimas e dos agressores. São
Paulo: Gente, 2008.
ELKIND, D. Crianças e adolescentes. Ensaios interpretativos sobre Jean Piaget. Rio de
Janeiro, 1972.
FANTE, Cleo. O fenômeno bullying: como prevenir nas escolas e educar para a paz. 2. ed.
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