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12/04/15 12:27 O cavalo que defecava dinheiro - Wikisource Página 1 de 12 http://pt.wikisource.org/wiki/O_cavalo_que_defecava_dinheiro O cavalo que defecava dinheiro Wikisource, a biblioteca livre O cavalo que defecava dinheiro por Leandro Gomes de Barros Na cidade de Macaé Antigamente existia Um duque velho invejoso Que nada o satisfazia Desejava possuir Todo objeto que via Esse duque era compadre De um pobre muito atrasado Que morava em sua terra Num rancho todo estragado Sustentava seus filhinhos Na vida de alugado. Se vendo o compadre pobre Naquela vida privada Foi trabalhar nos engenhos Longe da sua morada Na volta trouxe um cavalo Que não servia pra nada Disse o pobre à mulher: — Como havemos de passar? O cavalo é magro e velho Não pode mais trabalhar Vamos inventar um "quengo" Pra ver se o querem comprar. Foi na venda e de lá trouxe Três moedas de cruzado Sem dizer nada a ninguém Para não ser censurado No fiofó do cavalo Foi o dinheiro guardado Do fiofó do cavalo Ele fez um mealheiro Saiu dizendo: — Sou rico! Inda mais que um fazendeiro, Porque possuo o cavalo

O Cavalo Que Defecava Dinheiro-Literatura de Cordel

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Livreto de Cordel - O Cavalo que Defecava Dinheiro.

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O cavalo que defecava dinheiro

Wikisource, a biblioteca livreO cavalo que defecava dinheiro

por Leandro Gomes de Barros

Na cidade de MacaéAntigamente existiaUm duque velho invejosoQue nada o satisfaziaDesejava possuirTodo objeto que via

Esse duque era compadreDe um pobre muito atrasadoQue morava em sua terraNum rancho todo estragadoSustentava seus filhinhosNa vida de alugado.

Se vendo o compadre pobreNaquela vida privadaFoi trabalhar nos engenhosLonge da sua moradaNa volta trouxe um cavaloQue não servia pra nada

Disse o pobre à mulher:— Como havemos de passar?O cavalo é magro e velhoNão pode mais trabalharVamos inventar um "quengo"Pra ver se o querem comprar.

Foi na venda e de lá trouxeTrês moedas de cruzadoSem dizer nada a ninguémPara não ser censuradoNo fiofó do cavaloFoi o dinheiro guardado

Do fiofó do cavaloEle fez um mealheiroSaiu dizendo: — Sou rico!Inda mais que um fazendeiro,Porque possuo o cavalo

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Que só defeca dinheiro.

Quando o duque velho soubeQue ele tinha esse cavaloDisse pra velha duquesa:—Amanhã vou visitá-loSe o animal for assimFaço o jeito de comprá-lo!

Saiu o duque vexadoFazendo que não sabia,Saiu percorrendo as terrasComo quem não conheciaFoi visitar a choupana,Onde o pobre residia.

Chegou salvando o compadreMuito desinteressado:— Compadre, Como lhe vai?Onde tanto tem andado?Há dias que lhe vejoParece está melhorado...

—É muito certo compadreAinda não melhoreiPorque andava por foraFaz três dias que chegueiMas breve farei fortunaCom um cavalo que comprei.

—Se for assim, meu compadreVocê está muito bem!É bom guardar o segredo,Não conte nada a ninguém.Me conte qual a vantagemQue este seu cavalo tem?

Disse o pobre: —Ele está magroSó o osso e o couro,Porém tratando-se deleMeu cavalo é um tesouroBasta dizer que defecaNíquel, prata, cobre e ouro!

Aí chamou o compadreE saiu muito vexado,Para o lugar onde tinhaO cavalo defecado

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O duque ainda encontrouTrês moedas de cruzado.

Então exclamou o velho:— Só pude achar essas três!Disse o pobre: — Ontem à tardeEle botou dezesseis!Ele já tem defecado,Dez mil réis mais de uma vez.

—Enquanto ele está magroMe serve de mealheiro.Eu tenho tratado deleCom bagaço do terreiro,Porém depois dele gordoNão quem vença o dinheiro...

Disse o velho: — meu compadreVocê não pode tratá-lo,Se for trabalhar com eleÉ com certeza matá-loO melhor que você fazÉ vender-me este cavalo!

— Meu compadre, este cavaloEu posso negociar,Só se for por uma somaQue dê para eu passarCom toda minha família,E não precise trabalhar.

O velho disse ao compadre:— Assim não é que se fazNossa amizade é antigaDesde os tempo de seus paisDou-lhe seis contos de réisAcha pouco, inda quer mais?

— Compadre, o cavalo é seu!Eu nada mais lhe direi,Ele, por este dinheiroQue agora me sujeiteiPara mim não foi vendido,Faça de conta que te dei!

O velho pela ambiçãoQue era descomunal,Deu-lhe seis contos de réis

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Todo em moeda legalDepois pegou no cabrestoE foi puxando o animal.

Quando ele chegou em casaFoi gritando no terreiro:— Eu sou o homem mais ricoQue habita o mundo inteiro!Porque possuo um cavaloQue só defeca dinheiro!

Pegou o dito cavaloBotou na estrebaria,Milho, farelo e alfaceEra o que ele comiaO velho duque ia lá,Dez, doze vezes por dia...

Aí o velho zangou-seComeçou loga a falar:—Como é que meu compadreSe atreve a me enganar?Eu quero ver amanhãO que ele vai me contar.

Porém o compadre pobre,(Bicho do quengo lixado)Fez depressa outro planoInda mais bem arranjadoEsperando o velho duqueQuando viesse zangado...

O pobre foi na farmáciaComprou uma borrachinhaDepois mandou encher elaCom sangue de uma galinhaE sempre olhando a estradaPré ver se o velho vinha.

Disse o pobre à mulher:— Faça o trabalho direitoPegue esta borrachinhaAmarre em cima do peitoPara o velho não saber,Como o trabalho foi feito!

Quando o velho aparecerNa volta daquela estrada,

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Você começa a falarEu grito: —Oh mulher danada!Quando ele estiver bem perto,Eu lhe dou uma facada.

Porém eu dou-lhe a facadaEm cima da borrachinhaE você fica lavadaCom o sangue da galinhaEu grito: —Arre danada!Nunca mais comes farinha!

Quando ele ver você mortaParte para me prender,Então eu digo para ele:—Eu dou jeito ela viver,O remédio tenho aqui,Faço para o senhor ver!

—Eu vou buscar a rabecaComeço logo a tocarVocê então se remaxaComo quem vai melhorarCom pouco diz: —Estou boaJá posso me levantar.

Quando findou-se a conversaNa mesma ocasiãoO velho ia chegandoAí travou-se a questãoO pobre passou-lhe a faca,Botou a mulher no chão.

O velho gritou a eleQuando viu a mulher morta:Esteja preso, bandido!E tomou conta da portaDisse o pobre: —Vou curá-la!Pra que o senhor se importa?

—O senhor é um bandidoInfame de cara duraTodo mundo apreciavaEsta infeliz criaturaDepois dela assassinada,O senhor diz que tem cura?

Compadre, não admito

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O senhor dizer mais nada,Não é crime se matarSendo a mulher malcriadaE mesmo com dez minutos,Eu dou a mulher curada!

Correu foi ver a rabecaComeçou logo a tocarDe repente o velho viuA mulher se endireitarE depois disse: —Estou boa,Já posso me levantar...

O velho ficou suspensoDe ver a mulher curada,Porém como estava vendoEla muito ensanguentadaCorreu ela, mas não viu,Nem o sinal da facada.

O pobre entusiasmadoDisse-lhe: —Já conheceuQuando esta rabeca estavaNa mão de quem me vendeu,Tinha feito muitas curasDe gente que já morreu!

No lugar onde eu estiverNão deixo ninguém morrer,Como eu adquiri elaMuita gente quer saberMas ela me está tão caraQue não me convém dizer.

O velho que tinha vindoSomente propor questão,Por que o cavalo velhoNunca botou um tostãoQuando viu a tal rabecaQuase morre de ambição.

—Compadre, você desculpeDe eu ter tratado assimPorque agora estou certoEu mesmo fui o ruimPorém a sua rabecaSó serve bem para mim.

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—Mas como eu sou um homemDe muito grande poderO senhor é um homem pobreNinguém quer o conhecerPerca o amor da rabeca...Responda se quer vender?

—Porque a minha mulherTambém é muito estouvadaSe eu comprar esta rabecaDela não suporto nadaSe quiser teimar comigo,Eu dou-lhe uma facada.

—Ela se vê quase mortaJá conhece o castigo,Mas eu com esta rabecaSalvo ela do perigoEla daí por diante,Não quer mais teimar comigo!

Disse-lhe o compadre pobre:—O senhor faz muito bem,Quer me comprar a rabecaNão venderei a ninguémCusta seis contos de réis,Por menos nem um vintém.

O velho muito contenteTornou então repetir:—A rabeca já é minhaEu preciso a possuirEla para mim foi dada,Você não soube pedir.

Pagou a rabeca e disse:—Vou já mostrar a mulher!A velha zangou-se e disse:—Vá mostrar a quem quiser!Eu não quero ser culpadaDo prejuízo que houver.

—O senhor é mesmo um velhoAvarento e interesseiro,Que já fez do seu cavaloQue defecava dinheiro?—Meu velho, dê-se a respeito,Não seja tão embusteiro.

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O velho que confiavaNa rabeca que comprouDisse a ela: —Cale a boca!O mundo agora virouDou-lhe quatro punhaladas,Já você sabe quem sou.

Ele findou as palavrasA velha ficou teimando,Disse ele: —Velha dos diabosVocê ainda está falando?Deu-lhe quatro punhaladasEla caiu arquejando...

O velho muito ligeiroFoi buscar a rabequinha,Ele tocava e dizia:—Acorde, minha velhinha!Porém a pobre da velha,Nunca mais comeu farinha.

O duque estava pensandoQue sua mulher tornavaEla acabou de morrerPorém ele duvidavaDepois então conheceuQue a rabeca não prestava.

Quando ele ficou certoQue a velha tinha morridoBoto os joelhos no chãoE deu tão grande gemidoQue o povo daquela casaFicou todo comovido.

Ele dizia chorando:—Esse crime hei de vingá-loSeis contos desta rabecaCom outros seis do cavaloEu lá não mando ninguém,Porque pretendo matá-lo.

Mandou chamar dois capangas:—Me façam um surrão bem feitoFaçam isto com cuidadoQuero ele um pouco estreitoCom uma argola bem forte,

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Pra levar este sujeito!

Quando acabar de fazerMande este bandido entrar,Para dentro do surrãoE acabem de costurarO levem para o rochedo,Para sacudi-lo no mar.

Os homens eram dispostosFindaram no mesmo dia,O pobre entrou no surrãoPois era o jeito que haviaBotaram o surrão nas costasE saíram numa folia.

Adiante disse um capanga:—Está muito alto o rojão,Eu estou muito cansado,Botemos isto no chão!Vamos tomar uma pinga,Deixe ficar o surrão.

&mdashEstá muito bem, companheiroVamos tomar a bicada!(Assim falou o capangaDizendo pro camarada)Seguiram ambos pra vendaFicando além da estrada...

Quando os capangas seguiramEle cá ficou dizendo:—Não caso porque não quero,Me acho aqui padecendo...A moça é milionáriaO resto eu bem compreendo!

Foi passando um boiadeiroQuando ele dizia assim,O boiadeiro pediu-lhe:—Arranje isto pra mimNão importa que a moçaSeja boa ou ruim!

O boiadeiro lhe disse:—Eu dou-lhe de mão beijada,Todos os meus possuídosVão aqui nessa boiada...

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Fica o senhor como dono,Pode seguir a jornada!

Ele condenado à morteNão fez questão, aceitou,Descoseu o tal surrãoO boiadeiro entrouO pobre morto de medoNum minuto costurou.

O pobre quando se viuLivre daquela enrascada,Montou-se num bom cavaloE tomou conta da boiada,Saiu por ali dizendo:—A mim não falta mais nada.

Os capangas nada viramPorque fizeram ligeiro,Pegaram o dito surrãoCom o pobre do boiadeiroVoaram de serra abaixoNão ficou um osso inteiro.

Fazia dois ou três mesesQue o pobre negociavaA boiada que lhe deramCada vez mais aumentavaFoi ele um dia passar,Onde o compadre morava...

Quando o compadre viu eleDe susto empalideceu;—Compadre, por onde andavaQue agora me apareceu?!Segundo o que me parece,Está mais rico do que eu...

—Aqueles seus dois capangasVoaram-me num lugarEu caí de serra abaixoAté na beira do marAí vi tanto dinheiro,Quanto pudesse apanhar!..

—Quando me faltar dinheiroEu prontamente vou ver.O que eu trouxe não é pouco,

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Vai dando pra eu viverJunto com a minha família,Passar bem até morrer.

—Compadre, a sua riquezaDiga que fui eu quem dei!Pra você recompensar-meTudo quanto lhe arranjei,É preciso que me boteNo lugar que lhe botei!..

Disse-lhe o pobre: —Pois não,Estou pronto pra lhe mostrar!Eu junto com os capangasNós mesmo vamos levarE o surrão de serra abaixoSou eu quem quero empurrar!..

O velho no mesmo diaMandou fazer um surrão.Depressa meteu-se nele,Cego pela ambiçãoE disse: —Compadre eu estouÀ tua disposição.

O pobre foi procurarDois cabras de confiançaSe fingindo satisfeitoFazendo a coisa bem mansaSó assim ele podia,Tomar a sua vingança.

Saíram com este velhoNa carreira, sem pararSubiram de serra acimaAté o último lugarDaí voaram o surrãoDeixaram o velho embolar...

O velho ia pensandoDe encontrar muito dinheiro,Porém secedeu com eleDo jeito do boiadeiro,Que quando chegou embaixoNão tinha um só osso inteiro.

Este livrinho nos mostraQue a ambição nada convém

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Todo homem ambiciosoNunca pode viver bem,Arriscando o que possuiEm cima do que já tem.

Cada um faça por si,Eu também farei por mim!É este um dos motivosQue o mundo está ruim,Porque estamos cercadosDos homens que pensam assim.

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