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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANÁ UNIOESTE CENTRO DE EDUCAÇÃO, COMUNICAÇÃO E ARTES/CECA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO NÍVEL DE MESTRADO/PPGE ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: SOCIEDADE, ESTADO E EDUCAÇÃO O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO PROFESSOR DE ARTE: CONTRIBUIÇÕES DA PSICOLOGIA HISTÓRICO-CULTURAL SANDRA MACANHÃO BIAVATTI CASCAVEL - PR 2021

O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

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Page 1: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANÁ – UNIOESTE CENTRO DE EDUCAÇÃO, COMUNICAÇÃO E ARTES/CECA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

NÍVEL DE MESTRADO/PPGE

ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: SOCIEDADE, ESTADO E EDUCAÇÃO

O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO PROFESSOR DE ARTE: CONTRIBUIÇÕES DA PSICOLOGIA HISTÓRICO-CULTURAL

SANDRA MACANHÃO BIAVATTI

CASCAVEL - PR 2021

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANÁ – UNIOESTE CENTRO DE EDUCAÇÃO, COMUNICAÇÃO E ARTES/CECA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

NÍVEL DE MESTRADO/PPGE

ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: SOCIEDADE, ESTADO E EDUCAÇÃO

O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO PROFESSOR DE ARTE: CONTRIBUIÇÕES DA PSICOLOGIA HISTÓRICO-CULTURAL

SANDRA MACANHÃO BIAVATTI

CASCAVEL - PR 2021

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANÁ – UNIOESTE CENTRO DE EDUCAÇÃO, COMUNICAÇÃO E ARTES/CECA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

NÍVEL DE MESTRADO/PPGE

ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: SOCIEDADE, ESTADO E EDUCAÇÃO

O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO PROFESSOR DE ARTE: CONTRIBUIÇÕES DA PSICOLOGIA HISTÓRICO-CULTURAL

SANDRA MACANHÃO BIAVATTI

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação – PPGE, como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Educação. Área de concentração: Sociedade, Estado e Educação. Linha de pesquisa: Formação de Professores e Processos de Ensino e de Aprendizagem. Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE.

Orientadora: Profa. Dra. Maria Lidia Sica Szymanski

CASCAVEL - PR 2021

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Ficha de identificação da obra elaborada através do Formulário de Geração

automática do Sistema de Bibliotecas da Unioeste.

Bd

BIAVATTI, SANDRA MACANHÃO

O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO

PROFESSOR DE ARTE: CONTRIBUIÇÕES DA PSICOLOGIA HISTÓRICO-

CULTURAL / SANDRA MACANHÃO BIAVATTI; orientadora MARIA LIDIA

SICA SZYMANSKI. –

Cascavel, 2021.

156 p.

Dissertação (Mestrado Acadêmico Campus de Cascavel)

Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Centro de Educação, Programa de Pós-Graduação em Educação, 2021.

1. . I. SZYMANSKI, MARIA LIDIA SICA, orient.

II. Título.

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SANDRA MACANHÃO BIAVATTI

O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO DOCENTE DE

ARTE: contribuições da psicologia histórico-cultural

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação

em cumprimento parcial aos requisitos para obtenção do título de Mestra em

Educação, área de concentração Sociedade, Estado e Educação, linha de pesquisa

Formação de professores e processos de ensino e de aprendizagem,

APROVADO(A) pela seguinte banca examinadora:

Orientador(a) - Maria Lidia Sica

Szymanski

Universidade Estadual do Oeste do Paraná - Campus de Cascavel

(UNIOESTE)

Jane Peruzo Iacono

Universidade Estadual do Oeste do Paraná - Campus de Cascavel

(UNIOESTE)

Armando Marino Filho

Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS)

Cascavel, 29 de junho de 2021

Page 6: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

Dedico esse trabalho primeiramente a Deus e em seguida às pessoas mais importantes da minha vida: Às minhas filhas, Adrieli e Isabelli pelo amor, carinho e incentivo aos estudos. Ao meu esposo e companheiro pela compreensão e apoio nas minhas decisões e pela paciência no decorrer de todo o processo de estudos.

Page 7: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

AGRADECIMENTOS

À Profa. Dra. Maria Lidia Sica Syzmanski pela orientação tão especial,

dedicada, atenciosa, exigente, perfeccionista, humana e paciência durante todo o

processo da realização desta pesquisa.

A todos(as) os(as) professores(as) que fizeram parte da minha trajetória

acadêmica e aos professores do Programa de Pós-Graduação da UNIOESTE.

À Profa. Dra. Jane Peruzo Iacono (UNIOESTE) pela participação tão importante

na banca de qualificação.

Ao Professor Dr. Armando Marino Filho (UFMS) pela participação tão

importante na banca de qualificação.

A todas as pessoas do Núcleo Regional de Ensino de Cascavel e aos

professores que participaram da pesquisa de campo.

A minha família, em especial meu esposo Marcos e minhas filhas, Adrieli e

Isabelli que sempre incentivaram, apoiaram e entenderam as minhas constantes

ausências durante todo o processo de estudos.

A todas as pessoas que se fizeram presentes em minha vida durante todo o

processo de estudo.

A todos, a minha eterna gratidão!

Page 8: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

“As pessoas sem imaginação estão sempre querendo que a arte sirva para alguma coisa. Servir. Prestar [...] Dar lucro. Não enxergam que a arte [...] é a única chance que o homem tem de vivenciar a experiência de um mundo da liberdade, além da necessidade.”

Paulo Leminski

Page 9: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

BIAVATTI, Sandra Macanhão. O desenvolvimento do psiquismo na perspectiva do professor de arte: contribuições da Psicologia Histórico-Cultural. 2021. 156 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação. Área de concentração: Sociedade, Estado e Educação, Linha de Pesquisa: Formação de Professores e Processos de Ensino e de Aprendizagem. Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE, Cascavel, 2021.

RESUMO A presente pesquisa apoia-se na perspectiva da Psicologia Histórico-Cultural, por ser a que melhor explica o desenvolvimento psíquico e o papel da escola nesse processo. Objetivou investigar qual a compreensão dos professores de Arte da rede estadual de Cascavel (PR) acerca dos conceitos de desenvolvimento do psiquismo e sua relação com as funções psicológicas superiores, além de refletir sobre quais as consequências dessa concepção na práxis pedagógica. Com esse propósito, desenvolveu-se uma pesquisa de campo com 15 professores que correspondem a 44% dos professores efetivos da disciplina de Arte que atuam nas escolas estaduais no município pesquisado. Os dados foram coletados em 2019, por meio de um questionário aplicado coletivamente, com preenchimento por escrito, individualizado e presencial. Apenas 6% dos professores verbalizaram um conceito de desenvolvimento psíquico coerente com o proposto pela Psicologia Histórico-Cultural; 47% trouxeram algum elemento fragmentado referente a esse conceito e 47% dos professores não souberam ou apresentaram apenas fragmentos de ideias alheias ao conceito, ou seja, cerca de metade dos professores de Arte o desconheciam totalmente. Quanto ao conceito de funções psicológicas superiores, 73% dos professores pesquisados o desconheciam, 20% apresentaram algum elemento fragmentado desse conceito, e 6% o expressaram. A reflexão sobre o resultado da pesquisa revela, portanto, a ausência de discussões coletivas sobre esses conceitos no espaço escolar. Se a palavra não circula, não impacta os seres humanos, não é por eles apropriada e não se formam conceitos. Para que esses conceitos fossem apropriados seria necessário que circulassem nas discussões coletivas, possibilitando a objetivação de reflexões sobre o processo pedagógico, com base nas contribuições da Psicologia Histórico-Cultural. Buscou-se, ainda, verificar quais as consequências para o processo pedagógico da não apropriação dos conceitos constatada, investigando sobre o material utilizado pelos docentes para o preparo das aulas, suas ações pedagógicas, bem como seus limites e desafios. Notou-se que falta intencionalidade no processo pedagógico, no sentido de promover a humanização dos sentidos e a sensibilidade estética. A não consciência sobre o papel docente nesse processo, a dissociação entre a teoria e a prática, contribuem para a indisciplina, o desinteresse e a falta de concentração por parte dos alunos. Verificaram-se condições inadequadas relacionadas à competência do Estado, como falta de materiais e recursos tecnológicos, bem como de espaços físicos adequados às aulas de Arte. Observaram-se dificuldades pedagógicas devido ao fato de a disciplina exigir um professor que domine as quatro linguagens artísticas: Artes Visuais, Teatro, Música e Dança, enquanto a formação inicial aborda uma única delas. Ainda, há necessidade de que o Estado promova formações continuadas, por meio de cursos e se organizem grupos de estudo na escola, voltados ao desenvolvimento do pensamento teórico, considerando a Atividade de Estudo como importante alternativa de ensino na disciplina de Arte, de forma a suprir essa carência e promover a reflexão sobre o trabalho docente, tomando por base, os fundamentos teórico-práticos da Psicologia

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Histórico-Cultural. Dessa maneira, o professor poderá planejar e implementar tarefas efetivando uma aprendizagem significativa pela mediação dos conteúdos de forma organizada, a fim de consciência do aluno ao observar uma obra de arte, desenvolvendo sua criatividade, entendendo o significado histórico e a importância de compreender e representar a realidade por meio das linguagens artísticas de maneira a promover o desenvolvimento do psiquismo, por meio do ensino. Conclui-se entendendo que o trabalho pedagógico na escola deve ir além dos conceitos cotidianos, possibilitando aos alunos apropriarem-se dos conceitos científicos e, nesse processo, desenvolverem suas funções psicológicas superiores, entre as quais a imaginação criadora e o pensamento teórico e estético-artístico, de forma a que se instrumentalizem para uma leitura e consequente ação transformadora da realidade. Porém, questiona-se como o professor que não teve e não tem essa formação, poderá desempenhar o papel de agente mediador no desenvolvimento da personalidade de seus alunos que a apropriação do pensamento teórico exige. Constata-se que o problema não é individual, trata-se de um problema social, que exige do Estado cumprir seu papel de oportunizar condições para o desenvolvimento genérico humano, no qual a arte promova a transformação cultural e criativa no professor, no aluno, enfim no homem genérico, no sentido da humanização. Portanto, na direção oposta à barbárie desumanizadora que se instala a passos largos, na qual o homem é apenas um recurso para o capital. PALAVRAS-CHAVE: Desenvolvimento do Psiquismo; Psicologia Histórico-Cultural; Funções Psicológicas Superiores; Arte; Processo de Ensino e Aprendizagem.

Page 11: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

BIAVATTI, Sandra Macanhão. Development of the psychism from the perspective of the Arts teacher: contributions from the Cultural-historical Psychology. 2021. 156 p. Master Thesis (Master’s Degree in Education) – Post-Graduation in Education Program. Area of concentration: Society, State and Education. Line of research: Teacher’s formation and Teaching-learning processes. Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE, Cascavel, 2021.

ABSTRACT This research is based on the perspective of the Cultural-historical Psychology, for being the one which best explains the psychic development and the role of the school in this process. The aim was to investigate what the comprehension of the Arts teachers is, concerning the concepts of the development of the psychism and its relation with the superior psychological functions, besides reflecting upon the consequences of such conception in the pedagogical praxis. With this goal, a field research was developed involving 15 Arts teacher from state public schools in the city of Cascavel, state of Paraná, who correspond to 44% of the permanent Arts teachers who act in the researched city. Data were collected in 2019 through a handwritten-filled form, individualized and handed in person. Only 6% of the teachers verbalized a concept of psychic development coherent to what is proposed by the Cultural-historical Psychology; 47% brought some fragmented elements referring to this concept and 47% of the teachers did not know or presented only fragments of ideas far off the concept; that means, about half of the Arts teachers were totally unaware of it. Regarding the concept of superior psychological functions, 73% of the researched teachers did not know about it, 20% showed some fragmented elements of this concept and 6% expressed it accurately. The reflection upon the results of the research reveals, thus, the absence of collective discussions about these concepts in the school environment. If the word is not spread out, it does not impact human being, it is not appropriated by them and does not form concepts. For these concepts to be appropriated, it would be necessary to discuss them collectively, making the objectification of reflections on the Cultural-historical Psychology possible, based on the contributions of the Cultural-historical Psychology. This research also sought to verify which the consequences for the pedagogical process are, concerning the observed lack of appropriation of the concepts, investigating the material used by the teachers for the preparation of their classes, their pedagogical actions, as well as their limitations and challenges. It was observed an absence of intention in the pedagogical process in the sense of promoting the humanization of the senses and the aesthetic sensibility. The lack of consciousness about the role of the teacher in this process plus the dissociation between theory and practice contribute to the indiscipline, disinterest and absent-mindedness on the student’s side. Inadequate conditions were verified regarding competence of the State, such as lack of materials and technological resources, as well as physical spaces proper to the Arts classes. Pedagogical difficulties were observed due to the fact that the subject demands a teacher who masters the four artistic languages: Visual Arts, Theater, Music and Dance, whilst the initial formation approaches only one of these. Moreover, there is a clear need for the State to promote continuous training through courses or study groups in the school, focused on the development of the theoretical thinking, considering the Study Activity as an important alternative for teaching Arts, as a way of overcoming this need and promoting the reflection upon the teaching work, using the theoretical-practical fundament of the Cultural-historical Psychology as basis. This way, the teacher will be

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able to plan and implement tasks, carrying out a significant learning through the intercession of the contents in an organized way, aiming to provide students consciousness when observing a piece of art, develop their creativity, making sense of the historical meaning and the importance of understanding and representing reality through artistic languages, promoting development of the psychism through learning. As a conclusion, it is possible to understand that the pedagogical work in school must go beyond the everyday concepts, enabling students to appropriate scientific concepts and, in this process, develop their superior psychological functions, among which the creative imagination, the theoretical and aesthetic-artistic thinking, in a way that makes it possible for them to instrumentalize themselves for some reading and consequent action to transform reality. However, it is arguable how the teachers who did not have such formation will be able to play the role of mediator in the development of their students’ personality as demanded by the appropriation of the theoretical thinking. It is observed that the issue is not individual, but a social problem, which demands the State to carry out conditions for the human generic development, in which the Arts promote the cultural and creative transformation in the teachers and students in the sense of the humanization. Therefore, in the opposite direction of the dehumanizing barbarism that rapidly takes over, where the man is just a resource for the capital. KEYWORDS: Development of the psychism; Cultural-historical Psychology; Superior Psychological Functions; Arts; Teaching Learning Process.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

QPM Quadro Próprio do Magistério

PSS Professor Substituto Temporário

EJA Educação de Jovens e Adultos

SEMED Secretaria Municipal de Educação

CENSE Centro de Socioeducação

PTD Plano de Trabalho Docente

PPP Projeto Político Pedagógico

PPC Proposta Pedagógica Curricular

DCE Diretriz Curricular Estadual

BNCC Base Nacional Curricular Comum Curricular

QPM Quadro Próprio do Magistério

PSS Professor Substituto Temporário

EJA Educação de Jovens e Adultos

SEMED Secretaria Municipal de Educação

ZDP Zona de Desenvolvimento Próximo

ZDI Zona de Desenvolvimento Iminente

ZDR Zona de Desenvolvimento Real

RCP Referencial Curricular do Paraná

CREP Currículo da Rede Estadual do Paraná

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1: Comparação entre os conhecimentos empírico e teórico ...................... 83

Quadro 2: Análise do conceito de desenvolvimento do psiquismo apresentado pelos

professores de Arte da rede estadual de Cascavel ............................. 107

Quadro 3: Análise do conceito de funções psicológicas superiores apresentado pelos

professores de Arte da rede estadual de Cascavel ............................. 111

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Estrutura dinâmica da atividade humana ............................................... 81

Figura 2: Formação dos professores de Arte da rede estadual de Cascavel ...... 100

Figura 3: Tempo de serviço dos professores de Arte da rede estadual de

Cascavel..................................................................................................10

1

Figura 4: Carga horária de trabalho semanal dos professores de Arte da rede

estadual de Cascavel .......................................................................... 102

Figura 5: Elementos do Conceito de Desenvolvimento do Psiquismo apresentado

pelos professores Arte da rede estadual de Cascavel ......................... 103

Figura 6: Análise do nível de generalização correspondente ao conceito de

Desenvolvimento do Psiquismo, apresentado pelos professores de Arte

da rede estadual de Cascavel ............................................................. 108

Figura 7: Elementos do Conceito de funções psicológicas superiores apresentado

pelos professores Arte da rede estadual de Cascavel ......................... 109

Figura 8: Análise do nível de generalização correspondente ao conceito de Funções

Psicológicas Superiores apresentado pelos professores de Arte da rede

estadual de Cascavel .......................................................................... 113

Figura 9: Fontes utilizadas pelos professores Arte da rede estadual de Cascavel

para o preparo das aulas.......................................................................114

Figura 10: Ações pedagógicas desenvolvidas pelos professores Arte da rede

estadual de Cascavel .......................................................................... 116

Figura 11: Limites e Desafios apresentados pelos professores no Trabalho

Pedagógico ......................................................................................... 120

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 18

1 DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DA TEORIA

HISTÓRICO-CULTURAL .................................................................................. 28

1.1 PRINCÍPIOS DA TEORIA HISTÓRICO-CULTURAL ......................................... 28

1.2 O DESENVOLVIMENTO DAS FUNÇÕES PSICOLÓGICAS SUPERIORES:

SENSAÇÃO, PERCEPÇÃO, ATENÇÃO E MEMÓRIA ...................................... 36

2 A FORMAÇÃO DO CONCEITO E O PROCESSO CRIATIVO .......................... 43

2.1 LINGUAGEM: PALAVRA, SIGNIFICADO E SENTIDO, GENERALIZAÇÃO E

FORMAÇÃO CONCEITUAL .............................................................................. 43

2.2 O PROCESSO CRIATIVO ................................................................................. 57

3 ARTE E DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO .............................................. 63

4 CONTRIBUIÇÕES DO ENSINO DA ARTE NO CONTEXTO ESCOLAR .......... 79

4.1 CONSIDERAÇÕES SOBRE A EDUCAÇÃO DESENVOLVIMENTAL À LUZ DA

TEORIA HISTÓRICO CULTURAL ..................................................................... 80

4.2 RELAÇÃO ENTRE AS FUNÇÕES PSICOLÓGICAS SUPERIORES E A ZONA

DE DESENVOLVIMENTO IMINENTE ............................................................... 84

4.3 O ENSINO DA ARTE E AS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS NO CONTEXTO

ESCOLAR ......................................................................................................... 92

5 O CONTEXTO DA PESQUISA .......................................................................... 97

5.1 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS .......................................................... 98

5.2 CARACTERÍSTICAS DOS PROFESSORES DE ARTE DO NÚCLEO DE

CASCAVEL ..................................................................................................... 100

6 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS ..................................... 103

6.1 CONCEPÇÃO DOS PROFESSORES DE ARTE ACERCA DO

DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO .......................................................... 103

6.2 CONCEPÇÃO DE FUNÇÕES PSICOLÓGICAS SUPERIORES POR PARTE

DOS PROFESSORES DE ARTE .................................................................... 109

Page 17: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

6.3 ANÁLISE DE ELEMENTOS DO PROCESSO PEDAGÓGICO ........................ 114

CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 128

REFERÊNCIAS ..................................................................................................... 136

APÊNDICE 1 - Questionário com as respostas dos Professores .................... 143

APÊNDICE 2 - Questionário para coleta de dados ............................................ 147

APÊNDICE 3 - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido – TCLE

Professor(a) ................................................................................. 148

APÊNDICE 4 - Termo de Compromisso para uso de dados em arquivo ......... 149

APÊNDICE 5 - Termo de ciência do responsável pelo campo de estudo ........ 150

ANEXO 1 - Comprovante de envio do projeto ................................................... 151

ANEXO 2 - Parecer Consubstanciado do CEP ................................................... 152

ANEXO 3 - Folha de rosto para pesquisa envolvendo seres humanos ........... 154

ANEXO 4 - Declaração da Unioeste .................................................................... 155

ANEXO 5 - Declaração do NRE ........................................................................... 156

Page 18: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

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INTRODUÇÃO

Esta pesquisa integra-se à linha de pesquisa Formação de Professores e

Processos de Ensino e Aprendizagem do Programa de Pós-Graduação em Educação,

Nível de Mestrado, da Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Unioeste, Campus

de Cascavel - Paraná.

Apoia-se em estudos referentes à Psicologia e Arte, Psicologia e

desenvolvimento do psiquismo humano e no compromisso da Arte com a Educação.

E fundamenta-se nos estudos de Lev Semenovitch Vigotski (1896-1934), Alexander

Romanovich Luria (1902 - 1977), Daniil Elkonin (1904 – 1984), Alexis Nikolaevich

Leontiev (1903 – 1979), os quais trazem contribuições significativas para a

compreensão do processo de desenvolvimento psíquico e sua relação com os

processos de ensino e aprendizagem.

A Teoria Histórico-Cultural1 vem ao encontro de uma efetiva escolarização, pois

considera e valoriza a apropriação cultural que movimenta e impulsiona o

desenvolvimento das Funções Psicológicas Superiores eminentemente humanas.

Esta perspectiva, ao fundamentar a atuação do professor na prática social, pode

contribuir para compreensão da realidade social e a transformação da consciência do

sujeito quanto às desigualdades decorrentes de uma sociedade cujas relações se

articulam no modo de produção capitalista.

Devo2 expor os motivos que me levaram a pesquisar sobre o tema. Atuo na

área da educação há 28 anos, como professora. Concluí o Magistério, em 1989, no

Colégio Santa Maria e, em 2000, a Graduação em Educação Artística com Habilitação

em Artes Plásticas, na Universidade Oeste Paulista (UNOESTE). Cursei Pós-

Graduação Lato sensu em Metodologia do Ensino da Arte, em 2002, no Instituto

Brasileiro de Pós-Graduação IBEPEX, e, em 2007, conclui a Pós-Graduação Lato

Sensu em Fundamentos da Educação, na Universidade Estadual do Oeste do Paraná.

Em 1992, assumi a carreira como professora contratada pela prefeitura de

Cascavel, para ministrar aulas em turmas dos anos iniciais do Ensino Fundamental

na Escola Municipal Maria Tereza Abreu de Figueiredo. Desde 1994, assumi o

1 Neste trabalho, considera-se o termo Teoria Histórico-Cultural como sinônimo de Psicologia Histórico-Cultural. O termo Teoria Histórico-Cultural (THC) tem sido proposto para evitar confusão entre as siglas referentes a Psicologia Histórico-Cultural (PHC) e Pedgogia Histórico-Crítica (PHC). 2 Utilizarei a 1ª pessoa do singular na Introdução por estar expondo minha trajetória, porém os demais capítulos estarão redigidos na 3ª pessoa do singular, impessoal.

Page 19: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

19

concurso público da rede municipal de ensino de Cascavel por 20 horas e em 1996

assumi outras 20 horas de concurso público na mesma rede. Assim, trabalhei durante

oito anos, na mesma escola, apenas com o curso de Magistério, na qual, com a

oportunidade de ter-me graduado, em 2000, assumi na mesma escola a função de

coordenadora pedagógica.

Em 2001, fui convidada para trabalhar na Secretaria Municipal de Educação –

SEMED, como coordenadora pedagógica municipal da disciplina de Arte, com a

função de ministrar cursos e coordenar grupos de estudos envolvendo professores da

Educação Infantil e Ensino Fundamental - anos iniciais e da Educação de Jovens e

Adultos.

Coordenei a construção do currículo da Rede Municipal de Ensino de Cascavel

para a disciplina de Arte, nas modalidades de Educação Infantil, Ensino Fundamental

e EJA, cujo documento concluído em 2008 sob a coordenação do professor Dr.

Newton Duarte, pautou-se no Método Materialista Histórico e Dialético.

Em 2007, assumi o concurso como professora de Arte da Rede Estadual de

Ensino por 20 horas, solicitando exoneração de 20 horas da SEMED. Em 2008, ainda

na rede estadual, passei por um processo de seleção para atuar na Unidade

Socioeducativa CENSE II como professora de Arte no Ensino Fundamental anos

finais, na modalidade EJA, no qual fui aprovada para ministrar aulas para

adolescentes em conflito com a lei, durante um ano como professora substituta.

Desde quando iniciei a graduação em Arte em 1998, tive oportunidade de

estudar, aprender e admirar a arte como criação humana, a história da arte e dos

artistas, suas belezas, criações, a forma como o homem expressa suas emoções e

sentimentos nas diversas linguagens artísticas, e transmitir tais conhecimentos aos

estudantes com o objetivo principal de promover a educação estética, a sensibilização

dos sentidos humanos por meio das obras de arte.

Estudei sobre a arte na perspectiva da Pedagogia Histórico-Crítica e do

Materialismo Histórico-Dialético e percebi o quão é importante trabalhar a partir

desses fundamentos, e não visualizo, no momento, outra perspectiva melhor, que

envolva um conhecimento útil e verdadeiro, voltado ao movimento histórico e social,

levando em conta a historicidade dos conteúdos, artistas, época, sociedade, e assim

desenvolvendo a consciência crítica dos alunos.

Entretanto, durante minha experiência como coordenadora pedagógica

municipal da disciplina de Arte, pude constatar o quanto os professores dos anos

Page 20: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

20

iniciais eram limitados no processo de ensino, na perspectiva da Teoria Histórico-

Cultural que fundamenta o currículo, por falta de conhecimento científico.

Em 2009, assumi outro padrão de 20 horas na rede estadual de Educação

como professora de arte do Ensino Fundamental nos anos finais e Ensino Médio e

Profissionalizante e, consequentemente, pedi a exoneração do segundo padrão de 20

horas do município, dedicando-me exclusivamente para a Rede Estadual de Ensino

de Cascavel, com carga horária de 40 horas semanais no Colégio Estadual Padre

Carmelo Perrone.

Cumpre destacar que, ao atuar na rede municipal de ensino, pude participar de

um intenso processo de formação docente, no qual eram discutidos os conceitos da

THC para elaboração do currículo de Arte. Porém, na rede estadual o processo foi

quase incipiente. A reflexão sobre qual a compreensão docente acerca dos conceitos

da Teoria Histórico-Cultural direciona à análise de como o currículo foi elaborado e

implementado nos sistemas municipal e estadual de ensino e relaciona-se com a

problematização que envolve a presente pesquisa.

A rede municipal de ensino de Cascavel construiu democraticamente seu

currículo, entre os anos de 2005 e 2008, fundamentado no método materialista

histórico dialético. A elaboração desse documento envolveu a participação de

professores, diretores e coordenadores pedagógicos que atuam nas escolas e na

Secretaria Municipal de Educação.

Foram realizados vários encontros na rede municipal, durante todo esse

processo, dos quais participaram professores das diversas áreas de conhecimento.

Os textos utilizados como fundamentação teórica eram discutidos nas escolas, além

da promoção de palestras com os principais autores nacionais na perspectiva do

materialismo histórico-dialético, sendo que aos professores era oportunizada uma

carga horária mensal de formação. Um grupo de trabalho elaborava as propostas

curriculares nas diferentes disciplinas, e os textos produzidos eram socializados e

discutidos em todas as escolas da rede municipal, para sugestões, ao longo desse

período.

Cada disciplina tinha, como orientador, um autor reconhecido nacionalmente

com larga experiência e domínio teórico, tanto na área específica quanto sobre a

Pedagogia Histórico-Crítica, o qual sistematizava as contribuições docentes, cujo

texto retornava às escolas para discussão. Após a conclusão do currículo da rede

Page 21: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

21

pública municipal, os professores em geral e os professores de Arte especificamente,

tiveram oportunidade de formação continuada para compreensão desse documento.

Esse processo de formação continuada ocorreu por meio de grupos de estudo

mensais voltados à fundamentação teórica do currículo, articulada à prática

pedagógica, no período de 2008 a 2010, ano em que deixei de trabalhar na rede

municipal, para assumir aulas na rede estadual de ensino.

Posteriormente, os grupos de estudos nas escolas municipais passaram a ser

semestrais envolvendo um ciclo de palestras a cada início de ano letivo. Mantendo o

Materialismo Histórico e Dialético como referencial teórico, e a organização do

trabalho de discussão do currículo em grupos por área de conhecimento, com a

orientação de professores universitários mestres e doutores, o currículo da rede

municipal de ensino foi reformulado entre os anos de 2018 e 2019. Os textos

elaborados pelos grupos de estudos eram discutidos nas escolas e os professores

apresentavam sugestões a serem incorporadas, tanto em relação à fundamentação

teórica, quanto em relação à listagem de conteúdos curriculares. Ainda, nas semanas

pedagógicas semestrais eram realizadas oficinas voltadas à fundamentação teórica,

articulada aos conteúdos e à prática pedagógica.

Durante todo o período de elaboração e discussão da versão do currículo do

município editada em 2008, pude acompanhar o processo, como Coordenadora da

disciplina de Arte. E pude constatar como a construção coletiva de um processo de

ensino é árdua e lenta, bem como a importância da formação continuada nesse

processo, para que os professores possam se apropriar dos fundamentos teóricos do

trabalho pedagógico na práxis docente, situação que se agrava porque muitos

professores vão se aposentado e novos vão entrando. Dessa forma, várias pesquisas

envolvendo a rede municipal de ensino de Cascavel têm evidenciado a necessidade

de uma política pública consistente no sentido da formação continuada dos

professores, como as de Stepanha (2017) e Alves (2017).

Já na rede pública estadual, a elaboração do documento referente ao currículo

seguiu outro caminho, o qual envolveu um processo de formação docente bem menos

intenso. A construção de documentos norteadores iniciou pelo Currículo Básico do

Estado do Paraná, publicado em 1990, fruto da discussão coletiva que envolveu

professores da rede estadual de ensino e de instituições de Ensino Superior, durante

a década de 1980, também na perspectiva da Pedagogia Histórico-Crítica,

fundamentado na perspectiva do Materialismo Histórico-Dialético. Esse documento

Page 22: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

22

constituiu-se como orientador tanto para elaboração do currículo da rede municipal

em 2008, quanto para a elaboração das Diretrizes Curriculares Estaduais do Paraná,

documento publicado pela SEED – PR em 2008.

A construção das Diretrizes Curriculares Estaduais do Paraná aconteceu entre

2004 e 2008. Nos primeiros anos, a SEED – Secretaria de Estado da Educação,

mantenedora da rede estadual de ensino, promoveu poucos encontros para

elaboração coletiva dos textos, correspondendo a 16 horas para cada disciplina, em

cada Núcleo Regional.

Ao longo dos anos de 2007 e 2008 a equipe pedagógica do Departamento de Educação Básica (DEB) percorreu os 32 Núcleos Regionais de Educação realizando o evento chamado DEB Itinerante que ofereceu, para todos os professores da Rede Estadual de Ensino, dezesseis horas de formação continuada. Em grupos, organizados por disciplina, esses professores puderam, mais uma vez, discutir tanto os fundamentos teóricos das DCE quanto os [sic] aspectos metodológicos de sua implementação em sala de aula (PARANÁ, 2008, p. 8).

Portanto, os processos de elaboração e apropriação do currículo pelos

professores no município e no estado do Paraná foram paralelos em certos

momentos, em semanas pedagógicas com poucos dias de estudos e planejamentos,

porém bem distintos.

No município havia um coordenador de área para cada disciplina, que atendia

todas as escolas, em reuniões por área. Na rede estadual esses encontros eram

coordenados por um técnico pedagógico para cada disciplina que distribuía os textos

encaminhados pela SEED em Curitiba, além de orientações gerais também

encaminhadas para aprofundamento das questões curriculares.

A grande diferença entre a formação proporcionada pelo Estado e aquela

ofertada pelo município estava na carga horária de discussão na própria escola. Os

professores de Arte da rede estadual, assim como nas demais disciplinas, tiveram

apenas 16 horas de formação continuada, fora da escola, proporcionadas pelo NRE

durante todo esse processo. No restante, foram apenas discussões fragmentadas nas

semanas pedagógicas, com uma ou duas horas de discussão, durante um período –

vespertino ou matutino – as quais ocorriam nas instituições de ensino, no início de

cada semestre.

Page 23: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

23

Em seguida, o documento estadual passou por leituras críticas de especialistas

de diversas universidades brasileiras até a sua finalização, em 2008. De acordo com

o relato oficial:

Em 2011 iniciaram-se as discussões sobre a possibilidade de elaboração do Caderno de Expectativas de Aprendizagem pelo Departamento de Educação Básica. O documento foi elaborado de maneira coletiva, com a participação dos professores da rede e dos técnicos-pedagógicos que atuam nos Núcleos Regionais da Educação, apresentando a sistematização de, aproximadamente, 11.720 contribuições dos professores, debatidas durante a Semana Pedagógica de julho de 2011, bem como as contribuições dos técnicos-pedagógicos dos NRE, discutidas na formação continuada, realizada pelo DEB (PARANÁ, 2012, p. 5).

O Caderno, editado em 2011, teve como objetivo subsidiar o trabalho docente

e o planejamento das aulas, abordando o que, como, para quem, para que planejar e

avaliar o processo de ensino e aprendizagem, complementando o currículo de 2008.

Porém, mais uma vez constata-se a exiguidade da carga horária designada a essa

discussão - uma semana -. Além disso, o foco desse processo envolvia apenas os

conteúdos a serem abordados e não sua fundamentação teórica.

Em 2018, o Paraná iniciou a discussão dos Referenciais Curriculares do Estado

do Paraná, fundamentado na Base Nacional Comum Curricular para a construção do

Currículo da Rede Estadual Paranaense do Ensino Fundamental3. Para elaboração

desse novo currículo todos os profissionais da educação do Paraná, puderam

contribuir por meio de consulta pública durante os meses de julho e agosto de 2018,

mais voltada à listagem dos conteúdos, pela internet e naquele mesmo ano, na

semana pedagógica, no mês julho, houve um momento para discussão do referencial

curricular. Ressalte-se que as sugestões foram apresentadas “em consulta pública” e

“pela internet”, durante o período de dois meses.

Em 2019, a SEED encaminhou uma versão preliminar desse currículo (CREP)

baseada em competências gerais da educação básica, para os professores

analisarem e elencarem os conteúdos, a qual foi discutida em alguns momentos nas

semanas pedagógicas.

3 Os dados coletados sobre as DCEs e CREP encontram-se no site do Portal dia a dia Educação, Educadores: http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/crep_2020/arte_curriculo_rede_estadual_paranaense_20_01_2020__graf.pdf. Acesso em: 14 dez. 2020.

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24

Fica claro, portanto, a insuficiência das discussões acerca da Teoria Histórico-

Cultural que fundamentava teoricamente o currículo paranaense, principalmente na

rede estadual de ensino. Com a precariedade exposta quanto ao processo de sua

implantação, é possível supor que os professores de Arte da rede estadual de ensino

tenham uma compreensão insuficiente acerca de seus fundamentos.

Esse problema é muito importante, pois se desdobra pedagogicamente, uma

vez que a compreensão docente acerca do desenvolvimento do psiquismo está

diretamente ligada à organização do processo pedagógico, podendo comprometer o

processo de aprendizagem discente e, consequentemente, dificultar à escola exercer

sua própria função social.

Assim, como hipótese, na presente pesquisa supôs-se que se, enquanto

coordenadora da área de Arte, pude constatar a limitação na apropriação dos

fundamentos da Teoria Histórico-Cultural na rede municipal de ensino, com muito

mais razão a mesma limitação, seria encontrada entre os professores estaduais da

disciplina de Arte, tendo em vista a exiguidade do processo de discussão coletiva dos

fundamentos curriculares na rede estadual de ensino.

Portanto, considera-se que a Teoria Histórico-Cultural é a que melhor explica o

processo de desenvolvimento psíquico e sua relação com o desenvolvimento das

FPS, contribuindo, ao ser tomada como referencial teórico na práxis pedagógica, para

ampliar a democratização do ensino, em uma sociedade que, pelo próprio modo de

produção que a organiza, é excludente e afasta da escola quem mais precisa.

Considera-se, ainda, que os professores da rede estadual não tiveram a

formação continuada necessária acerca dos fundamentos da Teoria Histórico-Cultural

e contam somente com os conhecimentos adquiridos em seu processo de formação

inicial.

Dessas considerações decorre o objetivo geral desta pesquisa, ou seja,

investigar qual a compreensão dos professores da disciplina de Arte da rede estadual

de ensino do Paraná acerca do conceito de desenvolvimento do psiquismo e sua

relação com as funções psicológicas superiores, na perspectiva da Psicologia

Histórico-Cultural, para refletir sobre quais as consequências dessa compreensão na

práxis pedagógica. A análise desses dados poderá contribuir para a organização de

processos de formação docente, de forma a superar as lacunas detectadas.

Este objetivo geral desdobra-se nos seguintes objetivos específicos:

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25

1 - Investigar qual o conceito dos professores da disciplina de Arte, quanto

ao desenvolvimento do psiquismo e sua relação com as funções psicológicas

superiores, para verificar se se aproximam da concepção proposta pela THC;

2 – Investigar quais as consequências, para o processo pedagógico, da

concepção docente acerca do desenvolvimento do psiquismo e de sua relação com o

desenvolvimento das FPS;

3 - Analisar os fundamentos do desenvolvimento do psiquismo e das

Funções Psicológicas Superiores, com base nos estudos da Psicologia Histórico-

Cultural, para comparar com a concepção exposta pelos professores;

4 - Investigar quais as contribuições da Psicologia Histórico-Cultural para a

formação humana por meio do ensino de Arte, refletindo sobre quais as possíveis

consequências dessa concepção no trabalho pedagógico do docente de Arte.

Justifica-se esta pesquisa pois, compreender o desenvolvimento do psiquismo,

e, portanto, das funções psicológicas superiores e as suas relações diretas com o

processo de ensino e aprendizagem de Arte na realidade atual, e refletir sobre a

própria prática pedagógica na perspectiva da Teoria Histórico-Cultural poderá

contribuir para que possamos ter subsídios para uma outra leitura e atuação na

realidade, que nos amplie as possibilidades de transformá-la.

Justifica-se, ainda, pela necessidade de aprofundar os conhecimentos, da

pesquisadora e dos professores envolvidos, quanto ao processo pedagógico da

disciplina de Arte. Trata-se de proporcionar, por meio da pesquisa ora desenvolvida,

aos professores e à pesquisadora, um instrumento para a reflexão sobre a prática

pedagógica a partir dos estudos na perspectiva da Teoria Histórico-Cultural que

venham ao encontro da efetiva escolarização na disciplina de Arte.

Os estudos de Lev. S. Vigotski, Alexander R. Luria, Alexei Leontiev e Vasili V.

Davidov trazem contribuições significativas para o processo de ensino e

aprendizagem com o objetivo da efetiva escolarização, pois consideram e valorizam

a apropriação histórico-cultural que movimenta e impulsiona o desenvolvimento das

FPS, constituindo o pensamento teórico eminentemente humano.

Assim, o primeiro capítulo situa a origem da THC e objetiva apresentar

considerações nessa perspectiva teórica, referentes ao desenvolvimento do

psiquismo e ao desenvolvimento das funções psicológicas superiores: sensação,

percepção, atenção e memória, fornecendo subsídios para análise dos elementos

Page 26: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

26

apresentados pelos professores, ao conceituarem o desenvolvimento do psiquismo e

sua relação com as FPS.

No segundo capítulo, reflete-se sobre a formação de conceitos, seus níveis e

critérios, bem como sobre o desenvolvimento do pensamento e da linguagem com o

objetivo de subsidiar a análise da compreensão apresentada pelos professores acerca

dos conceitos investigados. Embora se utilize das categorias de generalização

propostas por Vigotski e retomadas por Davidov. Esclarece-se que este nível

conceitual não pode ser compreendido de forma generalizada, como correspondente

ao nível do pensamento teórico docente, pois essa pesquisa restringe-se à

compreensão dos conceitos investigados.

No terceiro capítulo busca-se identificar quais as contribuições da arte para a

formação humana, a partir da concepção de Vigotski. Com esse objetivo, apresenta-

se ainda, uma pesquisa sobre o Estado do Conhecimento a partir das palavras

chaves: Psicologia e Arte.

O quarto capítulo discute a relação entre arte e a atividade docente,

analisando as contribuições da Teoria Histórico-Cultural no processo de ensino e

aprendizagem da arte, a partir dos resultados de outro recorte da pesquisa sobre o

Estado do Conhecimento, tomando por base as palavras-chaves Arte e Práticas

Pedagógicas. Essa análise contribuiu para a reflexão sobre o processo pedagógico

docente, conforme revelado no discurso dos professores de Arte, coletado na

pesquisa de campo.

O quinto capítulo descreve os sujeitos, o procedimento e os instrumentos para

coleta e análise dos dados produzidos na pesquisa de campo.

No sexto capítulo apresentam-se e discutem-se os resultados obtidos na

pesquisa de campo, voltada à análise da qual a compreensão dos conceitos de

desenvolvimento do psiquismo e de funções psicológicas superiores, apresentada

pelos professores de Arte comparando-a com os fundamentos da Teoria Histórico-

Cultural. Busca-se, ainda, investigar como a compreensão docente acerca desses

conceitos, reflete-se na prática pedagógica.

Encerra-se com as Considerações Finais, sintetizando o percurso da

dissertação e refletindo sobre as consequências pedagógicas das concepções

docentes constatadas.

Espera-se que esta pesquisa contribua para aprofundar os conhecimentos da

pesquisadora e de professores envolvidos na docência de Arte, sobre os fundamentos

Page 27: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

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psicológicos desse processo pedagógico, e sua relação com o desenvolvimento do

psiquismo, de forma a promover um trabalho diferenciado no ambiente escolar,

significativo, criativo com objetivos claros e definidos, proporcionando ao professor

dessa área a oportunidade de refletir e evoluir em sua práxis pedagógica.

Um dos objetivos desta pesquisa é investigar qual a compreensão dos

professores de Arte sobre o desenvolvimento do psiquismo e de sua relação com as

funções psicológicas superiores para verificar se se aproximam da concepção

proposta pela THC. Assim, no capítulo 1, apresentamos os princípios dessa teoria, e

iniciamos a análise das funções psicológicas superiores, a qual será complementada

no capítulo 2.

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1 DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DA TEORIA

HISTÓRICO-CULTURAL

1.1 PRINCÍPIOS DA TEORIA HISTÓRICO-CULTURAL

A origem da Psicologia Histórico-Cultural, também chamada Teoria Histórico-

Cultural, remonta ao período da Revolução Russa de 1917, que teve como objetivos:

a luta entre as classes sociais por uma sociedade justa e igualitária, uma educação

para todos como instrumento de transformação social e a formação de um novo

homem para uma nova sociedade.

Esta teoria difere de outras psicologias por estar fundamentada no referencial

teórico do materialismo histórico dialético, perspectiva que tem como principais

autores Karl Marx (1818-1883) e Friedrich Engels (1820-1895). Busca analisar as

múltiplas determinações que engendram o real e o concreto, considerando que a

consciência é produto das relações sociais marcadas pelo modo de produção, com

suas contradições, tendo como base o trabalho por meio do qual o homem produz

meios para a sua sobrevivência (LEONTIEV, 1978).

Há muito tempo vem se estudando e discutindo a origem da espécie humana e

a diferença entre o homem e o animal. Várias teorias surgiram, dentre elas, Darwin,

no final do século XIX, defendia que “o homem é o produto da evolução gradual do

mundo animal e tem uma origem animal” (LEONTIEV, 1978, p. 261), teoria conhecida

como da evolução da espécie biológica. Outra teoria, inspirada na espiritualidade e

deixando de lado a ciência e a pesquisa, propõe que o homem é um ser de criação

divina, conforme várias crenças e culturas religiosas no decorrer da história da

humanidade.

Uma terceira teoria oposta às duas anteriores, defende a “ideia de que o

homem é um ser de natureza social, e tudo o que tem de humano nele, provém da

sua vida em sociedade no seio da cultura criada pela humanidade” (LEONTIEV, 1978,

p. 261). Essa vertente sustenta a ideia de que o homem evoluiu e se desenvolveu por

meio de suas atividades, marcadas pelas relações de produção, com base no trabalho

e nas formas com que ele se relaciona com a sociedade para sobreviver. Isto quer

dizer que, na medida que ele se socializa com os outros e com a natureza, no contexto

em que se encontra, modifica-se e modifica seu entorno, desenvolve-se.

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Assim se desenvolvia o homem, tornado sujeito do processo social de trabalho, sob a acção [sic] de duas espécies de leis: em primeiro lugar, as leis biológicas, em virtude das quais os seus órgãos se adaptaram às condições e às necessidades da produção; em segundo lugar, às leis sócio-históricas [sic] que regiam o desenvolvimento da própria produção e os fenômenos que ela engendra (LEONTIEV, 1978, p. 263).

Portanto, o desenvolvimento humano não depende somente das leis biológicas

e hereditárias, mas de leis sócio históricas, diferentemente do animal, cuja

sobrevivência é dependente das leis biológicas e não acumula e nem transmite

conhecimentos de geração em geração.

Nesse processo de desenvolvimento coletivo, o homem produz cultura, isto é,

instrumentos, técnicas e conhecimentos, os quais na medida em que evoluem, vão

historicamente acumulando transformações, que são transmitidas de geração em

geração, ao longo do processo de humanização do próprio homem, enquanto espécie.

Assim, quando o homem genérico satisfaz suas necessidades explorando a

natureza, transforma-a e transforma a si mesmo, adquirindo novos conhecimentos,

dando continuidade a um processo que é histórico e coletivo, a partir da atividade

criativa e produtiva que constitui o trabalho.

Pela sua atividade, os homens não fazem senão adaptar-se à natureza. Eles modificam-na em função do desenvolvimento das suas necessidades. Criam os objetos que devem satisfazer as suas necessidades e igualmente os meios de produção destes objetos, dos instrumentos às máquinas mais complexas. Constroem habitações, produzem as suas roupas e outros bens materiais. Os progressos realizados na produção de bens materiais são acompanhados pelo desenvolvimento da cultura dos homens; o seu conhecimento do mundo circundante e deles mesmos enriquece-se, desenvolvem-se a ciência e a arte (LEONTIEV, 1978, p. 265).

O homem é o único ser vivo que, em suas relações sócio históricas, é capaz

de criar, inventar, movimentar-se com intencionalidade de forma a planejar e executar

seus movimentos e ações. Vale ressaltar, mais uma vez, a diferença entre o homem

e o animal, pois enquanto os animais são regidos por leis biológicas, no humano a

atividade consciente é movida por necessidades que não são apenas biológicas, mas

geradas pela discrepância entre o que a situação lhe exige e suas condições pessoais:

[...] a atividade do homem é regida por complexas necessidades, frequentemente chamadas de “superiores” ou “intelectuais”. Situam-

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se entre elas as necessidades cognitivas, que incentivam o homem à aquisição de novos conhecimentos, a necessidade de comunicação, a necessidade de ser útil à sociedade, de ocupar, nesta, determinada posição, etc. (LURIA, 1979a, p. 72).

O animal tem sua história natural voltada para a satisfação de suas

necessidades biológicas, que são determinadas, enquanto as necessidades humanas

são sociais. O homem tem sua história social, que ele vai construindo na busca de

sua sobrevivência. Dessa forma, Davidov (1988) esclarece:

A atividade do sujeito está sempre ligada a uma determinada necessidade. Sendo expressão da falta de algo que o sujeito vivencia, a necessidade provoca sua tendência à busca, na qual se manifesta a plasticidade da atividade: sua semelhança com as propriedades dos objetos que existem independentemente dela (DAVIDOV, 1988, p. 28, tradução nossa)4.

O homem reflete sobre as condições do meio em que está inserido podendo

assim escolher – ainda que essa escolha seja limitada por sua posição de classe – o

que é conveniente para atender às suas necessidades, interpretando e tomando

decisões a partir de ações planejadas com esse objetivo.

Ou seja, o trabalho decorre da busca pelo homem genérico da satisfação de

suas necessidades. Gradativamente, a atividade coletiva vai se modificando, os

instrumentos nela envolvidos vão se alterando e constituindo a cultura e a história, e

nesse processo, em decorrência da aprendizagem do uso dos instrumentos na

consecução das atividades, o próprio homem, enquanto espécie, modifica-se,

biológica e socialmente.

[...] as raízes do surgimento da atividade consciente do homem não devem ser procuradas nas peculiaridades da “alma” nem no íntimo do organismo humano, mas nas condições sociais de vida historicamente formadas (LURIA, 1979a, p. 75, grifo no original).

Enfim, a partir da relação do homem com seu contexto, por meio das

experiências vividas em decorrência do trabalho social, considerando os aspectos

biológicos/hereditários e suas relações, suas descobertas baseadas na abstração

4 “La actividad del sujeto siempre está ligada a certa necessidad. Siendo expresión de la carência de algo que experimenta el sujeto, la necessidad provoca su tendência a la búsqueda, en la que se manifiesta la plasticidade de la actividad: su semejanza a las propriedades de los objetos existentes independentemente de ella” (DAVIDOV, 1988, p. 28).

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(pensamento) e na criação e emprego de instrumentos de trabalho, vão se ampliando

e constituindo a linguagem e o pensamento, acarretando novas necessidades

intelectuais, resultando em novos comportamentos. Portanto, o pensamento não é um

processo cuja gênese é individual. Ele é produto das relações sociais e só pode surgir

nas atividades socioculturais.

Dialeticamente, ainda que a transmissão do conhecimento não seja hereditária,

ela passa de uma geração a outra e resulta de experiência individual: “a grande

maioria dos conhecimentos e habilidades do homem se forma por meio da assimilação

da experiência de toda a humanidade, acumulada no processo da história social e

transmissível no processo de aprendizagem” (LURIA, 1979a, p. 73).

A atividade do homem está sempre inserida no meio social e nela condensa-se

todo um processo histórico e coletivo que exigiu que os homens se comunicassem,

engendrando a linguagem, condição necessária para o desenvolvimento do homem

na sociedade. Portanto, a atividade é fundamental para a formação psíquica tanto do

homem quanto do animal. Mas, no homem a linguagem articula-se à atividade,

propiciando a “[...] complexificação do psiquismo [...] pela diferenciação do sistema

nervoso elementar e dos órgãos dos sentidos visando à adaptação do organismo ao

meio” (MARTINS, 2013, p. 20).

Nesse processo, constitui-se a própria espécie humana: “A forma inicial de todo

tipo de atividade das pessoas é a prática histórico-social da raça humana, ou seja, a

atividade de trabalho coletiva, adequada, objeto sensorial, transformadora das

pessoas. [...]” (DAVIDOV, 1988, p. 27, tradução nossa)5.

Portanto, o trabalho social emprega instrumentos que o homem constrói, e

utiliza, transformando seu contexto. Reciprocamente, tomando consciência do uso e

significado desses instrumentos e dessas atividades laborais, o homem transforma a

si mesmo, e representa mentalmente essas operações e ações, por meio da

linguagem. Dessa forma, a linguagem – sistema de códigos que designam “os objetos

do mundo exterior, suas ações, qualidades, relações entre eles etc.” (LURIA, 1979a,

p. 78) –, circula nas relações sociais e permite ao homem comunicar-se e pensar

sobre suas atividades e realizar nesse coletivo, seu trabalho.

5 “La forma inicial de todos los tipos de actividad de las personas es la práctica histórico-social del género humano, es decir, la actividad laboral colectiva, adecuada, sensório-objetal, transformadora, de las personas. [...]” (DAVIDOV, 1988, p. 27).

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Davidov (1988), afirmando a inter-relação entre atividade, a qual constitui o

trabalho, e a organização social – que decorre das formas como o trabalho se organiza

–, destaca:

O conceito de atividade não pode ser examinado separadamente do conceito de consciência, que surge na atividade e a medeia. Por isso, o estudo da atividade deve estar intimamente relacionado com a investigação dos processos de surgimento e funcionamento da consciência humana (DAVIDOV, 1988, p. 33, tradução nossa)6.

Na verdade, a consciência decorre das atividades socioculturais e é um aspecto

fundamental do gênero humano, uma vez que somente o homem pode extrapolar os

comportamentos geneticamente programados que envolvem uma produção, ou seja,

sua atividade, criando novas possibilidades, voltando a etapas anteriores, enfim

avaliando se suas ações o estão conduzindo ao objetivo de seu trabalho.

Por isso, o “[...] desenvolvimento da atividade, em primeiro lugar, está

internamente ligado à formação da consciência humana” (DAVIDOV, 1988, p. 68,

tradução nossa)7; ou seja, conforme vai se alterando a atividade, a consciência altera-

se. Portanto, a consciência altera-se em cada período da vida, provocando

desenvolvimento e, dialeticamente, de acordo com as informações captadas pela

consciência, alteram-se as ações e operações envolvidas na atividade.

Portanto, as raízes da atividade consciente do homem são histórico-sociais e

fundamentam-se em três traços fundamentais como ressalta Luria (1979a):

Primeiro a atividade consciente não está ligada a motivos biológicos, e sim, às

necessidades superiores de vida, intelectuais, cognitivas, comunicação, que

incentivam o homem a buscar novos conhecimentos a partir do choque entre o

disponível pessoalmente ou coletivamente e as exigências demandadas pelas

condições socioculturais envolvidas na situação.

O segundo traço é que o homem reflete as condições do meio antes de agir. A

formação da consciência não se constitui em um processo cuja origem é individual,

pois “[...] no início essas funções são incluídas na estrutura da atividade coletiva e,

6 “El concepto de actividad no puede ser examinado separadamente del concepto de conciencia, la que surge en la actividad y luego la mediatiza. Por eso, el estúdio de la actividad debe estar en estrecha relación com la investigación de los processos de surgimento y funcionamento de la conciencia humana” (DAVIDOV, 1988, p. 33). 7 “El desarrollo de la actividad, en primer lugar, está internamente ligado con la formación de la conciencia humana [...]” (DAVIDOV, 1988, p. 68).

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depois, modificadas, passam a garantir o cumprimento da atividade individual”

(DAVIDOV, 1988, p. 45). Assim,

A consciência é a reprodução pelo indivíduo da imagem ideal de sua atividade voltada para uma finalidade e da representação ideal nela das posições das outras pessoas. A atividade consciente do homem está mediada pelo coletivo; durante sua atuação, o homem leva em consideração as posições dos outros membros do coletivo (DAVIDOV, 1988, p. 45, tradução nossa, grifo do autor)8.

O terceiro traço é que, nesse processo, ocorre a assimilação das experiências

acumuladas na relação com o contexto social, as quais podem ser transmitidas,

caracterizando o processo de aprendizagem.

A grande maioria de conhecimentos, habilidades e procedimentos do comportamento de que dispõe o homem não são o resultado de sua experiência própria, mas adquiridos pela assimilação da experiência histórico-social de gerações (LURIA, 1979a, p. 73).

Pode-se refletir sobre esses conceitos, tomando por base o processo

pedagógico. Quando se compreende a unidade entre a psique e a atividade, entende-

se que a consciência é a reflexão sobre o trabalho pedagógico de forma a analisar se

esse processo está articulado ao seu produto, ou seja, ao desenvolvimento psíquico

dos alunos, aspecto no qual se radica, portanto, a intencionalidade no processo

pedagógico.

Essa reflexão é individual e é coletiva, na medida em que na consciência do

professor estão reproduzidas relações sociais que envolvem necessidades,

interesses e posições daqueles que participam com ele da atividade “professor”.

Dessa forma, o professor atua como homem social e age como representante dessas

relações sociais.

Na consciência do indivíduo, graças a que nela certas relações sociais são idealmente reproduzidas, estão representadas também idealmente, determinadas necessidades, os interesses e as posições das outras pessoas incluídas nessas relações, as quais inicialmente

8 “[...] la conciencia es la reproducción por el individuo de la imagen ideal de su actividad tendiente a una finalidade y de la representación ideal em ella de las posiciones de las otras personas. La actividad consciente del hombre está mediatizada por el colectivo; durante su realización el hombre toma en cuenta las posiciones de los otros membros del colectivo” (DAVIDOV, 1988, p. 45).

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participaram junto com o indivíduo na atividade coletiva (DAVIDOV, 1988, p. 43, tradução nossa)9.

Ao mesmo tempo, o homem pode avaliar se suas ações e operações o estão

conduzindo ao objetivo que se propunham. Mas o faz com os olhos de outra pessoa,

uma vez que avalia a partir das necessidades, valores e interesses por ele apropriados

em suas relações sociais, atua como um “homem social”. Ou seja, a consciência antes

de ser individual, é social. Ela só é individual porque é social.

Na medida em que a própria atividade desse indivíduo, no caso de sua reprodução ideal, constitui um objeto peculiar de sua consciência, ele pode examinar, avaliar e planejar sua atividade como se fosse, por assim dizer, com os olhos de outras pessoas, tendo em conta as necessidades, interesses e posições delas. Em outras palavras, o determinado indivíduo passa a agir como um homem social. Ao mesmo tempo, ele atua na qualidade de representante de determinadas relações sociais (DAVIDOV, 1988, p. 43, tradução nossa)10.

Ao reproduzir no pensamento sua atividade, por meio de sua consciência, o

homem pode examiná-la, analisá-la e regular seu comportamento, analisando-as com

as ideias de seu grupo social. Como resume Davidov (1988):

Na consciência individual, uma série de funções fundamentais podem ser discernidas. Em primeiro lugar, no indivíduo, a consciência representa idealmente as posições das pessoas que estão incluídas com ele em certas relações sociais. Em segundo lugar, a consciência permite que o indivíduo seja representativo dessas relações. Em terceiro lugar, o indivíduo, graças à consciência, organiza sua própria atividade (isso se torna possível graças ao desenvolvimento de funções básicas da psique, como a busca, a prova e também a imagem ideal da própria atividade) (DAVIDOV, 1988, p. 44, tradução nossa)11.

9 “En la conciencia del individuo, gracias a que en ella se reproducen idealmente determinadas relaciones socialies, están representadas, también idealmente, determinadas necessidades, los interesses y las posiciones de las otras personas incluídas en estas relaciones, quienes incialmente paticiparon junto con el individuo dado en la actividad colectiva.” (DAVIDOV, 1988, p. 43). 10 “Por cuanto la actividad própria de este individuo, em caso de su reproducion ideal, constituye um objeto peculiar de su consciência, él puede examinar, valorar y planificar su actividad como si fuera, por así decirlo, com los ojos de otras personas, teniendo en cuenta las necessidades, los interesses y las posiciones de éstas. Com otras palavras, el individuo dado cominza a actuar como hombre social. Al mismo tempo actúa en calidad de representante de determinadas relaciones sociales” (DAVIDOV, 1988, p. 43). 11 “Em la conciencia individual se pueden discernir varias funciones fundamentales. En primer lugar, en el individuo la conciencia representa idealmente las posiciones de las personas que están incluídas junto com él em determinadas relaciones sociales. En segundo lugar, la conciencia permite al individuo ser representante de estas relaciones. En tercer lugar, el individuo, gracias a la consciencia, organiza

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Portanto, as funções intelectuais emocionais e afetivas que constituem a

consciência de um indivíduo, primeiro representam a consciência dos que estão em

relação com ele. Gradativamente, esse sujeito, apropria-se dessa forma de buscar e

avaliar a consecução de sua atividade e passa a ser um representante dessas

relações e organiza sua própria atividade com esses critérios por ele apropriados.

Quando o contexto social exige novas demandas, ou surgem outras atividades

com novas exigências, e o sujeito não tem os recursos internos para atendê-las,

precisará buscá-los, isto é, desenvolvê-los.

A base do desenvolvimento psíquico é precisamente a substituição de um tipo de atividade por outro que determina o processo necessário de formação de novas estruturas psicológicas. Por isso, o novo tipo de atividade, que está na base do desenvolvimento psíquico integral da criança de uma ou outra idade, foi denominado “reitor” (DAVIDOV, 1988, p. 70, tradução nossa)12.

O trabalho coletivo, tem fundamental importância para formação da

consciência, pois exige e provoca a atividade psíquica. Nas relações sociais o homem

difere dos animais ao criar um instrumento com certo objetivo, pois planeja-o e o

executa de diversas maneiras a fim de alcançar esse objetivo. Instaura mudanças de

comportamento, provoca novas estruturas de atividade consciente e alterações na

linguagem. Portanto, outro fator fundamental para a formação da consciência é a

linguagem constituída por um sistema de códigos que designam objetos, funções,

descrevem relações, e possibilitam a reorganização da atividade consciente,

Isto dá à linguagem a possibilidade de tornar-se não apenas meio de comunicação mas também o veículo mais importante do pensamento, que assegura a transição do sensorial ao racional na representação do mundo (LURIA, 1979a, p. 81).

Luria (1979a) reforça, portanto, que a atividade, elemento central do

desenvolvimento do psiquismo humano, por ser coletiva, exigiu que os homens

desenvolvessem a linguagem, sistema de códigos que designam os objetos e ações

sua actividad propia (esto se vuelve posible gracias a que se desarrollan funciones básicas de la psiquis tales como la búsqueda y la prueba y también la imagen ideal de la actividad misma)” (DAVIDOV, 1988, p. 44). 12 “La base del desarrollo psíquico es, justamente, la sustitución de un tipo de actividad por otro la cual determina con carácter necesario el processo de fomación de nuevas estructuras psicológicas. Por eso, el nuevo tipo de actividad, que está en la base del desarrollo psíquico integral del niño en una o otra edad, fue llamado ‘rector’” (DAVIDOV, 1988, p. 70).

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do mundo exterior, e possibilitam a reorganização da atividade consciente do homem.

A linguagem manifesta-se como forma de comunicação e pensamento, transmissão

de informações, mudando e orientando os processos de atenção, memória e

imaginação envolvidos no trabalho social.

Diferentemente, a linguagem dos animais nunca designa coisas, não define

ações nem qualidades, somente expressa seus estados de necessidades de

sobrevivência. Por isso,

[...] a unidade funcional entre mãos, cérebro e linguagem conduz o homem ao aperfeiçoamento anatomofisiológico do córtex cerebral, possibilitando um modo de relação entre o homem e suas condições de existência marcado em definitivo pela mediação da consciência (MARTINS, 2013, p. 28).

A partir da discussão da atividade como elemento central do desenvolvimento

do psiquismo, refletir-se-á, a seguir, sobre a constituição das funções psicológicas

superiores, eminentemente humanas. Pela sua complexidade, essa reflexão será

dividida em dois tópicos: o primeiro diz respeito à sensação, percepção, atenção e

memória desenvolvido a seguir. Quanto às funções de linguagem e a imaginação

serão discutidas no capítulo 2, por se articularem ao processo de formação de

conceitos.

1.2 O DESENVOLVIMENTO DAS FUNÇÕES PSICOLÓGICAS SUPERIORES:

SENSAÇÃO, PERCEPÇÃO, ATENÇÃO E MEMÓRIA

No processo sócio-histórico, o homem genérico criou e cria instrumentos,

produziu e produz conhecimentos necessários ao seu trabalho, em um processo de

mão dupla, pois, na medida em que modifica seu contexto, nesse trabalho coletivo, é

por ele modificado. E nessa relação, desenvolvem-se suas funções psicológicas

superiores tais como: sensação e percepção, atenção e memória, linguagem e

pensamento.

Por meio das sensações do olfato, visão, tato, audição e paladar, o homem

percebe, interpreta, raciocina, memoriza, percebe os sinais que o colocam em contato

com outros homens e com o mundo exterior, o qual é condição fundamental para o

seu desenvolvimento psíquico.

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As sensações constituem a fonte básica dos nossos conhecimentos atinentes ao mundo exterior e ao nosso próprio corpo. Elas representam os principais canais, por onde a informação relativa aos fenômenos do mundo exterior e ao estado do organismo chega ao cérebro, permitindo ao homem compreender o meio ambiente e o seu próprio corpo. Se esses canais estivessem fechados e os órgãos dos sentidos não fornecessem a informação necessária, nenhuma atividade consciente seria possível (LURIA, 1979b, p. 1).

Luria (1979b) afirma que as sensações podem ser de três tipos principais: o

primeiro são as sensações interoceptivas, sinais que chegam do interior do

organismo: paredes dos órgãos, coração, estômago, e conservam a semelhança com

os estados emocionais, fome, dor, sensação de desconforto, e muitas vezes

manifestam reações emocionais, provocando comportamentos diferentes, fazendo

chegar ao cérebro as excitações, fundamentais na regulação da balança dos

processos internos do metabolismo humano.

O segundo tipo são as sensações proprioceptivas que regulam o corpo no

espaço, propiciam informações sobre a posição do aparelho de apoio, o equilíbrio e

movimentos corporais envolvendo músculos e superfícies articulatórias.

O terceiro tipo de sensação são as exteroceptivas que fazem chegar ao homem

informações do mundo externo, criando a base do nosso comportamento consciente

por meio dos órgãos dos sentidos: olfato, tato, audição, visão e paladar. Este tipo

divide-se em dois subgrupos, que trabalham em conjunto: sensações de contato, em

que as ações são perceptíveis, aplicadas imediatamente à superfície do corpo, e

sensações à distância, como o paladar perceptível a uma grande distância do sujeito,

o som de um carro ou a visão luminosa a longa distância.

As sensações não constituem um processo passivo, são sempre acompanhadas de uma série de mudanças dos processos vegetativos, eletrofisiológicos e respiratórios e são reflectores [sic] por natureza (LURIA,1979b, p. 25).

Por isso, ao mesmo tempo em que a sensibilidade dos nossos órgãos de

sentido pode variar de acordo com o que o organismo capta da situação ambiente ou

de informações advindas do organismo, ocorre, dialeticamente, um processo de

adaptação de cada órgão de sentido ao ambiente.

Luria (1979b, p. 29) refere-se a “duas formas básicas de mudança da

sensibilidade”. A primeira, adaptação, depende das condições do meio, e envolve uma

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“grande plasticidade do organismo em seu processo de adaptação às condições do

meio” (LURIA, 1979b, p. 31). E a segunda, sensibilização, depende de mudanças

fisiológicas ou psicológicas no próprio estado do organismo.

O homem vive em um complexo mundo de coisas, imagens, objetos, pessoas

e diversas situações nas quais recebe informações do meio exterior e interior, em uma

constante relação dialética13. Essas informações são processadas por meio do

conjunto dos órgãos dos sentidos, e transformadas de sensações isoladas em

percepção integral. Portanto, o processo de percepção complementa a atividade

receptora do sujeito:

[...] a percepção do homem é mediada pelos seus conhecimentos anteriores, decorrentes da experiência anterior, e constitui uma complexa atividade de análise e síntese que compreende a criação da hipótese do caráter do objeto perceptível e a decisão acerca da correspondência do objeto perceptível a essa hipótese (LURIA, 1979b, p. 41).

Então, a profundidade da compreensão e a significação atribuída a

determinado objeto pelo sujeito ocorre a partir do momento em que ele recebe pelos

órgãos dos sentidos, as informações que decorrem de suas atividades socioculturais,

processando-as de acordo com os conhecimentos e experiências adquiridas

anteriormente nas relações sociais que o constituem.

Na percepção tátil, por exemplo, o sujeito obtém informações e características

de traços isolados de um determinado objeto pelo movimento de apalpação, ou seja,

pela sensação, e posteriormente os reúne em uma imagem integral. Já na percepção

visual, o sujeito percebe de uma só vez a imagem completa do objeto. O mesmo

ocorre com a percepção auditiva, em que o mundo das excitações sonoras é

determinado por fatores histórico-sociais, assim como com os demais órgãos dos

sentidos. A percepção visual difere da tátil pelo fato de captar a imagem completa do

13 “A dialética materialista histórica funda-se na concepção de que” [...] as ideias são o ‘reflexo’ do plano da organização nervosa superior, das realidades e leis dos processos que se passam no mundo exterior. [...] há uma realidade objetiva, isto é, uma realidade que existe independentemente das ideias e do pensamento”. É importante compreender, porém, que o reflexo não é toda a realidade, mas constitui-se na apreensão subjetiva da realidade objetiva. [...] A dialética situa-se, então, no plano de realidade, no plano histórico, sob a forma da trama de relações contraditórias, conflitantes, de leis de construção, desenvolvimento e transformação dos fatos. O desafio do pensamento – cujo campo próprio de mover-se é o plano abstrato, teórico - é trazer para o plano do conhecimento essa dialética do real.” (Frigotto, 2001, 75)

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objeto, fixando-a invertida na retina, sendo, a seguir encaminhada pelo nervo ótico ao

cérebro, possibilitando ao homem reverter a inversão e captar a imagem integral do

objeto.

A percepção auditiva é radicalmente distinta tanto da percepção tátil como da visual. Se as percepções tátil e visual refletem o mundo dos objetos dispostos no espaço, já a percepção auditiva está relacionada com uma sucessão de irritações que ocorrem no tempo (LURIA,

1979b, p. 86).

Entretanto, todas essas excitações sonoras, auditivas, visuais ou táteis são

determinadas por fatores histórico-sociais.

O processo de recepção é chamado por Luria (1979) como atividade receptora

do sujeito. Toda percepção humana ocorre de acordo com as experiências e

conhecimentos anteriores apropriados nas relações socioculturais e decorre de

análises e sínteses de determinados objetos perceptíveis correspondentes. Outra

questão importante a ressaltar é que a percepção, as mudanças na sensibilidade

evoluem conforme a vivência do sujeito lhe possibilita ampliar a linguagem, ou seja o

processo biológico se mantém, as alterações observadas são decorrentes das

experiências socioculturais apropriadas.

O homem, inserido em um meio social cheio de informações, ao observá-las,

seleciona o que é importante e/ou tem relação com a sua atividade consciente e seus

interesses, descartando as que não lhe interessam. Sempre destacando que essa

seleção depende dos critérios por ele apropriados em suas relações sociais. Esse

caráter seletivo de informações assegura “[...] os programas seletivos de ação e a

manutenção de um controle permanente sobre elas [...] convencionalmente chamados

de atenção” (LURIA, 1979c, p. 1).

O mesmo ocorre na percepção, nos processos motores e no pensamento. Sem

essa seleção não seriam possíveis a organização e o desenvolvimento das atividades,

o pensamento seria confuso e desorganizado e o homem não solucionaria

determinados problemas.

Nesse processo de seleção básica de informações, as que não estão sendo

utilizadas na atividade atual ficam retidas na consciência como um fundo de reserva,

tornando-se ativas, quando surgir uma tarefa que as solicite.

Assim, as informações que chegam à atenção do homem possuem “volume”,

que se refere ao número de sinais recebidos, “estabilidade” que diz respeito à duração

da atenção para a atividade de caráter dominante, e “oscilações”, ou seja, movimentos

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cíclicos de domínio ou não domínio de uma determinada atividade consciente (LURIA,

1979c).

Dois grupos de fatores determinam a atenção do homem, orientando o caráter

seletivo dos processos psíquicos. O primeiro grupo relaciona-se com a estrutura da

percepção e envolve os estímulos externos percebidos pelo sujeito que “[...]

determinam o sentido, o objeto e a estabilidade da atenção” (LURIA, 1979c, p. 2).

Nesse grupo, a intensidade e a novidade das informações recebidas são importantes

quando o homem executa uma determinada atividade consciente. Quanto mais

autêntica e nova a informação fornecida pelo estímulo, maior será a atenção por ele

captada.

O segundo grupo de fatores que dirigem a atenção relaciona-se com a estrutura

da atividade, a qual depende da história social, “reflete o seu processo e lhe serve de

mecanismo de controle” (LURIA, 1979c, p. 4).

A atividade do homem está condicionada aos motivos, aos objetivos e às

necessidades para a sua realização e quando a atividade se torna automática ela

deixa de ser atrativa e consciente, pois, “[...]o sentido da atenção é determinado pela

estrutura psicológica da atividade e depende essencialmente do grau de sua

automatização” (LURIA, 1979c, p. 5). Quando a atividade não é automática, o papel

da atenção e da consciência é decisivo.

Outra função importante é constituída pela memória humana que toma

informações ou vestígios de informações como objeto da consciência.

[...] entendemos por memória o registro, a conservação e a reprodução dos vestígios da experiência anterior, registro esse que dá ao homem

a possibilidade de acumular informação e operar com os vestígios da experiência anterior após o desaparecimento dos fenômenos que provocaram tais vestígios (LURIA, 1979c, p. 39).

A memória representa toda a realidade histórica do sujeito, as experiências

intelectuais, emoções, percepções, resultando no conhecimento e nas habilidades

que o homem, no decorrer da vida, utiliza para realizar atividades conscientes.

O cérebro humano capta estímulos e os distingue para “conservar na memória

os vestígios das influências antes percebidas por ele” (LURIA, 1979c, p. 47), mas para

conservá-los deve-se ter um objetivo, um significado. O homem memoriza a partir do

momento em que é estimulado a memorizar de acordo com seu interesse e objetivo.

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O que não lhe interessa não memoriza e/ou não percebe, por isso a importância da

orientação e do objetivo para determinada atividade. Então,

[...] o homem memoriza antes de tudo aquilo que está relacionado com o fim de sua atividade, aquilo que contribui para atingir o objetivo ou serve de obstáculo. Aquilo que está relacionado com o objetivo ou com o objeto da atividade motiva a reação orientada, torna-se dominante e é memorizado, não se observando nem se conservando na memória os detalhes secundários que não têm relação com o objeto principal da atividade (LURIA, 1979c, p. 78).

A linguagem e o pensamento constituem a base do desenvolvimento do

psiquismo. Por meio da linguagem e do pensamento articulados às atividades

materiais, o homem desenvolve a consciência, formando uma estrutura complexa que

constitui e possibilita o desenvolvimento da atividade intelectual.

Essa construção da consciência humana ocorre a partir das informações

recebidas do contexto em que o sujeito vive, as quais são por ele processadas e

registradas na memória. “Por esta razão atividade e consciência são, na teoria

histórico-cultural, as categorias centrais no estudo do psiquismo” (MARTINS, 2013, p.

29).

A atividade consciente do homem não pode tomar como orientação a impressão imediata da situação exterior e sim um conhecimento mais profundo das leis interiores dessa situação, razão por que há todo fundamento para afirmar-se que o comportamento humano, baseado no reconhecimento da necessidade, é livre (LURIA, 1979a, p. 72).

A partir da compreensão da estrutura do ato intelectual, Luria destaca a

diferença entre o comportamento animal, que é limitado ao aspecto motor-sensorial,

e busca satisfazer as necessidades básicas, como a fome e sexo, de forma

estereotipada, e o comportamento humano que é livre para buscar novas formas de

satisfação de suas necessidades.

A segunda característica que diferencia o homem do animal corresponde ao

comportamento perceptivo, uma vez que o animal reage de acordo com impressões

evidentes e imediatas, enquanto o homem busca superar o aparente e desvelar as

leis interiores da situação.

A terceira característica que diferencia o comportamento animal do

comportamento humano refere-se ao aspecto intelectual, considerado por Luria, o

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mais complexo. No animal manifesta-se como forma embrionária e adaptativa às

condições ambientais. No homem, o comportamento intelectual ou a atividade

intelectual foi se desenvolvendo a partir do surgimento dos instrumentos materiais por

ele construídos para auxiliá-lo em sua atividade laboral, assim como os instrumentos

simbólicos, que caracterizam a linguagem, cuja elaboração gradativa decorreu da

necessidade de comunicação para o trabalho social. Além disso, o homem assimila o

comportamento histórico de gerações, enquanto o animal só reproduz as habilidades

motoras de acordo com sua carga biológica.

Segundo Luria (1979a), a atividade consciente do homem difere dos animais

por não estar diretamente ligada aos motivos biológicos. Ela é movida por complexas

necessidades superiores e intelectuais, as quais se articulam à sua vida social,

podendo ser reconhecidas:

[...] a atividade do homem é regida por complexas necessidades, frequentemente chamadas de “superiores” ou “intelectuais”. Situam-se entre elas as necessidades cognitivas, que incentivam o homem à aquisição de novos conhecimentos, a necessidade de comunicação, a necessidade de ser útil à sociedade, de ocupar, nesta, determinada posição, etc. (LURIA, 1979a, p. 72).

O uso de instrumentos materiais e psicológicos possibilitou aos homens,

ampliarem suas possibilidades de trabalho, pesquisar e orientar suas ações no

coletivo, nomeando-as com palavras, assimilando os princípios abstratos da solução

de suas práticas construtivas, planejando mentalmente suas ações, executando-as e

avaliando-as, surgindo assim novas formas de comportamento.

Este capítulo objetivou descrever os princípios da THC, e as principais funções

psicológicas envolvidas na docência de Arte, destacando a sensação, a percepção, a

atenção e a memória. Entretanto, com o objetivo de não tornar o texto cansativo para

o leitor, optou-se por dividi-lo, abordando no próximo capítulo, as funções referentes

à linguagem e ao processo criativo na perspectiva vigotskiana. Sempre deixando claro

que no funcionamento psíquico atua o conjunto das funções psicológicas superiores

e os destaques a cada uma representam uma estratégia para compreendê-las em sua

articulação síncrona, como um feixe.

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43

2 A FORMAÇÃO DO CONCEITO E O PROCESSO CRIATIVO

Analisa-se, neste capítulo, o processo de apropriação da linguagem e de

formação conceitual, bem como o processo criativo, funções importantes no ensino

dessa disciplina. Considera-se que o processo de desenvolvimento do psiquismo

ocorre dialeticamente na relação entre consciência, pensamento e linguagem,

envolvendo o conjunto das funções psíquicas. Nesse sentido, destacou-se no primeiro

capítulo, a análise de algumas funções, como sensação, percepção, atenção e

memória, e na continuidade do estudo acerca das funções psicológicas superiores,

neste segundo capítulo, destacar-se-ão a linguagem e a criação. Trata-se de um

exercício analítico, no sentido de possibilitar uma síntese integradora, uma vez que o

cérebro atua como uma orquestra, isto é, as funções atuam em um conjunto,

simultaneamente, por meio das relações neuronais envolvidas no feixe funcional.

Ainda, considerando que esta pesquisa busca investigar por meio das

expressões linguísticas dos professores da disciplina de Arte, como compreendem o

conceito de desenvolvimento do psiquismo e sua relação com as funções psicológicas

superiores, tomando como referência a THC, a reflexão a seguir, objetiva fornecer

subsídios para analisar os conceitos apresentados pelos professores acerca do

desenvolvimento do psiquismo e das funções psicológicas superiores. Dessa forma,

neste capítulo abordam-se as funções de linguagem e criação, e discute-se o

processo de formação de conceitos.

2.1 LINGUAGEM: PALAVRA, SIGNIFICADO E SENTIDO, GENERALIZAÇÃO E

FORMAÇÃO CONCEITUAL

No desenvolvimento ontogenético o sujeito já nasce imerso em um contexto

onde circula a linguagem articulada a diferentes formas de trabalho. Gradativamente

esse homem irá se humanizando, isto é, apropriando-se dos instrumentos materiais e

simbólicos que suas atividades envolvem.

Pode-se afirmar, portanto, que o significado da palavra circula socialmente. No

entanto, a criança que começa a aprender as primeiras palavras, ouve uma palavra

desconhecida e esse som lhe é apenas um sinal, sem qualquer significado ou sentido,

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uma vez que: “Uma palavra desprovida de significado não é uma palavra, é um som

vazio” (VIGOTSKI, 2001, p. 289, tradução nossa)14.

Entretanto, à medida que esse elemento é nominado outras vezes pelas

pessoas que estão ao seu redor, a criança que ouve, vai reconhecendo essa palavra,

ampliando esse conceito revestido de significado e o generaliza pouco a pouco, a

partir dessa apropriação de seu significado social, uma vez que “[...] o significado é a

característica necessária e constitutiva da própria palavra” (VIGOTSKI, 2001, p. 289).

Por exemplo, a criança num primeiro momento ouve outra pessoa chamar o cachorro

de “au-au” e apropria-se do significado atribuído socialmente a esse sinal,

representando mentalmente a imagem do cachorro que está na sua frente,

relacionando-a à palavra “au-au”. Porém vai demorar bastante para ela entender que

“au-au” é cachorro e que essa palavra designa qualquer cachorro.

Quando a pessoa se apropria desse significado, ela lhe atribui um sentido

individual, que é resultado dessa apropriação, o “[...] sentido – é o que forma parte do

significado (resultado do significado), mas não foi fixado pelo signo”15 (VIGOTSKY,

1934, p. 128), entendendo que o “[...] sentido é mais amplo do que o significado”16.

Gradativa e socialmente nas suas relações com os diferentes grupos sociais o

indivíduo apropria-se do significado da palavra, formando seu sentido, - [...] resultado

e produto do significado [...]”17 –, possibilitando-lhe tanto o pensamento verbal quanto

a linguagem intelectual, permitindo-lhe refletir e compreender a realidade, bem como

expressar-se e expressá-la. O sujeito vai se apropriando do significado da palavra e

alterando o seu sentido, conforme os resultados que obtém em sua vivência ao utilizar

a linguagem, frente às demandas da realidade.

Por ser elaborada nas relações sociais a mesma palavra pode passar por

diferentes significados e formas, expressando diferentes sentimentos e ideias, e tem

uma história que pode revelar seu percurso. Nesse percurso, o sujeito analisa as

demandas/necessidades a ele colocadas pela realidade e busca o que lhe falta para

atendê-las. Reciprocamente, ao nomear os objetos, avalia os resultados que obtém,

14 “Una palabra carente de significado no es una palabra, es un sonido huero. Por consiguiente, el significado es el rasgo necesario, constitutivo de la propia palabra” (VIGOTSKI, 2001, p. 289). 15 “O sentido – es lo que forma parte del significado (resultado del significado), pero no ha sido fijado por el signo” (VIGOTSKY, 2001, p. 128) “Formación del sentido –resultado, producto del significado” (VIGOTSKY, 2001, p. 187). 16 “El sentido es más amplio que el significado” (VIGOTSKY, 2001, p. 187). 17 “Formación del sentido – resultado, producto del significado” (VIGOTSKY, 2001, p. 187).

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cotejando-os com a realidade. Nesse processo vai se apropriando e organizando seu

universo vocabular, em níveis de generalização cada vez mais elaborados.

Assim, o significado é a unidade que articula o pensamento e a linguagem e

possibilita a generalização, que se constitui em um ato de pensamento conceitual que

permite representar e expressar a realidade de um modo diferente de como ela se

apresenta nas sensações e percepções, que são imediatas (DAVIDOV, 1992). Na

medida em que o sujeito é capaz de aplicar aquela palavra a diferentes situações,

generaliza-a em diferentes níveis conceituais, e vai modificando, dominando, e

sintetizando o seu conceito em diferentes patamares.

Portanto, “[…] psicologicamente, o significado da palavra nada mais é do que

uma generalização ou um conceito, como pudemos nos convencer repetidamente ao

longo da investigação” (VIGOTSKI, 2001, p. 289, tradução nossa)18. Em outras

palavras, vai se alterando a linguagem do sujeito e sua relação com o mundo, ou seja,

de forma dialética altera-se o pensamento verbal e a linguagem intelectual, ao mesmo

tempo em que se alteram suas relações sociais.

Cada palavra pode vir a representar um conceito que, quando apropriado na

interação social, permite ao homem refletir, pensar e tomar consciência da realidade

com mais profundidade. Quanto mais o sujeito apreende os significados socialmente

atribuídos aos sinais, mais ele se apropria de palavras e vai desenvolvendo conceitos.

Esse processo envolve alterações na estrutura da generalização que essa palavra

abarca, de forma a refletir essa realidade na consciência do homem, em patamares

que vão se diferenciando, ou seja, se especificando cada vez com mais profundidade.

Generalização e significado da palavra são sinônimos. Cada generalização, cada formação de um conceito constitui o ato de pensamento mais específico, mais autêntico e mais indubitável. Portanto, temos o direito de considerar o significado da palavra como um fenômeno do pensamento. Isso significa que o significado da palavra é um fenômeno verbal e intelectual (VIGOTSKI, 2001, p. 289, tradução nossa)19.

18 “[...] psicológico, el significado de la palabra no es más que una generalización o un concepto, como hemos podido convencernos repetidas veces a lo largo de la investigación. Generalización y significado de la palabra son sinónimos” (VIGOTSKI, 2001, p. 289). 19 “Generalización y significado de la palabra son sinónimos. Toda generalización, toda formación de un concepto constituye el más específico, más auténtico y más indudable acto de pensamiento. Por consiguiente, tenemos derecho a considerar el significado de la palabra como un fenómeno del pensamiento. Esto significa que el significado de la palabra es a la vez un fenómeno verbal e intelectual” (VIGOTSKI, 2001 p. 289).

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Portanto, a palavra é uma generalização, uma vez que ela abarca mais do que

a percepção imediata apreende, e seu significado depende, reciprocamente, do

desenvolvimento intelectual do homem e das relações que o envolvem, isto é, tanto o

desenvolvimento intelectual interfere nas relações sociais, quanto as relações sociais

interferem no desenvolvimento intelectual, em um processo constante, alterando e

formando novos conceitos. Como esclarece Vigotski (1934)20:

Qualquer significado da palavra em qualquer idade constitui uma generalização. Mas o significado das palavras evolui. No momento em que a criança assimila uma nova palavra, relacionada a um significado, o desenvolvimento do significado da palavra não termina, apenas começa. A palavra é a princípio uma generalização do tipo mais elementar, e somente à medida que a criança se desenvolve é que ela passa da generalização elementar para formas mais elevadas de generalização, culminando este processo com a formação de conceitos autênticos e verdadeiros (VIGOTSKI, 2001, p. 185, tradução nossa).

Na concepção tradicional, elaborada na perspectiva da lógica formal, no

processo gradativo de elaboração de um conceito, o sujeito vai abarcando, por meio

da análise e orientação de sua ação na realidade, outros elementos que

correspondem a características do objeto conceituado. Pode-se afirmar que o conceito

se estabelece quando, toda vez que o sujeito se encontra frente às mesmas

características ele identifica o mesmo objeto original. Portanto, pode-se dizer que o

conceito abarca as mesmas propriedades exclusivas que caracterizam o objeto

original. Porém, o objeto original envolve outras características secundárias e a

criança as vai distinguindo das específicas, ou seja, distingue as propriedades

circunstanciais das propriedades fundamentais que qualificam o objeto original e se

encontram em outros objetos semelhantes, as quais correspondem ao mesmo

conceito.

É a essa capacidade de analisar o objeto, distinguir as propriedades essenciais e relacioná-lo a determinadas categorias que se chama significado da palavra (LURIA, 1979d, p. 20).

20 “Cualquier significado de la palabra en cualquier edad constituye una generalización. Pero los significados de las palabras evolucionan. En el momento en que el niño asimila una nueva palabra, relacionada con un significado, el desarrollo del significado de la palabra no finaliza, sino que sólo comienza. La palabra es al principio una generalización del tipo más elemental, y únicamente a medida que se desarrolla el niño pasa de la generalización elemental a formas cada vez más elevadas de generalización culminando este proceso con la formación de auténticos y verdaderos conceptos” (VIGOTSKI, 2001, p. 185).

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Portanto, a palavra permite analisar o objeto, definir suas características

essenciais, e expressar a realidade de forma a orientar a conduta humana. A palavra

orienta a conduta humana porque

Ao dominar a palavra, o homem domina automaticamente um complexo sistema de associações e relações em que um dado objeto se encontra e que se formaram na história multissecular da humanidade (LURIA, 1979d, p. 20).

Compreende-se, nesta análise, que uma palavra envolve relações e carrega

associações complexas e dinâmicas, que vão se alterando historicamente, ainda que

em determinado momento abarque relações que são determinadas pelas condições

que correspondem àquele momento histórico. Nesse sentido, esse processo é

semelhante à própria constituição do objeto, que também carrega consigo sua história,

da mesma forma que o homem, o qual também é a “síntese de múltiplas

determinações”, que envolveram associações e relações que foram se estabelecendo

historicamente.

Mas, há que distinguir os conceitos cotidianos - que se elaboram a partir da

situação real específica e se generalizam em um plano mais próximo da realidade,

ainda próximos do concreto material no processo de generalização -, do processo que

ocorre tendo como ponto de partida a generalização no pensamento, a generalização

que ocorre do ponto de vista teórico científico, que já parte do pensamento e que

envolve um concreto pensado.

Generalização remete ao geral que corresponde ao sistema no qual o conceito

se articula ou se fixa, mas pode-se dizer que há “diferentes gerais” articulados entre

si, isto é, o conceito pode “pertencer “a diferentes sistemas simultaneamente. E

Davidov (1992) afirma que um critério que define o conceito como científico é:

[...] aquele seu conteúdo que, mediante certas ações intelectivas, particularmente a reflexão, fixa certas relações genéticas [...] ou a “célula” de um determinado sistema de objetos em desenvolvimento. [...] Em outras palavras, o pensamento e os conceitos empíricos consideram os objetos como constantes e acabados, enquanto que o pensamento e os conceitos teóricos analisam os processos de seu desenvolvimento (DAVIDOV, 1992, p. 7).

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Nesse sentido, um conceito teórico é vivo e não se esgota, pois pode ser

articulado a novos sistemas gradativamente. Como destaca Davidov (1992), ainda

ancorado em Vigotski, é necessário distinguir entre “generalização de coisas”, que

tem como ponto de partida a percepção referindo-se à generalização que ocorre no

nível dos pseudo-conceitos e “generalização de pensamentos”, a qual prescinde dos

objetos físicos e está no plano das imagens mentais, caracterizando os conceitos.

Vigotski (1987) considera o conceito como um processo criativo e sua formação

ocorre a partir da percepção de um determinado elemento, da elaboração mental do

material sensorial e da palavra (símbolo). Portanto, o conceito é dinâmico e constitui

uma parte ativa do desenvolvimento intelectual, à medida em que a atividade

demanda a comunicação e solução de problemas.

Mas, é preciso considerar que uma simples palavra ao ser apropriada e

significada pelo homem já é um “embrião” de um pseudo-conceito.

É a essa capacidade de analisar o objeto, distinguir as propriedades essenciais e relacioná-lo a determinadas categorias que se chama significado da palavra (LURIA, 1979d, p. 20).

Portanto, o significado é um componente da palavra que articulado à sua

representação material, dialeticamente, constitui a base do pensamento. Por meio das

relações sociais, as palavras estruturam-se em complexas relações com a realidade,

constituindo a língua:

[...] veículo fundamental de que se serve o homem para transmitir informação, o sistema básico de códigos que se formaram no processo da história social e permitem refletir as complexas ligações e relações da realidade e formular o pensamento (LURIA, 1979d, p. 61).

Luria (1979a) considera a língua como um sistema de códigos que designam

coisas, ações e qualidades dos objetos, servindo de meio de informação, sendo que

“[...] a linguagem teve mudança decisiva para posterior reorganização da atividade

consciente do homem” (LURIA, 1979a, p. 80), por permitir

[...] discriminar esses objetos, dirigir a atenção para eles e conservá-los na memória. Resulta daí que o homem está em condições de lidar com os objetos do mundo exterior inclusive quando eles estão ausentes (LURIA, 1979a, p. 80).

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Compreende-se a linguagem como um processo de formulação e transmissão

de informações, possibilitando o processo do pensamento, uma vez que o significado

é a unidade que articula essas duas funções. As palavras e conceitos permitem que

o homem processe, interprete e aja de acordo com seus conhecimentos,

necessidades e dados da realidade. Deste modo, as linguagens falada e/ou escrita

possibilitam “[...] um meio de retoque do pensamento e desempenham importante

papel no aprimoramento da atividade propriamente intelectual do sujeito” (LURIA,

1979d, p. 72).

O pensamento codifica-se utilizando a linguagem em um sistema de ligações e

relações, no qual as palavras, de acordo com seus significados, têm também a função

de comunicação. Esse processo ocorre na relação social e permite ao homem

elaborar e apropriar-se de ideias e conceitos intelectualmente.

Dialeticamente, “A linguagem reorganiza substancialmente os processos de

percepção do mundo exterior e cria novas leis dessa percepção” (LURIA, 1979a, p.

82) Ou seja, quando um conceito se forma o homem passa a “ver” o que antes não

via. Portanto, “A linguagem muda essencialmente também, os processos da memória

do homem” (LURIA, 1979a, p. 82). E lhe possibilita, pela primeira vez, desligar-se da

experiência imediata e organizar o pensamento na ausência do objeto, na medida em

que as palavras adquirem um significado, permitindo-lhe retomar situações, planejar

o futuro e desenvolver a imaginação (LURIA, 1979a). Além disso, a linguagem

possibilita a expressão da própria consciência humana.

A consciência como um todo tem uma estrutura semântica. [...] Na consciência surgem as conexões semânticas (vergonha, orgulho, hierarquia [...]). A atividade formativa do sentido conduz a uma determinada estrutura semântica da própria consciência. [...] A fala produz mudanças na consciência. “A fala é um correlato da consciência, não do pensamento." “O pensamento não é uma porta pela qual a fala penetra na consciência” (L.S.) (VIGOTSKY, 1934, p. 129, tradução nossa)21.

21 “La conciencia en su conjunto tiene estructura semántica. […] En la conciencia surgen conexiones semánticas (la vergüenza, el orgullo, la jerarquía... […].) La actividad formativa del sentido conduce a una determinada estructura semántica de la propia conciencia. […] El habla produce cambios en la conciencia. “El habla es un correlato de la conciencia, no del pensamiento”. “El pensamiento no es una puerta a través de la cual penetra el habla en la conciencia” (L.S.) (VIGOTSKY, 1934, p. 129).

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Na verdade, o pensamento e a linguagem são instrumentos da consciência e

constituem os meios necessários para a sua formação. E, sendo socialmente

determinados, consequentemente essa consciência não é produzida a partir do

homem individual, ela é produzida socialmente, portanto, a consciência do homem

individual é também social, produto dessa relação.

A análise do produto da tarefa ou da atividade exige, por sua vez, uma análise

das condições pessoais e das condições da situação que o sujeito está enfrentando,

pois do cotejamento entre o que a situação exige e quais as condições pessoais do

sujeito, dependerá a decisão de qual objeto, ou comportamento será necessário para

atender à demanda imposta pela tarefa.

Algumas dessas condições são aparentes, captadas pela percepção

diretamente, como por exemplo, a necessidade do uso do guarda-chuvas em meio a

um temporal. Entretanto, outras condições são ocultas como a previsão de um

temporal, que levaria à opção por levar um guarda-chuva, ainda que não estivesse

chovendo. Portanto, analisá-las é parte do trabalho da consciência, isto é, a análise

do produto das tarefas que constituirão o objeto e o motivo da atividade.

A atividade consciente do homem não pode tomar como orientação a impressão imediata da situação exterior e sim um conhecimento mais profundo das leis interiores dessa situação, razão por que há todo fundamento para afirmar-se que o comportamento humano, baseado no reconhecimento da necessidade, é livre (LURIA, 1979a, p. 72).

Ao observar um elemento qualquer da realidade pela primeira vez, a percepção

o capta naquela situação particular de forma imediata. Significa que a análise da

situação exige que se supere o aparente, desvelando-o e compreendendo o que está

por trás da situação, buscando seus nexos internos. Esse é o processo do

pensamento teórico, que liberta o homem, na medida em que esse homem deixa de

ser cativado pelo aparente. Ao reconhecer a necessidade o homem pode optar se vai

ou não buscar o objeto que a satisfaz, por isso é considerado livre.

Davidov (1992)22 para analisar o processo de formação de conceitos apoia-se

em Vigotski, e destaca que a generalização representa a realidade de um modo

diferente daquele captado diretamente por meio da percepção. No processo de

22 “Tradução do italiano por José Carlos Libâneo do texto “II problema dela generalizzazione e del concetto nella teoria di Vygotskij”. Studi di Psicologia dell educazione, vol. 1, 2, 3.1995. Colaboração na revisão da tradução de Lélis Dias Parreira.”

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formação dos conceitos, Vigotski propõe três fases básicas, o amontoado sincrético,

o pensamento por complexos e o conceito, sendo que cada um divide-se em vários

estágios ou tipos básicos.

A primeira fase da formação de conceitos, corresponde ao amontoado

sincrético e caracteriza-se pela agregação desorganizada ou agrupamento de objetos

isolados instáveis, consequentes a uma percepção desarticulada da ação e das

imagens de objetos desiguais. A criança ouve determinada palavra, mas não a

conceitua como o adulto, apenas a relaciona com a imagem do objeto em sua mente,

sem sentido e significado.

As palavras resultam em um amontoado vago de objetos desiguais,

correspondendo a fatores da percepção da criança que são irrelevantes. Nessa fase,

ainda não existem significados estáveis, ou seja, a criança vai “experimentando”

aleatoriamente os significados que está se apropriando e observa qual o resultado

quando os utiliza.

A criança pequena, por volta de um ano, um ano e meio, utiliza uma linguagem

própria em que ela observa e repete os movimentos da boca do adulto e aparecem

pedaços de palavras. Essa “pseudo fala” imita a linguagem dos adultos, e é

compreendida apenas por quem cuida dela mas ainda não é a linguagem dos adultos.

Nessa fase, que demora cerca de um ano, não há significado, pois não há

estabilidade. Pode-se considerar, portanto, que ainda não há a palavra. Mas,

pensando dialeticamente, começa a haver “protosignificados”, quer dizer que ela usa

a palavra e observa se o resultado que obtém satisfaz sua necessidade no momento.

Trata-se de um uso aleatório, mas que aos poucos vai adquirindo estabilidade

(SACCOMANI, 2019).

Essa primeira fase divide-se em três estágios: o primeiro caracteriza-se pelo

agrupamento por tentativa e erro de objetos desiguais sem fundamento e

direcionamento, sem signo e sem significado para a criança. Nesse momento, a

criança percebe mas não discrimina o objeto e ocasionalmente o relaciona com uma

imagem instável, baseando-se em significados artificiais da palavra, suposições ou

tentativas no desenvolvimento do pensamento.

No segundo estágio dessa primeira fase, a criança apoia-se na organização do

seu campo visual, e agrupa os objetos utilizando critérios puramente sincréticos,

formando grupos com elementos isolados, perceptíveis por alguma relação. E no

terceiro estágio, os elementos tirados de grupos diferentes são recombinados.

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Portanto, nesse terceiro subtipo, destaca-se a coerência da incoerência, ou seja, a

simples agregação dos amontoados ainda sincréticos. Trata-se do nível mais

incipiente:

[...] a “conexão desconexa” do amontoado de objetos reagrupados sem um fundamento suficiente, segundo uma impressão casual que às vezes apanha, mas frequentemente[sic] não apanha, algum nexo objetivo destes objetos (reagrupamento efetuado sobre uma pura contiguidade espacial externa, na base de uma característica saliente, etc.) (DAVIDOV, 1992, p. 2).

Vigotski chama de “pensamento por complexos”, a segunda fase da formação

de conceitos. Nela, o pensamento avança e a criança consegue relacionar

características do objeto que de fato existem, agrupando-as. Inicia-se o processo de

relação entre os objetos no nível mais elevado de aquisição. “O pensamento por

complexos já constitui um pensamento coerente e objetivo, embora não reflita as

relações objetivas do mesmo modo que o pensamento conceitual” (VYGOTSKY,

1987, p. 53).

Corresponde à junção de alguns elementos que fazem parte do objeto que está

sendo conceituado. Esses elementos são captados conforme a experiência sensível

imediata, e agrupados de acordo com alguns nexos, que não são suficientes para

caracterizar o objeto conceituado e mudam continuamente. A representação verbal

apresenta-se em um nível primário, diz respeito conceitualmente a alguma

característica tomada como referência nas situações práticas em que o objeto

conceituado se apresenta. Neste nível raciocina-se por afinidade, há organização de

elementos discretos, constituindo a base para as próximas generalizações, porém há

dificuldades para pensar adversativamente.

[...] um complexo é, antes de mais nada, um agrupamento concreto de objetos unidos por ligações factuais. Uma vez que um complexo não é formado no plano do pensamento lógico abstrato, as ligações que o criam, assim como as que ele ajuda a criar, carecem de unidade lógica; podem ser de muitos tipos diferentes. [...] enquanto um conceito agrupa os objetos de acordo com um atributo, as ligações que unem os elementos de um complexo ao todo, e entre si, podem ser tão diversas quanto os contatos e as relações que de fato existem entre os elementos (VYGOTSKY, 1987, p. 53).

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Mas o pensamento por complexos apresenta um avanço: “A principal função

dos complexos é estabelecer elos e relações. O pensamento por complexos dá início

à unificação das impressões desordenadas” (VYGOTSKY, 1987, p. 66).

Vigotski subdivide essa fase em cinco tipos básicos de complexos. O primeiro

tipo, denominado associativo associa relações entre os objetos e designações de

algum traço (cores, nomes...). As ligações ocorrem entre os elementos do objeto por

contraste ou proximidade, portanto, são interligados por um elemento.

No segundo tipo, combinação de objetos ou coleções: ocorre o agrupamento

por características classificadas por cores, formas, tamanhos... formando coleções.

Entretanto, a criança começa a agrupar com um critério, mas ao longo do processo

de classificação, a criança passa a agrupar por outro, por isso o termo combinações.

Ela pode relacionar os objetos observados, de acordo com a sua experiência no uso

desses objetos. “[...] é um agrupamento de objetos com base em sua participação na

mesma operação prática”, associação por contraste e não por semelhança.

O terceiro tipo denomina-se complexo em cadeia e é “considerado como a

mais pura forma do pensamento por complexos” (VYGOTSKY, 1987, p. 55),

constituída nas relações entre elementos isolados, comuns que se fundem, ocorrendo

a transmissão de significados sem uma organização hierárquica. Isto porque, nesse

processo, ainda não há a abstração de elementos isolados de um determinado objeto,

o que acarreta infinitas alterações. Por exemplo, quando a criança relaciona o pato

com qualquer outra ave semelhante. O quarto tipo corresponde ao complexo difuso,

ou seja, complexos com impressões indefinidas, sem limites, vagas, irreais e instáveis,

caracterizado “[...] pela fluidez do próprio atributo que une os seus elementos. Grupos

de objetos ou imagens perceptualmente [sic] concretos são formados por meio de

conexões difusas e indeterminadas” (VYGOTSKY, 1987, p. 56).

O último tipo dentro da categoria dos complexos é o pseudo-conceito,

considerado por Vigotski como a ponte entre os complexos e o conceito: “o estágio

final e mais elevado do desenvolvimento da formação de conceitos” (VYGOTSKI,

1987, p. 57). Ainda é considerado um complexo, mas avança quanto ao entendimento

do significado do objeto. Envolve a transição e a ligação do pensamento por

complexos para a formação de conceitos.

Neste caso, o pensamento e a linguagem comum da vida cotidiana direcionam

o homem ao significado, e o signo verbal tem um “papel primário”, o qual une os

objetos que têm a mesma característica básica expressa nos fatos, ou representada

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pelo signo verbal: “[...] pelas características exteriores da generalização efetuada é

um conceito, mas pelo tipo de processo que a implica é um complexo” (DAVIDOV,

1992, p. 2).

Vigotski avança na distinção entre o complexo e o pseudo-conceito revelando

que, a utilização de um elemento comum, no complexo: a comunalidade - que

corresponderia à definição do conceito de acordo com a psicologia tradicional - já seria

considerado um conceito. Esse elemento comum mantém-se no pseudo-conceito.

Mas, na fase seguinte, “rompe-se a concretude das situações, e são

considerados elementos que vão para além da materialidade da experiência”

(DAVIDOV, 1992, p. 3), pois o conceito envolve uma nova síntese abstrata, alcançada

por operações intelectuais diferentes. Entretanto, no nível do pseudo-conceito ainda

não se estabelecem as suas relações recíprocas com outros conceitos que se referem

a ele.

Por exemplo, se em uma aula de Artes Visuais trabalha-se com a releitura da

“Monalisa del Giocondo” (“La Gioconda”, de Leonardo da Vinci), apoiada na

percepção visual, e se reconhece as diferentes reproduções da obra, tanto entre

alguns trabalhos discentes quanto em reproduções feitas por artistas, pode-se dizer

que há um reconhecimento visual dos traços utilizados na obra. Entretanto, se os

aspectos históricos-sociais que possibilitaram a elaboração da obra ainda não foram

apropriados, pode-se dizer que se trata de um pseudo-conceito. Os pseudo-conceitos

fazem parte da vida cotidiana.

Assim, o pseudo-conceito:

[...] desempenha um papel predominante no pensamento da criança na vida real, e é importante como um elo de transição entre o pensamento por complexos e a verdadeira formação de conceitos. [...] os complexos que correspondem ao significado das palavras não são desenvolvidos espontaneamente pela criança: as linhas ao longo das quais um complexo se desenvolve são predeterminadas pelo significado que uma determinada palavra já possui na linguagem dos adultos (VYGOTSKY, 1987, p. 58).

A próxima fase, a terceira da formação de conceitos, o conceito, vai além da

unificação, e tem como característica a análise dos objetos de forma abstrata “[...] unir

e separar: a síntese deve combinar-se com a análise” (VYGOTSKY, 1987, p. 66) é

obtida por meio da aplicação do método materialista histórico, o que significa

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compreender seu significado, situando-o historicamente, bem como as condições

materiais de sua produção e consumo. A

[...] unificação dos diversos objetos concretos se realiza sobre a base da afinidade máxima entre seus elementos. (Ibid., pág.169). [...] “Rompe-se aqui a concretude da situação, verifica-se a consideração dos elementos abstratos para além do nexo concreto factual no qual estão os dados na experiência” (Ibid., pág. 174). O conceito surge quando uma série de características abstratas vem mais uma vez sintetizadas. “...a síntese abstrata – escreve Vygotsky – torna-se a forma fundamental do pensamento pelo qual a criança obtém e conceitualiza a realidade (DAVIDOV, 1992, p. 176).

Para a formação de um conceito deve-se abstrair e sintetizar seus traços

concretos de forma a elaborar uma nova síntese que vai além do observável e que se

torna o principal instrumento do pensamento. Para o desenvolvimento desse

processo, a palavra é o veículo principal para ativar a atenção por meio de um signo,

e tem a função diretiva na formação de conceitos verdadeiros. Segundo Vigotski

(1934), um conceito se forma mediante uma operação intelectual. Assim,

A análise experimental do processo de formação de conceitos revela que o elemento fundamental e imprescindível de todo este processo é o uso funcional das palavras ou outros signos na qualidade de meios para direcionar ativamente a atenção, analisar e destacar os atributos, abstraí-los e sintetizá-los (VYGOTSKY, 1934, p. 130, tradução nossa)23.

Retomando o exemplo da Monalisa, significa compreender que essa obra

representa, historicamente, elementos como a transição do teocentrismo para o

antropocentrismo, o papel da obra de arte naquele momento histórico, os instrumentos

e técnicas de pintura então utilizadas: perspectiva, o “sfumato”24, o significado dos

elementos que aparecem na obra.

Portanto, Vigotski (1934) e Davidov (1992) reforçam a diferença entre os

conceitos: espontâneo ou comum, formado nas relações cotidianas, e conceito

científico, cujas relações exigem um processo pedagógico sistematizado para sua

23 “El análisis experimental del proceso de formación de conceptos revela que el elemento fundamental e imprescindible de todo ese proceso es el uso funcional de las palabras u otros signos en calidad de medios para dirigir activamente la atención, analizar y destacar los atributos, abstraes-los y sintetizarlos” (VYGOTSKY, 1934, p. 130). 24 “O sfumato é uma técnica artística usada para gerar suaves graduações entre as tonalidades, é comumente aplicado em desenhos ou pinturas. Vem do italiano ‘sfumare’, que significa ‘de tom baixo’ ou ‘evaporar como fumaça’” (IMBROISI, 2018).

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apropriação, em um nível que envolve a compreensão da dependência recíproca entre

o conceito que está sendo aprendido, e outros conceitos a ele reciprocamente

relacionados.

Assim, o domínio do particular sobre o geral, do concreto sobre o abstrato, é uma ordem particular típica do pensamento por complexos, e do desenvolvimento dos conceitos cotidianos. Essa relação se inverte no oposto, na estrutura da generalização de tipo diferente – na “generalização dos pensamentos” – ou seja, nos conceitos científicos, o geral domina sobre o particular (DAVIDOV, 1992, p. 6).

Vigotski (1934) destaca, no processo de formação de conceitos, a importância

das relações de comunalidade que, como esclarece Davidov (1992, p. 6),

correspondem à

[...] relação de conceitos, por assim dizer, na vertical. De acordo com a possibilidade de um através do outro (vegetal, flor, rosa). Dentro de uma estrutura de generalização (amontoados sincréticos, complexos, pseudo-conceitos, conceitos) pode haver comunalidade de tipo diferente, e em diferentes estruturas pode haver comunalidade de um mesmo tipo (DAVIDOV, 1992, p. 6).

Porém, Davidov (1992) chama a atenção para o fato de que Vigotski não quis

“[...] reduzir a riqueza das formas de pensamento a alguma característica particular

formal, segundo a qual todos os gatos são pardos [...]” (DAVIDOV, 1992, p. 6).

Portanto, o conceito científico em um nível superior de raciocínio, estabelece relações

a partir de relações, no nível do pensamento, articulando diferentes sistemas.

Pode-se refletir sobre a formação de um conceito qualquer, em outras etapas

da vida, tomando como base o desenvolvimento conceitual ora apresentado. Esse

mesmo processo de formação de conceitos se repete ao longo da vida, cada vez que

o sujeito está aprendendo um novo conceito.

Em uma primeira fase, o sujeito, que agora já tem o conceito de significado, vai

utilizando a palavra e lhe atribuindo um sentido. Essa palavra traz em si uma história,

seu significado é socialmente estabelecido.

Mas a apreensão dessa palavra ou conceito, passará pelas etapas de

amontoado sincrético, complexo e pseudo-conceito conforme esse sujeito for

utilizando essa palavra/conceito em suas relações sociais e sua consciência for

comparando, na vivência social, como esse conceito é compreendido. Ao mesmo

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tempo, ao utilizá-lo ou ouvir outro a expressá-lo, o sujeito vai se apropriando de novas

informações sobre esse conceito. Dessa forma, vai se alterando seu significado e seu

sentido, o qual não é cristalizado, e evolui conforme o sujeito se apropria de novos

conhecimentos relativos a esse conceito.

Portanto, um adulto pode apresentar um acervo conceitual no qual os conceitos

estarão em diferentes patamares de generalização, algumas palavras corresponderão

a amontoados sincréticos enquanto outras podem expressar verdadeiros conceitos.

Assim, propõe-se o uso dos critérios apresentados por Vigotski e Davidov, ora

expostos, para descrever o processo de elaboração de conceitos, como base para

subsidiar a análise dos conceitos de desenvolvimento do psiquismo e funções

psicológicas superiores, expressos pelos professores de Arte, na presente pesquisa.

Outro aspecto importante a ser considerado, quando se trata de expressões

artísticas e se pensa no ensino da Arte, articula-se a outra importante função

psicológica superior: a imaginação ou criação25, a qual será discutida a seguir.

2.2 O PROCESSO CRIATIVO

Por meio da linguagem o homem imagina e cria situações a partir de elementos

da realidade e das experiências anteriores. Vigotski (1998) considera, como tarefa de

criação,

[...] qualquer atividade humana geradora de algo novo, sejam reflexos de algum objeto do mundo exterior, ou de certas construções do cérebro, ou de sentimentos que vivem e se manifestam apenas no ser humano (VIGOTSKI, 1998, p. 2, tradução nossa)26.

Trata-se, portanto, tanto da produção de uma obra de arte, quanto dos

pequenos atos cotidianos, mesmo que sejam apenas reflexos no pensamento

referentes a objetos, sentimentos ou processos do dia a dia.

25 Segundo (VIGOTSKI, 2009, p. 16) “[...] a criação é condição necessária da existência, e tudo que ultrapassa os limites da rotina, [...] deve sua origem ao processo de criação do homem. Ainda, [...] o homem imagina, combina, modifica e cria algo novo[...] “(VIGOTSKI, 2009, p. 15). “É o que chamamos de atividade criadora e se refere a “toda atividade do homem que tem como resultado a criação de novas imagens ou ações, e não a reprodução de impressões ou ações anteriores da sua experiência” (VIGOTSKI, 2009, p. 13). 26 “Llamamos tarea creadora a toda actividad humana generadora de algo nuevo, ya se trate de reflejos de algún objeto del mundo exterior, ya de determinadas construcciones del cerebro o del sentimientos que viven y se manifiestan únicamente en el ser humano” (VIGOTSKY, 1998, p. 2).

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Vigotski (1998, p. 2) destaca que essa função criadora apoia-se na “plasticidade

de nossa substância nervosa”, e pode ocorrer de duas formas: a primeira, por ele

considerada como reprodutiva, refere-se à reprodução de condutas já criadas e

fixadas anteriormente na memória. Não envolve a criação de algo novo, sua base é a

repetição daquilo que já existe. Nas palavras do autor, essa função:

[...] costuma estar intimamente ligada à nossa memória, e sua essência reside no fato de o homem reproduzir ou repetir normas de conduta previamente criadas e elaboradas ou reviver vestígios de antigas impressões[...] repetir com maior ou menor precisão algo já existente. (VIGOTSKI, 1998, p. 2, tradução nossa)27.

Outro gênero de atividade proposto por Vigotski (1998; 2009) denomina-se

criadora ou combinatória, refere-se à criação de novas imagens ou ações envolvidas

nas impressões anteriores da memória. Essas impressões são combinadas e

reelaboradas, para criar uma atividade nova. Com referência à experiência anterior,

não se está apenas restaurando as marcas de excitações que estavam na memória,

pois cria-se uma nova ideia, ou um novo quadro, nunca visto anteriormente.

Toda atividade humana que não se limite a reproduzir eventos ou impressões vividas, mas crie novas imagens, novas ações, pertence a esta segunda função criadora ou combinatória. O cérebro [...] é um órgão combinador e criador; capaz de reelaborar e criar novas normas e abordagens com elementos de experiências anteriores.[...] É justamente a atividade criativa do homem que o torna um ser projetado para o futuro, um ser que contribui para criar e que modifica seu presente (VIGOTSKY, 1998, p. 3, tradução nossa)28.

Neste segundo tipo, o cérebro além de memorizar informações, conserva,

combina, reorganiza, reelabora de forma criadora com base em elementos da

experiência anterior, produzindo novos comportamentos e situações.

27 “[...] que suele estar estrechamente vinculado con nuestra memoria, y su esencia radica en que el hombre reproduce o repite normas de conducta creadas y elaboradas previamente o revive rastros de antiguas impressiones [...] repetir con mayor o menor exactitud algo ya existente” (VIGOTSKY, 1998, p. 2). 28 “Toda actividad humana que no se limite a reproducir hechos o impresiones vividas, sino que cree nuevas imágenes, nuevas acciones, pertenece a esta segunda función creadora o combinadora. El cerebro [...] también es un órgano combinador, creador; capaz de reelaborar y crear con elementos de experiencias pasadas nuevas normas y planteamientos. [...] Es precisamente la actividad creadora del hombre la que hace de él un ser proyectado hacia el futuro, un ser que contribuye a crear y que modifica su presente” (VIGOTSKY, 1998, p. 3).

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Na verdade, a imaginação, base de toda atividade criadora, manifesta-se, sem dúvida, em todos os campos da vida cultural, tornando também possível a criação artística, a cientifica e a técnica. Nesse sentido, necessariamente, tudo o que nos cerca e foi feito pelas mãos do homem, todo o mundo da cultura, diferentemente do mundo da natureza, tudo isso é produto da imaginação e da criação humana que nela se baseia (VIGOTSKI, 2009, p. 14).

Na psicologia, essa atividade criadora é denominada imaginação ou fantasia.

O homem cria a partir do que tem na memória. Por isso, não se pode considerar

somente as criações dos grandes gênios da história, toda combinação do velho com

o novo é caracterizada como criação, assim muitas delas são anônimas: “[...] a

criação, na verdade, não existe apenas quando se criam grandes obras históricas,

mas por toda parte em que o homem imagina, combina, modifica e cria algo novo [...]”.

Criar é, portanto, uma função vital necessária e qualquer objeto da vida cotidiana, é

“imaginação cristalizada” (VIGOTSKI, 2009, p. 15).

Vigotski (2009), ao se referir à relação entre imaginação e realidade, destaca

que cada período do desenvolvimento humano possui características próprias, não

existindo comportamento humano isolado ou descolado das experiências e vivências

de seu autor. A atividade de imaginação ou criação pode relacionar-se com a realidade

de quatro formas principais, descritas a seguir.

A primeira forma da Atividade de Imaginação ou Criação envolve as criações

construídas a partir de elementos da realidade e experiências anteriores. Sejam

criações fantásticas ou simples, são elaboradas com impressões da realidade. Esse

tipo de criatividade está no cotidiano, no próprio existir: “[...] toda obra da imaginação

constrói-se sempre de elementos tomados da realidade e presentes na experiência

anterior da pessoa” (VIGOTSKI, 2009, p. 20). Nesse caso:

[...] a atividade criadora da imaginação depende diretamente da riqueza e da diversidade da experiência anterior da pessoa, porque essa experiência constitui o material com que se criam as construções da fantasia. Quanto mais rica a experiência da pessoa, mais material está disponível para a imaginação dela (VIGOTSKI, 2009, p. 22).

Apoia-se, portanto, na memória. Quanto mais oportunidades, quanto maior a

diversidade e o número de experiências a criança tiver, maiores serão suas

possibilidades de imaginação e criação, “lei” - como é chamada por Vigotski - da qual

decorre importante orientação ao processo pedagógico.

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60

A segunda forma de relação entre a imaginação e a realidade ocorre quando a

atividade de criação envolve um produto final da imaginação de outrem o qual

representa algum fenômeno complexo da realidade. Esses produtos finais são

reelaborações criadas por outras pessoas – como um conto, ou um quadro por

exemplo – e dependem da experiência anterior dessa outra pessoa. São, em si,

produto da fantasia de alguém, mas se relacionam com um fenômeno real,

representam esse fenômeno real, que passará a fazer parte da experiência dessa

outra pessoa que pode até desconhecer esse fenômeno, mas que o imagina a partir

desse produto final alheio.

Neste segundo caso, a imaginação é ampliada com o auxílio de outros, que

permitem ao indivíduo imaginar algo que não viu, e incorporar esse produto à própria

experiência, ampliando-a. Esse tipo de imaginação é muito importante nas aulas de

Arte, uma vez que possibilitará a ampliação das experiências do aluno, por meio da

apropriação das experiências trazidas pelo professor.

Destaca-se que há, portanto, uma relação recíproca entre imaginação e

experiência. No primeiro caso a experiência possibilita a imaginação e no segundo

caso, a imaginação possibilita a experiência (VIGOTSKI, 2009).

A terceira forma é de caráter emocional. A relação entre imaginação e emoção

pode manifestar-se de dois modos: ou uma determinada emoção provoca ideias,

imagens, ou sensações corporais novas; ou, ao contrário, cria-se uma obra que

envolve a imaginação, a qual posteriormente provocará uma emoção, isto é, as

imagens criadas pela fantasia provocam sentimentos.

As imagens e as fantasias propiciam uma linguagem interior para o nosso sentimento. O sentimento seleciona elementos isolados da realidade, combinando-os numa relação que se determina internamente pelo nosso ânimo, e não externamente, conforme a lógica das imagens (VIGOTSKI, 2009, p. 26).

Isso significa que imagens diferentes, que têm a mesma marca afetiva, podem

ser relacionadas por provocarem um mesmo tipo de sentimento, ou influências

emocionais semelhantes. Ou, inversamente, a realidade emocional pode influenciar

na forma como o ser humano percebe as imagens da realidade.

Assim, obras de arte criadas pela imaginação, podem provocar emoções

profundas e verdadeiras – como se envolvessem fatos reais – ainda que sejam

criações humanas, como a música, uma peça de teatro ou um filme. É importante que

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61

se reflita, retomando o objeto desta dissertação, sobre a possibilidade de nas aulas

de Arte, o professor oportunizar aos alunos sentirem essa emoção, por meio de

músicas, filmes, pinturas, esculturas, ampliando o processo de humanização do aluno.

A quarta forma de relação entre fantasia e realidade está na construção de uma

fantasia totalmente nova, sem relação com a realidade atual ou com experiências

anteriores, expressando algo que nunca aconteceu. No entanto, essa fantasia é tão

persuasiva e ágil, e se materializa de tal forma que se torna “[...] tão real quanto as

demais coisas e passam a influir no mundo real que a cerca” (VIGOTSKI, 2009, p. 29).

Nesse caso, ainda que essa criação tenha se formado inicialmente com

elementos advindos da realidade, foram reorganizados de forma tão complexa, que

se tornaram produtos da imaginação. “Finalmente ao reencarnarem retornam à

realidade, mas já como uma nova força ativa que a modifica. Assim é o círculo

completo da atividade criativa da imaginação” (VIGOTSKI, 2009, p. 29).

Porém, há que se ter em conta que pensamento e emoção caminham juntos,

embora um ou outro possa preponderar. Assim, a função de criação, articulando

pensamento e emoção, considera as percepções externas e internas apropriadas pelo

homem no decorrer de sua existência, com base em suas experiências. O homem cria

e/ou constrói fantasias a partir do que vê, ouve e vivencia, acumula e futuramente

transforma em algo novo ou simplesmente reproduz o que está em sua memória, de

qualquer forma, em sua existência, a função de criação é fundamental para sua

sobrevivência e sua vivência.

Vigotski (2009) destaca alguns fatores psicológicos na atividade criadora que

envolve os desafios da vida como os estímulos para criação e a ressurreição das

imagens. O homem se adapta ao meio, surgem necessidades que são memorizadas,

ou que ele imagina e consequentemente cria novas formas de adaptação no contexto

em que interage, por meio das experiências, as quais ele também memoriza. Por fim,

a base da criação, da atividade criadora está na necessidade e no interesse, nos

anseios e desejos que possibilitam criar novas condições e possibilidades de

transformações.

Assim, considera-se fundamental a experiência histórico-social, os materiais e

os instrumentos disponíveis em uma determinada época ou contexto histórico, para

os processos de criação e de imaginação. Quanto mais condições sociais,

econômicas e culturais tanto maiores as possibilidades de criação. Destaca-se, aqui

a importância, na escola pública, de que o professor de Arte busque ampliar as

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62

condições culturais para apropriação do conhecimento científico pelo aluno. Na

medida em que esse acesso é democratizado, o aluno, melhor preparado, terá mais

possibilidades de inserção e transformação da realidade.

Qualquer inventor, mesmo um gênio, é sempre um fruto de seu tempo e de seu meio. Sua criação surge de necessidades que foram criadas antes dele e, igualmente, apoia-se em possibilidades que existem além dele. [...] A criação é um processo de herança histórica em que cada forma que sucede é determinada pelas anteriores (VIGOTSKI, 2009, p. 42).

Enfim, ao trazer essas reflexões sobre a linguagem e criação, importantes

funções humanas, diretamente envolvidas na disciplina de Arte, mais uma vez,

retoma-se a concepção de totalidade do desenvolvimento psíquico. Ressalta-se que

as funções psicológicas superiores atuam como um conjunto amalgamado, embora

por questões didáticas tenha-se selecionado e refletido sobre aquelas mais

relacionadas às manifestações e fruições artísticas.

A partir da concepção de desenvolvimento psíquico e de sua relação com as

funções psicológicas superiores apresentada nos capítulos 1 e 2, apresenta-se no

capítulo que segue, na perspectiva da Teoria Histórico-Cultural, a relação entre a arte

e o psiquismo humano.

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3 ARTE E DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO

Este capítulo objetiva desvelar qual a compreensão da Teoria Histórico-Cultural

quanto à importância da arte na vida cotidiana e no desenvolvimento do psiquismo

humano. Entende-se que essa compreensão é fundamental ao professor da disciplina

de Arte, uma vez que a arte é um de seus objetos de trabalho, e possibilitar ao aluno

a fruição de uma obra artística, em qualquer de suas expressões é um de seus

objetivos pedagógicos.

Ao considerar a evolução da história constata-se que, desde os primórdios, o

homem sente a necessidade psíquica de criar, alterando a realidade material,

apropriando-se da consciência, isto é, da possibilidade de buscar formas de

transformação da natureza para sobreviver e analisar o resultado de seu trabalho na

relação com a satisfação das suas necessidades.

No início, a atividade criadora surge pela necessidade imediata de

sobrevivência. Entra aí a criação de ideias, transformando a realidade, a natureza e o

próprio homem por meio da atividade do trabalho, provocando modificações na

realidade e no indivíduo.

Em determinados períodos históricos, no trabalho pesado dos trabalhadores

utilizava-se a arte com o objetivo de incentivar e motivar por meio da música e da

poesia. Assim, o trabalho exaustivo tornava-se mais leve e alegre, de forma a que os

homens o suportassem.

A arte, deste modo, surge inicialmente como o mais forte instrumento na luta pela existência, e não se pode admitir nem a idéia [sic] de que o seu papel se reduza a comunicar sentimentos e que ela não implique nenhum poder sobre esse sentimento (VIGOTSKI, 1999, p. 310).

Vigotski (1999) defende que a arte – como um conjunto de signos estéticos que

tem o objetivo de acender emoções humanas ao apreciá-la – apenas será

compreendida a partir do momento em que as pessoas não a apreciarem somente

por esses aspectos (VIGOTSKI, 1999, p. 73), e buscarem “revelar e explicar o

conteúdo psicossocial historicamente mutatório da arte e a escolha do tema, do

conteúdo ou do material condicionado àquele conteúdo” (VIGOTSKI, 1999, p. 79).

Portanto, Vigotski ressalta a arte como um instrumento na luta pela existência,

destacando que sua contribuição extrapola a comunicação de um sentimento, ou seja,

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64

a promoção de alegrias ou tristezas individuais. Do ponto de vista materialista

histórico, a arte nasce na sociedade e serve à sociedade, o artista cria para o coletivo.

Mas, no decorrer da história, a arte adquiriu diferentes interpretações na

sociedade capitalista. Peixoto (2003) destaca três interpretações de acordo com o

marxismo contemporâneo: a arte como ideologia, a arte como conhecimento e a arte

como criação.

Em relação à arte como ideologia, a partir da sociedade dividida em classes,

prevalece a arte individualizada atendendo aos interesses específicos de uma classe

dominante, que não valoriza a arte como trabalho criador considerando-a como

mercadoria.

A arte como conhecimento caracteriza-se por revelar aspectos da realidade. O

artista produz a partir das características reais e essenciais do seu contexto

ideológico, mas não faz a reflexão artística histórica e social sobre essa realidade.

Quando apenas representa uma cópia, não cria uma nova realidade, que se constitua

como uma forma de conhecimento, não é arte como conhecimento. De acordo com

Vázquez (1978, p. 36), “A arte só é conhecimento na medida em que é criação. Tão

somente assim pode servir à verdade e descobrir aspectos essenciais da realidade

humana”.

Na perspectiva da arte como criação ou trabalho criador considera-se a arte

como ideologia e conhecimento, destacando, como diferencial, o potencial de criação

do artista que traz a inovação, o inédito. O artista cria a partir de seu contexto histórico-

social. Em sua obra recupera a totalidade do seu eu criador e sua obra exprime a

identidade entre produtor e produto, no plano subjetivo e objetivo. Portanto, o homem

ao criar sua obra, o faz de modo dialético construindo o mundo e a história, e sendo

por eles construído (PEIXOTO, 2003).

Barroco (2007) entende que admitir a relevância da história e o seu movimento

é conhecer o homem e suas criações e consequentemente o desenvolvimento das

funções psicológicas superiores e das potencialidades humanas. A observação das

produções artísticas, a partir do artista criador, revela como ele se retrata. “Tudo

consiste em que a arte sistematiza um campo inteiramente específico do psiquismo

do homem social – precisamente o campo do seu sentimento” (VIGOTSKI, 1999, p.

12).

Trata-se, não de um homem criador, o artista individual, e sim de um homem

social, o qual representa um contexto social e histórico. É o que Superti, Cruz e

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65

Barroco (2011) denominam homem cultural, cuja formação humana ocorre no

processo de sua história social, suas experiências ao longo da vida, na qual se

desenvolvem a atividade criadora e a linguagem, possibilitando-lhe perceber, analisar,

sintetizar e generalizar informações e, sobre elas, elaborar novos conhecimentos que

retornem à prática social, modificando-a.

Dessa forma, como considera Vigotski, a arte é uma forma de conhecimento:

“A arte difere da ciência apenas pelo seu método, ou seja, pelo modo de vivenciar,

vale dizer, psicologicamente” (VIGOTSKI, 1999, p. 34), a realidade. A arte diferencia-

se da ciência pelas características das imagens, vivências psicológicas, pensamento

e emoções que são representadas em um conjunto de signos estéticos com a função

de provocar emoções e sentimentos nas pessoas.

Mas, é necessária uma análise científica da arte, o que significa ter consciência

sociológica e histórica da obra artística no estudo de suas formas e de suas relações

com os fenômenos da vida social. Isso exige considerar a arte, historicamente atrelada

e articulada às diferentes esferas da vida social.

[...] a arte só poderá ser objeto de estudo científico quando for considerada uma das funções vitais da sociedade em relação permanente com todos os outros campos da vida social e no seu condicionamento histórico concreto (VIGOSTKI, 1999, p. 9).

Duarte (2016) cita Lukács quando analisa a relação entre a arte e a ciência, as

quais mostram de maneiras diferentes a mesma realidade. Trata-se do psiquismo

humano na busca de refletir o concreto sob a gênese histórica da atividade do

trabalho, considerando que a realidade e o pensamento estão sempre em

transformação.

O reflexo artístico também se volta para a natureza e para a sociedade, mas seu objeto é sempre, em última instância, a relação entre o ser humano e esse objeto. Nesse sentido, as artes são, segundo Lukács, antropomórficas. No seu centro estão os seres humanos, as relações entre si e com o mundo, suas formas de percepção, seus sentimentos, seus conflitos, dramas etc. (DUARTE, 2016, p. 75).

A transformação da realidade, a partir da fruição da arte, decorre do processo

de transformação da consciência do sujeito ao observar uma criação artística. Na

medida em que esse sujeito entende o processo e os meios de criação, bem como a

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66

intencionalidade da obra, pode sensibilizar-se de forma a se apropriar da essência

dessa obra e compreender as relações da realidade sócio-histórica que interferiram

na sua produção artística, interpretando-a e sensibilizando-se. Dialeticamente, poderá

sensibilizar-se diante da própria realidade, agora transformada por esse novo olhar.

Vigotski (1999) discute a relação entre a reação estética e o comportamento

humano, nas diversas manifestações artísticas, concebendo a criação humana como

uma necessidade do psiquismo, seja na literatura, poesia, fábula, novela, poema,

tragédia, pintura, escultura, música, teatro ou comédia, enfim em qualquer forma de

expressão humana.

“Em toda criação humana há emoções” (VIGOTSKI, 1999, p. 37), o homem ao

criar ou ao interagir com a obra artística, sente algo definido como emoção, que se

manifesta de diversas formas: emoções de dor, tristeza, compaixão, indignação,

condolência, comoção, horror, etc.

A percepção da arte como ponto de partida para a interpretação da obra,

começa pela emoção provocada pela forma, envolvendo as operações intelectuais

que surgem em cada um a partir da obra observada. “[...] não só interpretamos de

modo diferente as obras de arte como as vivenciamos de maneira também diferente”

(VIGOTSKI, 1999, p. 48). As emoções provocadas no homem ao analisar uma obra

artística, em qualquer período histórico, dependerão da realidade vivenciada.

“A obra de arte é vista naturalmente [...] como um sistema de estímulos,

organizados consciente e deliberadamente com vistas a suscitar uma resposta

estética” (VIGOTSKI, 1999, p. 26). A reação estética refere-se à emoção ou

sentimento que a obra artística provoca no homem e atende a uma necessidade

psíquica de catarse, que funciona como um curto-circuito cerebral, ou seja, envolve

uma complexa transformação dos sentimentos, quando o homem entende essa obra.

[...] a lei da reação estética é uma só: encerra em si a emoção que se desenvolve em dois sentidos opostos e encontra sua destruição no ponto culminante, como uma espécie de curto-circuito (VIGOTSKI, 1999, p. 270, grifo do autor).

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Vigotski (1999) define esse processo de catarse29 como a transformação e

descarga das emoções na qual o consumo ou descarga de energia nervosa constitui

a essência de todo o sentimento.

Poderíamos dizer que a base da reação estética são as emoções suscitadas pela arte e por nós vivenciadas com toda realidade e força, mas encontram a sua descarga naquela atividade da fantasia que sempre requer de nós a percepção da arte. Graças a esta descarga central, retém-se e recalca-se extraordinariamente o aspecto motor externo da emoção, e começa a nos parecer que experimentamos apenas sentimentos ilusórios. É nessa unidade de sentimento e fantasia que se baseia qualquer arte (VIGOTSKI, 1999, p. 272).

A arte, nesse ponto de vista, é considerada como o veículo adequado para

obter o equilíbrio individual ou coletivo, podendo funcionar como uma descarga do

excesso de energias emocionais, favorecendo esse equilíbrio, pois “todo o nosso

comportamento não passa de um processo de equilíbrio do organismo com o meio”

(VIGOTSKI, 1999, p. 311).

Dessa forma, em concordância com Vigotski (1999), compreende-se que a arte

atua como reguladora do comportamento individual, estabelecendo um processo de

equilíbrio na relação com a realidade, em meio a situações críticas enfrentadas pelo

homem em suas relações sociais na luta pela sobrevivência. Assim a arte provoca

[...] uma descarga indispensável de energia nervosa e um procedimento complexo de equilíbrio do organismo e do meio nos momentos críticos do nosso comportamento. Só nos pontos críticos da nossa caminhada nós nos voltamos para a arte, e isto nos permite entender por que a fórmula que propomos desvela a arte exatamente como ato criador (VIGOTSKI, 1999, p. 313).

Vigotski (1999) ressalta o papel da arte nos momentos difíceis da vida, na

medida em que a descarga de energia nervosa, como efeito da obra de arte, envolve

parte dos sentimentos vitais. Apoia-se em Pliekhánov para afirmar que na arte ocorre

“[...] certa antítese, de que na arte supera-se certo aspecto do nosso psiquismo que

não encontra vazão na nossa vida cotidiana” (VIGOTSKI, 1999, p. 308).

29 Como exemplo, “a sensação musical [...] compõe esquemas amplificadores ao que envolve regiões integrativas do cérebro, desde a cóclea até as áreas pré frontais, aí incluída a participação subcortical do hipocampo-memória, bem como os centros límbicos de recompensa: amígdala, septo e núcleos accumdems, facilitadores de transmissão de neuro transmissores como a dopamina, serotonina, noripimefrina e endorfina, cujos efeitos pode levar à alegria, felicidade e ao êxtase. O canto e o manejo de instrumento permite o indivíduo extravasar afetos, emoções e sentimentos” (ANTUNHA, 2010).

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Vigotski (1999, p. 308) critica que a arte atue sobre o psiquismo humano

simplesmente por contágio, e a considera “bem mais complexa e diversa” indo além

da transmissão de sentimentos. “Veremos que essa elaboração consiste na catarse,

na transformação desses sentimentos em sentimentos opostos, nas suas soluções”

(VIGOTSKI, 1999, p. 309), o que vai além da simples antítese.

Vigotski (1999) retoma, ainda, a expressão catarse psicofísica utilizada por

Aristóteles ao referir-se ao drama, e sugere que há um sentido biológico no princípio

psicofísico que serve de base à arte, pois “[...] a arte resolve e elabora aspirações

extremamente complexas do organismo” (VIGOTSKI, 1999, p. 309). E considera que

a análise da origem da arte, permite compreender seu verdadeiro papel e função, uma

vez que historicamente a música e a poesia surgem, em princípio, do pesado trabalho

físico, objetivando resolver pela catarse a pesada tensão no trabalho pesado coletivo,

para, inconscientemente, “[...] exercitar e ordenar a força dos músculos e do cérebro”

(VIGOTSKI, 1999, p. 309).

Barbosa (2019) destaca, quanto ao potencial catártico, que a música, sendo

uma criação humana, é capaz de desenvolver a elaboração superior da consciência,

sua transformação qualitativa. Como afirma Vigotski (1999, p. 317), “A música me

obriga a esquecer a mim mesmo, a minha verdadeira situação, ela me transporta para

alguma outra situação, estranha a mim [...]”. Trata-se, portanto, de promover a

reelaboração dos sentimentos, isto é, uma forma superior de compreender a vida. A

compreensão leva à ação, e a ação pode transformar a realidade.

A catarse envolve, portanto, ações com efeitos sociais, agindo como

purificadora de comoções, emoções e sentimentos,

[...] que constitui a essência de todo sentimento, realiza-se nesse processo em sentido oposto ao habitual, a arte assim se transforma em um poderosíssimo meio para atingir as descargas de energia nervosa mais úteis e importantes (VIGOTSKI, 1999, p. 270).

Ressalta-se assim, a relevância social da arte na vida, na medida em que

provoca e altera inúmeros sentimentos e emoções. Vigotski (1999) também traz a

música como exemplo, a qual ao provocar uma emoção estética, age sobre o fruidor

de modo excitante, transporta seus sentimentos para outros lugares, motiva para algo

indefinido, provoca momentos de catarse, de libertação e transformação de

sentimentos mais íntimos e importantes já existentes no sujeito para sentimentos

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novos, purificando o psiquismo - isto é, possibilitando que elementos inconscientes

reprimidos e recalcados venham à consciência - permitindo ao sujeito incorporá-los

ao ciclo da vida social. Dessa forma, a arte

[...] age simplesmente de modo catártico, ou seja, elucidando, purificando o psiquismo, revelando e explodindo para a vida potencialidades imensas até então reprimíveis e recalcadas (VIGOTSKI, 1999, p. 319).

Para Vigotski (1999), um grande desafio para a psicologia da arte consiste em

compreender como o sentimento pode ser provocado pela imaginação que se articula

à atividade da fantasia.

Em arte a reação apenas começa pelo fato da percepção sensorial mas, evidentemente, não se conclui, e por isto se faz necessário não iniciar a psicologia da arte pelo campo que costuma operar com as emoções estéticas elementares, mas partindo de dois outros problemas do sentimento e da imaginação. Pode-se afirmar que a correta compreensão da psicologia da arte só surgirá no cruzamento desses dois problemas (VIGOTSKI, 1999, p. 249).

Vigotski (1999, p. 250) ressalta que “[...] para a psicologia moderna o mais

enigmático e problemático continua a ser a relação dos fatos emocionais com o campo

da fantasia”, ou seja, como as emoções estéticas são desencadeadas a partir do

sentimento e da imaginação.

A realidade fictícia que envolve a fantasia trazida na obra de arte, provoca

emoções como se essas fantasias fossem reais, mesmo a pessoa sabendo que não

o são. Esse encontro entre sentimento e fantasia na arte provoca um sentimento como

se fosse uma descarga elétrica, metáfora utilizada por Vigotski (1999) para explicar

que há uma energia psíquica represada no indivíduo, a qual pela vivência da arte, é

descarregada, trazendo certo conforto e alívio.

O sujeito desliga da realidade, entra no mundo da fantasia, vivenciando essa

realidade fictícia. Assim, a sensibilidade estética provocada pela arte age, no

espectador, como catarse, esse curto-circuito que envolve emoção e afeto, o

sentimento e a imaginação.

Schlindwein (2015) evidencia as qualidades vivenciais das emoções que

repercutem diretamente na atividade, na consciência e na personalidade da pessoa.

Uma formação que propicie a vivência estética provoca o estranhamento, a

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possibilidade de ressignificação da realidade e do acontecimento. Por isso, o fazer

artístico propicia à pessoa um trabalho completo, envolvendo o intelecto, os sentidos,

a emoção e os conhecimentos adquiridos.

Portanto, como Magiolino (2014) esclarece, a organização dramática do

psiquismo é um processo intrapsíquico que decorre das relações interpsíquicas, ou

seja, a forma como se vivem as emoções não é inata, é apropriada na interação social,

ratificando-se, portanto, a perspectiva histórico-cultural em detrimento da concepção

biológica e mecanicista.

Magiolino (2014) reitera que a emoção é algo interno e externo, é uma reação

humana, afetada pelas palavras ou signos, que apresentam aspectos conscientes e

inconscientes, expressando raiva, angústia, rancor, etc. Essa expressão possibilita

descarga de energia, uma perturbação fisiológica, sendo um processo dialético que

reflete uma realidade, um processo significativo de caráter unicamente humano.

Nesse processo de “organização dramática do psiquismo”, o sujeito vai se constituindo e suas emoções vão sendo (re) conhecidas e significadas. Esse processo é sempre constituído pela presença de um "outro", o que dá a dimensão intersubjetiva (social) da constituição desse sujeito e das próprias emoções (MAGIOLINO, 2014, p. 16).

Magiolino, nesta citação, toma como referência o fruidor, considerando que

quando o espectador a aprecia, a obra torna-se individual, não deixando de ser social,

uma vez que os critérios e emoções sentidas ao fruir uma obra artística são

apropriados primeiramente nas relações sociais, para então se tornarem

intrapsíquicos. No entanto, na perspectiva do artista criador, ao produzir uma obra de

arte, o artista usa e socializa seus sentimentos, emoções, afetos e vivências

apropriados socialmente.

Tudo em nós é social, mas isto não quer dizer, de modo algum, que as propriedades do psiquismo do indivíduo particular sejam, em sua totalidade absoluta inerentes a todos os demais integrantes de dado grupo (VIGOTSKI, 1999, p. 17-18).

Isso porque cada sujeito, integrante de um grupo social, ao mesmo tempo está

interagindo com outros grupos, e assim cada um dos outros membros desse mesmo

grupo original também tem vivências diversificadas, nos diferentes grupos dos quais

participa.

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Portanto, as condições sociais individuais são diversas entre os diferentes

sujeitos, e interferem tanto na elaboração da obra de arte, quanto em seu efeito.

Ocorre nesse processo a mesma relação que se observa em qualquer linguagem de

expressão. Tanto o artista criador quanto o apreciador fruidor não desaparecem, são

sujeitos no sentido de que um produz e o outro aprecia. Ambos estão presentes na

relação artística, com suas apreciações de acordo com suas experiências e vivências.

Trata-se de uma dialética entre o social e o individual.

A apreciação e fruição de uma determinada obra de arte possibilita ao homem

relacionar-se com as representações de mundo criadas pelo artista. De acordo com

Luria (1979d), ler uma obra de arte consiste em entender e interpretar o sentido da

obra, na elucidação dos motivos das personagens, dos artistas e a relação com os

fatos e acontecimentos da realidade.

No entanto, nem sempre a apreensão da essência da obra é reflexo da

intencionalidade do seu criador, uma vez que há sempre um componente individual

no fruidor, embora esse individual seja social.

Vigotski (1999) discute a relação entre a arte e a psicologia subjetiva que estuda

as emoções estéticas, ou seja, os sentimentos suscitados no homem ao apreciar a

obra de arte, os quais são complexos devido às particularidades do sujeito, que

envolvem gostos e desgostos. Indaga o porquê se gosta ou não de uma determinada

obra: “Tudo o que imaginamos para explicar o seu efeito vem a ser um artifício tardio,

uma racionalização ostensiva de processos inconscientes. A própria emoção continua

um enigma para nós” (VIGOTSKI, 1999, p. 18).

Frente aos desafios colocados pela situação enfrentada a cada momento, o

homem avalia suas condições pessoais e estabelece o que necessita para atender a

esses desafios. Suas condições pessoais amalgamadas às condições sociais, levam-

no a estabelecer gostos e conceitos estéticos.

Trata-se de uma relação dialética, na qual o gosto estético pessoal foi se

constituindo nessas relações sociais, mas reciprocamente sua apreciação estética

individual ao ser expressada está reverberando socialmente. Portanto, o homem pode

desenvolver gostos e conceitos estéticos, porém quais ele desenvolverá dependerá

das condições a ele possibilitadas em seu meio e experiências vivenciadas. Assim

“[...] se explica porque determinado homem social (isto é, dada sociedade, dado povo,

dada classe) tenha justamente esses e não outros gostos e conceitos estéticos”

(VIGOTSKI,1999, p. 10).

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De igual maneira, a arte é uma técnica social do sentimento, um instrumento da sociedade através do qual incorpora ao ciclo da vida social os aspectos mais íntimos e pessoais do nosso ser. Seria mais correto dizer que o sentimento não se torna social mas, ao contrário, torna-se pessoal, quando cada um de nós vivencia uma obra de arte, converte-se em pessoal sem com isto deixar de continuar social (VIGOTSKI, 1999, p. 315).

Então, subjetivamente, por meio da arte pode-se também vivenciar as emoções

do artista conforme sua visão de mundo, sua consciência histórica e social. Isso não

quer dizer que o artista expresse fielmente a realidade. Ele produz a obra de arte

conforme seu estilo e gênero artístico, expressando a relação entre seu produto e ele

próprio como produtor da obra, com o objetivo de transmiti-la para o coletivo. Ao fruidor

cabe a missão de interpretá-la com significados e sentidos, conforme a sua história

individual, seus conhecimentos e suas relações interpessoais.

Vigotski fundamenta-se em Freud, para refletir sobre a arte. Analisa o fato de o

indivíduo evitar o medo, o sofrimento e as angústias na vida real, mas buscar tais

emoções e sentimentos nas produções artísticas. Mesmo sabendo que dada situação

em um filme é surreal, fantasia ou imaginação, o indivíduo aprecia a obra pelo prazer

propiciado pela criação artística que envolve uma relação dinâmica entre o consciente

e o inconsciente.

Existe uma relação dinâmica, viva e permanente, que nunca cessa, entre ambas as esferas da nossa consciência. O inconsciente influencia os nossos atos, manifesta-se no nosso comportamento [...] (VIGOTSKI, 1999, p. 82).

Assim, Vigotski (1999, p. 81) considera que “as causas mais imediatas do efeito

artístico estão ocultas no inconsciente, e que só penetrando nesse campo

conseguiremos estudar de perto os problemas da arte”, uma vez que “os fatos

objetivos em que o inconsciente se manifesta de forma mais clara, são as próprias

obras de arte, e são estas que se tornam ponto de partida para a análise do

inconsciente” (VIGOTSKI, 1999, p. 82).

A interpretação consciente de uma obra é considerada por Vigotski como uma

explicação inventada post factum, uma racionalização, seja pelo artista seja pelo

fruidor.

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Como manifestação do inconsciente, a obra de arte aproxima-se da brincadeira

infantil - jogos de papéis, no qual a criança vivencia cenas de suas relações com os

adultos ou das relações que ela observa entre os próprios adultos -, a qual também

envolve um processo criativo em que a fantasia e a imaginação revelam aspectos

inconscientes, possibilitando uma via para a satisfação de desejos insatisfeitos como

forma de manifestação desse inconsciente. “Desse modo, a obra de arte é, para o

próprio poeta, um meio direto de satisfazer desejos não satisfeitos e não realizados

que, na vida real, não tiveram concretização” (VIGOTSKI,1999, p. 85).

Nesse sentido, a obra artística teria a função de sintoma, por representarem o

recalcado, de uma forma aceita socialmente:

O fundamento da arte é sempre constituído de atrações e desejos inconscientes e recalcados, ou seja, que não combinam com as nossas exigências morais, culturais, etc. [...]. O mesmo acontece com o artista, que, para satisfazer seus desejos reprimidos, deve revesti-los de uma forma artística [...] (VIGOTSKI,1999, p. 88).

O indivíduo demonstra interesse e a necessidade de alguma arte durante sua

vida, seja na música, na literatura, na poesia, no cinema, no teatro, na pintura, entre

tantas outras produções e/ou manifestações artísticas conforme a sua vivência e os

conhecimentos que lhe são proporcionados.

O prazer propiciado pela criação artística atinge o ponto culminante quando ficamos quase sufocados de tensão, com o cabelo em pé de medo, quando as lágrimas rolam involuntariamente de compaixão e simpatia. Tudo isso são relações que evitamos na vida e estranhamente procuramos na arte (VIGOTSKI, 1999, p. 83).

Portanto, dialeticamente, quando a obra artística circula, ela traz para a vida

social os sentimentos e emoções pessoais que assim passam a ser sociais, ao mesmo

tempo em que, ao apreciar a obra de arte, o homem experimenta sentimentos

pessoais, que continuam sendo sociais.

Como podemos observar os elementos de uma obra de arte são extremamente

importantes, são capazes de desencadear e transformar emoções. Mas o que

realmente define uma obra de arte são as reações estéticas provocadas no fruidor

pelas vivências emocionais, sentimentos e percepções revelando as “propensões

mais importantes do nosso psiquismo” (VIGOTSKI, 1999, p. 260).

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74

Vigotski (1999) reflete sobre o significado da arte e sua relação com a vida, e a

reação do espectador frente à relação estética ao apreciar uma determinada obra de

arte. Compreende a apreciação estética como dependente da interpretação

psicológica que se faça dela.

Entretanto, essa reação não é pré-determinada, ela é consequência de

aprendizagens anteriores pois “[...] a arte, no mais aproximado sentido, é determinada

e condicionada pelo psiquismo do homem social” (VIGOTSKI, 1999, p. 11). Cada

época e cada geração usufrui e interpreta a arte do seu modo.

Vigotski (1999) afirma que a arte é eterna e imutável, “[...] ela vem a ser eterna;

apesar de todas as mudanças, ela revela de forma mais plena a sua natureza e parece

como que retirada da lei geral do desenvolvimento histórico, ao menos em sua parte

essencial” (VIGOTSKI, 1999, p. 47).

Isso quer dizer que independentemente do período histórico em que foi

produzida, uma obra de arte clássica é eterna, pois os momentos que ela registra,

continuarão a ser representados em diferentes tempos históricos.

Ao observar uma obra de arte podem surgir inúmeras interpretações, vivências

e reações estéticas a partir dos elementos e conteúdos que a compõem. O conteúdo

de uma obra é subjetivo, cada um a interpreta de uma forma, o que resulta em uma

emoção ou um pensamento, enfim expressa-se em uma função psíquica social.

Além da impressão emocional suscitada pelos elementos isolados da arte, na reação estética podem distinguir-se com toda clareza vivências emocionais de um determinado tipo, que não podem ser atribuídas a esses diferenciais dos estados d’alma (VIGOTSKI, 1999, p. 259).

Vigotski (1999) critica o fato de alguns autores considerarem que a função da

arte seria contagiar o fruidor, do ponto de vista moral, com sentimentos bons ou ruins,

como o despertar das emoções bélicas, religiosas ou morais, a partir dos sentimentos

pessoais do artista. E afirma que se a arte tivesse apenas essa função de contágio,

mas não provocasse tais sentimentos, seria descartada.

Esta seria a função mais comum da obra de arte, contagiar emoções a partir

dos sentimentos pessoais do artista. Nesse caso, a arte reduzir-se-ia a “[...] um

simples ressonador, um amplificador e um aparelho transmissor do contágio pelo

sentimento” (VIGOTSKI, 1999, p. 304). E, “como seria desolador o problema da arte

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75

na vida se ela não tivesse outro fim senão o de contagiar muitas pessoas com os

sentimentos de uma” (VIGOTSKI, 1999, p. 307).

A arte é muito mais que isso, ela deve inspirar, provocar emoções e também

sentimentos individuais - cujos fundamentos que redundam no sentir e expressar

foram apropriadas do social - para então tornarem-se novamente sociais,

generalizando-se, transformando e superando os sentimentos comuns “[...] o

sentimento é inicialmente individual, e através da obra de arte torna-se social ou

generaliza-se. [...] a arte é uma espécie de sentimento social prolongado ou uma

técnica de sentimentos” (VIGOTSKI, 1999, p. 307).

Vigotski (1999) compara a arte ao milagre, pois ela transforma um aspecto da

vida material, em algo além, com a função de provocar e superar sentimentos

individuais e por meio da obra tornar-se social. A arte “[...] recolhe da vida o seu

material mas produz acima desse material algo que ainda não está nas propriedades

desse material” (VIGOTSKI, 1999, p. 308).

O milagre da arte lembra antes outro milagre do Evangelho – a transformação da água em vinho, e a verdadeira natureza da arte sempre implica algo que transforma, que supera o sentimento comum e aquele mesmo medo, aquela mesma dor, aquela mesma inquietação, quando suscitadas pela arte, implicam o algo a mais acima daquilo que nelas está contido (VIGOTSKI, 1999, p. 307).

Vigotski (1999) traz a frase de um pensador não identificado: “A arte está para

a vida como o vinho está para a uva” (VIGOTSKI, 1999, p. 307). Entende-se que a

arte pode transformar a vida, e ser vida transformada. Como ele exemplifica, ao refletir

sobre a função da música em sua própria vida:

A música me obriga a esquecer a mim mesmo, a minha verdadeira situação, ela me transporta para alguma outra situação, estranha a mim: sob o influxo da música tenho a impressão de sentir o que propriamente não sinto, de entender o que não entendo, de poder o que não posso.... (VIGOTSKI, 1999, p. 317).

A arte deve possibilitar a apropriação das formas socialmente desenvolvidas

de sentir, extrair do cotidiano elementos para a compreensão da obra, a fim de

produzir novos sentimentos, indo além do cotidiano aparente.

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76

Toda obra de arte é uma totalidade que reflete, em sua particularidade, a dialética entre singularidade e universalidade. Todo indivíduo receptor de uma obra de arte realiza a recepção em circunstâncias específicas, tanto do ponto de vista objetivo quanto do ponto de vista subjetivo (DUARTE, 2016, p. 7).

Duarte (2016) reflete sobre a arte ir além do indivíduo conscientizar-se sobre

os fatos presentes na vida real, e reviver de maneira “condensada e intensa” a obra

apreciada, percebendo que ela faz parte da sua vida influenciando em seu

comportamento.

A arte é antes uma organização do nosso comportamento visando ao futuro, uma orientação para o futuro, uma exigência que talvez nunca venha a concretizar-se, mas que nos leva a aspirar acima da nossa vida o que está por trás dela (VIGOTSKI, 1999, p. 320).

O homem anseia por absorver o mundo circundante, unindo na arte o individual

e o social, tornando-a coletiva: “A arte é o meio indispensável para essa união do

indivíduo com o todo: reflete a infinita capacidade humana para a associação, para a

circulação de experiências e ideias” (FISCHER, 2007, p. 13).

A arte transforma em possibilidade real algo que está fora da própria realidade,

utilizando-se de fantasia e imaginação sem perder de vista o social, a vida e a

sociedade na qual é produzida. Transpõe a realidade subjetiva para a exterioridade

fazendo acontecer algo do inconsciente imaginário, preservando aspectos reais, sem

perder a dimensão do coletivo, pois é “[...] um produto do trabalho humano espiritual-

material, como uma forma de expressão e de conhecimento de uma dada realidade,

historicamente datada” (PEIXOTO, 2003, p. 50).

O homem social está em um movimento constante e dialético de aprendizagem,

na busca de satisfazer suas necessidades, que decorrem da relação entre o que a

situação exige e as condições que o indivíduo dispõe. Esse movimento provoca

transformações em função da sua atividade principal, do trabalho coletivo que se

articula à necessidade de sobrevivência, que lhe exige criar algo o tempo todo. Cria

para sobreviver e assim desenvolve-se no decorrer de sua vida, e suas obras artísticas

resultam da vivência de suas relações sociais e históricas.

Isso mostra que a arte é a mais importante concentração de todos os processos biológicos e sociais do indivíduo na sociedade, que é um

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meio de equilibrar o homem com o mundo nos momentos mais críticos e responsáveis pela vida (VIGOTSKI, 1999, p. 328).

Vigotski (1998) ao estudar o cérebro humano, refletindo sobre a arte, ressalta

a capacidade de criação como uma das funções psicológicas superiores, que também

atua na resolução de problemas do cotidiano, a partir do acúmulo de experiências

passadas, com base nas quais o sujeito projeta ações futuras, de forma a possibilitar

modificações no presente. Entretanto, na criação da obra artística a imaginação

possibilita a criação de uma nova representação da realidade histórico-social que

mobiliza emoções e tem função catártica. Portanto, é um produto do contexto social,

apropriado nas interações entre os homens, o qual ao se individualizar, possibilita sua

expressão em um novo momento da prática social. Portanto, a arte inicia-se e termina

na prática social.

Caram (2015), fundamentada nos estudos de Vigotski, ressalta a função da arte

como uma ferramenta psicológica que contribui para a humanização, possibilitando

formar a personalidade da criança a partir de um processo histórico-cultural e social,

mediado pelos instrumentos materiais e psicológicos com seus sentidos e

significados.

A arte provoca a catarse quando ocorre uma reação emocional do ser humano

ao contatar com a obra artística, a qual resulta na modificação na conduta humana e

no desenvolvimento das funções psíquicas superiores. Caram (2015) destaca, de

forma mais acentuada, quatro processos psicológicos superiores fundamentais em

estreita ligação com a arte: imaginação, criatividade, percepção e emoção.

O processo criativo artístico, que corresponde “ao ato de criar, àquilo que se

produz” (FERREIRA, s.d., p. 400), tem como base a imaginação que corresponde à

“faculdade de representar imagens e objetos que não foram percebidos, ou de realizar

novas combinações de imagens” (FERREIRA, s.d., p. 742) pelo pensamento servindo-

se como base da imaginação.

Enquanto prática social, a arte envolve e possibilita a ampliação da imaginação

e da criação, e articula-se à educação, na medida em que ambas se constituem em

práticas que possibilitam a constituição da subjetividade. Vigotski (1998) considera a

educação como fundamental para que o indivíduo perceba-se enquanto ser social

participante e atuante na sociedade, e perceba-se como ser criativo, a partir das

relações sociais, da vivência, do trabalho, das suas experiências de aprendizagem ao

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longo da sua vida, e da apropriação da cultura elaborada historicamente pelas

gerações passadas.

Por isso, Barroco (2007) entende

[...] que há necessidade de se ampliar a experiência da criança: quanto mais ela vir, ouvir e experimentar, quanto mais aprenderá e assimilará, quantos mais elementos reais dispuser em sua experiência, tanto mais considerável e produtiva ela será (BARROCO, 2007, p. 45).

A educação escolar, em especial na disciplina de Arte, deve considerar a

história, o social de forma dialética envolvendo o desenvolvimento das funções

psicológicas superiores que não são isoladas do contexto social e das relações

humanas,

[...] ao contatar com a Arte, ou ao fruí-la, os indivíduos podem observar diferentes formas de expressão e de resposta aos estímulos que se apresentam ao artista, ao espectador, à sociedade, que se constitui em um recurso privilegiado nessa empreitada de se apreender o homem, explicá-lo, e junto a ele intervir (BARROCO, 2009, p. 118).

Enfim, só o homem, na medida em que se humaniza, é capaz de criar, apreciar

ou sensibilizar-se diante de uma obra artística, a qual traz em si dialeticamente

aspectos individuais apropriados socialmente, e aspectos coletivos, ou seja, o

movimento do homem social o qual representa o contexto sócio histórico.

Assim, com base nas considerações apresentadas neste capítulo, considera-

se que a educação escolar é fundamental para esse processo de humanização, pois,

a apropriação do conhecimento científico possibilita um olhar diferenciado e sensível

à criação humana, trazendo importante contribuição ao desenvolvimento das funções

psicológicas superiores, e, portanto, do psiquismo.

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79

4 CONTRIBUIÇÕES DO ENSINO DA ARTE NO CONTEXTO ESCOLAR

Este capítulo tem como objetivo analisar brevemente as contribuições da Teoria

Histórico Cultural para o desenvolvimento do processo de ensino e aprendizagem de

Arte na escola. Parte-se de elementos trazidos por Davidov (1995) e outros teóricos

como Elkonin e Vigotski, os quais discutem o conceito de psicologia pedagógica, ou

seja, educação desenvolvimental. Apresenta-se este capítulo a fim de refletir sobre

esse modelo pedagógico e, posteriormente investigar, nos dados coletados, quais as

consequências da concepção que os professores apresentam sobre o

desenvolvimento do psiquismo e sua relação com as FPS, para o processo

pedagógico.

Com o objetivo de analisar as contribuições das pesquisas envolvendo a prática

pedagógica nessa área, apresentam-se, ainda na sequência, recortes da pesquisa do

estado do conhecimento, cujas palavras-chaves utilizadas foram, Arte e Práticas

Pedagógicas.

Ao refletir sobre as teorias educacionais que eram discutidas nas primeiras

décadas do século XX, Vigotski destacou as três principais envolvendo a relação entre

a educação e desenvolvimento, na psicologia moderna (DAVIDOV, 1995).

A primeira fundamenta-se na ideia de que o processo de desenvolvimento é

condição necessária para a educação. Assim, o amadurecimento das capacidades

cognitivas e do desenvolvimento de certas funções da criança são condições

anteriores ao ensino na escola. Isso quer dizer que a criança deve ter maturidade

antes de lhe ser ensinado determinado conteúdo, para que possa apropriar-se de

conhecimentos e habilidades nos estudos, ou seja, o “[...] desenvolvimento e

amadurecimento é antes premissa e não resultado da educação” (DAVIDOV, 1995, p.

2). Essa teoria é defendida por Jean Piaget (1896-1981) e Sigmund Freud (1856-

1939), entre outros.

A segunda teoria, conforme a análise proposta por Vigotski (DAVIDOV, 1995),

considera que educação e desenvolvimento fundem-se. Quando ocorre a educação,

ocorre o desenvolvimento simultaneamente, passo a passo, resultando no acúmulo

de hábitos de estudos. Nessa perspectiva, qualquer educação torna-se

desenvolvente, portanto, “[...] não requer a condução de um procedimento complicado

de diferenciação dos processos de ‘educação’ e de ‘desenvolvimento’” (DAVIDOV,

1995, p. 2). A existência da educação desenvolvimental é proposta com base na

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experiência, sem maior aprofundamento no sentido de diferenciar educação e

desenvolvimento.

A terceira teoria, conforme a análise apresentada por Vigotski (DAVIDOV,

1995), busca superar as duas primeiras e entende o desenvolvimento como um

processo que “[...] prepara e torna possível o ensino”, enquanto que o “[...] ensino

estimula e impulsiona para frente o desenvolvimento (amadurecimento) [...]”

(DAVIDOV, s/p. 1995). Há, portanto, uma reciprocidade entre o amadurecimento e o

ensino. Os processos de ensino e de educação são diferenciados e ao mesmo tempo

inter-relacionados.

Vigotski concordava parcialmente com a terceira teoria, porém, ao propor sua

concepção de educação desenvolvimental, ressaltava que o ponto essencial residia

na ideia de que “[...] os processos de desenvolvimento não coincidem com os

processos de educação, que os primeiros seguem os segundos que criam zonas de

desenvolvimento proximal [...]” (DAVIDOV, 1995, p. 3).

Portanto, na perspectiva vigotskiana, a aprendizagem promove o

desenvolvimento desde que o professor trabalhe com as funções psicológicas que

estão se desenvolvendo, ou seja, na zona de desenvolvimento iminente. Dessa forma,

a seguir, analisa-se o conceito de zona de desenvolvimento iminente, tendo em vista

ser fundamental para a compreensão do conceito de educação desenvolvimental.

4.1 CONSIDERAÇÕES SOBRE A EDUCAÇÃO DESENVOLVIMENTAL À LUZ DA

TEORIA HISTÓRICO CULTURAL

Para compreender a educação desenvolvimental, Davidov (1995) apoiando-se

em Vigotski e Elkonin, relaciona-a com a teoria da atividade de estudo, ressaltando

seu papel no desenvolvimento das funções psicológicas superiores e

consequentemente no desenvolvimento do sujeito.

L. S. Vigotski resolveu a questão da correlação entre educação e desenvolvimento, baseando-se na lei geral da gênese das funções psíquicas da criança, que é descoberta nas zonas de desenvolvimento proximal criadas no processo de sua educação, no convívio com os adultos e com os colegas (DAVIDOV, 1995, p. 4).

Em um sentido amplo o termo atividade “[...] é usado em conexão com o

princípio da unidade entre mente e atividade” (DAVIDOV; MARKOVA, 1982/2014,

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s/p)30. Para compreender o conceito de atividade de estudo, o esquema a seguir,

referente à atividade humana servirá de suporte.

Figura 1: Estrutura dinâmica da atividade humana

Fonte: Marino Filho (2011), com adequações propostas posteriormente.

Ao ser apresentada ao aluno uma atividade, executá-la demanda certas

necessidades as quais o aluno irá atender com suas condições pessoais no contexto

em que se encontra. Quando, ao comparar essas necessidades com suas condições

pessoais, o aluno verifica que precisa buscar o objeto que satisfará sua necessidade,

vai em busca desse objeto - por exemplo um determinado tipo de informação -. Ao se

apropriar dessa informação, ocorrerá uma transformação na forma de executar a

tarefa (transformação objetiva), bem como uma transformação em sua subjetividade,

pois essa aprendizagem gerará desenvolvimento.

30 “[...] it is used in connection with the principle of the unity of the mind and activity” (DAVIDOV; MARKOVA, 1982/2014, s.p.).

Page 82: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

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Esse esquema geral para a Atividade é o mesmo quando se consideram as

tarefas parciais que a constituem, como se pode observar na Figura 1. Quando a

comparação entre a necessidade gerada por determinada tarefa parcial e as

condições pessoais para sua consecução, exigir novos objetos para satisfazê-la, o

aluno buscará essas informações perguntando à professora ou a outro colega, ou

mesmo pesquisando em outras fontes.

Apropriar-se de uma informação e utilizá-la na confecção da tarefa, possibilita

ao aluno uma transformação na forma de executar essa tarefa (transformação

objetiva), bem como uma transformação em sua subjetividade, pois essa

aprendizagem gera desenvolvimento, uma vez que o pensamento corresponderá à

representação mental da execução da tarefa e das verbalizações que a acompanham.

Dessa forma, as ações objetivas relacionam-se dialeticamente com ações

subjetivas, e envolvem diferentes operações internas e externas cujo objetivo é

atender a determinadas finalidades, e ao serem executadas, geram aprendizagem e,

assim, desenvolvimento.

Embora a análise desse esquema possa ser aprofundada, tendo em vista o

objeto da presente pesquisa apresenta-se uma noção básica, suficiente para a

compreensão do processo que revela a relação entre a atividade escolar e o

desenvolvimento da subjetividade discente.

Isso significa que quando o professor propõe uma tarefa ao seu aluno que lhe

for desafiadora, se o aluno não tiver desenvolvido suas FPS suficientemente ao

buscar executá-la, esse aluno poderá ser auxiliado pelo professor ou por um outro que

sabe como realizar a tarefa que a atividade envolve. Quando a ação daquele que

ensina for imitada ativamente pelo aluno, e reciprocamente o aluno compreender

como executar essa tarefa, a estará representando em sua mente.

Portanto, a atividade de estudo promove uma

[...] ‘ligação interna’ do processo de aprendizagem, não como um agregado de funções mentais individuais, mas como um engajamento ativo da criança escolar como um sujeito e uma personalidade (este ponto é uma distinção fundamental entre a visão dos psicólogos soviéticos e aquela das teorias neo-behavioristas contemporâneas, da psicologia cognitiva etc.) (DAVIDOV; MARKOVA, 1982/2014, s/p)31.

31 “[...] ‘the internal link’ of the learning process, not as na aggregate of individual mental functions, but as the schoolchild’s active engagement as a subject and a personality (this pinpoints a fundamental distinction between the view of Soviet psycologists and that of contemporary neobehaviorist theories, of cognitive psychology, etc.)” (DAVIDOV; MARKOVA, 1982/2014, s.p.).

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Esse esquema, portanto, apoia-se no conceito de atividade proposto por

Leontiev, “com seus dois conjuntos de características estruturais: atividade – ação –

operação, e motivo – objetivo – restrição” e é considerado como representando “o

conceito do termo atividade no seu sentido mais específico e estreito” (DAVIDOV;

MARKOVA, 1982/2014, s.p.)32.

Dessa forma, a Teoria da Atividade, propõe que o desenvolvimento psíquico

acompanha uma alteração no próprio sujeito, uma vez que esse sujeito é um ser em

atividade constante ao viver sua vida, uma vez que viver a vida é estar em atividade.

Por meio da Atividade de Estudo, objetiva-se desenvolver o pensamento

teórico. Davidov (1995) discute os conceitos de conhecimento empírico, - baseado

em noções básicas - e o conhecimento teórico - formado por conceitos científicos.

Quanto aos seus objetivos e formas de realização. E traz uma lista das principais

diferenças, com base na qual se elaborou a tabela a seguir:

Quadro 1: Comparação entre os conhecimentos empírico e teórico

Conhecimento empírico Conhecimento teórico

Compara um conjunto de objetos, noções e evidencia propriedades gerais iguais.

Análise da função de uma relação no sistema inteiro, que é fundamento original genético de todas as suas manifestações.

Evidencia uma propriedade geral em um conjunto de objetos de uma determinada classe.

A análise revela uma relação genética original do sistema interno com sua base geral ou essencial.

Baseia-se em noções evidentes e envolve propriedades exteriores dos objetos.

Relações e ligações internas.

Propriedade geral está mesmo nível que as propriedades especiais e unitárias dos objetos.

Fixa a ligação da relação geral do sistema inteiro com suas manifestações diversas.

Concretização por meio de exemplos. Concretização por meio de dedução e explicação do unitário a partir de sua base universal.

Fixação com palavras-termos. Expresso como atividade mental e posteriormente em sistemas de símbolos.

Fonte: Adaptado por Szymanski e Biavatti com base em Davidov (1995, p. 1)

O conhecimento empírico está relacionado aos objetos. Envolve comparações

e noções sobre eles do ponto de vista geral sem o aprofundamento teórico. O

raciocínio apoia-se no observável, que fornece elementos para classificações. O

32 “[...] (Thus, A. N. Leont’ev distinguished two sets of structural characteristics: activity – action – operation, and motive – goal – constraint” (DAVIDOV; MARKOVA, 1982/2014, s.p.).

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pensamento teórico (conceitos) está relacionado a elementos que se destacam a

partir da análise e pode abarcar níveis de generalização cada vez mais complexos.

Envolve o conhecimento científico e um trabalho de construção do pensamento,

revelando o universal. Os dois tipos de pensamento se completam e são importantes

e necessários a cada indivíduo.

É relevante que o ensino voltado ao pensamento teórico, ainda que articulado

ao empírico, ocorra com vistas ao desenvolvimento psíquico dos alunos, com

atividades que exijam planejamento, análise, execução e reflexão sobre as próprias

ações e conhecimentos.

Eis porque, ao investigar a formação inicial desenvolvimental, é necessário analisar cuidadosamente o conteúdo e a estrutura da atividade de ensino, com a qual está indissoluvelmente ligado o desenvolvimento psíquico. Do nosso ponto de vista, só se pode falar de ensino e educação no curso das noções sobre o [sic] tipos de atividade principais que são inerentes a determinados [sic] faixas etárias (DAVIDOV, 1995, p. 1).

Portanto, na perspectiva vigotskiana, a aprendizagem promove o

desenvolvimento quando o professor planeja tarefas, possibilitando ao aluno trabalhar

com as funções psicológicas em desenvolvimento, ou seja, na zona de

desenvolvimento iminente. Há tarefas fáceis demais ou difíceis demais, e qualquer

dessas duas possibilidades resulta em desinteresse por sua consecução.

Assim, tendo em vista a importância que apresentam dentro da Teoria

Desenvolvimental, a seguir, reflete-se sobre os conceitos de zona de desenvolvimento

iminente (ZDI) e sua relação com a zona de desenvolvimento real (ZDR), no processo

de aprendizagem.

4.2 RELAÇÃO ENTRE AS FUNÇÕES PSICOLÓGICAS SUPERIORES E A ZONA DE

DESENVOLVIMENTO IMINENTE

Vigotski propõe os conceitos de zona de desenvolvimento atual e zona de

desenvolvimento iminente33 para mostrar o papel do ensino no processo de

desenvolvimento. O desenvolvimento atual abrange aquilo que a criança já domina e

33 “O desenvolvimento iminente corresponde ao anteriormente chamado de desenvolvimento próximo ou proximal.”

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realiza sozinha, considera o desenvolvimento já alcançado. E aquelas atividades as

quais a criança só executa com ajuda hoje, mas que amanhã ela executará sozinha,

por já ter-se apropriado da forma de executá-las, isto é, por já ter aprendido,

corresponde ao seu desenvolvimento iminente. Assim:

[...] o que a criança é capaz de fazer hoje em colaboração será capaz de fazer por si mesmo amanhã. Por isso, parece verossímel que o ensino e o desenvolvimento na escola, guardem a mesma relação que a zona de desenvolvimento iminente e o nível de desenvolvimento atual (VIGOTSKI, 2001, p. 241-242, tradução nossa)34.

O desenvolvimento atual corresponde a todos os aspectos sociais, científicos,

emocionais que a criança já integrou à sua subjetividade e utiliza com autonomia.

Enquanto o desenvolvimento iminente corresponde ao que a criança ainda não sabe,

ou ao que ela ainda não consegue fazer sozinha mas está na iminência de aprender,

ou seja, ao que ela já é capaz de imitar com ajuda ou colaboração de um adulto.

Prestes (2010) apoia-se em Vigotski (2004), e nomeia nível de

desenvolvimento atual, o que na tradução de Paulo Bezerra do livro Pensamento e

Linguagem (VIGOTSKI, 1996) aparece como real –, caracterizando-o pelo ponto em

que certas atividades e/ou conteúdos estão apropriados pela criança. E conceitua a

zona de desenvolvimento atual, como o conjunto das funções até onde elas já estão

amadurecidas.

Prestes (2010), critica também a tradução, comumente encontrada no Brasil,

que utiliza a expressão Zona de Desenvolvimento Proximal, uma vez que essa palavra

não é utilizada na Língua Portuguesa, e propõe que se utilize a expressão Zona de

Desenvolvimento Iminente (ZDI), mais compatível com o significado atribuído por

Vigotski (2004) a esse conceito. Esclarece, também, que a ZDI não abrange somente

as atividades escolares, mas as atividades de manipulação de objetos e brincadeiras.

Chaiklin (2011) também reflete sobre a necessidade de uma aprendizagem que

possa desenvolver nos alunos suas capacidades intelectuais, explorando o conceito

de zona de desenvolvimento iminente, quando o desempenho independente é

inadequado. Articula o conceito de ZDI ao desenvolvimento das funções psicológicas

34 “[...] lo que el niño es capaz de hacer hoy em colaboración será capaz de hacerlo por sí mismo mañana. Por eso, parece verossímil que la instrucción y el desarrollo en la escuela guarden la misma relación que la zona de desarrollo próximo y el nível de desarrollo actual” (VYGOTSKY, 2001, p. 241-242).

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superiores, uma vez que algumas compreensões equivocadas, o relacionam

exclusivamente às noções escolares.

Zona de desenvolvimento próximo é uma forma de se referir tanto às funções que estão se desenvolvendo ontogenéticamente em um dado (objetivo) período etário quanto ao estado atual de desenvolvimento de uma criança em relação às funções que idealmente precisam ser realizadas (subjetivamente) (CHAIKLIN, 2011, p. 667).

Quer dizer que a criança as desenvolve, desde o nascimento, na interação com

o adulto e com outras crianças mais experiente. E pode-se destacar que, no processo

de aprendizagem, esse conceito de ZDI articula-se ao de imitação “[...] só se pode

ensinar a [sic] criança o que ela já for capaz de aprender. A aprendizagem é possível

onde é possível a imitação” (VIGOTSKI, 2001, p. 332).

Essa afirmação é ratificada por Vigotski em outros textos, por exemplo: “A

imitação, se a interpretamos no sentido amplo, é a forma principal na qual se leva a

cabo a influência do ensino sobre o desenvolvimento” (VIGOTSKI, 2001, p. 241)35.

Entretanto, é importante considerar que não se trata do conceito de imitação

com o sentido de reprodução:

Ao falar da imitação não nos referimos a uma imitação mecânica, automática, sem sentido, mas a uma imitação racional, baseada na compreensão da operação intelectual que se imita (VIGOTSKI, 2006, p. 268, tradução nossa)36.

Para a criança aprender, ela imita nesse sentido amplo que Vigotski destaca,

“[...] o desenvolvimento que parte da colaboração mediante a imitação é a fonte de

todas as propriedades especificamente humanas da consciência da criança”37

(VYGOTSKY, 2001, p. 241, tradução nossa). Trata-se de uma imitação acompanhada

mentalmente pelo raciocínio lógico envolvido nas ações e operações que ela executa

ao imitar.

35 “La imitación, si la interpretamos en el sentido amplio, es la forma principal en que se lleva a cabo la influencia de la instrucción sobre el desarrollo” (VYGOTSKY, 2001, p. 241). 36 “Al hablar de la imitación no nos referimos a uma imitacion mecánica, automática, sin sentido, sino a uma imitación racional, basada en la comprensión de la operación intelectual que se imita” (VYGOTSKY, 2006, p. 268). 37 “[...] el desarrollo que parte de la colaboración mediante la imitación es la fuente de todas las propriedades especificamente humanas de la consciência del niño” (VYGOTSKY, 2001, p. 241).

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Fica claro, portanto, que a Zona de Desenvolvimento Iminente abrange as

funções psicológicas superiores que estão em processo de desenvolvimento e são

mobilizadas pelas tarefas que a criança executa. Dessa forma, o ensino deve apoiar-

se nessas funções e não tanto nas funções já desenvolvidas.

“A zona de desenvolvimento próximo determina as possibilidades do ensino”

(VIGOTSKI, 2001, p. 242, tradução nossa). Apesar de duas crianças terem a mesma

idade, suas possibilidades de aprendizagem podem ser diferentes, mas sempre

começam em um ponto que está por se desenvolver. Aprendizagem e

desenvolvimento são processos que se relacionam, mas são distintos e o ensino só é

válido quando antecede o desenvolvimento.

O fator principal constitui-se no desenvolvimento com base no ensino, apoiado na possibilidade de elevar-se mediante a colaboração a um grau intelectualmente superior, a possibilidade de passar, com ajuda da imitação, do que a criança é capaz de fazer, ao que não é capaz. Nisto se baseia toda a importância do ensino no desenvolvimento e isso é o que constitui, na realidade, o conteúdo do conceito de zona de desenvolvimento iminente (VYGOTSKY, 2001, p. 241, tradução nossa)38.

Vigotski (2001) afirma que a observação do processo de imitação possibilita

investigar a maturidade mental e o nível de desenvolvimento da criança, considerando

suas possibilidades de interação ou cooperação em uma dada atividade e assim

identificando as funções psicológicas que estão sendo desenvolvidas e as que não

estão, as quais serão trabalhadas posteriormente.

“Um maior número de funções em maturação dá a uma criança melhores

oportunidades de se beneficiar do ensino escolar” (CHAIKLIN, 2011, p. 670), sendo a

aprendizagem boa quando está à frente do desenvolvimento. “Neste caso, ela motiva

e desencadeia para a vida toda uma série de funções que se encontravam em fase

de amadurecimento e na zona de desenvolvimento iminente” (VIGOTSKI, 2001, p.

334).

Pode-se estabelecer, portanto, uma importante diferença entre a aprendizagem

de tarefas que não promovem o desenvolvimento, ou seja, de tarefas mecânicas que

38 “[...] El fator principal lo constitue el desrrollo base en la instrucción estriba en la posibilidad de elevarse mediante la colaboración a un grado intelectualmente superior, la posibilidad de passar con ayuda de la imitación de lo que el niño es capaz de hacer a lo que no es capaz. En esto se basa toda la importancia de la instrucción en el desarrollo y eso es lo que constituye en realidade el contenido del concepto de zona desarrollo próximo” (VYGOTSKY, 2001, p. 241).

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depois de apropriadas tornar-se-ão automáticas - processo semelhante ao

desenvolvimento do animal que é unilateral, marcado por leis biológicas -, e o

desenvolvimento da criança promovido pela aprendizagem que mobiliza o conjunto

das funções psicológicas superiores, e portanto, é multilateral.

Duas funções psíquicas importantes iniciam gradativamente, a partir da

inserção da criança no Ensino Fundamental: a tomada de consciência e a regulação

da vontade, que se constituirão na medida em que se desenvolverem, como eixo

crucial, marcando todas as demais funções psíquicas.

Todas as funções principais que intervém ativamente na instrução escolar, giram ao redor do eixo das principais formações novas dessa idade: a tomada de consciência e a regulação da vontade. [...] traços diferenciadores fundamentais de todas as funções psíquicas superiores que se formam nessa idade (VIGOTSKI, 2001, p. 245, tradução nossa)39.

Ou seja, no processo de humanização da criança, “[...] essas funções ainda

não se desenvolveram no começo da idade escolar e [...] o ensino pode organizar de

certo modo, o processo posterior de seu desenvolvimento [...]”40. Além disso a “[...]

nova estrutura da consciência adquirida em cada idade significa sem dúvida que a

criança percebe sua vida interior de forma diferente [...]” (VIGOTSKI, 2006, p. 265,

tradução nossa)41.

Daí decorre a importância, no processo de humanização da criança, da

articulação entre o ensino escolar, a apropriação do conhecimento teórico e o

desenvolvimento das FPS.

Dialeticamente, Vigotski considera os aspectos externos e internos relativos ao

desenvolvimento psíquico, porém ressalta a importância da situação social em que a

criança se encontra.

No início de cada período de idade a relação que se estabelece entre a criança e o entorno em que a rodeia, sobretudo o social, é totalmente peculiar, específica, única e irrepetível para essa idade. Denominamos

39 “Todas las funciones principales que intervienen activamente en la instrucción escolar giran alrededor del eje de las principales formaciones nuevas de esa edad: l toma de conciencia y la voluntariedade. [...] los rasgos diferenciadores fundamentales de todas las funciones psíquicas superiores que se formam en esa edad” (VYGOTSKY, 2001, p. 245). 40 “[...] essas funciones aún no han madurado a comienzos de la edad escolar y [...] la instrucción puede organizar en certo modo el processo ulterior de su desarrollo [...]” (VYGOTSKY, 2001, p. 245). 41 “La nueva estructura de la conciencia adquirida en cada edad significa ineludiblemente que el niño percebe de distinta manera su vida interior [...]” (VIGOTSKI, 2006, p. 265).

Page 89: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

89

essa relação como situação social de desenvolvimento na dita idade. A situação social de desenvolvimento é o ponto de partida para todas as mudanças dinâmicas que se produzem no desenvolvimento durante cada período etário (VIGOTSKI, 2006, p. 264, tradução nossa)42.

A situação social, verdadeira fonte de desenvolvimento, corresponde às

demandas da realidade, solicitadas pelas atividades humanas com as quais o sujeito

se defronta cotidianamente, e correspondem à própria vivência. Essa vivência

mobiliza as funções psicológicas superiores, ou seja, os aspectos internos que dizem

respeito ao desenvolvimento singular. Esse processo envolve as funções psicológicas

superiores já desenvolvidas ou, nos casos em que as exigências forem mais

complexas, mobilizarão as funções psicológicas superiores que estão em maturação,

promovendo o desenvolvimento.

Uma vez conhecida a situação social de desenvolvimento existente no princípio de uma idade, determinada pelas relações entre a criança e o meio, devemos esclarecer seguidamente como surgem e se desenvolvem na dita situação social as novas formações próprias da idade considerada. Essas novas formações, que caracterizam em primeiro lugar a reestruturação da personalidade consciente da criança, não são uma premissa, mas o resultado ou o produto do desenvolvimento da idade. As mudanças na consciência da criança se devem a uma forma determinada de sua existência social, própria da idade considerada (VIGOTSKI, 2006, p. 264, tradução nossa)43.

Ao considerar que o conteúdo da ZDI muda de acordo com o período de

desenvolvimento do aluno, Chaiklin (2011) esclarece:

O princípio geral para compreender a dinâmica da mudança estrutural é o mesmo, mas é preciso examinar a situação social de desenvolvimento, a estrutura psicológica existente e a próxima estrutura que está sendo formada para que se possa caracterizar

42 “Al inicio de cada período de edad la relación que se estabelece entre el niño y el entorno que le rodea, sobre todo el social, es totalmente peculiar, específica, única e irrepetibe para esta edad. Denominamos esa relación como situación social del desarrollo en dicha edad. La situación social del desarrollo es el punto de partida para todos los cambios dinámicos que se producen en el desarrollo durante el período de cada edad” (VYGOTSKY, 2001, p. 264). 43 “Una vez conocida la situación social del desarrollo existente al principio de una edad, determinada por las relaciones entre el niño y el médio, ebemos esclarecer seguidamente cómo surgen y se desarrollan en dicha situación social las nuevas formaciones propias de la edad dada. Esas nuevas formaciones, que caracterizan en primer lugar la reestructuración de la personalidad consciente del niño, no son una premisa, sino el resultado o el produto del desarrollo de la edad. Los cambios en la conciencia del niño se deben a una forma determinada de su existencia social, propia de la edad dada” (VIGOTSKI, 2006, p. 264).

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90

apropriadamente a zona objetiva de desenvolvimento próximo para um dado período etário (CHAIKLIN, 2011, p. 671).

Isso quer dizer que cada aluno se desenvolve conforme seu ritmo, mas esse

ritmo não é uma característica unicamente pessoal, uma vez que as etapas de

desenvolvimento são despertadas pela atividade-guia, dentro de uma dada situação

social durante toda a sua vida, e provocam constante transformação das funções que

estão em vias de se desenvolverem.

Destarte, novas demandas provocadas pelas ações e operações que

correspondem ao processo de ensino, exigirão novos avanços intelectuais, ampliando

a consciência humana acerca da realidade. Mas destaca-se que, “[..] com ajuda da

imitação a criança não resolve na totalidade as tarefas que tem por desenvolver.

Chega a um certo limite, distinto para diferentes crianças” (VIGOTSKI, 2001, p. 240).

Conforme as tarefas se complexificam sua resolução torna-se impossível. Dessa

forma, a atividade de ensino direciona-se a um conjunto de tarefas que a criança,

embora não as execute independentemente, consegue imitar.

[...] O fundamental no ensino é precisamente o novo que a criança aprende. Por isso, a zona de desenvolvimento iminente que determina o campo das gradações que estão ao alcance da criança resulta no aspecto mais determinante no que se refere ao ensino e ao desenvolvimento (VIGOTSKI, 2001, p. 241, tradução nossa)44.

Em função das demandas exigidas pelas tarefas que o aluno executa e

compõem sua atividade, a qual mobiliza o conjunto neuronal que constitui suas

funções psíquicas superiores, decorre seu desenvolvimento cultural, e

consequentemente, o domínio do seu próprio comportamento.

Como afirma Davidov (1995), a apropriação desses conhecimentos teóricos

não se refere a um adendo que vai crescendo conforme a criança aprende, uma vez

que “[...] o desenvolvimento de uma ou outra função depende e está sempre

condicionado pelo desenvolvimento global da personalidade” (VIGOTSKY, 1931, p.

230, tradução nossa)45.

44 “[...] Lo fundamental en la instrución es precisamente lo nuevo que aprende el niño. Por eso, la zona de desarrollo próximo, que determina el campo de las gradaciones que están al alcance del niño, resulta ser el aspecto más determinante en lo que se refiere a la instrucción y el desarrollo” (VYGOTSKI, 2001, p. 241). 45 “[...] el desarrollo de una u otra función depende, y está siempre condicionado por el desarrollo global de la personalidad” (VIGOTSKY, 1931, p. 230).

Page 91: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

91

O importante é que se trata de um processo no qual, ao aprender, a criança

está se modificando, apropriando-se de formas mais evoluídas de se relacionar no

mundo, desenvolvendo sua subjetividade. Trata-se portanto, de considerar o aluno

uma totalidade dentro de outras totalidades.

A educação escolar, portanto, é um processo necessário e fundamental para o

desenvolvimento mental e intelectual da criança desde que seja intencionalmente

organizada de forma correta, o que para Davidov (1995) corresponde à organização

de tarefas de estudo coletivas, as quais gradativamente passarão a individuais, o que

envolve a colaboração das pessoas que rodeiam a criança. Nesse ponto, uma nova

organização da educação torna-se necessária, e promoverá novos avanços psíquicos.

Como o bom ensino adianta-se ao desenvolvimento, “[...] é necessário

organizar um ensino capaz de criar as zonas de desenvolvimento iminente

necessárias, que se transformem com o tempo nas novas formações exigidas”

(DAVIDOV, 1995, p. 9).

Enfim, “[...] a escola deve ensinar os alunos a pensar, quer dizer, desenvolver

ativamente neles os fundamentos do pensamento contemporâneo, para o qual é

necessário organizar um ensino que impulsione o desenvolvimento. Chamemos esse

ensino de ‘desenvolvimental’” (DAVÍDOV, 1988, p. 3)46.

Assim, espera-se que o desenvolvimento das atividades de ensino na perspectiva desenvolvimental dê as condições para que o aluno internalize mentalmente e incorpore no seu fazer os conceitos necessários para solucionar problemas de toda ordem, e que, mesmo diante de situações imprevistas e aparentemente novas que acontecem no cotidiano, possa ter desenvolvido a habilidade de organizar mentalmente os conceitos, informações e saberes necessários para discernir as situações e tomar as decisões mais acertados [sic] nas situações concretas. Este caráter generalizador dos conceitos deverá dar aos alunos a condição de inteligentemente agirem com autonomia em qualquer situação no âmbito da vida, inclusive criando novas soluções para novos problemas a partir da base conceitual já compreendida e efetivada (MIRANDA, 2010, p. 14).

Trata-se de uma atuação do professor, no sentido de fornecer tarefas

estimulantes e significativas, que levem à apropriação dos conteúdos sistematizados

e organizados de forma a possibilitar ao aluno, a formação de conceitos em níveis

46 “[...] la escuela debe enseñar a los alumnos a pensar, es decir, desarrollar activamente en ellos los fundamentos del pensamiento contemporáneo, para lo cual es necesario organizar una enseñanza que impulse el desarrolho) (llamésmosla ‘desarrolante’)” (DAVIDOV, 1988, p. 3).

Page 92: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

92

cada vez mais amplos de generalização, não fragmentados, mas articulados a seus

fundamentos histórico-sociais científicos e técnicos, na direção de outras e mais

complexas relações interfuncionais de forma a proporcionar a compreensão do

conhecimento historicamente acumulado e a transformação da capacidade mental

e/ou pensamento teórico. Portanto, novas possibilidades de inserção e transformação

social.

Tendo refletido sobre o processo pedagógico destacando a relação entre o

desenvolvimento das FPS, o conceito de ZDI e o ensino desenvolvimental, no próximo

subitem apresentam-se pesquisas que buscam refletir sobre as práticas pedagógicas

do ensino de arte no contexto escolar.

4.3 O ENSINO DA ARTE E AS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS NO CONTEXTO

ESCOLAR

Na pesquisa relativa ao estado do Conhecimento, ao serem utilizados os

descritores Arte e Práticas Pedagógicas e Funções Psicológicas Superiores; Arte e

Funções Psicológicas Superiores; Arte e Teoria Histórico-Cultural, nas plataformas

Scielo e Biblioteca Digital de Teses e Dissertações, não foram encontradas pesquisas.

Porém, com os descritores Arte e Psicologia Histórico-Cultural e Prática Pedagógica,

foram encontradas 36 pesquisas, no período entre 2015 e 2021, das quais cinco

mostraram-se pertinentes ao presente estudo, por envolverem o ensino de arte em

escolas regulares, tendo como referencial teórico a atividade de estudo e a Educação

Desenvolvimental.

Peixoto (2011) discute a Teoria Histórico-Cultural de Vygotsky, articulando-a à

Teoria da Atividade de Leontiev e à Teoria do Ensino Desenvolvimental de Davidov.

Considera o Ensino Desenvolvimental como o caminho para a formação e o

desenvolvimento do pensamento teórico e sensível dos alunos, a partir do trabalho

com a disciplina de Arte, voltado ao desenvolvimento da imaginação e da criatividade

da criança.

É função do professor de Arte problematizar e atuar na zona de

desenvolvimento iminente, utilizando ferramentas e materiais para mediar o

desenvolvimento da aprendizagem das crianças contribuindo para a formação do

pensamento teórico.

Page 93: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

93

Para tanto, o espaço da sala de aula deve ser ocupado para compreender arte como possibilidade de acesso a um conteúdo intencionalmente organizado, planejado de forma a propiciar o desenvolvimento do pensamento mais complexo por meio da criação e incorporação de modelos mentais dos objetos a serem utilizados no cotidiano. Nesse sentido, na opinião de Davydov (1988), sem a intervenção da escola, dificilmente se alcança o desenvolvimento da consciência e das ações mais complexas do pensamento humano na solução de diferentes tarefas. A escola tem condições de fornecer a base para a formação do conhecimento e da consciência humana [...] (PEIXOTO, 2011, p. 63).

Na mesma perspectiva, Silva (2013) investigou a aprendizagem de leitura de

imagens em Artes Visuais, em sua dissertação de Mestrado, e posteriormente, deu

continuidade a seus estudos em sua tese de doutorado, investigando a criatividade e

os processos de criação na disciplina de Arte no Ensino Fundamental (SILVA, 2018).

Em sua tese47, por meio de uma pesquisa bibliográfica e uma pesquisa de campo

envolvendo gestores, professores e estudantes dessa disciplina nos 6º e 7º ano do

Ensino Fundamental, em duas escolas da rede pública, com base na Teoria Histórico-

Cultural, buscou estudar o desenvolvimento da criatividade e dos processos de

criação na escola, entendendo-a como um processo que abrange o desenvolvimento

sistêmico das funções psicológicas superiores, por meio de interações intersubjetivas.

Nesse processo, enfatiza o papel da escola possibilitando a ampliação das

experiências cognitivo-afetivas da criança.

Os resultados obtidos na tese de Silva (2018) revelam que, embora a maior

parte da literatura consultada sobre a criatividade, a considere um fenômeno histórico-

cultural, as pesquisas por ela analisadas não apresentam uma explicação em nível

teórico, que permita entendê-la como produto de um processo em que se imbricam o

social e o cultural, no desenvolvimento do conjunto sistêmico das funções psíquicas,

constituindo a subjetividade. Ainda, as ações pedagógicas observadas por Silva não

envolviam a problematização, a atividade do pensamento, a reflexão, a fantasia,

trazendo prejuízos à imaginação criadora dos alunos, gerando formas estereotipadas

de expressão, limitadas à reprodução, não alcançando formas mais complexas, que

trariam a possibilidade de transformação das experiências. Silva conclui apontando a

necessidade de que o trabalho pedagógico considere a criatividade dentro do conjunto

das funções psicológicas superiores, superando a concepção tradicional.

47 Idem.

Page 94: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

94

Com base em suas pesquisas, Silva publicou em 2018, um artigo com sua

orientadora (SILVA; ZANATTA, 2018), no qual fundamentadas na Teoria Histórico-

Cultural, na perspectiva do Ensino Desenvolvimental, propõem para a disciplina um

trabalho pedagógico voltado à formação de conceitos, de forma a possibilitar o

desenvolvimento das funções psicológicas superiores das crianças, a partir da leitura

de imagens.

Por meio da mediação do professor, na compreensão da arte como resultado

das produções humanas, desenvolvem-se os conhecimentos científicos, necessários

à formação do pensamento estético e artístico. Dessa forma o Ensino

Desenvolvimental organiza-se pedagogicamente, objetivando proporcionar,

impulsionar e estimular os processos mentais conscientes do pensamento da criança

e/ou adulto.

Para que a aprendizagem consciente aconteça faz-se necessário ampliar o

pensamento teórico, por meio da apropriação de conceitos científicos ou culturais,

promovendo a organização de ações mentais de abstração e generalização. Pois, “[...]

o ensino é capaz de promover a formação humana conforme esteja orientado para

proporcionar o conhecimento e a compreensão dos objetos culturais em suas relações

de significação” (SILVA; ZANATTA, 2018, p. 3). Apropriar-se de um conceito relativo

a determinado objeto, envolve a compreensão de sua essência/significado.

Silva e Zanatta (2018) destacam, na organização do ensino, ações

pedagógicas como: elaboração e análise do plano de ensino a partir do conceito

científico a ser apreendido; realização de atividades que proporcionem o avanço no

pensamento teórico dos alunos, conectadas à realidade de forma a propiciarem

avanços crescentes no grau de abstração e generalização. A conexão da tarefa com

a realidade e a possibilidade de que os alunos assumam o controle ativo de suas

ações, promove a autonomia do aluno e o autocontrole em relação à consecução dos

objetivos da tarefa proposta. Em outras palavras, a tarefa proposta exige ações cuja

execução envolve determinado objeto e a busca desse objeto visualizado torna-se o

motivo para a ação. Nesse processo, os alunos desenvolvem ações mentais como a

observação, compreensão, análise, interpretação, criação e formação do conceito.

“Portanto, ao planejar as tarefas, o professor deve considerar as ações mentais nelas

implícitas, requeridas para a solução da tarefa, que deve envolver participação,

interação, mediação entre diferentes ZDP dos alunos no grupo” (SILVA; ZANATTA,

2018, p. 7).

Page 95: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

95

Ashbar (2019) investigou como atribuir um sentido pessoal à atividade de

estudo, dentro da disciplina de Arte. Sua unidade de análise foi a relação entre o

motivo e a atividade de estudo, em uma turma de 5º ano do Ensino Fundamental.

Categorizou os motivos em pragmáticos e vinculados à atividade de expressão, e as

ações em ações de organização pedagógica, de ajuda, valorização do trabalho

discente e coletivas. Assim como Silva e Zanatta (2018), Ashbar (2019) observou em

sua pesquisa que quando os alunos atribuem um sentido pessoal às tarefas que

desempenham, esse sentido produz um efeito transformador e a organização

pedagógica das professoras produz sucesso escolar. No experimento relatado, as

ações pedagógicas incentivavam a colaboração entre os colegas, fomentavam o

trabalho coletivo e organizavam ações de estudo, revelando que a organização do

ensino na perspectiva desenvolvimental é viável e pode ser uma alternativa adequada.

Ashbar (2019) destaca que, quando o processo pedagógico docente não se

apoia em ações como a problematização, a atividade do pensamento, a reflexão, a

fantasia, enfim, ações que constituem e desenvolvem a imaginação criadora e o

pensamento estético-artístico, os alunos acabam por desenvolver formas

estereotipadas de expressão, que se limitam a reproduzir, sem evoluir para formas

estéticas mais elaboradas e transformadoras. Propõe a reflexão sobre o ensino da

arte e o desenvolvimento da imaginação criadora na perspectiva histórico-cultural,

entendendo-a como uma função a ser desenvolvida no conjunto das funções

psicológicas superiores, por meio da educação.

Verificou-se que a Educação Desenvolvimental aplicada ao ensino da arte

ainda é pouco difundida no Brasil, uma vez que foram encontrados apenas cinco

trabalhos nessa perspectiva teórica, dos quais três envolvem os mesmos autores

(SILVA, 2013; 2018; SILVA; ZANATTA, 2018), além das pesquisas de Peixoto (2011)

e Ashbar (2019).

Entretanto, considerando constituir-se em uma proposta pedagógica que

incorpora a apropriação dos conceitos científicos e vai além voltando-se à formação

humana integral, fundamentada na Teoria Histórico-Cultural, propõe-se a Teoria do

Ensino Desenvolvimental como uma importante opção pedagógica, a ser pesquisada

e difundida no ensino da disciplina de Arte, no contexto da educação brasileira.

No próximo capítulo, contextualiza-se e apresenta-se uma pesquisa de campo,

objetivando investigar qual o conceito dos professores de Arte quanto ao

Page 96: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

96

desenvolvimento do psiquismo, para refletir sobre quais as consequências dessa

conceituação em suas práticas pedagógicas.

Page 97: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

97

5 O CONTEXTO DA PESQUISA

Esta pesquisa objetivou investigar qual a compreensão dos professores da

disciplina de Arte sobre o conceito de desenvolvimento do psiquismo e sua relação

com as FPS, os quais permeiam a atuação pedagógica docente. Ainda, investigou-se

quais os efeitos dessa concepção no processo de ensino. Em outras palavras, a

organização do processo pedagógico está diretamente vinculada à sua concepção de

aprendizagem e desenvolvimento. Com base na Teoria Histórico-Cultural, entende-se

o desenvolvimento psíquico como uma consequência da aprendizagem, a qual

promove o desenvolvimento das FPS, possibilitando o pensamento teórico.

Como questão central de pesquisa indagou: Qual a concepção do professor da

disciplina de Arte sobre o desenvolvimento psíquico e sua relação com as FPS, e

quais as consequências dessa concepção no processo pedagógico.

A análise da questão proposta está fundamentada na Psicologia Histórico-

Cultural, apoiando-se nos estudos soviéticos de Lev Semyonovich Vygotsky (1896-

1934), Alexander Romanovich Luria (1902-1977), Danil Borisovich Elkonin (1904-

1984), Vasili Vasilievich Davídov (1930-1998) e Alexis Nikolaevich Leontiev (1903-

1979) e em estudos referentes à Psicologia, Arte e Desenvolvimento do Psiquismo

Humano, e ao compromisso do ensino da Arte na Educação.

A fim de ampliar os estudos, investigou-se o Estado do Conhecimento no

período de 2005 à 2019 nas seguintes bases de dados: Scielo (Scientific Electronic

Library Online), Biblioteca Digital Teses e Dissertações, Portal Periódicos da Capes e

Plataforma SUCUPIRA envolvendo as palavras-chaves: Funções Psicológicas

Superiores; Psicologia Histórico-Cultural e Arte; Arte e Prática Pedagógica;

Psicologia e Arte.

Inicialmente buscou-se investigar, nos capítulos 1 e 2, quais as contribuições

da Teoria Histórico-Cultural para a compreensão do desenvolvimento psíquico. Ainda,

fez-se necessário analisar, no capítulo 3, como a arte articula-se ao psiquismo e quais

as contribuições da disciplina de Arte para a formação humana. Consequentemente,

no capítulo 4 analisaram-se os principais conceitos da Teoria Desenvolvimental, de

forma a fundamentar a organização de um trabalho pedagógico diferenciado na

escola, em uma abordagem da arte enquanto conhecimento científico, reforçando a

necessidade do reconhecimento da intencionalidade no processo pedagógico para o

desenvolvimento do pensamento teórico.

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98

A reflexão sobre a questão central apontada exigiu uma pesquisa de campo a

qual será apresentada neste capítulo. Inicia-se descrevendo os procedimentos

metodológicos para coleta e análise dos dados, a qual exigiu vários retornos à

realidade e reflexões que possibilitaram ir, gradativamente, compreendendo o objeto

de estudo e suas consequências no processo pedagógico.

5.1 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

A proposta desta pesquisa foi submetida ao Comitê de Ética em Pesquisa da

UNIOESTE - Universidade do Oeste do Paraná, obtendo aprovação em 04/08/2020

sob número 3.419.651. Ainda, após a análise da proposta pelo Núcleo Regional de

Ensino de Cascavel, órgão público filiado à Secretaria da Educação do Estado do

Paraná, que coordena o trabalho dos professores que atendem à rede estadual de

ensino, obteve-se autorização para a coleta de dados junto aos professores da

disciplina de Arte.

Como os professores de Arte das séries finais do ensino fundamental e do

ensino médio da rede estadual do município de Cascavel participavam de um encontro

inicial em um Grupo de Estudos sobre as Funções Psicológicas Superiores e suas

relações com o processo ensino e aprendizagem de Arte, a partir dos fundamentos

da Teoria Histórico-Cultural, aproveitou-se essa oportunidade para a coleta de dados.

Dessa forma, resulta

Para coleta de dados aplicou-se um questionário. Lakatos (2003, p. 200) define

questionário como “[...] um instrumento de coleta de dados, constituído por uma série

ordenada de perguntas, que devem ser respondidas por escrito e sem a presença do

entrevistador”. Optou-se por este procedimento por facilitar a coleta coletiva dos dados

e o registro escrito das falas dos professores, para análise posterior. Ainda, os

professores, não foram identificados, a fim de que se sentissem mais à vontade, livres

e com o tempo necessário para expressarem suas ideias.

Voltado aos objetivos da pesquisa, o questionário (Anexo 1) trazia questões

sobre os conhecimentos dos professores quanto ao desenvolvimento do psiquismo e

as funções psicológicas superiores. Ainda, no intuito de compreender quais as

consequências dessa concepção em suas práticas pedagógicas, buscou-se investigar

os limites e desafios por eles encontrados no processo de ensino aprendizagem e

quais fontes por eles buscadas para a organização do trabalho desenvolvido em sala

Page 99: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

99

de aula. A análise das respostas dos professores a este questionário será

apresentada no Capítulo 6. As respostas seguem na íntegra no Apêndice 1.

Os professores aceitaram espontaneamente o convite para a participação na

pesquisa, assinando o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido – TCLE,

(Apêndice 3) bem como a Declaração de Autorização do Núcleo Regional de Ensino

de Cascavel para o desenvolvimento deste trabalho (Anexo 6).

Os dados coletados trouxeram os discursos dos professores que foram

analisados, buscando suas concepções sobre o Desenvolvimento do Psiquismo e

sobre o conceito de Funções Psicológicas Superiores, bem como sobre os

fundamentos de suas práticas pedagógicas, os encaminhamentos metodológicos por

meio das descrições de suas ações pedagógicas e as dificuldades e desafios que

encontravam no trabalho docente.

Para análise, as respostas foram organizadas, na primeira etapa, de acordo

com as seguintes categorias: conceito de desenvolvimento do psiquismo, e

concepção sobre as funções psicológicas superiores destacando os elementos

conceituais trazidos pelos docentes.

A seguir, com base no modelo proposto por Davidov (1992) apoiado em

Vigotski (1932), analisou-se o nível de generalização dos conceitos de

desenvolvimento cognitivo e de funções psicológicas superiores, apresentado pelos

professores que compunham amostra pesquisada.

Na segunda etapa, foram analisadas quais as consequências para o processo

pedagógico das categorias iniciais, estabelecendo-se novas categorias que

emergiram dos próprios dados, tomando como base as questões a eles propostas:

fundamentação para o preparo das aulas, ações pedagógicas desenvolvidas pelos

sujeitos da pesquisa, e limites e desafios no trabalho pedagógico.

A análise buscou semelhanças, discrepâncias e contradições, na perspectiva

de totalidade, bem como elementos sobre a relação entre a concepção sobre o

desenvolvimento psíquico e sua relação com as FPS, e a contribuição da disciplina

de Arte no processo pedagógico. A partir da análise do conceito do professor de Arte

sobre o desenvolvimento do psiquismo, buscou-se refletir sobre quais as possíveis

consequências dessa concepção no trabalho pedagógico.

Ainda, procurou-se articular os dados coletados na pesquisa de campo com os

dados coletados na leitura das pesquisas encontradas no levantamento relativo ao

Page 100: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

100

compor o Estado do Conhecimento. Dessa forma, no Capítulo 6, apresentam-se a

análise e a discussão dos resultados obtidos.

5.2 CARACTERÍSTICAS DOS PROFESSORES DE ARTE DO NÚCLEO DE

CASCAVEL

A identidade dos professores foi preservada, atribuindo-se lhes um código:

Professor A, Professor B, ... e assim sucessivamente, sem discriminar o gênero. As

Figuras 2, 3 e 4, a seguir, apresentam suas características e são referentes ao coletivo

dos quinze professores inscritos.

Oitenta e sete por cento do grupo eram do gênero feminino e apenas 13% eram

homens, denotando-se que ainda há o predomínio das mulheres no magistério.

A Figura 2 apresenta a distribuição dos professores quanto à Formação

Profissional:

Figura 2: Formação dos professores de Arte da rede estadual de Cascavel

Fonte: Dados coletados por Biavatti (2019)

Ao observar a Figura 2, nota-se que a maioria, ou seja 93% dos professores,

são formados na linguagem das Artes Visuais e 7% formados em Música. Verifica-se,

portanto, que predomina a formação profissional na área específica de Artes Visuais,

revelando uma defasagem em relação às demais linguagens artísticas.

Santos e Caregnato (2019) assim como Castro (2015) relatam a preocupação

quanto à formação dos professores em Arte em apenas uma linguagem artística,

especificamente em Artes Visuais, não os capacitando para o trabalho pedagógico em

áreas como o Teatro, a Música e a Dança. Isso acontece em quase todos os estados

brasileiros: exige-se o professor polivalente, ministrando aulas nas quatro linguagens,

Artes Visuais. 93%

Música. 7%

Formação Profissional

Page 101: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

101

Artes Visuais, Teatro, Música e Dança, sendo sua formação específica em apenas

uma. Isso constitui-se em um obstáculo, devido à problemática da polivalência a que

o professor de Arte é incumbido, o que o leva à prática pedagógica privilegiando uma

determinada linguagem – a de sua formação – e proporcionando conhecimentos

superficiais em relação às demais linguagens.

A Figura 3 apresenta o tempo de serviço do professor de Arte dedicado ao

magistério.

Figura 3: Tempo de serviço dos professores de Arte da rede estadual de Cascavel

Fonte: Dados coletados por Biavatti (2019)

Verifica-se que 80% dos professores participantes nesta pesquisa trabalham

na área da educação há mais de cinco anos no efetivo exercício na profissão,

revelando experiência no processo pedagógico. Dessa forma, considerando-se que o

currículo do Paraná desde 1980 fundamentou-se na perspectiva Histórico-Cultural,

supõe-se que os professores teriam se apropriado de seus fundamentos básicos.

Dentre os sujeitos da pesquisa, a maioria, 67% dos professores faz parte do

Quadro Próprio do Magistério, (QPM)48 sendo concursados com habilitação específica

para esse exercício. Trinta e três por cento dos professores ocupam o cargo de

professor temporário PSS49, um processo seletivo simplificado, realizado pela

Secretaria de Estado da Educação (SEED- PR), para contratação temporária de

professores, pedagogos, intérpretes de libras, auxiliares de serviços gerais e técnicos

administrativos, habilitados nas áreas específicas de suas funções.

48 Disponível em: http://www.portaldoservidor.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo =630. 49 Disponível em:”http://www.educacao.pr.gov.br/arquivos/File/pss/guia%20de%20inscricao/02.pdf.”

0 a 5 anos. 3. 20%

6 a 10 anos. 7. 47%

11 a 15 anos 3. 20%

16 a 20 anos. 0. 0%

21 a 25 anos. 0. 0%

26 a 30 anos. 2. 13%

Tempo de serviço dos professores de Arte em sala de aula

Page 102: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

102

Na Figura 4 apresenta-se a carga horária semanal dos professores.

Figura 4: Carga horária de trabalho semanal dos professores de Arte da rede estadual

de Cascavel

Fonte: Dados coletados por Biavatti (2019)

Conforme dados apresentados, 67% dos professores possuem carga horária

semanal de 40h em efetivo exercício, 27% trabalham 20h e 6% trabalham 28h

semanais.

40h67%

20h. 27%

28h. 6%

Carga horária semanal

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6 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS

Neste capítulo serão apresentados e analisados os dados coletados na pesquisa de

campo a partir do questionário aplicado aos sujeitos da pesquisa. A Teoria Histórico-

Cultural fundamentou a discussão teórica dos resultados obtidos, assim como

utilizaram-se as pesquisas encontradas no levantamento relativo ao Estado do

Conhecimento. Foram estabelecidas cinco categorias para análise, a partir dos

objetivos da pesquisa.

6.1 CONCEPÇÃO DOS PROFESSORES DE ARTE ACERCA DO

DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO

A primeira categoria analisada refere-se à concepção do professor sobre o

desenvolvimento do psiquismo. Apresenta-se a seguir, na Figura 5, os elementos

elencados pelos professores quando arguidos sobre como entendiam esse processo.

Figura 5: Elementos do Conceito de Desenvolvimento do Psiquismo apresentado

pelos professores Arte da rede estadual de Cascavel

Fonte: Dados coletados por Biavatti e organizados por Biavatti e Szymanski (2019)

Quando lhes foi apresentado o questionário para a coleta dos dados, muitos

professores ao lerem a questão que indagava, como eles entendiam o

desenvolvimento do psiquismo, olhavam-se e olhavam para o alto demonstrando o

não entendimento ou o não conhecimento sobre o tema proposto. A pesquisadora

procurou deixar os professores tranquilos em relação a essa dificuldade.

FPS 6%

Não sabem/Não responderam 47%

Aspectos Emocionais 13%

Aspectos Emocionais+Intelectuais 7%

Não especifica aspectos 20%

Aspectos Intelectuais 7%

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Entretanto, a grande maioria (47%) não soube responder ou não respondeu,

demonstrando falta de conhecimento sobre a questão. Por exemplo50:

Não domino o tema (Professor O). Entendo que através do século passado, entre estudos de psicanalistas, foi atribuído ao consciente e ao inconsciente, atribuições de suma importância, tanto para o tratamento de patologias, com[sic] para o desenvolvimento saudável da mente humana, desde a infância, até uma velhice saudável. (Professor B).

Os dados revelaram que 7% dos professores têm uma visão mais abrangente

e compreendem o desenvolvimento psíquico, articulando-o a aspectos intelectuais e

emocionais, entretanto em momento algum foram apontadas conceitos relacionados

à Teoria Histórico-Cultural. Assim, o desenvolvimento psíquico seria:

Desenvolvimento da mente, intelectual e emocional. (Professor H).

Vinte por cento dos professores apresentam uma concepção fragmentada do

desenvolvimento psíquico, relacionando-o ou a aspectos emocionais (13%) ou a

aspectos intelectuais (7%). Entre os que restringem o psíquico a aspectos emocionais,

há afirmações como, por exemplo:

Trabalhar de forma a desenvolver o emocional, tomar consciência de si, suas capacidades. (Professor J).

Como reflete Magiolino (2014), as emoções constituem um aspecto do

desenvolvimento do psiquismo, contribuindo para sua “organização dramática”.

Schlidwein (2015) também afirma que as emoções, repercutem diretamente na

atividade humana, na consciência e na personalidade da pessoa. Portanto, está

correto considerar a emoção como componente do desenvolvimento do psiquismo.

Porém, restringir o desenvolvimento psíquico a aspectos emocionais revela uma

concepção fragmentada.

50 O Apêndice 1 apresenta as respostas na íntegra.

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Por outro lado, o mesmo conceito fragmentado pode ser constatado nos 7%

que consideraram o desenvolvimento psíquico apenas relativo a aspectos intelectuais,

conforme pode-se observar:

Desenvolvimento do pensamento crítico e reflexivo. (Professor F).

Seis por cento relacionaram o desenvolvimento do psiquismo ao

desenvolvimento das Funções Psicológicas Superiores:

Entendo que nosso desenvolvimento das funções superiores cognitivas depende da maturidade cronológica e das relações de aprendizagem/conhecimento experiências que fazemos ao longo da vida. (Professor G).

O conceito apresentado por esses docentes aproxima-se do conceito

apresentado por Barroco e Superti (2014), apoiadas na Teoria Histórico-Cultural ao

considerarem o desenvolvimento do psiquismo como um processo de organização da

consciência a partir de situações ou experiências vivenciadas entendidas como

síntese das funções psíquicas superiores, de forma dialética a envolver a totalidade e

as partes. Souza e Andrada (2013) também destacam que as funções psicológicas

superiores podem ser desenvolvidas a partir das incitações do ambiente por meio de

estímulos e mediações significativas para o sujeito, fazendo sentido e provocando

relações e nexos entre as funções, promovendo a passagem de suas experiências

naturais para as culturais, a partir da vivência.

Nessa perspectiva, o papel do professor seria o de promover essas mediações

significativas, que possibilitassem aos alunos novos nexos e relações. Portanto, a

educação escolar tem importância fundamental no desenvolvimento psíquico.

Entretanto, ao analisar as respostas dos professores foi possível perceber que

87% (não responderam, não especificaram, mencionaram apenas aspectos

intelectuais ou emocionais) dos professores não expressaram verbalmente uma visão

de totalidade do desenvolvimento do psiquismo e tampouco sobre como promover o

desenvolvimento psíquico discente, na perspectiva da Teoria Histórico-Cultural.

Uma segunda perspectiva de análise da primeira categoria, ou seja, da

concepção do professor sobre o desenvolvimento do psiquismo, tomou por base esse

conceito tal qual expresso pelos professores, comparando-o com o conceito proposto

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pela Teoria Histórico-Cultural, analisando-o de acordo com a classificação proposta

por Davidov (1992), com base nos estudos desenvolvidos por Vigotski (1934),

conforme os níveis de generalização de seus elementos conceituais.

Importante destacar, ao analisar os conceitos apresentados pelos professores

que, na presente pesquisa, não se objetivou analisar o desenvolvimento do

pensamento teórico docente. Buscou-se refletir sobre a apropriação dos professores

acerca do conceito de desenvolvimento psíquico e sua relação com as funções

psicológicas superiores.

Para isso, investigou-se a forma como esse conceito manifestava-se, o que não

indica de forma alguma qual é o desenvolvimento da capacidade do pensamento

conceitual do professor. A avaliação do pensamento teórico do professor constituir-

se-ia em outra categoria de análise, exigindo outro procedimento científico e teórico o

qual não é o objeto desta pesquisa.

Assim, trazem-se os dados, a seguir, como complemento da análise da primeira

categoria, uma vez que os resultados apresentados estão diretamente relacionados

com as oportunidades de estudo e de formação inicial e continuada acessíveis ao

professor.

De acordo com a Teoria Histórico-Cultural, o desenvolvimento do psiquismo

decorre da busca para atender às demandas colocadas a partir das tarefas

desenvolvidas pelos sujeitos em relação às suas condições pessoais para atendê-las.

Nesse processo, as tarefas propostas pelos professores integram a Atividade de

Estudo, e ao promoverem a apropriação dos conceitos científicos possibilitam o

desenvolvimento das funções psicológicas superiores e, portanto, do pensamento

teórico.

Entende-se que os elementos expressos neste conceito deveriam aparecer na

conceituação docente sobre o desenvolvimento do psiquismo, na perspectiva teórica

que se está tomando como referência. Assim, a análise apresentada buscou investigar

se esses elementos conceituais, tais como: Atividade, tarefa, funções psicológicas e

suas relações, eram expressos no respectivo conceito apresentado pelos docentes.

Complementando a análise da categoria 1, os Quadros 2 e 3 contribuíram como

instrumento para pesquisar a concepção teórica apresentada pelos professores,

sobre: o desenvolvimento do psiquismo e as funções psicológicas superiores.

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107

O Quadro 2 apresenta o instrumento de pesquisa utilizado para análise das

respostas dos professores e seus respectivos níveis de generalização com relação ao

conceito de desenvolvimento do psiquismo.

Quadro 2: Análise do conceito de desenvolvimento do psiquismo apresentado pelos

professores de Arte da rede estadual de Cascavel

O que você entende por Desenvolvimento do Psiquismo?

Professor A: É a forma como você acrescenta o conhecimento, que se evolui psicologicamente no aprendizado. (Complexo)

Professor B: Entendo que através do século passado, entre estudos de psicanalistas, foi atribuído ao consciente e ao inconsciente, atribuições de suma importância, tanto para o tratamento de patologias, com para o desenvolvimento saudável da mente humana, desde a infância, até uma velhice saudável. (Amontoado sincrético)

Professor C: Não respondeu.

Professor D: não

Professor E: Não respondeu.

Professor F: Desenvolvimento do pensamento crítico e reflexivo. (Complexo)

Professor G: Entendo que nosso desenvolvimento [sic] das funções superiores cognitivas dependem da maturidade cronológica e das relações de aprendizagem/ conhecimento experiências que fazemos ao longo da vida. (Conceito)

Professor H: Desenvolvimento da mente, intelectual e emocional. (Pseudo-conceito)

Professor I: muito pouco prefiro não comentar.

Professor J: Trabalhar de forma a desenvolver o emocional, tomar consciência de si, suas capacidades. (Complexo)

Professor K: Acredito que é algo constante na vida das pessoas, o estímulo é uma forma de desenvolvimento. (Complexo)

Professor L: Aquele que desperta o processo reflexivo, psicológico... (Complexo)

Professor N: “não sei.”

Professor O: Não domino o tema.

Professor Q: Ligado a emoções, sentimentos e mente. (Complexo) Fonte: Dados coletados por Biavatti e organizados por Biavatti e Szymanski (2019)

Constatou-se que 40% dos professores não responderam à questão, portanto

não estão nem sequer no nível de amontoado sincrético. Não conseguiram

expressar qualquer característica referente ao processo de desenvolvimento psíquico

uma vez que desconhecem o tema.

As respostas de 7% do professor Prof. B encontram-se no nível de

amontoado sincrético, apresentando um conjunto de definições reunidas de maneira

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desorganizada com elementos desconexos, sequer referentes ao desenvolvimento do

psiquismo, com respostas aleatórias, confusas e fragmentadas.

Quarenta por cento dos professores apresentaram um conceito de

desenvolvimento do psiquismo que pode ser classificado no nível de complexo. Neste

caso, a representação do objeto não abarca as propriedades essenciais, gerais e

universais do conceito, embora se refira a elementos presentes na cotidianidade

escolar. É o que pode ser observado nas respostas dos professores: Prof. A, Prof. F,

Prof. J, Prof. L e Prof. K.

Constatou-se que apenas 7% aproximou-se do conceito, como o Prof. G que

relaciona o desenvolvimento do psiquismo às FPS, e refere-se a esse processo ao

longo da vida. Revela um conhecimento mais profundo do objeto, indo além da

unificação das impressões desordenadas. Abstrai traços importantes do objeto,

sintetiza-os e simboliza-os por meio de signos, embora ainda não se refira ao

desenvolvimento como um processo de humanização.

A Figura 6 apresenta uma síntese da análise da concepção dos professores

acerca do desenvolvimento do psiquismo.

Figura 6: Análise do nível de generalização correspondente ao conceito de

Desenvolvimento do Psiquismo, apresentado pelos professores de Arte da rede

estadual de Cascavel

Fonte: Dados coletados por Biavatti e organizados por Biavatti e Szymanski (2019)

Verifica-se, portanto, que apenas 6% dos professores de Arte expressaram o

conceito de desenvolvimento do psiquismo no nível mais avançado e 7% atingiu o

nível de pseudoconceito, revelando que cerca de 87% dos professores nem sequer

identificam os traços principais do conceito, o que lhes impede de abstrair e sintetizar

esses traços de forma a generalizá-los, ainda que do ponto de vista do

desenvolvimento psíquico como um todo, a formação de conceitos enquanto operação

40%

7%

40%

7% 6%

Não respondeu AmontoadosSincréticos

Complexos Pseudo-conceito Conceito

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109

intelectual em outros aspectos do conhecimento lhes seja viável, revelando lacunas

na formação inicial e continuada do professor de arte.

6.2 CONCEPÇÃO DE FUNÇÕES PSICOLÓGICAS SUPERIORES POR PARTE DOS

PROFESSORES DE ARTE

A segunda categoria investigada correspondeu ao conceito de funções

psicológicas superiores apresentado pelos professores de Arte. A Figura 7 apresenta

uma síntese acerca dessa compreensão.

Figura 7: Elementos do Conceito de funções psicológicas superiores apresentado

pelos professores de Arte da rede estadual de Cascavel

Fonte: Dados coletados por Biavatti e organizados por Biavatti e Szymanski (2019)

As respostas apresentadas são coerentes com os dados coletados quanto à

concepção dos professores relativa ao conceito de desenvolvimento do psiquismo.

Quanto ao conceito de funções psicológicas superiores 7% dos professores associam

as funções psicológicas superiores à aquisição de conhecimento e experiência: Creio

que são nossas conexões cerebrais mais complexas, desenvolvidas a partir de nossas

experiências, conhecimentos e relações entre elas. (Professor G).

Treze por cento das respostas, embora não expressassem precisamente o

conceito, foram coerentes relacionando as Funções Psicológicas Superiores com

conexões cerebrais e funções conscientes voluntárias como: São as funções

conscientes voluntárias: memória, percepção etc. (Professor J).

Treze por cento apresenta um conceito fragmentado do que são funções

psicológicas superiores, relacionando-as apenas à reflexão, subentende-se a

aspectos intelectuais, ao pensar: Funções responsáveis pelo desenvolvimento

Não sabem/não responderam. 67%

Conexões cerebrais/funções conscientes. 13%

Aspectos Intelectuais. 13%

Conhecimento e experiência. 7%

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reflexivo. (Professor F). Não tenho certeza, mas acho que seja o refletir, o pensar

sobre um “assunto” e manifestar-se. (Professor O).

Outros professores (7%) apresentaram respostas que revelam uma

compreensão vaga do conceito de FPS. Por exemplo: Processos em que desperte

todos os sentidos psíquicos.” (Prof. L). Essa resposta suscita dúvida quanto ao seu

sentindo. A incerteza quanto ao significado atribuído pelo professor a alguns termos

constitui um dos limites do uso do questionário como instrumento de pesquisa, uma

vez que a entrevista para coleta dos dados permitiria elucidar essa dúvida.

Ressalta-se que, 67% deixou em branco, ou afirmou não saber, como o

Professor Q: “superiores...não sei”. Revelando o desconhecimento do conceito de

funções psicológicas superiores entre os docentes.

Importante destacar Souza e Andrada (2013) que, apoiadas em Vigotski,

apresentam em sua pesquisa exemplos de Funções Psicológicas Superiores, como,

memória, consciência, percepção, atenção, fala, pensamento, vontade, formação de

conceitos e emoção, que se relacionam entre si e formam um sistema psicológico

integrado.

Baraldo (2017), apoiando-se nos autores que fundamentam a Teoria Histórico-

Cultural, ressalta que o desenvolvimento humano depende das qualidades de

apropriação realizadas pelo homem nas relações com o mundo exterior, ocorrendo a

partir das interações sociais. Portanto, a não apropriação do conceito de funções

psicológicas superiores pelo professor de Arte, revela a ausência dessas

possibilidades de discussão na escola, bem como nos processos de formação

docente.

Na disciplina de Arte, devem ser mediados conteúdos, instrumentos e

ferramentas que possibilitem ao aluno analisar a realidade, aprendendo a situar-se

como um sujeito da história

[...] capaz de estabelecer relação com o mundo cultural, mas como pilar de sustentação das possibilidades de criações e projetos. A educação das formas superiores de conduta, o desenvolvimento das funções psíquicas superiores vem, portanto, tornar possível o domínio sobre a conduta humana, bem como o controle da natureza e do mundo, tomado como processo de trabalho na perspectiva de produção da vida plena para todos (BARALDO, 2017, p. 22-23).

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Entende-se, portanto, que o estudante ao se apropriar do conhecimento

elaborado pelo homem ao longo da história, por meio da sistematização dos

conteúdos científicos, estará se apropriando e desenvolvendo as funções psíquicas,

isto é, apropriando-se de estratégias que lhe permitam ampliar suas formas de

atuação na prática social.

Por isso, a educação escolar precisa ser adequada e organizada considerando

o desenvolvimento das funções psíquicas superiores, a estruturação da conduta dos

homens, não apenas como fator de inserção social, mas como pilar de sustentação

de uma forma de funcionamento psíquico envolvendo análises, sínteses e

generalizações que possibilitem projetos criativos que contribuam para a

transformação social, na busca de maior equalização nas oportunidades sociais.

A seguir, discute-se uma segunda perspectiva de análise da categoria referente

à concepção teórica dos professores sobre o conceito de funções psicológicas

superiores, fundamentada na classificação proposta por Davidov (1992), também com

base nos estudos desenvolvidos por Vigotski quanto à elaboração de conceitos. O

Quadro 3 apresenta o instrumento de pesquisa idealizado para essa análise.

Quadro 3: Análise do conceito de funções psicológicas superiores apresentado pelos

professores de Arte da rede estadual de Cascavel

O que são Funções Psicológicas Superiores?

Professor A: Após o conhecimento é o saber como usar esse conhecimento. (Complexo)

Professor B: Acredito que são aquelas que estão no momento atual de nossa vida, ou seja no consciente. (Complexo)

Professor C: Não respondeu.

Professor D: não

Professor E: Não respondeu.

Professor F: Funções responsáveis pelo desenvolvimento reflexivo. (Pseudo-conceito)

Professor G: Creio que são nossas conexões cerebrais mais complexas, desenvolvidas a partir de nossas experiências, conhecimentos e relações entre elas. (Conceito)

Professor H: Não respondeu.

Professor I: Não sei.

Professor J: São as funções conscientes voluntárias: memória, percepção, etc. (Pseudo-conceito)

Professor K: Não respondeu.

Professor L: Processos em que desperte todos os sentidos psíquicos. (Amontoado sincrético)

Professor N: “Não sei.”

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Professor O: Não tenho certeza, mas acho que seja o refletir, o pensar sobre um “assunto” e manifestar-se; (Complexo)

Professor Q: superiores...não sei Fonte: Dados coletados por Biavatti e organizados por Biavatti e Szymanski (2019)

Ao analisar as respostas apresentadas pelos professores sobre a concepção

de funções psicológicas superiores, constatou-se que 60% dos professores não

souberam responder e/ou não responderam, o que demonstrou a ausência de

consciência sobre o conteúdo.

O conceito de funções psicológicas superiores para treze por cento dos

professores encontra-se no nível de generalização que pode ser classificado como

amontoado sincrético, como o Prof. B, pois apresentam, características do objeto

sem fundamento suficiente para a compreensão desse conceito.

Treze por cento dos professores apresentam uma compreensão do conceito de

FPS no nível de complexo. Apresentam exemplos de funções psíquicas, ou mesmo

referem-se ao funcionamento do sujeito na relação com a vida, como os Prof. F e o

Prof. O. Porém, ainda estão no nível da impressão imediata, revelando algumas

características desse conceito, mas que ainda não o caracterizam de maneira mais

abrangente, embora iniciem o processo de generalização do conceito de FPS em um

nível mais elevado do pensamento.

Sete por cento das respostas pôde ser classificada no nível de

pseudoconceito, e 7% das respostas aproximam-se do nível do conceito, embora o

Professor G tenha expressado sua concepção em poucas palavras, subentende-se

que relaciona as funções psicológicas superiores com as conexões cerebrais,

experiências e conhecimentos, percebe-se que a elaboração mental ultrapassa a

impressão imediata, a resposta apresenta-se em um nível mais elevado do

pensamento e da consciência com a visão ampla do objeto.

A Figura 8 apresenta uma síntese visual da análise da concepção professor de

funções psicológicas superiores efetuada com base no conceito de conceito

apresentado por Vigotski (1934) e Davidov (1992).

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Figura 8: Análise do nível de generalização correspondente ao conceito de Funções

Psicológicas Superiores apresentado pelos professores de Arte da rede estadual de

Cascavel

Fonte: Dados coletados por Biavatti e organizados por Biavatti e Szymanski (2019)

Ao analisar o nível conceitual de funções psicológicas superiores dos

professores de Arte, observou-se que em 60% dos casos, os conceitos investigados

estão totalmente ausentes, ou seja, os professores não apresentaram sequer uma

característica relativa a esse conceito. E em 7% dos casos, os conceitos são meros

amontoados sincréticos, palavras soltas sem qualquer generalização revelando

impressões casuais com base em alguma característica que se destaca, porém sem

nexo. Esses índices demonstram que o desconhecimento em relação às FPS é ainda

maior do que em relação ao conceito de desenvolvimento psíquico.

Esse resultado precisa ser analisado em relação à questão da formação dos

professores. Revela que o desconhecimento sobre o tema, é consequência de sua

ausência na formação inicial e continuada quanto a fundamentação teórica, na

perspectiva da Teoria Histórico-Cultural, conforme constatado no relato apresentado

pela pesquisadora na Introdução desta dissertação.

Pode-se inferir, portanto, que esses conceitos não fazem parte do cotidiano

pedagógico do professor para a grande maioria, assim a indagação sobre eles

provocou um estranhamento, e resultou em respostas aleatórias, fragmentadas e em

nível de senso comum.

Investigar e diagnosticar os conceitos apresentados pelos docentes da

disciplina de Arte sobre o desenvolvimento do psiquismo e sobre as funções

psicológicas superiores, leva ao questionamento das práticas pedagógicas

desenvolvidas. Em outras palavras, indaga-se quais as consequências no processo

pedagógico da fragilidade conceitual revelada nesta etapa da pesquisa de campo.

A seguir apresentar-se-á a análise das possíveis consequências dessa

fragilidade conceitual e da falta de compreensão da fundamentação teórica da

67%

7%13%

7% 6%

Não sabem AmontoadosSincréticos

Complexos Pseudo-conceito Conceito

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114

perspectiva da Teoria Histórico-Cultural no preparo das aulas, nas ações pedagógicas

desenvolvidas pelos professores no ensino da disciplina de Arte, e nos limites e

desafios encontrados em sala de aula.

6.3 ANÁLISE DE ELEMENTOS DO PROCESSO PEDAGÓGICO

Para analisar as consequências da concepção docente sobre o

desenvolvimento do psiquismo e sua relação com as funções psicológicas superiores

no processo pedagógico, estabeleceram-se três categorias: Fundamentação teórica

dos professores para o preparo das aulas (Categoria 3); Ações pedagógicas

realizadas pelos professores (Categoria 4) e Limites e Desafios encontrados no

trabalho pedagógico (Categoria 5).

A Figura 9 apresenta e analisa os dados quanto às fontes nas quais os

professores de Arte apoiam-se para elaboração de suas aulas.

Figura 9: Fontes utilizadas pelos professores para o preparo das aulas

Fonte: Dados coletados por Biavatti e organizados por Biavatti e Szymanski (2019)

Setenta e três por cento dos professores responderam que seguem algum

documento para realizar o trabalho pedagógico e citam as diretrizes curriculares de

Arte do Estado do Paraná, o currículo, o PPP (Projeto Político Pedagógico da Escola)

e a PPC (Proposta Pedagógica Curricular). Esses documentos, orientadores da

mantenedora SEED/PR, para a organização da prática pedagógica em sala de aula,

devem ser seguidos pelos professores para a organização do trabalho pedagógico.

Como exemplos:

Citam documentos (PPP, PTD, PPC, REGIMENTO, CURRÍCULO

e DCE)73%

Respostas aleatórias: realidade do aluno, livros, artigos...

27%

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115

Do PPP da escola, PCC [sic] e da elaboração do plano de trabalho professor onde que utilizamos para se orientar e desenvolver nossa atividade conto na prática e teoria em sala de aula. (Professor D). DCE, PTD. As aulas são desenvolvidas para trabalhar a prática/teórico, muitas vezes os alunos preferem a prática de arte, mas, temos que passar e cobrar a teoria também, para que os mesmos saibam o que estão fazendo, o fundamento da atividade, o por que, de onde veio, onde vão precisar. (Professor K).

Porém, a maioria das respostas resume-se a nomeá-los:

O documento que eu utilizo são as diretrizes curriculares. (Professor H).

Vinte e sete por cento dos professores citam que se apoiam em outros

elementos para organizar suas aulas como a realidade do aluno, ou artigos e livros.

No entanto, suas respostas são lacônicas e superficiais, não revelando uma

concepção teórica, e não revelam compreenderem tais documentos. Desses, 20%

relatam que fundamentam o trabalho pedagógico no contexto social, na realidade dos

alunos e nas necessidades da turma. Como exemplo:

Partindo de uma análise escolar (alunado), local em que estão inseridos, estudos (aprendizagem) anteriores. (Professor L).

Muitas vezes, é somente na escola que o aluno pode ter contato com obras de

arte, aprender a conhecê-las e situá-las historicamente. Entretanto, chamou a atenção

a resposta de uma professora ao afirmar que, na escola a professora trabalha com

materiais recicláveis porque o aluno é pobre.

Me fundamento nas dificuldades que a sociedade que vive meu aluno [sic], por exemplo, se faz parte de uma comunidade de baixo poder aquisitivo, procuro criar aulas utilizando materiais recicláveis ou de baixo poder aquisitivo, sempre em conjunto com as propostas da PPC. (Professor B).

Enfim, o preparo das aulas exige uma compreensão abrangente e profunda

sobre o papel da disciplina de Arte na constituição da subjetividade, ou seja, no

processo de humanização discente.

Conforme Luria (1979), a preparação dos instrumentos, estudos e

conhecimentos a partir das experiências do trabalho, é a primeira forma de atividade

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116

consciente do homem que leva a mudanças no seu comportamento. Se o preparo das

aulas fundamenta-se nos documentos oficiais de forma superficial, demonstrando-se

mais com a função de cumprir uma exigência da mantenedora, sem a compreensão

do que esses documentos revelam para um processo pedagógico que objetive a

humanização e emancipação dos alunos, esse resultado não se materializa. E mais

ainda, o aligeiramento na fundamentação impede um trabalho docente consciente,

considerando-se que se compreende a consciência como a possibilidade humana de

análise, objetivando verificar se o trabalho docente está cumprindo seus objetivos.

Entende-se que o professor deve instrumentalizar-se a partir de fundamentos

teóricos e metodológicos para o melhor resultado pedagógico. Se esse processo não

ocorre, em consequência das próprias condições do trabalho docente, que não lhe

possibilitam tempo para estudar, ou de um sistema de trabalho que não lhe possibilita

um programa bem fundamentado de formação continuada, o professor acaba por

executar tarefas, porém não as desenvolve inseridas em uma atividade consciente de

estudo.

Desenvolver uma atividade consciente de estudo exige o constante preparo

teórico, e a constante avaliação do produto da atividade, verificando se as tarefas

desenvolvidas possibilitam o produto que se almeja.

Nesse sentido, buscou-se verificar quais as ações pedagógicas desenvolvidas

pelos professores na condução de suas aulas, as quais estão expressas na Figura 10,

que corresponde à quarta categoria de análise dos dados coletados.

Figura 10: Ações pedagógicas desenvolvidas pelos professores de Arte da rede

estadual de Cascavel

Fonte: Dados coletados e organizados por Biavatti e Szymanski (2019)

Prática/ênfase no emocional. 13%

Não respondeu. 7%

Teoria e Prática. 47%

Prática. 13%

Teoria . 20%

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Treze por cento dos professores não responderam quais as ações pedagógicas

desenvolvem em sala de aula. Outros responderam de forma vaga, não especificando

as especificando:

Comprometimento, criatividade, pesquisa. (Professor O).

Verificou-se que 33% dos professores privilegiam ou a teoria ou a prática,

revelando uma fragmentação que fragiliza o processo pedagógico. Assim, desses

33%, as respostas de 13% dos professores colocam a ênfase do processo pedagógico

na prática e no trabalho que desenvolvem, ainda que algumas vezes aliadas a

aspectos emocionais dos alunos, como comprometimento e segurança:

As atividades, produções práticas são sempre voltadas p/ que o aluno se perceba, que faz parte da história, que pode mudar sua realidade e desenvolva seu próprio senso crítico. Que ele se perceba capaz. (Professor J). Muito desenho, sou uma participante que aprendi a desenhar com a técnica, então os passos que me foram ensinados, eu repasso a eles, sempre regados de elogios, deixando claro, que é apaixonante fazer o desenho tortinho e assinar deixando sua marca de artista. (Professor B).

Referem-se apenas à teoria, os 20% dos professores - que compõem o

montante de 33% - quando afirmam, por exemplo:

Pesquisa, leitura, trabalho em grupo ou individual. (Professor D). Solicito a atenção, observação e o estudo. (Professor G).

A preocupação com o estudo é valorizada pela Teoria Desenvolvimental.

Entretanto, sabe-se que é a atividade que mobiliza o sujeito a buscar os conceitos

científicos que necessita. Assim, a dissociação entre teoria e prática, revelando a

fragmentação do processo pedagógico e a não compreensão do conceito de práxis,

aponta para a ausência da formação inicial e continuada dos professores.

Dentre aqueles que se referem a ações pedagógicas que envolvem Teoria e

Prática, encontram-se 47% dos professores. Entretanto, desse conjunto, 6% não

especificam quais ações pedagógicas realizam. Por exemplo:

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118

Teoria, reflexão, prática, trabalhando com os sentidos, desenvolvendo o senso crítico. (Professor K).

Os demais (41%), ainda dentro dos 47% que se referem à teoria e à prática,

desenvolvem ações pedagógicas objetivando a compreensão da obra artística e do

autor articulando esse trabalho com canto, leitura e releitura de imagens, observação,

apreciação e análise de desenhos, colagens, dentro das diferentes linguagens:

cinema, teatro e música, etc.

Aulas teóricas onde os estudantes possam refletir sobre determinados conteúdos, artistas e suas obras, contextos artísticos [...] Após momento reflexivos [sic], iniciamos processo criativo, desenvolvendo prática, com orientações tanto verbal quanto visual etc [...] Teorizar, Sentir e Perceber. (Professor L). Momentos de análise e reflexão sobre obras e artista. Em seguida sempre há pratica, em cada aula procuro usar um material ou espaço diferente [...] [sic] da aula anterior para realizarmos as atividades. (Professor F). Releituras, trabalhos em grupos, interpretação e leitura de obras e imagens, observação dos elementos. (Professor C).

Entretanto, ao se referirem as atividades práticas, 29% dos professores

revelaram em suas respostas que como atividades pedagógicas solicitam aos alunos,

individualmente ou em grupo, trabalhos teóricos envolvendo ações pedagógicas como

leitura, debate, pesquisas sobre artistas, obras e contexto artístico, o que pode

significar na verdade uma ênfase na teoria.

A teoria por si só não produz nenhuma mudança real. A prática tem a função

de transformar a teoria, o real, o agir no mundo com um sentido, sendo útil de acordo

com a necessidade do homem, da ciência e da realidade. No entanto, precisa articular-

se à teoria, isto é, à consciência, para transformar a realidade e transformar a própria

consciência. Portanto, a prática e a teoria se fundem e são dependentes (VÁSQUEZ,

2011).

Assim, a fragmentação entre teoria e prática constatada revela que o trabalho

pedagógico não está correspondendo aos objetivos propostos para a disciplina de

Arte.

Page 119: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

119

Verifica-se que 27% dos professores referiram-se à compreensão do

contexto histórico como um importante objetivo do trabalho professor, considerando-

se a importância de situar o artista e sua obra historicamente.

Leitura de imagens, Releitura, desenho de observação, trabalhos de pesquisa sobre obras e contexto histórico, teatro. (Professor I). Compreensão do contexto histórico em relação ao conteúdo que está sendo trabalhado, leitura de textos (resumos) apreciação/leitura/análise do que está sendo visto, atividades, na grande maioria prática, desenhos, colagens, etc sobre o conteúdo aprendido. (Professor E).

Para que o aluno se sinta como participante da história, fazem-se necessárias

a contextualização e a compreensão das obras artísticas, como expressões de um

momento histórico no qual as relações de produção se expressam de determinada

forma, relacionando-as à realidade atual.

Trabalhar o contexto de uma determinada obra de arte, exige a compreensão

de que a obra foi produzida naquele momento histórico, com os instrumentos,

recursos e conhecimentos que circulavam naquele contexto. Cada momento da

história, tem suas peculiaridades.

É importante que o aluno relacione a realidade do contexto da obra estudada

com a realidade atual, considerando as transformações ocorridas no processo

histórico de desenvolvimento da sociedade. Isto envolve a compreensão de que,

atualmente, os instrumentos, recursos, e os conhecimentos envolvidos na produção

de uma obra de arte são produtos das relações sociais vivenciadas neste momento

histórico, trazem a marca e são produtos da criação humana.

Apenas 18% dos professores referiram-se às diferentes Linguagens Artísticas:

cinema, teatro, música, dança, dentre as quais música e dança foram as mais citadas,

o que reforça a crítica no sentido de que o professor trabalha a linguagem na qual se

sente preparado.

A partir da análise sobre as práticas pedagógicas relatadas pelos professores

foi possível perceber que muitas respostas trazem a palavra “meio”, para se referir à

ideia de que o contexto do aluno deve ser levado em conta no planejamento professor.

Mas as respostas revelam uma consciência precária sobre o trabalho pedagógico, na

qual o desenvolvimento do psiquismo e das funções psicológicas superiores não se

inserem.

Page 120: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

120

Há fortes evidências de que a fragmentação observada nos conceitos

referentes ao desenvolvimento do psiquismo, repete-se na condução das aulas, como

se observou na dissociação teoria e prática, a qual ocorre em mais de 50% dos casos

analisados.

Os limites e desafios enfrentados pelos professores no processo de ensino e

aprendizagem também se constituem em consequências da concepção docente sobre

o desenvolvimento do psiquismo e de sua articulação com as funções psicológicas

superiores. A concepção desses conceitos orienta as decisões docentes na prática

pedagógica e se essa práxis refletir-se em um trabalho que seja significativo para o

aluno, ocorre uma alteração nos limites e desafios enfrentados pelo professor.

Buscou-se, assim, investigá-los, e sua distribuição é apresentada na Figura 11,

constituindo-se na quarta categoria pesquisada.

Figura 11: Limites e Desafios apresentados pelos professores no Trabalho

Pedagógico

Fonte: Dados coletados por Biavatti e Szymanski (2019)

Atualmente, muitos são os desafios do trabalho em sala de aula. Para analisar

os desafios apresentados pelos professores, considerou-se cada elemento por eles

citados, assim, o total de limites e desafios corresponde a 100%. Não corresponde ao

total de professores, pois o professor pôde apresentar mais de um limite e desafio.

As respostas dos professores foram organizadas em duas subcategorias, que

emergiram dos próprios dados, objetivando compreender a realidade atual em sala de

Falta de materiais. 28%

Falta /Interesse/Concentração/Urbanidade

/Comportamento/Motivação. 25%Falta de recursos tecnologicos. 13%

Planejamento. 3%

Falta de espaço físico adequado. 9%

Falta de apoio dos colegas. 6%

Agressividade/Indisciplina/Problemas

familiares. 16%

Page 121: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

121

aula no que diz respeito às condições que podem influenciar diretamente no trabalho

pedagógico com os alunos: Problemas materiais (50%) – levemente mais acentuada

– e Desafios emocionais (47%).

Além dessas duas subcategoriais, 3% dos professores relataram encontrar

dificuldade em relação ao planejamento das aulas nos anos anteriores, referindo-se a

ações mal planejadas, e consequentemente à incoerência dos conteúdos trabalhados.

Ações mal planejadas de professores anteriores, infelizmente estamos inseridos em um sistema, devemos seguir, com isso, existe uma falta de concordância nos conteúdos e planejamentos. (Professor L).

Anache e Fernandes (2011) ressaltam a necessidade do direcionamento das

atividades, e apontam a dificuldade em relação à falta de embasamento teórico e de

um referencial curricular para definir o método e as estratégias de ensino pelos

docentes.

Os limites encontrados no trabalho pedagógico podem relacionar-se à

necessidade de aprofundamento teórico por parte do professor no enfrentamento dos

desafios cotidianos em sala de aula. Porém, a mantenedora também deixa a desejar,

tanto no suprimento de recursos materiais, quanto em relação ao espaço físico. Dentre

as dificuldades materiais (50%), os professores apontaram: Falta de materiais

didáticos (28%), Falta de Recursos Tecnológicos, (13%) e Falta de espaço físico (9%),

ou seja uma sala adequada para o desempenho das aulas teóricas e práticas voltadas

às manifestações artísticas. Como se pode verificar a seguir:

Falta de recursos tecnológicos (projetor multimídia em salas de aulas, pois a disciplina exige imagens, vídeos, música para a abordagem da disciplina/conteúdo). [...] Falta de uma sala em específica para a realização de trabalhos práticos. (Professor H). Tem um colégio que não tem suporte técnico para fazer pesquisa, pouco material didático para auxiliar no desenvolvimento das atividades. (Professor D). [...] falta materiais diferentes para trabalhar técnicas novas, o desafio é inovar, renovar, criar atividades atrativas, a indisciplina também é um desafio para produção artística é necessário um ambiente calmo. (Professor K). Penso que nos dias de hoje seria o maior desafio, fazer com que os alunos queiram realizar as atividades propostas. A falta de concentração é um grande desafio. (Professor N).

Page 122: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

122

Grande limite é falta de laboratório de arte. (Professor A).

E a Prof. H ratifica:

Falta de uma sala em específica para a realização de trabalhos práticos.

Anache e Fernandes (2011) ressaltam em sua pesquisa a necessidade de um

lugar adequado para o desenvolvimento da criatividade no trabalho pedagógico, ao

direcionar as atividades.

Raach (2016) compreende que as tecnologias potencializam novas propostas

de aprendizagem na Educação, mas considera que a prática pedagógica necessita

de adaptações, propiciando novas relações no contexto escolar. Constatou a

dificuldade do uso das tecnologias por parte dos professores e estudantes, levando

ao predomínio da metodologia tradicional do ensino, mas reforça que o professor

precisa fazer a mediação usando-as com o objetivo de efetivar os processos de ensino

e de aprendizagem, “pois são muitas as possibilidades de criação, construção e

inovação nas aulas de Arte ampliando a compreensão do hibridismo” (RAACH, 2016,

p. 111)51.

Os professores devem estar constantemente em formação a fim de enfrentar

os desafios contemporâneos na docência, entre os quais os mais citados foram a falta

de materiais pedagógicos, além da carência de recursos tecnológicos para o preparo

e a execução das aulas. De fato, contraditoriamente, com todo o avanço tecnológico

desenvolvido atualmente pela humanidade, a carência de recursos e o

desconhecimento sobre como acessar os recursos tecnológicos que estão

disponíveis, ainda é um grande desafio na área da Educação.

A Teoria Histórico-Cultural acentua a necessidade de que o professor proponha

tarefas aos alunos que lhes exijam a utilização dos instrumentos, materiais

construídos pelos homens para deles se apropriarem, e assim se humanizarem.

Portanto, se 50% dos professores colocam problemas relativos aos instrumentos e

materiais como desafios para a práxis pedagógica, pode-se compreender por que

muitos professores trabalham apenas com a parte teórica da disciplina,

consequentemente de forma fragmentada, pouco contribuindo para o

desenvolvimento psíquico dos alunos.

51 O hibridismo, termo muito utilizado na Arte Contemporânea, caracteriza-se pelo diálogo e a fusão de diversos tipos de arte, indo além de determinada linguagem artística (ANDRADE, 2018).

Page 123: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

123

Na subcategoria referente às questões emocionais (47%), foram apontados

três aspectos: falta de interesse, motivação e concentração (25%), agressividade,

indisciplina, problemas familiares (16%), falta de apoio dos professores (6%).

Seis por cento dos professores relataram a falta de apoio dos colegas

profissionais. Entende-se, nesse aspecto, que há situações em que os próprios

professores não colaboram para a efetiva prática pedagógica da disciplina, que não

há a unidade do trabalho no coletivo docente. Individualismo que é característico de

uma sociedade competitiva fundada no modo de produção capitalista. Cada professor

age de forma individualizada, trabalhando conforme sua perspectiva, interesse ou

necessidade, demonstrando desconhecimento dos documentos norteadores da

prática pedagógica.

[...] falta de apoio e compreensão dos colegas professores. (Professor A). Falta de materiais, colaboração dos demais professores para realizarmos um bom trabalho para o desenvolvimento das crianças. (Professor F).

Os maiores desafios envolvem problemas de comportamento, muitas vezes

decorrentes da falta de interesse e motivação dos alunos, apontados por 25% dos

professores. Como exemplo:

Falta de estrutura (materiais), quantidade de alunos elevada por sala, desmotivação por parte dos alunos (alguns) o que leva a indisciplina e acaba dificultando o trabalho em sala. (Professor E). Penso que nos dias de hoje seria o maior desafio, fazer com que os alunos queiram realizar as atividades propostas. A falta de concentração é um grande desafio. (Professor N).

[...] falta de interesse dos alunos. (Professor A).

A falta de interesse pode acarretar indisciplina e interferir na concentração,

acentuando o desafio escolar quanto ao compromisso de contribuir para a

humanização discente. Porém, o professor consciente desse desafio tem mais

recursos para enfrentá-lo:

Dirigir a atenção para uma boa compreensão da atividade, interação dos alunos e produção sem material didático. (Professor C).

Page 124: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

124

Falta de recursos pedagógicos e o maior desafio é despertar no aluno a consciência quanto à importância do conhecimento. (Professor J). Dezesseis por cento dos professores colocaram como desafios a

agressividade, indisciplina e problemas familiares:

A agressividade advinda de alunos, com problemas familiares, pois isso interfere no interesse de aprendizagem e evolução do seu I.D. (Professor B). Falta de disciplina dos alunos e falta de materiais. (Professor O). Os desafios quanto a indisciplina, relacionam-se com falta de interesse,

problemas familiares e questões pedagógicas. Entretanto, é importante considerar o

contexto social em que o indivíduo está inserido. Na verdade, questões sociais e

pedagógicas, imbricam-se.

Assim, a partir da apresentação e análise dos resultados obtidos na pesquisa,

compreende-se o quão se faz importante e necessária a formação continuada do

professor para a transformação da sua consciência quanto às ações e operações

necessárias à atividade de ensino. Sem essa consciência o ensino caminha à deriva,

anula-se a intencionalidade no processo pedagógico, o que se refletirá na prática

pedagógica e consequentemente na aprendizagem escolar.

Como se pode observar, são inúmeros os desafios educacionais enfrentados

pelos professores. Essa situação agrava-se na ausência de políticas públicas

educacionais específicas que venham ao encontro das necessidades da escola

pública para a formação humana, e na usurpação dos direitos dos professores que se

vem observando na atual realidade educacional.

A formação humana ocorre no processo da história social, na vivência ao longo

da qual se desenvolvem a atividade criadora e a linguagem, resultando no

desenvolvimento do homem cultural, das suas potencialidades criativas que envolvem

a capacidade de perceber, analisar, sintetizar e generalizar informações e, dessa

forma, elaborar novos conhecimentos que retornem à prática social modificando-a

(VIGOTSKI, 1999).

No processo de formação humana, destaca-se o papel da escola. Entretanto,

Barroco e Tuleski (2007) questionam a escola atual entendendo que ela deveria

constituir-se como um espaço físico de socialização do conhecimento científico e da

produção humana, indo além do senso comum, de forma a desenvolver o homem

Page 125: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

125

cultural, enfatizando a capacidade de analisar, sintetizar, perceber e generalizar as

informações que o mundo oferece. Se os professores não revelam domínio de uma

fundamentação teórica para o trabalho pedagógico, como poderia a escola constituir-

se em um espaço para a socialização do conhecimento científico?

Para promover conhecimentos novos e transformá-los, tendo como ponto inicial

o não cotidiano, seriam necessários desafios pedagógicos que, por sua vez,

exigissem do aluno novas ações e operações. Na medida em que o aluno as

executasse, delas estaria se apropriando e desenvolvendo suas funções psíquicas,

ou seja, humanizando-se.

Porém, as ações e operações a serem propostas aos alunos precisam ser

planejadas de forma a incidirem na ZDI, possibilitando motivos para o aluno buscar

novos recursos para a consecução dessas ações e operações. Esse movimento

promove a formação humana, mas exige que o professor tenha domínio do conteúdo,

além de compreender como ocorre o processo de humanização, condição não

observada na presente pesquisa.

Silva (2018), na mesma direção, considera que a escola é um espaço que pode

proporcionar aos estudantes o acesso ao saber, aos bens culturais, à reflexão, a partir

da mediação dos conteúdos significativos, ampliando a diversidade nas aulas de

forma a desenvolver a criatividade e promover interações e intervenções entre alunos

e professores nos contextos educativos.

No entanto, constatou-se como consequências da não compreensão do

conceito do desenvolvimento do psiquismo e de sua relação com as funções

psicológicas superiores, que a prática docente não se fundamenta em teoria alguma,

as ações pedagógicas são soltas, e os professores citam mas desconhecem nos

documentos norteadores da educação no Paraná, a teoria que os embasa.

A Teoria Histórico-Cultural, com o foco na aprendizagem dos alunos, traz o

comportamento humano como resultado de um processo de desenvolvimento que

envolve o contexto histórico-social e as relações interpessoais em que o indivíduo está

inserido (BARROCO, 2009; BARALDO, 2017). Nessa perspectiva, o indivíduo é

dependente das relações com o mundo exterior. Ele precisa da interação com o outro

para desenvolver seu pensamento, sua linguagem enfim, suas funções psicológicas

superiores.

Na escola, a criança está em relação ativa, assimilando uma experiência

humano-social, mediante a interação com o meio circundante, na medida em que se

Page 126: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

126

apropria do processo de ler, escrever, fazer contas e aprender os fundamentos da

ciência. Se os alunos, como decorrência da indisciplina, da falta de material didático,

de problemas quanto ao planejamento não estão aprendendo, isso significa que o

papel principal da escola que é a humanização discente está sendo precarizado.

Quanto ao desenvolvimento das funções psíquicas superiores, um dos

objetivos da disciplina de Arte é o desenvolvimento da criatividade. Anache e

Fernandes (2011) consideram que a criatividade é uma atividade subjetiva complexa,

uma condição individual que decorre das possibilidades de interação social, nas quais

as ações e operações desenvolvidas na disciplina de Arte, têm importante papel.

Porém, os dados coletados na presente pesquisa revelam uma lacuna na

concepção psicológica que se reflete na práxis pedagógica. Silva (2018), enfatizou a

necessidade de desenvolver estudos sobre as produções criativas do ensino da arte

numa perspectiva Histórico-Cultural, superando noções enrijecidas ou equivocadas

sobre as concepções pedagógicas e psicológicas que não consideram as

interconexões entre o social e o cultural, no estudo da personalidade e da criatividade.

Na mesma vertente, Leitão (2019) faz uma reflexão sobre a compreensão da arte

como trabalho criador e como conhecimento sensível da realidade humana,

apontando a necessidade de conduzir os alunos à apropriação desse conhecimento

articulado à prática social.

As formas de manifestação criativa que se expressam na produção de algo

novo e valioso em algum campo da ação humana, referem-se à humanização dos

sentidos de forma a ampliar a sensibilidade estética, possibilitando aos alunos

apropriarem-se da cultura produzida ao longo dos séculos pela humanidade, ou seja,

humanizando-se. No entanto, se a apropriação dos conceitos científicos é precária,

questiona-se até que ponto o processo pedagógico possibilita a humanização

discente.

Ainda, na organização do processo pedagógico, resgatando as contribuições

de Davidov e de Vygotski, e ratificando Peixoto (2011), Silva (2013; 2018), Silva e

Zanatta (2018) e Ashbar (2019) com relação à Educação Desenvolvimental, finaliza-

se o presente capítulo ressaltando alguns aspectos importantes a serem considerados

na disciplina de Arte, voltados à humanização docente e discente:

Promover a formação humana, compreendendo a criança em sua

totalidade enquanto partícipe do gênero humano;

Page 127: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

127

Elaborar e analisar o plano de ensino a partir do conceito científico a ser

apreendido. Um conceito nuclear que, se necessário, seja trabalhado por

meio de conceitos parciais, analisados com a ajuda de um mapa mental

conceitual;

Conectar as tarefas a serem desenvolvidas pelos alunos com a

realidade, de forma a propiciarem avanços crescentes no grau de

abstração e generalização;

Possibilitar aos alunos o controle ativo das ações requeridas para a

solução da tarefa, que deve envolver participação, interação, mediação

entre diferentes zonas de desenvolvimento iminente dos alunos no

grupo;

Acompanhar o processo pedagógico, problematizando e atuando na

zona de desenvolvimento iminente;

Utilizar ferramentas e materiais para mediar o desenvolvimento da

aprendizagem das crianças;

Enfatizar a formação de conceitos, proporcionando o conhecimento e a

compreensão dos objetos culturais em suas relações de significação

objetivando a compreensão da sua essência/significado, ampliando o

pensamento teórico;

Possibilitar o desenvolvimento das funções psicológicas superiores,

considerando a fantasia, a imaginação criadora, o pensamento estético-

artístico, bem como a autorregulação dentro desse conjunto;

Possibilitar aos alunos atribuírem um sentido pessoal às tarefas que

desempenham.

A partir dessas constatações, a seguir, apresentam-se as últimas

considerações, com a certeza de que a questão não se esgota na presente pesquisa.

Page 128: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

128

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A presente pesquisa teve como objetivo investigar qual a concepção dos

docentes da disciplina de Arte sobre o desenvolvimento do psiquismo e sua relação

com as funções psicológicas superiores para verificar se se aproximam da concepção

proposta pela Teoria Histórico-Cultural, uma vez que essa concepção norteia o

trabalho pedagógico na rede estadual de ensino.

Espera-se apresentar subsídios para a formação dos professores em geral e,

especificamente, dos que trabalham com a disciplina de Arte, ampliando a consciência

docente e consequentemente discente, acerca da realidade social, ressaltando-se a

importância do aprofundamento teórico sobre esses fundamentos, na práxis

pedagógica.

Com esse objetivo, inicialmente, analisaram-se as contribuições da Teoria

Histórico-Cultural e, especificamente, qual a relação entre a Arte - em suas diferentes

manifestações - e o desenvolvimento psíquico, na formação humana, por meio do

ensino dessa disciplina. Buscou-se, também, refletir sobre as possíveis

consequências da concepção do professor sobre esse processo, no trabalho

pedagógico.

Para avaliar qual a compreensão acerca do desenvolvimento do psiquismo e

suas relações com as funções psicológicas superiores, solicitou-se aos professores

que expressassem por escrito e individualmente esses conceitos, avaliando o nível de

generalização que expressavam (DAVIDOV, 1992). Essa compreensão relaciona-se

diretamente com a oportunidade que o docente teve ou não de estudá-los, o que

implica em seus processos de formação inicial e continuada. É necessário destacar

que não se tratava da avaliação do pensamento teórico docente.

Apenas 13% verbalizou um conceito de desenvolvimento psíquico mais

próximo do conceito científico; 40% trouxe alguns elementos referentes a esse

conceito mas ainda fragmentados, podendo-se classificá-los como complexos; 47%

dos professores não sabiam, ou seja, quase metade dos professores de Arte

desconhecem totalmente o conceito de desenvolvimento psíquico.

Com relação ao conceito de funções psicológicas superiores, os resultados

obtidos revelaram que apenas 6% dos professores o compreendem, sendo que 13%

apresentou uma compreensão a nível de complexos e 67% declarou que não sabia

ou apresentou uma ou outra característica aleatória desse conceito.

Page 129: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

129

A reflexão sobre o processo de formação de conceitos conduz à palavra, como

produto do desenvolvimento histórico-social, que permite generalizar e refletir o

mundo circundante, fazer relações e ligações profundas de objetos e/ou imagens,

produzindo conceitos e significados, o quais não são estáticos. Evoluem, à medida

em que novas relações vão lhe sendo agregadas e, nesse processo, conforme se

altera o significado da palavra, alteram-se todas as funções psicológicas, como a

atenção, a percepção, a memória e o pensamento.

Porém, se a palavra não circula, ela não impacta os seres humanos, não é por

eles apropriada, e não forma conceitos, como se constatou. Para analisar os conceitos

de desenvolvimento psíquico e funções psicológicas superiores, faz-se necessário

ressaltar a relação entre esses signos e seus significados, e a formação da

consciência.

As palavras, ou seja, os signos são os meios auxiliares para a compreensão

psicológica de determinada atividade, e a consciência constitui-se como realidade

quando representada por signos. Para a formação de conceitos, os signos vão se

encadeando a outros signos, possibilitando ao pensamento teórico estabelecer

generalizações em patamares cada vez mais elevados, isto é, abrangentes,

estabelecendo uma cadeia semiótica, que possibilita a compreensão.

Portanto, a palavra não está isolada, ela se articula dentro de um sistema lógico

constituído pelos demais conceitos que o compõem, e que vão além do que pode ser

captado diretamente pela visão, as cadeias semióticas se articulam e assim vai se

constituindo o pensamento. Mas, é necessária a atividade, cuja consecução provoca

necessidades e move o sujeito na busca do objeto que satisfará a essas

necessidades, lhe permitindo apropriar-se desse objeto/palavra/signo.

A linguagem que vai assim se formando, é representada pelo conjunto de

palavras, signos, conceitos os quais são apropriados a partir de relações

interpsíquicas, para se tornarem intrapsíquicas. A consciência depende da linguagem,

que envolve atividade, e a linguagem articula-se com o pensamento assegurando a

transição do sensorial para o intelectual.

Na relação cotidiana, o sujeito se apropria de conceitos comuns, cujo conteúdo

é direto, isto é, captado pela percepção imediata. Entretanto, a apropriação dos

conceitos científicos exige uma fundamentação teórica, a qual é adquirida por meio

de um processo de aprendizagem sistematizado, que fornece subsídios para a

consciência do sujeito ao analisar a realidade.

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130

Os resultados revelaram a ausência dos conceitos científicos de

“desenvolvimento psíquico”, e, “funções psicológicas superiores”, portanto,

demonstrando ausência de agentes mediadores desses conceitos no processo de

interação que envolveu e envolve o corpo docente.

Para compreender esses resultados, a reflexão sobre os documentos

norteadores do processo pedagógico no Paraná remete ao fato de que o preparo dos

professores da rede estadual de Educação para implementação desses documentos,

que se fundamentavam na Psicologia Histórico-Cultural e na Pedagogia Histórico-

Critica - revistos no período entre 2004 e 2008, e posteriormente, durante sua

vigência, até 2019 - foi aligeirado e superficial, por meio de discussões esporádicas,

não suficientes para que os professores se apropriassem dos principais conceitos das

teorias que os fundamentavam.

Com a implantação da Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2018), no

plano federal - a qual fundamentou-se em organismos internacionais como: a

Organização para a Cooperação de Desenvolvimento Econômico (OCDE) que

coordena o Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA), e a Organização

das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) - já seus

reflexos puderam ser sentidos no Paraná.

Em 2019, foi publicado em versão preliminar o Currículo da Rede Estadual de

Educação do Paraná (CREP, 2018), e em 2021, sua versão consolidada foi publicada

como documento curricular orientador para construção da Proposta Pedagógica

Curricular (PPC), com foco em competências. Nesta nova versão curricular, constam

apenas objetos de conhecimento, objetivos, conteúdos distribuídos por trimestre.

Extraiu-se qualquer fundamentação teórica explícita, bem como extraiu-se a

importante concepção da Educação como instrumento de transformação social e não

consta do documento as referências bibliográficas que o embasaram.

Portanto, o CREP vai na direção da BNCC, objetivando o avanço do Brasil nas

avaliações internacionais, portanto, voltada aos resultados, relegando a segundo

plano o processo pedagógico e a fundamentação do trabalho docente.

Fica claro, portanto, que a formação continuada dos professores na rede

estadual do Paraná foi frágil no período de 2004 a 2017, ainda que o currículo fosse

claramente fundamentado na perspectiva histórico-cultural, teoria que se considera a

que melhor explicita o processo pedagógico e destaca a importância da aprendizagem

dos conhecimentos científicos para o desenvolvimento cognitivo, bem como a

Page 131: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

131

importância do desenvolvimento do pensamento teórico para uma ação

transformadora da realidade.

Atualmente, as formações continuadas têm sido realizadas on line, voltadas à

instrução sobre como trabalhar com as tecnologias em sala de aula por meio de

aplicativos, repassadas por tutores. Não há uma preocupação com qualquer

fundamentação teórica do trabalho pedagógico. Portanto, se não há uma formação

continuada que envolva uma fundamentação teórica voltada à prática pedagógica, o

professor não poderia ter esses conceitos.

Na mesma direção, na escola, a não apropriação dos conceitos que se está

analisando, revela a não ocorrência de tarefas que compõem a atividade de estudo

docente, uma vez que um conceito qualquer primeiramente é externo, social, antes

de se tornar interno.

Sabendo que as funções psíquicas não se formam isoladamente, mas são

desenvolvidas a partir da experiência e nas relações sociais, questiona-se se no

ambiente escolar esses conceitos avaliados circulavam, porque se circulassem, não

se observaria o estranhamento à questão relativa ao desenvolvimento psíquico

constatado na presente pesquisa, e novas generalizações sobre esse conceito seriam

gradativamente estabelecidas.

A reflexão sobre os resultados da pesquisa revela, portanto, a ausência de

instrumentos externos que poderiam desencadear instrumentos internos conceituais,

ou seja, discussões coletivas no espaço escolar que possibilitassem a objetivação de

reflexões sobre o processo pedagógico, com base nas contribuições da Teoria

Histórico-Cultural, ainda que essa teoria esclareça como ocorre o processo de

aprendizagem e sua relação com o processo de humanização.

Buscou-se, também, verificar quais as consequências para o processo

pedagógico do despreparo constatado, investigando o material utilizado pelos

docentes para o preparo das aulas, suas ações pedagógicas, bem como, seus limites

e desafios.

É notável o esforço dos professores na busca de sucesso no processo de

ensino, visando a aprendizagem dos alunos. No entanto, a pesquisa revelou inúmeras

dificuldades que prejudicam o desempenho docente e discente, acarretando sério

comprometimento na qualidade do processo ensino e aprendizagem na disciplina de

Arte.

Page 132: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

132

Constatou-se que, muitas vezes, falta intencionalidade nas aulas no sentido de

desenvolver a humanização dos sentidos e a sensibilidade estética, a partir do estudo

de uma obra de arte na sua totalidade. As aulas de arte, frequentemente, são

desenvolvidas restringindo-se à prática com materiais, e/ou à teoria, a vivência e a

contextualização histórica, ou estão ausentes ou são trabalhados de forma

fragmentada.

A não consciência sobre o processo pedagógico, e sobre o papel docente

nesse processo contribui para a indisciplina, o desinteresse, a falta de concentração

por parte dos alunos. Por isso, é preciso urgentemente repensar o processo

educacional na disciplina de Arte, tal como se constata nesta pesquisa. Porém, se o

conceito de desenvolvimento psíquico não circula na escola, se a relação entre o

desenvolvimento psíquico e a prática social não orienta o processo pedagógico, pode-

se supor que essa lacuna não se restringe à disciplina de Arte.

Entre os limites e desafios apontados pelos docentes de Arte, esta pesquisa

verificou a existência de problemas como falta de materiais e recursos tecnológicos,

espaços físicos inadequados às aulas, dificuldades no relacionamento entre

professores e alunos decorrentes de problemas familiares, falta de interesse discente,

agressividade e indisciplina, e pouco tempo docente para dedicar-se aos estudos e

planejamentos. Identificou-se, também, que a maioria dos professores trabalham com

a linguagem das Artes Visuais e lhes falta domínio nas demais linguagens, o Teatro,

a Música e a Dança, o que se constitui em mais um desafio à prática pedagógica.

No percurso do processo de investigação, a partir da análise das respostas

apresentadas foi possível observar o quão é necessária a continuidade da atividade

de estudo, não só para o aluno, como também para a atuação dos professores, de

forma a lhes possibilitar a transformação da consciência discente e docente. Se os

professores não tem a formação teórico-prática necessária, não terá consciência do

seu trabalho pedagógico e não poderá desenvolvê-la no seu aluno. No caso do

professor, essa consciência orienta a reflexão sobre a prática pedagógica, analisando

se seus resultados atendem às necessidades dos processos de ensino e

aprendizagem da arte.

O trabalho pedagógico na escola deve ir além dos conceitos cotidianos, pois

todos, alunos e professores, têm o direito de se apropriar do conhecimento científico,

independentemente da classe social, e nesse processo desenvolver suas funções

psicológicas, e poder analisar, abstrair, sintetizar, generalizar, ou seja, apropriar-se e

Page 133: O DESENVOLVIMENTO DO PSIQUISMO NA PERSPECTIVA DO …

133

desenvolver instrumentos psíquicos que possibilitem uma leitura e uma atuação na

prática social que seja transformadora.

O papel do professor como agente mediador é de extrema importância para

que a arte seja pensada como fundamental para a formação humana. Importante

destacar, em meio a tantas formas e manifestações culturais produzidas

historicamente e transmitidas há gerações, que a arte se faz presente como resultado

da criação e da apropriação de novas formas o tempo todo, a partir de necessidades

provocadas pela disparidade entre as possibilidades sociais e as condições pessoais.

Compreende-se, então, que o homem produz, incorpora e transforma o meio e a si

mesmo em um processo criativo.

A arte é revolucionária, pois pode propor novas relações humanas e é

democrática, porque abre oportunidade à todos. Por meio da linguagem figurada, a

arte pode transmitir mensagens muitas vezes censuradas, se fossem expressas por

palavras. Portanto, a arte pode ser um instrumento de luta e resistência.

Além disso, a arte é uma atividade essencial para o desenvolvimento da

imaginação criadora, como função psíquica e como expressão histórica da máxima

relevância, por meio das diferentes obras produzidas pelos homens. Daí sua função

na educação escolar como caminho para a formação dos sentidos em um processo

de humanização, comprometido com um projeto social que busque democratizar e

reduzir as discrepâncias sociais.

A disciplina de Arte possibilita uma experiência humano-social, que decorre da

humanização dos sentidos por meio de tarefas pedagógicas que envolvam a

apropriação dos conceitos científicos necessários à compreensão e fruição da arte,

em suas diversas manifestações e linguagens artísticas que motivem as crianças a

sentirem-se autônomas na busca das informações que necessitam para resolver

essas tarefas.

Assim, é importante que a educação escolar, na disciplina de Arte considere a

história, o contexto político, econômico e social em que a obra artística foi gestada,

compreendendo que se trata de um processo em constante movimento. Nessa

direção, o trabalho docente promove o pensamento teórico, o que acarreta o

desenvolvimento das funções psicológicas superiores dos alunos e do próprio

professor.

Esse processo não ocorre de forma isolada, individual. Decorre de relações

colaborativas entre os alunos e entre alunos e professor. Essas reflexões ratificam a

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134

importância da Arte na educação, assim como o cuidado e a responsabilidade

necessária ao planejamento e à consecução dessa disciplina no contexto escolar.

Nesse processo, o desenvolvimento estético do professor de Arte possibilita a

transformação da sala de aula em espaço lúdico, de prazer em aprender, promovendo

o desenvolvimento da imaginação criadora e do pensamento estético do aluno, que

se constituem em funções psíquicas as quais, no conjunto das demais, otimizam o

processo de ensino-aprendizagem.

Para que o docente compreenda o processo de desenvolvimento psíquico, e o

papel da arte nesse processo, e assim, possa avançar em sua práxis pedagógica, é

necessária a apropriação da fundamentação teórica de suas aulas, articulada a

práticas pedagógicas que mobilizem os alunos, de forma a que a atividade de ensino

docente e a atividade de estudo discente estejam articuladas, possibilitando a todos

os envolvidos no processo pedagógico, um avanço na direção oposta à barbárie, que

se instala a passos largos no Brasil e no mundo.

Portanto, é necessário e relevante a formação continuada do professor. A

ausência de oportunidades de aprofundamento teórico metodológico e de políticas

públicas que visem a formação continuada dos docentes é um problema crucial no

sistema educacional brasileiro. Porém, essa questão insere-se e decorre de uma

questão maior que se constitui nos objetivos que movem o modo de produção

capitalista. Objetivos voltados ao lucro e à exploração humana por uma minoria para

a qual a consequente barbárie parece não assustar.

A análise desta pesquisa possibilitou apontar alguns elementos essenciais que

poderiam amenizar os problemas encontrados no trabalho pedagógico na disciplina

de Arte, quanto a:

Efetivação de políticas públicas educacionais voltadas à formação

continuada do professor em serviço, com condições de tempo para os

estudos, de forma a atualizar seus conhecimentos, compreender e

apropriar-se da perspectiva teórica proposta pela THC, resultando na

melhoria da práxis pedagógica;

Investimentos no plano de carreira docente, valorização profissional e

salarial, organização do espaço físico e humano das escolas, recursos

materiais e tecnológicos adequados;

Tempo destinado ao planejamento entre os professores para que haja

discussão, troca de experiências, elaboração de estratégias

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metodológicas intencionais que possibilitem o desenvolvimento do

psiquismo para a aprendizagem dos alunos, resultando na humanização

dos sentidos nas diferentes linguagens artísticas.

A valorização da disciplina de Arte e de sua função social é consequência de

um trabalho pedagógico consciente e intencional, o qual só é possível a partir de uma

práxis que não negligencia os fundamentos teóricos, nem as diversas manifestações

artísticas.

No processo pedagógico há necessidade de aprofundamento teórico por parte

do docente, tanto na perspectiva da Teoria Histórico-Cultural, quanto no domínio da

concepção da arte e de seus fundamentos, bem como na compreensão de sua

importância na constituição da subjetividade do professor e do aluno. Em síntese, a

disciplina de Arte aproxima-se de sua função social, pela mediação dos conteúdos de

forma organizada, a fim de transformar a consciência do aluno ao observar uma obra

de arte, desenvolvendo sua criatividade, entendendo o seu significado histórico, e a

importância de compreender e representar a realidade por meio das diferentes

linguagens artísticas.

Finaliza-se, destacando a importância da luta por essas condições de trabalho

de forma a dar suporte para que a escola possa, ainda que limitada pelas condições

político-econômicas que a cerceiam, humanizar os que recebe, alunos e educadores,

instrumentalizando-os para a almejada prática social transformadora, no sentido de

maior equalização das oportunidades e redução das discrepâncias sociais.

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APÊNDICE 1 - Questionário com as respostas dos Professores

1 - O que você entende por Desenvolvimento do Psiquismo? Professor A: “É a forma como você acrescenta o conhecimento, que se evolui psicologicamente no aprendizado.” Professor B: “Entendo que através do século passado, entre estudos de psicanalistas, foi atribuído ao consciente e ao inconsciente, atribuições de suma importância, tanto para o tratamento de patologias, com para o desenvolvimento saudável da mente humana, desde a infância, até uma velhice saudável.” Professor C: Não respondeu. Professor D: “não” Professor E: Não respondeu. Professor F: “Desenvolvimento do pensamento crítico e reflexivo.” Professor G: “Entendo que nosso desenvolvimento das funções superiores cognitivas dependem da maturidade cronológica e das relações de aprendizagem/conhecimento experiências que fazemos ao longo da vida.” Professor H: “Desenvolvimento da mente, intelectual e emocional.” Professor I: “muito pouco prefiro não comentar.” Professor J: “Trabalhar de forma a desenvolver o emocional, tomar consciência de si, suas capacidades.” Professor K: “Acredito que é algo constante na vida das pessoas, o estímulo é uma forma de desenvolvimento.” Professor L: “Aquele que desperta o processo reflexivo, psicológico...” Professor N: “não sei.” Professor O: “Não domino o tema.” Professor Q: “Ligado a emoções, sentimentos e mente.” 2 – O que são Funções Psicológicas Superiores? Professor A: “Após o conhecimento é o saber como usar esse conhecimento.” Professor B: “Acredito que são aquelas que estão no momento atual de nossa vida, ou seja no consciente.” Professor C: Não respondeu. Professor D: “não” Professor E: Não respondeu. Professor F: “Funções responsáveis pelo desenvolvimento reflexivo.” Professor G: “Creio que são nossas conexões cerebrais mais complexas, desenvolvidas a partir de nossas experiências, conhecimentos e relações entre elas.” Professor H: Não respondeu. Professor I: “Não sei.” Professor J: “São as funções conscientes voluntárias: memória, percepção, etc.” Professor K: Não respondeu. Professor L: “Processos em que desperte todos os sentidos psíquicos.” Professor N: “Não sei.” Professor O: “Não tenho certeza, mas acho que seja o refletir, o pensar sobre um “assunto” e manifestar-se;” Professor Q: “superiores...não sei”

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3 - Em que você se fundamenta para preparar suas aulas? Professor A: “Além do currículo proposto procuro sempre saber a necessidade imediata da turma.” Professor B: “Me fundamento nas dificuldades que a sociedade que vive meu aluno, por exemplo, se fazem parte de uma comunidade de baixo poder aquisitivo, procuro criar aulas utilizando materiais recicláveis ou de baixo poder aquisitivo, sempre em conjunto com as propostas da PPC.” Professor C: “Minha fundamentação para as aulas parte de uma fundamentação teórica, a partir disso faço uma ligação com a prática para desenvolver os elementos das linguagens visuais.” Professor D: “Do PPP da escola PCC e da elaboração do plano de trabalho docente onde que utilizamos para se orientar e desenvolver nossa atividade conto na prática e teoria em sala de aula.” Professor E: “As aulas são preparadas para cumprir 3 etapas: conhecer o contexto e história, leitura/apreciação da arte através de imagens e vídeos e a prática, onde a proposta é um trabalho/atividade feita pelo aluno com base no conteúdo principal.” Professor F: “Aulas com muita prática, procuro experimentar com os alunos outros espaços da escola; procuro entender o que já estão estudando em sala de aula com a participante regente para fazer um trabalho colaborativo, mas também diferente da sala de aula comum.” Professor G: “Por ser do estado seguimos as diretrizes curriculares e complementamos com livros, textos, artigos relacionados ao conteúdo.” Professor H: “O documento que eu utilizo são as diretrizes curriculares. Sempre penso no desenvolvimento do aluno (intelectual, em grupo (empatia, humanização, socialização) e desenvolvimento do senso crítico e percepção) ao seu entorno, trazendo sempre a importância da Arte e da cultura).” Professor I: “No currículo/diretrizes de arte.” Professor J: “Além de teóricos na área, outras metodologias p/ levar o aluno a experienciar-se, perceber-se e sentir-se capaz, partindo do princípio a realidade do indivíduo.” Professor K: “DCE, PTD. As aula são desenvolvidas para trabalhar a prática/teórico, muitas vezes os alunos preferem a prática de arte, mas, temos que passar e cobrar a teoria também, para que os mesmos saibam o que estão fazendo, o fundamento da atividade, o por que, de onde veio, onde vão precisar.” Professor L: “Partindo de uma análise escolar (alunado), local em que estão inseridos, estudos (aprendizagem) anteriores.” Professor N: “Do PPP da escola, Regimento, PPC, entre outros documentos, sempre com o planejamento. A partir dos documentos da escola e das diretrizes, monta-se os planejamentos.” Professor O: “No meu PTD. Plano de Trabalho docente. Procuro conhecer um pouco sobre os meus alunos e preparo as aulas de acordo com a realidade, começando pelo que eles já conhecem.” Professor Q: “- Diretrizes – Leituras de diversos autores – PPP.” 4 – Quais os limites e desafios você encontra em seu trabalho pedagógico? Professor A: “Falta de interesse dos alunos; falta de apoio e compreensão dos colegas “professores”.

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Professor B: “A agressividade advinda de alunos, com problemas familiares, pois isso interfere no interesse de aprendizagem e evolução do seu I.D.” Professor C: “Dirigir a atenção para uma boa compreensão da atividade, interação dos alunos e produção sem material didático.” Professor D: “Tem um colégio que não tem suporte técnico para fazer pesquisa, pouco material didático para auxiliar no desenvolvimento das atividades.” Professor E: “Falta de estrutura (materiais), quantidade de alunos elevada por sala, desmotivação por parte dos alunos (alguns) o que leva a indisciplina e acaba dificultando o trabalho em sala.” Professor F: “Falta de materiais, colaboração dos demais professores para realizarmos um bom trabalho para o desenvolvimento das crianças.” Professor G: “Penso que ensinar alunos que nasceram dentro da tecnologia que tem acesso a tudo de forma muito rápida, fazer a transposição da informação para o conhecimento é um grande desafio.” Professor H: “Falta de recursos tecnológicos (projetor multimídia em salas de aulas, pois a disciplina exige imagens, vídeos, música para a abordagem da disciplina/conteúdo). Falta de educação e concentração por parte dos alunos. Falta de uma sala em específica para a realização de trabalhos práticos.” Professor I: “Desafio de fazer o aluno entender que arte não é só desenho e pintura, propiciar ao aluno aquele momento de reflexão, fazer o questionamento através da arte, na maioria das vezes o aluno quer desenho.” Professor J: “Falta de recursos pedagógicos e o maior desafio é despertar no aluno a consciência quanto à importância do conhecimento.” Professor K: “Grande limite é falta de laboratório de arte, materiais diferentes para trabalhar técnicas novas, o desafio é inovar, renovar, criar atividades atrativas, a indisciplina também é um desafio para produção artística é necessário um ambiente calmo.” Professor L: “Ações mal planejadas de professores anteriores, infelizmente estamos inseridos em um sistema, devemos seguir, com isso, existe uma falta de concordância nos conteúdos e planejamentos.” Professor N: “Penso que nos dias de hoje seria o maior desafio, fazer com que os alunos queiram realizar as atividades propostas. A falta de concentração é um grande desafio.” Professor O: “Falta de disciplina dos alunos e falta de materiais.” Professor Q: “Falta de materiais, falta de motivação, pressão.” 5 – Descreva ações pedagógicas que você solicita aos alunos. Professor A: Não respondeu. Professor B: “Muito desenho, sou uma Participante que aprendi a desenhar com a técnica, então os passos que me foram ensinados, eu repasso a eles, sempre regados de elogios, deixando claro, que é apaixonante fazer o desenho tortinho e assinar deixando sua marca de artista.” Professor C: “Releituras, trabalhos em grupos, interpretação e leitura de obras e imagens, observação dos elementos.” Professor D: “Pesquisa, leitura, trabalho em grupo ou individual.” Professor E: “- Compreensão do contexto histórico em relação ao conteúdo que está sendo trabalhado, leitura de textos (resumos) apreciação/leitura/análise do que está sendo visto, atividades, na grande maioria prática, desenhos, colagens, etc sobre o conteúdo aprendido.”

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Professor F: “Momentos de análise e reflexão sobre obras e artista. Em seguida sempre há pratica, em cada aula procuro usar um material ou espaço difente da aula anterior para realizarmos as atividades.” Professor G: “Solicito a atenção, observação e o estudo.” Professor H: “- Com o ensino médio trabalho com a história da Arte, junto com a abordagem teórica do conteúdo trabalho algo na prática (desenvolvendo a criatividade, percepção, senso-crítico et) linguagens. – Gosto de trabalhar um pouco sobre diversas áreas artísticas – cinema, teatro, música, dança.” Professor I: “Leitura de imagens, Releitura, desenho de observação, trabalhos de pesquisa sobre obras e contexto histórico. teatro. Professor J: “As atividades, produções práticas são sempre voltadas p/ que o aluno se perceba, que faz parte da história, que pode mudar sua realidade e desenvolva seu próprio senso crítico. Que ele se perceba capaz.” Professor K: “Teoria, reflexão, prática, Trabalhando com os sentido, desenvolvendo o senso crítico.” Professor L: “- Aulas teóricas onde os estudantes possam refletir sobre determinados conteúdos, artistas e suas obras, contextos artísticos... – Após momento reflexivos, iniciamos processo criativo, desenvolvendo prática, com orientações tanto verbal qto visual. Etc... Teorizar, Sentir e Perceber.” Professor N: “Pesquisa, leitura, trabalho em grupo. Debate. Sempre buscando ver o que o aluno já conhece, sabe.” Professor O: “Comprometimento, criatividade, pesquisa.” Professor Q: “Procuro diversificar, desenhos, desfile, dança roda de contos, performances, teatro, música, pesquisa.”

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APÊNDICE 2 - Questionário para coleta de dados

1 – O que você entende por desenvolvimento do psiquismo? 2 – O que são Funções Psicológicas Superiores? 3 – Em que você se fundamenta para preparar suas aulas? 4 – Quais os limites e desafios você encontra em seu trabalho pedagógico? 5 – Descreva ações pedagógicas que você solicita aos alunos.

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APÊNDICE 3 - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido – TCLE Professor(a)

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APÊNDICE 4 - Termo de Compromisso para uso de dados em arquivo

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APÊNDICE 5 - Termo de ciência do responsável pelo campo de estudo

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ANEXO 1 - Comprovante de envio do projeto

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ANEXO 2 - Parecer Consubstanciado do CEP

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ANEXO 3 - Folha de rosto para pesquisa envolvendo seres humanos

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ANEXO 4 - Declaração da Unioeste

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ANEXO 5 - Declaração do NRE