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Professor Ms. Gustavo Matias Ludodiagnóstico . O Ludodiagnóstico pode ser abordado como um procedimento utilizando por psicólogos clínicos em sua atuação junto a crianças, especialmente as que apesentam sofrimento psíquico. É uma técnica que pode ser usada para mediar o contato com a criança, favorecendo a comunicação entre o psicólogo e a criança. Permite que o clínico possa compreendê-la e favorece a intervenção, independente da manifestação psicopatológica, ou não, da criança. A psicopatologia tem definições distintas quando se estuda as enfermidades. No entanto, tomando o sentido de pathos como sofrimento, pode-se pensar em Psicopatologia, como o estudo e a compreensão do sofrimento psíquico. Dessa forma, é importante pensar sobre a noção de saúde, que é muito mais do que ausência de enfermidade. Diz Assumpção Jr (2008): (...)mais do que simplesmente a ausência de doenças, a saúde corresponde a um estado físico e mental relativamente liberto da dor e do desconforto que permite ao indivíduo funcionar o melhor possível durante a maior parte do tempo, em um ambiente no qual a casualidade ou a escolha a colocaram. O sofrimento afeta o sujeito (a subjetividade) em sua unidade e integridade, sua coesão e coerência. Corresponde ao que a Psicanálise atribui ao ego, instância reguladora, preservando, nas ambivalências e contradições (a divisão do sujeito), e sob a pressão da realidade e das outras instâncias (id e superego), uma unidade de identidade e uma estabilidade emocional. O sofrimento se refere, assim, a sérias dificuldades de manter a continuidade e a integridade do eu. A caixa lúdica, material tradicionalmente utilizado nos processos de ludodiagnóstico, implica ao profissional o manejo da escolha dos brinquedos como facilitador para o processo. O significado do brinquedo pode ser um tema polêmico, na medida em que os psicoterapeutas ou profissionais da saúde não consideram os significados dos brinquedos como algo estático e imutável. Além disso, o estudo do significado do brinquedo envolve necessariamente estudar a sua evolução no contexto de diversas culturas. O jogo é fundamental no psicodiagnóstico compreensivo e interventivo e no tratamento psicoterápico de crianças. Sua relevância e abrangência ultrapassam os limites da clínica com as crianças (Affonso, 2012). Winnicott (1975), a partir dos seus estudos na clínica infantil, defende a tese de que é necessário estudar o brincar como um fenômeno de formas diferenciadas, onde a brincadeira facilita o crescimento, desenvolvendo o potencial criativo e conduz para relacionamentos grupais. Nesse sentido, o autor entende que o brincar é uma terapia com possibilidade auto curativa, único veículo possível de expressão para as crianças, como meio privilegiado de expressão e de

O Ludodiagnóstico BASE

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Page 1: O Ludodiagnóstico BASE

Professor Ms. Gustavo Matias

Ludodiagnóstico .

O Ludodiagnóstico pode ser abordado como um procedimento utilizando por psicólogos clínicos

em sua atuação junto a crianças, especialmente as que apesentam sofrimento psíquico. É uma

técnica que pode ser usada para mediar o contato com a criança, favorecendo a comunicação

entre o psicólogo e a criança. Permite que o clínico possa compreendê-la e favorece a

intervenção, independente da manifestação psicopatológica, ou não, da criança.

A psicopatologia tem definições distintas quando se estuda as enfermidades. No entanto,

tomando o sentido de pathos como sofrimento, pode-se pensar em Psicopatologia, como o

estudo e a compreensão do sofrimento psíquico. Dessa forma, é importante pensar sobre a

noção de saúde, que é muito mais do que ausência de enfermidade. Diz Assumpção Jr (2008):

(...)mais do que simplesmente a ausência de doenças, a saúde corresponde a um estado físico e mental relativamente liberto da dor e do desconforto que permite ao indivíduo funcionar o melhor possível durante a maior parte do tempo, em um ambiente no qual a casualidade ou a escolha a colocaram.

O sofrimento afeta o sujeito (a subjetividade) em sua unidade e integridade, sua coesão e

coerência. Corresponde ao que a Psicanálise atribui ao ego, instância reguladora, preservando,

nas ambivalências e contradições (a divisão do sujeito), e sob a pressão da realidade e das outras

instâncias (id e superego), uma unidade de identidade e uma estabilidade emocional. O

sofrimento se refere, assim, a sérias dificuldades de manter a continuidade e a integridade do

eu.

A caixa lúdica, material tradicionalmente utilizado nos processos de ludodiagnóstico, implica ao

profissional o manejo da escolha dos brinquedos como facilitador para o processo. O significado

do brinquedo pode ser um tema polêmico, na medida em que os psicoterapeutas ou

profissionais da saúde não consideram os significados dos brinquedos como algo estático e

imutável. Além disso, o estudo do significado do brinquedo envolve necessariamente estudar a

sua evolução no contexto de diversas culturas.

O jogo é fundamental no psicodiagnóstico compreensivo e interventivo e no tratamento

psicoterápico de crianças. Sua relevância e abrangência ultrapassam os limites da clínica com as

crianças (Affonso, 2012).

Winnicott (1975), a partir dos seus estudos na clínica infantil, defende a tese de que é necessário

estudar o brincar como um fenômeno de formas diferenciadas, onde a brincadeira facilita o

crescimento, desenvolvendo o potencial criativo e conduz para relacionamentos grupais. Nesse

sentido, o autor entende que o brincar é uma terapia com possibilidade auto curativa, único

veículo possível de expressão para as crianças, como meio privilegiado de expressão e de

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apreensão da realidade, onde o brincar permite o acesso ao simbólico e aos processos

complexos da vida.

Trinca (1984) assim define o tipo de diagnóstico compreensivo:

(...) no diagnóstico psicológico, uma série de situações que inclui, entre outros aspectos, o de encontrar um sentido para o conjunto das informações disponíveis, tomar aquilo que é relevante e significativo na personalidade, entrar empaticamente em contato emocional e, também conhecer os motivos profundos da vida emocional de alguém”. (p.15)

Ainda para o autor (Trinca, 1984), o processo de diagnóstico do tipo compreensivo engloba

fatores estruturantes que dizem respeito ao objetivo de elucidar o significado das perturbações,

visando assim a explicitação das funções das perturbações e dos motivos inconscientes que se

mantém. Há, também, uma busca de composição psicológica globalizada do paciente, visando

realizar uma síntese dinâmica e estrutural da vida psíquica, considerando aspectos

intrapsíquicos, interfamiliares e forças sociais e culturais. São ressaltados, ainda, os aspectos de

centrar-se nos pontos nodais, produzindo julgamento clínico e a prevalência do uso de múltiplas

técnicas de exame fundamentadas na associação livre, aí inserindo-se a Hora de jogo, como

procedimento baseado na associação livre.

Atuamos em Psicologia Cínica, na qual se insere a Hora de Jogo valendo conceituar a Psicologia

não somente como a ciência dos fenômenos mentais, mas como “o estudo de todas as

manifestações do ser humano e estas se dão sempre, realmente, no nível psicológico de

integração” (Bleger, 1975 , p.35).

“Afirmamos que o papel do psicólogo clínico como investigador e profissional que intervem (papéis a meu ver indissociados) não é nunca o de julgar, mas o de se aproximar para compreender e, se possível, propor medidas que possam levar a mudanças” (Tardivo, 2004).

O brinquedo por si só pode ajudar a criança a representar e tentar encontrar soluções para os

próprios conflitos, mas somente a presença mental de alguém mais que brinque com ela é o que

permite que o jogo seja plenamente transformador de angústias. É a acolhida dos estados

mentais e emocionais presentes durante o jogo que consente as transformações mais

profundas.

A criança usa o material lúdico e gráfico para expressar aquilo que se passa com ela; este

material poderá ser utilizado como um reforçador junto à mesma.As informações obtidas

através da avaliação devem ser interpretadas e integradas para proporcionar um entendimento

mais profundo dos problemas apresentados. Esta formulação deve incluir comentários sobre

recursos e déficits específicos da personalidade e o modo como eles relacionam-se aos

problemas, gravidade do problemas, variáveis fisiológicas, psicológicas, familiares e sócio-

culturais que contribuem para o desenvolvimento e manutenção dos problemas, conseqüências

dos problema para a criança e a família e os meios atuais de lidar com os problemas.

A intervenção será tanto mais efetiva quanto maior for a alteração nos elementos negativos que

atuam sobre a criança (familiares, institucionais, ecológicos, etc.). Consequentemente, se a

família e/ou escola apoiarem o trabalho do psicólogo numa intervenção psicológica infantil,

esta, além de ser mais eficaz poderá também ser mais efetiva, isto é, alcançar mudanças mais

duradouras" (Silvares apud Rangé, 1995).

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Essa noção das relações entre investigação e intervenção tem respaldo nas concepções de

Winnicott (1971) que considera que a entrevista diagnóstica deve ser uma entrevista de caráter

terapêutico. Esse mesmo autor traz noções que são fundamentais no enfoque que atribuímos à

Hora de Jogo, bem como aos encontros com os pacientes. Winnicott valoriza especialmente o

brincar e a experiência cultural; vinculam o passado, o presente e o futuro, e que ocupam tempo

e espaço.” (Gil, 2011)

REFERENCIAS AFFONSO, L. R., Ludodiagnóstico: Investigação clínica através do brinquedo. São Paulo: Artmed., 2012 ASSUMPÇAO JUNIOR F., Principais quadros em Psicopatologia Infantil in TARDIVO, L. S. L. P. C.; GIL, C. A. APOIAR: Novas propostas em Psicologia clínica São Paulo: Sarvier, 2008. BLEGER, J., Psicologia de la Conducta, Buenos Aires Editoral Paidós, 1975 GIL, C A, Envelhecimento e Depressão: da perspectiva psicodiagnóstica ao encontro terapêutico. Dissertação Mestrado). Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, 2005. OCAMPO, M. L. S., O processo psicodiagnóstico e as técnicas projetivas. São Paulo: Martins Fontes, 1999 TRINCA, W. (org.), Diagnóstico psicológico: a prática clínica. São Paulo: EPU, 1984. SILVARES, M.E.F.M. (1995) Intervenção clínica e comportamental com crianças. In Rangé, B. Psicoterapia comportamental e cognitiva: pesquisa, prática e aplicações a problemas. Psy: Campinas