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MARILUCI ALVES MARTINO
O MUNDO DO TRABALHO E A FORMAÇÃOPROFISSIONAL
- A difícil adequação -
Dissertação apresentada à BancaExaminadora da Pontifícia UniversidadeCatólica de São Paulo – PUC-SP, comoexigência parcial para obtenção do Título deMestre em Administração, sob orientaçãodo Professor Doutor Ladislau Dowbor.
São Paulo PUC2001
ii
Banca Examinadora
_______________________________________
_______________________________________
_______________________________________
iii
Dedicatória
Aos meus pais Manoel e Maria, porque com
sabedoria e simplicidade, me incentivaram
e encorajaram a explorar o mundo do
trabalho e do conhecimento.
Ao meu marido Martino, que sempre
apoiou minhas opções e buscas, com
incentivo e amor. Acreditou em mim,
compreendeu meu afastamento e buscou
suprir minha ausência junto às nossas filhas.
Às minhas filhas Andressa e Larissa,amores da minha vida, pelas horas de
atenção que lhes foram negadas em função
deste Trabalho.
iv
Agradecimentos
Ao Professor Dr. Ladislau Dowbor, meu orientador, sempre tão rigoroso, sempre
tão terno, me fez viajar pelo mundo a fora num imenso universo de conhecimento,
com quem compartilho parte desta trajetória.
Ao Professor Dr. Onésimo pelas brilhantes aulas, fez despertar em mim vários
questionamentos sobre a existência humana, os dogmas e os dilemas, me fez
alcançar um plano mais elevado de reflexão e entendimento.
Ao Professor Doutor Leonardo Trevisan, que sempre me incentivou, ressaltando a
importância do meu trabalho e pelas importantes considerações feitas no exame
de qualificação.
À professora Dra. Marcia Leite, pelas recomendações feitas no exame de
qualificação que levaram ao aprimoramento deste trabalho.
Aos professores e coordenadores do Ceeteps, que prontamente me ofereceram
material para o desenvolvimento desse estudo.
Aos amigos do Ceeteps – Professor Antonio Carlos Baffi e Professor Jose
Aparecido Santos, que contribuíram com o desbrotar das idéias e ajudaram a
cultivá-las ao longo do estudo.
Às empresas de Transportes ABNT, CET, METRO, CBTU, SPTrans e Sindicatos
dos metroviários, metalúrgicos ABC e bancários que gentilmente me concederam
entrevistas.
À Shirlei Cristina dos Santos, com seu jeito terno e amigo, auxiliando a todos com
competência.
v
À Paulina, Marilini e Marani que com amor e carinho supriram a minha ausência,
cuidando de minhas filhas, enquanto eu estudava e realizava este trabalho.
À amiga Marcia S.Michelotti, pelo incentivo e palavras de afago nos momentos de
cansaço.
Às amigas Lucia Helena M.R. Domingues Fernandes e Eliane Shiobara pelo apoio
e oportunidade da frequente troca de idéias.
Ao Manoel Carvalho pelos ricos debates e estímulo na vida acadêmica.
Aos meus alunos, que me propiciam reflexão constante sobre a complexidade do
mundo em que vivemos, ampliando assim minha retórica sobre as transformações
atuais.
E finalmente ao Programa de Pós graduação em Administração, que com o auxílio
do Capes me concedeu a bolsa, tornando possível a conclusão deste trabalho.
Resumo
vi
As atuais transformações sociais, econômicas e políticas ilustram o período de
transição que vivemos. Neste momento de mudança de paradigma, o
conhecimento torna-se elemento chave para transformações sociais, pois assim
como as escolas as organizações empresariais estão alterando sua estrutura
organizacional e política, de forma a articular as novas exigências com a formação
profissional. Isto implica em sérios desafios para a educação e é preciso refletir
tanto sobre a prática profissional como sobre a formação oferecida pelas escolas.
Nesse trabalho faremos uma análise sobre as transformações no mundo do
trabalho, e a forma como as empresas reagem a essas transformações.
Discutiremos também o conceito de qualificação. Em seguida visando exemplificar
a dificuldade de adequação das instituições de formação profissional frente às
novas demandas, faremos um breve histórico da educação profissional no Brasil e
do Centro Paula Souza. Finalmente relataremos uma experiência de parceria
entre o Ceeteps e as Empresas de Transportes.
Esta estrutura de trabalho permitirá a visão articulada dos grandes eixos de
análise, a mudança do trabalho, as novas demandas empresariais e os esforços
de adequação que hoje se exige dos centros de formação profissional.
Abstract
vii
The present social, political and economical transformations show the transition
period we have been facing. With the changes of management paradigms,
knowledge becomes a key element of social transformation. Professional schools,
just like corporations, are having to change their organizational structures, so that
they can face the new demands. This means serious challenges for the education
system, since the new trends modify both professional practice and the type of
education schools have to offer.
In this study, we will first see how jobs are being transformed, and the way
corporations are facing these changes. We will then discuss the concept of
qualification. After that, as an example of the difficulties teaching institutions face in
order to be respond to the new demands, we will present a brief history of the
professional education system in Brazil and of the Centro Paula Souza. Finally, we
will present an experience of partnership between CEETEPS and the transport
companies.
This structure will allow us to show how three key trends, namely how jobs are
changing, how the corporations are facing these changes, and how professional
training institutions are responding, – can actually be faced by partnership and
more flexible management.
Sumário
viii
Relação de Figuras ....................................................................................Relação de Tabelas................................................................................
xxi
Relação de Siglas e Abreviações ............................................................. xii
Introdução ..................................................................................................
PARTE I – O MUNDO DO TRABALHO
Capítulo 1 – Transformação no Trabalho
2
1.1. 1.2. 1.3. 1.4. 1.5
Concepções e dimensões do Trabalho e do Emprego..............................Inovações Tecnológicas e Reestruturação Produtiva ...............................Teletrabalho ..............................................................................................Desemprego ..............................................................................................Tempo Livre ..............................................................................................
1015212530
Capítulo 2 – Estratégias Empresariais de Organização de Aprendizagem
2.1. 2.2.
2.3.
Tendências Organizacionais ...................................................................Organização Qualificante ........................................................................Gestão do Conhecimento ........................................................................2.3.1. Educação Corporativa....................................................................2.3.2. Organização de Aprendizagem .....................................................2.3.3. Do Teinamento à Educação ..........................................................2.3.4. Treinar Competências – Aprender à Aprender .............................
36394344464952
Capítulo 3 – Qualificação Profissional 3.1. 3.2. 3.3. 3.4. 3.5.
Discutindo os Conceitos .........................................................................Qualificação como Construção Social .....................................................Qualificação como sinônimo de preparação de capital humano .............As noções de qualificação que tomam como parâmetros a produção e a
Organização do Trabalho ........................................................................A ressignificação do conceito de qualificação e sua substituição pelo decompetência ..............................................................................................
57596264
67
ix
PARTE II – A FORMAÇÃO PROFISSIONAL
Capítulo 4 – Histórico do Ensino Profissionalizante
4.1. 4.2. 4.3. 4.4. 4.5.
4.6.
No Brasil ..................................................................................................Em São Paulo ...........................................................................................4.2.1. A reforma educacional nos anos setenta em São Paulo................A Educação Profissional Pós Constituição de 1988 ...............................A Educação Profissional na LDB ..............................................................A Educação Profissional no Decreto 2208/97 ..........................................4.5.1. Os objetivos da Educação Profissional .........................................4.5.2. Formas de Realização...................................................................4.5.3. Níveis da Educação Profissional ..................................................Parecer 16/99 ...........................................................................................
74 78 80 81 84 85 86 86 89
Capítulo 5 – A Instituição de Ensino Frente às Novas Demandas
5.1. 5.2.
5.3. 5.4. 5.5.
Caracterização de Instituição Ensino......................................................Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza .......................Diagnóstico da Gestão do Ceeteps .........................................................A nova organização do Ceeteps ............................................................Perspectiva de Mudança..........................................................................
94 96 99 103 110
Capítulo 6 – A Articulação – Formação da Parceria 116
Considerações Finais ...............................................................................
Bibliografia ................................................................................................
126
133
x
Relação de Figuras e Tabelas
Figura 2.1. Aprendizagem por Competência .......................................................46
Figura 2.2. O Modelo de Treinamento por Competência ....................................50
Tabela 4.1. Mudança de Paradigma da educação Profissional ...........................84
Tabela 5.1. Número de Inscritos cursos Técnicos de maior demanda ................91
Tabela 5.1. Número de alunos e turmas 2º semestre 2000 ...............................101
xi
Relação de Siglas e Abreviações
ANTP – Associação Nacional de Transportes Público
ARH – Administração de Recursos Humanos
CEB - Câmara Educação Básica
CEETEPS- Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza
CET - Companhia de Engenharia de Tráfego
CETEC- Coordenadoria de Ensino Técnico do Centro Paula Souza
CLT - Consolidação das Leis Trabalhistas
CNE - Conselho Nacional de Educação
CPTM – Companhia Paulista de Trens Metropolitanos
DISAETE – Divisão de Supervisão e Apoio às escolas Técnicas Estaduais
ETAE – Escolas Técnicas Agrícola Estaduais
ETES – Escolas Técnicas Estaduais
FATEC – Faculdade de Tecnologia
FSP – Folha de São Paulo
FUNDAB- Fundação do Desenvolvimento Administrativo
IE - Instituição de Ensino
LDB – Leis de Diretrizes e Bases Curriculares
MEC - Ministério da Educação e Desporto
METRÔ- Cia Metropolitano de São Paulo
MTB – Ministério do Trabalho
PEA- População Economicamente Ativa
xii
PROEP- Programa de Educação Profissional
SEFOR- Secretaria de Formação e Desenvolvimento Profissional
SPTrans- São Paulo Transportes
UNESP- Universidade Estado de São Paulo
UNIMETRO- Universidade Corporativa dos Metroviários
2
Introdução
O mundo do trabalho passa por mudanças profundas, os desafios que estas
mudanças trazem estão relacionados aos avanços tecnológicos e às novas
expectativas das empresas que enfrentam agora mercados globalizados e
extremamente competitivos. Com isso, surgem também novas exigências em
relação ao desempenho de todos os profissionais1.
No marco dessas transformações, consolida-se o consenso, entre os empresários,
da superação gradativa da concepção “taylorista-fordista” de organização do
trabalho. Isso nos leva, inevitavelmente, à mudança da concepção de tarefa que
deixa de requerer um aprendizado por assimilação de operações, às vezes
repetitivas e sem experiência e qualificação, para requerer formas mais
abrangentes e organizadas de aprendizagem, onde o ato de pensar preside o ato de
fazer. Daí a necessidade de ajudar o trabalhador-aluno a pensar e, mais ainda, de
contribuir para que esse trabalhador aproveite sua experiência de vida,
organizando-a intelectualmente para utilizá-la em seu trabalho.
As novas tendências atuais do mundo do trabalho, sugerem, portanto, novos
modelos de gestão, que enfocam a necessidade do aprendizado contínuo e do
comprometimento das empresas na busca do aprimoramento de seus recursos
humanos. Paulo Freire (1997), já atentava para a necessidade do aprender a
aprender, enfatizando em seu livro “Pedagogia da Autonomia” “que para se
aprender é preciso que se ensine e para se ensinar é preciso que se aprenda”.
A dinâmica da reestruturação produtiva e seus impactos sobre o mercado de
trabalho e sobre a qualificação profissional definem novas competências trazendo
mudanças estruturais na configuração dos mercados de trabalho e nos planos
nacional, regional e local.
1 As grandes linhas destas mudanças podem ser encontradas nos trabalhos de Alvin Tofler, Claus Offe,Domenico de Masi, Jeremy Rifkin, Manuel Castells, Willlian Bridges entre outros.
3
Esse processo apresenta uma série de desafios para os sistemas de educação
profissional, uma vez que valoriza o trabalho qualificado, com características de
multifuncionalidade e polivalência, num contexto de mudança altamente dinâmico. A
educação passa então a ser uma necessidade para a empresa e um interesse para
o trabalhador e para a sociedade, exigindo que se repensem as bases pedagógicas
da educação geral e da educação para o trabalho. Ao discutir tal questão Elenice
Leite nos fala:
“Em face da crescente difusão de um novo perfil de competências nomercado de trabalho, começa a perder sentido a dicotomiaeducação/formação profissional e a correspondente separação decampos de atuação entre instituições educacionais e de formaçãoprofissional. Trabalho e cidadania, competência e consciência nãopodem ser visto como dimensões distintas, mas reclamamdesenvolvimento integral do indivíduo que, ao mesmo tempo, étrabalhador e cidadão, competente e consciente [....]. A busca denovas metodologias, tanto para jovens como para adultos, colocaem xeque a própria cultura organizacional e pedagógica da maiorparte das instituições educacionais e de formação profissional, frutoem grande parte, das teses da organização científica. Perfilinovador, crítico, ousado e com iniciativa dificilmente pode serformado pela velha escola de organização e administração” (1995,p.13).
Portanto, os novos requerimentos em relação as habilidades para o trabalho e a
diversificação dos agentes produtivos implicam em não se esperar que um único
agente, seja o governo, os empresário, os trabalhadores ou outro segmento da
sociedade, tome a si a tarefa de formar, capacitar e retreinar recursos humanos. A
escassez de recursos obriga os atores sociais ao aproveitamento máximo das
diversas contribuições que instituições diversas podem oferecer para a formação dos
recursos humanos. Por isso, a articulação entre os agentes distintos – Instituição de
Ensino, Empresa – pública ou privada, centrais ou locais – é indispensável para
resolver os problemas enfrentados pelas sociedades no âmbito da educação e da
formação profissional. Esta tarefa reivindica a participação dos Ministérios da
Educação e do Trabalho, dos municípios, das organizações não governamentais,
dos meios de comunicação, dos serviços de formação profissional, e das diversas
organizações de ajuda à comunidade, e, em especial, dos empresários, através de
seus órgãos de associação e representação sindical.
4
De acordo com essas premissas, a literatura sobre as novas dinâmicas do trabalho e
de formação profissional evidenciam a necessidade desse tipo de articulação. A
nova legislação preconizada pelo MEC vem enfrentar essas questões, da forma
como estabelece no decreto 2208 de 17/04/1997 diz:
“Art.5º - A educação profissional de nível técnico terá organizaçãocurricular própria e independente do ensino médio, podendo seroferecida de forma concomitante ou seqüencial a este”.
E ainda ressalta a importância do desenvolvimento de estudos de mercado para a
construção de currículos sintonizados com o mundo trabalho e com os avanços
tecnológicos:
“Art.7º - Para a elaboração das diretrizes curriculares para o ensinotécnico, deverão ser realizados estudos de identificação do perfil edas competências necessárias à atividade requerida, ouvido ossetores interessados, inclusive trabalhadores e empregadores.”
Constatamos portanto, que no paradigma que ora se implanta na educação
brasileira, o currículo, tradicionalmente entendido como uma grade disciplinar
preestabelecida e, obrigatoriamente reproduzida pelas escolas, passa a ser um
conjunto de situações meio organizado de acordo com uma concepção criativa local
e particular, voltado para a geração de competências, estas sim estabelecidas para
cada área profissional. De acordo com esse paradigma e como resposta ao novo
perfil que a laborabilidade ou a trabalhabilidade vem assumindo, o foco central da
educação profissional transfere-se dos conteúdos para as competências.
Considerando a complexidade das transformações do mundo do trabalho, esta
dissertação tem como objetivo, portanto, apresentar um estudo sobre como uma
instituição educacional – o Centro Paula Souza – Ceeteps que é responsável por
viabilizar no Estado de São Paulo as políticas públicas relativas à educação
profissional de nível básico, tecnológico, mantém uma rede de 99 escolas técnicas
(com cursos técnicos nas áreas agrícola, industrial e de serviços) e 09 Faculdades
de Tecnologia, altera sua forma de gestão para atender as novas demandas de
capacitação profissional.
5
O grande desafio que o Ceeteps enfrenta é o de atender as novas demandas, que é
constituída também pelo aluno - trabalhador que tem experiência mas necessita de
reconhecimento e certificação de competências. Assim o Ceeteps não mais atenderá
somente o jovem estudante egresso do ensino médio, mas também o trabalhador,
pois é importante que as competências adquiridas, especialmente durante a vida
profissional, possam ser reconhecidas pelas empresas mas também pelo sistema
educativo formal Há projetos destes atualmente em estudo em diversas regiões do
mundo, a exemplo da comissão Européia2 que prevê a criação de “certificados
pessoais de competências” que façam com que cada indivíduo possa ver
reconhecidos os seus conhecimentos e aptidões à medida que os for adquirindo.
Essa mudança de postura representa uma alteração significativa nos procedimentos
habituais de preparação e planejamento de seus cursos. Empresa e escola precisam
estar lado a lado para definir o que deve ser ensinado aos alunos, o que torna esta
parceria muito importante.
A escolha por esta temática a ser desenvolvida neste trabalho é resultante do nosso
envolvimento com a formação profissional. Exercendo a função de professora de
cursos profissionalizante nas unidades do Ceeteps, pudemos vivenciar dia a dia as
grandes transformações decorrentes das exigências do mercado de trabalho, da
incorporação de novas tecnologias, novo modelo curricular, com importantes
implicações sociais econômicas, políticas e culturais, internas e externas à escola.
Percebemos a necessidade de uma revisão do modelo de gestão institucional, uma
vez que o modelo de formação profissional, com raras exceções estão todos
estruturados para atender aos padrões fordistas de produção. Nesse contexto
educacional, a organização curricular caracteriza-se pela divisão do conhecimento
em disciplinas (conteúdo determinado por especialistas, que costumam ver o mundo
a partir da ótica de sua disciplina) num processo de fragmentação da cultura escolar.
Assim optou-se como instrumental analítico relatar os depoimentos dos atores
sociais envolvidos na construção do “Primeiro Curso Técnico em Transporte
2 Comissão Européia, Enseigner et apprendre. Serviço de Publicações Oficiais das Comunidades Européias,Luxemburgo, 1995 – In –UNESCO-2001
6
Metropolitano sobre Trilhos no Estado de São Paulo”. Esse curso técnico na área de
transportes foi elaborado em parceria com empresas do Setor e com apoio na ANTP
– Associação Nacional de Transportes Públicos e foram desenvolvidos sob a
coordenação do Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza – Ceeteps.
Essa articulação entre empresa e escola demonstra a ruptura do modelo pedagógico
tradicional e do modelo convencional de treinamento oferecido pela área de recursos
humanos das empresas, como nos relata Marcos Monteiro3 :
“O curso técnico em transporte metropolitano sobre trilhos, é umprojeto piloto em São Paulo, representa um desafio para os atoresenvolvidos, pois a construção do itinerário de competência é umaexperiência nova no Brasil. A parceria entre escola e empresa só épossível concretizar-se a partir de um diálogo entre as partes”(2000).
Concordamos com Monteiro e acreditamos na importância de relatar essa
negociação, pontuando os depoimentos entre as partes envolvidas. De um lado a
instituição de ensino habituada a fazer seu planejamento de ensino, a partir de um
processo individual de aprendizagem de formas de fazer, definidas pelas
necessidades da ocupação a ser exercida, para então desenvolver cursos a partir da
necessidade da empresa. E de outro, as empresas alterando seu perfil de
treinamento, que era considerado como um meio para adequar cada pessoa ao seu
cargo, para modernamente considerá-lo como um meio de desenvolver
competências nas pessoas, objetivando maior produtividade.
Com base neste pensamento o Ceeteps está buscando uma adequação à nova
proposta de educação profissional e uma organização pró-ativa. A primeira privilegia
as demandas do mercado de trabalho e a segunda uma articulação com a
sociedade e o mundo do trabalho. Essa nova organização de gestão e de
organização compreende alterar a divisão do conhecimento em disciplinas para o
princípio da interdisciplinaridade, essencialmente sócio-humanista e parte da
reflexão sobre como se dá o conhecimento e para que serve este conhecimento,
levando-se em conta o ponto de vista social. Esse princípio resgata o método de
3 Monteiro, Marcos é Superintendente na gestão atual do Ceeteps.
7
projetos, os centros de interesse e outras propostas pedagógicas essencialmente
operatórias, críticas e democráticas.
Acreditamos ser oportuno um estudo à respeito na medida em que a parceria
representa um desafio para os atores sociais envolvidos com a qualificação
profissional, uma vez que é preciso superar a visão segmentada, setorizada que a
maioria das organizações tem delas mesmas. Torna-se necessário um grande
esforço para coletivizar idéias novas, o que implica uma ação de harmonização de
interesses, a fim de desenvolver formas de ensino que façam constantemente
conexões com a sociedade.
A partir de um mapeamento dos referenciais teóricos associados à dinâmica da
questão da qualificação em uma perspectiva da sociologia do trabalho e da
educação, poderemos confrontar a expressão dos princípios que organizam e
legitimam a passagem de um ensino centrado em saberes disciplinares a um ensino
definido pela produção das competências verificáveis em situações e tarefas
específicas. Tal estudo compreende uma relação interdisciplinar, quando recorre a
várias áreas do conhecimento para garantir sustentação nos referenciais teóricos. É
precisamente nesse contexto que esta dissertação pretende dar sua maior
contribuição, pois vale ressaltar que a literatura existente sobre as transformações
no trabalho e as reformas do ensino profissional reconhece a importância da
articulação entre os atores sociais. Entretanto, ainda parecem ser poucos os
trabalhos que relatam experiências concretas de cooperação técnica entre
empresários e agentes educacionais.
Para desenvolver nossa proposta organizamos este trabalho em seis capítulos
dispostos da seguinte forma:
O Capítulo 1 apresenta as transformações no mundo trabalho e, a partir das visões
de vários autores, discute um conjunto de idéias sobre os impactos das novas
tecnologias que justificam a necessidade de um novo modelo de formação
profissional.
8
O Capítulo 2 discute as estratégias empresariais, demonstrando como as empresas
reagem às transformações no mundo do trabalho. Especificamente no que se refere
à questão da aprendizagem e gestão do conhecimento, ressalta a importância de
diferenciar o aprendizado individual do organizacional, evidenciando a necessidade
do alinhamento entre as estratégias da organização e administração de recursos
humanos.
O capítulo 3 introduz um debate sobre a alteração do conceito de qualificação,
relacionando-o com o conceito de competência. Através deste capítulo será possível
compreender como o conceito de qualificação é polissêmico, podendo ser assumido
com várias acepções e analisado sob ângulos e enfoques distintos.
O capítulo 4 apresenta a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Profissional,
identifica as configurações atuais, bem como os rumos a serem seguidos ante a
proposta de reforma educacional contida na Lei nº 9.394/96 e no Decreto nº
2208/97. Discute o Parecer CEB/CNE nº 16/99, que é apresentado como Referencial
Curricular Nacional para a Educação Profissional.
O capítulo 5 caracteriza o que é uma instituição de ensino, objetivando
compreender a sua relação com o meio ambiente e identifica o modelo de gestão
de uma instituição de ensino – no caso específico o Centro Paula Souza (Ceeteps),
de maneira a entender como esta reage ao processo de mudança.
O Capítulo 6 apresenta um estudo de caso envolvendo o Ceeteps e as empresas de
transportes – ANTP, Metrô, CET/SP, CPTM e SPTrans. Apresenta também partes
de entrevistas realizadas com os sujeitos envolvidos no processo de cooperação
técnica educacional. Este capítulo mostra, portanto, formas renovadas de parceria
empresa/escola.
Nas Considerações Finais, alinharemos o conjunto de idéias expostas na
dissertação, levando em conta a questão do conhecimento como elemento central
de transformação social.
9
Esta estrutura deve nos permitir a visão articulada dos três grandes eixos de análise,
a mudança do trabalho, as novas demandas empresariais, e os esforços de
adequação que hoje se exige dos centros de formação profissional.
PARTE IO MUNDO DO TRABALHO
Há muitos outros sinais de continuidade, em
vez de ruptura (...) Mas considero igualmente
perigoso fingir que nada mudou (...)
10
David Harvey, Condição Pós-Moderna
Capítulo 1 Transformações no Trabalho
Esse capítulo aborda os grandes eixos de interpretação da realidade em
transformação, portanto representa a base para compreensão e justificativa do tema
objeto de estudo. A partir das visões de vários autores analisa um conjunto de
idéias sobre as transformações no mundo do trabalho e sobre os impactos
causados devido ao surgimento de novas tecnologias, de forma a elucidar os
argumentos teóricos que justificam a necessidade de um novo modelo de formação
profissional.
1.1. Concepções e dimensões do Trabalho e do Emprego
Etimologicamente o termo trabalho aparece com dois diferentes significados: o
primeiro, derivado de tripalium, como sinônimo de tortura e escravidão, mais tarde
passou a expressar a idéia de esforçar-se, exercer um ofício; o segundo significado
está relacionado com a idéia de orientada para um fim, construção, transformação.
Segundo Chnee4, uma análise da história da humanidade nos mostra que trabalho
e técnica sempre estiveram presentes em todas as formas de sociedade, por mais
rudimentares que fossem, desempenhando papel fundamental na formação e
organização das mesmas. Toda evolução baseia-se em conquistas que se deram a
partir do trabalho, ou foram desenvolvidas por meio de técnicas e, a partir de certo
momento, por meio da tecnologia. A evolução do trabalho esteve sempre
relacionada à estrutura sócio-econômica e cultural, desempenhando um papel
importante na construção do sentido do trabalho. A forma de concebê-lo e organizá-
CHNEE, Patricia C.Celani. O Significado do Trabalho na percepção de Profissionais que atuam em empresasglobaIizadas ou caracterizadas pela utilização de alta tecnologia. Dissertação de Mestrado em Administração -PUC-SP 1998.
11
lo passou a determinar o modo de vida das sociedades, sendo inclusive responsável
pela diferenciação das mesmas5.
No entanto, ameaças ao trabalho estiveram ligadas a importantes momentos de
crises sociais e econômicas ao longo da História, trazendo a tona questionamentos a
respeito de sua importância e de seu significado. Muitos trabalhadores lutaram e
ainda lutam por melhores condições de trabalho, alguns a partir de justas
reivindicações e outros por oportunismo. As máquinas desenvolvidas, para
aumentar a eficiência do processo de manufatura, originaram o sistema fabril de
produção – que levaria à Revolução Industrial, substituindo o homem em tarefas
repetitivas ou perigosas com mais rapidez. Se por um lado a máquina contribuiu com
o trabalho efetuado pelo homem, por outro ganhou parte de seu espaço e, em
certos casos, tirou seu lugar, determinando uma nova organização do trabalho.
Essas novas formas de organização refletem a introdução de novos procedimentos,
como por exemplo a Gestão do Conhecimento e Educação Corporativa, e o
afastamento daqueles até então dominantes.
Thomas Khun nos ensinou que a ciência avança pela vitória de novos paradigmas,
novas explicações e ou procedimentos para entender o mundo sobre verdades
estabelecidas. Podemos extrapolar essa proposição também para outras áreas.
Assim nos deparamos com vários eixos de interpretações, sendo designado várias
propostas de formato de trabalho, diferenciadas em função da ênfase de cada autor
em determinado aspecto. Algumas dessas propostas são: “produção de alta
performance”, “fabricação enxuta”, “automação flexível”, “just-in-time”, “kan-ban”,
“toyotismo”, “era da Informação”, “era do Conhecimento”, “Pós Industrial” ou ainda
“Terceira Onda” de Alvin Tofler, entre outros. Estes novos conceitos sinalizam
mudanças na organização do trabalho. Mudanças que favorecem a disseminação
do novo “modelo de gestão” e remetem à “crise”, de natureza estrutural e de
abrangência mundial, atravessada pela economia capitalista ao final da década de
60 e início dos anos 70. Sua complexidade explode nos anos 80 e com diferentes
nuanças vem se alastrando, até os dias de hoje, a “todos os campos mais
5 Privilegiamos aqui as relações de produção, cientes que as relações de distribuição formam também um papelde diferenciação das sociedades.
12
abrangentes da vida social - econômico, político, social e cultural”, caracterizando
uma ampla “crise societária” ou uma crise global (Wanderley, in Aprile 1996).
Diante da diversidade e da pluralidade de práticas emergentes de trabalho nas
sociedades contemporâneas, Leila Blass (1996) sugere que o conceito de trabalho
deve ser redefinido. Para Blass, a noção ampliada de trabalho romperia, assim, os
limites de um conhecimento sociológico fragmentado e compartimentado, herdeiro
da ciência moderna. Além disso, torna-se possível diferenciar os termos trabalho e
emprego, resolvendo a problemática surgida historicamente com a generalização
das práticas de assalariamento.
Mais do que uma questão de semântica e afora os modismos, a distinção dos
termos é um indicador da necessidade de mudança: o empregado (aquele que tem
um emprego) ou o funcionário (aquele que exerce uma função). Até mesmo o
recente e bastante difundido termo empregabilidade (capacitar-se para ser absorvido
pelo mercado de trabalho) começa a ser substituído por trabalhabilidade
(capacidade de auto motivar-se e criar oportunidades de trabalho onde não há
emprego). Isto nos remete a fala de Dowbor, que afirma:
“O problema do trabalho não pode ser reduzido à questão do“emprego” que garante uma vinculação formal da pessoa com umainstituição. A comunidade necessita de um grande volume deserviços antigamente prestados pela família “ampla“, pelos avós,tios, amigos da família que ajudavam a cuidar da casa, das criançase dos espaços comunitários” (1998, p.70).
Assim, segundo Helena Hirata (1996) pode-se afirmar que o trabalho, no sentido de
trabalho assalariado, perde sua centralidade na medida em que o volume do
emprego assalariado regride e ocorre um aumento dos empregos precários.
Portanto, repensar o sentido do trabalho, hoje ao nível da sociedade é de certa
forma, tentar dar respostas para essa questão da centralidade do trabalho.
Entretanto, pensar a respeito de trabalho, nos leva também a um raciocínio onde a
lógica corresponde ao modelo de trabalho caracterizado como emprego, atrelado às
relações contratuais, a carreira e ascensão profissional a partir do referencial capital
x trabalho e do modelo de administração a partir da era industrial. Acreditamos que
13
esse raciocínio reduz o universo de análise, quando o momento atual sugere outras
possibilidades de trabalho, (tais como: teletrabalho, terceirização, autônomo). Daí a
importância, para efeito desse estudo, de distinguirmos os conceitos de trabalho e
emprego, como veremos a diante.
Segundo o Dicionário Aurélio da Lingua Portuguesa o termo emprego significa: Ato
de empregar, aplicação, ou ainda de Cargo ou Ocupação em serviço particular,
público, etc. Para William Bridges (1995), os empregos não fazem parte da
natureza. São produtos históricos. Nada torna este fato mais claro do que o
significado mutante da própria palavra: emprego. As palavras que usamos são
coisas vivas com histórias próprias, e quando seus significados mudam com o
passar do tempo, podemos garantir que ocorreram mudanças nas realidades sociais
e psicológicas também.
A palavra emprego (Job) é antiga e remonta um período anterior ao ano de 1400,
mas até 1800 tinha significado diferente do seu significado atual. No começo, a
palavra emprego (job) pode ter sido uma variante de gob (bocado), porque
significava “uma pequena porção compacta de alguma substância, um pedaço, um
naco, um bocado”. Tanto job (emprego) como gob (bocado) podem, de fato, ter
surgido originalmente de uma palavra céltica, gob ou gop significando “boca”.
Iniciando-se com o sentido de “pedacinho” de alguma coisa, a palavra começou a
ampliar seu significado para incluir “grandes montes” de coisas, como montes de
feno ou estrume de curral (a idéia de que esse emprego original possa ter sido um
“monte de esterco” parece muito moderna para alguns trabalhadores). Por volta da
época em que os imigrantes, puritanos ingleses, chegaram a Plymouth, seu
significado sofreu mais uma transformação, mudando de “grande monte” em si para
o ato de transportar tal monte numa carroça. A partir daí, foi um passo para se usar
o termo emprego (job) para referir-se a “qualquer tarefa que fosse uma peça única
de trabalho” (Bridges,1995).
Para Bridges, várias linhas divergiam desse significado básico que utilizava o termo
emprego como tarefa. Uma nova linha considerou o emprego um pedaço do
negócio, como em “Decidimos dar o serviço (job) à gráfica da esquina”. Outra linha
considerou o emprego uma unidade de trabalho, como em “Sou pago para fazer o
14
serviço”. Em outras, ainda, como em “Tive um trabalho duro para encontrá-lo” ou
“Ela fez um negócio ruim ocultando seus sentimentos”, passou a utilizar o termo para
referir-se a quase que qualquer empreitada ou esforço.
Contudo, o emprego nos moldes atuais desenvolveu-se inicialmente nas
tecelagens, na metaloplastia e nas fábricas de calçados, atividades executadas além
daquelas de pastoreio e agricultura, que eram desempenhadas artesanalmente e
denominadas job-work (Bridges, 1995). A idéia moderna de emprego surgiu como
algo assustador, desagradável e socialmente ameaçador. Para os críticos, tratava-se
de uma forma de trabalho antinatural, desumana e insuportável. Mas com a
apropriação das terras onde havia plantio e pastoreio e com o oferecimento de
trabalho nas fábricas, cada vez mais pessoas deixaram o job-work ao estilo antigo e
dedicaram-se a arranjar um emprego.
O trabalho nas fábricas e organizações burocráticas dos países que se
industrializavam trouxe consigo o conceito de emprego. Até então as pessoas
trabalhavam, mas em geral em grupos que variavam segundo as tarefas.
Desempenhavam diversas atividades, que podiam ser breves e leves, ou árduas e
demoradas, para si próprio ou para outros por meio de contratos. Não existia
emprego no sentido fixo. A programação era determinada “pelo sol, pelo tempo e
pelas necessidades do dia” (Bridges 1995).
Contribuindo com esse pensamento, Phlippe Zarifian (1990) acredita que o
referencial do emprego não é outra coisa senão uma sequência lógica de tarefas, a
partir das quais infere-se as capacidades físicas, os conhecimentos técnicos e uma
disciplina social “qualidades” que todo indivíduo pretendendo ocupar aquele posto
de trabalho deve possuir.
Portanto, não podemos deixar de considerar que nossa vida em sociedade está
estruturada com base no emprego tradicional, o que consiste em um agravante da
situação. Desde crianças ouvimos falar na importância do trabalho e nos
preparamos para escolher o que seremos quando adultos, aprendendo a nos
autodefinir em função de um emprego. Sua importância transcende a questão
econômica e envolve a auto-estima, o que explica os inúmeros casos de depressão
15
em desempregados (Rifkin e Bridges, 1995). É fácil compreender o problema se
considerarmos que o trabalho faz parte dos projetos de vida das pessoas, o que
dificulta o fato de programá-lo em sua total ausência (Chnee, 1998).
Entretanto, Ladislau Dowbor (1998) adverte que o problema do emprego vai mais
longe, a visão conservadora do mundo está ruindo (Antony Guiddens) e estamos no
limiar de uma nova era, à qual as ciências sociais devem responder o que está nos
levando para além da modernidade. Basta dizer que estamos evoluindo para a era
dos serviços? É fácil dizer que nos Estados Unidos a agricultura ocupa 2,5% da
mão-de-obra. Tal avaliação segundo Dowbor, é possível porque reduzimos a
atividade agrícola à lavra da terra. Hoje o agricultor americano se apoia em serviços
de análise de solos, em serviços de inseminação artificial, serviços de calagem,
serviços de silagem, serviços meteorológicos e outros. Não há mais agricultura, ou
a agricultura passou a funcionar de outra forma?
Da mesma forma poderíamos dizer que a secretária ou engenheiro que trabalham
na fábrica não estão na indústria, estão na área de serviços. “Na realidade trata-se
em grande parte de uma transformação do conteúdo das atividades produtivas, e
não do desaparecimento destas atividades em proveito de uma nebulosa área de
serviços. De certa forma, é o conjunto das atividades humanas que está sendo
transformado ao incorporar mais tecnologias, mais conhecimento e mais trabalho
indireto” (Dowbor, 1999).
Sabemos então que o motor de transformações se dá pelo efeito causado pela
introdução de novas tecnologias, no âmbito do trabalho e do emprego. Portanto,
para efeito desse estudo, apontaremos seus efeitos no âmbito do emprego e das
novas formas de trabalho, as quais em boa parte pode resultar em uma exigência de
maior qualificação para o trabalhador.
1.2. Inovações Tecnológicas e Reestruturação Produtiva
As Inovações tecnológicas modificam o perfil do trabalho e do emprego, o ambiente
globalizado acarreta novos formatos de empresas e formas de gestão como
16
contratos temporários, terceirizações, organizações virtuais, projetos transnacionais,
teletrabalho, etc. Dessa forma, a atividade profissional passa então a ter uma
característica universal, expandindo a dimensão social do significado que lhe é
atribuído, uma vez que muitos profissionais já não fazem parte de um mercado de
trabalho local, mas sim mundial.
Em matéria de gestão e organização empresarial, Elenice Leite nos fala sobre as
definições que se difundem nesse quadro, uma série de princípios que configuram
uma “nova filosofia de produção”, ou como aventam alguns estudiosos, um “novo
paradigma”, sob vários aspectos distintos da arquitetura taylorista-fordista que teria
predominado no modelo anterior. Essa reestruturação, segundo Leite, chega a
configurar uma fase de crise e transição, de modo a incorporar um novo ideário nos
discursos de diferentes atores — empresários, trabalhadores, educadores,
administradores e associações de classe, assumindo de certa forma, a mesma
dimensão paradigmática que a organização científica atingiu ao longo dos anos do
pós-guerra.
Entretanto, esse ideário, inicialmente mais localizado no plano do discurso, acaba
incidindo na prática das empresas, definindo novas práticas produtivas, com
impactos diretos sobre o trabalho e na qualificação do trabalhador. A reestruturação
empresarial, assim conduzida, tem como componente básico a busca de:
• Integração, no sentido de racionalizar e otimizar recursos, ou
ainda, superar progressivamente “gargalos” ligados a estoques,
tempos mortos, desperdícios, e
• Flexibilidade, em particular na definição do mix de produtos e em
suas especificações segundo o perfil dos clientes.
Assim, as mudanças que acompanham as novas tecnologias da informação
alteraram profundamente a relação entre os trabalhadores e o trabalho. De acordo
com Rifkin (1995), as novas tecnologias de racionalização do trabalho geram duas
realidades: de um lado o aumento de produtividade, maior competitividade em nível
global e aumento dos lucros, e de outro o desemprego.
17
Manuel Castells (1999) em seu livro “A Sociedade em Rede” nos fala do surgimento
de uma nova estrutura social, associada à ascensão de um novo modo de
desenvolvimento: o informacionalismo. A economia informacional é caracterizada
por cultura e instituições específicas, mas não está relacionada a uma determinada e
única sociedade. Um de seus aspectos mais importantes é que ela não se restringe
a uma área geográfica ou a um país isolado; ao contrário, surge em contextos
culturais muito distintos, da América do Norte à China, passando pelos mais
variados pontos do planeta, exercendo influência em todos os países e gerando uma
estrutura de referências multiculturais.
Castells (1999) enfatiza que a revolução tecnológica não é caracterizada pela
centralidade de conhecimentos e informação, mas sim pela aplicação desses
conhecimentos e dessa informação para a geração de conhecimentos e de
dispositivos de processamento/comunicação da informação, em um ciclo de
realimentacão cumulativo entre a inovação e sua aplicação. Vejamos em suas
próprias palavras:
“Computadores, sistemas de comunicação, decodificação eprogramação genética são todos amplificadores e extensões damente humana. O que pensamos e como pensamos é expresso embens, serviços, produção material e intelectual, sejam alimentos,moradia, sistemas de transporte e comunicação, mísseis, saúde,educação ou imagens. A integração crescente entre mentes emáquina, inclusive a máquina de DNA, está anulando o que BruceMazlish chama de a “Quarta descontinuidade” (aquela entre sereshumanos e máquinas), alterando fundamentalmente o modo peloqual nascemos, vivemos, aprendemos, trabalhamos, produzimos,consumimos, sonhamos, lutamos ou morremos” (Castells, 51:1999).
Portanto, as tendências tecnológicas e organizacionais que vêm sendo introduzidas
no mundo do trabalho indicam que suas formas rígidas de organização começam a
ser flexibilizadas, dando passagem a um novo regime de acumulação, que alguns
autores denominam de “especialização flexível” ou “acumulação flexível”. O novo
“modelo produtivo”, conforme destaca Harvey (1992) :
(...) se apóia na flexibilidade dos processos de trabalho, dosprodutos e padrão de consumo. Caracteriza-se pelo surgimento desetores de produção inteiramente novos, novas maneiras defornecimento de serviços financeiros, novos mercados e sobretudo,
18
taxas altamente intensificadas de inovação comercial, tecnológica eorganizacional.
Ainda, segundo Harvey6, a “acumulação flexível”, envolve:
(...) rápidas mudanças dos padrões do desenvolvimento desigual,tanto entre setores como em regiões geográficas, criando, porexemplo, um vasto movimento no emprego no chamado setor deserviços, bem como conjuntos industriais completamente novos emregiões até então subdesenvolvidas (...)(140:1992).
Sob a égide da “acumulação flexível”, o velho “modelo taylorista/fordista” estaria
sendo substituido por um “novo” modelo de organização do trabalho, cujas
características principais seriam a produção em pequenos lotes, a reintegração das
atividades de execução, planejamento e ainda, o emprego de trabalhadores mais
qualificados para o desenvolvimento de um trabalho mais variado.
Nadia Araujo Castro, ao tratar de questões relativas ao trabalho e à organização
industrial num contexto de crise e de reestruturação produtiva, considera que:
[...] sinais emitidos do mundo da moderna atividade industrial,ou seja, indicadores conjunturais insistentemente veiculados aolongo de 1993 davam conta do crescimento da população, daprodutividade e da capacidade integração competitiva em algunssetores, como a automobilística, que se constituem em carros chefesda indústria no Brasil. Estes resultados pareciam decorrer não dasimples incorporação milagrosa de equipamentos sofisticados, massim de um intenso e simultâneo processo de reestruturaçãoorganizacional, que tem alterado tanto a estrutura interna dasempresas – suas formas de organizar e gerenciar a produção e otrabalho- quanto as relações entre empresas. (1994, p.116).
Tal processo, como afirma Oliveira Neto7, além de envolver mudanças na estrutura
produtiva, acarretou transformações micro e macroeconômicas, mudanças
institucionais no âmbito da sociedade civil e mudanças políticas e culturais,
presentes também no cenário mundial, as quais se fizeram sentir no País com o
processo de abertura iniciado na década de 90, o que colocou a indústria aqui
instalada – de capital nacional e estrangeiro diante de novos desafios. Foi o
momento de mudanças produzidas pelo processo de transição política, econômica e 6 Harvey David. Condição pós moderna. São Paulo: Loyola, 1992.
19
cultural decorrentes da implantação de um projeto político nacional iniciado no
Governo Collor, seguido pelo de Itamar Franco e intensificado pelo de Fernando
Henrique Cardoso.(1999).
Por outro lado, numa perspectiva macro social, Dowbor8 (1999) nos fala sobre o
conjunto das atividades humanas que está sendo transformado ao incorporar mais
tecnologias e mais conhecimentos. Adverte que nem a área produtiva, nem as redes
de infraestruturas, e nem os serviços de intermediação funcionarão de maneira
adequada se não houver investimento no ser humano, na sua formação, na sua
saúde, na sua cultura, no seu lazer, na sua informação. Em outros termos, a
dimensão social do desenvolvimento deixa de ser um “complemento”, uma dimensão
humanitária de certa forma externa aos processos econômicos centrais, para se
tornar um dos componentes essenciais da transformação social que vivemos.
Portanto, Dowbor nos lembra que o principal setor econômico nos Estados Unidos
não é mais a indústria automobilística, ou bélica, mas a saúde, que representa 14%
do seu PIB.
Sendo assim, por mais paradoxal que possa parecer a tecnologia, quanto mais
sofisticada, torna-se também mais acessível a um número maior de pessoas e
mais é reconhecido o valor do capital humano como vantagem competitiva das
empresas. Isto enfatiza o caráter de ferramenta da tecnologia freqüentemente sub
utilizada e não como um concorrente ou substituto do trabalho humano. Assim como
o arado para o período agrícola e a máquina a vapor para o período industrial, hoje
dispomos da informática como ferramenta na substituição de atividades repetitivas e
automatizadas, que prescindem de características basicamente humanas na
criatividade, intuição e inteligência. O que conta não é o quanto de tecnologia que se
dispõe, mas se o uso que se faz dela implica em diferença no resultado final do
produto ou serviço apresentado ao cliente.
Entretanto, cabe ressaltar que não estamos diante de um padrão único, estamos
diante de um complexo processo de construção social, para o qual a história 7 Oliveira Neto, Paulo Rocha. Aspectos do Trabalho na Pós Modernidade. Dissertação de Mestrado. São Paulo.Núcleo de Estudos e Pesquisas em Educação e Qualificação Profissional. PUC/SP, 1999.8 DOWBOR, Ladislau. Gestão Social e Transformação da Sociedade. Artigo One-Line- www.ppbr/ld.com.br.1999.
20
pregressa e a cultura dos agentes sociais envolvidos na transformação
desempenham uma enorme importância na definição de suas características. Assim
vale considerar por exemplo que algumas empresas implantam programas de
qualidade total (TQC ou CQT), Just-In-Time, reengenharia conceitos de cliente
interno e do binômio-cliente fornecedor em paralelo com inúmeras formas de
trabalho informal e mal pago.
Nessa linha de reflexão Marcia Leite nos alerta sobre a performance da indústria
japonesa, especialmente no setor automobilístico, que tem levado a um duplo
movimento entre os estudiosos: por um lado, pode-se identificar uma tendência à
idealização das características do chamado “modelo japonês” que seria responsável
pela adoção de formas de organização do trabalho mais satisfatórias, baseadas no
trabalho qualificado, bem pago e estável, por outro lado, uma tendência à crença de
que tal modelo deverá se expandir pelo mundo repetindo as mesmas características
do “modelo japonês” no que se refere à organização do trabalho, relações entre
empresas e formas de gestão da mão-de-obra, o que tem se expressado inclusive
no novo termo criado para a discussão de tal fenômeno, qual seja, a japonisação
((japanization) (M.Leite, 2000:17).
Esse tipo de consideração como nos fala M.Leite9, nos alerta não só para a
necessidade de levar em conta a diversidade nas formas de adaptação ao novo
contexto internacional, mas mais que isso, de ter presente que uma nova divisão
internacional do trabalho pode estar em andamento, provocada especialmente pela
enorme expansão do capital japonês a nível internacional nos últimos anos, a qual
tenderia a concentrar as fases mais sofisticadas do processo de produção em
alguns países, ao lado de uma externalização das fases mais simples, que se
dirigiria às regiões com maior concentração de mão-de-obra barata. Tal tendência,
que levaria a uma difusão de empresas que se caracterizariam por uma utilização
mais predatória da mão-de-obra, seria encontrada não só em alguns países em
desenvolvimento, mas inclusive em algumas nações do mundo desenvolvido onde a
qualificação da mão-de-obra é relativamente baixa e o custo do trabalho é
igualmente baixo ou vem tendendo ao declínio nos últimos anos (2000:20). Isso
9 Importantes considerações a esse respeito são encontradas na tese de livre docência de M.Leite- Unicamp-2000–Ciência, Tecnologia e Sociedade.
21
significa que estamos passando por processos complexos e contraditórios e que
requer, portanto, a capacidade de balizar as macro idéias.
Enfim, vale destacar que face à essas constatações, compreendemos que as
transformações que caracterizam o atual mundo do trabalho e o novo modelo de
gestão é orientado por um conjunto de valores e idéias, cujas mudanças provocam
sobre os processos de trabalho e gerenciamento da mão-de-obra configuram uma
nova ofensiva do capital frente às novas exigências que lhe são impostas. Ao alterar
a maneira de trabalhar e de produzir, o “Novo modelo de gestão” atinge diretamente
a classe trabalhadora, colocando “em xeque” a qualificação profissional, nos moldes
em que vem sendo tradicionalmente obtida, e ao mesmo tempo, exige do trabalho
qualificado o preenchimento de novos requisitos.
Portanto, qualquer discussão acerca das perspectivas que se apontam para o futuro
da qualificação profissional, passa necessariamente por um processo de reflexão
sobre as contradições e diversidades do atual mundo do trabalho. Consideramos
importante que essas mudanças apontadas pelos autores, devem ser vistas com
realismo e de acordo com a capacidade individual de cada contexto social
econômico e político.
Assim, os debates sobre as transformações no trabalho, que resultam numa
exigência de maior qualificação, devem levar em conta a diversidade real (por
exemplo, a divisão sexual e a discriminação da força de trabalho por gênero) ou
ainda as diferenças entre países desenvolvidos e em desenvolvimento. Pois o
universo do trabalho, que está na base das discussões, é aquele das grandes
empresas, empregando mão-de-obra masculina com processos de inovação
tecnológica intensos nos países do Norte.
1.3. O Teletrabalho
Outra forma de trabalho que vem se firmando é o teletrabalho, chamado de
“telecommuting” pelos americanos e ingleses. Trata-se de exercer o trabalho em
22
casa, ou de casa, ou mesmo na rua, no caso dos vendedores. As telecomunicações,
aliadas à informática, vêm dando um grande suporte a essa forma de trabalho,
permitindo a comunicação entre empregados, colegas e empresa através de
recursos tais como: o fax, telefone, a viva-voz, o correio eletrônico e o vídeo-
conferência. Porém, não se trata de uma idéia nova. Handy 1994:cap.4, cita uma
empresa britânica, a F. International, que iníciou em 1962 um programa chamado
“Free-lance Programmers”. Na realidade, tratava-se de uma só pessoa que escrevia
em sua própria casa programas de computador para empresas. Em 1988, a F.
International empregava 1100 pessoas, 70% das quais trabalhando em casa e 90%
eram mulheres. Essas pessoas não trabalhavam isoladas, mas em grupos formados
em torno de projetos e tarefas. Uma rede de telefones e computadores permite a
comunicação entre esses grupos, possibilitando o cumprimento dos objetivos
propostos (Tose: 1997).
Para De Masi (2000) existem muitas formas de teletrabalho: empresas de trabalho à
distância, escritórios-satélites, centros comunitários, trabalho em domicílio, trabalho
em escritórios móveis, como por exemplo, aqueles instalados em ônibus da equipe
de políticos durante as campanhas eleitorais (205).
Assim segundo este autor nem todos os trabalhos são descentralizáveis. Eles o são
mais facilmente, sobretudo, quando consistem numa atividade simbólica (ler,
traduzir, processar dados, etc) e se têm como matéria-prima a informação que,
devido a sua natureza ubíqua10, é transmissível em tempo real. É um trabalho que
se realiza com procedimentos bem codificados no que diz respeito ao seu início e
fim: a ordem é do tipo “até depois de amanhã, na hora tal devo ter feito isso”. Porém,
apresenta procedimentos bastante decodificados no que diz respeito ao processo: o
trabalhador pode cumprir sua tarefa de manhã ou de noite, na cozinha, no terraço,
tanto faz, isso não interessa à empresa.
Este modelo de trabalho requer, portanto, uma boa autonomia técnico-instrumental
ou ao menos a possibilidade de obtenção por parte de alguém mais qualificado se
surgirem dificuldades. Requer também, a possibilidade de usufruto de todos os
10 Segundo o Dicionário Aurélio da Lingua Portuguesa a palavra úbiqua significa “que está ao mesmo tempoem toda parte”.
23
recursos indispensáveis ao trabalho: se este exige o uso do correio eletrônico, deve-
se poder consultá-lo através do computador ou da Web TV. Todavia, De Masi
adverte que é preciso avaliar bem suas vantagens e desvantagens para os
trabalhadores, para os empregadores, para os sindicatos e para a sociedade em seu
conjunto.
Para os trabalhadores, segundo De Masi, parece que as vantagens são sobretudo
as seguintes:
“Autonomia dos tempos e dos métodos, coincidência entre o lar e olocal de trabalho, redução dos custos e do cansaço provocado pelosdeslocamentos, melhoria da gestão da vida social e familiar,relações de trabalho mais personalizadas, além da possibilidade deredução das horas de trabalho propriamente dito” (2000:206).
Ainda, segundo o mesmo autor as desvantagens podem ser:
“Isolamento, marginalização do contexto e da dinâmica da empresa(logo o provérbio “o que os olhos não vêem, o coração não sente”,significando menores chances na carreira), o problema dareestruturação dos espaços dentro de casa, dos hábitos pessoais edas relações familiares (do tipo quem leva os filhos para escola?).Mas também sobre este ponto goza-se da vantagem oferecida pelaflexibilidade dos horários e do fato de se passar mais tempo emcasa” (2000:207).
Do ponto de vista das Relações de trabalho, poderão existir dificuldades
para:
“Ações coletivas com os colegas de trabalho até que se descubra aidéia de fazê-las de tipo informático: utilizando os mesmos veículoscom os quais a empresa passa a informação para passar contra-informação”.
E no que se refere a organização sindical, haverá dificuldades até o momento em
que os sindicatos aprendam a usar estas tecnologias e se transformem em teles-
sindicais.
Poderá diminuir ainda:
24
“O poder contratual, pois se o trabalho é substituível, o trabalhopoderá se tornar mais precário. O espaço da concorrência seestende a todo o planeta. E existe, por esse motivo mesmo, o riscoda má distribuição”.
Por outro lado, as empresas poderão aproveitar as vantagens de uma maior
flexibilidade econômica (podendo empregar, com o teletrabalho uma pessoa que
está na mesma cidade, ou outra do outro lado do mundo) e de uma maior
flexibilidade organizacional. Poderão reduzir os custos de locação (em Milão, a IBM
calcula que um único emprego implica um custo de 30 milhões de liras por ano,
contando aluguel e as outras despesas) e os custos com o transporte dos
funcionários, nos casos em que pagavam por ele. Poderão gozar de um incremento
da produtividade e, em certos casos, também da motivação e da criatividade dos
empregados (De Masi, 2000: 207).
Suas desvantagens, segundo o mesmo autor, em potencial derivam do fato de que,
como isso altera a hierarquia empresarial e os quadros oferecem resistência:
querem manter os subalternos sob controle, pois, de fato, com o teletrabalho este
controle é bem mais difícil de ser exercido, seja em termos de relação pessoal, seja
do ponto de vista do processo de trabalho. O controle só pode ser feito com o
produto acabado. Há o perigo de que diminua-se a identidade empresarial, isto é,
que os empregados se sintam mais distanciados e estranhos à empresa. Com efeito,
os chefes de pessoas em empresas que adotaram o teletrabalho organizam festas,
reuniões, mostras cinematográficas para reavivar nas pessoas o “espírito de
empresa”.
Como vimos, o teletrabalho é um modelo de organização de trabalho que apresenta
vantagens e desvantagens do ponto de vista dos atores sociais. Contudo, apresenta
alternativas viáveis para a sociedade, pois o trabalho poderá ser difundido até em
zonas isoladas, deprimidas ou periféricas, possibilitando mais trabalho disponível
para categorias que até o momento eram excluídas, como deficientes físicos ou
idosos. Será possível também descongestionar as áreas superpovoadas e
sobretudo reduzir o tráfego e a poluição, além da manutenção das ruas e estradas.
25
Nosso objetivo com esta discussão foi o de identificar os fatos que demonstram
como as novas tecnologias sugerem novas formas de organização de trabalho,
desenvolvem-se atividades de organização, pesquisa, gerenciamento, design e
outras que têm sido chamadas, segundo Dowbor de atividades “intangíveis”11,
porque não produzem um produto concreto, não trabalham com uma máquina
concreta. Muita gente tem denominado estas atividades como serviços, que é um
termo vago. Mas na realidade, trata-se de uma forma mais intensiva em
conhecimento de desenvolver atividades de transformação produtiva industrial
(2000:6)
Assim, o conhecimento se torna um elemento chave de transformação social e a
própria importância da educação muda qualitativamente, deixando de ser um
complemento e adquirindo uma nova centralidade no processo (Dowbor, 2000). Na
ausência desse e de outras políticas de articulação social, deparamos com o
desemprego, conforme analisaremos mais detalhadamente a seguir.
1.4 Desemprego
A literatura sobre o tema apresenta vasta polêmica sobre os impactos da
modernização em relação ao emprego, não raro sem respostas definitivas.
Entretanto, parece haver consenso de que a questão do emprego não pode ser
reduzida à criação ou destruição de postos nas unidades produtivas, nem
condicionadas aos ditames da tecnologia, uma vez que envolve antes de tudo
políticas e formas de gestão (SINGER, 1998).
Há apenas 25 anos, havia abundância de empregos industriais bem remunerados
em setores como siderurgia, automóveis e borracha. Hoje, constatamos um declínio
em massa de empregos fabris, pois uma grande parte desses empregos nos países
industrializados foram substituídos por equipamento automatizado e , reestruturado
em empregos que exigem habilidades técnicas de nível consideravelmente
complexas.
11 Segundo Dowbor, quando se compra um produto, um sapato por exemplo, muita gente ainda imagina que paga os custosde produção física mais o lucro do produtor. Na realidade, em média os produtos custam menos de 25% do que pagamos. Os75% restantes constituem os “intangíveis”, como pesquisa, criação de imagem positiva através de publicidade, gastos depromoção e outros.
26
Segundo Manuel Castells, ao discutirmos as características do desemprego
industrial, fazendo uma analogia com o que ocorreu com o rural, podemos afirmar
que não haverá empregos suficientes no setor de serviços para substituí-los porque
os próprios empregos desse setor estão sendo rapidamente automatizados e
eliminados, e este movimento se acelerou na década de 90 (1999: 276).
Todavia, segundo esse mesmo autor, a tecnologia da informação em si não causa
desemprego, mesmo que obviamente reduza o tempo de trabalho por unidade de
produção. Mas sob o paradigma informacional, os tipos de trabalho mudam em
quantidade, qualidade e na natureza do trabalho executado. Assim, um novo
sistema produtivo requer uma nova força de trabalho e os indivíduos e grupos
incapazes de adquirir conhecimentos informacionais poderiam ser excluídos ou
rebaixados.
Na visão de Rifkin o desemprego tecnológico é a maior ameaça que a sociedade
contemporânea irá enfrentar nos próximos anos, oferecendo evidências dessa
inquietante perspectiva e da necessidade de um engajamento de todos os setores
sociais na busca de alternativas para a resolução do problema. Para ele, as
evidências históricas negam o pressuposto de que a inovação tecnológica estimula
o crescimento econômico neoclássico. A tendência de automação se mostra
inexorável e atinge os três setores da economia: agrícola, industrial e de serviços. A
mecanização do setor agrícola começou há cem anos e não parou desde então: as
novas tecnologias podem viabilizar uma fazenda totalmente automatizada daqui a
vinte anos. No setor industrial, os modelos de flexibilização pós-fordistas
possibilitaram um avanço ainda maior da substituição da mão-de-obra humana pôr
máquinas, o que torna o operariado um mero personagem da história neste século.
A inevitabilidade do desemprego estrutural coloca a humanidade diante do dilema de
viver em uma era luminosa, na qual a utopia do ócio se tornará possível no paraíso
criado pela tecnologia, ou em uma era sombria pautada pela violência e convulsão
social. Rifkin acredita que o futuro depende exclusivamente de como os ganhos de
produtividade da era da Informação serão distribuídos.
27
Assim, Rifikin adverte que a não distribuição dos ganhos auferidos com a
automação está levando a uma grande concentração de renda. Esta é agravada
pela irresponsabilidade social da classe empresarial, uma vez que esta só age no
sentido de aumentar ainda mais os índices de desemprego e a informalização do
mercado de trabalho, o que gera inevitáveis tensões sociais.
Rifikin se dedica, então, a mostrar como a renda poderia ser redistribuída. Em
primeiro lugar ele aponta a necessidade de uma reestruturação da jornada de
trabalho e dos níveis salariais. A redução da jornada de trabalho poderia causar um
impacto positivo nos índices de emprego, especialmente se fosse generalizada para
todos os setores, evitando que a classe empresarial recusasse a proposta através
do argumento de perda de competitividade. Paralelamente, uma política de
desestímulo ao pagamento de horas extras minimizaria as tentativas de sabotar a
redução da jornada de trabalho. Para assegurar a demanda por produtos e serviços
seria preciso aumentar ou manter os níveis salariais, proposta que naturalmente
sofreria oposições por parte do empresariado, mas que poderia ser solucionada com
uma negociação por um salário menor e a contrapartida de participação nos lucros.
Por outro lado, Rifkin assinala a necessidade de se estabelecer um novo pacto
social, uma vez que nem o Estado e nem o mercado tem se mostrado capazes de
satisfazer as necessidades básicas da humanidade. Nesse pacto, vislumbra-se a
participação do Terceiro Setor, que poderia absorver o tempo ocioso da população
economicamente ativa e a força de trabalho dos desempregados por meio da
prestação voluntária de serviços sociais. Em sua opinião, o Estado poderia apoiar
esse novo pacto com um salário indireto para os empregados que doassem seu
tempo. Isto poderia ocorrer através de um mecanismo de dedução no imposto de
renda por hora de trabalho voluntário ou de um salário social para os
desempregados que se dispusessem a ajudar sua própria comunidade.
Quanto ao uso do tempo ocioso, Guy Aznar, em sua obra “Trabalhar Menos para
Trabalharem Todos” (1995), propõe um projeto alternativo de sociedade, que é
diminuir o tempo de trabalho, para aumentar o tempo de vida e os espaços de
liberdade e autonomia dos indivíduos. Em tese, parte da lógica de que a
automação e as mudanças no mundo do trabalho iriam suprir, nos próximos anos,
28
milhões de empregos nos países industrializados e na Europa Ocidental. Propõe
que se proceda uma revisão profunda da duração do trabalho, das suas
finalidades e da natureza de suas atividades. Assim, a alternativa estaria entre
duas formas de gerir a abolição do trabalho – a sociedade do desemprego ou a
sociedade do tempo liberado.
A sociedade do desemprego é a dualidade12, tem-se de um lado trabalhadores
protegidos, e de outro lado uma massa crescente de desempregados, e, entre
estes dois segmentos, um proletariado de trabalhos precários com tarefas menos
qualificadas. A sociedade do tempo liberado começa a se esboçar como
contraponto à sociedade existente e fundamenta-se no princípio de que, para que
todos trabalhem, é preciso trabalhar menos e ter mais atividades autônomas. O
trabalho socialmente útil seria distribuído entre aqueles que desejassem trabalhar,
deixando de ser a ocupação principal ou exclusiva de cada indivíduo, para dar
lugar a um conjunto de atividades autodeterminadas e executadas em função do
interesse ou do prazer.
Compartilhamos com o autor a idéia de que a única forma de crescimento
sustentável que tem sentido é a que repousa numa redistribuição do trabalho. Isto
é, num modelo de sociedade que não desenvolva de forma indefinida a produção
de mercadorias mas converta em parte os ganhos de produtividade em benefício
qualitativo: o tempo livre, Redistribuir o tempo liberado pelo trabalho para que todos
possam trabalhar cada vez menos, essa vertente é confirmada por Gorz :
“Ter duas vidas, uma pela qual se assume seu lugar na mega-sociedade e se influi nela; a outra pela qual o homem pertence a si-mesmo, a seus próximos, às redes micro-sociais auto organizadastendo em vista uma livre cooperação, tendo em vista trocasrecíprocas e a realização do bem comum. Tudo pelo meio tempo,afirmava Aznar há uns dez anos; “trabalhar a meio- tempo é viver
12 O conceito de sócio-economia dualista é segundo Aznar, o de uma sociedade dividida voluntariamente em dois grandessubconjuntos de atividades e de indivíduos, complementares e diferentes. De um lado, um sub-conjunto adaptado às novastecnologias, integrado ao espaço mundial, feito de homens modernos, aptos a manipular a informática e a tecnologia deponta, assim como as linguas estrangeiras, passando uma parte de sua vida no exterior. De outro, um subconjunto encarnadoa herança de nossas tradições culturais, constituído por organizações isoladas da concorrência internacional fazendo penetrarmais lentamente as tecnologias modernas, de instituições de redistribuição, de homens menos móveis, de uma renda mínima,mas com uma forma de vida mais participativa e mais clássica”.
29
em dobro”, escreve ele hoje em dia. É a possibilidade de todospertencerem a duas esferas de uma “sociedade bipolar”, a dotrabalho macro-social determinado pelas exigências funcionais dosistema e aquela das atividades autodeterminadas, privadas oupúblicas, individuais ou cooperativas, regidas por valores e critériosoutros que não os do dinheiro, ou do mercado. A sociedade bipolar éa alternativa e o antídoto à sociedade dualista” (GORZ, apud Aznar1995).
Sendo assim, para os autores aqui citados, Aznar, Bridges, Castells, Dowbor, M.
Leite, Rifkin e outros, a tecnologia em si não gera e nem elimina empregos, ela, na
verdade, transforma profundamente a natureza do trabalho e a organização da
produção. A reestruturação de empresas e organizações, possibilitada pela
tecnologia da informação e estimulada pela concorrência global, está introduzindo
uma transformação fundamental: a individualização no processo de trabalho. O sinal
mais evidente dessa mudança talvez seja o lema “Não há longo prazo”. No trabalho,
a carreira tradicional, que avança passo a passo pelos corredores de uma ou duas
instituições, está desaparecendo, e também a utilização de um único conjunto de
qualificações no decorrer de uma vida de trabalho.
De outro lado, é de senso comum, no debate sobre o desemprego, que profundas
transformações estão em curso na relação que os sujeitos sociais, e sobretudo os
jovens, mantêm com o trabalho. É possível que estejamos a ponto de sair da
“civilização do trabalho” que, desde o século XVIII, colocou a economia no posto de
comando e a produção na base do desenvolvimento social. Este pensamento
demonstra um apego fora de moda ao passado subestimando as inovações que se
fazem e as alternativas que se buscam para ultrapassar a concepção clássica de
trabalho. Tanto que o reconhecimento da dignidade social de um indivíduo não é
necessariamente o emprego assalariado e nem mesmo o trabalho, mas sua
utilidade social, isto é, sua participação na produção da sociedade. Tal posição é
sustentada, com variantes, por sociólogos como C.Offe ( 1985), G.Aznar (1995) e
Castells (1999) e por economistas como Dowbor, (1998) J. Rifkin (1990) e outros.
Vale ressaltar que há uma congruência de idéias entre estes autores sobre a
relação do mercado de trabalho com a produção. Claus Offe (1989), por exemplo,
já nos alertava quanto a problemática da dupla tarefa que todas as sociedades
enfrentam o desafio de ter que resolver institucionalmente, a capacidade individual
30
de trabalho que segundo a sua ótica deve ser distribuída em processos concretos de
produção, e por outro lado os frutos desse trabalho devem ser distribuídos entre
aqueles que trabalham e os que legitimamente não trabalham (através de
orçamentos privados e públicos). Os sistemas capitalistas de economia de mercado
devem solucionar esse duplo problema (1989, 87). No entanto, segundo os
sistemas capitalistas de economia de mercado, “solucionaram” esse duplo problema
erigindo um mercado para a “mercadoria” da força de trabalho e essa solução
implica na monetarização da capacidade de trabalho (trabalho assalariado). Sendo
assim, a força de trabalho distingue-se das mercadorias usuais por causa de sua
marcante variabilidade e determinabilidade. O que o empregador de força de
trabalho compra no mercado não é propriamente “trabalho”, mas sim uma
capacidade de trabalho, então o grande desafio é como transformar a capacidade de
trabalho em trabalho real.
1.5. Tempo Livre
Dedicamos o final desse capítulo para refletir sobre as propostas revolucionárias de
Domenico de Masi (2000), que expressa uma profunda insatisfação com o modelo
social elaborado pelo Ocidente, sobretudo pelos Estados Unidos, centrado na
idolatria do trabalho, do mercado e da competitividade. Ele propõe um novo modelo
baseado na simultaneidade entre trabalho, estudo e lazer, no qual os indivíduos são
educados a privilegiar a satisfação de necessidades radicais, como a introspecção, a
amizade, o amor, as atividades lúdicas e a convivência.
Segundo De Masi, “o ócio” pode transformar-se em violência, neurose, vício e
preguiça, mas pode também elevar-se para a arte, a criatividade e a liberdade. É no
tempo livre que passamos a maior parte de nossos dias e é nele que devemos
concentrar nossas potencialidades.
Assim para de De Masi:
“ Homem que trabalha perde tempo precioso” .
31
E ainda :
“O futuro pertence a quem souber libertar-se da idéia tradicional dotrabalho como obrigação e for capaz de apostar numa mistura deatividades, onde o trabalho se confundirá com o tempo livre e oestudo. Enfim, o futuro é de quem exercitará o “ócio criativo”.
As transformações no trabalho indicam que agora é possível produzir sempre mais
bens e serviços com sempre menos trabalho humano. Portanto, segundo De Masi, o
trabalho deverá descer do trono onde tinha sido posto pelos patrões, pelos filósofos
e pela igreja. Se há cem anos a idolatria do trabalho era indispensável para liberar-
nos da miséria, hoje, na maioria dos casos, é apenas uma inútil escravidão
psicológica(2000: 298).
Uma vez delegadas às máquinas as tarefas executivas, para a maioria das pessoas
sobra só o desempenho de atividades de tipo intelectual, flexível, criativo,
empreendedor: atividades que, pela sua própria natureza, desembocam no estudo e
no jogo. O publicitário que deve criar um slogan, o jornalista em busca de uma “dica”
para um artigo, o juiz às voltas com a pista de um crime, todos têm maior chance de
encontrar a solução justa, passeando ou nadando, ou indo ao cinema, do que se
ficarem trancafiados dentro das corriqueiras, tediosas e cinzentas paredes dos seus
respectivos escritórios.
Entretanto, De Masi reconhece a dificuldade de aceitação de sua proposta e
esclarece que esta dificuldade se dá, infelizmente, porque todas as instituições que
cuidaram das pessoas — a família, a escola e as instituições religiosas –
prepararam, de uma forma obsessiva, para trabalhar, negligenciando a educação
para o lazer, identificado só somente como consumo exibicionista, caro e perigoso.
Portanto para De Masi, tempo livre significa:
“viagem, cultura, erotismo, estética, repouso, esporte, ginástica,meditação e reflexão. Significa, antes de tudo, nos exercitarmos paradescobrir, desde hoje, o que podemos fazer no nosso tempodisponível, sem gastar um tostão: passear sozinhos ou com amigos,
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ir á praia, fazer amor com a pessoa amada, adivinhar ospensamentos, os problemas e as paixões que estão por trás dospassageiros do metrô, admirar as fachadas dos prédios e as vitrinesdas lojas, assistir a um festival de televisão, ler um livro, levantaruma polêmica com um motorista de táxi, assistir ao pôr do sol ou aonascer da lua, admirar a sábia beleza de uma garrafa, de um ovo oudos carros que circulam pelas ruas. Balançar-se numa rede, que foisímbolo por excelência do ócio criativo, perfeita antítese da cadeiade montagem que o símbolo do trabalho alienado. Em suma darsentido às coisas de todo dia, em geral lindas, sempre iguais,diversas e que infelizmente ficam depreciadas pelo uso cotidiano(2000: 300).
Sendo assim, para efeito desse estudo julgamos as idéias de Masi importante para
a reflexão científica no que se refere ao conhecimento, pois conforme vimos, tudo
indica que não estamos enfrentando apenas uma revolução tecnológica. Na
realidade, conforme Dowbor, o conjunto de transformações parece estar levando a
uma sinergia da comunicação, informação e formação, criando uma realidade nova,
que está sendo designada como “sociedade do conhecimento13. De certo modo, o
processo reflete os primeiros passos do homo culturalis, em contraposição ao homo
economicus dos séculos XIX e XX.
Neste processo de transição, os desafios à educação estão lançados, na medida em
que é valorizado o conhecimento. Vejamos nas palavras de Dowbor:
“O universo cultural dos indivíduos ou de uma comunidade nãopossui uma gaveta estanque para “educação“ – os processoseducativos devem articular-se com os diversos espaços deconhecimento existentes, envolvendo a televisão, a formaçãoempresarial, as dinâmicas religiosas e assim por diante. A tarefa daeducação se complementa assim com a articulação de atoressociais, promoção de eventos que aproximam as pessoas”. (2000:29).
Isso significa que a educação para o trabalho não deve voltar-se unicamente para o
processo de reestruturação produtiva, especialmente para não operar uma relação
entre educação e emprego, educar para o ócio significa ensinar a escolher um filme,
13 Segundo Ladislau Dowbor, A Sociedade do Conhecimento é um conceito que já nos habituamos a utilizar paradefinir o conjunto de transformações que estão afetando o planeta, na empresa, na universidade, nas relaçõessociais. De certa maneira, passamos da antiga sociedade agrária, onde o eixo norteador era a agricultura, parauma sociedade industrial onde o eixo passou a ser a fábrica, e agora estamos evoluindo para uma sociedade ondea informação e o conhecimento se tornaram os elementos estruturadores mais significativos.
33
uma peça de teatro, um livro. Ensinar como se pode estar bem sozinho, consigo
mesmo significa também habituar às atividades domésticas e à produção autônoma
de muitas coisas que até o momento comprávamos prontas. Ensinar o prazer do
convívio, da introspecção, do jogo e da beleza. Para De Masi, a pedagogia do ócio
também tem sua própria ética, sua estética, sua dinâmica e suas técnicas, e tudo
isso deve ser ensinado. Educar significa enriquecer as coisas de significado.
Convém considerar que as transformações no trabalho aqui indicadas partem de um
mapeamento teórico a partir de macro visões. Há algumas tendências audaciosas,
como por exemplo nos fala De Masi, sobre o tempo livre. São idéias revolucionárias
e podemos até dizer que é contraditória frente à realidade atual, uma vez que nós
Brasileiros estamos trabalhando cada vez mais e tendo menos tempo livre, assim
como em outros países como EUA e Japão. Cabe ressaltar que os japoneses
trabalham cinco semanas inteiras por ano a mais que os americanos, ou seja
competimos com pessoas que trabalham muito. Tanto é verdade que trabalhar
demais no Japão é um fenômeno social e econômico14.
O nosso objetivo nesse capítulo, foi o de expor um conjunto de idéias sobre as
transformações no mundo do trabalho, os impactos causados pelas novas
tecnologias, de forma a demonstrar os argumentos teóricos que justificam a
necessidade de um novo modelo de formação profissional. Há que se considerar
como esclarece M. Leite, como o fordismo não assumiu as mesmas características
em todos países, é possível pensar que o novo modo de acumulação e organização
do trabalho venha a apresentar características também distintas, tendo em vista que
são diferenciadas as formas de inserção das distintas economias nacionais no
processo de globalização. Isso significa que, longe de representar um processo
homogêneo, a globalização pode ter repercussões muito distintas nos diferentes
países. A maneira e as condições através da qual cada economia nacional se
relaciona com o mercado globalizado, é de fato, bastante, diferenciada, variando de
acordo com a sua capacidade produtiva, suas condições políticas, sua cultura, sua
14 No Japão ocorre um fenômeno chamado “Karoshi” morte por excesso de trabalho segundo documentário transmitido pelaTV SENAC em dezembro/2000, mais de dez mil pessoas morrem por ano desse fenômeno. Tanto que há uma campanhafeita pelo sindicato japonês para diminuição do trabalho.
34
história e a capacidade de organização de seus distintos segmentos sociais
(M.Leite,2000:34).
Assim, vislumbramos essas macro visões, desde a possibilidade de trabalhar
menos para trabalharem todos, articulação e parcerias com a sociedades e até
mesmo a audaciosa proposta de trabalhar a pedagogia do ócio. No entanto
consideramos importante relativisar estes conceitos considerando as diferenças
culturais, sociais e econômicas de cada sociedade.
Portanto, qualquer discussão acerca das perspectivas apontadas para o futuro da
qualificação profissional, passa necessariamente por uma reflexão sobre as
transformações que caracterizam o atual mundo do trabalho. Acreditamos que uma
análise mais pormenorizada desses processos de transformações nos mostram que
há sérios desafios a serem enfrentados pelos atores sociais envolvidos, em maior ou
menor grau todos os segmentos terão dificuldades em se adaptar.
36
Capítulo 2
Capítulo 2 Estratégias Empresariais de Organização de Aprendizagem
Esse capítulo tem como objetivo analisar como as empresas reagem às
transformações no mundo do trabalho, discutindo, portanto, as tendências
organizacionais e a gestão da aprendizagem e do conhecimento, alinhadas à
estratégia de administração de recursos humanos.
2.1. Tendências Organizacionais
No modelo de organização fundamentada sob a égide do taylorismo-fordismo está
presente a idéia de que as organizações podem ser administradas como máquinas.
Para tanto, é preciso existir uma sincronia, uma máxima eficiência. O trabalhador é
controlado para obter produtividade. Da mesma forma a organização do trabalho
baseada em métodos mecanicistas, tende a atrelar o homem às máquinas. Os seres
humanos devem se adequar as necessidades de uma organização mecanicista e
compreendem em sua qualificação profissional conhecer partes de um processo e
não conhecê-lo como um todo. Separa-se planejamento e organização na execução
do trabalho, constituindo assim os trabalhadores que pensam sobre o trabalho e
outros que o executam.
Segundo Morgan, há um conjunto de problemas relacionados com as organizações
estruturadas de forma mecanicista, pois esse enfoque de organização tende a
limitar, em lugar de ativar o desenvolvimento das capacidades humanas, modelando
os seres humanos para servirem aos requisitos dessa organização mecanicista em
lugar de construir a organização em torno dos seus pontos fortes e potenciais.
Ambos, empregados e organizações, sofrem perdas neste enfoque de organização.
Os empregados perdem oportunidades de crescimento pessoal, dedicando-se
muitas horas por dia a um trabalho que nem valorizam e nem apreciam, enquanto
37
as organizações perdem contribuições criativas e inteligentes que a maioria dos
empregados é capaz de fazer, dadas as corretas oportunidades (Morgan:1996:41).
Por outro lado, Morin, aponta para o crescimento da reflexividade social e nos fala
da ascensão do “homem psicológico” nas organizações, em contraponto ao “homem
máquina” da época taylorista e ao “homem biológico” das últimas décadas, nas quais
houve uma grande preocupação com as condições físicas do trabalho e sua
interferência na saúde do trabalhador. Atualmente, o funcionário já demonstra
claramente sua frustração frente a tarefas repetitivas, automáticas e parceladas,
compelindo as empresas a reestruturar e enriquecer as funções de seus
colaboradores, se quiserem mantê-los motivados (in Biral: 2000).
Morgan (1996) nos fala que as organizações estruturadas de forma mecanicista têm
maiores dificuldades de adaptação a situações de mudança porque assim como as
máquinas, são planejadas para atingir objetivos predeterminados, não são
planejadas para a inovação. Isso segundo Morgan, não deveria causar surpresa,
uma vez que as máquinas têm comumente um propósito único, assim como os
mecanismos planejados para transformar insumos específicos em produtos também
específicos, só podendo engajar-se em atividades diferentes, caso sejam
explicitamente modificadas ou replanejadas para tanto.
Contudo, esse mesmo autor nos diz que quando novos problemas surgem, estes
são frequentemente ignorados porque não existem respostas já prontas e
fabricadas, ou porque são focalizados a partir de uma forma fragmentada e não
holística. Todavia, procedimentos padronizados e canais de comunicação são
incapazes de lidar eficazmente com novas circunstâncias, necessitando de
numerosas reuniões e comitês nomeados para este fim e que, devido ao fato de
terem sido planejados mais para servir do que para romper com a maneira
costumeira de operação, são muito vagarosos e chegam muito tarde em seu
destino. Problemas de imobilismo e de falta de cooperação tornam-se, desta forma,
frequentes. Em tais circunstâncias, a organização fica muitas vezes obstruída por
acúmulos de trabalho, porque a rotina normal foi interrompida e assuntos complexos
fluem para cima na hierarquia organizacional, à medida que os membros dos
demais níveis descobrem que são incapazes de resolvê-los.
38
Este modelo de organização tem se mostrado popular, em parte devido à sua
eficiência no desempenho de certas tarefas, mas também devido à habilidade que
tem de reforçar e sustentar padrões particulares de poder e controle. Há pouca
sombra de dúvida de que o crescente índice de fluxo de socialização e mudança
acarreta muitos problemas para organizações que se baseiam em planejamento
mecanicista. Ao ser introduzido nas organizações uma base tecnologicamente nova,
facilitada pela microeletrônica, novos princípios organizacionais deverão assumir
importância crescente.
Márcio Pochmann adverte que o novo desenho empresarial se daria a partir do
pressuposto da empresa enxuta e competitiva, com ampla integração nas fábricas,
maior flexibilidade produtiva e inovadores processos produtivos (just in time, sistema
de informação, células de produção e minifábricas). A adoção de novas estratégias
de competitividade e de produtividade, representadas pela nova conduta
empresarial, seria um dos principais fatores explicativos das mudanças na
organização do trabalho. Portanto, segundo esse autor caberia à empresa moderna:
“Focalizar a produção, terceirizar atividades ligadas aos serviços deapoio (alimentação, segurança, transporte, etc) e a produção(componentes). Dessa maneira, a empresa moderna poderia estarem condições mais adequadas para conviver num cenário de forteconcorrência e crescente instabilidade econômica” (Pochmann, 1999pg.29).
Nesse cenário, Morin (1994) enfatiza o papel fundamental do processo educativo na
sociedade, alertando, porém, para o fato de que o modelo atual de aprendizado,
baseado na fragmentação do conhecimento, é ineficaz frente aos desafios de um
mundo cada vez mais complexo. Para o autor, educar em um mundo complexo
exige que o pensamento simples, “que acredita alcançar o verdadeiro, que pensa
que o conhecimento é reflexo, que não considera conhecer a si mesmo para
conhecer o objeto” seja substituído pelo pensamento complexo, “que necessita a
curva auto-observável e autocrítica do observador conceituador sobre si mesmo”
(p.281).
39
Todas essas considerações nos conduzem a pensar que o panorama é
extremamente complexo e heterogêneo quando se leva em consideração as
diferenças relacionadas com o gênero, a qualificação e a divisão internacional do
trabalho: as teses de alcance universal, tais como as dos novos paradigmas ou dos
novos conceitos de produção, são forçosamente questionadas à luz de pesquisas
empíricas introduzindo tais diferenciações.
Cabe ressaltar, no entanto, que essas mudanças assinalam a importância da
compreensão e da integração das diferentes lógicas de pensamento para o alcance
de uma visão mais completa e elevada dos problemas que afetam a organização.
Isso demonstra que as organizações necessitam de seres pensantes, que agreguem
valor ao seu ramo de negócio. O empregado, nesse contexto é um solucionador
de problemas que ajuda a planejar as atividades antes de executá-las. As equipes
trabalham juntas para melhorar continuamente sua performance, alcançando níveis
mais altos de produtividade. E as organizações deveriam ser estruturadas de forma
que as pessoas sentissem que são capazes de alcançar os resultados pretendidos,
que podem fazer o que precisa ser feito e que serão recompensadas por isso.
2.2 Organização Qualificante
Em Philiip Zarifian (1992), encontramos o conceito de Organização Qualificante.
Esse conceito refere-se à dinâmica da organização sob o ponto de vista de sua
capacidade de desenvolver as competências dos assalariados, competências estas
fundamentais para que se possa assumir e conduzir a evolução da organização
flexível.
Portanto, para Zarifian uma organização qualificante é aquela que atende quatro
princípios:
Primeiro princípio:
“A organização qualificante é uma organização em que as suas atividades são
tratadas como sequência de eventos”, ou seja”
40
“O evento é o indício lógico-temporal de uma situação que oindivíduo deverá analisar e dominar por si mesmo. O evento só fazratificar o caráter eminentemente variável de toda situação industrialreal (a pane, a falha de qualidade): ele significa que a resolução dosproblemas que originaram o evento obrigou a uma tomada deconsciência e à realização de uma escolha por parte dosassalariados que tiveram que “conduzir” este evento a um finalsatisfatório”.
Nessa lógica, o evento é o acontecimento em si, como fato (particularmente
importante dentro de uma produção flexível) e a maneira como seu tratamento é
organizado. A exemplo de uma pane15, que passa a ser um momento privilegiado
ao qual uma comunidade de indivíduos terá podido dar um sentido positivo e que
terá permitido, ao mesmo tempo, a evolução de conhecimentos técnicos e trocas
sociais entre categorias diferentes de assalariados.
Segundo Princípio:
“A organização qualificante pressupõe uma reorganização de suas atividades sobre
uma base comunicacional”, assim:
“O avanço da atividade comunicacional16 pressupõe que umalinguagem comum seja elaborada e transformada, voltando comoelemento de referência compreendido por todos. No exemplo dapane, a comunicação se cria quando termos idênticos e precisos sãoaceitos por formularem os diagnósticos e designarem osconstituintes diferentes do sistema técnico, o que, mais uma vez nãotem nada de natural”.
Desse modo, não basta a reunião de um conjunto de pessoas detentoras de
conhecimentos, habilidades ou competências distintas. Não basta, no projeto de um 15 O autor define a “pane” de duas formas:1) a negativa que é a interrupção do andamento rápido das operações das máquinas, é percebida como fatopuramente aleatório, que deve ser eliminado o mais rápido possível, seu caráter positivo de evento é sufocado;2) positiva, como ocasião de aprendizado do sistema técnico pelos operários diretamente envolvidos, e comoocasião de trocas com os especialistas em manutenção, transformando-se assim num evento. 16 Vale ressaltar que segundo Zarifian, a comunicação não se limita a transferências de informação. Para havercomunicação, e portanto compreensão recíproca, é preciso que se construa um acordo simultâneo quanto ànatureza dos conhecimentos requisitados e quanto à validade dos objetivos que se procuram juntos alcançar.
41
grupo de trabalho, apenas escolher seus integrantes com vistas a formar um leque
de repertórios que estariam à disposição do grupo. É preciso que cada pessoa
envolvida reconheça nos outros a posse de um saber fazer importante e
necessário para a atuação naquela determinada situação, saber fazer este que ela
mesma não domina. Para Zarifian o reconhecimento da competência de uma
pessoa não passa apenas pelo cabedal de conhecimento técnico, mas também pela
forma como esse conhecimento se engaja no curso dos eventos, mobilizando-se
para atuar (tomando iniciativas) e assumindo a responsabilidade pela ação.
Contudo, a legitimação do saber e da competência do outro diz respeito à dimensão
cognitiva da comunicação, ou seja, o reconhecimento e validação das competências
necessárias para o tratamento de uma determinada situação, particularmente os
imprevistos, variabilidades, etc.
Terceiro Princípio
“A organização qualificante é aquela que permite a seus membros reelaborar os
objetivos de sua atividade profissional”.
Esse princípio envolve diretamente o sistema de tomada de decisões da empresa.
Assim, a organização só se torna verdadeiramente qualificante a partir do momento
em que é necessário fazer escolhas, elaborar propostas e tomar um partido para
guiar a atividade profissional. Este princípio diz respeito à explicitação estratégica, o
que significa que os atos da gestão se interpenetram com os atos de produção, isso,
por sua vez, pressupõe um reposicionamento do papel da hierarquia e reconhecer
nos assalariados de base uma capacidade de engajamento estratégico que lhes era
negada pela organizacional tradicional. É pensar que é através dela que a
aprendizagem se desenvolve de maneira mais viva.
Quarto Princípio
“A organização qualificante é aquela que permite a cada indivíduo se projetar no
futuro envolvendo-se nos projetos, sejam eles pequenos ou grandes”.
42
Esse princípio está relacionado com as condições, oferecidas pelas organizações,
de engajamento de seus funcionários no que se refere aos planos organizacionais e
projetos de mudanças. Trata-se de criar espaços oportunos para que os trajetos
profissionais se diferenciem e se bifurquem, de acordo com a maneira pela qual as
aspirações individuais encontram terreno para concretização dentro de um ou outro
setor da empresa. Portanto, é uma condição básica para a inscrição em um
processo de aprendizagem e de formação que sempre requer envolvimento pessoal.
Acreditamos que os princípios de organização qualificante indicados por Zarifian,
permitem repensar sobre as estruturas organizações e os espaços de
aprendizagem, de modo que as organizações propiciem um ambiente de trabalho
onde seja possível que as pessoas articulem experiências para alcançar objetivos
comuns e se sintam recompensadas por aprender e desenvolver talentos. Muito
embora seja preciso levar em conta a divisão sexual e internacional do trabalho,
pois elas questionam fortemente esses modelos de organização, que partem, da
figura do homem, ou seja os novos paradigmas da especialização ou do novo
conceito de produção que são fundados sobre a figura arquetípica do operário
masculino17, essa análise segmentada nos permite verificar que as práticas e os
métodos tayloristas e a produção em grande série, muitas vezes sem grande
preocupação com qualidade e uso de conhecimento, vai coexistir com algumas
“ilhas” de modernidade e de sofisticação tecnológica e organizacional.
É interessante notar que os estudos sobre a divisão sexual dos processos de
formação para inovações tecnológicas mostram até que ponto esta generalização, a
partir de uma população masculina, pode induzir ao erro. As ações de requalificação
não têm a mesma extensão, nem o mesmo alcance, nem a mesma significação,
para as mulheres e para os homens. Entretanto, esse embate presente na sociologia
do trabalho e da educação não aparece nas teorias de administração, nem tão
pouco é ressaltado a importância de um estudo mais apurado. É comum
encontrarmos generalizações e conclusões universais a respeito do uso do
conhecimento nas organizações. Sendo assim é preciso considerar que um estudo
17 Para maiores detalhes sobre a divisão sexual e internacional do trabalho H.Hirata – In Novas Tecnologias,Trabalho e Educação. Organizadores Celso João Ferreti .et,al. Vozes, Petrópolis, 1994
43
mais apurado sobre essa temática mudaria o foco principal de nosso trabalho.
Manteremos então o foco sobre a gestão do conhecimento e organização de
aprendizagem de forma à alinhar com as novas propostas de formação profissional.
2.3. Gestão do Conhecimento
O começo da década de 1990 marca o surgimento da era da informação, graças ao
impacto provocado pelo desenvolvimento tecnológico e pela tecnologia da
informação. Na era da informação, o capital financeiro cede o trono para o capital
intelectual18. A nova riqueza passa a ser o conhecimento, o recurso mais valioso e
importante (Chiavenato, 2000: 655). O capital financeiro tem sua importância
relativa, mas ele depende totalmente do conhecimento sobre como aplicá-lo e
rentabilizá-lo adequadamente. O conhecimento é a informação estruturada que tem
valor para uma organização.
Contudo, o conhecimento é um recurso diferente. Ele não ocupa espaço físico. Eleé um ativo intangível. Nas palavras de Luckesi (in Munno:2000):
“O conhecimento é antes de tudo uma forma teórica-prática decompreensão do mundo. Isso nos permite avaliar a nossa práticaescolar que, com raras exceções, está muito mais preocupada coma repetição de conhecimentos já envelhecidos do que em orientar eestimular a criatividade construtiva dos educandos (in Munno:2000)".
Portanto, o conhecimento é criado e modificado pelas pessoas e é obtido através da
interação social, estudo, trabalho e lazer. Assim as organizações bem sucedidas são
aquelas que sabem conquistar e motivar as pessoas para que elas aprendam e
apliquem seus conhecimentos na solução de problemas e na busca da inovação
rumo à excelência. A organização baseada no conhecimento depende, portanto, da
gestão do conhecimento. Assim, a empresa criadora de conhecimento tem a ver
tanto com ideais quanto com idéias, e esse fato alimenta a inovação. A essência da
inovação é recriar o mundo segundo uma visão ou um ideal específico. Criar novos
18 Antes da década de 1990, as empresas ganhavam investindo no financeiro, através de várias formas deaplicações. O que após esse período tornou-se inviável, as empresas devem procurar obter ganhos a partir daeficiência operacional, que é possível a partir das valorização do conhecimento , daí a expressão difundida como“o financeiro cede o trono”.
44
conhecimentos significa literalmente recriar a empresa e todos os que se encontram
dentro dela num processo ininterrupto de auto-renovação pessoal e organizacional.
Por esta razão, o investimento maior está sendo feito, não em máquinas e
ferramentas, mas no conhecimento das pessoas. Muitas organizações estão
desenvolvendo esquemas de educação corporativa e de universidades corporativas
e virtuais para melhorar a gestão do seu capital intelectual.
2.3.1. Educação Corporativa
Segundo Munno, a educação corporativa é uma ampliação do conceito de
treinamento e desenvolvimento de recursos humanos. Extrapola o âmbito da própria
organização, estendendo-se para a sua cadeia de valor: clientes, fornecedores, e
instituições de ensino tradicionais, estas também fornecedoras de talentos para as
empresas.
A Educação Corporativa, segundo Chiavenato em seu livro Gestão de Pessoas está
sendo estimulada por um ambiente inquieto, curioso e revolucionário, provocado por
fatores externos, como a globalização, o desenvolvimento tecnológico, a
competitividade, as mudanças rápidas e descontínuas, e outros fatores que causam
impacto na administração das organizações. Portanto, a responsabilidade da
organização no gerenciamento do conhecimento não significa um paradoxo em
relação à iniciativa das pessoas para o seu autodesenvolvimento. As pessoas estão
preocupadas com o futuro e ele está na educação. Trata-se de incentivar a
aprendizagem contínua para desenvolver atitudes, competências e uma visão do
negócio. O gerenciamento do conhecimento procurar alinhar a educação das
pessoas com os objetivos estratégicos do negócio ( 2000: 310).
Demajorovic19 afirma que a reformulação dos programas educacionais nas
organizações, depois de décadas de ênfase no treinamento, não é uma tarefa
simples, e cita a visão de diversos autores:
19 DEMAJOROVIC, Jacques. Sociedade de Risco e Responsabilidade Socioambiental: Perspectiva para aEducação Corporativa. Tese apresentada à Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo para obtençãodo Título de Doutor em Educação. USP-SP- 2000.
45
Para Senge, um dos principais problemas está justamente no fato de que muitas
organizações continuam a pensar a educação a partir de uma perspectiva em que o
processo de aprendizado se restringe aos programas de treinamento:
“O aprendizado pode envolver algum treinamento, mas vai além.Poucos de nós aprendem as coisas que são realmente importantespara a nossa vida em programas de treinamento. O aprendizadoocorre no dia-a-dia, ao longo do tempo. O aprendizado sempreacontece quando as pessoas estão às voltas com questõesessenciais ou se vêem diante de desafios. Nesse sentido, oaprendizado não tem muito a ver com treinamento. Programas detreinamento podem ser úteis, por exemplo, para apresentação de umassunto novo” (Senge, in Demajorovic, 2000).
Já Morse identifica os objetivos de curto prazo das organizações como um dos
obstáculos ao desenvolvimento de programas de educação mais amplos:
“Educação Corporativa continua sendo um instrumento tático e nãoestratégico para as organizações lidarem com necessidadesimediatas. Educação e treinamento de curto prazo exigidos para umdeterminado tipo de produto, processo ou tecnologia são sempreprioritários em relação aos objetivos educacionais de longo prazo,sendo que a justificativa dada para esta escolha é sempre tempo edinheiro (...) impedindo uma compreensão mais abrangente daeducação e treinamento”.
Por sua vez, Kolb diz que a forma como a cultura organizacional entende o
aprendizado é outra importante barreira para reformular os atuais programas
educacionais corporativos:
“A manutenção do sucesso num mundo em constante mudançaexige a capacidade de explorar novas oportunidades e aprendercom sucessos e fracassos passados. Tais idéias não são novas nemtão pouco particularmente polêmicas. No entanto, é surpreendenteque o fato de que esta capacidade de aprender, tão amplamenteconsiderada importante, receba tão pouca atenção explícita porparte dos gerentes e de suas organizações. Existe uma espécie defatalismo com relação à aprendizagem. Ou a pessoa aprende ounão aprende. A capacidade de gerir e controlar o processo deaprendizagem de forma consciente em geral se limita às velhasmáximas ditas colegiais.” Estude bastante e faça sua lição de casa(Kolb: 1997, in Demajorovic)".
46
Segundo esta visão, a razão do fatalismo se encontra na falta de entendimento real
do processo de aprendizagem. É essencial o desenvolvimento de modelos que
expliquem a forma como os indivíduos e as organizações aprendem, o que
possibilitaria elevar a própria capacidade dos administradores de aprender e
multiplicar este conhecimento nas organizações.
Acreditamos que é preciso repensar os desenhos e as estruturas organizações, de
modo a transformá-las em espaços de aprendizagem. Isso significa que o ambiente
de trabalho deve propiciar constantes desafios, de maneira que seja possível as
pessoas articularem suas experiências e mobilizem energias e ações para alcançar
objetivos comuns. Sobretudo por que as pessoas se sentirão recompensadas
aprendendo e desenvolvendo suas habilidades e talentos. Quando as pessoas se
sentem recompensadas por seu trabalho tendem a se tornar excelentes e
comprometidas com os objetivos da organização, e este é um fator que contribui à
longo prazo para o desenvolvimento e o sucesso das organizações.
2.3.2. Organização de Aprendizagem
Entre os estudos que têm sido feitos no campo da educação corporativa, destaca-se
o modelo de “organizações que aprendem” (Learning Organization20) que, a partir de
década de 70, despertou o interesse de diversos teóricos e profissionais.
Demajorovic nos lembra que embora os estudos nesse campo venham sendo
desenvolvidos desde a década de 70, apenas a partir da década de 90 o
aprendizado organizacional passa a ser valorizado em diversas empresas,
estimulado em grande parte pelo fracasso dos programas de reengenharia e
downsizing implantados em diversas organizações.
Segundo Munno, Organização de Aprendizagem é uma nova forma de administrar.
Esta administração é ancorada em cinco disciplinas integradas pelo “pensamento
20 Organização de Aprendizagem ou “Learning Organization” é um conceito extraído do livro de Peter M.Senge, The FifhtDiscipline – A Quinta Disciplina, desenvolvido no Brasil por Humberto Mariotti, em seu livro Organizações deAprendizagem e por uma entidade internacional que se dedica ao estudo e a difusão das Learning Organizations.( Munno,2000).
47
sistêmico” – a compreensão dos perigos que ameaçam a sobrevivência da
organização e a reconhecer novas oportunidades. De acordo com esse conceito,
uma empresa não apenas evolui, mas aperfeiçoa-se constantemente. Esse é o
caminho que pode levar as empresas – e as pessoas com elas – ao perfeito
equilíbrio entre o corpo interno e as metas organizacionais (consideradas as
condições do ambiente externo).
Vale ressaltar que partindo da constatação de que todas as organizações são um
conjunto de indivíduos e que os indivíduos têm capacidade de aprender de forma
semelhante, poder-se-ia afirmar que toda organização aprende quando um ou
alguns de seus integrantes aprendem algo novo. No entanto, esta simplificação não
resiste a uma análise mais apurada da realidade organizacional. O aprendizado
individual se distingue do organizacional, como esclarece Demajorovic:
“ Para que os indivíduos de uma coletividade tomem decisões que setraduzam em uma ação organizacional, certas condições têm de serrespeitadas:• Acordo sobre os procedimentos para o processo de tomada de
decisão em nome da coletividade;• Delegação da autoridade para os indivíduos em nome da
coletividade;• Estabelecimento de fronteiras entre a coletividade e o resto do
mundo.Quando estas características estão presentes na ação de umacoletividade, ainda que os indivíduos sejam responsáveis peladecisão e ação, eles o fazem em nome da coletividade, assumindo opapel de agentes do processo. Se essa forma de atuação é validapara todos os indivíduos que tem autoridade para agir em nome dacoletividade, pode-se afirmar que o grupo tornou-se uma polis e,portanto, se encontra organizado. Ainda assim, para que a açãoorganizacional consiga se perpetuar, é necessário que a coletividadeapresente outras características como as descritas por Max Weberem sua análise da burocracia: clara distinção entre os indivíduos e opapel que ocupam, padronização das tarefas, hierarquia eimpessoalidade do administrador” (Id.ibidem:53:2000).
Assim, o aprendizado individual não implica necessariamente em um aprendizado
organizacional, ainda que este só possa se concretizar a partir das ações individuais.
O aprendizado organizacional só pode se concretizar se duas condições básicas
forem respeitadas. Primeiro, os membros devem atuar em nome da coletividade.
Segundo, sua ação deve resultar de uma interação social, transformando-a em ação
organizacional.
48
O primeiro passo da aprendizagem, válido para o aprendizado individual e
organizacional, é o processo de questionamento, entendido como um processo
social, individual ou coletivo, realizado pelos membros da comunidade que
questionam premissas consideradas verdades absolutas. Entretanto, o
questionamento só se torna organizacional quando há uma relação entre o
questionamento individual e o questionamento organizacional, ou seja, o
questionamento individual ajuda a moldar o questionamento organizacional que, por
sua vez, alimenta e molda o questionamento individual. Nesse caso, os indivíduos
questionam em nome da organização, sendo seu comportamento determinado,
formal ou informalmente, por seus papéis dentro da organização e pelas regras
desta (Demajorovic:2000).
Por isso, esse mesmo autor adverte que o estudo do aprendizado organizacional
não trata de entidades estáticas, denominadas “organizações”, mas sim de um
processo ativo de organização, no qual as imagens individuais da teoria em uso vão
se ajustando para produzir sua teoria em uso organizacional. A construção dessa
imagem coletiva é feita a partir do conhecimento de cada indivíduo e de outras
ferramentas organizacionais como mapas, memórias e programas organizacionais.
Assim, Neri ressalta que para que ocorra o aprendizado, é preciso haver um
alinhamento entre as estratégias da organização e a administração de recursos
humanos por competências, já que as competências essenciais para a estratégia da
empresa são as premissas para o estabelecimento dos quadros de competências
funcionais. Além do alinhamento externo aos recursos humanos, as atividades
devem ter um alinhamento interno, ou seja, devem fazer parte de um sistema que se
retroalimente e que continuamente procure o resultado empresarial, o que podemos
visualizar na figura a seguir :
50
Figura 2.1. A APRENDIZAGEM POR COMPETÊNCIAS
Fonte: Aguinaldo A . Neri
Como pudemos vislumbrar nesse fluxo, um sistema de aprendizagem das
competências tem na ação gerencial seu fator crítico de sucesso. São os gerentes e
os executivos que poderão treinar e desenvolver as pessoas da organização, desde
que a área de recursos humanos construa instrumentos que facilitem essa atividade
e capacite esses profissionais para tal (Neri:55:1999).
2.3.3. Do treinamento à educação
Nas organizações, o conceito de educação é usado como sinônimo de
desenvolvimento de recursos humanos, com objetivos a longo prazo e visando o
crescimento das pessoas nas respectivas carreiras e de aquisição de novos
conhecimentos e novas habilidades. Segundo Munno a palavra “educação” significa
a capacidade do indivíduo em assimilar, usar e gerar informações. Já o conceito de
treinamento apresentaria significado diferente. Antigamente, alguns especialistas
em Recursos Humanos consideravam o treinamento um meio para adequar cada
pessoa ao seu cargo e desenvolver a força de trabalho da organização a partir dos
cargos ocupados (Chiavenato:294:1999).
TREINAMENTO"ON THE JOB"
APRENDIZAGEMDIRIGIDA
CAPACITAÇÃOGERENCIAL
CAPACITAÇÃO PESSOAL(AUTODESENVOLVIMENTO)
CAPACITAÇÃOTÉCNICA
AÇÃO GERENCIAL(MONITORAMENTO,
ORIENTAÇÃO, COACHING)
EXPERIÊNCIASEMPÍRICAS
REUNIÕES DETRABALHO
RESULTADOSEFETIVOS
- NA PRÓPRIA ATIVIDADE- NA ATIVIDADE DOS OUTROS
- VIVÊNCIAS
RESULTADOS
51
Para Morse (1984) a prática do treinamento de trabalhadores para desempenhar
funções específicas nas organizações é quase tão antiga quanto a própria
Revolução Industrial. Empresas Como a Westinghouse ou a General Eletric, pouco
antes do início do século XX, já tinham implementado grandes programas de
treinamento para que seus empregados desempenhassem as tarefas com eficiência
nos novos arranjos organizacionais que se desenvolviam (in Demajorovic,2000).
Esta realidade começou a se modificar a partir da década de 50, quando os setores
empresariais reconheceram que os programas de educação e treinamento, além de
preparem melhor o trabalhador para desempenhar suas funções, contribuíam para
assegurar sua vantagem competitiva. Nessa época, elevaram-se significativamente
os gastos destinados à política de desenvolvimento de recursos humanos que
pregava o treinamento em todos os níveis, incluindo habilidades genéricas e
específicas e o conhecimento adquirido nos sistemas de educação tradicional. Nos
anos 50, as universidades começam a desempenhar um papel importante no
aperfeiçoamento dos programas de treinamento das organizações Ao mesmo
tempo, multiplicam-se as pesquisas na área de Economia da Educação, ressaltando
a importância do papel da formação na eficiência do trabalho (Carolli, 1998 in
Demajorovic 2000).
Nesse cenário surgem os primeiros estudos no campo sobre novas formas
organizacionais, sendo seu principal expoente a abordagem sociotécnica do
trabalho. Em contraposição ao modelo hegemônico mecanicista de organização
industrial, baseada na proposta Taylorista/Fordista, na qual o aspecto da realização
de tarefas é enfatizado em detrimento do aspecto social, a abordagem sociotécnica
defende uma integração dos aspectos técnicos e sociais para o alcance dos
objetivos organizacionais. Entre suas propostas é possível destacar a capacitação
de trabalhos com habilidades multifuncionais em substituição a operários altamente
especializados, a diminuição das barreiras à comunicação entre as unidades
funcionais e o incentivo à adaptabilidade e à criatividade dos trabalhadores para a
consecução das metas organizacionais (Fleury et al, 1997, in Demajorovic, op.cit).
52
De Masi, nos fala da importância de diferenciar treinamento e formação. Segundo
ele, durante nosso crescimento, acumulamos três tipos de bagagem cultural: as
técnicas, que constituem nosso ganha-pão, as normas, para nos regularmos em
relação aos outros membros da sociedade, e os comportamentos, com os quais
interagimos com o próximo. O aprendizado de técnicas e de normas requer um
“treinamento” que se realiza com a transmissão de noções por parte de quem as
conhece para quem ainda não as conhece. Já o aprendizado de comportamentos é
bem mais complexo e requer “formação”.
Ainda conforme De Masi, não existe um divisor de águas claro e rígido entre estes
dois tipos de aprendizado e entre as suas respectivas pedagogias. Com a mudança
de tecnologia, por exemplo, muda entre outras coisas, o modo de nos relacionarmos
com o mundo, simplesmente porque se alteram as categorias de tempo e de espaço.
Portanto, é necessária uma formação filosófica, ética, estética, lingüística,
psicológica e sociológica, além da que se dá na área técnica e econômica. A
globalização, por sua vez, exige que se estude mais (2000:74)".
Nessa perspectiva, esse mesmo autor adverte sobre a necessidade de educar para
“complexidade” e para a ”descontinuidade”, que em sua ótica são duas categorias
que não devem nos intimidar, porque estão em plena consonância com a nossa
natureza humana. Quanto mais e melhor uma pessoa é capaz de administrar a
complexidade e a descontinuidade, mais madura ela é. Essa nova forma de
aprendizado é por ele chamado de pedagogia pós-industrial, e esse pressuposto é
sustentado conforme suas palavras:
“Quando a sociedade industrial enfrentava um problema complexo,tentava simplificá-lo, buscando transformá-lo em vários pequenosproblemas simples. Já a sociedade pós-industrial é capaz deenfrentar problemas bastante complexos porque dispõe deinstrumentos igualmente complexos e potentes. E quando problemascomplexos são enfrentados com instrumentos encontram-se, semmaior problema, soluções complexas, mas nem por isso difíceis, esim adequadas a todo o saber acumulado ao longo dos séculos. Edesse modo toda a cadeia de necessidades, problemas, técnicas esoluções se torna mais coerente e mais rica e portanto, maishumana. Porque o ser humano é complexo e aspira a poderadministrar esta complexidade. Só os animais são simples”. (DeMasi:2000:276)
53
“Problemas Complexos” nos remete à fala de Demajorovic, quando diz que:
“Educar no contexto organizacional, é diferente de educar em outroscontextos, como o escolar ou familiar. As intricadas relaçõesburocráticas das organizações empresariais representadas por seusníveis hierárquicos, os procedimentos de controle e seus sistemasde compartilhamento das informações afetam o processo deaprendizagem dos indivíduos nas empresas. Por isso mesmo, oselementos do modelo do aprendizado organizacional permitem umaampla análise do processo de educação corporativa uma vez quecontemplam, além dos programas de treinamento e formação, outrasvariáveis da complexa realidade organizacional (2000:50)".
É importante diferenciar o aprendizado individual do organizacional, porque, em
muitos casos, as organizações podem saber menos que seus integrantes. Isso se
explica muitas vezes devido ao fato de que seus membros não atuam em nome da
coletividade e suas ações não resultam em uma interação social, o que as
transformaria em ação organizacional.
2.3.4. Treinar Competências – aprender à aprender
Os programas de treinamento num ambiente de competências devem oferecer às
pessoas oportunidades de reflexão sobre seus projetos de vida profissional e sobre
o significado da sua contribuição para a organização, no que diz respeito à
realização desses projetos de vida profissional. O processo de capacitação das
pessoas tem por missão ensiná-las a pensar, a reelaborar constantemente seus
significados e a aprender a ter autocrítica. Os indivíduos não só precisam saber
“como fazer”, mas também conhecer o “porquê” do como fazer. Nesse sentido, o
modelo de treinamento de competências deve basear-se nos gaps, tanto de cada
pessoa quanto dos grupos, que podem ser funcionais, processuais, hierárquicos, etc
(Neri: 49:1999).
54
FIGURA 2.2. - O MODELO DE TREINAMENTO POR COMPETÊNCIA
Fonte: Aguinaldo A . Neri
Através dessa figura, pode-se perceber que todas as atividades de recursos
humanos devem ser alinhadas com a estratégia da organização, o que é possível
com a adoção da administração de recursos humanos por competências, já que as
competências essenciais para a estratégia da empresa são as premissas para o
estabelecimento dos quadros de competências funcionais (Neri: 54:1999).
Neri afirma, ainda que treinar competências é, antes de mais nada, dar acesso às
pessoas para a reflexão sobre uma circunstância psicossocial (a empresa) e um
momento específico da vida de cada um. É mediar um contrato de trabalho mais
explícito por meio de uma linguagem que possa dar um significado ao “sangue, suor,
e lágrimas”, exigidos pelo atual estado de complexidade organizacional e pela
economia mundial. Treinar competências, é ainda utilizar e realçar a capacitação
pelas vivências e pelo feedback, com uma negociação clara e madura de resultados
SITUAÇÃO ATUAL(PESSOAS,GRUPOS)
PLANOS DETREINAMENTO
COMPETÊNCIASDESEJADAS(QUADROS)
ASSESSMENT
GAP(NECESSIDADES)
BANCO DEDADOS
INSTRUMENTOS DEAVALIAÇÃO E
ACOMPANHAMENTO
TREINAMENTOSINDIVIDUAISE GRUPAIS
CONDUÇÃODOS PLANOS DETREINAMENTO
RESULTADOS
55
esperados de ambas as partes e, mais do que tudo, com o acompanhamento de
líderes do terceiro milênio, aqueles executivos e chefes capazes de serem
projetistas, regentes e professores em todos os momentos de sua atuação.
Como vimos, as mudanças no mundo do trabalho revelam que a qualificação é
cada vez mais um valor estratégico de interesse do trabalhador e do empregador.
Assim, é importante compreender que a preocupação com a Educação Profissional
se faz presente no âmbito social e também no âmbito das organizações
empresariais. Torna-se evidente a necessidade de conjugação dos esforços, através
do estabelecimento de parcerias entre os atores sociais na busca de novas
soluções, uma vez que as instituições de ensino não possuem condições técnicas e
estruturais para atender sozinhas às novas exigências. Tornam-se necessárias,
também, estratégias de cooperação para elevar o nível de qualificação da
população, reconhecendo cada qual a sua verdadeira missão. De um lado a
instituição de ensino cumprindo seu papel de prestação de serviços à comunidade e
de outro os empregadores elevando o nível de qualificação de seus colaboradores.
Assim como nos diz o SEFOR21:
“Educação Profissional – Necessidade da Empresa, interesse dotrabalhador e da própria sociedade, a qualificação para o trabalhoexige uma estratégia integrada, construida mediante articulação eparceria entre os vários atores sociais- governo, empresas,trabalhadores, educadores- de modo a beneficiar não apenassetores modernos da economia, mas toda a sociedade” (2000).
A ação empresarial no campo educacional embora fragmentada, além de
familiarizar e sensibilizar o empresário para uma das mais importantes questões
nacionais, também complementa a ação do governo, cria formas alternativas de
solução, faz novas experiências e beneficia a sociedade em geral (Dowbor:1998).
Entretanto, um dos grandes problemas enfrentados quando se pensa em trabalhar
com a questão da qualificação é a dificuldade de conceituá-la. Na realidade, os
diferentes conceitos com que podemos nos deparar expressam não só diferentes
preocupações com o fenômeno, mas também distintos pontos de partida teóricos
21 SEFOR: Secretaria de Formação e Desenvolvimento Profissional- Educação Profissional e Empregabilidade– O Repensar da Educação. 14/04/00.
56
que devem ser levados em consideração para que se possa abarcar na sua
totalidade o universo que se pretende estudar (M.Leite e Posthuma, 1996). Daí a
importância de dedicarmos um capítulo para este debate.
58
Capítulo 3
Qualificação Profissional
Este capítulo tem como objetivo discutir os vários conceitos de qualificação, uma vez
que a noção de qualificação é polissêmica, podendo ser assumida com várias
acepções. Isso expressa a dificuldade de se chegar a um denominador comum. Para
alguns autores a qualificação é considerada na perspectiva da preparação para o
mercado, envolvendo, portanto, um processo de formação profissional adquirido por
meio de um percurso escolar e de uma experiência (ou carreira profissional) capaz
de preparar os trabalhadores para o ingresso e a manutenção no mercado formal de
trabalho. Um outro uso da noção de qualificação é entende-la como um processo de
qualificação/desqualificação inerente à organização capitalista do trabalho e sendo o
resultado da relação social entre capital e trabalho e da correlação de forças entre
ambos. Há ainda uma terceira visão (mais recente, da sociologia do trabalho
francesa) que aborda e define a qualificação a partir da investigação de situações
concretas de trabalho.
3.1. Qualificação Profissional – Discutindo os conceitos
A qualificação profissional, tema clássico da Sociologia do Trabalho e da Sociologia
da Educação, assume, hoje, ares de um debate multidisciplinar, na medida em que
se ampliam os estudos e as pesquisas sobre esta temática em outras áreas do
conhecimento. É importante ressaltar que a amplitude que caracteriza, o debate
sobre o tema da qualificação não é um fato isolado, mas decorre de uma discussão
mais ampla, nem sempre consensual, que segundo Neise Deluiz, privilegia questões
referentes à:
“crise do capitalismo, reestruturação produtiva, novas tecnologias,novas formas organizacionais e ainda aos seus possíveisdesdobramentos em relação ao conteúdo e à organização dotrabalho (1995:162).
59
As exigências e os contornos (perfis) que assumem as qualificações profissionais
de um determinado período dependem, portanto, de vários fatores interligados:
“Da forma como é organizada socialmente a produção de bens eserviços (entendendo-se aí não só o desenvolvimento das forçasprodutivas, mas também as relações de força entre o capital e otrabalho que se estabelecem no interior do processo produtivo), dodesenvolvimento da ciência e da tecnologia, da disponibilidade derecursos naturais e materiais aplicados à produção, do grau deexpansão do sistema educacional e do acesso à educação geral, doacúmulo de experiências concretas de trabalho e das possibilidadesde aquisição de novos conhecimentos e habilidades por vias formaise informais da configuração social em termos do aparato jurídico-institucional (papel do Estado, dos sindicatos dos empresários).(Deluiz, 1995).
Sendo a questão da qualificação bastante complexa e polêmica, o importante,
para efeito desse estudo, é levantar a questão de como pensar a qualificação
profissional diante de tais indefinições, qual é o olhar que a instituição de ensino
deve focar ao planejar seus cursos?
Baseado na experiência de nosso dia a dia, acreditamos que o importante é
qualificar os alunos de modo que possam exercer determinadas atividades nas
empresas. Muito embora seja subjetivo a definição de qualificação, o que importa é
que o aprendizado oferecido pelas escolas técnicas seja possível se comprovar na
prática. Hoje mais que no passado a aprendizagem, depende de empenho pessoal
para poder ser efetiva e poder aplicar-se concretamente. A qualificação real passou
a ser a condição básica para o trabalho, seja no mercado formal de empregos dos
setores tradicionais da economia, seja em atividades alternativas, uma vez que
estamos diante de um mundo do trabalho em transformação. Isso reforça o objetivo
pelo qual as escolas técnicas foram formadas, que é o de propiciar a possibilidade
do aluno entrar ou permanecer no mercado de trabalho. Portanto torna-se relevante
conhecer a realidade do mercado, ou seja, conhecer o que efetivamente as
empresas irão utilizar de conhecimento dos alunos egressos de curso
profissionalizante.
60
Esse conhecimento da realidade vai ao encontro das expectativas dos alunos em
relação aos cursos oferecidos pelas escolas técnicas, quando nos diz:
“Nós gostaríamos de aprender aquilo que as empresas estãoexigindo dos funcionários no processo de contratação”, ou seja agrande pergunta dos alunos é “para que serve isto?”22
Esse tem sido o grande desafio dos educadores. Uma vez que a obsolescência dos
conteúdos ocorre muito rápido, o grande desafio do professor está em despertar no
aluno o interesse pela descoberta e a predisposição de aprender à aprender. Daí a
importância de articular, além do conteúdo técnico, também elementos de caráter
cultural fundamentais para expressão das reais qualificações. Nessa linha de
pensamento o conceito de qualificação adquire legalidade sociológica específica,
enquanto parte do processo social mais amplo de construção identidades e de
subjetividades. Não pode, portanto, ser traduzido operacionalmente por uma
expressão numérica, por uma escala de atributos objetivos, já que a qualificação não
é um dado tangível da realidade. Ela é antes, um processo histórico determinado
socialmente, como veremos a seguir.
3.2. Qualificação como Construção Social
Pensar em qualificação como construção social nos remete a um debate sobre a
articulação da escola com o mundo, com a vida, o que nos leva então a questionar
os nossos alunos:
“Quais foram as lições de vida, mais significativas queaprendemos? Foram dentro ou fora da escola?”
De um modo geral os entrevistados respondem:
“Aprendi, mais fora da escola do que dentro dela “...
22 Entrevista realizada com nossos alunos do Curso de Administração- ETE Aprígio Gonzaga / 2000.
61
E quando analisávamos porque isso ocorrera, geralmente descobríamos que as
situações de vida eram as mais propícias e significativas para a aprendizagem (ex.
fazer continhas versus contar o troco que sobrou depois dos chicletes e balas). E
isso geralmente ocorre porque a vida é interdisciplinar por natureza. Tudo é
integrado, tudo se relaciona com tudo.
Uma visão crítica dos alunos, nos diz:
Já, infelizmente, na escola em que estudamos, tudo era (ainda é)
dividido, separado ....
Assim, entendemos que a qualificação, enquanto um conceito socialmente
construído, incorpora, além do “conteúdo técnico”, elementos de caráter cultural
fundamentais para elucidar outros aspectos que lhe são pertinentes, tais como,
questões de gênero e relações intraclasses e até mesmo os motivos que levam
alguns postos de trabalho a serem ocupados exclusivamente por determinados
grupos de trabalhadores. Ou seja, não é possível pensar em qualificação
profissional desarticulada da dimensão social a qual os alunos estão inseridos.
Portanto, partilhamos com as idéias de Dubar (1987), quando nos diz que a
qualificação não é um objeto preciso em si e nem uma totalidade, mas uma
“articulação”, uma relação social. Além disso, admite que esta relação pode se dar
entre diversos elementos, portanto não é transparente, imediata e harmoniosa.
Sendo assim, condições tecnológicas, organizacionais e gestoriais dos processos
de produção e de trabalho, estratégias de incorporação do saber dos trabalhadores,
monitoramento da participação dos sujeitos no processo produtivo, formas de
regulação de conflitos, formas de distribuição e utilização dos diferentes segmentos
de trabalhadores são algumas das dimensões cruciais à investigação voltadas para
o controle do feedback vindo do ”chão-de-fábrica”, ou seja, do saber-atuar e da
qualificação dos sujeitos do trabalho.
Cabe destacar que a qualificação incorpora outros elementos que não apenas os
técnicos. Por isso não é possível dizer que a qualificação é um conjunto de
62
atributos, sem levar em conta o país, a empresa, a cultura, para que se possa
delimitar o valor de uso dessa qualificação como futuro valor de troca. Portanto o
que o capital vai chamar de mão-de-obra qualificada é aquilo que lhe interessa em
determinado momento, como por exemplo políticas de contratação de pessoas com
a terceira idade, negros, deficientes, etc.
Contudo, no atual quadro de modificações dos processos produtivos, os sistemas
técnicos estariam se tornando mais fortemente dependentes da sensibilidade
humana e da sua capacidade de avaliação e predição, o que significa que a
dimensão da subjetividade, ou seja, a afirmação da potência transformadora e
criadora dos sujeitos tem se tornado ainda mais fundamental.
Claude Dubar define a qualificação como expressão das relações sociais e em sua
análise faz uma comparação entre França e Alemanha, apontando que a noção de
qualificação não tem o mesmo sentido e muito menos a mesma tradução “societal”
nesses dois países. No modelo “socio-administrativo” de tipo francês, a qualificação
é fortemente determinada pela formação escolar, e ao mesmo tempo, codificada
administrativamente e gerenciada pelas empresas no modo da “descontinuidade"
estatutária (forte oposição executivos/executores). Já no modelo alemão “técnico-
profissional”, o diploma profissional confere à qualificação um caráter geral para
além do local onde é exercida” e permite, sobretudo, instaurar uma continuidade
profissional, fonte de eficiência produtiva. Sintetizando, Dubar descreve as
diferenças dos dois modelos da seguinte forma:
“São as competências dos próprios assalariados que sãoclassificadas (na Alemanha) e não os postos de trabalho ou asposições hierarquicas (como na França)”.
A questão pertinente a ser esclarecida é a forma como diversos elementos, tais
como modo de organização do trabalho, saber e valor, se relacionam entre si e qual
a natureza desta relação, se de causalidade, determinação reciproca ou se antes
haveria que se indagar sobre a preexistência de um fator mais preponderante. Se
qualificação se refere a uma relação social não faria sentido dar-lhe uma definição
absoluta apoiada em parâmetros invariáveis. Trabalho qualificado não seria também
63
aquele do qual se exigiria maior esforço intelectual, já que reduzir o tempo de
reflexão para a tomada de decisões é o objetivo da formação .
Portanto, partilhamos com Nadya A. Castro em sua afirmação de que é amplo (e
antigo) o dissenso acadêmico em torno da questão da qualificação. Não se debatem
apenas a sua natureza ou as mudanças no tempo. Debatem-se diferenças de fundo
entre concepções nas quais está em jogo a própria noção de qualificação.
3.3. Qualificação como sinônimo de preparação de “Capital Humano”
A noção de qualificação nasceu associada à concepção de desenvolvimento
socioeconômico dos anos 50 e 60, com a necessidade de planejar e racionalizar os
investimentos do Estado com a educação escolar. Visava-se garantir, em um nível
macro uma maior adequação entre as demandas dos sistemas ocupacionais e dos
sistema educacional.
Fundamentado na teoria do Capital Humano o Banco Mundial defendia a
importância da instrução e do progresso do conhecimento como ingredientes
fundamentais para a formação do chamado capital humano, isto é, a solução para a
escassez de pessoas possuidoras de habilidades-chave para atuarem nos setores
em processo de modernização. Naquele contexto histórico, por modernização
entendia-se a eleição e a adoção do modelo industrial capitalista como modo de
produção, consumo, estilo de vida, e a integração a um padrão de desenvolvimento
industrial adotado nos países capitalistas do ocidente.
Quando se discute a relação entre educação e desenvolvimento econômico,
especialmente a partir da perspectiva da teoria do capital Humano, o que se
procurar afirmar logo de imediato é uma relação de causa e efeito entre nível
educacional e performance econômica. Ao mesmo tempo, postula-se que, à medida
que aumenta a complexidade da formação dos trabalhadores, maiores serão seus
rendimentos não só em função dos ganhos de produtividade das empresas, mas
também em decorrência das possibilidades de ascensão social que se abrem aos
64
trabalhadores mais bem qualificados. Estas formulações partem do pressuposto de
que o trabalhador não só é proprietário de sua capacidade de trabalho, entendendo-
a como capital (capital/conhecimento), como também estaria em igualdade de
condições para negociar com o capitalista a venda e a compra de sua força de
trabalho.
Assim nesta transação, Lucia Bruno (1994) nos diz que o trabalhador teria
autonomia suficiente para:
Definir os termos em que sua capacidade de trabalho seriautilizada/explorada por aquele que a comprou no mercado. Daí, seconcluir que numa sociedade mais escolarizada/qualificada para otrabalho é equitativa, pois isto contribuiria decisivamente para adistribuição dos rendimentos e da riqueza social produzida( Bruno, 1994).
No plano macrossocietário, esta concepção de qualificação gerou uma série de
políticas educacionais voltadas para a criação de sistemas de formação profissional
estreitamente vinculados às demandas e necessidades dos setores mais
organizados do capital. A história dos sistemas de formação profissional no Brasil
enquadra-se nesta lógica de qualificação, entendida como preparação de mão de
obra especializada (ou semi-especializada), para fazer frente às demandas técnico-
organizativas do mercado de trabalho formal.
Ainda no plano macro, isto é no plano das correlações (positivas ou não) entre a
criação e o desenvolvimento dos sistemas nacionais de educação (em seus
diferentes níveis), e as necessidades econômicas e sociais do sistema ocupacional,
gestou-se uma outra concepção de qualificação referendada na capacidade de cada
Estado Nacional expandir quantitativa e qualitativamente seus sistemas escolares.
Surge, pois uma nova conotação para o termo qualificação, designada por Paiva, de
”qualificação formal” (1995).
“Por muitas décadas a economia e o planejamento da educaçãotrabalharam com a qualificacão formal. Planejava-se a maneira deobter um número x de diplomas em determinadas áreas ou setoresprofissionais, de acordo com projeções de demanda. Calculava-se a
65
taxa de retorno através de diferenciais de rendimentos (salários) emfunção de anos de escolaridade ou da posse de um diploma, media-se a relação custo-benefício social dos investimentos em educação,fosse por meio de considerações globais sobre o atendimento demetas econômicas nos países socialistas, fosse por meio deindicadores indiretos nos países capitalistas. Nestes, o mercadorequeria força de trabalho diplomada, atestados de conclusão decurso” (p.76).
Portanto, as noções de qualificação, elaboradas a partir dos enfoques das teorias
do capital humano e do planejamento macrossocial, estão ancoradas em enfoques
macroeconômicos que privilegiam dimensões relativas ao desenvolvimento
econômico, crescimento e diversificação do mercado formal de trabalho. Há,
contudo, outras acepções que têm sido destacadas pela sociologia do trabalho, em
que se toma por base outros recortes analíticos, privilegiando os eixos de
organização da produção e do trabalho.
3.4. As noções de qualificação que tomam como parâmetros a produção e a organização do trabalho.
No modelo taylorista-fordista de organização do trabalho e de definição das
estratégias empresariais, o conceito de qualificação propicia o referencial necessário
para se trabalhar a relação profissional individuo-organização. Esta concepção de
qualificação tem como matriz o modelo definido a partir da posição a ser ocupada no
processo de trabalho e pelos requisitos associados à posição, ou ao cargo,
previamente estabelecida nas normas organizacionais da empresa. Neste modelo, a
qualificação é concebida como sendo “adstrita” ao posto de trabalho e não como um
conjunto de atributos inerentes ao trabalhador.
Tendo como parâmetros o posto/função estabelecidos a partir da inserção e posição
no mercado de trabalho, a qualificação é privatizada, isto é, entendida como um bem
conquistado de forma privada. Este bem seria constituído por um conjunto de
conhecimentos técnico-científicos, destrezas, habilidades e experiências adquiridas
ao longo de uma trajetória de vida escolar e de trabalho. A qualificação vista desta
forma seria, individualizada, personalizada, sem nenhuma conotação ou
66
condicionamento sociocultural. Nesse sentido, a formação para o trabalho é
definida como “treinamento” básico, conhecimento ou formação escolar necessários
para o exercício da função. Esse conhecimento ou formação podem ter sido
adquiridos por instrução formal, por treinamento preliminar em trabalhos de menor
grau, ou pela combinação desses meios (Manfredi, apud Kuenzer 1985:114).
Para um modelo de qualificação que tem como referencial a função e o posto de
trabalho, o que importa, do ponto de vista da formação para o trabalho, é garantir
que os trabalhadores sejam preparados exclusivamente para desempenhar
tarefas/funções específicas e operacionais. Esta concepção de formação foi
alicerçada numa concepção comportamental rígida, por meio da qual o
ensino/aprendizagem das tarefas/habilidades deve-se dar numa sequência lógica,
objetiva e operacional, enfatizando os aspectos técnico-operacionais em detrimento
de sua fundamentação mais teórica e abrangente, assim:
A noção de hierarquia de postos de trabalho é estabelecida a partirde uma escala de qualificações profissionais, associadas, por suavez, a níveis também hierárquicos de escolaridade, ou melhor, a umcredenciamento escolar oficial que legitima a representação de queaos que comandam e possuem uma posição mais elevada nahierarquia de especialização (e, por conseguinte, de mando edecisão) são os mais competentes, estabelecendo-se uma relaçãomecanicista entre teoria/prática e competência, independentementedo ponto de vista a partir do qual se faça a análise, seja o doexecutor, do prático, sempre incompetente, ou o do decisor, téorico,sempre competente (Kuenzer, Apud Manfredi 1985).
Portanto, concerne à construção de representações, reduzir a qualificação a um
percurso de responsabilidade individual e de natureza meritocrática, privatiza-se a
noção de competência, restrita (tanto no âmbito teórico como prático) ao
ofício/função que cada trabalhador desempenha no mercado de trabalho formal.
Além disso, Manfredi chama a atenção para o desenvolvimento da crença política-
ideológica do “poder da educação escolar”, como mecanismo de acesso às
posições qualificadas. Esta crença segundo a autora mascara os demais
mecanismos sociais (inerentes a processos societais mais abrangentes) e os
organizacionais (mecanismos de credenciamento estabelecidos internamente pelas
67
empresas). Estes condicionam o acesso e a manutenção dos trabalhadores no
mercado formal de trabalho.
Por outro lado, Helena Hirata (1998) nos fala sobre as classificações ou
categorizações que são utilizadas pelas organizações, para definir qualificações,
nem sempre estas classificações estão fundadas em características de tipo
aquisitivo (como o grau de escolarização, por exemplo). Ao contrário, com
frequência eles se baseiam em qualidades do tipo adscrito, em marcas de identidade
que acompanham os indivíduos (como o sexo, a cor ou a idade). Estas
fundamentam formas de classificação social (com efeitos de inclusão ou de
exclusão), seja das pessoas portadoras dessas qualidades, seja das tarefas por
elas desempenhadas(1998).
Diante desse empasse sobre o conceito de qualificação, Castro parte da lógica de
que é necessário diferenciar a “qualificação do posto de trabalho” da “qualificação
do trabalhador”. Esta última chama a atenção para a formação e a experiência
mobilizadas pelo indivíduo para executar uma tarefa. Ambas têm fontes distintas e,
dependendo do reconhecimento social que lhes seja conferido, podem (ou não)
credenciar quem as possui. Por isso mesmo, é importante investigar a qualificação
do trabalhador, não apenas pela ótica de quem o recruta, mas também como ele
próprio a representa e vivência. Isto é, como o indivíduo identifica e classifica os
saberes que mobiliza no exercício profissional, em termos de sua natureza, origem,
funcionalidade e significação para o seu desempenho.
Nos últimos dez anos, a concepção de qualificação tecnicista (cuja matriz é o
modelo job/skills), ancorada nas normas previamente estabelecidas pelas empresas,
está convivendo ou sendo substituída por uma outra concepção que vem sendo
designada modelo da competência.
68
3.5. A ressignificação do conceito de qualificação e suasubstituição pelo de competência
O processo de reorganização da economia mundial e as transformações técnico-
organizacionais não só tem afetado as condições, os meios e as relações de
trabalho, como também estão associados à construção de novas formas de
representação ou ressignificação das noções de trabalho, qualificação, competência
e formação profissional.
Segundo Manfredi, inúmeros são os estudos que têm sido feitos no mundo do
trabalho (no campo da sociologia, da economia, da educação, da ergonomia, etc) no
sentido de aprofundar o estudo entre os processos de modernização técnica e
organizacional, que têm acompanhado o atual processo de globalização da
economia capitalista (em escala mundial), e os impactos destas transformações
sobre o mercado de trabalho, a estrutura ocupacional e as qualificações
profissionais.
No Brasil, desde o início da década de 1990, vários estudos empíricos têm enfocado
as transformações que estão ocorrendo nos diferentes setores da economia. Estes
estudos têm realidades diferenciadas, heterogêneas, contraditórias. Mostram
também que não é possível concluir, de forma linear e universal, que o caráter
inovador das atuais transformações na base técnica e material do trabalho se
expressa, também e genericamente, por ganhos de qualificação por parte dos
trabalhadores (Machado:1994, in Manfredi:1998).
Todavia, ainda que os diferentes estudos constatem a combinação e a sobrevivência
de várias estratégias de qualificação e requalificação do trabalho, apontando para
diferenças regionais e inter e/ou infra-setores da economia revelam, também, a
emergência de um “novo perfil de qualificação da força de trabalho” que tende a
institucionalizar as seguintes exigências:
“Posse de escolaridade básica, de capacidade de adaptação anovas situações, de compreensão global de um conjunto de tarefase das funções conexas, o que demanda capacidade de abstração e
69
de seleção, trato e interpretação de informações. Como osequipamentos são frágeis e caros e como se advoga a chamadaadministração participativa, são requeridas também a atenção e aresponsabilidade. Haveria, também, um certo estímulo à atitude deabertura para novas aprendizagens e criatividade para oenfrentamento de imprevistos. As formas de trabalho em equipeexigiriam ainda a capacidade de comunicação grupal”.(Machado:1996 , Apud Manfredi: 1998).
Há, portanto, no nível das concepções e representações, um movimento no sentido
de substituir a noção de qualificação pelo chamado modelo de competência.
Segundo Helena Hirata, a noção de competência é oriunda do discurso empresarial
nos últimos dez anos na França, retomada em seguida por economistas e
sociólogos. É uma noção ainda bastante imprecisa e decorreu da necessidade de
avaliar e classificar novos conhecimentos e novas habilidades a partir das novas
exigências de situações concretas de trabalho, associada, portanto, aos novos
modelos de produção e gerenciamento, e substitutiva da noção de qualificação
ancorada nos postos de trabalho e das classificações profissionais que lhes era
correspondentes(1994 132-133).
Para Tanguy (1997), este movimento observado nas empresas francesas, de
introduzir novas práticas de codificação do trabalho em termos de competência,
está se verificando em outros países da Comunidade Européia (Inglaterra,
Alemanha, Itália, etc) no sentido de romper com os modos preexistentes de
designação, promoção e de remuneração do trabalho, tais como eram difundidos
com o nome de job skills e job evaluation. O uso e a difusão de um modelo centrado
em saberes e habilidades possuídos pelos trabalhadores foram iniciados nas
grandes empresas multinacionais ou transnacionais e vêm sendo acompanhados de
um conjunto de operações sociais que lhe dão forma, e objetividade. Esses
modelos, são justificados pela idéia de racionalização reinvidicada pelos diferentes
protagonistas que estão na sua origem e que vão desde os empresários, as
autoridades governamentais, os construtores de referenciais, passando pelos
cientistas convocados para dar legitimidade às práticas e representações que estão
sendo construídas.
70
No Brasil a noção de competência não é nova, no entanto só era utilizada no
âmbito das ciências humanas (notadamente no campo da ciências da cognição e da
lingüística) . Porém desde os anos 70, passa a ser incorporada nos discursos dos
empresários, dos técnicos dos órgãos públicos que lidam com o trabalho e por
alguns cientistas sociais, como se fosse uma decorrência natural e imanente ao
processo de transformação na base material do trabalho (Manfredi, 1998:27).
Este termo utilizado de forma generalizada, é empregado, indistintamente, nos
campos educacionais e do trabalho como se fosse portador de uma conotação
universal. No discurso dos empresários há uma tendência a defini-la menos como
“estoque de conhecimentos/habilidades” mas, sobretudo, como capacidade de agir,
intervir, decidir em situações nem sempre previstas ou previsíveis. O desempenho e
a própria produtividade global passam a depender em muito dessa capacidade e da
agilidade de julgamento e de resolução de problemas (E. Leite, 1996).
Segundo uma pesquisa realizada por E. Leite em empresas metalúrgicas de São
Paulo, parece haver um certo consenso quanto à seguinte noções de qualificação e
competência.
“A Capacidade de mobilizar saberes para dominar situaçõesconcretas de trabalho e transpor experiências adquiridas de umasituação concreta a outra. A qualificação de um indivíduo é suacapacidade de resolver rápido e bem os problemas concretos maisou menos complexos que surgem no exercício de sua atividadeprofissional”. O exercício dessa capacidade implicaria a mobilizaçãode competências adquiridas ou construídas mediante aprendizagem,no decurso da vida ativa, tanto em situações de trabalho como foradeste, reunindo:
• O “saber fazer”, que recobre dimensões práticas, técnicas e científicas,adquirido formalmente (cursos treinamento) e/ ou por meio daexperiência profissional;
• O “saber ser”, incluindo traços de personalidade e caráter, que ditam oscomportamentos nas relações sociais de trabalho, como capacidade deiniciativa, comunicação, disponibilidade para a inovação mudança,assimilação de novos valores de qualidade, produtividade ecompetitividade;
71
• O “saber agir”, subjacente à exigência de intervenção ou decisão diantede eventos – exemplos: saber trabalhar em equipe, ser capaz deresolver problemas e realizar trabalhos novos, diversificados23.
Pode se considerar que esta é a visão que permeia o desenho do perfil ideal de
qualificação nas empresas inovadoras. Há pelo visto, nítida convergência entre as
empresas de diferentes setores e características, quanto aos traços mais relevantes
desse perfil, em matéria de conhecimentos, habilidades, atitudes e características
pessoais (Leite 1996: 164-165, apud Manfredi:1998).
Concordamos com Manfredi, que independente da fluidez com que se trabalham as
noções de competência, habilidades, capacidades, etc. (como se não fossem
diferenciadas no campo das ciências cognitivas), as diferentes tipologias e os
esquemas classificatórios utilizados denotam a polissemia da noção de competência
e a fluidez do modelo que leva seu nome.
Contudo, se ficarmos restritos aos níveis da reconstrução de significados dos termos
qualificação e competência e da recuperação das possíveis identidades
paradigmáticas, temos a impressão de que permaneceremos no interior de um
círculo fechado que nos impede de entender o conceito à luz de movimentos mais
amplos, incluindo o de ruptura.
Para o propósito dessa dissertação, o que interessa ressaltar é que a noção de
competência tem sido considerada como alternativa à de qualificação, tendo sido
originalmente recriada e reatualizada pelas equipes de recursos humanos das
grandes empresas, em nível de gerência, para construir novos critérios de acesso e
permanência no emprego, seu reconhecimento e sua institucionalização.
Entretanto, Dubar adverte que :
O ‘’modelo da competência” não é portanto, novo nem mais racionalque os outros. Ele corresponde a uma concepção das relações detrabalho e da organização que valoriza a empresa, o contratoinidividual de trabalho, a troca de uma “mobilização” pessoal
23 O atual livro da UNESCO – Sobre a Educação para o Século XXI Um Tesouro a descobrir, reforça esse pressuposto,ressaltando que a educação ao longo de toda vida baseia-se em quatro pilares: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprendera viver juntos e aprender a ser. Esta perspectiva deve orientar as reformas educativa, tanto no nível de programas como dadefinição de novas políticas pedagógicas, Cortez -São Paulo-2001.
72
(commitment) contra marcas de reconhecimento (inclusivesalariais), a integração forte numa organização hierárquica. Quem aele se refere racionaliza com freqüência sua escolha lançando mãodo “filtro” do diploma escolar e de referências “cognitivas”(resoluçãode problemas, tipos de saberes...) que mal conseguem esconderpreconceitos quanto à inteligência. Ao contrário do modelo dequalificação, que implica a negociação coletiva, o da competênciatende a apagar o fato de que o reconhecimento salarial é o resultadode uma relação social dinâmica e não de um face a face entreindivíduo provido de “competências” a priori e de uma empresa queas reconhece nele e as transforma em “desempenho” mais oumenos suscetível de ser medido. ( Dubar:1998: 100).
Por outro lado, no plano macro a noção de competência também pode ser
pesquisada numa perspectiva historicamente determinada da evolução da
sociedade civil e de suas diferentes instâncias de organização. Do ponto de vista
analítico-interpretativo é possível considerar a competência tanto a partir das
próprias trajetórias e experiências da vida, familiares e de trabalho, como também
incorporando-a historicamente aos estudos que procuram entendê-la como um
fenômeno de caráter histórico-estrutural. Desta forma é analisada sob os mais
diversos prismas de estudo: da história do trabalho e de suas organização, dos
modelos de desenvolvimento econômico, de trabalho e emprego, do trabalho,
gênero, grupos geracionais, grupos étnicos, do Estado e das políticas sociais, do
movimento sindical e das políticas sociais e dos sistemas educacionais.
É importante ressaltar que antes de gerir as competências, é preciso definir em que
medida a mobilização da competência é um modo de gestão da empresa. Gerir pela
competência, antes de gerir as competências. Zarifian, supõe uma revisão das
políticas de formação e sobretudo, sua articulação com as opções de organização
do trabalho.
Cabe observar que, uma vez que o conceito de qualificação é polissêmico, não é
possível esgotar sua definição a partir de uma característica, como por exemplo “um
construto histórico-social”, embora seja mais amplo e aceito por boa parte da
literatura especializada. Alguns autores começam a falar em “qualificações tácitas”
ou “sociais”, u ainda, “informal” para designar os “conhecimentos” que, essenciais à
aquisição de determinadas tarefas qualificadas, são apreendidos por meio “da
73
experiência subjetiva”. Por essa razão torna-se muito difícil quase impossível, a sua
transmissão por meio de uma linguagem explícita e formalizada. E, em decorrências
das dificuldades que os autores enfrentam para encontrar uma forma de lidar com
esse tipo de abordagem, ela passa a constituir um desafio para todos envolvidos
com a questão (M. Leite e Posthuma;1996 in Aprile).
74
PARTE IIA FORMACÃO PROFISSIONAL
A tarefa principal do homem é dar a luz asi mesmo, e se tornar o que
potencialmente já é.
E.Fromm
Pensador americano (1900-1980)
75
Capítulo 4
Histórico do Ensino Profissional
Este capítulo tem como objetivo delinear os caminhos traçados historicamente pela
educação profissional dentro dos marcos institucionais legais. A análise aqui
realizada será sucinta, pois metodologicamente, não estamos realizando uma
análise sctrito sensu. Estudos dessa natureza exigem que se compreendam os
projetos políticos, econômicos e culturais daqueles que as propõem e do momento
histórico no qual surgem, bem como se analisem a percepção e a valoração sobre
educação dos diferentes grupos sociais. Portanto, as reformas citadas neste
capítulo, são entendidas como o conjunto de inovações pretendidas para o ensino
profissional, a partir das mudanças no mundo do trabalho.
4.1. No Brasil
No Brasil, a formação profissional esteve sempre associada ao ensino profissional e
destinada aos grupos sociais marginalizados24. Essa concepção estava presente na
criação do Colégio das Fábricas por D.João VI, na vinda ao Brasil em 1808 que
tinha por finalidade educar os artistas e aprendizes vindo de Portugal. A Escola era
voltada para indústria e recebia os índios mais fortes e jovens, os escravos, os
órfãos, os mendigos e os renegados. Assim, as primeiras escolas
profissionalizantes do Império (1897) tinham por objetivo o adestramento da mão-de-
obra segundo princípios da moralidade e das caridades cristãs (ocupação de órfãos,
de jovens carentes e de pequenos delinquentes (Cattani, 1997:p.97: in Fundap25).
24 Somente nas duas últimas décadas, o ensino profissional atraiu estudantes oriundos das camadas médias, nãoem consequência de projetos de profissionalização anterior ao ensino superior, mas decorrentes da qualidade doensino oferecido por algumas destas escolas.25 FUNDAP-Fundação do Desenvolvimento Administrativo- Projeto de Assessoria à Formulação do Projeto deInversão do Ensino profissionalizante do Ceeteps/SCTE: Estudos para Definição do Modelo de EducaçãoProfissional- Volume II – Agosto, 1998.
76
Como nos lembra Carmen Sylvia V. Moraes26, o processo de industrialização no
Brasil não se deu nos mesmos moldes que aqueles seguidos pelos países centrais
do capitalismo, principalmente porque aqui o “novo” e o “arcaico” estabeleceram
uma convivência estrutural e dinâmica. A sociedade urbano-industrial formou-se nos
quadros de uma sociedade agrário-exportadora, baseada na grande propriedade
territorial e no trabalho escravo.
A implantação da república, no Brasil, não foi acompanhada, de imediato, por um
movimento de criação de uma estrutura educacional de caráter nacional e
republicano. Durante a Primeira República, não havia uma estrutura de ensino
organizada com base em um sistema nacional de educação, não havia nenhuma
política nacional que articulasse os sistemas estaduais ou municipais. De maneira
geral, as reformas educacionais circunscreviam-se ao Distrito Federal e às escolas
federais, e o ensino profissional continuou marginalizado como o fora durante o
império27.
Assim, vale ressaltar que a formação profissional, desde as suas origens, sempre
foi reservada às classes menos favorecidas, estabelecendo-se uma nítida distinção
entre aqueles que detinham o saber (ensino secundário, normal e superior) e os que
executavam tarefas manuais (ensino profissional). O desenvolvimento intelectual,
proporcionado pela educação escolar acadêmica, era visto como desnecessário
para a maior parcela da população e para a formação de “mão-de-obra”. Não se
reconhecia vínculo entre educação escolar e trabalho pois a atividade econômica
predominante não requeria educação formal ou profissional.
Kuenzer28 (1999) nos lembra que a formação profissional como responsabilidade do
Estado inicia-se no Brasil em 1909, com a criação de 19 escolas de artes e ofícios
nas diferentes unidades da federação, precursoras das escolas técnicas federais e
estaduais. Estas escolas, antes de pretenderem atender às demandas de um
desenvolvimento industrial praticamente inexistente, obedeciam a uma finalidade
26 Professora da Faculdade de Educação -USP27 O ensino profissional era destinado a cegos, surdos-mudos e menores abandonados do sexo masculino (Decreto nº 16.782-A, reforma João Luís Alves (1925).28 Acácia Zeneida Kuenzer é professora titular do Setor de Educação da Universidade Federal do Paraná.Doutora em Educação.
77
moral de repressão: educar pelo trabalho, os órfãos, pobres e desvalidos da sorte,
retirando-os da rua. Assim, a primeira vez que aparece a formação profissional como
política pública, ela o faz na perspectiva mobilizadora da formação do caráter pelo
trabalho.
A partir daí foram se desenvolvendo outras alternativas destinadas à formação de
trabalhadores, de modo que até 1932, ao curso primário havia as alternativas do
curso rural e curso profissional com quatro anos de duração, aos quais poderiam
suceder outras alternativas ao nível ginasial de formação exclusiva para o mundo do
trabalho, como eram os cursos normal, técnico comercial e técnico agrícola. Estas
modalidades eram voltadas para as demandas de um processo produtivo, no qual
as atividades voltadas para os setores secundário e terciário eram incipientes e não
davam acesso ao ensino superior. Para as elites, havia outra trajetória: o ensino
primário seguido pelo secundário propedêutico, completado pelo ensino superior,
este sim dividido em ramos profissionais, como nos relata Kuenzer:
“A formação de trabalhadores e cidadãos no Brasil constituiu-sehistoricamente a partir da categoria dualidade estrutural, uma vezque havia uma nítida demarcação da trajetória educacional dos queiriam desempenhar as funções intelectuais ou instrumentais, emuma sociedade cujo desenvolvimento das forças produtivasdelimitava claramente a divisão entre capital e trabalho traduzida notaylorismo-fordismo – a ruptura entre as atividades de planejamentoe supervisão por um lado, e de execução por outro” (122:1999).
A estas duas funções do sistema produtivo correspondiam trajetórias educacionais e
escolas diferenciadas. Para os primeiros, a formação acadêmica, intelectualizada,
descolada de ações instrumentais, para os trabalhadores, formação profissional em
instituições especializadas ou no próprio trabalho com ênfase no aprendizado quase
que exclusivo.
O diagnóstico do ensino profissionalizante elaborado pela FUNDAP (1998) nos
mostra que neste século houve nove reformas educacionais29 que atingiram a
estrutura e a organização do ensino secundário. Todas elas evidenciavam uma
29 1901 (Epitácio Pessoa), 1911 (Rivadávia Correia), 1915 (Carlos Maximiliano), 1925 (João Luis Alves), 1931 (FranciscoCampos), 1942 (Leis Orgânicas), 1961 (LDB, Lei nº 4.024), 1971 (Reformulação LDB, Lei nº 5.692) e 1996 (LDB, Lei nº9.394).
78
concepção de ensino secundário como aquele que precede o ensino primário e é
completado pelo ensino superior, “este sim dividido em ramos profissionais”. Para
atingi-lo, o estudante teve que vencer inúmeras barreiras, entre exames de
admissão, vestibulares e aprovações sucessivas, para que, ao final de no mínimo
15 anos, tivesse acesso à certificação formal superior que pretensamente lhe abriria
as portas do mercado de trabalho (Kuenzer, 1997: p.11).
Assim Mascellani30 nos fala que a Educação no Brasil caracteriza-se por:
“Uma transposição de padrões culturais e modelos estrangeirosestranhos à realidade do país, como nossa cultura, quase sempreimportada e desprovida de uma elaboração nacional. Baseado nohomem estrangeiro, o ponto de partida de qualquer processo culturalou educacional foi abstrato e ideal, totalmente desencarnado dasnecessidades de nossa realidade. Consequentemente, veio umadeterminação de padrões de comportamento e atitudes- como oconformismo, a disciplina, o apego à ordem vigente, como marcasde uma religião e de um Deus que tudo providencia, que, retratandoos primórdios de nossa colonização, vigoram até o momento atual,bloqueando a criatividade do Homem brasileiro( 56:1999).
A educação no Brasil sempre esteve dentro dos moldes da cultura européia, o que
significa que recebemos, com atraso e sem crítica, todas as elaborações dos
movimentos intelectuais do Velho Mundo. Portanto, a educação não teve como
principal preocupação a explicitação das exigências do Homem Brasileiro e de sua
realidade. Ela foi sempre o instrumento de manutenção do status quo e de ascensão
social. Por exemplo, “ensino jurídico, que tratava de formar líderes nos grupos
dominantes (do acúcar e do café), e que assim eram capacitados a encontrar
justificativa jurídica de uma dada estrutura econômica” (Mascellani, 56:1999).
A iniciativa de uma experiência brasileira de Educação do Homem Brasileiro surge
na década de 50 a 60 quando enfoca que “não há Educação fora das sociedades
humanas e não há homem no vazio” (Paulo Freire), esboça-se um esforço de
elaboração de uma resposta aos desafios cotidianos por que passa o Homem
Brasileiro. Busca-se, então, a libertação pela conscientização .
30 Mascellani, Maria Nilde. Uma Pedagogia para o Trabalhador: O ensino vocacional como base para umaproposta pedagógica de capacitação profissional de trabalhadores desempregados (Programa Integrar). Tese deDoutorado na área de História e Filosofia da Educação. USP- SP. 1999.
79
4.2. Em São Paulo
A formação profissional, em São Paulo, também associava ensino profissional aos
grupos sociais marginalizados. Mas diferentemente do país, as primeiras
experiências não foram organizadas pelo Estado, mas pela iniciativa privada. O
Liceu de Artes e Ofícios, criado em 1873, constituiu uma das primeiras experiências
de ensino profissional desenvolvido pela iniciativa privada – Sociedade propagadora
de Instrução Popular. Inicialmente voltado para o ensino primário da população
adulta, passou em 1894 a oferecer cursos de Artes e Profissionais para a formação
de mestres para a indústria de construção civil, mobiliário, artes decorativas e
correlatos31. Somente em 1911 começaram a funcionar, na capital, as duas
primeiras escolas profissionais oficiais32.
Os estados de São Paulo, Ceará, Bahia, Minas Gerais e o Distrito federal antecipam-
se às reformas que o país implementará na década dos anos 30, sob inspiração do
ideário liberal dos educadores que organizaram o movimento dos Pioneiros da
Escola Nova. Na década dos anos 20, os governos dos estados citados realizaram
reformas no ensino primário, tentando criar um sistema estadual de educação
público e laico, articulado com o desenvolvimento socioeconômico do país.
A organização do ensino profissional, desde a instalação das duas primeiras escolas
(1911) até as Leis Orgânicas (1942), também carecia de estruturas de ensino
organizadas com base num sistema estadual de educação. O ensino profissional
estava subordinado à Diretoria Geral de Instrução Pública, da Secretaria do Interior
do Estado de São Paulo até 1931, quando foi criada a Secretaria Estadual de
Educação e Saúde Pública. A Diretoria, aqui referida, era responsável pelos ensinos
primário, secundário e superior, pela politécnica, medicina e pelo ensino profissional.
31 GITAHY, Maria Lúcia Caira. Qualificação e urbanização em São Paulo: a experiência do Liceu de Artes e Ofícios ( 1873-1934). In: RIBEIRO, Maria Alice (coord.) Trabalhos urbanos e ensino profissional. 2º ed. Campinas: Editora da Unicamp,1986.32 RIBEIRO, Maria Alice Rosa. Qualificação da força de trabalho – a experiência das escolas profissionais do estado de SãoPaulo (1911-1942). In: RIBEIRO, Maria Alice (coord.) Trabalhadores urbanos e ensino profissional 2º ed. Campinas: Editorada Unicamp, 1986.
80
Na década de 20 e 30, o ensino profissional se diversifica e amplia com a criação de
cursos para ferroviários naquelas escolas localizadas em cidades onde houvesse
oficinas mecânicas das ferrovias. O objetivo era estabelecer proximidade entre o
ensino profissional e o mercado de trabalho regional. Essa preocupação também
estava presente na criação da escola profissional de Santos para preparar operários
especializados em serviços portuários. A ampliação do ensino profissional resulta da
criação da Superintendência da Educação Profissional e Doméstica, diretamente
vinculada ao Secretário da Educação e Saúde Pública (FUNDAP: 21:1998).
A reforma educacional paulista, gestão Abreu Sodré – 1967/1971, tinha dentre suas
cinco diretrizes a expansão do ensino técnico e profissional e o estabelecimento de
uma ação governamental definida no setor de treinamento empresarial (Perez,
1994). Essa reforma, concebida em 1967 e implementada nos anos subseqüentes,
tinha como objetivo redefinir o ensino médio e definir as diretrizes para implementar
uma escola básica de oito anos.
Em 1968 foi elaborado pelo Poder Legislativo um novo Código de Educação para o
Estado de São Paulo (Lei nº 10.125), com ênfase na formação profissional, na
preparação para o trabalho e na necessidade de explorar tendências vocacionais
(art. 35 a 39). O Código de Educação, ao expressar a ideologia nacional
desenvolvimentista, priorizou o ensino técnico e os cursos de aprendizagem como
sustentáculos do desenvolvimento tecnológico e como preparo de recursos humanos
para suprir as demandas do mercado de trabalho.
Durante a gestão de Abreu Sodré foram implementados os ginásios pluricurriculares,
com oficinas de “artes industriais” e “educação para o lar”, e instalado o Centro de
Treinamento de Professores para os Ginásios Pluricurriculares. Eram unidades
escolares que desenvolviam um currículo acadêmico e profissional e tinham por
objetivo desenvolver experiências e pesquisas, constituindo-se em centro de
formação e treinamento de pessoal técnico e docentes. Essa experiência não
encontrou sustentação institucional legal nas normas que regiam o ensino médio em
São Paulo (Perez, 1994). Na realidade, coexistiam dois tipos de classes na mesma
escola e havia falta de professores para as áreas técnicas e práticas.
81
A política educacional paulista era marcada pelo experimentalismo em busca de
novas pedagogias, de novas formas de gestão e da expansão do sistema
educacional. Coexistiam vários tipos e modalidades de escolas de educação
profissional: (a) técnica estadual com mais de um dos três ramos dos cursos
técnicos industrial, agrícola e comercial; (b) colégio industria, colégio agrícola ou
colégio comercial, estadual; (c) escola de aprendizagem estadual; (d) escola de
aprendizagem industrial estadual; (e) escola de aprendizagem agrícola.
O movimento de promover inovações educacionais que se evidenciavam em São
Paulo, parece ter ido na contramão do reforma educacional da década de setenta,
sob a direção do governo militar. A tentativa de São Paulo em construir um nova
proposta de educação escolar a partir do experimentalismo foi interrompida pela
5.692/71. A maior parte das inovações educacionais paulistas foram interrompidas
sem avaliação e muitas delas foram desativadas sem que se conhecessem seus
resultados.
4.2.1. As Reformas Educacionais nos Anos Setenta em São Paulo
O Governo do Estado de São Paulo, num esforço imediato de implementar a
reformulação (Lei nº 5.692/71) da lei de diretrizes e bases (4.024/61), criou um
“Grupo Tarefa” para elaborar o “Planejamento Prévio” e o “Plano Estadual de
Implementação da Reforma de primeiro e segundo graus”. Após exaustivos estudos
e propostas, o Plano não foi implantado.
Este plano já apontava dificuldades de implementação da reforma em relação ao
ensino de segundo grau, devido à profissionalização compulsória. A rede de
estabelecimentos de ensino técnico atendia somente a 2,9% dos alunos de ensino
de segundo grau e a maioria dos prédios da rede pública de ensino básico não
possuía infra-estrutura para implementar a parte profissionalizante, além de
considerarem impossível atender ao leque de habilitações propostas. Optou-se
então pela criação de centros interescolares. Alguns estabelecimentos trabalhariam
com grupos de disciplinas profissionalizantes e outros com disciplinas de formação
geral. Apesar da intensidade e quantidade de estudos, somente algumas medidas
82
isoladas foram implantadas. Após quatro anos de estudos e propostas, em 1975 a
rede física foi reorganizada integrando o primário e o ginásio em escolas de primeiro
grau; também foram criadas escolas que ofereciam tanto o primeiro como o segundo
grau num mesmo prédio.
A implementação da Lei nº 5.692/71, em São Paulo, permitiu que fossem instaladas
93 escolas de ensino técnico agrícola de segundo grau, em convênio com as
prefeituras municipais.
Em decorrência da nova legislação foram extintas as Coordenadorias de Ensino
Superior e Ensino Técnico; foram realizadas mudanças na estrutura administrativa
da Secretaria (Decreto nº 7.510/76); e foi criada a UNESP, integrada pelos institutos
isolados anteriormente vinculados à Secretaria de Educação. No novo
organograma, ainda em vigência, há duas coordenadorias de Ensino: uma para a
região metropolitana da Grande São Paulo (COGSP) e outra para o interior (CEI).
Somente a partir de 1985 a gestão das escolas técnicas passou a contar com uma
estrutura específica com a criação da Divisão de Supervisão e Apoio às Escolas
Técnicas Estaduais (Disaete).
4.3. A educação Profissional pós-constituição de 1988
Embora a proposta de profissionalização universal e ampliação da oferta de ensino
de segundo grau, contida na Lei nº 5.692/71, tenha fracassado, ela possui um
mérito, que foi o alavancamento do debate sobre o papel do sistema educacional,
suas funções na formação dos cidadãos e dos indivíduos, a concepção de ensino
médio e as relações entre educação e desenvolvimento socioeconômico. Esse
debate foi intenso no processo constituinte e na elaboração da nova lei de diretrizes
e bases da educação nacional, tendo como um dos principais interlocutores o Fórum
Nacional em Defesa da Escola Pública, formado pelo Conselho de Secretários
Estaduais de Educação, pelas associações de secretários municipais de educação e
de educadores e pesquisadores da área de educação, pelos sindicatos de
professores e trabalhadores, dentre outros.
83
Neste debate, o Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública buscava definir uma
concepção de educação que respondesse às demandas sociais dentro dos
contextos de desenvolvimento nos quais o país se insere. Discutia-se as novas
formas de relação entre ciência e trabalho na sociedade contemporânea que
deveriam fundamentar o marco constitucional e a lei de diretrizes e bases da
educação nacional. O resultado desse trabalho foi uma proposta do Fórum Nacional
em Defesa da Escola Pública que tratava o sistema educacional, em sua dimensão
de totalidade, a partir da concepção de educação básica unitária comum a todos os
brasileiros.
A educação era compreendida, pelo Fórum, em seu conceito mais amplo, como
aquela que ocorre no interior das relações sociais e não só na escola, reconhecendo
que os processos que se desenvolvem na vida social e produtiva são educativos.
Assim, reconhece a dimensão educativa do trabalho e a necessidade da vinculação
entre o mundo do trabalho e as práticas sociais. Educar passa a ser portanto
preparar o cidadão para constituir-se como humanidade, participando da vida
política e produtiva.
O sistema educacional, da perspectiva do Fórum Nacional em Defesa da Escola
Pública, incorporava todas as possibilidades educacionais até então existentes –
educação infantil (creches e pré-escolas), escolarização e alfabetização de jovens e
adultos, formação técnico-profissional, educação para portadores de deficiências,
educação indígena etc. Nenhuma forma de educação, escolarizada ou não, deveria
ser organizada fora dos marcos do sistema nacional de educação. O pressuposto
era de que toda a população brasileira deveria ter acesso a uma educação básica e
comum, a ser completada pela educação profissional – seja em cursos integrados ao
sistema educacional seja no próprio trabalho.
Esta concepção de educação desenvolvida pelo Fórum Nacional de Educação em
Defesa da Escola Pública foi contemplada na lei de diretrizes e bases da educação
nacional (Lei nº 9.394/96).
“A educação abrange os processos formativos que se desenvolvemna vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nasinstituições de ensino e pesquisa, nos movimento sociais e
84
organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais” (Leinº 9.394/96, art. 1o).
Entretanto, a LDB acaba por restringir a concepção de educação quando traça
diretrizes apenas para a educação que ocorre em espaços escolares. A educação é
aquela que “se desenvolve, predominantemente, por meio de ensino, em instituições
próprias” e “deverá vincular-se ao mundo do trabalho e à prática social” (Lei nº
9.394/96, art. 1o).
Também a proposta de criação de um sistema nacional de educação não foi
contemplada na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 394/96),
embora estivesse presente no projeto aprovado pela Câmara dos Deputados em
junho de 1990; prevaleceu a concepção de diferentes sistemas de ensino, sob o
argumento de que um sistema nacional era inconstitucional e feria o princípio
federativo que permitia a organização de sistemas de educação municipal e/ ou
estadual. De fato, a Constituição Federal de 1988 contém a expressão “sistemas de
ensino” da União, dos Estados e dos Municípios, e não sistema nacional de
educação. Portanto, prevaleceu a concepção de sistemas de ensino privilegiando a
educação escolarizada em detrimento da concepção mais abrangente de educação.
Estas questões também contaminaram, de forma contraditória, a discussão sobre
ensino médio e educação técnico-profissional. Há duas posições nas propostas
governamentais: de um lado, a organização de um sistema nacional de educação
permite a criação de cursos profissionalizantes, stricto sensu, em paralelo à
educação básica; de outro, haveria vários sistemas, dentre eles o sistema nacional
de educação tecnológica.
A concepção de sistema nacional de educação tecnológica, formulada em 1991, em
conjuntura pós-constitucional, tem sido reiterada nas propostas de reforma em
curso. Esse sistema é concebido como aquele capaz de articular as iniciativas de
educação profissional e definir políticas e normas para a área, respondendo aos
desafios da era tecnológica. Embora alicerçado na concepção de educação que
articula todas as modalidades de educação básica, como direito indispensável à
cidadania e sem a qual não é possível a formação profissional, acaba por repor a
85
histórica dualidade estrutural, a que nos referimos diversas vezes neste texto, que
supõe necessária uma educação tecnológica diferenciada e paralela à educação
básica. Esta proposta apresenta a separação entre ciência e tecnologia, entre
atividade teórica e atividade prática, entre fazer e pensar.
4.4. A Educação Profissional na LDB – Lei de Diretrizes e Bases daEducação Nacional
Para a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional há somente dois níveis
de educação: básica e superior. A educação básica é constituída por educação
infantil, ensino fundamental, ensino médio e educação de jovens e adultos
(escolarização e alfabetização), comum a todos os cidadãos jovens para que
consolidem e aprofundem os conhecimentos anteriormente adquiridos e para melhor
compreensão do significado da ciência e da tecnologia, das artes, das letras e das
manifestações culturais.
A educação profissional não integra a educação básica, como estava originalmente
no projeto aprovado pela Câmara dos Deputados, em junho de 1990; e, inclusive,
pode ser desenvolvida independentemente do nível de escolarização. No projeto da
Câmara dos Deputados, a formação profissional articulava-se à formação geral e
humanística e era parte do ensino médio, compreendendo a escola deste nível de
ensino como disseminadora de conhecimentos científicos e humanísticos que
poderiam criar condições tanto para a aquisição de uma profissão quanto para a
continuação dos estudos.
O capítulo III da LDB (Lei nº 9.394/96), que trata especificamente da educação
profissional, é apenas uma carta de intenções, já que não define instâncias,
competências ou responsabilidades, como pode ser verificado na transcrição do
capítulo abaixo33.
Art. 39. A educação profissional, integrada às diferentes formas deeducação, ao trabalho, à ciência e à tecnologia, conduz aopermanente desenvolvimento de aptidões para vida produtiva.
33 Este capítulo da LDB sobre educação profissional foi um dos mais polêmicos, durante a tramitação do projetode lei, daí a fragilidade das formulações que permitem diferentes e contraditórias interpretações.
86
Parágrafo único. O aluno matriculado ou egresso do ensinofundamental, médio e superior, bem como o trabalhador em geral,jovem ou adulto, contará com a possibilidade de acesso à educaçãoprofissional.Art. 40. A educação profissional será desenvolvida em articulaçãocom o ensino regular ou por diferentes estratégias de educaçãocontinuada, em instituições especializadas ou no ambiente detrabalho.Art. 41. O conhecimento adquirido na educação profissional,inclusive no trabalho, poderá ser objeto de avaliação,reconhecimento e certificação para prosseguimento ou conclusão deestudos.Parágrafo único. Os diplomas de cursos de educação profissional denível médio, quando registrados, terão validade nacional.Art. 42. As escolas técnicas e profissionais, além de seus cursosregulares, oferecerão cursos especiais, abertos à comunidade,condicionada a matrícula à capacidade de aproveitamento e nãonecessariamente ao nível de escolaridade.” (Lei nº 9.394/96,capítulo da Educação Profissional).
A nova LDB, ao considerar as limitações de uma sociedade em que a divisão social
e técnica do trabalho impõe uma dualidade estrutural, trata a educação profissional
apenas na sua relação com o mercado de trabalho e como requisito para acesso ao
emprego. A desvinculação do ensino médio, oferecendo o ensino técnico seqüencial
ou paralelo, dissocia a educação técnica da formação geral. Uma das intenções da
LDB foi romper com a concepção, até então preponderante, de ensino médio
constituído na mediação entre a educação fundamental e a formação profissional
stricto sensu.
4.5. A Educação Profissional no Decreto nº 2.208/97
Após a promulgação da LDB, os artigos referentes ao ensino profissional foram
regulamentados pelo Decreto nº 2.208/9734 e a Portaria MEC 646/97 (para a rede
federal de educação tecnológica). Apresentamos a seguir o detalhamento do decreto
que estabelece as diretrizes para a implementação da reforma do ensino
profissional.
Os proponentes da reforma da educação profissional, sob o argumento de que as
escolas técnicas de boa qualidade eram cursadas apenas pelos jovens das
34 O Decreto nº 2.208/97 substituiu o Projeto de lei nº 1.603/96, que estava em tramitação na Câmara dosDeputados.
87
camadas médias, propuseram a transformação dessas escolas em instituições que
oferecem apenas módulos ou cursos destinados exclusivamente à profissionalização
de jovens e adultos trabalhadores.
4.5.1. Os Objetivos da Educação Profissional
A educação profissional, segundo o Decreto nº 2.208/97, deverá promover a
transição entre a escola e o mundo do trabalho; formar profissionais com
escolaridade de nível médio, superior e pós-graduação; promover conhecimentos
tecnológicos do trabalhador em nível de especialização, aperfeiçoamento e
atualização; e qualificar, reprofissionalizar e atualizar os trabalhadores independente
de sua escolaridade.
4.5.2. Formas de Realização da Educação Profissional
A reforma da educação profissional prevê, segundo o Decreto nº 2.208/97, dois tipos
de formação: a formal em instituições especializadas e a não-formal, adquiridas por
diversos meios, e até no trabalho. “Educação profissional articulada com o ensino
regular ou por diferentes estratégias de educação continuada, em instituições
especializadas ou no ambiente de trabalho”. (Art. 40, Lei nº 9.394/96; Art. 2, Decreto
nº 2.208/97).
4.5.3. Níveis da Educação Profissional
O Decreto nº 2.208/97 define três modalidades de educação profissional: básico,
técnico e tecnológico, que corresponde aos níveis de ensino fundamental, médio e
superior.
O primeiro nível – básico – Trata-se de qualificação ocupacional dirigida aos
jovens e adultos que não tiveram oportunidade de freqüentar a escola regular e,
para aqueles que estejam cursando o ensino fundamental e queiram ter uma
formação específica para o exercício de uma ocupação. A educação profissional de
nível básico de modalidade não-formal e de duração variável poderá ser realizada
em instituições de educação profissional públicas ou apoiadas pelo poder público
88
através de cursos básicos para alunos de educação fundamental e trabalhadores
(independente da escolarização). Esses cursos terão certificação profissional.
Os cursos de curta duração ou de módulos independentes serão oferecidos segundo
a lógica do mercado, através da identificação de perfis, estudos de demanda e
acompanhamento de egressos. São cursos que atingirão a maioria da população,
pois cerca de dois terços da população brasileira economicamente ativa (PEA) entre
25 e quarenta anos de idade não possui escolaridade de nível fundamental e precisa
de alternativas de qualificação profissional.
O segundo nível – técnico – é destinado aos matriculados ou egressos do ensino
médio; oferta profissionalização em áreas definidas mediante habilitações
profissionais, formação que pressupõe conhecimentos técnicos e científicos
embasados na educação geral. O nível técnico será organizado independentemente
do ensino médio, oferecido de forma seqüencial ou concomitante, ministrado por
instituições públicas e privadas, de âmbito federal, estadual ou municipal e
estruturado por áreas ou setores da economia. Pode ser organizado de duas formas:
estruturada ou modulada. Os sistemas federal e estaduais, através de exames,
poderão certificar as competências objetivando a dispensa de disciplinas ou módulos
de cursos técnicos.
O ensino modular possibilita que a qualificação e habilitação profissional sejam
obtidas através da soma de certificados de comprovação de competências e
habilidades, de aproveitamento de créditos das disciplinas profissionalizantes da
parte diversificada do currículo. A forma modular facilita a fragmentação e a
desarticulação da formação técnica e acadêmica.
Os currículos35 dos cursos de ensino técnico, segundo o Decreto nº 2.208/97, serão
definidos a partir de parâmetros nacionais, mantendo a concepção de currículo
básico por habilitação profissional. Às instâncias subnacionais – estados – caberá a
definição de apenas 30% do conjunto do currículo proposto. A definição de um
núcleo de conhecimentos e habilidades comuns por área ou setor da economia,
35 Currículo é aqui definido como conteúdos e práticas relevantes em determinado momento histórico,transmutados para a escola (WILLIAMS, R. 1984. Culture. London: Falmer Press).
89
acessível a todos os estudantes de cursos técnicos no país e que seria
complementada por conhecimentos de base estadual ou regional, é o eixo central da
concepção de parâmetros curriculares propostos pelo Ministério da Educação.
A questão da formulação dos currículos, base para a elaboração de uma concepção
de formação profissional, contém muitas controvérsias. Os documentos formulados
pelo Ministério da Educação contribuem para diferentes interpretações.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional apresenta uma concepção de
currículo do ensino médio como aquele que combina a formação geral com a
preparação para o trabalho, sugerindo que é possível organizar o ensino médio com
uma parte de formação profissional:
“O ensino médio, atendida a formação geral do educando, poderáprepará-lo para o exercício de profissões técnicas” (art. 36, Lei nº9.394/96).
Também o Decreto nº 2.208/97 permite que o currículo seja organizado com uma
parte (25%) diversificada de conteúdo e práticas profissionalizantes. A novidade é
que as disciplinas (e práticas) profissionalizantes poderão ser aproveitadas nos
cursos de formação profissional de nível técnico, repondo o problema da
fragmentação entre a educação técnica e a acadêmica.
O documento do MEC que orienta o debate e formulação do Plano Nacional de
Educação afirma que “essa preparação para o trabalho pode incluir disciplinas que
capacitem os alunos para exercitarem atividades profissionais no setor terciário da
economia” (p. 26 e 27). Esta orientação apresenta uma possibilidade de
profissionalização no interior do próprio ensino médio. Sugere também que a
formação de técnicos para área de serviços seja realizada com menor requerimento
educacional.
“A reforma do ensino médio é dupla. De um lado, permite uma partediversificada no currículo, na qual podem ser oferecidas disciplinasque preparem para o trabalho e possam ser aproveitadas nocurrículo de habilitação profissional e que eventualmente venham aser cursadas, independente de exames específicos. Essas
90
disciplinas podem também propiciar o ingresso imediato do aluno nomercado de trabalho em ocupações no setor terciário da economia.De outro, permite a oferta de cursos técnicos concomitantementecom o ensino médio, podendo o aluno cursá-lo no mesmoestabelecimento ou em instituições especializadas” (MEC : p. 30).
Quanto às relações entre ensino médio e formação profissional, os documentos
governamentais possibilitam diferentes arranjos curriculares.
O terceiro nível – tecnológico – é destinado aos egressos do ensino médio ou
técnico. Corresponde ao curso superior e é dirigido à preparação de tecnólogos
busca-se o domínio de processos de trabalho adquiridos mediante conhecimentos
teóricos e práticos. Este nível se organiza através de cursos superiores estruturados
de acordo com os setores da economia, e responde a uma concepção já
consolidada de que os cursos de nível superior são dirigidos a formar profissionais.
4.6. PARECER 16/99
Neste parecer, duas indicações do Aviso Ministerial nº 382/98 são consideradas
premissas básicas: as diretrizes devem possibilitar a definição de metodologias de
elaboração de currículos a partir de competências profissionais gerais do técnico por
área; e cada instituição deve poder construir seu currículo pleno, de modo a
considerar as peculiaridades do desenvolvimento tecnológico com flexibilidade e a
atender as demandas do cidadão, do mercado e da sociedade.
Nesta construção, a escola deve conciliar as demandas identificadas, sua vocação
institucional e sua capacidade de atendimento. Além disso, as diretrizes não devem
se esgotar em si mesmas, mas conduzir ao contínuo aprimoramento do processo de
formação de técnicos de nível médio, assegurando sempre a construção de
currículos que atendam aos princípios de flexibilidade e de laborabilidade,
indispensáveis à inserção e reinserção profissional desses técnicos no mercado de
trabalho atual e futuro.
Considerando, portanto, essa concepção de educação profissional consagrada pela
LDB e, em sintonia com as diretrizes curriculares nacionais já definidas, as
91
presentes diretrizes caracterizam-se como um conjunto articulado de princípios,
critérios, definição de competências profissionais gerais do técnico por área
profissional e procedimentos a serem observados pelos sistemas de ensino e pelas
escolas na organização e no planejamento da educação profissional de nível
técnico.
Nesse sentido, as matrizes, revisadas e atualizadas a partir do Parecer CEB/CNE nº
16/99 e da resolução CEB/CNE nº 04/99, são apresentadas como Referenciais
Curriculares Nacionais para a Educação Profissional. O foco central deste parecer
está em responder ao novo perfil que laborabilidade ou a trabalhabilidade vem
assumindo. Assim a nova educação profissional desloca o foco do trabalho
educacional do ensinar para o aprender, do que vai ser ensinado para o que é
preciso aprender no mundo contemporâneo e futuro.
Em síntese, a realização competente de uma educação profissional tem nela
agregados saberes cognitivos, psicomotores e socioafetivos. A competência
caracteriza-se, essencialmente pela condição de alocar esses saberes, como
recursos ou insumos, através de análises, sínteses, inferências, generalizações,
analogias, associações, transferências, ou seja, de esquemas mentais, adaptados e
flexíveis, em ações própria de um contexto profissional específico, gerando
desempenhos eficientes e eficazes.
A tabela 1 identifica os pontos essenciais da mudança de paradigma que está no
núcleo da reforma da educação, particularmente da educação profissional.
92
Tabela 4.1. – Mudança de Paradigma da Educação Profissional
Paradigma em Superação Paradigma em Implantação
Foco nos CONTEÚDOS a serem
ensinados
Foco nas COMPETÊNCIAS a serem
desenvolvidas / nos SABERES ( saber,
saber fazer e saber ser) a serem
construídos.
Currículo como fim, como conjunto
regulamentado de disciplinas.
Currículo como conjunto integrado earticulado de situações-meio,
pedagogicamente concebidas e
organizadas para promover aprendizagens
profissionais significativas
Alvo do controle oficial:
Cumprimento do Currículo.
Alvo do controle oficial: geração dasCompetências profissionais gerais.
Fonte: Mec/2000
É importante ressaltar, que essa renovação não se fará sem a ruptura com o modelo
pedagógico tradicional, ao qual estamos histórica e fortemente vinculados, e sem
uma corajosa e responsável vontade de, efetivamente, revolucionar (MEC, 2000).
Vimos nesse capítulo o processo histórico do surgimento da educação profissional
no Brasil e em São Paulo. Compreendemos através desse resgate histórico como
desenvolveu-se os modelos pedagógicos de educação, a partir das mudanças que
ocorreram no mundo do trabalho e das relações sociais. As reformas aqui citadas
demonstram claramente a tentativa de responder as mudanças caracterizadas pelo
momento. Entretanto, constatamos que o modelo pedagógico foi sendo ajustado ao
longo da história para atender às demandas da divisão social e técnica do trabalho,
marcada pela clara definição de fronteiras entre as ações intelectuais e
instrumentais, ou seja a pedagogia taylorista-fordista. As instituições de ensino, por
93
sua vez, também foram ajustadas ao longo da história para atender às demandas
da divisão social e técnica do trabalho.
Em decorrência das transformações atuais no mundo do trabalho, o universo das
organizações passa a ser invadido pelos novos procedimentos de gerenciamento. O
novo discurso refere-se a um novo tipo de trabalhador. Portanto, o objetivo
educacional a ser atingido é preparar os alunos para lidar com a incerteza,
substituindo a rigidez pela flexibilidade, de modo a atender a demandas dinâmicas,
que se diversificam em qualidade e quantidade. Portanto, analisaremos no próximo
capítulo como uma instituição de ensino se prepara para atuar nesse novo contexto.
95
Capítulo 5
A Instituição de Ensino Frente as Novas Demandas
Nesse capítulo será apresentado as características do Ceeteps, diagnóstico de sua
gestão atual, assim como também as propostas de mudanças quanto à sua gestão
institucional. Essas mudanças privilegiam o atendimento às novas demandas do
mercado de trabalho conforme vimos no capítulo I. Antes de desenvolver a análise
da gestão do Ceeteps, é importante concentrar o foco de atenção na compreensão
da instituição de ensino como um todo e na sua inter-relação com os demais
agentes do ramo de atividade – setor educacional – ao qual pertence, na análise das
finalidades e missão, bem como na indentificação de produtos, mercados,
fornecedores, concorrentes e órgãos normativos oficiais. Tal compreensão não só
permitirá estabelecer traços comuns a uma instituição de ensino, mas também
delinear as estratégias inerentes a uma instituição de ensino típica.
5.1. Caracterização de uma Instituição de Ensino
Adotando um enfoque sistêmico, poder-se-ia representar uma instituição de ensino
como um macrosistema, em permanente interação com o meio ambiente.
Insumos, produtos e clientes
FORNECEDORES == Insumos=== IE === Produtos === CLIENTES
Tachizawa e Andrade36, nos falam que:
“Por fornecedores entendem-se as entidades/agentes que fornecemrecursos à instituição de ensino, na forma de bens, serviços, capital,materiais, equipamentos e demais recursos, que por sua vezconstituem os insumos necessários às atividades internas dasinstituições de ensino. Nesse contexto, a figura do professor surgecomo o principal (colaborador ou parceiro) da instituição de ensino”(40:1999).
E por sua vez clientes internos são representados:
36 Takeshy Tachizawa e Rui Otávio Bernardes de Andrade: Gestão de Instituições de Ensino- 1999
96
“Pelos funcionários da instituição de ensino e, principalmente, pelosalunos/estudantes. Estes últimos podem ser considerados, ainda,clientes intermediários, enquanto alunos, convivendo com ainstituição e recebendo conhecimentos ao longo do processo ensino-aprendizagem. As organizações, empregadoras dos alunosformados pelas instituições de ensino são consideradas, para efeitodesse estudo, os clientes finais (ou mercado)”(40:1999).
Por produto, em sentido amplo entende-se que:
É o resultado e uma série de atividades realizadas internamente nainstituição de ensino, entende-se o profissional formado de acordocom as especificações sinalizadas pelo mercado. Em sentido estrito,poderiam ser considerados produtos os serviços educacionais, comoos resultados de pesquisa, serviços de consulta e outros serviçosdemandados pela comunidade.
Mercado é subentendido como:
“O conjunto de clientes externos, constituído das organizações quepotencialmente irão absorver os profissionais formados e colocadosdisponíveis pelas instituições de ensino. Dessa forma, empresaspúblicas e privadas, indústrias manufatureiras, organizaçõesgovernamentais e demais entidades, que constituem os diferentessetores da economia, são os clientes finais do produto (profissionalformado) colocado à disposição da comunidade”( 40:1999).
Assim, para esses autores, um dos grandes problemas com que se defrontam as
organizações, inclusive as instituições de ensino, é a visão extremamente
segmentada, setorizada que a maioria tem delas mesmas. Isto leva a conflitos e
divergências operacionais que minimizam o resultados dos esforços. Com relação a
uma instituição de ensino, deve-se adotar uma visão sistêmica, global, abrangente e
holística, que possibilitaria perceber as relações de causa e efeito, o início, o meio e
o fim, ou seja, as inter-relações entre recursos captados e valores obtidos pela
instituição.
A adoção do enfoque sistêmico permite que a instituição de ensino analise o meio
ambiente e defina o cenário provável, à longo prazo, a partir do qual se delineiam
objetivos institucionais e respectivas estratégias para atingi-los. Posteriormente, são
identificados processos sistêmicos-chave indispensáveis para dar suporte a tal
97
delineamento estratégico. A instituição de ensino deve ser visualizada como um
conjunto de partes em constante interação, constituindo-se um todo orientado para
determinados fins e, em permanente relação de interdependência com o ambiente
externo. A adoção do enfoque sistêmico, que considera a instituição um
macrosistema – aberto interagindo com o meio ambiente, pode ser entendida como
um processo que procura converter recursos em produtos – serviços educacionais –
em consonância com seu modelo de gestão, missão, crenças e valores corporativos
(Tachizawa, Andrade: 1999).
A abordagem sistêmica, presente em todos os elementos do modelo de gestão,
visualiza a instituição de ensino de fora para dentro, de cima para baixo e do geral
para o particular. Esses são os maiores desafios para as instituições de ensino
profissional. Tendo esse raciocínio como escopo de nosso trabalho, optamos por
fazer um diagnóstico da estrutura organizacional de uma instituição de ensino
profissionalizante, que está nesse momento redefinindo suas formas de gestão
interna, o Centro Paula Souza.
5.2. Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza – CEETEPS
O Ceeteps é uma autarquia de regime especial, mantida pelo governo do Estado de
São Paulo, “vinculada e associada à Universidade Estadual Paulista“ Julio de
Mesquita Filho – UNESP. Foi criada pelo governo do estado de São Paulo, por
Decreto-Lei de 06/10/69, e instalada em 1970. Na sua criação foram explicitadas as
seguintes diretrizes:
“Incentivar ou ministrar cursos de especialidades correspondentesàs necessidades e características dos mercados de trabalhonacional e regional, promovendo experiências e novas modalidadeseducacionais, pedagógicas e didáticas e o seu entrosamento com otrabalho; e formar pessoal docente destinado ao ensino técnico, emseus vários ramos e graus, em cooperação com universidades degraduação de professores; desenvolver outras atividades quepossam contribuir para a consecução de seusobjetivos”(Motoyama:468:1995).
98
Em 1976, com a criação da Unesp, o Ceeteps transformou-se em uma “entidade
associada à Unesp, vinculada para fins administrativos e associada para fins de
ensino e pesquisa”. A partir de então, o reitor da Unesp passou a designar o
conselho deliberativo e o diretor-superintendente passou a ser designado pelo
governador com base em uma lista tríplice enviada pelo reitor. No entanto, o
CEETEPS, na sua origem, não era responsável por cursos técnicos de 2º grau,
estando sob sua jurisdição apenas as Faculdades de Tecnologia. Essa
responsabilidade foi assumida gradativamente pela instituição face a dificuldade
encontrada pela Secretaria da Educação para continuar administrando a rede de
ensino técnico existente no estado após os sucessivos percalços desencadeados
pela vigência da Lei nº 5692/71. Assim, o CEETEPS assumiu, inicialmente, um
grupo restrito de 18 escolas técnicas. Nos anos 90, a Secretaria da Educação abre
mão da gestão das restantes escolas da rede estadual de ensino técnico, que
passam a fazer parte do quadro da Secretaria Estadual de Ciência e Tecnologia.
Desde essa época a supervisão e gerenciamento das 99 escolas técnicas
estaduais, então existentes, passou a ser realizada pelo CEETEPS, todas elas
funcionando de acordo com as determinações da LDB então vigente, assim para
Motoyama:
“O Centro foi criado em 1969 para formar técnicos e tecnológos,sendo esta sua primeira atribuição; formar professores para o ensinotécnico, a segunda e a terceira, dar as formações possíveis eimaginárias na área do trabalho. Ele já nasceu com essa idéia erealmente mostrou que era competente para isso, quando em 1981recebeu seis escolas, e mais seis em 1982. Nessa ocasião, estavatudo pronto para receber as outras- com a mudança de governo istonão se concretizou. Depois, o Centro gerou duas escolas,mostrando, enfim, uma vocação pública também para o ensino 2ºgrau. As 82 escolas estavam em situação indefinida, saíram da rededa Secretaria da Educação e foram para uma secretaria que nãotinha afinidade com ensino, ficando sem a devidaatenção”(Motoyama:434:1995).
Atualmente o CEETEPS está presente em 90 munícipios paulistas, com 8 mil
funcionários e atende cerca de 90 mil alunos em cursos regulares e
aproximadamente 40 mil por ano em cursos de qualificação profissional, atualização
e reprofissionalização, assim :
99
“As FATECs oferecem 17 habilitações diferentes, enquanto as ETEsoferecem 41 habilitações. Semestralmente são abertas 1610 vagaspara as FATECS e aproximadamente 27 mil vagas anuais para asETEs, atendendo desta forma, cerca de 84 mil alunos, tornando-se omaior núcleo de desenvolvimento técnico- tecnológico da AmericaLatina ( SINTEPS, 1996).
A tabela a seguir demonstra os cursos, vagas e número de inscritos dos cursos
técnicos mais procurados nas escolas técnicas estaduais:
Tabela 5.1. - Alunos inscritos nos cursos técnicos mais procurados
CURSO VAGAS INSCRITOS DEMANDA
Auxiliar de Enfermagem 1.188 7.876 6,63
Telecomunicações 325 2.024 6,23
Mecatrônica 430 2.643 6,15
Informática 2.902 14.812 5,10
Nutrição e Dietética 940 4.337 4,61
Administração 2.315 10.028 4,33
Eletrônica 1.473 5.572 3,78
Turismo 735 2.584 3,52
Fonte: Vestibular 2000 – Ceeteps
O Ceeteps oferece atualmente 52 habilitacões, e neste último vestibular ofereceu
21.817 vagas, tendo um total de 78.340 inscritos, o que corresponde a uma
demanda de mais ou menos 4 candidatos por vaga. Esses dados nos mostram que
o Ceeteps é uma instituição expressiva no Estado de São Paulo, daí a importância
de reforçar práticas de ensino à necessidade da demanda.
5.3. Diagnóstico da Gestão atual do Ceeteps
O Ceeteps mantém uma rede pública de ensino técnico considerada, por diferentes
análises e documentos, como de boa qualidade e bem próxima à concepção
100
politecnica. Os princípios e padrões aceitos e mantidos pelos indivíduos que
compõem a organização estão referidos à missão tal como definida no regimento de
1981, que caracteriza o Ceeteps como uma organização de ensino regular. Outro
valor é a cultura da excelência desse ensino, que merece ser estimulado
continuamente.
O Ceeteps hoje é uma organização tradicional, piramidal e segmentada por
especialização. Esse desenho respondia à história da instituição, à forma pela qual
ela foi incorporando o ensino técnico de 2º grau e o ensino técnico de 3º grau e,
marginalmente, cursos de educação profissional básica. Nesse modelo esses três
conjuntos são independentes, e dificuldades de articulação são estimuladas pela
departamentalização vigente. Outro aspecto importante a ser considerado, é o curto
período em que o Ceeteps recebeu a maior parte das escolas (1994). Isso ocorreu
no momento em que as escolas recebidas em 1981 haviam formado um grupo, para
ser interlocutor junto à administração central. Com a ampliação da rede e do corpo
funcional do Ceeteps, houve a inserção de elementos culturais e de práticas de
trabalhos externos, que foram sendo absorvidos ao longo do tempo, mas que, por
outro lado, romperam a unidade que havia na rede anteriormente.
Esse diagnóstico confirma que o modelo de gestão do Ceeteps estava voltado para
dentro, ou seja para os processos de funcionamento das unidades escolares e da
instituição em si. Assim, o Ceeteps mantém uma postura reativa e não pró-ativa na
sua relação com o mercado empregador. Essa postura é resultado em grande parte
pela lentidão de resposta ocasionada por dificuldades burocráticas e jurídicas. Isso
ocorre tanto no estabelecimento de parcerias com empregadores quanto na criação
de novos cursos. Parte dessas dificuldades podem ser atribuídas ao fato de que
toda instituição pública está submetida às normas de direito público, o que impõe
grande complexidade à gestão, uma vez que impõe ritos e procedimentos morosos,
rígidos e onerosos. Para Aguiar o problema é explicado ainda pela postura reativa e
não pró-ativa da Instituição, na sua relação com o mercado empregador (Aguiar,
1998:41 in Fundap).
Explica, também essa postura reativa, ou a pouca interação da Instituição com o
mercado empregador, o fato de nem toda unidades escolar estar suficientemente
101
equipada (equipamentos, laboratórios, bibliotecas) ou seja, haver um desequilíbrio
na capacidade tecnológica das escolas. Isso contribui para o distanciamento uma
vez que, por um lado, o mercado não reconhece a possibilidade de contribuição da
escola, e por outro, a escola se inibe ante uma possível capacidade tecnológica
maior dos empregadores, além de não fazer parte da cultura empresarial uma
interação com o setor educacional público que resulte em uma demanda definida e
estruturada.
Quanto à criação de novos cursos, contribui para maior dificuldade a vinculação com
a Universidade na medida em que o Ceeteps é para ela um satélite afastado das
suas prioridades, mas submetido aos seus procedimentos e agenda. O professor
Marcos Monteiro37 nos fala da fragilidade do vínculo entre a Unesp e o Ceeteps,
evidenciando que é um dos maiores obstáculos para o cumprimento da proposta de
reforma do ensino.
Comprovadamente, essas diferenças, de certa forma previstas, tornaram-se mais
acentuadas conforme os objetivos das duas instituições foram se delineando.
Assim, vale destacar que o Centro Paula Souza, como instituição profissionalizante,
caracteriza-se por políticas diferenciadas de atendimento, tendo em vista as várias
regiões do Estado de São Paulo em que se faz presente. Portanto a fragilidade do
vínculo torna-se evidente, quando se pensa que:
• Embora o Conselho Universitário da UNESP se manifeste sobrealgumas questões administrativas com implicações econômico-financeiras, o Centro Paula Souza tem orçamento próprio;
• O vínculo não representou condição essencial nas ações isoladasdos trabalhos conjuntos não sistemáticos;
• O Centro Paula Souza, como autarquia de regime especialmantém orçamento sob a responsabilidade das Secretarias daFazenda, Planejamento, Ciência e Tecnologia bem como doTribunal de Contas do Estado, não representando relevânciaorçamentária qualquer outro vínculo (Jornal –Ceeteps-jun/2000).
Dessa forma, o projeto que tramita na Assembléia Legislativa do Estado de São
Paulo, que solicita a desvinculação do Centro da UNESP para vinculação direta à
Secretaria de Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Econômico do Estado de São
Paulo, atende à necessidade da nova condição da instituição no século XXI, com
102
maior autonomia e mobilidade para criar novos cursos, reciclar os já existentes,
capacitar professores e sintonizar com o que de mais moderno se produz no
mundo(Monteiro:2000).
Assim, Monteiro ressalta que é importante esclarecer:
• A desvinculação do Centro Paula Souza da Unesp não altera ostatus dos cursos ministrados pelas Fatecs, que continuarãosendo de nível superior;
• Não haverá modificação na dotação orçamentária ou na políticade remuneração de servidores e professores, considerando queserá mantida a mesma política adotada há cinco anos, totalmenteindependente das demais entidades vinculadas à Secretaria deCiências e Tecnologia;
• As novas diretrizes e políticas da instituição requerem a estreitaintegração com o setor produtivo, prevêem a ampliação deparcerias entre as escolas e as empresas, privadas ou públicas,não significando, com essa orientação, que o Centro PaulaSouza caminhe para a privatização.
Essa questão, no entanto, é considerada pela direção um dos maiores obstáculos
para implantação das mudanças preconizadas na nova legislação.
Diante dos problemas levantados, a instituição se viu obrigada a desenvolver um
plano de ação que signifique não somente a separação entre ensino médio e ensino
profissional, reequacionando-os, mas sobretudo a transformação do seu modelo de
gestão, criando e desenvolvendo os instrumentos (sistemas) necessários ao novo
modelo, criando condições para a mudança da cultura organizacional, a revisão dos
sistemas existentes e o melhor equacionamento do financiamento da rede de ensino
profissional.
Quanto ao padrão que caracteriza o Ceeteps como organização de ensino regular,
pode-se afirmar que seja um obstáculo à mudança ocorrida na missão institucional.
Ainda que permaneçam os cursos de ensino regular, a educação técnica foi
separada do ensino médio, o que exigiria uma mudança importante nas escolas. A
educação profissional modular passou a receber nova ênfase, desvinculada da
37 Marcos Antonio Monteiro é Diretor Superintendente do Centro Paula Souza.
103
escolaridade, e que exige um movimento contínuo de antecipação e de adequação
às necessidades e demandas do mundo do trabalho.
Um outro padrão que faz parte da cultura organizacional do Ceeteps, mas que é um
obstáculo à inovação, é o deslocamento do processo decisório do nível local, que
permanece concentrado no nível central da organização. O nível local parece
identificar as decisões como “decisões do Paula Souza” ou lá de cima”. E o nível
central gesta solitariamente normas e práticas que passam a ser regras a serem
cumpridas pelo nível local e são objeto de uma supervisão que é formal mas não de
conteúdo. Essa questão também tem, é claro, relação com o perfil dos dirigentes e
profissionais do nível local, muito referidos ao próprio espaço da escola. Esse
padrão, de qualquer modo, leva à desresponsabilização do nível local pelos
resultados e dificulta a introdução de novas posturas e posições proativas
necessárias para que o Ceeteps construa sua nova inserção.
Todas essas situações foram vivenciadas e percebidas no dia a dia, por ocasião do
exercício de nossa função como professora. Ao manter vínculo empregatício em
duas unidades do Ceeteps, convivemos e partilhamos com os colegas de trabalho,
as dificuldades de desempenhar um trabalho com qualidade, ora por deficiências
quanto à disponibilidade de recursos financeiros, humanos, estruturais e
tecnológicos, ora pela estrutura burocrática presente na gestão escolar. A exemplo
de uma situação burocrática, podemos citar a interrupção de um trabalho
desenvolvido em uma das escolas, por obedecer o critério de contratação por prazo
determinado (Conforme CLT). O problema não é contratar o professor por prazo
determinado, o problema se dá quando o prazo encerra e o profissional deve ser
afastado da instituição, podendo retornar apenas depois de seis de afastamento.
Esse procedimento frequentemente causa transtornos de ambos os lados, pois a
instituição se vê obrigada a substituir esse profissional, dificultando assim o seu
retorno, o trabalho é interrompido e consequentemente a qualidade do produto final
e a satisfação ficam comprometidas.
104
5.4. A nova organização do Ceeteps
A partir das mudanças no cenário, identificadas e detalhadas nos estudos
realizados, reforçaram a necessidade de reestruturar o Ceeteps, qualificando-o
como uma organização pró-ativa na articulação com a sociedade e o mundo do
trabalho, não só no tocante à escolha de conteúdos e formatos dos módulos, mas
também com relação às próprias possibilidades de integração.
A nova organização deve privilegiar sua atuação extramuros, no processo de
tomada de decisão, perfil e instrumentos gerenciais, de modo a preparar o Ceeteps
para gerenciar uma nova situação em um novo cenário. Dessa forma, uma proposta
básica de reorganização do Ceeteps teve origem no desencadeamento do processo
de planejamento, nas perspectiva do planejamento estratégico, com a redefinição da
missão e o estabelecimento de um elenco de objetivos estratégicos, ou seja,
objetivos que orientam o comportamento da organização como um todo para
direcionar o seu processo decisório.
Nessa dimensão a proposta do novo modelo de gestão privilegia a descentralização
e a concepção de atuação em rede. A concepção de rede considera não apenas a
rede de escolas, mas sim articulação de uma rede de parcerias, visando alcançar
efeitos sinérgicos de inserção da clientela no mercado de trabalho regional.
Desse modo, as questões básicas que nortearam a proposta de um modelo básico
para a reorganização do Ceeteps foram:
• a necessidade de voltar a organização para o mundo do trabalhoe para integração com a comunidade;
• a oportunidade de promover a articulação do Ceeteps com outrasinstituições científicas e tecnológicas;
• a necessidade de superar a dicotomia interna na gestão dosdiferentes níveis de ensino;
• a promoção de uma nova articulação da rede, cuja ampliaçãonão foi planejada;
• a reorientação do modelo de gestão, com ênfase em resultados;• a introdução planejada de um conjunto de inovações, buscando
sua inserção na cultura organizacional.
105
Em linhas gerais as mudanças vem sendo implementadas gradativamente em cada
unidade da rede. Refere-se a uma abordagem responsiva às necessidades de
preparação da área técnico-pedagógica, de articulação com o setor produtivo e a
sociedade e de reordenamento jurídico institucional para viabilizar a nova educação
profissional em São Paulo. Isso significa tornar o Ceeteps capaz de realizar a
educação profissional em nova perspectiva pedagogica, de articular-se ativamente
com o setor produtivo e outros segmentos da sociedade civil.
Para ilustrar tais propostas levantamos dados sobre algumas ações que estão se
concretizando norteadas por essa proposta de reorganização:
“Curso de Mecatrônica e Logística Industrial oferecido exclusivamente aosfuncionários da Scania e Kolynos ETE- Lauro Gomes”
Nessa articulação entre o Ceeteps e a empresa, a Kolynos assumiu 70% dos
custos do curso, cobrando os 30% dos seus funcionários. O curso é oferecido nos
espaços da escola, com obrigatoriedade de estágio na empresa.
O grande desafio para a escola nesse convênio é atender a expectativa da empresa,
proporcionando formação em nível médio aos colaboradores da empresa, no prazo
de um ano meio, por meio do curso Supletivo do Ensino Médio Profissionalizante.
Em entrevista com o Professor38 coordenador desse projeto, o mesmo nos disse:
“A grande dificuldade encontrada em ministrar essas aulas é quemuito embora os alunos tenham a escolaridade mínima exigida parao curso, muitas vezes torna-se necessário rever os conhecimentosbásicos, como por exemplo matemática e português. Esse fato temocorrido com frequência, uma vez que os alunos – trabalhadoresencontram-se afastados dos bancos escolares, alguns até com maisde 10 anos”.
Este tipo de dificuldade leva a escola a oferecer um módulo de aulas básicas de
forma a resgatar os conhecimentos básicos.
38 Antonio Garcia de Morais, responsável pela coordenação de cursos na área técnica (mecânica, indústria, etc)na ETE Lauro Gomes, nos cedeu entrevista em 10/01/2001
106
Outro grande obstáculo que merece destaque está relacionado ao perfil do
professor que irá ministrar essas aulas. É preciso que esse profissional esteja
engajado com as mudanças tecnológicas, tenha experiência prática e esteja
atualizado frente a realidade prática. Nos últimos anos, a desqualificação profissional
sofrida pela categoria dos professores tem sido grande e se verifica principalmente
na progressiva deterioração dos salários, o que representa, do ponto de vista do
professor, uma desatualização constante. Sem contar que há uma enorme distância
entre o perfil de professor que a realidade atual exige e o perfil de professor que a
realidade até agora criou.
Por outro lado Myrtes Alonso39, enfatiza que é importante levar em consideração que
os professores muitas vezes se vêem diante de uma situação totalmente nova,
embora reconheçam a necessidade de redimensionar o seu trabalho e buscar novas
bases para o ensino, via de regra encontram-se despreparados, mal informados e
sem condições de, sozinhos, enfrentarem tantos desafios (1999, 11).
“Os desafios são muito grandes e os professores diante deles maisparecem pigmeus. A seu favor tem muito pouco, sua frágil eultrapassada formação, suas crenças – especialmente no queconcerne à capacidade humana de aperfeiçoamento – e quem sabe,seu ideal em termos de educação”(1999, p 10).
Assim como esta autora, acreditamos que as propostas de mudanças de uma
instituição precisam ser analisadas não somente considerando-se seus objetivos
bem intencionados, mas também aqueles que operacionalizarão essa proposta, que
são os professores. No entanto, uma análise mais profunda sobre o papel do
professor ampliaria o foco de nosso trabalho que é a parceria entre empresa e
escola.
39 Alonso, Myrtes (org), Queluz, Ana Gracinda (orient) . O Trabalho Docente – Teoria & Prática- Pioneira, SãoPaulo, 1999.
107
Curso de Logística – ETE Horácio Augusto
A experiência na introdução do curso de Logística nesta escola, também merece
destaque, uma vez que houve dificuldade também na preparação dos conteúdos a
serem ministrados. Dificuldade também associada a falta de profissional com
conhecimento prático na área.
Cabe ressaltar que não podemos manter nossa análise restrita aos cursos
oferecidos na grande São Paulo, o Ceeteps é uma rede que mantém mais de100
escolas técnicas presente em vários Municípios do Estado de São Paulo, assim
algumas iniciativas, portanto já acontecem conforme abaixo relatamos:
Atendimento domiciliar: “O enfermeiro bate a porta” a vanguarda daenfermagem
As ETES de Araraquara, Oswaldo Cruz e Mocóca desenvolveram em convênio com
as prefeituras locais, um programa de assistência domiciliar de enfermagem. O
projeto tem pequenas variações entre as cidades, mas em todas o retorno da
população atendida é extremamente gratificante e o envolvimento dos alunos vai
além do cumprimento de horas-estágio, como diz uma aluna:
“No tratamento domiciliar você vê o paciente no meio em que elevive, orienta a família e dá apoio emocional (Jornal do Ceeteps -nº82- fev-2000)".
A ETE de Marília formou uma cooperativa-escola e desenvolve uma nova técnica no
plantio de mudas de maracujá. Essa técnica substitui os saquinhos de plástico, por
tubos de plástico, chamados de tubetes. O resultado é que as mudas ficam prontas
em 60 dias, ocupam menos espaços e são fáceis de transportar. A receita da
cooperativa vem garantindo o pagamento de diversas despesas da escola, como,
por exemplo, conserto de máquinas, compra de insumos e manutenção dos
equipamentos do setor produtivo.
108
São inúmeras as experiências que demonstram o esforço da instituição em manter
um nível de excelência em seus cursos profissionalizante. Entretanto, não cabe aqui
uma análise mais profunda sobre essas experiências. Vale, no entanto, demonstrar
que a instituição estabelece um canal de comunicação com a sociedade e privilegia
sua atuação extra-muros.
Cada Centro Regional de Educação Profissional será o articulador da rede das
atuais FATEC, ETE e ETAE sediadas nos vários municípios que compuserem a
respectiva região e através do seu potencial representado pelas escolas e seu
capital humano, fará uma ativa interlocução com a sociedade local e regional e
particularmente, com o setor produtivo. Já o nível central, deixando de ser normativo
e preocupado com processos, passará a ocupar-se essencialmente com a qualidade
e a avaliação de resultados, além de enfatizar, também, as articulações
interinstitucionais e com organizações científicas nacionais e internacionais. Assim,
passará a ter cinco áreas de apoio técnico e administrativo à produção de serviços e
bens:
1. Coordenação Pedagógica2. Articulação Interinstitucional3. Inovação Tecnologica4. Informação e Marketing5. Administração Geral
Junto ao Secretário de Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Econômico do
Governo do Estado de São Paulo e sob sua presidência, deverá ser instalado um
conselho como órgão de apoio à definição de políticas públicas de educação
profissional. Esse conselho deverá ter representação dos setores produtivos e de
inovações tecnológicas, de modo a orientar políticas de educação profissional em
São Paulo.
Assim, Laganá ressalta que um colegiado dessa natureza adquire grande
importância, pois pela primeira vez na história do país, a educação profissional teve
sua singularidade e o papel reconhecidos, explicitamente, na LDB e, portanto requer
a definição de suas políticas e diretrizes específicas harmônicas à educação regular.
109
Tais medidas tornam-se relevante quando o próprio senso apresenta através do
Jornal Folha de São Paulo de 25/10/2000:
“Sudeste concentra formação profissional”
“O Censo do Ensino Profissional – primeiro desse tipo e que foiapresentado ontem pelo MEC mostra que 55% das vagas no setorestão no Sudeste. A diferença entre a região e o restante do paíscresce de acordo com o nível do curso profissionalizante. No nívelmédio, em que o estudante precisa estar cursando o ensino médio, oSudeste concentra 57,7% das vagas. No tecnológico, que equivale aum curso de graduação de dois ou três anos, a concentração émaior - 65,6%. Nos cursos de nível básico, 86,6% dos alunos estãoem escolas particulares, que incluem o chamado sistema S (Senai,Senac, Sesi, Sesc, Senar e Senat). Os cursos tecnológicos tambémsão oferecidos pelo sistema privado, com 61% das vagas. Apenasas escolas de nível médio são, na maioria dos casos, públicas. Asfederais, estaduais e municipais juntas têm 56,4% dos alunos. Aintenção do MEC é usando o Programa de Expansão do EnsinoProfissional, aumentar o número de vagas gratuitas. O programafinancia a reforma e a construção de escolas profissionalizantes apartir de planos apresentados pelos Estados. O financiamento édado para escolas estaduais, municipais e comunitárias, que sãofinanciadas pelo governo e administradas por sindicatos ou outrasentidades” (FSP- Caderno Educação-out/2000).
Como vimos apenas as escolas de nível médio são na maioria públicas, e nessa
estatística inclui-se o Ceeteps, conforme podemos constatar através dos dados da
tabela a seguir
:
110
Tabela 5.2. - Número de Alunos e Turmas – 2º Semestre/2000
MODALIDADE DE ENSINOTOTAL DEALUNOS
TOTAL DETURMAS
MÉDIA DEALUNOSPOR TURMA
Supletivo Fundamental 79 2 40
Supletivo Médio 112 4 29
Médio – 1º Série 7.996 211 38
Médio – 2º Série 8.333 220 38
Médio - 3º Série 7.299 208 35
Técnico 1º Ciclo 16.405 418 39
Técnico 2º Ciclo 17.363 526 33
Técnico 3º Ciclo 8.057 285 28
Técnico 4º Ciclo 1.585 52 30
Qualificação Básica – 1º Ciclo 705 28 25
Qualificação Profissional – 1º e 2º Ciclo 2.638 78 33
Integrado (em extinção) 4º séries 7.717 256 30
Totais 78.289 2.288 34
Fonte: Banco de dados – Mapeamento das Escolas Técnicas - CEETEC – Setembro/2000
A tabela acima demonstra a concentração de alunos nos nível médio e técnico que
se constituem no maior público alvo da instituição, tendendo a crescer na
qualificação básica e profissional, sendo extinto o integrado40.
40 Para atender a reforma do decreto lei nº 2208/97, o (a) aluno (a) jovem ou adulto (a), que deseja se formar ehabilitar-se como técnico (a), deverá ingressar em escolas ou centros de Educação Profissional e estar cursandoou ter concluído o Ensino Médio em escolas voltadas, essencialmente, para o ensino básico. Na legislaçãoanterior o aluno ao matricular-se nas escolas do Ceeteps, poderia fazer o integrado, ou seja parte do ensinomédio(regular) e parte do ensino profissionalizante.
111
5.5. Perspectivas de Mudanças
Quando as organizações deparam-se com a necessidade de mudança muitas vezes
não sabem por onde começar e isto se transforma em um dilema. Não sabem se
iniciam por uma reforma administrativa ou por uma revolução de seus produtos. É
claro que essa duas questões estão intimamente imbricadas. Entretanto, uma
reforma administrativa, mesmo com foco na descentralização, tem o risco de
esgotar-se em si mesma, sem promover uma real mudança nos produtos e
resultados( Laganá:2000).
A mudança de valores e padrões é uma mudança de cultura que demanda
propósitos bem definidos. É também um processo que não se dá mediante normas,
mas pela implantação de práticas construídas em conjunto, ao longo do tempo. Um
processo decisório participativo, a ampliação da autonomia do nível local e a prática
de avaliação por resultados contribuem para introduzir novos valores e padrões.
Assim, Paulo Roberto Motta (1999) nos fala que na prática a mudança prescinde do
exame da realidade. O conhecimento da realidade se adquire pela adequação das
idéias e das teorias, e não pelo exame do fenômeno estudado. É a predominância
do pensamento sobre a observação. Preparar-se para a mudança é aprender
princípios e modelos ideais sobre gestão. Assim para Motta a mudança
organizacional ocorre quando:
“Altera-se a maneira das pessoas pensarem. Portanto, a únicamaneira de mudar é inculcar novos valores ou rearticular antigospara instituir um novo sistema de crenças. Conceber o mundo e avida de forma diversa redireciona o comportamento humano.Portanto, a mudança só tem sentido tomando-se o individuo comofoco e objeto exclusivo de análise”(Motta: 43:1999).
O movimento de mudança do Ceeteps se insere no processo de reforma
educacional em curso no país, e em especial, em São Paulo, orientado pela
112
proposta da lei de Diretrizes e Bases da educação Nacional – Lei 9.394/96 e o
Decreto 2.208/97.
“O novo marco legal pretende transformar a Educação Profissionaloferecida pelo Brasil para que responda, com maior eficiência eeficácia, às demandas do mercado de trabalho e aos requerimentosespecíficos do desenvolvimento econômico e social do país, compropósito de criar condições de empregabilidade para jovensingressos na População Economicamente Ativa – PEA, qualificar erequalificar mão de obra e contribuir para a elevação daprodutividade das empresas nacionais e melhoria da qualidade devida da população”(MEC/SEMTEC/PROEP, 1997 p.5).
Sucessivos movimentos de mudança quase sempre levam ao surgimento de
alguma resistência de todas as partes da organização. Dentre outras razões, isto
ocorre porque sentem dificuldade para estabilizar-se e passam a ser constantemente
pressionadas para dar novas respostas. As mudanças ameaçam valores,
concepções e formas de agir dos indivíduos. Vejamos nas palavras de Motta:
“A resistência se dá, em grande parte pelas limitações básicas queos seres humanos possuem para tratar assuntos não rotineiros, poisa dificuldade em enfrentar a complexidade das condições ambientaisde mudança faz com que as pessoas se adaptem e se conformemàs normas grupais, optando inconscientemente pelas atividadesrepetitivas” (1991: p 233).
É preciso, portanto, um grande esforço para coletivizar idéias novas, o que implica
uma ação de harmonização de interesses, percepções e tarefas diversas. Assim, o
Ceeteps efetivamente necessita de uma programação articulada de sensibilização
positiva para a mudança e para a aquisição de ferramentas modernas de
planejamento, avaliação e gerenciamento, além de ser indispensável a
transferência de informações sobre os sistemas e práticas existentes. Importante
também aproveitar o valor da excelência para municiar os dirigentes com o
instrumental do gerenciamento da qualidade, apostando no potencial que o Ceeteps
tem para tornar-se referência nacional na sua área de atuação.
Assim, a partir dessas informações, compreendemos que o Ceeteps está diante do
desafio de reorganizar a ação governamental na prestação de serviços de educação
113
profissional. Deve reorganizar-se para responder de maneira efetiva a nova
realidade e elaborar mecanismos para avaliar seu desempenho e de seus egressos
no mercado de trabalho. Ainda que permaneçam os cursos de ensino regular, a
educação profissional técnica foi separada do ensino médio, o que impõe uma
mudança importante nas escolas. Foi também introduzida uma nova ênfase na
educação profissional modular, desvinculada da escolaridade, que exige um
movimento contínuo de antecipação e de adequação às necessidades e demandas
do mundo do trabalho. Essas perspetivas certamente exigem um centro de formação
com um perfil de organização e de recursos humanos diferente de uma escola de
ensino regular. O dirigente desse centro precisará ser então um gerenciador de
projetos. É preciso ainda introduzir uma cultura de inovação e comportamento e, ou
seja construir novos valores.
Introduzir cultura de inovação, nos remete à metáfora41 da cultura indicada por
Morgan (1996), uma vez que essa metáfora ajuda a reinterpretar a natureza e o
significado das relações da organização com o ambiente. Morgan sugere que é
possível entender conceitos organizacionais corriqueiros, regras e procedimentos
como esquemas interpretativos através dos quais se constrói e é dado sentido à
realidade organizacional. Igualmente é possível compreender a maneira pela qual
uma organização dá sentido ao seu ambiente como um processo de reinterpretação
social. Assim o conhecimento que têm e as relações com o ambiente são extensões
da sua cultura, desde que se chegue a saber e a compreender o ambiente a partir
dos sistemas de crenças que guiam as interpretações e as ações.
Para efeito dessa dissertação interessa destacar que a construção de novas formas
de gestão devem privilegiar uma maior integração entre a instituição de ensino,
clientela e comunidade em geral. A participação das comunidades, dos segmentos
organizados da sociedade, e em particular o envolvimento de empresários e
sindicatos de trabalhadores, poderia garantir maior eficácia e eficiência no
planejamento, execução e gestão da educação profissional. Pode-se dizer que são
estratégias que enfatizam o eixo externo de avaliação, sempre em complementação 41Morgan utiliza a metáfora da agricultura para chamar a atenção sobre aspectos muito específicos dodesenvolvimento social. Isso para Morgan é uma metáfora que tem considerável relevância para o entendimentodas organizações. Explora a idéia de que a organização é em si mesma um fenômeno cultural que varia deacordo com o estágio de desenvolvimento da sociedade.
114
aos procedimentos de avaliação interna. Indica-se, em linhas gerais, um sistema de
avaliação que permita avaliar a eficiência e eficácia das ações desenvolvidas pelo
Ceeteps, considerando as demandas dos setores produtivos e dos mercados de
trabalho, as necessidades dos alunos e os requerimentos específicos do
desenvolvimento econômico e social .
O caminho escolhido pelo Ceeteps foi o de privilegiar uma revolução pedagógica e
uma nova inserção da educação profissional em São Paulo. A mudança
administrativa pela descentralização, é consequência dessa opção e deve ser
empreendida para viabilizá-la. Por isso, a ênfase no esclarecimento sobre qual é a
mudança pedagógica e de relações sociais que o Ceeteps busca conseguir nesse
momento, que se da através da inflexão de sua história e da história da educação
profissional em São Paulo.
As escolas também passarão a estabelecer uma relação mais dinâmica com a
sociedade local, na medida em que são interlocutores privilegiados dos educandos e
egressos, não apenas para gerar respostas às demandas locais, mas também para
perceber novas oportunidades e necessidades. O novo modelo supõe uma escola
que transborda seus muros e parte para a sociedade, acolhendo e buscando,
ocupando seus espaços tradicionais e novos espaços na comunidade, com classes
descentralizadas e, também, participando de atividades educacionais promovidas
por outros segmentos da sociedade local.
Os planos específicos de unidade da rede – FATECs, ETEs e ETAEs, deverão
contemplar uma perspectiva comum a todas as unidades, independentemente do
nível de ensino profissional oferecido. Sendo assim, Laganá nos fala que:
“O objetivo é que as unidades da rede se desenvolvam comoorganizações pró-ativas na articulação com a sociedade e com omundo do trabalho, não só no tocante à escolha de conteúdos eformatos dos módulos, mas também com relação à integração comesse ambiente” (ofício circular nº 024/00-Ceeteps/ 2000).
Dessa forma, para exemplificar a articulação da escola em atender a reforma –
decreto 2208/97 diz:
115
“Para a elaboração das diretrizes curriculares para o ensino técnico,deverão ser realizados estudos de identificação do perfil e dascompetências necessárias à atividade requerida, ouvido os setoresinteressados, inclusive trabalhadores e empregadores”.
Para demonstrar na prática a realidade de um procedimento de mudança, focamos
nossa atenção na área de articulação Interinstitucional, que é a área responsável
por promover e negociar parcerias com instituições nacionais e internacionais.
Nesse processo, o mundo empresarial e o mundo acadêmico se cruzam e
passam a discutir lado a lado as suas linhas de ação. Isso reforça a idéia de Dowbor
(1998) quando diz que os espaços do conhecimento não podem se dar apenas
dentro dos espaços da educação. Exige ampla participação e envolvimento de
segmentos empresariais, dos sindicatos, dos meios de comunicação, das áreas
acessíveis da política, dos movimentos comunitários, dos segmentos abertos, das
igrejas, etc. na gradual definição dos nossos caminhos para a sociedade do
conhecimento.
117
Capítulo 6
A Articulação – Formação da Parceria
Este estudo partiu da hipótese de que é necessário a conjugação de esforços no
estabelecimento de estratégias de cooperação para elevar o nível de qualificação
profissional da população, rompendo com a perspectiva tradicional fragmentada de
treinamento das empresas e de elaboração de currículo das instituições de ensino.
Portanto este capítulo tem como objetivo relatar a sinergia possível entre empresa e
instituição de ensino na elaboração de novas propostas pedagógicas. Não se trata
de buscar a construção de um modelo ideal de programa de qualificação profissional
e sim de demonstrar que há iniciativas que propõem um repensar integral nos
modelos dominantes.
Com base nessa observação, a Associação Nacional de Transportes42 e sua rede
de associados (Cia Metropolitano de São Paulo, Companhia de Engenharia de
Tráfego (CET), Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) e São Paulo
Transportes (SPTrans) reúnem-se com o Ceeteps para elaboração de cursos
modulares para o nível técnico.
Ao justificar a importância da parceria o cunsultor da ANTP nos disse que com o
passar do tempo, com a evolução da sua própria história, a ANTP percebeu que
não adiantava somente atacar o problema do transporte público. A questão da
cidade esta relacionada ao transporte, que esta relacionado com o trânsito que por
sua vez relaciona-se com o uso do solo. Portanto, os grandes desafios se traduzem
em torno de três grandes eixos de ação:
“Desenvolvimento urbano, transporte e trânsito – que devem sertrabalhados de forma coordenada, dada a sua interação. Porexemplo: alterações no uso do solo geram novas demandas detransporte e trânsito, a criação de novos sistemas de transportesgera por sua vez alterações no uso do solo; a mudança nas
42 A Associação Nacional de Transportes Públicos é uma entidade civil criada em 1977 e voltada exclusivamenteao desenvolvimento do setor de transporte público urbano do Brasil, seu objetivo é desenvolver e difundirconhecimentos sobre o transporte público e urbano de passageiros. Possui mais de 270 associados, entre órgãospúblicos, empresas públicas e privadas, sindicatos e universidades (ANTP:1999).
118
condições de trânsito também pode gerar mudanças no uso do soloe nas condições do transporte público. Apenas uma açãocoordenada nas três áreas pode reduzir os problemas e desenharum espaço de circulação com mais qualidade e eficiência”.(ANTP:200043).
A urbanização acelerada e o aumento do número de veículos em circulação
provocam o agravamento dos problemas de trânsito e de transportes nas cidades.
Os custos deste modelo inadequado são social e economicamente altos e
inaceitáveis – acidentes, desconforto, redução das oportunidades de realização de
atividades, atrasos impostos à circulação de pessoas e mercadorias, degradação
das condições ambientais. Sendo assim, emerge a necessidade de preparar uma
mão de obra qualificada, que permita uma nova organização do desenvolvimento
urbano, do transporte coletivo e do trabalho.
Torna-se importante, então promover um novo comportamento individual e coletivo
(especialmente quanto ao respeito às normas legais vigentes) e criar um novo
ambiente de circulação nas cidades. Portanto, a melhoría das condições dos
serviços de transporte exige investimentos em infra-estrutura e na operação
(monitoramento, controle e otimização das condições) de transporte e trânsito.
Quando se planeja promover um novo comportamento individual e coletivo, associa-
se a essa estratégia a participação da mão-de-obra em todos os seus níveis. Daí a
necessidade de qualificação profissional de todos aqueles que integram o corpo de
recursos humanos dessas entidades. O sucesso do trabalho da equipe é que
definirá a segurança, o desenvolvimento e o reconhecimento perante a opinião
pública, sobre a qualidade dos serviços prestados.
Não há no Brasil cursos de nível técnico na área de transportes, embora o cenário
descrito indique a demanda. Segundo a ANTP, estima-se que deve haver um
técnico para cada mil veículos em circulação. Por outro lado, o mercado de trabalho
está sendo ampliado pela vigência do novo Código Brasileiro de Trânsito que atribui
ao Município a capacidade legal de planejar, controlar e fiscalizar o trânsito. Os
municípios devem, portanto, criar departamentos de trânsito, que requerem
recursos humanos capacitados. Isto exige capacitação adequada para os
43 Informações obtidas em entrevista na ANTP- Julho -2000
119
responsáveis por toda a operação. Hoje, poucas cidades brasileiras dispõem de
pessoal qualificado, encontrando dificuldades permanentes em seu recrutamento.
Assim, em 16/08/1999, foi realizada a primeira reunião envolvendo – Centro Paula
Souza, ANTP, Metrô, CPTM, CET/SP, CET/Santos, EMDEC e SPTrans44,
concretizando então a integração dessas empresas.
Essa integração representa avanço significativo no próprio conceito de parceria,
pois embora as atividades operacionais entre transportes sobre pneus, transportes
sobre trilhos e as empresas de apoio operacional como a CET e a Sptrans sejam
diferenciadas, foram encontradas competências semelhantes nas atividades
exercidas por seus funcionários, o que fez com que os cursos fossem planejados
tendo módulos básicos e o módulo de planejamento e gestão de transportes
comuns à empresas, como por exemplo:
1. Compreender a função de transporte e o papel da circulação debens e pessoas, nos âmbitos internacional, nacional, regional,municipal e urbano.2. Executar a logística do transporte e do tráfego, aplicandoestratégias que compatibilizem os recursos às demandas.3. Desenhar os processos operacionais para atendimento aosclientes.
São inúmeros os exemplos que podemos citar sobre as competências comuns às
atividades destas 4 empresas. O que vale ressaltar é que esta integração converge
para uma formação ampla e não particular. Por se tratar de uma situação inédita
para todos envolvidos, é de senso comum que a parceria representa a solução de
um dos grandes problemas atuais. No entanto no momento em que se iniciam as
negociações surgem conflitos, como divergências de opiniões, que demandam
habilidade e perseverança por parte dos participantes desta parceria, o resultado
destas negociações foi a formação do curso modular, com as seguintes qualificações
profissionais:
1. Técnico em Transporte Metropolitano sobre Trilhos:Módulo básico de Transporte e Trânsito Urbano Módulo Operacional de Transporte Metropolitano sobre TrilhosMódulo de Planejamento e Gestão de Transporte e Trânsito Urbano
44 Ao longo das negociações permaneceram apenas 4 empresas – Metrô, CPTM, CET/SP e SPTrans.
120
2. Técnico em Transporte sobre Pneus e Trânsito UrbanoMódulo Básico de Transporte e Trânsito UrbanoMódulo Operacional de Transporte sobre Pneus e Trânsito urbanoMódulo de Planejamento e Gestão de Transporte e Trânsito Urbano
Através destes cursos, os alunos poderão seguir diferentes itinerários profissionais.
As áreas modulares constituem um importante instrumento de flexibilização e
abertura do currículo para o itinerário profissional a fim de adaptar-se às distintas
realidades regionais, permitirão também a inovação permanente, mantendo a
unidade e a equivalência dos processos formativos. Os módulos são organizações
de conhecimentos e saberes provenientes de distintos campos disciplinares, através
de atividades formativas que integram a formação teórica e a formação prática das
capacidades profissionais que se propõe desenvolver.
Assim, para cada módulo se propõe os seguintes critérios de organização curricular:
• Um conjunto de competências que servirão de base para seleção de conteúdos
por parte da equipe docente;
• Um conjunto de atividades e estratégias formativas que os docentes propõem
para a organização dos processos de ensino-aprendizagem;
• Uma estimativa de carga horária de conteúdo
A prática profissional será desenvolvida nas empresas conveniadas e nos
laboratórios das unidades escolares, não estando desvinculada da teoria. Na
verdade ela constitui e organiza o currículo.
Como vimos, essa mudança representa um grande desafio para os sujeitos
envolvidos, pois a dimensão da implicação subjetiva passa a ser o fundamento da
competência, operacionalmente traduzida em comportamentos e valores. Os
ingredientes do modo de ser, como não são formalizáveis, transparentes e
compiláveis, são antes, difíceis de objetivação, classificação e hierarquização. Não
são, portanto, simples de tradução curricular, fazem parte, na verdade, do chamado
“currículo não escrito”.
121
Assim, houve grande esforço, na formação dos módulos. Estar lado a lado com a
empresa e discutir competências a partir dos cargos e funções, não é uma tarefa
fácil para as escolas. A pedagogia sendo introduzidas no âmbito das organizações,
também constitui um grande desafio. Estabelecer um módulo significa reunir um
conjunto de cargos e nesses cargos detectar as competências requeridas. Ao fechar
o módulo, ele é uma resposta direta ao perfil das funções profissionais apresentadas
pelas empresas. Tais agrupamentos foram feitos através da detecção das
competências de cada uma das funções, a fim de que pudessem ser agrupadas,
formados os módulos e depois sub-divididos em componentes curriculares.
Do ponto de vista do Ceeteps, a parceria obedece os pressupostos da lei de
Educação Profissional, conforme vimos no capítulo 4, contempla também as
perspectivas de mudanças debatidas no capítulo 5, conforme nos diz Marcos
Monteiro – atual superintendente do Ceeteps:
“Esse ato tem importância significativa, obedece as mudanças daalteração da lei de Educação Profissional, que busca a aproximaçãoda escola com as demandas do setor produtivo”.
Monteiro ressalta que este tipo de parceria para construir um programa que
oferecesse a formação profissional, é um programa novo, projeto piloto em São
Paulo. A construção de itinerário de competência é uma experiência nova no Brasil.
Assim esta construção só pode ser feita a partir de um diálogo entre a escola e as
empresas.
Monteiro ainda nos diz: O objetivo é aumentar o nº de turmas a serem oferecidas
de forma a ampliar a qualificação dos Recursos Humanos. O projeto mostra o
empenho das empresas em oferecer qualificação aos seus funcionários.
Reforçando o ponto de vista do Ceeteps, Almério Melquíades – Coordenador de
Ensino Técnico e responsável por conduzir as negociações com as empresas nos
disse:
“É surpreendente como demoramos a perceber a necessidadedesses cursos na área de Transportes. Devemos estar com 30 anos
122
de atraso. Antes o treinamento era dado na empresa e os currículuselaborados dentro da escola, a partir de seus próprios referenciais,muitas vezes a partir do seu corpo docente, desassociados dademanda. O currículo que agora apresentamos resulta denegociações entre partes interessadas. A partir do rol decompetência formuladas pelo MEC para área de transporte”.
Questionado sobre as dificuldades, Almério nos fala:
“Articular a linguagem da empresa e a linguagem da escola, não éuma tarefa muito fácil. Partimos a princípio de algumas perguntas,entre elas: Quais as ocupações de nível médio? Quais eram ascompetências identificadas pelo RH para sua empresa?”
Nessa trajetória a dificuldade se deu por várias razões, entre elas podemos citar o
reconhecimento que cada empresa tem sobre as atividades que os funcionários
exercem. Cada empresa tem um olhar diferenciado quanto a complexidade das
tarefas e amplitude de controles. O desafio está então em assinalar as semelhanças
e eliminar as divergências.
Outro detalhe importante na construção desse itinerário é que as negociações
conduzidas pela Cia. Do Metrô e SPTrans traduziu-se em referencial e modelo para
as demais empresas, ou seja, para a CET e CPTM. Tal fato se comprovou no
evento ocorrido dia 16/11/2000, quando a Cia do Metro concretizou oficialmente a
formação da parceria com o Ceeteps. Esse foi um momento em que a empresa pode
disseminar suas políticas de valorização de recursos humanos, ao mesmo tempo
elevando sua imagem perante a comunidade, como podemos confirmar nas palavras
Sr. Caetano Jannini Neto45:
“O Metrô tem 26 anos de experiência e compõe um acervo deconhecimento, experiência e um volume de informação considerávele através do Ceeteps coloca à disposição da comunidade do pontode vista formal e de certificação esses conhecimentos, de forma amelhorar o perfil dos colaboradores. Já existe no Metrô políticas decapacitação com níveis mais elevados (de gerência), porém, agoracom essa parceria, abre espaço para área operativa, ou seja o níveltécnico. Pretendendo na próxima etapa elaborar curso técnico para opessoal da manutenção.
45 “Caetano Jannini Neto é o Atual presidente da Companhia Metropolitano de São Paulo – fala oficial em16/112000.
123
O presidente da Cia Metro fez questão de ressaltar ainda, que as negociações
demandaram esforço da área de Recursos Humanos. Isto demonstra visibilidade e
disseminação das propostas de gestão de pessoas, uma vez que esse programa faz
parte de um projeto mais amplo de capacitação de pessoal.
Por outro lado, conversamos informalmente com um funcionário que trabalha no
Metrô há 23 anos, e o mesmo disse:
“Após esses anos de trabalho nesta empresa, tenho umaexperiência relativamente grande na área, porém sempre tive receiode ser mandado embora a qualquer momento, e sair sem condiçõesde comprovar técnicamente a minha experiência. Agora com essecurso, que valoriza a experiência para certificar competência, eu eoutros colaboradores teremos o diploma de técnico em transportessobre trilhos, assim seremos melhor reconhecidos lá fora”.
Esse comentário demonstra a preocupação constante que os funcionários tem de
serem demitidos e não terem reconhecimento no mercado de suas experiências. O
curso vêm de fato propiciar um reconhecimento formal de sua experiência
profissional.
Do ponto de vista da CPTM a expectativa é grande, muito embora a empresa conte
com parceria, através de Termo de Cooperação, também com o SENAI. A
articulação com o Ceeteps vem a preencher uma lacuna problemática que é a
formação do técnico no ramo de transporte.
A CET não participou efetivamente das negociações dessa parceria e ao ser
questionado sobre as razões de tal comportamento, a resposta obtida é que “A
gestão Municipal anterior não priorizou a formação dos trabalhadores” houve
momentos até que quase desistiram, exigindo então grande esforço da área de
recursos humanos para se manterem no processo.
Por outro lado, a SPTrans considera positivo e excelente a parceria, ressaltando
que embora tenha sido moroso o diálogo durante as negociações, resultou em uma
124
expectativa positiva para a empresa. Isto se confirma pelo número de 309
funcionários inscritos, quando a oferta é de apenas 20 vagas.
A efetiva participação dos segmentos sociais na articulação de parcerias, nos remete
à questionar o porquê da ausência do sindicatos dos trabalhadores na mesa de
negociação. Na verdade esta ausência se explica, ainda que de maneira não
explicitamente declarada, pelo fato de que para o empresariado o sindicato é uma
organização que dificulta a liberdade de empresariar e de conduzir a cooperação.
Sendo assim, manifesta-se uma posição de insegurança ou dificuldade de diálogo,
como percebemos na fala dos entrevistados da empresas e da escola: “Já foi lento
e conflituoso o diálogo entre empresas e escola, imagine se está presente também o
sindicato”.
Esse depoimento comprova que está estabelecido a cultura de que a relação com
sindicato é sempre divergente e antagônica. Entretanto, são conceitos culturalmente
reconhecidos, porém longe de ser entendida como verdade absoluta. Assim, ao
questionarmos diretamente o sindicato dos metroviários sobre a formação da
parceria, nos disseram:
“Somos favoráveis a parceria e estamos apoiando a iniciativa.Porém, lamentamos não participar. Acreditamos que poderíamoscontribuir em muito com as negociações, afinal lutamos porobjetivos comuns”.
Tal posicionamento, como dito, reforça a idéia de que há uma inabilidade negocial
frente aos sindicatos, ignora-se portanto a possibilidade de uma contribuição efetiva
por parte dos mesmos. A presença dos sindicatos neste processo seria como ter
também os trabalhadores, representados durante toda a negociação. Como as
tecnologias evoluem e o processo de qualificacão e requalificação será permanente,
a prazo, a ausência dos trabalhadores nas políticas de qualificação podem fragilizar
todo o processo.
Entre a nossa participação efetiva nos processos de negociação e os relatos dos
entrevistados, percebe-se que essa articulação representa um avanço conceitual
na forma de elaboração do currículo. Isso é uma novidade porque rompe com a
125
tradição brasileira de os cursos serem programados a partir do que a instituição tem
nas prateleiras, muitas vezes empoeiradas. Portanto, o referencial desse curso de
transportes que será iniciado em março/20001 permitirá avançar em outras áreas,
como por exemplo na preparação de técnicos nas áreas de turismo e civil.
Enfim, é importante ressaltar que o processo de interação entre as atividades de
qualificação e as atividades profissionais exige flexibilidade da empresa que precisa
ter políticas de qualificação; exige atitude do trabalhador na busca de maiores
conhecimentos, e exige das instituições de ensino possibilidades de manter
sistemas abertos e flexíveis de entrada e saída, bem como abertura e flexibilidades
nos conteúdos. Não se trata de substituir um modelo por outro, mas de criar
condições institucionais para auto-transformação das unidades de formação.
127
Considerações Finais
Iniciamos este estudo tendo como objetivo analisar a forma de gestão de uma
instituição de ensino, Centro Paula Souza, e as transformações ocorridas nessa
instituição para atender às novas demandas de capacitação profissionais frente ao
mercado de trabalho atual. Para atender tal objetivo foi necessário primeiro
compreender as transformações do mundo do trabalho. Portanto, podemos dizer que
esta dissertação foi articulada em duas fases.
A primeira, que compreende os três primeiros capítulos, trata das mudanças
advindas com a introdução de novas tecnologias, que originaram novos conceitos
sobre trabalho, organização do trabalho e qualificação. Trata ainda, do
comportamento das empresas frente a todas essas transformações.
A segunda fase, que compreende os capítulos 4,5 e 6, inclui um histórico sobre a
educação profissional, caracterização de uma instituição de ensino, análise da
gestão do Centro Paula Souza e finalmente considerações sobre a articulação
empresa-escola.
Com base no estudo realizado e a partir do consenso de que o conhecimento é o
elemento chave, para transformação social, vimos como as empresas lidam com o
potencial de conhecimento existente e com a construção de novos. Constatamos,
também, que um novo conceito de gestão é introduzido nas organizações – a
“Gestão do Conhecimento”. Nesse modelo de gestão as empresas reformulam
seus programas educacionais, enfatizando o processo de aprendizagem. Ao
enfatizar a aprendizagem as organizações vão ao encontro dos interesses de seus
funcionários, quanto ao seu futuro e desenvolvimento profissional. Isto significa
que os atos de gestão se interpenetram com as aspirações individuais. Trata-se,
portanto, de criar espaços oportunos para que os trajetos profissionais se cruzem,
de modo que as pessoas articulem experiências para alcançar objetivos comuns.
128
Entendemos que está ai o grande desafio a ser superado pela organizações, pois
podemos afirmar que operacionalizar mudanças não é uma tarefa simples.
Por outro lado, discutindo um pouco as interferências das inovações tecnológicas no
mundo do trabalho, pode parecer, em algum momento, uma visão reducionista do
universo de análise, levar a crer que é possível elaborar programas de
qualificação/capacitação profissional, como solução ao problema do desemprego.
No entanto, uma análise mais ampliada nos mostra que há na verdade processos
contraditórios que precisam de um estudo mais profundo.
É comum as empresas mudarem a sua retórica e pouco alterarem as suas práticas
concretas. Em conversas com sindicatos46, fomos alertados por exemplo sobre a
tendência dos bancos em contratar pessoas com terceiro grau, o que dá uma
conotação de uso intensivo de conhecimento, portanto de valorização de capital
intelectual. Porém, na verdade o que ocorre muitas vezes é que os programas de
aprendizagem estão vinculados ao cumprimento de metas e resultados, definidos de
forma estreita, não permitindo o aproveitamento do potencial.
Algumas empresas, portanto, convivem tanto com necessidade de uma gestão
moderna voltada para um trabalho flexível, em equipe, com desenvolvimento de
competências, quanto com a necessidade de um modelo taylorista/fordista centrado
na divisão e especialização do trabalho. Isso nos mostra que não é possível afirmar
que o mundo do trabalho mudou. Apesar das empresas estarem convivendo com as
transformações advindas da era da tecnologia e do conhecimento, parece que esta
era convive ainda, de forma complementar, com os antigos paradigmas.
Acreditamos, então, que seria melhor dizer que estamos vivendo um momento de
transição em que devemos estar atentos para refletirmos sobre a complexidade
desse momento e também sobre o conceito de qualificação e sua relação com a
formação profissional.
46 Em entrevista com sindicatos dos bancários-SP e Metalúrgicos do ABC- encontramos vários exemplos desituações adversas e contraditórias sobre a valorização dos recursos humanos nas empresas. Uma analise maisprofunda nos mostra que há mecanismos de controle perversas sendo introduzidas nas organizações, porémapresentado aos trabalhadores em forma de discurso encantador.
129
No desenvolvimento de nosso estudo encontramos vários conceitos de qualificação,
porém parece difícil definir este termo tão amplo e subjetivo. Vimos que não é
possível dizer que a qualificação é um conjunto de atributos, sem levar em conta o
país, a empresa, a cultura. Vimos também que a qualificação está atrelada à teoria
do capital humano, ancorada em enfoques macroeconômicos que privilegiam
dimensões relativas ao desenvolvimento econômico. Há ainda um movimento no
sentido de substituir a noção de qualificação pelo chamado modelo de competência.
Este último modelo está centrado em saberes e habilidades, que se definem como
capacidade de agir, intervir, decidir e mobilizar saberes para dominar situações
concretas de trabalho.
A nosso ver a dificuldade de se definir o conceito de qualificação está associada às
próprias contradições e divergências que apontamos anteriormente. Não é possível
definir o que é qualificação, quando o próprio mundo do trabalho e do emprego
também está sendo revisto.
É muito comum também associar a qualificação profissional com a empregabilidade.
A tese da empregabilidade diz que a possibilidade de inserção de um indivíduo no
mercado de trabalho depende (potencialmente) da posse de um conjunto de
saberes, competências e credenciais que o habilitem para a competição pelos
empregos disponíveis. Atribui ao indivíduo ainda, a responsabilidade pelo seu
sucesso ou fracasso na obtenção de emprego. Havendo, portanto, um deslocamento
da responsabilidade dos atores sociais em viabilizar políticas de emprego para os
indivíduos.
Acreditamos que é preciso reforçar a idéia da necessidade do aprendizado contínuo,
rompendo o itinerário convencional de idade para brincar, estudar, trabalhar e
aposentar. Entretanto, atribuir a culpabilização restrita ao indivíduo pela sua não
inserção no mercado de trabalho, como nos faz crer a esfera dominante, é reduzir o
universo de analise diante de um conjunto de contradições que estão ocorrendo no
mundo do trabalho, como já dito anteriormente. Trata-se de articular a qualificação
profissional com outras políticas de criação de emprego.
130
Porém, apesar de complexo, é necessário discutir a questão da qualificação uma
vez que estudamos a parceria empresa-escola. Uma instituição educacional que
objetiva a formação técnica precisa entender o que é qualificação e que qualificação
é esta exigida pelas empresas. Só assim poderá reformular seu currículo e formar
profissionais que atendam a demanda do mercado, ao mesmo tempo que buscam
espaço para a transformação criativa das atividades.
Assim o foco passa a ser competências a serem desenvolvidas, busca-se uma
relação sinérgica entre teoria e prática. Trata-se de reformular projetos educativos
que possam dar respostas aos múltiplos desafios das sociedades da informação, na
perspectiva de um enriquecimento contínuo de saberes.
Acreditamos ser importante também atentar não só para a formação do profissional,
mas também para a formação do indivíduo de forma holística. É o que diz Morin
(1994) quando enfatiza o papel fundamental do processo educativo na sociedade,
alertando para o fato de que o modelo atual de aprendizado, baseado na
fragmentação do conhecimento, é ineficaz frente aos desafios de um mundo cada
vez mais complexo. Educar em um mundo complexo exige que o pensamento
simples, “que acredita alcançar o verdadeiro, que pensa que o conhecimento é
reflexo, que não considera conhecer a si mesmo para conhecer o objeto” seja
substituído pelo pensamento complexo, “que necessita a curva auto-observável e
autocrítica do observador conceituador sobre si mesmo”. Portanto ao mudar práticas
pedagógicas passa-se pelo desafio de mudar os valores e conceitos enraizados, e
mais uma vez estamos diante de uma tarefa nada fácil.
Com o resgate histórico do ensino profissionalizante, buscamos compreender como
se desenvolveram os modelos pedagógicos de educação profissional. Vimos que
esses modelos foram sendo ajustados ao longo da história para atender às
demandas da divisão social e técnica do trabalho. Em um modelo, as práticas de
ensino eram centradas no conteúdo a partir do paradigma taylorista, ou seja,
atreladas ao cargo ou posto de trabalho. À luz dos dias atuais esse modelo é
considerado “relativamente” ultrapassado, no entanto não podemos deixar de
reconhecer que as boas escolas técnicas foram excelência a partir desse referencial.
Hoje, o paradigma em implantação tem o foco nas competências a serem
131
desenvolvidas. Nesse sentido é preciso superar a visão fragmentada do currículo e
entendê-lo como um conjunto integrado e articulado de situações concretas
profissionais. Nessa nova retórica surgem elementos desafiadores para as
instituições de formação profissional, como por exemplo alterar as práticas
pedagógicas. Para tanto é preciso mudar a cultura, valores e padrões dominantes.
Um olhar mais direcionado a uma instituição de ensino como por exemplo o Centro
Paula Souza – que é uma rede pública de ensino técnico considerada por diferentes
análises como de boa qualidade – demonstram que ela é uma organização
tradicional, piramidal e segmentada por especialização, o que a faz agir de forma
reativa em relação ao mercado empregador. Essa postura é resultado, em parte, de
ser submetida às normas de direito público, o que impõe ritos e procedimentos
morosos, rígidos e onerosos. Somado ao fato de que a gestão pedagógica e a
gestão administrativa muitas vezes evoluem e sistematizam suas políticas de
maneira a convergir com o objetivo global. Esse é um dos fatores relevantes que
dificulta a implantação de mudanças.
É ainda presente entre o corpo funcional de algumas unidades, cultura e valores
retrógrados que favorecem comportamentos inadequados ao processo de
transformação vigente, característicos da administração pública. Em nossas
conversas com colegas de trabalho percebemos bem o sentimento de resistência
em relação às mudanças propostas. Percebemos claramente os dois lados da
mudança, os que a apoiam e portanto articulam suas propostas, e os que chamamos
de resistentes à mudanças.
O Centro Paula Souza, preparando-se para atuar de forma a reagir às novas
demandas do mercado de trabalho, passa a articular-se com a clientela e com a
comunidade em geral. A participação da comunidade, e em particular dos
empresários, poderá garantir a eficácia e eficiência no planejamento, execução e
gestão da educação profissional. Essas estratégias enfatizam o eixo externo,
estabelecendo uma relação mais dinâmica com a sociedade local.
A articulação com as empresas de transportes, por exemplo, representa um
significativo avanço nas propostas de inovação do Ceeteps. Houve grande esforço
132
na formação dos módulos, uma vez que há divergências de opiniões e interesses
entre as partes. As empresas ainda mantém a cultura de “dar treinamento” e a
escola mantém a cultura de “preparar seu currículo” a partir de seus próprios
referenciais. Portanto esta parceria vem romper com esses modelos tradicionais e
os atores sociais passam a compatibilizar interesses comuns. O referencial do curso
de transportes, citado no capítulo 6, permitirá avançar em outras áreas, o que
concretiza a tentativa de adaptação às mudanças do contexto atual.
No entanto, tais dificuldades não invalidam o movimento de parceria aqui estudada,
uma vez que toda proposta inovadora traz consigo problemas como – falta de
conhecimento prático, que acreditamos com o decorrer do processo irão se
ajustando.
Acreditamos que os valores e questões discutidos nesta dissertação nos apontam
para a importância de um dos principais personagens desta parceria, que é o
professor. Apesar de não ter sido o trabalho do professor objeto de estudo nesta
dissertação, durante o desenvolvimento de nossa pesquisa percebemos a relevância
de seu papel neste processo, pois é ele que estará em sala de aula com seus alunos
pondo em prática o currículo traçado pela parceria empresa-escola. É importante,
portanto o envolvimento dos professores neste processo de reformulação do
currículo. No entanto, é preciso deixar claro que não se pode atribuir esta
responsabilidade aos professores se não se pensar em oferecer também a ele a
possibilidade de reflexão e transformação de sua prática.
Enfim, a gradual flexibilidade do ensino e a opção por parceria, como esta
apresentada neste trabalho, se configuram como tendências promissoras à mão de
obra que as novas tecnologias exigem. Portanto, torna-se necessário não somente
políticas de mudanças na formação profissional, mas também políticas mais amplas
de emprego.
134
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