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Trabalho de Conclusão de Curso O PAPEL DOS EDUCADORES NO PROTAGONISMO INFANTIL E NO FORTALECIMENTO DOS DIREITOS DA CRIANÇA NO “INSTITUTO DE EDUCAÇÃO MARISA SERRANO”. Marcio de Vasconcelos Silva 1 Resumo: Este trabalho pretende conhecer o papel dos professores da educação infantil enquanto educadores frente ao protagonismo infantil e ao fortalecimento dos direitos da criança tendo em vista que a educação repassada pelo currículo escolar no modelo atual não favorece ao desenvolvimento da criança como cidadão de direitos, pois recorre a uma visão de transmissão de valores morais por meio de um processo de escolarização. Destarte, este estudo visa coletar as opiniões e visões de professores do último ano de creche para analisar seu papel como agentes de escolarização ou educadoras das crianças como sujeitos de direitos. Palavras-chave: Educação, protagonismo infantil, direitos da criança, escolarização. 1. APRESENTANDO AS BASES DO PROTAGONISMO 2 NA EDUCAÇÃO INFANTIL. No Relatório de Desenvolvimento Humano Global de 2014, “Sustentar o Progresso Humano: Reduzir as Vulnerabilidades e Reforçar a Resiliência 3 ”, elaborado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), ressaltou-se que os ciclos de vida são determinantes para a superação dos riscos sociais e seu resultado no enfrentamento da situação de pobreza ou exclusão social. De acordo com o relatório, as crianças pertencem aos grupos de maiores vulnerabilidades, pois compartem intrinsicamente de limitações correspondente à sua condição humana de desenvolvimento. Portanto, sua atenção deve redobrar na promoção de 1 Bacharel em Ciências Econômicas pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, atua como pesquisador e defensor da promoção, proteção e garantia dos direitos de crianças e adolescentes em organizações da sociedade civil, email de contato: [email protected]. 2 Para uma consulta sobre o termo e suas origens referente ao protagonismo infantil, ver o livro “ De la participación al protagonismo infantil. Propuestas para la acción. E. Alfageme, R. Cantos, M. Martínez. Ed. Plataforma de Organizaciones de Infancia. Madrid-ES. 2003. 3 O conceito de resiliência adotado pelo documento refere-se ao desenvolvimento humano centrado nas pessoas e em suas interações. Na abordagem dada pelo relatório, a resiliência significa a remoção de limitações às essas pessoas com capacidades limitadas de liberdade de ação, possibilitando-lhes que expressem suas preocupações e sejam agentes ativos na construção dos seus destinos. Para tanto, uma boa saúde e educação conferem as populações com melhor desenvolvimento humano maior grau de resiliência. (PNUD, 2014, p.16 e 17).

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Trabalho de Conclusão de Curso

O PAPEL DOS EDUCADORES NO PROTAGONISMO INFANTIL E NO

FORTALECIMENTO DOS DIREITOS DA CRIANÇA NO “INSTITUTO DE

EDUCAÇÃO MARISA SERRANO”.

Marcio de Vasconcelos Silva1

Resumo: Este trabalho pretende conhecer o papel dos professores da educação infantil enquanto

educadores frente ao protagonismo infantil e ao fortalecimento dos direitos da criança tendo

em vista que a educação repassada pelo currículo escolar no modelo atual não favorece ao

desenvolvimento da criança como cidadão de direitos, pois recorre a uma visão de

transmissão de valores morais por meio de um processo de escolarização. Destarte, este

estudo visa coletar as opiniões e visões de professores do último ano de creche para analisar

seu papel como agentes de escolarização ou educadoras das crianças como sujeitos de

direitos.

Palavras-chave: Educação, protagonismo infantil, direitos da criança, escolarização.

1. APRESENTANDO AS BASES DO PROTAGONISMO2 NA EDUCAÇÃO

INFANTIL.

No Relatório de Desenvolvimento Humano Global de 2014, “Sustentar o Progresso

Humano: Reduzir as Vulnerabilidades e Reforçar a Resiliência3”, elaborado pelo Programa

das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), ressaltou-se que os ciclos de vida são

determinantes para a superação dos riscos sociais e seu resultado no enfrentamento da

situação de pobreza ou exclusão social.

De acordo com o relatório, as crianças pertencem aos grupos de maiores

vulnerabilidades, pois compartem intrinsicamente de limitações correspondente à sua

condição humana de desenvolvimento. Portanto, sua atenção deve redobrar na promoção de

1 Bacharel em Ciências Econômicas pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, atua como pesquisador e

defensor da promoção, proteção e garantia dos direitos de crianças e adolescentes em organizações da sociedade

civil, email de contato: [email protected]. 2 Para uma consulta sobre o termo e suas origens referente ao protagonismo infantil, ver o livro “ De la

participación al protagonismo infantil. Propuestas para la acción. E. Alfageme, R. Cantos, M. Martínez. Ed.

Plataforma de Organizaciones de Infancia. Madrid-ES. 2003. 3 O conceito de resiliência adotado pelo documento refere-se ao desenvolvimento humano centrado nas pessoas

e em suas interações. Na abordagem dada pelo relatório, a resiliência significa a remoção de limitações às essas

pessoas com capacidades limitadas de liberdade de ação, possibilitando-lhes que expressem suas preocupações e

sejam agentes ativos na construção dos seus destinos. Para tanto, uma boa saúde e educação conferem as

populações com melhor desenvolvimento humano maior grau de resiliência. (PNUD, 2014, p.16 e 17).

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políticas sociais e principalmente em habilitá-las para o enfrentar suas adversidades desde

cedo, uma vez que a primeira infância seja decisiva para o desempenho de aprender por meio

de um desenvolvimento humano resiliente. (PNUD, 2014).

Nesta perspectiva, o estudo realizado pelas Nações Unidas aponta entre os serviços

públicos prestados que a educação e a saúde fundamentais para o progresso humano de todos,

e, especialmente a educação como a principal estratégia para a redução da desigualdade

social existente desde ao período infantil (PNUD, 2014).

Nos artigos 205 e 206 da Constituição Federal do Brasil, na seção que trata da

educação, destaca seu papel designando entre outras coisas, a contribuição para o pleno

desenvolvimento da pessoa para o seu exercício da cidadania e a garantia de igualdade de

condições para o acesso à escola, assim como dispor de liberdade de aprender e de divulgar o

pensamento e o saber (BRASIL, 1988).

Pela Lei de Diretrizes Básicas da Educação, a educação infantil é a primeira etapa da

educação básica e tem o objetivo de garantir o desenvolvimento integral da criança de 0 a 5

anos, em seus aspectos físicos, psicológico, intelectual e social por meio do cuidar e educar.

(Lei 9.394/96).

Apesar dessas concepções normativas, a educação também se confronta com outras

questões que influenciam no preparo ou desenvolvimento de condições predispostas para se

quebrar o ciclo de persistência da pobreza nas fases iniciais de vida pela educação. Dentre

esses aspectos estão; os processos de socialização que estabelecem campos de autonomia e os

valores repassados para a construção da identidade desses sujeitos em fase de

desenvolvimento.

Segundo Miguel Arroyo (2015), a educação é um meio privilegiado de introdução de

valores da sociedade que pauta a formação da consciência social para que esses indivíduos

continuem esse processo socializador. Portanto, o modelo atual de ensino é feito por meio de

transmissão de valores e conceitos para o conhecimento/adestramento funcional daquele

modelo.

Para Arroyo (2015, p.9), é possível verificar esse processo do seguinte modo:

Quando se imputa aos pobres a sua condição de pobreza e considera-se que

são carentes de valores, passa-se a entrever apenas uma solução: educá-los

nos valores do trabalho, da dedicação e da perseverança, desde a infância.

Nesse contexto, a tarefa da escola diante de milhões de crianças e

adolescentes na extrema pobreza seria de moralizá-los(as) nesses valores,

que eles(elas) supostamente não recebem das famílias e dos coletivos

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empobrecidos. A escolarização, então, seria somente um antídoto contra a

pobreza ao moralizar as infâncias e adolescências pobres.

Rego e Pinzani (2015) explicam também que não existe um nível absoluto de

autonomia, uma vez que cada pessoa fica "presa", até certo ponto, às amarras de sua

educação e de seu ambiente familiar e social. Isso ocorre porque não nascemos autônomos,

construímos nossa identidade e assumimos responsabilidades e deveres ao longo do tempo,

nossa autonomia está em constante movimento, variando de acordo com nossas capacidades e

habilidades, conforme demonstra a teoria das capabilidades4.

Para Márcia H. Acioli (2003) considerar a criança como sujeito de direitos e de

desejos, enquanto que dotados de inteligência e de saberes, bem como considerar suas

opiniões na tomada de decisões é fazê-los compreender suas forças internas, suas capacidades

de atuar na própria vida e por fim de contribuir com a identificação de suas potencialidades

para motivá-los a exercer a cultura democrática da participação. Segundo a autora, esse

protagonismo ocorre por meio de diversas formas de expressão, seja através de gestos,

olhares, sons, risos, movimentos do corpo, fala e outras tantas formas de manifestações em

que às crianças expõem-nos durante a sua interação.

Ginsburg e Jablow, Masten e Gewirtz (2015) ressaltam a importância de estimular a

resiliência em crianças, enquanto condição essencial para o desenvolvimento da confiança,

dos vínculos sociais, controle, contribuição e de participação na formação de qualquer

pessoa. Os autores recomendam diferentes estratégias de brincar e jogar para trabalhar com

esses aspectos que possam ajudar a desenvolver esta capacidade de superação e de

aprendizagem de problemas.

Para Mamede apud Didonet (2001, p.43) a educação infantil também reflete essa

combinação de relações, visto que:

A educação está em nosso fazer diário, na vida em família, no trabalho, na

escola, na creche. Em cada um desses lugares e momentos, devemos ter a

capacidade de ensinar e de aprender, seja com outros adultos, seja com as

crianças. Estamos nos educando quando convivemos com a diversidade das

relações entre as pessoas, das criações de nossa cultura, dos conhecimentos

que nela são produzidos. As crianças são educadas assim quando

procuramos criar na creche um espaço onde os direitos da criança-cidadã

4 A noção de capabilidade perpassa pelo conjunto social de conhecidos em que uma pessoa dispõe para conviver

e compartilhar o seu cotidiano, ademais do acesso e da oferta de recursos disponíveis para atender suas

eventualidades, seja em termos de opções de locomoções, serviços públicos e de bens públicos para o uso

coletivo.

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são tomados como referência, onde a cultura das famílias e dos profissionais

que nela atuam está presente na construção de seu projeto de trabalho.

Quando a criança é respeitada e valorizada nas diferenças do seu modo de

ser e do seu momento de desenvolvimento.

Neste sentido, reconhecer as crianças e os adolescentes perante a Declaração

Universal dos Direitos Humanos e segundo nossa Carta Magna Cidadã, representada pela

Constituição Federal promulgada em 1988, é fundamental para o exercício de cidadania a

seus direitos. Corsino, Didonet e Nunes (2011, p. 38) afirmam que o conceito de criança é

resultado de um processo histórico, em que:

[...] a concepção de criança como sujeito histórico, social, produtor de

cultura, ativo e criativo, cujo desenvolvimento se dá de forma indivisível.

Ela não pode ser vista apenas como um corpo que precisa de cuidado,

tampouco como uma mente sem corpo ou uma inteligência que aprende

num corpo ao qual não se dê atenção. O argumento é, pois, da coerência das

ações de educação infantil, que sejam respeitosas da unidade da criança.

De acordo com Stela Maris Lagos de Oliveira (2001, p.90) o papel da educação pode

ser incisivo nas relações sociais, pois:

(...) a concepção de educação infantil como uma ação complementar à ação

da família exige uma articulação entre família, escola e a própria

comunidade na construção do projeto pedagógico da creche ou pré-escola,

ficando claro, no entanto, que cabe à educação infantil ir “além” da

educação recebida na família e na comunidade, tanto no que diz respeito à

profundidade de conteúdos, quanto à sua abrangência.

Oliveira (2001, p. 90) defende ainda que a participação direta do professor no projeto

educativo é uma condição fundamental, porque ele consegue reconstruir e interiorizar valores

e concepções aumentando a possibilidade de novas competências que contribuam ao

exercício de seu trabalho com qualidade.

De acordo com Casabonne (s.d., p,5) é necessário compreender essa interação:

cuanto al protagonismo infantil como eje de una educación transformadora,

este debiese ser entendido de una manera que supere su manifestación

simbólica o testimonial. La oposición entre un protagonismo efectivo y uno

simbólico se da en razón de la capacidad que adquiere el niño, no solo de

participar activamente en un determinado espacio, sino principalmente por

el hecho de que sus acciones e intereses tengan consecuencias prácticas y

tiendan a desarrollarse en un sentido en el cual puedan influir en la

modificación de dichos espacios. Así, una participación efectiva en la

escuela implica comprender a los niños como constructores activos de

conocimiento, pero también como protagonistas con capacidad de incidir en

las decisiones que les afectan.

Trabalho de Conclusão de Curso

Assim uma escola emancipadora pode ser, entre outras coisas, o resultado das

expectativas de ações que são conquistadas por seus sujeitos, algo muito além do papel da

escolarização em que se preocupa com outros desempenhos ligados às suas metas

curriculares e que oferecem concepções menos plurais. Um princípio de ação que se

estabelece pela interdependência especialmente de seus professores aos anos iniciais de

educação, enquanto facilitadores deste conhecimento e prática.

2. EDUCAÇÃO INFANTIL VERSUS DIREITOS HUMANOS: O CASO DO

INSTITUTO DE EDUCAÇÃO MARISA SERRANO (IEMS)

A educação infantil, oferecida no Instituto de Educação Marisa Serrano (IEMS), na

Organização Mundial para Educação Pré-Escolar (OMEP) criado em 1997, tem o objetivo de

cumprir a missão institucional de desenvolver e publicar pesquisas sociais, atender crianças e

adolescentes em situações de risco, estabelecer parcerias estratégicas com a sociedade civil e

o poder público em prol de uma realidade social que permita o pleno desenvolvimento

humano para um futuro sustentável e melhor.

Considerando o artigo 4º de seu estatuto, alínea VIII, a finalidade deste serviço é:

“Realizar atendimento de cunho filantrópico em instituições e centros de educação infantil,

que assegure atendimento educacional, assistencial, social, médico e odontológico à criança e

à comunidade”. Por ser uma entidade privada sem fins lucrativos, o conceito de educação

ressaltado pela organização é compreendido como um direito fundamental de qualquer

pessoa humana seja esta uma criança, adolescentes, jovem ou adulto.

Deste modo, o Instituto de Educação Infantil caracteriza-se como um “projeto

contínuo” em que está sempre se ampliando e recebendo melhorias desde sua fundação, pois

é entendido como um elemento findado na identidade e na causa final da própria associação.

Como o Instituto localiza-se na periferia da cidade, há a presença de alunos

provenientes de famílias participantes de programas sociais, bem como pela proximidade às

regiões de incidência de exclusão social, como por exemplo: o bairro Arnaldo Estevão

Figueiredo, guetos do próprio bairro e da comunidade indígena Marçal de Sousa, gerando

uma demanda local que também é atendida pelo IEMS.

Como condição para a seleção dos perfis familiares em relação ao número de vagas

oferecidas, a instituição exige que a família possua e apresente cadastro social por meio do

Número de Inscrição Social – NIS. Em acréscimo a esta condicionante, a família também

Trabalho de Conclusão de Curso

responde a um questionário realizado com uma profissional Assistente Social para verificar

seu perfil e efetuar um acompanhamento pelo projeto “Espaço da Família5”.

No entanto, para termos um modelo ético baseado em uma nova consciência social,

solidária, capaz de reforçar e ampliar os direitos humanos para consolidar a justiça social e

eliminar a desigualdade é preciso investir na educação em direitos humanos como agente

fundamental no enfrentamento das violações desses direitos. Mendonça (2015, p.8), autor do

Módulo II, faz a seguinte colocação:

Sendo assim, refletir sobre a relação entre educação e direitos humanos

implica considerar que a escola deve se constituir como um local onde os

indivíduos possam adquirir consciência de si como sujeitos de direitos, bem

como possam tê-los assegurados. Para isso, ela precisa ter como parte de

suas ações pedagógicas iniciativas que promovam o enfrentamento da

violação de direitos humanos e permitam a vivência irrestrita desses

direitos.

Com relação ao IEMS, a instituição apresenta algumas vantagens atreladas às próprias

“preocupações” organizacionais de fomento da educação infantil com qualidade, respeito e

promoção de acesso aos serviços desses sujeitos de direitos. A instituição investe em

capacitações do corpo docente, realiza intervenções junto aos responsáveis, executa ações

sociais voltadas à comunidade, oferece materiais e estrutura às crianças sem depender

unicamente de recursos provindos do município.

Observa-se que a educação não deve aludir somente às condições objetivas que

permitem a um indivíduo receber uma educação pública gratuita, mas também às condições

intersubjetivas que dependem da cooperação dos professores, dos educadores, dos pais e dos

outros membros da sociedade, sem os quais não conseguiria literalmente sobreviver, e às

condições subjetivas, isto é, às capacidades e habilidades que consegue desenvolver graças à

sociedade.

Tendo em vista que os fundamentos enxergam as crianças enquanto sujeitos humanos

detentores de direitos que devem participar da vida social, este estudo buscou conhecer a

visão das professoras da educação infantil do último ano de creche do público atendido pelo

IEMS e compreender se estas compartilham dos princípios da organização na educação

5 O projeto “Espaço da Família” presta o atendimento às famílias assistidas no centro de educação infantil por

meio de palestras, reunião, cursos e de acompanhamento psicossocial para fomentar a integração e a inclusão

social.

Trabalho de Conclusão de Curso

infantil. Assim como, tentou identificar se essas docentes atribuem a transmissão do

conhecimento como princípio norteador que se preocupa com as determinações curriculares

para a escolarização ou se estimulam e incentivam a expressão de opiniões como elemento

primordial para o desenvolvimento de um protagonismo infantil. Essas indagações

orientaram as prerrogativas relativas à efetivação dos direitos de ser criança, assim como a

sua contribuição ou não ao fortalecimento dos direitos.

3. AS VISÕES DAS DOCENTES DAS CRIANÇAS DE 3 ANOS DO IEMS

A pesquisa com as docentes do Instituto Marisa Serrano recorreu a duas turmas do

último ano de creche em que há quatro docentes que trabalham com os alunos do nível III. A

escolha dessas turmas foi a de buscar docentes dos grupos de crianças com idade mínima de 3

anos por considerar uma fase em que a criança possui maior capacidade de expressão de

opiniões na interação educadora-aluno, e, consequentemente representar um período

fundamental da formação sociocultural e de intensa capacidade de absorção para sua

resiliência.

Como estratégia de investigação, para conhecer as visões das educadoras, foram

elaboradas perguntas semiestruturadas para o preenchimento de um formulário das

entrevistadas e também realizadas perguntas abertas para ouvir suas vozes e ideias que

reproduzissem por meio de suas falas as suas opiniões sobre a realidade social. Além de

considerar a existência de público vulnerável para as turmas escolhidas. De acordo com as

informações fornecidas pela coordenação do IEMS, as crianças que compõem o nível III

estão divididas em dois grupos:

a) grupo A, composto por 25 crianças com idades compreendidas de 3 anos e 1 mês até

3 anos e 5 meses, e;

b) grupo B, formado também com o número de 25 alunos, porém com idades superiores

a 3 anos e 6 meses, nas quais ao final do ano, 11 encontram-se com idades superiores

aos 4 anos completos.

Embora, em ambos os grupos, todas as famílias possuíssem inscrições no NIS foram

também encontradas famílias beneficiárias do Programa Bolsa Família (PBF). No nível III A,

a proporção de crianças que recebem o benefício corresponde a 24% do total de alunos e no

nível III B o percentual equivalente é de 20% do total de crianças.

a) Perfil das entrevistadas

Trabalho de Conclusão de Curso

Para saber sobre o contexto de vida das professoras e verificar informações sobre sua

formação, foi elaborado um formulário que fornecessem algumas respostas para identificar

características do perfil das entrevistadas. Veja tabela abaixo:

Tabela 1: Informações do perfil das docentes.

Profa A Profa B Profa C Profa D

Idade 31 anos 34 anos 31 anos 25 anos

Estado civil Solteira Casada Casada Solteira

Local de

nascimento Cáceres/MT Pitanga/PR

Campo

Grande/MS Cuiabá/MT

Bairro onde reside

em Campo Grande Tiradentes Marçal de Souza Bonança Jd. Aeroporto

Tempo de formada 5 anos 8 anos 4 anos 2 anos

Grau de

escolaridade Pós-graduada/

especializando-se

Pós-graduada/

especializando-se graduada Graduada

Tempo de atuação

no magistério 8 anos 8 anos 3 anos 3 anos

Tempo de trabalho

no IEMS 8 anos 8 anos 2 meses 3 anos

Participou de

cursos ou

treinamentos no

IEMS

sim Sim sim Sim

Caso afirmativo,

indique se foi

positivo a sua

função

sim Sim sim Sim

Renda familiar 1 a 3 salários

mínimos

1 a 3 salários

mínimos

4 a 6 salários

mínimos

1 a 3 salários

mínimos

De acordo com os dados da Tabela 1, o grupo de participante da pesquisa apresentou

alguns elementos diversos quanto a aspectos e características de seu perfil. A Professora

identificada como “A” possui uma experiência bastante superior, em relação as demais

docentes entrevistadas, entre o tempo médio de experiência e formada.

Entretanto, a professora “C”, natural de Campo Grande e com menor tempo de

experiência no IEMS, apresentou-se com melhor renda familiar no grupo mesmo sem possuir

um grau de escolaridade maior no grupo. Esse aspecto ao que parece, demonstra que, há

trabalhadoras de outras localidades com maior grau de escolaridade e de tempo de

experiência, porém com oportunidades divergentes aos das profissionais locais quanto a

composição da renda familiar.

Trabalho de Conclusão de Curso

No geral, as profissionais docentes advindas de outras localidades pertencem a

contextos sociais de vida bastante similares com maiores períodos de experiências na

Instituição. Há, contudo, a exceção de uma professora de naturalidade local que está há

pouco tempo na entidade e que apresenta um nível de renda um pouco superior,

provavelmente com renda complementada pelo seu cônjuge, ainda que possua um tempo

formação e de experiência proporcionalmente inferior às demais.

3.1 Avaliação das prioridades relativa ao trabalho

Em complemento, sobre o perfil traçado das entrevistadas, tentou-se também

compreender alguns elementos que pudesse indicar alguma influência positiva ou negativa do

papel desenvolvido pelas professoras no Instituto de Educação.

Neste sentido, as entrevistas tiveram elementos sobre rotinas das atividades docentes

para conhecer o que gostam ou consideram importantes para se avaliar as opiniões das

professoras. A avaliação consistia em assinalar valores que poderiam existir numa escala de 1

a 10, sendo 1 para prioridade mínima e 10 para máxima.

Para análise das respostas dadas pelas professoras, os valores marcados pelas

participantes foram agrupados e classificados em três intervalos de corte, correspondendo a:

10 – 8 como uma classificação de prioridade alta; 7 – 5 de prioridade média; e, 4 – 1 como

sendo de avaliação baixa.

Na avaliação das participantes dos elementos elencados que mais gostam em seu

trabalho, as classificações encontradas foram:

Quadro 1: Avaliação dos elementos que mais gostam em seu trabalho.

Elementos que mais gostam em seu trabalho* Profa A Profa B Profa C Profa D

Ambiente de trabalho alta alta média alta

Orientações pedagógicas alta alta baixa alta

Planejamento das aulas alta alta média alta

Remuneração salarial baixa média média Média

Projeto político pedagógico alta média média Média

Os eventos organizados pela OMEP alta alta média Média

Reuniões pedagógicas alta alta média média

Reuniões com os responsáveis pelas crianças alta alta média Alta

A gestão do IEMS alta alta média Alta

Ambiente de trabalho alta alta média Alta

*Escala de prioridade segundo valores de 1 a 10 dados pelas participantes:10 – 8 alta; 7 – 5 média; 4 – 1

baixa.

Trabalho de Conclusão de Curso

Observou-se que a professora A demonstrou maior afinidade com a maioria dos

elementos apresentados e indicou um menor valor no quesito “remuneração salarial”. E,

também, ficando com a segunda posição de maior classificação de prioridade elevada, a

professora B apresentou uma elevada satisfação quanto aos elementos listados, com a

exceção do mesmo item “remuneração salarial” e “projeto político pedagógico”.

As menores avaliações feitas foram expressas pelas professoras D e C

respectivamente. Cabe ressaltar que a professora C valorou sua menor prioridade referente às

orientações pedagógicas sem nenhum valor de alta classificação. Em menor intensidade,

porém com quase metade de sua classificação de pontuação média a professora D

entrevistada apresentou uma média de pontuação média de razoável satisfação. Entretanto,

todas as quatros assinalaram a “remuneração salarial” como elemento de menor valor

considerado.

Na avaliação realizada quando perguntadas sobre alguns elementos com maior

importância em seu trabalho, as participantes avaliaram conforme o quadro 2 a seguir:

Quadro 2: Avaliação dos elementos que consideram mais importantes em seu trabalho.

Elementos de maior importância em seu trabalho Profa A Profa B Profa C Profa D

As famílias atendidas Alta alta alta Alta

Diálogo com as famílias das crianças Alta alta média Alta

As interações de carinho com as crianças Alta alta alta Alta

Os valores éticos ensinados Alta alta alta Alta

Participação e expressão ativa da criança em sala Alta alta alta Alta

Relacionamento com os/as colegas de trabalho Alta alta alta Alta

A melhora do comportamento das crianças Alta alta alta Alta

Aprendizagem do currículo escolar Média alta alta Alta

A educação moral Alta alta alta Alta

*Escala de prioridade segundo valores de 1 a 10 dados pelas participantes: 10 – 8 alta; 7 – 5

média; 4 – 1 baixa.

Nas avaliações feitas pelas participantes somente duas respostas apresentaram

classificações diferentes, cujas respostas mostraram uma divergência de visões de elementos

da educação. A professora “A” considerou o currículo escolar como elemento prioritário

médio e a professora “C” a questão do diálogo com as famílias das crianças também como

elemento de menor importância. Os demais elementos foram avaliados com elevado grau de

prioridade nas opiniões das entrevistadas.

b) Opiniões sobre educação e objetivo das participantes

Trabalho de Conclusão de Curso

Na parte do questionário dedicado à identificação das respostas relacionadas a

educação e ao objetivo do trabalho. Quando perguntadas sobre a preparação de crianças por

meio da educação para ser um cidadão ativo, as opiniões das entrevistadas foram: as

professoras “A”, “B” e “D” responderam que se deve pela aprendizagem de valores morais e

comportamentais, contudo a professora “C” em campo aberto para outra resposta à questão,

com o seguinte: “a educação para formar um cidadão ativo necessita de 80% da família”.

Segundo Gomes e Ferreira (2006) a educação infantil deve ser reconhecida como

espaço da construção da infância cidadã, sem concebê-la somente com o objetivo de preparar

as crianças para a vida adulta. Esse avanço tem por princípio conceber a criança como um ser

capaz de construir conhecimentos dentro da visão da educação infantil.

As professoras quando perguntadas sobre o porquê da educadora ser uma agente de

transformação, marcaram as seguintes opções: as professoras “A” e “B” marcaram que se

deve porque articula o currículo escolar na formação dos alunos, e as professoras “C” e “D”

porque trabalha com as opiniões dos alunos.

Para Maurice Tardif (2002), as ações dos profissionais professores é fruto das suas

relações ou sociabilidades obtidas com os outros, tendo em vista atingir os objetivos

educativos propostos. É, portanto, dotado de uma intencionalidade que assinala uma dada

direção, por isso possui um significado conceitual e/ou valorativo, resultado de um sentido

histórico e social produzido que comporá uma ação política.

Neste sentido, Tardif (2002, p.149) conclui sobre o papel dos educadores:

[...] o professor não é um trabalhador que se contenta em aplicar meios e

que se comporta como um agente de uma organização: ele é sujeito de seu

próprio trabalho e ator de sua pedagogia, pois é ele quem a modela, quem

lhe dá corpo e sentido no contato com os alunos (negociando, improvisando,

adaptando). Consequentemente, não se pode separar a pedagogia de todo o

ambiente de trabalho do professor, de seu objeto, de seus objetivos

profissionais, de seus resultados, de seus saberes e de suas técnicas, nem de

sua personalidade e experiência. [...] Ora, essa análise demonstra que o

trabalho dos professores não pode ser vista mera ou exclusivamente como a

tarefa de um técnico ou de um executor.

Em relação à questão sobre ao desenvolvimento de maior protagonismo das crianças

na educação infantil, as respostas escolhidas ficaram em: a professora “A” respondeu no

campo aberto “que as crianças tenham oportunidade de dar sua opinião sobre os temas

abordados" e também marcou que demonstre suas emoções com os resultados positivos

esperados de atividades e comportamentos planejados em sala de aula; as professoras “B” e

Trabalho de Conclusão de Curso

“D” escolheram que por meio de intervenções contínuas no decorrer das atividades

planejadas para as crianças; e a professora “C” que se fortaleçam os vínculos da criança com

a escola, a comunidade e amigos.

Para Lúcia Helena Leite (2015) o conceito sobre “educação” tem o seu significado a

partir da própria raiz da palavra educar, ou seja, o ato de instruir, aprender e desenvolver a

pessoa. Assim sendo, ela considera a ação de educar pode advir do ambiente em que reside

uma pessoa, da relação intra e extra familiar, do meio social, da escola, do trabalho, das

crenças, dos valores, da pesquisa e de outras diversas fontes de culturais em que uma pessoa

tem acesso e assimila. De maneira contrária, a ideia de que a escola seja a principal

promulgadora do ato de educar, o sentido da educação deriva-se das combinações das

interrelações pessoais e das diversas multiculturas que possam haver para cada pessoa em

seus diferentes contextos de vida.

Na questão sobre o objetivo profissional e pessoal, todas as entrevistadas remeteram a

identificação com a defesa dos direitos pela primeira infância. A “coincidência” de visões das

educadoras é muito próxima à própria finalidade da Instituição, na qual possui

reconhecimento pela causa em favor da promoção, defesa e garantia dos direitos pela

primeira infância.

De acordo com Leite (2015) é necessário também considerar, quando a escola está

estabelecida numa posição formadora central, que o conceito de escolarização surge

associando-se à característica ressaltada da escola. Ela pode advir de algo que é transmitido a

partir de uma mesma base pedagógica, indiferente do contexto, infraestrutura, organização e

experiência cidadã tanto do formador/educador como também do formando/educando. Um

papel que denota a escola numa posição dominante e hegemônica em relação ao objeto

“educação” que se autoimpõem e autoafirma como instância oficial única realizadora e

detentora desta ação por meio da escola ou do fruto dela, a “escolarização”.

Entretanto, quando consultadas sobre uma nota como educadora de 0 a 10, sendo 0 a

pior nota e 10 a melhor, pelo trabalho realizado como educadora e o porquê, as respostas das

autoavaliações foram:

Tabela 2: Autoavaliação do trabalho como educadora das docentes entrevistadas.

Entrevistadas Nota Respostas

Professora A 9,8 Ás vezes no meu cotidiano, na minha metodologia, no meu

plano de atividade, nem sempre consegui obter bons resultados,

Trabalho de Conclusão de Curso

nem sempre consigo o melhor que será o dez.

Professora B 6 Porque eu tenho muito o que aprender, estou em fase de

aprendizagens constante todos os dias.

Professora C 7

Como estou na instituição há pouco tempo ainda estou em fase

de adaptação e o currículo é um pouco diferente do que estou

acostumada, como por exemplo: duas professoras em sala,

horários, etc., portanto estou me adequando e procuro dar o

melhor que posso.

Professora D 8

Por acreditar fazer meu trabalho da melhor maneira possível, por

acreditar que eu como educadora posso contribuir para o

crescimento e desenvolvimento de um cidadão ativo.

A professora “D” foi a única que sinalizou uma relação de seu papel com a preparação

da criança para tornar-se um cidadão. As demais professoras entrevistadas atribuíram a sua

atuação com questões funcionais práticas aos seus respectivos desempenhos e resultados.

c) Comentários e visões das educadoras

Com a finalidade de ouvi-las e conhecer melhor as visões das educadoras

participantes, realizou-se uma entrevista semiestruturada para identificar elementos que

reforçassem a visão da sua função como educadoras ao protagonismo infantil e no

fortalecimento dos direitos das crianças onde trabalham.

Para análise das opiniões das professoras com melhor precisão e objetividade, as

respostas registradas terão somente as transcrições dos trechos em que as entrevistadas

expressam suas respostas mais diretas às questões, desconsiderando algumas partes das

conversas com descrições genéricas ou exemplos redundantes. Nos casos omissos em que

parte dessas ilustrações constituírem parte fundamentais de suas respostas, os trechos das

conversas serão transpostos.

As entrevistas efetuadas com as professoras do Instituto de Educação Marisa Serrano

ocorreram em momentos distintos, cujas conversas foram gravadas. Na ocasião, as

entrevistadas tiveram a apresentação da finalidade deste estudo, bem como souberam que este

estudo objetiva conhecer as visões delas como educadoras com relação às crianças atendidas

em sala de aula provenientes de baixa renda.

Para comparação dos registros das professoras entrevistas, as respostas foram

organizadas de acordo com a quantidade de perguntas elaboradas, conforme as figuras a

seguir:

Trabalho de Conclusão de Curso

Figura 1: Entrevista com as professoras, pergunta I: Qual o seu papel no IEMS?

Nas falas das entrevistadas as educadoras possuem visões diferentes sobre si mesmas

quanto ao seu papel no IEMS. Entretanto, é possível identificar um discurso mais consciente

da sua função destacam a si próprias com definições mais diretas sobre uma concepção de

educadoras apresentado pelas professoras “A” e “B”. Por outro lado, as respostas das

entrevistadas “C” e “D” indicam mais próximas de um processo de autoconhecimento prático

pedagógico, da construção de seu sujeito como educadoras, todavia com a sobreposição

indefinida se vista pela ótica da relação sujeito x trabalho.

1)Professora A

•"O meu papel como educadora de educação infantil, nesta instituição, em sala de aula, é ter emmente sempre que a prioridade é a criança, eu tenho de visar o seu bem-estar desde o momentoque ela chega à instituição até o momento que ela vai embora. Então, o meu plano de atividadestem de ser voltado à sua faixa etária, ao seu contexto – de onde ela vem, sua família, suarealidade –, eu não posso lhe oferecer coisas fora do seu contexto."

Professora B

•"Estou aqui como estimuladora em todos os sentidos, estou aqui para estimular os movimentosdas nossas crianças, tanto, afetivos, cognitivos, em todas as áreas."

Professora C

•“(...) meu papel principal é o cuidar e o educar, que não estão dissociados da educação infantil,mas aqui isso é bem mais intrínseco, porque é onde as crianças passam o dia todo, alimentam-se... Esse é o papel do pedagógico e do cuidado.”

Professora D

•"Sou professora no IEMS há três anos; entrei aqui como jovem aprendiz, por isso atuava eminstituições de fora (Ceinfs), e quando vim para cá, tornei-me auxiliar, comecei no berçário C,tanto que a turma que acompanho hoje é a mesma que peguei no berçário C. Peguei entrando eagora elas estão saindo. Agora estou como professora regente do nível III."

Trabalho de Conclusão de Curso

Figura 2: Entrevista com as professoras, pergunta II: Quais metas você possui para a educação

das crianças da sua sala de aula?

As entrevistadas “A”, “B” e “D” expressaram opiniões condizentes ao papel de

facilitadores ao protagonismo infantil e a professora “C” relativa às metas institucionais de

ensino pedagógico. Cabe ressaltar que as visões das educadoras sobre a criança também

refletiram em suas metas a identificação dela como a pessoa em desenvolvimento, porém não

em contraste ao reconhecimento de sujeito de direitos.

1)Professora A

•"Minhas metas são desenvolver atividades em várias áreas: cognitivas, afetivas, motoras,sensoriais. Como alcançar essas metas? Por meio de atividades, conversas, sempre dando voz aessa criança e nunca me esquecendo de que ela é protagonista da própria aprendizagem, porisso tenho de respeitar, dar voz a ela também. Trago a proposta, os temas abordados e,dependendo da devolutiva dela, vou desenvolvendo principalmente a linguagem oral."

Professora B

•“Minha meta é que essas crianças saiam daqui com a oralidade bem desenvolvida, sendocríticas, não aceitando tudo o que o professor lhes impõe, eles devem fazer perguntas,participar de rodas de conversa, temos muitas rodas de conversa.(...) Essa é minha meta:queeles cheguem ao final do ano conhecendo vários lugares, várias coisas,por meio de imagens, devídeos, que tenham oralidade bem desenvolvida, sem medo de falar, de fazer perguntas.”

Professora C

•“Não, não tenho meta pessoal, pois minha meta pessoal está de acordo com a da instituição. Ameta agora é fazer com que eles exercitem a partilha, pois têm muita dificuldade de dividirbrinquedos, por exemplo, e estamos trabalhando isso com eles. Também existe a questãofamiliar, bastante trabalhada por nós.”

Professora D

•“Em minha formação como pedagoga, aprendi que a educação infantil tem de visar aautonomia da criança, isso é algo por que prezo muito em sala. Essa autonomia é minha metapessoal. Por quê? Porque são 25 crianças em sala para duas professoras – hoje são duasprofessoras, antigamente era uma. Quanto mais autônoma você deixar uma criança, maisfacilitará o seu trabalho e melhorará 100% a qualidade de vida da criança também, porque elase sentirá mais segura no que for fazer.”

Trabalho de Conclusão de Curso

Figura 3: Pergunta III- Você acredita que sua atuação pode contribuir de alguma maneira com

as crianças de famílias pobres de sua sala? Como você contribui para as crianças de famílias

pobres na sua sala de aula?

Nas opiniões de todas as entrevistadas, suas atuações podem contribuir na vida das

crianças de famílias pobres. Entretanto, a professora “A” busca interpretar as carências que

1)Professora A

•"A Pedagogia é humanitária, é algo muito humano, depende muito do seu olhar, da suaperspectiva de sala.[...]Na educação infantil, a gente tem de ter um olhar atento, a todomomento tem de observar a criança. De que forma? Das suas brincadeiras, analisar como elaestá brincando com seus pares, da sua fala, partindo da fala dela, do seu olhar atento, vocêconsegue identificar suas necessidades – precisamos trabalhar isso, aquilo... Como já são umpouco maiores, brincam o tempo todo, comunicam-se, expressam-se com mais facilidade, o quenos ajuda nessa identificação de necessidades. A partir dessa identificação, às vezes, atéprecisamos alterar o currículo para trabalhar suas demandas naquele momento.[...] A gentesabe que há essa contribuição quando há devolutiva da família – a gente vem fazendo umtrabalho em sala de aula e a família nos conta, [...] Então, eu acredito nessa contribuiçãopositiva porque há crianças que precisam dessa atenção maior – nem todas, é claro, pois hácrianças que vivem realidades diferentes."

Professora B

•"Muito. Minha atuação, como já disse, é estimulá-las a aprender. Como posso fazer isso?Através de meu planejamento. Temos as rodas de conversa, momento em que as criançassempre deixam escapar o que gostariam de fazer, comer ou aonde gostariam de ir. Nossascrianças já falam corretamente, elaboram bem as frases, então já sabem falar: “professora, euqueria fazer tal coisa, conhecer tal coisa”. Então a gente trabalha a partir das críticas e doslevantamentos prévios das crianças."

Professora C

•“Sim, acredito. Ela se dá por meio da conversa, da interação. Há criança com essa necessidade,pois enfrenta problemas com a pobreza, e acha que não pode ter mais do que lhe é oferecido emcasa, não pode usufruir de algo melhor, já vem com isso na mente, às vezes, os próprios paislhes passam essa ideia. Temos de lhe mostrar. Por exemplo, na alimentação, oferecendo algoque as crianças não têm em casa, como uma fruta diferente. Então a gente diz: “olhe que legal,aqui você tem e pode comer”. Ou ainda algum conteúdo sobre meio de transporte, pois muitassó falam de carro, então a gente diz que existe avião, e elas dizem: “Nunca vou andar numavião”, e nós respondemos que vão andar, sim, “Você vai estudar, vai viajar...Contribuímosassim, nesse sentido, na linguagem deles, mas lidando com algo verídico.” novos horizontesdesde a infância, senão ela ficará se sentindo sempre inferior."

Professora D

•"Então, em sala, mesmo às crianças com economia melhor como as crianças mais pobres, agente tenta dar as mesmas oportunidades para experimentar tais novidades, a fim de tentartrabalhar com todas a igualde, seja de respeito, seja de oportunidades, porque, querendo ounão, lá fora, na vida adulta, elas já vão ter essa diferença de tratamento, então tentamosminimizar ao máximo essa diferença dentro de sala, onde todo mundo é igual, todos brincamigualmente. Até mesmo quando elas querem coisas de menino e menina, nós dizemos: “Aquitudo é de todo mundo, vamos brincar juntos, todos são amigos”. Porque temos de fazê-lasesquecer um pouco essa questão de pobreza. Mas eles sabem dessa diferença econômica, e agente tenta lhes mostrar que eles não têm algo porque seu pai não tem condição de comprar, ouo outro tem algo porque seu pai pode comprar, mas aqui na sala vamos dividir, vamos mostraressa união."

Trabalho de Conclusão de Curso

forem manifestadas pelas crianças com o intuito de tentar ajudá-las ou de oferecer-lhes

estímulos para minimizar os impactos nas crianças. As professoras “C” e “D” procuram

enfatizar a ideia de que há possibilidades, apresentando-lhes que as suas situações de vida

não lhes devem restringir de conhecer ou de condicioná-las de forma desigual de tratamento.

Figura 4: Entrevista com as professoras, pergunta IV- Como você acha que a educação também

pode contribuir para as crianças pobres na superação ou na resistência da situação de pobreza?

Trabalho de Conclusão de Curso

1)Professora A•“Acredito que sim, porque quando muda a sociedade, a escola também tem de mudar, pois ascrianças que estão aqui irão para a sociedade, então, se estão num ambiente de vulnerabilidade,a escola pode trabalhar com projetos como ludicidade, culturais, esportivos, principalmente osesportivos, pois acredito que o esporte salva muitas crianças, temos relatos de crianças queviviam em ambientes de extrema pobreza e mudaram de vida por meio do esporte, da cultura.Acredito que a educação é prioridade, e se agente tiver boa educação, a gente consegue muitasvitórias. No currículo, trabalham-se princípios éticos, morais, raciais, culturais.... Eu acreditoque a educação pode contribuir, sim, com essas famílias de baixa renda.”

Professora B

• "A educação tem grande impacto nisso. A criança não tem essa noção de “sou pobre”, mas elasabe que está em determinado espaço desfavorável em relação ao das outras. [...]ela não sabeque é pobre, mas que não pode ter determinado objeto porque sua mãe não dinheiro paracomprá-lo. Qual o meu trabalho nisso? Fazê-la aceitar que não podemos ter tudo na vida, étrabalhar isso, senão a criança vai sair com trauma e se desvirtuar, pois sabemos que a criança,até os sete anos, vai formando sua capacidade de pensar, de agir, é neste momento que entra oprofessor, fazendo-a aceitar o outro, o diferente e respeitar. A nossa contribuição é essa: fazer acriança aceitar o meio em que ela vive, mas buscar outras formas e outros conhecimentos.Conhecer outras realidades e dar-lhes acesso. “Não é porque não posso ter uma fantasia ou umtênis bom que não posso brincar, que vou tratar o outro com indiferença ou que o outro vaitratá-lo com indiferença. Trabalhamos muito a igualdade, somos diferentes, mas precisamos terrespeito, devemos sempre respeitar o outro. Como educadora eu acredito que nós devemos fazeressas interferências, sim, intermediar isso, porque nossa sociedade vem há décadas colocandocada um no pedestal, o rico e o pobre são diferentes. A gente sofre isso todos os dias. Creio quegente pode mudar isso com a educação. Como? Começando pela sala de aula, porque ela vaitendo uma expansão, a criança chega em casa com outra visão, o pai vai tendo outra visão daescola: “Meu filho não vai lá só pra aprender a letra do nome dele, só pra comer ou só pradormir, meu filho aprende valores para a vida toda”

Professora C

•“Eu acho que sim, mas nós estamos caminhando muito pouco nesse sentido, acho que dever-se-ia trabalhar mais o imaginário da criança, pelo menos na educação infantil, porque depois quesaem daqui elas vão para outras realidades. Acho que há muito para avançar ainda, por issonão está bom, não. Acredito que a gente tem de estimular a imaginação da criança, incutindosonhos na cabeça dela, para que possa vislumbrar algo melhor para si, porque talvez elas nãovão para um lugar melhor, não. [...]Exemplificando: o que auxilia na educação podem ser asbolsas (Bolsa Família, por exemplo), algo que veio para estimular a educação. [...]Na verdade,ela recebe o benefício até certa idade, depois acaba, mas não foi plantado na mente dascrianças o fruto desse dinheiro. Quando ele acaba, se a criança não tiver algo em mente, comovontade de estudar, se formar e trabalhar, isso não vai colaborar. Acho que depende mais dafamília, porque nós fazemos nossa parte, mas às vezes,em torno de 80% dos casos, o estímulodepende da família que, se não estiver atenta e incentivando sempre essa criança, nada mudarána realidade dela, afinal, é muito mais forte o vínculo familiar do que educacional. Mas existemexceções, é claro.”

Professora D

•"Acho que aqui dentro da escola, ou de qualquer escola, nós lidamos com várias culturas. Porexemplo, tenho criança que, se eu chamá-la para conversar, ela me contará que o pai épresidiário, outra poderá dizer que nunca vê o pai porque ele vive viajando. Acho que aeducação, aqui dentro, tem a obrigação de juntar essas histórias para elas compreenderem queo mundo não é só o que ela vive, há outras coisas, há pessoas diferentes, culturas diferentes,modos de viver diferentes, tanto que a gente sempre apresenta esse tipo de trabalho.[...] Achobastante importante a educação nesse ponto. Eu não sei se é possível superar, pois a genteensina muita coisa aqui, mas o que pesa é o que aprendem em casa. Muitas vezes, a mãe diz quea professora ensinou errado, e eles se esquecem. Por isso, acho que superar talvez não seja apalavra mais correta, mas pelo menos eles terão a oportunidade de saber que existe um mododiferente, poderão começar a pensar de modo diferente."

Trabalho de Conclusão de Curso

As opiniões das entrevistadas sobre a contribuição da educação na vida das crianças

pobres para a resistência ou superação da situação de pobreza compartem da opinião de que

ela lhes permite conhecer outros tipos de vidas. Contudo, para uma melhora significativa a

professora “A” ressalta a necessidade de ações culturais, lúdicas e de esportes. Para as

professoras “C” e “D” esse impacto poderia ser positivo principalmente se a família ajudasse

para isso. E, na visão da professora “B” que esse processo tem seu princípio na demonstração

da igualdade de todos em sala de aula.

4. CONSIDERAÇÕES SOBRE O PAPEL DAS EDUCADORAS DO INSTITUTO

O estudo delineou sobre o papel das professoras/educadoras, do último ano de creche

do Instituto de Educação Marisa Serrano, algumas características que ajudam ao

desenvolvimento do protagonismo infantil e de fortalecimento aos princípios e condições

para a efetivação e/ou fortalecimento dos direitos da criança. Dentre esses aspectos

observados, contemplaram as seguintes características: familiaridade com relação ao público

mais vulnerável em ambas as salas de aulas pelas professoras; estímulo de valorização da

convivência igualitária entre as crianças de distintas classes sociais; e, elevado grau de

interface de ensino entre currículo escolar e as opiniões dos alunos.

Com relação aos aspectos menos favoráveis aos comportamentos e/ou atitudes que

possam ajudar na participação infantil e no uso do espaço escolar como local de resistência

da pobreza, os elementos frágeis percebidos pelo estudo foram: percepção de caráter mais

moral da situação de pobreza; influência institucional na atuação das educadoras; e, estímulo

a uma cidadania passiva da criança de merecimento e não de reconhecimento como sujeito de

pleno direitos.

Assim mesmo, as professoras do IEMS pesquisadas mostraram-se com uma visão

bastante proativa quanto as dinâmicas de atividades interativas e estimuladoras voltadas à

participação das crianças sem demonstrar formas de distinção às crianças na sua relação

sociopedagógica. Essas características constituem a base do protagonismo infantil e da

educação infantil como uma ação complementar à família e a comunidade, na qual

circunscreve o público infantil atendido. E, por fim, possibilitando o trabalho de uma atuação

social, visibilidade mais ampla e disseminação de valores menos adultocêntricos pelas

docentes para o fortalecimento dos direitos da criança.

Trabalho de Conclusão de Curso

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