O PRIMEIRO OU O SEGUNDO? A RESPEITO DA EXPOSIÇÃO DE JOHN MILTON SOBRE A TEORIA DE TRADUÇÃO DE FRIEDRICH SCHLEIERMACHER Werner

Embed Size (px)

Citation preview

  • 8/10/2019 O PRIMEIRO OU O SEGUNDO? A RESPEITO DA EXPOSIO DE JOHN MILTON SOBRE A TEORIA DE TRADUO DE FRI

    1/12

    O primeiro ou o segundo?.. . 99

    O PRIMEIRO OU O SEGUNDO?A RESPEITO DA EXPOSIO DE JOHN MILTON

    SOBRE A TEORIA DE TRADUO DE FRIEDRICHSCHLEIERMACHER

    Werner HeidermannUFSC

    John Milton intitula um dos oito captulos de seu livro O Poder

    da Traduo (Milton, 1993) Les Belles Infidlese a TradioAlem (Milton, 1993: 49). O captulo publicado sem alteraesna segunda edio (Milton, 1998: 55). O autor traa um amplopanorama, de Martinho Lutero at Walter Benjamin, mencionaWieland e Eschenburg, segue por Schlegel e Tieck at Herder eHumboldt. Muito apropriadamente, a abordagem sobre FriedrichSchleiermacher abrange um espao considervel. Milton traduzuma passagem central de Ueber die verschiedenen Methoden des

    Uebersezens (Sobre os Diversos Mtodos de Traduzir), deSchleiermacher:

    A primeira traduo ser perfeita quando for possvel dizerque, tivesse o autor aprendido o alemo to bem quanto otradutor aprendeu o latim, aquele no teria escrito a obra queoriginariamente escreveu de maneira diferente da maneira

    por meio da qual o tradutor escreveu. Mas a segunda traduo,que no mostra o autor como ele mesmo teria traduzido, mascomo um alemo teria originariamente escrito em alemo,no pode ter outro tipo de plenitude a no ser que seja possvelcertificar-se de que, se todos os leitores alemes pudessem

  • 8/10/2019 O PRIMEIRO OU O SEGUNDO? A RESPEITO DA EXPOSIO DE JOHN MILTON SOBRE A TEORIA DE TRADUO DE FRI

    2/12

    100 Werner Heidermann

    virar especialistas, o original em latim teria significadoexatamente o mesmo que a traduo significa para eles agora que o autor tornou-se um alemo (Milton, 1993: 58).

    Milton comenta:

    Embora no comeo do ensaio, Schleiermacher no parea

    dar preferncia a nenhum dos dois tipos, posteriormentedemonstra uma preferncia definitiva pelo segundo tipo(Milton, 1993: 58).

    Quanto a isso, Milton se engana. A no ser que ele esteja sereferindo ao pargrafo que precede a citao de Schleiermacher.Mas, por que, na parfrase do trecho da pgina 218, a seqncia

    dos mtodos est invertida?

    Na primeira, o tradutor deixa o leitor em paz e leva o autorat o leitor; em outras palavras, a traduo deveria parecerfluente na lngua-alvo, nesse caso, o alemo. No segundo, otradutor deixa o autor em paz e leva o leitor at ele (...)(Milton, 1993: 58).

    O original diz o seguinte:

    Entweder der Uebersezer lt den Schriftsteller mglichstin Ruhe, und bewegt den Leser ihm entgegen; oder er lt denLeser mglichst in Ruhe und bewegt den Schriftsteller ihmentgegen (Schleiermacher, 1838: 218).

    O tradutor deixa o autor em paz e leva o leitor at ele; ou otradutor deixa o leitor em paz e leva o escritor em direo aoleitor.

  • 8/10/2019 O PRIMEIRO OU O SEGUNDO? A RESPEITO DA EXPOSIO DE JOHN MILTON SOBRE A TEORIA DE TRADUO DE FRI

    3/12

    O primeiro ou o segundo?.. . 101

    A confuso poderia ter sido evitada, se a seqncia do originaltivesse sido mantida. Entre os erros e os acertos encontram-se osmal-entendidos. E, a abordagem que Milton faz das 30 pginas dotexto de Schleiermacher deixa a desejar alguns esclarecimentos.

    Schleiermacher apresenta as vantagens e as dificuldades deambos os mtodos, primeiramente dos mais orientados obraoriginal e depois daqueles mtodos que consideram mais o leitor.

    Atualmente, seria mais conveniente falar de mximas, poismtodos pressupem instrues prticas, que o trabalho deSchleiermacher no oferece. O texto no um vade-mcum dotradutor, e sim uma reflexo filosfico-lingstica.

    atribuda mais ou menos a mesma ateno a ambas asmximas, respectivamente nove pginas. O estilo deSchleiermacher dificulta naturalmente a compreenso do seudiscurso; no entanto, ainda assim fcil atestar que, no final, eled preferncia ao primeiro mtodo. Num primeiro momento,Schleiermacher parece at considerar o segundo modo legtimopor causa de tradues isoladas bem sucedidas - poderamoscomparar as excelentes tentativas que foram feitas conforme um eoutro modo/ man knnte die ausgezeichnetsten Versuche, welchenach beiden Ansichten gemacht worden sind, vergleichen -(Schleiermacher, 1838: 221), mas no final rejeita-o e polemiza

    contra ele - a obra da lascvia e da petulncia/ das Werk derLsternheidt und des Uebermuthes (p. 241).Em seguida, tentarei demonstrar como Schleiermacher,

    radicalmente e com argumentos bem fundados, rejeita o segundomtodo de traduo. Antes, porm, eu gostaria de me referir aoseu estilo, que dificulta a compreenso e possibilita confuses comoilustra o caso de John Milton.

    Friedrich Schleiermacher escreve e fala no no sentidorestritamente cientfico, porm com todo o luxo retrico doincipiente sculo XIX. Ele se permite fazer digresses, quando lheapraz, assim como julgamentos dos mais subjetivos. Ora umapolmica, ora um aforismo, enfim, uma escolha de vocabulrio

  • 8/10/2019 O PRIMEIRO OU O SEGUNDO? A RESPEITO DA EXPOSIO DE JOHN MILTON SOBRE A TEORIA DE TRADUO DE FRI

    4/12

    102 Werner Heidermann

    que, em geral, no visa a preciso lingistica, mas a vitalidadeliterria. Exemplos? Quando Schleiermacher fala sobre a lnguavazia dos aristocratas e diplomatas (p. 236), ele no se restringe auma anlise simples; no resiste tentao de divertir a si mesmoe seus ouvintes/leitores com as prolas e sutilezas em vriosidiomas/ Sigkeiten und Feinheiten in vielen Sprachen (p. 236),isto , com o discurso vazio. Ridculo/ Lcherlich (p. 210) e

    quase nojento/ fast ekelhaft (p. 221) so julgamentos, queSchleiermacher no hesita em fazer. Ns falamos pouco demaise, proporcionalmente, jogamos muita conversa fora/ Wir redenzu wenig und plaudern verhltnismig zu viel (p. 245) escreveele no final do texto; avaliao, que permanece atual, mas com aqual no esperaramos nos deparar num trabalho lingstico. Aescolha de vocabulrio que ao final das contas facilita a leitura, svezes dificulta a compreenso. Conjugam-se expresses comoviolncia da lngua/ Gewalt der Sprache (p. 214), a foravital do indivduo/ die lebendige Kraft des einzelnen (p. 214),esprito da lngua/ Geist der Sprache (p. 215), o estado deesprito do falante/ Gemth des redenden (p. 215). Ao lado dacompreenso de gozo/ Genu (p. 218), trata-se tambm demagia/ Zauber (p. 225), de milagre/ Wunder (p. 225),de enigma/ Rthsel (p. 226). De tudo o que foi considerado

    obscuro naquela poca (em 1813, ano em que Schleiermacherapresenta os mtodos em forma de uma palestra), s a terminologiafoi esclarecida at os nossos dias; basicamente se mantm airracionalidade/ Irrationalitt (p. 212). No texto deSchleiermacher (p. 234) pode-se encontrar tambm o recursoestilstico do paradoxo, tpico da sua poca - como na frase de Herderj como animal o homem possui lngua/ Schon als Tier hat derMensch Sprache (Herder, 1975: 5):

    Grotius und Leibnitz konnten nicht, wenigstens nicht ohneganz andere Menschen zu sein, deutsch und hollndischphilosophiren (Schleiermacher, 1838: 234).

  • 8/10/2019 O PRIMEIRO OU O SEGUNDO? A RESPEITO DA EXPOSIO DE JOHN MILTON SOBRE A TEORIA DE TRADUO DE FRI

    5/12

    O primeiro ou o segundo?.. . 103

    Grotius e Leibnitz no podiam filosofar em alemo e emholands, pelo menos no sem ser pessoas diferentes do que oforam.

    Eu retorno obscuridade, mencionada anteriormente, sobre odualismo na teoria de traduo de Schleiermacher. Numa passagemposterior, o autor sintetiza ambos os mtodos da seguinte maneira:

    Denn ein ganz anderes ist, den Einflu, den ein Mann aufseine Sprache ausgebt hat, richtig auffassen und irgend wiedarstellen, und wieder ein ganz anderes, wissen wollen, wieseine Gedanken und ihr Ausdrukk sich wrden gewendet haben,wenn er gewohnt gewesen wre ursprnglich in einer andernSprache zu denken und sich auszudrkken! (Schleiermacher,1838: 232-233).

    Um coisa compreender corretamente e representar ainfluncia, que um homem exerceu em sua lngua, e outra, jbem diferente, querer saber como os pensamentos (dessehomem) e a expresso desses seriam alterados, se ele tivesseoriginalmente se acostumado a pensar e a se expressar numaoutra lngua!

    Essa foi a parfrase dos dois modelos discutidos. Schleiermacherno apenas dirime dvidas quanto sua preferncia, como tambmse compromete e o faz na forma da seguinte questo retrica:

    Wer berzeugt ist da wesentlich und innerlich Gedanke undAusdrukk ganz dasselbe sind, und auf dieser Ueberzeugung

    beruht doch die ganze Kunst alles Verstehens der Rede, undalso auch alles Uebersezens, kann der einen Menschen vonseiner angebornen Sprache trennen wollen, und meinen, esknne ein Mensch, oder auch nur eine Gedankenreihe einesMenschen, eine und dieselbe werden in zwei Sprachen?(Schleiermacher, 1838: 233).

  • 8/10/2019 O PRIMEIRO OU O SEGUNDO? A RESPEITO DA EXPOSIO DE JOHN MILTON SOBRE A TEORIA DE TRADUO DE FRI

    6/12

    104 Werner Heidermann

    Quem est convencido de que pensamento e expresso so amesma coisa - e nessa convico se baseia toda a arte decompreenso do discurso e tambm de todo traduzir -, pode,esse, querer separar um homem da sua lngua materna e acharque um homem, ou somente uma linha de pensamentos de umhomem, pode se tornar um e o mesmo em duas lnguasdiferentes?

    Essa idia essencial para a reflexo lingstica dos romnticos.Ela foi to presente, que Wilhelm von Humboldt se permitiu umaobservao entre parnteses com relao ao assunto (fato bastanteraro em Humboldt):

    (...) so wie man wohl sonst sagen hrte, dass der Uebersetzerschreiben msse, wie der Originalverfasser in der Sprachedes Uebersetzers geschrieben haben wrde (ein Gedanke, beidem man nicht berlegte, dass, wenn man nicht bloss vonWissenschaften und Thatsachen redet, kein Schriftstellerdasselbe und auf dieselbe Weise in einer andern Sprachegeschrieben haben wrde) (Humboldt, 1909: 133).

    (...) assim como se ouve dizer, que o tradutor precisa

    escrever, como o autor original teria escrito na lngua dotradutor (a respeito disso, nunca consideramos que, se no nosreferimos apenas a cincias e fatos, nenhum escritor teriaescrito o mesmo e da mesma maneira num outro idioma).

    O pensar e tambm a produo intelectual-literria so de talforma impregnados e associados cada lngua, que j absurda aprpria idia de que um autor teria pensado exatamente assim num

    outro idioma, s teria concebido o produto numa outra formalingstica. Schleiermacher no chama essa idia de absurda,porm - no menos peremptrio - inatingvel (...) nula e vazia(p. 233). Nesse ponto a dissertao de teoria da traduo de

  • 8/10/2019 O PRIMEIRO OU O SEGUNDO? A RESPEITO DA EXPOSIO DE JOHN MILTON SOBRE A TEORIA DE TRADUO DE FRI

    7/12

    O primeiro ou o segundo?.. . 105

    Schleiermacher torna-se um importante manifesto de teoriaepistemolgica. Vale a pena citar todo o trecho:

    Ja man kann sagen, das Ziel, so zu bersezen wie derVerfasser in der Sprache der Uebersezung selbst wrdeursprnglich geschrieben haben, ist nicht nur unerreichbar,sondern es ist auch in sich nichtig und leer; denn wer die

    bildende Kraft der Sprache, wie sie eins ist mit derEigenthmlichkeit des Volkes, anerkennt, der mu auchgestehen da jedem ausgezeichnetsten am meisten sein ganzesWissen, und auch die Mglichkeit es darzustellen, mit derSprache und durch sie angebildet ist, und da also niemandenseine Sprache nur mechanisch und uerlich gleichsam inRiemen anhngt (Schleiermacher, 1838: 233).

    Pode-se dizer que a meta de traduzir assim como o prprioautor original teria escrito na lngua alvo no apenas inatingvel, como tambm nula e vazia em si: pois quemreconhece que a fora criadora da lngua una com asingularidade do povo, precisa admitir que, com relao acada povo, o conhecimento e tambm a possibilidade derepresent-lo so formados com a lngua e atravs dela e que,ento, ningum pode coloc-la nos trilhos de maneira

    meramente mecnica e superficial (...).

    John Milton (1933: 58) relaciona ambos os citados mtodos deSchleiermacher diferenciao entre interpretao etraduo. Mas, interpretao e traduo no so de maneiraalguma os mtodos, mas sim dois contextos diferentes, dois ramos(...) com fronteiras imprecisas/ zwei (...) Gebiete (...) mit

    verwaschenen Grenzen (Schleiermacher, 1838: 209):interpretao no mbito do mundo dos negcios/ in dem Gebietedes Geschftslebens (p. 209), traduo no mbito da cincia edas artes/ in dem Gebiete der Wissenschaft und Kunst (p. 209).Essa diferenciao bsica somente o ponto de partida na

  • 8/10/2019 O PRIMEIRO OU O SEGUNDO? A RESPEITO DA EXPOSIO DE JOHN MILTON SOBRE A TEORIA DE TRADUO DE FRI

    8/12

    106 Werner Heidermann

    argumentao de Schleiermacher. Na exposio que ele faz emseguida, trata-se quase que exclusivamente de traduo, ou seja,da transposio de textos artsticos. E, para isso, segundoSchleiermacher, apresentam-se no incio os mencionados mtodos.

    A representao da teoria de Schleiermacher feita por Milton concisa demais para ser correta. A citao de Schleiermacher queMilton inclui no seu texto, por exemplo, refere-se no mais

    dicotomia entre traduzir e interpretar, mas uma alegoria, atravsda qual ele rejeita o segundo mtodo:

    Quem no prefere gerar crianas que so a semelhanaperfeita de seus pais, e no bastardos? Quem vai obrigar-se asi mesmo a se apresentar fazendo uso de movimentos menosleves e elegantes de que se capaz, para parecer bruto etenso, pelo menos s vezes, para chocar o leitor tanto quanto

    necessrio para mant-lo consciente do que faz? (Milton,1993: 58).

    Lido isoladamente, esse trecho com certeza ser mal-entendido.S o contexto proporciona uma compreenso adequada, nesse caso.Antes da citao ele fala da suprema degradao/ derwunderbarste Stand der Erniedrigung (Schleiermacher, 1838: 227),

    em seguida se refere s renncias que aquele tradutornecessariamente tem que fazer/ die Entsagungen die jenerUebersezer nothwendig bernehmen mu (p. 227). O maiordesafio que o tradutor precisa vencer ento, nem tanto tcnicomas sim quase que de carter. Ele precisa ser capaz de conter suacompetncia; ele no deve almejar o texto sem arestas e perfeitomas uma traduo na qual se perceba que o original foi escritonuma outra lngua. Schleiermacher quer o bastardo! Ele reivindicaque o tradutor renuncie perfeio da obra-alvo o que faria perderde vista o original.

    A leitura do Milton torna se ainda mais incompreensvel quandose l as ltimas pginas de Schleiermacher. Schleiermacher fazvrias referncias explcitas, por exemplo:

  • 8/10/2019 O PRIMEIRO OU O SEGUNDO? A RESPEITO DA EXPOSIO DE JOHN MILTON SOBRE A TEORIA DE TRADUO DE FRI

    9/12

    O primeiro ou o segundo?.. . 107

    Dies scheint in der That der wahre geschichtliche Zwekkdes Uebersezens im groen, wie es bei uns nun einheimischist. Fr dieses aber ist nur die Eine Methode anwendbar, diewir zuerst betrachtet haben (Schleiermacher, 1838: 243-244).

    De fato isso parece ser a finalidade histrica do traduzircomum entre ns. Para isso porm s um mtodo aplicvel,

    aquele que nos estudamos primeiramente.

    Outras passagens remetem ao primeiro mtodo como o nicopertinente, como aquele, que deixa transparecer, antes de maisnada, a suprema leveza e a naturalidade do original/die grereLeichtigkeit und Natrlichkeit des Originals durchleuchten (...)lassen (p. 241) - eis aqui a finalidade mais importante da traduo.Por exemplo:

    Wenn es nicht mglich ist etwas der Uebersezung, sofernsie Kunst ist, wrdiges und zugleich bedrftiges ursprnglichin einer fremden Sprache zu schreiben, oder wenn dieswenigstens eine seltene und wunderbare Ausnahme ist: so kannman auch die Regel nicht aufstellen fr die Uebersezung, siesolle denken wie der Verfasser selbst eben dieses in der

    Sprache des Uebersezers wrde geschrieben haben; (...) Ja,was mag man einwenden, wenn ein Uebersezer dem Lesersagt, Hier bringe ich dir das Buch, wie der Mann es wrdegeschrieben haben, wenn er es deutsch geschrieben htte; undder Leser ihm antwortet, Ich bin dir eben so verbunden, als obdu mir des Mannes Bild gebracht httest, wie er aussehenwrde, wenn seine Mutter ihn mit einem andern Vater erzeugthtte? (Schleiermacher, 1838: 238-239).

    Se no possvel escrever o texto original numa lnguaestrangeira, texto que merea e ao mesmo tempo precise deuma traduo, ou quando isso no mnimo uma exceo rarae maravilhosa: assim no se pode estabelecer a regra para a

  • 8/10/2019 O PRIMEIRO OU O SEGUNDO? A RESPEITO DA EXPOSIO DE JOHN MILTON SOBRE A TEORIA DE TRADUO DE FRI

    10/12

    108 Werner Heidermann

    traduo segundo a qual ela deve expressar o mesmo que oprprio autor teria escrito na lngua do tradutor; (...) ao quealgum poderia replicar que, quando um tradutor diz ao leitor:Olhe, entrego-lhe o livro, como o autor o teria escrito, se eleo tivesse escrito em alemo; e o leitor respondesse ao tradutor:Eu lhe sou grato, como se voc tivesse me trazido um retratodo homem, na aparncia que ele teria, caso a me o tivesseconcebido com um outro pai?

    A necessidade de conservar o estranho do original na traduo encontrada em toda teoria da traduo, por exemplo em Wilhelmvon Humboldt, na distino que ele faz entre o estranho/ dasFremde e a estranheza/ die Fremdheit (Humboldt, 1909:133). E raras vezes esse aspecto foi tratado to diretamente comono dilogo fictcio Die Kunst zwischen den Sthlen (A Arte entre

    as Cadeiras) de Janheinz Jahn :

    (...) eine bersetzung soll doch vor allem ein Fensteraufstoen, soll uns fremde Wesensart nahebringen. Sonstknnten wir ja unsere Verse selber machen (Jahn, 1956: 430).

    ...uma traduo deve, antes de mais nada, nos abrir um

    caminho novo, deve nos aproximar de modos de ser diferentes.Se no, ns mesmos poderamos fazer nossos versos.

    O paradoxo da traduo tambm tratado por Jahn de umamaneira que nos deixa pensar em Schleiermacher. Citarei umapassagem de um texto pequeno e pouco conhecido que, contudo,pode esclarecer o trabalho de Schleiermacher, que muito mais

    abrangente e conhecido:

    Eine bersetzung, diealleQualitten des Originals bewahrt,und der man auerdem die bersetzung nicht anmerkt, istunmglich. Sie knnte nur mglich sein, wenn die Sprachen

  • 8/10/2019 O PRIMEIRO OU O SEGUNDO? A RESPEITO DA EXPOSIO DE JOHN MILTON SOBRE A TEORIA DE TRADUO DE FRI

    11/12

    O primeiro ou o segundo?.. . 109

    keine Unterschiede, also auch keine Seele htten. Dann gbees aber wahrscheinlich auch keine Kunstwerke, die manbersetzen knnte. Die Mglichkeit der bersetzung machtalso ihre Vollendung unmglich. Und in der Unmglichkeitvollendeter bersetzungen liegen die Mglichkeiten fr denbersetzer (Jahn, 1956: 430).

    Uma traduo com todasas qualidades do original, e na qualno se pode mais perceber a traduo, impossvel. Isso sseria possvel, se as lnguas no tivessem diferenas, ou seja,alma. Nesse caso, no entanto, no haveria obra de arte a sertraduzida. Ento, a possibilidade da traduo torna impossvelsua perfeio. E, na impossibilidade de tradues perfeitasesto as possibilidades para o tradutor.

    Referncias Bibliogrficas

    HERDER, J. G. (1975). Abhandlung ber den Ursprung der Sprache. Stuttgart:Reclam.

    HUMBOLDT, W. v. (1909). Wilhelm von Humboldts gesammelte Schri ften 1.Abteilung Band 8. Berlin: Behr.

    JAHN, J . (1956). Die Kunst zwischen den Sthlen Ein Dialog. In: Akzente 3.Jahrgang 1956, 426-431.

    MILTON, J. (1993). O Poder daTraduo. So Paulo: Ars Poetica.

    MILTON, J. (1998). O Poder da Tr aduo. So Paulo: Martins Fontes.

  • 8/10/2019 O PRIMEIRO OU O SEGUNDO? A RESPEITO DA EXPOSIO DE JOHN MILTON SOBRE A TEORIA DE TRADUO DE FRI

    12/12

    110 Werner Heidermann

    SCHLEIERMACHER, F. (1838). Ueber die verschiedenen Methoden desUebersezens.In: Friedrich Schleiermachers smmtliche Werke, Dritte Abtheilung:Zur Philosophie, Zweiter Band. Berlin: Reimer.