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Pesquisa em Debate, edição especial, 2009 ISSN 1808-978X O PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO PARA A FORMAÇÃO DE SARGENTOS DA POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE SÃO PAULO Cláudio Alencar Dores Mestre em Educação, Administração e Comunicação pela Universidade São Marcos Alzira Lobo de Arruda Campos Livre-docente em História pela Unesp e professora da Universidade São Marcos

O PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO PARA A …€¦ · interpessoais dentro de um grupo social, ... segundo Rodrigo Batagello, para criticar a formação tradicional que vinha ... o Curso

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ISSN 1808-978X

O PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO PARA A FORMAÇÃO DE

SARGENTOS DA POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE SÃO PAULO

Cláudio Alencar Dores

Mestre em Educação, Administração e Comunicação pela Universidade São Marcos

Alzira Lobo de Arruda Campos

Livre-docente em História pela Unesp e professora da Universidade São Marcos

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Resumo

Estudo do processo de formação dos sargentos da Polícia Militar do Estado de São

Paulo, realizado pelo Centro de Formação e Aperfeiçoamento de Praças (CFAP),

centrado no projeto político pedagógico desenvolvido. As teorias pedagógicas

desenvolvidas por Libâneo, Saviani e Freire servem de base para a análise efetuada.

Palavras-chave: projeto político-pedagógico, Polícia Militar de São Paulo, formação de

sargentos.

Abstract

Study of the formation process of the sergeants of the Military Police of São Paulo,

conducted by the Centre for Development and Improvement of Police (CFAP), focused

on political pedagogical project developed. Pedagogical theories developed by Libâneo,

Saviani and Freire are the basis for the analysis performed.

Keywords: political pedagogical project, the Military Police of São Paulo, training

sergeants.

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O conhecimento acadêmico a respeito das instituições de segurança, até o último

quartel do Século XX, foi restrito aquilo que os interessados haviam escrito e que

constituíam histórias contadas ou breves notícias sobre por eles observados. É dentro

desses limites que este artigo aborda o surgimento e o desenvolvimento das instituições

educacionais, conceituadas, para efeitos desta análise, como um conjunto de pessoas

autorizadas ao uso de força física (real ou simbólica), para regular as relações

interpessoais dentro de um grupo social, mediante autorização desse grupo1. Fato que,

com a urbanização, permitiu ao homem experimentar a alteridade, a segurança material

e afetiva e a proteção social.

Em meio ao contexto das instituições, o aparecimento do organismo policial está

entrelaçado à própria organização política e social das comunidades. Modernamente,

por mais concisa que seja, a definição restitui perfeitamente as três dimensões da função

policial às quais os cidadãos, sobretudo nas últimas três décadas, estão acostumados, e

que fazem a polícia constituir uma organização jurídica e um sistema de ação, cujo

recurso essencial é a força, mas, ao mesmo tempo, obriga-a a desempenhar um papel

social.2

Não é possível, portanto, compreender o papel de uma instituição sem que se

compreenda sua cultura. Inútil seria compreender sua cultura, como conjunto de práticas

que pressionam fortemente o comportamento de seus membros, sem que se proceda a

uma análise da história da instituição, sua resposta às mudanças sociais, a criação de

comportamentos habituais derivados da repetição de condutas de sucesso, seus ritos e

interpretação da realidade.

Nos dias de hoje, na grande maioria das nações, existe uma força pública que se

encarrega de manter o equilíbrio social, cabendo ao Estado, como representante da

comunidade geral, criá-la, mantê-la e controlá-la como agências públicas, especializadas

e profissionais.3

A polícia militar foi criada pelo Coronel Rafael Tobias de Aguiar, por meio dos

atos de 15 de dezembro de 18314 e de 5 de julho de 1832, aprovados pelo Conselho da

1 DANTAS, Diógenes Filho. Segurança e Planejamento. Rio de Janeiro: Ciência Moderna, 2004, p. 11. 2 LUIZ, Ronilson de Souza. O Currículo de Formação de Soldados da Polícia Militar frente às demandas

democráticas. São Paulo: PUC, 2003 (Dissertação de Mestrado). 3 BARLEY, D.H. Padrões de Policiamento : uma análise internacional comparativa.Trad. bras. São

Paulo: USP/Fundação Ford/Núcleo de Estudos da Violência – USP, 2001 (Polícia e Sociedade, nº 1). 4 Data comemorativa da criação da Polícia Militar do Estado de São Paulo.

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Presidência da Província.O primeiro criou a Guarda Municipal Permanente, e o segundo

organizou a Seção de Cavalaria, complemento da primeira. Esses organismos

constituíram a célula original da Polícia Militar do Estado de São Paulo, corporação

policial-militar, à qual o Estado confia a guarda da Lei e a manutenção da ordem

pública.

A Constituição de 1988 procura valorizar o principal elemento da ordem social,

qual seja, a “segurança pública”. Procura, ainda, guardar a correta grandeza entre a

ordem pública e a segurança pública, sendo esta exercida em função daquela, como um

de seus aspectos.

Lembre-se, a propósito, que “segurança pública” é um conceito mais restrito que

“ordem pública”, esta a ser preservada pelas Polícias Militares (artigo 144, § 5º, da

Constituição Federal5), às quais se atribuiu, além das atividades de polícia de segurança

ostensiva, as, também, referentes à “tranqüilidade pública” e à “salubridade pública”.6

Atualmente, a Polícia Militar do Estado de São Paulo possui uma grande estrutura

administrativa e operacional, a fim de cumprir seus objetivos constitucionais, contando

com órgãos de direção, de apoio e de execução, distribuídos em 47 Organizações

Policiais Militares, que detêm a competência de gerenciar, planejar e executar o

policiamento ostensivo, em suas várias modalidades, no território paulista.

Assim, as raízes históricas que marcaram o nascimento da Polícia Militar paulista e

o caminho percorrido por essa instituição até os dias atuais culminaram com suas

próprias atribuições constitucionais, fato que gerou um ensino específico voltado para a

formação de seus profissionais, que necessita ser compreendido e analisado sob a óptica

da sociedade contemporânea.

O ensino – entendido este em sua acepção mais ampla, que permite nele albergar

práticas mais rudimentares sob o ponto de vista pedagógico, como o treinamento e a

instrução – constitui atividade que desde sempre fez parte das preocupações das

instituições militarizadas. Em A República, Platão desenvolve criteriosa consideração

acerca do preparo militar dos cidadãos das polis gregas, e o fez, segundo Rodrigo

Batagello, para criticar a formação tradicional que vinha sendo imposta aos jovens

gregos, principalmente por desacreditar o valor dos exemplos típicos divulgados pela

5BRASIL.Constituição da República Federativa do Brasil (1988), Op. cit. p. 338. 6 LAZZARINI, Álvaro et al. Direito Administrativo da Ordem Pública. 2ª ed., Rio de Janeiro: Forense,

1987.

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epopéia Homérica, que se prestavam ao papel de modelos de ações morais e até mesmo

de práticas militares:

Justamente por negar a autoridade da educação tradicional neste campo é que

Platão se viu obrigado a tratar do problema da formação dos militares e

estruturar, na República, uma espécie de currículo para este estrato social da

polis. 7

Dessa forma, mesmo quando, pouco mais de dois séculos depois, deu-se a

instituição do Corpo Policial Permanente – origem remota da PMESP –, o ensino

militar, era ainda bastante precário, quase inexistente. Não se conhece a existência de

muitas fontes acerca do tema, mas as poucas referências são eloquentes em traduzir essa

precariedade.

Centros e Diretoria de Ensino da Polícia Militar Paulista

Com a finalidade de formar e aperfeiçoar o efetivo aproximado de 94.000 policiais

militares8 paulistas a Instituição conta com um complexo sistema de ensino com o

objetivo de formar e aproximar o policial militar da comunidade, estimulando o amor à

carreira e a profissionalização dos integrantes da Corporação, transmitindo-lhes os

conhecimentos técnicos peculiares das atividades policiais-militares, aprimorando o

profissional com plenas condições, para o exercício de suas funções.

Criada pelo Decreto nº 2.892, de 13 de janeiro de 1937 com a denominação de

Diretoria Geral de Instrução, passou por diversas transformações, evoluindo com a

Corporação, vindo a ser, hoje, a Diretoria de Ensino9. Está sediada no Quartel do

Complexo Administrativo "Cel. PM Hélio Guaycuru de Carvalho", e é o Órgão de

Direção Setorial do sistema de Administração de Ensino, integrando o Comando Geral

da Corporação. A ela estão incumbidos o planejamento, a coordenação, a fiscalização e

7 BATAGELLO, Rodrigo. A República de Platão: relações entre a crítica do sistema educacional grego

e as transformações na estrutura militar no período clássico. Dissertação (mestrado) - Universidade

Estadual de Campinas, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas. Campinas: [s.n.], 2005, p. 62. 8 Efetivo relacionado ao efetivo ativo da Corporação em novembro de 2008 (Site da Polícia Militar do

Estado de São Paulo acessado em 22 de novembro de 2008). 9Site da Polícia Militar do Estado de São Paulo (www.polmil.sp.gov.br) acessado em 22 de novembro de

2008.

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o controle da atividade de formação, aperfeiçoamento, e especialização tanto

profissional quanto desportiva dos policiais militares.

Subordinam-se à Diretoria de Ensino todas as demais Organizações Policiais

Militares (OPM) responsáveis pela formação dos policiais militares no Estado de São

Paulo, a saber: o CAES (Centro de Aperfeiçoamento e Estudos Superiores “Cel. PM

Nelson Freire Terra); a APMBB (Academia de Polícia Militar do Barro Branco); o CFS

(Centro de Formação de Soldados “Cel. PM Eduardo Assumpção”); o CCFO (Centro de

Capacitação Física e Operacional); e o CFAP (Centro de Formação de Aperfeiçoamento

de Praças).

A formação dos sargentos na polícia militar paulista.

O sargento na escala hierárquica da Polícia Militar do Estado de São Paulo

desempenha um papel de fundamental importância, não só pelos momentos históricos

vivenciados desde o momento de criação da milícia em 1831, mas principalmente por

figurar como a ligação entre as praças, que desempenham papéis operacionais na

instituição, e os oficiais – que exercem as funções diretivas e gerenciais nessa mesma

organização. Compete-lhe as funções de supervisão dos cabos e soldados, treinando-os,

fiscalizando-os e instruindo-os, com o foco direcionado aos princípios da eficiência

pública, primando pela prestação de um serviço de excelência à comunidade paulista, no

tocante à preservação da ordem pública, missão precípua da Polícia Militar, à luz do

texto constitucional.

Incumbe ao Centro de Formação e Aperfeiçoamento de Praças a missão de formar e

aperfeiçoar os sargentos paulistas, contando, para tanto, com dois cursos ali

implantados: o Curso de Formação de Sargentos (CFS) e o Curso de Aperfeiçoamento

de Sargentos (CAS).

O CFAP atualmente possui o Curso de Formação de Sargentos (CFS), o Curso de

Aperfeiçoamento de Sargentos (CAS), o Curso de Especialização de Praças – Prática de

Ensino (CEP – Prática de Ensino), o Curso de Especialização de Praças - Gestão de

Ensino (CEP – Gestão de Ensino), Estágio de Atualização Profissional de Praças e

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Oficiais do CFAP (EAP) e desenvolve esporadicamente o Curso de Formação de

Soldados, em apoio ao Centro de Formação de Soldados10.

Denomina-se Curso de Aperfeiçoamento de Sargentos aquele realizado no Centro

de Formação e Aperfeiçoamento de Praças, mas focado na formação continuada de

conhecimentos dos 2º Sargentos da Corporação, visando a habilitá-los ao desempenho

das funções de 1º Sargento PM e Subtenente PM, seja mediante o aprofundamento dos

acontecimentos gerais e técnico-profissionais já ministrados, seja mediante a oferta de

novos conhecimentos. O curso, com carga horária bem inferior ao Curso de Formação de

Sargentos, possui 534 horas/aula, equivalentes a 72 dias letivos de curso.

O Curso de Formação de Sargentos

O Curso de Formação de Sargentos (CFS) prepara os cabos de Polícia Militar ao

exercício de cargos e funções inerentes à graduação de sargentos da Polícia Militar do

Estado de São Paulo e de outros Estados do Brasil.

Para ingressar nele. o candidato, entre outros requisitos, deverá ser do efetivo da

Corporação, na graduação de Cabo (masculino ou feminino); estar, no mínimo, no

comportamento “BOM” há dois anos; ter sido considerado apto em inspeção de saúde;

ter sido considerado apto em Teste de Aptidão Física; ter concluído o ensino médio ou

equivalente; ser motorista habilitado, nos termos do Código de Trânsito Brasileiro; ter

aptidão em datilografia ou digitação; estar no efetivo exercício das funções policiais-

militares; ter, nos últimos quatro semestres, analisados no exercício da função, obtido

como resultado de avaliação de desempenho, conceito considerado, no mínimo, dentro

do esperado para o cargo.

Possui duração de 1.313 horas/aula curriculares, equivalentes a aproximadamente

36 semanas de curso, excluindo as 60 horas de estágio que são realizadas fora do

expediente escolar.

O objetivo principal do curso é qualificar profissionalmente o futuro sargento

policial-militar, promovendo a sua habilitação técnica, humana e conceitual para o

exercício consciente, responsável e criativo das funções de liderança, gestão e

assessoramento, nos limites de suas atribuições hierárquicas, dotando-o de capacidade

10 O Centro de Formação de Soldados Cel. PM Eduardo Assumpção solicita ocasionalmente o apoio de

outros centros de ensino da PMESP para a formação complementar dos soldados da corporação.

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de análise de questões atuais que envolvam o comando na execução das atividades de

polícia ostensiva, de preservação da ordem pública, em conformidade com a filosofia de

polícia comunitária, além de outras definidas em lei, bem como a execução das

atividades de bombeiro e de defesa civil.

Figura 1. Aula de Tiro Figura 2: Sala de aula

Fonte: Arquivo de Cláudio A. Dores Fonte: : Arquivo de Cláudio A.Dores

Figura 3. Aula de Condic.. Físico Figura 4. Aula de Proc. Operacionais

Fonte. Arquivo de Cláudio A. Dores Fonte. Arquivo de Cláudio A. Dores

As disciplinas do curso.

O Curso de Formação de Sargentos – desenvolvido em 2008 – conciliou em sua

grade curricular disciplinas teóricas e práticas, totalizando 25 matérias e contou com

atividades curriculares diversas (avaliações, treinamentos, formaturas, visitas e

competições) e extracurriculares (estágios operacionais).

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A disciplina Comunicação e Expressão visa proporcionar conhecimentos que

capacitem os alunos a desempenhar corretamente suas funções, quer seja na elaboração

de documentos ou em sua comunicação verbal com o público interno ou externo, além

de conhecer os processos linguísticos, em especial no que toca às suas lógicas e

racionalidade, bem como as estruturas básicas sobre as quais se organiza a

comunicação, compreendendo suas funções.

A disciplina Gestão Contemporânea da Qualidade permite internalizar os

conceitos, princípios e fundamentos da Qualidade Total, colaborando na consolidação

da implantação do Policiamento Comunitário, já que é uma importante ferramenta para

o futuro sargento compreender a necessidade de exercer com excelência sua função

profissional, internalizar a nova realidade organizacional e do mundo contemporâneo.

Informática tem como principal objetivo capacitar os alunos perante os aspectos

básicos de informática, levando-a a compreender a manutenção básica de usuário de

equipamento, executando corretamente a segurança e a limpeza dos equipamentos,

seguir devidamente as normas de segurança de dados, além de saber operar basicamente

um equipamento nos sistemas utilizados na Corporação (DOS, WINDOWS, WORD e

EXCEL) e a rede internet e intranet da Polícia Militar.

A matéria Prática de Ensino é voltada para os aspectos instrucionais de que estará

investido o futuro sargento da Corporação, proporcionando-lhe conhecimentos que o

capacitem a atuar como docente nos cursos e estágios desenvolvidos na Corporação,

buscando articulação entre o ensino na Polícia Militar do Estado de São Paulo e o

Serviço Policial-Militar.

A disciplina Psicologia Aplicada proporciona a aquisição de conhecimentos que

favoreçam a otimização do potencial humano e profissional do futuro sargento de

Polícia Militar, no tocante a desempenhar diretamente as funções ligadas à supervisão

de pequenos grupos de pessoas, que atuam nas mais diferentes atividades desenvolvidas

pela Instituição, favorecendo a interação com os mais diversificados seguimentos

sociais, primando pela prática de um relacionamento cordial e profissional e que,

sobretudo, valorize o respeito à vida, à integridade física e à dignidade da pessoa

humana.

O conteúdo programático de Direitos Humanos pretende envolver o acadêmico na

certeza de que deve atuar dentro dos limites da legalidade e consciente da necessidade

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do respeito à dignidade humana, conhecendo e pautando a conduta policial-militar de

acordo com os princípios éticos e legais de padrão internacional, além de identificar as

condições exatas para uso dos meios moderados para a contenção de pessoas e da

utilização de arma de fogo, previstas no Direito Internacional, relacionando-as com a

atividade policial-militar.

A matéria Legislação Penal e Processual Penal permite desenvolver e conhecer,

em níveis mais profundos de detalhamento, as normas jurídicas que dispõe sobre o

crime, a pena e a persecução penal, de maneira a executar com proficiência as funções

que lhe são inerentes na atividade de polícia ostensiva.

Medicina Legal e Criminalística objetiva o estudante a identificar e compreender o

delito como fator humano e social, reconhecendo os principais sintomas do abuso de

drogas e seus efeitos, conhecendo e identificando as noções básicas de Medicina Legal e

Criminalística, bem como o local de crime e sua respectiva preservação.

A disciplina Polícia Judiciária Militar conduz o aluno a conhecimentos sobre as

atividades de Polícia Militar Judiciária dentro dos preceitos legais, capacitando-o na

aplicação dos conceitos básicos do Direito Penal Militar e Processual Penal Militar,

além de habilitá-lo às funções de escrivão nos procedimentos de Polícia Judiciária

Militar (Inquérito Policial Militar, Auto de Prisão em Flagrante Delito e Termo de

Deserção).

Administração da Polícia Militar situa e distingue a Organização da Polícia Militar

do Estado de São Paulo, proporcionado ao discente reconhecer e identificar conceitos

previstos em leis, decretos e publicações afetas à administração de pessoal, vencimentos

e vantagens, bem como ter plena ciência dos seus direitos e deveres junto à Corporação,

facilitando a obter noções sobre o sistema de administração financeira da Corporação e

noções sobre o sistema de administração de material da Corporação.

Comunicação Social promove o conhecimento e utilização do Sistema de

Comunicação da Polícia Militar, de forma sistêmica e estratégica, bem como as leis e as

normas em vigor que o regulam, aliado à compreensão do funcionamento da imprensa e

sua função social junto à comunidade, habilitando-o no emprego de técnicas de

entrevistas para a divulgação da Instituição junto aos veículos de comunicação.

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A disciplina denominada Defesa Pessoal proporciona conhecimentos que

capacitem o aluno a conhecer e executar as técnicas básicas de defesa pessoal para o

exercício da função policial-militar.

A matéria intitulada Doutrina de Polícia Comunitária possibilita ao Aluno

Sargento atuar no Policiamento Comunitário segundo normas e orientações técnicas, de

forma que compreenda a importância de relacionar-se com a comunidade durante sua

atuação no policiamento, sempre norteado pelos princípios internacionais que regem a

atuação dos órgãos encarregados da aplicação da lei, respeitar o cidadão, garantindo-lhe

a integridade física e a dignidade.

Disciplina voltada ao bom condicionamento físico do policial militar, Educação

Física demonstra ao aluno a forma de realizar o Teste de Aptidão Física (TAF) da

Polícia Militar com planilhamento pelo instrutor e principalmente conscientizar o

policial militar dos benefícios advindos da prática de Educação Física para obtenção de

saúde e para que se preste como formador de opinião na tropa sobre o assunto.

O estudo dos valores e deveres policiais-militares está expressa na disciplina Ética

Profissional que visa estimular o estudo da ética policial-militar à luz dos direitos

fundamentais da cidadania e da pessoa humana, além de identificar a razão e finalidade

da conduta ética na atividade policial-militar e internalizar os valores e deveres éticos

próprios da instituição como pressuposto para um atuar deontológico.

O conteúdo existente na matéria Força Tática leva o Aluno Sargento a atuar em

ações de Força Tática, dentro das diretrizes do Comando Geral para o patrulhamento de

Força Tática de saturação e apoio em ações policiais de risco, proporcionando assim

condições para que exerça esta atividade de forma segura, com o mínimo de risco para

sua integridade e com o uso adequado e proporcional da força necessária para tais

ações.

A disciplina Informações fornece conhecimentos que capacitem o aluno a utilizar

as informações operacionais para melhor desempenhar o policiamento preventivo e

preservação da ordem pública, compreendendo o delito como fator humano e social,

levando-o a conhecer os diversos sistemas inteligentes existentes na Polícia Militar do

Estado de São Paulo e saber interpretá-los e usá-los com eficiência no desempenho da

atividade fim da Corporação.

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Legislação Organizacional, Correspondência na Polícia Militar e Educação

Institucional capacita o aluno no conhecimento da legislação que norteia a organização

da Polícia Militar do Estado de São Paulo como órgão público e a legislação que norteia

o comportamento de seus integrantes, recurso e recompensas na Polícia Militar,

identificando os tipos de documentos utilizados na Polícia Militar do Estado de São

Paulo para que desempenhe atividades educacionais dentro da área da ética profissional,

princípios de hierarquia, disciplina e regulamentação da continência.

No tocante ao conhecimento sobre deslocamentos de tropa, a disciplina Ordem

Unida proporciona conhecimentos que capacitem o aluno a comandar fração de tropa,

com espírito de liderança, e conscientizar-se da importância da aquisição do espírito de

corpo por parte dos integrantes da Corporação.

A matéria Polícia Ostensiva propicia conhecer a doutrina do Policiamento

Ostensivo e a rotina administrativo-operacional de uma Companhia Policial Militar,

além da correta aplicação das técnicas de abordagem à pessoa submetida à fiscalização

de polícia, pessoa em atitude sob fundada suspeita e infrator da lei, permitindo ao futuro

sargento conhecer as táticas e técnicas não letais de intervenção policial, identificando

as situações de crise, acionando e utilizando os meios mais adequados (negociação) para

possíveis soluções, bem como aprendendo o embasamento jurídico para a realização da

busca pessoal e da utilização de algemas e o emprego dos métodos de contenção não

letais, como o uso de munições químicas, explosivas e de borracha.

A disciplina Policiamento de Trânsito analisa, interpreta e identifica a legislação de

trânsito aplicável ao policiamento preventivo, para que o formando possa exercer, na

esfera de suas atribuições, as atividades de fiscalização de trânsito próprias da Polícia

Militar, bem como fiscalizar a execução das que tenham sido praticadas por seus

subordinados.

Com o fim de desenvolver a competência do discente no conhecimento dos

conceitos básicos de direito administrativo e dos processos administrativos da Polícia

Militar, a disciplina Processos Administrativos objetiva a aplicabilidade desses

conceitos na Administração da Polícia Militar do Estado de São Paulo, habilitando o

educando a atuar na função de escrivão nos diversos processos da Corporação, isto é,

Sindicâncias, Conselhos de Disciplina, Processos Administrativos Sumários,

Procedimentos Disciplinares, Procedimentos Administrativos Exoneratórios, etc.

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O maior objetivo de Pronto Socorrismo é capacitar o aluno prestar atendimento

pré-hospitalar a vítimas de acidentes ou enfermidades imprevistas, bem como aplicar

técnicas adequadas de primeiros socorros, durante as atividades de Policiamento,

especialmente quanto ao uso do aparelho Desfibrilador Externo Automático em vítimas

adultas e crianças inconscientes.

A disciplina Supervisão e Fiscalização Operacional favorece a execução dos

procedimentos do Comandante de Grupo de Patrulha no Policiamento ostensivo,

incutindo-lhe sobre a importante posição que ocuparão no contexto da Corporação,

devendo ser sempre o exemplo correto a ser seguido.

Por fim, a última disciplina prevista na grade curricular do Curso de Formação de

Sargentos, a saber, Tiro Defensivo na Preservação da Vida “Método Giraldi” permite

ao discente desenvolver e aprimorar habilidades para o manuseio e emprego da arma de

fogo de porte individual, bem como as armas de apoio para o serviço policial em

conformidade com as táticas e técnicas padronizadas na Polícia Militar do Estado de

São Paulo, além de habilitar o aluno Sargento de Polícia Militar a ser usuário da pistola

40 S&W, da espingarda gauge 12 e da submetralhadora FAMAE .40 S&W, de acordo

com as técnicas e táticas em vigor na Polícia Militar.

O projeto pedagógico do curso de formação de sargentos perante a legislação

nacional de ensino

O Estado de São Paulo foi o pioneiro no país a editar legislação estadual

equiparando os cursos oferecidos por sua Polícia Militar estadual aos contidos na Lei de

Diretrizes e Bases da Educação Nacional.

Através da Lei Estadual Nº 1036 de 11JAN200811, os cursos desenvolvidos nos

centros de formação de policiais militares, a saber, Curso Superior de Polícia, Curso de

Aperfeiçoamento de Oficiais, Curso de Formação de Oficiais, o Curso de Formação de

Sargentos e o Curso de Formação de Soldados foram equiparados, respectivamente, aos

cursos de doutorado, mestrado, bacharelado, tecnologia e técnico de que tratam nossa

legislação de ensino.

11 SÃO PAULO (Estado). Lei Complementar Nº 1.036 de 11 de janeiro de 2008. Institui o Sistema de

Ensino da Polícia Militar de São Paulo. São Paulo: DOE, 12JAN2008.

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Assim se torna inevitável traçar um paralelo entre os princípios e valores trazidos

pela legislação federal de ensino, mormente a LDB, com os preceitos e prerrogativas

concedidas aos cursos ministrados pela Polícia Militar do Estado de São Paulo.

Muito embora a própria LDB confira autonomia às Forças Armadas e Polícias

Militares dos estados para gerirem seus cursos, com a devida equivalência de estudos,

não lhes atribuiu essa mesma independência no desrespeito as demais diretrizes

educacionais impostas pela Lei 9.394/96, cujos princípios e imposições devem ser

cumpridos por quaisquer cursos criados no país, sejam civis ou militares.

No caso específico do Curso de Formação de Sargentos, o legislador titulou seus

egressos como “Tecnólogos em Polícia Ostensiva e Preservação da Ordem Pública”, daí

a necessidade de compreenderem-se separadamente os significados das expressões

contidas nessa titulação.

Nessa linha de pensamento, ao ser comparado aos cursos superiores de tecnologia,

o Curso de Formação de Sargentos da instituição policial-militar passou a ter uma

significativa importância no contexto educacional brasileiro, motivo pelo qual a

necessidade de entendermos, pelo menos resumidamente, a história da legislação de

ensino brasileira, até a chegada da LDB, e especialmente discutir o papel dos cursos

tecnológicos frente às demandas sociais.

Finalmente, e certamente a parte mais lógico-argumentativa desta pesquisa, a

última seção pretendeu analisar algumas defasagens pedagógicas observadas no atual

Projeto Pedagógico do Centro de Formação de Aperfeiçoamento de Praças, propiciando

seus gestores a refletirem sobre eventuais mudanças curriculares, caso pretendam atingir

um nível de excelência educacional à luz da sociedade inclusiva brasileira.

A Lei Estadual Nº 1.036, de 11 de janeiro de 2008, e o Sistema de Ensino na Polícia

Militar do Estado de São Paulo

A Polícia Militar possui um sistema de ensino próprio denominado ensino policial-

militar previsto através de legislação específica e regulado por meio de normas

designada “Normas de Planejamento e Conduta do Ensino Policial Militar” (NPCE) e

“Instruções do Sistema Integrado de Treinamento” (I-22-PM).

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O modelo de estrutura militar herdado pelas polícias foi construído nas décadas de

1960 e 1970, a partir da Doutrina de Segurança Nacional e somente em 2008 a Polícia

Militar de São Paulo foi contemplada com uma nova lei de ensino, que ainda aguarda

regulamentação.

O tradicional modelo pedagógico militar priorizava o adestramento e o

condicionamento voltados para a constituição de uma força combatente, contudo, o

horizonte de polícia requer uma ênfase dirigida para a qualificação de um meio de força

comedida, cuja intervenção está constrangida pelos princípios da legalidade e da

legitimidade. Mostra-se, pois, indispensável o desenvolvimento da capacidade

individual de tomada de decisão em situações voláteis e com um elevado grau de

aleatoriedade12. Assim foi que, tratando exclusivamente do Sistema de Ensino da Polícia

Militar do Estado de São Paulo, em data de 11 de janeiro de 2008, foi promulgada pelo

Governador do Estado, a Lei Estadual Nº 1.036.

Os objetivos da criação da nominada legislação encontram-se alinhavados na

exposição de motivos Nº 040/06-ATP, datada de 26 de junho de 2006, subscritos pelo

então Secretário da Segurança Pública do Estado de São Paulo, Saulo de Castro Abreu

Filho e encaminhado ao Gabinete do Governador do Estado, transformando-se em

projeto de lei e, posteriormente, em lei estadual.

Depreende-se da exposição de motivos que a legislação em vigor pretendeu

harmonizar o ensino na Polícia Militar do Estado de São Paulo aos moldes dos

conceitos didático-pedagógicos instituídos pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação

Nacional (LDB) 13.

O ensino da Polícia Militar Paulista era regido, até então, pelo Decreto-Lei Nº 160

de 28 de outubro de 196914, o qual em conseqüência do decurso de tempo (36 anos)

estaria totalmente defasado frente à evolução da sociedade brasileira.

Entendia-se, também, que, não obstante a Polícia Militar de São Paulo possuir um

ensino diferenciado e peculiar, em razão da condição de militares estaduais de seus

12 LUIZ, Ronilson de Souza. Ensino policial-militar. São Paulo, 2008. Tese (Doutorado em Educação).

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, p. 56. 13 BRASIL. Lei Federal Nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da

educação nacional. Brasília, DF: DOU de 26DEZ1996. 14 SÃO PAULO. Decreto-Lei Nº 160 de 28 de outubro de 1969. Dispõe sobre o ensino na Força Pública

do Estado e dá outras providências correlatas. SP:DOE de 29OUT1969.

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integrantes15, era necessária uma adaptação aos parâmetros legais, tornando-se, assim, o

ensino policial-militar uma referência em técnica e modernidade para as demais polícias

brasileiras.

Por tais motivos, após serem analisados os princípios contidos na LDB e as

orientações da Secretaria de Educação Superior (SESU) 16 resolveu-se adaptar o sistema

educacional da Polícia Militar, para considerar os seus cursos, apresentados na

legislação, como cursos superiores, no intuito de melhor qualificar seus profissionais,

para uma perfeita prestação de serviços à comunidade.

O artigo 44 da LDB dispõe sobre a abrangência dos cursos superiores, definindo-os

como: cursos seqüenciais, de graduação, de pós-graduação e de extensão. Assim, dentro

das características próprias da Polícia Militar, pretendeu a legislação adaptar os cursos

da corporação com os de ensino superior elencados na LDB, de acordo com as

orientações da SESU.

A proposta da Lei Estadual Nº 1.036, ao instituir o Sistema de Ensino da Polícia

Militar, de características próprias, considerando-os de educação superior, era o de

qualificar recursos humanos para a ocupação de cargos policiais militares e para o

desempenho de funções previstas em lei, voltadas para a polícia ostensiva, a

preservação da ordem pública, adotando-se a filosofia de polícia comunitária, as

atividades de bombeiros e a execução das atividades de defesa civil.

Na Polícia Militar do Estado de São Paulo o Curso de Aperfeiçoamento de Oficiais

(CAO) 17 e o Curso Superior de Polícia (CSP) 18 são obrigatórios para habilitar o Oficial

ao acesso na escala hierárquica, conforme determina o Decreto-Lei Nº 667 de 2 de julho

de 1969, assim disposto no seu artigo 12:

Artigo 12 – O acesso na escala hierárquica, tanto de oficiais como de praças,

será gradual e sucessivo, por promoção, de acordo com legislação peculiar a

cada Unidade da Federação, exigidos os seguintes requisitos básicos:

a) Para promoção ao posto de Major: curso de aperfeiçoamento feito na

própria corporação ou em Força Policial de outro Estado;

15 O Artigo 42 da Constituição Federal estabelece que os integrantes das polícias militares estaduais são

considerados militares estaduais. 16 Unidade do Ministério da Educação responsável por planejar, orientar, coordenar e supervisionar o

processo de formulação e implementação da política nacional de Educação Superior. 17 O referido curso foi abordado no capítulo II, seção 2.4, desta pesquisa. 18 O referido curso foi tema abordado no capítulo II, seção 2.4., deste trabalho.

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b) Para promoção ao posto de Coronel: Curso Superior de Polícia, desde que

haja na Corporação.19

Esses cursos de pós-graduação, realizados obrigatoriamente pelos Oficiais da

Polícia Militar não tiveram, até a promulgação da nova lei de ensino, a nomenclatura

adequada de titulação acadêmica, titulação esta definida, por decretos, nas instituições

militares federais.

O Curso de Aperfeiçoamento de Oficiais e o Curso Superior de Polícia da Polícia

Militar do Estado de São Paulo, antes mesmo da promulgação da lei de ensino paulista,

deveriam ser considerados cursos de pós-graduação stricto sensu, com as peculiaridades

do ensino militar.

A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES),

constatando o grande número de cursos e programas explicitamente direcionados para o

mercado de trabalho, e sentindo ser o momento exato de propor uma alternativa mais

condizente com a realidade, institui uma comissão presidida por Darcy Dillenburg,

Diretor de Avaliação daquele órgão, encarregada de redigir documento básico, que

servisse de suporte a possível regulamentação sobre o assunto. Nessas circunstâncias, a

comissão assim se posicionou sobre o chamado “mestrado profissional”:

Participação de profissionais de empresas privadas no quadro de docentes.

Parcerias entre Universidades e empresas interessadas na qualificação de seus

funcionários. Organização de estrutura curricular adequada a um tempo de

titulação menor do que o atual. Utilização do ensino à distância como recurso

didático. Autofinanciamento do curso. Formatos alternativos à dissertação

como trabalho de final de curso.20

Na concepção, portanto, da lei de ensino, este mestrado profissional é o Curso de

Aperfeiçoamento de Oficiais da Polícia Militar, o qual foi totalmente reformulado para

atender às características mencionadas; já o Curso Superior de Polícia, também

reformulado para atender às exigências da CAPES para o sistema civil de ensino, é o

seu doutorado, com as particularidades do sistema militar.

19 Op. cit. p. 5593. 20 RBPG, Revista Brasileira de Pós-Graduação, Brasília: Capes, v.2, n.4, jul. 2005. p.165.

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Diante do exposto, restou, em decorrência da diferenciação do ensino militar,

preconizado pela LDB21, assim como em face dos sistemas adotados pelas Forças

Armadas, considerarem-se os cursos previstos na lei de ensino como superiores,

definindo-os como cursos sequenciais, de graduação, de pós-graduação e de extensão.

A lei previu também que o Sistema de Ensino da Polícia Militar compreenderá as

atividades de educação, treinamento e de pesquisa, realizadas nos estabelecimentos de

ensino próprios ou de outras organizações militares com tais incumbências. Valendo-se

também dos cursos, de estágios e de graduações de interesse da Corporação, realizados

por seu efetivo em organizações estranhas à sua estrutura, militares ou civis, nacionais

ou estrangeiras, para a qualificação de seus quadros, segundo a legislação vigente.

Em regra, definiu os princípios fundamentais do ensino policial-militar, dentre eles

a integração à educação nacional, a seleção por mérito, o pluralismo pedagógico e o

respeito aos direitos humanos fundamentais.

Outro aspecto importante trazido pela citada lei foi a conferição dos títulos de

Técnico e Tecnólogo de Polícia Ostensiva e Preservação de Ordem Pública aos soldados

e sargentos, respectivamente, formados no Curso de Formação de Soldados e Curso de

Formação de Sargentos; o grau universitário de Bacharel em Ciências Policiais de

Segurança e Ordem Pública ao Oficial formado pela Academia de Polícia Militar; os

títulos de Mestre e Doutor em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública aos

Oficiais que concluírem, respectivamente, o Curso de Aperfeiçoamento de Oficiais e o

Curso Superior de Polícia da Corporação.

De longa data alguns estudiosos do Direito Administrativo já alertavam o mundo

acadêmico e a sociedade civil para a necessidade de criação de uma definição sólida e

perene de uma ciência que interpretasse devidamente o objeto de estudo relacionado às

atividades atípicas desenvolvidas pelas polícias militares.

Nesse viés o Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo Álvaro

Lazzarini escreveu:

A Polícia, atividade jurídica do Estado, deve ter seus problemas solucionados

à luz das Ciências do Direito e da Administração Pública. O conhecimento

21 O Artigo 83 da LDB assim expressa: “o ensino militar é regulado em lei específica, admitida a

equivalência de estudos, de acordo com as normas fixadas pelos sistemas de ensino”.

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científico, abrangente de experiências diversas e sedimentado pelo tempo,

representa caminho seguro na tomada de posições.22

Por sua vez, cuidando do tema para as ciências sociais, William L. Kolb, autor

norte-americano, salienta que:

Em ciência social o termo ciência designa hoje o estudo sistemático e

objetivo dos fenômenos empíricos e o acervo de conhecimentos daí

resultante; os cientistas sociais consideram que suas disciplinas são, nesse

sentido, ciências, e que a própria ciência como atividade humana é objeto de

pesquisa em ciência social.23

E ainda, dissertando sobre "Interdisciplinaridade", Nilson José Machado

argumenta que:

Já há algum tempo, no entanto interdisciplinaridade tem sido uma palavra-

chave na discussão da forma organização do trabalho escolar ou acadêmico.

Dois fatos parecem estar diretamente relacionados com tal emergência. Em

primeiro lugar, uma fragmentação crescente dos objetos do conhecimento

nas diversas áreas, sem a contrapartida do incremento de uma visão de

conjunto do saber instituído tem-se revelado crescentemente desorientadora,

conduzindo certas especializações a um fechamento no discurso que

constitui um óbice na comunicação e na ação. Em segundo lugar, parece

cada vez mais difícil o enquadramento de fenômenos que ocorrem fora da

escola no âmbito de uma única disciplina. Hoje, a Física e a Química

esmiúçam a estrutura da matéria; a entropia é um conceito fundamental na

Termodinâmica, na Biologia e na Matemática da Comunicação; a Língua e a

Matemática entrelaçam-se nos jornais diários; a propaganda evidencia a fle-

xibilidade das fronteiras entre a Psicologia e a Sociologia, para citar apenas

alguns exemplos. Em, consequência, a idéia de interdisciplinaridade tende a

transformar-se em bandeira aglutinadora na busca de uma visão sintética, de

uma reconstrução da unidade perdida, da interação e da complementaridade

nas ações envolvendo diferentes disciplinas, mesmo com os obstáculos que

possam ocorrer, porque o interdisciplinar de que tanto se fala não está em

confrontar disciplinas já constituídas das quais, na realidade, nenhuma

22 LAZZARINI, Álvaro. Op. cit., p. 74. 23KOLB, William L. Verbete “ciência”. Trad. bras. de Antonio Garcia de Miranda Netto. Rio de

Janeiro:FGV,1986, p. 182.

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consente em abandonar-se. Para se fazer interdisciplinaridade, não basta

tomar um assunto (um tema) e convocar em tomo de duas ou três ciências. A

interdisciplinaridade consiste em criar um objeto novo que não pertença a

ninguém.24

Vê-se, portanto, que a interdisciplinaridade encontra-se presente na atividade

policial de segurança e ordem pública, haja vista a complexidade pertinente às funções

policiais, norteadas notadamente pelas áreas do Direito, da História, da Administração,

das Ciências Sociais, da Psicologia, entre outros ramos de conhecimento, atingindo

naturalmente o grau de ciências policiais, com objetos de estudo próprios.

Daí porque os policiais militares, que integram os órgãos de preservação da ordem

pública para todo o universo da atividade policial em tema "ordem pública" e,

especificamente, da "segurança pública", devem ter uma qualificação profissional ideal,

em conformidade com a filosofia de polícia comunitária, especialmente as funções

voltadas à polícia ostensiva e de preservação de ordem pública, às atividades de

bombeiro e à execução das atividades de defesa civil. Razão de o atual Sistema de

Ensino da Polícia Militar dever promover a transmissão de conhecimentos científicos e

tecnológicos, humanísticos e gerais, indispensáveis à educação e à capacitação, visando

à formação, ao aperfeiçoamento, à habilitação, à especialização ao treinamento do

policial militar, com o objetivo de torná-lo apto a atuar como operador do sistema de

segurança pública.25

No tocante à equivalência da titulação obtida nos órgãos de ensino policiais-

militares para fins civis, dado que essa validade pode ser arguida a qualquer tempo, em

matéria similar, a CAPES já se posicionou em caso envolvendo curso das Forças

Armadas, ocasião em que foi indagado ao Ministério Educação e Cultura sobre a

equivalência de títulos de pós-graduação obtidos no sistema de ensino militar para fins

civis, dado que a Diretoria de Avaliação indagou sobre a validade do título de "mestre

em aplicações militares" conferido pelo DEP (Departamento de Ensino e Pesquisa do

Exército), sendo decidido que:

O Curso de Aperfeiçoamento em Artilharia, realizado na Escola de

24 MACHADO, Nilson José. Educação: Projetos e Valores, Coleção Ensaios Transversais, 5ª ed. São

Paulo:Escrituras,2004, p. 116. 25artigo 1°, caput e parágrafo único, da Lei Complementar n. 1.036, de 11 janeiro de 2008.

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Aperfeiçoamento de Oficiais daquela Força, equivale (grifo do parecerista)

ao mestrado empreendido pelo sistema civil, face à similitude de duração,

objetivos e modelo de avaliação, razão pela qual ser indiscutível no sistema

civil, a validade nacional do nível de mestre granjeado no sistema militar,

porque esta validade decorre de Lei que confere autonomia ao sistema militar

para o ensino em todos os níveis. O que não implica seja o objeto dos estudos

do mestrado equivalente ao objeto de curso civil, reconhecimento que, na for-

ma do art. 83, da LDB (Lei de Diretrizes e Base da Educação), seria

competência do Ministério da Educação e o do Desporto. Face à

independência dos sistemas de ensino militar e civil, é inadmissível a

negativa de validade a título conferido pelo outro sistema. A competência

para reconhecer a equiparação ou equivalência de estudos, entretanto, é

detida pelo sistema em que se pretende adequar a aplicação dos

conhecimentos adquiridos. Nada impede, por igual, que o órgão competente

de qualquer dos Ministérios Militar (ao tempo do parecer cada Força tinha o

respectivo Ministério) reconheça equivalência a cursos civis na sua órbita

acadêmica, salvo disposição legal em contrário, tudo porque os sistemas

militares de ensino são autônomos e submetem-se a legislações diferentes

daquelas que regem o sistema civil, o que inviabiliza ao Ministério da

Educação e Cultura o reconhecimento ou equiparação dos cursos militares,

embora o Conselho Federal de Educação, ao declarar a equivalência de

cursos militares, apenas reconhece o valor acadêmico que facilita aos seus o

acesso e o aproveitamento de estudos nas Unidades do sistema civil de

ensino.26

Tudo isso, em tese, deve ser aplicação em relação ao Sistema de Ensino da Polícia

Militar do Estado de São Paulo, implementado por força da Lei Complementar n.

1.036, de 11 de janeiro de 2008, do Estado de São Paulo, haja vista que se deve aceitar

a existência de uma ciência policial, que a lei, no plural, denominou Ciências Policiais

de Segurança e Ordem Pública, com objetos de estudo multidisciplinares e informada

por mais de um dos ramos da Ciência.

Projeto Político-Pedagógico.27

26TAVARES DOS SANTOS, José. Parecer PJR/JT/041, 23/11198, no Processo Nº CI CAA 109, de

19OUT1998, da CAPES. 27 Este artigo adota a expressão Projeto Político-Pedagógico, entretanto, o produto do processo de

planejamento tem recebido outras denominações: projeto pedagógico-curricular, projeto pedagógico,

projeto educativo, projeto da escola, plano escolar, plano curricular, todas se referindo ao mesmo objeto.

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O projeto político-pedagógico é proposto com o objetivo de descentralizar e

democratizar a tomada de decisões pedagógicas, jurídicas e organizacionais na escola,

buscando maior participação dos agentes escolares. Previsto pela LDB como proposta

pedagógica28 ou como projeto pedagógico29, o PPP pode significar uma forma de toda a

equipe escolar tornar-se co-responsável pelo sucesso do aluno e por sua inserção na

cidadania crítica.

Pode-se afirmar que os levantamentos e estudos até hoje realizados no tocante às

eficientes práticas escolares indicam, com relativa segurança, que o primeiro passo para

a boa prática da sala de aula se dá fora desta última, no âmbito do Plano de

Desenvolvimento da Escola, mais especificamente, no coração desse plano, que é o

Projeto Pedagógico como processo permanente de planejamento e ajuste curricular.

Nessa perspectiva, o projeto político-pedagógico vai além de um simples

agrupamento de planos de capacitação, atualização, educação em serviço, etc. O projeto

não é algo que é construído e em seguida arquivado ou encaminhado às autoridades

como prova do cumprimento de tarefas burocráticas. Ele é construído e vivenciado em

todos os momentos, por todos os envolvidos com o processo educativo da instituição.

O projeto busca um rumo, uma direção. É uma ação intencional, com um sentido

explícito, com um compromisso definido coletivamente. Por isso, todo projeto

pedagógico é, também, um projeto político por estar intimamente articulado ao

compromisso sociopolítico com os interesses reais e coletivos da população majoritária.

É político no sentido de compromisso com a formação do cidadão para um tipo de

sociedade.

Nesse sentido Saviani comenta:

A função política da educação se cumpre na medida em que ela se realiza

enquanto prática especificamente pedagógica. Na dimensão pedagógica

reside a possibilidade da efetivação da missão da instituição, que é a

formação do cidadão de direitos e deveres, participativo, responsável,

compromissado, crítico e criativo. Pedagógico, no sentido de definir as ações

28 Artigos 12 e 13 da Lei Federal 9.394/96. 29 Artigo 14, inciso I, da Lei Federal 9.394/96.

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educativas e as características necessárias às instituições, de cumprirem seus

propósitos e sua intencionalidade.30

Contudo, apesar da importância desse documento para o planejamento do processo

ensino-aprendizagem de qualquer instituição de ensino, mormente as de nível superior,

o Centro de Formação e Aperfeiçoamento de Praças, até o presente momento, não o

possui, limitando-se na edição quadrienal de um documento denominado “currículo”, o

qual ainda não satisfaz as exigências completas de um projeto de ensino.

O mero cotejo do referido documento, que reproduz as atuais práticas pedagógicas

desenvolvidas pelo CFAP no Curso de Formação de Sargentos, reflete a desatualização

curricular frente às demandas democráticas e a necessidade de rever algumas disciplinas

que representam ainda o ideário do passado vivido na época do regime militar.

Assim, disciplinas como Força Tática (96 horas-aula), Informações (22 horas-aula)

e Ordem Unida (16 horas-aula), poderiam ser facilmente abolidas ou, ao menos, terem

suas cargas horárias reduzidas, visando à formação humanista e comunitária, a que se

referem os próprios valores do ensino policial-militar, os quais valorizam a proteção da

vida, da dignidade humana e as estruturas e convicções democráticas.

Práticas pedagógicas direcionadas à ação

Para Libâneo, a monopolização do conhecimento contribui, sistematicamente,

com a manutenção de uma estrutura social, que só geraria mudanças se os que estão à

margem da sociedade conseguissem apropriar-se do conhecimento. Este propósito está

muito evidente quando o autor teoriza acerca da Pedagogia Crítica Social dos

Conteúdos:

[...] o ensino [tem] a tarefa de propiciar aos alunos o desenvolvimento de suas

capacidades e habilidades intelectuais, mediante a transmissão e a aquisição

ativa dos conteúdos escolares, articulando no mesmo processo, a aquisição e

noções sistematizadas e as qualidades individuais dos alunos que lhe

possibilitam a auto-atividade e a busca independente e criativa das noções.31

30 SAVIANI, Dermeval. Escola e democracia. 27ª ed. Campinas: Autores Associados, 1993. 31 LIBÂNEO, José Carlos. Didática. São Paulo: Cortez, 1994.

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Da mesma forma, não deve o educando, independentemente do nível de ensino em

que se encontre, ser um sujeito passivo, apático, incompreensivo às questões sociais,

econômicas e culturais a ele afetas; o professor, do mesmo modo, não pode estar restrito

a ser um mero transmissor de conhecimentos, os quais estariam longe da realidade

prática que o aluno encontrará após formado.

A crítica de Freire situa-se justamente aos currículos existentes que preceituam a

chamada “educação bancária”:

O educador é o que educa; os educandos, os que são educados; o educador é o

que sabe; os educandos, os que não sabem; o educador é o que pensa; os

educandos, os pensados; o educador é o que diz a palavra; os educandos, os

que a escutam docilmente; o educador é o que disciplina; os educandos, os

disciplinados; o educador é o que opta e prescreve sua opção; os educandos os

que seguem a prescrição; o educador é o que atua; os educandos, os que têm a

ilusão de que atuam; o educador escolhe o conteúdo programático; os

educandos, se acomodam a ele; o educador identifica a autoridade do saber

com sua autoridade funcional, que opõe antagonicamente à liberdade dos

educandos; estes devem adaptar-se às determinações daquele; o educador,

finalmente, é o sujeito do processo; os educandos, meros objetos.32

Formação de um projeto interdisciplinar

Interdisciplinaridade é uma nova atitude diante da questão do conhecimento, de

abertura à compreensão de aspectos ocultos do ato de aprender e dos aparentemente

expressos, colocando-os em questão.

Todo projeto interdisciplinar competente nasce de um locus bem delimitado,

portanto é fundamental contextualizar-se para poder conhecer. A contextualização exige

que se recupere a memória em suas diferentes potencialidades, resgatando assim o

tempo e o espaço no qual se aprende.

Para Ivani Fazenda,

A formação na educação pela e para a interdisciplinaridade se impõe e

precisa ser concebida sob bases científicas, apoiadas por trabalhos

desenvolvidos na área, trabalhos esses referendados em diferentes ciências

32 FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio: Paz e Terra, 1983.

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que pretendem contribuir desde as finalidades particulares da formação

profissional até a atuação do professor. A formação à interdisciplinaridade

(enquanto enunciadora de princípios) pela interdisciplinaridade (enquanto

indicadora de estratégias e procedimentos) e para a interdisciplinaridade

(enquanto indicadora de práticas na intervenção educativa) precisa ser

realizada de forma concomitante e complementar. Exige um processo de

clarificação conceitual que pressupõe um alto grau de amadurecimento

intelectual e prático, uma aquisição no processo reflexivo que vai além do

simples nível de abstração, mas exige a devida utilização de metáforas e

sensibilizações.33

O Parecer CNE/CEB nº 16/9934, ao tratar das Diretrizes Curriculares Nacionais para

a Educação Profissional de Nível Técnico, assinalou que a elaboração de currículos da

Educação Profissional deve ser pautada, dentre outros fatores, pelos princípios da

flexibilidade, da contextualização e da interdisciplinaridade. Tais princípios são

pertinentes e sinalizadores para a Educação Profissional de Nível Tecnológico.

Os Institutos Superiores de Educação deverão caracterizar-se como promotores

de formação profissional, fazendo da prática de ensino, da organização das escolas

e da reflexão sobre elas o núcleo central da formação inicial e continuada de

professores, candidatos à docência e às demais atividades do magistério,

favorecendo a abordagem multidisciplinar e interdisciplinar e constituindo-se em

centros de referência para a socialização e a avaliação de experiências pedagógicas

e de formação.

O próprio Ministério da Justiça, através da Secretaria Nacional de Segurança

Pública – SENASP – editou, em 2002, apostila destinada ao Programa de Treinamento

para Instrutores e Especialistas Policiais, adotando a interdisciplinaridade como um dos

pilares para o ensino nos centros formadores policiais brasileiros:

E tudo isso porque há que enfrentar o velho, o estabelecido, o tradicional, o

convencional. O que fundamenta seu poder em tudo isso e não na imanência

de uma proposta. Poder emanado de sistemas fechados e protegido por

33 FAZENDA, Ivani Catarina Arantes. Dicionário em construção: interdisciplinaridade. 2ª ed. São Paulo:

Cortez, 2002. 34 BRASIL. CBE, Parecer Nº 16 de 05 de outubro de 1999. Diretrizes Curriculares Nacionais para a

Educação Profissional de Nível Técnico: site www.crmariocovas.sp.gov.br/pdf/diretrizes_p0347-

0353_c.pdf (acessado em 19DEZ08).

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estruturas mentais anacrônicas e estereotipadas que se baseiam em sistemas

teóricos de tempos que já passaram.Por esse motivo, é fundamental, para uma

concepção de interdisciplinaridade, principalmente se dimensionada no

universo dos bens simbólicos, que esta não se detenha no formalismo de uma

proposta organizacional. É preciso ir mais fundo, penetrando nas estruturas

pensantes e nos universos pensados: os paradigmas ordenadores do

conhecimento humano e as ordenações mentais que lhes dão suporte e

fundamento.35

A grade curricular do Curso de Formação de Sargentos deve ser, na sua essência,

multidisciplinar, apoiada em ciências que interessam à atividade policial de segurança e

da ordem pública.

As disciplinas adotadas no curso devem transcender aos interesses corporativistas e

isso se obtém através de um novo olhar no currículo do Curso de Formação de

Sargentos: olhar o que não se mostra e alcançar o que ainda não se consegue. Isso

envolve uma nova atitude de aprendiz-pesquisador, o que aprende com sua própria

experiência, pesquisando. Para tanto, é impossível pensá-lo como um modelo estático,

ou que deve mudar a cada quatro anos36, ou um paradigma ao qual, por exemplo, um

currículo deva conformar-se. Pressuporiam paradoxos que desafiam e revolucionam os

paradigmas norteadores, desestabilizando-os para conduzi-los a uma nova ordem.

É de uma visão o mais possível didática desse trajeto de quase 18 décadas, marcado

pelo acúmulo de experiências vivenciadas por sucessivas gerações de policiais militares,

que se podem extrair algumas conclusões e, até mesmo, inferir certas condutas, ousando

antever projeções sobre seu futuro papel, a serviço de uma sociedade em permanente

processo de mudança.

O Sistema de Ensino da Polícia Militar promove a transmissão de conhecimentos

científicos e tecnológicos, humanísticos e gerais, indispensáveis à educação e à

capacitação, visando à formação, ao aperfeiçoamento, à habilitação, à especialização e

ao treinamento do policial militar, com o objetivo de torná-lo apto a atuar como

operador do sistema de segurança pública.

35 GRECO, Milton. Iniciando a reflexão sobre interdisciplinaridade. Curso de Capacitação Equipe

Técnica e Dirigentes de Centros de Ensino Policial. Brasília: Ministério da Justiça, 2002. 36 O atual currículo do Curso de Formação de Sargentos é quadrienal.

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Os centros de ensino da PMESP (DE, CAES, APMBB, CFSd, CCFO e CFAP)

qualificam os recursos humanos da instituição para o exercício das funções que lhes são

atribuídas por lei.

Devem passar esses centros de ensino da PMESP por uma acentuada

transformação, à vista das incessantes mudanças sociais, que afetam diretamente a

adequação de suas práticas pedagógicas, como também pela necessidade urgente de se

amoldarem à atual legislação estadual de ensino, que os equiparou aquelas modalidades

de ensino constantes na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.

Inserido nesse contexto educacional da Polícia Militar, está o sargento da

Corporação. Esse profissional desempenha o papel de supervisão nas áreas

administrativas e operacionais da instituição. Compete-lhe comandar os cabos e

soldados e subordinar-se a seus oficiais, daí ser conhecido no meio da caserna como o

elo entre tropa e comando.

Formado pelo CFAP (Centro de Formação e Aperfeiçoamento de Praças) o

sargento necessita, consequentemente, de preparo para gerir os meios pessoais e

materiais que estarão sob sua responsabilidade, exigindo uma formação voltada para a

Qualidade Total, com o objetivo maior de superar as expectativas da sociedade paulista,

motivo pelo qual a formação desse profissional deve ser alvo invariável de atualização,

sob pena de a corporação formar um profissional desalinhado com os objetivos maiores

da educação moderna, isto é, como fator de realização de cidadania, com padrões de

qualidade da oferta e do produto, na luta contra a superação das desigualdades sociais e

da exclusão social.

O CFS (Curso de Formação de Sargentos), nesse contexto, assume um papel de

vital importância para a Polícia Militar e para a sociedade, já que forma anualmente

cerca de 1.000 profissionais de segurança pública, que diuturnamente oferecerão seus

préstimos à sociedade paulista, motivos pelos quais devem estar capacitados a

compartilhar com essa sociedade de uma situação comunicativa ideal, devendo

conseguir situar-se em relação aos outros, de estabelecer relações entre objetos, pessoas

e idéias. Ademais, esse profissional, deve ser capaz de desenvolver sua autonomia, de

reconhecer nas regras e nas normas sociais o resultado do acordo mútuo, do respeito ao

outro e da reciprocidade.

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