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ORALIDADE EM SALA DE AULA INVESTIGAÇÃO SOBRE O TRABALHO COM A ORALIDADE NUMA ESCOLA PÚBLICA DE LAGOA SECA

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GT1: Ensino de língua materna e práticas de letramento na Educação Infantil e

Ensino Fundamental

ORALIDADE EM SALA DE AULA: INVESTIGAÇÃO SOBRE O TRABALHO

COM A ORALIDADE NUMA ESCOLA PÚBLICA DE LAGOA SECA

Laís Venâncio de Melo – UFCG¹ Micaelle Ribeiro do Nascimento – UFCG

1

Roziane Marinho Ribeiro - UFCG2

A oralidade é uma das modalidades da língua, importante tal como a escrita. O uso da fala

é mais comum no dia-a-dia, esse fato impulsiona a necessidade ditada pelos Parâmetros

Curriculares Nacionais (PCN), de se estudar as questões relacionadas à oralidade como

ponto de partida para entender o funcionamento da escrita. Se essa necessidade fosse

atendida, os educandos teriam mais facilidade ao longo do seu desenvolvimento escolar de

argumentar, mas geralmente as escolas priorizam o ensino da língua escrita, o que é

adequado, no entanto, não se pode esquecer que o primeiro domínio da língua é oral e que

o ensino do mesmo, é indispensável para o desenvolvimento do aluno, pois é sabido que a

oralidade é mais utilizada que a escrita, podendo se apresentar de diversas maneiras e o

aluno tem que ter conhecimento dos diversos gêneros orais. Este trabalho, como uma

pesquisa documental, objetivou investigar o processo de ensino da oralidade em cinco

salas de aula de uma escola pública da cidade de Lagoa Seca, sendo base para pesquisas

posteriores. O corpus constitui-se, então, da análise de 52 planejamentos semanais de aula

de cinco professoras, duas da Educação Infantil e três do 1º, 2º e 3º Ano do Ensino

Fundamental, além da análise de duas propostas de atividades orais. O trabalho

fundamenta-se teoricamente em Marcuschi e Dionísio (2005), Leite (2011), Bentes (2011),

Ribeiro (2009), entre outros. Os resultados apontam para um avanço quanto ao trabalho

com a oralidade nos planos de aula estudados, entretanto é preciso cautela, pois mesmo

sendo trabalhada a oralidade é tratada em alguns momentos como instrumento didático e

não como conteúdo em si, que deve ser trabalhado nas suas especificidades.

Palavras-chave: Oralidade. Planejamentos Semanais. Educação Infantil. Ensino

Fundamental.

1. INTRODUÇÃO

“Desenhem como foram suas férias”; “Registrem num texto escrito...”; “Imaginem

e escrevam outro final para a história que acabamos de estudar, depois lerão para a turma”;

Escrever e ler! Expressões tão comumente utilizadas pelos professores, mas, e se os

educadores não focassem exclusivamente nestes gêneros e utilizassem outras espressões,

tais como: “Conte-nos”; “Comentem”; “O que vocês acham?”; “Discutam com seus

colegas sobre o assunto”; “Expressem seus pensamentos, argumentando com os colegas.”

Faria alguma diferença no processo de ensino-aprendizagem dos educandos? O que eles

aprenderiam, através do estudo do gênero oral? Melhoraria o modo de se colocar nas

diversas situações?

1 Graduandas do curso de licenciatura em pedagogia, pela UFCG e bolsista do Programa de Educação

Tutorial, PET-pedagogia. 2 Professora da Unidade Acadêmica de Educação (UAED) da UFCG

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Mediante esses questionamentos, o presente trabalho se debruça a refletir sobre a

possibilidade do uso e do estudo do gênero oral em sala de aula. Com esse objetivo, o texto

a seguir fundamenta-se teoricamente em Marcuschi e Dionísio (2005), Leite (2011),

Bentes (2011), Ribeiro (2009), entre outros, e divide-se em três tópicos principais. O

primeiro tópico, denominado “Oralidade, escrita e leitura”, apresentará uma breve

discussão acerca da primazia da escrita e da leitura em relação a oralidade e a necessidade

de mudança dessa concepção. O segundo tópico, intitulado por “Oralidade como objeto de

estudo”, tem como intuito justificar o estudo do gênero oral em sala de aula, na medida em

que aponta algumas facilidades no desenvolvimento escolar dos alunos em relação a

oralidade, a argumentação, advindos do conhecimento dos diversos gêneros orais. No

terceiro e último tópico o trabalho centra-se na descrição e na análise de uma investigação

realizada em cinco salas de aula de uma escola pública da cidade de Lagoa Seca, no que

diz respeito à presença da oralidade. O corpus constitui-se, então, da análise de 52

planejamentos semanais de aula de cinco professoras, duas da Educação Infantil e três do

1º, 2º e 3º Ano do Ensino Fundamental, além da análise de duas propostas de atividades

orais. Os resultados apontam para um avanço quanto ao trabalho com a oralidade em sala

de aula, entretanto é preciso cautela, pois na maioria das vezes, a oralidade é tratada

unicamente como instrumento didático e não como conteúdo em si, que deve ser

trabalhado nas suas especificidades. Acredita-se, assim, que este trabalho possa servir

como base para pesquisas posteriores.

2. Oralidade e escrita

O presente tópico apresentará uma breve discussão sobre a supremacia da escrita

em relação à fala, juntamente com a defesa de um tratamento igualitário entre ambas,

reconhecendo assim, que as mesmas são compostas por similaridades e disparidades que

não fazem uma ou outra ser melhor. No entanto, antes de enfatizar as características de

cada uma dessas modalidades da língua, se faz necessário esclarecer o seu conceito.

O ser humano possui a capacidade de demonstrar seus pensamentos através de um

sistema de signos. A esta capacidade denominamos de linguagem, e à maneira como esta

linguagem é materializada chamamos de língua, esta se diferencia conforme a região e a

cultura de cada povo. “Mais do que um simples instrumento, a língua é uma prática social

que produz e organiza as formas de vida, as formas de ação e as formas de conhecimento”

(Marcuschi e Dionísio. 2005. p.14). Esse conhecimento faz referência a sociedade onde ela

é vigente. A língua, assim, representa a sociedade na qual ela está inserida, sendo

característica assim do seu povo, da sua história e cultura.

A língua possui diversas formas de se apresentar, dentre elas estão as duas

modalidades distintas da fala e da escrita. A fala, como representação da língua oral, é a

primeira a ser desenvolvida pela criança, a partir de sua interação com o meio, família e

amigos.

Além disso, a criança, o jovem ou o adulto já sabe falar com propriedade e

eficiência comunicativa sua língua materna quando entra na escola, e sua fala

influencia a escrita, sobretudo no período inicial da alfabetização, já que a fala

tem modos próprios de organizar, desenvolver e manter as atividades

discursivas. (Marcuschi e Dionísio. 2005. p.15)

Na citação acima, Marcushi e Dionísio destacam o fato de que a criança, jovem ou

adulto, ao entrar na escola possua a capacidade de se comunicar e representar suas

emoções usando a fala. O que ocasiona um destaque dado pela escola a escrita, já que a

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criança consegue usar a fala sem ter tido um ensino sistematizado, então, este não

necessitaria de acontecer na escola, pois a aprendizagem seria informal, acontecendo de

forma gradual. No entanto, como ressaltado pelos autores, a forma como falamos

influencia na maneira como escrevemos, dessa forma a escola deve aperfeiçoar o modo

como os alunos usam a oralidade, para que esta auxilie também na escrita.

A oralidade é desenvolvida pela criança com espontaneidade, o que também

acontece em muitos momentos de utilização da fala no decorrer da vida. Agrega-se a esta

característica, o fato de que a oralidade apresenta muitas variações, construídas conforme o

ambiente e o objetivo pretendido com sua utilização, como é o caso das gírias. Por estes

motivos, a fala pode ser considerada como uma modalidade menor ou mais simples que a

escrita. Em contraposição a este argumento Mascushi e Dionísio (2005. p.15) assevera que

“[...] não há razão alguma para desprestigiar a oralidade e supervalorizar a escrita”, porque

cada uma tem sua função e seu mérito.

Os referidos autores (Marcuschi e Dionísio. 2005. p. 25) também asseveram que é

inadequado afirmar que a fala é informal e a escrita é formal. A fala pode se apresentar de

maneira espontânea, todavia, ela também pode se apresentar de maneira formal, conforme

o lugar em que ela está sendo utilizada e o objetivo que se espera atingir com a mesma.

Conferências, palestras, entre outros, são exemplos de espaços onde a oralidade é usada

essencialmente formal, segundo as regras da língua. Do mesmo modo, a escrita,

dependendo do veículo de transmissão e do objetivo, pode se expor de forma espontânea,

por exemplo, num bate-papo da internet.

Outra diferença ressaltada por Marcushi e Dionísio (2005. p.21) é a de que “[...] a

fala, na medida que é som, tem presença fugaz, e a escrita, na medida que é grafia, tem

presença duradoura”. Esta característica reflete o porquê da escrita necessitar de regras e

padrões mais rígidos ditados pelas academias, pois esta é materializada para informar um

grande público por um vasto período de tempo e se não possuir regras que a generalize e a

faça compreensível aos mais diversos grupos sociais, não seria possível realizar a

comunicação.

Diferentemente da fala, a escrita não é apreendida na interação com o meio

informal, por isso “[...] a escola deve ocupar-se particularmente com o ensino da escrita,

não havendo nada de errado nisso, mas é bom frisar que o domínio da língua e seu

conhecimento primeiro é de natureza oral” (Marcuschi e Dionísio. 2005. p. 16-17) e que

este conhecimento oral influencia na aprendizagem da escrita. Por este motivo, a escola

deve buscar um ensino em que a escrita tenha destaque, porém a fala não seja esquecida,

sendo assim trabalhada conjuntamente com a escrita. Demonstrando também o valor da

oralidade para a vivência do aluno na sociedade, e as diversas maneiras que ela se

apresenta, para que o aluno saiba como escolher os termos adequados ao uso, conforme o

local e o objetivo.

Por fim, o professor também deve destacar que as variações da língua não

acontecem somente na oralidade, como certifica Elias:

Hoje, já não se pode pensar a língua escrita como modalidades

invariantes. É preciso levar em conta que, no interior dessas

modalidades, há variações provocadas pelas condições de produção e

uso da linguagem. (ELIAS. 2011. p. 26)

Com o passar dos anos também se observa que mudanças realizadas primeiramente

na fala são introduzidas à escrita pelas academias, o que demonstra a vivacidade da fala e

sua incorporação nas mudanças sociais.

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3. Oralidade como objeto de estudo

3.1 Objetivos do ensino da oralidade em sala de aula

Diante do exposto acima, argumenta-se neste tópico com base na seguinte questão:

Afinal, por que tomar a oralidade em sala de aula como objeto de estudo e quais seriam os

benefícios para os alunos? Inicialmente, é importante citar alguns aspectos apontados pelos

Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN)3 de língua portuguesa, quanto ao ensino da

língua oral nos anos iniciais do ensino fundamental. Este afirma que “não é papel da escola

ensinar o aluno a falar: isso é algo que a criança aprende muito antes da idade escolar.

(Brasil. Parâmetros curriculares nacionais: língua portuguesa. 1997. p.38), seu papel básico

seria, então, ensinar ao educando acerca das “variedades e registros da língua oral” (idem.

p 26), provocando o respeito as mais diversas variedades linguísticas, além de ensinar “o

exercício da adequação (das formas de expressão oral) aos contextos comunicativos, diante

de diferentes interlocutores, a partir de intenções de natureza diversa” (idem. p. 39).

A partir desses dois objetivos básicos, o documento apresenta os objetivos

específicos que devem ser alcançados, dentre eles, o aluno deve:

compreender a cidadania como participação social e política, assim como

exercício de direitos e deveres políticos, civis e sociais, adotando, no dia-a-dia,

atitudes de solidariedade, cooperação e repúdio às injustiças, respeitando o outro e exigindo para si o mesmo respeito. (Idem. p. 14)

Para isso que se efetive essa participação social e política, o próprio documento do

PCN determina que os alunos devem ter capacidade de “posicionar-se de maneira crítica,

responsável e construtiva nas diferentes situações sociais, utilizando o diálogo como forma

de mediar conflitos e de tomar decisões coletivas.” (idem. p. 14). Além desses, outros

objetivos podem ser citados para os anos iniciais do ensino fundamental:

Utilizar a linguagem oral com eficácia, sabendo adequá-la a intenções e

situações comunicativas que requeiram conversar num grupo, expressar sentimentos e opiniões, defender pontos de vista, relatar acontecimentos, expor

sobre temas estudados; participar de diferentes situações de comunicação oral,

acolhendo e considerando as opiniões alheias e respeitando os diferentes modos

de falar. [Idem. p. 68]

Anna Christina Bentes, professora do Departamento de Lingüística da Universidade

Estadual de Campinas e pesquisadora do fenômeno da narratividade, das práticas de

linguagem nos contextos sociais, dos gêneros do discurso e dos estilos de fala, publicou em

2011 um trabalho, intitulado por “Oralidade, política e direitos humanos”, no qual ela

defende o caráter humanizador da educação, através da adoção de princípios democráticos

pela escola brasileira, porque, para ela, "as práticas sociais no interior da escola atual

parecem carecer de reciprocidade, sinceridade, interesse público, emoção, sensibilidade e

de uma comunicação mais genuína e racional." (BENTES, 2011. p. 46-47).

Baseando-se nos princípios éticos postulados na DUDH (Declaração Universal dos

Direitos Humanos) e na EDH (Educação em Direitos Humanos), Bentes defende uma

3 Um dado curioso dos Parâmetros Curriculares Nacionais de língua portuguesa (1997) é que através do

sistema de busca do documento, percebe-se que a palavra “oralidade” aparece apenas duas vezes e em ambas

se busca a identificação de marcas ou traços dela na escrita. Enquanto que a palavra “escrita” aparece 183

vezes. Vê-se assim a primazia no trato com a escrita em relação a oralidade, apesar de todo o estudo acerca

dessa última no documento referido.

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escola democrática e não perpetuadora das desigualdades sociais. Ela, afirma então que "a

escola brasileira precisaria repensar os seus princípios metodológicos e adotar princípios

que há muito vêm sendo assumidos pela educação popular: a dialogicidade, a

solidariedade, a autonomia, a indignação e a discursividade." (BENTES, 2011. p. 45).

Visando o objetivo humanizador da educação, Bentes afirma que é necessário as

escolas promoverem práticas orais orientadas princípios determinados em lei.

Em uma sociedade como a nossa, que reivindica para si a qualificação de

democrática, o exercício orientado de determinadas práticas orais na escola (mas

também fora dela) precisaria estar pautado pelos princípios da igualdade de todos

perante a lei, da liberdade de expressão e da fraternidade de uns para com os

outros. [Idem. p. 41]

Em relação ao objetivo que a escola deveria ter como alvo, o desenvolvimento da

capacidade dos educandos de respeitar e conviver com as diferenças sociais, Bentes

ressalta que: "a instituição escolar como um todo não tem conseguido nos aparelhar para

que esse objetivo seja alcançado, como se ele fosse um objetivo descolado de outros mais

gerais, como o do aumento de determinadas capacidades específicas, como as de leitura e

escrita." (BENTES, 2011. p. 47).

O que é preciso, assim, é a relação entre as práticas da escrita, da leitura e da

oralidade, quanto a esta última, Bentes conclui que o objetivo de tomar a oralidade como

objeto de estudo em sala de aula vai além da adequação das formas de expressão oral em

ambientes, interlocutores e intuitos diferenciados, ela beneficia os educandos, no sentido

mais amplo, no seu conhecimento a respeito dos princípios de igualdade, liberdade, que

devem nortear qualquer ação em sociedade, inclusive as práticas orais.

Somente assim (com o estudo da oralidade) poderemos ter mais vezes a

experiência de nos depararmos com sujeitos que não apenas saibam 'se comportar' em interações públicas, mas que tenham, de fato, incorporado, como

princípios norteadores de suas ações sociais, um profundo respeito por seu

interlocutor como pessoa humana, que nada tem a ver com 'boas maneiras',

mas com um modo de ver e de pensar a si mesmo e o mundo social ao seu

redor. [BENTES, 2011. p. 53. grifo nosso].

Retomando o questionamento em relação ao motivo de tomar a oralidade em sala

de aula como objeto de estudo e de quais seriam os benefícios para os alunos, conclui-se

que as razões e os benefícios centram-se na promoção pelas escolas de facilitar o

desenvolvimento das formas de expressão oral, na medida em que não deduz que este, por

vir a escola falando, já conhece a língua oral e que por isso ela não precisa ser ensinada,

pelo contrário, as escolas devem estabelecer a oralidade como objeto de estudo,

favorecendo assim as capacidades orais dos alunos, ensinando-os não somente as

variedades do gênero oral e sua adequação em diferenciados ambientes, mas também os

principios éticos e democráticos que devem nortear qualquer prática oral.

3.2 Instrumentos para o ensino da oralidade

Para que a escola contribua, de fato, com a formação cidadã dos alunos e com o

desenvolvimento de cada um, a partir de princípios democráticos, é necessario a

explicitação do que se deve ensinar e de como ensinar a oralidade em sala de aula, mesmo

que este trabalho não pretenda se aprofundar nesses aspectos, é preciso, porém, citar a

necessidade da escola oferecer instrumentos para que os educandos alcancem os objetivos

estabelecidos quanto ao aprendizado da língua oral.

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Anteriormente a qualquer sugestão sobre o ensino da oralidade, é importante citar

que ele exige esforço dos docentes em planejar e ter objetivos claros e definidos durante

seu estudo.

Eleger a língua oral como conteúdo escolar exige o planejamento da ação

pedagógica de forma a garantir, na sala de aula, atividades sistemáticas de fala,

escuta e reflexão sobre a língua. São essas situações que podem se converter em

boas situações de aprendizagem sobre os usos e as formas da língua oral: atividades de produção e interpretação de uma ampla variedade de textos orais,

de observação de diferentes usos, de reflexão sobre os recursos que a língua

oferece para alcançar diferentes finalidades comunicativas. (Brasil. Parâmetros

curriculares nacionais: língua portuguesa. 1997. p. 38-39).

Levando-se em conta que há diferentes espaços de uso da oralidade, as escolas não

devem ensinar como proceder, em relação as práticas orais, somente nos espaços privados:

“contextos comunicativos informais, coloquiais, familiares.” (Brasil. Parâmetros

curriculares nacionais: língua portuguesa. 1997. p. 38), mas também e mormente em

instâncias mais formais, porque “a aprendizagem de procedimentos eficazes tanto de fala

como de escuta, em contextos mais formais, dificilmente ocorrerá se a escola não tomar

para si a tarefa de promovê-la.” (Idem. p.27).

No que diz respeito a este papel da escola, de promover os contextos formais e

ensinar os alunos a como agir nestes espaços, os Parâmetros curriculares nacionais da

língua portuguesa determinam que:

Cabe à escola ensinar o aluno a utilizar a linguagem oral nas diversas situações

comunicativas, especialmente nas mais formais: planejamento e realização de

entrevistas, debates, seminários, diálogos com autoridades, dramatizações, etc.

[Brasil. Parâmetros curriculares nacionais: língua portuguesa. 1997. p. 27].

Além da realização de entrevistas, debates e dramatizações, os PCN´s de língua

portuguesa sugerem que as escolas utilizem a gravação em áudio ou vídeo, como

instrumento didático, de uma exposição oral, ao vivo, como por meio do rádio ou da

televisão, de um debate, um pronunciamento, etc., “pois permite observar com atenção

coisas que não seriam possíveis apenas a partir da escuta direta e voltar sobre elas, seja da

fala do outro ou da própria fala.” (Idem. p. 54).

É possível também, os professores produzirem atividades, nas quais os alunos

narrem histórias que inventaram ou que ouviram, no intuito de aprender a falar

considerando o encadeamento dos fatos e a seqüência cronológica, além de se esforçarem

para adequar a linguagem à situação de comunicação na qual está contando a narração,

atentando se o reconto é para “os colegas de classe, numa situação de ‘Hora da História’,

por exemplo, e recontar para gravar uma fita cassete que comporá o acervo da biblioteca,

ou ainda numa reunião aberta a toda a comunidade escolar.” (Idem. p. 76).

Todas essas atividades devem ser realizadas com a ajuda e orientação do professor

e por citar a expressão “comunidade escolar”, Anna Christina Bentes afirma que:

Quando defendemos que o eixo do ensino de oralidade deve pressupor a natureza

pública e política das práticas orais na escola, estamos necessariamente falando

do estabelecimento de diálogos mais constantes entre a comunidade escolar e a

sociedade, da promoção de maiores e mais efetivos espaços e tempos de diálogos

intramuros da escola: diálogos dos alunos entre si, entre alunos e professores, dos professores entre si, sempre organizados, mediados pelo professor e focados

nos princípios éticos da igualdade na diferença, da solidariedade e da liberdade

de expressão. [BENTES, 2011. p. 51. grifo nosso].

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Ao tratar da natureza pública e política das práticas orais na escola, surgem, enfim,

dois aspectos: o primeiro é sobre o que falar; o segundo é o como falar no ensino da

oralidade. É preciso que se utilize de temas instigantes para, por exemplo, promover

discussões, é preciso que haja sentido para as crianças.

Não basta deixar que as crianças falem; apenas o falar cotidiano e a exposição ao

falar alheio não garantem a aprendizagem necessária. É preciso que as atividades

de uso e as de reflexão sobre a língua oral estejam contextualizadas. [Brasil.

Parâmetros curriculares nacionais: língua portuguesa. 1997. p. 39].

Em relação ao sobre o que falar, Bentes corrobora a as afirmações escritas acima:

"Nas aulas de Língua Portuguesa, o exercício da palavra pública pode tornar-se

extremamente significativo (e não apenas uma tarefa a ser cumprida) para os que

tomam a palavra e para aqueles que vão ouvir alguém falar. A meu ver, só é possível desenvolver as necessárias disciplinas do silêncio, da escuta atenta de

outrem e da reflexão sobre o que o outro fala, se os temas a serem tratados forem

envolventes, instigantes, polêmicos, de interesse público. [BENTES, 2011. p.

48].

Numa prática de oralidade significativa, há um série de ajustes em relação à fala, “é

possível dar sentido e função ao trabalho com aspectos como entonação, dicção, gesto e

postura que, no caso da linguagem oral, têm papel complementar para conferir sentido aos

textos.” (Brasil. Parâmetros curriculares nacionais: língua portuguesa. 1997. p. 40).

Corroborando com essa citação, Bentes cita outros ajustes à fala, como:

interpelar uma autoridade na frente de uma plateia; como modular a voz de

forma que ela seja ouvida por todos mas sem ser exageradamente alta; como

começar e terminar o seu comentário ou a sua pergunta de forma polida; como

controlar o tempo de sua fala; como se posicionar corporal e gestualmente

(levantar da cadeira ou não, fazer muitos gestos enquanto fala ou não; o que

dizer para elogiar a fala do palestrante ou para fazer um comentário crítico sobre ela. [BENTES, 2011. p. 51].

A produção oral na escola também pode abranger atividades em grupo, que exijam

do aluno preparação prévia com o estudo do tema a ser exposto oralmente e requer “a

coordenação da fala própria com a dos colegas - dois procedimentos complexos que

raramente se aprendem sem ajuda.” (p. 39). Esse tipo de exposição oral ocorre

tradicionalmente a partir, apenas, do quinto ano, por meio das apresentações de trabalho.

Todavia, o próprio documento dos Parâmetros Curriculares Nacionais de língua portuguesa

adverte que o ensino da exposição oral deve ocorrer desde os primeiros anos do ensino

fundamental. Em geral o procedimento de expor oralmente em público não costuma ser

ensinado. Possivelmente por se imaginar que a boa exposição oral decorra de

outros procedimentos já dominados (como falar e estudar). No entanto, o texto

expositivo — tanto oral como escrito — é um dos que maiores dificuldades

apresenta, tanto ao produtor como ao destinatário. Assim, é importante que as situações de exposição oral freqüentem os projetos de estudo e sejam ensinadas

desde as séries iniciais, intensificando-se posteriormente. (p. 39)

A título de conclusão, apresentar-se-á uma citação de Marli Quadros Leite, do seu

texto “Interação pela linguagem: o discurso do professor” Porque a finalidade do artigo

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dela é discutir e demonstrar os recursos linguísticos que o professor utiliza para dar aula

mais participativa, etc.

As competências linguística, discursiva, textual, interdiscursiva, intertextual,

pragmática e situacional. O acordo fiduciário (de confiança) entre enunciador e o

enunciatário. A ética da informação: não dizer mais do que cabe em cada

interação e não dar informações já conhecidas. Nas palavras de Bakhtin (1988), a

situação dá forma à enunciação, e o falante competente sabe como se comportar

em cada contexto em que se encontra. (LEITE, 2011. p. 57).

São essas as competências que a escola pode ensinar aos alunos desde as séries

iniciais, para que, de modo gradativo, cada educando desenvolva suas capacidades orais e

com autonomia aprendam a agir e a proceder em suas práticas orais não somente nas

escolas, mas na sociedade como um todo.

4. Investigação

O estudo sobre como a oralidade pode ser trabalhada em sala de aula provocou

diversos questionamentos, entre eles o que gerou esta pesquisa: “Como a oralidade está

sendo trabalhada nas turmas de educação infantil e nas primeiras séries do ensino

fundamental em uma escola pública do município de Lagoa Seca?” Com o intuito de obter

a resposta, foi realizada uma pesquisa documental, que tinha por base a análise de 52

planejamentos semanais de aula de cinco professoras, duas da Educação Infantil e três do

1º, 2º e 3º Ano do Ensino Fundamental, além da apreciação de duas propostas de

atividades orais. Diante do exposto, este tópico centra-se na apresentação e na análise desta

investigação realizada na escola.

A referida pesquisa contou com os planos de aula de cinco professoras, por motivos

éticos não iremos divulgar aqui o nome da escola e das professoras. As professoras serão

citadas como professora A, professora B, professora C, professora D, professora E,

respectivamente de acordo com as turmas que lecionam. Os planejamentos apreciados

correspondem desde o mês de fevereiro até o início de maio. Os mesmos são organizados

semanalmente, em planos de aula, temos assim os planejamentos realizados durante 16

semanas. Os planejamentos da escola são preparados com base em temas geradores

(exemplo: água e sua importância na vida; resíduos sólidos;), que são organizados em

bimestres, a partir destes são elaborados subtemas. No geral, percebe-se que os planos de

aula são organizados em dois tópicos: conteúdos e atividades. A princípio, procuramos

encontrar as similaridades contidas nos diversos planos de aula, tanto em relação ao

conteúdo, quanto em relação às atividades propostas para o trabalho com a oralidade. Para

isso construímos categorias, onde foi constatado o número de vezes que os conteúdos

aparecem nos planos de aula, juntamente com as atividades que estiveram relacionadas aos

conteúdos.

Da professora A, que leciona no pré I, educação infantil, tivemos acesso a cinco

planejamentos semanais correspondentes ao mês de abril e início do mês de maio. Neles, o

destaque para o trabalho com a oralidade é direcionada ao conteúdo “interação através da

linguagem”, tendo como atividade cogitada, principalmente, “rodas de conversa” – que

pode ser também chamada de “conversa informal” ou “conversa em círculo” - e “leitura

compartilhada”. Nos planejamentos também é recorrente o conteúdo denominado de

“linguagem oral”, que em sua maioria é trabalhado em “rodas de conversa”. No entanto,

este conteúdo também surge muitas vezes nos planejamentos sem ter uma atividade

específica. Esse fato acabou tornando vaga a nossa análise sobre essa categoria específica.

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Categorização análoga foi demonstrada mediante os planos de aula da professora B,

que ensina no Pré II. Da mesma, analisamos 16 planejamentos semanais correspondentes

aos meses de fevereiro até o início de maio. A similaridade encontrada se dá ao fato de

serem duas turmas da educação infantil. Através da categorização, percebemos que a

proporção entre a frequência dos conteúdos e de sua relação com as atividades eram

bastante aproximados, por isto o Gráfico 1 une as duas turmas.

Como se observa no gráfico acima, a atividade “roda de conversa” é comumente

utilizada nas turmas do Pré I e Pré II, com o pretexto de interação, socialização e ensino da

linguagem oral, todavia, nos planejamentos não consta como realmente se ocorre essa

atividade. Além disso, o ensino da linguagem oral se apresenta como conteúdo, mas

efetivamente, como se vê, não há atividades que o concretize.

Da professora C, que leciona no 1º ano do ensino fundamental, tivemos acesso a 16

planejamentos semanais e a duas propostas de atividade. Nos planejamentos da professora

C, diferente da ênfase encontrada nos planos do Pré I e Pré II, o conteúdo “interação

através da linguagem” não aparece e o conteúdo “linguagem oral” é citado apenas uma

vez. Todavia a atividade “roda de conversa”, seja como conversa informal ou dirigida, é

citada inúmeras vezes sem a explicitação de qual conteúdo será trabalhado neste diálogo.

Assim, o trabalho com a oralidade realizado a partir da roda de conversa, serve apenas

como instrumento para introdução de outro conteúdo e sempre cobrado em escrito, o que

demonstra a supremacia da escrita sobre a fala. Quando questionadas sobre a roda de

conversa, algumas professoras comentaram que essa é realizada através de questões sobre

o dia anterior, como forma de acolher os alunos. Outras professoras afirmaram que ela é

feita a partir de questões acerca de alguma leitura (literatura) ou ainda de questionamentos

a respeito de um tema, o que foi frequente na categorização. Não se comentou assim o uso

da “roda de conversa” como atividade para o próprio ensino da linguagem oral.

Outro dado que corrobora com esta afirmação é o apresentado no gráfico 2, sobre a

frequência das atividades orais e escritas. Temos que salientar também que é normal a

escola trabalhar prioritariamente com a escrita, porém a utilização da modalidade oral deve

0

5

10

15

20

25

Atividade: Roda de conversa

Conteúdo sem atividade específica

Atividade: Leitura

Compartilhada

Conteúdo que envolve a

maioria das atividades

Gráfico 1: Relação atividade e conteúdo no Pré I e Pré II

Interação através da linguagem

Linguagem oral

Socialização ou acolhida

Conhecimento das várias modalidades da linguagem

Literatura Infantil

Ampliação do vocabulário

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ter objetivos específicos e deve ser marcada explicitamente sua importância na

aprendizagem do aluno, para que assim a fala não sirva apenas como instrumento didático.

O gráfico 2 revela, na prática, a supremacia da escrita sobre a oralidade, uma vez

que em aproximadamente quatro meses, houve a presença maciça das atividades escritas

(67%), em contrapartida, apenas 33% de atividades exigindo a capacidade oral dos alunos.

Retomamos, então, uma afirmação citada em nosso estudo teórico: “[...] não há razão

alguma para desprestigiar a oralidade e supervalorizar a escrita” (Mascushi e Dionísio.

2005. p.15), uma vez que as duas devem ser ensinadas e desenvolvidas pelos alunos.

Da professora C, também tivemos acesso a duas propostas de atividade descritas e

analisadas abaixo:

Proposta de Atividade Nº 1

Na quinta-feira, dia 26 de abril de 2012, a professora C, propôs ao 1º Ano, uma

atividade dividida em conteúdo, atividades e desenvolvimento da aula. O conteúdo tinha

por tema a Diversidade brasileira, e foi utilizado o livro “Menina bonita do laço de fita”, de

Ana Maria Machado, que conta a história de uma garota linda, bem pretinha, que um

coelho achava linda demais, ao ponto de desejar ter uma filha como ela, bem pretinha.

Na descrição das atividades, a professora escreve que haverá leitura compartilhada

da história, interpretação oral, desenho, escrita espontânea e dramatização da história. No

desenvolvimento da atividade, a professora topifica:

1. Contação da história;

2. Conversa informal sobre as diferenças (diversidade);

3. Dramatização da história;

4. Imagem mental da história.

Por fim, faz uma observação: “Escolher crianças da turma para dramatizar a história –

ensaiar no final da aula para apresentar as outras turmas.” (Planejamento Semanal nº 12)

Mediante os planos de aula da professora, percebe-se que na mesma quinta-feira, foi

realizada a atividade proposta. No dia seguinte, sexta-feira (27/04) não houve aula, e nos

dias úteis posteriores, segunda, quarta e quinta-feira, correspondentes aos dias 30, 02 e 03

67%

33%

Gráfico 2: Frequência das atividades orais e escritas no 1º Ano (Fevereiro à Abril e início

de Maio)

Atividades escritas (74 vezes)

Atividades orais (37 vezes)

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de maio4, a professora trabalhou com a turma outros três textos infantis e na sexta-feira, dia

04 de maio 2012, retoma o texto narrativo “Menina bonita do laço de fita” e descreve as

atividades do dia assim: “leitura dramatizada e caracterizada, apresentada para as demais

turmas” (Planejamento Semanal nº 13).

Análise da Atividade Proposta Nº 1

A atividade integra contação de história, dramatização e imaginação, em todos estes

pontos a oralidade é amplamente utilizada. Além de que a fase da conversa informal pode

ser um momento dos alunos desenvolverem a argumentação. No entanto, não sabemos ao

certo como essa conversa será dirigida e se todos os alunos serão estimulados a falar suas

opiniões. Mas o que, de fato, nos chamou a atenção, foi a escolha de algumas crianças,

talvez as mais desenvoltas, para a dramatização, excluindo, assim, as demais crianças,

dessa atividade oral que poderia ser riquíssima para os alunos como um todo, mesmo que

todos não pudessem se apresentar como personagens, de alguma forma a professora

poderia incluí-los como organizadores, diretores, narradores, entre outras funções, mas o

fato da exclusão demonstra que os excluídos deveriam ser os mais estimulados a

dramatizarem, uma vez que, provavelmente, são os que menos desenvolveram a oralidade.

Proposta de Atividade Nº 2

Na quarta-feira, dia 09 de maio de 2012, a professora C, propôs ao 1º Ano uma

atividade dividida da mesma forma que a anterior, em conteúdo, atividades e

desenvolvimento da aula. Como conteúdos, a professora pôs: “texto não verbal; percepção

e atenção; valores: respeito e amor; texto descritivo: entrevista” (Planejamento Semanal nº

14). Já na descrição das atividades, ela escreveu: “observação de vídeos temáticos sobre

mães, conversa informal e dirigida, listagem dos objetos de uso pessoal da mãe, escrita

dirigida, entrevista” (Planejamento Semanal nº 14). No desenvolvimento da atividade, a

professora topificou:

1. Conversa sobre a mãe e seus objetos de uso;

2. Listagem no quadro com leitura;

3. Para atividade de casa: entrevista com a mãe.

No dia seguinte, quinta-feira (10/05), o conteúdo apresentado pela professora C foi

texto descritivo, entrevista, noção de adição, números naturais, e como atividade elencou:

“leitura de entrevista realizada com as mães, resolução de representações de adição

simples” (Planejamento Semanal nº 14).

Análise da atividade proposta

Na atividade supõe-se que garotos de 6, 7 anos, já saibam realizar uma entrevista e

transcrever a fala da mãe. Questiona-se, então, se todos os alunos já saibam escrever e

executar a atividade ou se são as mães que fazem a maior parte da mesma. Além de que,

nos planejamentos não foi citado um trabalho anterior com o gênero entrevista, como por

exemplo, a apresentação de outras entrevistas para que os alunos observassem e as

utilizassem como base. Diante disto, como os alunos irão produzir se desconhecem o

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gênero? Outro fato que também nos chamou a atenção foi o ápice dessa atividade, no dia

posterior as entrevistas. Esperávamos que os alunos pudessem expor de que modo e onde

fizeram as entrevistas e afinal o que as mães disseram, porém nada disso é estimulado,

porque a atividade final dessa proposta é a simples leitura das entrevistas, assim, partindo

do pressuposto de que as mães produziram a maior parte da atividade, se os alunos apenas

lerem no fim da mesma, o desenvolvimento da oralidade será mínimo.

Da professora D5, que leciona no 2º ano do ensino fundamental, não tivemos acesso

aos planejamentos, todavia, conversamos com a mesma e ela nos disponibilizou um esboço

da avaliação contínua dos alunos. Durante a conversa, um de nossos questionamentos foi

em relação a oralidade como objeto de ensino, ela nos revelou que não se especifica

oralidade exatamente como objeto de ensino e justificou sua afirmação, dizendo: “Nos

planejamentos não se especifica disciplinas, porque o ensino ocorre de maneira integrada”

e exemplificou: “Um exemplo é o projeto em Ciências sobre os animais, que se utiliza uma

literatura, ‘O mundinho’, para explorar a oralidade.”

A seguir, uma demonstração do gráfico entregue pela professora D, que

exemplifica o esboço da avaliação contínua feita por ela com seus alunos, neste, ela avalia

também a expressão oral. A avaliação é feita de modo que somam-se os pontos das

avaliações processuais de oralidade atribuindo notas aos alunos. A professora ainda

acrescenta que “durante o ano, as notas podem mudar, porque os alunos podem ir se

expondo mais”.

Quadro 1: Esboço da Avaliação Contínua

Nome do

Aluno

Expressão oral e

corporal

Atividade de

Escuta

Presença Comportamento

Pedro * * * *

Ana * * * * * * * * * * *

* *

* * * *

*

Apesar de na avaliação contínua ter uma categoria de expressão oral para ser

avaliada, durante a conversa ela afirma que a “avaliação oral só é feita se o aluno tiver uma

necessidade especial, por exemplo, se o aluno não dominar a escrita ou não ter realizado

todas as atividades por ser especial”. Observamos, então, que apesar dos alunos serem

avaliados por sua expressão oral, não há uma grande preocupação com o ensino dessa

modalidade, uma vez que quando há atividades específicas para esta modalidade, são raros

projetos como o que citamos acima, da disciplina de Ciências.

Da professora E, que leciona no 3.º ano da educação infantil, tivemos acesso a 15

planejamentos semanais. O conteúdo mais citado nos planos de aula é a literatura infantil,

que é trabalhada de diversas maneiras envolvendo, assim, tanto a oralidade quanto a

escrita, apresentado no gráfico 3. No entanto, nesse cenário, as duas modalidades são

utilizadas como instrumentos didáticos. Outro fator importante nos planos de aula do 3.º

ano é a presença da pergunta oral e avaliação oral, com isto se percebe que a fala não está

servindo apenas para introduzir um assunto, assim a forma como o aluno se expressa

oralmente também conta para o seu desempenho.

5 A professora D, cursou por 2 anos Logos, se formou em Pedagogia na UVA (Universidade do Vale do

Acaraú) e se especializou em Educação inclusiva, no município de Lagoa Seca, somando 17 anos de

profissão.

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Nos planejamentos, de maneira geral, a oralidade não se apresenta como objeto de

ensino. O meio que poderia ser aproveitado para trabalhar a oralidade, acaba não ficando

explícito, como é o caso das "rodas de conversa”. Não fica claro também quais serão os

objetivos em relação as práticas orais do educando, geralmente o objetivo visa apenas o

conteúdo, que terá como instrumento didático a fala.

Considerações

A oralidade deve ser trabalhada em sala de aula como forma de ampliar a

capacidade do aluno de adequar sua fala ao ambiente e ao objetivo a que o mesmo se

pretende. Além disso, o estudo sobre a oralidade auxilia o desenvolvimento do aluno

quanto à argumentação, característica necessária para o bom desempenho do estudante

tanto no decorrer da vida estudantil como profissional. Reconhecendo a importância do

ensino da oralidade, percebe-se, a partir da investigação apresentada neste trabalho, que

muitos professores não estão à par desse fato e quando alguns o reconhece, acaba por

ensinar a língua oral de modo inadequado, como visto em nossa pesquisa, geralmente a

oralidade é tratada unicamente como instrumento didático e não como conteúdo em si, eis

o problema, pois não alcançam o objetivo de fazer conhecida pelos alunos todas suas

especificidades. Apesar disso, os resultados da investigação apontam para um avanço

quanto ao trabalho com a oralidade em sala de aula, inclusive este trabalho pode servir

como base para pesquisas posteriores que melhor contribuam para o ensino da oralidade.

Referências

BENTES, Anna Christina. Oralidade, política e direitos humanos. In: _______ Ensino da

língua portuguesa: oralidade, escrita e leitura. Maria Vanda Elias (org.) São Paulo:

Contexto, 2011. p. 41-54.

54%

7%

16%

1%

21%

1%

Gráfico 3: O trabalho com literatura infantil no 3º ano

Leitura compartilhada e discussão do texto

Leitura

Perguntas e avaliação oral sobre texto

Leitura individual

Atividade escrita sobre o texto

Transcrição de Texto

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Brasil. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: língua

portuguesa. Brasília. 1997.

LEITE, Marli Quadros. Interação pela linguagem: o discurso do professor. In: _______

Ensino da língua portuguesa: oralidade, escrita e leitura. Maria Vanda Elias (org.)

São Paulo: Contexto, 2011. p. 55-66.

MARCUSCHI, Luiz – Fala e escrita / Luis Antônio Marcuschi e Angela Paiva Dionisio. –

Belo Horizonte: Autêntica, 2005.

ELIAS, Maria Vanda (org). Ensino da língua pootuguesa: oralidade, escrita e leitura.

São Paulo: Contexto, 2011.

RIBEIRO, Roziane Marinho. A construção da argumentação oral em contexto de

ensino / Roziane Marinho Ribeiro. – São Paulo: Cortez, 2009. – (coleção linguagem &

linguística)