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GABINETE DA DESEMBARGADORA ANA MARIA DUARTE AMARANTE BRITO 704571 Órgão : 6ª Turma Cível Classe : APC - Apelação Cível Processo : 2006.01.1.117516-6 Apelante(s) : SERGIO NORAT CAVALCANTI, HOSPITAL SANTA LÚCIA S/A, CASSI CAIXA DE ASSISTÊNCIA DOS FUNCIONÁRIOS DO BANCO DO BRASIL, JOSÉ SILVERIO ASSUNÇÃO Apelado(s) : ARIETE DE FÁTIMA MAROCOLO, rep. por DANIELA MAROCOLO CARDOSO e outros Relator(a) : ANA MARIA DUARTE AMARANTE BRITO Revisor(a) : JAIR SOARES EMENTA. CONSUMIDOR. PROCESSO CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ERRO MÉDICO. CIRURGIA. ANESTESIA. DANOS MORAIS. JUROS DE MORA. AÇÃO PROPOSTA PELO CURADOR. AUTORIZAÇÃO. INTERVENÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO A ausência de prévia autorização judicial para a propositura de demanda pelo curador não macula o processo, quando existir aprovação ulterior pelo juiz. A falta de intervenção do Ministério Público nas causas em que há interesse de incapaz não acarreta nulidade processual se oportunizada a manifestação do parquet para tomar ciência da sentença e diante da ausência de prejuízo ao curatelado. O julgador não está obrigado a deferir todos os requerimentos de provas feitos pela parte, uma vez que, pelos princípios da persuasão racional e da livre apreciação das provas, deve ele se ater àquelas que considerar relevantes ao deslinde da demanda. A responsabilidade dos hospitais e clínicas de saúde por atos dos seus administradores é objetiva. A responsabilidade dos médicos subsiste na modalidade subjetiva. E, apesar de não se poder exigir do médico, pela própria natureza de suas intervenções, que seja garantido determinado resultado prático, em face das muitas nuances do corpo humano, a imperícia, imprudência ou negligência no cuidado com o paciente são causas de responsabilização do profissional. Como o risco de falha, de insucesso e até de lesões está sempre presente na prestação de serviços médicos e, diante da imprevisibilidade da parada cardiorrespiratória relacionada com a anestesia, demanda-se constante observação pelo profissional anestesista até que o paciente saia do quadro anestésico. Nos termos da súmula 490, do STF, “a pensão correspondente a indenização oriunda de responsabilidade civil deve ser calculada com base no salário-mínimo vigente ao tempo da sentença e ajustar-se-á às variações ulteriores.” Para a fixação do quantum devido à título de danos morais,

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GABINETE DA DESEMBARGADORA ANA MARIA DUARTE AMARANTE BRITO

704571

Órgão : 6ª Turma Cível Classe : APC - Apelação Cível Processo : 2006.01.1.117516-6 Apelante(s) : SERGIO NORAT CAVALCANTI, HOSPITAL SANTA LÚCIA S/A, CASSI – CAIXA DE ASSISTÊNCIA DOS FUNCIONÁRIOS DO BANCO DO BRASIL, JOSÉ SILVERIO ASSUNÇÃO Apelado(s) : ARIETE DE FÁTIMA MAROCOLO, rep. por DANIELA MAROCOLO CARDOSO e outros Relator(a) : ANA MARIA DUARTE AMARANTE BRITO Revisor(a) : JAIR SOARES

EMENTA. CONSUMIDOR. PROCESSO CIVIL. RESPONSABILIDADE

CIVIL. ERRO MÉDICO. CIRURGIA. ANESTESIA. DANOS MORAIS. JUROS DE MORA. AÇÃO PROPOSTA PELO CURADOR. AUTORIZAÇÃO. INTERVENÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO

A ausência de prévia autorização judicial para a propositura de demanda pelo curador não macula o processo, quando existir aprovação ulterior pelo juiz.

A falta de intervenção do Ministério Público nas causas em que há interesse de incapaz não acarreta nulidade processual se oportunizada a manifestação do parquet para tomar ciência da sentença e diante da ausência de prejuízo ao curatelado.

O julgador não está obrigado a deferir todos os requerimentos de provas feitos pela parte, uma vez que, pelos princípios da persuasão racional e da livre apreciação das provas, deve ele se ater àquelas que considerar relevantes ao deslinde da demanda.

A responsabilidade dos hospitais e clínicas de saúde por atos dos seus administradores é objetiva.

A responsabilidade dos médicos subsiste na modalidade subjetiva. E, apesar de não se poder exigir do médico, pela própria natureza de suas intervenções, que seja garantido determinado resultado prático, em face das muitas nuances do corpo humano, a imperícia, imprudência ou negligência no cuidado com o paciente são causas de responsabilização do profissional.

Como o risco de falha, de insucesso e até de lesões está sempre presente na prestação de serviços médicos e, diante da imprevisibilidade da parada cardiorrespiratória relacionada com a anestesia, demanda-se constante observação pelo profissional anestesista até que o paciente saia do quadro anestésico.

Nos termos da súmula 490, do STF, “a pensão correspondente a indenização oriunda de responsabilidade civil deve ser calculada com base no salário-mínimo vigente ao tempo da sentença e ajustar-se-á às variações ulteriores.”

Para a fixação do quantum devido à título de danos morais,

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utiliza-se critérios gerais, como o prudente arbítrio, o bom senso, a equidade e a proporcionalidade ou razoabilidade, bem como específicos, sendo estes o grau de culpa da parte ofensora e o seu potencial econômico, a repercussão social do ato lesivo, as condições pessoais da parte ofendida e a natureza do direito violado.

Na responsabilidade contratual, os juros de mora incidem a partir da citação.

Acórdão

Acordam os Desembargadores da Sexta Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, ANA MARIA DUARTE AMARANTE BRITO - Relatora, JAIR SAORES - Revisor, JOSÉ DIVINO – Vogal, sob a presidência da primeira, em CONHECER, PROVER PARCIALMENTE, POR MAIORIA, VENCIDO O VOGAL, QUE O PROVIA EM MAIOR EXTENSÃO de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas.

Brasília (DF), 14 de agosto de 2013

Desembargadora ANA MARIA DUARTE AMARANTE BRITO Relatora

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R E L A T Ó R I O

O relatório é, em parte, o da r. sentença de fls. 1201/1222, que ora transcrevo:

“Trata-se de ação sob o rito comum ordinário proposta por ARIETE DE FÁTIMA MARÓCOLO, DANIELA MARÓCOLO CARDOSO, CAROLINA MARÓCOLO CARDOSO e BRUNA MARÓCOLO CARDOSO contra CASSI - CAIXA DE ASSISTÊNCIA DOS FUNCIONÁRIOS DO BANCO DO BRASIL, HOSPITAL SANTA LÚCIA, SÉRGIO NORAT CAVALCANTE e JOSÉ SILVÉRIO ASSUNÇÃO, partes qualificadas nos autos.

Afirmam as autoras que, em 10/06/2006, ARIETE DE FÁTIMA MARÓCOLO recebeu diagnóstico de apendicite aguda, sendo internada no Hospital Santa Lúcia, conforme assistência de seu plano de saúde (Cassi) para se submeter a cirurgia para extração do apêndice (apendicectomia videolaparoscópica). Narram que a cirurgia ocorreu sem percalços no dia 11/06/2006 a partir das 08:45 horas, com os procedimentos de anestesia geral feitos pelo Dr. SÉRGIO NORAT CAVALCANTE auxiliado pelo médico JOSÉ SILVÉRIO ASSUNÇÃO e cirúrgicos feitos pelos Drs. Isaias Pereira da Silva Neto e José Leal.

Descrevem que após o término da cirurgia, às 11:15 horas, ARIETE DE FÁTIMA MARÓCOLO foi encaminhada à sala de recuperação e, no período em que se encontrava naquele local, entre 11:20 horas e 12:00 horas do dia 11/06/2006, ficou desassistida dos profissionais médicos anestesistas e sofreu uma depressão respiratória, seguida de uma parada cardiorrespiratória, lesionando gravemente o córtex do cérebro. Esclarecem que durante esses acontecimentos a paciente ainda estava sob os efeitos da anestesia. Relatam que os médicos afirmaram à família que o estado de saúde da paciente era muito bom, no entanto foi encaminhada à Unidade de Terapia Intensiva com seqüela neurológica severa e em estado vegetativo persistente.

Asseveram que os médicos anestesistas não estavam na sala de recuperação após a cirurgia e sim uma enfermeira ou auxiliar de enfermagem que saiu em busca dos anestesistas responsáveis ao perceber a parada cardiorrespiratória. Destacam que não havia equipamento monitor para conferência dos sinais vitais da paciente e que passada uma fração de tempo considerável os médicos foram localizados e lograram reanimar a enferma, porém foram incapazes de devolvê-la ao estado de consciência. Aduzem que a direção do Hospital Santa Lúcia não esclareceu os fatos questionados pelas autoras.

Sustentam a aplicação do Código de Defesa do Consumidor e que a CASSI e o HOSPITAL SANTA LÚCIA devem responder objetivamente pelos danos materiais e morais advindos da conduta imprudente e negligente dos dois médicos anestesistas que atuaram na cirurgia, conforme artigos 2º, 3º, §2º e 14, §§ 1º e 4º do CDC. Indicam que a primeira autora exercia atividade remunerada em sua clínica particular de odontologia pela qual percebeu receita anual de R$ 99.166,93 no ano de 2005, que houve necessidade de adaptação na residência da família para receber a primeira autora e incremento do valor mensal pago ao plano de saúde para a prestação do serviço de home care. Certificam o dano moral, especialmente considerando o fato gravoso que prostrou a primeira autora,

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condenando-a a viver em estado vegetativo, bem como o vínculo emocional estreito existente entre a mãe e suas filhas.

Pedem a condenação dos réus nas obrigações de:

1) ressarcir o prejuízo material experimentado por ARIETE DE FÁTIMA MARÓCOLO no valor de R$ 2.253,05;

2) pagar lucros cessantes relativos à perda da capacidade laboral de ARIETE DE FÁTIMA MARÓCOLO calculados pela média dos dois últimos anos de declaração de ajuste do imposto de renda no valor mensal de R$ 7.243,00 desde a data do evento danoso até a data em que vier a falecer a primeira autora;

3) pagar todas as despesas mensais acrescidas ao orçamento familiar e que decorram do estado de saúde de ARIETE DE FÁTIMA MARÓCOLO enquanto esta viver, a serem apuradas em liquidação de sentença;

4) pagar a quantia de R$ 1.800.000,00 em favor das autoras a título de compensação pelo dano moral sofrido (emenda fl. 224);

Pedem, ainda, a anulação do termo de adaptação do contrato de assistência médica firmado entre a primeira autora e a CASSI, com condenação desta a devolver todos os valores pagos a título de adaptação do contrato, sem prejuízo da obrigação da CASSI e dos demais réus de continuar a prover toda a assistência à primeira autora na modalidade home care.

Formulam pedido de antecipação dos efeitos da sentença para que a ré CASSI preste o serviço indicado no termo de adaptação ao contrato original mediante cobrança do valor estipulado no contrato original, porquanto houve coação ilícita contra as autoras, além da assistência médica home care durante o período de necessidade de tal cuidado especial (emenda fls. 229/230).

Os documentos de fls. 18/215 instruíram a petição inicial.

Decisão de fls. 235/237 recebeu a petição inicial e deferiu parcialmente a antecipação dos efeitos da tutela.

Citada, a ré CASSI - CAIXA DE ASSISTÊNCIA DOS FUNCIONÁRIOS DO BANCO DO BRASIL ofertou contestação de fls. 299/328, com documentos (fls. 329/375).

Suscita preliminar de ilegitimidade passiva e ativa ad causam aos argumentos de que os danos alegados na inicial são referentes a atos do Hospital e médicos que atenderam a primeira autora e que somente esta tem legitimidade para figurar no pólo ativo da demanda.

No mérito, aduz que as autoras não provaram os fatos declinados na exordial. Discorre sobre a natureza jurídica da CASSI para sustentar a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor. Afirma que não houve nenhuma atitude abusiva no oferecimento do Termo de Adaptação para receber tratamento de home care, pois o plano da primeira autora não era adaptado à Lei n. 9.656/98 e não tinha previsão para cobertura de internação hospitalar. Traz as razões que justificam o tratamento de internação domiciliar e afirma que os benefícios são retirados paulatinamente na dependência da melhora do evento agudo gerador da internação, iniciando-se nova modalidade de atendimento domiciliar, o suporte domiciliar. Aponta relatório médico do Hospital Sara Kubitschek

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concluindo pela alta da primeira autora da enfermaria do Programa do Lesado Cerebral. Esclarece que a primeira autora será atendida por uma equipe multidisciplinar do plano de saúde família da CASSI indefinidamente, conforme os termos do contrato. Sustenta a inexistência de dano material e moral decorrente de ação da CASSI, bem como de nexo de causalidade.

Postula o acolhimento das preliminares e a improcedência do pedido.

Citado, o réu JOSÉ SILVÉRIO ASSUNÇÃO apresentou contestação às fls. 387/409, acompanhada dos documentos de fls. 410/423.

Narra que a primeira autora era a única paciente que estava na sala de recuperação no dia 11/06/2006 e estava acompanhada pelos médicos, pelo Enfermeiro-Chefe do Centro Cirúrgico do Hospital Santa Lúcia, Dr. Antônio Barros e da Técnica em Enfermagem Glaucimeire Martins Abreu. Afirma que lhe foi colocado o necessário equipamento de monitoramento e que prestou cuidado exclusivo à primeira autora, pois havia três anestesiologistas no Centro Cirúrgico. Diz que por volta das 11h40min o sistema de monitoramento acusou algum distúrbio e a primeira ré foi imediatamente acudida pelo Dr. Sérgio, Dr. Silvério, Dr. Guilherme Cutrim e ainda pelo Enfermeiro-Chefe Antônio Barros e pela Técnica em Enfermagem Glaucimeire Martins Abreu, sendo diagnosticado uma palidez cutânea mucosa na região da boca e uma depressão cardiorrespiratória, oportunidade em que foram realizados, de imediato, os procedimentos de reanimação. Relata que a primeira autora foi encaminhada à Unidade de Terapia Intensiva, mas sofreu piora em seu estado de saúde, com febre, coma barbitúrico, aumento da pressão intracraniana, ocasionando grave isquemia cerebral, culminando com o estado vegetativo que se encontra até o presente. Sustenta a inexistência de culpa e nexo de causalidade entre as ações tomadas pelos réus e o dano suportado pelas autoras, bem como que todos os profissionais envolvidos realizaram os procedimentos técnicos necessários para atender à primeira autora, observando as normas do Conselho Federal de Medicina.

Postula a improcedência do pedido.

O réu HOSPITAL SANTA LÚCIA, igualmente citado, apresentou resposta às fls. 424/451, na qual pede a denunciação da lide à SANES - SERVIÇO DE ANESTESIA BRASÍLIA LTDA que é contratada pelo Hospital Santa Lúcia para prestar serviços médicos na especialidade anestesiologia sendo responsável solidariamente por eventuais danos, conforme cláusula contratual.

Certifica a inexistência de qualquer ato negligente ou imprudente durante o tratamento médico-hospitalar dispensado à primeira autora. Relata os procedimentos realizados na primeira autora durante a cirurgia e recuperação, asseverando que houve pronto atendimento à paciente quanto apresentou quadro de depressão respiratória, tendo sido realizadas com sucesso as manobras de reanimação, porém a primeira autora não evoluiu positivamente, razões pelas quais as conseqüências de seu atual quadro vegetativo não podem ser atribuídas aos profissionais que trabalharam em atendimento a ela. Aponta as qualidades profissionais dos médicos anestesiologistas que atenderam a primeira autora, bem como da estrutura física, equipamentos e equipe do Hospital, afirmando a ausência de culpa e nexo de causalidade. Discorre sobre a natureza do contrato firmado entre as partes e o direito que entende aplicável ao caso dos autos.

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Postula a improcedência do pedido.

SÉRGIO NORAT CAVALCANTI, regularmente citado, ofertou contestação às fls. 495/507.

Esclarece que aproximadamente às 11:40 horas do dia 11/06/2006 se dirigiu à sala de recuperação e verificou que o pessoal lá presente se dirigia à primeira autora, com o que também acorreu à paciente e verificou sua palidez cutânea mucosa, sem resposta estímulos. Descreve que o oxímetro de pulso não acusava os dados de saturação, mesmo estando com máscara de oxigênio e cânula de guedell, momento em que foi aplicado oxigênio 100% através de ambu, de imediato. Diz que juntamente com SILVÉRIO, DR. GUILHERME SOARES CUTRIM e ANTÔNIO BARROS iniciou-se as manobras de cardiorressucitação, entubação traqueal e massagem cardíaca externa, aplicadas duas ampolas de adrenalina seguidas de 20 ml de soro fisiológico. Afirma que a primeira autora seguiu monitorizada, foram realizados exames e encaminhamento para a Unidade de Terapia Intensiva, sendo que o exame de tomografia cerebral não indicou edema cerebral característico das encefalopatias hipóxicas, fato que deixou a equipe médica otimista em relação à evolução positiva do quadro de saúde da primeira autora, porém esse resultado não ocorreu até o presente momento. Defende que não houve omissão de ato ao qual estivesse obrigado, especialmente pelas normas técnicas referentes à profissão de médico anesteseologista, pois foi substituído por outro médico para encerramento do procedimento, inexistindo falha na vigilância médica sobre o estado de saúde da primeira autora durante sua recuperação pós-operatória. Aduz que houve uma fatalidade, sem ato ilícito.

Postula a improcedência do pedido.

As partes autoras se manifestaram em réplica às contestações às fls. 514/545.

Audiência de conciliação, conforme termo de fls. 567/568.

Decisão de fls. 594/597 saneou o feito, com rejeição das preliminares e indeferimento do pedido de denunciação da lide, determinando a realização de prova pericial e oral.

O Dr. João Pereira Júnior, perito judicial nomeado, apresentou o laudo às fls. 707/787 e 1011/1013, sobre o qual se manifestaram as partes (fls. 840/843, 846/861, 862/882, 883/888).

A audiência de instrução e julgamento transcorreu conforme consta do termo de fls. 1090/1096.

As parte se manifestaram sobre a prova produzida nos autos (fls. 1098/1124, 1128/1145, 1150/1169 e 1175/1181.

Os autos seguiram conclusos para sentença (fl. 1198).”

Acrescento que a MMª. Juíza a quo julgou parcialmente

procedente os pedidos para “condenar os réus, solidariamente, ao pagamento de:

1) R$ 2.253,05 (dois mil duzentos e cinqüenta e três reais e cinco centavos) em favor de ARIETE DE FÁTIMA MARÓCOLO a título de ressarcimento do dano emergente, quantia que deverá sofrer correção monetária pelo INPC e juros de mora de 1% ao mês desde do efetivo pagamento pela referida autora;

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2) pensão vitalícia no valor mensal equivalente a 20 salários mínimos em favor de ARIETE DE FÁTIMA MARÓCOLO, cessando-se a obrigação se advier o falecimento da referida autora. O valor da pensão será atualizado conforme a variação salarial e será depositado em conta bancária a ser indicada pela beneficiária, até o 10º dia de cada mês;

3) todas as despesas necessárias ao tratamento da saúde de ARIETE DE FÁTIMA MARÓCOLO enquanto esta viver, nestas incluída a assistência domiciliar (home care), se houver recomendação médica de sua necessidade, a serem apuradas em liquidação de sentença;

4) R$ 80.000,00 (oitenta mil reais) para ARIETE DE FÁTIMA MARÓCOLO a título de compensação por dano moral, acrescida de correção monetária pelos índices legais a partir da presente data (Súmula 362 do STJ) e de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir da data do evento danoso (Súmula 54 do STJ);

5) R$ 30.000,00 (trinta mil reais) para DANIELA MARÓCOLO CARDOSO a título de compensação por dano moral, acrescida de correção monetária pelos índices legais a partir da presente data (Súmula 362 do STJ) e de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir da data do evento danoso (Súmula 54 do STJ);

6) R$ 30.000,00 (trinta mil reais) para CAROLINA MARÓCOLO CARDOSO a título de compensação por dano moral, acrescida de correção monetária pelos índices legais a partir da presente data (Súmula 362 do STJ) e de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir da data do evento danoso (Súmula 54 do STJ);

7) R$ 30.000,00 (trinta mil reais) para BRUNA MARÓCOLO CARDOSO a título de compensação por dano moral, acrescida de correção monetária pelos índices legais a partir da presente data (Súmula 362 do STJ) e de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir da data do evento danoso (Súmula 54 do STJ).

Condenou, ainda, a ré CASSI - CAIXA DE ASSISTÊNCIA DOS FUNCIONÁRIOS DO BANCO DO BRASIL à devolução à ARIETE DE FÁTIMA MARÓCOLO de eventual pagamento em seu favor de despesa de ampliação da cobertura por causa única do estado vegetativo persistente da primeira autora, cujo valor dependerá de futura liquidação de sentença.

Em face da sucumbência mínima das autoras, os réus foram condenados nas custas processuais e honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, pro rata.

Irresignados, apelam os réus.

O réu SÉRGIO NORAT CAVALCANTI (fls. 1256/1284) defende a inexistência de conduta negligente, sustentando que o fato deve ser atribuído à fatalidade. Aduz que a sentença estaria em desacordo com as provas produzidas nos autos, uma vez que o laudo pericial não teria apontado qualquer falha no procedimento. Diz que a Resolução 1.802/2006, utilizada na fundamentação do decisum, que determina a assinatura do termo de transferência de responsabilidade entre os anestesistas, entrou em vigor em data posterior ao procedimento cirúrgico, o que torna válida a transferência

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de responsabilidade ao Dr. José Silvério Assunção. Alternativamente, pugna pela incidência dos juros de mora a contar da citação por se tratar de responsabilidade contratual. Pede a minoração do valor fixado a título de pensão e danos morais. Pede que a responsabilidade pelo ressarcimento das despesas do plano de saúde seja atribuída exclusivamente a CASSI.

A ré HOSPITAL SANTA LÚCIA S/A (fls. 1304/1327), preliminarmente, pugna pela extinção do processo sem julgamento de mérito, sustentando que a curadora da autora não requereu autorização judicial para a propositura da demanda. Requer a nulidade de todos os atos processuais praticados antes da intimação do Ministério Público para acompanhar o feito. No mérito, defende que não houve comprovação da inexistência de falha na prestação dos serviços. Diz não haver qualquer previsão de que o médico anestesista devesse permanecer na sala de recuperação. Aduz que a autora permaneceu na sala de recuperação, monitorada pelos equipamentos exigidos pelo Conselho Federal de Medicina. Sustenta que a sentença condenou os réus em valor superior ao requerido pelos autores. Pede a limitação da pensão mensal ao teto pago pelo INSS e condicionada a não aposentadoria junto à autarquia. Pugna pela exclusão da condenação do hospital na prestação de serviço de atendimento médico à primeira autora, tendo em vista que a Cassi já esta prestando a assistência médica, em face do contrato de plano de saúde. Defende a inexistência de danos morais e materiais, pugnando, alternativamente, pela minoração do quantum indenizatório.

O réu JOSÉ SILVÉRIO ASSUNÇÃO (fls. 1335/1376) aduz, preliminarmente, cerceamento de defesa diante da não realização da perícia neurológica. Pede a nulidade dos atos processuais em face da ausência de intimação do Ministério Público. Sustenta que a primeira autora já estava com a saúde debilitada antes da realização do procedimento cirúrgico. Defende a adequação dos procedimentos antes, durante e após a cirurgia, afastando a ocorrência de negligência, imperícia ou imprudência. Diz não haver nexo de causalidade entre a conduta e o resultado, tendo em vista que não houve comprovação de culpa por erro médico, tendo sido observadas todas as normas do CFM. Defende que a responsabilidade civil do médico consiste em obrigação de meio, e não de fim. Alternativamente, pugna pela minoração do quantum indenizatório e a fixação dos juros a partir do arbitramento.

A CAIXA DE ASSISTÊNCIA DOS FUNCIONÁRIOS DO BANCO DO BRASIL – CASSI (fls. 1335/1402) defende a inexistência de ato ilícito e dever de indenizar, tendo em vista que o laudo pericial foi conclusivo no sentido de não ter havido negligência por parte dos médicos, afastando nexo de causalidade entre as lesões sofridas pela apelada e a conduta dos profissionais. Alternativamente, pede a redução da indenização e a exclusão do pagamento das mensalidades do plano de saúde e demais despesas necessárias ao tratamento da primeira apelada.

Em sede de contrarrazões (fls. 1411/1452), as apeladas pugnam pela manutenção do decisum.

É o relatório. V O T O S

A Senhora Desembargadora Ana Maria Duarte Amarante Brito – Relatora

Conheço do recurso, presentes os pressupostos de admissibilidade.

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Trata-se de recursos em face da sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos em sede de ação de reparação de danos materiais e morais.

Passo ao exame conjunto dos recursos.

As preliminares argüidas pelos apelantes não merecem prosperar.

A ausência de prévia autorização judicial para a propositura de demanda pelo curador não macula o processo, tendo em vista que se trata de nulidade relativa.

Nos termos art. 1.748, § único, do Código Civil, não é necessário que o ato seja previamente autorizado, mas, para ser eficaz, depende da aprovação ulterior pelo juiz, o que se deu no caso em comento. Ademais, há prova da curatela exercida pela filha da primeira autora e a ação foi proposta em benefício da curatelada e na defesa de seus direitos.

No que tange a nulidade do processo pela ausência de intervenção do Ministério Público, igualmente razões não assistem ao recorrente.

Com efeito, mostra-se obrigatória a intervenção do Ministério Público nas causas em que há interesse de incapaz, sob pena de nulidade do processo, consoante os artigos 82,II, 84 e 246, ambos do Código de Processo Civil.

No entanto, no caso em comento, foi oportunizada a manifestação do parquet em primeira instância, tendo oficiado pelo regular prosseguimento do processo, diante da ausência de prejuízo à autora (fls. 1459/1461).

A d. Procuradoria de Justiça, em sede de apelação, manifestou-se no mesmo sentido (fl.1486), in verbis:

“o processo tramitou de forma regular perante o Juízo a quo, com uma adequada produção probatória e em observância aos ditames legais, sobretudo no que diz respeito aos direitos fundamentais das partes à ampla defesa e ao contraditório.

A r. sentença, proferida em conformidade com as provas dos autos, não gerou qualquer prejuízo para a incapaz cujos interesses reclamariam a intervenção do Ministério Público no feito. Por essa razão, a preliminar levantada de nulidade processual não merece guarida” (fls. 1487/1488).

Verifica-se, portanto, que nem teriam as rés a titularidade do interesse de agir.

Quanto ao alegado cerceamento de defesa, diante da não realização de perícia neurológica, melhor sorte não socorre ao apelante.

Conforme já venho decidindo, o deferimento de provas é ato discricionário do juiz, que tem a faculdade de decidir a pertinência da produção de determinada prova para a formação de seu convencimento. O julgador não está obrigado a deferir todos os requerimentos de provas feitos pela parte, uma vez que, pelos princípios da persuasão racional e da livre apreciação das provas, deve ele se ater àquelas que considerar relevantes ao deslinde da demanda.

Verifica-se que os quesitos apresentados pelas partes foram devidamente respondidos pelo perito designado. Ademais, a decisão está em consonância com as demais provas dos autos, mormente os diversos laudos de neurologistas que atestam a

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evolução do quadro neurológico da autora, culminando com o estado vegetativo persistente (fls. 172,173,178).

Portanto, tendo em vista que a prova requerida pelo apelante José Silvério Assunção não se mostrou imprescindível para o deslinde da demanda, não há que se cogitar em cerceamento de defesa.

Rejeito as preliminares.

No mérito, tenho que a irresignação dos apelantes merecer prosperar, apenas em parte.

A responsabilidade dos hospitais e clínicas de saúde por atos dos seus administradores, médicos e demais integrantes do corpo clínico, e pelos danos produzidos pelos equipamentos utilizados na prestação dos serviços, é fundamentada na legislação protetiva do consumidor, uma vez que há relação de consumo onde a demandada presta um serviço remunerado, sendo os usuários os destinatários finais. Nesse passo há responsabilidade objetiva do prestador pelo serviço oferecido, conforme previsto no artigo 14, do CDC, in verbis:

“O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos”.

Nesses casos, a proteção do consumidor possui duas órbitas distintas de preocupações. A garantia da incolumidade físico-psíquica é o primeiro aspecto da proteção. É a tutela da saúde e segurança do consumidor que visa resguardar a vida e a integridade física contra os acidentes de consumo que os produtos e serviços possam provocar. Trata-se da disciplina da responsabilidade civil do fornecedor pelo fato do produto e do serviço.

A teoria do risco da atividade ou negócio do fornecedor sustenta o dever de reparar o dano na relação de consumo, considerando que o fornecedor é o único que obtém lucros e controla o ciclo produtivo, razão pela qual a lei impõe-lhe o dever de introduzir produtos e prestar serviços no mercado sem ameaçar ou violar os direitos da parte vulnerável, dentre eles a incolumidade físico-psíquica do consumidor.

Nesse sentido, preleciona o insigne jurista Sérgio Cavalieri Filho1:

“Os estabelecimentos hospitalares são fornecedores de serviços, e, como tais, respondem objetivamente pelos danos causados aos seus pacientes.

É o que o Código chama de fato do serviço, entendendo-se como tal o acontecimento externo, ocorrido no mundo físico, que causa danos materiais ou morais ao consumidor, mas decorrentes de um defeito do serviço.”

Quanto à responsabilidade dos médicos, esta subsiste na modalidade subjetiva, sendo necessária demonstração da culpa para que surja o dever de indenizar.

Impende destacar que a responsabilidade médica, no caso em comento, consiste em obrigação de meio, conforme defende o apelante José Silvério Assunção. No

1 CAVALIERI FILHO, Sérgio, Programa de Responsabilidade Civil, 7ª ed., rev. e amp. SP: Atlas, 2007, p. 371.

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entanto, apesar de não se poder exigir do médico, pela própria natureza de suas intervenções, que seja garantido determinado resultado prático, tendo em vista que o corpo humano apresenta muitas nuances com fatores imponderáveis; a imperícia, imprudência ou negligência no cuidado com o paciente são causas de responsabilização do profissional.

Quanto à exclusão da responsabilidade do médico/apelante, Dr. SÉRGIO NORAT CAVALCANTI, peço vênia para transcrever trecho do d. parecer da Procuradoria de Justiça, que passa a integrar as presentes razões de decidir, in verbis:

“O fato de o recorrente (na condição de anestesista indicado na Ficha descritiva da Sala de Operação da paciente/apelada – fl.107) ter trasmitido a responsabilidade pelo término do procedimento anestésico ao Dr. José Silvério Assunção, com o objetivo de fazer outra anestesia na sala de cirurgia nº 09, não retira sua responsabilidade.

Com efeito, além de inexistir nos autos qualquer termo de transferência de responsabilidade durante o procedimento – conforme previsão normativa da Resolução nº 1.802/2006, publicada em data posterior ao evento danoso para regular os casos em que o médico plantonista é sucedido no procedimento por outro colega de profissão – a realização simultânea de anestesias em pacientes distintos pelo mesmo profissional, ainda que seja no mesmo ambiente cirúrgico, é ato atentório à Ética Médica, nos termos que já eram previstos na Resolução nº 1.363/93, in verbis:

O CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA, no uso das atribuições que lhe confere a Lei nº 3.268, de 30 de setembro de 1957, regulamentada pelo Decreto 44.045, de 19 de julho de 1958 [...] RESOLVE:

Art. 1º - Determinar aos médicos que praticam anestesia que:

[...]

IV - É ato atentatório à Ética Médica a realização simultânea de anestesias em pacientes distintos pelo mesmo profissional, ainda que seja no mesmo ambiente cirúrgico;

[...]

Não é de forma despropositada a norma emanada do Conselho Federal de Medicina. O objetivo é que o médico anestesista não deixe desassistido um paciente para assistir outro, antes da necessária alta anestésica do primeiro. (fls. 1477/1478).

No que tange à responsabilidade dos médicos/apelantes, restou incontroverso que o procedimento cirúrgico decorreu normalmente, sem qualquer incidente; ficou cristalino que a parada cardiorrespiratória se deu quando a paciente já se encontrava na sala de recuperação, ainda sob o efeito de anestesia, e; não há dúvidas de que os procedimentos adotados pelos médicos anestesistas, depois de identificada a parada cardiorrespiratória, foram os adequados para o quadro clínico.

A controvérsia reside na existência de culpa e nexo causal entre a conduta dos anestesistas e os danos narrados na inicial.

Impende observar que a evolução das técnicas relativa à matéria levou o anestesista a transformar-se num médico especialista que hoje desempenha sua função

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com completa autonomia.

Como o risco de falha, de insucesso e até de lesões está sempre presente na prestação de serviços médicos e, diante da imprevisibilidade da parada cardiorrespiratória relacionada com a anestesia, demanda-se constante observação pelo profissional anestesista até que o paciente saia do quadro anestésico.

Inclusive, essa é a normatização estabelecida pela Resolução CFM nº 1.363/93, vigente à época dos fatos, determina que o médico anestesista mantenha vigilância permanente ao paciente anestesiado, in verbis:

Art“. 1º - Determinar aos médicos que praticam anestesia que:

(...)

“II – Para conduzir as anestesias gerais ou regionais com segurança, assim como manter a vigilância permanente ao paciente anestesiado durante o ato operatório, o médico anestesista deve estar sempre junto a este paciente”

(...)

VIII - Os critérios de alta do paciente no período de recuperação pós-anestésica são de responsabilidade intransferível do anestesista. (sem grifos no original)

No mesmo sentido, é a literatura especializada, in verbis:

“Hoje, o anestesista tem sua atuação estratificada nas seguintes fases:

a) a fase pré-anestésica, na qual o anestesista avalia o paciente na véspera da operação programada com antecedência ou mesmo antes da operação de urgência. (...)

b) a indução anestésica, quando a sensibilidade e reação do paciente estão sendo postas à prova: como nesta fase, a concentração dos anestésicos é alta, requer uma pronunciada atenção;

c) a per anestésica, durante a qual o paciente deve ser acompanhado, por ser imprescindível o controle de suas condições ventilatórias e cardiovasculares, logo inadmissível a saída do anestesista da sala de cirurgia, mesmo com a melhor monitoração por aparelhagem;

d) a de recuperação anestésica, consistente em trazer o paciente às condições prévias à anestesia. O paciente, paulatinamente, vai readquirindo seus reflexos, apresentando com muita freqüência, náusea e vômito. A aspiração do vômito pode produzir pneumonia, com graves conseqüências, às vezes letais. Existe um risco comum e perigoso para o paciente já reanimado do estado em que se encontrava quando anestesiado, mas ainda não totalmente recuperado, pois no organismo dele pode haver quantidade suficiente da substância anestesiante, ainda não metabolizada, capaz de agir repentinamente e, na falta de atendimento imediato, causar parada respiratória, matando-o. A preocupação com o paciente é tão grande na fase que se instalou sala de recuperação anestésica, em que vários doentes são monitorados permanentemente por anestesiologistas e enfermagem especializada” [Castro, João Monteiro de. Responsabilidade

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Civil do Médico. São Paulo: Editora Método, 2005, p.163, sem grifos no original].

In casu, apesar do laudo pericial não ter apontado falhas no procedimento, é cediço que o juiz não está atrelado apenas à perícia, podendo sentenciar com base nas demais provas produzidas nos autos. Além disso, mormente quando se trata de dano decorrente de procedimento médico, nem sempre é possível um juízo rigoroso, preciso, sobre a falha técnica e seu nexo com a lesão ou dano. Às vezes, faz-se necessário a aplicação de princípios universalmente aceitos como o da previsibilidade e o da razoabilidade. O julgador segue sua experiência da vida e, da observação do que comumente acontece, pode chegar a juízos de valor sobre a conduta profissional, quando se mostre muito difícil uma conclusão puramente técnica sobre a causa da lesão.

Assim, a ausência dos médicos na sala de recuperação no momento da ocorrência do infortúnio foi decisiva para impedir o agravamento do estado de saúde da vítima. Mesmo tendo sido tomadas as providências para “reanimar” a paciente, é bem se concluir que o atendimento não foi instantâneo, ainda que tenha sido rápido. Em se tratando de parada cardiorrespiratória, é cediço que o quadro evolui muito rápido para lesão cerebral e morte.

A prova dos autos demonstra que os médicos anestesistas não estavam na sala de recuperação no momento do infortúnio, fato confirmado, inclusive, nas razões recursais:

Apelante SÉRGIO NORAT CAVALCANTI: “Nota-se que, conquanto houvesse enfermeiros na sala de recuperação prestando o necessário socorro imediato à paciente [...], ao ouvir o sinal de emergência, dirigiu-se imediatamente à sala de recuperação em que se encontrava a recorrida” (fl. 1263)

Apelante JOSÉ SILVÉRIO ASSUNÇÃO: “Ocorre que, por volta das 11h40, o sistema de monitoramento acusou algum distúrbio e imediatamente a paciente foi acudida pelo Dr. Sérgio, Dr. Silvério, Dr. Guilherme Cutrim, os quais estavam nas imediações da Sala de Recuperação” (fl. 1338).

A inobservância do dever de vigilância pelos anestesistas gera o ilícito culposo pela negligência, pois a paciente ainda estava sob os efeitos da anestesia, não podendo permanecer desassistida do profissional especializado.

O fato de a vítima estar, anteriormente, apresentando problemas de saúde, tendo se submetido a exames médicos, mostra-se insuficiente para excluir a responsabilidade dos médicos, pois não há qualquer comprovação de que essas debilidades contribuíram para a parada cardiorrespiratória e atual estado vegetativo da paciente.

Assim, resta demonstrado que o ato negligente dos réus acarretou nos danos sofridos à autora, restando devida a indenização.

Passo à analise do quantum indenizatório.

A quantificação da reparação por danos morais constitui tormentoso problema, pois sempre remanescerá uma franja de subjetividade, por mais que se intente objetivar os dados relevantes ao desate da questão.

A esse respeito, boa doutrina vem conferindo à indenização do dano moral um caráter dúplice, tanto punitivo do agente, quanto compensatório, em relação à

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vítima (cf. CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA, Responsabilidade Civil, Editora Forense, 1989, pág. 67). Quem sofrer lesão a direitos de natureza não patrimonial (Constituição da República, artigo 5º, incisos V e X) deve receber um valor compensatório da dor e da humilhação sofridas, que deverá ser arbitrada de forma prudente, à luz de alguns parâmetros, posto que, embora não deva constituir fonte de enriquecimento, não poderá resultar inexpressiva (CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA, ob. e loc. cit.).

Destaco que, para a fixação do quantum devido, utilizo critérios gerais, como o prudente arbítrio, o bom senso, a equidade e a proporcionalidade ou razoabilidade, bem como específicos, sendo estes o grau de culpa da parte ofensora e o seu potencial econômico, a repercussão social do ato lesivo, as condições pessoais da parte ofendida e a natureza do direito violado.

Nesse sentido, é a preleção do consagrado doutrinador Sérgio Cavalieri Filho: 2

“Creio que na fixação do quantum da indenização, mormente tratando-se de lucro cessante e dano moral, deve o juiz ter em mente o princípio de que o dano não pode ser fonte de lucro. A indenização, não há dúvida, deve ser suficiente para reparar o dano, o mais completamente possível, e nada mais. Qualquer quantia a maior importará enriquecimento sem causa, ensejador de novo dano.

Creio também, que este é outro ponto onde o princípio da lógica do razoável deve ser a bússola norteadora do julgador. Razoável é aquilo que é sensato, comedido, moderado; que guarda uma certa proporcionalidade. A razoabilidade é o critério que permita cotejar meios e fins, causas e conseqüências, de modo a aferir a lógica da decisão.

(...)

A lição do mestre Caio Mario, extraída de sua obra Responsabilidade civil, pp. 315-316, pode nos servir de norte para esta penosa tarefa de arbitrar o dano moral. Diz o preclaro Mestre: “Como tenho sustentado em minhas Instituições de Direito Civil (v. II, n. 176), na reparação por dano moral estão conjugados dois motivos, ou duas concausas: I – punição ao infrator pelo fato de haver ofendido um bem jurídico da vítima, posto que imaterial; II – pôr nas mãos do ofendido uma soma que não é o pretium doloris, porém o meio de lhe oferecer oportunidade de conseguir uma satisfação de qualquer espécie, seja de ordem intelectual ou moral, seja mesmo de cunho material, o que pode ser obtido ‘no fato’ de saber que esta soma em dinheiro pode amenizar a amargura da ofensa e de qualquer maneira o desejo de vingança”.

Dessa forma, valorando-se as peculiaridades da hipótese concreta, considerando capacidade econômica dos ofensores, a intensidade do dano sofrido em toda a sua dimensão, tenho que o valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) para cada uma das autoras filhas se mais mostra adequado à violação ocorrida, considerando o número de autoras, e R$ 60.000,00 (sessenta mil reais) para a vítima, não ocasionando enriquecimento sem causa, no mesmo passo em que desestimula outras ilicitudes.

2 In Programa de Responsabilidade Civil, 5ª ed., Malheiros, 2004, p. 115.

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Quanto ao termo a quo para incidência dos juros moratórios, tenho que razões assistem ao apelante JOSÉ SILVÉRIO ASSUNÇÃO.

No tocante, tenho por inaplicável a súmula 54, do C. Superior Tribunal de Justiça, haja vista esta tratar de juros moratórios em caso de responsabilidade extracontratual, o que não é a hipótese em apreço.

Assim, por se cuidar de relação contratualmente estabelecida, aplicável, na presente demanda, o disposto no artigo 219, caput, do Código de Processo Civil, o qual preceitua que “A citação válida torna prevento o juízo, induz litispendência e faz litigiosa a coisa; e, ainda quando ordenada por juiz incompetente, constitui em mora o devedor e interrompe a prescrição.”

Nesse sentido, mutatis mutandis, é jurisprudência desta colenda Corte:

“RESPONSABILIDADE CIVIL. CLÍNICA DE ESTÉTICA. APLICAÇÃO DO CDC. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. QUEIMADURA EM PROCEDIMENTO MAL REALIZADO. DANO MORAL. JUROS DE MORA. TERMO INICIAL. VALOR INDENIZATÓRIO.

[...]

6. A hipótese ora em julgamento trata de responsabilidade civil contratual, tendo em vista a existência de relação jurídica de prestação de serviços entre as partes, razão pela qual os juros moratórios devem incidir a partir da citação, nos termos do art. 406 do Código Civil.

7. Rejeitou-se a preliminar de ilegitimidade ativa suscitada pela empresa ré e negou-se provimento a seu recurso. Deu-se parcial provimento ao recurso da Autora, apenas para determinar que os juros de mora incidam a partir da citação. No mais, inalterados os demais termos da r. sentença.” (Acórdão n.666675, 20070110738295APC, Relator: FLAVIO ROSTIROLA, Revisor: TEÓFILO CAETANO, 1ª Turma Cível, Data de Julgamento: 03/04/2013, Publicado no DJE: 15/04/2013. Pág.: 48)

“DIREITO DO CONSUMIDOR. VÍTIMA DE ACIDENTE DE TRÂNSITO. PREJUÍZO ESCOLAR. SEGURADORA. DANOS MATERIAIS E MORAIS. JUROS MORATÓRIOS.

(...)

7. Em se tratando de responsabilidade contratual (acidente envolvendo passageiro de empresa de transporte), os juros moratórios devem correr a partir da citação, em observância ao art. 406 do Código Civil de 2002. Precedentes desta E. Corte e do Superior Tribunal de Justiça. (...).” (20060110250440APC, Relator WALDIR LEÔNCIO JÚNIOR, 2ª Turma Cível, julgado em 10/09/2008, DJ 13/10/2008 p. 99);

“REPARAÇÃO DE DANOS. PERMISSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. VALOR DA INDENIZAÇÃO. JUROS DE MORA.

(...)

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3. Na indenização por danos morais os juros moratórios incidem a partir da citação, quando se tratar de dano que tenha origem em relação contratual.

4. Apelação parcialmente provida.” (20050111414993APC, Relator JAIR SOARES, 6ª Turma Cível, julgado em 16/04/2008, DJ 23/04/2008 p. 134);

No que tange ao valor do pensionamento vitalício, tenho que a r. sentença deva ser reformada neste ponto.

As autoras requereram a condenação dos réus ao pagamento de pensão mensal vitalícia no valor de R$ 7.243,00 (sete mil, duzentos e quarenta e três reais), relativo à perda da capacidade laboral (exercício de atividade de odontologia, em sua clinica particular), calculado pela média dos dois últimos anos de declaração do imposto de renda.

In casu, aplica-se o disposto na súmula 490, do STF, in verbis:

“A pensão correspondente a indenização oriunda de responsabilidade civil deve ser calculada com base no salário-mínimo vigente ao tempo da sentença e ajustar-se-á às variações ulteriores.”

O valor requerido pelas autoras, ao tempo da sentença, corresponde a 11,64 salários mínimos, tendo em vista que na data que foi proferido o decisum, o salário vigente era de R$ 622,00 (seiscentos e vinte e dois reais), conforme estabelecido no Decreto Nº 7.655, de 23 de dezembro de 2011.

Consigno que com o arbitramento de pensão em salário mínimo não se está violando a regra do art. 7º, IV, da Constituição Federal, já que a utilização deste critério não visa à atualização parcelas vencidas, mas sim a arbitrar pensão no que tange às vincendas.

No que tange à limitação da pensão ao teto do INSS e ao deferimento da aposentadoria, razões não assistem aos apelantes, tendo em vista que as pensões previdenciárias possuem fundamentos jurídicos diversos da indenização decorrente da responsabilidade civil. Esta visa reparar os danos sofridos pela vítima, em decorrência da diminuição ou impossibilidade de exercício de sua atividade laboral. Aquela consiste na retribuição mensal decorrente do recolhimento das contribuições previdenciárias.

Nesse sentido, é a jurisprudência do c. STJ, in verbis:

“RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. REDUÇÃO DA CAPACIDADE LABORATIVA. PENSÃO VITALÍCIA. EXTENSÃO DA OBRIGAÇÃO AOS DEPENDENTES. IMPOSSIBILIDADE.

1. Indenização por ato ilícito não se confunde com pensão enquanto benefício previdenciário (Resp 811.193/GO, Min. Rel. Jorge Scartezzini, 4ª T., DJ de 06.11.2006). A indenização, reconhecida em sentença, representada por pensão mensal vitalícia, devida a quem teve reduzida a capacidade laborativa, tem caráter personalíssimo, perdurando enquanto vivo o seu titular. Falecido o credor, em respeito à natureza da obrigação e aos limites da coisa julgada, os seus dependentes não têm direito a continuar percebendo a indenização.

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2. Recurso ordinário improvido.” (RMS 21.611/PR, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 08/05/2007, DJ 28/05/2007, p. 287)

“ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. ACIDENTE DE TRÂNSITO CAUSADO POR AGENTE DO ESTADO. MENOR. PARAPLEGIA E AMPUTAÇÃO DO MEMBRO INFERIOR DIREITO. DANOS MATERIAIS. PENSIONAMENTO. TERMO INICIAL. DATA DA APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. TERMO AD QUEM. PENSÃO VITALÍCIA. CONSTITUIÇÃO DE CAPITAL GARANTIDOR. DESNECESSIDADE. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. VALOR IRRISÓRIO DADA A GRAVIDADE DAS LESÕES. MAJORAÇÃO. POSSIBILIDADE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS FIXADOS EM 5% SOBRE O VALOR DA CONDENAÇÃO.

[...]

2. Diversamente do benefício previdenciário que o recorrente já recebe, a indenização de cunho civil tem por objetivo não apenas o ressarcimento de ordem econômica, mas, igualmente, o de compensar a vítima pela lesão física causada pelo ato ilícito do agente do Estado que reduziu sua capacidade laboral em caráter definitivo, tornando-lhe mais difícil a busca por melhores condições de remuneração no mercado de trabalho, já que não mais poderá exercer a função anteriormente desempenhada bem assim a execução de qualquer outra atividade laboral demandará maior sacrifício em face das sequelas permanentes, o que há de ser compensado pelo pagamento de uma pensão mensal a ser arcada pela recorrida. Precedentes: REsp 712.293/RJ, Rel. Ministro Castro Filho, DJ 4/12/2006 e Resp 126.798/MG, Rel. Ministro Cesar Asfor Rocha, DJ de 4/2/2002. (REsp 1168831/SP, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02/09/2010, DJe 13/09/2010)

'Diversamente do benefício previdenciário, a indenização de cunho civil tem por objeto não apenas o ressarcimento de ordem econômica, mas, igualmente, o de compensar a vítima pela lesão física causada pelo ato ilícito do empregador, que reduziu a sua capacidade laboral em caráter definitivo, inclusive pelo natural obstáculo de ensejar a busca por melhores condições e remuneração na mesma empresa ou no mercado de trabalho' (DJU de 7/4/03, pág. 292 e DJU de 16/02/04, pág. 261).

Quanto ao pedido de exclusão do pagamento de despesas necessárias ao tratamento de saúde da vítima, requerido pelo Hospital apelante, razões não lhe assistem. Apesar de possuir plano de saúde, a autora poderá estar sujeita ao desembolso de outros custos, o que, conforme decido na r. sentença, será apurada em sede de liquidação de sentença.

No que tange à devolução de eventuais despesas decorrentes da ampliação da cobertura, melhor sorte não assiste a CASSI, uma vez que a mudança no plano ocorreu em decorrência da necessidade de home care, mormente o estado

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vegetativo em que se encontra a vítima, o que deverá ser apurado, igualmente, em sede de liquidação de sentença, conforme restou sentenciado, não carecendo o decisum de ausência de fundamentação.

Com efeito, o ordenamento jurídico vigente adotou o principio do livre convencimento motivado, cuja ausência acarreta nulidade, consoante dispõe o art. 93, IX da Constituição Federal. No entanto, a referida norma não determina que o juiz esgote a matéria, discorrendo sobre as teses jurídicas apresentadas pelas partes ou citando os dispositivos legais. Basta que apresente os fundamentos, ainda que sucintos, de sua convicção, satisfazendo, assim, a exigência legal insculpida nos arts. 131 e 458 do CPC.

O pedido de exclusão do pagamento das mensalidades do plano de saúde não foi objeto de condenação, não havendo interesse recursal da apelante CASSI, neste ponto.

Por fim, quanto ao pedido de afastamento da responsabilidade solidária, melhor sorte não socorre aos apelantes. A responsabilidade dos profissionais restou devidamente comprovada, ainda que na modalidade subjetiva, devendo, portanto, serem responsabilizados pelos danos decorrentes de suas condutas.

A responsabilidade dos requeridos é solidária, do nosocômio e do plano de saúde, inclusive, na condição de fornecedores de serviços, de natureza objetiva, considerando que os médicos co-responsáveis são membros do corpo clínico, trabalhando sob autorização e supervisão do hospital e do plano de saúde.

ANTE O EXPOSTO, dou parcial provimento aos recursos para reformando, em parte, a r. sentença, fixar o valor da pensão vitalícia em 11,64 salários mínimos; reduzir os danos morais para R$ 20.000,00 (vinte mil reais) para cada uma das autoras filhas, R$ 60.000,00 (sessenta mil reais) para a vítima; e determinar que os juros de mora incidam desde a citação, mantendo incólume a r. sentença quanto aos demais aspectos.

É como voto.

O Senhor Desembargador Jair Soares – Vogal

A intervenção do Ministério Público em grau de apelação, sem arguir nulidade ou prejuízo ao incapaz, supre a falta de intervenção ministerial no primeiro grau de jurisdição.

Decidiu o e. STJ que “a ausência de intimação do Ministério Público, por si só, não enseja a decretação de nulidade do julgado, a não ser que se demonstre o efetivo prejuízo para as partes ou para a apuração da verdade substancial da controvérsia jurídica, à luz do princípio pás de nullités sans grief. Até mesmo nas hipóteses em que a intervenção do Parquet é obrigatória seria necessária a demonstração de prejuízo para que se reconheça a nulidade processual.” (Precedentes: REsp 1.010.521/PE, Rel. Min. Sidnei Beneti, Terceira Turma, julgado em 26.10.2010, DJe 9.11.2010; REsp 814.479/RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 2.12.2010, DJe 14.12.2010). (apud, REsp 1199244 / PI, Min. Mauro Campbell Marques, 2ª Turma, DJe 03/10/2011).

Após a sentença, a Promotora de Justiça Adjunta do MPDFT, que não arguiu prejuízo para a autora ou nulidade, opinou pelo prosseguimento do feito (f. 1461), o

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que foi confirmado no parecer da d. Procuradoria de Justiça do DF (fls. 1468/1504). Inexistente o prejuízo, não se declara nulidade.

Compete ao tutor, com autorização do juiz, propor em juízo as ações, ou nelas assistir o menor, e promover todas as diligências a bem deste, assim como defendê-los nos pleitos contra ele movidos (CC, art. 1.748, V).

A autora Ariete de Fátima Marácolo estava sob a curatela de sua filha Daniela Marácolo Carrdoso desde o ajuizamento da ação, conforme decisão de 25.8.06 proferida nos autos da ação n. 2006.01.1.080074-5 (f. 21).

O juiz é o destinatário da prova, a partir da qual firma, fundamentadamente, juízo de convencimento. Reputando suficientes os elementos de prova constantes dos autos, não está obrigado a autorizar a produção de outras.

E tampouco está adstrito ao laudo pericial, podendo formar sua convicção com outros elementos ou fatos provados nos autos (CPC, art. 436).

O que o apelante José Silvério de Assunção pretendia provar com perícia neurológica – – nexo causal entre a parada respiratória, a atuação dos médicos na reanimação e a lesão cerebral – se comprova pelos documentos, laudos médicos e perícias que instruem o feito. E esta prova, desnecessária, por si só, não auxilia no deslinde da questão.

Rejeito as preliminares.

A relação jurídica em exame submete-se ao CDC, pois o autor foi atendido pelo hospital-réu e utilizou os serviços médico-hospitalares por ele prestados, como destinatário final (L. 8.078/90, arts. 2o e 3o).

O serviço é considerado defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração o modo do seu fornecimento, o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam (CDC, art. 14, § 1o, I e II).

A obrigação decorrente de contrato médico-hospitalar, de meio, não impõe ao hospital e ao profissional garantia de cura do paciente. Nem mesmo seria possível tal exigência, haja vista as inúmeras variáveis capazes de influir na recuperação do paciente, nem todas passíveis de controle pelo saber médico.

Contudo, a par da utilização de todos os meios disponíveis e de eficácia cientificamente comprovada para buscar melhora no estado de saúde do paciente, impõem-se tanto ao médico como ao hospital deveres de atenção, cuidado e assistência, que, não observados na espécie, culminaram na invalidez permanente da primeira autora.

Na condição de fornecedor de serviços, o hospital responde objetivamente por danos causados ao consumidor (CDC, art. 14). Não é necessário, pois, perquirir ou demonstrar eventual culpa. Suficiente a demonstração da conduta lesiva, do dano experimentado e do nexo de causalidade.

Sobre o tema, lecionam os comentaristas do CDC:

“O parágrafo único do art. 7º traz a regar geral sobre a solidariedade da cadeia de fornecedores de produtos e serviços. O art. 34 repete a ideia do sistema geral do direito civil, de que o empregador é responsável pelos atos de seus prepostos (art. 932, III, do CC⁄2002, antigo art. 1.521, III, do CC⁄1916), mas inova ao visualizar uma cadeia de fornecimento

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solidariamente responsável (todos e cada um por todos) entre o preposto (com vínculo trabalhista) ou o representante autônomo (sem vínculo trabalhista) e o fornecedor principal de produto e serviço, ou organizador de cadeia de fornecimento de produtos e serviços. O CDC impõe a solidariedade mesmo àqueles que teoricamente são independentes, tendo em vista o fim comum, que é fornecer o produto e o serviço. Segundo o parágrafo único do art. 7º, tendo mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação dos danos previstos nas normas de consumo, norma que vem repetida no art. 25, § 1º. A conseqüência da norma do art. 34 é que os deveres de boa-fé, de cuidado, de cooperação, de informação, de transparência, de respeito à confiança depositada pelos consumidores serão imputados a todos estes fornecedores diretos, indiretos ou auxiliares, e caberá a escolha, contra quem acionar ou a quem reclamar, somente ao consumidor. (MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antônio Herman; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: Editora dos Tribunais, 2006.p. 510)” grifamos

O § 4º do art. 14 do CDC excepciona a responsabilidade objetiva para os profissionais liberais. Todavia, configurada uma cadeia de fornecimento do serviço, e comprovada a culpa do profissional, impõe-se a solidariedade do caput do art. 14 do CDC.

Assim, quando houver uma cadeia de fornecimento para a realização de determinado serviço, ainda que o dano decorra da atuação de profissional liberal, verificada culpa desse, nasce a responsabilidade solidária dos participantes da cadeia de fornecimento do serviço.

Ao comentar a exceção do § 4º do art. 14 do CDC, argumenta Claudia Lima Marques:

“A única exceção do sistema do CDC de responsabilidade objetiva é o § 4º do art. 14 do CDC, que privilegia os profissionais liberais, retornando ao sistema subjetivo da culpa . Relembre-se que esse artigo apenas se aplica ao caso de defeito no serviço, falhas na segurança deste, muito comum no caso dos médicos, mas pouco comum no caso dos advogados. As falhas de adequação dos serviços dos profissionais continuam reguladas pelo art. 20 e ss. do CDC, com sua responsabilidade solidária e de estilo contratual, logo, sem culpa. Também me parece que as pessoas jurídicas formadas por médicos ou outros profissionais perdem este privilégio, devendo ser tratadas como fornecedores normais, elas mesmas não profissionais liberais. Aqui privilegiado não é o tipo de serviço, mas a pessoa (física) do profissional liberal. Difícil o caso das cadeias de profissionais liberais, como grupos médicos ou cirúrgicos que não abram mão de sua característica de profissionais liberais, mas atuem em grupo, talvez até com pessoas que não sejam profissionais liberais.” (MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. p. 288⁄289) grifamos

A primeira autora, diagnosticada com quadro de apendicite aguda, realizou cirurgia de emergência. A internação ocorreu em Hospital credenciado à CASSI, nos termos da cobertura do plano de saúde. Não houve cirurgia eletiva.

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Certo que “se o contrato for fundado na livre escolha pelo beneficiário/segurado de médicos e hospitais com reembolso das despesas no limite da apólice, conforme ocorre, em regra, nos chamados seguros-saúde, não se poderá falar em responsabilidade da seguradora pela má prestação do serviço, na medida em que a eleição dos médicos ou hospitais aqui é feita pelo próprio paciente ou por pessoa de sua confiança, sem indicação de profissionais credenciados ou diretamente vinculados à referida seguradora.” (REsp 866371/RS, 4ª Turma, DJe 20/08/2012, RIOBDCPC vol. 79 p. 79). Não foi o que ocorreu na hipótese.

A operadora do plano de saúde, na condição de fornecedora de serviço, responde perante o consumidor pelos defeitos em sua prestação, seja quando os fornece por meio de hospital próprio e médicos contratados ou por meio de médicos e hospitais credenciados (CDC, arts. 2º, 3º, 14 e 34). Essa responsabilidade é objetiva e solidária.

Ademais, o Cassi não alegou em contestação ser parte ilegítima, ilegitimidade que haveria se fosse de livre escolha pelo segurado de médicos e hospitais, com reembolso das despesas no limite da apólice.

Na hipótese está caracterizada a cadeia de prestação de serviços que atuou na realização da cirurgia de apendicectomia que resultou na invalidez de Aríete Marócolo Cardoso, e em decorrência, a solidariedade entre eles. Atuaram de maneira coordenada médicos cirurgiões, os anestesistas, e o hospital, que forneceu centro cirúrgico, profissionais, medicamentos e hotelaria.

As operadoras de plano de saúde também integram a cadeia de prestação de serviços. O e. STJ reconheceu que há solidariedade entre a operadora de saúde e o médico credenciado, afastando qualquer exceção ao sistema de solidariedade. Confira-se:

“CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS MÉDICOS.

Quem se compromete a prestar assistência médica por meio de profissionais que indica, é responsável pelos serviços que estes prestam. Recurso especial não conhecido.” (REsp 138059⁄MG, Rel. Ministro Ari Pargendler, 3ª Turma, julgado em 13⁄03⁄2001, DJ 11⁄06⁄2001, p. 197)

Aríete Marocolo Cardoso submeteu-se à cirurgia de apendicectomia em 11.6.06 nas dependências do Hospital Santa Lúcia. A cirurgia foi realizada pelos cirurgiões Isaias Pereira da Silva e José Patrocínio Leal. O procedimento foi acompanhado pelo anestesista Sérgio Norat Cacalcanti, e finalizado pelo anestesista José Silvério Assunção.

Após o procedimento cirúrgico, que ocorreu sem intercorrências, a autora foi encaminhada para a sala de recuperação, onde sofreu parada cardiorrespiratória, sendo, em seguida, reanimada. Inconsciente, foi encaminhada à UTI do hospital e posteriormente diagnosticada como portadora de sequelas neurológicas na forma de estado vegetativo persistente, decorrentes de encefalopatia hipóxica.

O episódio ocorreu nas dependências do hospital, sob a supervisão de equipe médica que ele disponibiliza aos pacientes. É o quanto basta para que lhe seja atribuída responsabilidade pelo evento.

De acordo com entendimento deste Tribunal “em caso de anestesia geral ou regional, o médico anestesiologista deve permanecer durante todo o tempo ao

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lado do paciente, e dedicado exclusivamente à observação da anestesia e suas complicações, para que possa detectá-las e corrigi-las precocemente. É vedado ao médico responsável pela anestesia afastar-se do paciente ou realizar procedimento que impeça a observação contínua das alterações relacionadas à anestesia, como cirurgia ou outra anestesia simultânea. Ainda, os instrumentos de monitoração devem funcionar como meios auxiliares, fornecendo informações úteis acerca da respiração, pulso, pressão arterial, pressão venosa central, gases sanguíneos, temperatura, dentre outros, mas não substituem o contato permanente com o paciente.” (20080150143464EIR, Relator: Roberval Casemiro Belinati, Câmara Criminal, Data de Julgamento: 14/03/2011, Publicado no DJE: 18/04/2011. Pág.: 48) grifamos

Não foi o que ocorreu na hipótese.

Os anestesistas agiram com culpa, pois negligenciaram o acompanhamento e assistência da paciente que estava em recuperação pós-anestésica. A anestesia, durante a cirurgia, foi acompanhada pelo anestesista Sérgio Norat, e, após a cirurgia, José Silvério Assunção assumiu o procedimento anestésico, extubou a primeira autora e a encaminhou à sala de recuperação.

Fato é que os anestesistas não estavam presentes na sala de recuperação quando a primeira autora sofreu parada cardiorrespiratória. O primeiro anestesista conduzia outro procedimento na sala de cirurgia nº 9, e o segundo anestesista não ouviu soar o alarme dos aparelhos de monitoramento.

A conduta deles, não observou o dever de cuidado imposto pelos códigos de conduta e procedimento dos médicos anestesiologista (Resolução CFM n. 1.363/93).

A sentença que condenou José Silvério Assunção pela prática de conduta criminosa descrita no art. 129, §§ 6º e 7º, do CP, consignou:

“O nexo de causalidade está no fato de que a vítima estava desassistida do profissional especializado responsável, o médico anestesista, no caso o denunciado, o que deveria estar junto a si, prontamente preparado para agir em eventual intercorrência pós-anestésica, mal que efetivamente ocorreu. Não há como seu atendimento ter sido instantâneo, ainda que tenha sido rápido, e, como já dito linhas atrás, é muito rápido também que o quadro de PCR – parada cardiorrespiratória evolui para lesão cerebral e morte. O atendimento por enfermeiros, que são auxiliares, não era o recomendado, e por si só já caracteriza negligência. (...)” (f. 642).

Inexiste critério rígido para se fixar indenização por danos morais. No entanto, na sua fixação, deve se levar em conta, além do nexo de causalidade (art. 403, do Cód. Civil), os critérios de proporcionalidade e razoabilidade na apuração do quantum, atendidas as condições do ofensor, do ofendido e do bem jurídico lesado.

A indenização por danos morais não pode ser fonte de enriquecimento da vítima, devendo o valor da indenização ser fixado, em montante razoável, com prudência e moderação.

Considerando as circunstâncias em que o fato ocorreu – a negligência dos anestesistas que não assistiram a autora na recuperação pós- anestésica - bem como sua função – compensar a dor da vítima (função reparatória), dos filhos e punir seu causador (função pedagógica ou inibitória), razoável o valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) para cada filho e R$ 60.000,00 (sessenta mil reais) para a primeira autora.

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Tratando-se de dano que tem origem em relação contratual, os juros moratórios incidem da citação (CC, art. 406).

Esse o entendimento do e. STJ, segundo o que “tratando-se de compensação por dano moral decorrente de erro médico, os juros devem incidir a contar da citação. Nesse sentido: AgRg nos EDcl no Ag 1.186.066⁄SP, Rel. Min. Massami Uyeda, Terceira Turma, DJe 03⁄02⁄2011, e EDcl no REsp 1.065.747⁄PR, Rel. Min. Raul Araújo, Quarta Turma, DJe 22⁄09⁄2010.”

E deste Tribunal:

“PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS E MATERIAIS. ACIDENTE. EMPRESA PRESTADORA DE TRANSPORTE PÚBLICO. PENSIONAMENTO MENSAL. PARCELA ÚNICA. PRESTAÇÕES VENCIDAS. CORREÇÃO MONETÁRIA. DANO MORAL E ESTÉTICO. VALOR DA INDENIZAÇÃO. INCIDÊNCIA DE JUROS MORATÓRIOS.

(...) III. Tratando-se de responsabilidade civil contratual, os juros moratórios incidirão a partir da citação.

IV. Deu-se parcial provimento ao apelo.” (Acórdão n. 575062, 20070210070092APC, Relator JOSÉ DIVINO DE OLIVEIRA, 6ª Turma Cível, julgado em 21/03/2012, DJ 29/03/2012 p. 181);

.

“INDENIZAÇÃO. CONTRATO DE SERVIÇOS DE TELECOMUNICAÇÕES. RESCISÃO. COBRANÇAS POSTERIORES. CADASTRO DE INADIMPLENTES. INSCRIÇÃO INDEVIDA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. DANO MORAL. VALORAÇÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. TERMO INICIAL.

(...) VI - Sobre a condenação ao pagamento de indenização por dano moral, incidem a correção monetária a partir da sua fixação - Súmula 362/STJ, e os juros de mora desde a citação, por se tratar de responsabilidade contratual.

VII - Apelações parcialmente providas.” (Acórdão n. 488130, 20080111225405APC, Relator VERA ANDRIGHI, 6ª Turma Cível, julgado em 02/03/2011, DJ 17/03/2011 p. 295).

A condenação em pensão mensal, refletindo indenização a título de danos materiais, não exclui a reparação dos danos morais advindo da perda de ente querido, que pode ser cumulada com os danos materiais (súmula 37 do e. STJ).

E o dano material engloba todos os gastos decorrentes do tratamento de saúde da primeira autora, sobretudo os que não estejam incluídos na cobertura do plano de saúde.

A Caixa de Assistência dos Funcionários do Banco do Brasil – CASSI foi condenada a devolver à primeira autora eventuais pagamentos de despesas de ampliação de cobertura por causa única do estado vegetativo persistente, valor este que será apurado em liquidação de sentença.

Não houve condenação na exclusão do pagamento das mensalidades. A matéria não foi devolvida a esta instância.

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A pensão mensal vitalícia deve ser reduzida ao valor postulado pelos autores, R$ 7.243,00, ou 11,64 salários mínimos ao tempo da prolação da sentença, valor este que, decorrente de integral reparação por ato ilícito, não se limita ao teto das pensões pagas pelo INSS, de natureza previdenciária.

E sobre a possibilidade de fixar a pensão com base no salário mínimo, decidiu o col. STF, em caso semelhante, afastando possível violação ao art. 7º, IV, da CF:

”EMENTA:

AÇÃO DE INDENIZAÇÃO DECORRENTE DE ACIDENTE DE VEÍCULO. REPARAÇÃO DE GANHOS QUE A VÍTIMA PODERIA AUFERIR. FIXAÇÃO DA PENSÃO COM BASE NO SALARIO MINIMO. ART. 7., INC. IV, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.

E inaplicável a proibição da vinculação ao salário mínimo, prevista na parte final do art. 7º, inc. IV, da Constituição Federal, como base de calculo e atualização de pensão em ação de indenização por ato ilícito. Recurso extraordinário não conhecido.“ (RE 140940/SP, Relator(a): Min. Ilmar Galvão, DJ 15-09-1995).

Dou provimento, em parte, aos recursos dos réus fixo a indenização por danos morais em R$ 20.000,00 (vinte mil reais) para cada filho e R$ 60.000,00 (sessenta mil reais) para a autora, e a pensão mensal vitalícia em 11,64 (onze vírgula sessenta e quatro) salários mínimos. Os juros de mora serão contados da citação.

O Senhor Desembargador José Divino – Vogal

Peço vista.

D E C I S Ã O

Tendo a Relatora e o Revisor dado provimento parcial aos recursos, pediu vista o eminente Vogal.

P E D I D O D E V I S T A

O Senhor Desembargador José Divino – Vogal

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço dos recursos.

Cuida-se de ação de conhecimento, subordinada ao procedimento comum de rito ordinário, ajuizada por ARIETE DE FÁTIMA MAROCOLO, representada por Daniela Marocolo Cardoso, e OUTROS em face de HOSPITAL SANTA LÚCIA S/A, CASSI – CAIXA DE ASSISTÊNCIA DOS FUNCIONÁRIOS DO BANCO DO BRASIL, SÉRGIO NORAT CAVALCANTI e JOSÉ SILVÉRIO ASSUNÇÃO, objetivando a condenação dos réus a reparação dos danos morais e materiais, bem como a anulação de termo aditivo do contrato de prestação de serviços de assistência médica-hospitalar firmado com a Cassi, cujos pedidos foram julgados parcialmente procedentes.

PRELIMINARES

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O Hospital Santa Lúcia S/A argui preliminar de nulidade do processo, por ausência de pressuposto processual, consistente na autorização judicial para o ajuizamento de ação em nome de curatelado, como determina os artigos 1.748, V, c/c 1.774 e 1.781, todos do Código Civil.

Não lhe assiste razão.

A referida autorização judicial não precisa ser prévia à propositura da demanda, se houver aprovação ulterior do juiz, como ocorreu na hipótese, conforme inteligência do parágrafo único do art. 1.748 do Código Civil.

O mesmo apelante e José Silvério Assunção suscitam ainda a nulidade do processo, por falta de intervenção obrigatória do Ministério Público.

A intervenção do Ministério Público é realmente obrigatória nas causas em que há interesse de incapaz, consoante art. 82, I, do CPC; entretanto, a inobservância dessa regra somente implica em nulidade do processo, como determinam os artigos 84 e 246 do CPC, se houver prejuízo ao incapaz, o que não ocorreu na hipótese.

A propósito, assim se manifestou o ilustre representante do Ministério Público na primeira instância:

“[...] da detida análise dos autos, verifica-se que o processo transcorreu consoante os ditames legais, a produção probatória revela-se hígida, às partes foi garantido o contraditório e a ampla defesa e a sentença foi proferida em perfeita consonância com os elementos constantes dos autos, sem qualquer prejuízo para o incapaz” – fls. 1461.

No mesmo sentido, o ilustrado parecer ministerial às fls. 1487/8.

O réu José Silvério Assunção argúi também a nulidade da sentença, ao argumento de que a matéria versada nos autos reclamava dilação probatória, consistente na realização de perícia neurológica.

Ocorre que o magistrado é o destinatário da prova, de modo que compete a ele avaliar a necessidade de outros elementos para formar seu convencimento em cada demanda. Ao entender que a lide está em condições de ser julgada, sem necessidade de dilação probatória, a prolação da sentença constitui uma obrigação, máxime em face dos princípios da economia e celeridade processuais.

Depois, a prova pericial pretendida era desnecessária ao deslinde da controvérsia, diante da farta prova produzida, notadamente o laudo pericial confeccionado por médico anestesiologista.

Rejeito as preliminares.

MÉRITO

A responsabilidade civil do Hospital Santa Lúcia S/A, pessoa jurídica de direito privado, é objetiva, nos termos do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, e art. 932, III, do Código Civil.

De igual forma, a responsabilidade da operadora de plano de saúde – CASSI com relação aos serviços médicos e hospitalares prestados por sua rede de

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credenciados.

Assim, para fins de responsabilização do hospital e do seguro saúde, basta a demonstração da existência do fato e a relação de causalidade entre este, o dano alegado e o sujeito a quem se imputa.

A responsabilidade civil do médico, entretanto, é subjetiva, de modo que incumbe ao autor, credor da prestação dos serviços, comprovar os danos sofridos, a conduta culposa do médico e o nexo de causalidade.

A autora afirma que no dia 11/06/2006 foi submetida a uma apendicectomia laparoscópica no Hospital Santa Lúcia S/A, credenciado na rede de assistência médica hospitalar da CASSI, vindo a sofrer uma depressão respiratória quando já se encontrava na sala de recuperação da anestesia, que, seguida de parada cardiorrespiratória, não revertida imediatamente pelos médicos anestesiologistas Sergio Norat Cavalcanti e José Silvério Assunção, culminou em uma lesão isquêmica cerebral, que evoluiu para o quadro neurológico compatível com estado vegetativo persistente (coma vigil).

O conjunto probatório colacionado os autos revela que o ato cirúrgico em si transcorreu normalmente, sem qualquer complicação ou intercorrência. No entanto, quando já se encontrava na sala de recuperação da anestesia, a autora sofreu uma parada cardiorespiratória, que em face da demora do socorro médico, redundou na mencionada lesão cerebral irreversível.

De fato, ainda que os apelantes insistam em asseverar que realizaram o procedimento de reanimação com presteza, é irrefragável que a intervenção não foi imediata, uma vez que não havia no recinto qualquer médico anestesiologista, muito embora a autora ainda estivesse ainda sob os efeitos da anestesia.

A ausência de especialista nesse momento foi crucial para o agravamento do estado de saúde da paciente, pois, caso estivessem monitorando adequadamente a autora, poderiam ter verificado os sintomas que ela apresentava como a intensa palidez cutânea e o tom “arroxeado” da mucosa, na região da boca (fls. 392), e quiçá evitado a parada cardiorrespiratória, causadora da isquemia cerebral (fls. 715/6).

Logo, é irrelevante que parte da literatura médica sustente que a lesão cerebral pode ocorrer mesmo se o socorro for imediato (fls.716, 724 e 728), pois o fato é que a parada cardiorrespiratória poderia ter sido evitada, caso a paciente estivesse devidamente assistida.

A propósito, consignou o expert: “o acidente da parada cardio-respiratória poderia ser evitado, ou ter suas consequências minimizadas caso houvesse alguém ao lado da paciente” (fls.720).

A inobservância do dever de vigilância permanente da paciente, portanto, foi a causa da produção do evento danoso, o que basta para estabelecer a responsabilidade civil objetiva e solidária do hospital e da operadora de plano de saúde.

A propósito, colaciono os seguintes arestos:

“CIVIL E CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. INDENIZAÇÃO. MORTE DE PACIENTE. HOSPITAL PRIVADO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANO MORAL. AUSÊNCIA DE NEXO DE CAUSALIDADE.

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1. A responsabilidade civil do estabelecimento hospitalar é objetiva, não se questionando da ocorrência ou não de culpa, bastando que se comprove a ocorrência do dano e o nexo de causalidade com a prestação defeituosa do serviço, conforme preceitua o caput do artigo 14 do mesmo normativo.

2. Se o conjunto probatório atesta que a morte do paciente ocorreu pelo agravamento de seu estado de saúde e não por falha ou defeito na prestação do serviço, tampouco por imperícia, imprudência ou negligência dos profissionais, afasta-se o dever indenizatório, porquanto ausente o nexo causal.

3. Recurso desprovido.”3

“RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. CONSUMIDOR. CIVIL.

RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DAS OPERADORAS DE PLANO DE SAÚDE. ERRO MÉDICO. DEFEITO NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. DANO MORAL RECONHECIDO. VALOR DA INDENIZAÇÃO. MAJORAÇÃO. RECURSO PROVIDO.

[...]

2. Se o contrato é fundado na prestação de serviços médicos e hospitalares próprios e/ou credenciados, no qual a operadora de plano de saúde mantém hospitais e emprega médicos ou indica um rol de conveniados, não há como afastar sua responsabilidade solidária pela má prestação do serviço.

3. A operadora do plano de saúde, na condição de fornecedora de serviço, responde perante o consumidor pelos defeitos em sua prestação, seja quando os fornece por meio de hospital próprio e médicos contratados ou por meio de médicos e hospitais credenciados, nos termos dos arts. 2º, 3º, 14 e 34 do Código de Defesa do Consumidor, art. 1.521, III, do Código Civil de 1916 e art. 932, III, do Código Civil de 2002. Essa responsabilidade é objetiva e solidária em relação ao consumidor, mas, na relação interna, respondem o hospital, o médico e a operadora do plano de saúde nos limites da sua culpa.

[...]

5. Recurso especial provido.”4

Com relação à responsabilidade civil dos médicos, verifica-se que ficou demonstrada a culpa apenas do réu José Silvério Assunção.

Com efeito, não se vislumbra qualquer conduta culposa do anestesiologista Sérgio Norat Cavalcante que pudesse ter provocado as complicações do quadro de saúde da primeira autora.

33 Acórdão n.566805, 20070111373116APC, Relator: MARIO-ZAM BELMIRO, Revisor: NÍDIA CORRÊA LIMA, 3ª

Turma Cível, Data de Julgamento: 08/02/2012, Publicado no DJE: 28/02/2012. Pág.: 142. 4 REsp 866.371/RS, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, DJe 20/08/2012.

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Isso porque o mencionado anestesiologista cumpriu com o seu dever. Segundo atesta o laudo pericial, a conduta de SÉRGIO foi escorreita, posto que durante o ato cirúrgico ele laborou com restrita observância às técnicas recomendadas pela literatura médica especializada.

Nesse sentido, afirmou o laudo pericial:

“O procedimento anestésico trans operatório ocorreu dentro da normalidade esperada [...]. Um dos fatores que demonstram a regularidade da evolução da anestesia é a estabilidade hemodinâmica observada nos registros da frequência cardíaca, pressão arterial, oximetria de pulso e capnometria” – fls. 716.

“A análise do prontuário médico não se evidencia qualquer intercorrência (definindo-se intercorrência como sendo alguma complicação) anterior ou durante o procedimento cirúrgico” – fls. 722.

É incontroverso que os demais procedimentos, como a extubação da paciente e o seu acompanhamento na sala de recuperação pós-anestésica, ficaram sob a responsabilidade de outro médico anestesiologista, o corréu José Silvério.

Logo, não se pode atribuir ao réu Sérgio a responsabilidade pelo distúrbio ocorrido na sala de recuperação, pois a desditosa paciente já não estava mais sob seus cuidados.

Nesse diapasão, insta enfatizar que, durante a sua atuação, Sérgio agiu com correção e segurança, tanto que a autora foi encaminhada a sala de recuperação pós-anestésica em quadro clínico estável.

A propósito, o perito afirmou:

“[...] no momento em que a paciente foi encaminhada para a sala de recuperação apresenta-se clinicamente bem, com boa estabilidade hemodinâmica e excelente oxigenação periférica” (fls. 723).

A inobservância do dever de vigilância permanente por José Silvério não pode atrair a responsabilidade solidária de Sérgio, até porque a depressão respiratória e a parada cardiorrespiratória subsequente não tiveram como causa, próxima ou remota, qualquer ação ou omissão do último.

Por outro lado, o fato de Sérgio ter transferido a responsabilidade sobre a paciente para o seu colega não constitui violação aos deveres impostos na Resolução do CFM nº 1.363/93, pois, a rigor, ele assegurou à paciente a assistência médica contínua por um anestesiologista, pois não podia imaginar que José Silvério não fosse monitorar a paciente, conforme as regras técnicas da medicina especializada.

Ademais, a transferência da responsabilidade sobre pacientes, é prática comum entre os anestesistas, ainda mais quando o ato cirúrgico já havia sido encerrado, sem nenhuma intercorrência. Frise-se que o apelante Sérgio não podia ter outro conduta, senão transferir a paciente ao outro anestesista, pois fora convocado para atuar em outra cirurgia, na sala 9. Assim, não poderia proceder à anestesia de outro paciente e concomitantemente cuidar da Senhora Ariete.

Sobre a regularidade da sua atuação, resumiu a perícia:

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“A transferência de responsabilidade (como fez o Dr. Sérgio, ao transferir a atividade anestésica ao Dr. Silvério) é prática comum em todos os hospitais do mundo. O anestesiologista ao terminar seu plantão, transfere a anestesia ao anestesista que está chegando, da mesma forma que o intensivista necessita proceder. Portanto, o Dr. Sérgio estava livre para executar outra anestesia. Sua participação na reanimação cardio-respiratória da paciente deu-se à circunstância de estar presente e por obrigação profissional e humana de socorrer uma paciente em estado crítico” – fls. 719/720.

A necessidade de subscrever termo de transferência de responsabilidade, prevista na Resolução do CFM n. 1.802, de 01/09/06, constitui uma formalidade necessária à identificação do médico responsável por cada etapa do tratamento, o que era desnecessário na hipótese, porquanto incontroverso nos autos que o anestesiologista do momento pós-anestésico era o Dr. José Silvério.

Além disso, tal exigência normativa não estava em vigor na data dos fatos.

Por fim, cumpre destacar que a aceitação da transação penal pelo réu Sérgio não implica em assunção de culpa pelo fato danoso, tanto que não importa em reincidência (Lei n. 9.0999/95, art. 76, §4º).

Assim, não sendo imputável ao apelante Sérgio a prática de qualquer ato ilícito, deve-se afastar a sua responsabilização pelos danos causados a autora.

Com relação a José Silvério Assunção, verifica-se que sua conduta omissiva, consistente em não acompanhar ostensivamente a autora durante o período de recuperação pós-anestésica, foi decisiva para a ocorrência do evento danoso.

Com efeito, no momento da parada cardiorrespiratória, o ele não estava na sala de recuperação; mas, caso estivesse, conforme já dito, poderia ter identificado a alteração do quadro clínico da paciente e tê-la socorrido a tempo de evitar a isquemia cerebral.

No entanto, José Silvério faltou com o dever de cuidado objetivo, deixando a paciente na sala de recuperação pós operatória, sem o monitoramento de qualquer profissional qualificado.

O anestesiologista é o responsável pela saúde e a vida do paciente durante a recuperação anestésica, o que lhe impõe o dever de guarda e vigilância até que esteja em condições clínicas de receber alta.

A omissão desse mister gera ato ilícito culposo indenizável, sobretudo diante da gravidade do resultado danoso. Por consequência, deve o réu José Silvério responder pelo resultado danoso.

Nesse sentido, destacou o próprio perito:

“O Dr. Silvério, assumindo a anestesia tornou-se o responsável pelo seu término e todas as conseqüências do ato anestésico (como determina o item III do art. 1º da resolução do CFM 1363/93). Sua conduta de deixar o paciente na SRPA, aos cuidados da equipe de enfermagem, corresponde à rotina diária de hospitais em todo o mundo. Evidentemente que sua responsabilidade continua existindo” – fls.720 (grifos

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nossos).

A suposta debilidade pretérita da saúde da autora não exime a responsabilidade do anestesista. Ao contrário, dele exigiria maior atenção e zelo no atendimento da paciente.

Atente-se, outrossim, que a culpabilidade de José Silvério foi reconhecida por sentença penal condenatória (fls. 627/644), confirmada pelo Tribunal (fls. 896/926); cuja acórdão recebeu a seguinte ementa:

“[...] PENAL (MÉRITO): LESÃO CORPORAL CULPOSA (CP, ART. 129, §§ 69 e 7Q). INOBSERVÂNCIA DE REGRA TÉCNICA PROFISSIONAL POR MÉDICO-ANESTESISTA. DEVER DE ABSOLUTA E CONSTANTE VIGILÂNCIA -MONITORAMENTO - SOBRE A PACIENTE EM PERÍODO PÓS-OPERATÓRIO QUE RESTOU DESATENDIDO (AFASTAMENTO DO RECORRENTE DA SALA DE RECUPERAÇÃO, DEIXANDO DE ESTAR AO LADO DA PACIENTE NO ALUDIDO PERÍODO). NÃO CUMPRIMENTO AO PADRÃO DE CONDUTA PROFISSIONAL ESTABELECIDO NAS NORMAS REGULAMENTARES INSTITUÍDAS PELO CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA (RES. Ns 1.393/83).ALTERAÇÃO (OBJETIVAMENTE PREVISÍVEL) DO QUADRO DE SAÚDE DA PACIENTE OCORRIDA DURANTE A AUSÊNCIA DO ESPECIALISTA NA ADMINISTRAÇÃO DE ANESTÉSICOS. NÃO EFETIVAÇÃO DO IMEDIATO ATENDIMENTO ESPECIALIZADO ESPERADO E QUE DEU CAUSA À LESÃO CEREBRAL GRAVÍSSIMA E IRREVERSÍVEL (PACIENTE EM ESTADO "VEGETATIVO"). INEFICAZES AS ULTERIORES MEDIDAS DE REANIMAÇÃO DA VÍTIMA. CARACTERIZADA A CONDUTA OMISSIVA PRÓPRIA (IMPERÍCIA) INCREMENTADORA DE UM RISCO NÃO TOLERADO NEM PERMITIDO PELO ORDENAMENTO PENAL (CP, Art. 13, § 2Q, "a") A CAUSAR O LAMENTÁVEL RESULTADO. ADEMAIS, COMO BEM PONDEROU A DOUTA RELATORIA (ORIGINÁRIA):

"(...) 1.1 - Tem o médico-anestesista, profissional especializado na administração de anestésico, o dever legal de estar junto ao paciente antes, durante e depois de procedimento cirúrgico até que lhe dê alta do período pós-anestésico. I.2 - Se, apesar do dever de vigilância absoluto que lhe é exigível, por algum tempo se ausenta do ambiente da sala de recuperação pós-anestésica e, portanto, deixa de estar junto do paciente a quem acompanha, mesmo que tenha permanecido em área compreendida pelo centro cirúrgico, responde por culpa médica que decorre da falta de diligência quando no período de seu afastamento vem o paciente a apresentar intercorrência consistente em depressão respiratória que, pela demora no atendimento, evolui para parada cardiorrespiratória causadora de lesões neurológicas graves porque compatíveis com estado vegetativo. I.3 -Responsabilidade caracterizada do anestesista por haver desatendido a dever de precaução ínsito à sua atividade profissional, com o que agravou o risco inerente à natureza do procedimento anestésico. Atividade médica essencialmente perigosa e tornada mais grave pela inobservância de regras estabelecidas em Resolução CFM n. 1.393/93. Omissão que frustrou legítima expectativa da paciente em ter a seu lado profissional especializado, vigilante e apto a contornar riscos normais e previsíveis. Situação de urgência e periculosidade ocorrida na ausência do anestesista. Risco superior ao normal que retirou da paciente a chance de não ver evoluído para

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quadro de parada cardiorrespiratória a depressão respiratória que apresentara. Funções vitais não retomadas a tempo, do que resultou "quadro neurológico compatível com estado vegetativo persistente". I.4 - Autoria, materialidade e nexo causai devidamente comprovados. Conjunto probatório exaustivamente analisado pelo Julgador a quo. Elementos de convicção coerentes e harmônicos no sentido de que não houve causa independente ou concorrente a contribuir para o agravamento do quadro clínico da vítima, salvo não estar ela assistida por profissional habilitado no instante em que se concretizou risco previsível a quem se submete a procedimento anestésico." - fls. 897/898.

Não se olvida, entretanto, que José Silvério teve a sua punibilidade extinta pelo pronunciamento da prescrição da pretensão punitiva em face da pena aplicada em concreto (fls. 1000).

Todavia, essa circunstância não impede que a autoria e a materialidade do fato danoso sejam suscitadas e discutidas no juízo cível, admitindo-se inclusive a utilização de prova emprestada produzida no juízo criminal, para se aferir a responsabilidade do agente, mormente porque no processo penal busca-se a verdade real, enquanto no processo civil o juízo contenta-se com a verdade formal.

Acerca do tema, confira-se o seguinte aresto:

“RECURSO ESPECIAL. CIVIL. PENAL. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS E MATERIAIS. COMUNICABILIDADE NO JUÍZO CÍVEL DE SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA NÃO TRANSITADA EM JULGADO, ANTE O RECONHECIMENTO SUPERVENIENTE, NO JUÍZO CRIMINAL, DE PRESCRIÇÃO RETROATIVA. IMPOSSIBILIDADE. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. AFASTAMENTO DOS EFEITOS PRINCIPAIS E SECUNDÁRIOS DA SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

1. A executoriedade da sentença penal condenatória (CPP, art. 63) ou seu aproveitamento em ação civil ex delicto (CPP, art. 64; CPC, arts. 110 e 265, IV) depende da definitividade da condenação, ou seja, da formação da coisa julgada criminal, até mesmo pela máxima constitucional de que ninguém poderá ser considerado culpado antes do trânsito em julgado de sentença penal condenatória (CF, art. 5º, LVII).

2. Na hipótese em exame, a sentença penal condenatória não transitou em julgado para a defesa, pois foi, supervenientemente, substituída por acórdão em apelação criminal que extinguiu a punibilidade, em decorrência do reconhecimento da prescrição retroativa.

3. A sentença penal condenatória, não transitada em julgado, não possibilita a excepcional comunicabilidade entre o juízo cível e o criminal, prevista no art. 1.525 do Código Civil de 1916 (atual art.

935 do Código Civil de 2002) e nos arts. 63 e 65 do Código de Processo Penal.

4. Segundo delineia a doutrina de direito penal, a prescrição retroativa, da maneira como disciplinada pela reforma de 1984 (CP, art. 110, §§ 1º e 2º), constitui forma de prescrição da pretensão punitiva, e não apenas da pretensão executória. Por isso, quando reconhecida, extingue o jus puniendi, e

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não apenas o poder-dever do Estado de impor concretamente a sanção penal (jus executionis).

5. O reconhecimento da prescrição retroativa, por se referir à forma de prescrição da pretensão punitiva, extingue a punibilidade afastando todos os efeitos principais (aqueles concernentes à imposição das penas ou medidas de segurança) e secundários da sentença penal condenatória (custas, reincidência, confisco, etc.), incluindo-se nesses últimos o efeito civil de que trata o art. 91, I, do Código Penal.

6. Afastado o obrigatório aproveitamento da sentença penal condenatória que não transitou em julgado, deve o juízo cível, no âmbito de sua livre convicção, pautar-se nos elementos de prova apresentados no âmbito de todo o processo, inclusive em eventual prova emprestada do processo criminal do qual tenha participado o réu (garantia do contraditório), a fim de aferir a responsabilidade da parte ré pela reparação do dano.

7. Recurso especial parcialmente provido, com retorno dos autos ao colendo Tribunal a quo, para novo julgamento da apelação cível.”5

No caso, ficou exaustivamente demonstrado que o ato negligente do réu José Silvério, preposto do hospital Santa Lúcia S/A, cuja empresa é credenciada na rede hospitalar da CASSI, acarretou a lesão cerebral da autora, o que atrai a responsabilidade civil e solidária do aludido médico e das duas empresas pelos danos causados.

Dito isso, passo a análise do pedido de redução do valor condenatório.

Para a fixação do valor da compensação por dano moral, deve o julgador se valer dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, aliando-se a critérios objetivos concebidos pela doutrina e pela jurisprudência, à míngua de parâmetro legislativo, dado o repúdio do ordenamento jurídico à tarifação do dano moral. Deve, assim, o magistrado considerar a extensão do dano (art. 944, CC/2002) e as possibilidades econômicas e financeiras dos agentes ofensores.

Impera a observância, ainda, de que a indenização deve servir de minimização da dor das vítimas, sem, contudo, gerar enriquecimento sem causa (art. 884, CC/02) e, ao mesmo tempo, propiciar mudança de comportamento dos ofensores.

A indenização não pode ser, portanto, demasiadamente expressiva a ponto de traduzir enriquecimento ilícito, mas nem tão pequena que se torne irrisória.

Atento a essas diretrizes, máxime a orientação doutrinária e jurisprudencial no sentido de que a indenização possui caráter compensatório e penalizante, de modo a desestimular a reincidência na ofensa ao bem juridicamente tutelado pelo direito, bem como diante das circunstâncias verificadas no caso concreto em exame, entendo por razoável a importância fixada em sentença, a saber, R$ 30.000,00 (trinta mil reais) para cada filha da paciente; e R$ 80.000,00 (oitenta mil reais) para a vítima.

Tais valores deverão ser devidamente corrigidos pelo INPC e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, contados da citação, por cuidar de responsabilidade contratual.

5 REsp 678.143/MG, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, DJe 30/04/2013.

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Nesse sentido:

“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. DANOS MATERIAIS E MORAIS. LUCROS CESSANTES. SÚMULA STJ/7. JUROS MORATÓRIOS. TERMO INICIAL. IMPROVIMENTO.

[...]

2.- Os juros moratórios, em sede de responsabilidade contratual, fluem a partir da citação. Precedentes.

3.- Agravo Regimental improvido.”6

No que concerne à reparação do dano material, em razão da inabilitação da autora para a atividade laboral, verifica-se da inicial que os autores requereram a condenação dos réus ao pagamento de R$ 7.243,00, referente à média da sua receita anual nos últimos dois anos de declaração de imposto de renda.

Ocorre que o enunciado de súmula nº 490 do Supremo Tribunal Federal determina que a pensão mensal vitalícia seja calculada com base no salário-mínimo vigente ao tempo da sentença.

Considerando, então, que o salário mínimo vigente à época da prolação da decisão era de R$ 622,00, conforme Decreto n. 7.655/11, tem-se que o valor requerido pelos autores corresponde a 11,64 e não 20 salários mínimos, como fixado na sentença, a impor o respectivo decote.

Ainda sobre o tema, não merece prosperar a pretensão dos recorrentes de ter a pensão limitada ao valor do teto do INSS, na medida em que o dever de indenizar e o benefício previdenciário possuem fundamentos jurídicos diversos.

Confira-se:

“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DE TRABALHO. LESÃO POR ESFORÇO REPETITIVO. SENTENÇA ANTES DA ENTRADA EM VIGOR DA EC/45. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA COMUM PARA O JULGAMENTO DA LIDE. DANOS MORAIS E PATRIMONIAIS. CULPA E NEXO CAUSAL. SÚMULA 07/STJ. PENSÃO VITALÍCIA. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS 282 E 356/STF. DISSÍDIO NÃO DEMONSTRADO.

[...]

5. A percepção de benefício previdenciário não exclui o pagamento de pensão mensal como ressarcimento por incapacidade decorrente de ato ilícito. Precedente.

[...]

8. Agravo regimental desprovido.”7

6 AgRg no REsp 1341138/SP, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, Terceira Turma, DJe 07/06/2013. 7 AgRg no REsp 1295001/SC, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Terceira Turma, DJe 01/07/2013.

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“CIVIL. PROCESSO CIVIL. AÇÃO DE CONHECIMENTO. INDENIZAÇÃO. LUCROS CESSANTES. PENSÃO VITALÍCIA. VALOR REFERENTE À REMUNERAÇÃO. DISTINÇÃO DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DE INVALIDEZ PERMANENTE. CUMULATIVIDADE. POSSIBILIDADE. RECURSO PROVIDO.”8

Também não subsiste o pedido do Hospital Santa Lúcia S/A para excluir a condenação ao pagamento das despesas necessárias ao tratamento da saúde.

Nos termos do art. 950 do Código Civil, a indenização decorrente de ato ilícito que impossibilite o ofendido de exercer seu ofício incluirá as despesas do tratamento e os lucros cessantes até a convalescença.

A adesão a assistência médica hospitalar não exclui da base de cálculo da indenização o referido elemento, na medida em que a autora pode ser obrigada a desembolsar outros custos, os quais, a partir de agora, são de responsabilidade dos réus.

A CASSSI, no entanto, pugna que essa obrigação não inclua o valor das mensalidades do plano de saúde. Entretanto, isso não foi objeto de condenação, o que afasta o seu interesse recursal quanto ao ponto.

Por fim, também não assiste razão a mencionada ré quanto à desobrigação da restituição dos valores pagos para a adaptação do seguro de saúde.

A necessidade de ampliação de cobertura, para incluir o atendimento de home care, decorreu do ato culposo de médico preposto de hospital da sua rede credenciada. Logo, o valor somado ao preço mensal pago à CASSI antes do evento danoso deve ser incluído nas despesas de tratamento, a ser apurado em liquidação de sentença.

Ante o exposto, rogando respeitosa vênia aos eminentes pares, DOU PARCIAL PROVIMENTO aos recursos, para, reformando em parte a respeitável sentença:

a) afastar a responsabilidade do réu Sérgio Norat Cavalcanti pelos danos causados à autora, por ausência de nexo causal;

b) determinar que os juros moratórios de 1% ao mês incidam a partir da citação;

c) reduzir o valor da pensão vitalícia para 11,64 salários mínimos, mantendo os demais termos.

É como voto.

O Senhor Desembargador Jair Soares – Vogal

Senhora Presidente, ouvi, com atenção, as ponderações feitas pelo Desembargador José Divino.

8 Acórdão n.425358, 20050111020118APC, Relator: DÁCIO VIEIRA, Revisor: ROMEU GONZAGA NEIVA, 5ª

Turma Cível, Data de Julgamento: 20/05/2010, Publicado no DJE: 31/05/2010. Pág.: 136.

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Quando foi encerrado o procedimento cirúrgico, o Dr. Sérgio Norat Cavalcanti deixou o local onde a paciente ficou aguardando a recuperação e encarregou outro médico, Dr. José Silvério Assunção, para acompanhar a paciente. A questão que se coloca é se a responsabilidade do médico que fez a anestesia, Dr. Sérgo Norat Cavalcanti, está afastada.

Entendeu o eminente vogal, Desembargador José Divino — como sempre, muito cuidadoso — que não tinha o anestesista responsabilidade. A responsabilidade solidária permanece. Quem fez a anestesia foi ele. Embora o procedimento cirúrgico e a anestesia tenham ocorrido normalmente, ele deveria ficar até o momento em que a paciente se recuperasse da anestesia. Se ele entregou para outro médico essa incumbência e se ausentou para fazer outra anestesia, ainda assim, não pode afastar sua responsabilidade pelo destino da paciente, que precisava, naquele momento, que estivesse sendo acompanhada. Ele entregou para um terceiro que ali não permaneceu. Ele admitiu que um terceiro ficasse cuidando de uma tarefa que estava entregue a ele. Não vejo como afastar a responsabilidade dele, que é solidária.

No tocante à indenização por danos morais, como se sabe, é difícil arbitrar o valor dessa. A situação é delicada. Sem dúvida, o quadro dela dramático. Mas a Turma, para casos até mais graves que envolvem morte, tem fixado valores semelhantes. Quem está obrigado a pagar, a Cassi e o Hospital Santa Lúcia, dispõe de meios para tanto. Nem por isso justifica elevar o valor.

Pedindo vênia ao eminente Desembargador José Divino, mantenho o voto tal como proferido.

A Senhora Desembargadora Ana Maria Duarte Amarante Brito – Relatora

Entendo que esse tipo de responsabilidade pessoal não se transfere, remanescendo a chamada tradicionalmente culpa in eligendo, à qual o novo Código Civil não faz referência expressa.

De qualquer sorte, até a valoração do fato é matéria jurídica que pode estar bem enquadrada na moldura do acórdão e, com isso, ser alçada às instâncias superiores, se aqui as cabeças não tiverem pensado com acerto.

Mantenho o meu voto.

D E C I S Ã O

Conhecido, provido parcialmente, por maioria, vencido o Vogal, que o provia em maior extensão.