Orientação à queixa escolar- considerando a dimensão social - PEPA

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  • 8/7/2019 Orientao queixa escolar- considerando a dimenso social - PEPA

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    Psicologia: cincia e profissoISSN 1414-9893 versin impresa

    Psicol. cienc. prof. v.26 n.2 Braslia jun. 2006

    EXPERINCIA

    Orientao queixa escolar: considerando a dimensosocial

    Guidance on how to deal with school problems: considering

    the social dimensionBeatriz de Paula Souza*

    Universidade de So Paulo

    Endereo para correspondncia

    RESUMO

    Trata-se de uma modalidade de atendimento clnico s queixas escolares, breve efocal. Partiu-se da necessidade de desenvolver uma abordagem que superasse asdificuldades das prticas tradicionais, fundadas numa concepo abstrata deindivduo, desconsiderando seu contexto social para alm do grupo familiar e,assim, excluindo a escola da investigao e da interveno.Nosso objetivo conquistar uma movimentao da rede de relaes na qual emerge a queixa escolarno sentido de sua superao. Essa rede tem como personagens principais, via deregra, a criana/adolescente, sua escola e sua famlia. Assim, nosso objeto deinvestigao/interveno essa rede e como as relaes entre seus participantesse desenvolveram e se desenvolvem. Alguns princpios tcnicos so: obter eproblematizar as verses de cada participante, promover a circulao dasinformaes pertinentes e identificar, mobilizar e fortalecer as potncias contidasnessa rede.

    Palavras-chave: Queixa escolar, Fracasso escolar, Sade mental, Atendimentopsicolgico.

    ABSTRACT

    This project refers to a type of brief and focused clinical counseling on how to dealwith school problems. It arose from the need to develop a procedure to overcomethe difficulties faced by traditional practices. These practices are based on a

    concept of an abstract individual, which disregards social connections beyond thefamily group, thereby excluding school both from investigation and intervention.

    http://pepsic.bvs-psi.org.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-98932006000200012&lng=es&nrm=#*a%23*ahttp://pepsic.bvs-psi.org.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-98932006000200012&lng=es&nrm=#end%23endhttp://pepsic.bvs-psi.org.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-98932006000200012&lng=es&nrm=#*a%23*ahttp://pepsic.bvs-psi.org.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-98932006000200012&lng=es&nrm=#end%23end
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    Our aim is to create a movement in the network of relationships whereby schoolproblems will come up, so as to be dealt with and overcome. Generally speaking,this network's main characters are: the child/adolescent, his/her school and his/herfamily. Thus the focus of our investigation/intervention is this network and how therelationships among its participants developed and continue to develop. Some basictechniques are: gather each participant's version to reach the problem area, begin

    circulating the relevant information and identify, move and strengthen thepotentialities within this network.

    Keywords: School problems, School failure, Mental health, Psychological guidance.

    A modalidade de atendimento psicolgico queixa escolar apresentada a seguirestruturou-se na convergncia de diversas necessidades e fundamentos terico-prticos.

    uma das produes do Servio de Psicologia Escolar da USP, do qual fao parte.

    Atuando na interface entre Psicologia e Educao, esse Servio tem desenvolvidodiversas frentes de trabalho: intervenes em escolas e outras instituieseducativas, cursos para professores, participao em eventos, publicaes eassessoria a grupos de educadores e trabalhadores em sade mental preocupadoscom as queixas escolares, entre outras.

    Psiclogos da rede pblica de sade, procura de novos rumos no atendimento squeixas escolares, revelaram que tais queixas constituam cerca de 75% de suademanda infanto-juvenil. Tal cifra confirma-se na pesquisa de Marilene Proena R.de Souza (1996) junto a clnicas-escola de instituies de ensino de Psicologia daGrande So Paulo, repetindo ndices de unidades bsicas e centros de sade doMunicpio de So Paulo (Morais, 2001), o que evidencia a prioridade que a queixa

    escolar deveria ter na nossa formao e nas aes da sade.

    A viso crtica que tnhamos acerca dos funcionamentos escolares cotidianosprodutores de fracasso - a partir da obra de Maria Helena S. Patto, de outrosautores e de nosso convvio com as escolas - levavam-nos a incentivar, apoiar eassessorar esses psiclogos, que nos procuravam em suas experincias extra-muros das unidades bsicas e centros de sade, partindo para intervir nas escolas.

    No entanto, esse tipo de assessoria evidenciava uma lacuna no conjunto de aesque o Servio desenvolvia: o atendimento s queixas escolares no mbito daclnica. Era preciso desenvolver uma abordagem que superasse as dificuldades dasprticas tradicionais, que se fundam numa concepo abstrata de indivduo,

    desconsiderando seus pertencimentos sociais, para alm do grupo familiar.

    Era preciso incluir a escola na investigao e na interveno. Perguntas como: emque tipo de classe est? Quantas professoras teve este ano? Onde se senta naclasse? Qual a freqncia com que ocorrem faltas de professores? Em quemomento da carreira escolar emergiu a queixa em questo? precisavam serincludas no rol de perguntas possveis no atendimento.

    A interlocuo com a escola, semelhana da que se tem com os pais, necessitavaser introduzida.

    Era preciso, ainda, ter um olhar para as camadas social e tnica a que pertenciam

    os envolvidos e os desdobramentos disso na vida e carreira escolares da criana ouadolescente atendido. A passagem de uma criana pobre e negra pela escola tende

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    a guardar diferenas significativas em relao de uma rica e branca. O estgio deconhecimento que a Psicologia e outras cincias atingiram acerca da importnciados fatores sociais na constituio das subjetividades no nos permite mais ignor-los num atendimento psicolgico.

    Impulsionadas por tais necessidades, com uma demanda de atendimento de

    crianas e adolescentes com queixas escolares batendo s nossas portas, apoiadasem nossas referncias tericas e em nossas prticas nas intervenes nasinstituies escolares e junto a educadores, partimos para desenvolver umaabordagem em atendimento psicolgico a que chamamos Orientao QueixaEscolar.

    Trata-se de uma abordagem que parte de uma determinada concepo da naturezae da gnese da queixa escolar. Entende-a como aquela que tem, em seu centro, oprocesso de escolarizao. Trata-se de um emergente de uma rede de relaes quetem como personagens principais, via de regra, a criana/adolescente, sua escola esua famlia. Seu cenrio principal, no qual surge, o universo escolar.

    Assim, nosso objeto de investigao/interveno essa rede e como as relaesentre seus integrantes se desenvolvem. Considerando que um momento construdo ao longo de uma histria que lhe d sentido, conhecer e problematizartal histria incluem-se no atendimento.

    Nosso objetivo conquistar uma movimentao nessa rede dinmica que sedirecione no sentido do pleno desenvolvimento de todos os seus participantes - danossa contraposio s prticas adaptacionistas, que entendem a superao daqueixa escolar como a mudana apenas da criana/adolescente portador da queixa,abrangendo tambm sua famlia, mas deixando intocada a escola. Assim, umacriana que se rebela contra aulas que lhe parecem sem sentido, autoritarismo eatos de humilhao, mostrando-se agressiva e apreendendo pouco os contedospedaggicos que lhe so impostos nessas condies, freqentemente consideradaresponsvel por suas atitudes de recusa e a meta de seu atendimento suaadaptao/submisso.

    A obra de D. Winnicott e de seus seguidores nos ensina que a interveno noambiente - e no apenas em suas representaes no universo simblico doindivduo - faz parte do mbito da ao teraputica. Assim, estruturamos nossaabordagem a partir de princpios tcnicos como:

    obter e problematizar as verses de cada participante da rede (criana, famlia eescola);

    promover a circulao das informaes pertinentes e integrao ou confronto dasmesmas dentro dessa rede, propiciando releituras e buscando soluesconjuntamente;

    identificar, mobilizar e fortalecer as potncias contidas nessa rede, de modo a queesta passe a movimentar-se no sentido da superao da situao produtora daqueixa.

    Trata-se de uma abordagem breve e focal. Breve, por dois motivos essenciais. Porum lado, porque nosso objetivo no passar a integrar essa rede at a superaoplena da configurao na qual a queixa emergiu, mas faz-lo apenas at a

    conquista de sua movimentao no sentido da superao de tal configurao; poroutro, porque, como Winnicott tambm nos ensina em sua obra ConsultasTeraputicas (1984), nos primeiros encontros com o terapeuta, este comparece

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    diante do paciente na condio de objeto subjetivo. Explicando rapidamente: oterapeuta tem, sim, uma existncia objetiva, mas que est envolta pelasubjetividade do paciente. Assim, o paciente - devidamente acolhido - tende ainstitu-lo como aquele que o entende e que capaz de ajud-lo. Esse momentoefmero extremamente poderoso do ponto de vista teraputico, podendo produzirmudanas profundas se bem manejado. E nesse tempo que operamos.

    O processo todo (exceto o acompanhamento) costuma durar por volta de doismeses. Consideramo-lo focal porque centramo-nos na queixa escolar, o que nosignifica que nos restrinjamos apenas ao que diz respeito diretamente a ela,mesmo porque uma abordagem assim restrita no daria conta de nosso objeto.Consideramo-la um campo bastante amplo de investigao/interveno, pormcom o olhar voltado principalmente para as relaes dos contedos emergentescom tal queixa.

    Ser continente nossa instituio como terapeutas, na condio de objetosubjetivo, no significa uma postura passiva; pelo contrrio, entendemos que umapostura ativa especialmente importante em atendimentos psicolgicos s queixas

    escolares. Tal postura mobilizadora dos recursos dos atendidos se assumida apartir da construo de uma relao horizontal com os mesmos. uma relao queno os empobrece em funo de um suposto saber, mas que os acompanha ecompartilha saberes com eles, constituindo-os sempre como seres capazes deserem sujeitos de sua prpria histria.

    Tal postura relaciona-se tambm questo do tempo, que, no caso das queixasescolares, tem uma especificidade que no pode ser ignorada: o tempo escolar, otempo do ano letivo. Fazer com que a superao da situao de fracasso aconteadentro desses parmetros, se essa possibilidade existir sem violentar o tempopsicolgico, deve constituir-se numa meta de trabalho teraputico, uma vez quesabemos o quanto enfrentar uma repetncia ou avanar na carreira escolar sem a

    aquisio dos conhecimentos e competncias correspondentes (falo aqui pensandona promoo automtica em que se converteu a proposta de progresso continuadaou de ciclos na Educao) costuma ser uma situao que tende a dar saltos em seupotencial enlouquecedor a cada passagem de srie.

    A partir dos fundamentos expostos at aqui, estruturamos uma forma de atenderque no rgida, pois a considerao das singularidades faz parte essencial denosso trabalho. Consiste nos seguintes procedimentos:

    Triagem de orientaoUma vez que somos procurados quase sempre pelos pais, por eles quecomeamos nosso trabalho, entendendo que, at esse momento, so eles osdemandantes. Nesse primeiro encontro, valorizamos a presena do pai, sempre quepossvel, dado que a tendncia ainda a presena apenas da me. Solicitamos queseja trazido material escolar da criana, rica fonte de informaes.

    Esse momento tem por objetivos:

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    apresentar a modalidade de atendimento que oferecemos, de modo que osdemandantes possam escolher estar ou no includos no processo de posse de ummnimo de informaes;

    colher a verso dos pais acerca da queixa,

    investigar e pensar a demanda que se apresenta, procurando solues - da adenominao de Orientao;

    verificar se a queixa ou no de natureza principalmente escolar, estabelecendoprioridades em caso de necessidade de atendimento, verificando se o atendimentoque oferecemos ou no o mais adequado para o caso.

    Com relao investigao, no temos um roteiro de perguntas pr-fixado. Asperguntas devem surgir como decorrncia dos caminhos que a narrativa sugere,levando-se em conta, ainda, as concepes acerca das queixas escolares expostasno incio deste texto.

    Assim, quando os pais dizem que seu filho est mal-alfabetizado e no quer ir paraa escola, nossas perguntas iniciais so feitas no sentido de entender melhor, commaior profundidade, o querem dizer com isso. Por exemplo: pedimos exemplos ecircunstncias em que essas manifestaes da criana ocorrem. Pedimos que ospais nos tragam o histrico do filho na relao com a escola e com a alfabetizao,procurando resgatar o momento e circunstncias em que o desencontro se iniciou ese instalou.

    Nunca pedimos, logo em seguida queixa escolar, informaes acerca de gravidez,amamentao, desenvolvimento neuro-psicomotor, relacionamento com os pais ouconstelao familiar. Essas perguntas sero feitas apenas se fizerem sentido dentro

    do quadro que se vai desenhando; do contrrio, a mensagem subliminar que sepassa aos pais de que a queixa escolar decorre de problemas inerentes crianae/ou a sua famlia.

    Os pais so convidados a expressar suas hipteses, pensar junto conosco o queest sendo trazido e possveis sadas. Avaliamos juntos os recursos em jogo e suapotncia.

    Esse momento pode ser individual (no sentido de tratar de apenas um caso) ougrupal. Geralmente o temos realizado em pequenos grupos, procurando utilizar opotencial que essa forma de atendimento propicia, ou seja, procurando fazer comque as reflexes ocorram de maneira coletiva, o que tem produzido identificaes

    emobilizaes que pensar com pares - e no apenas com um especialista -conquistam, facilitando o aparecimento de informaes sobre recursos e outrosefeitos interessantes.

    No raro, a triagem de orientao encerra o atendimento, quando, por exemplo, seconclui que a criana e/ou seus pais e/ou a escola aparentemente j estoencontrando solues e h uma trajetria de melhora. Nesses casos, acordamos emesperar um determinado tempo para verificar se essa trajetria permanece e, casoisso no ocorra, que os pais retomem o contato conosco.

    Por vezes, esse encontro suficiente para produzir nos pais uma releitura dasituao tal que eles se tranqilizam quanto gravidade do que est acontecendo

    e/ou sentem-se capazes de lidar adequada e suficientemente com isso.

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    O encaminhamento para outros atendimentos especializados, tais como aspsicoterapias, pode ocorrer na medida em que esse caminho for se desvelandocomo o mais adequado ou prioritrio. Ressentimo-nos, no entanto, da precariedadedo sistema pblico de sade, que tem profissionais de sade mental em nmeroabsolutamente insuficiente frente s necessidades da populao. Assim,encaminhar para um atendimento psicolgico gratuito , muitas vezes, lanar essa

    populao ao abandono.

    Ressentimo-nos, ainda, da falta de psiclogos clnicos que tenham um olhar para oque ocorre no cenrio escolar, valorizando o oferecimento de algum suporte sescolas ou podendo ouvir o que a criana traz acerca de seu cotidiano escolar coma devida ateno.

    Quando entendemos que h questes escolares importantes na configurao doquadro que se desenhou e que nossa interveno necessria e prioritria, oprocesso de atendimento tem continuidade.

    Encontros com as crianas ou adolescentes

    Nesses momentos, temos como objetivos:

    colher a verso da criana sobre a queixa que se tem a respeito dela;

    propiciar a conquista e/ou valorizao de sua condio de sujeito de sua prpriahistria, que percebe, pensa e intervm;

    perceber e acolher suas necessidades, instaurando a esperana;

    oferecer acolhimento para seus sofrimentos e dificuldades, de modo que possamencontrar inscrio no universo simblico e tornem-se pensveis;

    favorecer a manifestao e utilizao de suas capacidades e potencialidades,afetivas e cognitivas;

    A criana informada acerca da queixa que se tem dela, porm com o cuidado deno se criar obstculos manifestao de outras necessidades que porventura lhesejam mais importantes. Ao longo do processo, procuramos fazer com que elapossa pensar a existncia dessa queixa, expressar sua verso sobre a mesma eproblematiz-la, buscando sadas.

    Assim como com os pais, no temos um roteiro pr-fixado de perguntas eprocedimentos. Os encontros so planejados um a um, de acordo com o que oprocesso sugere. No utilizamos testes, mas procuramos investigar o queentendemos pertinente atravs da observao e interao com a criana dentro deuma relao de acolhimento, confiana e aposta em sua capacidade. Essascaractersticas da relao so importantes para que seu universo de potncias edificuldades possa ser captado com adequao.

    Os materiais que utilizamos, alm de ns mesmos, no diferem dos encontradosnas ludoterapias em geral: materiais expressivos, jogos, brinquedos, livros, etc.

    Temos a preocupao de poder contar com materiais tipicamente escolares (papelpautado, lpis preto, borracha, rgua, etc.) e de planejar o que estar presente em

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    cada encontro segundo a singularidade que se desvela e o que o processo sugerede rumos investigativos, de reflexo e de elaborao.

    A explorao do material escolar especialmente preciosa. T-lo nos encontros,apresentado pela prpria criana, uma conquista. Atravs dele, muitos aspectosda vida escolar emergem, tais como o jogo de fazer de conta que sabe escrever,

    compartilhado por alunos e professores atravs das cpias, as tcnicas didticas, aadequao ou no do que se ensina e se exige na escola, as necessidades epossibilidades da criana, a relao com os pais - muitas vezes revelada embilhetes no caderno-, o capricho, o esforo, o esforo da professora em ofereceralgo adequado e outros tantos aspectos.

    Conquistar a produo escolar da criana em atividades com sentido e carregadasde afetividade, num ambiente acolhedor, tem revelado muitos conhecimentos ondeescola e pais pensavam que no havia quase nenhum, alm fazer com que aprpria criana se aproprie e imprima movimento a capacidades que julgavainexistentes ou com as quais tinha uma relao penosa e envergonhada.

    Em geral, o nmero de encontros com a criana/adolescente por volta de seis,um por semana. O processo pode ser individual ou grupal.

    Interlocuo com a escola

    Esta costuma dar-se em dois momentos: no incio do processo, quando solicitamosda escola um pequeno relatrio, e mais ao final, quando, de posse de tal relatrio,de trabalhos com pais e criana e do delineamento de perguntas e orientaes queo quadro at ento composto sugeriu, vamos escola.

    No processo de marcao desse encontro, procuramos garantir a presena doprofessor na qualidade daquele que lida diretamente com a criana no dia a diaescolar. Esse cuidado se deve prtica comum das escolas de restringir o contato coordenao pedaggica.

    recorrente entre psiclogos a fala de que extremamente difcil dialogar com aescola, pois os educadores so resistentes e hostis. No compartilhamos, via deregra, essa opinio. Nossa experincia tem confirmado reiteradamente que, umavez que busquemos

    uma relao horizontal com os educadores, em que no pressuponhamos nossa

    superioridade diante desses profissionais, mas apenas nossa especialidade - comsuas possibilidades e limitaes;

    despir-nos dos freqentes preconceitos negativos acerca dos professores, que nolevam em conta as circunstncias estressantes, precrias e desestimulantes em quegeralmente desenvolvem seus trabalhos;

    ouvir sua verso da queixa, fazer perguntas que ajudem a esclarec-la e pens-la;

    perceber e valorizar seus recursos e esforos e

    levar informaes e sugestes que possam contribuir para a criao de sentidos ecaminhos em seu trabalho,

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    costumamos encontrar receptividade. O olhar para a criana e para seus pais podemudar e a possibilidade de fortalecer e/ou mobilizar os recursos escolares surge,nem sempre, naturalmente. Muitos so os casos em que o contato com a escolafrustra, o que no deve, no entanto, paralisar-nos ou criana e a seus pais.

    O contato com a escola no espao da mesma tem-se mostrado importante, pois

    revela aspectos do ambiente que uma conversa por telefone ou no local deatendimento no revelaria. Assim, podemos perceber que se trata de um ambienteopressor ou agradvel, se vidros e paredes esto ou no intactos e cuidados, se hou no crianas fora das classes, se se ouvem gritos de professores, se oscompromissos marcados so valorizados e outros aspectos da vida escolar. possvel perceber o entorno da escola, o aspecto das moradias, a presena depoliciais, igrejas ou msica.

    Geralmente esse encontro nico. Investigao, discusso de caso e busca desolues acontecem de maneira integrada. Porm, se avaliamos ser necessrio, hcasos em que um novo encontro acontece.

    Entrevistas de fechamento

    Podem ser realizadas com a criana/adolescente e pais em separado, ou ainda coma criana/adolescente em separado e depois junto com os pais. Vale ressaltar quepodem ter ocorrido outros contatos com os pais em momentos anteriores doprocesso, na medida em que tenha sido necessrio.

    Objetiva-se construir uma releitura do caso luz do que o processo de trabalhopde trazer de novas informaes, vises e perspectivas. Avalia-se o processo de

    orientao e seus efeitos e procura-se pensar como os diversos envolvidos podemestar mobilizando-se no sentido da superao da situao inicial.

    Combina-se um novo contato dentro de um tempo que costuma girar em torno dedois meses, sem contar o perodo de frias escolares.

    Acompanhamento

    Esse procedimento ainda relativamente novo e ainda no temos dados

    sistemticos acerca do mesmo. Consistiu, at o momento, em um novo contatocom os pais e/ou com a escola aps um perodo de cerca de dois meses dofechamento do processo de orientao queixa escolar. Planejamos aperfeio-lo,procurando colher as verses de todos os principais envolvidos: pais, escola e aprpria criana/adolescente."

    O acompanhamento decorre do fato de que as camadas populares carecem, muitasvezes, de informaes e de ajuda para enfrentar meandros e entraves burocrticosque, por vezes, inviabilizam o acesso a recursos procurados, muitos dos quais soseu direito. Decorre, ainda, de nossa necessidade de colher dados acerca daefetividade ou no de nosso trabalho no que tange efetiva mudana de rumos nasqueixas escolares a que atendemos. Nesse sentido, nossa experincia encontra-se

    ainda em seus estgios iniciais, mas temos sinalizaes bastante positivas. Emonze, de quinze casos acompanhados, os responsveis por crianas/adolescentes

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    atendidos referiram-se a tal atendimento como um ponto de inflexo claro numacarreira escolar e pessoal que, antes, rumava ao fracasso.

    Consideraes finaisH quatro anos realizamos levantamentos anuais acerca do que realizamos que tmnos revelado alguns dados de interesse. Um deles que, em 2004, nosso ndice dedesistncia foi de menos de 0,5% dos atendidos. A pesquisa de Souza (op.cit.)encontrou um ndice de desistncia de cerca de 40% apenas aps a primeiraentrevista, em clnicas-escola. Temos, ento, um dado que nos sinaliza estarmosconstruindo um atendimento que atende de maneira mais satisfatria asnecessidades daqueles que procuram um atendimento psicolgico para seus filhoscom dificuldades em seu processo de escolarizao.

    A comparao possvel porque a mesma pesquisa revelou que cerca de 75% da

    demanda infanto-juvenil de tais clnicas de queixas escolares _ o que, alis, omesmo ndice encontrado em unidades bsicas e centros de sade do Municpio deSo Paulo ( Morais, op.cit.) . Alm disso, h uma parcela de cerca de 10% de nossademanda que se revela de natureza principalmente no-escolar.

    Nossos levantamentos revelam, mais uma vez, o peso das polticas educacionais nagerao das queixas escolares. Entendemos que a demanda crescente deatendimento a crianas de 11-12 anos que no esto alfabetizadas, ou o estomuito precariamente, guarda relao direta com a implantao de formaquestionvel dos ciclos na Educao. Por outro lado, vemos crescer a demanda decrianas em idade pr-escolar com queixa de no estarem se alfabetizando, umaconseqncia funesta do carter obrigatrio que a alfabetizao, nesse perodo da

    vida escolar, vem assumindo.

    Novamente constatamos a impossibilidade de pensar a queixa escolar isolada deseus atravessamentos sociais se pretendemos dar conta desse objeto deconhecimento e interveno.

    Chama-nos, ainda, a ateno, o fato de que em apenas 44% dos casos em quefomos procurados1 entendemos que o processo de Orientao Queixa Escolar noera suficiente ou adequado e consideramos necessrio o encaminhamento dacriana ou jovem e/ou de um ou mais familiares para atendimentos psicolgicos demdio e longo prazo e/ou outros trabalhos de especialistas. Em clnicas-escola, ondice de casos em que se considera o atendimento na triagem e no

    psicodiagnstico insuficientes, necessitando de encaminhamentos como os citadosacima, de 100%2 (Souza, op.cit.). Lembramos, mais uma vez, que estacomparao cabvel, em funo das queixas escolares representarem cerca de75% da demanda infanto-juvenil de tais clnicas. Ser possvel que todos queprocuram um psiclogo por conta de questes escolares necessitem de cuidadosespecializados que vo alm de um atendimento psicolgico breve ou at de umpensar que pode acontecer em um encontro nico com um psiclogo atento natureza escolar de tais questes?

    Referncias

    MORAIS, M.L.S. Frum de Sade Mental. Morais, M.L.S. e Souza, B.P. (org.).

    Sade e Educao:muito prazer! So Paulo: Casa do Psiclogo, 2001, pp. 69-88.

    http://pepsic.bvs-psi.org.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-98932006000200012&lng=es&nrm=#1a%231ahttp://pepsic.bvs-psi.org.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-98932006000200012&lng=es&nrm=#2a%232ahttp://pepsic.bvs-psi.org.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-98932006000200012&lng=es&nrm=#1a%231ahttp://pepsic.bvs-psi.org.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-98932006000200012&lng=es&nrm=#2a%232a
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    SOUZA, M.P.R. A Queixa Escolar e a Formao do Psiclogo.TesedeDoutorado em Psicologia. Instituto de Psicologia da Universidade de So Paulo, SoPaulo, 1996.

    WINNICOTT, D. Consultas Teraputicas. Rio de Janeiro: Imago, 1984.

    Endereo para correspondnciaR. Dr. Manoel Maria Tourinho, 70101236-000, Pacaembu, So Paulo, SP, BrasilFone e fax: (11) 3873.7229E-mail:[email protected]

    Recebido 14/07/05Aprovado em: 10/03/06

    * Psicloga do Instituto de Psicologia da - Universidade de So Paulo. Mestre emPsicologia1 Consideramos aqui todos os casos com que tivemos no mnimo um contato direto.No consideramos os que apenas preencheram ficha de inscrio.2 No esto considerados os casos em que a autora no pde, pelas informaesconstantes nos pronturios pesquisados, identificar a continuidade ou conclusodos mesmos. Isto ocorreu em 19% das vezes.

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