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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6 Cadernos PDE OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE Artigos

OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA PERSPECTIVA DO ... · alunos de 6º ano do Ensino Fundamental, procurando sanar as dificuldades encontradas para garantirmos uma escolarização

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A LEITURA LITERÁRIA NA FORMAÇÃO DO LEITOR

Dagmara de Santana Skalski1

Maria Cristina Fernandes Robazckievcz2

Resumo: Lendo, descobrimos e aprendemos coisas que nos transformam, possibilitando-nos

interagir com o mundo. A atividade de leitura na escola, não deve limitar-se à sala de aula. Deve ir além, abrir portas, apontar caminhos, desenvolver leitores, novas formas de ler, novas leituras... A escola precisa oferecer ao aluno, o acesso a diversas leituras, entre elas, a literária. Este acesso não deve limitar-se a levar o aluno a fazer interpretações prontas e acabadas em troca de uma nota. É necessário ensinar os alunos a ler, assegurando o direito de escolha, pois o texto literário, acima de tudo, deve ser prazeroso. Este Artigo apresenta resultados relacionados às atividades desenvolvidas no Projeto PDE, com objetivo de tornar a leitura literária interessante, prazerosa e que desperte curiosidade nos alunos, sem usá-la simplesmente como um conteúdo a ser avaliado, desprovida de significados. As estratégias de ação contaram com 17 momentos, envolvendo alunos, familiares, professor, a escola e a comunidade. A participação da família foi relevante no desenvolvimento do Projeto, ressaltando que a nenhuma das atividades desenvolvidas foi atribuída uma nota.

Palavras-chave: Letramento literário. Leitura literária. Escolarização literária.

1. INTRODUÇÃO

O presente artigo objetiva apontar caminhos de como se trabalhar a leitura

literária em sala de aula desvinculada de uma nota, de uma avaliação, através de

diferentes atividades de leitura. A partir do momento em que o aluno dá sentido

àquilo que está lendo e encontra um objetivo em sua leitura, este descobrirá o

quanto é gostoso ler, mesmo dentro do ambiente escolar.

Precisamos com urgência, abandonar a ideia de que é preciso avaliar, dar

uma nota ao aluno para que este leia, pois o que acontece, na grande maioria das

vezes, é que acabamos desta forma, afastando nosso aluno/leitor do mundo dos

livros, quando transformamos a leitura literária em cobranças desnecessárias,

tornando a mesma, um sacrifício para o aluno. Neste sentido, cabe ao professor

buscar novas metodologias para que possa despertar em seus alunos, o gosto pela

leitura literária, sendo ele, o grande responsável por este despertar. O professor

deve ser o guia, conduzindo seus alunos por este caminho de surpresas

1 Professora da Rede Pública Estadual de Ensino do Paraná. E-mail: [email protected].

2

Professora da UNESPAR – FAFIUV – Campus de União da Vitória. Doutoranda em Linguística

Aplicada UNISINOS – Universidade do Rio dos Sinos - RG. E-mail: [email protected].

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inesgotáveis, o caminho da leitura. Porém, para que isto se efetive, é preciso

também, que o próprio professor seja um leitor. Ele, mais do que ninguém, deve

acreditar na leitura para transmitir aos seus alunos, porque do contrário, tudo soará

falso. As crianças e adolescentes têm essa capacidade de decifrar o que é falso e

verdadeiro. Num estudo feito por Silva (2009, p. 28) ela cita que:

Ana Maria Machado, em um texto de reflexão sobre esse tema, diz ser inconcebível que alguém que não saiba nadar seja instrutor de natação, porém inúmeros professores que não são leitores tentam inculcar, sem sucesso, em seus alunos o gosto pela leitura. A propaganda que fazem da leitura soa falsa, pois eles próprios não acreditam nela, e os alunos percebem a incoerência. Portanto, o problema está mais atrás, está na formação leitora dos professores, que, mesmo tarde, precisa ser de alguma forma recuperada.

Ao analisarmos estas dificuldades em se trabalhar a leitura literária na escola,

precisamos trabalhar todo o contexto que nos cerca, desde a falta de interesse dos

nossos alunos frente à leitura até as práticas de sala de aula realizadas pelo

professor. Portanto, este artigo procura direcionar atividades a serem realizadas com

alunos de 6º ano do Ensino Fundamental, procurando sanar as dificuldades

encontradas para garantirmos uma escolarização adequada da leitura literária, bem

como a formação do leitor dentro da escola. Evangelista, Brandão e Machado (2011,

p. 11) afirmam que:

Em outras palavras, professores de Português temos nos debatido com esse pressuposto da dificuldade de trabalhar textos literários na escola, de promover a leitura de livros, de contribuir para que os alunos se tornem leitores voluntários e autônomos, acrescendo-se o fato de que a necessidade escolar de avaliação de leitura tem se transformado em cobrança, com todas as ameaças que esta traz e, por isso mesmo, em vez de aproximação e identificação, tais práticas têm causado repulsa ao objeto, desgosto no ato de ler e afastamento das práticas sociais de leitura próprias do contexto de leitores.

Todo o trabalho aqui realizado foi fundamentado através de vários autores e

as atividades propostas, pautadas na obra de Rildo Cosson sobre o letramento

literário, de Joana Cavalcanti sobre os caminhos da literatura infanto/juvenil e de

Magda Soares sobre a escolarização da literatura infantil e juvenil, pois foram os

que mais me aproximaram daquilo que pretendia desenvolver com meus alunos

sobre a leitura literária.

2. LETRAMENTO LITERÁRIO

Dentro da concepção do letramento literário não basta apenas que o indivíduo

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tenha habilidade de ler textos literários, mas sim compreender e dar significados a

esses textos. Busca-se trabalhar o processo da escolarização da literatura,

reformando, fortalecendo e ampliando a educação literária que ofertamos nas

escolas. A prática da literatura baseia-se em uma exploração das potencialidades da

linguagem, da palavra e da escrita, que não tem paralelo em outra atividade

humana. Neste sentido Cosson (2012, p. 12) afirma:

O letramento literário, conforme o concebemos, possui uma configuração de existência da escrita literária, o processo de letramento que se faz via textos literários compreende não apenas uma dimensão diferenciada do uso social da escrita, mas também e, sobretudo, uma forma de assegurar seu efetivo

domínio.

Por isso sua importância em qualquer processo de letramento tanto na escola

como naquele que se encontra difuso na sociedade. Para isso precisamos que a

literatura tenha um lugar especial na escola. A literatura nos diz e nos incentiva a

desejar e a expressar o mundo por nós mesmos. É através dela que conhecemos o

mundo, por meio da experiência do outro. Para tanto, é preciso mudar os rumos da

sua escolarização. Segundo Cosson (2012, p. 17)

A experiência literária não só nos permite saber da vida por meio da experiência do outro, como também vivenciar essa experiência. Ou seja, a ficção feita palavra na narrativa e a palavra feita matéria na poesia são processos formativos tanto da linguagem quanto do leitor e do escritor.

"Seja em nome da ordem ou do prazer, o certo é que a literatura não está

sendo ensinada para garantir a função social de construir e reconstruir a palavra que

nos humaniza." (Cosson, 2012, p. 23). O autor afirma que falta um objeto próprio de

ensino da literatura. Há os que se prendem apenas na História da Literatura, mas

que precisam deixar de lado esta noção conteudística do ensino para compreender

que, o que pode ser passado ao aluno é uma experiência de leitura a ser

compartilhada. Para aqueles que acreditam que basta a leitura de qualquer texto, é

preciso que percebam que essa experiência poderá e deverá ser ampliada com

informações específicas do campo literário e até fora dele.

Para Cosson, é fundamental que seja colocado como foco das práticas

literárias na escola a leitura efetiva dos textos, e não as informações das disciplinas

que ajudam a construir essas leituras. Essa leitura não pode ser realizada,

simplesmente pelo prazer absoluto de ler. "Por fim, devemos compreender que o

letramento literário é uma prática social e, como tal, responsabilidade da escola."

(Cosson, 2012, p. 23).

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Segundo Cosson, quando promovemos o letramento literário, é necessário ir

além da simples leitura do texto literário. Pressupõe-se que os livros falam por si

mesmos ao leitor. Se fora da escola, lemos textos literários com prazer, sem que

ninguém nos dê instruções, por que a escola deve apropriar-se a passar aos alunos,

essa forma de leitura? Uma das respostas é de que a leitura fora da escola está

ligada pela maneira que ela nos ensinou a ler. Os livros, como os fatos, não falam

por si mesmos. O que os fazem falar são os mecanismos de interpretação que são

usados, e muitos deles são aprendidos na escola. A escola precisa ensinar o aluno a

explorar a leitura de maneira adequada, sem o que nada poderá ser feito.

Há de se concordar com Cosson (2012, p. 27) quando afirma que:

Ler implica troca de sentido não só entre o escritor e o leitor, mas também com a sociedade onde ambos estão localizados, pois os sentidos são resultados de compartilhamentos de visões do mundo entre os homens no tempo e no espaço.

Para o autor, quando lemos, fazemos uma ligação do nosso mundo com o

mundo do outro. O sentido do texto só se completa quando esse trânsito se efetiva,

quando se faz a passagem de sentidos entre um e outro.

Kleiman (1999, p. 65) afirma que:

Mediante a leitura, estabelece-se uma relação entre leitor e autor que tem sido definida como de responsabilidade mútua, pois ambos têm a zelar para que os pontos de contato sejam mantidos, apesar das divergências possíveis em opiniões e objetivos.

Não podemos ir direto ao texto com ideias pré-estabelecidas ou inalteráveis,

pois ao invés de ir pensando junto com o autor, o leitor acaba se fechando, somente

para aquilo que acredita, transformando a leitura numa atividade difícil. Se

acreditarmos que o mundo está absolutamente completo, que nada mais pode ser

feito, a leitura não nos faz sentido algum. É preciso, então, tornar a atividade da

leitura significativa. Cabe, então, ao professor, criar condições para a formação de

leitores capazes de experienciar toda a força humanizadora da literatura, não

bastando apenas ler, até porque, não existe uma leitura simples. Segundo Cosson

(2012, p. 30):

Na escola, a leitura literária tem a função de nos ajudar a ler melhor, não apenas porque possibilita a criação do hábito da leitura ou porque seja prazerosa, mas sim, e, sobretudo, porque nos fornece, como nenhum outro tipo de leitura faz, os instrumentos necessários para conhecer e articular com proficiência o mundo feito linguagem.

Para Kleiman, a leitura que não surge de uma necessidade para chegar a um

propósito não é propriamente leitura, quando lemos porque nos mandam, como

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ocorre frequentemente nas escolas, estamos somente realizando atividades

mecânicas que pouco têm a ver com significado e sentido. Se não há uma

motivação para a leitura, não há aprendizagem. Pré-determinar objetivos ao

aluno/leitor, não é necessariamente um mal. Quando o adulto fornece um modelo, a

partir deste, o leitor poderá estabelecer seus próprios objetivos, desenvolvendo

estratégias necessárias e adequadas para a atividade de ler.

Dessa forma, é preciso que a leitura na escola, seja uma prática democrática.

A leitura depende mais daquilo que o leitor está interessado em buscar no texto do

que as palavras que estão ali escritas. Dentro destas perspectivas, o professor e o

aluno devem fazer da leitura literária uma prática significativa para eles e para a

comunidade em que estão inseridos. As atividades de sala de aula devem

contemplar o processo de letramento literário e não apenas a simples leitura das

obras. "A literatura é uma prática e um discurso, cujo funcionamento deve ser

compreendido criticamente pelo aluno" (Cosson, 2012, p. 47), sendo de

responsabilidade de o professor fortalecer essa disposição crítica. O letramento

literário tem como princípio a construção de uma comunidade de leitores.

Comunidade que oferecerá um conjunto cultural dentro da qual o leitor poderá se

mover e construir o mundo e a ele mesmo. Desta forma, Cosson (2012, p. 47 - 48)

afirma que:

Para tanto, é necessário que o ensino da Literatura efetive um movimento contínuo de leitura, partindo do conhecido para o desconhecido, do simples para o complexo, do semelhante para o diferente, com o objetivo de ampliar e consolidar o repertório cultural do aluno. Nesse caso, é importante ressaltar que tanto a seleção das obras quanto as práticas de sala de aula devem acompanhar este movimento.

Muitas dessas práticas de sala de aula trabalham o texto, segundo Coracini,

como pretexto para o estudo da gramática, do vocabulário ou de outro aspecto da

linguagem que o professor acredita ser importante ensinar. Cosson afirma ainda,

que uma das grandes preocupações do professor é a comprovação da leitura que o

aluno fez, através de resumos, testes ou notas que só comprovam o grau de

memória dos alunos. Tanto para Cosson como para Coracini e Souza, muitas vezes

as leituras que o aluno faz são deixadas de lado para dar lugar as leituras do

professor - dono das informações, tomadas como fatos e não ferramentas; ou do

livro didático - que o professor tem como portador da verdade, como representante

fiel da ciência. "Para romper com essas práticas e concepções que pouco têm a ver

com o letramento literário, propomos, antes de qualquer coisa, que o professor tome

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a literatura como uma experiência e não um conteúdo a ser avaliado." (Cosson,

2012, p. 113).

O autor coloca ainda, que o professor não deve procurar por respostas certas,

mas sim, pela interpretação que o aluno chegou. A leitura do aluno deve ser

discutida, questionada e analisada, devendo apresentar coerência com o texto e a

experiência de leitura da turma. Não se pode tentar aprisionar a leitura literária em

testes ou notas, pois dessa forma, podemos acabar afastando o leitor do texto. A

avaliação aqui deve ter caráter de registros dos avanços do aluno para ampliá-los e

suas dificuldades superadas. Se o aluno lê com um objetivo, o professor deve deixar

de avaliá-lo a todo o momento atribuindo-lhe notas. Dentro do letramento literário,

segundo Cosson, há uma sequência básica que traz três grandes pontos de apoio

para a avaliação da leitura literária. O primeiro deles está nos intervalos que

acompanham a leitura da obra - momentos de checagem do andamento da leitura

que ajudam o professor e os alunos a compartilhar suas impressões iniciais. O

segundo é a discussão e o terceiro é o registro da interpretação. Cosson (2012, p.

115) afirma ainda que:

A avaliação não pode ser um instrumento de imposição da interpretação do professor, antes deve ser um espaço de negociação de interpretações diferentes. São essas negociações que conduzem à ultrapassagem das impressões iniciais individuais e configuram o coletivo da comunidade de leitores.

Na visão de Cosson, precisamos enquanto escola, propiciar aos nossos

alunos um ensino significativo de literatura, formando um leitor cuja competência

ultrapasse a simples decodificação dos textos, de um leitor que se apropria de forma

autônoma das obras e do próprio processo da leitura, enfim, de um leitor literário.

2.1 ESCOLARIZAÇÃODA LEITURA LITERÁRIA

Sabemos hoje, que muitos professores têm encontrado dificuldades em

trabalhar textos literários na escola, de oferecer aos alunos a leitura de livros, para

ajudar na formação de um leitor literário capaz de fazer suas próprias escolhas.

Sem contar como é feita a avaliação da leitura, pois esta, na maioria das vezes,

acaba se tornando um sacrifício, uma forma de punição, de cobranças

desnecessárias. Com isto, a escola acaba afastando os alunos, ao invés de

aproximá-los da leitura. É preciso repensar a escolarização da leitura literária.

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Segundo Soares, o processo de escolarização é inevitável, pois é da essência

da escola a instituição dos saberes escolares. Mas é preciso descobrir uma

escolarização adequada da literatura, sem desvirtuá-la, distorcê-la, tornando-a

sedutora e desafiante. Há de se concordar com Soares (2011, p. 21) quando coloca

que:

Portanto, não há como evitar que a literatura, qualquer literatura, não só a literatura infantil e juvenil, ao se tornar “saber escolar”, se escolarize, e não se pode atribuir, em tese, conotação pejorativa a essa escolarização, inevitável e necessária; não se pode criticá-la, ou negá-la, porque isso significaria negar a própria escola.

A autora refere-se como “tese”, pois na escola, essa escolarização da

literatura da forma como vendo sendo realizada, acaba adquirindo um sentido

negativo. A questão não é a de negar esta escolarização, mas sim a sua

inadequada, errônea e imprópria escolarização. A autora lembra ainda, que essa

escolarização inadequada pode ocorrer com qualquer outro conhecimento, quando

transformado em saberes escolares. É preciso (re) descobrir como se deve ensinar

literatura, como se deve trabalhar o texto literário, como se deve orientar e usar

formas de incentivo a leitura de livros, para promovermos a escolarização adequada

aos nosso alunos. Para Zilberman (2003, p. 26):

Tal decisão por uma mudança de rumos implica algumas opções por parte do professor, delimitadas estas, de um lado, pela escolha do texto e, de outro, pela adequação deste último ao leitor. Dessa maneira, as fronteiras se estendem da valorização da obra literária à relevância dada ao procedimento da leitura.

Segundo Soares, há três principais instâncias de escolarização da literatura: a

biblioteca escolar, a leitura e o estudo de livros de literatura, a leitura e os estudos

de textos. Na biblioteca, se realiza a escolarização da literatura, através do próprio

espaço que é vista como um local da e de acesso à literatura, da organização do

tempo e acesso aos livros e de leitura, através da seleção de livros e a determinação

de rituais de leitura (como se deve ler, por exemplo, em silêncio, sem escrever no

livro, etc.) e em que posição se deve ler. A leitura e o estudo de livros de

literatura escolarizam através da determinação e orientação da leitura,

configurando-se como tarefa ou dever escolar, além disso, a leitura é sempre

avaliada, seja ela através de qual atividade for, ela terá que ser demonstrada,

comprovada, porque é da essência da escola avaliar. Fora da escola, nunca temos

que demonstrar, comprovar que lemos um livro. Quando a escola toma para si a

literatura, é sempre inevitável que ela seja escolarizada. Na instância da leitura e

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estudo de textos, a literatura se apresenta na escola sob a forma de fragmentos

que devem ser lidos, compreendidos, interpretados, e é aí que ela tem sido mais

inadequada.

Assim, Cavalcanti (2009, p. 28) afirma:

Os textos são apresentados de forma incoerente, são mesmo mutilados uma vez que pinça fragmentos das obras de grandes autores e, posteriormente, os leitores devem responder às questões de interpretação e gramática. Ora, isso é uma violência contra a arte, contra o autor e contra a formação de leitores. Mas, ainda é assim que se tem feito.

Sabe-se que algumas escolas tentam oferecer atividades diferenciadas, em

locais preparados para leitura. Mesmo que isso tudo seja válido, é preciso que o

professor ou qualquer outro responsável por tal atividade, estejam bem preparados,

que os mesmos sejam apaixonados pela leitura. Pois do contrário, terão a leitura

literária como pretexto para impor a leitura de um determinado texto, para finalmente

avaliar.

Para Soares, várias são as formas de escolarização inadequada da literatura

encontradas nas escolas:

Os gêneros literários nos livros didáticos: os textos narrativos se

encontram desestruturados. Quando se trata, por exemplo, de poesia, trabalha-se

apenas os aspectos formais (conceito de estrofes, verso...) ou então se usa para fins

ortográficos ou gramaticais.

A seleção de autores e obras: há uma grande recorrência de autores e das

mesmas obras nas coleções didáticas. Uma seleção limitada de autores e obras faz

com que a criança/adolescente acabe entendendo que literatura se resume a

determinados autores e determinadas obras – o importante aqui é a compreensão

do literário e o gosto pela leitura literária. Outro aspecto a ser colocado, é que não

existem critérios apropriados para a seleção de autores e textos. Nos livros

didáticos, é muito frequente a ausência de referência bibliográfica e informação

sobre o autor do texto, o que acaba tornando o texto independente da obra que

pertence, desapropriando-se o autor de seu texto. É preciso trabalhar o conceito de

autoria, de obra, de fragmentos de obra;

A seleção do fragmento que constituirá o texto: os textos para leitura são

fragmentados de textos maiores, pois é preciso que os textos sejam curtos para que

sejam trabalhados no tempo limitado imposto pelos currículos e horários escolares.

Ao selecionar o fragmento de um texto, este tem de constituir-se como texto. O

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fragmento não é um texto, pois não é um todo significativo e coerente, nem é uma

narrativa, pois apenas apresenta a situação e o fato que desencadeará os

acontecimentos. Sobre este tema, Soares (2011, p. 36) afirma que:

Em síntese, e concluindo este item sobre a fragmentação da narrativa em “textos” propostos à leitura em livros didáticos, pode-se afirmar que a escolarização – inevitável, repita-se o adjetivo – da literatura infantil faz-se frequentemente de forma inadequada e, mais que isso, prejudicial mesmo, pois abala o conceito que a criança tem, intuitivamente, da estrutura da narrativa, dá-lhe uma ideia errônea do que é um texto e pode induzi-la a produzir ela mesma pseudotextos, já que estes é que lhe são apresentados como modelo.

Transferência do texto de seu suporte literário para a página do livro

didático: quando isto ocorre, o texto acaba, inevitavelmente, sofrendo

transformações. Se isto não pode ser evitado, é necessário, que sejam respeitadas

as características essenciais da obra literária, que não sejam alterados aqueles

aspectos que constituem a literalidade do texto, tais como: alterações de parágrafo,

eliminação de palavras e expressões, alteração do título do texto, alteração do

contexto textual e distorção do texto (gênero do texto). É preciso, no entanto,

reconhecer que não há como não alterar o texto ao transportá-lo do livro didático,

porém este, precisa respeitar o que é a essência caracterizadora do texto. É preciso

que seja uma escolarização que obedeça a critérios que preservem o literário.

Nos livros didáticos, os textos para leitura, colocados aos alunos, vem sempre

acompanhados de exercícios de “estudo do texto”, com o objetivo de que “a escola

deve conduzir o aluno à análise do texto e a explicitação de sua compreensão e

interpretação” (Soares, 2011, p. 43), no entanto, esta atividade acaba centrando-se

nos conteúdos, e voltando-se para as informações que os textos veiculam. Dessa

forma ao ser transportado para o livro didático, o texto literário, torna-se um texto

estudado e não mais um texto para divertir, para dar prazer. Para Soares (2011, p.

43):

Os objetivos de leitura e estudo de um texto literário são específicos a este tipo de texto, devem privilegiar aqueles conhecimentos, habilidades e atitudes necessárias à formação de um bom leitor de literatura: a análise do gênero do texto, dos recursos de expressão e de recriação da realidade, das figuras autor-narrador, personagem, ponto de vista (no caso da narrativa), a interpretação de analogias, comparações, metáforas, identificação de recursos estilísticos, poéticos, enfim, o “estudo” daquilo que é textual e daquilo que é literário.

Em relação à citação acima, o que acontece realmente é que os livros

didáticos fazem totalmente ao contrário. Quase sempre os exercícios propostos aos

alunos são de compreensão – para localizar informações no texto ou exercícios de

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metalinguagem (gramática e ortografia) ou ainda, exercícios de opiniões – buscar no

texto um ensinamento moral - sem contar que as respostas estão prontas no livro

didático do professor, sugerindo aquilo que o aluno deve achar ou aprender do

texto. Sobre isso, Kleiman (2012, p. 73) reitera que:

De fato, essa tentativa seria incoerente se o ensino de leitura seguisse a prática escolar, tanto do professor como do livro didático, que privilegia uma leitura, a do professor, como a única leitura correta, autorizada. Essa orientação fica evidente na divisão que o livro didático faz entre “perguntas de compreensão” que, como apontamos anteriormente, na maior parte são perguntas sobre informação que aparece explicitamente no texto, e a “resposta pessoal”, que parece ser o único momento, também controlado pelo autor do livro didático ou pelo professor, em que prevê que o aluno chegue a uma opinião própria, isto é, se coloque como sujeito da leitura.

Dentro de todas as afirmações aqui colocadas, Liberato (2012) defende a

ideia de que é preciso melhorar a legibilidade dos textos didáticos, tornando-os mais

acessíveis, mais fáceis de compreender – tanto do conhecimento da língua quanto

do conhecimento do assunto de que trata o texto, favorecendo a compreensão e

facilitando o aprendizado da leitura. O que deve ser feito, são atividades que

respeitem a diversidade de ritmos, capacidades de compreensão, de abstração, de

concentração dos alunos.

A partir do momento em que nós educadores estivermos prontos para uma

transformação de nossas práticas de sala de aula que dizem respeito à leitura

literária, quando nos sensibilizarmos e acreditarmos que a leitura é o caminho que

nos leva a mundos infinitos, dentro e fora de cada um de nós, aí sim, estaremos

propiciando uma escolarização adequada da literatura.

3. METODOLOGIA

O Projeto foi aplicado no Colégio Estadual Duque de Caxias de São Mateus

do Sul, com os alunos do 6º ano B do Ensino Fundamental no período matutino,

durante o 1º semestre do ano letivo de 2014. Cabe ressaltar que nenhuma das

atividades realizadas teve cunho avaliativo. Todas elas foram desenvolvidas com o

objetivo de desvincular o livro de uma nota, sem usá-lo como instrumento de

avaliação, como atividades de interpretações prontas e acabadas ou como

atividades de revisão gramatical. Dentro deste contexto, Cosson (2012, p.115),

afirma:

Por fim, se estamos criando um espaço no qual os alunos estão lendo literatura com objetivo, precisamos resistir à tentação de avaliar a

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performance do aluno a cada momento ou valorizar com pontos cada atividade realizada.

A implementação do projeto, que tem como problematização “Como trabalhar

a leitura literária em sala de aula sem utilizar o livro simplesmente como instrumento

de avaliação?” teve início no mês de fevereiro com a exposição do projeto através

de uma conversação para o conhecimento dos alunos como seriam desenvolvidas

as atividades e também sobre a importância da leitura literária e a importância da

participação dos pais. Neste momento foi distribuído um questionário para os alunos

e pais responderem sobre o contato e a experiência de cada um com livros, pois

este projeto visa também a participação dos familiares. Cada aluno levou o

questionário para que os pais respondessem em casa. Na semana seguinte,

entregaram os questionários respondidos. A partir daí, o professor pôde ter uma

ideia da realidade de cada aluno e seus familiares em relação à leitura. A

participação dos pais é imprescindível, pois eles são fundamentais neste despertar

para o mundo da leitura. Se a família entende a importância da leitura, ela também

incentiva suas crianças/adolescentes ao contato com os livros. Segundo Petit (2009,

p.86):

... em contextos críticos, o espaço do jogo, o espaço do devaneio, os tempos de trocas gratuitas, o imaginário, são reduzidos. [...] Quando a luta pela sobrevivência ou o trabalho ocupam todo o tempo cotidiano, quando os pais são infelizes e preocupados, independentemente do amor que sintam por seus filhos, eles não têm condições de proporcionar-lhes tais momentos, de compartilhar com eles, esses “jogos de olhares conjuntos” [...]

Então é preciso que nós, enquanto escola, propiciemos e incentivemos

nossos alunos e familiares, esse contato mais íntimo, essa troca de olhares, essa

cumplicidade que falta entre pais e filhos. Juntos redescobrirmos a importância deste

elo pais/professor/aluno e é através da leitura que podemos retomar este contato. É

difícil? Talvez... Mas não impossível!

Após este primeiro momento, foi apresentado aos alunos, a Biblioteca da

Classe da qual cada um escolheu um livro (de acordo com o interesse de cada um)

para levarem para casa e lerem juntamente com a família. Se nem todos da família

pudessem ler, poderia ser uma pessoa que o acompanhasse nesta leitura, conforme

a disponibilidade de cada um.

Para a montagem da Biblioteca da Classe, foram selecionados textos com

pluralidade de autores e obras para atender aos diferentes gostos dos alunos pela

leitura, transformando-a numa prática democrática. Por se tratar de alunos de 6º

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ano, o objetivo era de que eles começassem uma leitura mais simples, voltada a

temas de seu interesse e, que nos próximos anos, eles cheguem a leituras mais

complexas, tornando a leitura literária, uma atividade de prazer e conhecimento.

Para Cosson (2012, p. 35):

... a diversidade é fundamental quando se compreende que o leitor não nasce feito ou que o simples fato de saber ler não transforma o indivíduo em leitor maduro. Ao contrário, crescemos como leitores quando somos desafiados por leituras progressivamente mais complexas. Portanto, é papel do professor partir daquilo que o aluno já conhece para aquilo que ele desconhece, a fim de se proporcionar o crescimento do leitor por meio da ampliação de seus horizontes de leitura.

Para trazer os pais até a escola para conhecerem e fazerem parte do projeto

foi realizado o I ENCONTRO LITERÁRIO DA FAMÍLIA, onde contamos com a

presença dos alunos e seus familiares. O evento foi realizado no Salão Nobre do

Colégio onde foi exposto oralmente todo o encaminhamento do projeto e sua

importância. Os pais tiveram acesso a Biblioteca da Classe da qual, alguns levaram

livros para casa, independente dos livros que os filhos já haviam levado. Tivemos

também contação de histórias, realizadas com alunos e professora do nosso

Colégio. Sobre contação de histórias, Silva (2009, p. 29) coloca:

... os grupos de contadores de histórias que se formaram nas últimas décadas demonstram sua preocupação de levar o livro ao ouvinte. Além disso, ao situarem o autor num contexto, ao contarem alguma particularidade de sua vida (a época em que viveu, seu país de origem) ou do personagem, eles também ajudam a despertar o interesse e a imprimir esses dados na mente do ouvinte. A bagagem cultural do jovem leitor vai aí, então pouco a pouco, se enriquecendo.

Desenvolver esta atividade com a participação do Grupo de Contadores de

História era de justamente despertar o interesse pelos livros, não somente nos

alunos, mas também em seus familiares. Para o encerramento desta atividade,

tivemos o Café Literário.

Retomando as atividades de sala de aula, passamos para o trabalho de

análise dos elementos paratextuais, através de slides. É preciso que, além da leitura

da obra, os alunos conheçam outros elementos que compõem um livro, tão

importantes e que muitas vezes acabamos deixando de lado. Cosson (2012, p. 60)

afirma que:

Independentemente da estratégia usada para introduzir a obra, o professor não pode deixar de apresentá-la fisicamente aos alunos. [...] A apresentação física da obra é também o momento em que o professor chama a atenção para a leitura da capa, da orelha e outros elementos paratextuais que introduzem uma obra.

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Após a explicação feita pelo professor e análise coletiva, os alunos sentaram

em duplas e fizeram a leitura paratextual de seus livros e apresentaram à turma.

Neste momento, foi entregue a um aluno, o Diário de Classe para levar para casa e

juntamente com a família, registrassem suas experiências com a leitura em família.

Assim que registrassem, passava-se para outros, para que todos fizessem seus

registros.

Sabemos o quanto é importante também, conhecer um pouco sobre o autor

que estamos lendo. Para isso, os alunos fizeram pesquisas sobre as obras e os

autores repassando aos colegas, aquilo que aprenderam. Para Cosson “A biografia

do autor é um, entre outros contextos que acompanham o texto. No momento da

introdução é suficiente que se forneçam informações básicas sobre o autor e, se

possível ligadas àquele texto.” (Cosson, 2012, p. 60).

Para que a leitura que estava sendo feita em casa com os familiares, não se

perdesse, foram realizados momentos para que os alunos falassem um pouco do

que estavam lendo e tirar suas possíveis dúvidas, até mesmo, despertar a

curiosidade dos colegas. É importante fazer essas intervenções para que o aluno

perceba a importância da leitura que está fazendo. Cosson (2012, p. 62) afirma que:

A leitura escolar precisa de acompanhamento porque tem uma direção, um objetivo a cumprir, e esse objetivo não deve ser perdido de vista. Não se pode confundir, contudo, acompanhamento com policiamento. O professor não deve vigiar o aluno para saber se ele está lendo o livro, mas sim acompanhar o processo de leitura para auxiliá-lo em suas dificuldades, inclusive aquela relativas ao ritmo da leitura.

Neste mesmo direcionamento, foi realizada uma aula de leitura em sala de

aula, na qual o professor também estava lendo seu livro, para que os alunos

percebessem que todos estavam lendo. Um momento de leitura, onde no final cada

um fez suas considerações acerca da leitura que estava sendo realizada.

A leitura literária realizada na escola requer uma escolarização e não

podemos fugir deste papel frente à leitura. Precisamos realizar atividades escolares,

como já foi dito aqui, usando diferentes estratégias para despertar no aluno o gosto

pela leitura e, principalmente, sem relacioná-la a uma nota. Outra atividade então, foi

após a leitura dos livros, a produção de sinopses feitas pelos próprios alunos. Antes

desta produção foi trabalhado o que é sinopse e como fazê-la. Os alunos tiraram

suas dúvidas e produziram seus textos que foram reestruturados pelo professor. Ao

concluírem esta etapa, foram produzidos marcadores de texto com as sinopses e

imagens de cada livro. Este material foi usado posteriormente no evento Literatura

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na Praça. Foram produzidos também, cartazes como atividades de registros

escritos. É muito importante que os alunos externalizem a leitura, através desses

registros. Há várias maneiras de se fazer esses registros, aqui então, optamos por

produção de sinopses e cartazes.

Outra forma de externalizar, de materializar a sua interpretação foi o momento

da Contação de Histórias dos livros que cada aluno leu. Esta atividade foi realizada

no Salão Nobre do Colégio, onde os alunos falaram sobre seus livros, contaram

suas histórias no palco usando fantasias. Para Cosson (2012, p. 65):

O momento de externo é a concretização, a materialização da interpretação como ato de construção de sentido em uma determinada comunidade. É aqui que o letramento literário feito na escola se distingue com clareza da leitura que fazemos independentemente dela. [...] Na escola, é preciso compartilhar a interpretação e ampliar os sentidos construídos individualmente. A razão disso é que por meio do compartilhamento de suas interpretações, os leitores ganham consciência de que são membros de uma coletividade e de que essa coletividade fortalece e amplia seus horizontes de leitura.

Sabemos o quanto é gostoso ler e ouvir histórias e, partindo deste ponto, é

necessário oferecermos aos nossos alunos, momentos em que eles ouçam uma

história e ao mesmo tempo interajam com ela. Para promover um momento de

contato do professor com os alunos, como contador de histórias, foi realizada a

leitura dinâmica do livro “Uma Professora Muito Maluquinha” – Ziraldo, para tal, o

professor fez a leitura dividida em dois dias, durante quatro aulas, onde os alunos

também participaram, fazendo comentários, lendo trechos do livro, sendo algumas

vezes algum personagem. Foi uma atividade em que todos participaram,

descobriram e refletiram sobre temas abordados no livro, brincaram e riram, enfim,

uma atividade realmente dinâmica. “Sem dúvida, existem algumas maneiras de fazer

do momento de leitura um espaço de prazer, troca, dinamismo, entrega e reflexão.”

(Cavalcanti, 2009, p.72).

Aproveitando todas as informações presentes no livro lido aos alunos (com o

qual podemos realizar tantos outros trabalhos), fizemos em conjunto, professor e

alunos uma análise literária da obra de acordo com as possibilidades dos alunos de

6º ano. A análise foi feita oralmente e registrada no quadro, e depois cada aluno fez

suas anotações no caderno. Comparamos informações daquela época com a atual,

das quais posteriormente alguns alunos relataram experiências vividas por seus pais

e avós, a partir do contexto da obra. Para Cavalcanti (2009, p. 79):

Não basta que a escola promova o lúdico, a brincadeira e a leitura dentro de um clima de prazer. É fundamental que aprender a ler e a gostar de ler

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tenha um sentido na vida de cada um. Que o leitor se sinta identificado com o lido, que possa exercitar-se numa aprendizagem importante sobre o mundo, as pessoas, a natureza, as lutas, a dor e o amor.

A partir do momento em que os alunos começaram a ouvir e a interagir com o

texto narrado pelo professor, eles começaram a buscar e a trazer informações e

materiais para exemplificarem aquilo que ouviram.

Após as atividades realizadas até este momento, sentamos para relataras

experiências vividas durante a realização das atividades relacionadas à leitura

literária. Cada um teve o momento de expor suas opiniões, seus relatos. Aqui não

teve contação de histórias, mas sim de experiências.

Para o encerramento das atividades deste semestre (pois este projeto pode

ser trabalhado durante o ano todo, acrescentando outros momentos) era preciso

fazer algo diferente, que envolvesse toda a comunidade escolar. O trabalho com a

leitura literária realizada com os alunos não poderia ficar restrito as quatro paredes

da sala de aula. Deveríamos dividir com todos, esse momento. Foi então realizado,

o evento LITERATURA NA PRAÇA, com o objetivo de dar continuidade àquilo que

estava sendo trabalhado em sala de aula, um contato maior dos alunos com

escritores, para que eles vissem que um escritor não é alguém tão distante da nossa

realidade, saberem como se faz um livro, enfim, desenvolver várias atividades

relacionadas à leitura literária não somente para a nossa escola, mas sim a toda a

comunidade são-mateuense.

O trabalho começou uns três meses antes para organização deste dia. Esta

atividade foi realizada no final do mês de junho, no Salão Nobre do Colégio, pois

devido ao mau tempo, com muita chuva, teve-se que montar num local coberto e

fechado. O evento Literatura na Praça contou com a participação de autores locais e

de fora, os quais ministraram oficinas aos alunos e professores, participação de

professores e alunos do curso de Formação de Docentes do Colégio São Mateus,

contadores de histórias, cantores de MPB da cidade, declamadores de poemas,

poetas, alunos e professores da UNESPAR-FAFIUV, escola de música da cidade

com apresentações de violino e teclado, participação da Biblioteca Municipal

fazendo carteirinhas e oficina de dobraduras. Tivemos exposição e venda de livros

com representantes de livrarias e escritores, sorteio de livros e brindes aos

participantes e visitantes. Os alunos do projeto participaram das oficinas, expuseram

seus trabalhos e fotografias e interagiram com os visitantes sobre a importância da

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leitura literária. As atividades tiveram início às 9h e encerramento às 17h, onde

contamos com a participação dos familiares, alunos, professores e funcionários do

Colégio e muitos outros visitantes. Este evento contou com patrocínios do comércio,

indústrias e empresas locais e de fora. Foi um dia totalmente voltado à literatura, em

meio a livros, escritores, poetas, contadores de histórias, alunos, professores,

crianças, jovens, adultos e idosos, enfim, um dia de muita interação com o mundo da

literatura, provocando e despertando os sentidos, vendo, ouvindo e sentindo.

Tomando como referência, Cavalcanti (2009, p. 85) que diz:

... esperamos que a entrada no mundo da leitura seja sempre realizada num clima de entrega e busca pela transformação. Cada educador tem nas mãos uma varinha de condão, e por mais difícil que seja sensibilizar para a leitura, não podemos perder de vista o nosso propósito de não deixar morrer a nossa tradição e cultura, portanto as histórias que falam do que somos e podemos ser.

Após a realização de todas as atividades propostas na Unidade Didática,

conforme calendário PDE para o 1º semestre fizemos (professor e alunos) uma

avaliação oral do Projeto como um todo, incluindo os relatos dos pais e dos alunos

registrados nos questionários e do Diário de Classe. Também foram considerados

comentários de outros professores da escola e de pessoas externas, patrocinadores,

colaboradores e através do GTR, com o objetivo de estabelecer um parâmetro

delineador da viabilidade, ou não, da implementação do Projeto.

4. GRUPO DE TRABALHO EM REDE - GTR

O Grupo de trabalho em rede é um espaço virtual onde temos a oportunidade

de socializarmos os materiais pedagógicos que estavam sendo desenvolvidos na

escola e ao mesmo tempo interagirmos com professores da rede estadual de ensino

do Paraná. Esta interação nos proporciona a troca de experiências, ideias e

sugestões para o enriquecimento do nosso trabalho.

As interações realizadas neste momento foram muito importantes, pois

discutimos muito acerca do tema proposto com o intuito de levarmos algo diferente

para as nossas aulas de leitura. Alguns professores já trabalham de forma parecida

com as atividades aqui citadas. No momento do GTR, alguns professores

começaram a desenvolver com seus alunos algumas atividades desta Produção

Didático-Pedagógica. Estas interações foram muito enriquecedoras, pois pudemos

observar que mudam as escolas, mudam os alunos, mas as dificuldades de se

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trabalhar a leitura literária são as mesmas. Dessa forma, o GTR é um trabalho

realizado no PDE que nos ajuda muito na avaliação da viabilidade do Projeto. Todos

os que participaram deram valiosas contribuições e o resultado foi muito positivo.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Levar a leitura literária para a sala de aula nesses tempos em que a

tecnologia toma conta do nosso dia a dia, em que nossas crianças/adolescentes

vivem num mundo mediático, onde luz, movimento, cor e ação atraem o leitor, não é

uma tarefa simples e, portanto, exige-se mais do professor que tem o papel – que

muitas vezes nossos alunos não encontram no seio familiar – que é o de despertar o

gosto pela leitura. Não podemos de forma alguma tentar utilizar de uma avaliação,

de uma nota, para fazer com que nossos alunos leiam, isso é no mínimo desastroso.

Não podemos continuar repetindo aquilo que vivenciamos um dia. Nossos alunos,

hoje, são mais críticos e ao tentarmos impor uma nota em troca de uma leitura que

não lhes interessa é no mínimo, uma falta de preparo e bom senso de nós

professores. Aquilo que foi talvez, bom para uma geração, hoje já não é mais, então,

precisamos procurar metodologias que nos ajudem a inserir nossas

crianças/adolescentes no mundo da leitura e não acabar afastando-os de vez. Não

temos receitas prontas e milagrosas, pois cada situação de sala de aula e cada

aluno são únicos. Precisamos ter um olhar crítico frente às mudanças em que

estamos vivendo e ajudarmos nossos alunos a encontrarem um significado, um

objetivo naquilo que estão lendo. Só assim vão descobrir o quanto é prazeroso e

gostoso ler, ao mesmo tempo em que aprendemos e abrimos muitas portas em

nossas vidas através da leitura literária.

Partindo desses pressupostos, foi desenvolvida uma Produção Didático-

Pedagógica, realizando-se atividades de incentivo à leitura com alunos de 6º ano

(pois devemos começar pelas séries iniciais), desvinculando o livro de uma

avaliação, de uma nota, sem se perder a função de escolarização da leitura literária,

mas de forma mais objetiva sem perder o prazer e o gosto pela mesma.

Todas as atividades desenvolvidas tiveram excelentes resultados com a

participação dos alunos e familiares. Por se tratarem de alunos de comunidades

rurais que vem até o centro para estudarem, muitos deles não têm acesso a

livrarias, a bibliotecas, sem contar que alguns são de família de baixa renda. Porém

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a aceitação e a participação dos alunos e da família foram ótimas, pois os familiares

leram os livros com seus filhos, irmãos, netos... e também emprestaram outros livros

da escola para lerem em casa. Muitas vezes, os pais acabam deixando de lado os

livros na vida dos filhos e de suas próprias, por causas diversas, entre elas a

desestrutura familiar, famílias de baixa renda, falta de conhecimento e de tempo

para conversarem com seus filhos, comprar um livro de presente, enfim, um

momento em que o livro esteja presente dentro da casa e na vida de cada um.

Vamos então nós, professores, trazer esses pais para junto de nós, pois muitas

vezes também estão perdidos, sem saber o que dar e o que fazer por seus filhos, e

é junto deles que podemos ajudar nossas crianças e adolescentes.

Cada atividade planejada e desenvolvida teve seu objetivo alcançado, mas

precisamos ter em mente, que ao planejarmos nossas atividades na hora de

colocarmos em prática podemos nos deparar com algum empecilho, porém não

podemos perder o foco. Ocorreram alguns detalhes que não estavam previstos,

como o laboratório de informática em que a maioria dos computadores não

funcionava, falta de apoio dentro da escola, condições desfavoráveis do tempo para

a realização de uma determinada atividade, mas nada que pudesse desestruturar

aquilo que foi planejado. É sabido também que dificilmente atingiremos 100% dos

nossos alunos, mas 98% é possível.

O nosso objetivo também era alcançar horizontes além da sala de aula e

conseguimos atingi-lo, trazendo junto conosco a comunidade são-mateuense que

participou, apoiou e nos ajudou na concretização do Evento Literatura na Praça, pelo

qual eu e meus alunos recebemos uma MOÇÃO DE APOIO E APLAUSOS da

Câmara de Vereadores do nosso município. Todas as atividades tiveram resultados

acima das expectativas e com a excelente participação de todos os envolvidos.

Conseguimos atingir os objetivos com a certeza de que a implementação deste

Projeto é viável e podemos com ele alcançarmos ótimos resultados. O Projeto

continuará durante o ano todo com outras atividades propostas já realizadas neste

segundo semestre e outras que ainda realizaremos até o final do ano.

Ao finalizarmos as atividades do 1º semestre, fica a certeza de que vale a

pena lermos, estudarmos e procurarmos novos caminhos para oferecermos aos

nossos alunos e familiares, alguma coisa que um dia possa fazer a diferença na vida

de cada um e é através da leitura que podemos fazer essa diferença. Parafraseando

o que bem colocou Mário Quintana, os livros não mudam o mundo, as pessoas é

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que mudam o mundo. Os livros, eles só mudam as pessoas.

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