Upload
voduong
View
218
Download
1
Embed Size (px)
Citation preview
UNIVERSIDADE DA AMAZÔNIA - UNAMA PRO-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO, PESQUISA E EXTENSÃO - PPPE
NÚCLEO DE ESTUDOS E PESQUISA EM QUALIDADE DE VIDA E MEIO AMBIENTE PROGRAMA DE MESTRADO EM DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE URBANO
MARCO JOSÉ ANDRADE CRUZ
OS IMPACTOS DOS ACIDENTES DE TRÂNSITO POR LESÃO CORPORAL NA VIDA DOS VITIMADOS EM FACE AO CONTROLE SOCIAL DO ESTADO
BELÉM 2013
MARCO JOSÉ ANDRADE CRUZ
OS IMPACTOS DOS ACIDENTES DE TRÂNSITO POR LESÃO CORPORAL NA VIDA DOS VITIMADOS EM FACE AO CONTROLE SOCIAL DO ESTADO
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente Urbano, da Universidade da Amazônia para a obtenção do título de Mestre.
Orientadora: Profª. Drª: Maisa Sales Gama Tobias.
BELÉM
2013
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Nazaré Soeiro CRB2 961
342.1513 C957i Cruz, Marco José Andrade.
Os impactos dos acidentes de trânsito por lesão corporal na vida dos vitimados em face ao controle social do Estado./Marco José Andrade Cruz. – 2013.
102 f. ; 21 x 30 cm.
Dissertação (Mestrado) – Universidade da Amazônia, Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente Urbano, 2013.
Orientador: Profª. Drª. Maisa Sales Gama Tobias.
1. Acidente no transito – Dano Ambiental. 2. Lesão Corporal - Atropelamento. 3. Crime de Trânsito – Controle Social. I. Tobias, Maisa Sales Gama (orient.). II. Título.
MARCO JOSÉ ANDRADE CRUZ
OS IMPACTOS DOS ACIDENTES DE TRÂNSITO POR LESÃO CORPORAL NA VIDA DOS VITIMADOS EM FACE AO CONTROLE SOCIAL DO ESTADO
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente Urbano, da Universidade da Amazônia para a obtenção do título de Mestre.
Orientadora: Profª. Drª: Maisa Sales Gama Tobias.
Banca Examinadora:
_________________________________________ Profª. Drª. Maísa Sales Gama Tobias - Orientadora
Universidade da Amazônia – UNAMA
_________________________________________ Profª. Drª. Luciana Fonseca
Universidade Federal do Pará – UFPA
_________________________________________ Profª. Drª. Ângela Maria Nascimento Oliva –
Examinador Interno Universidade da Amazônia - UNAMA
Apresentado em: ____/____/_____
Conceito: ____________________
Dedico este trabalho primeiramente a Deus, criador e mantenedor de todas as coisas, por ter me concedido o privilégio da vida e a serenidade necessária para vencer os obstáculos dessa jornada. A minha esposa Eliany e aos meus filhos: Thaynara, Marco e Matheus, pelos estímulos que me impulsionaram a buscar vida nova a cada dia; meus agradecimentos por terem aceitado se privar de algum conforto em favor dos meus estudos, concedendo a mim a oportunidade de me realizar ainda mais.
AGRADECIMENTOS
A vitória é conquistada quando aprendemos a construir degraus com as
pedras que encontramos no caminho. Esses degraus construídos a base de suor e
lágrimas é que possibilitam alcançar os objetivos traçados. Apesar de saber que, o
esforço deve ser individual, é imprescindível a colaboração de outras pessoas.
Para ajudar nessa tarefa uma legião de anjos transfigurados na figura de
amigos, professores e familiares deram apoio, incentivo, orientação e, até mesmo
broncas, para que não se perdesse o foco. Por esta razão, registro nesse espaço os
meus sinceros agradecimentos a todos que me ajudaram a transformar as pedras de
tropeço em degraus para o êxito.
Primeiramente agradeço a Deus porque com Ele e através Dele, todas as
coisas se fazem possíveis. A nossa Orientadora Profª. Drª Maisa Sales Gama
Tobias, pela sábia condução dos rumos da pesquisa. Agradeço a Profª. Drª Luciana
Fonseca pela simpatia e presteza e importante contribuição técnica para o
aprimoramento desta Dissertação.
Especialmente agradeço a Profª. Drª. Ângela Oliva e a Prof. Msc. Mirna
Moraes pela valiosa orientação, paciência, carinho e incentivo nesta árdua estrada
de produção do conhecimento.
Agradeço a minha chefia e aos colegas de trabalho pelo apoio e carinho.
Aos meus irmãos e irmãs, esposa e filhos pelas orações e apoio. Aos meus colegas
de turma, entusiastas do conhecimento, pela espontaneidade e alegria na troca de
informações e materiais numa rara demonstração de amizade e solidariedade, dos
quais sentirei imensa saudade. Agradeço a todas as pessoas que de alguma forma
estiveram na torcida.
No limiar dessa tarefa podemos dizer que, aqui chegamos pela fé, confiando
em Deus!
“Os rios atingem os seus objetivos porque
aprenderam a contornar os seus
obstáculos.”
(Mao Tse Tung)
RESUMO
O acidente de trânsito é um fenômeno que causa grande preocupação em todo o mundo, em razão de suas consequências irem além dos danos materiais e ambientais. Por causa das lesões que produz afeta a vida pessoal, profissional e familiar dos vitimados. O estudo em foco é resultado de uma pesquisa exploratória com abordagem crítico-dialética que teve como lócus inicial a VEPMA. A amostragem envolveu 112 casos de lesões corporais escolhidos aleatoriamente entre os processos em fase de execução de pena, em cumprimento na VEPMA, correspondentes ao período de 2007, 2008 e 2009. Através da análise documental foi possível a localização e a obtenção dos dados socioeconômicos dos sujeitos da pesquisa. Foi utilizado o questionário para complementar dados que não constavam nos processos e a entrevista semi-estruturada para capturar a essência do fenômeno pesquisado. O resultado da pesquisa mostrou que o impacto que o acidente de trânsito causa na vida dos vitimados ultrapassa os danos visíveis, já que afeta a vida pessoal da vítima quando o tira bruscamente de sua rotina cotidiana obrigando-o a ficar num leito, com dor física ou psicológica. Afeta ainda, a sua vida profissional tirando-o de maneira momentânea ou permanente do mercado de trabalho no auge da capacidade produtiva. Além disso, a vida familiar fica comprometida, visto que seus membros experimentam privações e necessidades em razão da falta de recursos financeiros. O Estado realiza o controle social sobre o trânsito através dos órgãos de do Sistema Nacional de Trânsito. No entanto, em face de ocorrência de ilícito que ultrapasse a competência administrativa, no caso deste estudo, as lesões corporais, a presença do Estado é percebida na esfera judicial, sendo a VEPMA um dos órgãos executores de sentença condenatória. Palavras-Chaves: Acidente no transito – Dano Ambiental. Lesão Corporal - Atropelamento. Crime de Trânsito - Controle Social.
ABSTRACT
Traffic accidents are a phenomenon that cause great concern in the entire world, because the consequences stretch beyond material and environmental damages. Because of the harms it causes, it affects personal, professional, and family lives of victims. The present study is a result of an exploratory research with a critic-dialectical approach, which had VEPMA as initial locus. The sample involved 112 cases of actual bodily harms, which were chosen randomly among the processes during sentence enforcement phase or sentence serving at VEPMA, during 2007, 2008, and 2009. The documental analysis enabled the localization and obtaining of socioeconomic data about the research subjects. A questionnaire was used to complete data that were not present in processes and a partially structured interview was held to capture the essence of the researched phenomenon. The research result showed the impact that traffic accidents cause in victims' lives, which surpass visible damages, affects their personal lives, compelling them to be bedridden with physical or psychological pain. It also affects their professional lives, depriving them shortly or permanently from job market at the peak of their productive capacity. Furthermore, family life is compromised, because their limbs experience privations and needs due to their lack of financial resources. The state carries out social control regarding traffic through agencies of National Traffic System. However, in view of a tort that surpasses the administrative environment - in the case of this study, actual bodily harms - the presence of state is perceived in courts and VEPMA is one of enforcement bodies of sentences.
Keywords: In Traffic Accident-Environmental Damage. Personal Injury-Trampling. Transit Crime-Social Control.
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 - Distribuição por tipo de deficiência (%) ............................................... 30 Gráfico 2 - Causas de deficiência física ............................................................... 30 Gráfico 3 - Distribuição das lesões por área do corpo .......................................... 38 Gráfico 4 - Distribuição dos pacientes vítimas de Acidentes de Trânsito por causa de internação ........................................................................... 39 Gráfico 5 - Posição na Família (em %) ................................................................. 42 Gráfico 6 - Demonstrativo geral da pesquisa ....................................................... 71 Gráfico 7 - Por gênero .......................................................................................... 72 Gráfico 8 - Por Faixa etária .................................................................................. 73 Gráfico 9 - Por Escolaridade ................................................................................ 73 Gráfico 10 - Por Renda .......................................................................................... 74 Gráfico 11 - Motivo do deslocamento ..................................................................... 75 Gráfico 12 - Tipo de veículo envolvido no acidente ................................................ 77 Gráfico 13 - Circunstâncias do tempo e iluminação ............................................... 77 Gráfico 14 - O que deu causa ao acidente ............................................................. 79 Gráfico 15 - Circunstâncias do Meio Ambiente Urbano que contribuíram para a
ocorrência do acidente ........................................................................ 80 Gráfico 16 - Quem prestou socorro ........................................................................ 81 Gráfico 17 - local de atendimento ........................................................................... 82 Gráfico 18 - Maneira como o acidente afetou a vida pessoal ................................. 83 Gráfico 19 - Sentimentos referidos após o acidente ............................................... 85 Gráfico 20 - Maneira como o acidente afetou a vida profissional ........................... 86 Gráfico 21 - Posição que a vítima ocupa/ocupava na família enquanto responsável financeiro ........................................................................ 88 Gráfico 22 - Maneira como o acidente afetou a vida familiar.................................. 90
LISTA DE ABREVIATURA
AT Acidente de Trânsito
CF Constituição Federal
CP Código Penal
CTB Código de Trânsito Brasileiro
DETRAN Departamento de Trânsito do Estado do Pará
DNIT Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transporte
DPVAT Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Vias Terrestres
HMUE Hospital Metropolitano de urgência e Emergência
IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
OMS Organização Mundial da Saúde
SNT Sistema Nacional de Trânsito
TEPT Transtorno do Estresse Pós-Traumático
VEPMA Vara de Execução de Penas e Medidas Alternativas
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO 11
1.1 O projeto de dissertação 12
1.2 Estrutura da dissertação 15
2 CATEGORIAS DE ANÁLISES 17
2.1 Acidente de trânsito 17
2.1.1 Classificações dos tipos de acidentes 18
2.1.2 Causas dos acidentes 23
2.1.3 Mortalidade e morbidade causadas por acidentes de trânsito 28
2.1.4 O enfrentamento do problema pelo Estado 31
2.2 Lesão corporal e suas consequências 34
2.2.1 Lesões mais frequentes e a tipificação como crime de trânsito 37
2.2.2 Consequência das lesões 41
2.3 O controle social do estado sobre o trânsito 45
2.3.1 Evolução histórica da atuação do Estado sobre o trânsito 51
2.3.2 O código de trânsito vigente 52
2.3.3 Controle Administrativo e Judicial do trânsito 56
3 FUNDAMENTOS METODOLÓGICOS 64
3.1 O tipo de pesquisa 64
3.2 Procedimentos metodológicos 65
3.3 O método de análise 68
4 OS IMPACTOS DOS ACIDENTES NA VIDA DOS VITIMADOS: AN ÁLISE
DAS DIMENSÕES QUANTITATIVA E QUALITATIVA 71
4.1 DEMONSTRATIVOS DA PESQUISA 71
4.2 Dados Socioeconômicos 72
4.3 Dados sobre o acidente 76
4.4 Impacto dos acidentes na vida das vítimas 81
4.4.1 Impactos na vida pessoal 83
4.4.2 Impactos na vida profissional 86
4.4.3 Impactos na vida familiar 88
4.5 A percepção atual da vítima sobre o aciden te 91
5 CONCLUSÃO 93
REFERÊNCIAS 97
11
1 INTRODUÇÃO
A presente dissertação é resultado de uma investigação exploratória sobre os
impactos que os acidentes de trânsito causa na vida dos vitimados. O despertar do
interesse em estudar o fenômeno deve-se ao fato do acidente de trânsito ser um
grave problema no mundo contemporâneo que afeta tanto países ricos quanto
países pobres, deixando um rastro de dor, sofrimento, sequelas e mortes. Em
termos de Brasil, considerando os anos de 1998 a 2008, morreram 365.016 pessoas
vitimadas pelo trânsito (WAISELFISZ, 2011).
Estima-se que em 2010, houve mais de 1 milhão de acidentes e mais de 500
mil feridos, milhares ficando com sequelas graves definitivas que impedem uma vida
normal. Em 2011, a empresa que administra o seguro de Danos Pessoais Causados
por Veículos Automotores de Vias Terrestres – DPVAT, divulgou que foram pagas
239.738 indenizações por invalidez permanente (SEGURADORA LÍDER, 2011).
No Estado do Pará, considerando os anos de 2007 a 2009, ocorreram, 63.758
acidentes de trânsito que resultaram em 31.410 feridos e 3.423 mortos. A capital
paraense, nesse mesmo período, registrou 31.624 acidentes que resultaram em
9.893 feridos e 397 mortos (DETRAN/PA, 2010). Em virtude da violência do trânsito
o Estado do Pará é considerado o primeiro Estado da Região Norte em número de
mortes por acidente de trânsito (WAISELFISZ, 2011).
Apesar do Código de Trânsito vigente prever leis mais duras, e, mesmo com
os avanços na engenharia de tráfego, os acidentes de trânsito continuam evoluindo
e causando: danos materiais, ambientais, custos previdenciários, despesas com
internações e indenizações, deixando sequelas visíveis e invisíveis. Desta forma, o
pós-acidente traz repercussão para a vida pessoal, profissional e familiar dos
envolvidos, o que afeta também, familiares e a sociedade como um todo.
Estudos e pesquisas mostram as causas e os prejuízos materiais e
ambientais em decorrência do acidente (Impactos Sociais e Econômicos dos
Acidentes de Trânsito nas Rodovias Brasileiras – IPEA – 2006; Juventude
e Segurança Rodoviária - OMS, 2007; Mapa da Violência: Acidentes de Trânsito,
2011). No entanto, poucos se debruçam em estudar o que acontece com o vitimado
após o acidente, e responder questões, tais como: 1) O que alterou na situação
ocupacional? 2) De que forma o acidente afetou a família? 3) Como ficou a vida
12
profissional após o sinistro? Diante destas questões, esta dissertação se debruça na
investigação do impacto que o sinistro causou na vida do vitimado.
1.1 O projeto de dissertação
Nesta seção estão apresentados os pontos desencadeadores e norteadores
do trabalho que envolve a justificativa, a caracterização do problema e os objetivos
da pesquisa, para efeito de entendimento da proposta inicial da dissertação, bem
como do processo de pesquisa e os possíveis resultados alcançados.
Primeiramente, faz-se necessário refletir que o deslocamento para as mais
diversas atividades humanas: trabalho, educação, lazer, saúde, comércio, dentre
outras, passou a ser uma condição básica de sobrevivência e desenvolvimento da
sociedade, principalmente, nas cidades. A maior necessidade de viagens pode
ocasionar problemas à mobilidade urbana e, com isto, resultar em acidentes.
O acidente de trânsito é um fenômeno social de caráter mundial, que traz
consequências para todos os atores envolvidos impedindo, de forma momentânea
ou permanente, o prosseguimento de uma vida normal. Pode causar a morte
prematura ou como resultado das lesões, deixarem o vitimado padecendo com
sequelas física, mental ou psicológica, obrigando-o a parar subitamente com suas
atividades produtivas.
O grande desafio da sociedade contemporânea, na área de trânsito e
transporte, é reduzir os crescentes índices estatísticos de acidente de trânsito. Sob
essa ótica é relevante então destacar que o acidente de trânsito é reflexo de vários
fatores, que inclui desde o comportamento dos usuários, as políticas públicas de
trânsito e transporte, até a produção da indústria automobilística que investem em
veículos cada vez mais potentes.
Aparentemente alheio aos riscos da velocidade, que é uma das causas
desencadeadora de acidentes de trânsito, as indústrias automobilísticas oferecem
opcionais de segurança para os modelos mais sofisticados, como cintos com pré-
tensionamento, airbags frontais, freios com ABS, prometendo segurança para os
ocupantes do veículo. Porém, apesar da comprovada eficácia de tais equipamentos,
estes não são suficientes para impedir a tragédia quando a velocidade ultrapassa o
seu limite de impacto. Margaret Chan, Diretora Geral da Organização Mundial da
Saúde afirma que:
13
Historicamente, muitas das medidas para reduzir as mortes e ferimentos por acidentes trânsito destinam-se a proteger os ocupantes dos veículos. No entanto, (...) cerca de metade das pessoas que morrem anualmente por acidentes de trânsito no mundo são pedestres, motociclistas, ciclistas e passageiros de transportes públicos. (Informe sobre la situación mundial de la seguridad vial: es hora de pasar a la acción. Ginebra, Organización Mundial de la Salud, 2009, p.IV).
As estatísticas oficiais demonstram que aqueles que conseguem sobreviver
acabam por adquirir deficiências, consideradas sequelas visíveis (SEGURADORA
LÍDER, 2011). No entanto, os estudos de Cavalcante et al (2007) mostra a
existência de transtornos pós traumáticos, denominadas de sequelas invisíveis
resultantes dos acidentes. Desta maneira, tanto as sequelas visíveis, quanto as
sequelas invisíveis interferem no retorno à normalidade existente antes do sinistro.
Esta dissertação parte da seguinte questão-problema: Quais as consequências das
lesões provocadas por acidente de trânsito na vida pessoal, familiar e profissional do
vitimado?
Em resposta ao problema levantado, foi elaborada a seguinte hipótese: quem
adquire deficiência física, assim como, aquele que desenvolve transtorno pós-
traumático, em virtude do acidente, sofre um violento impacto em sua vida que vai
além das feridas no corpo: na vida pessoal – pode adiar ou inviabilizar planos
pessoais; profissionalmente – pode resultar em perdas econômicas, em decorrência
da interrupção temporária ou permanente das atividades produtivas; e, familiar –
pode causar dificuldades financeiras e sociais, principalmente se o acidentado era o
principal provedor financeiro da família, obrigando a família a promover adaptações
por conta do acidente.
O fenômeno acidente de trânsito motiva o interesse de estudos e pesquisas
pelas diversas áreas do conhecimento, como: engenharia, medicina, direito,
psicologia, dentre outras. Investigar as consequências do pós-acidente colocará em
evidencia o impacto que as sequelas, visíveis e invisíveis, causaram na vida dos
vitimados, assim como, a maneira que afetou os familiares, e seu reflexo na
sociedade. Esse conhecimento trará importante contribuição para a implantação de
políticas públicas para: segurança viária; saúde pública; e, também, de inclusão
social para portadores de deficiência adquirida.
14
� Diante do exposto, este trabalho tem como objetivos:
Geral:
Realizar um estudo exploratório acerca das consequências dos acidentes de
trânsito na vida pessoal, profissional e familiar dos vitimados, tendo como local de
pesquisa a Vara de Execuções de Penas e Medidas Alternativas – VEPMA, no
período de 2007, 2008 e 2009, na capital paraense.
� Objetivo específico:
• Apresentar os impactos dos acidentes de trânsito para a sociedade;
• Analisar os acidentes de trânsito como produtores de mortes e lesões;
• Identificar as sequelas visíveis e invisíveis causadas pelos acidentes de
trânsito;
• Analisar o papel do Estado no controle social da questão.
A escolha do tema nasceu da observação do cotidiano do trânsito na cidade
de Belém-PA. O sistema viário principal do transporte coletivo urbano da cidade é
espaço disputado, de visual caótico onde, além dos pedestres, das bicicletas, da
quantidade de carros cada vez maior; vans, kombis e motocicletas - para transporte
clandestino de pessoas - disputam com o transporte coletivo regular um número
expressivo de passageiros, o que gera conflito e faz com que o ato de dirigir se torne
um risco constante nas vias e resulte em muitos acidentes.
Os acidentes de trânsito são produtores de lesão corporal, porém, quando a
lesão corporal for consequência do acidente, essas, serão consideradas crimes de
trânsito, tipificadas como lesão corporal culposa. O foco da pesquisa está centrado
nas consequências do acidente na vida dos envolvidos, essas consequências são
percebidas a partir da sequela deixada pelo acidente de trânsito.
A possibilidade de capturar o fenômeno num estágio após o impacto imediato
do sinistro, sendo produto de um crime de trânsito específico – lesão corporal -
motivou a escolha da VEPMA como local para realização da pesquisa exploratória
por possibilitar maiores informações sobre os impactos dos acidentes de trânsito. O
recorte temporal avaliado nessa discussão compreende os anos de 2007, 2008 e
2009.
15
A VEPMA é um espaço jurídico-social com competência na Região
Metropolitana de Belém para aplicar, fiscalizar e controlar o cumprimento das penas
restritivas de direitos. Essas penas são formas alternativas, legalmente constituídas
para o cumprimento das penas atribuídas aos crimes considerados de menor
potencial ofensivo, como é o caso da lesão corporal culposa quando provocada na
direção de um veículo automotor.
Para servir de instrumento de coleta de dados utilizou-se a pesquisa
documental e a entrevista semi-estruturada. A pesquisa documental foi realizada nos
112 processos, a entrevista semi-estruturada, aplicada em 71 vitimados e 8
familiares, totalizando 79 entrevistas.
Os dados coletados foram analisados através do método de Análise de
Conteúdo (BARDIN, 1988), com procedimentos temáticos e categoriais. Esse
método é considerado híbrido pelo fato de fazer ponte entre o formalismo estatístico
e a análise qualitativa da matéria. Portanto, mostra-se adequado para atender aos
objetivos desta dissertação.
Assim sendo, este estudo constitui-se num importante instrumento
investigativo para retratar os impactos causados pelo acidente de trânsito,
demonstrando a outra face do sinistro ao pesquisar o que acontece com o vitimado
de maneira tridimensional: na vida pessoal, profissional e familiar. Desta forma,
objetiva-se trazer importantes contribuições para a construção e materialização de
políticas públicas.
1.2 Estrutura da dissertação
Na sua organização formal, esta dissertação está dividida em duas partes, a
saber: na primeira parte estão presentes as categorias de análises com a
contribuição de diferentes autores e o itinerário metodológico da pesquisa que foi
levada a efeito para a concretização da dissertação. Na segunda parte, é
apresentado o resultado do estudo empírico com aplicação do método de Análise de
Conteúdo (Bardin, 2009), momento de discussão e análise daquilo que foi revelado
pela pesquisa com base nos fundamentos apresentados na primeira parte.
Buscando um efeito didático que proporcione melhor compreensão do objeto
em estudo, as partes que compõem esta dissertação obedecem à seguinte ordem:
16
• 1- Introdução, utilizada para elucidar as primeiras aproximações ao
tema e aos parâmetros de fundamentos teóricos;
• 2- Categorias de análises, na qual se discute o acidente de trânsito
com sua tipologia e causa, mortalidade e morbidade, a lesão corporal e
suas consequências e a tipificação como crime de trânsito; e,
finalizando as categorias de análises, o controle social do Estado sobre
o trânsito;
• 3- Fundamentos metodológicos, onde são demonstrados o tipo de
pesquisa e o método de análise dos dados coletados;
• 4- Análise da dimensão quali-quantitativa, na qual é apresentado o
resultado da pesquisa de campo realizada na VEPMA, com a análise
do impacto que o acidente causou na vida pessoal, profissional e
familiar da vítima;
• 5- Por último, as Conclusões do estudo mostrando a eficácia do
método aplicado para responder à questão-problema e apresentação
de sugestões.
17
2 CATEGORIAS DE ANÁLISES
Esse Capítulo faz a discussão teórica sobre o tema, analisa a situação do
acidente de trânsito mostrando os tipos de acidentes, as causas, a mortalidade e
morbidade provocadas pelo sinistro; as Lesões corporais e suas consequências, as
lesões mais frequentes e a tipificação como crime de trânsito; finaliza com o controle
social do Estado sobre o trânsito, o Código vigente e o controle administrativo e
judicial sobre o trânsito.
2.1 Acidente de trânsito
A evolução da economia e do poder aquisitivo da população, aliada as
facilidades de crédito, possibilitou a aquisição de um modo de transporte motorizado
por uma significativa parcela da população, que, anteriormente, era excluída desse
privilégio. A aquisição de um veículo para o transporte individual, que num primeiro
momento mostrou-se como facilitador da mobilidade para as diversas atividades
humanas causou impacto direto na frota nacional e na malha viária, e, por
consequência, o aumento das ocorrências de acidentes de trânsito. A esse respeito,
Resende e Sousa (2009) consideram que:
...os congestionamentos... começam a se prolongar de maneira assustadora... isso resulta em travamento dos principais corredores, com graves consequências para a qualidade de vida dos cidadãos, associadas a enormes prejuízos econômicos e sociais... Na maioria das estradas brasileiras, acidentes e imprevistos são comuns. Uma pessoa que necessita chegar ao destino em um horário determinado, precisa adicionar um tempo extra ao tempo previsto para o trajeto. Este tempo extra é um dos mais agravantes aspectos dos congestionamentos (RESENDE; SOUSA, 2009, p. 16).
Os acidentes de trânsito apresentam elevadas taxas de mortalidade e
morbidade. Além de causar mortes trágicas, também dão causa a incapacidades,
momentâneas ou permanentes em virtude das sequelas deixadas pelas lesões
corporais. Apesar de haver vítimas graves que evoluem para uma recuperação total,
não se pode ignorar o longo período de internação/tratamento.
Esse período em que o vitimado compulsoriamente dedica ao tratamento
obriga-o a se afastar de suas atividades laborais e de outras relações sociais,
18
ocasionando consequências para a vida pessoal, profissional e familiar, em razão de
perdas financeiras, necessidade de acompanhamento de familiar nas internações e
outras necessidades do tratamento, como consultas e fisioterapia, assim como,
afastamento das atividades produtivas provedoras da subsistência.
A Associação Brasileira de Normas Técnicas – ABNT (NBR 10697/1989)
define acidente de trânsito como todo evento não premeditado de que resulte dano
em veículo ou na sua carga e/ou lesões em pessoas e/ou animais, em que pelo
menos uma das partes está em movimento nas vias terrestres ou áreas abertas ao
público. Pode originar-se, terminar ou envolver veículo parcialmente na via pública.
Para o IPEA (2006) acidente é um evento independente do desejo do homem,
causado por uma força externa, alheia, que atua subitamente, de forma inesperada
e deixa ferimentos no corpo e na mente do acidentado. Já o DETRAN-PA (2010)
conceitua o acidente de trânsito como sendo todo evento com dano que envolve um
veículo, a via, o homem ou animais e que, para caracterizar-se, tem a necessidade
da presença de pelo menos dois desses fatores.
Na trilha desse entendimento, Ferraz et al (2012) considera como acidente de
trânsito um evento envolvendo um ou mais veículos, motorizados ou não, em
movimento por uma via, que provoca ferimentos em pessoas e/ou danos em
veículos e/ou em outros elementos (postes, edificações, sinais de trânsito, etc).
Numa ampliação desse entendimento, também deveria ser considerado como
acidente de trânsito a queda de uma pessoa no interior de um veículo de transporte
coletivo, fato esse que atualmente está fora desse conceito.
2.1.1 Classificações dos tipos de acidentes
O DNIT (2009) considera que, se na sequência de eventos da qual ocorreu
um acidente de trânsito, o veículo, que depois de projetado para fora da área da via
destinada ao trânsito, venha a capotar, tombar ou mesmo colidir com qualquer
objeto, pessoa ou animal, o acidente deve ser tipificado como saída de pista. No
entanto, se o veículo, antes de ser projetado para fora da referida área, tiver colidido
com, por exemplo, uma mureta, o acidente deve ser tipificado como colisão com
objeto fixo.
A importância da classificação dos tipos de acidente de trânsito está no fato
de possibilitar a identificação das prováveis causas para implantação de medidas
19
preventivas. É plenamente admitido que um mesmo acidente apresente mais de
uma forma de possibilidade classificatória dado ao contexto em que o fato ocorreu. A
classificação colocada a seguir é baseada no Anuário estatístico das rodovias
federais (DNIT, 2009).
• Choque com objeto fixo - colisão de veículo motorizado com objeto
estacionário ou fixo (exceto veículo estacionado), tais como: poste, meio-fio,
mureta, barranco etc., presente na área da via destinada ao trânsito de
veículos;
• Capotagem – ocorrência que se caracteriza pelo fato do veículo girar sobre si
até ficar de rodas para cima, ou mesmo de lado, ou voltar a ficar sobre as
próprias rodas;
• Atropelamento – colisão de veículo motorizado com pessoa a pé ou
conduzindo animal ou veículo não motorizado, na área da via destinada ao
trânsito de veículos;
• Atropelamento de animal – colisão de veículo motorizado com animal solto na
área de influência da rodovia;
• Choque com veiculo estacionado – colisão de veículo motorizado com outro
veículo motorizado estacionado na área da via destinada ao trânsito de
veículos (usualmente, pista de rolamento e acostamento);
• Colisão traseira – colisão de veículo motorizado com outro veículo motorizado
que trafegue à sua frente, quando o impacto se dá com a parte traseira do
veículo;
• Abalroamento no mesmo sentido – colisão de veículo motorizado com outro
veículo motorizado que trafegue no mesmo sentido, quando o impacto se dá
entre as laterais dos veículos envolvidos;
20
• Colisão frontal – colisão de veículo motorizado com outro veículo motorizado
que trafegue em sentido contrário, quando o impacto se dá com a parte frontal
de ambos os veículos;
• Abalroamento em sentido oposto – colisão de veículo motorizado com outro
veículo motorizado que trafegue em sentido contrário, quando o impacto se
dá entre as laterais dos veículos envolvidos;
• Abalroamento transversal – colisão de veículo motorizado com outro veículo
motorizado que trafegue em sentido perpendicular (usualmente em
cruzamento de fluxos), quando o impacto se dá com a parte da frente de um
com a lateral do outro;
• Tombamento – ocorrência que se caracteriza pelo fato do veículo motorizado
tombar sem ter girado sobre si, ficando, usualmente, de lado;
• Saída de pista – ocorrência que se caracteriza pelo fato do veículo motorizado
projetar-se para fora da área destinada ao tráfego de veículos, sem que tenha
colidido, tombado ou capotado dentro da referida área;
• Outros tipos – outras situações não enquadráveis dentre as demais classes
descritas;
• Atropelamento e fuga – colisão de veículo motorizado com pessoa a pé ou
conduzindo animal ou veículo não motorizado, da qual o motorista do veículo
motorizado tenha escapado furtivamente do local da ocorrência;
• Queda de veículo – ocorrência em que uma das vítimas (condutor ou
passageiro) tenha caído do veículo em movimento, na área da via destinada
ao trânsito de veículos.
21
A Tabela 1 demonstra o tipo de acidente em que estiveram envolvidas 31.624
ocorrências do fenômeno, em Belém-PA, no período de 2007 a 2009.
Tabela 1 - Tipos de acidentes de trânsito no Município de Belém de 2007 a 2009.
TIPO DE ACIDENTES 2007 % 2008 % 2009 %
Abalroamento 124 1,2 225 2,2 310 2,79
Atropelamento 840 8,1 788 7,7 733 6,60
Capotamento 21 0,2 27 0,3 25 0,23
Choque objeto fixo 242 2,3 189 1,9 165 1,49
Colisão bicicleta 806 7,8 632 6,2 530 4,77
Colisão veículo 7.964 77,3 8.078 79,2 8.982 80,85
Queda de motocicleta 124 1,2 98 1,0 124 1,12
Queda de ônibus 155 1,5 133 1,3 195 1,76
Não informado 8 0,1 15 0,1 18 0,16
Outros 25 0,2 20 0,2 27 0,24
TOTAL 10.310 100 10.205 100 11.109 100
Observa-se, através da Tabela, que nesse período houve um declínio no
percentual de colisão de veículos. Enquanto que, os abalroamentos, apresentaram
um pequeno aumento devido aos constantes engarrafamentos e a diminuição das
distâncias entre veículos o que propicia este tipo de acidente. Os demais tipos de
acidentes apresentam aumentos e declínios ao longo do período analisado
(DETRAN/PA, 2010).
O conhecimento do tipo de acidente proporciona a possibilidade de se estudar
a causa. O conhecimento da causa possibilita a implementação de medidas mais
eficazes de segurança viária. Rozestraten (1988) considera que, a partir daquilo que
restou do acidente deve-se reconstruir o que, como e onde aconteceu, e daí deduzir
quais foram as causas principais e quem foi o responsável. Isso se discute quando a
investigação parte de alguma coisa palpável ou pelo menos visível. No entanto,
quando se quer saber o que de fato aconteceu, recorre-se geralmente a
testemunhas. Nessa situação ele faz a seguinte ponderação:
Fonte: DETRAN/PA, 2010.
22
Há duas observações importantes: (1) o acidente acontece numa fração de segundo e (2) as testemunhas não estavam lá para observar o acidente: viram-no casualmente e são influenciáveis por tudo que se falou, publicou e se interpretou depois. (...) todos nós temos a tendência de procurar o culpado de um acidente. Quanto mais grave o acidente tanto maior nossa tendência de acusar alguém (ROZESTRATEN,1988, p.77).
Com relação à gravidade dos acidentes o DNIT (2009) reconhece três
categorias:
• Acidente com morto - é o evento no qual tenha ocorrido, pelo menos, uma
morte, independentemente da quantidade de pessoas e de veículos
envolvidos;
• Acidente com ferido - é o evento no qual tenha ocorrido, pelo menos, um
ferido (lesões leves ou graves);
• Acidente sem vítima - é o evento do qual todas as pessoas envolvidas tenham
saído com ausência de lesões (ilesas).
Desta forma, considerando os tipos de acidentes e a gravidade de cada um
pode-se inferir que nem todas as ocorrências de acidente de trânsito chegam a ser
registradas, como, por exemplo, pequenas batidas ou aqueles que não causam
vítimas. Assim sendo, os 10.506 acidente de trânsito registrados em Belém no ano
de 2010, representam os casos que chegaram ao conhecimento dos órgãos
gestores do trânsito (DETRAN/PA, 2010).
Com relação ao estado físico das vítimas a ABNT (NBR 10697/1989)
apresenta a seguinte classificação:
• Fatal – quando a vítima falecer em razão dos ferimentos sofridos no local do
acidente, ou depois de socorrido no período até a conclusão do boletim de
ocorrência;
23
• Grave – quando a vítima sofrer lesões graves que exigem tratamento médico
mais prolongado;
• Leve – quando a vítima sofrer ferimentos leves, em geral superficiais, que não
exigem tratamento médico prolongado;
• Ileso – quando a vítima não sofrer qualquer tipo de ferimento aparente, nem
apresentar sintomas ou queixas de lesões internas.
Com relação à morte da vítima, será atribuída como causa o acidente de
trânsito, se ocorrer o óbito no período de até 30 dias após o acidente em decorrência
das lesões sofridas; conforme determina a Convenção Sobre Trânsito Viário de
Viena de 1968, da qual o Brasil é signatário desde 1981 (Decreto nº 86.714/81). No
tocante ao estado físico da vítima, relacionado a lesão corporal culposa – grave,
leve, é importante saber que se trata de um crime de trânsito de menor potencial
ofensivo, que depende de representação do ofendido ou de seu representante legal
para que se busque reparação judicial.
2.1.2 Causas dos acidentes
O significado do termo causa, remete a uma série de acontecimentos
pretéritos que deram origem a um fato. Raramente os acidentes de trânsito
acontecem motivados por uma única causa. Em geral existe uma convergência de
fatores, sendo possível identificar, um ou mais fatores que contribuíram ou
determinaram a ocorrência do sinistro, de maneira direta ou indireta. Neves (2013)
considera que:
Enquanto as autoridades culpam a irresponsabilidade, a imperícia, a negligencia, a imprudência dos motoristas... Parecem esquecer-se do aumento desmesurado da frota, da precariedade das nossas vias e estradas e da falta de uma sinalização eficiente e de uma fiscalização moralizadora (NEVES, 2013, p.36)
Rozestraten (1988) diz que, todo acidente de trânsito tem uma causa material
ou psíquica, resultado de uma cadeia causal de fatores: humanos, do veículo e do
24
ambiente. Por esse entendimento, a causa do acidente de trânsito pode ter origem
numa disfunção do sistema homem-via-veículo que, em circunstâncias normais,
funciona sem problemas. A esse respeito faz o seguinte comentário:
A explicação científica não pode aceitar o destino, a vontade de Deus ou forças ocultas como causas de um acidente. Portanto, a base (...) é a existência de uma explicação real, algo concreto no ambiente, no veículo ou no homem que os causou. (...) no simples dirigir um carro há uma enorme quantidade de fatores a serem considerados. No carro temos a gasolina, o duto da gasolina, o carburador e dezenas de outras peças que podem apresentar defeitos. No ambiente há outra série de fatores, não somente da via com o asfalto esburacado, ou com um semáforo desregulado, mas toda quantidade de carros em volta do seu que podem provocar acidentes. Além disso, a quantidade de fatores que envolvem o próprio indivíduo: seus olhos, seus ouvidos, sua capacidade de atenção, de discriminação, de previsão e de decisão. É praticamente impossível dizer quantos fatores estão funcionando e integrando quando se está guiando um carro. Como resultado do mau funcionamento de um ou alguns desses fatores os acidentes acontecem (ROZESTRATEN, 1988, p, 91).
Fell apud ROZESTRATEN, 1988. p, 92, defende a Teoria Causal para a
ocorrência de acidentes de trânsito. Para esse teórico existe uma cadeia causal de
fatores humanos, do veículo e do ambiente que contribuem para a ocorrência de
acidentes, da seguinte forma: existe uma causa inicial, cujo efeito se transforma em
outra causa da qual resultará outro efeito que irá se transformar em nova causa de
modo a formar uma cadeia de causas e efeitos até resultar na ocorrência do
acidente.
Para exemplificar a Teoria Causal toma-se como exemplo uma briga de casal
momentos antes da saída para o trabalho, o veículo não estava com as revisões
atualizadas e estava chovendo.
Primeiramente, vejamos a cadeia causal humana: causa inicial, um homem
briga com a sua mulher antes de sair para o trabalho, em razão da briga sai tarde
para o trabalho, saindo tarde para o trabalho dirige agressivamente, a velocidade
alta demais para as condições da via não permite que o motorista compreenda
imediatamente o perigo de um veículo lento à sua frente perto de uma curva,
resultando em acidente.
Com base nesse exemplo, a teoria de Fell (1976) considera que, a discussão
do homem com a mulher foi uma causa, que teve como efeito o homem sair tarde
para o trabalho. O fato de o homem ter saído tarde para o trabalho passou a ser
25
uma causa, que teve como efeito dirigir agressivamente. O dirigir agressivamente se
transformou em causa que teve como efeito a velocidade alta demais para as
condições da via. A velocidade alta demais para as condições da via teve como
efeito a não percepção pelo motorista do perigo de um veículo lento à frente perto de
uma curva, causando como resultado a ocorrência do acidente.
Para compreensão da cadeia causal do veículo, o exemplo explica da
seguinte forma: causa inicial, a falta de revisão do veículo, tendo como efeito o
desconhecimento por parte do motorista sobre o fato dos freios estarem gastos, os
freios gastos fez com que a distância de frenagem aumentasse resultando em
acidente. Assim, para Teoria Causal a causa inicial foi a falta de revisão, que teve
como efeito o desconhecimento, por parte do motorista, sobre as condições do freio,
os freios gastos tiveram como efeito o aumento da distância para frenagem
resultando na ocorrência do acidente.
Seguindo com o mesmo exemplo para explicar a cadeia causal do ambiente.
Causa inicial, a condição do tempo, chovia, tendo como efeito provocado pela chuva
a estrada molhada, com a estrada molhada há diminuição do coeficiente de fricção
sobre a estrada resultando em acidente. Desta maneira, a chuva foi a causa inicial
que teve como efeito a estrada molhada, a estrada molhada transformou-se em
causa cujo efeito foi a diminuição do coeficiente de fricção sobre a estrada cujo
efeito foi o acidente.
Essa teoria sobre prováveis efeitos de prováveis causas mostra que o
acidente de trânsito pode ocorrer pela soma das causas originadas na cadeia causal
humana, mais a cadeia causal do veículo, mais a cadeia causal do ambiente. Assim
como, pode ocorrer motivada por uma única causa, que mesmo assim, salvo os
fenômenos da natureza, guardará relação com fatores humanos. Afinal, quem
projetou o carro ou construiu a estrada foi o próprio homem.
De maneira subjetiva, os fatores humanos refletem aspectos ligados à
formação insatisfatória dos envolvidos, relacionadas com a imperícia, inabilitação,
inexperiência entre outras, ou às suas condições físicas / psicológicas
desfavoráveis, como: o cansaço, sonolência, estresse, agressividade, euforia,
pressa, desatenção etc. Fatores que potencializam o cometimento de erros no
trânsito por parte dos seus usuários.
De maneira objetiva os fatores humanos estão relacionados com ações
arriscadas do indivíduo no trânsito, quer na condição de condutor de veículo que
26
pode se envolver em um acidente, quer na condição de pedestre arriscando-se a ser
atropelado. Estes comportamentos indevidos acabam, isolados ou juntamente com
outros fatores, induzindo à ocorrência do acidente.
Vasconcelos (2005) considera que, existe divergência entre os técnicos e
especialistas a respeito da importância relativa das várias causas dos acidentes de
trânsito. Porém, há consenso sobre o fato dos acidentes raramente terem uma única
causa e o paradigma vigente apontar para o fator humano como sendo o maior
responsável pelos acidentes.
Dentre os fatores considerados desencadeadores dos acidentes, mencionam-
se como os mais importantes: o ambiente inadequado de circulação, tanto em
relação aos veículos quanto a pedestres e ciclistas; o uso de álcool ou de outras
drogas por interferirem nos reflexos dos condutores e, até mesmo, dos outros
usuários da via; a velocidade excessiva, em razão de a energia cinética aumentar
exponencialmente com a velocidade; as condições da pista e da sinalização estão
por traz dos grandes acidentes; por último, o estado de manutenção dos veículos,
principalmente com relação aos freios e suspensão (VASCONCELOS, 2005).
Ferraz et. al., (2012) acrescenta: o cansaço e sonolência, por reduzirem a
capacidade física e mental dos condutores, e assim, interferirem na resposta a
situação de risco; a conduta perigosa, que consiste em dirigir sem respeitar as leis
de trânsito e o bom senso; a falta de habilidade, ocasionada pela ausência de
treinamento, inexperiência e/ou incapacidade por doenças, idade avançada, etc.;
desvio de atenção, como procurar/pegar objetos no chão do carro, bolsa, etc.; não
ver e não ser visto, fato que pode estar associado a deficiência visual, condições
ambientais, etc.; propaganda comercial na lateral da pista que pode desviar a
atenção dos condutores; dentre outros fatores que exercem influência sobre aqueles
que estão expostos ao trânsito.
A Tabela 2 mostra que, em Belém- PA, de acordo com o DETRAN/PA (2010),
as principais causas dos 5.024 acidentes de trânsito ocorridos de 2007 a 2009,
estão relacionadas com: perder o controle do veículo; manobra irregular; desrespeito
a preferencial; contra mão; desviar de um veículo; embriaguês alcoólica; excesso de
velocidade; atravessar na pista sem atenção; avançar de sinal; falta de atenção e
frear bruscamente.
27
Tabela 2 - Principais causas de Acidentes de Trânsito registrados no município de Belém de 2007 a 2009.
CAUSAS DE ACIDENTES 2007 % 2008 % 2009 %
Manobra irregular 195 13,90 352 22,68 576 27,84
Falta de atenção 83 5,92 111 7,15 295 14,26
Desrespeito a preferencial 117 8,34 161 10,37 182 8,80
Perdeu o controle 108 7,70 105 6,77 142 6,86
Avanço de sinal 134 9,55 110 7,09 114 5,51
Excesso de velocidade - - - - 103 4,98
Embriaguês alcoólica 103 7,34 137 8,83 90 4,35
Desviar de um veículo 109 7,77 88 5,67 90 4,35
Atravessar na pista sem atenção
126 8,98 105 6,77 90 4,35
Contra mão 80 5,70 - - - -
Frear bruscamente - - 75 4,83 - -
Outras 348 24,80 308 19,85 387 18,70
TOTAL 1.403 100 1.552 100 2.069 100
Calil et. al., (2009) considera que o panorama de acidentalidade deve servir
de orientação para medidas preventivas e educacionais úteis para prevenção de
acidentes. Analisando a Tabela 2, pode-se observar a expressiva participação do
fator humano dando causa aos acidentes de trânsito. A manobra irregular e o
avanço do sinal vermelho despontam entre as principais causas dos acidentes.
De todas as causas apontadas, a manobra irregular teve um aumento de
195% em 2009, em relação a 2007, passando de 195 para 576 casos. Esse
crescimento põe em xeque a maneira com que os condutores estão sendo
preparados para tirarem a habilitação. Além de que, de acordo com Vasconcelos
(2005), há uma tendência das pessoas acharem que uma vez obtida à carteira de
habilitação, o seu processo de aprendizado está terminado.
Fonte: DETRAN/PA, 2010.
28
2.1.3 Mortalidade e morbidade causadas por acidentes de trânsito
Ferraz et. al., (2012) considera que o cenário de tragédia no trânsito irá piorar
cada vez mais, se não forem implantadas e colocadas em prática políticas
adequadas. A avaliação do impacto causado pela mortalidade e morbidade dos
acidentes de trânsito é feita através de dois indicadores: I - Disabilly-adjusted life
year – DALY, que corresponde a uma escala de saúde composta pela combinação
dos anos perdidos com a morte prematura e o número de anos vividos com
sequelas graves; II - Global Burden Disease – GBD, que é uma estimativa regional e
global ampla da mortalidade e da incapacidade provocada por 107 doenças e por
dez fatores de risco.
Para esses indicadores, o acidente de trânsito, em 1990, era classificado
como a 9º causa mortis, representando 2,6% do total de mortes no mundo. No
entanto, se os índices de mortalidade no trânsito continuarem no patamar de
evolução que se encontram, a previsão que fazem é de que, em 2020 os acidentes
de trânsito ocuparão a 3º posição, representando 5,1% do total de mortes no mundo.
No Brasil, no ano de 2010, ocorreram 40.989 óbitos motivados por acidentes
de trânsito, 66,6% das vítimas, a saber, 27.298, foram pedestres, ciclistas e/ou
motociclistas. A tendência nacional da última década está marcando uma evolução
extremamente diferencial: significativas quedas na mortalidade de pedestres;
manutenção das taxas de ocupantes de automóveis; leves incrementos nas mortes
de ciclistas e violentos aumentos na letalidade de motociclistas (WAISELFISZ,
2012).
Em Belém, também em 2010, foram contabilizados 131 óbitos em virtude de
acidentes de trânsito (DETRAN/PA 2010). Houve um aumento em relação a 2009,
que registrou 108 mortes, e queda em relação a 2007 e 2008 que registraram 142 e
147 óbitos, respectivamente. Outro fato relevante refere-se à queda no percentual
de acidentes com automóveis, contudo os valores absolutos continuam elevados, ao
apresentar percentuais em crescimento de acidentes envolvendo motocicletas e
microônibus. Acrescenta-se ainda, uma peculiaridade da cidade de Belém um
pequeno aumento no percentual de acidentes envolvendo viaturas policiais.
Além das mortes, os acidentes de trânsito causam morbidade, ou seja, são
produtores de deficiências em virtude das lesões provocadas naqueles que
sobrevivem. Mesmo que os dados do Censo 2010 do IBGE não apontar as causas
29
da deficiência, o que dificulta saber quantas deficiências adquiridas foram motivadas
por acidentes, pode-se considerar as indenizações por invalidez permanente pagas
pelo seguro DPVAT para demonstrar que os acidentes de trânsito estão
aumentando o número de deficientes no Brasil.
A Tabela 3 mostra um crescimento percentual das indenizações pagas pelo
seguro DPVAT em 2010 e 2011 revelando que, em 2011 o crescimento no
pagamento das indenizações por invalidez permanente foi maior que a registrada
em 2010. Revela, também, que, as indenizações pagas pelo seguro em 2011
registraram um crescimento de 45% em face de 2010.
Tabela 3 – Indenização pagas pelo seguro DPVAT em decorrência de invalidez permanente nos anos de 2010 e 2011.
Fonte: Seguradora Lider DPVAT Período: janeiro a dezembro/2011.
Essas informações revelam que os acidentes de trânsito são produtores de
lesões que causam invalidez permanente, dessa maneira, aumentando os índices
de portadores de deficiência. Comparando esses dados com as estatísticas que
mostram a faixa etária em que mais ocorre acidentes, percebe-se que um importante
grupo de indivíduos jovens adquire deficiência física, e por esta razão saem do
mercado de trabalho em plana capacidade produtiva.
Esse fato resulta em ônus para a sociedade em virtude dos custos com
internações hospitalares, tratamento e reabilitação, inclusive custos previdenciários.
Soma-se a isso, o forte impacto na família que muitas vezes se desestrutura em face
da nova realidade.
Os Gráficos 1 e 2 são resultado do estudo realizado pela FEBRABAN (2006)
sobre a população com deficiência no Brasil, cuja amostra utilizada foi de 1.200
deficiente. Através desses gráficos observa-se a distribuição por tipo e as causas
das deficiências.
30
Gráfico 1 - Distribuição por tipo de deficiência (%).
Fonte: FEBRABAN, 2006.
Gráfico 2 - Causas de deficiência física
Fonte: FEBRABAN, 2006.
Os dados apresentados mostram que, dos 1.200 indivíduos participantes da
pesquisa portadores de deficiência, 342, ou seja, 27,1% são portadores de
deficiência física. Quando investigado as causas que deram origem a deficiência o
resultado mostra que 313, ou seja, 25,9% tornaram-se deficientes em consequência
de acidente de trânsito.
Os acidentes de trânsito dão causa a um número preocupante de
deficiências física adquiridas. Consideram-se deficiência adquirida, aquelas
31
adquiridas ao longo da vida. Ou seja, o indivíduo não nasceu deficiente, passou a
ser deficiente devido a uma causa externa, fazendo parte de uma estatística que
afeta não só o vitimado, mas também, toda a sua família trazendo consequências
que vão além dos danos materiais e ambientais causado pelo acidente que o
vitimou.
Independente da culpa pelo acidente percebe-se, pelas estatísticas, as
consequências desse fenômeno em todo mundo. Vitimados e vitimizados padecem
em virtude das sequelas físicas ou psicológicas deixadas pelas lesões corporais que
foram produzidas pelos acidentes. Os custos ambientais e materiais podem ser
mensurados e demonstrados através dos números. No entanto, a perda de vidas ou
de qualidade de vida não pode ser mensurada pelo quantum indenizatório, pois não
há dinheiro que pague a vida ou a saúde de um indivíduo.
2.1.4 O enfrentamento do problema pelo Estado
A investigação do fenômeno mostra que os acidentes de trânsito representam
um significativo peso econômico e social arcado por toda sociedade. Os números
das estatísticas oficiais apontam que os acidentes são responsáveis, dentre as
causas externas, pelo maior número de internações, representando altos custos
hospitalares, perdas materiais e custos previdenciários. Além desses custos que
podem ser representados estatisticamente, existe um ônus invisível, que não pode
ser mensurado através dos números: o sofrimento das vítimas e de seus familiares.
A mortalidade e morbidade do fenômeno afeta tanto os países pobres quanto
os países ricos, deixando rastro de dor, sofrimento, sequelas e mortes. Além do
mencionado custo previdenciário, existem custos ambientais, que, também, afetam
toda a sociedade. Fato que motivou a Assembléia Geral da Organização das
Nações Unidas - ONU, a proclamar oficialmente o período de 2011 a 2020 como a
Década Mundial de Ações de Segurança no Trânsito.
Proclama el período 2011-2020 “Decenio de Accion para la Seguridad Vial”, com el objetivo de estabilizar y después reducir las cifras previstas de victimas mortales em accidentes de tránsito em todo el mundo aumentando las actividades em los planos nacional, regional y mundial. (Assembléia General 24 de febrero de 2010. A/64/L.44/Rev. 1º)
32
O Estado brasileiro é signatário desse pacto mundial que tem como objetivo
reduzir em 50% o número de mortes no trânsito até 2020. Nessa empreitada
desenvolve as políticas públicas com base no Plano Nacional de Ações pela
Segurança no Trânsito 2011-2020. Esse plano está estruturado em cinco pilares, a
saber:
• Gestão da Segurança no Trânsito;
• Infraestrutura Viária Adequada;
• Segurança Veicular;
• Comportamento/Segurança do Usuário;
• Atendimento Pré/Hospitalar/Pós.
Concentrando as informações no foco da pesquisa, destaca-se: Gestão da
Segurança no Trânsito e Atendimento Pré/Hospitalar/Pós. Na gestão, destaca-se: I
– o Sistema Integrado de Informações de Trânsito; e, II - o Observatório Nacional de
Trânsito.
I - O Sistema Integrado de Informações de Trânsito tem como objetivos:
• Integrar os sistemas de informações de trânsito, saúde e segurança pública
através de um sistema de informação nacional com módulos específicos para
registro da ocorrência, internações hospitalares, mortes, invalidez e
afastamento do trabalho e exame médico legal;
• Fortalecer, modernizar e consolidar a gestão do sistema de informação de
acidentes que permita o planejamento e o mapeamento detalhado dos pontos
de risco como instrumento de apoio às políticas de prevenção de acidentes;
• Gerar informações integradas e importantes para a escolha de soluções que
visem a melhoria nas condições de segurança viária aumentando a
confiabilidade dos dados e análises e apoiando a tomada de decisões.
33
II – o Observatório Nacional de Trânsito tem como objetivos:
• Produzir análise sobre situação, tendências e cenários sobre acidentes de
trânsito e fatores de risco/proteção, com informações oriundas do sistema
integrado de informações alimentadas pelas áreas de trânsito, segurança
pública, saúde e previdência;
• Identificar os principais problemas relacionados à segurança no trânsito;
• Desenvolver programas de estudos e investigações sobre segurança viária,
violência e prevenção de acidentes e lesões mortes no trânsito;
• Fazer revisão de políticas e experiências exitosas de promoção da segurança
no trânsito;
• Propor recomendações de intervenções aos órgãos envolvidos com a saúde e
segurança no trânsito;
• Monitorar e acompanhar as ações do plano da Década 2011-2020.
Com relação ao Atendimento Pré/Hospitalar/Pós as políticas estão balizadas nos
seguintes objetivos:
• Implementação da Vigilância de Lesões, Mortes, condicionantes e
determinantes dos acidentes de trânsito – Produção Qualificação da
Informação; Prevenção e Promoção da Saúde e Paz no trânsito – Ampliação
e consolidação do Projeto Vida no Trânsito;
• Implementação da Rede de Atenção às Urgências (RAU) com priorização das
vítimas do trânsito (ênfase em motociclistas) – Rede Saúde Toda Hora;
34
• Ampliação e consolidação do atendimento de reabilitação das vítimas em
articulação com o componente de Atenção à Saúde do Plano Nacional para
as Pessoas com Deficiência;
• Ampliação da atenção psicossocial das vítimas do trânsito em conformidade
com a Rede de Cuidados em Saúde Mental, Álcool, Crack e outras Drogas.
Essas ações, acima mencionadas, complementam as políticas públicas que
já vinham sendo desenvolvidas anteriormente, a saber:
• Política Nacional de Redução da Morbimortalidade por Acidentes e Violências
– Portaria MS/GM nº. 737 de 16 de maio de 2001;
• Projeto de Redução da Morbimortalidade por Acidentes de Trânsito:
Mobilizando a Sociedade e Promovendo a Saúde – Portaria MS nº. 344 de
19/02/2002;
• Política Nacional de Promoção da Saúde – Portaria MS/GM nº. 687 de
30/03/2006, publicada no DOU / Seção 1 nº. 63 de 31/03/2006.
Ante ao exposto, percebe-se que existe a implementação de políticas públicas
para o enfrentamento desse fenômeno desde antes da promulgação da década de
segurança viária, proclamada pela ONU. Desta forma, o Estado brasileiro procura
materializar ações que tenham como resultado a garantia de um trânsito seguro para
que a liberdade de circulação não seja vetor de tantas mortes nas estradas.
2.2 Lesão corporal e suas consequências
A Constituição Federal - CF (art. 5º) protege a vida humana, ainda quando em
desenvolvimento no útero materno. Do direito à vida decorrem todos os demais
direitos, portanto, nessa perspectiva o corpo humano, em sua integralidade física e
mental, é a matéria protetora da vida. Para proteger o corpo e a mente, a legislação
tutela a integridade física e mental; com isso, o Estado quer evitar a prática de atos
35
capazes de causar lesão corporal que ponham em risco a vida ou resultem em
sequelas.
Os acidentes de trânsito são produtores de lesões corporais que podem
deixar sequelas irreversíveis, afetando a vítima, a família e, de certo modo, toda a
sociedade em virtude dos custos sociais resultantes da reparação do dano físico ou
mental causado pelo sinistro. Para compreender a importância de se estudar a lesão
corporal e suas consequências são imprescindíveis que se estabeleça inicialmente o
aspecto conceitual.
A lesão corporal consiste em dano ocasionado por alguém à integridade de
outra pessoa. Croce (2004) conceitua a lesão corporal como todo e qualquer dano
ocasionado à normalidade do corpo humano, quer do ponto de vista anatômico, quer
do fisiológico ou mental. Alcântara (1982) considera que as lesões corporais podem
atingir o corpo, a mente e alterar o funcionamento perfeito da saúde da pessoa.
Almeida (1998) ao analisar o âmbito da matéria disse:
Desde que a violência dolosa ou culposa (seja de que natureza for – mecânica ou física, química ou biológica, e até mesmo psíquica) ofenda a integridade corporal ou a saúde de outrem, configura-se lesão corporal (...) a ofensa a integridade corporal objetiva-se pelo dano anatômico (...) a ofensa a saúde se expressa mediante perturbações funcionais na sensibilidade geral ou específica, na motricidade, nas funções vegetativas (...) existe lesão mesmo que o dano funcional pareça não acompanha-se de alteração anatômica - como perturbações mentais provindas de traumas psíquicos ( p.221-222).
Entende-se como saúde, o mais completo bem-estar físico, mental e social,
não apenas a ausência de enfermidade (OMS, 2003). O Código Penal – CP (art.129)
tipifica as condutas humanas que se voltam contra a integridade corporal e a saúde,
reconhecendo cinco modalidades diferentes de lesão: lesão corporal leve, lesão
corporal grave, lesão corporal gravíssima, lesão corporal seguida de morte e lesão
corporal culposa.
As lesões corporais leves são representadas frequentemente por danos
superficiais, lesionando: a pele, tela subcutânea, músculos superficiais, vasos
arteriais e venosos de pequeno calibre, sendo, assim consideradas, as escoriações,
as equimoses, os hematomas, as feridas contusas, algumas entorses, os torcicolos
traumáticos, os edemas e a maioria das luxações. Constituem, pericialmente, cerca
de 80% das lesões corporais (CROCE, 2004).
36
Considera-se lesão corporal de natureza grave, quando dela resultar:
incapacidade para as ocupações habituais, por mais de 30 dias; perigo de vida,
debilidade permanente de membro, sentido ou função; ou, aceleração do parto (CP,
art.129, §1º). E, será considerada lesão corporal de natureza gravíssima, quando
dela resultar: incapacidade permanente para o trabalho, enfermidade incurável,
perda ou inutilização de membro, sentido ou função; deformidade permanente, ou
aborto (CP, art. 129, §2º).
Enquanto que, lesão corporal seguida de morte, será assim considerada,
quando a conduta que foi dirigida para produzir lesão corporal, tiver como resultado
das lesões a ocorrência da morte. Para que essa morte não seja tipificada como
homicídio, o texto legal diz que as circunstâncias devem evidenciar que aquele que
praticou a ação não quis o resultado nem assumiu o risco de produzi-lo (art. 129, §
3º, do CP).
A lesão corporal será considerada culposa quando a ofensa, física ou mental,
acontecer em razão de negligência, imprudência ou imperícia por parte de quem
praticou a ação, isto é, apesar do resultado a conduta não foi direcionada para
aquele resultado, nem mesmo se assumiu o risco de produzir o resultado lesivo
(DINIZ, 1998).
O Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transporte – DNIT
reconhece duas modalidades de leões: lesões leves e lesões graves (DNIT 2008).
Lesão leve é aquela que não apresenta risco de vida e se caracteriza por dores em
geral; lacerações leves, contusões e abrasões; queimaduras de 1° grau e as
pequenas de 2° e 3° graus. Enquanto que, lesão grav e é aquela que apresenta
risco de vida com sobrevivência provável e se caracteriza por grandes lacerações e
ou avulsões com hemorragias severas; queimaduras de 2° e 3° graus envolvendo
até 50% da superfície corporal.
A Tabela 4 mostra a existência de certa relação entre a gravidade da lesão e
o tipo de acidente de trânsito, conforme pesquisa realizada pelo DNIT (2009)
envolvendo 1.148 feridos.
37
Tabele 4 – Amostra das vítimas por tipo de acidente e gravidade das lesões.
Fonte: Pesquisa médico-hospitalar, DNIT, 2009.
Apesar das lesões leves predominarem, não se pode esquecer que, salvo as
lesões em órgãos vitais, a gravidade é mensurada levando em consideração a
extensão da área atingida. Por exemplo, as escoriações, muito comum nos
acidentes de moto, são consideradas lesões leves, porém, se atingirem grandes
áreas do corpo o sofrimento do paciente e o risco de infecções serão bem maiores
que uma fratura de um membro inferior, que é considerada uma lesão grave.
Por outro lado, as lesões tipificadas como grave, por sua própria natureza e
lesividade podem causar mortes e sequelas muitas vezes irreversíveis. No entanto,
os primeiros atendimentos, o transporte adequado, o atendimento em serviço de
saúde especializado e a sucessão de tratamento podem evitar ou minimizar suas
consequências.
2.2.1 Lesões mais frequentes e a tipificação como crime de trânsito
As pesquisas de Koizumi (1992), REDE SARAH (2009) e DNIT (2009)
mostram que as lesões mais frequentes, provocadas por acidentes de trânsito, são:
fraturas e luxações de membros e pelve; ferimentos de superfície externa; lesões
medulares; lesão cerebral; lesão ortopédica e lesão neurológica.
TIPO DE ACIDENTE GRAVIDADE DAS LESÕES
LESÕES LEVES LESÕES GRAVES TOTAL
Abalroamento lateral mesmo sentido 78 40 118
Abalroamento lateral sentidos opostos 56 37 93
Abalroamento transversal 75 49 124
Atropelamento 35 49 84
Atropelamento de animal 26 6 32
Atropelamento e fuga 2 12 14
Capotagem 40 11 51
Choque com objeto fixo 39 14 53
Choque com veículo estacionado 2 1 3
Colisão frontal 47 37 84
Colisão traseira 103 46 149
Saída de pista 178 70 248
Tombamento 26 19 45
Outros tipos 33 17 50
TOTAL 740 408 1.148
38
O Gráfico 3 a distribuição percentual das lesões em função das áreas do
corpo afetadas. A pesquisa realizada pelo DNIT (2009) envolveu 1.148 pessoas.
Gráfico 3 - Distribuição das lesões por área do corpo.
Fonte: Pesquisa médico-hospitalar/ DNIT, 2009.
Os traumatismos de cabeça e pescoço são considerados uma das formas
mais graves de lesões, em virtude de sua letalidade e sequelas, salvo raras
exceções, quando não mata deixa o acidentado com sequela motora, tais como,
paraplegia e tetraplegia, isto é, a sequela do traumatismo de cabeça e pescoço
geralmente conduz o acidentado para as estatísticas dos deficientes físicos. Esse
tipo de lesão tem maior incidência nos acidentes com moto ou bicicleta e nos
atropelamentos.
O Gráfico 4 mostra os tipos de lesões que foram causas de internações em
virtude de acidentes de trânsito. A pesquisa realizada pela Rede Sarah (2009)
envolvendo 799 internados vitimados pelo trânsito
17,40%
2222
39
Gráfico 4 - Distribuição dos pacientes vítimas de Acidentes de Trânsito por causa de internação.
O Gráfico demonstra o total predomínio das lesões medulares e lesões
cerebrais em virtude de traumatismos crânio-encefálico.
Os neurotraumas consubstanciam, portanto, o padrão das lesões verificadas
entre as vítimas desse tipo de acidente: somadas, as lesões medulares e as lesões
cerebrais foram responsáveis por 83% das internações registradas no período de
01/01/2009 a 30/06/2009 nos hospitais da Rede Sarah.
As lesões ortopédicas constituíram a terceira causa de internação mais
frequente, dentre os pacientes vítimas de acidentes de trânsito, concentrando-se a
maioria (73,0% dos casos) dessas lesões na região dos membros inferiores,
particularmente na perna. Vale destacar que a quase totalidade das lesões
neurológicas observadas nesse tipo de acidente referiram-se a lesões do plexo
braquial.
Diante dos resultados das pesquisas realizadas pode-se perceber que o
traumatismo da cabeça e do pescoço tem um resultado lesivo devastador, visto que
as sequelas resultantes, geralmente não tem reversão obrigando o vitimado a uma
mudança brusca em sua rotina, alguns, apesar de vivos, passam a ter uma vida
vegetativa sem nenhuma esperança de reversão do quadro. A esse respeito, Calil
et. al., (2009) considera que:
...não há dúvida em afirmar que as lesões na região da cabeça, denominadas traumatismo crânio-encefálico (TCE) ocupam o primeiro lugar em gravidade de lesão... O TCE em vítimas de acidente de transporte é a lesão isolada mais frequentemente encontrada em casos graves e fatais e aquela que mais traz
Fonte: REDE SARAH, 2009.
Lesão medular - 483
Lesão cerebral - 180
Lesão ortopédica - 116
Lesão neurológica - 20
40
sequelas, incapacidades e deficiências... (CALIL et. al., 2009, p. 126).
Esse é um dos motivos da lesão corporal ser tipificada como crime contra a
pessoa, sabendo que a tutela do Estado busca proteger a integridade física ou
fisiopsíquica da pessoa. Desta forma, pune-se o condutor do veículo por ofender, em
acidente de trânsito, culposamente, a integridade corporal ou a saúde da vítima.
Considera-se crime um fato humano que, propositada ou descuidadamente, lesa ou
expõe a perigo bens jurídicos considerados fundamentais para a existência da
coletividade e da paz social (CAPEZ, 2005).
Dependendo da manifestação da vontade de quem pratica, o crime pode ser
tipificado na modalidade dolosa ou culposa. Considera-se doloso quando se fizer
presente os elementos de ligação – consciência e vontade. Dolo é a vontade
consciente de concretizar determinado ato. De outra maneira, considera-se culposo
quando a conduta estiver diretamente ligada à inobservância do dever de cuidado,
manifestada pela negligência, imprudência ou imperícia. A respeito desse tema,
Rizzardo (1998) faz o seguinte comentário:
Há de se distinguir se o condutor procedeu com dolo ou culpa. As análises procedidas relativamente ao dolo direto, ao dolo eventual e à culpa estendem-se à prática de lesão corporal na direção de veículo. Imprescindível a configuração da culpa, resultante de imprudência, negligencia ou imperícia, para a tipificação. Se previsto o resultado, embora não pretendido, reconhece-se o dolo eventual, não incidindo na tipificação culposa. (RIZZARDO, 1998. p, 762).
O legislador ao tipificar os crimes de trânsito considerou que as vias são
espaços de convivência, utilizadas por diversos usuários, que a pé ou através de
outros modos de transporte, motorizados ou não, objetivam alcançar seus destinos.
Portanto, não estão ali para cometer crimes, e se acontecem não foi por vontade do
condutor. Por esse motivo, quando tipificou os crimes de trânsito, considerou que as
lesões corporais praticadas na direção de veículo automotor devem ser
consideradas lesão corporal culposa.
41
2.2.2 Consequência das lesões
Das lesões corporais provocadas pelos acidentes de trânsito podem resultar
sequelas, visíveis ou invisíveis. Entende-se por sequela o efeito de uma causa, a
alteração anatômica ou funcional permanente, motivada direta ou indiretamente por
doença ou acidente (Houaiss 2001). Essas sequelas podem interferir no retorno à
normalidade existente antes do sinistro. E, dependendo da gravidade da lesão e das
sequelas, pode nem existir a possibilidade de retorno. Calil et. al., (2009) dissertando
sobre o impacto dos ferimentos em virtude de lesões provocadas por acidentes de
trânsito, disse:
Elevado número de pacientes permanece, por semanas, meses ou até anos, em programas de reabilitação e fisioterapia, com perdas salariais e de emprego em decorrência desses eventos, mostrando a dimensão econômico-social do problema (CALIL et. al., 2009, p. 125).
Esse fato é preocupante, considerando o aumento dos acidentes que levam a
uma sequela motora, cuja consequência manifesta-se na forma de paraplegia e/ou
tetraplegia, principalmente afetando um grupo etário na idade produtiva. Esses
acidentes, segundo Mello e Laurenti (1997), representam importante carga social,
não só pelas perdas de vidas e pelas sequelas, mas também por onerarem a
sociedade com custos diretos e indiretos.
Quem sobreviveu a um acidente de trânsito e adquiriu uma deficiência física
vive um martírio diário. Para reconstruir a vida é preciso muito sacrifício,
principalmente se as consequências são para a vida toda. Quem se torna deficiente
tem todo um sofrimento psicológico a ser trabalhado. Por vezes sente-se culpado
pela sua sobrevivência, ou ainda, pela carga que acredita ter-se tornado para seus
familiares.
De acordo com o estudo sobre a população com deficiência no Brasil: fatos e
percepções, que envolveu 1.200 participantes (FEBRABAN, 2006), em razão das
lesões, os acidentes de trânsito deram causa a 34% das deficiências adquiridas, isto
é, da amostra pesquisada 408 acidentados adquiriram algum tipo de deficiência.
Desta forma, 25,9%, ou seja, 308 acidentados tornaram-se deficientes físico; 5%, ou
42
seja, 60 tornaram-se deficientes visual e, 3,4%, ou seja, 40 acidentados tornaram-se
deficientes auditivo.
Pires (2008) considera que anualmente são contabilizadas, no Brasil, mais de
100.000 pessoas que adquirem deficiências temporárias ou permanentes, motivadas
por acidentes de trânsito. Fato confirmado através das estatísticas da seguradora
que administra o seguro DPVAT, que mostra que é crescente o índice de pagamento
de indenizações por invalidez permanentes pagas em virtude de acidentes de
trânsito.
Há de se considerar também, que a faixa etária que mais se envolve em
acidentes afeta pessoas jovens, fato preocupante, pois, considera-se que o ingresso
pleno na força de trabalho se dê aos 20 anos de idade e o horizonte produtivo
presumido alcance até a idade de 64 anos. Desta maneira, as vítimas de acidente
de trânsito estão na faixa etária de pessoas economicamente ativa. Assim, o
acidente afeta a capacidade de auferir ganhos em função unicamente do próprio
trabalho.
Observando o Gráfico 5, também é fruto do estudo da FEBRABAN (2006),
mostra a posição que o indivíduo com deficiência física ocupa na família, na maioria
dos casos apresenta-se como chefe, isto é, o principal responsável financeiro da
família.
Gráfico 5 - Posição na Família (em %)
Fonte: FEBRABAN, 2006.
43
A deficiência física adquirida em consequência das lesões corporais
provocadas pelo acidente de trânsito é uma sequela visível. Em virtude das sequelas
ocorrem mudanças bruscas na vida pessoal, profissional e familiar dos vitimados,
ocasionando perdas de rendimentos futuros em virtude da perde da capacidade de
trabalho.
Pela estimativa do Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transporte -
DNIT (2008) em termos econômicos, os custos das lesões provocadas pelos
acidentes de trânsito são estimados em 1% do Produto Interno Bruto - PIB dos
países de baixa renda, 1,5% dos de média e 2% dos de alta renda.
Há de se considerar que não é somente o vitimado que sofre com a
deficiência adquirida. A partir do momento da constatação da deficiência, inicia-se
uma fase que provoca revolução e mudança no seio familiar, sendo que, em alguns
casos ocorre a desorganização e ruptura, e em outras pode haver reorganização,
união e fortalecimento (HADDAD et. al., 2007).
Outra consequência está relacionada com os traumas psíquicos,
considerados sequelas invisíveis. Conhecidos na ciência médica como Transtorno
do Estresse Pós-Traumático – TEPT. Almeida (1998) afirma que perturbações
mentais provindas de traumas psíquicos também podem ser consideradas lesões.
Evangelista e Menezes (2000) consideram que o dano psíquico existe quando o
evento desencadeante, no caso o acidente, gera efeitos traumatizantes na
organização psíquica ou no repertório de comportamentos da vítima.
No acidente de trânsito a reação ao estresse pode ser vivida como uma
experiência traumática. Há pessoas mais vulneráveis para viverem situações de
traumas do que outras. Para o IPEA (2006) os impactos do estresse pós-traumático
de um acidente na pessoa vitimada e nas suas relações familiares e sociais, embora
sejam de difícil quantificação, necessitam ser identificados e caracterizados, pois
evidenciam a amplitude da violência dos acidentes.
O TEPT é caracterizado por reações a um evento que causa estresse, que
seja ameaçador e/ou catastrófico, que traga sério dano a si ou a outros, com
impossibilidade de defesa, resultando em forte estresse e ocasionando sempre um
prejuízo nas atividades usuais da pessoa. Essa reação pode se apresentar na vítima
sobrevivente - vítima primária, ou em pessoas próximas de seu convívio,
profissionais que trabalham na ocorrência ou que presenciam essas situações, e
familiares - vítimas secundárias. (DSM-IV/1994 e CID 10/1998).
44
Os estudos sobre Sequelas Invisíveis dos Acidentes de Trânsito (HADDAD et.
al., 2007) diz que o TEPT é uma resposta, neuroquímica e neurofisiológica, do
cérebro ao perceber que está em perigo. Essa resposta fisiológica faz com que haja
liberação de hormônios e permita reação de sobrevivência. É uma resposta
extremamente adaptativa e adequada à situação.
Os acidentes de trânsito são acontecimentos traumáticos, há ameaça à vida;
confronto com o sofrimento ou com a morte de outros e responsabilidade pela causa
do sinistro. Assim, desencadeiam respostas de medo intenso ou culpa que podem
culminar em excitamento, experienciação, dissociação e hipervigilância.
Estima-se que 11,5% dos acidentados de trânsito desenvolvam TEPT
(NORRIS, 1992). Outro estudo realizado por Blanchard (1998) que investigou três
milhões de pessoas envolvidas em acidentes rodoviários, estimou que entre 8 e 40%
das vitimas terão transtorno de estresse pós-traumático no primeiro ano após o
acidente. Os estudos de Mayou, Bryant e Ehlers (2001) detectaram em vítimas de
acidentes de trânsito a ocorrência das seguintes perturbações: ansiedade fóbica a
viagens (52%); ansiedade generalizada (58%), transtorno de estresse pós-
traumático (50%) e depressão (39%). Ao discutir sobre o tema, Pires e Maia (2006)
disseram que:
A primeira queixa das pessoas depois de um acidente rodoviário é a dificuldade de concentração e memória, menor funcionamento intelectual, menor capacidade de diferenciar o que é ou não importante, de manter autocontrole, com lembranças recorrentes do acidente e, muitas vezes, sentimentos de culpa por causa do acidente, o que traz um custo laboral significativo, pois muitas delas ficam sem condições de trabalhar. Na prática, algumas pessoas passam a viver “embrulhadas no acidente rodoviário” (MAIA e PIRES 2006, p. 20).
Muitas dessas pessoas vão precisar de uma intervenção psicológica focada
em ajudá-las a dar sentido a suas vidas, buscando ressignificar o que a experiência
traumática lhes ensinou acerca da vida, bem como suporte social e oportunidades
para aprender a lidar com a situação. O que mostra que os acidentes de trânsito não
causa só feridas no corpo, as suas consequência podem destruir planos, inviabilizar
projetos, desestruturar famílias e literalmente acabar com a vida dos vitimados
sobreviventes.
45
Portanto, as consequências dos acidentes de trânsito podem afetar, não só a
capacidade de locomoção, mas também abalar o psicológico do vitimado. Essas
perturbações interferem na vida pessoal atrapalhando o convívio social, visto que,
profissionalmente afetam a capacidade laboral para o desempenho de atividades
que possam relembrar o ocorrido, e na família podem ocasionar desestruturação em
virtude das mudanças de humor do vitimado ou da situação financeira.
Há de se esclarecer que não existe um programa específico de atenção as
vítimas de acidentes de trânsito que apresentam sequelas visíveis ou invisíveis, o
que existe é a ampliação de programas já existentes para atender tal demanda. No
caso das deficiências existem políticas públicas de acesso à educação, inclusão
social, acessibilidade e atenção à saúde, constantes no Plano Nacional para
Pessoas com Deficiência. Já atenção psicossocial das vítimas do trânsito é feito
através Rede de Cuidados em Saúde Mental, Álcool, Crack e outras Drogas, as
chamadas Casa Mental.
2.3 O controle social do estado sobre o trânsito
A convivência em sociedade pressupõe um complexo de relações ensejadas
por interesses de toda ordem, e tem reflexo direto na vida das pessoas, de modo
que existe a necessidade de uma autoridade hierarquicamente superior que aponte
a direção do bem comum, esta autoridade é o Estado. Para compreender a
relevância da atuação do Estado como forma de controle social é imprescindível que
se estabeleça inicialmente, a distinção entre sociedade e Estado.
A sociedade é uma unidade orgânica interna que pressupõe a existência do
Estado. Ribeiro Jr (1995) considera que para haver sociedade, é preciso que haja,
numa pluralidade de homens, uma união estável, procedente da inteligência e da
vontade de cada um dos componentes do corpo social, e que tenha por objetivo a
consecução de um bem comum de todos. E, além disso, que haja uma autoridade
que conjugue e coordene os esforços individuais, convergindo à atuação de todos,
para que possam atingir, sem divergência, a finalidade comum, que é o próprio
existir da sociedade.
Enquanto que o Estado é a organização política de uma coletividade social,
com a finalidade de salvaguardar a paz, protegendo a vida dos indivíduos que a ele
pertençam. O Estado constitui-se quando os homens renunciam a fazer uso da força
46
individual, que produz situações de anarquia, para se entregarem a um poder
coletivo ao qual se reconhece o direito de impor as próprias ordens, recorrendo –
nos casos extremos – também a força. Ribeiro Jr (1995) ao analisar o âmbito da
matéria disse:
O Estado é uma criação necessária da exigência da coexistência e cooperação entre os homens, que não pode realizar-se, de modo satisfatório, se o grupo social não se organiza sob uma autoridade, reconhecida por todos e com força de impor-se. Esta autoridade dá ao grupo o ordenamento jurídico indispensável para realizar a convivência pacífica e a atuação dos fins coletivos, garantindo, ainda que coativamente, a observância daquele ordenamento (RIBEIRO JR 1995, p.113)
Para atingir sua finalidade, o Estado apresenta uma estrutura de poder com
setores mais próximos ou mais afastados do centro da decisão, de acordo com essa
estrutura, controla-se socialmente a conduta dos homens. O controle social é uma
forma de limitação da liberdade individual por intermédio de normas que expressam
padrões de comportamento. A eficácia específica da ordem de conduta jurídica
baseia-se na probabilidade segura de impor a observância das normas mediante um
procedimento de imposição, juridicamente organizado. A formalização do controle
social estampa-se na lei e o sistema de leis que regula a conduta humana chama-se
ordenamento jurídico.
Portanto, o Estado – no contexto de poder político de uma nação – é o
responsável pelas normas jurídicas que tem a função de garantir entre os homens
uma convivência ordenada de forma harmoniosa e segura. Por intermédio das leis,
protege bens jurídicos fundamentais, especificando exatamente o que é proibido e,
sanciona com penas as condutas que não são toleradas no convívio social.
Kelsen (1996) ensina que a ordem jurídica não é um sistema de normas
ordenadas no mesmo plano, situadas umas ao lado das outras. É uma construção
escalonada de diferentes camadas ou níveis. Desta maneira, existem hierarquias
entre as normas jurídicas, ou seja, um mapeamento formal das competências de
cada norma estabelecida de maneira que não exista conflito de competência.
A ordem de importância das normas pode ser percebida em forma de
pirâmide, que as classifica numa escala de valor, cuja norma de menor grau deve
obedecer as de grau maior, na seguinte estrutura: Constituição Federal; Lei
Complementar; Lei Ordinária; Lei Delegada; Decreto; e, Resoluções/Portarias. Desta
47
maneira, entende-se que norma jurídica é o gênero cuja espécie são as leis,
decretos, portarias e resoluções.
Figura 1 - Hierarquia das Leis.
Fonte: Hans Kelsen,1996.
No topo das normas jurídicas está a Constituição Federal – CF, também
chamada de lei suprema, carta magna. Contém um conjunto de normas e princípios
que tem por finalidade a estruturação do Estado, a organização de seus órgãos
supremos e a definição de suas competencias. Assim como, direitos e garantias
individuais para viabilizar o pleno exercício da cidadania e a prática responsável da
liberdade. Nos seus preceitos, indica como devem ser elaboradas as normas gerais,
que, com ela, não podem conflitar.
A Constituição Federal assegura que todos são iguais perante a lei (art. 5º),
sem distinção, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade. Dentre esses direitos fundamentais, o direito à liberdade e o direito à
vida estão intimamente ligados com a questão do trânsito.
Nessa perspectiva, pouco importa o tipo de via, o modo de transporte
terrestre utilizado, se automotor ou por propulsão humana, para caracterização de
trânsito. A mera movimentação, se acontecer como prevista no CTB, constitui
trânsito, independente da qualificação do local destinado ao deslocamento, e até por
mais remoto, íngremes e afastados que sejam os pontos onde se dê a utilização da
via. Apesar de simbolizar uma liberdade, a ninguém é facultado desrespeitar a
sinalização, e muito menos seguir na contramão da ordem estabelecida pelo Estado.
Nos termos do CTB (art. 1º § 1º) o trânsito é a circulação de pessoas,
veículos ou animais em vias, ou seja, é o exercício da liberdade de locomoção
48
prevista na Constituição Federal (art. 5º, XV). Por esta ótica, a liberdade de
circulação é uma garantia constitucional, assim sendo, é reconhecida como um
direito fundamental do indivíduo, que deve ser exercida sob a proteção do Estado
que tem o dever de garantir um trânsito seguro, conforme preconiza a Constituição
Federal (art. 6º e 144 da CF/88).
As garantias constitucionais asseguram ao cidadão a possibilidade de exigir
dos poderes públicos o respeito ao direito que instrumentalizam, nesse caso, a
segurança no trânsito. Desta forma, em virtude da liberdade de circulação ser uma
atividade cujo exercício expõe à constante risco a integridade física dos usuários da
vias, a propriedade e ao meio ambiente, se faz necessária a intervenção do Estado
para garantir o exercício de uma liberdade sem lesionar outros direitos. A esse
respeito Bonavides (2007) considera que:
As garantias constitucionais, em qualquer das acepções (...), legitimam sempre a ação do Estado, uma vez que sua presença ou intervenção se faz ora em defesa da Constituição como um todo, ora em prol da sustentação, integridade e observância dos direitos fundamentais (BONAVIDES, 2007. P. 534).
Assim compreendido, o trânsito seguro consiste em garantia constitucional,
que tem como finalidade assegurar o direito à vida e à incolumidade física de todos
os usuários das vias terrestres. Que mesmo sendo dever do Estado garantir tal
segurança, e direito do cidadão exigir tal proteção, a responsabilidade pelo trânsito
seguro é dever de todos, não podendo o autor do acidente se eximir de sua parcela
de culpa invocando a responsabilidade exclusiva do Estado.
A liberdade é considerada o valor supremo da sociedade, mas, o Estado,
para garantir a liberdade dos cidadãos deve possuir poder de coação em face
daquele que violar a lei previamente estabelecida. Que, em se tratando de trânsito
essa lei está esculpida no CTB. Delmanto (2010) ao tratar do tema liberdade fez o
seguinte comentário:
Na clássica lição de Montesquieu, “a liberdade é o direito de fazer tudo o que as leis permitem; se um cidadão pudesse fazer tudo o que elas proíbem, não teria mais liberdade, porque os outros também teriam tal poder” (Do Espírito das Leis, Livro XII, Das leis que formam a liberdade política na sua relação com o cidadão, Capítulo 2). Sobre outro enfoque, Montesquieu ressalta a necessidade da tutela da liberdade dos cidadãos perante o próprio Estado, característica dos Estados
49
Democráticos de Direito atuais, por meio dos chamados direitos fundamentais... (DELMANTO, 2010, p. 205).
A fronteira do pleno exercício de um direito situa-se no início de um próximo
direito, igualmente tutelado pelo Estado. Na iminência de um conflito de direitos, o
Estado realiza o controle social limitando a liberdade individual, porque a liberdade
de fazer ou não fazer e de que forma fazer determinada coisa, não pode causar
lesão a outros direitos fundamentais. Então, a liberdade de circular não pode impedir
o exercício do direito à vida.
O direito à vida é considerado o mais fundamental de todos os direitos, já que
se constitui em pré-requisito à existência e exercício de todos os demais direitos.
Sem vida perde-se a razão de ser dos outros direitos. A CF proclama, portanto, o
direito à vida, cabendo ao Estado assegurá-lo em sua dupla acepção, sendo a
primeira relacionada ao direito de continuar vivo (art. 5º) e a segunda de se ter vida
digna quanto à subsistência (art.1º). A esse respeito Silva (1999) considera que:
De nada adiantaria a Constituição assegurar outros direitos fundamentais, como a igualdade, a intimidade, a liberdade, o bem-estar, se não erigisse a vida humana num desses direitos. No conteúdo de seu conceito se envolvem o direito à dignidade humana, o direito a privacidade, o direito à integridade físico-corporal, o direito a integridade moral e, especialmente, o direito à existência (SILVA, 1999, p. 201).
Porém, as estatísticas mostram que o trânsito está cada vez mais violento,
diariamente centenas de vítimas perdem a vida ou a oportunidade de uma vida
digna, quando são compulsoriamente obrigados a substituir o caminhar com suas
próprias pernas por cadeiras de rodas e muletas. Diante de tal constatação, o
fenômeno trânsito não pode ser visto apenas como o exercício de liberdades
individuais. Deve-se considerar que na utilização de espaços coletivos os exercícios
das liberdades pressupõem resguardar a vida, a integridade física e moral do ser
humano, pois só assim há de se falar em dignidade da pessoa humana.
O CTB (art. 1, § 1º e 2º) preconiza que a circulação seja realizada em
condições seguras para todos os usuários da via, ratificando que tal fato é um direito
de todos e um dever do Estado que deve ser executado pelos órgãos do SNT. As
estatísticas oficiais mostram que, a falta de segurança nas vias propicia a ocorrência
de acidentes. Por seu turno, os acidentes podem por fim a existência da pessoa ou
50
ser causa de lesões incapacitantes que, pela própria condição de deficiência física e
precariedade dos espaços urbanos, em termos de acessibilidade, retiram do
indivíduo o direito a uma vida com dignidade, o que acaba afetando o seu bem-
estar.
Num Estado democrático de direito, a liberdade de circulação deve acontecer
em condições seguras de modo a preservar a vida e a integridade física de todos os
usuários da via, daí a importância do controle social realizado pelo Estado ao criar
um arcabouço de normas de circulação e condutas para o trânsito, que dentre suas
finalidades está à regulamentação do uso das vias terrestres, de modo a torná-la útil
e segura para utilização coletiva. Ao comentar sobre as liberdades e a existência de
normas Bobbio (2005) fez a seguinte consideração:
A nossa vida se desenvolve em um mundo de normas. Acreditamos ser livres, mas na realidade, estamos envolto em uma rede muito espessa de regras de conduta... o desenvolvimento da vida de um homem através da atividade educadora... se desenvolve guiada por regras... Bobbio (2005, p. 22).
Ante as lições de Norberto Bobbio (2005) percebe-se que as normas também
têm uma finalidade educadora, que também é uma finalidade social do Estado.
Desta forma, quando o Estado edita normas de conduta no trânsito está buscando
educar os usuários da via para que através de um comportamento adequado na
utilização do espaço coletivo de trânsito e circulação evite as ocorrências de
acidentes.
O Estado realiza seu papel social e intervencionista no trânsito através das
normas regulamentadoras, da fiscalização e da implementação de políticas públicas
de segurança viária. Assim, regulamenta o uso das vias, realiza o policiamento
ostensivo e a fiscalização do cumprimento das normas, assim como, promove ações
visando proteger os Direitos Humanos relacionados ao fenômeno trânsito, como, por
exemplo, as campanhas de educação para o trânsito.
Resta provado que, os acidentes de trânsito afetam os direitos fundamentais
quando impedem a continuidade da vida, quer no seu aspecto existencial causando
óbito, quer no aspecto da dignidade da pessoa humana, ao retirar o cidadão do
convívio social, em razão das dificuldades de locomoção ou impondo-lhe uma vida
vegetativa, subtraindo-lhe a oportunidade de uma vida saudável e produtiva.
51
Desta maneira, o Estado, sem impedir a liberdade de locomoção e a
crescente necessidade de deslocamento para as mais diversas atividades humanas,
intervém no exercício do direito fundamental de locomoção, exercendo o controle
social do trânsito através das normas gerais de circulação e conduta previstas no
CTB. Esse controle social realizado pelo Estado tem por finalidade evitar riscos
proibidos que coloque em perigo a vida humana.
2.3.1 Evolução histórica da atuação do Estado sobre o trânsito
Até o século XVII, a condução das pessoas nas cidades e para as cidades era
feita a pé, montado em animal ou através de carruagem. Com o período industrial
foram surgindo novos meios de locomoção; em 1839 surgiu a bicicleta, nos anos
que se seguiram veio a motocicleta, o trem, o carro, o ônibus (ARRUDA, 1996). Na
medida em que essas ditas melhorias iam sendo criadas, nasciam também,
problemas para a circulação, que envolvia esses meios de locomoção com eles
mesmos, e, entre eles e as pessoas que trafegavam a pé. Nesse sentido, Pires
(2008) faz o seguinte comentário:
A humanidade sempre teve necessidade de regulamentar os deslocamentos de pedestres e veículos. (...) com o crescimento das urbes e a construção das primeiras estradas, regras foram sendo estudadas e implantadas. Sempre se admitiu que, a semelhança da selva valeria as regras impostas pelo mais forte, secundada pela disposição de tirar ou levar vantagem tópica e momentânea. Assim, um homem a cavalo tinha prioridade sobre o pedestre, bem como um homem dirigindo uma carroça tinha prioridade sobre um homem a cavalo e, mais ainda, sobre o pedestre. Apesar disso, a sociedade sempre procurou defender os mais fracos, aplicando punições aos que desrespeitavam as regras (PIRES, 2008. P, 12).
A legislação referente ao trânsito no Brasil inicia-se esparsamente a partir de
1910, tendo como marco inicial o Decreto Federal nº 8.324 de 27 de outubro daquele
ano, o qual aprovou o Regulamento para o serviço subvencionado de transporte por
automóveis. Dentre os seus preceitos, determinava que os condutores, na época
chamados de motoneiros, se mantivessem constantemente senhores da velocidade
do veículo, devendo diminuir a marcha ou mesmo parar o movimento todas as vezes
que o automóvel pudesse ser causa de acidente.
52
Em 24 de julho de 1928 o Decreto nº 18.323, aprovou o Regulamento para
circulação internacional de automóveis no território brasileiro. Atribuiu à União,
Estados ou Municípios a competência para fiscalizar, sinalizar e tomar as medidas
para garantir a segurança, na medida do domínio da estrada. Um dado curioso a
respeito desse Decreto é que ele permitia a qualquer pessoa, de notória idoneidade,
autenticar multas de infrações de trânsito e levá-las ao conhecimento de quem de
direito, cabendo a esta pessoa, metade do valor da multa arrecadada.
Em 28 de janeiro de 1941 foi criado o primeiro Código Nacional de Trânsito,
que surgiu através do Decreto-Lei nº 2.994, entretanto, teve curta duração, pois oito
meses depois foi revogado pelo Decreto-Lei 3.651, de 25 de setembro de 1941 que
deferia expressamente aos Estados a atribuição de regulamentar o trânsito de
veículos automotores, devendo, contudo, a legislação adaptar-se a Lei Nacional. Em
dezembro do mesmo ano, foram criados o Conselho Nacional de Trânsito –
CONTRAN e o Departamento Nacional de Estradas de Rodagem – DNER.
Em 21 de setembro de 1966, através do Decreto-Lei nº 5.108 foi instituido o
segundo Código Nacional de Trânsito, estabelecendo que os Estados poderiam
adotar normas pertinentes as peculiaridades locais, complementares ou supletivas
da legislação federal. No ano de 1967 foi feita uma modificação no Código Nacional
de Trânsito e em seguida foi criado o Departamento Nacional de Trânsito –
DENATRAN.
De um modo geral, pode-se dizer que cabe à União legislar sobre os assuntos
nacionais de trânsito e transporte; ao Estado-membro compete regular e prover os
aspectos regionais e a circulação intermunicipal em seu território, e ao Município
cabe a ordenação do trânsito urbano, que é de seu interesse local previsto
constitucionalmente (CF, art. 30, I e V).
2.3.2 O código de trânsito vigente
Em vista da expansão do uso do veículo automotor, o Estado tem
demonstrado, desde as primeiras legislações de trânsito, a preocupação em conter a
acidentalidade no trânsito. O vigente CTB partiu dos estudos feitos por uma
comissão que se formou por determinação do Ministro da Justiça, em 1991, com a
finalidade de elaborar um anteprojeto para revisão do CTB de 1966.
53
O que diferencia o CTB vigente dos outros que o antecederam, é o fato de não
apenas codificar posturas e penalidades, mas, também, de orientar as ações do
Sistema Nacional de Trânsito – SNT. Estruturalmente, contém 20 capítulos, 321
artigos e dois anexos, posteriormente foram acrescentados outros anexos que
modificaram a redação de determinados artigos.
Por ser um conjunto de normas codificadas para regulação unitária do direito
do trânsito, o CTB, têm como eixo principal, a segurança dos usuários; a qualidade
de gestão do trânsito e a relação entre os órgão públicos e a sociedade. Nesse eixo,
existem três pilares, conhecidos como os três Es, do inglês: Education (Educação),
Engineering (Engenharia), Enforcement (Fiscalização).
As diretrizes do pilar Education (Educação) leva em considerando que a culpa
pela causa dos acidentes de trânsito são muitas vezes atribuídas aos próprios
usuários da via quando praticam ações arriscadas no trânsito, tanto quando estão na
condição de condutor cujo desrespeito à sinalização e às normas de trânsito podem
resultar em acidentes, quanto na condição de pedestres pondo-se em risco de
atropelamento quando atravessam fora da faixa.
Desta maneira, através da educação para o trânsito, busca-se aumentar o
nível de educação e respeito ao próximo para que, nos momentos cruciais, onde há
maior incidência de acidentes, como: diante de vias preferenciais, aproximação dos
cruzamentos, vias de trânsito livre, ultrapassagens e aproximação de pedestres, o
usuário tenha consciência do perigo de modo a agir com atenção, quer na condição
de condutor ou pedestre, sem jamais subestimar o risco da atividade e nem supor
que os outros se cuidem.
A educação para o trânsito é um valioso instrumento para redução de
acidentes se estiver aliada com as soluçõs propostas pela engenharia de tráfego e a
intensificação da fiscalização. Por esta razão, dentre as várias funções do Sistema
Nacional de Trânsitoc – SNT, destaca-se a educação, com realização de
campanhas dirigidas à educação, à redução de acidentes, a observância da
sinalização, à diminuição da velocidade, além de outras, sempre envolvendo o
trânsito.
O segundo pilar Engineering (Engenharia), refere-se à engenharia de tráfego
que é a área do conhecimento que tem como funções: planejamento, projeto
geométrico e operação de tráfego em vias, suas redes, terminais e relações com
outros modos de transporte. Tem como objetivo assegurar o movimento seguro,
54
eficiente e conveniente de pessoas e bens, trata de problemas que não dependem
apenas de fatores físicos, mas frequentemente incluem o comportamento humano
do motorista e do pedestre e suas inter-relações com a complexidade do ambiente.
As propostas de soluções para o trânsito, apresentadas pela engenharia de
tráfego, levam em consideração o intervalo de tempo entre o estímulo sofrido pelos
usuários da via e as reações correspondentes. Este intervalo de tempo considerado
é composto de quatro parcelas e conhecido como PIEV, do inglês: Perception
(percepção), Identification ou intellection (identificação), Emotion ou judgment
(decisão), Volition ou reaction (ação).
A percepção é um processo que se dá através dos sentidos, especialmente a
visão. É importante destacar que é a visão periférica a primeira a se perder com o
avanço da idade, particularmente a partir dos sessenta anos. A visão periférica não
permite distinguir formas, mas é sensível a movimentos e ao brilho. Por isso, a sua
obstrução diminui a capacidade do ser humano de avaliar a velocidade em que se
encontra e de manter a direção do movimento.
Lynch (1999) considera que o espaço e a paisagem urbana afetam as
pessoas, uma vez que esses mesmos espaços são percebidos, observados e
transitados por elas. No espaço urbano o motorista está exposto a vários estímulos:
i) estímulos do ambiente geral, como: o céu, as casas, as árvores; ii) os estímulos do
ambiente do trânsito, como por exemplo: o trânsito que está a sua frente, ao nosso
lado, atrás. Esses estímulos são transformados em impulsos nervosos que, por sua
vez, agem sobre as diversas partes do cérebro provocando a percepção.
A identificação é o reconhecimento do estímulo por parte do usuário que o
sofre. O processo de identificação é extremamente dependente da intimidade do
usuário com os estímulos a que ele está exposto. Assim, é fundamental a
padronização da sinalização, a adoção de soluções geométricas iguais para
problemas iguais, a minimização da interferência de quaisquer fontes externas aos
sistemas de tráfego etc.
A tomada de decisão por parte do usuário do sistema de tráfego raramente é
um processo racional. Dirigir um veículo é um processo em que o motorista está
submetido a um estado permanente de tensão. Frequentemente ele é chamado a
tomar decisões de complexidade próxima dos limites individuais a partir dos quais
erros podem ser cometidos, tais decisões são difíceis e a ponderação das
55
alternativas possíveis consome um tempo tal que pode comprometer o tempo
necessário à concretização da ação.
Velocidades menores permitem maior margem de segurança para a tomada
de decisões. Por outro lado, o tempo necessário à tomada de decisão depende
também das condições individuais de motivação do motorista e das situações de
risco. Quando os estímulos são previsíveis e a viagem é monótona, o nível de
atenção do motorista cai, cedendo lugar ao que se pode chamar de
automonitoramento da atividade de dirigir, nestas circunstâncias, quando ocorre um
estímulo não previsível, o risco de acidentes é maior.
A ação é o intervalo de tempo que vai desde a tomada da decisão até o início
de sua execução por parte do usuário, é a implementação da ação decidida no
processo anterior. A reação de cada indivíduo é um processo que depende da sua
capacidade de coordenação motora. Por exemplo, o tempo entre o motorista tomar a
decisão de parar o veículo e o instante em que o pedal do freio é acionado.
O terceiro pilar Enforcement (Fiscalização) é o elemento catalisador de todas
as ações propostas. Faria e Braga (1999) consideram que todas as regras de
circulação, estacionamento e parada contidas no CTB devem ser fiscalizadas; no
entanto, para reduzir os atropelamentos, algumas merecem ser fiscalizadas com
mais intensidade: estacionamento sobre calçadas, avanço de sinais, excesso de
velocidade e consumo de bebida alcoólica.
Nesses termos, pode-se inferir que qualquer solução proposta para reduzir a
acidentalidade do trânsito deve ser pensada de maneira interdisciplinar. De forma
que, o resultado positivo da proposta de solução de Engenharia só terá resultado se
acompanhada da Educação e da Fiscalização, assim como, as campanhas de
Educação para o trânsito dependem da Fiscalização e da Engenharia para surtirem
resultado.
Desta maneira, o código de trânsito vigente define atribuições das diversas
autoridades e órgãos ligados ao trânsito, fornece diretrizes para a Engenharia de
tráfego e estabelece normas de conduta, infrações e penalidades para os diversos
usuários das vias de circulação. Logo no seu primeiro artigo define que o trânsito em
condições seguras é um direito de todos e um dever dos órgão que compõem o
SNT, que devem ter como prioridade de suas ações: a vida, a saúde e o meio
ambiente.
56
Para Rizzardo (2003) o CTB representa um forte apelo à consciência da
responsabilidade dos condutores de veiculos, ao mesmo tempo em que trouxe
sanções implacáveis aos infratores, implantou uma nova filosofia no trato do trânsito,
considerando-o não apenas incubência, mas missão de luta em prol de uma grande
causa por todos os brasileiros – conter o crescente indice de acidentalidade no
trânsito.
O CTB guarda estreita vinculação com os preceitos estabelecidos na CF. No
entanto, a sua efetividade para redimir o trânsito brasileiro de ostentar níveis
estatísticos elevados de acidentes, de transgressão das normas de circulação e de
inobservância de cuidados básicos com a segurança pessoal e veicular depende do
comprometimento de todos.
2.3.3 Controle Administrativo e Judicial do trânsito
Na disposição dos assuntos contidos no CTB, percebe-se que o Estado
exerce o controle social do trânsito sob duas formas: administrativa e judicial. O
controle social de forma administrativa, é feito através dos órgão do SNT, esses
órgãos têm por finalidade o exercício das atividades de planejamento,
administração, normatização, pesquisa, registro e licenciamento de veículos,
formação, habilitação e reciclagem de condutores, educação, engenharia, operação
do sistema viário, policiamento, fiscalização, julgamento de infrações e de recursos e
aplicação de penalidades. Compõem o SNT os seguintes órgãos e entidades:
• Conselho Nacional de Trânsito – CONTRAN;
• Departamento Nacional de Trânsito – DENATRAN;
• Departamento de Trânsito dos Estados e do Distrito Federal – DETRAN;
• Conselho de Trânsito – Estados/Distrito Federal;
• Polícia Rodoviária Federal – PRF;
• Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transporte – DNIT;
• Junta Administrativa de Recursos de Infração – JARI;
• Órgãos Municipais;
• Polícia Militar;
• Departamento de Estradas e Rodagens – DER.
57
A Composição do SNT revela a indicação de todos os órgãos que exercem
controle sobre o trânsito, a começar com o de maior importância, até aqueles que
se encarregam de setores particularizados. São órgãos administrativos, instituídos
para a aplicação do CTN, o que se realiza através de Resoluções, Circulares e,
inclusive, de ofícios circulares.
O CONTRAN é órgão máximo normativo e consultivo. Coordena o Sistema
objetivando a integração de suas atividades. Expede normas e determinações,
dirigidas geralmente a outros órgãos, aos quais competem atividades executórias.
Todas as resoluções, portarias e circulares que o CONTRAN emite têm força de lei
(art. 12 do CTB), obrigando não apenas as partes diretamente atingidas, mas a
sociedade em geral.
O DENATRAN é órgão máximo executivo do trânsito. Tem a função de
administrar e colocar em prática a legislação em todo o território nacional. É o órgão
executor da política nacional do trânsito e das decisões do CONTRAN. Através das
atribuições conferidas ao DENATRAN, a União conduz e orienta políticas públicas
de promoção de direitos humanos e da cidadania, por meio da pacificação e do
combate à violência do trânsito.
DETRAN é o órgão Estadual executivo do trânsito. Além das competências
elencadas no CTB (art. 22) o DETRAN tem competência para gerenciar ações que
possibilitem um trânsito seguro, direcionando suas atividades ao desenvolvimento
de trabalhos de alta relevância e qualificação, visando, primordialmente, à
segurança, defesa da vida, preservação da saúde, do meio-ambiente e cidadania,
oferecendo a sociedade o controle do registro de veículos e de habilitação de
condutores, fiscalização e a educação de trânsito.
Nos termos do CTB, compete aos órgãos executivos de trânsito municipais:
planejar, projetar, regulamentar e operar o trânsito de veículos, de pedestres e de
animais, bem como promover o desenvolvimento da circulação e da segurança de
ciclistas. Além de ter competência para, implementar, manter e operar o sistema de
sinalização, os dispositivos e os equipamentos de controle viário, coletar dados
estatísticos e elaborar estudos sobre acidentes de trânsito e suas causas, executar
a fiscalização do trânsito, autuar e aplicar as medidas administrativas cabíveis por
infração de circulação, estacionamento e parada, dentre outras funções.
Com tantos meios de transportes e pedestres utilizando o mesmo espaço de
circulação, o acidente de trânsito passa a ser um risco da atividade de mobilidade
58
urbana. O esforço das autoridades é manter este risco em níveis aceitável e
diminuir a gravidade das lesões capazes de oferecer risco à vida das vítimas ou
resultem em sequelas incapacitantes.
Os artigos do CTB traduzem um dever geral de atenção que o condutor deve
ter na direção de veículo automotor (art. 28), em nome da segurança do trânsito e da
proteção da integridade física das pessoas, estabelece normas de cuidado a que se
submeterão todos os usuários das vias terrestres (arts. 26 a 55), sob pena de, com a
violação, criarem-se riscos proibidos, que, quando violados podem resultar no
cometimento de crimes culposos, como no caso de lesão corporal (art. 303).
Na visão do legislador as vias terrestres são locais de convivência de veículos
e pedestres, que mesmo tendo interesses diferentes não estão ali com a finalidade
de praticar delito, e quando acontecem é em razão da efetiva inobservância dos
deveres de cautela previstos no CTB. Razão pela qual, justifica a tipificação na
forma culposa.
Na ocorrência de crime de trânsito o controle social do Estado é feito através
de procedimento judicial. Dependendo da natureza e resultado do delito o caso pode
ser de competência do Juizado Especial ou do Tribunal de Justiça. Os Juizados
Especiais Criminais – JEC estaduais são órgãos do Poder Judiciário, criados com o
intuito de agilizar os procedimentos penais de sua competência, à luz dos princípios
da oralidade, informalidade, economia processual e celeridade, objetivando, sempre
que possível, a reparação dos danos sofridos pela vítima e a aplicação de pena não
privativa de liberdade (Lei n.º 9.099/95).
A finalidade dos JECs é a resolução das infrações de menor potencial
ofensivo, principalmente pela via conciliatória e pela aplicação de penas restritivas
de direitos ou de multa. A Lei prevê que a condenação privativa de liberdade inferior
a 04 (quatro) anos de prisão, pode ser convertida em pena restritiva de direitos.
Hipótese na qual está enquadrada a lesão corporal culposa quando praticada na
direção de veículo automotor cuja pena prevista é de detenção, de seis meses a
dois anos, podendo chegar ao tempo máximo de três anos nos casos de agravantes
legalmente previstos (art. 303 do CTB).
No JEC o Ministério Público, independente da vontade da vítima, pode
apresentar uma proposta de aplicação imediata de multa ou pena restritiva de
direitos, ao invés de prosseguir o processo para que seja aplicada a pena prevista
59
no delito, uma vez que um dos objetivos primordiais da Lei nº 9.099/95 é evitar a
aplicação de pena privativa de liberdade.
Ao invés de ficar encarcerado, o condenado paga por seu crime efetuando
doação de bens ou dinheiro, através da prestação de serviços gratuitos à
comunidade ou outra pena restritiva de direitos. Esta possibilidade de resolver
através da apresentação de uma proposta alternativa de pena, somente poderá ser
concretizada desde que observadas algumas condições pré-estabelecidas na lei,
tais como, o infrator não ter praticado crime com violência ou grave ameaça contra a
pessoa, nem ser reincidente (art. 43 do CP).
Em conformidade com Código Penal (art. 43) as penas restritivas de direito
que podem ser cumpridas como formas alternativas, são: prestação pecuniária,
perda de bens e valores, prestação de serviço à comunidade ou a entidades
públicas, interdição temporária de direitos e, limitação de fim de semana.
Na execução alternativa, o apenado é chamado de beneficiário – que, como o
próprio nome diz, é aquele que recebeu ou usufrui benefício ou vantagem. A ideia é
exatamente essa. O beneficiário recebe a alternativa de cumprir a sua pena sem que
seja recolhido a um estabelecimento prisional. Em certos casos acontecem reuniões
mensais, com lições de cidadania e palestras de profissionais de diversas áreas, no
sentido de despertar a consciência do erro e se eliminar a possibilidade de
novamente infringir a lei.
Considera-se que as penas e medidas alternativas ofereçam vantagens para:
o poder judiciário; as instituições que acolhem os beneficiários; para o próprio
beneficiário desta modalidade de cumprimento de pena e, para a sociedade.
Para o poder judiciário:
• Desafogam as vias tradicionais já esgotadas;
• Torna-se um agente punitivo mais justo e eficaz, visando ao fim da
impunidade para delitos de pequeno e médio potencial ofensivo;
• Desenvolve o seu papel de agente social;
• Tem baixo custo de execução.
60
Para a Instituição:
• Torna-se parceira do Poder Judiciário;
• É valorizada como agente de responsabilidade social;
• Recebe colaboradores, sem ônus.
Para o Beneficiário:
• Promove a sua ressocialização, resgatando a sua cidadania através de
seu trabalho e habilidades, mostra-se útil à sociedade;
• Não fica preso, permanecendo no meio social e familiar, não abandona
suas responsabilidades, bem como seu emprego, contribuindo para a
redução do índice populacional nos presídios do Estado;
• Tem a possibilidade de contratação pela instituição, ao final do tempo de
cumprimento (na modalidade prestação de serviço).
Para a Sociedade:
• Conquistas sociais resultantes do conjunto de ações que envolvem os
diversos segmentos da sociedade;
• Tem um indivíduo reinserido, livre do isolamento que estimula a
marginalização;
• Possibilita o indivíduo refletir sobre sua conduta e alterar sua visão de
mundo e valores que norteiam seu agir na sociedade;
É importante saber que o CTB, quando define os delitos, apresenta algumas
situações em que a pena alternativa aparece não em caráter substitutivo, mas
cumulativo com a privativa de liberdade. É o caso da lesão corporal culposa, onde
se tem além da pena privativa, que pode ser de detenção de seis meses a dois
anos, a pena restritiva de direito na modalidade de suspensão ou proibição de obter
a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor (art. 303).
As medidas alternativas de cumprimento de penas são consideradas uma
forma de garantir a reinserção social do condenado, humanizando o cumprimento da
pena e atribuindo a ela uma finalidade social. A meta prioritária é a ressocialização
61
daqueles que transgrediram as regras sociais, mas não representam um perigo para
a sociedade, e, por isso podem ser beneficiados com a conversão da pena aplicada.
Em Belém, a execução das penas alternativas é cumprida na Vara de Execução de
Penas e Medidas Alternativas – VEPMA.
Diferente dos Juizados Especiais, o Tribunal de Justiça do Estado julga os
casos de maior complexidade, com penas previstas superiores a dois anos, e que
atentaram contra a vida, por exemplo, o homicídio culposo no trânsito, em que a
conduta do causador do sinistro pode determinar que este desejou o resultado lesivo
ou assumiu o risco de produzi-lo, conduta tipificada como dolo eventual. Nesses
casos, a autoridade policial procederá ao inquérito para apurar as causas, a autoria
e a materialidade do delito.
Existem crimes de ação penal pública e crimes de ação penal privada. Se a
tipificação indicar que o crime é de ação penal pública o resultado do inquérito será
enviado para o Ministério Público que decidirá sobre a acusação ou arquivamento do
inquérito, conforme a suficiência ou não das provas obtidas. A esse respeito Bonfim
(2007) ensina:
Cabe exclusivamente ao Ministério Público o exercício da ação penal pública, por meio do oferecimento de denuncia, devendo, também, atuar durante todo o curso do processo até a sentença final, desenvolvendo a acusação, velando pela legalidade do procedimento e interpondo os recursos cabíveis. (BONFIM, 2007.p, 41).
No entanto, se o crime for de ação penal privada, cabe ao ofendido, ou quem
a ele represente demonstrar o interesse de ver processado e julgado o culpado pelo
crime de trânsito. Iniciando a ação penal por meio da queixa-crime que deverá ser
oferecida por advogado. Nesse caso, o Ministério Público atuará durante todo o
processo, velando pela legalidade.
Após a queixa-crime o processo é entregue ao Tribunal para julgamento.
Nessa fase, cabe ao Ministério Público sustentar a acusação em juízo e fiscalizar a
legalidade do respectivo procedimento. O Tribunal indica com a maior brevidade a
data, hora e local para a audiência e notifica do despacho da audiência: o Ministério
Público, o acusado e/ou seu advogado.
A audiência é una, ou seja, o ato processual é único, porém divide-se em três
fases – conhecimento, instrução e julgamento. A fase de instrução de uma audiência
62
corresponde ao momento destinado à apresentação das provas. A fase seguinte
corresponde ao julgamento, culminando com a sentença.
Conceitualmente, sentença é a decisão judicial que põe fim ao processo. É a
resposta do Estado-Juiz decidindo o destino do acusado, inocentando ou
condenando. Há um princípio no direito penal que diz que não é o tamanho da pena
que inibe a criminalidade, o que inibe é a certeza da punição. Delmanto (2010)
considera a pena como instrumento excepcional e subsidiário de controle social,
visando proteger bens considerados essenciais à vida harmônica em sociedade.
Há de se considerar que, via de regra, a lesão corporal culposa prevista no
CTB (art. 303) é infração penal de menor potencial ofensivo, cabendo perfeitamente
a adoção de penas alternativas. No entanto, o próprio CTB (art. 291) diz que,
existem circunstâncias capazes de mudar o conceito de menor potencial ofensivo e
transformar em crime de ação penal pública, quando o crime for praticado nas
seguintes circunstâncias:
• Sob a influência de álcool ou qualquer outra substância psicoativa que
determine dependência;
• Participando, em via pública, de corrida, disputa ou competição
automobilística, de exibição ou demonstração de perícia em manobra de
veículo automotor, não autorizada pela autoridade competente;
• Transitando em velocidade superior à máxima permitida para a via em 50
km/h (cinquenta quilômetros por hora).
O consumo do álcool ou outras substâncias análogas potencializam a
gravidade dos acidentes. Diversas pesquisas mostram que o álcool é um forte
depressor do Sistema Nervoso Central. Quem bebe e pega o volante tem os reflexos
prejudicados, se acha mais corajoso, porém, reage de forma lenta e perde a noção
de distância. Dados estatísticos da Policia Rodoviária Federal, apontam que o
consumo de bebidas alcoólicas é uma das principais causas de acidentes
automobilísticos no País.
Razão determinante para aprovação da Lei 12.760/12, conhecida como lei
seca, cujo objetivo é diminuir os acidentes de trânsito causados por motoristas
63
embriagados. Com esta lei o Brasil passou a ser um dos 12 países do mundo com
mais rigor quando se trata da associação álcool e volante, segundo pesquisa
publicada pela International Center for Alcohol Policies – EUA. Os outros 11 países
são: Armênia, Azerbaijão, Colômbia, Croácia, República Tcheca, Etiópia, Hungria,
Nepal, Panamá, Romênia e Eslováquia.
Portanto, o Estado exerce o controle social sobre o trânsito, limitando
liberdades com o intuito de preservar o bem maior, que é a vida. Dita normas de
conduta no trânsito para que todos passam usufruir o direito de liberdade de
circulação no território nacional, de tal forma que o exercício desse direito não
ofenda outros direitos, nem a integridade física dos usuários das vias.
64
3 FUNDAMENTOS METODOLÓGICOS
Neste capítulo são apresentados os fundamentos metodológicos que
nortearam o processo de elaboração da pesquisa, incluindo, o tipo de pesquisa, os
procedimentos metodológicos e o método de análise. Oliva (2012) considera que a
investigação descortina uma realidade e traz muitos desafios, questionamentos e
perplexidade. Assim sendo, é necessário a realização de um planejamento
metodológico para conduzir os rumos da investigação.
3.1 O tipo de pesquisa
O estudo em foco é resultado de uma pesquisa exploratória com abordagem
crítico-dialética, em razão de ter possibilitado a definição de objetivos, aproximação
do objeto de análise e permitir que as compreensões do fenômeno obtidas através
das discussões teóricas sofressem intervenção crítica na realidade observada
possibilitando maior compreensão sobre o objeto de estudo.
De acordo com Cervo e Bervian (1996), os estudos exploratórios são
utilizados quando se deseja definir objetivos na busca de maiores informações sobre
um determinado assunto, possibilitando uma maior familiarização com um
determinado fenômeno, bem como a obtenção de uma nova percepção, além de
realizar descrições precisas da situação e das relações existentes entre seus
elementos.
A razão de realizar um estudo exploratório reside no fato de existir carência
de material de pesquisas com temática que trata dos impactos que os acidentes de
trânsito causam na vida dos vitimados e a resistência dos próprios entrevistados em
reviver, através dos relatos a tragédia sofrida. Desta maneira, a pesquisa
exploratória possibilitou aproximação com o objeto de análise permitindo conhecer
aspectos objetivos, subjetivos e ideológicos que interferem, pela dificuldade de
serem mensurados, mas que, precisam ser evidenciados porque trazem
consequências para vida pessoal, profissional e familiar da vítima.
Por seu turno, a abordagem crítico-dialética, traz em seu bojo, segundo Oliva
(2003, p. 16) “não apenas a compreensão do fenômeno que interfere em
determinada realidade, mas, primordialmente, a possibilidade de intervenção crítica
na realidade posta”. Na visão de Gamboa (1992, p.97):
65
As pesquisas crítico-dialética questionam fundamentalmente a visão estática da realidade (...) uma postura marcadamente crítica, expressa a pretensão de desvendar, mais que o conflito das interpretações, o conflito dos interesses. Essas pesquisas manifestam um interesse transformador das situações e fenômenos estudados, resgatando sua dimensão sempre histórica e desvendando suas possibilidades de mudanças.
O que justifica a utilização da pesquisa crítico-dialética, nesta dissertação é a
possibilidade de intervir criticamente na realidade observada em campo levando em
consideração as discussões presentes nas categorias de análises para se propor
possibilidades de mudanças. Desta maneira, o resultado desta pesquisa sobre os
impactos que os acidentes causam na vida dos vitimados face ao referencial teórico
adotado permite que sejam apresentadas sugestões importantes para a construção
e materialização de políticas públicas sobre a temática em questão.
3.2 Procedimentos metodológicos
Por se tratar de pesquisa com seres humanos foi necessário certificado ético,
o qual foi emitido pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade da Amazônia –
UNAMA. Após aprovação do projeto de pesquisa, conforme protocolo n°
0757.1512.2.00005173, foi iniciada a pesquisa de campo realizada nos meses de
outubro, novembro e dezembro de 2012, considerando o lapso temporal de 2007,
2008 e 2009.
A pesquisa investigou os impactos da lesão corporal provocada por acidente
de trânsito na vida dos vitimados, buscando saber a maneira que o Estado realiza o
controle social da questão. Haja vista que, a lesão corporal culposa é considerada
crime de trânsito, enquadrando-se no conceito de crime de menor potencial
ofensivo, fato que possibilita o benefício de penas alternativas.
O local escolhido para a realização da pesquisa foi a Vara de Execuções de
Penas e Medidas Alternativas – VEPMA, sendo necessária Autorização para
Realização de Pesquisa, a qual foi emitida pelo Juiz titular da Vara, em 28 de agosto
de 2012. O que motivou a escolha desse espaço jurídico-social foi a sua
competência, na região metropolitana de Belém/PA para aplicar, fiscalizar e
controlar o cumprimento das penas e medidas alternativas, o que demonstra o
controle social do Estado. E, também, a possibilidade de capturar o fenômeno
estudado num estágio posterior ao acidente onde subsistem as sequelas.
66
De posse do Certificado Ético emitido pelo CEP da Unama e da Autorização
para Pesquisa emitida pela VEPMA, foi iniciada a fase exploratória da pesquisa
através da análise documental realizada em 112 processos, com o intuito de
perceber algumas especificidades e, a partir disso, ter a possibilidade de construir
procedimentos para a investigação e definir os rumos teóricos adotado pela
pesquisa. A respeito da análise documental Oliva (2012, p.133) considera que:
Esta técnica permite, além da captura dos discursos, a caracterização dos atendidos, ultrapassando a dimensão usual e oficial do sexo, idade, bairro. Com esta compreensão (...) pode-se construir outros indicadores, que possam retratar os escaninhos do fenômeno.
Os sujeitos dessa pesquisa são os vitimados em acidentes de trânsito,
identificados através da pesquisa exploratória realizada em 112 processos
correspondentes aos anos de 2007, 2008 e 2009. Desta maneira, a amostragem
caracterizada como não probabilística envolveu 112 casos. Marconi (1999)
considera que esse tipo de amostragem seleciona um subgrupo de população, que à
luz de informações disponíveis passa a ser considerado como representativo de
toda população. Os dados da pesquisa foram coletados utilizando-se como
instrumentos a análise documental e a entrevista semi-estruturada.
A análise documental realizadas nos processos que se encontram na
secretaria da VEPMA possibilitou a localização e contato dos sujeitos da pesquisa,
assim como, à obtenção de dados socioeconômicos do vitimado e das
circunstancias do acidente. De posse dos endereços e telefones iniciou-se os
primeiros contatos esclarecendo sobre os objetivos da pesquisa. Após os
esclarecimentos obteve-se a autorização, conforme assinatura do Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido – TCLE (Resolução CNS 196/96) para que as
entrevistas fossem realizadas nas residências dos participantes da pesquisa.
O roteiro da entrevista semi-estruturada (apêndice A) centra-se no próprio
acidente de trânsito e nos impactos suportados pelo vitimado e seus familiares, com
a finalidade de se obter a essência do fenômeno. Temas relacionados com as
causas do acidente, o motivo do deslocamento, a maneira como o acidente afetou a
família, de que forma interferiu na vida pessoal e profissional, fazem parte da
entrevista. Essas entrevistas foram gravadas e, posteriormente transcritas. Trivinos
(1987, p.146) Considera a entrevista semi-estruturada como sendo:
67
Aquela que parte de certos questionamentos básicos, apoiados em teorias e hipóteses que interessam a pesquisa e que, em seguida oferecem amplo campo de interrogativas, fruto de novas hipóteses que vão surgindo à medida que se recebem as respostas dos informantes. Desta maneira, o informante, seguindo espontaneamente a linha de seu pensamento e de suas experiências dentro do foco principal colocado pelo investigador, começa a participar na elaboração do conteúdo da pesquisa.
Concluída a fase exploratória da pesquisa todo material coletado foi
sistematizado e submetido a uma pré-análise para sistematização das idéias iniciais
de forma a possibilitar a análise e consequente interpretação conforme o método
Análise de Conteúdo proposto por Bardin (2009) culminado com a conclusão do
estudo.
O período de aplicação dos instrumentos de pesquisa foi de 10 de outubro de
2012 a 20 de janeiro de 2013, no período matutino ou vespertino, conforme
disponibilidade do participante. O critério de inclusão na pesquisa foi: ter sido vitima ou
familiar de vítima de lesão corporal causada por acidente de trânsito, independente de que
pólo esteve no momento do sinistro, se autor ou vítima; e, ser maior de 18 anos. Como
critério de exclusão, ser menor de 18 anos; mesmo sendo vítima de acidente de trânsito não
ter sofrido lesão corporal.
Do universo dos 112 processos analisados, de lesão corporal culposa,
tipificada como crime de trânsito, que transitou na VEPMA de 2007 a 2009, foram
realizadas 79 entrevistas, sendo 2 ou 3 entrevistas por dia, entre 10 a 20 minutos
cada gravação, as quais eram imediatamente transcritas.
Com relação aos benefícios, acredita-se que o desenvolvimento da pesquisa
poderá gerar benefícios importantes para o conhecimento teórico-prático da
segurança viária, além de estimular novos estudos científicos relacionados com o
tema. Esse conhecimento trará considerável contribuição para a implantação de
políticas públicas para: segurança viária; saúde pública; e, também, de inclusão
social para portadores de deficiência adquirida.
O segundo momento da pesquisa corresponde à abordagem crítico-dialética
quando, já definidos os rumos das categorias de análise e, compreendido o
fenômeno no seu aspecto conceitual, houve a intervenção crítica discutindo os
achados da pesquisa de campo confrontado com os fundamentados da teoria, essa
maneira possibilitou apresentar sugestões de medidas para subsidiar a tomada de
decisões relacionadas com a segurança viária.
68
3.3 O método de análise
Appolinário (2006) diz que há diferentes métodos de analisar dados em
pesquisas qualitativas, porém, o método análise de conteúdo proposta por Bardin
(2009) é o método mais tradicionalmente utilizado nesse tipo de pesquisa. Esse
método busca uma interpretação teórica do material textual produzido pelas
entrevistas utilizando-se de várias técnicas, sendo a temática e categorial a mais
utilizada.
O método análise de conteúdo é considerado uma técnica híbrida por fazer a
ponte entre o formalismo estatístico e a análise qualitativa de materiais, cuja
finalidade é identificar nos dados coletados o que está sendo dito a respeito do tema
pesquisado. Bardin (2009) define a análise de conteúdo como sendo um conjunto de
técnicas de análise das comunicações, que utiliza procedimentos sistemáticos e
objetivos de descrição do conteúdo das mensagens. A esse respeito Lozano citado
por Fonseca Jr, disse:
A análise de conteúdo é sistemática porque se baseia num conjunto de procedimentos que se aplicam da mesma forma a todo conteúdo analisável. É também confiável – ou objetivo – porque permite que diferentes pessoas, aplicando em separado as mesmas categorias à mesma amostra de mensagens, podem chegar às mesmas conclusões (Lozano, 1994 apud Fonseca Jr, 2005. p.286).
Na visão de Krippendorf (1990), o método de análise de conteúdo tem
metodologia própria, que permite ao investigador programar, comunicar e avaliar
criticamente um projeto de pesquisa com independência de resultados, pelo fato de
possuir uma orientação fundamentalmente empírica, exploratória, vinculada a
fenômenos reais e de finalidade preditiva; transcende as noções normais de
conteúdo, envolvendo as idéias de mensagem, canal, comunicação e sistemas.
A técnica constitui-se em três fases: a) pré-análise, com a qual objetiva-se
obter a sistematização das idéias iniciais; b) exploração, utilizada para definir as
categorias e unidades de registro e; c) tratamento de resultados com inferências e
interpretações, esse é o momento mais fértil da análise de conteúdo, estando
centrado nos aspectos implícitos da mensagem analisada. Nessa fase acontece a
sistematização e a evidência das informações para análise, que deve ocorrer de
maneira reflexiva e crítica.
69
Dentre as técnicas utilizadas em análise de conteúdo optou-se pela análise
categorial. Nessa técnica há o desmembramento do texto em unidades, em
categorias segundo grupamentos analógicos. Dentre as várias possibilidades de
categorização, encontra-se a análise temática, bastante rápida e eficaz. Desta
forma, para esta pesquisa o tema é o acidente de trânsito e a categoria refere-se ao
impacto suportado pela vítima em sua vida pessoal, profissional e familiar.
Em conformidade com os ensinamentos de Fonseca Jr (2005), para uma
análise temática e categorial foi realizado os seguintes procedimentos:
• Definição do material: as entrevistas ou partes delas que tenham relação e
sejam especialmente relevantes para a solução do problema de pesquisa,
destacando e numerando cada fala do(s) sujeito(s). Cada uma dessas falas
recebe a designação de unidade de registro;
• As unidades de registro devem ser analisadas e classificadas de acordo com
o seu conteúdo. Procede-se, então, a uma avaliação da situação de coleta de
dados – incluindo-se, aí, as informações acerca de como o material foi obtido,
quem participou da coleta, como foi realizado o registro do material, etc.;
• A terceira etapa do processo consiste na categorização das unidades de
registros, de acordo com uma análise semântica;
• Mapeando-se as inter-relações entre as diversas categorias, podem ser
obtidos esquemas que revelam a articulação que servirá de base à
interpretação teórica do material;
• Finalmente, procede-se à interpretação dos esquemas, comparando-os com o
referencial teórico desejado ou mesmo produzindo uma nova teoria a partir
dos esquemas obtidos. Tendo em vista o problema de pesquisa e o
referencial teórico adotado.
70
Desta maneira, a interpretação aconteceu após o processo de redução do
material original em categorias claramente visíveis, de forma a desvendar seu
significado por meio da interpretação e da comparação dos resultados com outras
pesquisas e referencial teórico. Em razão da sua versatilidade este método é
utilizado nos diversos campos do conhecimento, como a psicologia, antropologia, e
comunicação, dentre outros, mostrando-se perfeitamente cabível para esta
pesquisa.
71
4 OS IMPACTOS DOS ACIDENTES NA VIDA DOS VITIMADOS: AN ÁLISE DAS
DIMENSÕES QUANTITATIVA E QUALITATIVA
Neste Capítulo, utilizando-se a dimensão quantitativa e qualitativa, é realizada
a análise dos dados de maneira temática e categorial, através do método de Análise
de Conteúdo proposto por Bardin (2009). Inicialmente houve a transcrição das
entrevistas e a realização de várias leituras com a finalidade de perceber os temas
que são considerados eixos do discurso.
Após destacar esses temas, o próximo passo foi formar categorias claramente
visíveis de maneira que possibilitasse desvendar seu significado por meio da análise
interpretativa, desta maneira, busca-se capturar os impactos suportados pelas
vitimas em sua vida pessoal, profissional e familiar, desvendando o que há além dos
danos visíveis causado pelo fenômeno. Os dados foram sistematizados e
transformados em gráficos para demonstrar a incidência do que foi coletado, de
modo a facilitar a visualização e a análise.
4.1 DEMONSTRATIVOS DA PESQUISA
O Gráfico 6 trata do desenho da amostra no universo de 112 casos de lesão
corporal culposa tipificada como crime de trânsito, cujo processo de execução
transitou na VEPMA de 2007 a 2009, os quais foram utilizados na pesquisa dessa
dissertação, e apresenta percentual de exclusão, recusa e não-localização de
vitimados.
Gráfico 6 - Demonstrativo geral da pesquisa.
Amostra - 79
Não localizados - 11
Recusaram - 17
Excluídos - 5
Fonte: autor da pesquisa.
72
Do universo de 112 casos indicados através dos processos consultados,
apenas 79 vitimados aceitaram participar e demonstraram bastante interesse na
pesquisa e na sua efetivação. Aqueles que se recusaram participar da pesquisa,
usaram como justificativa: a desconfiança dos motivos desse estudo; o incômodo
que as lembranças do sinistro ainda causam; e, o resultado do processo que deixou
uma sensação de impunidade pelo fato dos culpados não irem para a cadeia.
Ultrapassado essa barreira a pesquisa prosseguiu sem mais entraves.
Desta maneira, os dados que serviram de base para a elaboração dos
gráficos foram coletados através das entrevistas semi-estruturada realizadas com 79
vitimados. Os dados socioeconômicos e determinadas informações foram retiradas
da análise documental realizada nos112 processos consultados, que se encontram
na secretaria da VEPMA.
.
4.2 Dados Socioeconômicos
O Gráfico 7 revela que na amostra há predominância do sexo masculino no
envolvimento em acidentes. Enquanto que, o Gráfico 8 evidencia a faixa etária com
maior incidência de acidentes.
Gráfico 7 – Por gênero.
Fonte: autor da pesquisa.
Masculino - 52
Feminino - 27
73
Gráfico 8 – Por Faixa etária.
Fonte: autor da pesquisa.
A amostra pesquisada acompanha a tendência mundial com relação ao maior
envolvimento dos homens em acidentes de trânsito. Porém, mostra-se diferente com
relação à faixa etária. Pesquisa de âmbito mundial considera que a maioria dos
acidentes de trânsito envolve jovens na faixa etária até os 24 anos (OMS, 2007),
enquanto que, a amostra analisada revela maior envolvimento na faixa etária dos 30
a 59 anos. Esta faixa etária representa importante parcela da força de trabalho e
afeta quase todo horizonte produtivo presumido que vai dos 20 anos até a idade de
64 anos.
O Gráfico 9 está relacionado com a escolaridade dos vitimados revelando
através de seus números a educação formal dos envolvidos em acidentes de
trânsito no período pesquisado.
Gráfico 9 – Por Escolaridade
Fonte: autor da pesquisa.
18 a 29 anos - 21
30 a 59 anos - 52
60 anos ou mais - 6
Médio completo - 25
Médio incompleto - 35
Superior incompleto - 1
Analfabeto - 1
Fundamental incompleto - 9
Fundamental completo - 8
74
A pesquisa mostrou que a grande maioria das vítimas de acidentes de trânsito
não avançou nos estudos além do ensino médio incompleto. Esse fato é
preocupante quando se considera que as condições gerais do mercado de trabalho
somadas com a qualificação profissional do trabalhador constituem fatores que
repercutem na empregabilidade e na renda do indivíduo.
O pouco estudo do trabalhador cria situações de desemprego ou
subemprego, nessas condições o indivíduo raramente contribui para o INSS ficando
afastado do benefício previdenciário no caso de enfermidade ou acidente. Esse fato
constitui-se numa ameaça à sobrevivência da família quando o principal
mantenedor, que não tem vínculo empregatício, for vítima de acidente e por força
das circunstâncias ter que parar de trabalhar.
Foram 40 dias internados e mais seis meses me recuperando. Como trabalho por conta própria as coisas ficaram difíceis, não tinha INSS então passei a depender de favores da minha família. (P.A.44 anos, masc.)
O Gráfico 10 está relacionado com a renda familiar, nele é possível observar
a condição econômica do vitimado. Há predomínio de ganhos maior que um salário
mínimo até dois salários.
Gráfico 10 – Por Renda.
Fonte: Autor da pesquisa.
Sem renda - 23
Mais de 7 até 10 salários - 1
Mais de 2 até 4 salários - 3
Mais de 1 até 2 salário - 46
Até 1 salário mínimo - 6
58%
75
Com relação à renda a pesquisa revelou que a maioria das vítimas tem renda
de um a dois salários mínimos, mostrando que existe predominância de vítimas
pertencentes à classe econômica D (FGV, 2012). Através dessa informação pode-
se inferir que, a melhora nas condições econômicas possibilita maior número de
viagens e por consequência maior exposição ao risco de envolvimento em acidentes
de trânsito.
A evolução da economia, a valorização da moeda, a redução do Imposto
sobre Produtos Industrializados - IPI e as facilidades de crédito são apontadas como
facilitadores para aquisição de um meio de transporte individual por parte daqueles
que, por razões econômicas estavam excluídos dessa possibilidade. Hoje, até
mesmo quem ganha um salário mínimo, após análise de crédito, pode financiar a
aquisição de uma motocicleta. No entanto, se por um lado a conjuntura econômica
possibilita a aquisição de um modo de transporte motorizado individual, por outro se
percebe o esgotamento da malha viária, resultando em engarrafamentos e
acidentes.
Através do Gráfico 11 pode-se ter uma visão sobre o motivo do deslocamento
quando ocorreu o acidente de trânsito. A complexidade das atividades
desenvolvidas no meio urbano gera variedades de motivos de deslocamentos, para
efeito desta pesquisa foi considerado os deslocamentos por motivo de: estudo,
trabalho, lazer e consumo de bens e serviços.
Gráfico 11 – Motivo do deslocamento.
Fonte: Autor da pesquisa.
Com relação ao motivo do deslocamento quando ocorreu o acidente a
pesquisa revelou que as vítimas se deslocavam para variados destinos com a
finalidade de trabalho, lazer, consumo de bens e serviços e estudo. Esses dados
revelam que devido a dimensão do espaço urbano e a complexidade das atividades
Trabalho - 27 Estudo - 12
Lazer - 24
Consumo de bens e Serviços - 16
76
há uma crescente necessidade de deslocamentos para diversas atividades
imprescindíveis na vida urbana.
Minha filha voltava da escola, vinha pela calçada. Mas tinha um contêiner, esses de pegar entulho de construção, bem no meio da calçada. Ela foi desviar pela pista quando veio o carro e bateu nela. Não gosto de ficar lembrando porque dói muito. Só Deus na nossa vida para dar força. Como a gente tem fé em Deus à gente supera. (A.M.L. mãe da vítima. P.M.L. 18 anos). Quando aconteceu o acidente eu tava fazendo uma corrida. O passageiro e eu ficamos todo ferido. Hoje quando vejo carro me fechando fico apreensivo, tenho medo de me quebrar de novo. (J.P. 24 anos. Masc) Estava voltando de Mosqueiro (praia). Como tinha bebido um pouco dei o carro para meu cunhado trazer. Fico com raiva só de lembrar que deixei outra pessoa dirigir o meu carro. Agora, veja só, sou autônomo e tenho que correr atrás do pão de cada dia. O carro ficou quebrado. E eu todo endividado, mas já passou (R.F.48 anos. masc.). Eu estava indo pro supermercado na minha bicicleta quando um cara de moto me bateu. Tive fratura exposta do meu pé, e por causa disso passei quase 15 dias internada. Imagina como é difícil para uma dona de casa com filho pequeno ficar todo esse tempo no hospital (N.C. 26 anos. FEM).
A análise desses dados mostra que os impactos do acidente de trânsito,
também afeta a sociedade, pois, o impedimento de locomover-se livremente pela
cidade, em virtude das lesões provocadas pelo acidente, resulta em perdas
econômicas por causa da perda de produção decorrente da interrupção das
atividades produtivas por parte do acidentado, que, por via de consequência, afeta o
próprio vitimado, sua família, o comércio e a sociedade como um todo.
4.3 Dados sobre o acidente
O Gráfico 12 mostra o modo de transporte que se envolveram em acidentes
na amostra pesquisada. O automóvel está envolvido na maioria dos acidentes.
Porém, a motocicleta apresenta uma incidência bastante expressiva no percentual
dos acidentes sistematizados. Logo em seguida estão as bicicletas, os ônibus, os
caminhões e num percentual quase inexistente as Vans.
77
Gráfico 12 – Tipo de veículo envolvido no acidente.
Fonte: Autor da pesquisa.
O automóvel é o tipo de veículo que mais se envolveu em acidente, porém, as
estatísticas mostram que os acidentes envolvendo motocicleta estão em crescente
evolução. Já foi mencionado anteriormente que a atual conjuntura econômica
possibilita a aquisição de motocicletas. Aliado ao crescente número desse tipo de
veículos nas vias está o desrespeito às leis de trânsito, por parte dos condutores de
moto, em destaque menciona-se o não uso do capacete e a velocidade excessiva,
fatores que contribuem para a gravidade do sinistro.
O Gráfico 13 demonstra as circunstâncias do tempo e iluminação quando
ocorreu o acidente. Verifica-se que o período da noite foi o que mais produziu
acidentes, em comparação com o período do dia. Com relação às condições do
tempo, verificou-se que a maioria dos acidentes aconteceram no momento de chuva,
porém, dias com sol aberto não evitaram acidentes.
Gráfico 13 – Circunstâncias do tempo e iluminação.
Automóvel - 31
Motocicleta - 21
Bicicleta - 16
Van - 1
Ônibus - 7
Caminhão- 3
Fonte: Autor da pesquisa.
78
Dos 79 acidentes pesquisados 33 aconteceram no período do dia e 46 no
período da noite. Desta maneira, a pesquisa registrou ocorrências de acidentes em
todos os horários, prevalecendo o período da noite com mais registros. Com relação
às condições do tempo aconteceram mais acidentes no momento de chuva, porém,
existe expressivo registro quando o tempo apresentava sol aberto e durante a noite
em locais com boa iluminação. Há de se considerar que, a deficiência de iluminação
do período noturno gerou menos acidentes do que os registrados sob sol.
O acidente aconteceu quando voltava do trabalho para casa. Era noite e estava chovendo. Estava sentada na ultima cadeira na direção do corredor do ônibus. Não deu pra ver como aconteceu o acidente. Só sei dizer que o motorista corria muito. Ele bateu num outro ônibus que estava na frente, aí todo mundo caiu, se tivesse cinto de segurança acho que eu não tinha quebrado a minha perna e hoje não estaria deficiente. (A.S.C.V. 38 anos. Fem.)
Essas informações demonstram que a preocupação com a segurança viária
deve ser constante independente do horário do dia ou da noite e das condições do
tempo. Campanhas educativas, estudos e discussões sobre a acidentalidade no
trânsito mostram que o dever de cuidado e a observância das normas legais que
regem o trânsito buscam evitar a ocorrência de acidentes. Porém, compete a cada
usuário da via ter compromisso com a preservação da vida, tanto da sua quanto a
de outrem, pois, os acidentes não têm hora marcada para acontecer.
O Gráfico 14 aponta as causas dos acidentes na percepção das vítimas
entrevistadas, dentre as causas estão: o excesso de velocidade; a embriaguez; o
avanço de sinal vermelho; a ultrapassagem; o pedestre transitando pela pista de
rolamento; a falta de atenção do pedestre; o avanço de preferencial; a falta de
respeito ao idoso; e, a manobra irregular.
79
Gráfico 14 – O que deu causa ao acidente.
Fonte: Autor da pesquisa.
Hoje em dia o trânsito em Belém tá muito difícil. Tem muita imprudência de motoristas que pensa que está disputando corrida. Quando me lembro do acidente fico nervoso, apreensivo... às vezes passa um filme na minha cabeça, sem querer começo a lembrar do acidente ( A.R.O.S. 64 anos. Masc). Ninguém respeita, o sinal tinha fechado quando o carro me bateu, ele não respeitou o sinal e ainda disse que eu tive culpa, culpa teve ele que tava porre. Fiquei quatro meses e meio me recuperando, nesse tempo o meu marido teve que colocar uma empregada em casa para fazer as coisas enquanto me recuperava (T. S. 30 anos. Fem.).
Na percepção das vítimas o excesso de velocidade e a embriaguez ao
volante foram apontados como possíveis causas do acidente. A gravidade dos
acidentes guarda estreita relação com a velocidade que o veículo estava no
momento do acidente, quanto maior a velocidade menor será o tempo que o
condutor terá para decidir o que fazer diante da situação apresentada e racionar
sobre os efeitos da decisão tomada. Sendo o consumo do álcool um agravante da
situação por diminuir a capacidade de mensuração do risco e de reação no
momento de perigo.
O Gráfico 15 demonstra as circunstâncias do meio ambiente urbano que, na
percepção dos participantes da pesquisa, contribuem para a ocorrência dos
acidentes, destacando: a ocupação desordenada das calçadas existentes; a
ausência de ciclo faixa/ciclovia; obras públicas inacabadas; a falta de manutenção
Excesso de Velocidade - 21
Embriaguez - 19
Manobra irregular - 2
Pedestre transitava pela pista de rolamento - 6 Avanço de sinal Vermelho - 12
Avanço de preferencial - 6
Falta de respeito ao idoso - 3 Falta de atenção do pedestre - 1
Ultrapassagem - 9
80
das vias que causam imperfeições e/ou buracos no asfalto; a falta de calçadas para
os pedestres transitarem; a sinalização e a Iluminação precária.
Gráfico 15 - Circunstâncias do Meio Ambiente Urbano que contribuíram para a ocorrência do acidente.
Fonte: Autor da pesquisa.
“Minha filha voltava da escola, vinha pela calçada, mas tinha um contêiner,
esses de pegar entulho de construção, bem no meio da calçada”. (A.M.L. mãe da
vítima. P. M. L. 18 anos). A ocupação desordenada das calçadas, por obras e
construções ilegais ou mesmo as autorizadas ou pelo comércio irregular, dentre
outras formas, impõem ao pedestre terem que arriscar-se pela via destinadas aos
carros. Lynch (1999) ao dissertar sobre o a paisagem urbana ponderou que, os
problemas do espaço e da paisagem urbana afetam as pessoas, uma vez que esses
mesmos espaços são percebidos, observados e transitados por elas.
O leito da pista de rolamento é um local inadequado para o trânsito de
pedestres que se vêem obrigados a transitar por ela ante a ocupação ou inexistência
de calçadas. A soma da sinalização precária, da iluminação deficiente no período da
noite, com a falta de manutenção das vias que são esburacadas, tem imperfeições
e/ ou buracos no asfalto, tem como resultando as condições propícias para a
ocorrência de acidentes.
81
4.4 Impacto dos acidentes na vida das vítimas
Através da análise do conteúdo das entrevistas verifica-se o desdobramento
do acidente de trânsito afetando a vida pessoal, profissional e familiar das vítimas.
Desta forma, pode-se perceber que os acidentes de trânsito, além de causarem
danos materiais, ambientais e mortes, também são produtores de lesões corporais.
O acidente de trânsito e tudo que esteja relacionado com sinistro, desde os
primeiros atendimentos no local do acidente, passando pelo transporte, atendimento
nos serviços especializados, período de recuperação, e tudo que esteve relacionado
com o evento, podem causar na vítima um desequilíbrio no bem estar físico, mental
e social, capaz de causar desestruturação em todos os aspectos da sua vida.
O Gráfico 16 mostra quem prestou os primeiros atendimentos ao acidentado,
enquanto que o Gráfico 17 mostra que os atendimentos na sua maioria foram
realizados em hospitais públicos, evidenciando que, a sociedade arcou com quase a
totalidade dos custos do atendimento pré-hospitalar, na amostra pesquisada.
Gráfico 16 – Quem prestou socorro.
Fonte: Autor da pesquisa.
SAMU - 31
Bombeiro -19
Policia Militar - 22
O causador do acidente - 4
População - 3
82
Gráfico 17 – local de atendimento.
Fonte: Autor da pesquisa.
A maioria das vítimas foi socorrida por serviço especializado de resgate e
atendida em hospitais da rede pública, fato que transfere o ônus do acidente para
toda a sociedade. Os profissionais que trabalham nos serviços de resgate e
atendimento de urgência atuam num cenário de alto nível de estresse ante a
gravidade das lesões, a ansiedade da população em socorrer o acidentado, o tempo
até a chegada ao hospital e o cuidado no transporte para que não ocorra
agravamento das lesões capazes de comprometer a vítima para o resto da vida.
Há de se considerar também que, as estimativas da OMS (2009) apontam
que, em virtude dos acidentes de trânsito, existe uma sobrecarga nos atendimentos
de urgência e emergência com uma taxa ocupando: 50% dos centros cirúrgicos e
86% das hospitalizações. Além de aumento das demandas nos setores de
radiologia, fisioterapia e reabilitação.
A minha vida ficou arrasada, agora sou deficiente, dependo de favores para tudo, agora não dirijo mais, não ando com minhas próprias pernas. Quando me lembro tenho raiva de mim, falar desse assunto me irrita. Sinto muita tristeza porque sei que não vou me recuperar, acabou... (M.S.A. 36 Anos. Masc.).
Na ocorrência de um acidente de trânsito um expressivo número de curiosos
se apresenta como voluntários na prestação do socorro. No entanto, esta
generosidade pode resultar no agravamento das lesões do acidentado. O transporte
inadequado feito por pessoas não habilitadas, ansiosas em socorrer as vítimas, em
Pronto Socorro - 45
Hospital Metropolitano - 12
Hospital particular - 22
83
vez de ajudar pode resultar no agravamento irreversível das lesões em virtude da
manipulação inadequada.
4.4.1 Impactos na vida pessoal
Da amostra pesquisada 50,63%, isto é, 40 vitimados, disseram que tiveram
sua vida pessoal abalada. O Gráfico 18 revela as diversas maneiras que o acidente
afetou a vida pessoal dessas vítimas, mostra também em porcentagem que os
impactos são representados por: deixar de andar de moto; de bicicleta; de dirigir
carro; perdas financeiras; perdas do controle das finanças; deficiências físicas que
interferem nas relações sociais; e, medo de sair de carro.
Gráfico 18 - Maneira como o acidente afetou a vida pessoal.
Fonte: Autor da pesquisa.
Para maior clareza das informações, o Gráfico 18 deve ser analisado levando
em consideração as informações constantes no Gráfico 12 o qual mostra os tipos de
veículos envolvidos em acidentes, na amostra pesquisada. Desta maneira, das 21
ocorrências de acidentes envolvendo o tipo de veículo motocicleta, 9 vítimas
deixaram de utilizar esse modo de transporte, o que em termos percentual
representa 42,87% do número de acidentes. Somando 31 acidentes de carro, 3 de
caminhão e 7 de ônibus, totaliza 41 acidentes. Desses, 9 vitimados deixaram de
dirigir, representando 21,95% de vitimas que deixaram de dirigir após o acidente.
84
Em razão do acidente a vida pessoal do vitimado foi abalada com perda
financeira, aumento das despesas, descontrole das finanças. O medo de novamente
ser vítima de acidente fez com que deixasse de dirigir carro, andar de moto ou
bicicleta; as lesões deixaram como sequelas deficiências físicas, que por sua vez
interferem nas relações sociais.
Consta nos autos que, em razão do acidente de trânsito ocorrido por culpa do condutor, a vítima ficou com sérias cicatrizes no rosto, as quais comprometem não só a sua estética e aparência, como também seu amor próprio, auto-estima e até mesmo seus futuros relacionamentos. (M.B.P. 22 anos. Fem. Síntese do caso pelo autor da pesquisa a partir dos autos do processo). Laudo do IML atesta deformidade estética permanente no membro inferior direito, decorrentes das cicatrizes e também pelo edema residual na perna direita. Concluindo pela invalidez parcial e permanente, em virtude do encurtamento em 2,9 cm da perna direita. (E.L.S. 29 anos. Fem. Síntese do caso pelo autor da pesquisa a partir dos autos do processo). Agora tenho medo de andar de moto. Às vezes choro. Tenho muito medo que aconteça de novo. Eu estava tentando uma vaga de estagiária no meu ramo de trabalho. Meus pais ficaram loucos com o acidente. Minha mãe teve que pedir licença do trabalho pra cuidar de mim (A.C. 26 anos fem.)
Como visto anteriormente, a renda da maioria dos entrevistados não
ultrapassa a dois salários mínimos, desta forma, a sucessão de perdas financeiras
provocadas pelo acidente pode ter como resultado, significativa privação financeira
obrigando-o a rever orçamento e comprometendo o sustento da própria família. O
impacto suportado pelo vitimado em sua vida pessoal vai além das limitações físicas
podendo até causar transtornos psicológicos.
O Gráfico 19 representa a incidência de sentimentos referidos após o
acidente, tais como: tristeza, medo da violência do trânsito, raiva, revolta por causa
da impunidade no trânsito, pavor do trânsito, agradecimento por estar vivo, culpa por
estar dando trabalho para a família, frustrados com a justiça, culpa por ter dado
causa ao acidente, preocupados com o futuro e indignado por estar na situação de
deficiente físico.
85
Gráfico 19 - Sentimentos referidos após o acidente.
Fonte: Autor da pesquisa.
Os transtornos de ordem emocional são considerados sequelas invisíveis, por
esta razão, são difíceis de serem mensurados, no entanto, verificou-se através das
entrevistas, uma grande incidência de referência a sentimentos apresentados após o
acidente, tais como: tristeza, medo da violência no trânsito, revolta por causa da
impunidade, pavor, agradecimento, frustração, culpa, preocupação e indignação.
Só Deus tem dado forças para ir sobrevivendo. Sinto-me triste, melancólico, sem animo. Passei a sofrer de pressão alta, depressão, gastrite. Depois desse acidente, tive que fazer uma viagem longa de carro. Eu passei mal. Tive que voltar. Só depois de dois ou três dias é que pude continuar a viagem. O abalo é pro resto da vida. Quanto menos tocar no assunto é melhor (D.C.O. 57 anos. Masc). O fato de ter causado o acidente ainda mexe muito comigo. Sinto-me culpada. Primeiro meus pais queriam me bater, mas depois eles se mantiveram do meu lado e cuidaram de mim. Eu fico muito apreensiva quando me deparo com uma situação semelhante aquela do acidente, fiquei com medo de andar de moto. (E.Q. 22 anos. fem.) Sempre que me deparo com histórias semelhantes como a minha, me causa uma revolta, porque parece que nada é feito, então pergunto: até quando vai continuar a impunidade no trânsito brasileiro? (R.C. 22 anos. Masc.). Já tinha problema para me locomover por causa da idade, agora piorou, não consegui me recuperar totalmente. Quando me lembro do acidente fico muito triste. Quando saímos na rua temos que estar atentos porque a ignorância é muito grande (A.F. 60 anos. Masc.)
Revoltado por causa da impunidade no trânsito - 11
Culpa por ter provocado o acidente - 2
Culpa por dar trabalho aos familiares - 2
Preocupação - 2
Agradecimento por Estar vivo - 3
Medo do trânsito - 15
Frustração - 2
Pavor - 10
Indignação - 1
Raiva - 14
Tristeza - 16
86
A análise do conteúdo das entrevistas revela que o acidentado experimenta
mudança em sua rotina, seus hábitos e em seu estilo de vida, passa ainda a
experimentar sentimentos e apresentar sintomas antes não vivenciados. Percebe-se
diante de perdas que, em alguns casos, impõe dependência de outras pessoas, isso
é bastante frustrante para quem levava uma vida ativa e subitamente se ver
obrigado a depender de assistência alheia para realizar atividades simples e até
mesmo a própria higiene.
Strunin (2004) diz que o indivíduo sente-se como se fosse outra pessoa e que
as mudanças que acontecem na vida pessoal estendem-se para além das limitações
físicas. Experimenta sentimentos de culpa, ansiedade e depressão que podem
interferir na forma de conviver e interagir com outras pessoas. Aliado a isso a
sucessão de perdas financeiras, em virtude do acidente, aumenta o sentimento de
impotência em virtude das privações e da necessidade de rever orçamentos.
4.4.2 Impactos na vida profissional
Na amostra pesquisada 50,63%, isto é, 40 vitimados, responderam que a vida
profissional também foi afetada. O Gráfico 20 demonstra que a demora na
recuperação resultou em perda de trabalhos, que o medo de dirigir interferiu na volta
para o trabalho em razão de ser motorista profissional, houve demissão e perda de
trabalhos eventuais.
Gráfico 20 - Maneira como o acidente afetou a vida profissional.
Fonte: Autor da pesquisa.
Foi prejudicado em virtude da dificuldade de andar - 1
Perda financeira em virtude do tempo de recuperação - 4
Demora na recuperação fez perder trabalhos - 9
Não consegue arranjar emprego por causa das sequelas - 3
Desistência de planos profissionais - 7
Perdeu entrevista de emprego - 1
Medo de dirigir - 6 Deixou de fazer bicos - 5
Demissão - 4
87
A gravidade do acidente afeta a vida profissional do vitimado em virtude das
sequelas físicas, que podem resultar em deficiências, tirarem a capacidade do
indivíduo de realizar determinadas tarefas, assim como as sequelas psicológicas,
representadas pelo medo, pavor, receio, por exemplo, impossibilitar o exercício
profissional daquelas que exercem suas atividades em meio ao trânsito como é o
caso dos motoristas e motoqueiros. Soma-se a isso, o fato da demora na
recuperação resultar em perda de trabalhos e de renda para os autônomos.
Eu fiquei com deficiência física, a minha perna é mais fina que a outra, ainda tenho dores no local da fratura e também ainda estou com os parafusos. Por causa das dores não posso ficar muito tempo em pé. Então tive que ser readaptada no trabalho, pelo fato de trabalhar como técnica de enfermagem poderia ter mais um emprego, só que o acidente me tirou essa possibilidade porque não tenho condições de ficar muito tempo em pé. Graças a Deus sou funcionária pública e fui readaptada senão não sei como seria se trabalhasse em hospital particular. Acho que teria sido demitida. (A.S.C.V. 38 anos. Fem.) Vitima de atropelamento em via pública. Conforme laudo do IML teve fratura de bacia e esmagamento da mão. O que ocasionou perda de movimento no 2º dedo da mão esquerda, com perda moderada na bacia, causando-lhe incapacidade laborativa parcial e permanente, pois não poderá exercer atividades que exijam movimentos delicados da mão esquerda. (R.E.S. Mas. 40 anos. Síntese do caso pelo autor da pesquisa a partir dos autos do processo).
O acidente que resulta no afastamento do empregado de suas atividades
produtivas, por via reflexa, acaba por afetar também a empresa onde este indivíduo
trabalha, pois cria a necessidade de remanejamento ou de contratação de outro
funcionário para exercer as funções daquele até a sua recuperação. O funcionário
temporário pode despertar o interesse do empregador em lhe contratar, em
substituição ao acidentado, quando verificar que o temporário é mais eficiente e
produtivo.
Isso porque muitos daqueles que foram afastados do trabalho em virtude de
acidentes graves, ao retornarem tem que diminuir o ritmo de trabalho por causa da
condição de saúde; essa diminuição da produção não interessa ao empregador.
Desta forma, ao retornarem para suas funções após longo período de benefício do
INSS ficam mais expostos a demissões.
88
Para retornarem ao mercado de trabalho terão que enfrentar diversos fatores
de ordem social que devem ser considerados, tais como: a disponibilidade de
trabalho adequado, ambiente econômico e trabalhista, condições de mercado,
habilidades e experiências. A amostra pesquisada revelou que a maioria dos
acidentados tem baixo nivel de educação formal, fato que aumenta as dificuldades
de retorno ao mercado de trabalho.
4.4.3 Impactos na vida familiar
O Gráfico 21 demonstra a posição que a vítima ocupa na família enquanto
responsável financeiro; considerando que o acidente vitimou o responsável pelo
sustento da família percebe-se desde já que as consequências atingem toda a
família. Enquanto o acidentado suporta as dores físicas, a família sofre privações e
necessidades.
Gráfico 21 - Posição que a vitima ocupa/ocupava na família enquanto responsável financeiros.
Fonte: Autor da pesquisa
A pesquisa mostrou que na condição de pai/mãe a grande maioria dos
vitimados são considerados o principal responsável financeiro da família. Fato que
repercute diretamente no sustento da família, resultando em necessidade de a
família fazer adaptações financeiras para enfrentar a nova realidade. Além de alguns
familiares terem de deixar de trabalhar para cuidar do acidentado.
Pai - 42
Mãe- 16
Filho (a) - 21
89
Por causa desse acidente passamos por muitas dificuldades financeiras. Além dos remédios, das dores que até hoje sinto. O meu marido teve que pagar uma pessoa pra fazer as coisas de casa até eu melhorar. Hoje fico apavorada quando ando de bicicleta. Não saio como antes, só ando por aqui perto de casa (N.C. 34 anos. FEM).
As coisas ficaram difíceis, tive que me tornar duas para cuidar dele, antes eu trabalhava para ajudar, com o acidente tive que dar conta sozinha das despesas, ele, coitado, não podia trabalhar, como trabalhava como autônomo, cadê INSS, não tem porque nunca pagou. Tivemos que nos adaptar com a nova situação (E.I.C. Esposa da vítima J.L. 33 anos. Masc.)
A família sofre um forte impacto quando o principal mantenedor financeiro é
vitimado em acidente de trânsito, principalmente nas famílias que tem uma única
fonte de renda, geralmente originada do trabalho assalariado ou autônomo da
vítima. A amplitude das consequências do adoecimento e afastamento do trabalho
será maior quando houver redução salarial, o que geralmente acontece quando o
indivíduo fica de benefício previdenciário.
O acidente afetou a minha vida porque ficou muito conturbada. Preciso trabalhar e como trabalho por conta própria as coisas ficaram difíceis. Foram 40 dias internado. E mais seis meses me recuperando. Não tenho INSS e passei a depender dos favores da minha família. Logo no inicio todo mundo ajudava. Mas sabe como é, né? Aí a falta de dinheiro, a mulher reclamava dia e noite uma aporrinhação, cabei me separando dela. (P.A. 44 anos. masc).
Nem sempre o beneficio recebido é suficiente para absorver as crescentes
demandas de gastos com medicamentos, consultas, deslocamento para os serviços
de tratamento e recuperação. Pior ainda, quando o indivíduo trabalha por conta
própria e não contribui para o INSS, ficando assim, afastado da cobertura
previdenciária pública.
O Gráfico 22 mostra a maneira como o acidente afetou a família, apontando
dificuldades financeiras; necessidade de adaptações nas finanças domésticas,
percentual de familiares que tiveram que deixar de trabalhar para cuidar do
acidentado. Através desse gráfico percebe-se não só o impacto suportado, mas
também, a importância que a família tem quando algum membro é acometido por
enfermidade ou necessidade diversa.
90
Gráfico 22 - Maneira como o acidente afetou a vida familiar.
Fonte: Autor da pesquisa.
Em todos os casos de acidentes a amostra evidenciou que houve
aproximação da família e muito raramente, relato de afastamento, mas isso
aconteceu após algum tempo quando os cuidados não precisavam ser intensos. A
vida urbana demanda muitos interesses individuais, porém, nos momentos de
necessidade os laços de parentescos sobrepõem-se ao individualismo. Os parentes
próximos, pais e irmãos, representam uma condição importante de segurança
econômica, pois constitui um apoio seguro nas situações de crise.
A minha família ficou desesperada porque não sabia como eu estava. A minha mãe tirou licença no trabalho pra cuidar de mim. Agora eu não gosto de andar de carro quando outra pessoa está dirigindo. Quando me lembro do acidente fico com raiva. Sinto ainda muitas dores na minha perna (R.A.R. – masc. 29 anos).
Algumas famílias estão mais bem preparadas do que outras para gerenciar as
mudanças, no cotidiano doméstico, em razão do acidente. Mas independente de
haver maior ou menor preparo, na ocorrência de um acidente com consequências
graves, os membros da família apóiam-se mutuamente, buscam e mediam esforços
para atenuar ou resolver o impacto.
91
A existência de um acidentado em casa afeta a vida familiar, porque o
indivíduo incapacitado necessita de cuidados durante a fase de recuperação, o que
acaba sobrecarregando o tempo dos outros membros da família.
Quando meu marido sofreu o acidente tive que pedir licença do emprego para cuidar dele. Acontece que foram muitas idas e vindas para o hospital, fisioterapia... Depois foi ficando difícil ser dispensada para acompanhá-lo ao médico. Aí comecei a faltar ao trabalho, até que fui demitida (Esposa. Vítima. E.P. 19 anos. Masc.).
Desta maneira, a análise dos dados apresentados demonstra que os
impactos produzidos pelos acidentes de trânsito ultrapassa os danos materiais e
ambientais. Afeta a vítima primária do acidente com sequelas visíveis, que são as
deficiências físicas e, com sequelas invisíveis, assim consideradas os transtornos da
ansiedade.
Por via de consequência, afeta também a família, considerada vitima
secundária, impondo sofrimento, limitações e dificuldades financeiras,
principalmente quando o vitimado era o principal mantenedor da família. Por via
reflexa, atingem toda a sociedade através dos custos previdenciários, de tratamento
e internação, quando retira o acidentado de uma vida produtiva. Desta forma, é
iminente a necessidade de medidas capazes de minimizar a gravidade das lesões.
4.5 A percepção atual da vítima sobre o acidente
Em razão dos dados levantados serem pretéritos, cobrindo o lapso temporal
de 2007 a 2009, buscou-se saber como o vitimado está passando nos tempos atuais
e sua expectativa quanto ao futuro.
Com relação à vida pessoal, percebe-se que, mesmo após ter se passado
anos da ocorrência do acidente as lembranças ainda incomodam e traz a tona o
sofrimento vivido: “O abalo é pro resto da vida. Quanto menos tocar no assunto é
melhor. (D.C.O. 57 anos. Masc”). No entanto, existem outros que conseguiram lidar
com as consequências do problema e seguir vida normal: “... fiquei todo endividado,
mas já passou” (R.F.48 anos. masc.). “... hoje contribuo para o INSS porque sei que
é importante” (P.A.44 anos, masc).
Com relação à vida profissional os relatos apontam que emergiam convicções
de que voltaram para suas rotinas de trabalho marcados pelo acidente: “Se o
92
acidente serviu para alguma coisa além de me deixar de cama? posso dizer que
ajudou a despertar o desejo de estudar e ter um profissão melhor, a vida de moto-
taxista é arriscada demais”. (E.M. 28 anos. Masc.). “ tenho consciência que se der
mole pode acontecer de novo”. (R.O. 32 anos. Masc.). “ Espero que esse acidente
não afete o meu futuro, hoje não posso trabalhar muito tempo em pé”. (K.L. 26 anos.
Fem.) “Graças a Deus sou funcionária pública e fui readaptada ...não sei como seria
se trabalhasse em hospital particular”. (A.S.C.V. 38 anos. Fem.)
Com relação à vida familiar percebe-se certa preocupação em evitar que
novamente aconteça algo semelhante: “minha família ficou muito balada, tenho
medo de passar por tudo isso de novo” (J.A.B. 27 anos. Masc.). “Não quero ver
meus filhos passando necessidades como passaram quando estive doente, é muito
difícil para um pai de família ficar deitado numa cama vendo o filho passar
necessidades (J.L. 33 anos. Masc.)
Ao analisar tais conteúdos, percebe-se o tom de superação, de esperança
aliado ao desejo de não mais ser vítima de acidentes de trânsito. É importante dizer,
que apesar do tempo da ocorrência, muitos entrevistados ainda estão em processo
de reabilitação. As feridas sararam, mas as lembranças ainda causam, em alguns,
medo, angustia e sofrimento psicológico.
93
5 CONCLUSÃO
A análise final da pesquisa confirmou que o método Análise de Conteúdo,
proposto por Bardin (2009), utilizado nesta dissertação, pode ser usado como
método de interpretação de dados capazes de subsidiar a tomada de decisões
relacionadas com a segurança viária, por parte do poder público. Esse método
possibilitou definir a percepção dos vitimados sobre os impactos que o acidente de
trânsito trouxe para sua vida pessoal, profissional e familiar. Assim como, permitiu
estabelecer relações desta percepção com a necessidade de implementação de
medidas mais eficazes para minimizar a gravidade dos acidentes.
A embriaguez e o excesso de velocidade estão entre as principais causas do
acidente, contudo, percebe-se que a conduta humana é o principal vetor das
tragédias. Desta maneira, a mudança de comportamento dos condutores pode evitar
a ocorrência de acidentes, razão pela qual o legislador reservou um capítulo no CTB
dedicado à educação para o trânsito, cujo objetivo é de, através da educação mudar
comportamentos capazes de causar acidentes.
A pesquisa mostrou também que, existem circunstâncias no meio ambiente
urbano que contribui para a ocorrência de acidentes de trânsito, como: iluminação e
sinalização precárias, ausência de ciclofaixa/ciclovia, obras públicas inacabadas e,
deficiência de limpeza pública. Destaca-se ainda, a ocupação desordenada das
calçadas existentes, pelo comércio informal, por estacionamento irregular, por obras
e construções, entre outros, fato que obriga o pedestre a transitar pela pista de
rolamento constituindo-se risco de acidente de trânsito.
A amostra pesquisada revelou que o principal motivo do deslocamento foi em
virtude do trabalho, que o perfil do acidentado é predominante do sexo masculino,
na faixa etária entre 30-59 anos, com grau de escolaridade que não ultrapassa o
ensino médio incompleto e rendimentos mensais que não vão além de dois salários
mínimos, com um número expressivo de trabalhadores sem vínculo empregatício.
A maioria dos vitimados considerou-se como o principal responsável
financeiro da família. Esse fato é preocupante porque o afastamento inesperado da
fonte de rende, em razão do acidente, sem a garantia do benefício do INSS resulta
em complicações da situação econômica da família, produzindo consequências que
vão além das dores físicas causadas pelas lesões, comprometendo a própria
subsistência.
94
A investigação confirmou a hipótese elaborada no projeto de pesquisa, pois, o
método utilizado possibilitou que a interpretação dos dados fosse além dos números,
permitindo concluir que a vítima de acidente de trânsito com lesões graves sofre um
violento impacto em sua vida, que vai além das feridas no corpo e perdura por longo
período, causando um desequilíbrio no seu bem estar por afetar a sua vida pessoal,
profissional e familiar.
O impacto na vida pessoal ocorre em razão das lesões ou das sequelas
incapacitantes, que colocam as vítimas nas estatísticas dos deficientes físicos, de tal
maneira que o vitimado se ver obrigado a adiar ou desistir de planos pessoais. Há de
se considerar que a deficiência adquirida é uma situação difícil de ser enfrentada,
especialmente se o fato acontece na idade adulta e atinge o principal provedor da
família.
Através da análise do conteúdo das entrevistas, pode-se perceber que,
mesmo após as feridas do corpo terem sarado, ficam sequelas invisíveis
manifestadas por sentimentos, como: raiva, medo, revolta, indignação, frustração,
culpa e preocupação. Transtornos esses, que interferem na vida pessoal da vítima
ao ponto de impedir a condução do seu próprio veículo: carro, moto ou bicicleta. E
mais, há um prejuízo nas relações sociais, pois com medo de acontecer novamente
um acidente o indivíduo sai menos de casa.
Esses transtornos, se não tratados adequadamente, vão se agravando cada
vez mais, fazendo com que o vitimado fique refém de seu próprio medo, e passe a
desenvolver enfermidade psicológica ou mental. Além disso, há perdas financeiras
em função dos gastos com o tratamento e remédios e, pelo tempo que fica sem
trabalhar e sem ter outra fonte de renda acontecem de as dívidas não serem
administradas como deveriam, resultando num endividamento progressivo.
O impacto na vida profissional do vitimado é percebido quando em virtude
das lesões, fica afastado das atividades laborativas por um longo período, se torna
incapacitado para exercer a mesma função, ou, se torna incapacitado para o
trabalho. Quem é celetista ou estatutário não sente tanto impacto, porque durante o
período que for necessário para tratamento e recuperação poderá, conforme o caso,
receber benefício através do INSS ou ser aposentado por invalidez.
Retornando ao trabalho, se não tiver condições de continuar na mesma
função, poderá ser readaptado em outra função compatível com a sua limitação, se
houver. O mesmo não ocorre com aqueles que não podem contar com os benefícios
95
da Previdência Social, o tempo que ficam sem trabalhar imprime perdas
econômicas.
A pesquisa mostrou que as sequelas visíveis, como as deficiências físicas
adquiridas e as sequelas invisíveis representadas por transtornos de ansiedade,
desenvolvidas após o acidente podem interferir no retorno ao mercado de trabalho,
como por exemplo, quando impossibilitam que um profissional do volante retome
suas funções com medo de sofrer outro acidente ou em razão da sequela física
impedir o exercício da atividade.
O impacto na vida familiar ocorre mediante dificuldades financeiras que
repercute diretamente no sustento da família provocando privações e necessidade
de adaptações econômicas. Outro fato que deve ser considerado é que o acidentado
necessita de cuidados durante a fase de recuperação o que acaba sobrecarregando
a família, em alguns casos existe a necessidade de familiar deixar de trabalhar para
cuidar do acidentado até a completa recuperação.
A investigação mostrou que existe uma aproximação extraordinária da família
quando ocorre um acidente. A família participa ativamente no apoio à vítima em
todos os momentos, este apoio constitui-se como um fator importante na
recuperação da incapacidade e pode ser considerado como um facilitador positivo
para o retorno ao trabalho.
Percebe-se que, o impacto que o acidente de trânsito causa na vida dos
vitimados ultrapassa os danos visíveis. Afeta a vida pessoal da vítima quando o tira
bruscamente de sua rotina cotidiana obrigando-o a ficar num leito, com dor física ou
psicológica. Afeta também, sua vida profissional tirando-o de maneira momentânea
ou permanente do mercado de trabalho no auge da capacidade produtiva. Além de
que, a vida familiar fica comprometida, visto que seus membros experimentem
privações e necessidades em razão da falta de recursos financeiros.
No contexto da acidentalidade o Estado realiza o controle social através dos
órgãos de do Sistema Nacional de Trânsito - SNT, que cumprem sua competência
administrativa através de atividades de planejamento, administração, normatização,
pesquisa, registro e licenciamento de veículos, formação, habilitação e reciclagem
de condutores, educação, engenharia, operação do sistema viário, policiamento,
fiscalização, julgamento de infrações de trânsito e de recursos e aplicação de
penalidades concernentes ao âmbito administrativo.
96
No entanto, em face de ocorrência de ilícito que ultrapasse a competência
administrativa, como as lesões corporais que foi objeto de estudo nessa dissertação,
a presença do Estado é percebida na esfera judicial, processando e julgando os
crimes de trânsito, determinando coercitivamente, a reparação dos danos causados
e a aplicação de pena não privativa de liberdade, sendo a VEPMA um dos órgãos
executores de sentença condenatória que, através das medidas alternativas, busca
a reinserção social do condenado humanizando o cumprimento da pena e atribuindo
a ela uma finalidade social.
Por fim, considera-se que os objetivos geral e específicos da pesquisa foram
alcançados, uma vez que se conseguiu realizar um estudo exploratório acerca das
consequências dos acidentes de trânsito na vida pessoal, profissional e familiar dos
vitimados, sendo apresentados os impactos dos acidentes, identificada a incidência
de sequelas visíveis e invisíveis, o controle social do Estado e, apesar da amostra
não ter apresentado óbito, ficou evidente que os acidentes são produtores de mortes
e lesões corporais.
Restando provado que o método de Análise de Conteúdo é um método
satisfatório para a realização de pesquisa relacionada com a segurança viária
quando busca-se uma análise temática e categorial.
Na perspectiva do que foi apresentado, sugere-se a implantação de políticas
públicas capazes de garantir maior segurança no trânsito que sejam capazes de
mitigar os consequentes efeitos da tragédia; políticas de saúde pública para
diagnóstico e tratamento das sequelas visíveis e invisíveis e de acompanhamento
psicossocial tanto da vítima quanto das famílias; que sejam atribuídos, ao autor do
crime de trânsito, que tenha agido com dolo, o dever de ressarci ao erário público os
custos de internação e tratamento das vítimas que forem atendidas na rede pública.
97
REFERÊNCIAS
ALCANTARA, Hermes Rodrigues de. Pericia médica e judicial . Rio de Janeiro: Guanabara Dois, 1982. ALMEIDA, Junior. A. Lições de medicina legal . 22. ed. rev. e atual. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1998. ALVES, Priscila; RAIA JR, Archimedes Azevedo. Mobilidade e Acessibilidade Urbanas Sustentáveis : a gestão da mobilidade no Brasil.1999. Disponível em: <http://www.ambiente-augm.ufscar.br/uploads/A3-039.pdf>. Acesso em: 15 maio 2012. APPOLINÁRIO, Fábio. Metodologia da ciência : filosofia e prática da pesquisa. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2006. ARRUDA, Jose Jobson de Andrade. História moderna e contemporânea . São Paulo: Ática, 1996. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. Pesquisa de Acidentes de Trânsito , NBR 10697/TB331, 1989. BARDIN, L. Análise de conteúdo . Lisboa: Edições 70, 2009. BLANCHARD E. B. et. al. Effects of litigation settlements on posttraumatic stress symptoms in motor vehicle accident victims . 1998, p. 337-354. Disponível em: < http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/9565919>. Acesso em 18 Jul. 2012. BOBBIO, Noberto. Teoria da norma jurídica . 3 ed. rev. Bauru: Edipro, 2005. BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 21 ed. atual. São Paulo: Malheiros Editores, 2007. BONFIM, Edilson Mougenot. Processo Penal 1 : dos fundamentos a sentença. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil . 6. ed. Brasília, DF: Senado, 2006. BRASIL. Decreto-Lei No 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Código Penal Brasileiro . Diário Oficial da União de 31.12.1940. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848.htm>. Acesso em: 22 Set. 2012. BRASIL. Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997. Institui o Código de Trânsito Brasileiro. Publicado no DOU de 23 de setembro de 1997.Disponível em:< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9503.htm>. Acesso em: 14 Jul. 2012. CALIL, Ana Maria et. al. ACCIDENTES DE TRÁNSITO, Mapeamento das lesões em vítimas de acidentes de trânsito: revisão sistemática da literatura. Revista Latino-americana de Enfermagem , v. 17, n. 1, 2009.
98
CAPEZ, Fernando. Curso de direito Penal: parte geral, (artigos 1º a 120). 9 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005. 1 v. CAVALCANTE, Fátima Gonçalves; MORITA, Patrícia Alessandra; HADDAD, Sonia Rodrigues. Sequelas invisíveis dos acidentes de trânsito: o transtorno de estresse pós-traumático como problema de saúde pública. Revista Ciência & Saúde Coletiva . 2007. CERVO, A. L; BERVIAN, P. A. Metodologia científica. 4. ed. São Paulo: Makron Books, 1996. CID 10. Classificação Estatística Internacional de doenças e Problemas Relacionados à saúde , 1998. CONVENÇÃO SOBRE TRÂNSITO VIÁRIO DE VIENA (1968). Disponível em: <http://geo5.net/convencao-de-viena-sobre-transito-viario>. Acesso em: 18 Jul. 2012. CROCE, Delton. Manual de Medicina Legal . 5. ed. rev. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2004. DECLARAÇÃO DA ONU SOBRE A DECADA DE SEGURANÇA VIÁRI A. Disponível em: <http://www.bhtrans.pbh.gov.br/portal/page/portal/portalpublicodl/Tr%C3%A2nsito/Seguran%C3%A7a/galeria_vida_no_transito/BH_Encontro%20TCC_PLANO%20DA%20D%C3%89CADA%20DE%20SEGURAN%C3%87A%20VI%C3%81RIA_30%2009%202011.pdf>. Acesso em: 23 Jul. 2012. DELMANTO, Celso et. al. Código Penal Comentado . 8. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2010. DENIT. Anuário Estatístico das rodovias federais . Acidentes de trânsito e ações de enfrentamento ao crime, 2009. DETRAN-Pa. Comportamento dos condutores de veículos quanto aos fatores de riscos na direção veicular em alguns municípios do estado do Pará , 2010. DETRAN-Pa. Relatório estatístico de trânsito no estado do Pará e município de Belém , período: 2007 a 2009. DETRAN, 2010. DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico . São Paulo: Saraiva, 1998. DNIT. Relatório Específico: Pesquisa Médico-Hospitalar Minas Gerais – Goiás – Pará – Santa Catarina – Pernambuco , 2008. DSM-IV. Diagnostic and statistical manual of mental disorde rs . American Psychiatrric Association, 1994. EVANGELISTA, Roberto; MENEZES, Ivani Valarelli. Avaliação do Dano psicológico em perícias acidentárias. Revista IMESC, n. 2, 2000.
99
FARIA, Eloir de Oliveira; BRAGA, Marilita Gnecco de Camargo. Propostas para minimizar os riscos de acidentes de trânsito envolvendo crianças e adolescentes. Revista Ciência & Saúde Coletiva , p. 95-107, 1999. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/csc/v4n1/7133.pdf. Acesso em: 21 Ago. 2012. FEBRABAN. População com deficiência no Brasil – fatos e percepções . Coordenação Geral: Andrea Schwarz e Jaques Haber. Agosto/2006. Publicação: FEBRABAN - Federação Brasileira de Bancos. FERRAZ, Antonio Clóvis Pinto “Coca” et. al. Segurança viária . São Carlos, SP: Suprema Gráfica e Editora, 2012. FONSECA JÚNIOR, Wilson Corrêa da. Análise de conteúdo. In: DUARTE, Jorge; BARROS, Antonio (Org.). Métodos e técnicas de pesquisa em comunicação . São Paulo: Atlas, 2005. p. 280-303. GAMBOA, Silvio. A dialética na pesquisa em educação. Elementos de um contexto. In: FAZENDA, Ivani (org.). Metodologia da Pesquisa educacional . 2 ed. São Paulo: Cortez, 1992. HADDAD, Sonia Rodrigues (et al.) Sequelas invisíveis dos acidentes de trânsito: o transtorno de estresse pós-traumático como problema de saúde pública. Revista Ciência e Saúde Coletiva , 2007. p. 176-177. HOUAISS, Antonio (1915-1999); VILLAR, Mauro de Salles (1939). Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa . Elaborado no Instituto Houaiss de Lexicografia e Banco de Dados da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva: 2001. INFORME SOBRE LA SITUACIÓN MUNDIAL DE LA SEGURIDAD VIAL: ES HORA DE PASAR A LA ACCIÓN. GINEBRA, ORGANIZACIÓN MU NDIAL DE LA SALUD , 2009. Disponível em: <http://www.who.int/violence_injury_prevention/road_safety_status/2009.>. Acesso em: 12 Ago. 2012. IPEA, Impactos sociais e econômicos dos acidentes de trân sito nas rodovias brasileiras . Relatório Executivo. Brasília, 2006. LYNCH, Kevin. A imagem da cidade . Trad. de Jefferson Luiz Camargo. São Paulo: Martins Fontes, 1999. KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. trad. João Baptista Machado, 5. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1996. KOIZUMI, Maria Sumic. Padrão das lesões nas vitimas de acidentes de motocicleta. Revista Saúde Pública , São Paulo, n. 26, p. 306-315 1992. KRIPPENDORFF, Klaus. Metodologia de análisis de contenido . Barcelona: Paidós, 1990.
100
MAIA, A. C. Trauma, PTSD e Saúde. In: PIRES L.C.M (Org.). Stresse Pós-Traumático – Modelos, Abordagens e Práticas . 2006. Disponível em: <http:// www.adafa-portugal.com/livros/Livro_stress.pdf>. Acesso em: 03 Ago. 2012. MARCONI, Marina de Andrade. Técnicas de pesquisa : planejamento e execução de pesquisa, amostragens e técnicas de pesquisas, elaboração, análise e interpretação de dados. 5 ed. São Paulo: Atlas, 2002. MAYOU R; BRYANT, B.; EHLERS A. Prediction of psychological outcomes one year after a motor vehicle accident . p. 1231-1238. Disponível em: < http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/11481156>. Acesso em: 12 Jul. 2012. MELLO, J. M. H. P.; LAURENTI, R. Acidentes e violências no Brasil. Revista Saúde Publica , v. 31, p. 1-4, 51-54, 1997. supl. 4. MORAES, Irany Novah. Perfil forense da medicina . São Paulo: Editora Livraria Pioneira, 1990. MOREIRA; MANTOVANI, R. Educação e mobilidade urbana. Revista dos Transportes Públicos – ANTP . Ano 31, 2009. 1 quadrimestre. NEVES, José Luiz. Pesquisa qualitativa – características, usos e poss ibilidades . Caderno de pesquisa em Administração, São Paulo, v. 1, n. 3, 2º Sem. 1996. Disponível em: <http://www.ead.fea.usp.br/cad-pesq/arquivos/c03-art06.pdf. Acesso em: 18 Ago. 2012. NEVES, Luiz Octávio Rocha Miranda Costa. O novo Código de Trânsito sofre com a impunidade. Revista Visão Jurídica . n. 81, p. 34-37, São Paulo: Escala, 2013. NORRIS, F. H. Epidemiology of trauma: frequency and impact of different potentially traumatic events on different demographic groups. p. 409-418. Disponível em: < http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/1619095>. Acesso em: 18 Ago. 2012. OLIVA, Ângela Maria. O Estatuto da criança e do adolescente : Um estudo sobre as medidas sócio-educativas e a reincidência. Belém-PA: UNAMA/FIDESA, 2003. OMS. Classificação Internacional de Funcionalidade, Inc apacidade e Saúde : Classificação Detalhada com definições. 2003. Disponível em: < http://www.drealg.min-edu.pt/upload/docs/CIFIS.pdf>. Acesso em: 21 Jul. 2012. OMS. Relatório da Situação Global sobre Segurança Rodovi ária . Genebra, Organização Mundial da Saúde, 2009. PAVARINO FILHO, Roberto Victor. Proposições decorrentes das teorias da segurança no trânsito e alternativas possíveis. Revista dos Transportes Públicos – ANTP. Ano 26, 2004. 3 trimestre. PIRES, Ailton Brasiliense. A história do Trânsito. Trânsito no BRASIL : Avanços e Desafios. ANTP, 2008.
101
PIRES T. S. F, Maia A. C. O impacto psicológico de acidentes rodoviários nas suas vítimas. Iberpsicología: Revista Electrónica de la Federación española de Asociaciones de Psicología 2005; Disponível em: <http://www.fedap.es/IberPsicologia/marcoip.htm>. Acesso em: 21 Jul. 2012. RAIA JR, Archimedes Azevedo. A responsabilidade pelos acidentes de trânsito segundo a visão zero. Revista dos Transportes Públicos – ANTP . São Paulo, ano 31, 2009. 1 quadrimestre. RESENDE, Paulo Tarso Vilela; SOUSA, Paulo Renato. Mobilidade urbana nas grandes cidades brasileiras: um estudo sobre os impactos do congestionamento. SIMPÓSIO DE ADMINISTRAÇÃO DA PRODUÇÃO, LOGÍSTICA E OPERAÇÕES INTERNACIONAIS . FGV, 2009. Disponível: http://www.simpoi.fgvsp.br/arquivo/2009/artigos/E2009_T00138_PCN41516.pdf. Acesso em: RIBEIRO JR, João. Curso de teoria geral do Estado. São Paulo: Editora Acadêmica, 1995. RIZZARDO, Arnaldo. Comentarios ao Código de trânsito brasileiro . – 4. ed. rev. atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003. RODRIGUES, Juciara. Educação e mobilidade: rumo a um novo caminho. Revista dos Transportes Públicos – ANTP. Ano 25, 2003. 3 trimestre. ROLNIK, Raquel. O que é cidade . São Paulo: Brasiliense, 2004. (coleção primeiros passos). ROZERSTRATEN, Reiner, J. A. Psicologia do trânsito : conceitos e processos básicos. São Paulo: EPU, 1988. SANTOS, Glauber Eduardo de Oliveira. Cálculo amostral : calculadora on-line. Disponível em: <http://www.calculoamostral.vai.la>. Acesso em: 03 jul. 2012. SANTOS, José J. Responsabilidade civil e criminal em acidentes de t rânsito . São Paulo: Editora de Direito, 1999. SANTOS, Milton. Metamorfose do espaço habitado: fundamentos teóricos e metodológicos da geografia. 3 ed. São Paulo: Hucitec, 1994. SEQÜELAS INVISÍVEIS DOSACIDENTES DE TRÂNSITO: O TRA NSTORNO DE ESTRESSE PÓS-TRAUMÁTICO COMO PROBLEMA DE SAÚDE PÚBL ICA. Junho de 2007. Disponível: < http://www.ipea.gov.br/sites/000/2/publicacoes/tds/td_1291.pdf>. Acesso em: 10 Ago. 2012. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo . 16ed. rev., atual. São Paulo: Malheiros Editores, 1999. STEVENSON, W. J. Estatística aplicada à administração . São Paulo: Harbra, 2001.
102
STIEL, Valdemar Correia, 1921. História do transporte urbano no Brasil : Bondes e trólebus: “summa tranviariae brasiliensis”. São Paulo: Pini; EBTU, 1984. (História dos bondes e trólebus e das cidades onde eles trafegaram). TOROYAN. T.; PEDEN, M. (Eds), Juventude e Segurança Rodoviária, Genebra, Organização Mundial da Saúde . 2007. Disponível: <http://www.who.int/mediacentre/news/releases/2007/pr17/es/index.html. acessado em 21/04/2012>. Acesso em: 20 Set. 2012. TRIVINOS, Augusto N. S. Introdução à pesquisa em Ciências Sociais : a pesquisa qualitativa em educação. São Paulo: Atlas, 1987. VASCONCELOS, Eduardo Alcântara de. A cidade, o transporte e o trânsito . São Paulo: Prolivros, 2005. VASCONCELOS, Eduardo Alcântara de. Transporte urbano nos países em desenvolvimento : reflexões e propostas. 3 ed. - São Paulo: Annablume, 2000. VASCONCELOS, Eduardo Alcântara. Transporte urbano, espaço e equidade : análise das políticas públicas. São Paulo: Unidas, 1996. WAISELFISZ, Julio Jacobo. Mapa da Violência 2011 . Os Jovens do Brasil. Brasília, Ministério da Justiça, Instituto Sangari, 2011. Zaffaroni, Eugenio Raúl. Manual de direito penal brasileiro : parte geral. 7 ed. rev. e atual. 2. tir. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. 1v.