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- GUIA DE LEITURA - PARA O PROFESSOR Os segredos de Iholdi Mariasun Landa Ilustrações Elena Odriozola Tradução Luiz Roberto Guedes Série azul nº 26 72 páginas O LIVRO Composto por duas cartas para a falecida avó e mais duas redações escolares, o romance narra as aventuras de Iholdi, guardiã de custosos segredos. Apesar da pouca idade, ela deve, em primeiro lugar, submeter-se às ordens do primo, que a obriga a brincar com armas de fogo, ameaçando revelar que ela faz xixi na cama. Não bastasse isso, Iholdi também deve fechar-se em copas sobre os encontros entre a polícia e sua babá (suspeita de envolvimento com drogas) e, na parte final, zelar pelo cemitério de dentes enterrados por uma vizinha maluca cujo pai, dentista e imigrante, havia pouco morrera. Um mesmo cenário – o parque onde Marina vai passear todos os dias com seu irmão menor – une as partes da narrativa: ali o primo encontra o revólver, provavelmente ligado ao tráfico de drogas, sendo também esse o local escolhido para as tumbas odontológicas da vizinha. Grande parte do encanto do romance deriva do descompasso entre o caráter adulto dos problemas com que Iholdi depara e a linguagem inocente por meio da qual ela dá seu testemunho e revela seus impasses. A AUTORA Mariasun Landa nasceu em 1949, em Renteria, Espanha. Formou-se em Filo- sofia pela Universidade de Paris, França, e em Letras pela Universidade de Valência, Espanha. Além de escritora, atividade que desempenha desde a juventude, é também professora de euskara, a língua basca. Landa contribui fortemente para a tradição da literatura basca, tendo escrito vários li- vros infantis em euskara, pelo que recebeu, em 2011, o Prêmio Dabilen Elea. A ILUSTRADORA Elena Odriozola nasceu em 1967, no País Basco, Espanha. Neta e filha de pintores, cresceu entre telas e pincéis. Após trabalhar muitos anos com publicidade, em 1997 passou a dedicar-se exclusivamente à ilustração. Hoje conta com extensa obra, com mais de 50 livros ilustrados, muitos dos quais premiados. TEMAS Chantagem / Criminalidade / Drogas / Saúde mental

os segredos de Iholdi - edicoessm.com.br O livrO Composto por duas cartas para a falecida avó e mais duas redações escolares, o romance narra as aventuras de Iholdi, guardiã de

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- Guia de leitur a -pa r a o p r o f e s s o r

os segredos de Iholdi

Mariasun Landa Ilustrações elena odriozolaTradução Luiz roberto Guedessérie azul nº 2672 páginas

O livrO Composto por duas cartas para a falecida avó e mais

duas redações escolares, o romance narra as aventuras de Iholdi,

guardiã de custosos segredos. Apesar da pouca idade, ela deve,

em primeiro lugar, submeter-se às ordens do primo, que a obriga

a brincar com armas de fogo, ameaçando revelar que ela faz xixi

na cama. Não bastasse isso, Iholdi também deve fechar-se em

copas sobre os encontros entre a polícia e sua babá (suspeita de

envolvimento com drogas) e, na parte final, zelar pelo cemitério

de dentes enterrados por uma vizinha maluca cujo pai, dentista

e imigrante, havia pouco morrera.

Um mesmo cenário – o parque onde Marina vai passear todos

os dias com seu irmão menor – une as partes da narrativa: ali

o primo encontra o revólver, provavelmente ligado ao tráfico

de drogas, sendo também esse o local escolhido para as tumbas

odontológicas da vizinha.

Grande parte do encanto do romance deriva do descompasso

entre o caráter adulto dos problemas com que Iholdi depara e

a linguagem inocente por meio da qual ela dá seu testemunho

e revela seus impasses.

A AutorA Mariasun Landa nasceu em 1949, em renteria, espanha. formou-se em filo-sofia pela Universidade de Paris, França, e em Letras pela Universidade de Valência, Espanha. Além de escritora, atividade que desempenha desde a juventude, é também professora de euskara, a língua basca. Landa contribui fortemente para a tradição da literatura basca, tendo escrito vários li-vros infantis em euskara, pelo que recebeu, em 2011, o Prêmio Dabilen Elea.

A ilustrAdorA elena odriozola nasceu em 1967, no país Basco, espanha. Neta e filha de pintores, cresceu entre telas e pincéis. após trabalhar muitos anos com publicidade, em 1997 passou a dedicar-se exclusivamente à ilustração. Hoje conta com extensa obra, com mais de 50 livros ilustrados, muitos dos quais premiados.

temas Chantagem / Criminalidade / Drogas / Saúde mental

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O s s e g r e d O s d e I h O l d I • M a r I a s u n l a n d a

IntErPrEtAnDo o tExto

Gê n e r o s t e x t u A i s

Sem apresentar uma história única e contínua, Os segredos

de Iholdi tampouco se confunde com uma reunião de contos

sobre assuntos variados, com personagens diferentes. Salta

aos olhos a estrutura tripartida do livro. Assim, as três seções

que o compõem – “Da sua Iholdi”, “Marina” e “Dentes e tú-

mulos”– podem ser lidas de forma autônoma, conquanto se

relacionem intensamente.

Cumpre notar também a diversidade de gêneros textuais

empregados pela autora. Em “Da sua Iholdi”, a personagem

principal escreve para a avó duas cartas. Essa abertura introduz

o leitor no “gênero epistolar”, modo de escrita que pressupõe

um interlocutor, no caso de Iholdi, a avó morta (“Dizem que

você está no céu”, p. 7). A leitura de uma carta sempre se recorta

sobre um fundo dialógico, ainda que o leitor só tenha acesso

às palavras e ao pensamento de um dos dialogantes.

Na segunda e terceira partes, “Marina” e “Dentes e túmulos”,

leem-se redações escolares. Textos dessa categoria podem ser

de tipo narrativo (relato de fatos, fictícios ou reais, que ocor-

reram em dado tempo e local, envolvendo determinadas per-

sonagens, com causalidade temporal mais ou menos definida),

descritivo (descrição de situações, pessoas, animais, coisas ou

sentimentos, sem obrigatoriedade de encadeamento temporal)

ou dissertativo (exposição de um raciocínio, apresentação de

dados, argumentos, exemplos, visando à defesa de um ponto

de vista, com introdução/tese, desenvolvimento/antítese e

conclusão/síntese). No caso de Iholdi, temos narração de fatos

passados, na primeira pessoa do singular.

A independência entre as seções do livro não implica, con-

tudo, ausência de unidade, pois, embora haja predominância

do gênero epistolar na primeira parte, há traços de outras

modalidades textuais. Em “Da sua Iholdi”, por exemplo, o

gênero epistolar mistura-se com a forma diário, por causa da

condição defunta do interlocutor. Acreditando que a avó lerá

sua carta, Iholdi também escreve para desabafar e entender

melhor os próprios sentimentos (“Depois de te contar o que

diário

Pode-se dizer que há traços de diário em todas as partes de Os segredos de Iholdi, já que a menina escreve sobre si e sobre os fatos de sua vida íntima. o diário é uma importante via de autoconhecimento, na qual o “autor” se coloca não apenas como sujeito, mas também como objeto da escrita, analisando as próprias atitudes e sentimentos. Hoje em dia, é comum que blogs e outras redes sociais funcionem como uma espécie de diário para os jovens. É preciso refletir sobre como a exposição de sentimentos íntimos em espaços públicos (internet, por exemplo) transforma a relação dos jovens com a escrita e seu potencial de autoconhecimento.

Mergulhando na temática

* Os destaques remetem ao item Mergulhando na temática.

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O s s e g r e d O s d e I h O l d I • M a r I a s u n l a n d a

me acontece, sempre encontro uma solução”, p. 23). Além

disso, há também nas cartas algo de prece, pois a menina tem

consciência de que sua interlocutora está em outro plano. A

relação que Iholdi estabelece entre a avó e Deus (“Então ima-

gino que Deus incumbiu você de controlar o tráfego aí em

cima”), bem como a configuração da idosa como autoridade

máxima (“Você me olha para saber se estou me comportan-

do bem [...] você dá uma espiada nos gerânios de que tanto

gostava para ver se ponho água neles, checa se damos alpiste

pro Jerônimo [...] ou se faço as lições de casa”, p. 7) reforçam

essa impressão de prece.

Na terceira parte, “Dentes e túmulos”, a própria classificação

de gênero é questionada pela narradora: embora se trate de

um relato infantil, Iholdi afirma não saber se o seu texto é ou

não um conto. A menina coloca em xeque tanto a veracidade

da história de Deo quanto seu caráter ficcional: “Não inventei

nada e tanto faz se não parecer um conto; tudo aconteceu de

verdade. Bem, quase tudo”.

Afora a mescla entre diferentes modalidades discursivas,

concorre para a sensação de unidade o parque como espa-

ço comum a todas as histórias e o fato de elas todas serem

narradas pela mesma personagem, Iholdi. Por fim, mas não

menos importante, há o motivo do segredo, que funciona

como elemento de ligação entre as partes, além de impulsio-

nar Iholdi à escrita.

Vi o l ê n c i A e d e s p r ot e ç ã o

Ao motivo do segredo, liga-se ainda o tema da violência, que

alinhava as três histórias narradas por Iholdi. Em primeiro

lugar, a violência de Martim, o primo que chantageia a pro-

tagonista, obrigando-a a brincar com o revólver. Depois, a

violência sofrida por Marina, sob a pressão do rapaz que ela diz

ser seu primo e que desperta a atenção da polícia. Pelo relato

de Iholdi depreende-se o envolvimento do “primo” da babá

com o mundo das drogas. A menção ao fato de que Marina às

vezes “lhe entregava algo, que o rapaz rapidamente enfiava no

bolso da jaqueta” faz o leitor imaginar, ao longo da narrativa,

que se tratava de dinheiro para comprar droga. A cena da fuga

após a abordagem policial permite ainda a criação retrospectiva

de um nexo com a primeira história: como se a arma encon-

trada por Martim tivesse sido perdida pelo fugitivo. Como o

cenário onde se passam as histórias é o mesmo, a aparição da

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O s s e g r e d O s d e I h O l d I • M a r I a s u n l a n d a

arma pode ser explicada, em alguma medida, pela presença

de infratores e policiais no parque.

Por fim, a terceira manifestação de violência está ligada à

figura de Deo, que teme a profanação de seus túmulos (“– Você

tem que cuidar dos meus túmulos, que está ficando cada vez

mais perigoso, cheio de drogados, polícia, gente armada e até

cachorro louco”, p. 56) e que também sofre a violência de ser

internada, retirada de sua casa, afastada dos amigos e vizinhos,

estigmatizada como doente mental.

Tais recorrências (três mulheres – Iholdi, Marina e Deo

– desprotegidas em face de diferentes ameaças) vão criando

ligações sutis entre as histórias, entrelaçadas por em encadea-

mento romanesco subterrâneo.

Finalmente, a maneira pela qual Iholdi reage à carga de

violência das histórias termina por configurar um percurso

de amadurecimento da protagonista que, na primeira histó-

ria é vítima, na segunda, testemunha impotente da violência

sofrida pela babá e, na terceira, “heroína” responsável pelo

resgate da amiga.

Me tA l i n G u AG e M

Outra característica marcante do livro é a reflexão sobre a

linguagem e sobre o ato de escrever. Apesar da pouca idade,

a esperta narradora procura entender tudo a seu redor por

meio da escrita, objeto de sua atenção. Assim, não são raros

os momentos do livro em que há metalinguagem.

Tal questão é bastante forte na terceira parte do livro, quando

Iholdi afirma não saber se é conto o que ela escreve: “Só não sei

se o que eu escrevi afinal é ou não um conto” (p. 66). Ademais,

em meio à triste história de Deo, o humor da menina no ma-

nejo da linguagem é responsável por tiradas de notável força

expressiva (“Sabia que Deo teria um ataque se soubesse que eu,

com o perdão do trocadilho, dera ‘com a língua nos dentes’”).

Noutros momentos, a reflexão sobre o nome das coisas e

pessoas leva a menina a refletir sobre a própria identidade:

“Eu também gostava muito do nome Marina. Não sei por

que, mas ao pronunciá-lo me vêm à cabeça mar, praia, sorvete

[...]. Eu, se pudesse, mudaria meu nome. Nesse caso, também

acho que os pais passam da conta, não pedem a opinião dos

filhos, botam na gente um nome esquisito feito o meu, que

ninguém nunca ouviu, que não dá pra mudar e a gente carrega

pra sempre” (p. 27).

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Vale lembrar que o livro foi publicado na Espanha e que,

provavelmente, as histórias de Iholdi se passam nesse país –

afinal, as personagens fazem a sesta (p. 57), hábito cultural

caro ao povo espanhol. Iholdi também é um nome de origem

basca. Os bascos, embora possuam cultura e língua próprias,

não constituem um país independente, vivendo em constantes

conflitos com seus vizinhos. Assim, por meio da inocente refle-

xão sobre o nome da babá, insinua-se a questão da identidade,

não só subjetiva, mas também cultural.

lo u c o s e c r i A n ç A s

Talvez a história de Deo seja a mais comovente das três nar-

rativas que compõem Os segredos de Iholdi. Trazendo em seu

bojo uma simbologia complexa – o enterro dos dentes –, a

história trata ainda de um tema delicado: a loucura. Tal tema

relaciona-se intensamente com o ponto de vista infantil da

narrativa, isto é, por ser criança, Iholdi percebe o mundo e

seus problemas de modo muito singular, afastado da lógica

cartesiana e de certos códigos sociais. Nesse sentido, a perspec-

tiva de Iholdi aproxima-se da de Deo – não por acaso Iholdi a

caracteriza como “uma mulher normal, comum; por dentro,

uma criança” (p. 48). Assim, tanto Deo quanto Iholdi deparam

com questões complexas e encontram maneiras específicas para

lidar com seus problemas. Juntas, ambas fabulam sobre seus

mortos: “– Agora meu pai vai ficar com sua avó lá no Grande

Parque, Iholdi” (p. 49). Assim elas se aproximam: enquanto a

mãe de Iholdi arruma um jeito de livrar-se da vizinha tantã,

a menina lamenta, querendo ficar perto da amiga: “Eu queria

que ela jantasse conosco ao menos uma vez e que mamãe não

a convidasse apenas para que ela recuse e vá embora” (p. 53).

Não seria exagero dizer que Iholdi vê um pouco de sua traje-

tória na vida de Deo: ambas olham para o mundo por meio

da fantasia; as duas passam por perdas difíceis – no caso de

Iholdi, a avó e a babá; no caso de Deo, o pai; ambas encontram

uma forma simbólica de superar suas perdas: Iholdi se vale

das palavras; Deo, do enterro dos dentes.

BAscos

Conforme observado anteriormente, a certa altura da narrativa Iholdi reflete sobre o próprio nome, achando-o “esquisito”.Além das questões concernentes àconstituição da subjetividade, pontonevrálgico do livro, a singularidadecultural do povo basco também atravessaOs segredos de Iholdi, cristalizada nonome da protagonista.

embora tenham uma cultura milenar e uma língua própria (euskara), os bascos não possuem um país, isto é, um território político e economicamente autônomo em que possam viver. Eles habitam regiões da França e, sobretudo, da Espanha.

A cultura basca mistura-se à espanhola de modo conflituoso. Existem até organizações políticas, como o Partido nacionalista Basco, que reivindicam a formação de um Estado nacional autônomo. entre 1952 e 2011, o grupo Pátria Basca e Liberdade (em basco, Euskadi Ta Askatasuna, eTa) cometeu uma série de atentados para reivindicar tal autonomia, provocando mortes na Espanha.

Assim, no simples questionamento de Iholdi sobre seu nome, podem-se observar certos conflitos históricos, como a sobreposição de uma cultura sobre outra – no caso, a espanhola sobre a basca.

A ideia de culturas em conflito ecoa ainda na ideia de desarraigamento, com que a avó de Iholdi explica a esquisitice do pai de Deo. Sem entender por que a avó se referia ao dentista como um “pobre homem desarraigado” (p. 51), Iholdi aprende com a mãe o que significa perder as raízes, as referências, a cultura. A sensação de deslocamento em relação ao meio circundante parece explicar algo do desconforto sentido pela protagonista por carregar um nome estranho, pouco familiar.

dentes

o lírico cemitério criado por Deo faz lembrar o costume medieval de enterrar dentes. tal prática visava evitar a ação de bruxas que, lançando dentes ao fogo, poderiam se apropriar da alma de quem os perdia. Uma versão mais branda desse “animismo odontológico” perdura na lenda da fada dos dentes, a qual, em troca dos dentes de leite que as crianças

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escondem sob o travesseiro, deixa um dinheirinho para os pequenos banguelas.

na história de Deo, também se verifica a associação entre dentes e riqueza. Em mais de um momento Iholdi menciona que a amiga se refere à sua coleção de dentes como um tesouro: “– Quero que você saiba onde ficam meus túmulos. Vou te mostrar um mapa do parque e dos lugares marcados com cruzes. Caso me aconteça algo, alguém vai saber onde guardo meus tesouros. Mas isso é um segredo entre nós duas... – promete?” (p. 56).

Por fim, a associação entre dentes, alma e tesouro autoriza a hipótese freudiana dos dentes como símbolo fálico, cuja perda, não por acaso, é sentida como castração. Como símbolo fálico, os dentes ainda simbolizam a força e a agressividade: elementos duros, capazes de morder, triturar. seu nascimento possibilita os primeiros ataques do bebê ao seio materno.

Na mitologia grega, da semeadura dos dentes do dragão morto por Cadmo, nascem guerreiros violentos que lutam entre si até a morte. em Os segredos de Iholdi, é lícito também identificar uma cadeia associativa entre ocultamento e agressividade, podendo-se traçar um paralelo entre os dentes enterrados na terceira parte e a arma escondida sob os galhos do salgueiro na primeira parte, ambos capazes de ferir, ambos objetos de segredo e vigilância.

tudo isso sem esquecer o nexo entre os dentes e a profissão do pai de Deo, cuja memória é de certa forma preservada por meio da coleção de presas.

ConVErSAnDo Com oS ALUnoS

atividades didáticas

A n t e s dA l e i t u r A

Escrita e intimidade

O professor pede aos alunos que se organizem em roda. Em

seguida, propõe uma discussão sobre o ato de escrever, pergun-

tando se eles têm o hábito de registrar seus sentimentos ou de

inventar histórias. Vale perguntar também sobre os meios de

que os alunos se servem para se expressar (diário, carta, posts

em redes sociais ou blogs), sobre o conteúdo dos textos e sobre

os efeitos da escrita sobre quem escreve. A discussão servirá de

aquecimento para as questões presentes em Os segredos de Iholdi.

d u r A n t e A l e i t u r A

O tamanho do que se sente

Durante a leitura, sugere-se o trabalho com as ilustrações

do livro. Pode-se questionar, por exemplo, a proporção das

figuras, isto é, em algumas ilustrações – como as das páginas 32

e 36 – Iholdi aparece muito maior do que os outros elementos

do desenho. Em seguida, pede-se aos alunos que destaquem

algum episódio do livro que, embora não tenha sido ilustrado,

lhes tenha chamado a atenção. Ato contínuo, com o auxílio do

professor de Artes, os alunos são estimulados a produzir uma

nova versão das ilustrações existentes ou a ilustrar qualquer

episódio da história. Ao final, reúnem-se os desenhos em uma

pequena exposição. A atividade será enriquecida por comen-

tários dos alunos sobre a seleção dos trechos a ilustrar e sobre

a forma de representação por eles adotada.

d e p o i s dA l e i t u r A

Diferença intergêneros e produção textual

A fim de desenvolver a percepção da turma para diferen-

tes gêneros textuais, o professor divide a classe em pequenos

Indicações de livros e filmes

livros

Para o aluno

• fINe, anne. Diário de um gato assassino.São Paulo: Edições Sm, 2004.

Seis dias na vida de Veludo, o incorrigível gato da Carol, que obriga a família a fazer segredo em torno de Bongô, o coelho da vizinha.

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O s s e g r e d O s d e I h O l d I • M a r I a s u n l a n d a

grupos e pede a cada um deles que liste, em tópicos, as prin-

cipais diferenças e semelhanças encontradas em cada seção

do livro. Com base nisso, o professor explica para a turma as

especificidades de cada gênero, bem como a interpenetração

entre eles.

Num segundo momento, os alunos elaboram em casa

um texto para o mesmo “Concurso Interescolar de Relatos

Infantis” do qual participou a personagem Iholdi. Vale tudo:

carta, conto, crônica e até poema, histórias verídicas ou to-

talmente inventadas.

Como encerramento da atividade, sugere-se a leitura em

voz alta de alguns textos – que pode ser feita pelo próprio

autor ou por um de seus colegas – e/ou a criação de um blog

com todo o material produzido.

elaboração do guia Carolina serra azul, mestre em Letras pela faculdade

de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo);

preparação Fabio Weintraub; revisão Carla Mello Moreira.

Para o professor

• mUrAIL, Marie aude. Tantã. São Paulo:Edições Sm, 2009.

o irmão mais velho do adolescente, Kléber, é deficiente mental. Embora pareça adulto, ele age como uma criança pequena: apronta travessuras, conversa com bichos de pelúcia e dá confiança para qualquer um. A fim de evitar sua internação pelo pai, Kléber passa a cuidar dele, contribuindo para sua inserção na sociedade.

• PAronUzzI, fred. Dez anos e novemeses. São Paulo: Edições Sm, 2011.

outro livro que, como Os segredos de Iholdi, tira partido do contraponto entre perspectiva infantil e problemas adultos – no caso, xenofobia, violência contracriança, depressão e doença de Alzheimer,desafios enfrentados com humor ecoragem pelo pré-adolescente frédéric, emmeio à animação dos anos 1970.

• sTaLLoNI, Yves. Os gêneros literários.rio de Janeiro: Difel, 2003.

Breve passeio sobre a origem da noção de gênero e sobre os traços característicos dos gêneros lírico, épico e dramático.

filmes

Para o aluno

• O ano em que meus pais saíramde férias. Brasil, 2006. Direção: CaoHamburguer. 115 min.

em plena ditadura, os pais de Mauro, menino de 12 anos, saem repentinamente de férias, entregando o filho aos cuidados do avô paterno. refletindo sobre a estranha ausência dos pais, aos poucos o adolescente vai entendendo o momento grave que o país atravessa.

Para o professor

• Os incompreendidos (Les Quatre centcoups). França, 1959. Direção: FrançoisTruffaut. 93 min.

o filme aborda a transição da infância à vida adulta, discutindo o papel de certas instituições sociais. A personagem principal, Antoine Doinel, é um jovem que se sente inadequado tanto na escola quanto no seio familiar. Procura, então, refúgio na arte, sobretudo na literatura e no cinema.