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pesquisada? Ao todo 2725 jovens do Município de São Paulo responderam ao questionário, sendo 50,8% do sexo mascu- lino e 48,4% do sexo feminino. Em relação à idade dos par- ticipantes, a maioria – aproximadamente 70% da amostra – encontrava-se na faixa etária entre 15 e 17 anos. Quan- to ao IPVS (Índice Paulista de Vulnerabilidade Social Fun- dação do sistema Estadual de Análise de Dados – SEADE (2005). In: http:// www.seade.gov.br) houve uma distribuição da amostra proporcional aos grupos de baixa, média e alta vulnerabilidade da população de jovens da cidade, conforme apresentado no Mapa da Vulnerabilidade Social do Municí- pio de São Paulo. Como foi a escolha de valores sobre os quais os adolescentes foram questionados? A partir de um modelo proposto por uma organização americana não lucrativa, o Search Institute, que existe desde 1958 e trabalha no intuito de promover o bem estar de crian- ças e adolescentes. Tal modelo foi construído por meio de am- plo levantamento bibliográfico de forma a deslocar (esse mo- delo desloca) o foco dos problemas que os jovens representam, para a importância das relações positivas, as oportunidades, as habilidades e os valores em suas vidas. Esse modelo per- mitiu compreender a influência crítica desses fatores para um desenvolvimento saudável dos adolescentes e a construção de um questionário, - viors”, “A&B”, adaptado a nossa realidade e utilizado como instrumento de pesquisa. Quais foram os valores questionados? Na pesquisa nós apresentamos os valores positivos agrupados em valores externos e internos. Os valores externos foram agrupados em quatro categorias: Apoio, Capacitação, Limites e Expectativas e Uso Construtivo do Tempo; e os va- lores internos foram agrupados nas categorias: Compromisso com o Aprendizado, Valores Positivos, Competências Sociais e Identidade Positiva. O que mais chamou atenção nos resultados? Com base nos resultados, desenvolvemos uma re- flexão em torno dos aspectos que significam força (F) para os nossos jovens e aqueles que podem ser interpretados como necessidades (N). De forma breve, os (aspectos) valores que representam força, ou seja, influenciam o desenvolvimento saudável dos adolescentes, foram: a percepção do apoio que é oferecido pela família, do futuro de forma positiva e da alta expectativa em pais e professores. Os resultados também evi- denciaram altos índices no que se refere a valores tais como cuidado, integridade, honestidade e responsabilidade. Mas houve vários fatores interpretados como ne- cessidades? Drª Ida: Sim. Entre esses fatores estão: o diálogo, como estra- tégia educativa é pouco presente nas relações familiares; os professores e adultos são pouco percebidos como modelos e figuras de apoio; os jovens percebem pouco envolvimento dos pais na escola; se sentem pouco valorizados pela comunidade e nela se sentem inseguros; os limites impostos pela família, escola e comunidade, (que é) são percebidos (percebida) apenas pela metade dos jovens. Essa população, de forma geral, não está usando o tempo de forma criativa. Como eles vêem a escola, nesse processo de desen- volvimento pessoal saudável? Mais da metade dos jovens evidencia estar engajada no processo de aprendizagem, motivada para sair-se bem na es- cola e ligado à escola. A escola aparece como importante espa- ço de socialização, mas deixa de cumprir seu objetivo principal já que apenas 5,5% dos participantes referem sucesso na escola. Outro dado, nesse processo, que precisa ser evidenciado, é que poucos jovens lêem por prazer e em geral dedicam pouco tem- po para as tarefas de casa. Que outros dados foram revelados pela pesquisa? A pesquisa também revelou que: a maior parte dos jo- vens faz uso de bebidas alcoólicas; menos da metade dos jovens revela ter as habilidades nos relacionamentos interpessoais e com pessoas de diferentes culturas, bem como para projetar o futuro e fazer escolhas; a maioria (cerca de 60%), revela optar pela reso- lução pacífica de conflitos; a minoria (cerca de 40%) dos jovens sente estar no controle daquilo que ocorre com eles. Por outro lado observamos grandes diferenças em relação às questões de gênero, mais acentuadas do que aquelas relativas ao IPVS. O que esses resultados indicam? O que os resultados vêm indicando, é que existe uma relação entre valores positivos e comportamentos de risco, ou seja, quanto mais valores se encontram presentes, menos com- portamentos de risco são observados entre os jovens. Eles su- gerem uma inversão na forma de abordar o adolescente: com o olhar em um horizonte que visa à promoção de saúde ao invés de fixar-se no risco, ações poderiam ser desenvolvidas no sen- tido de fortalecer os valores positivos, os recursos internos dos jovens e os recursos comunitários. Como vão ser utilizados esses resultados? Além de o projeto haver fornecido uma forma adapta- da à nossa realidade do Questionário A&B, acredito que os re- sultados serviram para traçar um retrato de jovens paulistanos, ponto de partida para geração de estratégias de promoção de saúde para esta população, co-construídas com a comunidade. Cabe observar que tais resultados não podem ser generaliza- dos, já que podem diferir em função do contexto. C - quisados? De forma geral nossos jovens: percebem pouco apoio positivo nas relações intergeracionais e (percebem) falta de oportunidades para o desenvolvimento de liderança; percebem falta de espaço na comunidade e dela se sentem desconectados; evidenciam que sua experiência com limites é inconsistente; evidenciam falhas na construção de competências sociais e de valores positivos. Manter tal padrão é manter os jovens susceptíveis ao risco e mal equipados para tornarem-se a próxima geração. Para compreender como esse padrão é mantido devemos aten- tar para: a falta dos pais na vida dos filhos; o silêncio dos adul- tos em torno de limites e valores; a fragmentação dos sistemas sociais; a segregação por idade em nosso meio e a falta de em- penho dos adultos para a construção de vínculos significati- vos com os jovens; a super-exposição dos jovens à mídia e na mídia, de forma negativa; a pobreza que impede o acesso a programas e serviços e famílias não equipadas para cuidar de suas crianças; medo dos adultos de se envolverem com os jo- vens pela crença corrente de que estes são responsabilidade de outros; instituições não equipadas para tornarem-se espaço de suporte, cuidado e desafio positivo. A entrevista dessa edição da Revista Contato é com a professora Drª Ida Kublikowski, integrante do Departamento de Psicologia do Desenvolvimento da Faculdade de Psicologia e do Programa de Estudos Pós- Graduados em Psicologia Clínica da PUC-SP. Ela participou da pesquisa sobre “Os Valores positivos e o desenvolvimento do adolescente: da vulnerabilidade à responsabilidade”, reali- zada em 2007, com 2725 adolescentes paulis- tanos, com idade entre 15 e 17 anos. O intuito foi o de mapear os valores presentes em jovens paulistanos com vistas ao desenvolvimento de estratégias de promo- ção de saúde para essa população. Os resultados indica- ram que existe uma rela- ção inversa entre valores positivos e com- portamentos de risco, ou seja, quanto mais valores se encontram presentes, menos com- portamentos de risco são observados entre os jovens. A pesquisa, que foi coordenada pela Profª Drª Rosa M. S. de Macedo, e contou, como pesquisadoras, com as professoras Drª Ida Kublikowski, da PUCSP, Drª Cristina M. Esper B. Esper Berthoud, da UNITAU, Ligia Rosa de R. Pimenta, que é Coordenadora do Programa Ação Família da Secretaria Muni- cipal de Assistência e Desenvolvimento, foi feita numa parceria entre o Consulado Geral dos Estados Unidos da América em São Pau- lo, Fundação Abrinq, Fundação Bank Boston, ONG Meninos do Morumbi, Search Institute e SENAC.

Os valores positivos e o desenvolvimento do adolescente

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Os valores positivos e o desenvolvimento do adolescente: da vulnerabilidade à responsabilidade

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Page 1: Os valores positivos e o desenvolvimento do adolescente

pesquisada?

Ao todo 2725 jovens do Município de São Paulo responderam ao questionário, sendo 50,8% do sexo mascu-lino e 48,4% do sexo feminino. Em relação à idade dos par-ticipantes, a maioria – aproximadamente 70% da amostra – encontrava-se na faixa etária entre 15 e 17 anos. Quan-to ao IPVS (Índice Paulista de Vulnerabilidade Social Fun-dação do sistema Estadual de Análise de Dados – SEADE (2005). In: http:// www.seade.gov.br) houve uma distribuição da amostra proporcional aos grupos de baixa, média e alta vulnerabilidade da população de jovens da cidade, conforme apresentado no Mapa da Vulnerabilidade Social do Municí-pio de São Paulo.

Como foi a escolha de valores sobre os quais os adolescentes foram questionados?

A partir de um modelo proposto por uma organização americana não lucrativa, o Search Institute, que existe desde 1958 e trabalha no intuito de promover o bem estar de crian-ças e adolescentes. Tal modelo foi construído por meio de am-plo levantamento bibliográfico de forma a deslocar (esse mo-delo desloca) o foco dos problemas que os jovens representam, para a importância das relações positivas, as oportunidades, as habilidades e os valores em suas vidas. Esse modelo per-mitiu compreender a influência crítica desses fatores para um desenvolvimento saudável dos adolescentes e a construção de um questionário, -viors”, “A&B”, adaptado a nossa realidade e utilizado como instrumento de pesquisa.

Quais foram os valores questionados?

Na pesquisa nós apresentamos os valores positivos agrupados em valores externos e internos. Os valores externos foram agrupados em quatro categorias: Apoio, Capacitação, Limites e Expectativas e Uso Construtivo do Tempo; e os va-lores internos foram agrupados nas categorias: Compromisso com o Aprendizado, Valores Positivos, Competências Sociais e Identidade Positiva.

O que mais chamou atenção nos resultados?

Com base nos resultados, desenvolvemos uma re-flexão em torno dos aspectos que significam força (F) para os nossos jovens e aqueles que podem ser interpretados como necessidades (N). De forma breve, os (aspectos) valores que representam força, ou seja, inf luenciam o desenvolvimento saudável dos adolescentes, foram: a percepção do apoio que é oferecido pela família, do futuro de forma positiva e da alta expectativa em pais e professores. Os resultados também evi-denciaram altos índices no que se refere a valores tais como cuidado, integridade, honestidade e responsabilidade.

Mas houve vários fatores interpretados como ne-cessidades?

Drª Ida: Sim. Entre esses fatores estão: o diálogo, como estra-tégia educativa é pouco presente nas relações familiares; os professores e adultos são pouco percebidos como modelos e figuras de apoio; os jovens percebem pouco envolvimento dos pais na escola; se sentem pouco valorizados pela comunidade e nela se sentem inseguros; os limites impostos pela família, escola e comunidade, (que é) são percebidos (percebida) apenas pela metade dos jovens. Essa população, de forma geral, não está usando o tempo de forma criativa.

Como eles vêem a escola, nesse processo de desen-volvimento pessoal saudável?

Mais da metade dos jovens evidencia estar engajada no processo de aprendizagem, motivada para sair-se bem na es-cola e ligado à escola. A escola aparece como importante espa-ço de socialização, mas deixa de cumprir seu objetivo principal já que apenas 5,5% dos participantes referem sucesso na escola. Outro dado, nesse processo, que precisa ser evidenciado, é que poucos jovens lêem por prazer e em geral dedicam pouco tem-po para as tarefas de casa.

Que outros dados foram revelados pela pesquisa?

A pesquisa também revelou que: a maior parte dos jo-vens faz uso de bebidas alcoólicas; menos da metade dos jovens revela ter as habilidades nos relacionamentos interpessoais e com pessoas de diferentes culturas, bem como para projetar o futuro

e fazer escolhas; a maioria (cerca de 60%), revela optar pela reso-lução pacífica de conflitos; a minoria (cerca de 40%) dos jovens sente estar no controle daquilo que ocorre com eles. Por outro lado observamos grandes diferenças em relação às questões de gênero, mais acentuadas do que aquelas relativas ao IPVS.

O que esses resultados indicam?

O que os resultados vêm indicando, é que existe uma relação entre valores positivos e comportamentos de risco, ou seja, quanto mais valores se encontram presentes, menos com-portamentos de risco são observados entre os jovens. Eles su-gerem uma inversão na forma de abordar o adolescente: com o olhar em um horizonte que visa à promoção de saúde ao invés de fixar-se no risco, ações poderiam ser desenvolvidas no sen-tido de fortalecer os valores positivos, os recursos internos dos jovens e os recursos comunitários.

Como vão ser utilizados esses resultados?

Além de o projeto haver fornecido uma forma adapta-da à nossa realidade do Questionário A&B, acredito que os re-sultados serviram para traçar um retrato de jovens paulistanos, ponto de partida para geração de estratégias de promoção de saúde para esta população, co-construídas com a comunidade. Cabe observar que tais resultados não podem ser generaliza-dos, já que podem diferir em função do contexto.

C -quisados?

De forma geral nossos jovens: percebem pouco apoio positivo nas relações intergeracionais e (percebem) falta de oportunidades para o desenvolvimento de liderança; percebem falta de espaço na comunidade e dela se sentem desconectados; evidenciam que sua experiência com limites é inconsistente; evidenciam falhas na construção de competências sociais e de valores positivos.

Manter tal padrão é manter os jovens susceptíveis ao risco e mal equipados para tornarem-se a próxima geração. Para compreender como esse padrão é mantido devemos aten-tar para: a falta dos pais na vida dos filhos; o silêncio dos adul-tos em torno de limites e valores; a fragmentação dos sistemas sociais; a segregação por idade em nosso meio e a falta de em-penho dos adultos para a construção de vínculos significati-vos com os jovens; a super-exposição dos jovens à mídia e na mídia, de forma negativa; a pobreza que impede o acesso a programas e serviços e famílias não equipadas para cuidar de suas crianças; medo dos adultos de se envolverem com os jo-vens pela crença corrente de que estes são responsabilidade de outros; instituições não equipadas para tornarem-se espaço de suporte, cuidado e desafio positivo.

A entrevista dessa edição da Revista Contato é com a professora Drª Ida Kublikowski, integrante do Departamento de Psicologia do Desenvolvimento da Faculdade de Psicologia e do Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia Clínica da PUC-SP. Ela participou da pesquisa sobre “Os Valores positivos e o desenvolvimento do adolescente: da vulnerabilidade à responsabilidade”, reali-zada em 2007, com 2725 adolescentes paulis-tanos, com idade entre 15 e 17 anos.

O intuito foi o de mapear os valores presentes em jovens paulistanos com vistas ao desenvolvimento de estratégias de promo-ção de saúde para essa população.

Os resultados indica-ram que existe uma rela-

ção inversa entre valores positivos e com-portamentos de risco, ou seja, quanto mais valores se encontram presentes, menos com-portamentos de risco são observados entre os jovens.

A pesquisa, que foi coordenada pela Prof ª Drª Rosa M. S. de Macedo, e contou, como pesquisadoras, com as professoras Drª Ida Kublikowski, da PUCSP, Drª Cristina M. Esper B. Esper Berthoud, da UNITAU, Ligia Rosa de R. Pimenta, que é Coordenadora do Programa Ação Família da Secretaria Muni-cipal de Assistência e Desenvolvimento, foi feita numa parceria entre o Consulado Geral dos Estados Unidos da América em São Pau-lo, Fundação Abrinq, Fundação Bank Boston, ONG Meninos do Morumbi, Search Institute e SENAC.