out(5)

  • Upload
    amdtz

  • View
    218

  • Download
    1

Embed Size (px)

DESCRIPTION

lkjsfdal asdkljlkl

Citation preview

  • Temtica Livre Artigo original

    DOI 10.5752/P.2175-5841.2012v10n28p1435

    Horizonte, Belo Horizonte, v. 10, n. 28, p. 1435-1457, out./dez. 2012 ISSN 2175-5841 1435

    Dilema epistemolgico do Ensino Religioso e formao docente1 Epistemological Dilemma of Religious Education and teacher training

    Wilian Ramos Marcos

    Resumo

    A proposta deste artigo abordar a temtica do ensino religioso sob a perspectiva do dilema

    epistemolgico, tendo por escopo identificar uma possvel contribuio formao docente por meio da

    rea de conhecimento referente s Cincias da Religio. Nesse sentido, procurou-se traar um caminho

    que comea pela apresentao do dilema epistemolgico do ensino religioso, sob a tica da relao

    histrica, no Brasil, entre Estado e Religio, destacando as categorias pblico e privado. Feito isso, passa-

    se a uma abordagem de modelos tericos da disciplina, enquanto categorias de anlise, que servem de

    referncia de estudo e compreenso da temtica. Nesse ponto, destacam-se os modelos catequtico,

    teolgico e das Cincias da Religio. Ao final desse percurso, procurou-se estabelecer a relao entre

    modelo das Cincias da Religio, pluralismo religioso e pequenas aproximaes questo da formao

    docente, tendo como referncia dados que dizem respeito, sobretudo, presena do ensino religioso em

    Minas Gerais.

    Palavras-chave: Ensino Religioso. Dilema epistemolgico. Cincias da Religio. Formao docente.

    Abstract This article addresses the issue of Religious Education from the perspective of epistemological dilemma

    and seeks to identify contributions to the teaching training through the formation of Religious Sciences.

    The text traces a path that presents the religious dilemma of Religious Teaching from the perspective of

    the historical relationship, in Brazil, between State and Religion, highlighting the categories of public and

    private. The text also discusses the theoretical models of the discipline `Religious Education`, as analytical

    categories that serve as a reference point of study and reference of such discipline. In sum, the present

    study highlights the Catechetical and the Theological models of `Sciences of Religion`, religious pluralism,

    and teacher formation, taking as reference the data concerning the presence of `Religious Education in

    the State of Minas Gerais, Brazil.

    Keywords: Religious Education. Epistemological dilemma. Religion Sciences. Teacher training.

    Artigo recebido em 21 de julho de 2012 e aprovado em 30 de outubro de 2012. 1 Este artigo apresenta parte de resultados de estudo realizado pelo autor no Curso de Mestrado em Cincias da Religio da PUC -

    Minas. Maiores informaes em texto completo podem ser encontradas no seguinte endereo: http://www.sistemas.pucminas.br/BDP/SilverStream/Pages/pg_ConsItem.html. Acesso em 21 de julho de 2012. Mestre em Cincias da Religio pela PUC-Minas, graduado em Filsofia pelo UNILESTEMG, professor da Faculdade Presidente Antnio Carlos de Itabira e da Rede Municipal de Itabira. Brasil. E-mail: [email protected]

  • Wilian Ramos Marcos

    Horizonte, Belo Horizonte, v. 10, n. 28, p. 1435-1457, out./dez. 2012 ISSN 2175-5841 1436

    Introduo

    O ensino religioso (ER) est presente no contexto educacional brasileiro

    desde os tempos da Colnia. Segundo os Parmetros Curriculares Nacionais do

    Ensino Religioso (PCNERs), no perodo de 1500 a 1800 foi entendido como ensino

    da religio oficial, isto , enquanto elemento eclesial na escola, como se fosse uma

    extenso, uma parte da Igreja Catlica presente no meio escolar. Nessa condio, o

    ER foi entendido como catequese eclesial (PCNERs, 1997).

    A partir da implantao da Repblica (1889), o ER passou a ser questionado,

    tendo como pano de fundo as discusses que giram em torno da separao entre

    Igreja e Estado. Esses questionamentos propiciaram o surgimento de esforos no

    sentido de conceber o ER no mais como catequese eclesial. Entretanto, o mesmo

    continuou sendo pensado em referncia a alguma confisso religiosa, da

    resultando a denominao de modelo confessional. Em 1961, com a primeira Lei de

    Diretrizes e Bases da Educao Nacional (LDBEN), a Lei n. 4.024, ocorreu a

    homologao desse modelo (OLIVEIRA et al., 2007).

    Atualmente, existem esforos no sentido de construir uma proposta de ER

    diferente do modelo confessional. Nessa perspectiva, podem-se destacar duas

    linhas significativas. Uma a proposta do ER como educao da religiosidade.

    Esta, por sua vez, entendida como dimenso fundamental do ser humano. Um

    representante dessa linha Wolfgang Gruen, que compreende a religiosidade como

    a atitude de abertura dinmica realizada pelo ser humano e direcionada ao sentido

    radical de sua existncia. Outra proposta a que procura fundamentar o ER no

    modelo das Cincias da Religio, baseando-se na argumentao de que os estudos

    realizados nesse campo constituem-se como rea de conhecimento que pode

    sustentar o ER como disciplina escolar.

  • Temtica Livre - Artigo: Dilema epistemolgico do Ensino Religioso e formao docente

    Horizonte, Belo Horizonte, v. 10, n. 28, p. 1435-1457, out./dez. 2012 ISSN 2175-5841 1437

    1 Dilema epistemolgico do ensino religioso

    Tomando como ponto de partida a incluso do ensino religioso nos textos

    constitucionais e tambm na legislao educacional, possvel lanar um olhar

    sobre a disciplina a partir do enfoque da relao entre Estado e religies, de modo

    particular, a partir do perodo republicano, no qual o Estado brasileiro passou a ser

    compreendido em carter laico. As vozes defensoras do Estado laico, de maneira

    geral, entendem que o ensino religioso corresponderia a uma concesso, ou mesmo

    ingerncia religiosa, em questes de laicidade.

    A esse respeito, Vaidergon (2008)2 qualifica a disciplina como herana do

    que chama de autoritarismo religioso, fazendo referncia, sobretudo, no

    aceitao imediata da separao com o Estado por parte da Igreja Catlica3,

    passando pela imposio da Educao Moral e Cvica durante a ditadura militar de

    1964 e culminando com a [...] concorrncia religiosa nas escolas pblicas em pleno

    regime democrtico (VAIDERGON, 2008, p. 407). Em sntese, o posicionamento

    desse autor pode ser entendido da seguinte maneira:

    A tradio autoritria persiste no ensino religioso. Por mais que se queira atualizar, renovar e descaracterizar sua gnese, permanece o intento das religies de influir na sociedade civil e nos poderes da Repblica, atravs da educao. A f, que na promessa iluminista, deveria se manter no mbito privado, cada vez mais, no mundo e no Brasil, se torna fator de poltica pblica, por vezes combatendo a razo e o conhecimento cientfico e legitimando aes antidemocrticas tal como na poca da ditadura. (VAIDERGON, 2008, p. 410-411).

    Na Constituio Federal de 1988, a religio constitui direito individual,

    segundo o artigo 5, VI, ou seja, assunto de mbito privado. A educao, por sua

    vez, segundo o artigo 6 da mesma Carta Magna, constitui-se como direito social,

    em outras palavras, situada no mbito pblico. O ensino religioso, por meio do

    2 Doutor em Educao e professor do Departamento de Cincias da Educao e do Programa de Ps-Graduao em Educao Escolar,

    da Faculdade de Cincias e Letras da Universidade Estadual Paulista (UMESP, Araraquara). 3 Segundo Vaidergon (2008, p. 407): Depois do Imprio, onde o padroado estabeleceu o vnculo entre o poder monrquico e o

    catolicismo como religio oficial, a Repblica, mesmo estando constitucionalmente separada da Igreja, desta sempre sofreu, de forma mais ou menos explcita, a presso ideolgica pelo comando de coraes e mentes de seus cidados.

  • Wilian Ramos Marcos

    Horizonte, Belo Horizonte, v. 10, n. 28, p. 1435-1457, out./dez. 2012 ISSN 2175-5841 1438

    artigo 210, 1, foi assegurado nas escolas pblicas em carter facultativo. Dessa

    forma, segundo Pauly (2004), a Constituio:

    [...] situa o ensino religioso no espao, ao mesmo tempo pblico (escola) e privado (liberdade de conscincia). Essa localizao ambgua implica dilema epistemolgico. A LDBEN tenta super-lo pela: a) proibio do proselitismo; b) freqncia optativa; c) no-integralizao da carga horria da disciplina nas 800 horas; e) concesso do direito audio pelo sistema de ensino de entidade civil representativa das igrejas. (PAULY,

    2009).

    O entendimento de que o Ensino Religioso configura presena ambgua do

    privado em ambiente pblico decorre da compreenso da disciplina em estreita

    ligao com as religies. O carter facultativo, bem como o posicionamento da

    LDBEN (Lei n. 9.394/1996) ao conferir aos sistemas de ensino a competncia de

    estabelecimento dos contedos do ensino religioso e a tarefa de definio da

    qualificao e admisso de professores, podem ser entendidos como reflexo dessa

    posio ambgua da disciplina. No se pode deixar de destacar, tambm, como

    reflexo dessa ambiguidade, que o Ministrio da Educao e Cultura ainda no

    assumiu a tarefa de estabelecer qual seria a habilitao desse professor em mbito

    nacional.

    Para preservar a liberdade de crena, que se configura como aspecto

    privado, a legislao assegura o carter facultativo. Nesse caminho, quando a

    legislao deixa a cargo dos sistemas de ensino a definio de contedos e

    estabelece que essa tarefa se realize por meio da audio de entidade civil

    constituda por representantes religiosos, fica claro que h a compreenso de que

    se procura preservar e respeitar as particularidades regionais religiosas. A questo

    central que se coloca a compreenso do ensino religioso ligado s tradies

    religiosas, implicando, assim, o dilema epistemolgico. Isso se d medida que a

    epistemologia do ensino religioso diz respeito a aspectos tericos e metodolgicos,

    fazendo referncia a uma rea de conhecimento especfica que tem a religio como

    objeto de estudo.

  • Temtica Livre - Artigo: Dilema epistemolgico do Ensino Religioso e formao docente

    Horizonte, Belo Horizonte, v. 10, n. 28, p. 1435-1457, out./dez. 2012 ISSN 2175-5841 1439

    O dilema epistemolgico est presente medida que o ensino religioso busca

    fundamentar-se em um conhecimento sobre o religioso que tem suas fontes nas

    tradies religiosas. Entretanto, importante ressaltar que a atividade de ensino

    se d a partir de contedos a serem difundidos, contedos que podem vir do senso

    comum, de tradies religiosas ou do acmulo das pesquisas cientficas, no caso

    das cincias (PASSOS, 2007, p. 27).

    Passos (2007), na perspectiva curricular, esclarece que se pode fazer uma

    distino entre o ensino que reproduz e o ensino que produz conhecimento. As

    tradies religiosas se situam na primeira condio citada. Isso devido s suas

    caractersticas de repassar s geraes, de forma espontnea ou sistemtica, suas

    tradies por meio da catequese, isto , sua preocupao fundamental objetiva a

    reproduo da doutrina confessional. Com relao escola, muito embora no

    exclua o primeiro tipo de ensino, isto , aquele que reproduz, situa-se

    primordialmente no segundo, ou seja, no ensino que produz conhecimento e

    pretende transmitir e discutir os resultados e processos de produo das cincias

    com os educandos. Dessa forma, Passos (2007, p. 28) esclarece que:

    O ER escolar, exatamente por ser escolar, justifica-se como componente curricular enquanto expresso de uma abordagem cientfica. O processo de ensino-aprendizagem pode e deve decodificar valores e tradies, porm, dentro de um discurso regrado por fundamentos tericos e regras metodolgicas, ou seja, dentro de uma dinmica lgica enraizada nas cincias. (PASSOS, 2007, p.28).

    Ainda segundo Passos (2007, p. 28), pode-se constatar que h [...] carncia

    histrica de uma base epistemolgica para o ER, que permanece, quase sempre,

    vinculado s tradies religiosas e termina por reproduzi-la nos currculos

    escolares. Os esforos que vm sendo empreendidos no sentido de conceber o

    ensino religioso como rea de conhecimento, desvinculado do carter confessional,

    foram desconsiderados no momento em que houve a promulgao do Acordo

    Brasil-Santa S e a consequente recorrncia da confessionalidade para o ensino

    religioso. Mais uma vez, fica claro que h dificuldade de pensar a disciplina

  • Wilian Ramos Marcos

    Horizonte, Belo Horizonte, v. 10, n. 28, p. 1435-1457, out./dez. 2012 ISSN 2175-5841 1440

    desvinculada das tradies religiosas, sobretudo por parte dos legisladores, o que

    torna no muito fcil a superao do dilema epistemolgico da disciplina.

    2 Trs modelos de ensino religioso

    Feita a apresentao, em linhas gerais, do dilema epistemolgico do ensino

    religioso, neste tpico, a abordagem ser realizada a partir da tica de trs modelos,

    a saber: modelo catequtico, modelo teolgico e modelo das Cincias da Religio.

    Essa escolha se deve ao fato de que ela permite uma abordagem com maior alcance

    sobre a disciplina a partir da perspectiva epistemolgica. A opo por trs modelos

    foi apresentada por Passos (2007), em obra na qual argumenta em favor do modelo

    das Cincias da Religio como aquele que melhor responde aos desafios

    apresentados ao ensino religioso. Os desafios se colocam em funo do lastro

    histrico de disputa poltica que envolve a disciplina, ou mesmo em funo da

    compreenso dela como rea de conhecimento e, principalmente, considerando o

    dilema epistemolgico, ainda no resolvido. Soares (2009, p. 314), ao refletir

    acerca da opo por trs modelos, esclarece melhor as razes dessa escolha, como

    se pode perceber a seguir:

    Por que esses trs modelos e no outros? Passos opta por uma viso diacrnica do ER no Brasil, que vai do longo perodo histrico em que ensinar religio equivalia a iniciar o aluno nos mistrios cristos (e, principalmente, na tradio catlica) at a situao contempornea, que concilia desconfiana contra as instituies e atrao por novas espiritualidades. Por essa razo, nosso autor prefere dispor os trs modelos numa certa seqncia cronolgica. (SOARES, 2009, p. 314).

    O enfoque diacrnico possibilita uma viso mais ampla acerca da disciplina

    em suas grandes linhas, sobretudo considerando-a a partir de um olhar mais

    abrangente, que procura localizar a passagem da vinculao do ensino religioso s

    tradies religiosas por meio da tica teolgica at a iniciao de processo

    emancipatrio da disciplina, ocorrido a partir do estabelecimento de sua rea de

  • Temtica Livre - Artigo: Dilema epistemolgico do Ensino Religioso e formao docente

    Horizonte, Belo Horizonte, v. 10, n. 28, p. 1435-1457, out./dez. 2012 ISSN 2175-5841 1441

    conhecimento, este, por sua vez, realizada por meio da Resoluo n. 2/1998. Ainda

    a respeito do enfoque dado disciplina sob a perspectiva de abertura para alm do

    mbito teolgico, pode-se dizer que:

    A partir de 1997, com a reviso do artigo 33 da LDB, estabeleceu-se nova concepo para o Ensino Religioso. Seu foco deixou de ser teolgico para assumir um perfil pedaggico de re-leitura das questes religiosas da sociedade, baseado na compreenso de rea de conhecimento e orientado pelos Parmetros Curriculares Nacionais. (OLIVEIRA et al., 2007, p. 58).

    Partindo da ideia de que a compreenso do ensino religioso como rea de

    conhecimento proporcionou a releitura da disciplina, deixando a perspectiva

    teolgica, convm ressaltar que, por uma questo de rigor no uso dos termos, seria

    melhor no tratar o ensino religioso como rea de conhecimento autnoma em

    paridade com, por exemplo, a Sociologia, as Cincias Jurdicas ou a Matemtica

    (SOARES, 2009, p. 313). No seria interessante essa paridade, sobretudo, porque:

    Infelizmente, ainda no termos clareza nos setores envolvidos com o tema do Ensino Religioso MEC, profissionais da educao, lideranas religiosas, autoridades polticas e porta-vozes da opinio pblica sobre qual deva ser a justa relao entre o tipo de conhecimento adquirido sobre a experincia religiosa da humanidade e os procedimentos pedaggicos

    para apresent-la a nossos jovens cidados. (SOARES, 2009, p. 313).

    A falta de clareza aponta a necessidade de buscar um aprofundamento maior

    acerca do ensino religioso, sobretudo do ponto de vista epistemolgico. Nesse

    sentido, a abordagem a partir dos modelos pode contribuir muito para que se

    avance na discusso.

    importante destacar que, do ponto de vista geogrfico, h no territrio

    nacional experincias diversificadas de ensino religioso. Experincias que se

    consolidaram levando em conta a expresso de jogos de fora locais, bem como a

    atuao de agentes especializados, da Passos (2007, p. 52) esclarece que:

  • Wilian Ramos Marcos

    Horizonte, Belo Horizonte, v. 10, n. 28, p. 1435-1457, out./dez. 2012 ISSN 2175-5841 1442

    Os modelos que estabelecem as prticas do ER podem esconder em sua singularidade a realidade plural dessas prticas com suas peculiaridades localizadas no tempo e no espao, marcadas sempre por traos tendenciais, mas tambm por misturas de elementos. Os modelos aqui apresentados captam as propenses predominantes nas prticas de ER, com base no critrio de fundamentao epistemolgica. (PASSOS, 2007, p. 52).

    O modelo catequtico o mais antigo e relaciona-se aos contextos histricos

    nos quais a religio, sobretudo o catolicismo, gozava de hegemonia na sociedade

    brasileira. A esse respeito importante citar os perodos Colonial e Imperial, nos

    quais ainda havia a unio entre Estado e Igreja Catlica sob o regime de padroado.

    Nesses perodos, o modelo catequtico no encontrou grandes problemas para se

    manter em funo do fato de quase coincidir a opo religiosa pela tradio

    hegemnica e a cidadania. Esse modelo representa a educao da f, ou seja, a

    aprendizagem centrada no aspecto da transmisso de contedo pela via da

    experincia de f. Com o advento da modernidade e da reforma protestante nesse

    processo e a consequente intolerncia religiosa, o modelo catequtico adquiriu

    caractersticas apologticas do catolicismo de maneira que [...] a catequese era

    vista como instruo, como uma prtica escolar voltada para a formao das ideias

    corretas, em oposio s ideias falsas (PASSOS, 2007, p. 56-57).

    Apesar de o modelo catequtico situar-se historicamente nos perodos

    colonial e imperial, e, tambm, de as orientaes catequticas fazerem distino

    entre a educao da f e o ensino religioso, sua prtica persiste ainda hoje4, seja

    implcita ou explicitamente, sob o patrocnio de diversas igrejas e pela prpria

    Igreja Catlica. O que fere o esprito laico do Estado brasileiro e esconde intenes

    proselitistas.

    No Brasil, tanto a excluso do ER das escolas com a implantao da Repblica e a Constituio de 1891, quanto sua incluso nas diversas Constituies, a partir da dcada de 1930, fizeram que ele ficasse ligado intimamente com a confessionalidade. (PASSOS, 2007, p. 57).

    4 A respeito da persistncia do modelo catequtico, importante citar o emblemtico caso do estado do Rio de Janeiro no qual ele se

    apresenta implcito no modelo confessional adotado. Para uma melhor compreenso da problemtica gerada por esse modelo, importante consultar Cavaliere (2007).

  • Temtica Livre - Artigo: Dilema epistemolgico do Ensino Religioso e formao docente

    Horizonte, Belo Horizonte, v. 10, n. 28, p. 1435-1457, out./dez. 2012 ISSN 2175-5841 1443

    Essa ligao implcita do modelo catequtico com o confessional pode ser

    percebida na persistncia em matria legislativa do carter facultativo do ensino

    religioso, bem como na continuidade entre as comunidades religiosas e escolas, por

    meio da produo, no interior destas ltimas, de espaos para a formao religiosa

    (PASSOS, 2007, p. 57). Essa modalidade de ensino religioso, devido sua

    caracterstica de reproduzir mtodos e ao pedaggica de confisses religiosas, s

    poderia continuar existindo no meio escolar em contexto de separao Igreja-

    Estado por meio de acordos entre esses poderes. Nesse sentido, convm ressaltar o

    Acordo Brasil-Santa S e a recorrncia da confessionalidade para o ensino

    religioso, encontrada na redao do artigo 11 da concordata do Brasil com a Santa

    S5.

    O modelo teolgico utilizado por Passos (2007) pode ser entendido como

    uma concepo de ensino religioso que busca fundamentao para alm da

    confessionalidade estrita. Nesse sentido, supera o modelo catequtico, pois procura

    uma justificativa mais universal de religio, a partir do princpio da existncia de

    uma dimenso antropolgica religiosa do ser humano a ser educado. O modelo

    teolgico procura oferecer um discurso religioso e pedaggico em dilogo com as

    diversas confisses religiosas. Esse modelo moderno esteve presente nas escolas a

    partir do Conclio Vaticano II e recebe dele suas orientaes principais, assim como

    das chamadas teologias modernas (PASSOS, 2007, p. 61). Enquanto modelo que

    se situa em uma perspectiva diacrnica, inclui os modelos j citados confessional,

    ecumnico, interconfessional ou pluralista levando-se em conta que so

    diretamente influenciados, em termos epistemolgicos, a partir das reflexes

    teolgicas modernas em suas expresses ecumnicas e de dilogo inter-religioso.

    Nesse sentido:

    5 Em 11 de fevereiro de 2010, o Presidente da Repblica, Luis Incio Lula da Silva, promulgou o acordo, publicado no Dirio Oficial da

    Unio como Decreto n. 7.107, em 12 de fevereiro de 2010.

  • Wilian Ramos Marcos

    Horizonte, Belo Horizonte, v. 10, n. 28, p. 1435-1457, out./dez. 2012 ISSN 2175-5841 1444

    A teologia no configura, necessariamente, contedos confessionais nas programaes de ER, mas age, sobretudo, como um pressuposto que sustenta a convico dos agentes e a prpria motivao da ao; a misso de educar afirmada como um valor sustentado por uma viso transcendente do ser humano. (PASSOS, 2007, p.61).

    Essa caracterstica do modelo teolgico permite que ele se nutra de um

    dilogo maior entre as igrejas crists chegando at mesmo a

    [...] contemplar uma viso pluralista que inclua religies no-crists. Mas continua sendo uma catequese mais sutil, pois ainda est sob a responsabilidade de lideranas religiosas que, em ltima instncia, tm poder de deciso e veto sobre os contedos a serem ministrados nas aulas. Justamente por essa dependncia de certos interesses religiosos, ainda

    que bem mais diludos, no nos parece ser o modelo ideal para o ER nas escolas pblicas. (SOARES, 2009, p. 315).

    Considerando objees ao modelo teolgico, interessante citar Pauly

    (2009), que argumenta contra a fundamentao do ensino religioso em uma

    antropologia religiosa. Suas objees se do no sentido de questionar a existncia

    de tal antropologia. Para justificar sua posio, parte do princpio de que, na

    teologia acadmica, existem concepes antropolgicas divergentes, o que, do

    ponto de vista epistemolgico, seria pouco razovel para a disciplina (PAULY,

    2009, p. 179). Alm disso, h outros problemas que o modelo teolgico enfrenta.

    Dentre eles, pode-se citar o fato de haver o questionamento acerca da necessidade

    de uma formao religiosa para a cidadania. Em outras palavras, o problema em

    questo poderia ser entendido da seguinte maneira:

    A justificativa de que o ensino religioso um componente curricular porque integra a formao para a cidadania falsa. A suposio de que uma pessoa religiosa seja melhor, igual ou pior cidad em razo de sua crena, caracteriza clara discriminao. (PAULY, 2009, p. 174).

    Existem, tambm, questionamentos acerca do modelo teolgico que, a partir

    da perspectiva do dilema epistemolgico da disciplina, envolvem a questo da

    formao dos professores de ensino religioso. Esses aspectos sero retomados mais

    adiante, por ora, procura-se abordar a concepo de ensino religioso adotada pelo

  • Temtica Livre - Artigo: Dilema epistemolgico do Ensino Religioso e formao docente

    Horizonte, Belo Horizonte, v. 10, n. 28, p. 1435-1457, out./dez. 2012 ISSN 2175-5841 1445

    estado de Minas Gerais para, na sequncia, proceder-se apresentao do modelo

    das Cincias da Religio.

    O modelo de ensino religioso adotado em Minas Gerais possui razes nas

    reflexes pioneiras de Wolfgang Gruen, que, na dcada de 1970, procedendo em

    um esforo de superao da confessionalidade na disciplina e no intuito de

    compreend-la como elemento integrante, de fato, do meio escolar, prope o

    ensino religioso baseado na religiosidade. Nesse sentido:

    religiosidade a atitude dinmica de abertura do homem ao sentido fundamental da sua existncia, seja qual for o modo como percebido este

    sentido. No se trata apenas de uma atitude entre muitas: quando presente, a religiosidade est na raiz da vida humana na sua totalidade. (GRUEN, 1997, p. 75).

    Segundo Silva (2007, p. 60), a proposta de Gruen recebe influncias de

    autores do campo teolgico como Metz, Max Scheler e Troeltsch. No entanto, a

    fundamentao para o que compreende por religiosidade encontra suas bases no

    pensamento de Paul Tillich, que entende a religiosidade como dimenso mais

    profunda de todas as funes da vida humana, isto , da totalidade da vida humana

    (SILVA, 2007, p. 60). Essa observao de Silva (2007) pode ser percebida

    claramente no seguinte trecho: A religiosidade no uma atitude entre muitas: ela

    a raiz do conjunto das dimenses da vida da pessoa; medida que as integra, a

    religiosidade d coerncia a um projeto de vida (GRUEN, 2004, p. 413).

    A proposta de Gruen (2004) situa-se no modelo teolgico medida que

    busca suas fundamentaes em representantes da teologia moderna. A

    religiosidade, mesmo no fazendo referncia a uma confisso especfica, pressupe

    uma complementaridade de beneficiamentos mtuos entre ensino religioso e

    catequese. Em outras palavras, situa-se, ainda, na perspectiva teolgica. Nesse

    sentido, importante destacar que:

  • Wilian Ramos Marcos

    Horizonte, Belo Horizonte, v. 10, n. 28, p. 1435-1457, out./dez. 2012 ISSN 2175-5841 1446

    O ER beneficia a Catequese. D-lhe forte embasamento em termos de convivncia na diversidade; abertura macroecumnica; elaborao de sistema de valores e sentido da vida, e disposio para superar a injustia social; construo da paz. Fornece estmulos para purificar o mbito religioso de patologias nada infrequentes: radicalismos, ritualismo enfadonho, ou vistoso mas estril; contra-faces do sagrado, com intenes supostamente imexveis. (GRUEN, 2004, p. 420).

    Dantas (2004) esclarece que a Secretaria de Estado da Educao de Minas

    Gerais iniciou, em 1994, processo de implantao de um novo projeto pedaggico

    por meio da reviso e atualizao dos currculos das disciplinas; nesse sentido,

    estabeleceu diretrizes prprias para o ensino religioso. Nesse processo, foram

    contemplados referenciais tericos que buscaram enfatizar:

    reviso e amadurecimento do projeto de vida pessoal do aluno; o desenvolvimento da sua religiosidade; o reconhecimento e valorizao do pluralismo filosfico e religioso; e o incentivo participao efetiva na construo da sociedade, atravs da reflexo tica e prtica cidad.

    (DANTAS, 2004, p. 115).

    Esse autor, ao refletir sobre os modelos de ensino religioso, prope o inter-

    religioso ou pluralista, no sentido de apresent-lo como possibilidade de superao

    dos impasses surgidos nos modelos anteriores. Na compreenso de Dantas (2004),

    isso seria possvel devido s caractersticas do modelo proposto que conseguiria

    abranger as mais variadas modalidades de religiosidade, filosofias de vida,

    incluindo o agnosticismo e o atesmo. Ele argumenta, ainda, que esse modelo

    dialoga com a Antropologia Cultural, a Psicologia da Religio, a Fenomenologia da

    Religio e a Sociologia da Religio, a partir das categorias antropolgicas de

    transcendncia e alteridade. Nesse sentido, este modelo tem o mrito de superar

    uma viso unirreligiosa e pautar-se pelo dilogo entre as confisses religiosas

    presentes nas escolas (PASSOS, 2007, p. 64).

    O modelo pluralista identifica-se com a proposta do Departamento

    Arquidiocesano de Ensino Religioso (Daer), que organizou em Belo Horizonte o

    curso de Filosofia e Metodologia da Educao Religiosa como iniciativa de

  • Temtica Livre - Artigo: Dilema epistemolgico do Ensino Religioso e formao docente

    Horizonte, Belo Horizonte, v. 10, n. 28, p. 1435-1457, out./dez. 2012 ISSN 2175-5841 1447

    capacitao e formao permanente de professores de ensino religioso da rede

    pblica estadual, com atuao na Regio Metropolitana da capital mineira.

    Essa proposta, ao procurar dialogar com disciplinas como a Psicologia da

    Religio, Fenomenologia da Religio e Sociologia da Religio, j aponta uma

    abertura do ensino religioso s Cincias da Religio. No entanto, ao utilizar as

    categorias transcendncia e alteridade no consegue sair do enfoque teolgico e,

    consequentemente, no resolve o problema epistemolgico da disciplina. Para

    compreender melhor a vinculao do modelo pluralista proposto por Dantas

    (2004) ao plano teolgico, convm observar que o modelo teolgico sustenta-se na

    ideia da educao da religiosidade como um valor antropolgico, sendo que a

    dimenso transcendente marca o ser humano na sua profundidade,

    independentemente de sua confisso explcita de f (PASSOS, 2007, p. 64). Nessa

    perspectiva que se coloca como posicionamento interessante a proposta de Passos

    (2007) do modelo das Cincias da Religio.

    Com o intuito de romper com os modelos catequtico e confessional, o das

    Cincias da Religio se coloca a partir de uma postura que procura dar autonomia

    epistemolgica ao ensino religioso. importante destacar que a proposta do

    modelo das Cincias da Religio encontra-se em fase embrionria, muito embora,

    segundo Passos (2007, p. 62), j em 1995, Wolfgang Gruen, em sua obra O ensino

    religioso nas escolas, tenha sinalizado as Cincias da Religio como base

    epistemolgica para o ensino religioso.

    Outros momentos significativos de reflexo, em torno da aproximao das

    Cincias da Religio com o ensino religioso, e a possibilidade de afirmao de uma

    epistemologia decorrente desse dilogo, so, primeiramente, a realizao do IX

    Seminrio de Capacitao Docente, promovido pelo Frum Nacional Permanente

    do Ensino Religioso, na Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo (PUC-SP),

    entre os dias 3 e 4 de outubro de 2006, que, contando com apoio logstico do

    regional paulista da Sociedade de Teologia e Cincias da Religio (Soter-SP) props

  • Wilian Ramos Marcos

    Horizonte, Belo Horizonte, v. 10, n. 28, p. 1435-1457, out./dez. 2012 ISSN 2175-5841 1448

    como tema de seus trabalhos a aproximao entre a pesquisa das Cincias da

    Religio e a transposio didtica de seus resultados no ensino religioso. Como

    resultado desse evento, foi publicada em 2007 a obra Ensino religioso e formao

    docente: Cincias da Religio e ensino religioso em dilogo. No mesmo ano, Joo

    Dcio Passos publicou Ensino religioso: construo de uma proposta. Nessa obra,

    Passos (2007) apresenta os trs modelos de ensino religioso catequtico,

    confessional e teolgico e prope o modelo das Cincias da Religio. Vale

    destacar que, anteriormente, esse autor havia participado dos trabalhos do IX

    Seminrio Nacional de Capacitao Docente para o ensino religioso, onde

    apresentara elementos acerca da temtica do modelo Cincias da Religio como

    base epistemolgica do ensino religioso.

    Trata-se de um modelo mais ideal, pouco explicitado, embora embutido em muitas recomendaes mais atuais de fundamentao desse ensino, como no caso da proposta do Fonaper. Em suma, consiste em tirar as decorrncias legais, tericas e pedaggicas da afirmao do ER como rea

    de conhecimento. (PASSOS, 2007, p. 65).

    No modelo confessional h o pressuposto poltico de que o cidado teria

    direito de obter apoio do Estado para uma educao religiosa. Em contraposio,

    pode-se dizer que o modelo das Cincias da Religio prope o reconhecimento

    tanto da religiosidade quanto da religio como dados antropolgicos e

    socioculturais a ser abordados no conjunto das demais reas de conhecimento por

    razes cognitivas e pedaggicas (PASSOS, 2007). Trata-se de uma proposta de

    deslocamento da fundamentao do ensino religioso do campo teolgico

    (confessional) para o campo acadmico, este ltimo, aqui entendido a partir da

    tica das reas de conhecimento. Nessa perspectiva, fazendo relao com a

    religiosidade, mesmo que pensada como inerente ao ser humano, o modelo das

    Cincias da Religio no a toma como uma dimenso a ser aprimorada pelo ensino

    religioso, bem como no postula a dimenso religiosa como fundamento ltimo dos

    valores aos quais se direcionam a educao.

  • Temtica Livre - Artigo: Dilema epistemolgico do Ensino Religioso e formao docente

    Horizonte, Belo Horizonte, v. 10, n. 28, p. 1435-1457, out./dez. 2012 ISSN 2175-5841 1449

    O pressuposto bsico do modelo proposto por Passos (2007) o de que as

    Cincias da Religio podem oferecer [...] base terica e metodolgica para a

    abordagem da dimenso religiosa em seus diversos aspectos e manifestaes,

    articulando-a de forma integrada com a discusso sobre a educao (PASSOS,

    2007, p. 65). O autor aponta o fato de que os desafios enfrentados pelo ensino

    religioso tm relao direta com o estado dos Estudos da Religio ou das Cincias

    da Religio no pas. Isso significa afirmar que, sem uma base epistemolgica, no

    h o que ensinar em termos de rea de conhecimento.

    A discusso acerca da epistemologia do ensino religioso faz referncia ao

    mbito de sua rea de conhecimento. Dessa forma, convm ressaltar que:

    [...] as reas de conhecimento para serem reconhecidas como tais devem possuir consistncia prpria, ou seja, terem objetos, metodologias e teorias que acumuladas componham um conjunto coerente e consistente

    que normalmente adquire o status de cincia. prprio da cincia elucidar algum mbito da realidade e ser capaz de comunicar o caminho dessa elucidao e seus resultados. As escolas, desde os seus primrdios, tm a tarefa de introduzir os sujeitos nesse caminho, mostrando-lhes os resultados do conhecimento e ensinando-lhes a trilhar o mesmo caminho na direo da autonomia intelectual sempre maior. (SENA, 2006, p. 24-25).

    Nesse sentido, muito embora o modelo das Cincias da Religio [...] seja o

    que menos saiu do papel, tem flego para dar um passo frente dos dois

    anteriores, na medida em que garante ao ER autonomia epistemolgica e

    pedaggica (SOARES, 2009, p. 315). Essa autonomia se localiza em trs mbitos,

    isto , na comunidade cientfica, nos sistemas de ensino e na prpria escola

    (PASSOS, 2007, p. 64). O diferencial prtico que o ensino religioso, baseado no

    modelo das Cincias da Religio, pode oferecer se d na medida em que pode

    proporcionar ao educando comparaes contrastantes entre sistemas de referncia.

    Dito de outra forma, possibilitaria ao educando a percepo de que, independente

    da diversificao cultural e religiosa, o ser humano no pode viver sem sistemas de

    referncia, ao mesmo tempo que possibilita compreender que nenhum desses

  • Wilian Ramos Marcos

    Horizonte, Belo Horizonte, v. 10, n. 28, p. 1435-1457, out./dez. 2012 ISSN 2175-5841 1450

    sistemas possui legitimidade para reivindicar validade absoluta sobre os demais

    (SENA, 2006, p. 58-59).

    Em comparao com os modelos catequtico e confessional, pode-se dizer

    que trabalham, a partir do princpio de liberdade religiosa, com a ideia de que o

    Estado deveria apoiar o direito do cidado de obter uma formao religiosa que se

    conciliasse com a f que professa (SOARES, 2009, p. 316). O modelo das Cincias

    da Religio, por sua vez, sem negar que religiosidade e religio sejam dados

    antropolgicos e socioculturais, passveis de ser ensinados, parte do princpio de

    que o conhecimento da religio contribui com a formao completa do cidado, ao

    mesmo tempo que faz parte da educao geral, no entanto, desde que esteja sob a

    responsabilidade no das autoridades religiosas, mas dos sistemas de ensino e

    submetendo-se s mesmas exigncias das demais reas de conhecimento que

    compem os currculos escolares (PASSOS, 2007, p. 65). Em outras palavras, pode-

    se dizer que:

    A educao geral, fundada em conhecimentos cientficos e em valores, assume o dado religioso como um elemento comum s demais reas que compem os currculos e como um dado histrico-cultural fundamental para as finalidades ticas inerentes ao educacional. Portanto, esse modelo no afirma o ensino da religio como uma atividade

    cientificamente neutra, mas, com clara intencionalidade educativa, postula a importncia do conhecimento da religio para a vida tica e social dos educandos. As religies particulares so transcendidas, na procura por uma viso ampla capaz de abarcar as diversidades e, ao mesmo tempo, captar a singularidade que caracteriza o fenmeno enquanto tal. (PASSOS, 2007, p. 65-66).

    O grande desafio colocado ao modelo das Cincias da Religio diz respeito

    transposio didtica de seus resultados e a necessidade de avanar nas discusses

    para que ganhe corpo e possa ser viabilizado, sobretudo na formao docente, uma

    vez que, segundo Passos (2007), a proposio das Cincias da Religio, como base

    epistemolgica para o ensino religioso, corresponderia de melhor maneira ao valor

    terico, social, poltico e pedaggico do estudo da religio para formao do

    cidado (PASSOS, 2007, p. 67).

  • Temtica Livre - Artigo: Dilema epistemolgico do Ensino Religioso e formao docente

    Horizonte, Belo Horizonte, v. 10, n. 28, p. 1435-1457, out./dez. 2012 ISSN 2175-5841 1451

    Para que se tenha efetivao desse modelo, o primeiro passo diz respeito ao

    reconhecimento de cursos de licenciatura em Cincias da Religio. Esse o

    caminho para que se possa passar das Cincias da Religio, enquanto rea de

    conhecimento, e a partir do acmulo e experincias j realizadas em mbito de ps-

    graduao, para o ensino religioso. Posio que se pode perceber no trecho a

    seguir:

    Passar das Cincias da Religio, como rea de conhecimento com seus resultados j postos, para o ER um caminho de construo desafiante e fecundo, em muitos aspectos ainda por se fazer. H que se ressaltar que esse o desafio comum das licenciaturas: o de traduzir para o ensino aquilo que contedo obtido das pesquisas em determinada rea de conhecimento. (PASSOS, 2007, p. 126).

    A traduo dos resultados de pesquisas da rea das Cincias da Religio,

    operacionalizada por meio das licenciaturas, forneceria contedo disciplina sob a

    tica cientfica. Seria um ganho para a disciplina, medida que se deslocaria a

    responsabilidade e competncia do ensino religioso das confisses religiosas para o

    Estado e comunidade cientfica, isto , o tratamento dado ao fenmeno religioso

    no se fundamentaria em confisses religiosas. As Cincias da Religio no tomam

    o estudo sobre a religio a partir do dado da f. Esse deslocamento corresponde

    melhor ao carter laico da escola pblica. H que se ressaltar tambm o fato de esse

    deslocamento proporcionar abertura para que se estabelea uma licenciatura

    especfica para a docncia em ensino religioso. A esse respeito, a disciplina teria

    muitos ganhos, uma vez que, no havendo a definio de uma formao especfica

    para a disciplina, verifica-se que o professor possui, em muitos casos, formao

    variada. Essa diversificao na formao dificulta a discusso e o estabelecimento

    de objetivos, mtodos e linguagem apropriados ao ensino religioso.

  • Wilian Ramos Marcos

    Horizonte, Belo Horizonte, v. 10, n. 28, p. 1435-1457, out./dez. 2012 ISSN 2175-5841 1452

    3 Desafios do pluralismo religioso formao docente

    A formao de professores na histria da Educao brasileira, de modo

    geral, passou por altos e baixos. A partir da dcada de 1990, em funo do

    atendimento s orientaes internacionais, foi-se intensificando no Brasil uma

    srie de aes polticas e reformas educacionais, o que, por sua vez, refletiu-se, nas

    instncias federal, estadual e municipal, em esforos no sentido de buscar definir e

    concretizar polticas pblicas para a formao de professores. Dentre elas, pode-se

    citar a educao distncia e o protagonismo do prprio professor enquanto

    sujeito de sua educao continuada (OLIVEIRA; RISKE-KOCH; WICKERT, 2008,

    p. 62-66). Convm ressaltar que a formao dos professores insere-se em uma

    condio epistemolgica social e complexa. A formao do professor

    multidisciplinar, complexa, incompleta, articulada ao contexto social mais amplo,

    na inter-relao com o outro (OLIVEIRA; RISKE-KOCH; WICKERT, 2008, p. 68).

    Tomando como base essas caractersticas, pode-se dizer que a formao dos

    professores de ensino religioso tambm se enquadra na mesma perspectiva, no

    obstante partir da compreenso de que a disciplina ainda conta com complicadores

    de ordem poltica, legal e epistemolgica6 relativos laicidade do Estado e

    presena do religioso em espao pblico no Brasil. Partindo do pressuposto de que

    a formao dos professores se articula ao contexto social, o ensino religioso tem

    diante de si a perspectiva da diversidade cultural e religiosa verificada na sociedade

    brasileira atual. Nesse sentido, convm ressaltar que:

    O pluralismo religioso colocado como um direito expresso na primeira Constituio e um ideal manifesto pelas associaes interconfessionais.

    Nem todos os grupos religiosos, entretanto, possuem o mesmo poder de intervir na definio de contedos e estratgias da disciplina do Ensino Religioso, hoje constitudo como elemento curricular. Portanto, faz-se necessria a discusso de uma perspectiva do pluralismo religioso, para

    6 Do ponto de vista poltico, a referncia o jogo de foras que se opera em torno da disciplina a partir da implantao da Repblica e

    as estratgias, sobretudo catlicas, para a manuteno do ensino religioso na escola pblica. Do ponto de vista da legislao, a disciplina ocupa lugar ambguo por ser obrigatria para a escola e facultativa para o aluno. Com relao epistemologia, a r eferncia o dilema da presena privada em espao pblico, bem representada pela perspectiva do modelo teolgico.

  • Temtica Livre - Artigo: Dilema epistemolgico do Ensino Religioso e formao docente

    Horizonte, Belo Horizonte, v. 10, n. 28, p. 1435-1457, out./dez. 2012 ISSN 2175-5841 1453

    balizar esta disciplina e discutir, inicialmente, a capacidade de acolher a diversidade religiosa que compe o campo religioso brasileiro (JUNQUEIRA; ALVES, 2003, p. 10).

    O primeiro passo para que o ensino religioso tenha condies de enfrentar o

    desafio de acolher a diversidade que compe o campo religioso brasileiro j foi

    dado. Refere-se ampliao da disciplina enquanto rea de conhecimento. No

    entanto, ao mesmo tempo que o ensino religioso tem diante de si a possibilidade de

    emancipao, h, ainda, complicadores. A esse respeito, pode-se citar a

    obrigatoriedade, dada pela redao do artigo 33 da LDBEN (Lei n. 9.394/96), de

    que os sistemas de ensino ouam entidade civil com representao religiosa. H,

    tambm, segundo Oliveira et al. (2007), dificuldades dos prprios professores,

    como se pode perceber a seguir:

    Outro possvel agente determinante na demora de efetivao das mudanas talvez seja o posicionamento de professores que ainda no conseguem estabelecer necessria distncia entre sua formao inicial de base confessional e a elaborao de uma viso plural e inclusiva do componente curricular de Ensino Religioso (OLIVEIRA et al., 2007, p. 59).

    Essa situao ocorre em mbito nacional e pode ser percebida, tambm,

    quando se volta o olhar para Minas Gerais. Nesse sentido, de maneira mais

    especfica, fazendo referncia ao universo que compreende a escola pblica

    estadual da regio metropolitana de Belo Horizonte, pode-se citar que:

    O professor de Ensino Religioso deveria falar a partir do aluno, de suas possibilidades e necessidades; ao contrrio do representante da instituio religiosa, que fala a partir de princpios teolgicos e de um projeto de evangelizao. A linguagem catequtica mais comum em escolas

    particulares confessionais, mas ainda muito utilizada por docentes de escolas pblicas, o que refora as acusaes de que o Ensino Religioso subjuga e domestica por ser o brao estendido das igrejas crists dentro da escola (DANTAS, 2004, p. 121).

    Essa situao permite a compreenso de que ocorre com o ensino religioso

    um distanciamento entre os avanos tericos e a prtica docente. Esse quadro

  • Wilian Ramos Marcos

    Horizonte, Belo Horizonte, v. 10, n. 28, p. 1435-1457, out./dez. 2012 ISSN 2175-5841 1454

    sugere deficincias na formao dos professores, que depende de uma base

    epistemolgica, e esta, por sua vez, compreende aspectos tericos e metodolgicos

    ainda no suficientemente desenvolvidos.

    Consideraes finais

    guisa de concluso, pode-se dizer que o modelo das Cincias da Religio,

    atualmente, aquele que responde com mais ganhos prtica do ensino religioso,

    mesmo ainda se encontrando em estado embrionrio. O Estado laico, mesmo que

    em seu territrio haja diversidade religiosa, no assume propriamente

    caractersticas religiosas, isto , possibilita a liberdade religiosa e de crena, muito

    embora no assuma nenhuma delas como uma religio oficial. medida que o

    ensino religioso foi pensado como estando ligado s confisses religiosas e mantido

    nos estabelecimentos oficiais de ensino pblico configurou a presena do privado

    (religioso) em mbito pblico (laico), instaurando o dilema epistemolgico e

    gerando uma srie de polmicas em torno do ER.

    Alm das vozes que se colocam contra esse lugar ambguo do ensino

    religioso em defesa da laicidade do Estado, h, tambm, problemas do ponto de

    vista epistemolgico. O ensino religioso, medida que concebido como estando

    ligado s tradies religiosas, busca nelas o conhecimento religioso para sua

    prtica, isso sem falar no problema da formao dos professores, tendo em vista a

    diversidade de tradies religiosas e, atualmente, de movimentos religiosos no

    Brasil no necessariamente estruturados sob a lgica j h muito estabelecida nas

    confisses religiosas7.

    Enfim, pode-se dizer que o modelo das Cincias da Religio seria aquele que

    responderia com mais ganhos prtica do ensino religioso e atenderia de maneira

    interessante ao dilema epistemolgico desse componente curricular. Isto , a

    7 Para maiores informaes, cf. Antoniazzi (2004).

  • Temtica Livre - Artigo: Dilema epistemolgico do Ensino Religioso e formao docente

    Horizonte, Belo Horizonte, v. 10, n. 28, p. 1435-1457, out./dez. 2012 ISSN 2175-5841 1455

    adoo do modelo das Cincias da Religio corresponderia secularizao do

    ensino religioso e favoreceria-o tanto do ponto de vista da autonomia

    epistemolgica quanto auxiliando, medida que a integre ao ambiente escolar,

    superando o estigma de corpo estranho.

    REFERNCIAS

    ANDRADA, Bonifcio de. Acordo do Brasil com a Santa S sobre a Igreja Catlica: texto do parecer do Deputado Bonifcio de Andrada na Cmara dos Deputados e documentos oficiais. Belo Horizonte: Del Rey, 2009.

    BRASIL. Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educao nacional. Dirio Oficial da Unio, Braslia, 23 dez. 1996. Disponvel em: . Acesso em: 09 mar. 2009.

    BRASIL. Lei n. 9.475, de 22 de julho de 1997. D nova redao ao art. 33 da Lei n 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educao nacional. Dirio Oficial da Unio, Braslia, 23 jul. 1997. Disponvel em: . Acesso em: 09 mar. 2009.

    BRASIL. Cmara de Educao Bsica do Conselho Nacional de Educao. Resoluo CNE/CEB n. 02, de 7 de abril de 1998. Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental. Dirio Oficial da Unio, Braslia, 15 abr. 1998. Disponvel em: . Acesso em: 05 dez. 2008.

    BRASIL. Decreto n. 7.107 de 11 de fevereiro de 2010. Promulga o Acordo entre o Governo da Repblica Federativa do Brasil e a Santa S relativo ao Estatuto Jurdico da Igreja Catlica no Brasil, firmado na Cidade do Vaticano, em 13 de novembro de 2008. Dirio Oficial da Unio, Braslia, 12 FEV. 2010. Disponvel em: Acesso em: 23 de fev. 2012.

    CAETANO, Maria Cristina. O ensino religioso e a formao de seus professores: dificuldades e Perspectivas. 2007. 389 f. Dissertao (mestrado) Pontifcia Universidade Catlica de Minas Gerais, Programa de Ps-graduao em Educao, Belo Horizonte.

    CARNEIRO, Moaci Alves. LDB Fcil: leitura crtico-compreensiva artigo a artigo. 9 ed. Petrpolis: Vozes, 2003.

    CAVALIERE, Ana Maria. O mal-estar do ensino religioso nas escolas pblicas. Cadernos de Pesquisa, v. 37, n. 131, p. 303-332, 2007. Disponvel em: . Acesso em: 15 fev. 2012.

  • Wilian Ramos Marcos

    Horizonte, Belo Horizonte, v. 10, n. 28, p. 1435-1457, out./dez. 2012 ISSN 2175-5841 1456

    CUNHA, Luiz Antnio. A educao na concordata Brasil-Vaticano. Educao & Sociedade, v. 30, n. 106, p. 263-280, 2009. Disponvel em: . Acesso em: 15 out. 2009.

    CURY, Carlos Roberto Jamil. Ensino religioso na escola pblica: o retorno de uma polmica recorrente. Revista Brasileira de Educao. n. 27, p. 183-191, 2004. Disponvel em: . Acesso em: 15 out. 2009.

    DANTAS, Douglas Cabral. O ensino religioso na rede pblica estadual de Belo Horizonte, MG: histria, modelos e percepes de professores sobre formao e docncia. 2002. 191 f. Dissertao (mestrado) Pontifcia Universidade Catlica de Minas Gerais, Programa de Ps-graduao em Educao, Belo Horizonte.

    DANTAS, Douglas Cabral. O ensino religioso escolar: modelos tericos e sua contribuio formao tica e cidad. Horizonte: Revista de Estudos de Teologia e Cincias da Religio, Belo Horizonte, v. 2, n. 4, p. 112-124, jan./jun. 2004.

    FIGUEIREDO, Ansia de Paulo. A Educao da dimenso religiosa no ambiente escolar. So Paulo: FTD, 1993.

    FIGUEIREDO, Ansia de Paulo. Ensino Religioso: da concepo regulamentao. Revista de Educao AEC, Braslia, v. 35, n. 138, p. 43-61, jan./mar. 2006.

    FIGUEIREDO, Ansia de Paulo. Ensino religioso no Brasil: tendncias, conquistas, perspectivas. Petrpolis: Vozes, 1996.

    FISCHMANN, Roseli. A proposta de concordata com a Santa S e o debate na Cmara Federal. Educao & Sociedade, Rio de Janeiro, v. 30, n. 107, p. 563-583, 2009. Disponvel em: . Acesso em: 15 out. 2009.

    FONAPER. Parmetros Curriculares Nacionais: ensino religioso. So Paulo: Ave Maria, 1997.

    GIUMBELLI, Emerson. A presena do religioso no espao pblico: modalidades no Brasil. Religio & Sociedade, Rio de Janeiro, v. 28, n. 2, 2008. Disponvel em: . Acesso em: 20 fev. 2010.

    GRUEN, Wolfgang. O Ensino Religioso na escola. 2 ed. Petrpolis: Vozes, 1997.

    GRUEN, Wolfgang. Aspectos legais do ensino religioso na escola. Revista de Educao AEC, Braslia, v. 13, n. 51, p. 52-60, jan. 1984.

    GRUEN, Wolfgang. Ensino religioso escolar. In: GUIMARES, Almir Ribeiro. Dicionrio de Catequtica. So Paulo: Paulus, 2004.

  • Temtica Livre - Artigo: Dilema epistemolgico do Ensino Religioso e formao docente

    Horizonte, Belo Horizonte, v. 10, n. 28, p. 1435-1457, out./dez. 2012 ISSN 2175-5841 1457

    GRUEN, Wolfgang. Cincias da religio numa sociedade multicultural. Horizonte: Revista de Estudos de Teologia e Cincias da Religio, Belo Horizonte , v. 3, n. 6, p.15-26, jan./jun. 2005.

    JUNQUEIRA, Srgio Rogrio Azevedo. O processo de escolarizao do ensino religioso no Brasil. Petrpolis: Vozes, 2002.

    JUNQUEIRA, Srgio; ALVES, Luiz Alberto Souza. O ensino religioso em um contexto pluralista. Estudos de Religio, So Bernardo do Campo, v. 17, n. 25, p. 65-82, jul./dez. 2003.

    JUNQUEIRA, Srgio Rogrio Azevedo; MENEGHETTI, Rosa Gitana Krob; WASCHOWICZ, Lilian Anna. Ensino religioso e sua relao pedaggica. Petrpolis: Vozes, 2002.

    OLIVEIRA, Lilian Blanck et al. Ensino religioso no ensino fundamental. So Paulo: Cortez, 2007.

    OLIVEIRA, Llian Blanck; RISKE-KOCK, Simone; WICKERT, Tarcsio Alfonso. Formao de docentes e ensino religioso no Brasil: tempos, espaos, lugares. Blumenau: Edifurb, 2008.

    PASSOS, Joo Dcio. Como a religio se organiza: tipos e processo. So Paulo: Paulinas, 2006.

    PASSOS, Joo Dcio. Ensino religioso: construo de uma proposta. So Paulo: Paulinas, 2007.

    PANASIEWICS, Roberlei. Pluralismo religioso contemporneo: dilogo inter-religioso na teologia de Claude Geffr. So Paulo: Paulinas, 2007.

    PAULY, Evaldo Luis. O dilema epistemolgico do ensino religioso. Revista Brasileira de Educao, Rio de Janeiro, n. 27, p. 172-182, 2004. Disponvel em: . Acesso em: 15 out. 2009.

    SENA, Luzia . Ensino religioso e formao docente. So Paulo: Paulinas, 2006.

    SILVA, Antnio Francisco da. Idas e vindas do ensino religioso em Minas Gerais: a legislao e as contribuies de Wolfgang Gruen. Belo Horizonte: SEGRAC, 2007.

    SOARES, Afonso Maria Ligorio. Por uma epistemologia do Ensino Religioso. In: CONGRESSO DA ANPTECRE: FENOMENOLOGIA E HERMENUTICA DO RELIGIOSO, 2, Belo Horizonte, MG. Anais..., 2009. 1 CD-ROM.

    VAIDERGORN, Jos. Ensino religioso. uma herana do autoritarismo. Cadernos CEDES, Campinas, v. 28, p. 407-411, 2008. Disponvel em: . Acesso em: 15 de out. 2009.

  • Reproduced with permission of the copyright owner. Further reproduction prohibited without permission.