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A D IVERSIDADE DA G EOGRAFIA B RASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO 2117 PLASTICIDADE DO TRABALHO E COOPERATIVISMO RURAL NO ALTO SERTÃO SERGIPANO: CONTRADIÇÕES ATUAIS DA REPRODUÇÃO CAMPONESA Fabio Ferreira Santos 1 RESUMO As contradições do mundo do trabalho no século XXI nos instigam a pensar as diferentes formas que o capital busca para subordinar e explorar a classe trabalhadora. Não obstante, as discussões das transformações verificadas no trabalho a partir da dinâmica territorial do capital são fundamentais para a leitura geográfica sobre as formas diferenciadas de resistência dessa classe. Nesse aspecto, este texto tem como objetivo analisar a plasticidade do trabalho na Cooperativa Regional de Assentados do Alto Sertão Sergipano e suas contradições na produção do espaço. Sabe-se que o espaço é produto do trabalho, nesse sentido as diferentes formas de produção de mercadorias nos assentamentos rurais vinculados a cooperativa submetem-se as diferentes formas de trabalho e suas divisões na organização e produção do espaço geográfico. Para desmistificar essa questão, recorremos ao materialismo histórico e dialético, pois nos permite compreender a relação capital-trabalho e as formas em que a plasticidade do trabalho aparece na cooperativa dos assentamentos rurais do alto sertão de Sergipe. Metodologicamente, para o desenvolvimento da nossa analise, partimos das pesquisas bibliográficas que retratam o tema da discussão, no qual será crucial para desvelar as formas que o desenvolvimento desigual do capital produz um complexo de divisões do trabalho no seio da cooperativa de assentados de Reforma Agrária do Alto Sertão de Sergipe(COOPRASE). Nesse viés, interessa-nos também levantar as contradições originadas pela efetivação de programas e ações de Politicas Públicas, em especial o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), nos assentamentos que participam com seu trabalho vivo das cooperativas que participam da produção e comercialização de produtos agrícolas para a merenda escolar. Contraditoriamente, a cooperativa como forma de organização do trabalho e a produção, contribui para a reprodução do campesinato através da comercialização de produtos oriundos da agricultura camponesa. Importante frisar que a cooperativa tem uma grande importância para os assentamentos rurais pesquisados, visto que contribui para o escoamento e a comercialização de produtos agrícolas oriundos dos assentados, garantindo renda. PALAVRAS-CHAVES: plasticidade do trabalho, capital, cooperativa, assentados, produção do espaço. 1 Doutorando do programa de pós-graduação em Geografia da Universidade Federal da Paraíba. E-mail de contato: [email protected]

PLASTICIDADE DO TRABALHO E COOPERATIVISMO RURAL NO

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A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA

AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO

2117

PLASTICIDADE DO TRABALHO E COOPERATIVISMO RURAL NO ALTO

SERTÃO SERGIPANO: CONTRADIÇÕES ATUAIS DA REPRODUÇÃO

CAMPONESA

Fabio Ferreira Santos1

RESUMO

As contradições do mundo do trabalho no século XXI nos instigam a pensar as

diferentes formas que o capital busca para subordinar e explorar a classe trabalhadora.

Não obstante, as discussões das transformações verificadas no trabalho a partir da

dinâmica territorial do capital são fundamentais para a leitura geográfica sobre as

formas diferenciadas de resistência dessa classe. Nesse aspecto, este texto tem como

objetivo analisar a plasticidade do trabalho na Cooperativa Regional de Assentados do

Alto Sertão Sergipano e suas contradições na produção do espaço. Sabe-se que o espaço

é produto do trabalho, nesse sentido as diferentes formas de produção de mercadorias

nos assentamentos rurais vinculados a cooperativa submetem-se as diferentes formas de

trabalho e suas divisões na organização e produção do espaço geográfico. Para

desmistificar essa questão, recorremos ao materialismo histórico e dialético, pois nos

permite compreender a relação capital-trabalho e as formas em que a plasticidade do

trabalho aparece na cooperativa dos assentamentos rurais do alto sertão de Sergipe.

Metodologicamente, para o desenvolvimento da nossa analise, partimos das pesquisas

bibliográficas que retratam o tema da discussão, no qual será crucial para desvelar as

formas que o desenvolvimento desigual do capital produz um complexo de divisões do

trabalho no seio da cooperativa de assentados de Reforma Agrária do Alto Sertão de

Sergipe(COOPRASE). Nesse viés, interessa-nos também levantar as contradições

originadas pela efetivação de programas e ações de Politicas Públicas, em especial o

Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), nos assentamentos que participam

com seu trabalho vivo das cooperativas que participam da produção e comercialização

de produtos agrícolas para a merenda escolar. Contraditoriamente, a cooperativa como

forma de organização do trabalho e a produção, contribui para a reprodução do

campesinato através da comercialização de produtos oriundos da agricultura camponesa.

Importante frisar que a cooperativa tem uma grande importância para os assentamentos

rurais pesquisados, visto que contribui para o escoamento e a comercialização de

produtos agrícolas oriundos dos assentados, garantindo renda.

PALAVRAS-CHAVES: plasticidade do trabalho, capital, cooperativa, assentados,

produção do espaço.

1Doutorando do programa de pós-graduação em Geografia da Universidade Federal da Paraíba. E-mail de

contato: [email protected]

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INTRODUÇÃO

O sistema capitalista é em sua essência e aparência contraditório, desigual e

combinado. Sob essa égide que nas ultimas décadas presenciamos o que Mészáros

(2002) denominou de crise estrutural do capital. Um em que percebemos os altos

índices de desempregos, desigualdades sociais e pobreza sendo uma das características

marcantes deste sistema perverso, desigual e contraditório.

Perceber que o capital busca áreas de exploração e expropriação da força de

trabalho para a extração da mais valia é apenas mais uma peça no tablado que compõe o

mundo do trabalho e suas peculiaridades. Afinal, o sistema capitalista busca

incessantemente explorar a classe trabalhadora e ampliar (re) produção.

Diante desse aspecto, vemos no espaço agrário um avanço das relações

capitalistas que contraditoriamente (re) cria o campesinato através de suas formas de

subordinação. Dentre elas podemos citar as politicas publicas direcionadas a agricultura

camponesa2. Dessa forma, o nosso texto tem como objetivo analisar e desvelar a

plasticidade do trabalho e do cooperativismo rural no alto sertão sergipano e suas

contradições na reprodução camponesa.

Oriundo de discussões teóricas e pesquisas bibliográficas no campo da ciência

geográfica, em especial no espaço agrário, buscamos levantar as contradições originadas

pela efetivação de programas e ações de Politicas Públicas, em especial o Programa

Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), nos assentamentos que participam com seu

trabalho vivo das cooperativas que participam da produção e comercialização de

produtos agrícolas para a merenda escolar.

Para tal, o esclarecimento sobre o programa de alimentação escolar torna-se

necessário para que o desenvolvimento da nossa analise. Assim, o programa PNAE faz

2 Utilizo o termo agricultura camponesa em contra-posição ao modelo agrícola posto pelo Estado

brasileiro, no qual determinou e denominou chama agricultura familiar, como forma de extinguir a classe

camponesa de qualquer discussão teórica, impondo chamar agricultor familiar. Aliás, a categoria

agricultor familiar tende a negar a existência histórica de uma classe camponesa. Nesse sentido, optamos

em trabalhar com a agricultura camponesa, pois resulta de um processo histórico de luta pela terra e na

terra.

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parte de um dos eixos de acesso aos alimentos, no qual está inserido dentro da política

nacional de segurança alimentar e nutricional (PNSAN) desde o ano de 2005. Nesse

sentido, O PNAE vincula-se como um programa suplementar a política educacional,

uma vez que direciona a produção de alimentos da agricultura para a alimentação

escolar. Ambos os programas estão englobados como ação estrutural do programa fome

zero e têm como objetivos o fortalecimento da política nacional de segurança alimentar

e nutricional.

Esse programa atende os camponeses do campo que produzem alimentos que

serão direcionados as escolas e à distribuição de alimentos para pessoas em situação de

insegurança alimentar. Imperceptivelmente, o PNAE é um programa importante para os

camponeses, pois os ajudam na comercialização dos seus produtos via compra e venda,

gerando trabalho e renda no campo.

As políticas públicas para o campo, em especial o PNAE, têm sido uma

alternativa camponesa de reprodução familiar, embora, a forma em que está ocorrendo o

processo vem sendo alvo de cooptação pelo o capital, no qual busca subordinar o

camponês as suas relações desiguais.

Sob esse aspecto que a plasticidade do trabalho e o cooperativismo rural no seio

da reprodução camponesa nos instigam a pensar o papel de a Geografia no

desvelamento das contradições que existem na produção do espaço.

1. O Programa Nacional de Alimentação Escolar e sua relação com os assentados

A leitura do Programa nacional de alimentação escolar se insere nesse contexto

para desvelamento da plasticidade do trabalho e do cooperativismo rural, pois esta

politica publica contribui para que os assentados desenvolvam a produção agrícola

direcionada a venda de seus produtos ao programa. Nesse aspecto, desvelaremos

algumas questões sobre o programa para que possamos entender e compreender o nosso

objetivo do texto.

O PNAE faz parte de um dos eixos de acesso aos alimentos, no qual está

inserido dentro da política nacional de segurança alimentar e nutricional (PNSAN)

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desde o ano de 2005. Para tal, o contexto em que se insere o PNAE no Brasil deve ser

posto em evidencia para que fique claro o programa e sua atuação.

Alguns autores no dar suporte teórico nas análises do PNAE como: Carvalho e

Castro (2009), Belik (2006), Coimbra (1982), Fialho (1993), Costa (2001), Sturion

(2003), entre outros que nos mostram que o programa nacional de alimentação escolar

tem possibilitado aos camponeses a permanência na terra e que o PNAE é o mais antigo

programa social do Governo Federal na área de educação e é o maior programa de

alimentação em atividade no Brasil.

Nesse âmbito a importância do PNAE para a educação é de extrema

importância, pois visa a merenda escolar. Segundo Carvalho e Castro (2009)

O Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) foi criado em

1979, mas somente com a promulgação da Constituição Cidadã em

1988, foi assegurado o direito à alimentação escolar a todos os alunos

do ensino fundamental, como programa suplementar à política

educacional. Logo na primeira metade da década de 1990, os

formulados foram totalmente abolidos dos cardápios. (CARVALHO;

CASTRO, 2009, p.3)

Nesse sentido, O PNAE vincula-se como um programa suplementar a política

educacional, uma vez que direciona a produção de alimentos da agricultura para a

alimentação escolar. De acordo com Carvalho e Castro (2009),

a alimentação escolar envolve aspectos cultural-territoriais; interações

socioeconômico-ambientais; políticos-institucionais; de respeito ao

ciclo da natureza de ofertar alimentos para atender à necessidade

básica do indivíduo de não sentir fome; entre outros, a fim de

promover a Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) e o Direito

Humano à Alimentação Adequada (DHAA). (ibid., p.5)

Nesse sentido, a alimentação escolar conhecida como merenda escolar, é

importante para os estudantes durante o período em que está na escola, pois é uma

pequena refeição no intervalo da atividade escolar. Observamos que

o PNAE é um programa socioeducacional coordenado pelo

FNDE/MEC, responsável pela sua normatização, coordenação,

monitoramento e controle; definindo suas diretrizes, princípios e

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objetivos; financiando os programas estaduais e municipais em caráter

suplementar; e fiscalizando com outros órgãos federais e locais, a

aplicação dos recursos. (ibid., p.7)

Em Sergipe o PNAE atua consorciado com as cooperativas de abastecimento de

alimentos da agricultura. Uma das cooperativas é a COOPRASE, na qual diversos

alimentos produzidos no assentamento rural Jacaré Curituba vão para a alimentação

escolar em diversos municípios do Estado.

O PNAE vem se constituindo como um programa importante para que os

trabalhadores do campo possam escoar seus produtos agrícolas e conseguirem melhores

condições de vida. A diversidade de produtos é um fator importante a se destacar uma

vez que a cooperativa reuni um grande número de associados para produzir alimentos

direcionados a PNAE.

Nesse emblema que a pesquisa nos remete pensarmos de que forma a plasticidade

do trabalho e o cooperativismo rural contribui para a reprodução camponesa através do

PNAE. Dessa forma, como a Plasticidade do trabalho e cooperativismo rural promove a

inclusão social e o fortalecimento da agricultura camponesa?

2. Plasticidade do trabalho e cooperativismo rural e seus rebatimentos na

reprodução camponesa

Para efeito de analise sobre esse item, buscaremos primeiro esclarecer a ideia de

plasticidade do trabalho para depois vim entender como o cooperativismo rural vem

permitindo uma reprodução camponesa e sua recriação frente ao capital. Nesse sentido,

o desvelamento da categoria trabalho será crucial para a compreensão de plasticidade do

trabalho.

A leitura da plasticidade do trabalho que um esclarecimento anterior do que vem

ser a categoria trabalho para que possamos debruçar melhor sobre o mundo do trabalho

e suas peculiaridades. Dessa forma, o sistema capitalista é caracterizado como um

sistema desigual, contraditório e combinado, pois criar as desigualdades entre classe

sociais através de suas relações sociais na busca de sua reprodução e ampliação da mais

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valia. Nesse aspecto, têm-se de um lado, os capitalistas que detém os meios de

produção, e do outro, o proletariado que detém a força de trabalho.

É nesse bojo que Marx nos permite entender que

o trabalho é um processo entre o homem e a Natureza, um processo

em que o homem, por sua própria ação, media, regula e controla seu

metabolismo com a Natureza. Ele mesmo se defronta com a matéria

natural como uma força natural. Ele põe em movimento as forças

naturais pertencentes a sua corporalidade, braços e pernas, cabeça e

mão, a fim de apropriar-se da matéria natural numa forma útil para sua

própria vida. Ao atuar, por meio desse movimento, sobre a Natureza

externa a ele e ao modificá-la, ele modifica, ao mesmo tempo, sua

própria natureza. Ele desenvolve as potências nela adormecidas e

sujeita o jogo de suas forças a seu próprio domínio. Não se trata aqui

das primeiras formas instintivas, animais, de trabalho. O estado em

que o trabalhador se apresenta no mercado como vendedor de sua

própria força de trabalho deixou para o fundo dos tempos primitivos o

estado em que o trabalho humano não se desfez ainda de sua primeira

forma instintiva. (MARX, 1996, p. 297)

Essa passagem de Marx nos permite compreender o trabalho na sociedade

capitalista, no qual

O trabalhador trabalha sob o controle do capitalista a quem pertence

seu trabalho. O capitalista cuida de que o trabalho se realize em ordem

e os meios de produção sejam empregados conforme seus fins,

portanto, que não seja desperdiçada matéria-prima e que o instrumento

de trabalho seja preservado, isto é, só seja destruído na medida em que

seu uso no trabalho o exija. (ibid. p.304)

Sob a forma do capital-trabalho que aparece às desigualdades sociais, no qual o

capital explora e expropria a força de trabalho na ampliação e reprodução da mais valia.

Nesse âmbito, o campesinato é uma classe trabalhadora que busca se reproduz e recriar-

se frente à ordem metabólica do capital, das contradições e desigualdades que regem

esse sistema de produção perverso e contraditório.

Devemos esta ciente de que a classe trabalhadora é heterogênea, multifacetária,

fragmentada e não deve ser contextualizada apenas a explicação sobre a ótica da relação

capital-trabalho, visto que as mudanças nas relações de trabalho oriunda das

reestruturações produtiva do capital nos faz pensar como o trabalho se modifica nas

novas formas de organização das estruturas produtivas.

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Autores como (ALVES, 2000, 2009; THOMAZ JUNIOR, 2004, 2006, 2009.

ANTUNES, 2004, 2005; BEZERRA, 2013) nos apontam para uma compreensão

ampliada da classe trabalhadora no mundo atual. Sob esse aspecto que surge a ideia de

plasticidade do trabalho como forma de explicar a morfologia do trabalho e os desafios

que a classe trabalhadora tem sob a hegemonia do capital.

O conceito de plasticidade do trabalho vem sendo destacado no grupo de

pesquisa CEGET, sob a tutela do professor Tomaz Junior, no qual ele analisa as novas

expressões do mundo do trabalho e suas transformações na dinâmica territorial do

trabalho. Para Bezerra (2009), “a plasticidade do trabalho é um aspecto das relações

sociais de produção e do trabalho diante da nova configuração do capitalismo”.

Essas diferentes formas de expressões do trabalho nos instiga a pensar o

conteúdo da dinâmica territorial do capital. De acordo com Thomaz Junior (2009)

Quando nos ocupamos com a (des)realização e as novas identidades

do trabalho territorialmente expressas na plasticidade que se refaz

continuamente, estamos preocupados com os desdobramentos para os

trabalhadores da constante redefinição de profissões, habilitações,

especializações, inserções autônomas etc., entremeada, em vários

casos, com experiências de despossessão. Essa trajetória de

fragmentações atinge em cheio o trabalho, de sorte que são essas as

evidências mais profundas do estranhamento a acrescentarem desafios

à compreensão do trabalho, na perspectiva de classe. (Thomaz Junior,

p.318, 2011)

Percebe-se que o autor nos aponta características importantes para entender a

plasticidade do trabalho como diferentes formas de expressão do trabalho frente as

transformações no mundo capitalista. Sob essas diferentes formas do mundo do

trabalho que o cooperativismo rural aparece em áreas de assentamentos rurais, como

uma forma de associação entre os trabalhadores assentados para enfrentar as

contradições do sistema capitalista.

Nesse aspecto, as cooperativas não devem se organizar apenas com objetivos

econômicos, mas também com objetivos políticos de longo prazo, que

permitam conscientizar os trabalhadores para fortalecer as suas lutas,

tendo em vista a transformação da sociedade. Os assentamentos

devem transformar-se em retaguarda política de luta contra a

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burguesia para Ír acumulando forças para a realização da Reforma

Agrária. (GORGEN e STÉDILE, 1991:146).

Dessa forma, as cooperativas englobam a luta na terra trazendo perspectivas de

luta e envolvimento em diferentes dimensões como politica, ideológica, social,

econômica e simbólica. Essa forma de se organizar fortalece os assentamentos e permite

desenvolver novas formas de transformação da sociedade. Para Fabrini (2000),

Nos assentamentos, a cooperativa não deve ser vista como um

empreendimento essencialmente capitalista, porque esta não produz

exclusivamente para o mercado: produz também para as famílias.

Entretanto, é importante observar que existe uma grande preocupação

em produzir excedentes, viabilizados, principalmente, através da

mecanização e uso de instrumentos e equipamentos modernos,

adquiridos no mercado. É evidente que a produção destinada ao

consumo no próprio assentamento/ cooperativa (gêneros alimentícios,

instrumentos, produtos de sustentação de outras atividades) têm

importância fundamental na produção de excedentes, com

barateamento de produtos destinados ao mercado. (FABRINI, p. 73)

A cooperativa agrícola camponesa tem sido uma proposta feita pelos assentados

como forma de emancipação frente ao domínio do mercado capitalista. Alias, a

cooperação permite ao camponês quebrar com a produção individual camponesa na qual

esta subordinada aos interesses do capital via apropriação da renda da terra na

circulação dos produtos agrícolas e não na produção.

Analisando as cooperativas COAGRI (Cooperativa Regional de Assentados) e a

COOPROSERP (Cooperativa do Assentamento Novo Paraíso), ambas situadas na

região sul do país, a Franciosi (2007), nos mostra que

A adesão ao cooperativismo por parte dos assentados tem sido

incentivada pelo MST, que conhece a realidade e as dificuldades do

dia-a-dia nos assentamentos e reconhece que há necessidade da

adoção de ações coletivas que garantam resultados positivos na

atividade agropecuária. (FRANCIOSI, 2007, p.2)

Nesse âmbito, percebe-se que o coletivismo passa a ser influenciado e

incentivado pelo MST na busca de enfrentar as contradições do sistema capitalista e os

camponeses pudessem emancipar-se diante do capital. O autor ainda nos mostra que

Uma das soluções para os assentamentos seria a adoção de ações

coletivas, organizadas em cooperativas que possuam condições de

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sustentar os assentados e se sustentar, através da produção e

comercialização de diversas culturas. E mais, as complexas práticas de

mercado e a acirrada concorrência que derrubam os preços dos

produtos agrícolas, indicam um novo perfil para os assentamentos,

que além da cooperativa é necessário à implantação de agroindústrias.

(Ibid., p.8)

A adoção coletiva nas cooperativas dos assentamentos rurais cria uma

possibilidade de desenvolvimento para os camponeses, pois o campesinato passa a ter

acesso às politicas publicas e a comercializar frente aos ditames do capital.

Em Sergipe, em especial no alto sertão sergipano, a cooperativa que se destaca

nessa região é a COOPRASE (Cooperativa regional do alto sertão sergipano), no qual

tem 1200 camponeses filiados. Para ter ideia, a região do alto sertão de Sergipe tem 96

assentamentos, segundo o boletim data luta, publicados em 2012.

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Fonte: DATALUTA Sergipe – Banco de Dados da Luta pela Terra, 2012. LABERUR/NERA,

2013.www.laberur.ufs.br

O grande número de assentamentos no alto sertão sergipano possibilitou a

criação de uma cooperativa regional pelos assentados, como forma de somar forças para

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a aquisição de politicas de crédito e a comercialização dos assentados no estado. O

trabalho na cooperativa é coletivo, havendo divisões de trabalho para dinamizar a

produção e a produtividade de alimentos.

Nessa divisão, as mulheres ficam no setor de empacotamento, embalagem, entre

outros, e os homens se encarregam de ficar no setor de transporte dos alimentos dos

assentamentos para a cooperativa. Percebe-se nessa divisão de tarefa a plasticidade do

trabalho, na qual homens e mulheres desempenham suas funções individuais, mas tendo

a coletividade entre os setores para dinamizar a agilidade e rapidez no setor produtivo

agrícola.

A eficácia dos camponeses na cooperativa vem ganhando destaque no mercado

interno sergipano, e prestigio na sociedade. A aquisição de alimentos pelo PNAE

promoveu uma condição favorável ao assentado para comercialização de seus produtos

via programa escolar.

O PNAE é importante para a cooperativa e os camponeses do alto sertão, pois o

direcionamento produtivo comercial ligado a esta politica publica, permite ao camponês

produzir alimentos que possam ser inseridos na compra das prefeituras e do Estado pelo

programa de alimentação escolar.

Dessa forma, a plasticidade do trabalho na cooperativa ascende uma luz de

esperança camponesa para quebrar com o domínio do capital e estabelecer uma

emancipação camponesa na região.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O avanço das contradições no sistema capitalista tem fortes rebatimentos no

mundo do trabalho. Nesse aspecto, a classe trabalhadora busca diferentes formas para

sobreviver a barbárie do capital. A dinâmica territorial e a plasticidade do trabalho são

imprescindíveis para entender as transformações que vem ocorrendo no mundo

trabalhista.

Nesse aspecto, esse texto, nos possibilitou compreender a forma que a

plasticidade do trabalho e o cooperativismo rural vêm transformações as relações

sociais de produção em áreas de assentamentos rurais.

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Perceptível às transformações do espaço fruto do trabalho humano, no qual a

cooperativa regional do alto sertão de Sergipe tem um papel crucial nos rebatimentos

territoriais da região. A cooperação camponesa contribui pra um dinamismo e

desenvolvimentos dos assentamentos rurais e uma melhoria de condições da vida

camponesa.

A cooperativa de assentados de Reforma Agrária do Alto Sertão de

Sergipe(COOPRASE) foi fundamental para a aquisição e efetivação de programas e

ações de Politicas Públicas, em especial o Programa Nacional de Alimentação Escolar

(PNAE) nestas região.

A cooperação camponesa alia-se a plasticidade do trabalho, no qual os

camponeses participam com seu trabalho vivo na cooperativa nos setores de produção e

comercialização de produtos agrícolas para comercialização no mercado interno e

principalmente para a venda de gêneros alimentícios direcionados a merenda escolar.

Dessa forma, percebe-se que a cooperativa como forma de organização do

trabalho e a produção, contribui para a reprodução do campesinato através da

comercialização de produtos oriundos da agricultura camponesa. Aliás, a cooperativa

tem uma grande papel importante para os assentamentos rurais do alto sertão sergipano,

visto que contribui para o escoamento e a comercialização de produtos agrícolas

oriundos do campesinato, garantindo trabalho e renda para os camponeses.

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