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Reqte. : MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL Reqdos. : EDSON FIGUEIREDO MAGALHÃES e OUTRO S E N T E N Ç A Vistos etc. Cuidam os presentes autos de Ação Civil Pública por Ato de Improbidade Administrativa, intentada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL, em face de EDSON FIGUEIREDO MAGALHÃES (ex-Prefeito Municipal de Guarapari) e ANTONICO GOTTARDO (ex-Prefeito Municipal de Guarapari), partes devidamente qualificadas. Aduz-se na inicial, em síntese, que: 1. foi encaminhado para a 5ª Promotoria de Justiça especializada na defesa do patrimônio público o OFÍCIO Nº 1346/2007/GUAV 01, da lavra do Exmº Sr. Juiz do Trabalho, Dr. Welington do Nascimento Andrade, no qual fez juntar sentença trabalhista exarada no processo 1955.2007.151.17.00-7 pela MMª Juíza do Trabalho, Drª Ana Paula Rodrigues Luz Faria, em processo ajuizado pela Srª Adriana Ferreira Vieira, em face do Município de Guarapari, para adoção das medidas cabíveis no que se refere à nomeação de referida servidora, por sucessivos decretos, para cargo em comissão desprovido dos requisitos constitucionais, bem como à sua PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO Vara dos Feitos da Fazenda Pública Estadual e Municipal, de Registros Públicos e do Meio Ambiente da Comarca de Guarapari PROCESSO nº 021.07.009973-0

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Reqte. : MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUALReqdos. : EDSON FIGUEIREDO MAGALHÃES e OUTRO

S E N T E N Ç A

Vistos etc.

Cuidam os presentes autos de Ação Civil Pública porAto de Improbidade Administrativa, intentada pelo MINISTÉRIO PÚBLICOESTADUAL, em face de EDSON FIGUEIREDO MAGALHÃES (ex-PrefeitoMunicipal de Guarapari) e ANTONICO GOTTARDO (ex-Prefeito Municipalde Guarapari), partes devidamente qualificadas.

Aduz-se na inicial, em síntese, que:

1. foi encaminhado para a 5ª Promotoria de Justiçaespecializada na defesa do patrimônio público oOFÍCIO Nº 1346/2007/GUAV 01, da lavra doExmº Sr. Juiz do Trabalho, Dr. Welington doNascimento Andrade, no qual fez juntar sentençatrabalhista exarada no processo nº1955.2007.151.17.00-7 pela MMª Juíza doTrabalho, Drª Ana Paula Rodrigues Luz Faria, emprocesso ajuizado pela Srª Adriana Ferreira Vieira,em face do Município de Guarapari, para adoçãodas medidas cabíveis no que se refere ànomeação de referida servidora, por sucessivosdecretos, para cargo em comissão desprovidodos requisitos constitucionais, bem como à sua

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contratação temporária irregular, diferida notempo por sucessivos contratos, para o exercíciode função permanente essencial à população,sem observância da regra do concurso público, esem a presença de situação legal que legitimassetal vínculo;

2. as nomeações e contratações da referidaservidora foram de fato ilegais einconstitucionais, o que evidencia a improbidadedos requeridos, ante a voluntária e dolosaviolação de preceitos constitucionais e legaisproibitivos das nomeações e contrataçõestemporárias efetivadas

3. no exercício do cargo eletivo de PrefeitoMunicipal os requeridos tinham a obrigação deatuarem no estrito cumprimento da lei, o quenão foi observado, tendo, ainda, causado danoao erário ao influir de qualquer forma para aaplicação irregular de verba pública, havendosubsunção das condutas à figura do inc. XI, infine, do art. 10, da LIA;

4. o prejuízo econômico-financeiro se efetivou como abuso no gasto do dinheiro público pelosrequeridos ao contratarem indefinidamente amencionada servidora em flagrante desrespeito àCF/88, ocasionando, ainda, despesas extras coma demanda trabalhista;

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5. o comportamento dos requeridos, que sevaleram de contrato para perpetuar umailegalidade, além de afronta aos princípios daimpessoalidade e da legalidade, traduziu, noplano ético-jurídico, violação a um dos vetoresfundamentais que regem o exercício da atividadeestatal, qual seja, o princípio da moralidadeadministrativa, implicando, assim, ofensa aocomando do art. 37, caput, da CF/88, bem como,subsidiariamente, aos arts. 4º e 11, caput e incs. I,II e V, da LIA.

Com base neste fático contexto, pede-se oafastamento e a indisponibilidade de bens dos requeridos, bem como, aofinal, a condenação dos mesmos nas sanções previstas no art. 12, incs. IIou III, da LIA, além do pagamento de indenização por danoextrapatrimonial coletivo ocasionado ao ente público, no importe de R$200.000,00 (duzentos mil reais).

A inicial foi instruída com documentos (fls. 21/38).

A decisão de fls. 40 declinou a competência em favorda vara trabalhista desta Comarca de Guarapari, mas foi reformada emConflito de Competência submetido ao crivo do STJ (fls. 65/70).

Os requeridos foram notificados e apresentarammanifestações às fls. 83/113 (segundo requerido) e 114/141 (primeirorequerido).

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A decisão de fls. 143/151 rejeitou as preliminaresarguidas e recepcionou a inicial, concedendo, liminarmente, a restrição deveículos pertencentes aos requeridos.

O segundo requerido contestou às fls. 301/496.

A contestação do primeiro requerido consta às fls.504/529.

Réplica às fls. 536.

A decisão de fls. 560/562 saneou o processo, com arejeição da preliminares arguidas, e designou AIJ.

Agravo retido às fls. 559/581.

AIJ às fls. 603 e 634/649.

As partes ofertaram alegações finais na forma dememoriais às fls. 651/664 (MP), 668/710 (primeiro requerido) e 713/742(segundo requerido).

Vieram os autos conclusos.

É o relatório, em síntese.

DECIDO.

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As preliminares suscitadas nas contestaçõesapresentadas pelos requeridos já foram devidamente enfrentadas erejeitadas pela decisão de fls. 560/562.

Em alegações finais, o segundo requerido aindainvoca preliminar de impossibilidade de utilização de prova emprestada,referindo-se a uma suposta impossibilidade de consideração, neste feito,como prova, da sentença proferida na esfera trabalhista, onde não figuroucomo parte.

Ocorre que a sentença proferida na Justiça doTrabalho não figura, neste feito, na qualidade de prova emprestada, tendo,tão-somente, sido colacionada na exordial como peça deflagradora daapuração administrativa levada a efeito pelo MP no que concerne aosfatos veiculados no reportado édito judicial, de resto também investigadosem atividade instrutória permeada pelo contraditório e ampla defesanestes autos.

Rejeito, assim, a preliminar.

O primeiro requerido, a seu turno, em seus memoriais,suscita preliminar de incompetência absoluta deste juízo, lastreando-se,para tanto, na edição da EC 85, de 09/07/2012, publicada no DOE de10/07/2012, a qual acresceu a alínea “h”, ao art. 109, da CE, atribuindo aoE. TJES competência originária “nas ações que possam resultar nasuspensão ou perda dos direitos políticos ou na perda da função públicaou de mandato eletivo, aqueles que tenham foro no Tribunal de Justiçapor prerrogativa de função, previsto nesta Constituição”.

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Ocorre que nenhum dos requeridos ocupa,hodiernamente, o cargo de Prefeito Municipal de Guarapari, circunstânciaque, à toda evidência, possui o condão de esvaziar a hipótese deincidência de referida inovação legislativa.

Rejeito, assim, mais esta preliminar.

No mérito, o caso é de procedência parcial dospedidos.

Como cediço, a probidade administrativa representauma faceta da moralidade administrativa, espelhando o dever de o"funcionário servir à administração com honestidade, procedendo noexercício de suas funções, sem aproveitar os poderes ou facilidades delesdecorrentes em proveito pessoal ou de outrem a quem queira favorecer ",conforme bem leciona José Afonso da Silva em seu Curso de DireitoConstitucional Positivo, 8ª ed. São Paulo: Malheiros, p. 571.

Afinada a esta assertiva, a Constituição Federal, emseu art. 37, § 4º, sanciona com severidade os atos de improbidadeadministrativa, in verbis:

"Os atos de improbidade administrativa importarão asuspensão dos direitos políticos, a perda da funçãopública, a indisponibilidade dos bens e oressarcimento ao erário, na forma e gradaçãoprevistas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível."

Outrossim, a LIA, ao complementar o textoconstitucional e conferir ao representante do Ministério Públicolegitimação para agir nos casos ali arrolados, definiu de maneira ampla o

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alcance da norma, a ela sujeitando qualquer agente público, servidor ounão, contra a administração direta, indireta ou fundacional de qualquerdos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, eestabeleceu, ainda, o dever dos agentes públicos de qualquer nível ouhierarquia de “velar pela estrita observância dos princípios de legalidade,impessoalidade, moralidade e publicidade no trato dos assuntos que lhessão afetos” (art. 4º).

A moralidade do ato administrativo aliada à sualegalidade e finalidade constituem pressupostos de sua validade e sem taispredicados toda atividade administrativa emerge como ilegítima.

O ato ímprobo, a seu turno, mais do que um atoilegal, é um ato de desonestidade do servidor ou agente público para coma administração, e, portanto, não prescinde de dolo ou culpa graveevidenciadora de má-fé para que se possa configurar.

No caso dos autos, é possível inferir que a presentedemanda iniciou-se a partir do recebimento, pelo MP, de ofícioencaminhado pela Justiça do Trabalho, dando conta da condenação doMunicípio de Guarapari ao pagamento de verbas trabalhistas em razão danomeação para exercício de cargo em comissão e contrataçõestemporárias sucessivas da Srª Adriana Ferreira Vieira, em desconformidadecom os requisitos constitucionais e legais.

1. Da conduta do segundo requerido.

Neste contexto, ao segundo requerido, ANTONICOGOTTARDO, é imputada apenas a conduta consistente na nomeação dereportada servidora para ocupação de cargo em comissão (“Encarregado

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CC6”) que, no entender do MP, não se enquadra em nenhuma dasmodalidades excepcionadas no art. 37, II, da CF/88 (assessoramento, chefiaou direção), o que, conforme deduzido na inicial, teria implicado violaçãoaos princípios da moralidade, impessoalidade, legalidade e, maisespecificamente, ao princípio que apregoa a compulsoriedade do concursopúblico para o acesso ao serviço público.

Após sopesar o conjunto probatório, todavia, nãovislumbro conjuntura fático-jurídica que autorize o reconhecimento daprática de ato ímprobo pelo segundo requerido, já que não restouevidenciado pelo MP a ocorrência de hipótese de enriquecimento ilícito,lesão ao erário ou mesmo de má-fé ou dolo (ainda que genérico) dirigidoà violação aos princípios regentes da Administração Pública.

Na hipótese, como já dito, a única conduta praticadapelo segundo requerido (fato incontroverso), na condição, à época dosfatos, de Prefeito Municipal de Guarapari, residiu na nomeação (em22/02/2005, fls. 32) da servidora Adriana Ferreira Vieira para o provimentodo cargo em comissão de "Encarregado CC6" na Secretaria Municipal deSaúde, o que perdurou até a data de 31/01/2007, quando a mesma foiexonerada pelo primeiro requerido (fls. 34).

Referido cargo, segundo atestado pela testemunhaGILCÉIA CRISTINA GOMES, integrava a estrutura administrativa daSecretaria Municipal de Saúde e, a depender de sua lotação, poderiaostentar atribuições diversas. Tal é o que emerge do seguinte trecho deseu depoimento (fls. 637):

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"(...) que a servidora Adriana foi nomeada para ocuparcargo em comissão ainda na gestão do Sr. AntonicoGottardo; que o cargo objeto da nomeação foi o deencarregado da Secretaria Municipal de Saúde; que oscargos de encarregado tinham diversas atribuições adepender da secretaria a que estivesse vinculado; queo cargo em questão existia na estrutura administrativado município, mas não sabe dizer se as atribuiçõesdeste cargo tinham previsão em lei".

Esta realidade restou também atestada pelatestemunha CLÁUDIO GIANORDOLI TEIXEIRA (fls. 641/642):

"que o depoente figurou como Secretário Municipalde Saúde até início do ano de 2005; que no ano de2001, quando assumiu como Secretário de Saúde,havia uma situação difícil em relação aos cargos esalários no âmbito do funcionalismo municipal; quehavia um débito grande em relação ao pagamento desalários de servidores e fornecedores; que não haviano âmbito municipal uma grade adequada deprofissionais; que existiam cargos comissionadosdenominados pelas siglas CC1 a CC8, o queenglobava desde os cargos de Secretário eSubsecretário, até cargos como o de encarregado; quetodos esses cargos estavam à disposição daadministração para funções de chefia, direção eassessoramento; que acredita que a indicação para anomeação dos servidores declinados nos documentosde fls. 400 e 402 tenha sido motivada em razão de

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algum programa na área de saúde relacionado aoatendimento de urgência e emergência; que o cargode encarregado, embora conste nos reportadosofícios a função de técnico em enfermagem, não eraespecificamente para o exercício desta função técnica,servindo para outras atribuições como coordenação;(...) que as indicações dos nomes para a ocupação doscargos em comissão partia da própria SecretariaMunicipal de Saúde, baseando-se nas atribuições docargo e na qualificação profissional do indicado, o queera feito pelo corpo técnico da secretaria; (...) queacredita que as pessoas indicadas nos documentos defls. 400 e 402 foram indicadas para exercerem asfunções apontadas nos parênteses, ou seja, motorista,técnico em enfermagem etc.; que contudo reforça queo cargo CC6 era um cargo em comissão que nãoservia especificamente para estas funções demotorista ou técnico em enfermagem, podendo serutilizado, dentro da ótica da chefia, direção ouassessoramento, para outras atividades; que não sabeinformar se o cargo em questão tinha suas atribuiçõesdefinidas em lei; que como o programa era deurgência e emergência, as pessoas indicadas para aocupação dos cargos CC6 poderiam exercer, porexemplo, a despeito da formação indicada (motoristae técnico em enfermagem) funções de coordenaçãonas respectivas áreas; que poderia ter umacoordenação geral e coordenações pontuais deequipes de trabalho, em qualquer das áreas".

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Nota-se, assim, que o segundo requerido, na espécie,limitou-se a efetivar o provimento de cargo em comissão ("EncarregadoCC6") pregressamente criado e, portanto, já existente na estruturaadministrativa da Prefeitura Municipal de Guarapari, visando atender àseara da saúde, cujas atribuições ligavam-se, em princípio, sob a ótica dadeficiente delimitação legal, à atividade de assessoramento.

A circunstância de referida servidora, enquantoocupante do cargo de "Encarregado CC6", ter exercido, de fato, funçãotécnica (na área de enfermagem) desbordante do figurino constitucionalestabelecido para os cargos em comissão, ou ainda a hodiernaconstatação de o cargo em questão não ostentar, ante omissão oucarência regulamentar, atribuições compatíveis com referidoenquadramento, não traduzem, de per si, motivos suficientes para acaracterização da prática de ato de improbidade pelo gestor municipalresponsável pela nomeação, porquanto, conforme esclarecido pelatestemunha CLÁUDIO GIANORDOLI TEIXEIRA, a despeito de inserir-se nafunção de assessoramento, o cargo em questão (CC6) acabava sendoutilizado, ainda que de forma irregular, para variadas atividades, inclusivede caráter técnico, por orientação, muitas vezes, do próprio responsávelpela pasta de sua lotação.

Vale ressaltar, no particular, que não houve aevidenciação, nos autos, da prática, pelo segundo requerido, de condutaque pudesse revelar seu intento ou efetiva interferência na definição oudesvio das atribuições a serem exercidas pela servidora no cargo alhuresenfatizado, de modo que a discussão atinente à definição das atribuiçõeseminentemente técnicas do cargo objeto de provimento repercute naseara da legalidade, e não da improbidade. Mesmo porque, a existência de

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previsão legal para a nomeação possui o condão de retirar o dolo doagente, ao passo que o exame da própria constitucionalidade dosparâmetros normativos do cargo existente na estrutura administrativa damunicipalidade envolve controvérsia constitucional de relativacomplexidade jurídica que exige o exame da compatibilidade das Leis como texto constitucional.

Avulta, pois, em importância a advertência, outrora járegistrada, de que o ato ímprobo, mais do que um ato ilegal, é um ato dedesonestidade do servidor ou agente público para com a administração, e,portanto, não prescinde de dolo ou culpa grave evidenciadora de má-fépara que se possa configurar, de modo que nem toda ilegalidade pode sererigida em ato de improbidade administrativo.

Assim vem entendendo a jurisprudência em situaçõessimilares à tratada nestes autos, in verbis:

“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE IMPROBIDADEADMINISTRATIVA. NOMEAÇÃO PARA CARGO EMCOMISSÃO. DISPENSA DE CONCURSO PÚBLICO.Servidores que exerceram funções que não eram dechefia, direção ou assessoramento. Ausência dedolo/má-fé do agente. Inexistência de ato ímprobo.Manutenção da sentença. Recurso conhecido eimprovido. Não se deve trivializar a Lei daimprobidade administrativa, seja porque a severidadedas punições nela previstas recomenda cautela eequilíbrio na sua aplicação, seja porque os remédiosjurídicos para as desconformidades entre o ideal e o

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real da administração brasileira não se resumem àssanções impostas ao administrador, tanto maisquando nosso ordenamento atribui ao juiz, pelaferramenta da ação civil pública, amplos e genéricospoderes de editar provimentos mandamentais deregularização do funcionamento das atividades doestado (RESP 892.818/RS).” (TJSE; AC 2012220319; Ac.18087/2012; Primeira Câmara Cível; Relª Desª MariaAparecida S. Gama da Silva; DJSE 07/12/2012; Pág.28).

“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE IMPROBIDADEADMINISTRATIVA. NOMEAÇÃO PARA CARGO EMCOMISSÃO. FUNÇÃO QUE NÃO É DE DIREÇÃO,CHEFIA OU ASSESSORAMENTO.INCONSTITUCIONALIDADE. AUSÊNCIA DEDECLARAÇÃO. CONTROVÉRSIA CONSTITUCIONAL.INEXISTÊNCIA DE ATO ÍMPROBO. SENTENÇAREFORMADA. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE.APELAÇÃO CONHECIDA E PROVIDA. DECISÃOUNÂNIME. Não se deve trivializar a Lei daimprobidade administrativa, seja porque a severidadedas punições nela previstas recomenda cautela eequilíbrio na sua aplicação, seja porque os remédiosjurídicos para as desconformidades entre o ideal e oreal da administração brasileira não se resumem àssanções impostas ao administrador, tanto maisquando nosso ordenamento atribui ao juiz, pelaferramenta da ação civil pública, amplos e genéricos

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poderes de editar provimentos mandamentais deregularização do funcionamento das atividades doestado (RESP 892.818/RS). A Constituição daRepública, a partir da emenda nº 19/98, somenteadmite cargos em comissão para atribuições dedireção, de chefia e de assessoramento. Todavia, anomeação de servidor público para cargo emcomissão com atribuições técnicas, depois do adventoda Emenda Constitucional nº 19/98, não configura,por si só, ato de improbidade que viola princípio daadministração pública, porquanto se trata de atoadministrativo cuja legalidade envolve controvérsiaconstitucional de relativa complexidade jurídica queexige o exame da compatibilidade das Leis com otexto constitucional. Sem a declaração deinconstitucionalidade do texto legal, ainda que deforma incidental, a inicial da ação de improbidadesequer merece recebimento.” (TJSE; AC 2012206899;Ac. 8922/2012; Primeira Câmara Cível; Relª Desª MariaAparecida S. Gama da Silva; DJSE 28/06/2012; Pág.24).

“AÇÃO CIVIL PÚBLICA IMPROBIDADEADMINISTRATIVA NOMEAÇÃO DE SERVIDOR PARAOCUPAR CARGO EM COMISSÃO. Deixa-se deenfrentar a alegação de nulidade processual, nostermos do art. 249, § 2º, do CPC, por antever, noexame da matéria de mérito trazida a debate norecurso, desfecho favorável ao recorrente Ato de

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nomeação autorizado por Lei Ilícito de improbidadeadministrativa não caracterizado O que se discute naação civil pública não é a atividade administrativapropriamente dita, da qual se infere a improbidade,mas a própria Lei Municipal a qual, como resultado deatividade legislativa, sujeita-se a controle próprio eespecífico de legalidade e constitucionalidade, quenão pode ser confundido com o controle deprobidade Recurso provido para julgar improcedentea ação.” (TJSP; APL 9071255-21.2007.8.26.0000; Ac.5496679; Teodoro Sampaio; Quinta Câmara de DireitoPúblico; Rel. Des. Xavier de Aquino; Julg. 24/10/2011;DJESP 30/01/2012).

“AÇÃO CIVIL PÚBLICA. Nomeação em cargo emcomissão de servidor para exercer cargo meramenteoperacional. Necessidade de concurso público. Nemtoda ilegalidade pode ser erigida em ato deimprobidade administrativo. Necessidade de dolo emá-fé. Recurso provido para julgar improcedente aação.” (TJSP; APL-Rev 774.467.5/9; Ac. 3310544;Serrana; Décima Primeira Câmara de Direito Público;Rel. Des. Francisco Vicente Rossi; Julg. 13/10/2008;DJESP 27/11/2008).

“(...) Ainda que o cargo de encarregado de transportesnão pudesse ser de nomeação em comissão, semmá-fé não se poderia falar em improbidadeadministrativa.” (TJSP; APL-Rev 660.418.5/0; Ac.

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2450606; Brodowski; Sétima Câmara de DireitoPúblico; Rel. Des. Barreto Fonseca; Julg. 21/01/2008;DJESP 29/05/2008).

2. Da conduta do primeiro requerido.

Em relação ao primeiro requerido, EDSONFIGUEIREDO MAGALHÃES, imputa-se-lhe a conduta de haver contratadotemporariamente a servidora antes ocupante do cargo em comissão de"Encarregado CC6", Adriana Ferreira Vieira, após efetivar sua exoneração,sem a realização de concurso público, para o exercício de atividade denatureza técnica ligada à saúde.

Com efeito, segundo consta dos autos, o primeirorequerido, após haver sucedido o segundo requerido na Chefia do PoderExecutivo local, exonerou, precisamente em 31/01/2007, a então servidoraAdriana Ferreira Vieira do cargo em comissão de “Encarregado CC6” (fls.33/35), ocupado desde 2005, e, ato-contínuo, a contratoutemporariamente para o exercício da função de “Técnico em Enfermagem”,o que se deu em 15/02/2007, e se renovou até 31/08/2007.

A questão reside em saber se a contratação efetivadapelo primeiro requerido, sem a realização de pregresso concurso público,poderia ter sido concretizada, levando-se em conta não apenas a naturezada atividade contratada como também a ausência de implementação deum prévio processo administrativo evidenciador da urgência utilizadacomo justificativa para a contratação ou mesmo de um processo seletivo,ainda que simplificado, voltado à isonômica e impessoal oportunização eescolha de destinatários para a formalização do reportado vínculo denatureza precária com a Administração Municipal.

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Neste último aspecto, cumpre desde já consignar que,embora tenha o primeiro requerido afirmado em sua contestação e nasalegações finais que a contratação da servidora Adriana Ferreira Vieiradeu-se após o desencadeamento de processo seletivo simplificado, emnenhum momento fez juntar ao processo qualquer documento quepudesse corroborar sua afirmação.

Ao revés, do conjunto probatório carreado aos autosé possível inferir que a contratação em questão foi operacionalizada semobservância dos requisitos constitucionais e legais, e sem atendimento deformalidades voltadas ao atendimento das diretrizes da impessoalidade,publicidade e isonomia, dentre outras, com isso restando maltratados osprincípios que regem a atuação do público e probo gestor.

Como de sabença geral, no art. 37 da ConstituiçãoFederal estão descritas as normas constitucionais de observânciaobrigatória para a Administração Pública da União, dos Estados, do DistritoFederal e dos Municípios, direta ou indireta, de qualquer dos Poderes,dentre as quais destacam-se as diretrizes mais abrangentes da legalidade,impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.

Não por outra razão, na redação dada pela Emenda nº19/98 foi reafirmado e consagrado o princípio da acessibilidade aoscargos, funções e empregos públicos aos brasileiros que preencham osrequisitos estabelecidos em lei e aos estrangeiros, na forma que a leidispuser (inciso I), assim como o da aprovação prévia em concurso públicopara a investidura em cargo ou emprego público (inciso II).

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A exigência do concurso, requisitada também para aAdministração Pública indireta, inclusive para as empresas estataisexploradoras de atividade econômica, é iluminada pelos critérios demoralidade, impessoalidade e eficiência, não mais restrita à primeirainvestidura em cargo inicial de carreira.

Manoel Gonçalves Ferreira Filho observava que:

“a exigência do concurso é de caráter moralizador.Visa a obstar que o filhotismo seja erigido em critériopara o preenchimento dos cargos públicos. Faz domérito o critério para esse ingresso” (Comentários àConstituição brasileira, São Paulo, Saraiva, 1974, v. 2,p. 198).

Por outro lado, mister reconhecer que o postuladofundamental do Estado Democrático de Direito (CF/88, art. 1º) representaum princípio constitucional estruturante que é densificado pelo primadoda igualdade (art. 5º, caput), e ostenta o status de princípio constitucionalgeral, concretizado, à sua vez, pelo princípio constitucional especial doconcurso público (CF/88, art. 37, II). Realmente, segundo escólio deDiogenes Gasparini, “pelo concurso concretiza-se o princípio da igualdade”(Direito Administrativo, 5ª ed., São Paulo, Saraiva, 2000, p. 160).

Comentando o referido e magno preceptivo legal,Reinaldo Moreira Bruno e Manolo Del Olmo asseveram que:

"Como regra geral, nos termos do que dispõe o art.37, II, da Constituição Federal, o ingresso no serviçopúblico dá-se mediante a realização de concurso

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público. (...) Constitui-se, assim, o concurso público,em regra moralizadora e assecuratória da isonomia eda impessoalidade no recrutamento de pessoal para aAdministração Pública..." (in Servidor Público, Del Rey,2006, Belo Horizonte - MG - g. N.)

Celso Antônio Bandeira de Mello, do alto de suaexcelente doutrina, erige o preceito em verdadeiro princípio constitucional,verbis:

"O que a Lei Magna visou com os princípios daacessibilidade e do concurso público foi, de um lado,ensejar a todos iguais oportunidades de disputarcargos ou empregos na Administração direta eindireta. De outro lado, propôs-se a impedir tanto oingresso sem concurso, ressalvadas as exceçõesprevistas na Constituição, quanto obstar a que oservidor habilitado por concurso para cargo ouemprego de determinada natureza viesse depois a seragraciado com cargo ou emprego permanente deoutra natureza, pois esta seria uma forma de fraudar arazão de ser do concurso público." (in Curso deDireito Administrativo, p. 266, 2006, Malheiros, SãoPaulo - Capital)

É importante lembrar que o citado princípio restourepetido, como não poderia deixar de ser, no artigo 32, inciso II, daConstituição do Estado do Espírito Santo, e no artigo 96, inciso II, da LeiOrgânica do Município de Guarapari.

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Assim, como primeira conclusão jurídica, no caso,tem-se que, de fato, à luz do ordenamento jurídico nacional, regional elocal, a todos os entes federativos se impõe a observância do princípio doconcurso, como regra geral para acessibilidade a cargos e empregospúblicos, o que, de resto, afigura-se incontroverso nos autos.

Daí porque a obrigatoriedade da realização deconcurso como forma de acesso a cargo público fora aprimorada ao longoda evolução constitucional brasileira, de modo a valer para qualquer cargoinicial de carreira ou isolado, ressalvadas, como já dito, além das demais epontuais exceções constitucionais, como as nomeações para cargo deprovimento em comissão declarado em lei de livre nomeação eexoneração, os casos de contratação por tempo determinado para atendera necessidade temporária de excepcional interesse público, conforme viera ser estipulado em lei.

Com efeito, a própria Constituição Federal de 1988,no inciso IX, do art. 37, no que interessa ao deslinde da presente demanda,autorizou, em cunho excepcional, a possibilidade de contratação deservidores públicos, sem concurso, mediante os seguintes requisitos: a)previsão em lei; b) contratação por tempo determinado; c) necessidadetemporária, e d) excepcional interesse público.

Quanto aos requisitos acima destacados, permito-metranscrever a prestimosa lição doutrinária de Adilson Abreu Dallari (RegimeConstitucional dos Servidores Públicos, RT, 1992, p. 124), onde sevislumbra, com clareza, a importância de serem harmonicamente aferidos:

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“Está absolutamente claro que não mais se podeadmitir pessoal por tempo determinado, para exercerfunções permanentes, pois o trabalho a ser executadoprecisa ser, também, eventual ou temporário, além doque a contratação somente se justifica para atender aum interesse público qualificado como excepcional,ou seja, uma situação extremamente importante, quenão possa ser atendida de outra forma. Em resumo, épreciso atender ao espírito da Constituição Federal,evitando um novo arrombamento dessa abertura,impedindo que a contratação temporária sirva (maisuma vez) para contornar a exigência de concursopúblico, levando à admissão indiscriminada depessoal, em detrimento do funcionalismo público, docontrole que deve ser exercido pelo Poder Legislativo,da qualidade dos serviços prestados à população e,por último, arruinando as finanças públicas e oplanejamento orçamentário”.

Neste ponto exsurgem requisitos desatendidos peloprimeiro requerido, porquanto não há como caracterizar a atividadeentregue à Srª Adriana Ferreira Vieira, com violação aos princípios daimpessoalidade e isonomia, como adiante melhor restará esclarecido,como temporária e/ou eventual, pela sua própria natureza de funçãopermanente, ligada à prestação de serviços de saúde à população. Assim jáassentou o TJES, conforme infere-se do julgado seguinte, que versa sobresituação similar:

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“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. 1)preliminar de inadequação da via eleita. Controleabstrato de Lei Municipal. Confronto comConstituição Estadual. Preliminar rejeitada. 2) mérito.Lei Municipal nº 08/03. Investidura em cargo ouemprego públicos. Concurso público. Aprovaçãoprévia. Regra geral. Criação de cargos comissionados.Exceções constitucionais. Não enquadramento.Inconstitucionalidade declarada. 1) rejeita-se apreliminar de inadequação da via eleita, pois o objetoda presente ação direta é o controle abstrato de LeiMunicipal que se encontra em confronto com ditamesda Constituição Estadual, nos exatos termos do art.125, §2º, da Carta Política de 1988. Preliminarrejeitada. 2) sabendo-se que a regra geral parainvestidura em cargo ou emprego públicos é o daprévia aprovação em concurso público, e que oscargos de psicólogo, odontólogo e médico não seenquadram nas duas exceções constitucionais(contratação temporária ou natureza comissionadadas funções), mister reconhecer que a Lei Municipalnº 08/03 agride o art. 32, II, V e IX, da ConstituiçãoEstadual, mormente quando referidos cargos não sedestinam às atribuições de direção, chefia eassessoramento. Inconstitucionalidade declarada.”(TJES; ADI 100.03.002620-5; Tribunal Pleno; Rel. Des.Rômulo Taddei; Julg. 03/06/2004; DJES 22/06/2005).

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Vale observar que o SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL,de forma recorrente, tem declarado inconstitucionais leis estaduais emunicipais com a argumentação de que não se admite a possibilidade deque atividades de caráter ordinário e permanente caracterizem oexcepcional interesse público necessário para haver a dispensa doconcurso público do art. 37, IX, da Constituição Federal, sendo necessário,conforme este órgão julgador, que a atividade seja de caráter eventual,temporária ou excepcional. É o que se infere dos julgados infratranscritos:

“CONSTITUCIONAL. LEI ESTADUAL CAPIXABA QUEDISCIPLINOU A CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA DESERVIDORES PÚBLICOS DA ÁREA DE SAÚDE.POSSÍVEL EXCEÇÃO PREVISTA NO INCISO IX DO ART.37 DA LEI MAIOR. INCONSTITUCIONALIDADE. ADIJULGADA PROCEDENTE. I - A contratação temporáriade servidores sem concurso público é exceção, e nãoregra na Administração Pública, e há de serregulamentada por lei do ente federativo que assimdisponha. II - Para que se efetue a contrataçãotemporária, é necessário que não apenas sejaestipulado o prazo de contratação em lei, mas,principalmente, que o serviço a ser prestado revista-sedo caráter da temporariedade. III - O serviço públicode saúde é essencial, jamais pode-se caracterizarcomo temporário, razão pela qual não assiste razão àAdministração estadual capixaba ao contratartemporariamente servidores para exercer tais funções.IV - Prazo de contratação prorrogado por nova leicomplementar: inconstitucionalidade. V - É pacífica a

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jurisprudência desta Corte no sentido de não permitircontratação temporária de servidores para a execuçãode serviços meramente burocráticos. Ausência derelevância e interesse social nesses casos. VI - Açãoque se julga procedente.” (Pleno, ADI 3430/ES, RelatorMin. RICARDO LEWANDOWSKI, j. 12/08/2009).

“CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. SERVIDORPÚBLICO: CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA. C.F., art. 37, IX. Lei 9.198/90 e Lei 10.827/94, do Estado do Paraná.I. - A regra é a admissão de servidor público medianteconcurso público: C.F., art. 37, II. As duas exceções àregra são para os cargos em comissão referidos noinciso II do art. 37 e a contratação por tempodeterminado para atender a necessidade temporáriade excepcional interesse público: C.F., art. 37, IX.Nessa hipótese, deverão ser atendidas as seguintescondições: a) previsão em lei dos casos; b) tempodeterminado; c) necessidade temporária de interessepúblico excepcional. II. - Precedentes do SupremoTribunal Federal: ADI 1.500/ES, 2.229/ES e 1.219/PB,Ministro Carlos Velloso; ADI 2.125-MC/DF e 890/DF,Ministro Maurício Corrêa; ADI 2.380-MC/DF, MinistroMoreira Alves; ADI 2.987/SC, Ministro SepúlvedaPertence. III. - A lei referida no inciso IX do art. 37,C.F., deverá estabelecer os casos de contrataçãotemporária. No caso, as leis impugnadas instituemhipóteses abrangentes e genéricas de contrataçãotemporária, não especificando a contingência fática

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que evidenciaria a situação de emergência, atribuindoao chefe do Poder interessado na contrataçãoestabelecer os casos de contratação:inconstitucionalidade. IV. - Ação direta deinconstitucionalidade julgada procedente.” (Pleno, ADI3210/PR, Relator Min. CARLOS VELLOSO, j.11/11/2004).

“CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. SERVIDORPÚBLICO: DEFENSOR PÚBLICO: CONTRATAÇÃOTEMPORÁRIA. C.F., art. 37, II e IX. Lei 6.094, de 2000,do Estado do Espírito Santo: inconstitucionalidade. I. -A regra é a admissão de servidor público medianteconcurso público: C.F., art. 37, II. As duas exceções àregra são para os cargos em comissão referidos noinciso II do art. 37, e a contratação de pessoal portempo determinado para atender a necessidadetemporária de excepcional interesse público. CF, art. 37, IX. Nessa hipótese, deverão ser atendidas asseguintes condições: a) previsão em lei dos cargos; b)tempo determinado; c) necessidade temporária deinteresse público; d) interesse público excepcional. II. -Lei 6.094/2000, do Estado do Espírito Santo, queautoriza o Poder Executivo a contratar,temporariamente, defensores públicos:inconstitucionalidade. III. - Ação direta deinconstitucionalidade julgada procedente.” (Pleno, ADI2229/ES, Relator Min. CARLOS VELLOSO, j.09/06/2004).

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Tal entendimento também é compartilhado poroutros Tribunais de Justiça, conforme apreende-se da leitura dos recentesjulgados a seguir transcritos:

“AÇÃO CIVIL PÚBLICA - Lei de ImprobidadeAdministrativa. - Administração pública - Princípio dalegalidade - Contratação temporária de médico -Inexistência de excepcional interesse público - Afrontaao princípio da legalidade - Licitação - Procedimentopara dispensa ou inexigibilidade - Ausência - Violaçãodas formalidades previstas na Lei nº 8.666/98 - CF/88,artigo 37, IX - Recurso provido.” (TJSP, RelatorAntonio Carlos Malheiros, 3ª Câmara de DireitoPúblico, j. 22/09/2009).

"APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PREFEITOMUNICIPAL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.CONTRATAÇÃO DE SERVIDORES PÚBLICOS SEMCONCURSO PÚBLICO, POR INTERMÉDIO DEASSOCIAÇÃO DE PROTEÇÃO À MATERNIDADE EINFÂNCIA. QUEBRA DA LEGALIDADE,IMPESSOALIDADE E MORALIDADE ADMINISTRATIVA.ATO ÍMPROBO CARACTERIZADO. PROVASSUFICIENTES. ILEGITIMIDADE PASSIVA ECERCEAMENTO DE DEFESA. PRELIMINARESAFASTADAS. PREJULGAMENTO INOCORRENTE. DOLOVISÍVEL NA ATITUDE DO RÉU ENQUANTO PREFEITOMUNICIPAL. ADEMAIS, VIOLAÇÃO DE PRINCÍPIOS DAADMINISTRAÇÃO QUE INDEPENDE DE DOLO OUCULPA (ART. 11, LIA). JURISPRUDÊNCIA DO STJ.

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AUSÊNCIA DE PREJUÍZO AO ERÁRIO QUE NÃOAFASTA A PUNIÇÃO PELA IMPROBIDADE (ART. 21, LIA). CONDENAÇÃO MANTIDA. APELO DESPROVIDO.SENTENÇA REFORMADA EM PARTE, DE OFÍCIO,SOMENTE PARA READEQUAR AS SANÇÕESIMPOSTAS.” (TJPR - 5ª C. Cível - AC 0451537-9 - ForoRegional de Campina Grande do Sul da RegiãoMetropolitana de Curitiba - Rel.: Juiz Subst. 2º G.Rogério Ribas - Por maioria - J. 22.09.2009).

“DIREITO ADMINISTRATIVO. CONTRATAÇÃOIRREGULAR DE SERVIDORA SEM CONCURSOPÚBLICO. OFENSA AOS PRINCÍPIOSADMINISTRATIVOS. PRESCRIÇÃO. RESSARCIMENTO.SERVIÇOS PRESTADOS. INOCORRÊNCIA DE DANOAO ERÁRIO. a) O Apelado, quando Prefeito, nãoobservou os princípios que regem a AdministraçãoPública ao contratar e manter a Servidora semconcurso público prestando serviços ao Município, oque tipificaria sua conduta no art. 11 da Lei nº 8.429/92. Todavia, houve a prescrição dessa pretensão, nostermos do art. 23, inciso I, da Lei nº 8.429/92. b)Diferentemente, a pretensão de ressarcimento dosdanos ao erário é imprescritível, conforme dispõe a Constituição da República no art. 37, § 5º. c)Entrementes, nos termos do artigo 12, inciso III, da Leide Improbidade Administrativa, o ressarcimento dosdanos ao erário fica condicionado à prova do efetivoprejuízo aos cofres públicos. d) Nessas condições, não

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é possível aplicar a sanção de ressarcimento dosdanos ao erário, uma vez que não houve prejuízo aoscofres públicos, porquanto a Servidora, mesmocontratada ilegalmente, prestou os seus serviçosregularmente ao Município. 2) APELO A QUE SE NEGAPROVIMENTO.” (TJPR - 5ª C. Cível - AC 0533690-5 -Andirá - Rel.: Des. Leonel Cunha - Unânime - J.16.12.2008).

Daí a inconstitucionalidade material da Lei Municipalnº 2.687/2007, aqui reconhecida incidenter tantum, ao menos na parcelaem que dispôs sobre autorização para a contratação temporária de“Técnicos em Enfermagem” (fls. 647/649), ante a caracterização deatividade eminentemente técnica, desprovida dos requisitos daeventualidade e da temporariedade.

Mas ainda que se pretenda resguardar a esferajurídica do primeiro requerido sob a assertiva de que sua conduta visouapenas prestar atendimento aos termos da maculada legislação municipal,outros vícios emergem dos contornos da contratação ora questionada,aptos, de per si, à evidenciação da prática de improbidade. Refiro-me,aqui, ao fato de o primeiro requerido, na qualidade de gestor mor damunicipalidade, não ter evidenciado, como encargo que lhe assistia, emregular e prévio procedimento administrativo, a efetiva ocorrência desituação imprevisível de excepcional interesse público que estivesse ajustificar a contratação direta da Srª Adriana Ferreira Vieira.

Em outras palavras, não houve regular e préviademonstração, em processo administrativo devidamente motivado, doexcepcional interesse público caracterizado pela necessidade de imediatoatendimento dos serviços relacionados à saúde na seara da enfermagem,

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que estivesse a impossibilitar, ao menos, a formalização de um processo,ainda que simplificado, de seleção, em cunho a atender, minimamente, aosprincípios da impessoalidade e do livre acesso aos cargos e funçõespúblicas.

Além de se reportar a situação da saúde a um serviçopúblico cuja demanda é de fácil previsibilidade, passível, portanto, de sersubmetido a benfazejo planejamento1, nota-se dos autos que, emmomento algum, houve a instauração, pelo primeiro requerido, de regularprocedimento administrativo voltado a séria e segura evidenciação de realinviabilidade operacional do ente público, em cunho e gravidade ajustificar a contratação direta da Srª Adriana Ferreira Vieira, ao que sesoma a ausência de realização de um processo seletivo, ainda quesimplificado, para escolha objetiva dos interessados e avaliação segundocritérios pré-definidos.

Daí a pertinência da indagação: na situação em tela,qual foi o critério utilizado para a contratação direta e temporária da SrªAdriana Ferreira Vieira? Amizade? Parentesco? Afinidade Política?

À toda evidência, não se buscou o atendimento doprincípio da eficiência (art. 37, caput da CF/88) na escolha da melhormão-de-obra. Caso fosse realizado concurso público, ou mesmo um

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1 O que igualmente desautoriza a dispensa licitatória, conforme entendimentosedimentado no âmbito no TCU: “A contratação direta com fundamento em situaçãoemergencial deve decorrer de evento incerto e imprevisível, e não da falta deplanejamento ou desídia administrativa do gestor.” Acórdão 3267/2007 PrimeiraCâmara (Sumário).

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processo de seleção simplificado, ter-se-ia, ao menos, sinalizado com ointento de resguardo do interesse público.

A gravidade da omissão acima enfatizada emerge,ainda, da constatação de que, no ano de 2006, segundo depoimentoprestado pela testemunha JACINTA MERIGUETE COSTA (fls. 639/640),houve a realização de concurso público no âmbito do Município deGuarapari abrangendo justamente os cargos de “Técnico em Enfermagem”,sendo que a convocação dos primeiros aprovados, segundo a referidatestemunha, deu-se já em meados do ano de 2007, ao passo que todos osaprovados no concurso para o cargo de “Técnico em Enfermagem” foramchamados pela municipalidade, o que, à toda evidência, torna injustificávela contratação temporária discutida nestes autos, levada a efeito peloprimeiro requerido na data de 15/02/2007, sem a realização sequer deprocesso seletivo simplificado, e com aditivo de prorrogação para vigênciaaté 31/08/2007.

Esta conjuntura reforça a prática corriqueira, noâmbito da municipalidade, da ilegalidade reproduzida na contratação daSrª Adriana Ferreira Vieira, como de resto ressaltado na sentença prolatadano âmbito da Justiça Laboral (colacionada com a exordial), sendo que, nocaso subexamine, a ilegalidade da referida contratação deu-se também emdetrimento de aprovados em prévio concurso público homologado aindano ano de 2006 (fls. 639) para atendimento da idêntica função permanentee previsível (de enfermagem) na área de saúde.

Analisando, portanto, a conduta do primeirorequerido, percebe-se que a mesma enquadra-se nos ditames do art. 11,caput e incs. I e V, da LIA, ante a frustração de concurso público mediante

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a utilização de contratação temporária sem respaldo nos requisitosconstitucionais, visando fim proibido em lei, visto que também nãoobservada a diretriz da escolha impessoal do melhor profissional para acomposição do quadro de servidores municipais.

Em outros termos, tem-se que, ao implementar acontratação da Srª Adriana Ferreira Vieira sem concurso, e o que é pior,sem a concretização de um prévio processo seletivo simplificado, e ainda adespeito da existência de aprovados em pregresso concurso público jáhomologado para o preenchimento do idêntico cargo agraciado com ovínculo precário, o primeiro requerido, mesmo sem a comprovação deefetivo prejuízo ao erário, e na condição de gestor municipal, porquedesprovido dos requisitos legais exigidos para a contratação temporária,praticou ato de improbidade administrativa, com fulcro no art. 11, da LIA,por violação aos princípios que regem a administração pública, como o dalegalidade, porque tal prática é vedada pelo ordenamento jurídico; o daeficiência, já que no concurso presume-se a escolha dos melhorescandidatos para os quadros da administração pública; o daimpessoalidade, pois a escolha da contratada se dirigiu a determinadapessoa em detrimento de outras; ao da moralidade, já que o trato da coisapública impõe conduta pautada por parâmetros éticos e legais,incompatíveis com o favorecimento injustificado de poucos, e ao daisonomia, visto que devem todos ter a mesma oportunidade de acesso aoserviço público.

A jurisprudência solidifica esse entendimento:“(...) PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. CONTRATAÇÃOTEMPORÁRIA DE MÉDICO. INEXISTÊNCIA DEEXCEPCIONAL INTERESSE PÚBLICO. AFRONTA AO

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PROCESSO nº 021.07.009973-0

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PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. LICITAÇÃO.PROCEDIMENTO PARA DISPENSA OUINEXIGIBILIDADE. AUSÊNCIA. Violação dasformalidades previstas na Lei n 8.666/98. CF/88, artigo37, caput e IX. Recurso provido.” (TJSP; APL-Rev758.827.5/5; Ac. 4107112; Taubaté; Terceira Câmarade Direito Público; Rel. Des. Antonio Carlos Malheiros;Julg. 22/09/2009; DJESP 30/10/2009).

“1) Irretocável é a decisão que legitima o gestor maiorpara figurar no pólo passivo da demanda quando osatos são praticados por um agente produto de umarelação de subordinação no exercício de um cargo,delegado pelo chefe do executivo estadual; 2) Não háde falar em ausência de lesividade, quando aadministração foi violada em seus princípiosconstitucionais; 3) Deve ser declarado nulo o contratotemporário firmado pela administração estadual senão restar efetivamente demonstrada a necessidade eo excepcional interesse público; 4) Acertada é adecisão que julgou como ato de improbidadeadministrativa a contratação sem concurso público,sem atender os requisitos da necessidade eexcepcional interesse público; 5) Apelação improvida.”(TJ-AP; AC 2033/05; Ac. 8502; Câmara Única; Rel. Des.Luiz Carlos; Julg. 30/08/2005; DOEAP 19/10/2005).No julgamento da Apelação Cível nº

0003947-25.2008.8.08.0021 (021080039478)2, oriunda deste Juízo de

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2 TJES, TERCEIRA CÂMARA CÍVEL, j. 25/09/2012, DJ 05/10/2012.

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Guarapari, em cujo bojo restou confirmada sentença de primeiro grau quecondenou o primeiro requerido pela prática de ato de improbidadeadministrativa consistente na contratação temporária de médico sem arealização de prévio procedimento seletivo, o Eminente Relator,Desembargador WILLIAN SILVA, em assertivas plenamente aplicáveis aocontexto fático-jurídico destes autos, assim consignou:

“Até em situações emergenciais, há modos certos eerrados de se agir. O mínimo que se poderia exigirpara se evitar a grotesca ilegalidade cometida seriarealizar-se “Processo seletivo simplificado” mediante aanálise do currículo dos interessados, apóspublicidade acerca da existência de vagas. Dessaforma haveria presunção iuris tantum de que somenteum dentre muitos possíveis médicos se interessoupela vaga. E que não se diga que era inviável, pelotempo, realizá-lo (o processo simplificado). Em buscaà internet, encontrei um exemplo que bem ilustra apossibilidade que se tinha de se agir com adequaçãona busca pela solução de uma situação emergencial.Trata-se de exemplo retirado da Prefeitura de VilaVelha. Abriu, por cinco dias, Processo seletivosimplificado (nº 007/2012) com vistas à contrataçãotemporária para atendimento de necessidades deexcepcional interesse público na educação, queanalisaria somente a documentação apresentadapelos interessados, a fim de classificá-los somente poresse critério (pontos obtidos a partir dos documentosrepresentativos do curriculum apresentados). Se assim

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tivessem agido os apelantes EDSON e MARIAHELENA, talvez se pudesse relevar a qualificação deímprobo dada ao ato de contratação temporária doapelante HUMBERTO, relevando-se o fator acimadestacado de não existir lei que preveja, no município,a contratação temporária. Ter-se-ia uma ilegalidade,mas não uma improbidade.”

O dolo do primeiro requerido, na espécie, portanto,decorre das próprias circunstâncias que permearam a prática do ato, emrazão da notória ofensa aos princípios da legalidade, impessoalidade,igualdade e eficiência, considerando, inclusive, a circunstância de amunicipalidade, à época da contratação, contar com um quadro decandidatos aprovados em pregresso concurso público para preenchimentodo idêntico cargo de “Técnico em Enfermagem”.

Por ser um estado anímico do agente, a má-fé (doloou culpa gravíssima) deve sempre ser extraída das circunstâncias do caso,retirada da leitura de elementos objetivos constantes dos autos. Aninguém seria dado imaginar que a prova da má-fé tivesse que resultar deuma declaração do agente ou de testemunhas negando ter ele agidodeliberadamente com o fim de fraudar a lei, de obter vantagem indevidaetc. O julgador, na apreciação da prova, deve levar em conta as máximasde experiência, subministradas pelo que de ordinário acontece no planoempírico, considerada a realidade social circundante.

Vale observar, no particular, que, conformeentendimento do SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, a “caracterização deimprobidade censurada pelo art. 11 da Lei 8.429/1992 dispensa acomprovação de intenção específica de violar princípios administrativos,

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sendo suficiente o dolo genérico.” (STJ-2ª Turma, REsp. 1229779/MG,Relator Ministro HERMAN BENJAMIN, j. 16/08/2011, DJe 05/09/2011).

De observar-se que não aproveita ao primeirorequerido a simplória alegação de haver tão-somente dado continuidade auma prática que já vinha sendo exercida no âmbito da municipalidade,porquanto, conforme bem elucidado pelo Eminente DesembargadorSAMUEL MEIRA BRASIL JR., no julgamento da Apelação Cível nº0240801551123:

“A prática desidiosa por parte de outros servidorespúblicos não implica escusa para o servidor repetir oato. Não existe proteção jurídica de igualdade com oilícito ou conduta moralmente reprovável. Ninguémestará autorizado a fazer algo errado, porque outros ofazem. Ninguém poderá praticar ato ímprobo aoargumento de que outros praticam. A única igualdadeprotegida pela Constituição é a que usa, comoparadigma, comportamentos lícitos e moralmenteaceitáveis. É um absurdo pensar em sentidocontrário.”

Assim, configurada a lesão aos princípiosadministrativos, não há que se falar em prova da existência de doloespecífico na conduta do primeiro requerido, nem de prova da lesão aoerário público para que se configure o ato de improbidade. Nesse sentido,doutrina Marçal Justen Filho4:

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4 in Curso de Direito Administrativo. São Paulo; Saraiva, p. 686-691.

3 TJES, QUARTA CÂMARA CÍVEL, j. 14/05/2012.

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“(...) não depende, para sua consumação, dapercepção de um benefício econômico, assim comonão se exige dolo específico, para a caracterizaçãoconduta intencional, consumando-se a improbidade,nos termos do artigo 11 da Lei n. 8.429/92, por umaação ou omissão violadora aos deveres da legalidade,honestidade, imparcialidade, honestidade e lealdade.” Já no dizer de José Carvalho dos Santos Filho5:

"(...) o pressuposto exigível de improbidade cometidacom base no artigo 11 da Lei n. 8.429/92 é somente avulneração em si dos princípios administrativos.Conseqüentemente, são pressupostos dispensáveis oenriquecimento ilícito e o dano ao erário, não sendoessencial lesão patrimonial às pessoas mencionadasno artigo 1 da Lei n. 8.429/92."

Violados, portanto, os deveres de probidade, retidão,impessoalidade, seriedade, imparcialidade, diligência e responsabilidade, oprimeiro requerido está sujeito às sanções da LIA, ainda que não tenhahavido dano patrimonial ou enriquecimento ilícito, mesmo porque o artigo21 da LIA admite a possibilidade de aplicação de sanção,independentemente da efetiva ocorrência de dano ao patrimônio público.

Por outro lado, considerando que não houve acomprovação do pagamento de importâncias sem a regularcontraprestação de serviços pela Srª Adriana Ferreira Vieira, não vislumbrocontexto para o reconhecimento de dano ao erário, o que afasta a

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5 in Manual de Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 15ª edição.

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possibilidade de enquadramento da conduta no moldura normativa do art.10, da LIA.

Nesse sentido, o STJ (2ª Turma, REsp 876886/MG,Relator Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, j. 16/09/2010, DJe08/10/2010) possui entendimento pacífico no sentido de que, nos casosde contratação de servidores públicos sem concurso público, em razão daefetiva contraprestação em serviços pelos vencimentos recebidos, mesmoconfigurada em tese a improbidade administrativa, é indevida a devoluçãodos valores havidos pelos beneficiários, a fim de evitar o enriquecimentosem causa do Poder Público.

Por fim, não vislumbro contexto para reconhecimentode dano extrapatrimonial coletivo, haja vista a ausência de comprovaçãode sua efetiva concretização, vedada mera presunção de sua ocorrência,conforme entendimento já consagrado no âmbito do STJ, in verbis:

“(...) DANO MORAL COLETIVO. IMPOSSIBILIDADE.AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. INDICAÇÃODE DISPOSITIVO NÃO DEBATIDO NA INSTÂNCIA "AQUO". (...) 2. Ad argumentandum tantum, ainda queultrapassado o óbice erigido pelas Súmulas 282 e 356do STF, melhor sorte não socorre ao recorrente,máxime porque a incompatibilidade entre o danomoral, qualificado pela noção de dor e sofrimentopsíquico, e a transindividualidade, evidenciada pelaindeterminabilidade do sujeito passivo eindivisibilidade da ofensa objeto de reparação,conduz à não indenizabilidade do dano moralcoletivo, salvo comprovação de efetivo prejuízo dano.

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3. Sob esse enfoque decidiu a 1ª Turma desta Corte,no julgamento de hipótese análoga, verbis: (...) 4.Nada obstante, e apenas obiter dictum, há de seconsiderar que, no caso concreto, o autor nãodemonstra de forma clara e irrefutável o efetivo danomoral sofrido pela categoria social titular do interessecoletivo ou difuso, consoante assentado pelo acórdãorecorrido: "... Entretanto, como já dito, por não setratar de situação típica da existência de dano moralpuro, não há como simplesmente presumi-la. Serianecessária prova no sentido de que a Municipalidade,de alguma forma, tenha perdido a consideração e arespeitabilidade e que a sociedade uruguaienseefetivamente tenha se sentido lesada e abaladamoralmente, em decorrência do ilícito praticado,razão pela qual vai indeferido o pedido deindenização por dano moral". 5. Recurso especial nãoconhecido.” (STJ-1ª Turma, REsp. nº 821891/RS,Relator Ministro LUIZ FUX, j. 08/04/2008, Dje12/05/2008).

Estando, portanto, o primeiro requerido, incurso noart. 11, caput e incs. I e V, da Lei nº 8.429/92, mister a fixação das sançõesa serem aplicadas, conforme enumeração contida no art. 12, inc. III, do jámencionado diploma legal. Nesse particular, cumpre enfatizar que aaplicação das sanções deve atender aos princípios da proporcionalidade eda razoabilidade, levando-se em consideração que a quantidade de atosde improbidade previstos no art. 11 e a quantidade de sanções a elesimpostas induzem à conclusão de que, na fixação das penas, deve o

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julgador dosar as mesmas, levando em conta a extensão do dano causado,a gravidade da conduta e a intensidade do elemento subjetivo do agente.

Também o art. 37, § 4º, da Constituição da Repúblicaprevê o estabelecimento de uma gradação para as sanções relativas a taisatos, circunstância que impõe a observância de uma simetria coerente erazoável. Destarte, tem-se que as cominações previstas no art. 12 da LIAnão determinam a necessária aplicação cumulativa, devendo ser observadoo caso concreto, em respeito aos princípios da razoabilidade,proporcionalidade, adequação e racionalidade na interpretação dodispositivo. Neste sentido:

"A aplicação das sanções da Lei nº 8.429/92 deveocorrer à luz do princípio da proporcionalidade, demodo a evitar sanções desarrazoadas em relação aoato ilícito praticado, sem, contudo, privilegiar aimpunidade. Para decidir pela cominação isolada ouconjunta das penas previstas no artigo 12 e incisos,da Lei de Improbidade Administrativa, deve omagistrado atentar para as circunstâncias peculiaresdo caso concreto, avaliando a gravidade da conduta,a medida da lesão ao erário, o histórico funcional doagente público etc." (STJ - REsp. 300184/SP – Rel.Min. Franciulli Netto).

É de se ressaltar, contudo, que o ato de improbidadeadministrativa praticado é grave, razão pela qual merece o primeirorequerido ser apenado com rigor, porquanto revela total desrespeito à lei,e menosprezo à coisa pública, o que recomenda a aplicação das sançõeselencadas no art. 12, inciso III, da Lei nº 8.429/92, no grau médio.

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Mesmo porque, segundo abalizada doutrina6, ocritério legal elencado no art. 12, parágrafo único, da LIA, atrelado ao danoocasionado ao patrimônio público ou ao proveito pessoal do agente,afigura-se insuficiente, não podendo figurar como único parâmetro,ressaindo, assim, como necessária à dosimetria das penas também avaloração de critérios correlatos como a personalidade e o grau departicipação do agente nos ilícitos; o reflexo de seus atos na organizaçãoda administração pública, dentre outros.

Ditos parâmetros afiguram-se, todos, desfavoráveisao primeiro requerido, já que escorada sua conduta em dolo e/ou má-fé,tendo sido graves e inúmeras as violações aos princípios regentes daAdministração Pública, o que impõe a observância de outros critérios, aexemplo da gravidade da infração, não apenas no campo material, comotambém na seara da ética, da moralidade, da honestidade, da lealdade eda eficiência, da impessoalidade e da legalidade.

Em tal conjuntura, entendo que a hipótese reclama aaplicação das penas de multa civil, proibição de contratação com o poderpúblico e suspensão dos direitos políticos, porquanto, como já advertidopelo SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (REsp. nº 513.576/MG, Rel. p/acórdão Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJ de 06/03/2006), os princípiosda razoabilidade e da proporcionalidade, lembrados no acórdão, nãopodem servir de justificativa para eximir o agente público e isentá-lo dassanções previstas em lei. Mal aplicados, os princípios podem significar aimpunidade e frustrar os fins legais.

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6 Emerson Garcia e Rogério Pacheco Alves, in Improbidade Administrativa, 3ª ed., 2ªtiragem, Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2006, pp. 509/510.

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À luz do exposto, JULGO PROCEDENTES, em parte,os pedidos, e, em consequência, com fulcro nos arts. 11, caput e incs. I e V,e 12, inc. III, da Lei nº 8.429/92, CONDENO o primeiro requerido, EDSONFIGUEIREDO MAGALHÃES, ao pagamento de multa civil que fixo em 10(dez) vezes o valor da última remuneração pelo mesmo percebida nocargo de Prefeito, cujos valores deverão ser corrigidos monetariamentedesde o ajuizamento da demanda e acrescidos de juros de mora nopercentual de 1% (um por cento) ao mês, a partir da citação.

APLICO-LHE, ainda, as sanções de proibição decontratação com o Poder Público ou de recebimento de benefícios ouincentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que porintermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de03 (três) anos, e de suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 04(quatro) anos, com vigência depois do trânsito em julgado desta decisão.

JULGO IMPROCEDENTE o pedido de ressarcimentode dano extrapatrimonial coletivo.

JULGO IMPROCEDENTES os pedidos em relação aosegundo requerido, ANTONICO GOTTARDO.

CONDENO, ainda, o primeiro requerido aopagamento das custas e despesas processuais.

Sem condenação em honorários advocatícios por setratar de demanda proposta pelo MP (CF/88, art. 128, § 5º, inc. II, al. "a").

Com fulcro no art. 269, inciso I, do CPC, JULGOEXTINTO o processo, com resolução de mérito.

Transitada em julgado, oficie-se ao Egrégio TribunalRegional Eleitoral do Espírito Santo e à Câmara Municipal de Guarapari,

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comunicando a suspensão dos direitos políticos do primeiro requeridopara as providências cabíveis, bem como ao Estado, União e ExecutivoMunicipal, bem como ao TCEES para ciência e observância da proibição deo primeiro requerido contratar com o Poder Público ou receber benefíciosou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que porintermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário,inscrevendo-se a sentença no Cadastro Nacional de Improbidade,instituído pelo Conselho Nacional de Justiça.

P.R.I.

Guarapari/ES, 04 de março de 2013.

GUSTAVO MARÇAL DA SILVA E SILVA

Juiz de Direito

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