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Publicação da Secretaria de Política Agrícola do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento ISSN 1413-4969 ./ / 200 Publicação Trimestral Ano XV - Nº 3 Jul Ago. Set. 6 Revista de Etanol, meio ambiente e tecnologia Futuro para o álcool brasileiro Pág. 19 Pág. 51 Campeões de desmatamento Ponto de Vista Pág. 83 Programa Nacional para a Produção e Uso do Biodiesel Pág. 5

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Publicação da Secretaria de Política Agrícola do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento

ISSN 1413-4969

./ / 200

Publicação TrimestralAno XV - Nº 3

Jul Ago. Set. 6

Revista de

Etanol,meio ambientee tecnologia

Futuro parao álcoolbrasileiro

Pág. 19 Pág. 51

Campeões dedesmatamento

Ponto de Vista

Pág. 83

Programa Nacionalpara a Produção eUso do Biodiesel

Pág. 5

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ISSN 1413-4969Publicação Trimestral

Ano XV – Nº 3Jul./Ago./Set. 2006

Brasília, DF

Sumário

Carta da Agricultura

O crescimento recente do agronegócio brasileiro ........... 3Luis Carlos Guedes Pinto

Programa Nacional para a Produção e Uso doBiodiesel – Diretrizes, desafios e perspectivas ................. 5Frederique Rosa e Abreu / José Nilton de Souza Vieira / Simone Yuri Ramos

Futuro para o álcool brasileiro ...................................... 19Paulo Morceli

Aproveitamento de dejetos de animaispara geração de biogás................................................. 28Airton Kunz / Paulo Armando V. de Oliveira

Custos de produção de biodiesel no Brasil ................... 36Geraldo Sant'Ana de Camargo Barros / Ana Paula Silva / Leandro AugustoPonchio / Lucilio Rogério Aparecido Alves / Mauro Osaki / Mariano Cenamo

Etanol, meio ambiente e tecnologia –Reflexões sobre a experiência brasileira ........................ 51Alexandre Betinardi Strapasson / Luís Carlos Mavignier de Araújo Job

Produção de álcool combustívela partir de carboidratos ................................................. 64Cristina Maria Monteiro Machado / Frederique Rosa e Abreu

Agroenergia veicular .................................................... 79Henry Joseph Jr.

Ponto de VistaCampeões de desmatamento ......................................83Evaristo Eduardo de Miranda

Conselho editorialEliseu Alves (Presidente)

Edilson GuimarãesIvan WedekinElísio ContiniHélio Tollini

Antônio Jorge de OliveiraRegis N. C. Alimandro

Biramar Nunes LimaPaulo Magno Rabelo

Marlene de Araújo

Secretaria-geralRegina M. Vaz

Coordenadoria editorialMierson Martins Mota

Antônio Jorge de Oliveira

Cadastro e distribuiçãoCristiana D. Silva

Revisão de texto etratamento editorial

Raquel Siqueira de Lemos

Normalização bibliográficaCelina Tomaz de Carvalho

Projeto gráfico e capaCarlos Eduardo Felice Barbeiro

Foto da capaCarlos Eduardo Felice Barbeiro

Impressão e acabamentoEmbrapa Informação Tecnológica

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Ano XV – Nº 3 – Jul./Ago./Set. 2006 2

Todos os direitos reservados.A reprodução não autorizada desta publicação, no todo ou em parte,

constitui violação dos direitos autorais (Lei nº 9.610).

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)Embrapa Informação Tecnológica

Revista de política agrícola. – Ano 1, n. 1 (fev. 1992) - . – Brasília: Secretaria Nacional de Política Agrícola, Companhia Nacionalde Abastecimento, 1992-

v. ; 27 cm.

Trimestral. Bimestral: 1992-1993.Editores: Secretaria de Política Agrícola do Ministério da Agricultura,

Pecuária e Abastecimento, 2004- .Disponível também em World Wide Web: <www.agricultura.gov.br>

<www.embrapa.br>ISSN 1413-4969

1. Política agrícola. I. Brasil. Ministério da Agricultura, Pecuária eAbastecimento. Secretaria de Política Agrícola. II. Ministério daAgricultura, Pecuária e Abastecimento.

CDD 338.18 (21 ed.)

Interessados em receber esta revista, comunicar-se com:

Ministério da Agricultura, Pecuária e AbastecimentoSecretaria de Política Agrícola

Esplanada dos Ministérios, Bloco D, 7º andarCEP 70043-900 Brasília, DF

Fone: (61) 3218-2505Fax: (61) 3224-8414

[email protected]

Empresa Brasileira de Pesquisa AgropecuáriaSecretaria de Gestão e Estratégia

Parque Estação Biológica (PqEB), Av. W3 Norte (final)CEP 70770-901 Brasília, DF

Fone: (61) 3448-4336Fax: (61) 3347-4480

Mierson Martins [email protected]

Esta revista é uma publicação trimestral da Secretaria dePolítica Agrícola do Ministério da Agricultura, Pecuária eAbastecimento, com a colaboração técnica da Secretariade Gestão e Estratégia da Embrapa e da Conab, dirigida atécnicos, empresários, pesquisadores que trabalham como complexo agroindustrial e a quem busca informaçõessobre política agrícola.

É permitida a citação de artigos e dados desta Revista, desdeque seja mencionada a fonte. As matérias assinadas nãorefletem, necessariamente, a opinião do Ministério daAgricultura, Pecuária e Abastecimento.

Tiragem5.000 exemplares

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O crescimento recente do agronegóciobrasileiro é resultado da competência dos nossosagricultores, da ampla disponibilidade de terrasagricultáveis de baixos preços, da geração eincorporação de tecnologias produtivas maiseficientes, particularmente para regiões tropicais.O governo federal fez a sua parte ao ajustar amacroeconomia para estimular investimentos e,na política agrícola, ao disponibilizar crédito ecriar outros instrumentos para minimizar riscos,inerentes à atividade agrícola.

O agronegócio abasteceu, de forma regulare a preços decrescentes, o amplo mercadobrasileiro de alimentos e de outros produtosagropecuários. Alimentos mais baratos ajudaramno combate a fome e fortaleceram a renda,particularmente dos mais pobres, permitindo maiorparticipação no consumo de outros produtos eserviços não agrícolas.

A competitividade do setor impulsionou asexportações de US$ 20,6 bilhões em 2000 paraUS$ 43,6 em 2005 e para US$ 48,3 bilhões, nosúltimos 12 meses (novembro de 2005 a outubrode 2006). O saldo comercial do agronegócio temsido crescente, atingindo US$ 38,5 bilhõessomente em 2005, num total de US$ 137 bilhõesentre 2001 e 2005. Nos últimos 12 meses(novembro de 2005 a outubro de 2006), o saldocomercial do setor alcançou US$ 41,9 bilhões.Esses resultados permitiram ao Brasil superar osgraves problemas de suas contas externas, empassado recente, e. permitiram a importação detecnologia e insumos fundamentais para o seuprocesso de desenvolvimento.

O crescimentorecente doagronegócio brasileiro

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Nem tudo são louros no caminho dodesenvolvimento. Muitos agricultores ficaram àmargem do mercado, outros viram sua renda serreduzida, comprometendo o nível de vida de suasfamílias. Enfrentamos secas em vastas regiões deprodução de grãos, nos 2 últimos anos. Há ques-tões relativas à sustentabilidade ambiental queainda precisam ser resolvidas. Doenças animais,como a febre aftosa e a ameaça da influenzaaviária, restringiram nosso potencial produtivo eexportador. Muitos países, por razões sanitáriasou protecionistas, criaram embargos à carnebrasileira. Observa-se que a crise não foi genera-lizada, pois setores importantes como o açúcar eo álcool, a citricultura, o café, madeira e celulose,e carnes continuaram a crescer e a remunerarseus produtores.

Para minimizar os efeitos das secas, queatingiram os produtores de grãos, o governoprorrogou dívidas e ampliou recursos oficiais decrédito, com o objetivo de sustentar o nível deprodução e manter os agricultores na atividade.Implementou medidas de erradicação e controledas doenças animais. Junto com o setor privado,promove a qualidade dos produtos brasileiros ecombate ações protecionistas de nossos potenciaisconcorrentes. Há sinais claros de que o setorcomeça a superar a crise. Estimativas de plantiopara a próxima safra (dados de final de outubro/2006), tanto do Instituto Brasileiro de Geografia eEstatística (IBGE) como da Companhia Nacionalde Abastecimento (Conab), confirmam que apróxima safra deverá ficar próxima de valoresobtidos em 2005–2006. A venda de maquinaria

1 Ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.

Luis Carlos Guedes Pinto1

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agrícola e fertilizantes começa a aumentar asvendas. Esses sinais comprovam o acerto dasmedidas de política, adotadas pelo governofederal, no último ano.

A agricultura brasileira é competitiva e temalto potencial de expansão, pois dispõe de terraem abundância – barata nos padrões interna-cionais – e detém um bom estoque de tecnologiaspara emprego em regiões tropicais e subtropicais.A redução dos custos tanto pela escala deprodução quanto pela logística e transporteaumentará significativamente a participação doBrasil no mercado agroalimentar mundial.

Na área de agroenergia, o Ministério daAgricultura, Pecuária e Abastecimento, emparceria com os Ministérios de Minas e Energia,

da Ciência e Tecnologia e do Desenvolvimento,Indústria e Comércio, definiu as Diretrizes dePolítica de Agroenergia e, à luz dessa política,elaborou o Plano Nacional de Agroenergia,envolvendo, na sua execução, os setores privadoe governamental.

A política agrícola brasileira procura sempreconciliar a busca do crescimento da agropecuáriacom os objetivos sociais e ambientais. Osinvestimentos em pesquisa e desenvolvimento;qualidade e segurança alimentar; infra-estrutura;esforços de promoção dos produtores brasileiros,vendas e distribuição; maior acesso aos mercados-chave serão sempre uma constante nas políticase ações do governo para a manutenção da compe-titividade do agronegócio brasileiro.

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Programa Nacional para aProdução e Uso do BiodieselDiretrizes, desafiose perspectivas Frederique Rosa e Abreu1

José Nilton de Souza Vieira2

Simone Yuri Ramos3

1 Engenheiro químico, Doutor em Química, pela Universidade de Brasília (UnB), com tese em produção de biocombustíveis. Ocupa o cargo de coordenador-geralde Agroenergia, do Departamento de Cana-de-açúcar e Agroenergia do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa);[email protected]

2 Economista, com mestrado em Economia Industrial e Tecnologia, pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Membro da carreira de Especialistas emPolíticas Públicas e Gestão Governamental desde 1998. Assessor do Departamento de Cana-de-açúcar e Agroenergia do Mapa; [email protected]

3 Engenheira agrônoma, com mestrado em Economia Aplicada, pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq/USP). Integrou a equipe do Departamentode Cana-de-açúcar e Agroenergia entre março de 2005 e abril de 2006. Atualmente integra a carreira de Técnicos de Planejamento Agrícola, da CompanhiaNacional de Abastecimento (Conab).

IntroduçãoO Brasil é hoje uma das principais refe-

rências mundiais no que diz respeito à produçãoe utilização de fontes renováveis de energia. Issose explica pelos pesados investimentos para aeficiente exploração de suas vantagens naturais,como uma bacia hidrográfica privilegiada e avocação natural para a produção de biomassaagrícola. Essa combinação de fatores levou anúmeros expressivos no que tange à participaçãode energias renováveis na matriz energéticabrasileira. Conforme dados do Ministério de Minase Energia, as hidrelétricas respondem por 14% daenergia produzida internamente, enquanto abiomassa representa outros 27%.

No segmento de biomassa há que sedestacar o êxito do Programa Nacional do Álcool.O combustível renovável hoje representa 40% doconsumo pelos veículos do ciclo Otto. Adicio-nalmente, de uma situação de auto-suficiênciaenergética, muitas usinas sucroalcooleiras jáofertam excedentes crescentes de energiaelétrica, a partir da co-geração, com a queima dobagaço da própria cana.

Apesar do êxito do setor sucroalcooleiro naprodução de etanol, a dependência em relaçãoao óleo diesel, onde os mais de 38 milhões demetros cúbicos consumidos em 2005 representam57,7% do consumo de combustíveis líquidos,ainda é um problema. Ao mesmo tempo em que oPaís exporta excedentes crescentes de gasolina,continua dependendo de importações desse com-bustível, a fim de atender à demanda doméstica.

Para contornar o problema, já vinham sendofeitos estudos com foco na produção e mistura dobiodiesel ao combustível mineral. Além de permitira redução da dependência externa, o biodieseltambém cumpriria importante papel ambiental, aomelhorar o processo de queima do diesel fóssil,tal como ocorre na mistura do álcool à gasolina.

A baixa atratividade econômica, uma vezque o preço de mercado dos óleos vegetais aindaé maior do que o do diesel mineral, sempre foi umentrave. Entretanto, para dar impulso ao programa,o governo adicionou a componente social, deforma a permitir que o processo de produção dematérias-primas se transforme num vetor deinclusão social, gerando oportunidades de

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ocupação e renda para os segmentos mais pobresdo meio rural, em especial a agricultura familiardo Semi-Árido Nordestino.

Cabe destacar que o sucesso do programapoderá permitir que o País também se consolidecomo grande exportador do produto. As diretivasda União Européia, com foco no cumprimento doProtocolo de Kyoto, sugerem que parte da deman-da por biocombustíveis no Velho Continentevenha a ser suprida por fornecedores externos.Da mesma forma, os Estados Unidos, que conso-mem um quarto do petróleo mundial, tambémpoderão recorrer às importações para regular aoferta doméstica.

Além de uma gigantesca oportunidade paraalavancar a atividade agrícola, o biodiesel tam-bém deverá permitir a maior agregação de rendaa partir do aproveitamento de subprodutos eresíduos de biomassa, bem como da captação derecursos internacionais por meio dos mecanismosprevistos no Protocolo de Kyoto, como o Meca-nismo de Desenvolvimento Limpo e o Comérciode Emissões.

Dentro dessa perspectiva, o atual governolançou, em dezembro de 2004, o Programa Na-cional de Produção e Uso do Biodiesel (PNPB). OPNPB prevê a implementação de um conjunto deiniciativas: estabelecimento do marco regulatóriodo novo combustível; estruturação da base tecno-lógica relacionada à produção de biodiesel; defini-ção de linhas de financiamento; e organizaçãodas cadeias produtivas. Esses elementos serãotratados mais detalhadamente a seguir.

Políticas públicas parao biodiesel no Brasil

Programa Nacional para aProdução e Uso do Biodiesel

O Brasil vem desenvolvendo pesquisas como biodiesel desde a década de 1970, em que oóleo de dendê era a principal matéria-prima. Ouso energético de óleos vegetais foi proposto em1975, dando origem ao Plano de Produção de

Óleos Vegetais para Fins Energéticos (Pró-óleo),cujo objetivo era gerar um excedente de óleovegetal capaz de tornar seus custos de produçãocompetitivos com os do petróleo. Previa-se umamistura de 30% de óleo vegetal no óleo diesel,com perspectivas para sua substituição integralem longo prazo.

Tais estudos colocaram o País como um dospioneiros nas pesquisas com biodiesel, sendo oprimeiro a registrar a patente relativa ao seuprocesso de produção, em 1980. Em 1983, ogoverno brasileiro, motivado pelo aumento dopreço do petróleo, determinou a implantação doPrograma de Óleos Vegetais (Projeto Oveg), nointuito de testar o uso do biodiesel puro e emdiferentes níveis de mistura ao diesel mineral. Taliniciativa foi coordenada pelo Ministério da Indús-tria e Comércio (atual Ministério do Desenvolvi-mento, Indústria e Comércio) e teve forte participa-ção das indústrias automobilística, de autopeças,de óleos vegetais, de combustível e lubrificantes,além de diferentes centros de pesquisa.

Mais recentemente, em dezembro de 2004,o governo federal lançou o Programa Nacionalpara a Produção e Uso do Biodiesel (PNPB), quetem por objetivo estimular a produção e uso dobiodiesel no País, de forma técnica e economi-camente sustentável. Trata-se de um programa in-terministerial, que conta com a participação de14 ministérios, cujas principais diretrizes são: a)implantar um programa sustentável, promovendoa inclusão social e o desenvolvimento regional;b) garantir preços competitivos, qualidade eregularidade na oferta do novo combustível; c)estimular a utilização de diferentes matérias-primas e rotas tecnológicas.

O programa foi resultado do esforço de umGrupo de Trabalho Interministerial, instituído peloDecreto de 2 de julho de 2003. O grupo apresen-tou seu relatório no final daquele ano, sugerindoa constituição de uma Comissão ExecutivaInterministerial (CEI) e de um Grupo Gestor, res-ponsáveis pela execução das atividades de com-petência da esfera pública, especialmente no quediz respeito à estruturação do marco regulatórioe a condução das atividades consideradas prioritá-rias para equacionar os entraves verificados noestudo.

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As recomendações do GT foram acolhidase a CEI e o Grupo Gestor foram formalmentecriados por um Decreto não numerado, do dia 23de dezembro de 2003. A CEI assumiu a competên-cia pela elaboração, implementação e monitora-mento do programa, propondo os atos normativose definindo as ações de governo e diretrizes depolítica públicas. O Grupo Gestor é responsávelpela execução das ações propostas pela CEI.

A Comissão Interministerial subordina-se àCasa Civil da Presidência da República e éintegrada por dois (um titular e um suplente)representantes dos seguintes órgãos:

• Casa Civil da Presidência da República,que a coordenará.

• Secretaria de Comunicação de Governo eGestão Estratégica da Presidência daRepública.

• Ministério da Fazenda (MF).• Ministério dos Transportes (MT).• Ministério da Agricultura, Pecuária e

Abastecimento (Mapa).• Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).• Ministério do Desenvolvimento, Indústria

e Comércio Exterior (MDIC).• Ministério de Minas e Energia (MME).• Ministério do Planejamento, Orçamento e

Gestão (MPOG).• Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT).• Ministério do Meio Ambiente (MMA).• Ministério do Desenvolvimento Agrário

(MDA)• Ministério da Integração Nacional (MI).• Ministério das Cidades (MC).

O Grupo Gestor, coordenado peloMinistério de Minas e Energia, é integrado por dois(um titular e um suplente) representantes de cadaórgão listado a seguir:

• Ministério de Minas e Energia (MME).• Casa Civil da Presidência da República

(CC).• Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT).

• Ministério do Desenvolvimento Agrário(MDA).

• Ministério do Desenvolvimento, Indústriae Comércio Exterior (MDIC).

• Ministério do Planejamento, Orçamento eGestão (MPOG).

• Ministério da Fazenda (MF).• Ministério do Meio Ambiente (MMA).• Ministério da Integração Nacional (MI).• Ministério da Agricultura, Pecuária e

Abastecimento (Mapa).• Banco Nacional de Desenvolvimento

Econômico e Social (BNDES).• Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural

e Biocombustíveis (ANP).• Petróleo Brasileiro S.A. (Petrobras).• Empresa Brasileira de Pesquisa Agrope-

cuária (Embrapa).

Os principais desafios para a implemen-tação do programa, levantados pelo GT, sãoresumidos na Fig.1. Nela, fica explícita a neces-sidade do trabalho articulado entre os diferentesórgãos de governo, a fim de que todas as restriçõespossam ser superadas de forma concomitante.Assim, compete à Comissão Executiva Interminis-terial o monitoramento dos trabalhos de forma aassegurar que cada um dos órgãos integrantes vemexecutando as tarefas que lhes foram delegadas.

Ainda em termos de estrutura, foi criada aRede Brasileira de Tecnologia do Biodiesel (RBTB),formada por entidades de pesquisa localizadas em23 estados da Federação, com o objetivo de provero serviço de assistência técnica e realizarpesquisas nas diversas áreas que envolvem aprodução e comercialização de biodiesel e dosco-produtos e subprodutos oriundos de suaprodução.

O programa contempla as especificidadesde cada região geográfica do Brasil, em termosde opções de matérias-primas e necessidade dedesenvolvimento regional, como ilustra a Fig. 2.Ele também contempla a produção de biodiesel apartir de diferentes rotas tecnológicas, como ocraqueamento e a transesterificação etílica ou

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Fig. 1. Plano de trabalho dos órgãos integrantes do PNPB.Fonte: Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel (2006).

Fig. 2. Motivações regionais para a produção de biodiesel.

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metílica. Com isso, espera-se a complemen-taridade entre o agronegócio e a agriculturafamiliar no fornecimento de matérias-primas, numcontexto de estímulo ao aproveitamento dasvocações regionais. Entretanto, independente daoleaginosa e da rota tecnológica, o biodiesel deveatender às mesmas especificações técnicasestabelecidas pela Agência Nacional do Petróleo.

Essa estrutura busca o equilíbrio entre osaspectos econômico, ambiental e social. Ou seja,a meta é introduzir na matriz energética brasileiraum combustível cuja produção seja economica-mente viável (custos competitivos), que possa, aomesmo tempo, proporcionar ganhos ambientais(redução das emissões líquidas) e criar oportunida-des de geração de postos de trabalho no meiorural, especialmente nos estabelecimentos deagricultura familiar (inclusão social).

Seguindo essas diretrizes, o governo federalcriou um pacote de normativos, compreendendoas regras que tratam dos percentuais de misturade biodiesel no diesel, o regime tributário aplicadoao combustível e os critérios para a obtenção do“Selo Combustível Social”. Esse último, com oobjetivo de tornar mais atrativa a aquisição dematérias-primas produzidas por agricultoresfamiliares. Espera-se, com isso, estimular a maiorgeração de postos de trabalho e renda no meiorural. Essas medidas serão detalhadas a seguir.

Procedimentos para ainserção do biodiesel namatriz de combustíveis líquidos

O primeiro passo para a construção domarco regulatório do PNPB foi a Medida Provisórianº 214, de 13 de setembro de 2004, que criou afigura jurídica do biodiesel na matriz energéticabrasileira, delegando competência à ANP parafiscalizar a sua produção e comercialização. Issoabriu caminho para que a agência tambémpudesse colocar em consulta pública as minutasde portarias tratando das especificações técnicas,tanto do biodiesel puro quanto do combustível jámisturado.

A partir de uma consulta à indústria automo-tiva, acertou-se que a mistura voluntária começa-

ria em 2%, percentual que dispensaria a realiza-ção de testes prévios. Entretanto, ao tramitar noCongresso, a MP 214 recebeu um conjunto deemendas, inclusive a que definia o uso compulsó-rio. Essa obrigatoriedade, embora tenha comobenefício a redução das incertezas para o investi-dor privado, impõe a necessidade de montagemda estrutura produtiva, num espaço de temporelativamente curto, especialmente em virtude doestágio embrionário de desenvolvimento dastecnologias de produção.

A referida MP foi convertida na Lei nº 11.097,de 13 de janeiro de 2005, que estabelece aobrigatoriedade da adição de um percentualmínimo de 5% de biodiesel ao óleo diesel, emqualquer parte do território nacional. Talpercentual teria um prazo até 2013 para sercumprido. Mas, em 2008, a mistura já deveriaatingir 2%, representando uma demanda poraproximadamente 800 milhões de litros anuais debiodiesel. Estima-se que, nessa primeira fase, emque as oleaginosas disponíveis apresentam baixorendimento, será necessária uma área deaproximadamente 1,5 milhão de hectares paraproduzir matéria-prima suficiente para a adiçãodos 2%. Isso equivale a 1% da área disponívelpara a agricultura no País (150 milhões dehectares).

Numa situação de mistura facultativa, osempresários teriam que competir entre si e buscareficiência, pois o limite superior de seus preçosde venda estaria balizado pelo preço do dieselmineral. Com a obrigatoriedade, esse referencialperde força, podendo transferir para o consumidoros custos eventualmente mais elevados.

Para reduzir as incertezas, o ConselhoNacional de Política Energética, por meio daResolução nº 3, de 23 de setembro de 2005,antecipou para 1º de janeiro de 2006 a obrigatorie-dade da mistura. Essa antecipação se dará nolimite da produção por empresas que detenham oSelo Combustível Social, as quais devemconcorrer em leilões públicos para comercializaro produto.

Os leilões, cujo objetivo é garantir aviabilização econômica dos empreendimentos já

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em curso, são definidos e realizados pela ANP.Podem participar a empresa já instalada e possui-dora do Selo Social, ou a sociedade detentora deprojeto de produção que reúna os requisitosnecessários à obtenção desse selo. Para tanto, ointeressado deve estar devidamente registrado naANP e na Secretaria da Receita Federal.

Aspectos do modelo tributário

No Brasil, o regime tributário federal sobrecombustíveis foi definido pela Emenda Constitu-cional nº 33 e pela Lei nº 10.336, que criaram aContribuição de Intervenção no Domínio Econô-mico (Cide). Tais normativos, no entanto, não con-templaram a possibilidade de existência dobiodiesel, de modo que a incidência daquelacontribuição sobre esse combustível dependeriade nova Emenda Constitucional.

A alternativa adotada para compensar umaeventual perda de arrecadação no âmbito federal,decorrente da impossibilidade de cobrança daCide, foi a definição de alíquotas mais elevadasdo Programa de Integração Social (PIS) e daContribuição para Seguridade Social (Cofins). Talcomo no caso daquela contribuição, a Lei nº11.116 fixou as alíquotas máximas desses tributos,delegando ao Poder Executivo o mandato paraalterá-las dentro desse limite. Assim, o Decretono 5.297 estabeleceu benefícios fiscais para em-presas que utilizem os óleos de mamona ou palma(intensivas em mão-de-obra), ou mesmo outrasmatérias-primas, desde que produzidas poragricultores familiares enquadráveis no ProgramaNacional de Apoio à Agricultura Familiar (Pronaf).Tais benefícios são ainda maiores se a produçãodessas matérias-primas ocorrer nas regiões Nortee Nordeste e no Semi-Árido.

Também ficou estabelecido que a soma dosimpostos federais incidentes sobre o biodiesel (PISe Cofins) não poderá ser maior do que a dos queincidem sobre o combustível fóssil (PIS, Cofins eCide). Os coeficientes de redução dessas alíquotassão aplicados segundo a origem das matérias-primas utilizadas pela indústria produtora. No casoextremo (palma ou mamona, produzidas poragricultores familiares, nas regiões Norte ou

Nordeste e Semi-Árido), o coeficiente de reduçãoé igual a 1, significando ausência de tributaçãofederal.

Outro Decreto, o de nº 5.298, de 6 dedezembro de 2004, estabeleceu a isenção decobrança do Imposto sobre Produtos Industrializa-dos (IPI). Dessa forma, os incentivos fiscais podemser assim resumidos:

1. Redução de 32% para o biodieselfabricado a partir da palma e da mamona produzi-das nas regiões Norte, Nordeste e no Semi-Árido.

2. Redução de 68% para biodieselfabricado com matérias-primas produzidas pelaagricultura familiar em qualquer região do País.

3. Redução de 100% para o biodiesel fabri-cado com palma ou mamona produzidas pelaagricultura familiar nas regiões Norte, Nordestee no Semi-Árido.

A Tabela 1 fornece os valores dos tributosaplicados ao biodiesel e diesel de petróleo. Cabedestacar que o modelo tributário institui alíquotasdiferenciadas de PIS/Pasep e Cofins, segundo aregião em que se cultiva a matéria-prima da qualse origina o biodiesel e a utilização de produtosda agricultura familiar.

Selo Combustível Social

Uma das diretrizes estabelecidas pelogoverno federal para o PNPB foi o foco no vetorsocial. Os incentivos fiscais têm como finalidadeo estímulo à maior participação da agriculturafamiliar como fornecedora de matérias-primas.Como não há uma definição legal para o termo“agricultura familiar”, foram utilizados os critériosde enquadramento para os beneficiários doPrograma Nacional de Apoio à AgriculturaFamiliar (Pronaf).

Foi criado, por meio do Decreto nº 5.297, o“Selo Combustível Social”. Esse selo é o requisitoindispensável para que o produtor de biodieselpossa gozar dos benefícios fiscais, na proporçãoda matéria-prima adquirida dos agricultoresfamiliares. Com isso, os critérios para a obtençãodo selo foram definidos pelo Ministério doDesenvolvimento Agrário, o qual editou a

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Instrução Normativa nº 1, de 5 de julho de 2005,para esse fim.

O objetivo é estimular a parceria entre asempresas e a agricultura familiar, o que envolve,além da garantia de compra da matéria-prima apreços previamente acordados, a prestação deserviços de assistência técnica e o apoio à organi-zação desse segmento de agricultores. Para rece-ber o selo, a empresa precisa comprovar essaparceria, bem como adquirir desses agricultorespercentuais mínimos de matéria-prima a serprocessada, quais sejam: 50% para a região Nor-deste e Semi-Árido, 30% para as regiões Sudestee Sul e 10% para as regiões Norte e Centro-Oeste.

Além dos benefícios tributários, a empresatambém pode ter acesso a programas definanciamento em condições privilegiadas, bemcomo participar dos leilões de compra dobiodiesel até que passe a vigorar a obrigatoriedadeda mistura. O selo representa um status de parceriapara com o agricultor familiar, podendo serutilizado como instrumento de marketing.

A preocupação em apoiar a agriculturafamiliar se baseia em estudos elaborados pelosMinistérios do Desenvolvimento Agrário, daAgricultura, Pecuária e Abastecimento, da Integra-ção Nacional e das Cidades, os quais concluíramque a substituição de 1% do diesel consumido noPaís, por biodiesel produzido a partir de matérias-primas vindas da agricultura familiar, permitiria

gerar cerca de 45 mil empregos no campo, a umcusto médio pouco superior a R$ 4.900,00 poremprego (HOLANDA, 2004).

Admitindo-se que, para cada emprego nocampo, são gerados até três empregos no restanteda cadeia produtiva, podem ser criados até 180mil empregos para cada um ponto percentual desubstituição do combustível fóssil. A produção dematérias-primas seria uma atividade complemen-tar à agricultura de subsistência, representandouma forma de obtenção de renda monetária eocupação da força de trabalho familiar por maistempo, no próprio estabelecimento.

É importante destacar que na agriculturaempresarial emprega-se, em média, umtrabalhador para cada 100 hectares cultivados,enquanto na agricultura familiar a relação é de10 hectares por trabalhador. Adicionalmente,calcula-se que cada R$ 1,00 aplicado naagricultura familiar gera R$ 2,13 adicionais narenda bruta anual para o produtor rural. Daí ajustificativa para o apoio à inserção dosagricultores familiares como fornecedores dematérias-primas.

Linhas de crédito paraa cadeia do biodiesel

O Banco Nacional de DesenvolvimentoEconômico e Social (BNDES) e o Banco do Brasil

R$/L

Diesel depetróleo

Tabela 1. Tributos aplicados ao biodiesel e ao diesel de petróleo.

CidePIS/CofinsSomatório dostributos federais

Biodiesel

R$/L

Regra geral

R$/L

Agriculturaintensiva no Norte,

Nordeste eSemi-Árido,

com mamonaou palma

R$/L

Agriculturafamiliar

em geral

R$/L

Agriculturafamiliar no Norte,

Nordeste eSemi-Árido,

com mamonaou palma

Inexistente0,0

0,0

Inexistente0,07

0,07

Inexistente0,148

0,148

Inexistente0,218

0,218

0,070,148

0,218

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possuem linhas de crédito voltadas à produção ecomercialização de biodiesel, compreendendofinanciamentos tanto para a indústria quanto paraa produção agrícola. No caso da agriculturafamiliar, os recursos podem ser obtidos no âmbitodo Pronaf, que colocou à disposição desse seg-mento, em 2005, cerca de R$ 100 milhões, comtaxas de juros que variaram de 1% a 4% ao ano.

O Programa de Apoio Financeiro a Investi-mentos em Biodiesel, do BNDES, prevê o financia-mento de até 90% dos itens passíveis de apoiopara projetos com o Selo Combustível Social e deaté 80% para os demais projetos. Os financia-mentos são destinados a todas as fases de produ-ção do biodiesel, inclusive o armazenamento, alogística e o beneficiamento de subprodutos. Nasoperações para micro, pequenas e médias empre-sas, os empréstimos são corrigidos pela TJLP mais1% (projetos com o Selo Combustível Social) ou2% ao ano. Para grandes empresas, a taxa é aTJLP mais 2% ao ano (projetos com o Selo) ou 3%ao ano. Há flexibilização em relação às garantiasreais, com possibilidade de dispensa quandohouver contrato de longo prazo de compra e vendade biodiesel.

O BB Biodiesel, do Banco do Brasil, visaapoiar a produção, a comercialização e o uso dobiodiesel. Por meio dele são oferecidas linhas decrédito tanto para a produção agrícola (custeio,investimento e comercialização, disponíveis parao produtor rural familiar e empresarial), quantopara a industrial (BNDES Biodiesel, PronafAgroindústria, Prodecoop e Crédito Agroindustrialpara aquisição de matéria-prima).

Para minimizar os riscos das operações, osbancos costumam exigir a garantia de comercia-lização, o que se faz por meio da comercialização.Significa que o produtor rural só deve pleitear fi-nanciamento para investir na produção de deter-minada oleaginosa caso já tenha um compradorpara a sua produção. Da mesma forma, a indústriatambém deve manter vinculações contratuais com

os distribuidores de combustíveis, responsáveispela mistura e distribuição do biodiesel.

Produção de biodiesel no Brasil

O biodiesel é um combustível sintetizado apartir de óleos vegetais, novos ou residuais,gorduras animais ou ácidos graxos oriundos dorefino dos óleos vegetais e pode ser obtido pormeio de uma série de processos tecnológicos,como a transesterificação4, o craqueamento5 e aesterificação6. No Brasil, em virtude da grandedisponibilidade do etanol, as pesquisas vêmpriorizando a sua utilização como regente noprocesso de transesterificação. Nesse processo,utiliza-se como catalisador o hidróxido de sódioou de potássio, obtendo-se como subproduto aglicerina (Fig. 3).

Cabe destacar que a maior parte do biodie-sel no Brasil deverá ser produzida por meio datransesterificação, inclusive nos casos de produ-ção para autoconsumo. Entretanto, há casos deprodução por esterificação (como a Agropalma,que utiliza a borra do refino do óleo de dendêcomo matéria-prima), e poderá haver projetosespeciais de craqueamento, voltados para comu-nidades isoladas.

Apesar do interesse em desenvolver a rotaetílica, o processo de transesterificação tambémpoderá utilizar o metanol, num processo maisconhecido e aplicado industrialmente em diversospaíses. Essa rota metílica facilita a reação quandose utiliza o óleo de mamona como matéria-prima.Portanto, deve estar mais presente na RegiãoNordeste e no Semi-Árido.

Entretanto, com o avanço das pesquisas,espera-se que o Centro-Sul do País possa se valerda abundância relativa do etanol, que já nãoenfrenta restrições técnicas quando combinadocom os óleos de soja, girassol ou nabo forrageiro.Eventualmente, o metanol poderá ser necessárionas plantas que venham utilizar o sebo bovino,

4 Transesterificação: reação química de triglicerídeos (óleos e gorduras vegetais ou animais, em que os ácidos graxos formam ésteres com o glicerol) com álcoois(metanol ou etanol), na presença de um catalisador (ácido, base ou enzima), resultando na substituição do grupo éster do glicerol pelo grupo do etanol oumetanol.

5 Craqueamento catalítico ou térmico: reação que provoca a quebra de moléculas por aquecimento a altas temperaturas, formando uma mistura de compostosquímicos com propriedades muito semelhantes às dos derivados de petróleo.

6 Esterificação: reação que envolve a obtenção de ésteres (biodiesel) a partir de álcoois e ácidos graxos ou seus derivados.

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embora as pesquisas para superar os entraves àutilização do etanol já estejam bem adiantadas.

Além dessas frentes de pesquisas, aPetrobras anunciou recentemente uma tecnologiapara a utilização de óleo vegetal refinado noprocesso de purificação do diesel de petróleo. Taltecnologia, conhecida como HBio, poderá seroutra importante forma de inserção dos óleosvegetais na matriz de combustíveis líquidos.

Desse modo, pode-se dizer que, num curtoespaço de tempo, o biodiesel está deixando deser um produto puramente experimental, para setransformar em alternativa energética de fato. Aprodução ainda é incipiente, mas as estimativas daANP indicam que a atual capacidade instalada paraa produção já chega a 1,2 bilhão de litros ao ano.

Perfil da produção segundoas regiões geográficas do PaísA extensão territorial, a posição geográfica

e as condições edafoclimáticas fazem do Brasil o

país com maior vocação natural para a produçãode energia a partir da biomassa de origemagrícola. No caso do biodiesel, as alternativasvegetais para a produção de óleo são diversas econstituem num dos muitos diferenciais positivospara a estruturação de um programa de produção.

O programa coloca o desafio de aproveitaras potencialidades regionais, especialmente numcontexto em que a abundância de terrasagricultáveis contribui para a redução das pressõespela busca de maior eficiência técnica. Em meioa isso, o viés social obriga que seja dada ênfase àinserção competitiva das cadeias produtivasbaseadas na maior intensividade do uso do fatortrabalho, em especial, a palma e a mamona.

Assim, há o natural conflito entre a promo-ção do desenvolvimento regional, explicitada nomodelo tributário, e a necessidade de busca demaior eficiência econômica, o que sugere apriorização de alternativas tecnologicamentemais amadurecidas, como a soja, que representa90% da produção atual de óleos. Em meio a isso,cada região do País possui o que se pode chamar

Fig. 3. Processo de obtenção de biodiesel por transesterificação.Fonte: Holanda (2004).

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de cesta de opções, impondo a necessidade derigor técnico na estruturação de ações de fomentoque contemplem essa diversidade. Essa problemá-tica será abordada a seguir.

Região Norte

A Região Norte possui característicasbastante peculiares. Ela detém a maior extensãoterritorial, onde ainda predomina cobertura porfloresta nativa. Embora haja espaços para a práticada agricultura intensiva (arroz, milho, soja) e desubsistência (principalmente feijão e mandioca),seu maior potencial se concentra na exploraçãoda riqueza florestal, especialmente pelo predo-mínio do clima equatorial úmido. Com isso, aspalmáceas assumem a condição de melhoralternativa para a produção de biodiesel.

Além da grande diversidade de palmáceasnativas, a Amazônia brasileira possui o maiorpotencial para o plantio da palma africana (dendê)no mundo, com área estimada de 70 milhões dehectares. Isso representa um potencial de produ-ção equivalente a 350 milhões de metros cúbicosde petróleo ao ano.

Na região, existem cerca de 40 milcomunidades, parte das quais pode vislumbrar obiodiesel como alternativa energética local. Pornão estar conectada ao Sistema Elétrico Integrado,depende do óleo diesel como combustível parageradores estacionários. Conforme salientamZylberstajn et al. (1996), esses geradores têm naslongas distâncias em relação às refinarias depetróleo um importante fator de risco dedesabastecimento. Assim, o óleo de dendê, quepode ser produzido localmente, é uma alternativade grande relevância.

A palma pode ser vista como opção para aexploração econômica de grande parte da áreade florestas já desmatada, especialmente noEstado do Pará, que responde por mais de 80%da produção nacional de óleo de dendê. Deacordo com Peres et al. (2005), ele é a alternativaque apresenta maior produtividade, com umrendimento de 4 a 6 toneladas de óleo por hectare.Além do óleo de palma, pode-se extrair o óleo de

palmiste, oriundo da amêndoa, tendo comosubproduto a torta, que se destina à ração animal.No processamento dos frutos são produzidosresíduos sólidos, que podem gerar energia térmicaou elétrica para a própria unidade industrial oupara o uso nas comunidades locais.

Há também espaço para a exploração devariedades nativas, em regimes de extrativismo ede manejo agroflorestal. Essas são atividadestipicamente intensivas em mão-de-obra, o quepermite a mobilização de um grande universo deagricultores familiares. No caso do cultivo dapalma, há a necessidade de desenvolvimento deatividades complementares, especialmente aslavouras de subsistência, em função do longo ciclode maturação dos investimentos.

Além da substituição do diesel em geradoresestacionários e embarcações fluviais, pelopotencial apresentado, a região poderá ser umaimportante base de exportação do biodiesel. Nessesentido, há a necessidade de estruturar programasde fomento à produção, bem como programas deteste do biodiesel nos diferentes tipos de motores,de forma a identificar os limites técnicos demistura.

Por fim, deve-se destacar que a cultura dodendê é elegível, no âmbito do Mecanismo deDesenvolvimento Limpo, previsto no Protocolo deKyoto, para o recebimento de investimentosprovenientes dos créditos de carbono. Outro fatorque poderá contribuir de forma significativa paraa viabilização dos projetos de investimento. Dessaforma, se coloca o desafio da organizaçãoprodutiva das comunidades locais, seja em regimede extrativismo simples ou de exploraçãoagroflorestal.

Região Nordeste

A Região Nordeste responde por aproxima-damente 15% do diesel consumido no País e éconhecida pelo pioneirismo nas pesquisas com obiodiesel. Atualmente, em virtude da conotaçãosocial dada ao programa, seu foco de pesquisastem sido a mamona. Isso se reflete nas plantas jáinstaladas e nos projetos de produção comercial.

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curto, voltadas para a subsistência, como o feijão,o milho e a mandioca. Pela capacidade produtivano Semi-Árido, constituindo alternativa para osestabelecimentos de agricultura familiar, amamona tem sido o carro-chefe na fase inicial doPNPB e a principal opção de cultura oleaginosano Nordeste. Peres et al. (2005) salientam que amamona é uma cultura de forte apelo social, pois,além de produzir óleo, pode ser consorciada comoutras culturas, como feijão, amendoim e milho.

A região possui uma área superior a 3milhões de hectares aptos para o cultivo damamona, que em condições de sequeiro podeproduzir 1.200 quilos de bagas por hectare, comum teor de óleo de 47% (PERES et al., 2005). ONordeste responde por 96% da produção brasileirade mamona (200 mil toneladas). O principalestado produtor é a Bahia, onde a mamonaconsolidou-se como importante alternativa,especialmente na região central. No estado, a áreacultivada é de aproximadamente 130 mil hectares,com uma produção superior a 90 mil toneladasde baga, o que representa 70% da produçãonacional.

Além do potencial da Zona da Mata e ointeresse social pela viabilização econômica doSemi-Árido, há que se considerar as áreas deCerrado, em especial o Oeste Baiano e o sul dosestados do Maranhão e Piauí, bem como a regiãode transição para Amazônia, onde palmáceas,como o babaçu, podem se constituir emimportantes alternativas. No Maranhão, ele ocupacerca de 18 milhões de hectares. No entanto,embora o óleo seja de excelente qualidade, obabaçu tem como restrições o custo de extração,já que o óleo representa de 4% a 5% do fruto, oqual é envolto por uma casca muito dura, e o fatode a produção ainda ser baseada no extrativismo,com baixo padrão de organização.

No caso do Cerrado, tem sido observadogrande crescimento da produção agrícola,especialmente da soja, num padrão de agriculturaaltamente tecnificada. Há também cultivosexperimentais de mamona, em regime mecani-zado, com potencial agronômico significativa-mente superior ao observado no Semi-Árido.

Apesar dos registros de grande expansão na áreacultivada com mamona, há a necessidade deexplorar outras alternativas, bem como deve serintensificado o esforço para aumentar a capaci-dade de processamento.

A região é caracterizada pela grandediversidade climática. Embora historicamente sejasubdividida em três macrorregiões (Zona da Mata,Semi-Árido e Sertão), nela também há importantesáreas de Cerrado, apresentando tambémcaracterísticas de clima equatorial úmido, natransição para a Região Amazônica. Essadiversidade climática se reflete nas alternativaspara a produção de matérias-primas.

A Zona da Mata, região mais desenvolvida,tem um histórico de agricultura mercantil, baseadana monocultura da cana-de-açúcar, responsávelpor aproximadamente 15% da produção nacional.A área cultivada é de aproximadamente 1 milhãode hectares. Nela há espaço para o cultivo deoleaginosas, especialmente nas áreas de renova-ção dos canaviais. Isso representa um potencialanual de 200 mil hectares, ou uma produção deaté 100 mil toneladas de óleo, dependendo daalternativa escolhida.

Entretanto, um dos fatores limitantesrelaciona-se à falta de tradição no cultivo delavouras complementares, sendo necessárioquebrar o tabu da monocultura, o que envolvenão apenas a capacitação dos agricultores, comotambém os investimentos em capital fixo. Outroimportante aspecto a ser considerado é que faltampesquisas para identificar alternativas agrícolase, a partir daí, desenvolver variedades mais apro-priadas às características climáticas da região.Embora o girassol, o amendoim e o gergelimvenham sendo pensados, ainda não há plantiosexperimentais, especialmente com foco naintegração da produção sucroalcooleira aobiodiesel.

Em relação ao Semi-Árido, as adversidadesclimáticas constituem-se num fator inibidor daincorporação de capital e tecnologia, de modoque a agricultura sempre esteve baseada naexploração de culturas mais rústicas, como amamona e o algodão mocó, ou lavouras de ciclo

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Entretanto, ainda são incipientes as pesquisas nodesenvolvimento de novas variedades, bem comode tecnologias de manejo.

Cabe considerar, adicionalmente, queembora a produção regional de óleo de soja aindaseja inferior ao consumo alimentício, com o ritmoacelerado de expansão da produção agrícola,acompanhado de investimentos no processamentoindustrial, o quadro deve se reverter, de modo queessa oleaginosa poderá complementar asnecessidades de suprimento de matéria-prima nasunidades produtoras de biodiesel.

Centro-Sul

Para efeitos desse estudo, as análises aseguir consideram as regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, aqui chamadas de Centro-Sul. Isso porcausa de um conjunto de características comuns,que se reproduzem na exploração agrícola damesma cesta de produtos. É o caso da soja,principal produto da agricultura dos estados doRio Grande do Sul, Paraná e no Centro-Oeste, eda cana-de-açúcar, principal atividade daagricultura paulista, que vem adquirindoimportância crescente no Paraná, Minas Geraise no Centro-Oeste.

Do ponto de vista das alternativas para obiodiesel, a região também apresenta grandepotencial para o amendoim, o girassol, culturasjá tradicionais, embora com uma área cultivadaainda restrita, e a mamona. Quanto a essa última,as experiências no Estado do Mato Grosso e aspesquisas do Instituto Agronômico de Campinas(IAC) vêm obtendo resultados satisfatórios com aschamadas “variedades anãs”, que, além da altaprodutividade de campo (até 4 toneladas de bagapor hectare), podem ser colhidas mecanicamente.

Apesar da diversidade de opções, as duasprincipais alternativas no curto prazo são o sebobovino (apresenta os menores custos) e a soja(maior disponibilidade de oferta). Na última safra,a produção regional dessa leguminosa ultrapassouos 45 milhões de toneladas, com uma área poucoinferior a 20 milhões de hectares. Por se tratar daprincipal fonte de óleo disponível e considerando

os problemas de logística para escoamento daprodução nas novas fronteiras agrícolas (norte deMato Grosso, por exemplo), a alternativa dobiodiesel tem despertado grande atratividade.

Notadamente, o óleo é um produto secun-dário. Com isso, tão importante quanto estimularo processamento do grão nessas regiões maisdistantes dos portos é criar condições para o desen-volvimento da cadeia de carnes e conseqüenteaproveitamento do farelo também no âmbito local.Algumas empresas alimentícias já estão revendosuas estratégias, não apenas deslocando suasbases de processamento de carnes para essasfronteiras, como também investindo no aprovei-tamento de resíduos, como o sebo bovino egorduras de aves para alimentar as caldeiras dasunidades frigoríficas.

O sebo bovino, por sinal, é a matéria-primamais barata atualmente. Isso tem motivado nãoapenas os frigoríficos como também unidadesindustriais de produção de biodiesel a considerara sua utilização, inclusive em mistura com óleosvegetais. Entretanto, por se tratar de umsubproduto, sofre de restrições de oferta e poderáter os preços elevados com o aumento dademanda.

Há que se destacar, também, a proximidadeentre a produção do biodiesel e a atividadesucroalcooleira. De um lado, as áreas de renova-ção dos canaviais podem ser utilizadas para oplantio de oleaginosas, como a própria soja, ogirassol e o amendoim. Do outro, como as unida-des industriais já dispõem de álcool e energia,insumos indispensáveis à produção do biodiesel,há vantagens técnicas e econômicas em se aco-plar plantas de transesterificação a essas uni-dades.

Cabe destacar, ainda, que tanto o óleo desoja quanto o de girassol e do amendoim já têmum mercado desenvolvido, onde o processo deformação de preços é transparente. Desse modo,a produção do biodiesel compete com aalternativa de colocar esses óleos no mercadoalimentício, inclusive externo. Isso acaba por setornar um fator de insegurança para osempreendedores, mesmo na Região Centro-Sul,

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que representa quase 80% do consumo nacionalde óleo diesel.

A necessidade de priorizar os aspectossociais leva ao conflito entre a questão energéticae a econômica. Isso porque no marco regulatórioos incentivos fiscais para a produção do biodieselna região são mais restritos. Desse modo, emborao potencial produtivo seja grande, a tendência éde que os investimentos priorizarão o auto-consumo, especialmente nas fazendas de grãose em algumas unidades sucroalcooleiras, distantesdas refinarias e dos centros de distribuição emistura de combustíveis.

ConclusãoO Brasil é uma das referências mundiais na

produção e uso de fontes renováveis de energia.Nesse campo, o setor agropecuário ocupa papelde destaque, seja com a madeira (carvão vegetale lenha representando 13,2% das fontes primáriasde energia) ou com a cana-de-açúcar (álcool ebagaço representando outros 13,5%). Essesnúmeros refletem a eficiência do País na explora-ção de uma vocação natural das regiões tropicais:a produção de energia de biomassa.

O Programa Nacional de Produção e Usode Biodiesel objetiva criar as condicionantes paraa consolidação dessa posição de liderança nautilização de fontes renováveis de energia. E, maisdo que isso, lança o desafio de ter na matriz ener-gética uma alternativa para o óleo diesel, quepossa ocupar o mesmo papel de destaque ocupa-do pelo álcool em relação à gasolina.

Entretanto, diferentemente do ProgramaNacional do Álcool, onde a conotação econômicase sobrepôs à social, o programa do biodiesel temcomo uma das prioridades a criação decondicionantes para a competitiva inserção daagricultura familiar na base da cadeia produtiva.Mais do que isso, objetiva assegurar a participaçãoda matéria-prima produzida nas regiões de menordesenvolvimento relativo, como a Região doSemi-Árido, de forma a contribuir para a reversãodo quadro histórico de empobrecimento em quese encontram.

Tal propósito, apesar de incontestavelmentelegítimo, encontra como grande entrave adisponibilidade de terras agricultáveis em outrasregiões do País, com maior aptidão para aagricultura intensiva. Desse modo, ao definir ummodelo tributário que confere benefícios fiscaispara o biodiesel produzido nessas condiçõesespeciais (matérias-primas intensivas em mão-de-obra, produzidas em estabelecimentos deagricultura familiar, especialmente nos estadosmais pobres), há o risco da baixa eficiênciaeconômica nesse processo.

Com isso, considerando que a cargatributária federal sobre o diesel mineral não é tãoelevada quanto sobre a gasolina, a desoneraçãopara o biodiesel produzido no contexto de inclusãosocial pode não ser suficiente para permitir a suacompetitividade em relação àquele baseado nouso de matérias-primas provenientes da agricul-tura empresarial. Significa que mesmo nãooferecendo benefícios fiscais para o biocombus-tível produzido empresarialmente, ele ainda po-derá ser mais competitivo do que aquele baseadona matéria-prima oriunda da agricultura familiar.

Destaque-se que em outros países, comoAlemanha, França e Estados Unidos, o combus-tível renovável goza não apenas de um regimetributário diferenciado, como também, em algunscasos, da subvenção direta à sua produção. Essaprevalência da componente ambiental, combi-nada com a questão da segurança energética, noentanto, não deverá ser observada na fase inicialde implantação do programa brasileiro.

Há que se considerar, também, anecessidade de pensar o biodiesel num escopomais amplo. A obrigatoriedade da mistura, definidapela Lei nº 11.097/2005, cria uma demandacompulsória para uma pequena fração domercado potencial. Com isso, há espaço paraações mais concretas para viabilizar níveis maiselevados de substituição do diesel em segmentosespecíficos de mercado. É o caso dos geradoresestacionários, em regiões remotas, o auto-consumo, nos estabelecimentos rurais distantesdos centros de refino e distribuição do combustívelfóssil e alguns segmentos de grandes consumi-dores, como empresas de transporte de cargas.

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Enfim, o biodiesel representa um grandepotencial de negócios para o meio rural brasileiro,permitindo a conciliação de ações de fomentovoltadas para a maior inserção da agriculturafamiliar no processo de produção de matérias-primas, com medidas de natureza mais econô-mica e energética, visando assegurar a efetivainserção do novo combustível como vetor deredução da dependência em relação ao dieselmineral.

As diretrizes para a etapa inicial já estãoestabelecidas, mas, certamente, muitos ajustesdeverão ser feitos para promover essaharmonização de interesses no âmbito do tripéeconômico, ambiental e social. O próprioprocesso de desenvolvimento tecnológico poderátrazer novas respostas para questões ainda emaberto. É o caso das oportunidades oferecidas pelatecnologia do Hbio, do craqueamento e aspesquisas visando ao pleno domínio da rota etílicano processo de transesterificação.

Cabe ao poder público estar atento e flexí-vel para tomar as medidas oportunas para reduziros riscos para o investidor e os custos para osconsumidores finais. Quanto mais efetiva e eficaza ação governamental, mais rápido e menores ten-dem a ser os custos do processo de aprendizado.

ReferênciasPERES, J. R. R; FREITAS JUNIOR, E.; GAZZONI, D. L.Biocombustíveis: uma oportunidade para o agronegóciobrasileiro. Revista de Política Agrícola, Brasília, DF, ano XIV,n. 5, p. 31-46, jan./fev./mar. 2005.

PROGRAMA NACIONAL DE PRODUÇÃO E USO DEBIODIESEL. O programa. Disponível em: <http://www.biodiesel.gov.br/>. Acesso em: 25 jul. 2006.

HOLANDA, A. Biodiesel e inclusão social. Brasília, DF: Câmarados Deputados, 2004. 200 p. (Caderno de Altos Estudos, 1).

ZYLBERSTAJN, D.; COELHO, S. T.; IENO, G. O. Potencial degeração de eletricidade na Amazônia a partir de resíduosagrícolas. São Paulo: Universidade de São Paulo - Instituto deEletrotécnica e Energia, 1996.

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Futuro para oálcool brasileiro Paulo Morceli1

1 Superintendente substituto de Gestão da Oferta - Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), SGAS 901, Conjunto A, Lote 69, 2º Andar, Sala A-201,70390-010 - Brasília, DF; [email protected]

De maneira geral, nos 2 últimos anos oagronegócio brasileiro tem passado por momen-tos difíceis, com poucos setores conseguindo atémesmo sobreviver. Por sua vez, o setor sucroal-cooleiro vive momentos de esplendor, com os seusprodutos (açúcar e álcool) altamente valorizadosnos mercados interno e externo. É preciso umaanálise profunda quanto às razões que levam atal posição, pensando, inclusive, na continuidadede crescimento e qual o futuro do setor.

Na verdade, com o Protocolo de Kyoto,abriu-se uma janela para o agronegócio brasilei-ro na área de biomassas (etanol, biodiesel, co-geração, etc.) e com o País tendo a obrigação demanter esta janela aberta. Neste trabalho, pre-tende-se chamar a atenção dos agentes envolvi-dos com a cadeia produtiva do etanol para que sepreparem para tirar proveito do excelente momen-to, diga-se de passagem, porém breve.

Vem se acentuando a busca para reduzir apoluição ambiental e pela auto-sustentabilidadedo setor produtivo, especialmente o agrícola. Acada dia acentuam-se as pressões para que a pro-dução agropecuária utilize modelos com menorou até nenhuma agressão ao meio ambiente. Naprodução e uso de energia, especialmente aembarcada, a busca tem sido pela que poluamenos, que dê o maior rendimento por unidade eque tenha o menor custo, ou seja, por fontes quetenham uma maior relação custo/benefício.

No presente momento, o Brasil, por ter gran-des extensões de terras que podem seragricultáveis sem desmatamento (o desmatamentonão é mais admitido), tendo um excelente regime

climático, com um sol maravilhoso, pode tirar pro-veito no fornecimento de etanol e de gorduras (ani-mal e vegetal) para o biodiesel. Entretanto, os ci-entistas continuam trabalhando com afinco, ten-do a certeza de que a descoberta de uma fontede energia que não dependa da natureza não estálonge de ser conseguida. Portanto, é hora de apro-veitar o momento.

Para que se entenda o que propõe este tex-to, será feita uma incursão no passado, visitandoum pouco a história do álcool no Brasil, entrandoposteriormente pela situação presente, ou seja,qual o posicionando atual, e, finalmente, analisan-do o futuro que se apresenta.

O passadoAnalisando os dados da história recente, não

se pode deixar de considerar que a indústriasucroalcooleira teve um desempenho econômi-co e tecnológico brilhantes, não correspondendo,no entanto, ao sentimento que prevalece na opi-nião pública brasileira. Como pode ser visto naFig. 1, na safra 1970–1971, do total de cana-de-açúcar produzido naquele período, 82,22% foi des-tinado para a produção de açúcar, em grande partepara o consumo interno. Foram produzidos, ain-da, 252 mil metros cúbicos de álcool anidro (oBrasil já utiliza álcool anidro misturado à gasoli-na desde 1931) e mais 385 mil metros cúbicos deálcool hidratado para usos gerais, especialmentena indústria farmacêutica. Nessa ocasião, o Bra-sil esmagou 79,8 milhões de toneladas de cana-de-açúcar, ou seja, apenas 18,85% do que é in-dustrializado atualmente.

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Com o surgimento do carro leve movido aálcool em fins da década de 1970 e o aumento dopercentual de mistura, na safra 1979/80, foramcolhidos 138,9 milhões de toneladas de cana-de-açúcar, havendo uma redução importante da par-ticipação do açúcar já que, apenas 54,16% fo-ram destinadas à fabricação desse produto. Nes-sa ocasião, foram produzidos 2.712 mil metroscúbicos de álcool anidro, pois os percentuais demistura tinham sido elevados e variaram entre20% e 23%, e 671 mil metros cúbicos de álcoolhidratado, pois já estavam presentes no mercadoos primeiros carros com essa tecnologia total-mente brasileira.

Com o crescimento da frota de veículos le-ves movidos a álcool, conforme mostrado naFig. 2, além do crescimento substancial da quan-tidade colhida de cana-de-açúcar, o perfil dos pro-dutos gerados também foi modificado. Na safra1985–1986, época em que foi maior a relaçãodas vendas de carros a álcool em comparaçãocom os a gasolina, foram produzidas 224,4 mi-lhões de toneladas de cana-de-açúcar, sendo27,87% utilizados para fabricação de açúcar, como restante originando 3.208 mil metros cúbicosde álcool anidro e 8.612 mil metros cúbicos dehidratado. Nessa ocasião, 85,51% de todos oscarros leves vendidos no Brasil eram a álcool,correspondendo a 697.049 unidades.

A maior safra do combustível de cana-de-açúcar ocorreu na safra 1991–1992, quando fo-

ram produzidos 228,8 milhões de toneladas decana, incremento de 64,72% em relação ao iní-cio do uso de álcool combustível. Apenas 28,50%da matéria-prima foi utilizada para a fabricaçãode 8,7 milhões de toneladas de açúcar, ou seja,apresentou um crescimento de apenas 24,64%.O grande incremento deu-se na produção deálcool, com o anidro reduzindo-se em 26,84% eo hidratado crescendo 1.460,95%, resultando, des-sa forma, em aumento de 248,20% no álcool to-tal, sempre em relação à produção de 1979–1980.Esse fato ocorreu em decorrência da mudançado perfil da frota brasileira com maior participa-ção dos carros a álcool hidratado, em detrimentodos carros a gasolina.

Em fins da década de 1980, ocorreu o pri-meiro movimento que trouxe descrédito à capa-cidade de suprimento da frota brasileira de carroscom combustíveis da biomassa. Sem entrar naanálise de quem foi a responsabilidade, é certoque o consumidor sentiu-se lesado ao adquirir umveículo a álcool, pois, ao buscar as fontes de su-primento do combustível, viu-se impossibilitadopela falta do mesmo. O descrédito chegou a talponto que, em 1986, do total de veículos comer-cializados no Brasil, 85,51% eram a álcool, cain-do em 1997, para apenas 0,08%. Como agravan-te, a falta de álcool nos postos de abastecimentotrouxe ao mercado a idéia de que o empresáriodeste setor era pouco confiável, movido especifi-camente pelo lucro e não tendo qualquer ou ne-

Fig. 1. Cana-de-açúcar no Brasil: quantidade moída, açúcar e álcool produzidos.(1) Estimativa, (2) Previsão.

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nhum compromisso com o consumidor. Esse sen-timento ainda é muito enraizado nos usuários bra-sileiros, que vem à tona sempre que ocorrem ele-vações de preços sem uma explicação convin-cente, como as que ocorreram em fevereiro de2003 e janeiro a março de 2006. Para minimizaros efeitos danosos, no primeiro caso, o governobrasileiro fez um acordo com o setor produtivo,que o cumpriu integralmente, superando a crise;no segundo momento, a despeito de um acordoenvolvendo quatro ministros de Estado (Agricul-tura, Casa Civil, Fazenda e Minas e Energia) osetor não cumpriu tal acordo e os preços volta-ram a subir naturalmente, deixando o consumi-dor brasileiro com o prejuízo e a péssima sensa-ção de ter feito um mau negócio ao comprar umcarro flex fuel (a indústria sucroalcooleira "ven-de" a idéia de que esse carro é a álcool, o quenão é verdade, sendo este outro fato negativo comrelação ao fornecimento de combustíveis dabiomassa no Brasil).

Entretanto, não se pode esquecer que o Bra-sil, por meio das indústrias alcooleira e automobi-lística, apoiado em programas governamentais e

de pesquisas, foi capaz de “inventar” um com-bustível substituto do petróleo que, além de utili-zar insumos, em sua maior parte, nacionais, temum grande apelo ecológico. Em relação ao ba-lanço de pagamentos brasileiro, contabiliza-se queno período de 1979 a 2000 houve economia deUS$ 43,5 bilhões com a redução das importaçõesde petróleo. Tal fato torna-se mais relevante se forlevado em conta que foi durante esse período queo Brasil teve os piores momentos de sua história,com a falta de moeda externa para aquisiçõesimprescindíveis ao seu desenvolvimento.

O presenteAnalisando a Fig. 2, tem-se uma visão errô-

nea do momento atual. A partir do ano 2000, emrazão de alguns programas de incentivos gover-namentais, como, por exemplo, a chamada “fro-ta verde”, em que o uso de carros a álcool foiincentivado para aumentar o consumo desse com-bustível, percebe-se crescimento, embora insi-piente, nas suas vendas, de modo que, em 2003,já aparece a comercialização de 4,61% do total

Fig. 2. Carros leves: volume de vendas em carros a álcool e a gasolina C.Elaboração: Conab - (1) até junho de 2006.Fonte: Anfavea.

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de automóveis vendidos naquele ano. Um fatomarcante que ocorreu nesse exercício foi o lan-çamento do carro flex fuel, em novembro, pelaVolkswagen. A partir de então, cresceu substan-cialmente o volume de vendas de carros que podeconsumir gasolina C ou álcool hidratado, de modoque, em 2005, das 1.631.217 unidades vendidasinternamente, 895.002 unidades eram a álcool ouflex fuel, ou seja, 54,87%. Em 2006, tomando-sepor base os dados de janeiro e junho, essepercentual atingiu 73,80%, com 622.508 unida-des a álcool ou flex fuel, para o total de 843.521carros comercializados no período.

O crescimento atual, no uso de carros "aálcool", apresenta grandes diferenças em relaçãoao passado. Em primeiro lugar, o fato de que ocarro flex fuel não foi fabricado para utilizar álco-ol como combustível, a despeito dos produtoresde álcool "venderem" a idéia. A tecnologia foidesenvolvida para dar flexibilidade aos consumi-dores para que estes não fiquem dependentes deum único combustível, podendo, dessa maneira,escolher aquele que melhor lhe atendesse, eco-nômica ou ecologicamente. Outro ponto impor-tante foi a motivação da indústria automobilísti-ca. No passado, o lançamento e a produção docarro a álcool tiveram forte imposição institucio-nal, com o governo federal sendo o grande indutorna sua implementação.

Atualmente, são as montadoras que têm in-teresse nesse tipo de tecnologia, já que “desco-briram” um grande apelo de marketing ao dar essetipo de opção ao consumidor e uma excelentevantagem tecnológica, pois deixam de se preo-cupar em ajustar o motor às diferentes misturasde álcool a gasolina, ante as constantes altera-ções dos padrões de misturas adotadas. O consu-midor, na verdade, não tem muita escolha, pois aindústria, para um bom número de modelos, sófornece a "opção" do motor bicombustível. Esse éo embrião do motor universal, onde a mesma pla-taforma pode ser utilizada em países que mistu-ram 20% de álcool, como no Brasil; 10%, 5,7%ou nada como é nos EUA; 3% como proposto parao Japão; ou nada como acontece na maior partedos países.

Na visão dos produtores de álcoois com-bustíveis, o sucesso do motor flex fuel traz a im-portante possibilidade de ampliação do mercadodemandante desse combustível. Com essa incor-poração à frota de carros a álcool, que já estavano processo de descarte por obsolescência, háum novo alento no consumo do álcool hidratadono Brasil. Como pode ser visto na Fig. 1, na safra2006–2007, a produção de álcool hidratado serásuperior à de álcool anidro, fato esse que não ocor-ria desde a safra 1999–2000.

Entretanto, a frota de carros com dupla ap-tidão pode induzir os produtores de álcool a séri-os erros. Não se pode esquecer que os proprietá-rios desses automóveis estão se conscientizando,ainda que aos poucos, de que não são possuido-res de um carro a álcool, mas sim de um veículoque oferece a opção de utilizar o combustível queestiver mais barato, sem qualquer prejuízo para oseu bem. É diferente de quando a frota tinha omotor próprio para álcool e, se houvessemajoração dos preços, o consumidor não tinhaoutra opção senão desembolsar um valor maiorpara abastecer seu veículo, ou pior, quando falta-va o combustível nos postos de abastecimento.

Nesse sentido, é bom dar uma olhada naFig. 3, onde são apresentados os preços compa-rativos do álcool hidratado no Estado de São Pau-lo, maior produtor do combustível e dono da mai-or frota de veículos leves do País, assim como oDistrito Federal que, embora tenha uma frota re-presentativa, importa todo combustível que con-some. Nota-se que em boa parte do período sobanálise os proprietários paulistas deram preferên-cia para o álcool, já que existe alguma vantagemfinanceira com o seu uso. Já para o Distrito Fede-ral, geralmente, o proprietário de carro flex fuelsó irá abastecê-lo com álcool se quiser ter umaatitude politicamente correta em relação ao meioambiente, não se preocupando em gastar um pou-co mais, ou ainda, não atentando para esse as-pecto, no uso do próprio bem.

Outra questão importante no mercado decombustíveis diz respeito à transmissão de pre-ços entre os agentes da cadeia. Tomando por baseos dois estados anteriormente referidos, vê-se na

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Fig. 4 os efeitos das mudanças de preços no álco-ol na indústria, partindo-se do Índice Esalq, e oque ocorre nas distribuidoras e postos de abaste-cimentos, segundo dados disponibilizados pelaAgência Nacional do Petróleo (ANP). É fácil no-tar que em São Paulo, dada a proximidade entreindústrias, distribuidoras e postos, as mudanças nospreços são refletidas com rapidez em toda cadeia.No Distrito Federal, por ter que importar o com-bustível consumido, o tempo de entrega, dedisponibilização e de venda faz com que a trans-missão das mudanças de preços aconteçam emritmo mais lento.

Com o crescimento econômico de impor-tantes países e as novas regras impostas pela Or-ganização Mundial do Comércio (OMC) à UniãoEuropéia, o Brasil desponta como grande forne-cedor de açúcar para os próximos anos. Segundoprojeções do International Sugar Organization,MECAS(05)20, November 2005, para o total deexportações, na safra 2005–2006 (outubro a se-tembro), de 46,5 milhões de toneladas, base açú-car em bruto, o Brasil contribuirá com 19,1 mi-

lhões, portanto 41,08% do total. Nesse sentido, ascotações nas bolsas internacionais deram maisforça na remuneração do setor, pois as cotaçõesdo contrato Sugar 11, por exemplo, na NYBOT,chegaram a atingir US$¢ 19,30 por libra-peso em3/2/2006, enquanto nesta mesma data, no ano pas-sado, estava em US$¢ 8,94 por libra-peso, por-tanto uma valorização de 115,88%.

Efetivamente, as exportações brasileiras deaçúcar seguem em ritmo acelerado. Em 2005,foram embarcadas 18,1 milhões de toneladas aopreço médio de US$ 215,95 por tonelada, tendosido faturado US$ 3,9 bilhões. No ano anterior, osembarques totalizaram 15,8 milhões de tonela-das ao preço médio de US$ 167,89 por tonelada,com receita total de US$ 2,6 bilhões. Esses dadosdão a perfeita idéia de como o mercado remune-rou bem o setor sucroalcooleiro, nas exportaçõesdo açúcar.

Com relação ao mercado de álcool, o au-mento da frota de veículos que tecnologicamenteestão preparados para utilizar esse tipo de com-bustível, diretamente no tanque, já é fator para o

Fig. 3. Álcool hidratado carburante e gasolina tipo C: relação entre os preços dos combustíveis, em %.Fonte: ANP - Elab.: Conab.

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crescimento da demanda interna. Além disso, omundo está descobrindo o álcool como um exce-lente aditivo à gasolina e tem buscado no Brasil afonte de suprimento. Em 2004, os embarques des-se produto atingiram 2,4 milhões de metros cúbi-cos, que, ao ser faturado pelo preço médio deUS$ 322,94 por metro cúbico, obteve a receitatotal de US$ 497,4 milhões. No ano passado, osembarques totalizaram 2,6 milhões de metroscúbicos (aumento de apenas 8,33%). Os preçosmédios foram de US$ 459,95 por metro cúbico(aumento de 42,43%), com o faturamento deUS$ 765,5 milhões. (incremento de 53,90%).

A comparação do desempenho do comér-cio exterior desse produto já dá para se ter umaidéia de quanto os empresários do setor estãomotivados para novos investimentos. Segundo oInformativo Única, de janeiro/fevereiro de 2006,a safra 2006–2007 contará com mais 19 novasindústrias na Região Centro-Sul, sendo 11 delassó no Estado de São Paulo. Segundo o Relatóriodo JBIC, sobre o potencial do mercado de

bioenergia brasileiro, existem 50 novas unidadessendo construídas nos Estados de Goiás, MinasGerais, Mato Grosso do Sul, Paraná, Rio de Janei-ro e São Paulo, onde, na safra 2011–2012, pro-cessarão 75,5 milhões de toneladas de cana-de-açúcar. Existem informações de que o total deusinas que estariam prontas recentemente emmontagem, em projeto e em consulta totalizaria104 unidades na Região Centro-Sul.

Pode-se dizer, portanto, que para as próxi-mas safras, haverá empresários interessados emimplantar cerca de 150 indústrias de açúcar e ál-cool no Brasil, com capacidade para moer algocomo 225 milhões de toneladas de cana-de-açú-car. A grande questão é: qual será o destino a serdado a essa produção? Considerando, em termosmédios, estima-se que, se fosse mantida a rela-ção de uso da matéria-prima para açúcar e álco-ol atuais, seriam produzidas 14,6 milhões de to-neladas de açúcar e 10,1 bilhões de litros de ál-cool. A capacidade de crescimento do mercadointerno é limitada para ambos os produtos. No

Fig. 4. Álcool hidratado carburante: transmissão de preços entre indústria, distribuidoras e postos do DF e SP,em R$/L.Fonte dos dados básicos: ANP e Esalq/Cepea - Elaboração: Conab.

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caso do açúcar, o crescimento é inexpressivo,abaixo do crescimento vegetativo da população,e o do álcool, mesmo que os carros flex fossemabastecidos apenas com álcool, certamente oaumento da demanda não seria suficiente paraabsorver toda a oferta, podendo trazer à tona,momento como o que ocorreu em maio de 1999,quando o álcool hidratado foi vendido nas desti-larias por R$ 0,16532 o litro.

O futuroEmbora seja crescente a demanda mundial

por açúcar, em função do crescimento e desen-volvimento de países que estavam à margem doconsumo de alimentos e bebidas que utilizam esseproduto como matéria-prima, seu potencial deexpansão é mais limitado, diferentemente do ál-cool como aditivo à gasolina. Desta feita, o gran-de mercado para os produtos do setor sucro-alcooleiro está na rota dos combustíveis dabiomassa para atender ao mercado externo.

Com relação ao álcool como aditivo, coma implementação do Protocolo de Kyoto e com apreocupação crescente da população mundialcom respeito à questão da poluição atmosférica,a oferta de um combustível que agrida menos omeio ambiente é muito bem-vinda, política e eco-logicamente. Segundo dados do governo ameri-cano disponíveis no site http://www.eia.doe.gov/ipm/demand.html, no primeiro trimestre de 2006foram consumidos, em média, 85,3 milhões debarris de petróleo por dia. Fazendo as devidasconversões, pode-se estimar o consumo de 998,0bilhões de litros de gasolina por ano no mundo.Se considerarmos a possibilidade, bastante viá-vel, de uma mistura média de 10% de álcoolanidro à gasolina, tem-se uma demanda total desseaditivo de 99,8 milhões de metros cúbicos por ano.

Como foi ressaltado anteriormente, o apelodo álcool como aditivo é em relação à preocupa-ção com o meio ambiente. Nesse sentido, vale apena dar algumas indicações aproximativas. Se-gundo estudos, cada metro cúbico de álcoolanidro evita a emissão de 2,7 toneladas equiva-lentes de CO2. Se tomar a demanda total estima-da anteriormente, resulta em 269,5 milhões detoneladas equivalentes de CO2 que serão retira-

das da atmosfera todo ano. Imagine o mundo dofuturo, do qual serão retirados os valores anterio-res calculados de dióxido de carbono, anualmen-te, e o que isso significa em termos de melhoriaao meio ambiente.

Para que o álcool venha se tornar o aditivoutilizado pela grande maioria dos países em subs-tituição ao Metil-Tércio-Butil-Éter (MTBE), muitotem que ser feito no setor, conforme ressaltadocom detalhes no trabalho, Internacionalização doÁlcool Anidro para Uso como Aditivo à Gasoli-na". Em linhas gerais vale citar:

a) Criar credibilidade: combustível é umbem estratégico em qualquer país do mundo. Osaditivos atualmente em uso têm suas fontes desuprimento já estabilizadas, estando associadasàs mesmas regras de fornecimento dos derivadosdo petróleo. Dificilmente um governante vai mo-dificar sua matriz energética se não puder contarcom contratos de longo prazo, com garantia desuprimento e com regras de preços estabelecidas.O setor deve, portanto, atentar que a facilidaderelativa em alterar os produtos que pode produzirem sua unidade industrial, embora seja uma van-tagem de curto prazo, pode não trazer bons re-sultados no futuro. O cenário de preços deste ano,no Brasil, com os produtores descumprindo o acor-do com o governo federal e obrigando a reduçãoda mistura de 25% para 20% de álcool anidro àgasolina, trouxe graves prejuízos na credibilidadedo setor, interna e externamente. É o segundomomento ruim para o setor em termos de perdade confiança como fonte segura na produção decombustível. Tal fato tem que mudar para que oBrasil seja visto pelos tomadores de decisões comoum fornecedor seguro e confiável.

b) Necessidade de parcerias: Num empre-endimento desta magnitude não é possível o se-tor sucroalcooleiro brasileiro ser o único fornece-dor mundial. É preciso associar-se com os demaispaíses que têm potencial para o plantio da cana-de-açúcar, com vistas à produção de álcoolanidro, eliminando a idéia de dependência defornecedor único. A agregação de várias fontesde fornecimento trás a idéia de que o Brasil nãodominará o fornecimento do álcool, dando maissegurança quanto à disponibilidade do produto eda não formação de cartel de preços. Além disso,o atendimento da demanda global implicará uma

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necessidade que, por um bom tempo, estará forado alcance do Brasil, e a adesão de outros paísesprodutores facilitará, sobremaneira, a tomada dedecisão quanto ao uso do álcool como aditivopelos países em que a segurança no suprimentoainda é um fator preponderante. Neste processo,como o Brasil domina as fases das tecnologiasagrícola, industrial e logística, poderá tirar pro-veito, vendendo-as aos interessados, tendo, destafeita, mais um ramo de negócios bastante lucra-tivo.

c) Melhoria das tecnologias de produção:atualmente, as tecnologias utilizadas no setorsucroalcooleiro permitem produzir a média de 6mil litros de álcool anidro por hectare, com o Paíscontando com mais de 60 milhões de hectares deterras ociosas que podem ser dedicadas ao plan-tio da cana-de-açúcar (essa área já está disponí-vel, sem a necessidade de qualquer agressão aomeio ambiente). Entretanto, se o Brasil for forne-cedor de 30% do total de álcool calculado anteri-ormente, terá que plantar, com o rendimento atu-al, cerca de 5 milhões de hectares de cana-de-açúcar, que somados aos 3 milhões atuaistotalizam 8 milhões, podendo ser considerada umagrande área para uma única cultura. Atualmente,já existem tecnologias agrícola e industrial quepermitem praticamente dobrar a produção porhectare, portanto o Brasil poderia exportar algoem torno de 30 milhões de metros cúbicos e ape-nas incorporar 1/3 de áreas novas cultivadas comcana-de-açúcar.

d) Solução das questões de logística: atual-mente, o escoamento do álcool é feito basicamen-te por meio de caminhões. É um meio de trans-porte que tem suas vantagens, sendo, no entanto,caro e de baixa capacidade de carga. Para umaoperação no volume que se estima é necessárioque o Brasil adote um sistema de transporte degrande eficiência e baixo custo. A melhor idéia éutilizar a infra-estrutura já disponível nos corre-dores de dutos da Transpetro, construindo umalcoolduto em paralelo. A rede de dutos daTranspetro parte de Brasília, passando pelo triân-gulo mineiro, pela principal região produtora decana-de-açúcar de São Paulo, chegando ao Por-to de Santos, no Terminal da Alemoa, e ao Portode São Sebastião, ambos especializados emlogística de combustíveis, como mostra a Fig. 5.

Com o uso dessa rota, várias questões já estariamsolucionadas: não haveria necessidade delicenciamento ambiental, tendo em vista que essaautorização já existe para os dutos de petróleo; aTranspetro já tratou da questão de segurança des-ses dutos quando construiu os dutos atuais; as de-sapropriações já foram feitas, não necessitandode novos e maiores gastos; há um operador dotransporte de combustível altamente especializa-do e eficiente. Com isso, o álcool alcançaria osportos com baixo custo e alta eficiência, permi-tindo que o setor sucroalcooleiro fizesse contra-tos de grandes volumes com preços altamenteremuneradores e competitivos em relação aosderivados de petróleo.

e) Segurança institucional: a partir do iní-cio da década de 1990, o Brasil adotou a totaldesregulamentação do setor sucroalcooleiro e defornecimento de combustíveis da biomassa. É poresse motivo que vez por outra têm ocorrido difi-culdades no cumprimento da meta de abasteceros veículos brasileiros a preços aceitáveis. É pos-sível, e desejável, que na questão das exporta-ções sejam mantidas as mesmas regras, ou seja,sem qualquer interferência institucional do gover-no. Entretanto, caso exista alguma dificuldade,indicando que o ganho de mercado estaria ocor-rendo em ritmo menor do que o esperado, seriacriada uma espécie de joint venture entre o go-verno federal e a iniciativa privada com a funçãode buscar e dar garantias a todos os negócios deexportação de álcool para uso como combustí-vel. Teria, também, a função de buscar paísesparceiros para atuar na produção e exportaçãode álcool, no fornecimento das tecnologias ne-cessárias à atividade e na busca de compradoresdo álcool.

ConclusãoOs agentes do agronegócio sucroalcooleiro

estão em um momento espetacular. Os dois pro-dutos pelos quais são responsáveis estão com ademanda em alta, especialmente no comércioexterior. Os cenários de crescimento no mercadointernacional são muito bons, especialmente parao álcool anidro. Entretanto, questões comocredibilidade, parcerias, desenvolvimento

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tecnológico e soluções de logística estão postas àmesa e necessitam de soluções rápidas. Se o se-tor não tiver soluções prontas quando, pelo me-nos, a metade das novas indústrias estiver emoperação, a possibilidade de queda de preços apatamares indesejáveis é muito grande. É umaquestão fundamental para que o setor, apoiadopelo governo, busque sua equalização.

Deve-se atentar que a janela para uso decombustível líquido de origem da biomassa estáaberta e tem um tempo curto para ser utilizada.As pesquisas na busca de alternativas mais efici-entes e baratas estão aceleradas. Os cientistas têmdezenas de projetos em suas bancadas e não de-mora muito surgirá uma alternativa muito maiseconômica e muito melhor sob o ponto de vistaecológico que inviabilizará totalmente o uso do

Fig. 5. Exportação de álcool pelo Brasil - Rede de Dutos da Transpetro.Fonte: www.transpetro.com.br/portugues/empresa/dutosTerminais/mapas/mpdtcs.gif

álcool ou de qualquer outro combustível líquidoembarcado. As idéias já estão fervilhando emvários centros de pesquisas, e dentro de 20 a 30anos estarão disponíveis. Assim, se o Brasil e osindustriais do setor quiserem aproveitar e obterbons lucros com a exportação de um produto emque o País pode ser o líder, este é o momento.Tem-se que ir à luta rapidamente e com muita efi-ciência. O Brasil foi privilegiado pela natureza epode contribuir com a redução da poluição mun-dial, fornecendo o melhor combustível para veí-culos leves já idealizado pelo homem e, aindaassim, obter um excelente lucro. Para tanto, pre-cisa unir forças de governantes e iniciativa priva-da, para, juntos, buscarem desse mercado. Espe-ra-se, portanto, que os brasileiros, de fato, este-jam preparados para essa empreitada.

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Resumo: As fortes transformações do sistemas de produção de animais confinados (SPACs) têm trazidoavanços significativos ao setor, no entanto isso também tem causado problemas ambientais fruto daconcentração e aumento de escala da atividade. Isso cria a necessidade de busca de novas alternati-vas para mitigar o problema e também agregar valor aos resíduos gerados. A geração e o aproveita-mento do biogás a partir desses resíduos se mostra como uma alternativa interessante, pois permite oaproveitamento do biogás gerado nas propriedades rurais como fonte de energia térmica e elétrica,reduzindo os custos provenientes da demanda energética das propriedades rurais.

Palavras-chave: impacto ambiental, energia, resíduos animais.

Aproveitamento dedejetos de animaispara geração de biogás

1 Químico industrial, Dr., pesquisador da Embrapa Suínos e Aves, Caixa Postal 21, 89700-000, Concórdia, SC., [email protected] Engenheiro agrícola, Dr., pesquisador da Embrapa Suínos e Aves, Caixa Postal 21, 89700-000, Concórdia, SC., [email protected]

IntroduçãoA produção de animais têm sofrido grandes

modificações nas últimas décadas, passando deum sistema de criação extensivo para um mode-lo intensivo de confinamento. O sistema de pro-dução de animais confinados (SPACs) visa princi-palmente reduzir os custos de produção e aumen-tar a eficiência do processo. O Brasil tem se des-tacado internacionalmente nesse contexto, au-mentando suas exportações e gerando divisas parao País. No entanto, os problemas ambientais tam-bém têm se intensificado, em função dessa altaconcentração, criando-se a necessidade de alter-nativas que permitam minimizar o problema e,na medida do possível, agregar algum valor aosresíduos dos SPACs. Nesse sentido, a geração eutilização de biogás apresenta-se como uma al-ternativa interessante para contribuir na mitigaçãodesses problemas ambientais.

A biodigestão anaeróbia é um processo co-nhecido há muito tempo e seu emprego para aprodução de biogás para a conversão em ener-

gia de cozimento, iluminação e como biofertili-zante é muito popular nos países asiáticos, aexemplo da China e Índia.

O interesse pelo biogás, no Brasil, intensifi-cou-se nas décadas de 1970 e 1980, especial-mente entre os suinocultores. Programas oficiaisestimularam a implantação de muitos biodigestoresfocados, principalmente, na geração de energiae na produção biofertilizante e diminuição doimpacto ambiental. O objetivo dos programasgovernamentais era reduzir a dependência daspequenas propriedades rurais na aquisição deadubos químicos e de energia térmica para osdiversos usos (cozimento, aquecimento, ilumina-ção e refrigeração), bem como reduzir a polui-ção causada pelos dejetos animais e aumentar arenda dos criadores. Infelizmente, os resultadosnão foram os esperados e a maioria dos sistemasimplantados acabaram sendo desativados.

A conjugação de uma série de fatores foiresponsável pelo insucesso dos programas de bio-digestores nesse período, entre os quais podemoscitar:

Airton Kunz1

Paulo Armando V. de Oliveira2

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a) Falta de conhecimento tecnológico so-bre a construção e operação dos biodigestores.

b) Custo de implantação e manutenção ele-vados (câmaras de alvenaria, concreto ou pedra,gasômetros de metal).

c) O aproveitamento do biofertilizante con-tinuava a exigir equipamentos de distribuiçãona forma líquida, com custos de aquisição, trans-porte e distribuição elevados.

d) Falta de equipamentos desenvolvidosexclusivamente para o uso do biogás e a baixadurabilidade dos equipamentos adaptados para aconversão do biogás em energia (queimadores,aquecedores e motores).

e) Ausência de condensadores para água ede filtros para os gases corrosivos gerados no pro-cesso de biodigestão.

f) Disponibilidade e baixo custo da energiaelétrica e do GLP.

g) Não resolução da questão ambiental, poisbiodigestores, por si só, não são considerados comoum sistema completo de tratamento. Outros fato-res, como erros grosseiros de dimensionamento,construção e operação, foram determinantes parao insucesso dos biodigestores.

Passados aproximadamente 30 anos osbiodigestores ressurgem como alternativa ao pro-dutor, graças à disponibilidade de novos materi-ais para a construção dos biodigestores e, eviden-temente, da maior dependência de energia daspropriedades em função do aumento da escalade produção, da matriz energética (demanda daautomação) e do aumento dos custos da energiatradicional (elétrica, lenha e petróleo). Sem dúvi-da, o emprego de mantas plásticas na construçãode biodigestores, material de alta versatilidade ebaixo custo, é o fator responsável pelo baratea-mento dos investimentos de implantação e da suadisseminação (OLIVEIRA, 2005).

Biodigestão anaeróbicaO entendimento do processo de obtenção

do biogás é de grande importância para o suces-

so da tecnologia de aproveitamento do biogás,haja vista que são complementares e, caso nãose tenham os devidos cuidados na geração, a uti-lização estará seriamente prejudicada.

O mecanismo de decomposição anaeró-bica se desenvolve pela ação de um consórciode microrganismos, em que um dos produtos fi-nais da degradação é o metano (Fig. 1). O biogás,produto da degradação anaeróbica, é compostomajoritariamente por metano (50%–70%) e CO2.Esse gás pode ser coletado dos sistemas de de-gradação anaeróbica e utilizado como combustí-vel (geração de calor ou energia). Os sistemasmais representativos para tratamento de dejetosanimais via degradação anaeróbica são osbiodigestores.

Os biodigestores são sistemas fechados dedegradação anaeróbica em que os gases produ-zidos são coletados e armazenados em compar-timentos chamados gasômetros para posterior uti-lização ou simples queima. Vários modelos debiodigestores têm sido desenvolvidos e adapta-dos para se buscar um aumento da eficiência des-

Fig. 1. Etapas da degradação anaeróbica.Fonte: Bitton, 2005.

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ses sistemas aliado a uma redução de custos dosequipamentos (REUNIÃO TÉCNICA SOBREBIODIGESTORES PARA TRATAMENTO DEDEJETOS DE SUÍNOS E USO DE BIOGÁS, 2006).

Os principais modelos de biodigestor são oindiano, chinês e canadense, sendo este últimobastante utilizado recentemente, principalmentepelo desenvolvimento de geomembranas que fa-cilitam a instalação dos biodigestores.

Os biodigestores podem apresentar proble-mas de eficiência influenciados por um manejoincorreto ou pela influência da temperatura am-biente. Esta última variável pode alterar a tempe-ratura da biomassa no interior do biodigestor e,nos meses de inverno, reduzir a atividade dosmicrorganismos, já que estes apresentam umatemperatura ótima de crescimento por volta de35oC (OLIVEIRA, 2005). No Brasil isso é mais sig-nificativo nos estados do Sul, que têm maior am-plitude térmica e invernos mais rigorosos, conse-qüentemente quando se tem as maiores deman-das por energia térmica (KUNZ et al. 2005).

Um cuidado que deve ser tomado com autilização de biodigestores diz respeito aoefluente líquido que sai do sistema (Tabela 1),não podendo ser descartado nos corpos recep-tores, pois ainda apresenta um alto potencialpoluidor, principalmente quando consideradonitrogênio e fósforo.

Capacidade de geração de biogásem função de diferentes resíduos

A geração de biogás a partir de resíduosanimais é dependente, além da temperatura, pH,alcalinidade e do manejo adotado no SPAC, tam-bém da própria característica do resíduo, que é osubstrato para o crescimento dos microrganismosno biodigestor (Tabela 2).

Essa diferença na capacidade de geraçãode biogás está associada a vários fatores, comodieta dos animais e sistema digestivo, que fazemcom que sejam produzidos resíduos de caracte-rísticas distintas com potencialidades distintas naprodução de biogás.

Desenvolveu-se um trabalho para avalia-ção da produção de biogás, durante os meses dejulho a dezembro de 2004, em propriedade com400 suínos nas fases de crescimento e termina-ção e com um biodigestor modelo canadense,com volume da câmara de digestão para 100 m3

de biomassa (OLIVEIRA, 2004; OLIVEIRA et al.,2005). No biodigestor, a câmara de biomassa foiescavada no solo e revestida com vinimanta dePVC com espessura de 0,8 mm, sendo o depósitode biogás coberto, também com vinimanta dePVC, com espessura de 1 mm. O biodigestor foiprojetado para um Tempo de Retenção Hidráuli-co (TRH) de 30 dias, sendo então alimentado dia-riamente com 2,45 m3 de dejetos. O biogás gera-do foi registrado com um medidor modelo LiceuMG-4, com capacidade para a medição máximade 4 m3/hora. Semanalmente, eram coletadasamostras de dejetos na entrada e na saída dobiodigestor para análise físico-química dos dejetos.No período observado, a média e o desvio-pa-drão das medições semanais da densidade(kg/m3) dos dejetos de suínos na entrada dobiodigestor foi de 1.032,15 ± 15,38, sendo, na sa-ída do biodigestor, de 1.010,32 ± 2,24. A densida-de média observada na entrada do biodigestor(sólidos totais de 8,77 %) pode ser consideradaelevada quando comparada com os valores mé-dios de sólidos totais 2,5%, observados em pro-priedades produtoras de suínos, no OesteCatarinense. Essa densidade foi obtida em funçãode um manejo adequado dos dejetos de suínosnas instalações (raspagem a seco e limpeza so-mente na saída dos animais) e o uso de novos

Tabela 1. Médias (g L-1) das determinações de cargaorgânica e nutrientes para a alimentação e o efluentedo biodigestor.

Fonte: Kunz et al. (2004).

DQO

DBO520

N-NH3

NTotal

PTotal

SólidosVoláteis

Parâmetro

66,9 ± 13,5

34,8 ± 7,4

2,6 ± 0,8

4,8 ± 1,1

1,60 ± 0,41

41,7 ± 15,6

Entrada

8,5 ± 1,0

3,2 ± 1,2

2,3 ± 0,7

3,2 ± 0,5

0,22 ± 0,14

9,7 ± 4,9

Saída

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Tabela 2. Potencial de geração de biogás a partir de diferentes resíduos orgânicos animais.

Fonte: Oliveira (1993). SV: Sólidos voláteis.

Bovino (500 kg)

Suíno (90 kg)

Aves (2,5 kg)

Animal(Peso vivo)

10–15

2,3–2,8

0,12–0,18

Kg esterco/Animal/dia

0,038

0,079

0,050

m3 biogás/kg esterco

0,094–0,31

0,37–0,50

0,31–0,62

m3 biogás/Kg SV

0,36

0,24

0,014

m3 biogás/animal/dia

bebedouros que desperdiçam o mínimo possívelde água. Os valores de densidade estãocorrelacionados diretamente com os valores dosST e SV, então quanto maior a densidade maior aconcentração de ST e SV. A temperatura médiada biomassa observada no biodigestor foi de 23oC,o que indica que na digestão anaeróbica dabiomassa ocorreu predominantemente a presen-ça de bactérias mesofílicas. A média e o desvio-padrão, na entrada do biodigestor para a concen-tração de ST, observados foi de 65,12 g/L ± 23,7,e para os SV foi de 53,1 g/L ± 20,8. A produçãode biogás mínima registrada foi de 40 m3 emagosto e máxima de 60 m3 em dezembro (OLI-VEIRA et al., 2005).

Utilizou-se o modelo matemático desenvol-vido por Chen (1983), descrito em LA FARGE, 1995,com os valores de carga de alimentação dobiodigestor, para estimar a produção de biogáspara o biodigestor usado neste trabalho (100 m3).Na Fig. 2, pode-se observar os valores da produ-ção de biogás estimada pelo modelo de Chen(1983), para a faixa de temperatura (23oC) de ope-ração do biodigestor, para diferentes concentra-ções de carga.

O biodigestor instalado na propriedade pro-dutora de suínos, quando manejado adequada-mente, pode produzir biogás com uma eficiênciade produção variando entre 0,35 a 0,60 m3 debiogás por m3 de biomassa. Para uma produçãoeconomicamente aceitável de biogás, o manejodos dejetos na unidade produtora de suínos devebuscar obter a maior concentração possível desólidos voláteis e evitar a diluição dos dejetos coma mistura de água de chuva, água desperdiçadapelos bebedouros e água de limpeza das instala-ções (OLIVEIRA et al.,2005).

Utilização de biogás

Geração de energia térmica

O grande desafio das regiões com alta con-centração de animais é a redução dos Gases deEfeito Estufa (GEE) e principalmente a utilizaçãodo metano (CH4) como fonte de energia térmicaem substituição ao Gás Liquefeito de Petróleo(GLP) nos sistemas de produção de suínos e deaves. A Embrapa Suínos e Aves, uma das Unida-des de pesquisa da Embrapa, desenvolveu um tra-balho de utilização do biogás como fonte de aque-cimento do ambiente interno de um aviário, emjulho de 2004. A propriedade possui 400 suínosnas fases de crescimento e terminação e um avi-ário com 12 m x 100 m (1200 m2), com 14.400aves (12 aves/m2) (OLIVEIRA; HIGARASHI, 2006).

Fig. 2. Produção específica de biogás (m3/m3 debiomassa) estimada pelo Modelo de CHEN (1983),usando-se os valores observados de temperatura, sólidosvoláteis (g/L), vazão de dejetos (litros/dia) e carga dealimentação do biodigestor.Fonte: Oliveira et al. (2005).

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A propriedade possui um biodigestor modelo ca-nadense. No aviário, foram usadas oitocampânulas, fabricadas para o uso do GLP, asquais foram adaptadas para o uso do biogás, emque modificou-se o diâmetro do injetor de gás para1,50 mm (1,7672 mm2) e adotou-se o seguintemanejo das campânulas no aviário: durante o dia(12 horas), eram acionadas 5 campânulas e du-rante a noite, as 8 campânulas (12 horas). Apressão da linha de alimentação de biogás uti-lizada para as campânulas foi de 0,517 kg/cm2

(523,85 Pa) (OLIVEIRA; HIGARASHI, 2006).

O calor gerado pelo biogás foi testado noaquecimento do ambiente interno de um aviáriopara a produção de frango de corte. As tempera-turas foram observadas a cada 15 minutos, com ouso de dattaloger modelo Testo-175. A temperatu-ra da biomassa observada no biodigestor situou-se em 25oC. A média e o desvio-padrão da con-centração de ST, observada na entrada dobiodigestor, foi de 75,12 g/L ± 16,7, e para os SVfoi de 56,31 g/L ± 18,8, sendo a produção média debiogás verificada no período de observação (julho,2004) de 52 ±10 m3. O consumo médio de biogásregistrado por campânulas foi de 0,226 m3/h(totalizando em média 35,256 m3/dia).

A temperatura média de bulbo seco obser-vada no interior do aviário foi de 28,09oC, sendoobservada uma máxima de 32,86oC e mínima de21,68oC. No exterior do aviário, a temperaturamédia de bulbo seco observada foi de 11,29oC,sendo registrada uma máxima de 22,5oC e míni-ma de 2,47oC. O fluxos de calor foram estimadosem função dos valores observados das tempera-turas, umidade relativa e velocidade do ar e amassa corporal dos animais, sendo o fluxo decalor total de 42,52 W/m², o fluxo de calor sen-sível de 76,51 W/m² e o fluxo de calor latentede 23,17 W/m² (OLIVEIRA; HIGARASHI, 2006).

Na Fig. 3, pode-se observar as temperatu-ras de bulbo seco (oC), interna e externa,verificadas no aviário de produção de frango decorte, dos 14 aos 21 dias de criação.

O trabalho desenvolvido por Oliveira eHigarashi (2006) demonstrou que o biogás produ-zido diariamente pelos dejetos gerados por 400suínos na fase de crescimento e terminação pode

substituir o GLP que é utilizado como fonte decalor, sendo capaz de gerar energia térmica sufi-ciente para aquecer o ambiente interno de umaviário, mantendo a temperatura na faixa de con-forto térmico, para a produção de 14.400 frangosde corte.

Geração de energia elétrica

Os sistemas de produção de suínos geramgrandes quantidades de dejetos que podem sertratados convertendo-se matéria orgânica embiogás, que é uma fonte alternativa de energia,para alimentação de geradores de eletricidade.Salienta-se, porém, que, apesar das perspectivasfavoráveis, a utilização de biodigestores em pro-priedades rurais não foi bem difundida, em virtu-de da falta de conhecimento e de informaçõestecnológicas a seu respeito.

Estudos desenvolvidos por La Farge (1995)e Bleicher (2000), que avaliaram a geração deenergia elétrica com o uso do biogás, em proprie-dades produtoras de suínos, concluíram a viabili-dade técnica e econômica deste tipo de geraçãode energia.

A geração de energia elétrica com o usode biogás como combustível pode ser dividida nasseguintes tecnologias disponíveis no momento,segundo OLIVEIRA, 2004:

1- Conjunto Gerador de Eletricidade – Con-siste em um motor de combustão interna Ciclo Otto(álcool, gasolina ou diesel) adaptado para o usodo biogás como combustível, acoplado a um ge-rador de eletricidade, independente da rede deenergia elétrica da concessionária local.

2- Conjunto Gerador Economizador de Ele-tricidade – Consiste em um motor de combustãointerna Ciclo Otto (álcool, gasolina ou diesel)adaptado para o uso do biogás como combustí-vel, acoplado a um motor assíncrono, de dois ouquatro pólos, que passa a gerar energia ao serconectado à rede de energia elétrica da conces-sionária local.

No primeiro caso, o conjunto é indepen-dente da rede de energia elétrica local, gerandoenergia dentro de propriedade com o sistema de

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distribuição interno isolado. No segundo caso, oequipamento gera energia somente se estiverconectado à rede de distribuição da concessio-nária de energia elétrica, deixando de funcionarse a mesma sofrer interrupção, o que elimina pos-sibilidades de acidentes quando técnicos estive-rem trabalhando na manutenção nas redes elétri-cas externas. Neste caso, a energia gerada é dis-tribuída na propriedade e na rede externa até otransformador mais próximo.

Estudo desenvolvido por Zago (2003), ava-liando o potencial de produção de energia inte-grada por meio do biogás, na Região do Meio-oeste Catarinense, concluiu que o consumo mé-dio de energia nas propriedades é de (600 a 1.800kWh/mês), tomando como base apenas a criação

Fig. 3. Temperatura de bulbo seco interna e externa (oC), observada no aviário de produção de frango de corte, dos14 aos 21 dias de criação.Fonte: Oliveira e Higarashi (2006).

de suínos, (produção média de 50 m³ de biogás/dia). Teoricamente, a capacidade de gerar ener-gia por propriedade é de 2.700 KVA/mês, o queequivale aproximadamente a 2.160 kWh/mês.Com essa produção, as propriedades podem se tor-nar auto-suficientes em energia elétrica, adotandoum sistema que seja capaz de gerar 25 KVA/h depotência elétrica.

Em alguns países da Comunidade Européiae também na Austrália existe legislação específi-ca para a produção de energia de fonte renovável.Na Austrália, por exemplo, as concessionárias deenergia elétrica devem contabilizar no mínimo2% de energia de fonte renovável. Isso faz comque o valor de mercado para esse tipo de energiaseja melhor remunerado.

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O consumo de biogás observado gira entre16 e 25 m³/hora no sistema gerador/motor estaci-onário para a geração de energia elétrica, depen-dendo da potência elétrica gerada.

Deve-se salientar que o rendimento, quan-do existe transformação da energia contida nobiogás em energia elétrica, gira em torno de 25%contra 65%, quando transformada em energia tér-mica. A seu favor, a energia elétrica tem o fato deser um tipo de energia de fácil utilização e tam-bém, no caso, o biogás tem seu custo de produ-ção bastante baixo.

Uma propriedade, produtora de suínos, comcapacidade de gerar de 80 a 100 m³/dia de biogás,poder transformar essa quantidade de biogás emenergia elétrica, produzindo entre 120 e 150KVAh/dia. Considerando que uma propriedadegaste em média 1.000 kWh/mês, teria uma capa-cidade ociosa em torno de 3.000 kVAh/mês, issocom o conjunto trabalhando 6 horas/dia, em mé-dia. Para viabilizar o investimento, o agricultorteria que encontrar formas de gastar esse exces-so de energia produzida, ou vender o excesso paraa concessionária de energia, o que tecnicamenteé possível. Segundo estimativas, o empreendi-mento passa a ser viável economicamente quan-do a propriedade possui capacidade de produ-ção de 200 m³/dia de gás, o que daria uma produ-ção aproximada de 300 kVAh/dia (ZAGO, 2003).Como a grande maioria dos suinocultores não seenquadra nessas condições, para esse tipo de em-preendimento os equipamentos poderiam ser ad-quiridos em forma de cooperativas de produtores,gerando, neste caso, uma situação em que todossairiam ganhando. Os suinocultores, como umaforma de agregar valor à sua produção, como maisuma fonte de renda; o governo, como alternativaem momentos de crise do setor energético; o meioambiente, pela redução da poluição. O uso debiodigestores com geração de energia elétricapode servir de incentivo aos pequenos suinocul-tores, para o manejo e tratamento mais adequa-do dos dejetos dos animais produzidos na propri-edade (OLIVEIRA, 2004).

Considerações finaisA utilização de biodigestores para geração

de biogás nas propriedades rurais e para geração

de calor e energia é uma alternativa viável e temdespertado a atenção dos produtores rurais, pelapossibilidade de agregação de valor aos resíduosanimais. No entanto, as questões envolvendo adisposição final dos efluentes dos biodigestoresdevem ser abordadas dentro de critérios técnicos,para se evitar o impacto ambiental deste no meioambiente, haja vista que o resíduo final ainda apre-senta um alto potencial poluidor.

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Resumo

Este estudo apresenta cálculos e análises dos custos de produção do biodiesel partindo da agricul-tura até a usina. Foi considerada a produção do biocombustível a partir de seis matérias-primasagrícolas, nas cinco macrorregiões do País, em três escalas industriais. Numa das frentes, calcu-lou-se o custo considerando-se a inserção da matéria-prima agrícola a custo de produção e, nou-tra instância, partindo do seu preço regional de mercado. O trabalho considera unidades industri-ais que integram o esmagamento da matéria-prima agrícola para a obtenção de óleo e oprocessamento do biodiesel propriamente. Os cálculos e análises do biodiesel foram feitos consi-derando o custos e receitas dos “subprodutos” tanto da etapa de esmagamento quanto de elabo-ração do biodiesel na contabilidade total, sejam esses positivos ou negativos, sem incluir margemde comercialização. Neste caso, portanto, ora o valor do biodiesel pode aumentar para compen-sar os prejuízos de subprodutos ora ser reduzindo por assimilar lucro com derivados do processo.Os resultados gerais apontam que o biodiesel a partir de caroço de algodão no Nordeste é o maisbarato do Brasil.

Palavras-chave: biodiesel; biocombustível; energia renovável; análise econômica; custo de pro-dução; comercialização.

Abstract

This study presents calculations and analyzes of the biodiesel production costs, from farming toprocessing. It was considered the biofuel produced from six agricultural raw materials, in the fiveregions of Brazil, in three industrial scales. In one of the fronts, it was calculated the cost by takinginto account the insertion of the agricultural raw material as production cost and, in the other,starting from its regional market price. The study takes into consideration processing plants thatintegrate the raw material crushing to obtain the oil and also the biodiesel processing. The calculusand the analysis of biodiesel were also processed, which involves costs and yields of the byproductsduring the processing and the elaboration of the biodiesel in the total calculation, positive ornegative, without considering the markup. In the second case, the biodiesel value can increase tocompensate the loss of byproducts produced during the processing or decrease as it incorporates

Custos deprodução debiodiesel no Brasil1

1 Artigo elaborado com base da parte I do trabalho Biodiesel: Análise de Custos e de Tributos nas Cinco Regiões do Brasil Suporte à Tomada de Decisão e àFormulação de Políticas, realizado pelo Cepea/Esalq/USP (parte I) e pelo Pólo Nacional de Biocombustíveis (parte II - tributação), com apoio da Dedini Indústriade Base.

2 Professor Titular do Departamento de Economia, Administração e Sociologia da Esalq/USP. Coordenador Científico do Centro de Estudos Avançados emEconomia Aplicada (Cepea); [email protected].

3 Pesquisadores do Cepea-Esalq/USP. Caixa Postal 132, CEP: 13400-970 - Piracicaba, SP; [email protected], [email protected], [email protected],[email protected], [email protected].

Geraldo Sant’Ana de Camargo Barros2

Ana Paula Silva3

Leandro Augusto Ponchio3

Lucilio Rogério Aparecido Alves3

Mauro Osaki3

Mariano Cenamo3

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gains with byproducts selling. The general results show that the biodiesel produced from thecottonseed, in the Northeasterner of Brazil, is the most competitive in the country.

Key-words: biodiesel; biofuel; renewable energy; economic analyze; production cost; trade.

IntroduçãoO objetivo deste trabalho é calcular o cus-

to de produção do biodiesel no Brasil a partir dediferentes matérias-primas agrícolas nas cincomacrorregiões do Brasil, em plantas industriais dediferentes escalas. Apresenta-se este trabalho coma intenção de que seja uma referência para a for-mulação de políticas relacionadas ao biodiesel.Reconhece-se que sua amplitude implica a utili-zação de médias de algumas variáveis, o que di-ficulta a precisão dos resultados, mas, por sua vez,guarda o mérito de ser um direcionamento impar-cial em termos de custos do biodiesel a todos osinteressados.

No escopo deste trabalho, não foi incluídaanálise dos impactos intersetoriais e inter-regio-nais que decorreriam da instalação de usinas debiodiesel. Para avaliação desses impactos, reco-menda-se análise de equilíbrio geral.

Para cada região foi considerado o uso dematérias-primas compatíveis com suas respecti-vas vocações agrícolas. Isso significa que foi es-tudada a produção de biodiesel a partir das se-guintes origens vegetais: Região Sul: soja e giras-sol; Região Sudeste: soja, girassol e amendoim;Região Centro-Oeste: soja, caroço de algodão egirassol; Região Nordeste: soja, caroço de algo-dão e mamona; Região Norte: soja, mamona edendê.

Em cada região, os cálculos foram feitospara plantas industriais de biodiesel de três esca-las de produção: 10 mil toneladas de biodieselpor ano, 40 mil toneladas de biodiesel por ano e100 mil toneladas de biodiesel por ano. Indepen-dentemente da escala, são adotadas para o estu-do unidades industriais integradas, ou seja, querealizam a extração de óleo e também oprocessamento de biodiesel.

O local de instalação da indústria foi defi-nido com base principalmente na maior disponi-bilidade de matérias-primas agrícolas para a ge-

ração de óleo. Para tanto, procede-se a examedetalhado dos calendários agrícolas das cinco re-giões, bem como das produções médias nas sa-fras de 1999–2000 a 2003–2004 (dados da safra2004–2005 não consolidados para todas as cultu-ras em junho/05).

O passo seguinte foi o cálculo detalhadodos custos de produção de cada matéria-primaagrícola – custo do produto in natura ao chegarna unidade de extração de óleo. Paralelamente,serão levantados os preços de mercado dos mes-mos produtos para análises comparativas dos cus-tos finais do biodiesel quando formados a partirde uma forma ou de outra de aquisição – ou seja,se via custo de produção ou por preço de mercado.

Posteriormente à análise do segmento agrí-cola, são agregados para análise os centros decustos industriais, subdivididos nas etapas de es-magamento e de processamento do biodiesel, pro-priamente. Todos os custos e receitas dos“subprodutos” tanto do processo de extração doóleo quanto de elaboração do biodiesel são com-putados na análise.

Além dessas considerações iniciais, estetrabalho está subdividido em outras sete partes.Na segunda parte se apresenta o calendário agrí-cola das culturas consideradas neste trabalho eem seguida (parte três) a localização das unida-des industriais em cada região. Os procedimen-tos metodológicos são descritos na parte quatro eas considerações sobre custos de produção agrí-cola, esmagamento e processamento do biodieselna parte cinco. Na parte seis, os resultados sãodescritos e discutidos. Nas considerações finais,parte sete, sumariza-se este trabalho com algu-mas recomendações.

Calendário agrícolaA Tabela 1 compila os períodos de colheita –

oferta – das matérias-primas selecionadas paraeste estudo. Para sua elaboração combinaram-se

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Tabela 1. Períodos de colheita da soja, girassol, algodão, amendoim, mamona e dendê nas cinco macrorregiõesdo Brasil.

Sul

Sudeste

Centro-Oeste

Nordeste

Norte

SojaGirassol(1)

SojaGirassol(1)

AmendoimáguasAmendoimsecas

SojaGirassol(1)

Algodão

SojaAlgodãoMamona

SojaDendê

Cultura

Elaboração dos autores(1) Não foram encontradas informações precisas o suficienteFontes: Conab (2005), IBGE (2005), Unicamp (2005), Embrapa Amazônia Oriental (2005) e Ferrari (2004).

Região

informações de entidades de pesquisas, institui-ção governamental e empresas privadas.

Para a soja e o algodão, informações ofici-ais, claramente validadas pelo mercado, foramconsideradas de forma direta; já para amendoim,girassol, mamona e dendê, os períodos de colhei-ta, especialmente os percentuais de cada mês,foram estimados com base no conjunto de infor-mações das fontes já citadas.

A esquematização dos períodos de colhei-ta deixa claro que a oferta de matérias-primas seconcentra no primeiro semestre. Dadas as facili-dades de estocagem do caroço de algodão e dasoja em grão, já de início pressupõe-se que essasdeverão ser as bases de suprimento das indústriasde biodiesel no segundo semestre no Sul, Sudes-te, Centro-Oeste e Nordeste. De forma comple-mentar, portanto, nessas quatro regiões, a produ-ção de biodiesel no primeiro semestre contará comuma maior mistura de oleaginosas. Na regiãoNorte, estima-se, em princípio, que a oferta desoja será consumida paulatinamente no correr de

todos os meses, mas sempre de forma comple-mentar ao dendê, que é a base efetiva considera-da nesta região. Entrementes, vale salientar queneste trabalho não foi feito estudo sobre as mistu-ras de matérias-primas com a finalidade de en-contrar o mix que proporcionaria um menor custoem cada período do ano.

Análise da oferta dematéria-prima agrícola

Os montantes indicados a seguir são base-ados em informações das safras 1999–2000 e2003–2004, publicadas pela Companhia Nacio-nal de Abastecimento (Conab) e Instituto Brasilei-ro de Geografia e Estatística (IBGE), este últimono caso específico do dendê. Os valores oficiaispara a última safra (2004–2005) não foram inclu-ídos por serem ainda preliminares para algunsprodutos na época de elaboração deste trabalho(Tabela 2).

Acredita-se que a tomada de cinco safraspara os cálculos das ofertas mínimas, médias e

Períodos de colheita (%)

32,8

20,5

33,1

23,5

0,2

14,5

47,6

27,29,0

Fev.

15,5

16,2

4,3

23,6

10,0

Jan.

17,2

29,5

16,9

24,4

2,2

33,03,61,9

22,89,0

Abr.

34,5

39,2

33,8

42,1

1,5

36,9

25,0

43,310,0

Mar.

44,3

29,7

2,631,5

0,4

9,0

Jun.

10,8

12,1

5,8

8,8

13,130,1

1,0

6,712,0

Maio

7,1

19,1

2,20,2

7,5

Ago.

36,5

36,9

31,30,3

8,0

Jul.

0,4

5,5

Out.

1,6

0,6

6,5

Set.

9,0

Dez.

0,3

4,5

Nov.

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máximas de cada matéria-prima em questão sejaum indicativo seguro de patamares a serem con-siderados por uma unidade de biodiesel. Acredi-ta-se que em cinco safras é possível amenizar oimpacto de variações abruptas de um único ci-clo, ocasionadas, por exemplo, por fatores climá-ticos extraordinariamente adversos ou favoráveis.

Uma das grandes restrições à produção dobiodiesel pode ser a garantia de abastecimentode matéria-prima nas diversas regiões pesquisa-das. Somente a soja e o caroço de algodão, nasregiões analisadas, mostraram-se suficientes paraabastecer o ano todo uma fábrica de 100 mil to-neladas de biodiesel. Cinco plantas conjuntamen-te gerariam 435 milhões de litros de biodiesel, ou435 mil metros cúbicos.

Assumindo que o consumo médio de dieselentre os anos de 2000 e 2004 foi de 37,2 milhõesde metros cúbicos ao ano, os 435 mil metros cú-bicos representariam 1,7% dessa demanda. Con-tudo, a partir de 2008, segundo a Lei nº 11.097, de13 de janeiro de 2005, todo diesel comercializadono País poderá ter em sua composição 2% debiodiesel, o que implicaria uma demanda estima-da de 743 milhões de metros cúbicos de biodiesel,

Tabela 2. Produções de matéria-prima – Safras 1999–2000 a 2003–2004 (em toneladas).

Sul

Sudeste

Centro-Oeste

Nordeste

Norte

SojaGirassol

SojaGirassolAmendoim águas(1)

Amendoim secas(1)

SojaGirassolCaroço de algodão

SojaCaroço de algodãoMamona

SojaDendê

Cultura

(1) Amendoim: sem casca.Fontes: Conab (2005) e IBGE (2005).

Região

1.3002.385

2.5121.5312.188

696

2.7461.4762.011

2.267765770

2.43114.500

kg/ha

6.880160.415.060

3.487.6002.820

144.12023.140

20.097.72063.680

1.020.380

2.458.820226.440

84.620

441.700579.334

Média

10.40021.340.600

4.474.4003.000

162.30026.500

24.613.10090.800

1.371.800

3.538.900467.500104.500

913.700729.184

Máximo

3.90012.614.900

2.569.7002.600

129.00018.700

14.945.30046.300

760.700

2.064.000127.300

68.100

150.700361.656

Mínimo

que seriam processadas, no mínimo, no equiva-lente a oito indústrias com capacidade de 100 miltoneladas por ano. É preciso observar ainda quea partir de 2013 a lei prevê mistura com 5%.

Localização das unidadesindustriais de biodiesel

O critério principal, mas não único, para sedefinir a localização das unidades de esmaga-mento e produção de biodiesel (integradas) foi adisponibilidade de matéria-prima vegetal em cadaregião. Essa análise foi feita a partir do examedetalhado do calendário de colheita e dos volu-mes produzidos nas últimas safras.

Outro fator considerado foi a estrutura debases coletoras das distribuidoras cadastradas naAgência Nacional de Petróleo (ANP). No caso doálcool, não é monopólio da Petrobras a coletadesse combustível; mesmo a mistura de álcoolanidro à gasolina pura (tipo A) para a composiçãoda gasolina C pode ser feita pelas diversas distri-buidoras cadastradas. Para o biodiesel, a legisla-ção é semelhante, já que refinarias e distribuido-

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ras cadastradas à ANP são autorizadas a faze-rem a mistura dos 2% do biodiesel ao diesel depetróleo (elaboração do B2).

As plantas industriais para estudoseconômicos foram consideradas nas seguinteslocalidades:

• Região Sul – Rio Grande do Sul – Cara-zinho.

• Região Sudeste – São Paulo – Piracicaba.• Região Centro-Oeste – Mato Grosso –

Rondonópolis.• Região Nordeste – Bahia – Luiz Eduardo

Magalhães.• Região Norte – Pará – Marabá.

Procedimentos metodológicosA estrutura do trabalho realizado pode ser

visualizada como a integração de três centros

principais de custos: custos agrícolas, custos deesmagamento (obtenção do óleo) e da indústriade biodiesel, conforme pode ser visualizado naFig. 1.

A definição dos custos agrícolas envolvetodos os insumos de produção, incluindo o custode arrendamento da terra e depreciações domaquinário, mas sem considerar assistência téc-nica nem as remunerações do produtor e do ca-pital investido. Esse cálculo foi feito para a soja,girassol, amendoim, mamona e dendê. Para ocaroço de algodão, em vez de custos, conside-ram-se os preços de mercado. Esclarece-se que,numa segunda frente de cálculos, todas as maté-rias-primas agrícolas foram imputadas também apreços de mercado.

Ao se tratar da aquisição da matéria agrí-cola via custo de produção, foi definido previa-mente que seria feita diretamente de produtor ru-ral, o que implica o cenário mais oneroso em ter-mos de impostos (2,3% de INSS).

Fig. 1. Esquematização dos centros de custos para os cálculos de custo do biodiesel – Posto Veículo Usina (PVU).Fonte: Dados da pesquisa.

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A estrutura de custo que se apresenta é uti-lizada correntemente pelos institutos de pesqui-sa, como o Centro de Estudos Avançados em Eco-nomia Aplicada (Cepea), exposta com freqüênciaà análise de agentes de todos os segmentos doagronegócio, alcançando suas validações. Oscálculos dos custos de soja e girassol em todas asregiões foram obtidos pela técnica de painéis4

(reuniões) com produtores e técnicos das regiões.Alguns coeficientes, contudo, foram coletados viaagentes de mercado e adaptados na planilha parahomogeneizar os cálculos, principalmente emalgumas regiões onde não foi possível a realiza-ção de painéis. Os custos do amendoim vêm daCooperativa Agrícola Mista da Alta Paulista(Camap), de Tupã, SP, e os de mamona e dendêpartem de coeficientes técnicos (sobre as quanti-dades utilizadas) publicados especialmente pelaEmpresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária(Embrapa), com algumas colaborações da empre-sa Agropalma, no caso do dendê.

Os preços dos insumos, por sua vez, foramobtidos no Cepea (2005) em cada uma das regi-ões, considerados com pagamento à vista. Da-das as localizações das unidades industriais esti-puladas anteriormente, privilegiou-se o levanta-mento dos preços nos estados onde serão – teori-camente – instaladas as plantas.

O critério de custo de produção utilizado éo do Custo Operacional Total. Por esse critério,são computados os custos variáveis (insumos,mão-de-obra, combustíveis e manutenção deequipamentos) e a depreciação de máquinas eequipamentos. Não são computados, portanto, aremuneração de fatores fixos diversos, como de-preciação de instalações diversas, remuneraçãoe o custo de oportunidade do empresário, e ou-tros custos fixos e semifixos, notadamente custosadministrativos. Contudo, os itens consideradossão bastante característicos aos processos produ-tivos e, portanto, menos heterogêneos entre pro-dutores.

O custo das máquinas e implementos éalocado para cada cultura segundo o tempo queos mesmos são utilizados em cada lavoura, inclu-

indo-se também a mão-de-obra requerida para aatividade. Consideram-se também os custos demanutenção, depreciação e combustível. A mão-de-obra segue o mesmo raciocínio de utilizaçãodas máquinas, qual seja o de considerar o tempoque o trabalhador estará se dedicando a determi-nada lavoura.

Deve-se acrescentar também o custo dearrendamento da terra na região em estudo. Ape-nas a título de análise comparativa, foram feitas si-mulações também excluindo-se o arrendamento.

A estrutura industrial tomada para estudo éintegrada, melhor dizendo, reúne na mesma plan-ta as etapas de extração do óleo e as de produ-ção efetiva do biodiesel (rota etílica). Todos oscoeficientes desses processos industriais foramfornecidos pela empresa Dedini S/A Indústrias deBase. Ressalta-se que, para a produção debiodiesel, foram consideradas três plantas contí-nuas com capacidade de geração de 10 mil tone-ladas de biodiesel por ano, 40 mil e 100 mil tone-ladas por ano. Já para o processo de esmagamen-to, os coeficientes industriais fornecidos foram osmesmos para as esmagadoras integradas às dife-rentes escalas de usinas de biodiesel.

O trabalho se estendeu até o cálculo doscustos de produção do biodiesel na indústria, nacondição PVU – Posto Veículo Usina, conside-rando todos os insumos a preços pagos no varejo.

Custos de produção agrícola,esmagamento e processamentode biodiesel

Nesta seção, são apresentados resumos decustos de produção econômicos da soja, girassol,amendoim, mamona e dendê, nas diferentes re-giões. Quanto ao caroço de algodão, serão leva-dos em conta apenas seus preços médios nomi-nais à vista no período de março a junho de 2005(Tabela 3).

Para os cálculos do custo de produção in-dustrial do óleo vegetal a ser usado para o biodiesel,

4 DEBLITZ, C. The International Farm Comparison Network (IFCN).

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Tabela 3. Custos de campo e produtividades nascinco macrorregiões.

SojaSulSudesteCentro-OesteNordesteNorte

GirassolSulSudesteCentro-Oeste

AmendoimSudeste

MamonaNordeste

DendêNorte

(1) CFF: cacho de fruto fresco.Nota: custo não inclui INSS, frete nem armazenagem.Fonte: Dados da pesquisa.

R$/sc 60 kg36,9830,2824,6735,5329,42

R$/sc 60 kg38,1436,8424,69

R$/sc 25 kg18,68

R$/sc 60 kg35,17

R$/t (CFF(1))135,93

2.4002.7003.1202.5002.500

1.6001.8001.800

3.500

770

14.500

CustoProdutividade

kg/ha

pode-se partir da matéria-prima agrícola a custos deprodução ou do seu preço de mercado. Se a comprafor feita de cooperativa ou de pessoa jurídica, consi-dera-se o preço de mercado.

Para o caroço de algodão e mamona, casoa indústria compre a matéria-prima de cooperati-va (mercado disponível), no valor do negócio jáestão inclusos 3,65% de PIS/Cofins, mas que dão aocomprador o direito de ressarcir os mesmos 9,25%que incidem sobre o vendedor pessoa jurídica.

O preço de mercado considerado neste tra-balho é uma média do produto agrícola no estadoonde a unidade industrial está no período de ju-nho/04 a julho/05. O caroço de algodão, comodito, entra sempre a preço de mercado, tambémcom 9,25% de PIS/Cofins. Para esse produto, ospreços de mercado representam média de marçoa junho/05, apenas – série disponível do Cepea(2005). Para o dendê, os preços de mercado sãode agosto/05.

Na Tabela 4 estão apresentados os custos eos preços de mercado das matérias-primas agrí-colas considerados para comparação dos preçosfinais do biodiesel.

Tabela 4. Custos de produção e preços de mercado das matérias-primas.

RS

SP

MT

BA

PA

(1) Preços do caroço de algodão: de fevereiro a maio/05 (período de negociações mais intensas).(2) Custos incluem INSS, frete e armazenamento.(3) Preços do dendê: apenas agosto/05.Fontes: Cepea (2005) (soja e caroço de algodão), Conab (2005) (girassol, Centro-Oeste e mamona, Nordeste), Instituto de Economia Agrícola (2005)(Girassol e amendoim, SP) e Paraná (2005).

SojaGirassol

SojaGirassolAmendoim

SojaGirassolCaroço de algodão

SojaMamonaCaroço de algodão

SojaDendê

R$ 39,10/sc de 60 kgR$ 40,31/sc de 60 kg

R$ 32,32/sc de 60 kgR$ 38,95/sc de 60 kgR$ 22,33/sc de 25 kg

R$ 27,72/sc de 60 kgR$ 26,06/sc de 60 kg-

R$ 37,56/sc de 60 kgR$ 37,21/sc de 60 kg-

R$ 31,36/sc de 60 kgR$ 135,93/t de CFF

Estado Matéria-primaCusto de produção (2)

(safra 2004/05)

R$ 34,60/sc 60 kgR$ 20,30/sc 60 kg

R$ 33,94/sc 60 kgR$ 21,10/sc 60 kgR$ 25,50/sc 25 kg

R$ 29,80/sc 60 kgR$ 24,70/sc 60 kgR$ 214,25/t(1)

R$ 28,57/sc 60 kgR$ 54,00/sc 60 kgR$ 180,00/t(1)

R$ 28,05/sc 60 kgR$ 150,00/t(3)

Custo de mercado(média jun./2004 – jun./2005)

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Os coeficientes dos processos industriais –de esmagamento para obtenção de óleo vege-tal, bem como para a geração de biodiesel pro-priamente – foram fornecidos pela empresaDedini S/A Indústrias de Base. Ressalta-se que nãoforam considerados ganhos de escala no proces-so de extração do óleo; para todas as plantas debiodiesel (10 mil, 40 mil e 100 mil toneladas porano) computaram-se custos e rendimentos idênti-cos de extração5.

Para a soja, caroço de algodão e mamona,o processo considerado é de extração química.Para o amendoim e girassol, a extração se dá porprensa seguida por ação química e, no caso dodendê, usa-se prensa mais extração a vapor.

Para o dendê, o volume de informações dis-poníveis no Brasil é muito menor que para as ou-tras culturas, em relação a praticamente todos osprocessos. Por esse motivo, este trabalho foi con-duzido com base em estimativas feitas pela Dedinie Cepea, a partir de informações conseguidas emempresas ativas neste mercado.

Neste estudo, o processo e custos de esma-gamento correspondem à extração do óleo comfinalidade única à produção de biodiesel. Isso édistinto do que se tem no mercado, já que as em-presas processadoras de dendê se focam em óle-os mais refinados e, portanto, obtidos a partir deoutros processos.

Quanto ao custo do processamento dobiodiesel, parte-se, aqui, do óleo degomado neu-tralizado. Nesta seção, os cálculos são divididosde acordo com as escalas industriais deprocessamento de biodiesel (10 mil, 40 mil e 100mil toneladas de biodiesel por ano).

Os coeficientes industriais variam de acor-do com a escala da planta; também os preços dealguns insumos usados na produção direta dobiodiesel são distintos entre as regiões. Neste tra-balho, contudo, todos os cálculos levaram emconta os valores de químicos, reparos e manuten-ção de máquinas, mão-de-obra, depreciação (10anos) e outros custos no processamento. A somadesses itens totaliza R$ 278 por tonelada debiodiesel processado em uma planta de 10 miltoneladas por ano, R$ 168,01 por tonelada de

biodiesel processado em uma planta de 40 miltoneladas por ano e R$ 136,00 por tonelada debiodiesel processado em uma planta de 100 miltoneladas por ano.

Ao se examinar a produção de biodiesel, énecessário atentar para os subprodutos geradosno processo de extração de óleo e também no deelaboração do biodiesel propriamente. O proce-dimento adotado neste estudo compreende trêsetapas:

a) Cálculo do custo de produção da maté-ria-prima agrícola.

b) Cálculo do valor do óleo vegetal.

c) Cálculo do custo do biodiesel.

Em (a) pode-se valer, como exposto, do cus-to propriamente ou do preço de aquisição damatéria-prima no mercado. Em (b) parte-se docusto da matéria-prima; então, primeiro, adicio-nam-se os custos de industrialização e, depois,subtraem-se os valores (a preços de mercado) dossubprodutos. Com isso obtém-se o valor do óleovegetal. Analogamente, em (c) parte-se do valordo óleo vegetal; então, adicionam-se os custosindustriais e, a seguir, subtraem-se os valores (apreços de mercado) dos subprodutos. Assim, che-ga-se ao custo do biodiesel.

Resultados e discussãoNesta seção, analisam-se os custos do

biodiesel na usina (PVU) em duas situações quan-to ao valor da matéria-prima: a custo de produ-ção e a preços de mercado.

Nestas reflexões teóricas, é importante acres-centar que a implantação de uma usina que pro-cesse qualquer uma das matérias-primas deveinflacionar os preços locais, daí a importância estra-tégia de se ter uma base de custos de produção.

Região Sul

Apesar da grande tradição da soja no RioGrande do Sul, esta oleaginosa é menos compe-

5 Rendimento industrial para soja (19% de óleo e 72% de farelo); caroço de algodão (16% de óleo e 52% de torta); girassol (39% de óleo e 53% de farelo); amendoim(44% de óleo e 50% de torta); mamona (42% de óleo e 54% torta); dendê (17% de óleo e 80% de farelo).

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titiva que o girassol no Sul do País. Aliás, o bio-diesel com base em soja atinge nesta região omaior custo entre todas as matérias-primas: Ocálculo integrado da unidade industrial, que temcomo ponto de partida o custo de produção agrí-cola, o biodiesel de soja custaria na planta de 40mil toneladas por ano R$ 2.053 por tonelada (ouR$ 1,786/litro). Com o grão considerado a preçode mercado, o biodiesel custaria 25% menos. VerTabela 5.

Outra oleaginosa selecionada neste estudofoi o girassol. O biodiesel a partir dessa matéria-prima mostrou-se, na média das três plantas in-dustriais, 7,6% mais barato que o derivado de soja.Uma grande vantagem do girassol perante a sojaé o seu rendimento em óleo, aqui estimado em39%, enquanto a soja apresenta apenas 19%.

No caso do girassol, um entrave para o seudesenvolvimento como fonte para produção debiodiesel é a irregularidade da oferta. Na safra2003–2004 foram produzidas no Sul do País 10.400toneladas de girassol, suficientes apenas paraabastecer 141 dias de uma fábrica de 10 mil to-neladas por ano ou menos de 35 dias de uma fá-brica de 40 mil toneladas por ano.

O processamento da soja requer uma quan-tia maior de capital por tonelada de biodiesel pro-duzida que o girassol. Numa unidade industrialde 10 mil toneladas por ano, seriam necessáriosR$ 4.652,00 por tonelada, incluindo-se o dispên-dio com o grão e com todos os insumos utilizados

Tabela 5. Custos do biodiesel a partir de custos de produção agrícola e a preços de mercado para aprodução em três escalas industriais, no Sul.

Nota: assume-se lucro zero por parte da indústria integrada.Fonte: Dados da pesquisa.

2.195,811,910

1.775,461,545

Sul – Carazinho, RS10.000 t/ano

Matéria-prima a custosda produção agrícolaCustos do biodiesel – PVU em R$/tCustos do biodiesel – PVU em R$/L

Matéria-prima a preçosde mercadoCustos do biodiesel – PVU em R$/tCustos do biodiesel – PVU em R$/L

Soja

2.036,041,771

1.153,251,003

Girassol

2.053,071,786

1.637,121,424

40.000 t/ano

Soja

1.894,991,649

1.021,480,889

Girassol

1.970,211,714

1.562,791,360

100.000 t/ano

Soja

1.815,411,579

959,870,835

Girassol

para o processamento industrial (esmagadora maisusina de biodiesel). Já com girassol, a operaçãoseria coberta por R$ 2.819,00 por tonelada namesma planta.

No caso do girassol, o custo do biodieselpode ser reduzido em até 47%, passando deR$ 1,58/litro para R$ 0,83/litro na planta de 100mil toneladas por ano. Com a aquisição da maté-ria-prima no mercado, o girassol se mantém maiscompetitivo que a soja – cerca de 37% numa plan-ta de 40 mil toneladas por ano (a custo de produ-ção a diferença é de 29%).

Muito importante é notar que, a preços demercado, o industrial (médias das três escalas)reduz 9,2% a necessidade de capital ao proces-sar biodiesel a partir de soja e em 32,3% ao movi-mentar girassol. A contrapartida é o risco de abas-tecimento da indústria, uma vez que está sujeitoàs variações do mercado.

Região Sudeste

Considerando-se o custo de produção damatéria-prima, uma tonelada de biodiesel a partirde amendoim custa R$ 1.990,00 por tonelada(R$ 1,732/litro), considerando-se a escala de 10mil toneladas por ano. Na planta de 100 mil tone-ladas por ano, o custo cai 12% (Tabela 6). Obiodiesel a partir de soja é o mais competitivo noSudeste, quando contabilizados todos os custos etodas as receitas dos subprodutos (R$ 1.432,00 portonelada ou R$ 1,25/litro para 40 mil toneladas).

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da de biodiesel produzida, cerca de R$ 2.700,00numa planta de 10 mil toneladas por ano. Nestevalor, já estão inclusos o dispêndio com o grão ecom todos os insumos utilizados para oprocessamento industrial (esmagadora mais usi-na de biodiesel). Isso significa que uma planta de10 mil toneladas por ano, caso operasse com gi-rassol, movimentaria R$ 27 milhões por ano. Nooutro extremo, uma indústria de 100 mil tonela-das por ano que processe grão de soja para obterbiodiesel movimentará no ano R$ 375 milhões,ou seja, só de CPMF geraria R$ 1,42 milhão.

Região Centro-Oeste

No Centro-Oeste, considerou-se uma plan-ta instalada na região de Rondonópolis (MT), pro-cessando óleo degomado neutralizado de soja,de girassol e de caroço de algodão (Tabela 7).

Independentemente da escala da usina debiodiesel, a utilização do óleo de soja favorece aobtenção do menor custo do biodiesel, seguidoda utilização dos óleos originados do girassol edo caroço de algodão. Numa planta de 100 miltoneladas por ano, por exemplo, o custo dobiodiesel a partir da soja seria R$ 0,829/litro. Essecusto vai para R$ 0,90/litro quando o valor do grãocorresponde a seu preço de mercado. Enquantoo custo de produção da soja era de R$ 27,72/scde 60 kg, o preço de compra no mercado foi deR$ 29,80/sc de 60 kg.

Com a matéria-prima avaliada a preço demercado, todavia, a vantagem vai para o girassolde forma contundente: custos de biodiesel (R$ 987por tonelada ou R$ 0,86/litro) mais de 50% inferi-ores aos verificados para o amendoim e 35% aoscalculados no caso da soja.

Em termos comparativos, portanto, o amen-doim é o menos competitivo e o girassol tem umdesempenho intermediário na Região Sudeste.Ambos têm ainda problemas de oferta em largaescala e com regularidade, principalmente o gi-rassol. Ainda que essa cultura tenha um grandepotencial de desenvolvimento na região, na safra2003/04, a produção dos cerca de 2 mil hectaresplantados na Região Sudeste seria suficiente ape-nas para 40 dias de operação de uma usina de 10mil toneladas por ano.

O girassol ainda é uma cultura pouco ex-plorada no Brasil. Investimentos e incentivos pri-vados e governamentais poderiam torná-la umafonte viável economicamente para a produçãode biodiesel na Região Sudeste.

A soma total do amendoim produzido noSudeste, por sua vez, conseguiria atender umaplanta de 40 mil toneladas por ano – a produ-ção da safra 2003–2004 foi de 188.800 tonela-das (Conab) –, caso conseguisse superar a con-corrência da indústria alimentícia humana poressa matéria-prima.

Em relação à necessidade de caixa, o gi-rassol requer a menor quantia para cada tonela-

Tabela 6. Custos do biodiesel a partir de custos de produção agrícola e a preços de mercado para aprodução em três escalas industriais, no Sudeste.

Nota: assume-se lucro zero por parte da indústria integrada.Fonte: Dados da pesquisa.

1.569,01

1,365

1.714,24

1,491

SudestePiracicaba, SP

10.000 t/ano

Matéria-prima a custosda produção agrícolaCustos do biodiesel –PVU em R$/tCustos do biodiesel –PVU em R$/L

Matéria-prima apreços de mercadoCustos do biodiesel –PVU em R$/tCustos do biodiesel –PVU em R$/L

Soja

1.903,14

1,656

1.118,45

0,973

Girassol

1.990,94

1,732

2.297,63

1,999

Amendoim

1.432,83

1,247

1.576,54

1,372

40.000 t/ano

Soja

1.763,48

1,534

987,04

0,859

Girassol

1.850,37

1,610

2.153,84

1,874

Amendoim

1.362,68

1,186

1.503,45

1,308

100.000 t/ano

Soja

1.686,60

1,467

927,12

0,806

Girassol

1.771,72

1,541

2.068,96

1,800

Amendoim

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Em relação à oferta de matéria-prima, nãose vê problema em relação à soja e ao caroço dealgodão – não se estudaram aqui, contudo, im-pactos do crescimento da demanda por conta daprodução de biodiesel. No entanto, a oferta degirassol (até safra 2003–2004) não seria suficien-te para atender a necessidade anual das usinasde 40 mil toneladas por ano e de 100 mil tonela-das por ano. No máximo, considerando a ofertamédia dos anos-safras de 1999–2000 a 2003–2004, seria possível a instalação de duas usinasde 10 mil toneladas por ano de biodiesel.

Região Nordeste

Nesta região, foram avaliados os custos dobiodiesel a partir da mamona, da soja e do caro-ço de algodão. Na Tabela 8, apresentam-se osresultados do custo do biodiesel a partir do custode produção agrícola e do preço do mercado damatéria-prima.

O biodiesel a partir de caroço de algodãono Nordeste é o mais barato do Brasil. Conside-rando-se o processo completo, ou seja, todas asdespesas e receitas da unidade industrial integra-da (esmagadora + usina), um litro de biodiesel éproduzido a R$ 0,662 numa planta de 100 mil to-neladas por ano.

A produção de biodiesel com base em ca-roço de algodão no Nordeste é ainda favorecida

pela oferta da matéria-prima na região. De acordocom a Companhia Nacional de Abastecimento(Conab), na safra 2003/04, foram geradas 467.500toneladas de caroço, suficientes para suprir plantasde 10 mil e de 40 mil toneladas por ano, já que essasdemandariam, em 1 ano, cerca de 66 mil e 260 miltoneladas por ano, respectivamente, deixando umasobra para outras alocações.

Para que a mamona fosse tão competitiva,partindo-se do seu custo de produção, quanto ocaroço de algodão, num cálculo integrado, serianecessária uma produtividade de 2.500 kg/ha ouque o preço de mercado da saca de 60 kg dofruto fosse obtido a R$ 12,35, muito abaixo do preçomínimo estipulado pelo Ministério da Agricultura,Pecuária e Abastecimento.

A soja, por sua vez, é a matéria-prima me-nos competitiva no Nordeste. O custo do biodiesela partir da soja é mais que o dobro do obtido apartir de caroço de algodão. Em comparação como biodiesel de mamona, a vantagem do caroçotambém fica próxima aos 100%. Novamente, aexplicação vem do dispêndio com a matéria-pri-ma agrícola. A soja perde por sua produtividadebaixa (2.500 kg/ha ou 41 sc/ha) na região e o ca-roço leva vantagem por ter preço de mercadoreduzido.

Para que a soja se tornasse a mais competi-tiva do Nordeste – superasse o caroço de algo-dão e também a mamona –, o grão deveria ser

Tabela 7. Custos do biodiesel a partir de custos de produção agrícola e a preços de mercado para aprodução em três escalas industriais, no Centro-Oeste.

Nota: assume-se lucro zero por parte da indústria integrada.Fonte: Dados da pesquisa.

1.146,44

0,997

1.226,59

1,067

Centro-OesteRondonópolis, MT

10.000 t/ano

Matéria-prima a custosda produção agrícolaCustos do biodiesel –PVU em R$/tCustos do biodiesel –PVU em R$/L

Matéria-prima apreços de mercadoCustos do biodiesel –PVU em R$/tCustos do biodiesel –PVU em R$/L

Soja

1.258,04

1,094

1.258,04

1,904

Car.algodão

1.321,78

1,150

1.575,93

1,371

Girassol

1.014,68

0,883

1.094,00

0,952

40.000 t/ano

Soja

1.120,48

0,975

1.120,48

0,975

Car.algodão

1.188,23

1,034

1.439,70

1,253

Girassol

953,11

0,829

1.030,81

0,897

100.000 t/ano

Soja

1.061,35

0,923

1.061,35

0,923

Car.algodão

1.123,18

0,977

1.369,48

1,191

Girassol

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Tabela 8. Custos do biodiesel a partir de custos de produção agrícola e a preços de mercado para aprodução em três escalas industriais, no Nordeste.

Nota: assume-se lucro zero por parte da indústria integrada.Fonte: Dados da pesquisa.

2.061,45

1,793

1.225,73

1,066

NordesteLuiz EduardoMagalhães, BA

10.000 t/ano

Matéria-prima a custosda produção agrícolaCustos do biodiesel –PVU em R$/tCustos do biodiesel –PVU em R$/L

Matéria-prima apreços de mercadoCustos do biodiesel –PVU em R$/tCustos do biodiesel –PVU em R$/L

Soja

947,62

0,824

947,62

0,824

Car.algodão

1.962,08

1,707

2.698,83

2,348

Girassol

1.920,10

1,670

1.093,14

0,951

40.000 t/ano

Soja

817,95

0,712

817,95

0,712

Car.algodão

1.821,81

1,585

2.550,82

2,219

Girassol

1.839,96

1,601

1.029,95

0,896

100.000 t/ano

Soja

760,42

0,662

760,42

0,662

Car.algodão

1.743,72

1,517

2.457,74

2,138

Girassol

adquirido pela esmagadora por R$ 25,00/sc oumenos, valor possível caso se considere a com-pra no mercado – em vez do custo de produção.

Assumindo os custos agrícolas da soja,numa planta de 40 mil toneladas por ano, obiodiesel custaria R$ 1,67/litro, ao passo que, viamercado, o litro do biodiesel sairia por R$ 0,95.

Região Norte

Seguindo a tendência observada no centrode custos da esmagadora, principalmente em vir-tude do baixo custo e da alta produção agrícola,

o biodiesel a partir da soja se mostrou mais compe-titivo. O custo do biodiesel foi estimado em R$ 1,17/litro numa planta de 40 mil toneladas por ano. Essevalor cai para R$ 0,90 se a matéria-prima for avalia-da a preço de mercado (R$ 28,05/sc, valor médio dejunho/04 a julho/05). Ver Tabela 9.

Quanto à necessidade de matéria-prima eárea de plantio, cabe destacar a grande diferençado dendê em relação à soja e às demais culturasanalisadas. Para o abastecimento de uma plantade 10 mil toneladas por ano de biodiesel a partirde soja, são necessários 22.161 hectares cultiva-dos, enquanto para o dendê, bastam 4.270 ha.

Tabela 9. Custos do biodiesel a partir de custos de produção agrícola e a preços de mercado para aprodução em três escalas industriais, no Norte.

Nota: assume-se lucro zero por parte da indústria integrada.Fonte: Dados da pesquisa.

1,476,091,284

1.168,331,016

Norte – Marabá, PA10.000 t/ano

Matéria-prima a custosda produção agrícolaCustos do biodiesel – PVU em R$/tCustos do biodiesel – PVU em R$/L

Matéria-prima a preçosde mercadoCustos do biodiesel – PVU em R$/tCustos do biodiesel – PVU em R$/L

Soja

1.550,751,349

1.659,411,444

Dendê

1.340,881,167

1.036,340,902

40.000 t/ano

Soja

1,414,831,231

1,522.351,324

Dendê

1.272,621,107

974,330,848

100.000 t/ano

Soja

1.345,161,170

1.450,481.262

Dendê

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Ano XV – Nº 3 – Jul./Ago./Set. 2006 48

Fig. 2. Biodiesel a partir de matéria-prima agrícola a custo de produçãoagrícola (com arrendamento) emplanta de 40 mil toneladas por ano –Safra 2004–2005.

Resumo dos resultados finaisAs Fig. 2 e 3 resumem os custos de produ-

ção em unidades industriais de 40 mil toneladaspor ano. Os valores apresentados foram obtidosem cálculos que consideraram a inserção de ma-téria-prima agrícola a custo de produção, o qualinclui arrendamento da terra, e, nas etapas industri-ais, assumiu-se a possibilidade de venda do álcoolhidratado resultante do processamento do bio-diesel – sem coluna de desidratação, portanto.

Fig. 3. Biodiesel a partir de matéria-prima agrícola comprada no mercadoem planta de 40 mil toneladas porano – Safra 2004–2005.

Algumas simulações aqui apresentadasapontaram que, ao se desconsiderar o arrenda-mento da terra no custo da produção agrícola, ocusto final do biodiesel na usina (PVU) – sem con-siderar subprodutos – fica em média 8% menor,nas plantas de 40 mil toneladas por ano. Ao seinstalar coluna de desidratação do álcool, tam-bém ocorre redução dos custos: em média, de 12%nas plantas de 40 mil toneladas por ano.

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Ano XV – Nº 3 – Jul./Ago./Set. 200649

Considerações finaisEste trabalho objetivou servir de referên-

cia de custos de produção do biodiesel a partirde seis matérias-primas agrícolas – soja, giras-sol, amendoim, mamona, dendê e caroço dealgodão – nas cinco macrorregiões do País. Re-conhecem-se algumas limitações inerentes a essaabrangência, mas destaca-se também o pioneiris-mo de se calcular os custos do biodiesel em todoo País e a importância desses valores comoparâmetros para políticas do setor.

Uma das dificuldades para a efetivação dotrabalho foi a obtenção de dados de campo sobrecustos de produção e produtividade de mamonae dendê. Como alternativa, baseou-se em núme-ros da literatura especializada e em informaçõescoletadas com agentes do setor. Também as infor-mações industriais de extração do óleo de dendê,bem como do seu processamento em biodiesel,se deram a partir de estimativas, elaboradas pelaDedini S/A.

Cita-se que não foi incluída no escopo des-te trabalho análise dos impactos intersetoriais einter-regionais que decorreriam da instalação deuma usina de biodiesel. Para avaliação desses im-pactos, recomenda-se análise de equilíbrio geral.

Não se procedeu tampouco a uma análisedo custo financeiro do capital investido, para ve-rificar a viabilidade e longevidade do negócio debiodiesel. Tais limitações podem ser superadas empróximas pesquisas, que aprimorariam orientaçõesa agentes da iniciativa privada e do governo, so-bretudo para a condução de investimentos e defi-nição de regras do Programa Nacional deBiocombustível.

Os custos de produção agrícolas aponta-dos podem estar um pouco acima do efetivo dosprodutores de algumas regiões pelo fato de os pre-ços dos insumos computados terem sido levanta-dos em lojas agropecuárias, ao passo que algunsprodutores conseguem valores menores ao seremcomprados em grandes quantidades.

Quanto aos preços de mercado, observa-se que, para conferir máxima atualidade ao estu-do, optou-se por trabalhar com valores referentes

à média de junho de 2004 a julho de 2005, perío-do de cotações baixas, especialmente da soja edo algodão. Ressalta-se, portanto, que os resulta-dos que se apresentam são condicionados aospreços médios desse período, em específico. Anteessa delimitação temporária, foram feitos cálcu-los, para o caso da soja, considerando-se tambémo preço médio desse grão nos últimos 5 anos –desde janeiro de 2000 – nas regiões Sul, Sudestee Centro-Oeste. Nesse caso, o custo do biodieselmostrou-se menor em todas as unidades e regi-ões pesquisadas, ou seja, o biodiesel gerado à basede soja imputada com preço médio de janeiro/2000 a julho/2005 ficou 3,19% mais barato que oobtido com o grão a preço da safra 2004–2005.

Neste estudo considerou-se a possibilida-de de a usina de biodiesel poder comercializar oálcool hidratado resultante do processo, apesarde ser sabido que essa operação, por enquanto,não está regulamentada. Por esse motivo, foramfeitos cálculos também levando em conta a alter-nativa técnica de instalação adicional na indús-tria de biodiesel de coluna de desidratação doálcool (subproduto). Dados os investimentos ne-cessários para esse equipamento, ele foi conside-rado somente em plantas de 40 mil e 100 mil to-neladas por ano.

Ao se trabalhar com coluna de desidrata-ção de álcool, diminui a quantidade do insumoálcool anidro outros fins imputado no início doprocesso de biodiesel, mas é intensificado o usode energia elétrica e mão-de-obra, além de sernecessário mais capital investido. Analisando ape-nas o impacto sobre os custos do biodiesel, cons-tata-se que, com a coluna, eles diminuem por voltade 4%. Apesar dessas diminuições, os cálculosaqui executados não são suficientes para reco-mendar a viabilidade econômica do uso de colu-na de desidratação.

Paralelamente à análise de custos dobiodiesel, interessados nesse mercado devemanalisar também a disponibilidade de matéria-pri-ma, levando em conta sobretudo a competiçãocom outros mercados que enfrentará, inclusivecom a própria alimentação humana.

Isso implica um alto custo de oportunidadedo óleo como fonte de matéria-prima para o

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Ano XV – Nº 3 – Jul./Ago./Set. 2006 50

biodiesel. No caso do óleo de mamona, seu pre-ço no mercado internacional foi de US$ 1.091/tna média de junho/04 a julho/05, ou seja, cer-ca de R$ 2.980,00 a tonelada (câmbio conside-rado: R$ 2,73/US$ – média do mesmo período).Segundo a Conab, o preço de paridade de im-portação desse óleo em julho de 2005 foi deUS$ 916,09/t (R$ 2.160/t; câmbio médio do pe-ríodo: R$ 2,36/US$). Valores que deixariam obiodiesel, na porta da usina, a valores superio-res a R$ 2,35/L.

Outro custo que não pode ser esquecido,na análise da planta integrada, é o administrati-vo, que envolve desde a mão-de-obra especializa-da até a infra-estrutura utilizada, que deve estarde acordo com o negócio. Contudo, neste traba-lho, não foram avaliados tais dispêndios. Da mes-ma forma não estão incluídos cálculos de viabili-dade econômico-financeira do projeto. Na ver-dade, foi levado em conta basicamente o custode produção operacional do biodiesel, em dife-rentes escalas de produção para as regiões ematérias-primas previamente selecionadas parao trabalho.

A consideração da estrutura integrada des-de a agricultura tida como estratégica para o abaste-cimento da indústria de biodiesel deve pesar tam-bém nos custos administrativos de uma estrutura comtamanha verticalização e o montante de capital in-vestido – instalações e fluxo de caixa.

A planta de 40 mil toneladas por ano é aque apresentou a melhor relação custo/benefício,dado que obtém significativo ganho perante aunidade de 10 mil, mas não muito expressivos aoser comparada à de 100 mil, que requer capital evolume de matéria-prima muito maiores, além daampliação dos riscos.

Nos casos da soja no Sul, Nordeste e Nor-te, e do girassol, no Sul e Sudeste, a aquisição damatéria-prima se mostrou mais viável a preçosde mercado – análise condicionada à safra 2004–2005. Mesmo assim, seria importante consideraruma integração ao menos parcial com a agricul-

tura, tendo em vista sobretudo a grande facilida-de de comercialização das matérias-primaselencadas neste trabalho para outras finalidades.No mercado de soja, por exemplo, não são rarosos casos de rompimento de contratos com produto-res. Negociações via cooperativas podem ser umaalternativa para diminuir esses riscos e custos.

Quanto ao aspecto ambiental, chama aten-ção o volume de farelo/torta gerado no processode esmagamento. Uma avaliação mais precisada alocação desses “subprodutos”, especialmen-te da torta de mamona, ainda deve ser feita, tantopelo lado ambiental como pelo econômico.

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EMBRAPA AMAZÔNIA ORIENTAL. Disponível em: <http://www.cpatu.embrapa.br>. Acesso: 20 ago. 2005.

FERRARI, R. V. Girassol está invadindo. Bunge no Campo,Ano 1, n. 5, p. 2-3, jul. 2004. Disponível em: <http://www.bunge.com.br/shared/files/campo/BNC5.pdf >. Acessoem: 16 ago. 2005.

IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. SIDRA.Disponível em: <http://www.sidra.ibge.gov.br/bda/agric>. Aces-so em: 18 ago. 2005.

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DEBLITZ, C. The International farm comparison network(IFCN): bridging the gap between farmers, science and policy.Federal Agricultural Research Centre (FAL) Disponível em:<http://www.macaulay.ac.uk/elpen/work2/cdsab.html>. Aces-so em: 10 ago 2005.

PARANÁ. Secretaria da Agricultura e Abastecimento. Depar-tamento de Economia Rural. Preço. Disponível em: <http://www.pr.gov.br/seab>. Acesso em: 14 ago. 2005.

UNICAMP. Universidade estadual de Campinas. Centro dePesquisa Meteorológica e Climática Aplicada a Agricultura(Cepagri). Zoneamento agrícola Brasil. Disponível em: <http://www.cpa.unicamp.br/zonbrasil>. Acesso em: 14 ago. 2005.

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Ano XV – Nº 3 – Jul./Ago./Set. 200651

Etanol, meio ambientee tecnologiaReflexões sobre aexperiência brasileira

Resumo: O trabalho apresenta uma breve reflexão sobre os principais aspectos ambientais e tecnológicosda experiência brasileira voltada à produção e ao uso de etanol a partir da cana-de-açúcar. Ao seanalisar toda a cadeia produtiva do etanol, observa-se que o aproveitamento estratégico de todos ossubprodutos da cana-de-açúcar é condição essencial para a sustentabilidade do processo produtivo.Por sua vez, a queima da cana-de-açúcar para colheita e a expansão da monocultura canavieira sãofatores que requerem maior atenção. O trabalho demonstra que a produção de etanol de cana-de-açúcar contribui para a sustentabilidade ambiental e que seu uso como combustível renovável é favo-rável em relação aos combustíveis fósseis.

Palavras-chave: álcool, cana-de-açúcar, meio ambiente, energia.

Abstract: The purpose of this paper was to present a reflection about the main environmental andtechnological aspects of producing and consuming ethanol from sugar cane in Brazil. By analyzing thewhole production processes of ethanol from sugar cane it became clear that the strategic use of byproductsis essential for the sustainability of the production chain. On the other hand, the burning of the sugarcane before harvesting and the expansion of the cane monoculture are still two issues that need to beaddressed. The paper demonstrates that ethanol production from sugar cane contributes to theenvironment sustainability and that the use of this renewable fuel is favorable regarding fossil fuels.

Key-words: ethanol, sugar cane, environment, energy.

Alexandre Betinardi Strapasson1

Luís Carlos Mavignier de Araújo Job2

1 Coordenador-geral de Açúcar e Álcool - Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Esplanada dos Ministérios, bloco D, sala 724;[email protected]

2 Gestor Governamental - Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Esplanada dos Ministérios, bloco D, sala 734; [email protected]

IntroduçãoA iminente escassez do petróleo anuncia-

da para as próximas décadas tem impulsionado ocrescimento de diversas fontes de energiasrenováveis no mundo, tais como: a biomassa, ohidrogênio e as energias solar e eólica. Em 2005,o consumo mundial de petróleo foi de 81,1 mi-lhões de barris/dia e o total de reservas provadas

de 1.201 bilhões de barris, ou seja, considerando-se a relação reservas/produção, haveria petróleosomente para os próximos 40,6 anos (BRITISHPETROLEUM, 2006). Contudo, em uma análisemais precisa, é necessário também se relevaroutros fatores, dentre eles: aumento da participa-ção de outras fontes de energia na matrizenergética mundial; descobrimento de novas re-servas; aumento ou redução do consumo de pe-

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tróleo nos próximos anos; contratos de compra evenda; custos de extração; preços de revenda;conflitos internacionais; limitações de logística;crescimento da economia mundial; compromis-sos ambientais; avanços tecnológicos; eficiênciaenergética; e o reaproveitamento de campos an-tigos com o uso de novas tecnologias.

Na prática, é difícil precisar qual será areal sobrevida do petróleo, mas seja ela 40, 60ou 100 anos, aumentar a participação das fon-tes renováveis na matriz energética mundial tor-na-se necessário e urgente. É possível que algu-mas reservas específicas sejam até mesmo pre-servadas no futuro, caso seu custo de exploraçãofor muito acentuado, ou em virtude de restriçõesambientais, como as mudanças climáticas.

No caso do Brasil, as reservas totais recu-peráveis de petróleo somam cerca de 24 bilhõesde barris. Estudo desenvolvido por Ferreira (2005)estima que o pico da produção ocorrerá em 2011,o que possibilitaria uma auto-suficiência entre 8 e13 anos, segundo modelagem matemática ampa-rada em “Curva de Hubbert”.

Do total do consumo mundial de petróleo,cerca de 50% é destinado ao setor de transportes,onde o petróleo é responsável por mais de 95%da demanda energética (INTERNATIONALENERGY AGENCY, 2004). O cenário torna-se ain-da mais crítico ao se observar que a demandamundial de petróleo tende a crescer até 2030, in-clusive no setor de transportes, sobretudo em pa-íses em desenvolvimento como China e Índia(FULTON, 2004). Portanto, encontrar fontes com-plementares e substitutas à gasolina e ao diesel éuma questão de segurança e de estratégia global.

Como a frota mundial de veículos utilizabasicamente combustíveis líquidos e sua renova-ção é lenta e gradual, os biocombustíveis tornam-se os substitutos naturais dos combustíveis fósseis,em um período de transição global de motoresconvencionais, Ciclos Otto e Diesel, para veícu-los de uma nova geração tecnológica. Nesse sen-tido, o etanol tem se mostrado como um dos pro-dutos mais viáveis e estratégicos para esse pro-cesso de transição, podendo eventualmente tam-bém integrar tecnologias futuras em longo prazo.

Com o aumento das preocupações ambientais, oetanol reúne vantagens significativas em relaçãoaos combustíveis fósseis, em especial à gasolina,nos três pilares que compõem o desenvolvimentosustentável, quais sejam: ambiental, social e eco-nômico.

O Brasil é líder na produção e consumo debiocombustíveis em larga escala. Na área doetanol são mais de 30 anos de experiência co-mercial. Na última safra de cana-de-açúcar, 2005–2006, foram colhidas 426 milhões de toneladas,sendo 384 milhões de toneladas destinadas à pro-dução de açúcar e álcool e o restante para outrosusos, como ração animal, produção de cachaçae mudas para formação de novo canavial. Foramproduzidos 15,8 milhões de metros cúbicos deetanol, sendo 7,7 milhões de metros cúbicos deálcool anidro (misturado à gasolina) e 8,1 milhõesde metros cúbicos de álcool hidratado. Desse to-tal, 13,5 Mm3 foram destinados ao mercado inter-no, a outra parte foi exportada e uma pequenaparcela incorporada a estoques de passagem. Noentanto, a tendência é que o Brasil amplie tanto oseu consumo interno de etanol quanto a sua ca-pacidade de exportação, a exemplo do que já vemocorrendo nos últimos anos. A idéia é transformaro etanol em uma grande commodity internacio-nal, em cooperação com outros países.

Nesse sentido, o governo federal lançou,em 2005, o Plano Nacional da Agroenergia (BRA-SIL, 2005a), coordenado pelo Ministério da Agri-cultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) e pelaEmpresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária(Embrapa), a fim de expandir ainda mais a produ-ção de biocombustíveis no Brasil, de forma pla-nejada e sustentável. A agroenergia consiste naprodução agrícola de biomassa voltada à gera-ção de energia, merecendo destaque o etanol, obiodiesel, as florestas energéticas plantadas e oaproveitamento de resíduos agrossilvipastoris. Oplano prevê crescimento da participação dessasfontes de energia na matriz energética nacional,especialmente o etanol, um produto já consolida-do e economicamente viável.

A agroenergia representa um novoparadigma para a energia e agricultura mundiais,

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podendo ser produzida em quase todos os paísesdo globo, sejam eles desenvolvidos ou em desen-volvimento, com relevante potencial de reduçãoda dependência internacional de petróleo. Por-tanto, a agroenergia contribui para uma maior dis-tribuição de renda entre os países, bem como paraa redução de conflitos internacionais ligados àenergia, em harmonia com o desenvolvimentosustentável e a geração de empregos, principal-mente no meio rural.

O presente trabalho não é exaustivo, de-vendo ser resguardadas as devidas limitações dasanálises apresentadas. Trata-se de uma simplesconsolidação de informações sobre os principaisaspectos ambientais e tecnológicos relacionadosà agroindústria canavieira, a fim de dar elemen-tos a uma reflexão sistêmica sobre o etanol. Nãofoi intenção realizar uma análise científica ouconceitual sobre o tema, bem como sobrepor dis-cussões de ordem política ou econômica.

ObjetivoO objetivo deste trabalho foi realizar uma

breve reflexão sobre os principais aspectos am-bientais e tecnológicos relacionados à cadeia pro-dutiva do etanol no Brasil, bem como das limita-ções e potencialidades à expansão sustentável daagroindústria canavieira.

Etanol, meio ambiente e tecnologiaA seguir, são apresentadas as principais

vantagens e desvantagens ambientais relaciona-das à produção e ao consumo de etanol em largaescala, assim como os aspectos tecnológicos en-volvidos em suas três principais fases: agrícola;industrial; distribuição e consumo.

Fase agrícola

O etanol proveniente da cana-de-açúcar sediferencia pelo seu reduzido impacto ambientalem relação às fontes fósseis de energia. Inicial-mente, cabe salientar que qualquer forma de agri-

cultura apresenta algum impacto ambiental, hajavista sua interferência na dinâmica natural dabiodiversidade local. Contudo, isso não invalidaseu uso estratégico e sustentável. Utilizando-se práticas adequadas de manejo e respeitando-se critérios ambientais específicos para cada cul-tura e região, pode-se reduzir muito os possíveisimpactos ambientais gerados e garantir asustentabilidade do meio às gerações futuras.

A produção de cana-de-açúcar, quando fei-ta sob orientação agronômica, protege o solo con-tra a erosão, melhorando sua conservação. Porser uma gramínea cultivada em regime adensado,o solo não se torna exposto após o desenvolvi-mento da lavoura, especialmente em virtude dasua elevada taxa de crescimento, típica de plan-tas do tipo C4, característica relacionada à efici-ência fotossintética. Mesmo depois da colheita,desde que não haja utilização de queimada, o solopermanece protegido da erosão, pois praticamentetoda a palha é deixada sobre o solo, cobrindo-o par-cial ou totalmente, dependendo da técnica utiliza-da. Esse material contribui para a melhoria da quan-tidade de matéria orgânica do solo, com reflexospositivos sobre o balanço de nutrientes e para amicrobiologia pedológica. Conforme Bertoni et al.(1972), as perdas de solo são da ordem de 12,5 t/ha/ano, sendo bastante inferiores às da soja, algodão,feijão, mamona, dentre outras culturas.

A presença da palha no campo tambémreduz a incidência de energia luminosa sobre osolo, inibindo o processo de fotossíntese e a ger-minação de algumas plantas daninhas, presentesno banco de sementes do solo. Mesmo as plantasque não respondem ao estímulo luminoso paraquebra de dormência do processo germinativo,sem haver fotossíntese, não há energia suficientepara transpor a cobertura vegetal somente comas reservas energéticas da semente, com exce-ção de algumas espécies. No caso da cana-de-açúcar, as reservas acumuladas nas raízes e nocolmo do tolete, além de possibilitarem a rebrotanatural da cana, viabilizam a transposição dacobertura vegetal. Em média, faz-se 5 cortes dacana, o primeiro (cana-planta) aos 15-18 meses eos posteriores (cana-soca) a cada 12 meses, o queevita o revolvimento do solo até a renovação com-pleta do canavial.

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Por sua vez, a utilização de queimadas, comotécnica de eliminação da palha para facilitar o pro-cesso de colheita manual ou mecânica, elimina qua-se a totalidade dos resíduos agrícolas que ficari-am sobre o solo. Entretanto, a colheita de canacrua, sem queima, reduz significativamente a efi-ciência do corte manual de cana e aumenta osriscos de acidentes de trabalho. Com isso, ob-serva-se que a proibição da queimada tem esti-mulado o avanço da colheita mecânica, gerandoganhos ambientais, mas também a redução de em-pregos no campo. Em média, cada colhedora decana substitui cerca de 70 trabalhadores.

Com base em dados históricos da RelaçãoAnual de Informações Sociais (RAIS), do Ministé-rio do Trabalho e Emprego (MTE), estima-se queo setor sucroalcooleiro gere atualmente cerca deum milhão de empregos formais diretos no Brasil.A maior parte se refere a trabalhadores rurais con-tratados para a execução de atividades de cortee manejo da cana, em período de colheita, pos-suindo baixo nível de escolaridade e qualifica-ção profissional. Apesar disso, a remuneraçãomédia, em geral, é superior à obtida em ativida-des similares no meio rural. O desafio é ampliar onível de formalização da mão-de-obra, bem comodar melhores condições de vida aos cortadoresde cana. Destaca-se, porém, que o setorsucroalcooleiro, assim como organizações não-governamentais, Ministério Público e Poder Exe-cutivo, tem obtido avanços significativos nessesentido nos últimos anos, embora muito ainda pre-cise ser feito, especialmente em termos deconscientização e ética empresarial.

No que se refere ao aspecto ambiental, aqueima gera ainda intensa carga poluente na at-mosfera, com impactos diretos sobre a populaçãode cidades próximas aos canaviais, sobretudoproblemas ligados ao trato respiratório. Os princi-pais poluentes atmosféricos gerados são: óxidosde nitrogênio (NOx) e enxofre (SOx); monóxidode carbono (CO); compostos aromáticos; materi-ais particulados; e hidrocarbonetos. Algunspoluentes ainda são precursores de ozôniotroposférico quando expostos à radiação solar.

Quanto aos óxidos de nitrogênio e enxofre,além de seu impacto direto sobre a saúde huma-na, ao reagirem com a umidade atmosférica, sãoconvertidos em ácidos, que podem ser arrastados

a longas distâncias de seu local de origem, antesde serem depositados na forma de chuva. Porconseguinte, a então “chuva ácida” pode ocasi-onar a acidificação de rios e lagoas, a corrosãode estruturas, bem como prejudicar a agriculturae a dinâmica natural do meio ambiente. A quei-ma da palha também gera a emissão de aerossóis,que ao serem transportados à alta atmosfera po-dem interferir no equilíbrio do sistema climático,até mesmo em longas distâncias. Ademais, o usodo fogo afeta a biodiversidade local, especialmen-te ao eliminar predadores naturais de espécies in-desejáveis à produção agrícola.

No Estado de São Paulo, foi instituída aLei no 11.241, de 19 de setembro de 2002, queestabelece a proibição gradativa da queima decana-de-açúcar. Segundo a mencionada Lei,após 2021, não poderá haver mais queimadasem áreas mecanizáveis e, após 2031, tambémem áreas não-mecanizáveis. Em ambos os ca-sos, a eliminação das queimadas deverá aten-der a um calendário de redução gradual até osprazos mencionados acima.

Medidas similares têm sido estudadas poroutros estados, contudo, observa-se que há umatendência natural de expansão da colheita me-cânica, sem prática de queima, tanto em áreasantigas quanto em áreas de expansão. A maiordificuldade para se reduzir a utilização da quei-ma controlada se dá em áreas com declividadesuperior a 12%, onde a colheita mecânica torna-se limitada, prevalecendo, portanto, o corte ma-nual. No entanto, novas colhedoras já estão sen-do desenvolvidas para trabalhar em áreas demaior declividade.

No âmbito nacional, o Decreto Federalno 2.661, de 8 de julho de 1998, que regulamentao parágrafo único do art. 27 da Lei nº 4.771, de15 de setembro de 1965, conhecida como Códi-go Florestal, estabelece normas de precaução re-lativas ao emprego do fogo em práticasagrossilvipastoris, porém não estabelece regula-mentação específica para a cana-de-açúcar nes-se sentido.

Outro problema ambiental que pode serobservado na fase agrícola é a compactação desolo, desde que não aplicadas técnicas agronô-micas adequadas. O intenso fluxo de maquináriopesado no processo de plantio e colheita pode

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ocasionar a compactação do solo, podendo sermitigada com aração profunda ou até subsolagem,em casos extremos. Contribuem para a reduçãodesse tipo de impacto a utilização de maquináriosmais leves e modernos, com rodados especiais,bem como a rotação de cultura e a manutençãoda palha no solo.

A rotação de cultura também contribui paraum maior equilíbrio da biologia do solo, evitandoa excessiva pressão de seleção sobre a biodiversi-dade local e, conseqüentemente, o surgimentointenso de pragas e doenças. Além disso, complantas leguminosas, a rotação de cultura promo-ve a fixação de nitrogênio no solo, através dasimbiose entre bactérias e o sistema radicular des-ses vegetais.

Quanto à utilização de agrotóxicos, a cana-de-açúcar requer poucas aplicações, em relaçãoa outras culturas de produção extensiva, em ra-zão de sua robustez e adaptação às condiçõesedafoclimáticas em que são cultivadas no Brasil.Os herbicidas são o grupo mais utilizado. O con-sumo de inseticidas é relativamente baixo, sendoquase nulo o de fungicidas. Além disso, muitosprodutores já utilizam controle biológico em es-cala comercial. A produção orgânica também temaumentado, em face do crescimento do mercadode açúcar orgânico, tanto no Brasil quanto noexterior.

Em áreas de declividade acentuada, indi-ca-se a prática de terraceamento, a fim de se evi-tar perdas de solo e assoreamento de recursoshídricos. No caso de áreas de alta declividade etopos de morro, recomenda-se a manutenção defloresta nativa ou o plantio de espécies perenes,sob amparo da legislação ambiental vigente. Aproteção de mata ciliar na bordadura dos recur-sos hídricos e a manutenção de reserva legal naárea rural são obrigatórias por força de lei. É fun-damental que as áreas protegidas estejamconectadas umas às outras, formando os chama-dos “corredores ecológicos”, contribuindo para amigração e reprodução das espécies locais, es-pecialmente das endêmicas. O Brasil possui umadas legislações ambientais mais rigorosas do mun-do, porém ainda precisa avançar mais em ativi-dades de fiscalização, controle, monitoramento eeducação ambiental.

A despeito das limitações e dos problemasdescritos, observa-se que o plantio de cana-de-açúcar tem ocorrido em áreas tradicionalmentecultivadas com a mesma, como a Região da Zonada Mata Nordestina, ou em áreas anteriormenteocupadas com pecuária extensiva e culturascomo soja, milho, laranja e café, a exemplo daRegião Centro-Sul do Brasil. Portanto, raramentea cana-de-açúcar se encontra em áreas de fron-teira agrícola. A principal razão para isso é que acana, no caso do Brasil, é cultivada em um raiode aproximadamente 30–40 quilômetros ao redorda usina receptora, em virtude do crescente cus-to de transporte para colheita em distâncias mai-ores. Por sua vez, a usina requer condições ade-quadas de logística para escoamento da produ-ção, optando por áreas com infra-estrutura jáinstalada e proximidade a portos e centros con-sumidores. Dessa forma, as novas unidadesindustriais têm buscado se instalar justamenteem áreas com essas características, além da pre-sença de condições edafoclimáticas adequadas.

No caso da Região Amazônica, observa-se uma condição bastante precária em termos delogística, além de grande distância aos grandescentros consumidores, o que implica maiores cus-tos de transporte. Ademais, as variedades de canaatuais não são adaptadas às condições de climaamazônico. O ciclo fenológico da cana requerum período de estresse hídrico para inibição deseu crescimento e concentração de sacarose, oque não ocorre na Amazônia, em função do regi-me de chuvas regulares ao longo do ano. Comisso, a cana-de-açúcar cresce em demasiado,mas acumula pouca sacarose em seu colmo. Por-tanto, atualmente a Região Amazônica não temsido alvo da expansão da agricultura canavieira,mas sim áreas já ocupadas com agricultura e pas-tagem ou em áreas degradadas, nas Regiões Cen-tro-Sul e Nordeste, com destaque para o oestepaulista, triângulo mineiro e sul de Goiás.

O grande desafio para contenção dodesmatamento da Amazônia é a redução da ex-pansão desregrada da pecuária extensiva e aexploração ilegal de madeira, dando outras opor-tunidades para o desenvolvimento sustentável daregião. Nesse sentido, o governo federal tem ob-

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tido resultados expressivos nos últimos anos, aoreduzir em mais de 60% a taxa de desmatamento,no acumulado de 2005 e 2006, embora muito ain-da se precise avançar.

A Embrapa estima haver cerca de 90 mi-lhões de hectare disponíveis para expansão daagricultura no Brasil, que possui um território totalde 852 milhões de hectares. A atual área planta-da com cana-de-açúcar é pouco superior a 6 mi-lhões de hectares (safra 2005–2006), ou seja, me-nos de 1% do território nacional. Ademais, maisde 30 milhões de hectares ocupados com pastagensextensivas subaproveitadas poderão ser liberados nospróximos anos para exercício de outras atividadesagrícolas, sem prejuízo às produções de carne e lei-te, fato já constatado para o Estado de São Paulo.

Sendo assim, no Brasil, em curto e médioprazos, a agroenergia não necessariamente con-correrá com a agricultura de alimentos. Além dis-so, no caso da cana-de-açúcar, há ainda uma pro-dução consorciada de energia e alimento. Noentanto, em âmbito mundial, essa é uma discus-são estratégica, especialmente no que se refere apaíses do Sudeste Asiático, Oceania, América doNorte e Europa, onde quase não há mais novasfronteiras agrícolas, e as demandas por energia ealimentos são crescentes. A utilização energéticada biomassa precisa ser vista dentro de um con-ceito maior. Nesse novo paradigma energético,deve-se buscar uma Civilização das EnergiasRenováveis e não somente da biomassa.

Embora ainda existam grandes áreas paraa expansão do setor sucroalcooleiro no Brasil, nocaso do Estado de São Paulo, responsável porcerca de 62% da produção nacional de cana-de-açúcar, e em algumas regiões dos Estados doParaná, Minas Gerais e Mato Grosso do Sul, aexpansão canavieira gera certa preocupação, peloexcesso de monocultura intensiva em determinadasáreas, fato também observado na Região da Zonada Mata Nordestina, sobretudo nos Estados dePernambuco, Alagoas e Paraíba (CANASAT, 2006).

Além da cana-de-açúcar, a produção deetanol pode ser feita por meio de outras culturas,tais como: mandioca, milho, sorgo, trigo e beter-raba. Logo após a criação do Programa Nacionaldo Álcool (Proalcool), em 1975, foram estimula-

das a produção de etanol de várias matérias-pri-mas. No entanto, observou-se que a cana-de-açú-car apresentava melhor produtividade agrícola erendimento industrial dentre as demais. Embora al-guns países produzam álcool de outras fontes, é ocaso do milho nos EUA e do trigo em países da UniãoEuropéia, a eficiência energética da cana-de-açú-car é sensivelmente superior em relação às demaisculturas (Tabela 1), sobretudo em virtude da utiliza-ção de seus próprios resíduos no processo produtivo.

A eficiência energética da produção deetanol de cana-de-açúcar pode avançar aindamais, sobretudo ao se considerar potenciais avan-ços em melhoramento genético e biotecnologia,bem como a extração de álcool do bagaço decana (ex: hidrólise lignocelulósica), o melhor apro-veitamento da palha, a utilização de equipamen-tos e processos mais eficientes para a conversãode energia, e o melhor aproveitamento de resídu-os industriais.

Atualmente, extraem-se, em média, cercade 6.500 litros de etanol por hectare. Para se pro-duzir 1 bilhão de litros de etanol, são necessáriosaproximadamente 200 mil hectares, já incluindoas áreas para produção de mudas e as de renova-ção dos canaviais. Esses rendimentos tendem acrescer nos próximos anos, com a adoção demelhores práticas de manejo e utilização de no-vas tecnologias.

Fase industrial

A industrialização da cana-de-açúcar geragrandes quantidades de resíduos. Quando essesnão recebem tratamento adequado, podem oca-sionar sérios danos ambientais. No entanto, com

Tabela 1. Eficiência energética de diferentesmatérias-primas utilizadas na produção de etanol.

1,21,3 - 1,8

1,98,3

Balanço energético(output/input)

Trigo(1)

Milho (EUA)(1)

Beterraba (UE)(1)

Cana-de-açúcar (Brasil)(2)

Matéria-prima para a produção de etanol

(1) F. O. Licht (2004).(2) Macedo (2005).

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o desenvolvimento de pesquisas e a crescentepreocupação ambiental, o gerenciamento de re-síduos da cana-de-açúcar tem avançado muito.Os dois principais resíduos da produção canavi-eira, o bagaço e a vinhaça, ou vinhoto, se torna-ram grandes aliados do processo produtivo comoum todo. O aproveitamento desses resíduos é con-dição essencial para se garantir uma produçãosustentável de cana-de-açúcar e etanol.

Da massa total de cana colhida, cerca deum terço se refere à palha deixada sobre o soloou então queimada no processo de colheita, ooutro um terço, ao caldo que será destinado à pro-dução de açúcar e álcool, e um terço final, aobagaço, resíduo sólido resultante da moagem dacana no primeiro estágio do processo industrial(HASSUANI et al., 2005).

No caso do caldo, após seu aproveitamen-to industrial, resta um efluente líquido como resí-duo, a vinhaça. Durante décadas, a vinhaça foidescartada indevidamente sobre o solo e recur-sos hídricos nas proximidades das usinas. Dada asua elevada demanda bioquímica de oxigênio(DBO), o despejo indevido de vinhaça em recur-sos hídricos ocasionava drástica redução da vidaaeróbia, além de ocasionar eutrofização peloexcesso de nutrientes. Contudo, atualmente, avinhaça é aplicada sobre o solo de forma contro-lada, como um fertilizante orgânico, deixando deser um produto indesejável. Normalmente, apli-ca-se a vinhaça nas próprias áreas colhidas, lo-calizadas nas proximidades das usinas, por meiode sistemas de irrigação por bombeamento oucanal. Deve-se evitar a aplicação concentradaem uma mesma área, para que não haja excesso

de nutrientes e a eventual contaminação de len-çol freático em áreas saturadas.

A vinhaça é um composto rico em macro emicronutrientes necessários ao crescimento ve-getal, com destaque para o potássio (K2O). Comoa maioria das regiões cultivadas com cana-de-açúcar no Brasil apresenta solos deficientes empotássio, reduz-se a necessidade de adubaçãoquímica e os custos de produção, internalizandoao processo produtivo o que antes era umaexternalidade ambiental.

A vinhaça também pode ser fermentada embiorreatores que, por intermédio da decomposi-ção anaeróbia, produz gás metano, mas sem re-duzir significativamente a concentração de nutri-entes presentes na vinhaça, mantendo assim seuuso como fertilizante, conforme apresentado naTabela 2. Dentre os possíveis usos desse biogás,destaca-se a sua utilização como fonte de ener-gia adicional ao próprio sistema industrial, poden-do também ser convertido na forma de energiaelétrica, passível de ser exportada ao sistema elé-trico interligado.

Há também estudos em desenvolvimentovoltados à concentração da vinhaça, transforman-do-a em um novo produto comercial, de fácil trans-porte, o qual poderia ser tanto utilizado como fer-tilizante agrícola quanto comercializado paraoutros fins na indústria química. Embora o Brasiltenha equacionado o problema da vinhaça, elaainda é um resíduo indesejável em vários países,especialmente naqueles que produzem cana empequenas áreas, muitas vezes distantes das uni-dades industriais. O maior desafio para avanço

Tabela 2. Concentração dos principais compostos da vinhaça, antes e após a biodigestão.

988496

--

98851-

% de remoção

0,34

0,57

402,5

230190

1.00030

Digerido

622103,5-80120250200

1.00030

Sedimentado

2025123,5-80120250200

1.00095

Bruto

g/Lg/Lg/L-meq/Lmeq/Lmg/Lmg/Lmg/LºC

Unidade

STSDQODBOpHAlcAGVNPKTemperatura

Parâmetro

Fonte: Haandel e Lier (2006).

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mentar ainda mais com a construção de novasunidades industriais já em curso e em previsão.

Outros usos têm sido pesquisados para obagaço e a palha de cana-de-açúcar, como aextração de álcool de celulose, bem como a ob-tenção de outros produtos químicos, como obioóleo e compostos para a indústria química.Essas tecnologias possibilitarão aumentar aindamais a eficiência energética da cana-de-açúcar.

Os demais subprodutos do processo in-dustrial, como a torta de filtro e os resíduos delevedura, também possuem valor comercial. Atorta de filtro é utilizada como adubo orgânicono próprio canavial. Já os resíduos de levedurapossuem alto valor protéico e são normalmen-te utilizados para alimentação animal, em mis-turas à ração. O dióxido de carbono (CO2) re-sultante do processo de fermentação alcoólicaainda tem sido pouco utilizado, mas pode seraproveitado para produção de “gelo seco”, naprodução de refrigerantes na indústria de bebi-das, ou até mesmo como substância para a indús-tria química, haja vista seu alto nível de pureza.

A utilização de energia renovável proveni-ente da agroindústria canavieira também possibi-lita a obtenção dos chamados “créditos de carbo-no”, por meio do Mecanismo de Desenvolvimen-to Limpo (MDL) do Protocolo de Kyoto da Con-venção-Quadro das Nações Unidas sobre Mu-dança do Clima. Ao se evitar a emissão adicionalde gases de efeito estufa, como o dióxido de car-bono, metano (CH4) e óxido nitroso (N2O), emrelação a um cenário tendencial de linha de base,pode-se obter um certificado equivalente às emis-sões evitadas pelo projeto, chamado Certificadode Redução de Emissões (CER, sigla em inglês),bem como comercializá-lo no mercado interna-cional de carbono, seja pela sua venda direta, ouem bolsa de valores e mercados futuros.

A elaboração de um projeto de MDL requertambém alguns procedimentos básicos. Inicial-mente, é necessário haver uma metodologia decálculo, para se mensurar as emissões do projeto,que deverá ser aprovada no Conselho Executivodo MDL, órgão internacional da Convenção doClima, lotado em Bonn, Alemanha. Em seguida,prepara-se um documento intitulado Documentode Concepção do Projeto (PDD, sigla em inglês),

comercial dessa tecnologia está na demandade energia necessária para desidratação davinhaça, que pode ser equacionado com fon-tes energéticas do próprio processo produtivo,como o bagaço de cana.

Da mesma forma que a vinhaça, o bagaçode cana não era devidamente aproveitado déca-das atrás. Atualmente, o bagaço é utilizado paraprodução de energia – térmica, mecânica e elé-trica – necessária à fabricação de açúcar e álco-ol e à manutenção das demais atividades das usi-nas, tornando-as auto-suficientes e, em muitoscasos, até mesmo exportadoras de energia elétri-ca ao sistema elétrico interligado. Segundo da-dos do Balanço Energético Nacional (BRASIL,2005b), os produtos resultantes da cana represen-tam 15,4% da matriz energética brasileira, emtermos de produção de energia primária. O ba-gaço de cana-de-açúcar é responsável por 1,8%da energia elétrica ofertada no País, consideran-do a eletricidade consumida pelas próprias usi-nas, que em média chega a 80% do total gerado.

A despeito da magnitude da geração atual,há um potencial não aproveitado muito superiora essa capacidade, haja vista a utilização recor-rente de sistemas e equipamentos obsoletos. Es-tudo desenvolvido pelo Centro de TecnologiaCanavieira (CTC), em parceria com o Programadas Nações Unidas para o Desenvolvimento(Pnud) (Projeto BRA96/G31) e coordenação doMinistério da Ciência e Tecnologia (MCT)(HASSUANI et al., 2005), estima um potencialatual adicional de geração de energia da ordemde 700 MW a 12 mil MW, dependendo datecnologia utilizada, considerando-se desde cal-deiras convencionais a vapor de 22bar/300oC, atétecnologias de Gaseificação de Biomassa Integra-da a Turbinas a Gás (BIG-GT, sigla em inglês), in-cluindo a utilização parcial de palha. Os mesmosautores avaliam que cerca de 50% da palha dei-xada sobre o solo após a colheita da cana pode-ria ser destinada à produção adicional de ener-gia, sem ônus à produção final de cana. A quanti-dade remanescente no campo seria suficientepara garantir os mencionados benefícios da pre-sença da palha sobre o solo. O desafio está emviabilizar o custo de transporte da palha até a usi-na, dada sua baixa densidade volumétrica. A atu-al capacidade instalada de energia tende a au-

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que juntamente com a Carta de Validação do pro-jeto, elaborada por uma entidade credenciadajunto ao mesmo conselho, chamada EntidadeOperacional Designada (EOD), é submetido àaprovação da Autoridade Nacional Designada(DNA, sigla em inglês) do país hospedeiro do pro-jeto. No caso do Brasil, essa autoridade é a Co-missão Interministerial de Mudança Global doClima, presidida pelo Ministério da Ciência eTecnologia, que analisará o projeto do ponto devista de sua sustentabilidade ambiental e, se apro-vado, emitirá uma Carta de Aprovação, reconhe-cendo também a voluntariedade do país nesseprocesso. Posteriormente, toda a documentaçãoé submetida ao Conselho Executivo do MDL pararegistro. Uma vez registrado, o projeto passa aser monitorado por uma segunda EOD e, após operíodo comprobatório das emissões reduzidas,podem-se requerer os CERs, que validam o direi-to a um “crédito de carbono”, calculado emdióxido de carbono equivalente (CO2eq), a serincorporado ao balanço de emissões de gases deefeito estufa do país comprador.

No Brasil, a maioria dos projetos aprova-dos pela Comissão Interministerial de MudançaGlobal do Clima se refere à área de agroenergiae ao aproveitamento de biogás proveniente dadecomposição de resíduos sólidos urbanos ematerros sanitários, ainda com amplo potencial decrescimento (BRASIL, 2004). Dentre os projetosde agroenergia, destaca-se a co-geração combagaço de cana, que representa 32% dos proje-tos aprovados. Esses projetos normalmente plei-teiam créditos pelas emissões evitadas da não uti-lização de outras fontes de energia para atenderàs demandas da unidade industrial, por exemplo:diesel; óleo combustível; e eletricidade da rede detransmissão, que em parte provém de geração fóssil.

A despeito de a cogeração com bagaço decana-de-açúcar ser um dos principais projetos sub-metidos à referida Comissão Interministerial, aose observar o número de usinas de açúcar e álco-ol cadastradas no País, cerca de 360 unidades,verifica-se que muito pouco ainda foi explorado.Dessa forma, observa-se mais uma contribuiçãoambiental da agroindústria canavieira, o comba-te ao aumento do efeito estufa em escala globale, por conseqüência, das mudanças climáticas,maior problema ambiental global do século 21.

A título de ilustração, no caso do biogás dedejetos suínos, que representam 26% do total deprojetos de MDL já aprovados, após biodigestãodesse resíduo, obtêm-se como principais resultan-tes: o metano, que pode ser utilizado para a gera-ção renovável de energia térmica ou elétrica;adubo orgânico; e efluente líquido de baixa DBO(demanda bioquímica de oxigênio). Projetos dereflorestamento e de aproveitamento de resíduosde biomassa ainda têm sido insipientes, emborahaja alguns projetos em fase inicial e um grandepotencial a ser explorado.

A Fig. 1 mostra um perfil dos projetos deMDL em curso no Brasil, já aprovados pela refe-rida Comissão, que em junho de 2006 já soma-vam 81 projetos, desde a ratificação do Protocolode Kyoto, em fevereiro de 2005.

Fig. 1. Perfil dos projetos de MDL aprovados pelogoverno brasileiro.Fonte: Brasil (2006).

Outra questão importante de ser relatadana fase industrial é o potencial de uso químico aoetanol. Os preços elevados do petróleo tendem aestimular a retomada da indústria alcoolquímica,desenvolvida ainda nas décadas de 1970 e 1980,onde eram produzidos compostos como:dicloroetano, ácido acético, aldeído acético,acetato de vinila e acetato de etila. Na décadade 1990 havia aproximadamente 30 produtos sen-do produzidos no Brasil, com destaque para odicloro etileno, LD polietileno, etil-benzeno,cloreto de vinila e HD polietileno (BOTO, 1988;MACEDO et al., 2005).

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Distribuição e consumoO álcool etílico é biodegradável, miscível

em água, higroscópico e volátil quando expostoao ar. Sendo assim, eventuais vazamentos ou der-rames de álcool em operações de armazenamentoe transporte, tanto por via terrestre ou marítima,apresentam impactos ambientais inferiores aos dopetróleo e seus derivados. Ressalva feita paracasos de vazamento de misturas de gasolina eálcool no solo, especialmente em postos de abas-tecimento, onde, por meio de “efeito de co-sol-vência”, o álcool potencializa a contaminaçãodo lençol freático pelo combustível e a migraçãodos compostos mais perigosos e solúveis da gaso-lina, como o benzeno, tolueno, etilbenzeno exilenos (CORDAZZO et al., 2006).

No que se refere ao consumo de álcool com-bustível, as emissões de gases poluentes são, emgeral, inferiores às da gasolina. Cabe destacar queos poluentes provenientes das emissões veicula-res são os principais responsáveis pelos impactosnegativos sobre a qualidade do ar urbano.

Há países que ainda utilizam chumbotetraetila como aditivo à gasolina, o qual pode serdescartado com a utilização de álcool anidro. OBrasil foi o primeiro país do mundo a eliminar to-talmente o chumbo da gasolina, em 1992, embo-ra desde 1989 a maior parte do petróleo refinadono País já não usasse mais esse aditivo. A conta-minação e exposição continuada ao chumbo po-dem causar graves danos à saúde humana, po-dendo deixar seqüelas permanentes ou até mes-mo levar o paciente a óbito, em casos de conta-minação extrema.

Dados apresentados por Blumberg e Walsh(2004) mostram que há uma relação direta entrea concentração média de chumbo verificada nacorrente sanguínea da população urbana e a quan-tidade de chumbo presente na gasolina. Os auto-res avaliaram dados relativos aos Estados Unidos,no período de 1976 e 1991, ano em que o chumbofoi retirado da gasolina americana, e observaram quea concentração deste metal na corrente sanguíneada população caiu drasticamente, em 78%.

Ademais, com a mistura de etanol à gasoli-na, também não há necessidade de se utilizaraditivos como o MTBE (metil tércio butil éter) e o

ETBE (etil tércio butil éter), evitando assim os im-pactos ambientais específicos de suas emissões.

Em relação à gasolina, o consumo deetanol apresenta emissões inferiores de monóxidode carbono, dióxido de enxofre e particulados.Segundo Apace Research (1998), estudos condu-zidos na Austrália, com misturas de 10% de etanolna gasolina, identificaram reduções nos níveis deemissões nas seguintes proporções: 32% para CO,12% para hidrocarbonetos totais (THC) e 7% paraCO2. As emissões de óxidos de nitrogênio são si-milares para ambos os combustíveis.

No caso de aldeídos, as emissões do etanolsão ligeiramente maiores do que às da gasolina,mas não superiores ao diesel. Ainda assim, se-gundo Szwarc (2006) grande parte das emissõesde aldeído provenientes do etanol é do tipoacetaldeído, produto menos tóxico do que os ti-pos emitidos pela gasolina e pelo diesel. Estudosconduzidos em Denver (ANDERSON, 1997) eCalifórnia (CALIFORNIA AIR RESOURCESBOARD, 1999), com misturas de 10% de etanolna gasolina, constataram que a concentração at-mosférica de aldeídos praticamente não se alte-rou quando comparada a uma situação de consu-mo de gasolina sem mistura. Em contrapartida,essas emissões podem ser facilmente evitadas coma utilização de catalisadores. No Brasil, desde1992, esses equipamentos são obrigatórios emveículos novos.

Além disso, o etanol também pode ser utili-zado em misturas ao diesel, em pequenas propor-ções, com o uso de aditivos específicos. SegundoAhmed (2002), testes realizados com misturas de10% e 15% de etanol no diesel, em caminhõesutilizados no transporte rodoviário dos EstadosUnidos, apresentaram reduções significativas paraa maioria dos gases poluentes, se comparadas àsdo diesel puro, conforme apresentado na Fig. 2.Resultados similares foram obtidos em simulaçõesrealizadas no Brasil, assim como a redução dasemissões de enxofre, em projeto intitulado Proje-to Mistura Álcool Diesel AEP102 e MAD-08, apoi-ado pelo governo federal e desenvolvido em par-ceria com instituições de pesquisa e entidades li-gadas ao setor sucroalcooleiro.

Quanto às emissões de gases de efeito es-tufa, especialmente o dióxido de carbono, emiti-

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misturas de álcool à gasolina, de 0% a 100%, ademanda interna de etanol aumentou muito nosúltimos anos, tendendo a crescer ainda mais emcurto e médio prazos. Em 2005, 50,2% dos novosveículos leves vendidos no Brasil foram flex fuel,e em junho de 2006 esse valor atingiu 76,3% dasvendas (CARTA DA ANFAVEA, 2006).

Fig. 2. Redução de emissões em mistura álcool/diesel(10% e 15%), em relação ao diesel puro.Fonte: Ahmed (2002).

dos durante a combustão do etanol, salienta-seque seu efeito é praticamente nulo, uma vez queo mesmo provém de um processo renovável, ondedurante o crescimento da cana-de-açúcar há fi-xação de gás carbônico por meio da fotossín-tese. Adicionalmente, ao se evitar o consumode gasolina, o etanol mostra-se como uma im-portante estratégia para redução das emissõesde gases de efeito estufa em escala global(Macedo et al., 2004)

Misturas de etanol à gasolina ou o consu-mo direto de etanol são uma forma relativamentesimples de se reduzir emissões de gases de efeitoestufa, sobretudo no caso de países desenvolvi-dos com metas no âmbito do Protocolo de Kyoto.Cabe destacar que o setor de transportes é res-ponsável por cerca de 25% das emissões globaisde CO2, (IPCC, 2001). Macedo et al. (2005) esti-mam que para cada 100 milhões de toneladas decana poderiam ser evitadas 12,6 milhões de to-neladas CO2eq, considerando-se o uso de etanol,bagaço e energia elétrica adicional.

Misturas inferiores a 10% não requeremquaisquer ajustes nos tradicionais veículos a ga-solina, exceto em veículos com carburação, ondesão mais indicadas misturas inferiores a 5%, confor-me mostra a Tabela 3. No Brasil, a Lei nº 10.464, de24 de maio de 2002, estabelece a obrigatoriedadeda mistura entre 20% e 25%.

Com o surgimento dos veículos flex fuel nafrota brasileira, os quais podem utilizar quaisquer

Tabela 3. Modificações possivelmente necessárias emveículos leves, Ciclo Otto, segundo diferentespercentuais de mistura de álcool anidro à gasolina.

Fonte: Anfavea (2006a).

Considerações finaisA produção de cana-de-açúcar e etanol

apresenta reduzido impacto ambiental, especial-mente quando acompanhada de medidas de fis-calização, controle e planejamento. Os impactosambientais do etanol devem ser analisados emtoda sua cadeia produtiva e não de forma isola-da, assim como os combustíveis fósseis. Sendoassim, observa-se que o etanol propicia diversosbenefícios ao meio ambiente, à economia e à so-ciedade como um todo.

Ainda que dois dos principais problemasambientais relativos à produção do etanol tenhamsido resolvidos, em virtude do uso da vinhaça edo bagaço, em etapas de sua cadeia produtiva,restam ainda alguns problemas que requeremmaior atenção, tais como: a queima da cana-de-açúcar no processo de colheita; e o avanço dacultura em regiões saturadas. O problema dasqueimadas pode diminuir em grande parte, namedida em que o Estado de São Paulo priorize ocronograma de redução de queimadas estabele-cido em Lei, já que tal estado responde pela mai-

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or parcela da produção canavieira nacional, em-bora outros estados também precisem avançarnesse sentido.

Por sua vez, não se deve ocultar o efeitodesfavorável da redução de postos de trabalhoocasionado indiretamente pela eliminação dasqueimadas. A despeito de ser um trabalho extre-mamente árduo e de caráter temporário, o cortede cana muitas vezes é a única oportunidade detrabalho para um grande contingente de mão-de-obra, a maioria sem qualificação para conseguirempregos com remuneração semelhante em ou-tras atividades. Portanto, devem-se buscar medi-das de controle ambiental, associadas à qualifi-cação e à inserção desses trabalhadores em ou-tras atividades, com cidadania e inclusão social.

Quanto ao avanço da cana-de-açúcar, épreciso evitar uma excessiva concentração des-sa cultura em áreas saturadas, a exemplo de al-guns estados das regiões Centro-Sul e Nordeste,com destaque para os estados de São Paulo,Alagoas e Pernambuco, a fim de se evitar maio-res problemas agronômicos e ambientais, bemcomo reduzir a vulnerabilidade econômica efitossanitária desses estados a eventuais crises agrí-colas com a cultura canavieira. Apesar da maiorparte dos novos investimentos estar ocorrendo jus-tamente no estado de São Paulo, já se observatambém um crescente número de investimentosem outros estados, notadamente Goiás e MinasGerais. Novos pólos de desenvolvimento daagroindústria canavieira poderiam ser mais bemexplorados, especialmente nos estados doMaranhão, Piauí e Tocantins.

Merecem destaque alguns mecanismosimportantes ao desenvolvimento sustentável daagroindústria canavieira, quais sejam: ozoneamento agroecológio para a cultura da cana-de-açúcar, no âmbito nacional; a AvaliaçãoAmbiental Estratégica (AAE); a orientação fede-ral aos Órgãos Estaduais de Meio Ambiente(Oemas), no âmbito do processo de licenciamentoambiental de usinas e destilarias; a ampliaçãoorientada da infra-estrutura e logística; e o desen-volvimento de políticas de incentivo voltadas àexpansão sustentável da cana-de-açúcar em áreasconsideradas estratégicas.

As perspectivas para o etanol são bastantepromissoras, tanto para no âmbito nacional quantointernacional. O etanol tem se mostrado uma impor-tante alternativa ao petróleo no plano global, dentrediversas outras fontes. Ademais, pesquisas voltadasao desenvolvimento comercial de tecnologias paraa obtenção de álcool a partir de celulose e abiotecnologia prometem dar um novo impulso à pro-dução mundial de etanol nas próximas décadas.

Com base nas informações apresentadasneste trabalho, pode-se observar que o etanol decana-de-açúcar, produzido no Brasil, é um pro-duto consolidado e viável. Tanto sua produçãoquanto seu consumo em larga escala mostram queo etanol é competitivo e estratégico, contribuin-do para a redução da demanda por combustíveisfósseis, em prol de uma matriz energética maislimpa e renovável, da geração de emprego e ren-da à população, e da sustentabilidade ambientalàs gerações futuras.

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Produção de álcoolcombustível a partirde carboidratos

Resumo: Desde os primeiros momentos da indústria automobilística, o álcool tem sido consideradocomo um combustível viável. De fato, o primeiro modelo desenvolvido por Henry Ford tinha seu motoradaptado para funcionar tanto com álcool como gasolina. Entretanto, como a gasolina tornou-se maisbarata e disponível que o álcool, este combustível deixou de ser considerado prioridade até as criseseconômica de 1929 e do petróleo dos anos de 1970. Assim, inicialmente a produção de etanol foijustificada por aspectos políticos. Atualmente, a ênfase em redução da poluição e limitação do aque-cimento global também têm sido fortes motivações para a continuidade de produção e uso dessecombustível renovável. Embora no Brasil o uso de cana-de-açúcar para produção de álcool seja muitobem-sucedido, outras matérias-primas devem ser consideradas futuramente, seja para possibilitar aprodução em regiões sem vocação agrícola para aquela cultura, seja para inclusão de pequenosprodutores usando materiais amiláceos como mandioca e batata-doce, ou com a utilização de mate-riais lignocelulósicos quando esta tornar-se uma realidade. Dessa forma, este trabalho fala de aspectostécnicos da produção de etanol a partir de carboidratos, considerando as principais vantagens, dificul-dades e inovações técnicas em seu uso.

Palavras-chave: álcool, produção, combustíveis renováveis, carboidratos

Abstract: Since the beginning of automobilist industry, ethanol has been considered as a viable fuel. Infact, Henry Ford developed his motor adapted for functioning with alcohol and gasoline. However, asgasoline became cheaper and more available than alcohol, this fuel weren't considered as viable untilthe economic and petroleum crisis of 1929 and 1970's, respectively. Thus, initially, political aspectsjustified the ethanol production. Now, the emphasis is on reducing pollution and limiting the globalwarming. Although in Brazil the sugar cane use for ethanol producing is very successful, other rawmaterials should be considered in the future, for enabling its production in regions without agriculturalvocation for that culture, or inclusion of small farmers using amilaceous products as cassava andsweetpotato, or, with the utilization of lignollulosic materials when it becomes a commercial reality.Therefore this paper treats of the technical aspects of fuel-alcohol production using carbohydrates,considering the main advantages, difficulties and technical innovations in their use.

Key-words: ethanol, manufacture, renewable fuels, carbohydrates

Cristina Maria Monteiro Machado1

Frederique Rosa e Abreu2

1 Doutora em Processos Biotecnológicos, pesquisadora da Embrapa Hortaliças, Rod. BR 060 Km 09, CP 218, 70359-970, Brasília, DF, [email protected] Doutor em Química, coordenador-geral de Agroenergia, Ministério da Agricultura, Pecuária, e Abastecimento,[email protected].

IntroduçãoO álcool etílico (etanol) é caracterizado

como um líquido incolor, de odor ardente, facil-mente inflamável, de chama azulada, e muito

higroscópico. No estado desidratado é perfeita-mente solúvel em diversas substâncias orgânicasou minerais, como ésteres, carburantes, acetonas,etc. Sua solubilidade diminui com o aumento dapresença de água. Em uma mistura com água, o

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álcool tem ponto de congelamento mais baixo doque a mesma.

O etanol é um excelente combustívelautomotivo: apresenta um índice de octanagemsuperior ao da gasolina e tem uma pressão devapor inferior, resultando em menores emissõesevaporativas. A combustão no ar é inferior à dagasolina, o que reduz o número e a severidadede fogo nos veículos. O etanol anidro tem podercalorífico inferior e superior de 21,2 e 23,4megajoule por litro, respectivamente, contra 30,1e 34,9 megajoule por litro da gasolina.

As propriedades do etanol como combustí-vel levaram ao desenvolvimento de motores aálcool e motores para a mistura álcool-gasolinano Brasil. Até 1988, os desenvolvimentos foramrealizados pela indústria automobilística (GM,Ford, Volskwagen, Fiat) para sistemas carburados;atualmente, encontram-se disponíveis para todosos motores sistemas com injeção eletrônica, e maisrecentemente, bicombustíveis.

No Brasil, o etanol combustível é utilizadode duas maneiras: o álcool anidro e o álcoolhidratado. O anidro possui menos água em suacomposição, sendo mais adequado para a mistu-ra carburante com a gasolina. A adição do álcoolcarburante à gasolina eleva em 2% o volumemétrico consumido. Assim, para cada 100 L de ga-solina misturada existirá uma proporção de 81,6 Lde gasolina e 20,4 L de álcool anidro. Assim,20,4 L de álcool anidro podem poupar 18,4 L degasolina. O Brasil foi o primeiro país a eliminartotalmente o chumbo tetraetila de sua matriz decombustíveis em 1992, embora, desde 1989, cer-ca de 99% do petróleo refinado no País já nãousasse esse aditivo. Essa conquista deu-se graçasao uso do álcool como aditivo à gasolina. Adicio-nado à gasolina, o álcool anidro confere-lhe po-der antidetonante, tendo em vista sua elevadaoctanagem. Assim, revela-se um bom substitutoao chumbo tetraetila ou MTBE, possibilitando aeliminação dos efeitos danosos provocados poresses compostos ao meio ambiente.

O álcool hidratado é adequado para os ve-ículos movidos exclusivamente à álcool ou aosbicombustíveis. Por sofrer um menor número de

operações produtivas, o álcool hidratado é, emmédia, 4,5% mais barato do que o álcool anidro. Orendimento motor do álcool hidratado é de 20% a27% menor do que a gasolina. Isso significa quepara cada quilômetro rodado com gasolina requer-se um consumo volumétrico de álcool com essaproporção. Para compensar esse diferencial, atu-almente, o preço do álcool é 21,4 % menor doque a gasolina. As principais propriedades da ga-solina e do álcool estão indicadas na Tabela 1.

Tabela 1. Propriedades e características dos com-bustíveis.

34.900

91/80

376 ~ 502

220

14,5

Gasolina

Calor específico(kJ/kg)Número de octano(RON/MON)(1)

Calor latente de vaporização(kJ/kg)Temperatura de ignição(ºC)Razão estequiométricaAr/Combustível

(1) Research Octane Number (RON);Motor Octane Number (MON)Fonte: Goldemberg e Macedo (1994).

26.700

109/98

903

420

9

Etanol

HistóricoDesde os primeiros momentos da indústria

automobilística, o álcool tem sido consideradocomo um combustível viável. De fato, o primeiromodelo desenvolvido por Henry Ford tinha seumotor adaptado para funcionar tanto com álcoolquanto com gasolina. Em 1917, Alexander GrahanBell já proclamava os benefícios do álcool comocombustível em um artigo publicado na NationalGeographic. O inventor cita a grande quantida-de de matérias-primas passíveis para a produçãode álcool, incluindo “serragem, sabugo de mi-lho, e a maior parte dos vegetais, até mesmo se-mentes... os resíduos de nossas fazendas... e mes-mo o lixo urbano”.

Entretanto, como a gasolina tornou-se maisbarata e disponível que o etanol, esse combustí-vel deixou de ser considerado. Porém, em 1929,a grande crise internacional colocou em xequeas economias de todos os países e, no Brasil, fal-

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tavam divisas para a aquisição de combustívellíquido. A primeira destilaria de álcool anidro foiinstalada, e o governo federal, em 1931, estabe-leceu a obrigatoriedade da mistura de 5% deetanol à gasolina (Decreto nº 19.717), como me-dida de economia na importação de combustívele para amparar a lavoura canavieira. Tambémnessa época, pelos mesmos motivos, o álcool pas-sou a participar em uma fração do mercado decombustíveis em outros países, como EstadosUnidos, Alemanha, Nova Zelândia e França.

O Programa Nacional do Álcool, oProálcool, foi criado em 1975, 2 anos depois daconclusão da guerra árabe-israelense, quando, noespaço de 1 ano, os preços do petróleo mais doque triplicaram, trazendo um forte impacto sobrea Balança Comercial brasileira. Em face dessecontexto, o governo federal lançou uma amplapolítica de superação do chamado “gargaloenergético”, na qual se incluiu o Proálcool. A Co-missão Nacional do Álcool (Cenal), em meadosdos anos 70, elencou os cinco objetivos básicosdo Proálcool:

• Economia de divisas mediante a reduçãoda importação do petróleo para a produção dagasolina e de matérias-primas.

• Redução das disparidades regionais derenda mediante o alargamento da produção paradiferentes regiões do Brasil com baixo nível deocupação produtiva. Nesse item, previa-se a pro-dução de álcool de mandioca o que, de certomodo, democratizaria o programa, visto que essaraiz é produzida majoritariamente por pequenosprodutores.

• Redução das disparidades individuais derenda por meio da maior ocupação da mão-de-obra no setor agrícola em uma atividade quepagaria salários mais elevados que a média dosetor agrícola.

• Crescimento da renda interna com umaocupação mais intensiva da terra e da mão-de-obra até então vistas como ociosas.

• Expansão da indústria de bens de capital(tratores, máquinas agrícolas, fábricas produtorase construtoras de destilarias, indústria química,

etc.) mediante a elevação da demanda do setoralcooleiro.

Pode-se ver, portanto, que na origem doProálcool havia um conjunto de objetivos de or-dem social articulado com as metas econômicasmais imediatas, como a redução do consumo dopetróleo e a superação do colapso energético, porexemplo. Por sua vez, quando da primeira fasedo Proálcool não foi mencionado nenhum objeti-vo ambiental, que somente viria a ganhar relevoanos mais tarde.

Outro aspecto que merece destaque é queo Proálcool, em sua primeira fase, previa a pro-dução de álcool derivado de outros produtos ve-getais, no caso a partir da mandioca, produto queno Brasil é cultivado em sua maioria por peque-nos produtores. O uso dessa raiz viabilizaria aconstrução de destilarias menores capazes depropiciar uma auto-suficiência energética notransporte no meio rural. Seis usinas de álcool demandioca chegaram a ser construídas no Brasil,na década de 1980, com financiamento públicoe incentivos fiscais. Porém, foram instaladas emregiões não tradicionais, ou em fim de ciclo dopólo mandioqueiro, o que fez com que o empre-endimento se tornasse inviável e a idéia fosseabandonada.

Trinta anos depois do início do Proálcool, oBrasil vive agora uma nova expansão dos cana-viais com o objetivo de oferecer, em grande es-cala, o combustível alternativo. O plantio avançaalém das áreas tradicionais, do interior paulista edo Nordeste, e espalha-se pelo Cerrado. Atecnologia dos motores flex fuel veio dar novofôlego ao consumo interno de álcool. O carro quepode ser movido a gasolina, álcool ou com umamistura dos dois combustíveis foi introduzido noPaís em março de 2003 e conquistou rapidamen-te o consumidor. A velocidade de aceitação pe-los consumidores dos carros bicombustíveis, ouflex fuel, foi muito mais rápida do que a indústriaautomobilística esperava. As vendas desses veí-culos já superaram as dos automóveis movidos agasolina. Os bicombustíveis representaram 49,5% dototal de automóveis e comerciais leves vendidosno mês, enquanto a participação dos movidos a

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gasolina ficou em 43,3%, segundo a AssociaçãoNacional dos Fabricantes de Veículos Automo-tores (Anfavea). A preferência do mercado levoua Câmara Setorial de Açúcar e do Álcool, órgãoligado ao governo, a rever suas projeções e indi-car que a participação da nova tecnologia deve-rá atingir 75% dos carros vendidos em 2006.

Aspectos ambientais e econômicosA principal vantagem do etanol em relação

à gasolina é ser renovável e, em princípio, umcombustível completamente sustentável e menospoluente. O ponto mais importante é que o CO2

liberado pela combustão do etanol foi recém-fi-xado pelas plantas, que são sua matéria-prima,de forma que se pode considerar que não há con-tribuição líquida ao aquecimento global. Entre-tanto, há requerimento de energia (em sua maiorparte proveniente de combustíveis fósseis) em to-das as etapas do processo, incluindo produção(plantio, fertilização, colheita) da matéria-prima,fermentação para transformação em etanol e des-tilação. No Brasil, com o bagaço da cana sendoutilizado como combustível, a geração de ener-gia pelo etanol produzido excede à energia gastaem um fator de até duas vezes.

As críticas iniciais à produção de etanol noBrasil eram concernentes à baixa eficiência e pro-blemas ambientais em virtude da cultura da cana-de-açúcar. Quanto ao primeiro aspecto, com osavanços das pesquisas, a produção de etanol noBrasil tem crescido a uma taxa de aproximada-mente 4% ao ano (Fig. 1) e os custos têm sidoreduzidos em cerca de 3% ao ano desde a intro-dução do Próalcool, em razão das melhores vari-edades de cana desenvolvidas, técnicas maisadequadas de manejo e melhoria no processo in-dustrial de fermentação, extração e destilação.

Em relação a problemas ambientais em fun-ção da agricultura intensiva, pode-se considerarque, com o tempo, a produção de cana no Brasilse tornou um exemplo importante de agriculturasustentável, em especial no Estado de São Paulo:é a atividade agrícola que apresenta um dos maisbaixos índices mundiais de erosão de solos, e apre-

senta também um dos mais baixos índices mundi-ais de uso de defensivos e insumos químicos, rea-lizando controle biológico de pragas efertirrigação do solo com os resíduos do proces-samento industrial da cana. O uso de pesticidas eherbicidas é relativamente baixo, em função dosprogramas de controle biológico. O uso de dosesespecíficas desses insumos para cada local, a prá-tica de deixar cobertura de palha em locais ade-quados e técnicas derivadas dos cultivos “orgâ-nicos” poderão melhorar ainda mais esse qua-dro. O uso de fertilizantes minerais é menor quenas culturas de milho e soja, e o melhor geren-ciamento do reciclo praticado hoje de resíduos(torta de filtro, vinhoto e alguma palha) pode le-var ainda a uma substancial redução. Na prote-ção de solos e águas, os problemas iniciais sãoatenuados pelo crescimento rápido da cultura,pelo uso de culturas de rotação e por vários cor-tes. O consumo de água in natura para o cultivoda cana praticamente não é utilizado; a água ésuprida, basicamente, pelos vários efluentes ge-rados no processo produtivo (tratados ou não), eem função da precipitação das chuvas. Aindaassim, é necessário aumentar a implantação deproteção a áreas de reserva permanente e adotartécnicas (conhecidas) para a redução da capta-ção de água para uso na indústria sucroalcooleira.A poluição provocada pelas usinas diminuiu dras-ticamente desde que se passou a aproveitar obagaço da cana como combustível, e o vinhoto ea torta de filtro como fertilizante, evoluindo am-bos da categoria de resíduos à de valiosos insumos.

Fig. 1. Evolução da produção e rendimento da cana-de-açúcar nos últimos 30 anos.Fonte: IBGE (2006).

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Vias de obtençãoO etanol pode ser obtido de duas diferentes

formas: por síntese química e por fermentação.

Na síntese química, o etanol é produzido apartir de hidrocarbonetos insaturados, como etenoe etino, e de gases de petróleo e hulha. Esse pro-cesso apenas possui significado econômico empaíses com grandes reservas de petróleo e indús-tria petroquímica avançada. Obviamente, o etanolobtido dessa forma não vem de matéria-primarenovável nem pode ser considerado como com-bustível alternativo.

Assim, a via fermentativa é o método utili-zado na obtenção de etanol no Brasil e na maiorparte dos países. Esse processo é constituído detrês partes: preparo do substrato, fermentação edestilação do fermentado. No preparo do substrato,a matéria-prima é tratada para dela se obteremos açúcares fermentescíveis. Essa etapa depen-de do tipo de matéria-prima utilizada, como serádescrito a seguir. A fermentação é o processo peloqual os carboidratos serão transformados em ál-cool e gás carbônico pela ação de microrganis-mos. Finalmente, na destilação, o etanol é sepa-rado do caldo de fermentação e purificado.

Etapas do processoHá um grande número de variáveis na fa-

bricação de etanol. De fato, o processamento podeser radicalmente diferente, de acordo com a ma-téria-prima e microrganismo utilizados. De modogeral, envolve as etapas de upstream, fermenta-ção e dowstream. A etapa upstream abrange to-dos os procedimentos necessários para que a fer-mentação ocorra com sucesso, seguida da recu-peração do produto ou etapa dowstream. Dessaforma, a produção de álcool envolve as seguintesetapas, que serão descritas, separadamente, nes-te trabalho: preparo do substrato, preparo doinóculo, fermentação, destilação e retificação.

Matérias-primasQualquer produto que contenha uma quan-

tidade considerável de carboidratos (açúcares)

constitui-se em matéria-prima para obtenção deálcool. Entretanto, para que seja viável economi-camente, é preciso que se considere o seu volu-me de produção, rendimento industrial e o custode fabricação. De acordo com o tipo decarboidratos presentes nas matérias-primas elaspodem ser classificadas em três tipos descritos aseguir:

Materiais açucarados – Contêm açúcaressimples, ou seja, carboidratos com seis (monossa-carídeos) ou 12 átomos de carbono (dissacarí-deos), como glicose, frutose e maltose. Osmonossacarídeos se limitam aos sucos de frutas esão diretamente fermentescíveis, sendo utilizadosapenas na produção de álcool em bebidas comovinho e sidra. Já os dissacarídeos são fermenta-dos após uma hidrólise ocorrida pela ação daenzima invertase, produzida pelo próprio agentede fermentação. Ex.: cana-de-açúcar, beterrabaaçucareira, melaços, mel de abelhas e frutas.

Materiais amiláceos – Contêm carboidratosmais complexos como amido e inulina que po-dem ser quebrados em glicose pela hidrólise áci-da ou ação de enzimas num processo denomina-do malteação ou sacarificação. Ex.: grãos amilá-ceos (milho, sorgo, cevada, trigo), raízes e tubér-culos (batata, batata-doce, mandioca).

Materiais celulósicos – São constituídos decelulose, e, apesar de estarem disponíveis emgrande quantidade, não oferecem, por enquanto,condições econômicas na produção de etanol,pois, para tornarem-se fermentescíveis, devempassar por um processo complexo de hidróliseácida. Ex.: palha, madeira, resíduos agrícolas ede fábricas de papel.

Na Tabela 2, serão comparados algunssubstratos potenciais para produção de etanol noBrasil, considerando-se produtividade nas regiõescaracterísticas de produção e quantidade médiade carboidratos totais. Deve-se ter em mente queesses não devem ser os únicos parâmetros paraescolha de uma matéria-prima, pois os custos daprodução de etanol dependem também dos cus-tos de cultivo, transporte e processamento, alémde outros aspectos não econômicos a serem con-siderados.

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Tabela 2. Potencialidade de algumas matérias-primas açucaradas e amiláceas em carboidratos e etanol.

2,51,63,21,6

6,0 - 9,0(1)

4,84,91,61,11,1

Potencialidade emetanol (m3/ha)

3,52,44,42,2

9,2-136,76,82,31,61,5

Produtividadecarboidrato (t/ha)

122017157725

13,53,52,32,3

Produtividadeagrícola (t/ha)

28,912

26,115

12-1726,834,666765

Carboidratostotais (%)

ArarutaBatataBatata-doceBeterrabaCana-de-açúcarInhameMandiocaMilhoSorgoTrigo

Matéria-prima

(1) Produção real de etanol a partir da cana-de-açúcar.Fontes: Leonel e Cereda (2002); BNDES (2003); IBGE (2006).

Preparo do substrato (mosto)Tecnologicamente, todo líquido suscetível

à fermentação é denominado mosto. Para o pre-paro do mosto natural, deve-se extrair oscarboidratos (açúcares) da matéria-prima, e, senecessário, torná-los disponíveis para fermenta-ção. Conhecendo-se as propriedades fisiológi-cas e as exigências nutricionais das leveduras,pode-se propiciar condições ótimas para essesmicrorganismos e favorecer a fermentação alco-ólica, a fim de que esta seja mais regular, homo-gênea e pura. Isso se consegue adicionando aomosto os nutrientes necessários, corrigindo a rea-ção do meio, empregando anti-sépticos ou antibi-óticos e conduzindo a fermentação à temperatu-ra adequada. Os elementos nutricionais, a quan-tidade e a necessidade de se adicionar ou nãooutros elementos corretivos dependem da maté-ria-prima utilizada.

Materiais açucaradosComo dito anteriormente, substratos que

contenham sacarose ou glicose requerem ummenor número de etapas para a produção deetanol que os outros tipos de substrato. De fato,melaços e outros xaropes com alta concentraçãode açúcar só precisam ser diluídos e ter seu pHajustado antes da fermentação. Para outros mate-riais, como frutas, beterraba e cana-de-açúcar, énecessária uma etapa de extração, feita, normal-mente, pela prensagem e posterior filtração domaterial.

Frutas – A seguir, a concentração média deaçúcar em algumas frutas: uva, 15%; banana,13,8%; maçã, 12,2%; abacaxi, 11,7%; laranja5,4%; melão, 2,5% e tomate, 2,0%. Supondo umaextração de 75% de eficiência em maçãs, porexemplo, se teria cerca de 9 % de materialfermentescível a partir do produto inicial. Assim,1 t de maçãs levaria produção de 56 L de álcool.Em qualquer caso, a percentagem de açúcar nosubstrato é baixa, de forma que não se faz neces-sária diluição, pelo contrário, esta é indesejável.Ou seja, no preparo de mostos de frutas, apenas éfeita a extração do suco, e então o pH é ajustado.Entretanto, a fermentação alcoólica de frutas nãoé usada para produção de etanol combustível, esim para produção de bebidas, onde o alto custoda matéria-prima justifica-se pelas característicasde aroma e sabor geradas no processo.

Melaços – O melaço é um licor de cor es-cura (marrom a preto), de composição variável,sendo um subproduto da produção de açúcar, tan-to de cana como de beterraba. Esse material, sedisponível, é um excelente substrato para produ-ção de álcool, pois contém de 50% a 55% de açú-cares fermentescíveis, ou seja, uma tonelada pro-duziria de 250 a 300 L de álcool. Para preparo domosto é apenas necessário fazer a diluição e cor-reção do pH. Em casos especiais, adicionam-sefosfatos e sais de amônio na proporção de 1 g/L demosto.

Cana-de-açúcar – A cana-de-açúcar con-tém de 12% a 17% de açúcares totais. A eficiên-cia da extração é de 95% e o resíduo sólido é o

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bagaço. Para a produção de etanol, o caldo dacana é aquecido até 110oC para reduzir a conta-minação microbiana, decantado, concentrado porevaporação (se necessário) e, usualmente, adici-onam-se superfosfatos e sulfato de amônio (1 g/Lde mosto), sais de magnésio (0,1 g/L) e sais demanganês e de cobalto (0,01 g/L). Após a dilui-ção e adição de nutrientes, ajustam-se a tempe-ratura e o pH.

Beterraba – A beterraba pode ser um ex-celente material para a produção de etanol, porsua alta concentração de açúcares (15%). O sucopode ser extraído por prensagem, e por conter umpouco de amido, a adição de uma pequena quan-tidade de malte (1% a 2% em peso) leva a umaumento significativo no rendimento do proces-so. O ajuste de pH é necessário. Uma toneladade beterrabas pode levar a um rendimento decerca de 100 L de álcool.

Materiais amiláceosOs materiais amiláceos podem ser dividi-

dos em amiláceos (grãos) e feculentos (raízes etubérculos). No primeiro grupo é necessária umamoagem inicial, para expor o amido. Eles con-têm boa quantidade de material com potencialfermentativo, compensando, em muitos casos, asdiversas etapas de processamento. O conteúdomédio de amido conversível e açúcar em algunsgrãos típicos é: cevada, 50%; milho, 66%; aveia,50%; centeio, 59%; sorgo, 67% e trigo, 65%. Aprodutividade de álcool depende de quão com-pleta é a conversão do amido, mas normalmenteé de 260 a 380 litros por tonelada. Quanto às raízese aos tubérculos, uma vantagem é que podem serutilizados materiais de refugo, fora de tamanho,machucados e até mesmo com brotação desen-volvida. De fato, a existência de brotos reduziráa quantidade de malte (ou enzimas) necessáriapara a malteação. As batatas contêm entre 15%e 18% de material fermentescível, as batatas-do-ces contêm cerca de 22% de amido e 5% a 6%de açúcares redutores, e a mandioca contém30% a 35% e todos esses materiais feculentos sãouma fonte tradicional de álcool. Em média, 1 t debatatas leva a uma produção de 85 L a 95 L deálcool, e de batata-doce, até 150 L.

Todos os materiais amiláceos requerem umprocesso de cozimento para diluição e gelatini-zação do amido, e, em seguida, de sacarificaçãoou hidrólise no qual o amido é transformado emaçúcares fermentescíveis. Essa hidrólise pode serpor maltagem, por adição de enzimas ou pela açãode ácidos. Cada um desses métodos tem suas van-tagens, desvantagens e aplicações, e serão dis-cutidos a seguir.

Cozimento – Todos os materiais amiláceosdeverão ser cozidos em água, para que sejamdissolvidos os amidos solúveis em água e, namedida do possível, que estes sejam gelatinizados.Em processamentos industriais o cozimento é fei-to com vapor, quase sempre sob pressão e emprocesso contínuo. A pressão serve para diminuiro tempo e a temperatura de processamento. Paraprocessos em escala menor, o cozimento podeser feito a pressão atmosférica, mantendo-se omaterial em uma fervura leve de 30 a 60 minutos(em geral, os grãos levam mais tempo paragelatinizar que as raízes e os tubérculos). Umavez que é necessária grande quantidade de ener-gia para o cozimento, é melhor que este seja feitocom a menor quantidade de água possível. As-sim, a concentração adequada para fermentaçãoserá alcançada pela posterior adição de água nocaldo obtido.

Hidrólise ácida – Apresenta como vanta-gens o pequeno tempo de sacarificação, porémtem como desvantagens evidentes os problemasde corrosão dos equipamentos e a necessidadede neutralização da solução açucarada após ahidrólise, além de provocar certa destruição dosaçúcares. Acrescenta-se a isso o fato de o pro-cesso gerar açúcares não fermentescíveis, o quediminui o rendimento da fermentação. De fato,esse processo é mais usado para a hidrólise demateriais celulósicos, e será detalhado na seçãoque trata desse tipo de matéria-prima.

Maltagem – O malte é um cereal germina-do em condições especiais de umidade, tempe-ratura e aeração. Durante a germinação, ocor-rem diversas modificações físicas, bioquímicas equímicas no cereal, sendo uma delas a ação deenzimas (amilases), que converterão o amido em

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uma forma de açúcar fermentescível chamadomaltose. Todo cereal em grãos produz essasenzimas em maior ou menor grau, podendo-seusar o malte do próprio substrato a ser fermenta-do (se esse for grão), ou de cevada, que, por con-ter maior concentração de amilases, tem um usomais econômico. Na conversão de amido amaltose, as enzimas do malte atuam de duas for-mas: a liquefação e a sacarificação. A intensida-de dessas duas atividades depende da tempera-tura do processamento. A liquefação é mais in-tensa a 70oC, começa a diminuir a 80oC e cessaa 93oC. Já a sacarificação ocorre a temperaturas maisbaixas (50oC–55oC), tornando-se inativa a 80oC.Como ambas as ações são desejáveis, o processo deconversão é feito, usualmente, a 65oC. O material émantido nessa temperatura por um certo tempo eentão, quando a conversão estiver completa, omaterial será resfriado a 20oC–24oC e poderá seiniciar a fermentação. A quantidade de malte usa-da e o tempo para a conversão dependerá damatéria-prima. Para a malteação, milho e trigoprecisarão de 8 %–10% de malte (em peso); cen-teio, de 10%–12%, e outros grãos, entre essesvalores; já para raízes e tubérculos é necessáriauma razão de apenas 3%–4% de malte. A con-versão será completa após 5–15 minutos para otrigo, 30 minutos para milho, 30–60 minutos paracevada e de 15–20 minutos nas raízes e tubércu-los. Para se determinar exatamente o tempo demalteação assim como a quantidade mínima demalte necessária para uma boa conversão, o ide-al é que sejam feitos alguns testes com a matéria-prima antes de se definir o processo.

Uso de microrganismos produtores deenzimas – O farelo enzimático provém do cultivode microrganismos que produzem enzimas ca-pazes de realizar a hidrólise do material amiláceo,a exemplo do Aspergillus oryzae, cujo crescimen-to se dá sobre farelos de milho, trigo, arroz oucevada previamente gelatinizados. O fareloenzimático, além de ser facilmente produzido,apresenta altos rendimentos em glicose equiva-lente (percentagem da produção de glicose emrelação à quantidade de amido presente em ummaterial) quando comparado ao malte. Porém,

para sistemas em pequena escala, é mais compen-sador o uso de enzimas industriais.

Uso de enzimas industriais – As enzimascontidas em malte são produzidas, normalmente,pela fermentação dos microrganismos Bacillussubtilis, Aspergillus niger e Aspergillus awamori eestão comercialmente disponíveis produzidas pordiferentes empresas. Os procedimentos para seuuso são bem parecidos com os da sacarificaçãopor maltagem. As vantagens do uso desse méto-do é que os extratos enzimáticos são normalmen-te mais baratos e, por serem especialmenteprojetados para esse trabalho, produzem resulta-dos mais previsíveis e rendimentos mais altos. Astrês enzimas comercialmente disponíveis são α eβ-amilase e glucoamilase. A α-amilase quebra oamido para produzir a dextrose e a β-amilase pro-duz a maltose (ambos açúcares fermentescíveis).Juntas, essas duas enzimas podem converter apro-ximadamente 85% do amido. A glucoamilaseconverte o amido restante, e o uso das três enzimaspode alcançar conversão quase total do amido.

Materiais celulósicosA disponibilidade de resíduos celulósicos,

representados por palhas, folhas, resíduos da ex-ploração madeireira e outros, despertou o inte-resse para seu uso como matéria-prima para aprodução de álcool. As vantagens desses subs-tratos são sua grande disponibilidade, baixo cus-to (freqüentemente gratuitos) e, mais recentemen-te, questões ambientais. Os materiais celulósicossão compostos de lignina, hemicelulose e celulo-se em diferentes proporções (Tabela 3) e são, porisso, também chamados de lignocelulósicos.

Uma das principais funções da lignina éprover suporte estrutural para a planta. Assim, ár-vores contêm maior quantidade de lignina do quegramíneas. Infelizmente, a lignina, que não pos-sui açúcares, reveste as moléculas de celulose ehemicelulose, dificultando seu acesso. As molé-culas de celulose consistem de longas cadeias demoléculas de glicose ligadas entre si, assim comoo amido, tendo, porém, uma configuração estru-tural diferente. Essa diferença estrutural, além do

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revestimento pela lignina, torna materiaiscelulósicos mais difíceis de hidrolisar que materi-ais amiláceos. A hemicelulose é também com-posta por longas cadeias de moléculas de açú-car, mas contém, em adição à glicose (um açú-car de 6 carbonos), pentoses (açúcar de 5 carbo-nos), um problema: na hidrólise, a composiçãoexata de açúcares na hemicelulose varia, de acor-do com o tipo de planta. Uma vez que pentosescontêm uma maior percentagem de açúcares dis-poníveis, a habilidade de recuperar e fermentá-los é importante para a eficiência e economia doprocesso. O tratamento dos materiais celulósicospara fermentação pode ser feito pelo uso deenzimas ou pela hidrólise ácida. Os dois tipos deprocessos serão detalhados a seguir.

Uso de enzimasEsse método é, provavelmente, o que apre-

senta maior potencial de desenvolvimento, porémainda é muito caro. Para que a ação das enzimasseja eficiente, é necessário que elas tenham aces-so às moléculas a serem hidrolisadas. Assim, ini-cialmente, é necessário um pré-tratamento quequebre a estrutura cristalina da lignocelulose eremova a lignina para expor as moléculas de ce-lulose e hemicelulose. Podem ser usados méto-dos físicos, como temperatura e pressão, moagem,radiação ou congelamento, ou métodos químicoscom solventes para quebrar e dissolver a estrutu-ra da lignina.

Então, o material deverá ser misturado auma quantidade de água suficiente para formar

uma massa espessa, o pH é ajustado entre 4,5 e6,0 e as enzimas são adicionadas. Em geral, usa-se um consórcio de enzimas (endoglucanase,exoglucanase e β-glucosidase) coletivamenteconhecidas como celulase, e que, juntas, levama uma conversão próxima de 100%. A tempera-tura ótima de processamento é de 60oC e a mis-tura deverá ser mantida nessa temperatura porcerca de 16 horas. Antes de se iniciar a fermenta-ção, poderá ser necessário um ajuste de pH.

Além do custo das enzimas, uma dificulda-de nesse processo é conhecer o teor de celulosee hemicelulose em uma dada matéria-prima,para se estimar a quantidade de enzimas a seradicionada para uma eficiência adequada. O pro-cedimento mais comum é fazer testes iniciais,partindo-se de 2% de enzimas em peso. Por suavez, esse processo tem diversas vantagens, como:alta eficiência e pequena produção de resíduos;gastos com energia relativamente baixos e con-dições brandas de processamento que não exi-gem materiais de construção caros.

Processo ácidoO processo ácido é relativamente simples

e pode ser realizado usando-se soluções diluídasou concentradas de ácido, conforme descrito aseguir.

Ácido diluído e temperatura relativamen-te alta – Basicamente, é feita com ácido sulfúricodiluído a 1%–4% peso/peso adicionado aosubstrato e aquecido a uma temperatura de cer-ca de 175oC (pressão de 10 atm). O material é

Tabela 3. Conteúdo de celulose, hemicelulose e lignina de alguns materiais.

18-3530-40

1510-300-15150

18-302,7-5,7

Lignina(%)

25-4025-30

3535-50

050

80-8525-40

1,4-3,3

Hemicelulose(%)

40-5525-30

4525-4085-99

3015-2040-55

1,6-4,7

Celulose(%)

Tronco de árvoreCasca de nozesEspiga de milhoCapimPapelPalha de trigoFolhasJornalEsterco sólido de gado

Materiaislignocelulósicos

Fonte: Sun e Cheng (2002).

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então neutralizado com hidróxido de cálcio, oualguma outra base, e lavado. Possui a limitaçãodo custo dos equipamentos, pois estes devem su-portar a alta temperatura e pressão. O processo éconduzido sob alta temperatura e pressão(150oC–250oC) e tem tempo de reação na ordemde segundos ou minutos, o que facilita o processocontínuo. Como exemplo, um processo com ce-lulose pura em um reator contínuo, com 1% deácido sulfúrico e temperatura de 237oC, leva auma conversão próxima de 50% em açúcares emum tempo de residência de 0,22 minuto. O pro-blema desse processo é que a combinação de altatemperatura e pressão obriga o uso de materiaisespeciais, o que torna o reator caro. Além disso, aconversão é relativamente baixa (próxima dos50%). A maior vantagem desse processo, princi-palmente para processos em média e grande es-cala, é a rápida taxa de reação, o que facilita oprocesso contínuo.

Ácido forte e temperatura relativamentebaixa – Inicialmente, o material é misturado comácido sulfúrico diluído (10%) e aquecido a 100oCpor 2 a 6 horas no primeiro reator de hidrólise. Asbaixas temperatura e pressão minimizam a de-gradação dos açúcares. Para recuperarem-se osaçúcares, o material hidrolisado no primeiro rea-tor é lavado com água diversas vezes. O resíduosólido do primeiro estágio é, então, seco e adicio-nado de ácido sulfúrico numa concentração de30% a 40% por 1 a 4 horas para a etapa dehidrólise da celulose. O material é drenado e fil-trado para remoção dos sólidos e recuperação doaçúcar e do ácido. A solução com ácido e açúcardo segundo estágio é reciclada para a primeiraetapa. Os açúcares da hidrólise da segunda eta-pa são, então, recuperados no líquido da primeiraetapa de hidrólise. A principal vantagem do pro-cesso ácido concentrado é a eficiência na recu-peração de açúcares, que pode chegar a 90%para celulose e hemicelulose. As baixas tempe-raturas e pressões permitem o uso de materiaiscom menor custo, como fibra de vidro. Infelizmen-te, é um processo relativamente lento que exigeum controle rígido. Além disso, é necessário quehaja um sistema efetivo para recuperação do áci-do. Sem essa etapa, quantidades muito grandesde base teriam que ser utilizadas para neutralizar

a solução de açúcares antes da fermentação. Essaneutralização forma sais (mais comumente sulfa-tos de sódio ou cálcio) que requerem tratamento,e causam uma despesa adicional.

FermentaçãoAs leveduras são fungos normalmente

unicelulares, apresentando células de forma ar-redondada. Apesar de não ser o único microrga-nismo capaz de produzir álcool, as propriedadesespecíficas das leveduras, como tolerância a al-tas concentrações de álcool e CO2, o crescimen-to rápido e a capacidade de fermentação as tor-nam os microrganismos mais adequados para aoperação em escala industrial. As cepas maisimportantes para a produção de álcool são asSaccharomyces cerevisiae e Saccharomycescarlsbergensis. Sua biomassa pode ser recupera-da como subproduto da fermentação e transfor-mada em levedura seca, que se constitui em ma-téria-prima para fabricação de ração animal ousuplemento vitamínico humano. Existem váriaslinhagens (raças) desse microrganismo que foramselecionadas ao longo do tempo, para maior tole-rância a variações de pH, maior resistência aoálcool e rendimento da fermentação. As caracte-rísticas genéticas que as leveduras devem ter parauma boa produção industrial de álcool são: altaprodução (relação entre o álcool produzido e oaçúcar disponível à levedura); alta velocidade defermentação; alta tolerância ao álcool; tolerân-cia a altas temperaturas e estabilidade (essas ca-racterísticas devem ser mantidas em uma linha-gem de levedura por várias gerações).

Tudo o que é necessário para iniciar a fer-mentação é misturar o inóculo de leveduras emanter as condições adequadas para o seu cres-cimento e produção de etanol. O tempo de fer-mentação pode variar com a matéria-prima, omicrorganismo, o pH, a temperatura e diversosoutros fatores, levando, normalmente, de 2 a 5dias. Diversos fatores físicos (temperatura, pres-são osmótica), químicos (pH, oxigenação, nutri-entes minerais e orgânicos, inibidores) emicrobiológicos (espécie, linhagem e concentra-ção da levedura, contaminação bacteriana) afe-tam o rendimento da fermentação, ou seja, a efi-

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ciência da conversão de açúcar em etanol. Ge-ralmente, as quedas na eficiência fermentativadecorrem de uma alteração no equilíbrio do pro-cesso, levando à maior formação de produtos se-cundários (especialmente glicerol, ácidos orgâ-nicos e biomassa), ou por contaminação de ou-tros microrganismos, como bactérias, que com-petem pelo substrato para produção de outros pro-dutos.

DestilaçãoO mosto fermentado (vinho) que vem da

fermentação possui, em sua composição, 7% a10% em volume de álcool, além de outros com-ponentes de natureza líquida, sólida e gasosa. Oálcool presente nesse vinho é recuperado peladestilação, processo de separação de componen-tes de uma mistura baseado nas suas capacida-des de evaporação (volatilidades) em uma dadatemperatura e pressão. Na destilação, a mistura éaquecida até a ebulição, e os vapores são resfria-dos até sua condensação. Esse processo baseia-se no fato de que, numa solução de líquidos volá-teis, o fracionamento dos mesmos se dá de tal for-ma que os que apresentam pontos de ebuliçãomais baixos se separam primeiro, seguidos pelosoutros componentes em uma seqüência corres-pondente às suas respectivas volatilidades. Assim,o efeito final é o aumento da concentração docomponente mais volátil no vapor e do compo-nente menos volátil no líquido. Em virtude da di-ferença de gravidade entre a fase líquida e vapor,o líquido desce à coluna de destilação enquantoo vapor sobe, sendo recolhidos separadamente.

No caso de uma mistura homogênea (comoa da água e álcool), o destilado terá a composi-ção dos dois componentes, mas com predominân-cia do mais volátil. Então, para se fazer a separa-ção, usa-se um processo em série, que leva aoprogressivo enriquecimento em álcool da corren-te de líquido ascendente. Por esse processo ob-tém-se, a partir de um vinho de 7% a 9% de teoralcoólico, um teor próximo a 96% em etanol. Apartir desse ponto, ocorre um fenômeno físicodenominado “azeotropia” e a destilação fracio-nada não funciona mais. A mistura nessa compo-

sição é chamada “mistura azeotrópica”. A forma-ção de um azeótropo na destilação determina aexistência de duas classes de álcool: álcoolhidratado e álcool anidro ou absoluto. Asespecificações para os tipos de álcool hidratadoe do anidro dependem basicamente da aplica-ção que será dada ao álcool.

Secagem do álcoolO álcool hidratado, produto final dos pro-

cessos de destilação e retificação, é uma misturabinária álcool–água que atinge um teor da ordemde 96oGL. Isso ocorre em conseqüência da for-mação de uma mistura azeotrópica, fenômeno fí-sico no qual os componentes não são separadospelo processo de destilação. Esse álcool hidratadopode ser comercializado dessa forma ou podesofrer um processo de desidratação. De fato, sen-do a secagem do álcool mais uma etapa de fabri-cação que requer adicionais trabalho, gastos eenergia, deve-se considerar muito seriamente asvantagens e desvantagens de se fabricar álcoolhidratado ou anidro. Atualmente, três métodosprincipais são usados na obtenção de etanolanidro:

Destilação azeotrópica – Consiste na adi-ção de um terceiro componente na corrente deprodutos de topo, que irá formar um outroazeótropo de ponto de ebulição mais baixo. Ouso desse método iniciou-se nos anos 1970, utili-zando-se benzeno como o terceiro componente.Atualmente, 65% do álcool anidro brasileiro é ob-tido com esse método, usando-se, especialmen-te, ciclo-hexano, que há mais de 15 anos substi-tuiu o benzeno, com vantagens de saúdeocupacional e ambiental. No entanto, esse pro-cesso é considerado demasiadamente energético.

Destilação extrativa – A técnica da utili-zação da destilação extrativa na desidratação doetanol não é nova, e foi utilizada no Brasil atémeados da década de 1970, quando veio ser subs-tituída pela destilação azeotrópica com benzeno,por esta representar um custo de instalação me-nor. Nesse método adiciona-se monoetilenoglicol(MEG) ou glicerina na corrente de produtos de

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fundo, como separador de fases, eliminando o ál-cool anidro pelo topo da coluna. Apesar de terum custo inicial um pouco elevado, esse proces-so passa a ser vantajoso se for contabilizada, porexemplo, a economia de um terço da energia (va-por e água) consumida pelo ciclo-hexano. Alémdisso, esse processo produz álcool de qualidadesuperior, a operação da planta é mais simples e osolvente pode ser facilmente recuperado. Dessaforma, com o desenvolvimento de tecnologiaspara adaptação de plantas que operam por desti-lação azeotrópica para destilação extrativa, o usodessa última tem aumentado ano a ano. Atual-mente, esse processo é responsável por 25% daprodução nacional de álcool anidro, mas estima-se que até o final da safra 2004–2005, 33% daprodução será por destilação extrativa.

Destilação com peneiras moleculares –Este sistema foi desenvolvido na década de 1970nos Estados Unidos. É o processo com menor con-sumo energético, porém exige alto investimentoinicial. Consiste da adsorsão em zeólitos (materi-al microporoso, semelhante a uma cerâmica), sen-do a água depois extraída do zeólito pela aplica-ção de vácuo. Com a utilização da peneiramolecular, não há uso de qualquer insumo quími-co, obtendo-se um álcool anidro sem traços des-ses produtos. Dessa forma, esse álcool é especifi-camente indicado para aplicações mais exigen-tes, como o uso em indústrias farmacêuticas, quí-micas e de alimentação. O custo de produção deálcool anidro (R$/m³ de álcool) com a destilaçãocom peneiras moleculares é de cerca de 30%maior que a destilação azeotrópica e o dobro dadestilação extrativa.

Aproveitamento dossubprodutos de fermentação

Uso da vinhaça

A vinhaça, resíduo final da fabricação doálcool etílico por via fermentativa, é também co-nhecida por vinhoto, restilo, caldo ou garapão,dependendo da região. Para cada litro de álcoolproduzido, são produzidos de 10 a 15 L de vinhaça.Sua composição é bastante variável, dependen-

do, principalmente, da composição do vinho, oqual, por sua vez, depende de fatores como anatureza e a composição da matéria-prima, o sis-tema usado no preparo do mosto, o método defermentação adotado, o equipamento e métodousados na destilação e o tipo de flegma separado.

É caracterizada como um efluente de des-tilarias com alto poder poluente (cerca de cemvezes a do esgoto doméstico), que decorre da suariqueza em matéria orgânica e por possuir trêsimportantes componentes: nitrogênio, fósforo epotássio. Apesar de tal potencial, por muito tem-po a vinhaça foi simplesmente evacuada em riose canais abertos, o que provocava um compro-metimento significativo de flora e fauna das regi-ões próximas às usinas.

Com o início da sistemática de controle dapoluição dos órgãos públicos, algumas medidastransitórias foram adotadas e a vinhaça passou aser armazenada em solo. Logo surgiram, porém,as áreas de sacrifício, que acabaram comprome-tendo a qualidade da terra e das águas subterrâ-neas e foi necessário realizar um maior aprimo-ramento da questão. Enfim, a grande concentra-ção de potássio observada na vinhaça estimulouestudos integrados para o aproveitamento do pro-duto na área agrícola como fonte de adubaçãodos canaviais. Hoje essa prática é realizada emmuitas unidades e sua utilização in natura, atra-vés da fertirrigação em quantidades racionais,além de contribuir positivamente na atividade pro-dutiva, evita o despejo do resíduo em cursosd'água.

Uma outra alternativa é a combustão dire-ta ou incineração total da vinhaça. Esse processoconsiste na queima da vinhaça e na recuperaçãoeconômica de alguns sais, como o potássio, queposteriormente pode ser reutilizado nas práticasde fertilização da lavoura. Esse método apresen-ta basicamente três benefícios: elimina por com-pleto esse efluente poluente, possibilita a recupe-ração econômica de alguns sais para posterior usoagrícola e possibilita a geração de energia a par-tir da queima.

A biodigestão anaeróbica da vinhaça é umaoutra alternativa ainda pouco utilizada nas usi-

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nas. Consiste no tratamento desse material emreatores anaeróbicos, um processo largamenteconhecido e empregado no tratamento deefluentes urbanos domésticos. Tem como vanta-gem um baixo consumo de energia, pequena pro-dução de descartes (lodo), grande eficiência nadiminuição da carga orgânica e a produção deetanol envolvida no processo pode ser capturadae convertida em gerar energia. Além disso, avinhaça tratada nesse sistema apresentabaixíssimo potencial poluidor quando reutilizadana fertirrigação.

Uso do resíduo das matérias-primas

Após a extração do açúcar ou amido, emgeral, tem-se produtos com uma composição ricaem minerais e, geralmente, altamente energéticase facilmente digeríveis. Dessa forma, na maiorparte das vezes podem seu utilizados na alimen-tação animal em complementação à ração.

Usos diferentes têm sido estudados para asmatérias-primas mais comuns na produção de ál-cool, como beterraba, cana-de-açúcar e grãos,especialmente milho. A seguir, serão feitas consi-derações sobre esses materiais.

Beterraba – A polpa constitui um elementode grande valor nutricional para a produção decarne e leite. É assim um subproduto destinado àsindústrias de alimentação animal. Pode serdisponibilizada no estado seco ou granulada, emambos os casos com um teor de matéria seca naordem dos 90%, ou, alternativamente, no estadoúmido (polpa prensada), com um teor de matériaseca de aproximadamente 22%.

Cana-de-açúcar – O bagaço da cana-de-açúcar é um subproduto do processo de extraçãodo caldo, seja este para a produção de açúcar oude álcool. A principal característica do bagaçoda cana é o seu teor de fibra, uma vez que a quan-tidade de bagaço que se obtém por unidade demassa de cana depende do teor de fibra. Em com-paração a outros resíduos da agroindústria, o ba-gaço é considerado um subproduto nobre utiliza-do historicamente como combustível em caldei-ras, visando à produção de vapor de processo e

energia elétrica para os processos de industriali-zação do açúcar e do álcool. De fato, 1 t de canamoída gera aproximadamente 250 kg de bagaço,que, revertido em energia calórica, representa oequivalente a 560 mil kcal. Essa mesma quanti-dade de cana produz 70 L de álcool que propor-cionam em torno de 392 mil kcal de energia, ouseja, existe mais energia embutida no bagaço dacana do que no álcool isoladamente. Comparadaa queima do bagaço com outros combustíveis fós-seis, ela é mais limpa, gerando menor impactoambiental uma vez que praticamente não liberacompostos com bases de enxofre, como SO2 ouSO3, relativamente comum na queima de óleoscombustíveis. Além disso, sua queima é lenta comuma baixa temperatura de chama proporcionan-do pouca formação de óxido nitroso. O bagaçopode ainda ser empregado como fertilizante or-gânico e como matéria-prima para a produçãode papel, celulose, aglomerados e chapas demadeira. Recentemente, com o desenvolvimentode técnicas de hidrólise de compostos celulósicos,também têm sido feitos estudos para seu uso comosubstrato para a produção de álcool.

Grãos – Os resíduos de grãos após a extra-ção do amido têm sido utilizados, com sucesso,como complemento em dietas de suínos, aves,ovinos e gado. Esses resíduos são fonte de vitami-na B e possuem um teor protéico relativamentealto.

Uso das leveduras

As leveduras secas, provenientes da fer-mentação do álcool, constituem excelentes raçõespara animais, substituindo com vantagens o farelode soja. Podem ser utilizadas também como fer-mento na indústria de panificação, farmacêuticae de bebidas.

Novas tecnologias naprodução de etanol combustível

Grande parte da tecnologia de produçãode etanol combustível foi desenvolvida há 30–40anos. Entretanto, existem muitas pesquisas sendo

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feitas, principalmente relacionadas à viabilizaçãodo uso de materiais celulósicos e resíduosagroindustriais como matérias-primas. De fato, nosprocessos utilizados atualmente, a matéria-primachega a custar 40% do valor de produção doetanol. Dessa forma, o desenvolvimento detecnologias adequadas para o uso de matérias-primas mais baratas, como materiais lignocelulósi-cos, será uma contribuição significativa na redu-ção dos custos de produção e maior universa-lização do uso de etanol combustível. A seguir,serão descritas algumas dessas novas tecnologias.

Enzimas imobilizadas

Uma das mais importantes áreas de pes-quisa atualmente trata do uso de enzimas na con-versão de amido e celulose em açúcaresfermentescíveis. Como já discutido neste traba-lho, o uso de enzimas traz uma alta conversão,operação relativamente simples e baixo consu-mo de energia. Entretanto, as enzimas são carase extremamente sensíveis, além do que, com atecnologia atualmente usada, são misturadas nocaldo e não podem ser recuperadas parareutilização. Uma solução que tem sido estuda-da envolve a imobilização de enzimas, isto é,"prendê-las" em um substrato inerte. Como resul-tado, após a conversão, o caldo poderia ser filtra-do, e as enzimas recuperadas e usadas novamen-te, levando a considerável economia.

Pré-tratamento da celulose

Para a lignocelulose ficar disponível parafermentação, ela deve ser tratada de modo quesejam liberados açúcares de cadeia curta, quepodem ser, então, convertidos em etanol por mi-crorganismos. Atualmente, não existe nenhum pré-tratamento completamente eficiente para essaconversão, porém diversos métodos têm sido es-tudados e otimizados.

Explosão a vapor (auto-hidrólise)

A explosão a vapor é um método razoa-velmente comum de pré-tratamento de materiais

lignocelulósicos. Nesse método, a biomassa mo-ída é tratada com vapor saturado a alta pressãoseguido por uma redução abrupta da pressão, oque faz o material entrar em decompressão ex-plosiva. A explosão a vapor é normalmente ope-rada a temperaturas iniciais entre 160oC–260oC(correspondendo a pressões entre 0,69–4,83 MPa)por alguns segundos, e, então, o material é ex-posto a pressão atmosférica. Com esse métodopode-se ter uma alta eficiência na conversão dacelulose. As limitações desse método incluem adestruição da fração de xilana, disrupção incom-pleta da matriz lignina-carboidrato e geração decompostos que podem ser inibidores do cresci-mento do microrganismo.

Sacarificação e fermentação simultâneas

Nesse processo, as enzimas que transfor-marão a lignocelulose em açúcares fermentes-cíveis e o microrganismo que vai fermentar omaterial são adicionados simultaneamente nomesmo reator, à medida que a lignocelulose étransformada em açúcares de cadeia curta pelasenzimas, estes são transformados em etanol pelomicrorganismo. Esse processo aumenta a conver-são de etanol pela diminuição da produção decompostos inibidores do crescimento dos micror-ganismos, assim como elimina a necessidade dedois reatores diferentes para a sacarificação (con-versão de lignocelulose em açúcares de cadeiacurta) e fermentação. Ademais, a maior limitaçãodo processo ocorre pelas diferentes temperaturasótimas de sacarificação (50oC) e fermentação(35oC). Além disso, o etanol produzido pode exer-cer alguma inibição no processo de sacarificação.

Modificação genética

A falta de microrganismos que tenham acapacidade de, por um lado, fermentar açúcaresde cadeia longa, e, por outro, produzir etanol emconcentrações viáveis é o grande problema douso de materiais lignocelulósicos como substratopara a fermentação alcoólica. Dessa forma, umobjetivo importante da engenharia genética temsido desenvolver tal microrganismo, combinan-do as vantagens de diferentes espécies.

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Considerações finaisO álcool é conhecido há muito tempo, sen-

do, talvez, o mais antigo produto obtido pelabiotecnologia tradicional. Em suas aplicações in-cluem-se o álcool potável, químico e combustí-vel. De fato, carros abastecidos com etanol fo-ram planejados por Henry Ford já na década de1880, quando ele desenvolveu seu primeiro mo-delo, Ts, que funcionava com etanol feito de mi-lho. Entretanto, no século 20, os combustíveis de-rivados de petróleo, chamados "combustíveis fós-seis", apareceram e rapidamente dominaram omercado. Os preços menores de combustíveispersistiram por bastante tempo, até a crise do pe-tróleo, na década de 1970. Essa crise realçou aimportância do uso de fontes alternativas de ener-gia, entre elas o etanol.

Além da questão econômica, sob o pontode vista ambiental, são pacificamente reconheci-das as vantagens do álcool, seja quando empre-gado isoladamente sob a forma de álcoolhidratado, seja quando misturado à gasolina sobforma de álcool anidro. Em ambos os casos, apre-senta imensa vantagem de reduzir a emissão demonóxido de carbono e de dispensar o empregodo chumbo tetraetila como aditivo, um dos ele-mentos mais tóxicos no ar das grandes cidades.Graças ao álcool, o Brasil não contribui para oaumento do efeito estufa e foi o primeiro país a selivrar do chumbo tetraetila. Além dessa vantagem,o álcool combustível propicia redução na emis-são de poluentes primários e também reduçãoconsiderável nas chamadas emissões poluidorasreativas. Em termos gerais, portanto, o álcool gerauma energia cada vez mais “limpa”, característi-ca invejável e cada vez mais atrativa num mun-do onde cresce a preocupação com o total depoluentes emitidos.

Há mais de 20 anos, a primeira Conferên-cia Mundial sobre Meio Ambiente, patrocinadapela Organização das Nações Unidas (ONU),determinou, como condição da boa convivênciainternacional, o estabelecimento de uma relação

mais equilibrada do homem com o meio ambien-te. Desde então, a procura por esse equilíbrio tor-nou-se uma tendência irreversível em todo o Pla-neta. Alguns países já criaram impostos sobre aemissão de CO2. Uma série de mecanismos per-mitirá que as quantias arrecadadas sejam inves-tidas em projetos que contribuam para diminuir ototal de gás emitido. O álcool, pela sua contribui-ção positiva à questão ambiental, poderá ser be-neficiado por mecanismos semelhantes.

As tecnologias em uso atualmente para aprodução de etanol são baseadas em culturasvegetais, utilizando-se substratos como cana-de-açúcar e amido de milho. Por serem matérias-pri-mas alimentares, e que precisam de manejo agrí-cola, esses materiais podem representar até 40%do custo de produção do etanol. Dessa forma, acompleta utilização da tecnologia existente e osnovos desenvolvimentos, principalmente no to-cante ao uso de materiais lignocelulósicos comomatéria-prima, tornarão a produção de etanolmuito mais econômica e promissora em um futu-ro próximo.

ReferênciasBNDES. Documento de base para discussão sobre umprograma de ampliação da produção de álcool no Brasilcom vistas à exportação. 2003. Disponível em: <http://www.bndes.gov.br/conhecimento/seminario/alcool_discussao.pdf>. Acesso em: 05 nov. 2006

GOLDEMBERG, J. E MACEDO, I. Brazilian AlcoholProgram: na overview. Energy for Sustainable Development,[S.l.] n. 1, p. 17-22, 1994.

IBGE. Levantamento sistemático da produção agrícola.Disponível em: <http://www.ibge.gov.br>. Acesso: 15 out.2006

LEONEL, M.; CEREDA, M. P. Physicochemicalcharacterization of some starchy tubers. Ciência eTecnologia de Alimentos, Campinas, SP, v. 22, n. 1, p. 65-69, 2002.

SUN,Y.; CHENG, J. Hydrolysis of lignocellulosic materialsfor ethanol production: a review. Bioresource Technology,Essex, v. 83, n. 1, p. 1-11, 2002.

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Agroenergia veicular

Não há como negar: o Brasilé hoje um país privilegiado!

Enquanto o mundo procura um meio parase livrar da dependência do petróleo, combustí-vel hoje usado por quase 1 bilhão de veículos eque algum dia, de modo inexorável, vai acabar, onosso país se deu ao luxo, no começo deste ano,de reduzir a quantidade de álcool misturado nagasolina, porque o consumo de álcool puro au-mentou tanto, em decorrência do seu baixo pre-ço e da grande venda e aceitação dos veículosflex fuel, que a produção não acompanhou a de-manda, obrigando-nos a gastar mais do combus-tível fóssil para economizar o renovável.

Isto seria absolutamente lamentável, se fos-se para sempre. Mas não: após poucos meses, aprodução de álcool está crescendo num ritmo talque se pode afirmar que a normalidade seráalcançada em breve. Além disso, o País alcan-çou a auto-suficiência na extração e produçãode petróleo, permitindo que essas mudanças ocor-ram sem afetar a balança de pagamentos.

Este é um bom exemplo do potencial queos combustíveis renováveis, produzidos a partirda biomassa, terão no mundo nos próximos anose da facilidade que o Brasil terá em responder àprocura por um novo combustível que possa serintegrado aos combustíveis convencionais, poisninguém espera que essa frota de 1 bilhão deveículos seja substituída por uma que não use de-rivados de petróleo de um dia para o outro, ouque seus proprietários se conformem em deixá-los na garagem por falta de combustível. Portan-to, misturar novos produtos aos combustíveis tra-dicionais será um meio rápido de estender a dis-ponibilidade dos derivados de petróleo e, conse-qüentemente, do uso dos veículos existentes, uma

Henry Joseph Jr.1

1 Presidente da Comissão de Energia e Meio Ambiente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), diretor da AssociaçãoBrasileira de Engenharia Automotiva (AEA) e gerente do Laboratório de Motores e Emissões da Volkswagen do Brasil.

vez que 10% de álcool na gasolina ou 5% de óleovegetal no óleo diesel significa economizar mui-to petróleo.

É absolutamente certo quando se diz queos veículos do futuro serão silenciosos, dotadosde motores elétricos não poluentes, que usarãohidrogênio para gerar energia e este gás seráobtido de modo ambientalmente correto e sus-tentável.

Porém, existe um enorme deserto a se cru-zar entre a realidade que hoje vivemos e estemundo perfeito de amanhã, uma vez que a frotaque usa derivados de petróleo continua crescen-do – vide China, Índia e todo potencial de cresci-mento dos países em desenvolvimento – e a in-dústria automobilística mundial, por absoluta fal-ta de opções econômica ou tecnicamente viáveis,continua a fabricar 65 milhões de veículos porano com motores de combustão interna, ecologi-camente poluentes e termodinamicamente pou-co eficientes, porém confiáveis e acessíveis. Ouseja, ao invés de diminuir o consumo de petróleo,a humanidade está celeremente indo na direçãocontrária.

A única exceção, atualmente,neste panorama, é o Brasil.

O nosso país produz para o mercado inter-no cerca de 1,5 milhão de veículos leves por anoque, como o dos outros países, também são dota-dos de motores de combustão interna, mas queestão adaptados para queimar álcool puro ou umagasolina misturada com mais de 20% de álcool.Mesmo para os motores a diesel, usados em ca-minhões, ônibus, tratores ou picapes, já é previstoo uso de um óleo diesel contendo de 2% a 5% deóleo vegetal transesterificado (sem glicerina), e

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no futuro este teor irá aumentar para 15% ou 20%,ou talvez até mesmo 100%.

Assim, apesar de aparentemente estarmosfabricando veículos convencionais, na realidadeestamos constituindo uma frota de veículos quesão mais independentes da necessidade de pe-tróleo e que têm permitido ao País fazersignificante economia de divisas e melhor se pre-parar para atravessar o deserto citado. Enquantoas montadoras e a comunidade científica interna-cional trabalham para desenvolver e produziraquele mencionado veículo do futuro, o Brasil vaiestar minimizando suas necessidades de deriva-dos de petróleo, por meio do uso em larga escalade combustíveis derivados da biomassa. E, pro-vavelmente, muitos outros países vão seguir essemesmo caminho.

Essa nossa posição não foi conseguida degraça nem de imediato. Há 30 anos, ante umasituação momentânea internacional de forte re-dução na oferta de petróleo, fez-se uma opçãopor uma alteração profunda da nossa matrizenergética e, desde então, alternando momentospositivos e negativos diante de cenários promis-sores e de outros nem tanto, pesquisadores, pro-dutores de álcool, indústria automobilística, decomponentes, etc. têm trabalhado bastante paraatingirmos essa posição atual.

Sem dúvida, o lançamento em março de2003 dos veículos flex fuel, popularmente cha-mados de bicombustíveis, foi um marco históricona nossa matriz energética e um ponto de inflexãono mercado de combustíveis alternativos do nos-so país. Após vários anos do sucesso do Proálcool,quando 5 milhões de veículos a álcool foram pro-duzidos até 1992, a indústria automobilística bra-sileira produziu neste período de 3 anos 1,5 mi-lhão de veículos flexíveis. Hoje, sete fabricantesestão oferecendo mais de 70 modelos “flex” nomercado brasileiro, a preço equivalente aos dosveículos similares convencionais.

Graças à enorme aceitação desses veícu-los e ao seu preço competitivo perante a gasoli-na, a produção brasileira de álcool, que vinha di-minuindo 11% ao ano, tomou um violento impul-so e passou a crescer a mais de 10% ao ano.

Entretanto, mesmo com esse crescimento,a demanda nos últimos meses foi maior que a ofer-ta, pressionando o preço do álcool e levando ogoverno a tentar intervir nesse mercado, fazendoacordos para estabelecimento de preços máximose reduzindo o teor de álcool na gasolina para au-mentar sua disponibilidade. Tudo em vão, pois opreço não abaixou conforme esperado. Como emmercado livre o que vale é a lei da oferta e daprocura, finalmente, com o início da safra e au-mento da produção, o preço do álcool começa ase reduzir e a distribuição volta a se normalizar.

Paralelamente, estes últimos anos tambémforam marcados pelo galopante aumento do pre-ço do petróleo no mercado internacional, quepassou de US$ 25 o barril para mais de US$ 70dólares, o que coloca os refinadores brasileirosnuma saia justa ante o álcool, uma vez que comos carros flexíveis o consumidor pode passar comfacilidade de álcool para gasolina e vice-versa,levando os formuladores de preços a ter que pen-sar muito antes de repassar os aumentos de custodo óleo cru para os derivados, sob pena de per-der mercado.

Entretanto, não é somente a questão do au-mento do preço e a preocupação com o esgota-mento das reservas que têm levado pesquisado-res de todo o mundo a procurar alternativas paraos derivados do petróleo. Desde que se desco-briu que a temperatura da Terra vem crescendopor culpa dos gases resultantes da queima doscombustíveis fósseis, o que levou vários paísesdesenvolvidos a assinar o famoso Protocolo deKyoto, onde se comprometem a reduzir as emis-sões desses gases, a comunidade científica bus-ca outra fonte de energia veicular que possa serusada sem aumentar o aquecimento global. E, maisuma vez, os combustíveis renováveis produzidosa partir da biomassa, entre eles o álcool, ganhamum papel importante.

A expressão "combustíveis renováveis" éusada para definir aqueles combustíveis feitos apartir de produtos agrícolas ou da fermentaçãode matéria orgânica, uma vez que, ao contráriodo combustível fóssil (petróleo ou gás natural), quequando acabar, acabou, o homem sempre pode-

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rá produzir mais, de acordo com suas necessida-des. Basta plantar ou fermentar.

Mas há uma outra particularidade que tor-na a expressão renovável mais significativa e quetem apontado os combustíveis renováveis comouma salvadora solução para o aquecimento glo-bal. É o fato de que o gás CO2, emitido pela quei-ma de qualquer combustível e principal causa doaquecimento atmosférico, é reabsorvido porfotossíntese pelas plantas usadas para produzir oscombustíveis renováveis, tornando neutro o seuuso. Assim, o CO2 emitido na queima se renova,sem agredir o ambiente.

Por essas características de facilidade deuso em tecnologias veiculares existentes, substi-tuição do moribundo e caro petróleo e reduçãono impacto ambiental, é que os combustíveisrenováveis feitos a partir da biomassa têm obtidoespaço e têm levado outros países a se interessarpor sua aplicação.

Do mesmo modo que existem países inte-ressados em usar os combustíveis renováveis, tam-bém existem países interessados na sua produ-ção para exportação, uma vez que por razõesclimáticas e geográficas são países com inclina-ção agrícola e enxergam nessa produção umaoportunidade econômica.

Portanto, pode-se imaginar brevemente osurgimento de um mercado internacional de com-bustíveis renováveis, criando alternativassocioeconômicas para muitos países e alternati-vas energéticas para outros, pelo menos até quese desenvolva um novo conceito de veículo, maislimpo, acessível, confiável, para ser produzido emlarga escala e que substitua os atuais automóveiscom motor de combustão interna.

E quais são as novas tecnologias maispromissoras em desenvolvimento?

Basicamente, todos os estudos em anda-mento apontam para um mesmo caminho, que éo do uso de motores elétricos, pois são eficientes,silenciosos, potentes, não emitem poluentes e sãosimples. Porém, são duas as questões ainda emaberto: como gerar a energia elétrica para movi-mentar o motor de modo seguro e não poluente e

como levar a bordo essa energia em quantidadesuficiente para o veículo ter uma boa autonomia.

Gerar energia de modo seguro e nãopoluente passa pela análise dos riscos que envol-vem usinas nucleares ou térmicas, e levar quanti-dade suficiente de energia a bordo significa qual-quer coisa que não seja a conhecida e pesadabateria à base de chumbo ou de outros metaispesados.

Atualmente, acredita-se que o meio maisadequado de gerar a energia elétrica necessáriaseria pela troca iônica obtida na passagem de hi-drogênio por um conjunto de membranaseletrolíticas, a chamada célula de combustível (oufuel cell), acrescida de um reformador catalíticoque possa extrair o hidrogênio de uma substânciarica nesse gás, tal como o gás natural (rico emmetano), ou, preferencialmente, devido à facili-dade de abastecimento e transporte, de um líqui-do, tal como um álcool (metanol ou etanol). Devi-do à sua baixíssima densidade e explosividade,procura-se evitar a idéia de transportar o própriogás hidrogênio em cilindros, no veículo.

Assim, como se pode observar, o Brasil con-tinua um país privilegiado no futuro da tecnologiaveicular, pois o uso de álcool para gerar hidrogê-nio, que em outros países é o metanol, obtido apartir do gás natural (fóssil e finito) ou de madeira(péssimo rendimento), no nosso caso será o etanol,que já sabemos fazer como ninguém.

Juntando-se tudo, temos umquadro bastante promissor.

Estamos substituindo nossa frota de veícu-los por automóveis flexíveis, que podem usar ga-solina ou álcool, o que nos permite flutuar de umcombustível para outro conforme os preços e adisponibilidade. Também estamos introduzindo oóleo vegetal misturado ao óleo diesel, o que re-duzirá nossa dependência do petróleo na medidaem que a produção desse biodiesel atingir escalasuficiente. Apesar de mais atrasados, outros paí-ses também estão seguindo caminhos semelhan-tes, o que levará a um mercado internacional decombustíveis renováveis, dando ao Brasil maissegurança energética e abrindo espaço para no-

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vos desenvolvimentos. Em virtude de suas carac-terísticas de sustentabilidade, por unir aspectoseconômicos, sociais e ambientais, e de reduçãode emissão de gases que causam o aquecimentoglobal, o mercado de combustíveis renováveisserá muito atraente para investimentos internaci-onais. Existe enorme potencial de aplicação doscombustíveis renováveis nas futuras tecnologias

veiculares. Alcançamos a auto-suficiência na pro-dução de petróleo e ainda temos disponibilidadede gás natural para ser incluído na matrizenergética.

Portanto, ao contrário dos países que temempelo futuro, o Brasil aguarda ansioso pela oportu-nidade de poder melhor usufruir do potencial desua matriz energética.

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Campeões dedesmatamento

Há 8 mil anos, o Brasil possuía 9,8% das flo-restas mundiais. Hoje, o País detém 28,3%. Dos 64milhões de quilômetros quadrados de florestas exis-tentes antes da expansão demográfica e tecnológicados humanos, restam menos de 15,5 milhões, cercade 24%. Mais de 75% das florestas mundiais já desa-pareceram. Com exceção de parte das Américas,todos os continentes desmataram, e muito, conformerevela o estudo da Embrapa Monitoramento por Sa-télite sobre a evolução das florestas mundiais2.

A Europa, sem a Rússia, detinha mais de 7%das florestas do Planeta e hoje tem apenas 0,1%. AÁfrica possuía quase 11% e agora 3,4%. A Ásia jádeteve quase um quarto das florestas mundiais(23,6%), agora possui 5,5% e segue desmatando. Nosentido inverso, a América do Sul, que detinha 18,2%das florestas, agora detém 41,4%, e o grande res-ponsável por esses remanescentes, cuja representa-tividade cresce ano a ano, é o Brasil.

Longe de estar encerrada no passado, essatendência se mantém e se o desflorestamento mun-dial prosseguir no ritmo atual, o Brasil – por ser umdos que menos desmataram – deverá deter no futuroquase metade das florestas primárias do Planeta. Oparadoxo é que, ao invés de ser reconhecido peloseu histórico de manutenção da cobertura florestal,o País vem sendo severamente criticado pelos cam-peões do desmatamento e paulatinamente alijadoda própria memória.

Na maioria dos países europeus, africanos easiáticos, a defesa da natureza é um fenômeno re-

Evaristo Eduardo de Miranda1

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cente. Mas a preocupação com a preservação flo-restal no Brasil vem de longa data. Desde o século16, no início do povoamento português, as Ordena-ções Manuelinas e Filipinas estabeleceram regras elimites para exploração de terras, águas e vegeta-ção. Em 1550, já havia uma lista de árvores reais,protegidas por lei, o que deu origem à expressãomadeira-de-lei. O Regimento do Pau-Brasil, de 1600,estabeleceu o direito de uso sobre as árvores masnão sobre as terras, consideradas reservas florestaisda Coroa. Elas não podiam ser destinadas à agricul-tura. Essa legislação garantiu a manutenção e a ex-ploração sustentável das florestas de pau-brasil até1875, quando entrou no mercado a anilina3. Ao con-trário do que muitos pensam e propagam, a explora-ção racional do pau-brasil manteve boa parte da MataAtlântica até o final do século 19 e não foi a causa doseu desmatamento, fato bem posterior.

O mesmo ocorreu com os manguezais. Em1760, um alvará real de Dom José I os protegeu. AsCâmaras Municipais foram notificadas e chamadasa aplicá-lo. Em 1797, uma série de cartas régias con-solidou as leis ambientais daquele tempo: pertenciaà Coroa toda mata à borda da costa, de rio que de-sembocasse imediatamente no mar ou que permitis-se a passagem de jangadas transportadoras de ma-deiras. A criação dos cargos de Juízes Conservado-res, aos quais coube aplicar as penas previstas nalegislação, foi outro marco em favor das florestas. Aspenas eram de multa, prisão, degredo e até penacapital para os incêndios dolosos4. No final do sécu-lo 19, surgiu o Regimento de Cortes de Madeiras,

1 Doutor em ecologia, chefe-geral da Embrapa Monitoramento por Satélite ([email protected]).2 www.cnpm.embrapa.br.3 MIRANDA, Evaristo Eduardo de. Natureza, conservação e cultura. Ensaio sobre as relações homem natureza no Brasil. Metalivros. São Paulo, 2002.4 A primeira lei de crimes ambientais da era republicana só foi promulgada em 1999.

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estabelecendo regras rigorosas para a derrubada deárvores, além de outras restrições à implantação deroçados.

O desmatamento, dos séculos 17 ao 19, limi-tou-se a alguns pontos da faixa costeira. Em junho de1808, D. João VI criou a primeira unidade de conser-vação florestal, o Real Horto Botânico do Rio de Ja-neiro, com mais de 2.500 ha5. Uma ordem, de 9 deabril de 1809, deu liberdade aos escravos que de-nunciassem contrabandistas de pau-brasil e o De-creto de 3 de agosto de 1817 proibiu o corte de árvo-res nas áreas circundantes às nascentes do Rio Cari-oca. Em 1830, o total acumulado de áreasdesmatadas no Brasil era inferior 30 mil quilômetrosquadrados6. Hoje, desfloresta-se mais do que isso acada 2 anos.

Em 1844, após uma grande seca, o ministroAlmeida Torres propôs desapropriações e plantios deárvores para salvar os mananciais do Rio de Janeiro.Em 1854 e 1856, começaram a ser desapropri-ados sítios com essa finalidade pelo ministroCouto Ferraz. Em 1861, pelo Decreto Imperialnº 577, de D. Pedro II, foram criadas (e plantadas)as Florestas da Tijuca e das Paineiras.

O pensamento e a crítica ambiental brasileirade hoje resultam de uma continuidade histórica deséculos, uma tradição intelectual única7. A políticaflorestal da Coroa portuguesa e brasileira logrou, pordiversos mecanismos, manter a cobertura vegetalpreservada até o final do século 19. O desmatamentobrasileiro é fenômeno do século 20. Entre 1985 e1995, a Mata Atlântica perdeu mais de 1 milhão dehectares, mais do que toda área desmatada no perí-odo da Coroa portuguesa. Em São Paulo, SantaCatarina e no Paraná, a marcha para o oeste trouxegrandes desmatamentos. As florestas de araucáriasforam entregues pela Ré-pública aos construtoresanglo-americanos de ferrovias, junto com as terrasadjacentes (15 a 30 km de cada lado!).

Na Amazônia, por 4 séculos, a presença hu-mana limitou-se a cidades ribeirinhas e aoextrativismo. A ocupação desenvolveu-se na segun-da metade do século 20 com migrações, crescimen-to da população, construção de estradas de roda-gem, hidrelétricas e outras obras de infra-estrutura.Há 30 anos, as taxas anuais de desmatamento naAmazônia têm variado de 15 mil a 20 mil quilôme-tros quadrados, com picos de 29 mil e 26 mil quilô-metros quadrados, respectivamente em 1995 e 2003,porém com tendência de queda nos últimos 2 anos,passando agora para 11 mil quilômetros quadradospor ano, segundo estimativas do Instituto Nacionalde Pesquisas Espaciais (Inpe)8.

O estudo da Empresa Brasileira de PesquisaAgropecuária (Embrapa) indica que, apesar dodesmatamento dos últimos 30 anos, o Brasil é umdos países que mais mantêm sua cobertura florestal.Dos 100% de suas florestas originais, a África man-tém hoje 7,8%, a Ásia 5,6%, a América Central9,7% e a Europa – o pior caso do mundo – apenas0,3%. Embora deva-se mencionar o esforço dereflorestar para uso turístico e comercial, não épossível ignorar que 99,7% das florestas primári-as européias foram substituídas por cidades, cul-tivos e plantações comerciais.

O continente que mais mantém suas florestasoriginais é a América do Sul, com 54,8%. Com inve-jáveis 69,4% de suas florestas primitivas, o Brasil temgrande autoridade para tratar desse tema ante as crí-ticas dos campeões do desmatamento mundial. Háque ter também responsabilidade para reavivar, pormeio de políticas e práticas duradouras, a eficáciadas medidas históricas de gestão e exploração quegarantiram a manutenção das suas florestas primári-as. Um bom começo seria recolocar sob responsa-bilidade do Ministério da Agricultura, Pecuária eAbastecimento as florestas cultivadas para produçãocomercial.

5 Hoje, o Jardim Botânico do Rio de Janeiro foi republicanamente reduzido a pouco mais de 100 ha.6 CASTRO, Carlos Ferreira de Abreu. Gestão Florestal no Brasil Colônia. UNB, Brasília, 2002.7 PADUA, José Augusto. Um sopro de destruição, pensamento político e crítica ambiental no Brasil escravista (1786-1888). Zahar, Rio de Janeiro, 2002.8 Projeto PRODES – www.obt.inpe.br/prodes/index.html

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1. Tipo de colaboração

São aceitos, por esta Revista, trabalhos que se enquadrem nasáreas temáticas de política agrícola, agrária, gestão e tecnologiaspara o agronegócio, agronegócio, logísticas e transporte, estudosde casos resultantes da aplicação de métodos quantitativos equalitativos aplicados a sistemas de produção, uso de recursosnaturais e desenvolvimento rural sustentável que ainda não forampublicados nem encaminhados a outra revista para o mesmo fim,dentro das seguintes categorias: a) artigos de opinião; b) artigoscientíficos; d) textos para debates.

Artigo de opinião

É o texto livre, mas bem fundamento sobre algum tema atual e derelevância para os públicos do agronegócio. Deve apresentar oestado atual do conhecimento sobre determinado tema, introduzirfatos novos, defender idéias, apresentar argumentos e dados,fazer proposições e concluir de forma coerente com as idéiasapresentadas.

Artigo científico

O conteúdo de cada trabalho deve primar pela originalidade, istoé, ser elaborado a partir de resultados inéditos de pesquisa queofereçam contribuições teórica, metodológica e substantiva parao progresso do agronegócio brasileiro.

Texto para debates

É um texto livre, na forma de apresentação, destinado à exposiçãode idéias e opiniões, não necessariamente conclusivas, sobretemas importantes atuais e controversos. A sua principal carac-terística é possibilitar o estabelecimento do contraditório. O textopara debate será publicado no espaço fixo desta Revista,denominado Ponto de Vista.

2. Encaminhamento

Aceitam-se trabalhos escritos em Português. Os originais devemser encaminhados ao Editor, via e-mail, para o endereç[email protected].

A carta de encaminhamento deve conter: título do artigo; nomedo(s) autor(es); declaração explícita de que o artigo não foi enviadoa nenhum outro periódico para publicação.

3. Procedimentos editoriais

a) Após análise crítica do Conselho Editorial, o editor comunicaaos autores a situação do artigo: aprovação, aprovaçãocondicional ou não-aprovação. Os critérios adotados são osseguintes:

• adequação à linha editorial da revista;

• valor da contribuição do ponto de vista teórico, metodológico esubstantivo;

• argumentação lógica, consistente, e que ainda assim permitacontra-argumentação pelo leitor (discurso aberto);

• correta interpretação de informações conceituais e de resultados(ausência de ilações falaciosas);

• relevância, pertinência e atualidade das referências.

b) São de exclusiva responsabilidade dos autores, as opiniões eos conceitos emitidos nos trabalhos. Contudo, o editor, com aassistência dos conselheiros, reserva-se o direito de sugerir ousolicitar modificações aconselhadas ou necessárias.

c) Eventuais modificações de estrutura ou de conteúdo, sugeridasaos autores, devem ser processadas e devolvidas ao Editor, noprazo de 15 dias.

d) A seqüência da publicação dos trabalhos é dada pela conclusãode sua preparação e remessa à oficina gráfica, quando entãonão serão permitidos acréscimos ou modificações no texto.

e) À Editoria e ao Conselho Editorial é facultada a encomenda detextos e artigos para publicação.

4. Forma de apresentação

a) Tamanho – Os trabalhos devem ser apresentados no programaWord, no tamanho máximo de 20 páginas, espaço 1,5 entre linhase margens de 2 cm nas laterais, no topo e na base, em formatoA4, com páginas numeradas. A fonte é Times New Roman, corpo12 para o texto e corpo 10 para notas de rodapé. Utilizar apenasa cor preta para todo o texto. Devem-se evitar agradecimentos eexcesso de notas de rodapé.

b) Títulos, Autores, Resumo, Abstract e Palavras-chave (key-words) – Os títulos em Português devem ser grafados em caixabaixa, exceto a primeira palavra ou em nomes próprios, com, nomáximo, 7 palavras. Devem ser claros e concisos e expressar oconteúdo do trabalho. Grafar os nomes dos autores por extenso,com letras iniciais maiúsculas. O resumo e o abstract não devemultrapassar 200 palavras. Devem conter uma síntese dos objetivos,desenvolvimento e principal conclusão do trabalho. É exigida,também, a indicação de no mínimo três e no máximo cinco pala-vras-chave e key-words. Essas expressões devem ser grafadasem letras minúsculas, exceto a letra inicial, e seguidas de doispontos. As Palavras-chave e Key-words devem ser separadaspor vírgulas e iniciadas com letras minúsculas, não devendo conterpalavras que já apareçam no título.

c) No rodapé da primeira página, devem constar a qualificaçãoprofissional principal e o endereço postal completo do(s) autor(es),incluindo-se o endereço eletrônico.

d) Introdução – A palavra Introdução deve ser grafada em caixa-alta-e-baixa e alinhada à esquerda. Deve ocupar, no máximoduas páginas e apresentar o objetivo do trabalho, importância econtextualização, o alcance e eventuais limitações do estudo.

e) Desenvolvimento – Constitui o núcleo do trabalho, onde que seencontram os procedimentos metodológicos, os resultados dapesquisa e sua discussão crítica. Contudo, a palavra Desenvol-vimento jamais servirá de título para esse núcleo, ficando a critériodo autor empregar os títulos que mais se apropriem à natureza doseu trabalho. Sejam quais forem as opções de título, ele deve seralinhado à esquerda, grafado em caixa baixa, exceto a palavrainicial ou substantivos próprios nele contido.

Em todo o artigo, a redação deve priorizar a criação de parágrafosconstruídos com orações em ordem direta, prezando pelaclareza e concisão de idéias. Deve-se evitar parágrafos longosque não estejam relacionados entre si, que não explicam, quenão se complementam ou não concluam a idéia anterior.

f) Conclusões – A palavra Conclusões ou expressão equivalentedeve ser grafada em caixa-alta-e-baixa e alinhada à esquerda dapágina. São elaboradas com base no objetivo e nos resultadosdo trabalho. Não podem consistir, simplesmente, do resumo dosresultados; devem apresentar as novas descobertas da pesquisa.Confirmar ou rejeitar as hipóteses formuladas na Introdução, sefor o caso.

g) Citações – Quando incluídos na sentença, os sobrenomes dosautores devem ser grafados em caixa-alta-e-baixa, com a dataentre parênteses. Se não incluídos, devem estar também dentro

Instrução aos autores

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do parêntesis, grafados em caixa alta, separados das datas porvírgula.

• Citação com dois autores: sobrenomes separados por “e”quando fora do parêntesis e com ponto-e-vírgula quandoentre parêntesis.

• Citação com mais de dois autores: sobrenome do primeiroautor seguido da expressão et al. em fonte normal.

• Citação de diversas obras de autores diferentes: obedecerà ordem alfabética dos nomes dos autores, separadas porponto-e-vírgula.

• Citação de mais de um documento dos mesmos autores:não há repetição dos nomes dos autores; as datas das obras,em ordem cronológica, são separadas por vírgula.

• Citação de citação: sobrenome do autor do documentooriginal seguido da expressão “citado por” e da citação daobra consultada.

• Citações literais que contenham três linhas ou menos devemaparecer aspeadas, integrando o parágrafo normal. Após oano da publicação acrescentar a(s) página(s) do trecho citado(entre parênteses e separados por vírgula).

• Citações literais longas (quatro ou mais linhas) serão desta-cadas do texto em parágrafo especial e com recuo de quatroespaços à direita da margem esquerda, em espaço simples,corpo 10.

h) Figuras e Tabelas – As figuras e tabelas devem ser citadas notexto em ordem seqüencial numérica, escritas com a letra inicialmaiúscula, seguidas do número correspondente. As citaçõespodem vir entre parênteses ou integrar o texto. As Tabelas eFiguras devem ser apresentadas no texto, em local próximo aode sua citação. O título de Tabela deve ser escrito sem negrito eposicionado acima desta. O título de Figura também deve serescrito sem negrito, mas posicionado abaixo desta. Só são aceitastabelas e figuras citadas efetivamente no texto.

i) Notas de rodapé – As notas de rodapé devem ser de naturezasubstantiva (não bibliográficas) e reduzidas ao mínimo necessário.

j) Referências – A palavra Referências deve ser grafada comletras em caixa-alta-e-baixa, alinhada à esquerda da página. Asreferências devem conter fontes atuais, principalmente de artigosde periódicos. Podem conter trabalhos clássicos mais antigos,diretamente relacionados com o tema do estudo. Devem sernormalizadas de acordo com a NBR 6023 de Agosto 2002, daABNT (ou a vigente).

Devem-se referenciar somente as fontes utilizadas e citadas naelaboração do artigo e apresentadas em ordem alfabética.

Os exemplos a seguir constituem os casos mais comuns, tomadoscomo modelos:

Monografia no todo (livro, folheto e trabalhos acadêmicospublicados).

WEBER, M. Ciência e política: duas vocações. Trad. de LeônidasHegenberg e Octany Silveira da Mota. 4. ed. Brasília, DF: EditoraUnB, 1983. 128 p. (Coleção Weberiana).

ALSTON, J. M.; NORTON, G. W.; PARDEY, P. G. Science underscarcity: principles and practice for agricultural research

evaluation and priority setting. Ithaca: Cornell University Press,1995. 513 p.

Parte de monografia

OFFE, C. The theory of State and the problems of policy formation.In: LINDBERG, L. (Org.). Stress and contradictions in moderncapitalism. Lexinghton: Lexinghton Books, 1975. p. 125-144.

Artigo de revista

TRIGO, E. J. Pesquisa agrícola para o ano 2000: algumasconsiderações estratégicas e organizacionais. Cadernos deCiência & Tecnologia, Brasília, DF, v. 9, n. 1/3, p. 9-25, 1992.

Dissertação ou Tese

Não publicada:

AHRENS, S. A seleção simultânea do ótimo regime dedesbastes e da idade de rotação, para povoamentos depínus taeda L. através de um modelo de programaçãodinâmica. 1992. 189 f. Tese (Doutorado) – Universidade Federaldo Paraná, Curitiba.

Publicada: da mesma forma que monografia no todo.

Trabalhos apresentados em Congresso

MUELLER, C. C. Uma abordagem para o estudo da formulação depolíticas agrícolas no Brasil. In: ENCONTRO NACIONAL DEECONOMIA, 8., 1980, Nova Friburgo. Anais... Brasília: ANPEC,1980. p. 463-506.

Documento de acesso em meio eletrônico

CAPORAL, F. R. Bases para uma nova ATER pública. SantaMaria: PRONAF, 2003. 19 p. Disponível em: <http://www.pronaf.gov.br/ater/Docs/Bases%20NOVA%20ATER.doc>.Acesso em: 06 mar. 2005.

MIRANDA, E. E. de (Coord.). Brasil visto do espaço: Goiás eDistrito Federal. Campinas, SP: Embrapa Monitoramento por Satélite;Brasília, DF: Embrapa Informação Tecnológica, 2002. 1 CD-ROM.(Coleção Brasil Visto do Espaço).

Legislação

BRASIL. Medida provisória nº 1.569-9, de 11 de dezembro de1997. Estabelece multa em operações de importação, e dá outrasprovidências. Diário Oficial [da] República Federativa doBrasil, Poder Executivo, Brasília, DF, 14 dez. 1997. Seção 1, p.29514.

SÃO PAULO (Estado). Decreto nº 42.822, de 20 de janeiro de1998. Lex: coletânea de legislação e jurisprudência, São Paulo,v. 62, n. 3, p. 217-220, 1998.

5. Outras informações

a) O autor ou os autores receberão cinco exemplares do númeroda Revista no qual o seu trabalho tenha sido publicado.

b) Para outros pormenores sobre a elaboração de trabalhos aserem enviados à Revista de Política Agrícola, contatar diretamenteo coordenador editorial, Mierson Martins Mota, ou a secretária-geral, Regina Mergulhão Vaz, em:

[email protected]; telefone: (61) 3448-4336

[email protected]; telefone: (61) 3218-2209

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Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária

CG

PE6050

Colaboração